Monografia TCC DAS RECEITAS DA UNIÃO

Transcrição

Monografia TCC DAS RECEITAS DA UNIÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
FACULDADE DE DIREITO
PAULO HENRIQUE DA ROCHA
A INCONSTITUCIONALIDADE DA DESVINCULAÇÃO DAS RECEITAS
DA UNIÃO
Extrapolação da Competência da União na Cobrança das
Contribuições Sociais e de Intervenção de Domínio Econômico
Belo Horizonte
2015
PAULO HERIQUE DA ROCHA
A INCONSTITUCIONALIDADE DA DESVINCULAÇÃO DAS RECEITAS
DA UNIÃO
Extrapolação da Competência da União na Cobrança das
Contribuições Sociais e de Intervenção de Domínio Econômico
Monografia apresentada ao Curso
de Direito da Universidade Federal
de Minas Gerais, como requisito
parcial para obtenção do grau de
Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Dr. Flávio de
Couto Bernardes
Belo Horizonte
2015
PAULO HERIQUE DA ROCHA
A INCONSTITUCIONALIDADE DA DESVINCULAÇÃO DAS RECEITAS
DA UNIÃO
Extrapolação da Competência da União na Cobrança das
Contribuições Sociais e de Intervenção de Domínio Econômico
Monografia apresentada ao Curso
de Direito da Universidade Federal
de Minas Gerais, como requisito
parcial para obtenção do grau de
Bacharel em Direito.
____________________________________________
Prof. e orientador Dr. Flávio de Couto Bernardes
____________________________________________
Prof. Dr.
____________________________________________
Prof. Dr.
Belo Horizonte, ____ de dezembro de 2015.
Persiga um sonho,
mas não deixe ele viver sozinho.
Descubra-se todos os dias,
deixe-se levar pelas vontades,
mas não enlouqueça por elas.
Acelere seus pensamentos, mas
não permita que eles te consumam.
Mergulhe de cabeça nos seus desejos e satisfaça-os.
Procure os seus caminhos,
mas não magoe ninguém nessa procura.
Arrependa-se, volte atrás, peça perdão!
Não se acostume com o que não o faz feliz,
revolte-se quando julgar necessário.
Alague seu coração de esperanças,
mas não deixe que ele se afogue nelas.
Se achar que precisa voltar, volte!
Se perceber que precisa seguir, siga!
Se estiver tudo errado, comece novamente.
Se estiver tudo certo, continue.
Se sentir saudades, mate-a.
Se perder um amor, não se perca!
Se achá-lo, segure-o!
Caso sinta-se só, olhe para as estrelas:
eu sempre estarei nelas.
Não estão ao seu alcance, mas estarão eternamente
brilhando para você!
Trecho de “Navegue” por Silvana Duboc
RESUMO
O presente estudo trata da DRU - Desvinculação das Receitas
da União, e busca analisar se o mecanismo é constitucional, sob a
perspectiva de que a não observância da afetação do produto da
arrecadação, das contribuições sociais e contribuições de intervenção
no domínio econômico, caracteriza uma extrapolação de competência
da União para a cobrança destas espécies tributárias. Fez-se uma
analise dos conceitos das espécies tributárias e do instituto denominado
de Desvinculação das Receitas da União e por fim um estudo sobre a
adequação de tal instituto ao ordenamento jurídico constitucional.
Com esse objetivo buscou-se através de uma abordagem
crítica da tredestinação do produto da arrecadação de tributos cuja
receita é pré-afetada, demonstrar a inconstitucionalidade do mecanismo
e explicitar os reflexos que esta desvirtuação gera, buscando entender
as razões que levaram um mecanismo de caráter temporário e
extraordinário a estar em vigor por mais de 20 anos.
Palavras-chave:
Contribuições
Sociais;
Contribuição
de
Intervenção no Domínio Econômico; Desvinculação de Receitas da
União; Tredestinação do Produto da arrecadação; Inconstitucionalidade.
ABSTRACT
This study deals with the DRU - Untying the Union's revenue,
and seeks to examine whether the mechanism is constitutional, from the
perspective of that failure of the storage product affectation, social
contributions and intervention contribution in the economic domain, it
features a extrapolation of Union competence to recover these tax
species. There was an analysis of the concepts of tax species and
institute called Untying of Union Revenues and finally a study on the
appropriateness of such an institute to constitutional law.
With this objective we sought through a critical approach to
tredestinação the proceeds from the collection of taxes whose revenue is
pre-affected, demonstrating the mechanism of unconstitutionality and
explain the consequences that this distortion creates, seeking to
understand the reasons behind a character mechanism temporary and
extraordinary to be in place for over 20 years.
Keywords: Social Contributions; Contribution for Intervention in
the Economic Domain; Untying of Union's revenue; Unconstitutional.
