Mini casas, uma possibilidade para a habitação social

Transcrição

Mini casas, uma possibilidade para a habitação social
Mini casas, uma
possibilidade para a
habitação social
Noêmio Xavier
www.noemio.com
U
muitos, deveria ganhar um certo número de adeptos e defensores, mas o que
aconteceu foi muito além disso. Ele vem
se tornando uma "febre" que contagia um
número surpreendente de pessoas, defensores sociais, ONGs, estudantes de arquitetura, universitários de outras áreas,
arquitetos, urbanistas, além de governos
municipais e estaduais de todo o país.
m crescente número de cidades e bairros dos EUA, assolados pela pobreza e pela grande quantidade de desabrigados, desempregados e
desassistidos de todos os tipos têm experimentado resultados positivos com a implantação de conjuntos de mini casas com
características inovadoras.
A implantação desses condomínios apresentou dados impressionantes
de baixo custo (sem que isso significasse
baixa qualidade) e rapidez de execução,
além de não incorrer nos mesmos vícios
dos projetos habitacionais para pessoas
de baixa renda que acabam, na maioria da
vezes, se tornando grandes negócios para
empreiteiras, bancos e investidores, mas
também, no fim das contas, acabam gerando dívidas eternas e impagáveis para
os beneficiários.
As casas construídas dentro desse
conceito têm, aproximadamente, 10 metros quadrados de área, o que pode parecer uma dimensão ridícula para os fins
esperados. E além disso elas não tem nem
banheiro nem cozinha. Como assim?
Acontece que todo o conceito do
projeto apresenta uma nova abordagem
do bem estar de uma moradia. Além das
mini casas a aldeia tem um centro comunitário onde ficam banheiros comunitários, com chuveiros, água quente e materiais de higiene pessoal, tem uma cozinha
e lavanderia comunitárias, com um amplo espaço para refeitório, que também é
usado para reuniões dos moradores, para
assembléias, para ver televisão, e para
que crianças e jovens façam lições de casa
com ajuda dos pais, ou dos mais velhos,
ou de professoras voluntárias da escola
pública local.
Erika Lundahl, em seu artigo de fevereiro de 2014 1 revela que: "Em um sábado de setembro, mais de 125 voluntários,
ex-sem-teto, chegaram com as ferramentas nas mãos e construíram seis novas casas." Era o início da segunda aldeia "Wind
Cottages", em Newfield, NY. O projeto
faz parte de um movimento nacional de
aldeias (ou conjuntos) de mini casas, em
uma abordagem alternativa aos programas sociais até então praticados.
O terreno da aldeia ainda tem uma
área reservada para horta comunitária,
cultivada e administrada pelos próprios
O programa de aldeias de mini casas para os sem-teto, na expectativa de
1
moradores, cujos produtos serão consumidos na cozinha da própria comunidade, e ainda tem um galinheiro que ajuda
no autoabastecimento de ovos e frangos.
da ameaça de extinção provocada pelo
modelo de progresso insustentável. Esses novos modelos de vida trazem como
prêmio adicional uma dramática redução
do custo de vida da família, além de direcionar suas vidas para um modelo física
e psicologicamente mais saudável. Cat
Johnson relata sua experiência em um artigo onde diz: "Uma mini-casa é uma boa
maneira de reduzir o seu impacto ecológico, economizar dinheiro e simplificar a
vida indo na direção das coisas que realmente importam." 2
Ao compartilhar todas estas comodidades, cada pessoa da comunidade foi
capaz de aumentar seu poder aquisitivo real, melhorar sua auto confiança, se
tornar mais independente e, pelo fato de
agora estar estabelecida com dignidade,
se qualificar para empregos públicos ou
privados da região.
