A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE NO ESPAÇO

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A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE NO ESPAÇO
A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE NO ESPAÇO AUTOBIOGRÁFICO
Karime Amaral Hauaji∗
RESUMO: A História tem por ocupação investigar vestígios que possam ajudar a
pensar o passado e ao mesmo tempo apontar para o futuro; a memória, sua principal
aliada, torna-se fundamental, já que antes de tudo é preciso esquecer para lembrar. Tais
esquecimentos, porém, podem ser meros silêncios coletivos ou episódios que o próprio
indivíduo ou mesmo a História Oficial se encarregou de refrear. A descolonização, a
partir da década de 60, e a busca por histórias alternativas e revisionistas impulsionarão
a obsessão por esse tipo de discurso; assim, na mesma medida em que reinventamos a
História, também podemos nos reinventar, tornando-se a escrita o lugar ideal para alojar
a rememoração. O objetivo desse estudo é, portanto, ao fazer uma leitura d’O périplo de
Baldassare, de Amin Maalouf, levantar questões pertinentes à escrita autobiográfica, ao
papel do leitor, do autor, da memória e da História, imperativos para entender o jogo
estabelecido entre o real e o ficcional. Nesse sentido incumbir-se-ão tanto memória,
quanto autobiografia, de patentear voz às minorias e instituir discurso próprio do
imigrante, delimitando sua relação com a alteridade e contribuindo para desvendar sua
identidade.
PALAVRAS-CHAVES: memória; História; autobiografia; identidade; Maalouf.
ABSTRACT: History has by occupation investigate traces that might help to think
about the past while pointing to the future; the memory, its main ally, becomes critical,
whereas it is necessary to forget to remember. Such lapses, however, may be mere
collective silences or episodes that the individual itself or even the Official History
undertook to curb. The decolonization, from the 60's, and the search for alternative and
∗ Doutoranda em Estudos de Literatura pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
revisionist histories boost the obsession with this kind of discourse, so at the same
extent that reinvented history, we can reinvent ourselves, making it the ideal writing
place to accommodate remembering. The aim of this study is, therefore, to make a
reading of The journey of Baldassare of Amin Maalouf, raising questions pertinent to
autobiographical writing, the role of the reader, the author's memory and History,
imperative to understand the game established between real and fiction. Accordingly
both memory and autobiography will be entrusted to patent voice to minorities and to
establish an immigrant's own speech, they will demarcate their relationship with
otherness and they will help to uncover its identity.
KEYWORDS: memory; History; autobiography; identity; Maalouf.
Lê o teu livro! Hoje bastarás tu mesmo
para julgar-te. (Alcorão, surata 17: 14)
A palavra história, do grego histore (testemunho), entendida no sentido daquele
que vê, faz referência à narração de fatos e acontecimentos relacionados a um
determinado assunto; ao conjunto de relatos e documentos do passado de um povo ou
nação; ao passado da humanidade, e que é traçado cronologicamente, de forma fiel aos
acontecimentos e ações, sendo então grafada como História.
Por estar o vocábulo associado diretamente à ideia de verificação e, como
dissemos, principalmente de testemunho, a verdade como um conceito absoluto fica
impossível. Essa História nomeada oficial, portanto, precisará ser constantemente
retificada e novos elementos a ela acrescidos no sentido de ora enriquecê-la, ora
questioná-la.
O trabalho do historiador é de constante averiguação, buscando nos vestígios e
fragmentos do passado, pistas que possam ajudá-lo a constituir uma ou mais páginas
para o futuro. A memória recebe então um valor inigualável. Nesse sentido, há um
ponto consensual: é preciso, antes de tudo, esquecer para lembrar.
Os esquecimentos podem ser meros silêncios coletivos, episódios que foram
“sufocados” pela História oficial, ou por uma escolha do próprio indivíduo que, ao
passar por tal situação ou processo simplesmente não deseja dele falar – fato comum,
por exemplo, aos que vivenciaram traumas de guerra. Se a ausência é o princípio do
discurso, o silêncio, fruto ou não de uma interdição, sendo por si só um significante,
consistirá nessa pausa, mais tarde o ponto de partida para a memória.
