Todos nós já ouvimos falar da figura de fiador nas operações de

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Todos nós já ouvimos falar da figura de fiador nas operações de
PUBLICADO NA EDIÇÃO IMPRESSA | SEGUNDA-FEIRA, 28 DE MAIO DE 2012 | POR JM
FIADORES: CASOS PRÁTICOS
Esperamos que, com estas questões, tenhamos contribuído para
esclarecer e alertar as pessoas, que devem ponderar muito bem,
antes de aceitarem ser fiadores de alguém, por muito amigos que
sejam. Ponderação essa, que passa muito, pela avaliação da
idoneidade e confiança da pessoa a favor de quem se é fiador.
Na semana passada, abordamos a temática da
fiança e o papel do fiador nas operações de
crédito. Julgámos pertinente aprofundar esta
questão, pelo interesse que suscitou junto dos
leitores.
Todos já compreendemos, claramente, que a
figura do fiador não é mais do que uma garantia
adicional,
que
assegurará
ao
banco
o
cumprimento de determinado crédito concedido a
um seu cliente, caso este falhe.
Qualquer pessoa pode ser fiador, desde que seja maior de idade e
tenha capacidade jurídica para o efeito. Todavia, os bancos, para
reforço da sua garantia e segurança, exigem fiadores que tenham
património, meios financeiros e que não possuam incumprimentos
bancários. Nestes termos, a figura do fiador popularizou-se e tornouse comum, como se tornaram, também, conhecidos casos e histórias
de pessoas que perderam os seus bens por terem, por amizade, sido
fiadores de dívidas de terceiros. Na verdade, a grande maioria das
pessoas que aceita ser fiador quando lhe pedem, fá-lo como uma
ajuda a um amigo ou familiar.
No entanto, muitas vezes, ser fiador revela-se a pior decisão
financeira que alguém pode tomar. Vejamos dois exemplos concretos,
para os quais foi solicitado o apoio do Serviço de Defesa do
Consumidor:
O primeiro caso diz respeito ao Sr. José Freitas (nome fictício) que
assumiu o papel de fiador do seu filho (António Freitas) no contrato
de crédito automóvel.
António Freitas, para além do contrato atrás referido, ainda, era
detentor de outros créditos, nomeadamente crédito à habitação,
crédito pessoal e vários cartões de crédito.
Tudo corria bem, quando foi confrontado com uma situação de
desemprego. A cônjuge, apenas auferia o rendimento mínimo
mensal. Com dois filhos menores, ficaram numa situação de
desespero, não conseguindo honrar as suas responsabilidades
financeiras, entraram numa espiral de sobreendividamento.
A única solução, uma vez que o banco não aceitara a dação em
cumprimento do imóvel (entrega pelo devedor ao credor do imóvel
para liquidação total ou parcial da dívida) seria a insolvência para
pessoas singulares. (situação em que se encontra o devedor, cujo
passivo – dívidas - é manifestamente superior ao activo –
rendimentos/património).
O grande problema residia no fiador (José Freitas).
A questão que se coloca é a seguinte:
António Freitas, devedor principal, fica com a sua situação
resolvida através do recurso a uma insolvência. Quais seriam
então as consequências para o seu pai, enquanto fiador?
Neste caso concreto, o fiador seria responsabilizado pelo
cumprimento integral da dívida. É de salientar que José Freitas, que
vivia num clima de estabilidade financeira, apesar de possuir outras
dívidas, ficou com o seu orçamento familiar descontrolado, não
conseguindo, desta forma, fazer face aos seus compromissos
financeiros. Os problemas de incumprimento começaram, e
consequentemente, foi forçado a recorrer, também ele, à insolvência.
O segundo caso foi-nos colocado pelo Sr. Paulo Santos (nome fictício)
e tem a ver com o seguinte:
“Em 2007, fui fiador na compra de uma casa (crédito à habitação). A
pessoa que comprou a casa, disse que tinha uma herança para
receber e uma dívida relativa a pensão de alimentos atrasada, pelo
que, além da fiança ainda me pediu 10 mil euros. Em 2009, ainda
não tinha recebido nada e, para piorar a situação, a pessoa ficou com
o salário penhorado por Tribunal, devido a uma divida antiga.