A ideia de que o tradicional lar-doce-lar pode ser desdobrado em áreas privativas e áreas comunitárias não é nova e
nem assustadora. Nas melhores universidades americanas os alunos, filhos da elite mais abastada, têm um espaço privado
menor do que 10 metros quadrado e compartilham banheiros, cozinhas, cantinas,
lavanderia, salões de estar, salas de estudos, bibliotecas, jardins, dentre outros espaços coletivos, sem se sentirem humilhados ou diminuídos por isso.
O estudo de Lundahl menciona que
o custo de uma habitação do padrão "baixa renda", nos programas habitacionais
tradicionais, gira em torno de US$200.000
(em moeda americana) o que chega a ser
mais de dez vezes o custo de uma minicasa do movimento TinyHouse, mesmo
considerando a construção do centro comunitário com todas as suas facilidades.
Nos assentamentos tradicionais isso resultaria em contas crescentes para o resto da
vida do sem-teto. Nos assentamentos de
mini casas os custos de uma unidade não
ultrapassam os U$10.000, que na maioria
dos casos é assimilado integralmente por
doações ou por verbas públicas de fundo perdido. O beneficiário não ganha de
presente uma dívida pesada e eterna. Em
troca ele pode se tornar um voluntário do
Muitas famílias com razoável poder
aquisitivo têm, por convicção própria,
optado por viver em espaços habitáveis
muito menores do que viviam antes. Isso
ocorre quando as pessoas passam a acreditar que esse é um possível caminho para
a sobrevivência da humanidade diante
As mini casas são
montadas a partir de
kits padronizados e
seus projetos originais
apresentam diferentes
concepções de material, estrutura, acabamento e metragem.
2
movimento e participar da construção de
mini-casas, nos fins de semana, para futuros beneficiários do programa.
No assentamento de mini casas denominado Quixote Village, em Olympia,
Washington, dois escritórios de arquitetura colaboraram com o projeto pro bono
(sem honorários) e os voluntários que no
início eram cerca de 100 pessoas hoje ultrapassam milhares. A empresa proprietária do terreno o alugou para a comunidade de mini casas por tempo indeterminado e pelo aluguel de US$1,00 por ano. 3
O risco, ou efeito colateral indesejado desse tipo de programa, aparece
quando algum espertalhão tenta transformar o projeto em um grande e milionário
contrato de fornecimento de kits para a
construção das mini-casas, fornecido por
alguma grande corporação industrial.
Nas sociedades oligárquicas os projetos
sociais sempre acabam se tornando grandes oportunidades para novas e atraentes
negociatas armadas pelas classes parasitárias.
O movimento das mini casas vem
se espalhando pelo mundo com apoio de
entusiasmados estudantes universitários
e ativistas de diversas origens, que criam
concursos de projetos, desenvolvidos por
equipes multidisciplinares, constroem
protótipos, criam modelos alternativos,
com ou sem cozinha e banheiro incorporados, discutem conceitos em seminários
e eventos do tipo "Semana MiniCasa",
pesquisam novos materiais e tecnologias
buscando baixos custos com alta qualidade... Enfim, algo muito importante que
está apenas começando..
Os kits padronizados das casas podem facilmente ser construídos no próprio canteiro das obras ou em canteiros
municipais patrocinados pelo poder público; por universidades e/ou por ONGs
de voluntários e ativistas sociais, com materiais básicos provenientes de doações
ou verbas públicas e ainda mão de obra
voluntária.
1. Erika Lundahl - Tiny Houses for the Homeless: An Affordable Solution Catches On,
Posted Feb 20, 2014 Yes Magazine (http://www.yesmagazine.org/)
2. Cat Johnson - Tiny House Living, Off the Grid? Here’s How to Do it in Style. Posted
Apr 09, 2014 Yes Magazine (http://www.yesmagazine.org/)
3. Erika Lundahl - Idem.
Noêmio Xavier é arquiteto e urbanista, CAU A86878-7, e escreve artigos e cursos para
(http://www.noemio.com/)
Copyright © Noêmio Xavier 2014
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