Ao falarmos sobre a memória não nos referimos a algo único e estanque. Estamos
diante de um artefato constantemente reorganizado, tornando-se também ele
responsável por estabelecer, criar e repensar o passado. Régine Robin, em Le romam
memóriel (1989), define que existem pelo menos quatro diferentes tipos de memória. O
primeiro diz respeito a uma memória nacional ou oficial, aos fatos passados que
precisam ser rememorados (datas, lendas, mitos); o segundo, à memória histórica,
aquela organizada e elaborada de acordo com um discurso próprio, calcando-se em
provas e documentos; o terceiro, à memória coletiva, atemporal, “viva”, de uma
sociedade podendo ser subjetiva e, às vezes, traída pelas emoções; o último, à memória
cultural, associada ao caráter polifônico da memória e ao seu poder de representação,
sem ter compromisso com a “verdade”.
De modo geral, o que é possível perceber é que atualmente a temática da memória
está “em alta”. Andreas Huyssen (2000), ao analisar o mundo globalizado em seus
aspectos culturais e políticos após a queda do Muro de Berlim, mostra como o nosso
discurso voltado para o porvir, para a criação de futuros longínquos, que caracterizou as
primeiras décadas do século XX, foi pouco a pouco se deslocando - especialmente com
a reorganização da ideia de tempo e de espaço - para passados presentes.
Huyssen enfatiza que os discursos de memória emergem depois da década de 60,
no rastro da descolonização e dos novos movimentos sociais na busca por histórias
alternativas e revisionistas. O ensaísta diz que há uma obsessão contemporânea pela
memória e que poderíamos nos perguntar o que vem primeiro: “é o medo do
esquecimento que dispara o desejo de lembrar ou é, talvez, o contrário?” (2000:19).
Em outro texto, intitulado Repétions, Régine Robin parece dialogar com Andreas
Huyssen (2000) ao apontar as diferentes fases seguidas pelo processo da memória: o
silêncio, o recalque, o retorno do recalque e por fim o excesso da memória do que foi
então recalcado. Isso explicaria, porque em um determinado momento não se falava
sobre o período nazista, porque muitos dos sobreviventes do Holocausto se calaram e de
uma hora para outra, uma vez cumprido le deuil (o luto), chegamos ao seu extremo: o
excesso da memória. Hoje são construídos memoriais, museus da Shoá, feitas
publicações, artigos e, claro, escritos os livros de memórias.
É nesse abuso de memória que habita uma grande problemática: a oportuna
amnésia advinda do capitalismo. A criação de museus e memoriais, de centros de
visitação, pode “globalizar” a dor de um povo e, contraditoriamente, banalizá-la,
tornando-a, um eco vazio, apenas mais um objeto de consumo - transformar um campo
de concentração nazista em postal ou Adolf Hitler em souvenir não parece ser a melhor
solução para rever o passado.
Este então seria o grande enigma da memória: achar o ponto de equilíbrio entre o
calar e o falar, não abusando nem da lembrança, nem do esquecimento, já que em um
dado momento, tanto esquecer quanto lembrar acabam se igualando. Paul Ricoeur
(L’oublie et la memóire manipulée), ao retomar da filosofia de Platão o sentido de
anamnésis (a forma ativa de lembrar e recordar) e de mnène (a imagem deixada na alma
- pathos), dá a ideia do nível psicopatológico assumido pela memória. Ele acredita na
existência de uma memória manipulada conforme o nosso desejo e que acaba se
servindo de uma memória a que ele denomina impedida (memóire empêchée), ou seja,
aquela que foi recalcada por razões diversas.
Ricouer aponta um caráter intrínseco à narrativa: se não se pode lembrar tudo,
também não se pode narrar tudo. A ideia de uma narrativa exaustiva acaba sendo
impossível, pois ela comporta um número limitado de elementos, podendo tornar-se
uma espécie de “armadilha” direcionada pela história oficial. O filósofo francês
argumenta que é a narrativa, contudo, o espaço em que se pode deitar, discutir e
vivenciar todas as questões para que elas finalmente sejam resolvidas através da poética.
Na mesma medida em que podemos reinventar a História, também podemos nos
reinventar. A escrita torna-se o espaço ideal para alocação dessa rememoração e a
escrita autobiográfica o melhor recurso para esse desdobramento.