SUMÁRIO
1 - INTRODUÇÃO .................................................................................. 8
2 - O TRIBUTO E A SUA DESTINAÇÃO ............................................. 12
3
-
COMPETÊNCIA DA UNIÃO
PARA
A INSTITUIÇÃO
DE
CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS E DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO
ECONÔMICO ....................................................................................... 16
4 - CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS ........................................................... 17
5 - CONTRIBUIÇÕES DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO
............................................................................................................. 22
6 - A PRÉ-AFETAÇÃO DE RECEITAS TRIBUTÁRIAS ....................... 23
7 – A INCONSTITUCIONALIDADE DA DRU – DESVINCULAÇÃO DAS
RECEITAS DA UNIÃO ......................................................................... 25
8 - CONCLUSÃO ................................................................................. 36
REFERÊNCIAS ..................................................................................... 39
8
1 - INTRODUÇÃO
Ao atribuir competência a União para a instituição das
Contribuições Sociais e de Intervenção no Domínio Econômico o
legislador constitucional ao mesmo tempo outorgou a competência para
tributar e criou uma limitação, tendo em vista que produto da
arrecadação é pré-afetado.
Sendo assim, a tredestinação do produto da arrecadação não
caracterizaria extrapolação de competência por parte a União e
consequentemente a inconstitucionalidade do instituto, que se sobrepõe
a mandamento constitucional e fere vários princípios constitucionais
tributários?
Em um contexto social e político onde se fala o tempo todo em
elevada carga tributária, reforma tributária, excesso de impostos, não
aplicação do produto da arrecadação dos tributos em áreas necessárias,
desvio de dinheiro público e vários outros temas relacionados às
finanças públicas e principalmente ao Direito Tributário, em especial a
arrecadação e aplicação dos tributos, mister se faz esclarecer quais os
mecanismos existentes que a maioria da população não tem
conhecimento e demonstrar qual o panorama real e quais são os
verdadeiros problemas existentes na política tributária brasileira.
O
presente
trabalho
busca
analisar
o
mecanismo
da
Desvinculação das Receitas da União (DRU), e tentará demonstrar a
inconstitucionalidade na cobrança dos tributos que são afetados por ele.
9
O mecanismo da desvinculação de receitas se originou em
1994, à época da implementação do Plano Real, como medida de
estabilização da economia e reserva emergencial, com o nome de
Fundo Social de Emergência – FSE, posteriormente, foi alterado,
passando a ser denominado Fundo de Estabilização Fiscal - FEF. A
intenção a época era criar um mecanismo temporário de auxílio ao
Governo no período inicial de queda da inflação, enquanto as reformas
fiscais não fossem aprovadas. Mas desde então este mecanismo foi
sendo prorrogado passando a adquirir o nome pelo qual o conhecemos
hoje, por meio da EC nº 27, de 21 de março de 2000.
A partir de então a DRU vem sendo prorrogada e um
mecanismo temporário de auxílio num período de transição e
dificuldades, da impressão de que nunca mais será extinto. Por isso, nos
últimos anos sempre que se aproxima o termo da vigência da norma que
estabelece a DRU, o tema volta tona e nos traz vários questionamentos.
O que garante que a futura emenda que prorroga o mecanismo não
possa aumentar o percentual da DRU? O que garante que não venha a
haver nova prorrogação prolongando a validade até 2020, ou 2030, ou
então, vire instituto permanente?
Além dos motivos acima citados o tema se mostra interessante
por outros diversos fatores. Primeiramente tem se que correntes
doutrinárias divergentes quanto à natureza da pré-afetação do produto
da arrecadação dos tributos chegam à mesma conclusão, a de que o
mecanismo é inconstitucional. Segundo, porque as receitas que são
desvinculadas pelo mecanismo advêm dos tributos que geram maior
arrecadação para a União, em sua maioria que não tem de ser
10
repartidas com os demais entes da federação e que coincidentemente
sofreram nos últimos anos os maiores aumentos de alíquotas.
Outro fator relevante é o fato das receitas “afetadas” pela
desvinculação envolverem em grande parte o produto da arrecadação
de tributos, cuja destinação está intimamente ligada a áreas de grande
importância para a população, como a seguridade social, ou áreas cujos
contribuintes esperam retornos e investimentos específicos, visto que
estes estão na gênese da criação do tributo.
O tema se mostra desafiador, pois apesar dos grandes
impactos sociais, financeiros e tributários que gera, poucos estudos se
fazem sobre ele, principalmente no que diz respeito às contribuições. A
pesquisa então é complexa e difícil, mas ao mesmo tempo traz grande
satisfação e aguça a curiosidade.
Deste modo se tentará demonstrar a inconstitucionalidade da
Desvinculação das Receitas da União (DRU), tendo em vista que a
característica mais marcante, das contribuições sociais e contribuições
de intervenção no domínio econômico, são a pré-afetação do produto de
suas arrecadações, logo, a destinação diversa daquela estabelecida na
norma instituidora do tributo ou aquela estabelecida na constituição leva
a extrapolação de competência da União e consequentemente a
inconstitucionalidade da cobrança destes tributos.
Por se tratar de um tema extenso e muito complexo serão
abordadas apenas as partes do mecanismo que afetam as contribuições
sociais e as contribuições de intervenção no domínio econômico, não
sendo abordadas as questões relativas aos impostos. Não serão
11
tratadas também as questões afetas ao balanço financeiro do Estado e
relativas aos impactos na atuação do gestor público.
12
2 - O TRIBUTO E A SUA DESTINAÇÃO
“Atividade Financeira é o conjunto de ações
do Estado para a obtenção da receita e a realização
dos gastos para o atendimento das necessidades
públicas” (TORRES, Ricardo Lobo, 2011, p. 3).