Novamente emprestei dinheiro, para saldar essa divida. Neste
momento tenho um cheque pré datado de 16 mil euros e sou fiador.
As minhas perguntas são: Poderei pedir a anulação do contrato e
respectiva fiança, baseada no facto de o banco não ter investigado
que a pessoa em questão tinha um processo em Tribunal? De certa
forma, sinto-me burlado pela pessoa, mas também pelo banco. Como
poderei agir nesse sentido? Como posso descobrir que dívida de
Tribunal era essa? Que poderei fazer para reaver o dinheiro do
cheque, sabendo que este não tem cobertura? Em caso de
incumprimento do pagamento das prestações, poderei, na qualidade
de fiador, pedir ao banco para executar a hipoteca? Na qualidade de
fiador, tenho direito a alguma informação privilegiada relativamente
ao contrato, saldos bancários da pessoa, ou algo que me possa ser
útil?”
A resposta foi a seguinte:
1-Relativamente à anulação do contrato de mútuo com hipoteca em
que é fiador:
Esse contrato tem por finalidade conceder crédito a uma pessoa para
a aquisição de habitação própria. Para garantia do cumprimento das
obrigações dele decorrentes, habitualmente os bancos (entidades que
emprestam o dinheiro) exigem a constituição de hipoteca voluntária
sobre o imóvel financiado. O montante da garantia é um valor
máximo que contempla eventuais incumprimentos.
Para além desta garantia (garantia real) os bancos podem pedir
garantias pessoais (fiança). É o seu caso. Para além do banco ter
garantido o pagamento do montante que emprestou através da
eventual execução da hipoteca que detém sobre o imóvel, pode
igualmente executar o fiador nos seus bens pessoais até ao montante
em dívida.
Claro que a venda em execução do imóvel poderá, ou não, ser
suficiente para o pagamento. Se for, nada mais terá que ser exigido
do mutuário e/ou do fiador. Se não for suficiente, o remanescente
poderá ser exigido pelo banco ao mutuário e ao fiador nessa mesma
execução.
Como é evidente, o que refere não poderá ser motivo para arguir
qualquer nulidade, anulabilidade e/ou irregularidade do contrato de
mútuo com hipoteca. A análise de risco é responsabilidade do banco.
2-O cheque que tem na sua posse, que refere ser "pré-datado", pode
ser objecto de execução. Contudo, aconselhamos que, antes de
recorrer a este mecanismo, se informe junto de um advogado ou
agente de execução, sobre os meios que estão ao seu dispor (a
solvabilidade do devedor principal) para satisfazer o seu crédito.
3-Em caso de incumprimento das prestações, poderá ser executado
conjuntamente com o devedor principal, na qualidade de fiador.
A sua obrigação é, na verdade, solidária e é, por isso, comum os
bancos incluírem um documento anexo ao contrato de crédito, com
vista à renúncia do "benefício da excussão prévia", que muitas vezes
passa despercebida.
Quando assinado, significa que o banco não tem primeiro que
executar o património do devedor principal, podendo executar o
fiador, se assim o entender.
4-A qualidade de fiador dá-lhe o direito de saber do regular
cumprimento ou incumprimento do contrato. Essa informação é,
normalmente, assegurada pelos bancos.
5-Um direito que lhe assiste como fiador é o de poder exigir do
afiançado tudo o que pagar em cumprimento da obrigação, isto é, o
"direito de regresso". A informação sobre saldos bancários já é
informação sigilosa, apenas podendo ser levantada através de
decisão judicial.”
Esperamos que, com estas questões, tenhamos contribuído para
esclarecer e alertar as pessoas, que devem ponderar muito bem,
antes de aceitarem ser fiadores de alguém, por muito amigos que
sejam. Ponderação essa, que passa muito, pela avaliação da
idoneidade e confiança da pessoa a favor de quem se é fiador.