De tal modo, a arte tem papel fundamental, ou melhor, começa a ser reconhecida
como tal. Surge o que Jacques Le Goff, apoiado por Michel Foucault, define como
documento-monumento (1984), atribuindo à memória a capacidade de figurar-se como
“aquilo que já está lá” (monumento) ou como “aquilo que é tarefa do historiador”:
selecionar (documento); daí é que se torna possível dizer que todo monumento é
documento e todo documento é uma forma de manipulação da realidade. Principia-se o
verdadeiro trabalho de “escavações”; pequenos escritos, que antes não se incluíam nos
registros oficiais, relatos tidos como menores (confissões, diários, memórias) passam a
ter um novo valor; trapeiro, “catador”, arqueólogo, historiador, escritor tornam-se
termos unívocos.
Desse modo, levantemos aqui algumas questões pertinentes à escrita
autobiográfica, à relação autor, leitor, texto e, claro, à memória e à História, a fim de
possibilitar uma leitura da obra O périplo de Baldassare, de Amim Maalouf e o
constante jogo entre o real e o ficcional. Indispensável se torna compreender parte da
evolução do processo de surgimento do discurso relacionado ao “eu”.
Uma primeira mudança e que parece impactar sobremaneira na questão textual diz
respeito ao autor. Durante o período do texto manuscrito, o papel de autor e de leitor se
confundia. A palavra era reproduzida por exegetas e copistas que freqüentemente
alteravam o texto, além disso, muitos não se viam como autores, mas como mensageiros
da palavra divina, como no caso de Santo Agostinho. Já no final do século XVIII e
início do XIX é que a necessidade cultural de atribuir autoria começa a se firmar. Havia
a importância de associar traços textuais e assim relacionar o discurso a um nome. A
impressão dos textos exigia a autoria, em contrapartida não permitia mais as
modificações do leitor.
Em 1968, a “morte do autor” foi anunciada por Roland Barthes em um ensaio,
cuja finalidade era enfatizar a ideia de que não existia autor fora ou anterior à
linguagem. Todo autor é um sujeito social e é o ato da escrita que o constitui, não
sendo, por conseguinte, entendido como uma pessoa real, mas como um produtor de
discursos.
Um ano mais tarde Michel Foucault publicaria O que é um autor? (1986)
agravando ainda mais a crise da identidade autoral. Primeiro, o autor fora declarado
“morto”, agora sua existência era colocada à prova - a começar pelo título da obra já
sugerindo uma reificação do sujeito: “o quê?”, e não “quem?”. Existe uma
multiplicidade de “eus” e o autor não é nem o escritor propriamente dito, nem o
narrador, ocupando um entre-lugar.
É seguindo essa linha estruturalista que Philippe Lejeune escreve Le pacte
autobiographique, um texto fundamental para os estudos autobiográficos, em que
define a autobiografia como o discurso retrospectivo em prosa que uma pessoa real faz
de sua própria existência. Nesse sentido, deve haver uma consonância entre o nome do
autor, do personagem e do narrador e, embora, o emprego do discurso autodiegético seja
predominante, esse também pode suceder de modo homodiegético, empregando-se
“eu”, “tu” ou “ele”.
Lejeune propõe a existência de um acordo estabelecido entre autor e leitor a partir
de elementos da ordem do paratexto. Esse acordo que ele chama de “pacto” justamente
por implicar na ideia de elementos muitas vezes intangíveis, mas principalmente na
confiança entre as partes envolvidas, incide de diferentes maneiras. A diferenciação
mais comum estaria atribuída à razão onomástica. A primeira referência do leitor é o
nome do autor na capa e o nome do personagem dentro do livro. A declaração de uma
identidade entre esses dois elementos poderia sugerir a firmação de um pacto
autobiográfico, enquanto a não-firmação, além da possível atestação de ficcionalidade
sugerida pelo subtítulo, roman, implicaria em um pacto romanesco.
O autor assume um papel fundamental. Ele é a linha tênue que separa o dentro e o
fora do texto, devendo ser entendido simultaneamente como uma pessoa real e um
produtor de discursos. A relação se dará de acordo com o conhecimento ou crença que o
leitor tem do ou no autor. É o leitor quem ativará a essência do pacto e o dimensionará.
Ao escrever um romance, o autor não espera que o leitor creia naquilo que lhe é
dito como verdadeiro, o que já não se dá na autobiografia. Não há, pois, como entender
a autobiografia como uma forma fixa, nem tampouco como uma figura de adivinhação,
e sim como um pacto estabelecido entre o leitor e o autor, um pacto autobiográfico. No
entender de Lejeune, o escritor autobiográfico comporta-se como o historiador ou o
jornalista, ao dar uma informação que se supõe verdadeira, a diferença é que o assunto é
ele mesmo.