As receitas públicas são os recursos captados pelo Estado
para a execução de suas funções públicas, essas receitas são
classificadas de várias formas, uma das mais importantes e a
classificação em receitas originárias e derivadas.
As receitas originárias são aquelas decorrentes da exploração
do patrimônio do Estado (p.ex. vendas e aluguéis de prédios e outros
bens e cobrança de preços públicos). Já as receitas derivadas são as
advindas do patrimônio privado (p.ex. tributos). Hoje a maior fonte de
receitas do Estado são sem dúvida os tributos e por isso o Direito
Tributário, e o estudo dos tributos passou a ganhar uma importância
cada vez maior. Deste modo se faz necessário definir e conceituar
tributo.
O Código Tributário Nacional, em seu art. 3º, oferece a
seguinte definição de tributo:
“Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em
moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não
constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e
cobrada mediante atividade administrativa plenamente
vinculada.”
13
Para fins didáticos passemos a analise de cada um dos termos
usados no art. 3º do CTN, para definir exatamente quando estaremos
diante de um tributo e não de outro tipo de prestação obrigacional.
O termo “prestação pecuniária” é utilizado para estabelecer que
no Brasil, obrigação tributária é sempre devida em dinheiro, nunca em
bens ou serviços. Compulsória, devido logicamente ao seu caráter
impositivo pelo Estado. A expressão “em moeda ou em valor que nela
se pode exprimir” visa à permissão para indexação, isto é, estabelecer
tributo em unidades do tesouro que não sejam dinheiro. Prestação que
não constitua ato ilícito, tributo não é multa seu fato gerador sempre
será um fato lícito. Por fim a expressão “instituída em lei e cobrada
mediante atividade administrativa plenamente vinculada”, visa consagrar
os princípios da legalidade e delimitar que a cobrança somente poderá
se dar nos estritos limites previstos em lei.
Logo, sempre que se deparar com uma prestação obrigacional,
para saber se esta diante de um tributo deverá se perguntar: A
prestação e voluntária? Constitui sanção a ato ilícito? É decorrente de
um dano? Caso as três respostas sejam negativas certamente se estará
diante de uma obrigação tributária.
Ocorre que para o estudo da tributação, não basta apenas
definir o gênero tributo, é necessário definir com precisão as diferentes
espécies tributárias, uma vez que questões de competência, incidência,
discriminação de rendas e limitação ao poder de tributar são variáveis e
determinadas de acordo com a espécie tributária.
14
Estabelece o art. 4º do Código Tributário Nacional:
“A
natureza
jurídica
determinada
pelo
específica
do
tributo
gerador
da
respectiva
fato
é
obrigação, sendo irrelevantes para classifica-la:
I – a denominação e demais características formais
adotadas pela lei;
II – a destinação legal do produto da arrecadação”
Deste modo fica claro que o legislador aponta que a distinção
do tributo em espécies leva em conta apenas a análise do fato gerador
da obrigação ou também chamado de critério material da hipótese de
incidência tributária.
Boa parte da doutrina possui entendimento em consonância
com o mandamento do art. 4º do CTN, isto é, o destino do produto da
arrecadação é irrelevante para a caracterização da espécie tributária e
nesse sentido entendem PAULO DE BARROS CARVALHO e AMILCAR
FALCÃO DE ARAUJO:
“O destino que se dê ao produto da
arrecadação é irrelevante para caracterizar a natureza
jurídica do tributo. Coincide, a ponto, com o limite do
campo especulativo do Direito Tributário, que não se
ocupa com momentos ulteriores à extinção do liame
fiscal”. (CARVALHO, Paulo de Barros, 2005, p.30-31).
“O destino do tributo, sua aplicação é mera
providência
momento
de
da
tesouraria
imposição;
[...].
o
Importante
motivo
jurídico
é
o
da
15
percepção do gravame pelo Estado”. (ARAUJO,
Amilcar Falcão de, 1990, p.15).
Ocorre que há divergência doutrinária quanto a esta divisão em
espécie dos tributos que leva em conta apenas o fato gerador, o PROF.
DR. WERTHER BOTELHO SPAGNOL afirma:
“Não se pode, pois, a luz da teoria tributária,
pretender que o fato gerador da obrigação seja o
único critério de identificação de uma espécie
tributária, nem tampouco desconsiderar, em face do
Texto
Maior,
o
destino
dado
ao
produto
da
arrecadação tributária” (SPAGNOL, Werther Botelho,
2002, p. 33).
Deste modo conclui o ilustre professor que a classificação dos
tributos
quanto
às
suas
espécies
(sejam
taxas,
impostos
ou
contribuições de melhoria) levando em consideração apenas o fato
gerador, não consegue abarcar as contribuições especiais e os
empréstimos compulsórios ou classifica-las de acordo com uma das três
espécies mencionadas. E então apresenta como solução para a
situação, uma classificação que leva em consideração a finalidade dada
ao produto da arrecadação do tributo, conjuntamente com a análise do
fato gerador.
16
3 - COMPETÊNCIA DA UNIÃO PARA A INSTITUIÇÃO DE
CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS E DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO
ECONÔMICO
Necessário então é a divisão dos tributos em espécies, pois a
Magna Carta distribui as competências de acordo com as espécies
tributárias. Tendo em vista o objeto deste estudo iremos tratar apenas
da distribuição de competências das Contribuições Especiais, mais
precisamente de duas de suas três subespécies, as Contribuições
Sociais e as Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico.