Amim Maalouf, historiador por vocação, jornalista por profissão, utiliza-se desse
discurso referencial, porém sempre embebido em ficção e, dessa forma, esquiva-se dos
possíveis julgamentos dos leitores que poderiam acusá-lo, tratando-se de um texto
essencialmente autobiográfico, de não dizer a verdade. O mesmo já não se dá com a
ficção. Não se julga um romance como verdadeiro ou falso - talvez julguemo-no apenas
quanto à verossimilhança, ou, mais subjetivamente, o qualificado como bom ou ruim.
Uma interessante particularidade desse escritor libanês é sua destreza em elaborar
narrativas históricas fazendo uma espécie de memória da História. Ele mistura fatos e
acontecimentos históricos maiores e menores, resultantes de um trabalho de árdua
verificação (assim como faz a Nova História) a personagens, lendas, mitos e, claro, a
sua história pessoal – sem contudo fazer autobiografia clássica - de modo a permitir que
H/história e ficção se interpenetrem.
Um diário de viagem narrado em primeira pessoa seria um texto autobiográfico,
um texto de memória. Mas o que dizer se esse narrador fosse ficcional? Ou tivesse
vivido trezentos anos antes do autor? Os aspectos formais do texto, enquanto diário,
seriam amainados? Ele deixaria de ser autobiográfico e tomaria o campo apenas do
ficcional?
A proeza é similar àquela proposta por Marguerite Yourcenar, em Memórias de
Adriano, ao retroceder o tempo histórico e supor as memórias do imperador e foi
realizada por Amim Maalouf ao compor O périplo de Baldassare. Adriano é um
personagem histórico e Baldassare Embriaco, o personagem central, ao que parece é
ficcional (O clã dos Embriaco existiu, contudo, e foi a casa intacta, vista durante uma
viagem, que despertou a atenção de Maalouf). Ele usou sua habilidade de
escritor/arqueólogo para dar continuidade, através do imaginário, às escavações.
Se tomarmos por base a teoria de Philippe Lejeune, acreditaremos, a julgar pelo
fato do nome do autor, do personagem e do narrador não coincidirem, estar diante de
um pacto romanesco, o que será endossado pela classificação romance dada pela edição
francesa (a edição do Brasil não traz nenhuma definição). Não podemos nos esquecer,
porém, que se trata de um diário de viagem, remetendo a outros termos como memória,
autobiografia ou confissões, ainda que nada semelhante esteja claramente sugerido no
título, a não ser a ideia do périplo de alguém em particular e não de um povo, como era
comum nas antigas navegações.
Em O périplo de Baldassare, o leitor está diante de um diário de viagem, escrito
em quatro cadernos e que são também as quatro partes em que o livro se divide (O
centésimo nome, A voz de Sabattai, Um céu sem estrelas, A tentação de Gênova). O
narrador, dono de uma importante loja de curiosidades, diz, porém, não saber como
começar o seu relato: “Uma simples narração dos fatos? Um diário íntimo? Um diário
de viagem? Um testamento?” (MAALOUF, 2002:12).
Ainda no início do texto, Baldassare alude a um possível lapso da memória como
se quisesse tornar o texto mais real, já que não é possível se recordar de tudo dizendo:
“um peregrino da Moscóvia veio bater na minha porta há dezessete anos, mais ou
menos”. Então ele completa: “Porque dizer mais ou menos? Tenho a data exata no meu
registro de mercador” (MAALOUF, 2002: 12) como se quisesse firmar, estabelecer suas
alianças com o leitor, dando índices de fidedignidade, tornando seu romance menos
ficcional e acrescenta: “Sempre anotei tudo, em primeiro lugar os detalhes ínfimos,
aqueles que eu acabaria esquecendo”.
Vincent Colonna em Autofiction & autres mythomanies littéraires define como
“mentir-vrai” (mentir-verdadeiro) o mecanismo graças ao qual é possível o autor
modelar sua imagem literária. A caminho de Gênova, Baldassare diz “escondi
constantemente de mim mesmo a verdade, inclusive neste diário que deveria ser meu
confessor” (MAALOUF, 2002: 462). Se ele mente e diz que mente, logo, o que diz é
verdade; assim como na escrita, em que ao assumir a ficcionalidade a “mentira” torna-se
“verdade” ou ao menos passível der ser verdadeira, verossímil.