O art. 149 da Constituição da República Federativa do Brasil de
1988 estabelece:
“Compete exclusivamente à União instituir
contribuições sociais, de intervenção no domínio
econômico e de interesse das categorias profissionais
ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas
respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146,
III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195,
§ 6º, relativamente às contribuições a que alude o
dispositivo”.
Pela analise do artigo acima fica claro a competência da União
para a instituição e cobrança das Contribuições Sociais e das
Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico, mas até onde vai
esta competência. Para o desenvolvimento do estudo se faz necessário
primeiramente traçar comentários sobre as duas espécies tributárias que
serão tratadas no presente esforço teórico.
17
4 - CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS
Analisando a Constituição da República Federativa do Brasil,
pode-se afirmar que há dois tipos de Contribuições Sociais. Há as
contribuições destinadas ao custeio da Seguridade Social e àquelas
destinadas a satisfação de outros direitos sociais previstos na Carta
Magna.
Pode-se assim entender que as Contribuições Sociais em
sentido estrito, são os tributos destinados ao financiamento da outorga e
da garantia, pelo Poder Público, da Seguridade Social. A competência
para sua instituição se encontra explicitada nos arts. 194 e 195 da CF.
Art. 194. A seguridade social compreende
um conjunto integrado de ações de iniciativa dos
Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a
assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência
e à assistência social.
Parágrafo único. Compete ao Poder Público,
nos termos da lei, organizar a seguridade social, com
base nos seguintes objetivos:
I
-
universalidade
da
cobertura
uniformidade
e
equivalência
e
do
atendimento;
II
-
dos
benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;
18
III
-
seletividade
e
distributividade
na
prestação dos benefícios e serviços;
IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;
V - equidade na forma de participação no
custeio;
VI - diversidade da base de financiamento;
VII - caráter democrático e descentralizado
da administração, mediante gestão quadripartite, com
participação dos trabalhadores, dos empregadores,
dos
aposentados
e
do
Governo
nos
órgãos
colegiados.
Art. 195. A seguridade social será financiada
por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos
termos da lei, mediante recursos provenientes dos
orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, e das seguintes contribuições
sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade
a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos
do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à
pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem
vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
19
c) o lucro;
II - do trabalhador e dos demais segurados
da previdência social, não incidindo contribuição sobre
aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral
de previdência social de que trata o art. 201;
III - sobre a receita de concursos de
prognósticos.
IV - do importador de bens ou serviços do
exterior, ou de quem a lei a ele equiparar.
Quanto as Contribuições Sociais lato sensu vale-se ressaltar
que a Carta Constitucional de 1988 estabelece, em seu título II, Capítulo
II, arts. 6º a 11º, os direitos sociais do cidadão, são esses direitos que
este tipo de contribuição social visa concretizar. Vale destacar que a
Carta Magna de 1988 não outorgou competência para a União instituir
tais tipos de contribuição, apenas buscou garantir que algumas
contribuições preexistentes a ela fossem mantidas.
Logo, as Contribuições Sociais em sentido lato, referem-se a
tributos
vinculados
às
políticas
sociais,
mas
apenas
aquelas
recepcionadas pela nova ordem constitucional, quais sejam: o Finsocial
e PIS/PASEP, dispostos respectivamente nos arts. 56 do ADCT, 212, §
5º e art. 239 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:
Art. 56. Até que a lei disponha sobre o art.
195, I, a arrecadação decorrente de, no mínimo, cinco
dos seis décimos percentuais correspondentes à
alíquota da contribuição de que trata o Decreto-Lei nº
1.940, de 25 de maio de 1982, alterada pelo Decreto-
20
Lei nº 2.049, de 1º de agosto de 1983, pelo Decreto nº
91.236, de 8 de maio de 1985, e pela Lei nº 7.611, de
8 de julho de 1987, passa a integrar a receita da
seguridade social, ressalvados, exclusivamente no
exercício de 1988, os compromissos assumidos com
programas e projetos em andamento.
Art. 212. A União aplicará, anualmente,
nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no
mínimo,
da
receita
resultante
de
impostos,
compreendida a proveniente de transferências, na
manutenção e desenvolvimento do ensino.
§ 5º A educação básica pública terá como
fonte adicional de financiamento a contribuição social
do salário-educação, recolhida pelas empresas na
forma da lei.
Art. 239. A arrecadação decorrente das
contribuições para o Programa de Integração Social,
criado pela Lei Complementar nº 7, de 7 de setembro
de 1970, e para o Programa de Formação do
Patrimônio do Servidor Público, criado pela Lei
Complementar nº 8, de 3 de dezembro de 1970,
passa, a partir da promulgação desta Constituição, a
financiar, nos termos que a lei dispuser, o programa
do seguro-desemprego e o abono de que trata o § 3º
deste artigo.
21
Posto isto, deve-se observar os ensinamentos do ilustre
professor WERTHER BOTELHO SPAGNOL, segundo ele a Carta de
1988, ao mesmo tempo em que recepcionou tais contribuições, as
tornou de certa forma imutáveis na nova ordem jurídica, de modo que
qualquer alteração em suas estruturas originais deve ser entendida,
como verdadeira instituição de novo tributo. Nas palavras do ilustre
professor:
“O que fez o constituinte foi garantir, de
forma provisória (Finsocial) ou permanente (nos
outros dois casos), que a promulgação da nova Carta
de Princípios não comprometesse determinado fluxo
de arrecadação preexistente, cuidando de afetá-lo a
uma especial destinação social”. (SPAGNOL, Werther
Botelho, 2002, p.88).
Feita esta distinção, para o presente esforço teórico, só serão
objeto de estudo as Contribuições Sociais destinadas ao custeio da
Seguridade Social (stricto sensu).
22
5 - CONTRIBUIÇÕES DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO
ECONÔMICO
As Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico
(CIDE)
ou
contribuições
interventivas,
como
são
usualmente
denominadas, têm por escopo intervir em determinada atividade
econômica, de forma a atingir certo círculo de pessoas. Por mais
redundante que pareça, esse esclarecimento é importante, haja vista
que a quase totalidade dos tributos tem como finalidade arrecadar ou
custear uma atividade, uma prestação de serviço público ou o exercício
do poder de polícia.
A contribuição interventiva deve ser criada para atender nos
casos em que há a possibilidade jurídica da intervenção, o que se define
em face das normas constitucionais e também a necessidade da
referida intervenção, o que se determina em face das circunstâncias
econômicas excepcionais relativas ao setor econômico que será objeto
da intervenção.
Em razão do seu caráter excepcional, a Contribuição de
Intervenção no Domínio Econômico deve ser cobrada de forma
temporária, enquanto durar a necessidade de intromissão do Estado no
setor da economia. A lei que institui a cobrança da contribuição em
questão deve indicar expressamente a destinação dos recursos que
serão arrecadados, os quais, por motivos lógicos, não podem
ultrapassar o âmbito da atividade interventiva.
23
6 - A PRÉ-AFETAÇÃO DE RECEITAS TRIBUTÁRIAS
Visto a definição dessas duas espécies de Contribuições
Especiais percebe-se que a característica marcante das Contribuições
Sociais e das Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico, e
que será de suma importância neste esforço teórico, é a pré-afetação do
produto de sua arrecadação, nos dizeres de WERTHER BOTELHO
SPAGNOL:
“As contribuições sociais possuem como
característica marcante a afetação do produto de sua
arrecadação às despesas genéricas coma seguridade
social (stricto sensu) ou às despesas com a
manutenção de direitos sociais específicos (lato
sensu). Tal característica as individualiza da regra
geral de equilíbrio financeiro própria dos tributos
fiscais, ou seja, os gastos são a medida dos
ingressos. [...] O art. 195, § 5º, da Constituição
Federal ilustra bem a distinção: Nenhum benefício ou
serviço da seguridade social poderá ser criado,
majorado ou estendido sem a correspondente fonte de
custeio total”. (SPAGNOL, Werther Botelho, 2002,
p.92-93).
Tendo em vista a pré-afetação do produto da arrecadação das
Contribuições Sociais e das Contribuições de Intervenção no Domínio
Econômico, seria constitucional no direito pátrio um mecanismo que
desvinculasse parte do produto da arrecadação destes tributos?
24
Novamente
citamos
os
ensinamentos
do
professor
WERTHER
BOTELHO SPAGNOL:
“Sendo
as
contribuições
instituídas
em
virtude de um determinado gasto, ou seja, de uma
determinada finalidade, podemos afirmar que um
eventual desvio de finalidade ou a tredestinação do
produto
da
condições
arrecadação
para
o
implica
exercício
da
alteração
das
competência
impositiva”. (SPAGNOL, Werther Botelho, 2002, p.95).
No mesmo sentido de forma brilhante afirma a PROF. DRA.
MISABEL DERZI:
“Se inexiste o órgão, a despesa ou a pessoa
que
necessariamente
devem
financiar,
falece
competência à União para criar contribuições”.
(DERZI, Misabel, 1991, p. 208).
Em
observância
aos
ensinamentos
dos
dois
ilustres
professores, fazemos a seguinte pergunta, se as Contribuições de
Intervenção no Domínio Econômico e as Contribuições Sociais tratadas
no presente estudo, estivessem tendo parte de seu produto sendo
desviado para o Orçamento Fiscal, o que poderia acarretar tal ato.
25
7
–
A
INCONSTITUCIONALIDADE
DA
DRU
–
DESVINCULAÇÃO DAS RECEITAS DA UNIÃO
Primeiramente precisamos discorrer de forma geral sobre o
orçamento da União. O orçamento do Governo Federal é divido em duas
partes: o orçamento fiscal e o orçamento da seguridade social. A
seguridade social compreende as atividades do governo nas áreas de
saúde, assistência social e previdência social. As demais áreas têm
seus gastos programados no orçamento fiscal.
A Constituição ainda discriminou quais ingressos deveriam
custear cada orçamento. Para o da seguridade foram reservadas as
chamadas “contribuições sociais”, que são tributos que incidem,
principalmente, sobre a folha de pagamento das empresas, o lucro, o
faturamento ou a receita, conforme dispõe o artigo 195 da Constituição
Federal. São exemplos: as contribuições para a previdência social,
COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) e
CSLL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido).