O tempo da narrativa é o ano de 1665 e o Ano da Besta, e junto com ele o fim do
mundo, é aguardado por aqueles que crêem no Apocalipse de São João. Al-asma´Ahhusná é o nome dado em árabe aos conjunto dos 99 nomes de Deus descritos no
Alcorão (o Beneficente; o Clemente; o Misericordioso; o Soberano; o Sagrado; o
Poderoso; o Majestoso; o Maior; o Oculto, são alguns deles). A existência de um
centésimo nome é alvo de especulações místicas; conhecê-lo seria a única forma de
salvar-se da ira divina.
Esse nome secreto seria supostamente revelado por Abu-Maher Al-Mazandarani
em “O desvendamento do nome oculto” ou “O centésimo nome” um cobiçado livro
procurado por todos que visitam a loja de curiosidades de Gibelet. Baldassare ganha o
livro, como que por obra do acaso, de Idriss (uma espécie de velho sufi) e, cético, ele se
desfaz do livro. A morte de Idriss, todavia, vem como um sinal. Inicia-se, então, uma
longa viagem na tentativa de recuperá-lo.
Baldassare inicia o seu périplo e parte de Gibelet, em companhia de dois
sobrinhos, indo para Constantinopla, a capital do Império Bizantino, considerada um
verdadeiro símbolo cosmopolita. Impossível aqui não associar a figura do herói à do
autor, já que Amim Maalouf escolheu a não menos cosmopolita Paris como lugar de
exílio. Edward Said em Reflexões sobre o exílio diz: “Paris pode ser a capital famosa
dos exilados cosmopolitas, mas é também uma cidade em que homens e mulheres
desconhecidos passaram anos de solidão miserável” (2003:49).
É nessa viagem que Baldassare mostra-se reflexivo e pouco a pouco se permite
descobrir, ou repensar, o amor. O contraste será a tônica deste sentimento: Marta, uma
das mulheres que irá personificar esse amor é uma muçulmana e Baldassare é católico.
Além das diferenças religiosas, o herói genovês cruza o Mediterrâneo e conhece de
perto também o ódio e a xenofobia a que os homens são capazes. O que se pretende
tratar é a sutileza do afeto, mas também a superação de fronteiras e como se dá esse
constante embate junto à alteridade.
Utilizando como pretexto uma situação amorosa ele diz:
Nasci estrangeiro, vivi estrangeiro e morrerei mais estrangeiro ainda. Sou orgulhoso demais
para falar de hostilidade, de humilhações, de rancor, de sofrimentos, mas sei reconhecer os
olhares e os gestos. Há braços de mulheres que são lugares de exílio e outros que são a terra
natal (MAALOUF, 2002: 415).
A propósito do exílio, Edward Said (2003), citando Simone Weil, afirma ser o
dilema da necessidade da alma humana de ter raízes. O risco do exilado é achar que
tudo é temporário e fazer do exílio um fetiche. Para Amim Maalouf, o homem não deve
ter raízes, e sim origens e é por isso que ele com freqüência parte em busca das suas,
escrevendo retrospectiva e prospectivamente.
A fala do imigrante, do exilado, permeia e se mistura à do narrador:
compreendo facilmente os que abandonam um dia seu país e todos os seus próximos, e que
mudam até de nome, para começar uma vida num país sem limites. Seja nas Américas, seja
na Moscóvia. Meus ancestrais não fizeram acaso exatamente isso? Meus ancestrais, e
também todos os ancestrais de todos os seres humanos. Todas as cidades foram fundadas e
povoadas por gente vinda de outra parte, todas as aldeias também, a terra só se encheu por
migrações sucessivas (MAALOUF, 2002: 326).
Maalouf que como dissemos trocou o Líbano por Paris, não mudou de nome,
embora o faça constantemente ao criar seus personagens em seus romances. Na
definição de Philippe Vilain, “La particularité de l’imagination autobiographique est
justement de provenir de sa capacité de dédoublement narcisique qui permet au sujet de
s’inventer un double, idéal, ou non, e de rendre possible une forme d’
autofictionnalisation” (2005: 119)1. É esse o recurso de que se utiliza o escritor ao dar
voz a Baldassare ou tantos outros de seus personagens, tomando da autoficção essa
inclinação à autofabulação.