Já o orçamento fiscal é composto pelos impostos tradicionais,
como os impostos sobre renda, sobre produtos industrializados, sobre
exportação e importação. No entanto, diferentemente das Contribuições
Sociais cuja receita não precisa ser divida, a Constituição determina que
a maioria dos impostos deva ter sua receita repartida com os estados e
municípios, conforme dispõem os artigos 157, 158 e 159 da Constituição
da República Federativa do Brasil.
A partir do momento em que houve a necessidade de elevar a
arrecadação para promover uma redução do déficit público e poder
26
pagar a elevada dívida pública, o Governo Federal se viu numa situação
muito complicada.
Há apenas uma competência definida na Carta Magna para a
instituição de imposto que ainda não foi exercida, qual seja, o imposto
sobre grandes fortunas (artigo 153, VII da Constituição Federal), medida
que gera grandes discussões doutrinárias e cujos estudos mostram que
a arrecadação seria muito pequena.
Outra saída seria aumentar a alíquota dos impostos já
existentes, medida que além de impopular, também não geraria grande
aumento de receita para a União, pois parte desta teria que ser dividida
com Estados e municípios, de modo que a União ficaria apenas com
algo em torno de 50% da receita adicional nos cofres.
A terceira medida pensada seria elevar a alíquota das
contribuições sociais, ocorre que além de desestimular os empresários
(maiores contribuintes) as receitas obtidas necessariamente devem ser
direcionadas para os gastos com saúde, assistência social e
previdência, não havendo a possibilidade de se carrear a nova receita
para o pagamento da dívida pública.
Nesse contexto, de procura de soluções se criou a DRU, que
nada mais é do que uma regra que estipula que 20% das receitas da
União ficariam provisoriamente desvinculadas das destinações fixadas
na Constituição. Com essa regra, 20% das receitas de contribuições
sociais, que compõem o orçamento da Seguridade Social, não
precisariam ser gastas nas áreas de saúde, assistência social ou
previdência social.
27
Passe-se
então
a
analise
desse
instituto
denominado
Desvinculação das Receitas da União (DRU). Ele tem suas origens no
ano de 1994, à época da implementação do Plano Real. Foi criado como
medida de estabilização da economia e reserva emergencial, com o
nome de Fundo Social de Emergência – FSE, que posteriormente, foi
alterado, passando a ser denominado Fundo de Estabilização Fiscal FEF. A intenção a época era criar um mecanismo temporário de auxílio
ao Governo no período inicial de queda da inflação, enquanto as
reformas fiscais não fossem aprovadas.
Mas desde então este mecanismo foi sendo prorrogado
passando a adquirir o nome pelo qual o conhecemos hoje, por meio da
EC nº 27, de 21 de março de 2000. A DRU então continuou sendo
prorrogada e hoje estamos sob a regulação da EC nº 68 de 21 de
dezembro de 2011, que prorrogou a desvinculação das receitas da
União até 31 de dezembro de 2015 e dando ao art. 76 dos Atos de
Disposição Constitucionais Transitórias (ADCT) a seguinte redação:
“São desvinculados de órgão, fundo ou
despesa, até 31 de dezembro de 2015, 20% (vinte por
cento) da arrecadação da União de impostos,
contribuições sociais e de intervenção no domínio
econômico, já instituídos ou que vierem a ser criados
até a referida data, seus adicionais e respectivos
acréscimos legais.”
Nesse ponto chega-se ao último objetivo que se pretende com
este estudo, qual seja, a análise da constitucionalidade da DRU.
28
Grande parte dos doutrinadores e dos tribunais entende que o
mecanismo
não
possui
qualquer
inconstitucionalidade,
sendo
perfeitamente aplicável, e essa é a corrente que prevalece, visto que o
art. 76 do ADCT se encontra em vigor e a desvinculação das receitas é
feita exatamente do modo que ele determina.
No entanto, WERTHER BOTELHO SPAGNOL e OTTO
CARVALHO PESSOA DE MENDONÇA vão contra tal corrente e
afirmam que, in verbis:
“Uma vez consignada a relevância jurídica do
destino da arrecadação das contribuições Sociais, há
que se concluir pela ilegitimidade e consequente
inconstitucionalidade de norma ou ato administrativo
que
imponha
destino
diverso
ao
produto
da
arrecadação daquele previsto constitucionalmente”.
(SPAGNOL, Werther Botelho, 2002, p.97).
“A tredestinação “constitucional” refere-se à
desafetação, veiculada por emendas constitucionais,
do produto da arrecadação das contribuições sociais e
interventivas. Sustentamos que estas emendas, além
de corromperem o regime jurídico-constitucional a que
estão submetidas esta exações, também afetarão o
exercício válido da competência da União Federal
outorgada pelo artigo 149 da Constituição. Por se
chocarem com o seu texto original, são, à primeira
vista,
inconstitucionais”.
(MENDONÇA,
Carvalho Pessoa de, 2006, p. 203).
Otto
de
29
Desvio de poder ou desvio de finalidade, constitui a má
utilização da competência que o agente possui para a prática de um
determinado ato, quer por fugir ao interesse público, quer quando, ainda
que de interesse público, o fim alcançado destoe do escopo precípuo
que tinha.
Deste modo esse conceito do Direito Administrativo foi
transportado para o Direito Tributário, para ser aplicado nos casos em
que há desvio ou tredestinação, seja ela parcial ou integral, das receitas
dos tributos a fins diversos daqueles fixados pela constituição.
A finalidade é elemento que não apenas caracteriza, mas
define a espécie tributária. A autorização dada pela constituição a União
para a criação e cobrança das Contribuições Sociais e de Intervenção
no Domínio Econômico, deve ser observada por completo, isto é, o
produto da arrecadação deve ser dirigido ao fim definido na Carta
Magna.
Deste modo, qualquer desvio de finalidade, em relação ao
produto da arrecadação das Contribuições Sociais e de Intervenção no
Domínio Econômico, importa na desconfiguração de tal espécie
tributária, e mais, a destinação é o fundamento de validade para a
competência da União na instituição desse tributo, ao dar destinação
diversa à prevista no Texto Maior falece a competência da União na
cobrança de tais espécies tributárias.
No paradigma do Estado Democrático de Direito, a tributação
não mais é um instrumento de arrecadação de recursos que objetiva
apenas custear a manutenção do aparato burocrático do Estado. Na
30
sociedade atual é nítida a importância da destinação das receitas de
certas espécies tributárias, que são consagradas na Constituição,
objetivando a satisfação de Direitos Sociais.
Nesse contexto faz-se necessário citar os ensinamentos do
professor WERTHER BOTELHO SPAGNOL, in verbis:
“(...) a Constituição Federal, a par de
consagrar uma série de direitos sociais ao cidadão,
estatuídos como direitos fundamentais, consagra
igualmente tributos destinados a fornecer recursos
específicos para a garantia de sua efetivação na
prática. Para que não se resumam a mera peça de
retórica, é necessário que a Carta Maior assegure o
financiamento dos direitos fundamentais de todos”.
(SPAGNOL, Werther Botelho, 2002, p.57).
Logo, se as Contribuições Sociais e de Intervenção no domínio
econômico são espécies tributárias instituídas em razão de determinado
gasto público, ou para financiar gastos, como por exemplo, a
Seguridade Social, qualquer desvio do fim a que se destina ou
tredestinação das receitas provenientes dessa arrecadação, gera
enormes complicações jurídicas, visto que a legitimidade para a sua
cobrança possui ligação direta com a finalidade que a constituição lhe
deu.
A questão então é bastante simples, se determinada
contribuição foi criada para arcar com os gastos relativos à manutenção
das estradas, por exemplo, qualquer mecanismo ou ato que vincule o
31
produto da arrecadação a área que fuja a esta finalidade, implica em
extrapolação de competência.
Além da questão da competência para a criação e cobrança do
tributo, no caso específico das Contribuições Sociais devemos analisar o
que diz o artigo 60 da Constituição Federal. Tal dispositivo legal ao tratar
da possibilidade/forma de alteração de disposições constitucionais,
estabeleceu de forma explicita, rol temático inalterável, as chamadas
cláusulas pétreas. Dispõe o referido artigo:
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada
mediante proposta:
§ 4º Não será objeto de deliberação a
proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e
periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais
Percebe-se no inciso IV que são vedadas quaisquer alterações
constitucionais, que atentem contra as garantias e direitos fundamentais
estabelecidos na Carta Magna. Fica claro que o constituinte buscou
proteger certos direitos e garantias que constituem a essência da nova
32
ordem jurídica que então se instaurava com a nova Constituição,
objetivando assim impedir que o legislador derivado alterasse aquilo que
era entendido como vital a nova forma de Estado e a sociedade que no
Brasil se edificava.
Novamente citamos os ensinamentos do professor WERTHER
BOTELHO SPAGNOL que discorreu sobre o tema, in verbis:
“De
evidência
solar,
portanto,
que
a
desvinculação de 20% do produto da arrecadação das
contribuições sociais do orçamento da seguridade
social é írrita, já que atentatória à Constituição por
comprometer o custeio de direitos fundamentais do
cidadão”. (SPAGNOL, Werther Botelho, 2002, p.103).
Dos ensinamentos do ilustre professor pode-se extrair a ideia
de que num Estado Democrático de Direito, que possui uma
Constituição repleta de Direitos Sociais, diretos estes que exigem uma
prestação comissiva do Estado, são necessários recursos próprios para
o custeio destas prestações positivas. O constituinte então previu
competências tributárias com intuito de dar ao Estado receitas para
fazer frente a estes gastos.
As Contribuições Sociais, enquanto tributo garantidor de
Direitos Sociais (garantias fundamentais) goza de proteção conferida por
clausula pétrea, não podendo ser o seu produto destinado a fim diverso
daquele estabelecido em constituição, qual seja, custeio de Direitos
Sociais, sob pena de atentar contra norma constitucional.
33
Portanto, a tredestinação do produto da arrecadação das
Contribuições Sociais e de Intervenção no Domínio Econômico leva a
extrapolação da competência estabelecida na Constituição a União,
visto que a partir do momento em que se aprova norma ou se pratica ato
que aloca as verbas obtidas com estes tributos em fim diverso daquele
estabelecido por norma constitucional, está se praticando conduta
inconstitucional.
No caso das Contribuições Sociais ainda há outro fator que
também gera a inconstitucionalidade, pois a criação de Emenda
Constitucional
que
traz
conteúdo
que
está
suprimindo
direito
fundamental é totalmente inconstitucional e vedado expressamente em
nossa constituição.
Nesse sentido entendem WERTHER BOTELHO SPAGNOL e
MISABEL DERZI, in verbis:
“Existindo
desvio
de
finalidade
ou
tredestinação, a cobrança da contribuição Social
torna-se inconstitucional, surgindo, por consequência,
direito subjetivo para o contribuinte de opor-se ao
pagamento ou repetir os pagamentos já efetuados”.
(SPAGNOL, Werther Botelho, 2002, p.154).
“A destinação é fundante da norma de
competência.
(...)
34
Inexistindo
o
fundamento
constitucional,
legitimador do exercício da faculdade legislativa, o
contribuinte pode opor-se à cobrança, pois indevido o
tributo que nasce de norma sem validade”. (DERZI,
Misabel de Abreu Machado, 1991, p. 209).
Logo, no caso das Contribuições Sociais e de Intervenção no
Domínio Econômico, a conexão entre os ingressos tributários e as
despesas específicas a cujo financiamento ou cobertura se destinam é
tal que, inevitavelmente, os gastos a serem realizados estabelecem a
justificação imediata e direta do ingresso tributário.
Uma contribuição é criada para a realização de um gasto
específico e não porque o referido gasto já se realizou. Deste modo, se
tais contribuições são instituídas visando o alcance de determinadas
finalidades e se existe uma vinculação tão forte entre os ingressos
obtidos de sua cobrança com os gastos públicos específicos a que se
destinam, o estudo do direito tributário aqui não atinge apenas a
cobrança do tributo, mas também alcança a destinação do produto da
arrecadação deste.
Assim se os gastos previstos com o produto daquela
arrecadação não foram realizados, não há motivos, e mais, não há
fundamento jurídico, para se exigir ingressos tributários.
Consequentemente podemos concluir também que se a
destinação das receitas obtidas com estes tributos for diversa daquela
estabelecida na constituição, os ingressos arrecadados com aquela
justificativa serão contrários a normas constitucionais.
35
Conclui-se assim que o sujeito passivo da obrigação tributária,
decorrente de Contribuições Sociais e de Intervenção no Domínio
Econômico, pode, caso descumprida a afetação da receita destes
tributos, buscar mecanismos jurídicos para ressarcir os valores por ele
pagos, pois tal prática pelo Governo Federal é inconstitucional.
36
8 - CONCLUSÃO
No presente estudo se verificou que a maior parte da
arrecadação tributária da União Federal é composta por tributos cujas
receitas estão vinculadas, isto é, destinadas a gastos específicos. Estes
tributos denominados de Contribuições Especiais (no presente trabalho
foram tratadas as Contribuições Sociais relativas à Seguridade Social e
as Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico) tem por
mandamento constitucional, o produto de sua arrecadação destinado ao
cumprimento de certas finalidades.
Diante desse quadro o Poder Executivo Federal com a
necessidade de elevar a arrecadação para promover uma redução do
déficit público e poder pagar a elevada dívida pública encontrou como
alternativa mais efetiva se utilizar de um mecanismo que hoje é
denominado DRU, que nada mais é do que uma norma que estipula que
20% das receitas da União ficariam provisoriamente desvinculadas das
destinações fixadas na Constituição. Com essa regra, por exemplo, 20%
das receitas de Contribuições Sociais, que compõem o orçamento da
Seguridade Social, não precisariam ser gastas nas áreas de saúde,
assistência social ou previdência social.
Deste modo o Congresso Nacional tem aprovado Emendas a
Constituição que vão prorrogando a duração dessa medida de caráter
excepcional e provisório. O desvio de finalidade está na prática
constitucionalizado.
Ora, tanto se adotarmos a corrente doutrinária que entende a
vinculação dos produtos das Contribuições Especiais, como parte da
37
norma (o critério finalístico da hipótese de incidência da norma tributária
é que define a espécie tributária e condiciona o produto da
arrecadação), quanto à corrente que entende a finalidade do produto da
arrecadação como delimitador de competência, estaremos diante de
uma afronta a Carta Magna.
Logo, pode-se concluir que se as contribuições especiais são
instituídas visando o alcance de determinadas finalidades e se existe
uma vinculação tão forte entre os ingressos obtidos de sua cobrança
com os gastos públicos específicos a que se destinam, o estudo do
direito tributário aqui não atinge apenas a cobrança do tributo, mas
também alcança a destinação do produto da arrecadação deste.
Assim se os gastos previstos com o produto daquela
arrecadação não foram realizados, não há motivos, e mais, não há
fundamento jurídico, para se exigir ingressos tributários, seja tanto por
descumprimento
do
critério
finalístico
da
norma
tributária
ou
dependendo da doutrina pela carência de competência da União.
Demonstrou-se então que como tais tributos estão submetidos
a uma validação finalística, a constatação de que houve tredestinação
do
produto
da
arrecadação
implica
necessariamente
em
inconstitucionalidade na sua cobrança.
Verificada a inconstitucionalidade da norma impositiva ou a
inobservância/extrapolação da competência dada pela constituição a
União, o sujeito passivo possui interesse e legitimidade para propor
ação para discutir tanto a falta de competência da União para a
cobrança daquele tributo, quanto o desrespeito ao critério finalístico da
38
norma, opondo–se ao pagamento e pleiteando eventual repetição de
indébito.
39
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