O périplo de Baldassare está longe de ser “etiquetado” como autoficcional –
afinal não existe a coincidência entre narrador, autor e personagem. O risco reside
justamente no fato de que o termo autoficção vem sendo utilizado para abrigar qualquer
tipo de produção autobiográfica, principalmente as produções contemporâneas ou ditas
“pós-modernas”. Ao que parece, como diz Vilain, é uma forma de fabular o real e
escrever de modo retrospectif e prospectif (retrospectivo e prospectivo), ou seja, um
modo de rever o passado e projetar a imagem desejada.
Um trecho intrigante e que remonta não só a essa capacidade de se antecipar que a
arte oferece, é o que descreve o incêndio. Em 1º de setembro de 1666, Baldassare
acorda sobressaltado lembrando-se de que aquela seria a data prevista pelos moscovitas
para o fim do mundo, e por uma diferença no calendário, o mesmo só ocorrerá daí a 10
dias. Em 11 de setembro de 1666, dia de São Simão, o herói de Maalouf diz-se
apreensivo diante da possibilidade do mundo ser destruído, por um dilúvio de fogo.
Nada acontece. Mas no meio da noite, Londres começa a queimar. O fato a que se refere
é verídico Trata-se do grande incêndio iniciado em 2 de setembro de 1666, em uma
padaria da capital inglesa e que se tornou uma catástrofe, marcando o início do Ano da
Besta. Escrito às vésperas do Terceiro Milênio, na tentativa de discutir os anseios e
especulações em torno da possibilidade de “fim do mundo”, ao narrar o que seria o
desespero daqueles que viram Londres em chamas, acabou por antecipar a verdade
sobre outro império do nosso tempo.
A viagem, um tema recorrente na obra de Amim Maalouf, assinala a
transitoriedade, o gosto pela aventura e pela exploração – influência das leituras de
Jonathan Swift e Alexandre Dumas que povoaram o imaginário de criança, ainda no
Líbano. A ideia de literatura de viagem nos remete a Gil Vicente ou a Luís de Camões e
faz pensar, sobretudo, no seu olhar estrangeiro. Existe agora uma inversão, porém, e o
“Novo Mundo” a ser descoberto é seu próprio mundo, o Oriente, agora, visto de longe,
da Europa. Foi preciso partir para o Ocidente para falar do Oriente, e despi-lo de alguns
estereótipos.
Walter Benjamim (1994) em seu texto sobre o desaparecimento da arte de narrar
aponta a existência de dois importantes tipos de narrador: o camponês e o marinheiro.
No caso de Maalouf ambos os modelos são exercidos, sendo sempre muito bem
combinados. Freqüentemente em seus textos as lendas e mitos, próprios daqueles que
conhecem a terra, misturam-se aos relatos dos narradores e personagens em trânsito. A
tradição oral, peculiar à cultura oriental, se faz presente em seus textos em que uma
pluralidade de vozes conta e reconta uma mesma história, entrecruzando informações e
permitindo que o leitor construa, seguindo a direção da trama e do urdume, o seu tapete.
Le rocher de Tanios (1993), obra que deu a Amim Maalouf o prêmio Goncourt,
pode ser apontado como outro exemplo em que relatos históricos, crônicas, se misturam
a mitos e lendas a fim de narrar o que teria acontecido a Tânios, o jovem do Oriente
Médio, cujo nascimento marcara um destino conturbado para si e para seu povo. A
posição do narrador, no texto que faz as vezes de prólogo, é de aproximar-se do leitor e,
diferentemente do narrador de O périplo de Baldassare, ele demonstra interesse em ler a
crônica que se apresenta em suas mãos, mesmo sendo um relato um pouco extenso.
Un livre étrange, inegal, déroutant. Certaines pages, le ton est personnel, la plume
s’echauffe et se libère, on se laisse porter par queleques envolées, par quelques écarts
audacieux, on croit être en présence d’um escrivain vrai. Et puis soudain, comme s’il
craignait d’avoir péché par ogueil, le moine se rétracte, s’efface, son ton s’applatit, Il se
rabat pour faire pénitence sur son rôle de pieux compilateur. (MAALOUF, 1993: 12).2
Nesse trecho poderíamos entender que discorre sobre o livro escrito pelo monge
(Crônicas Montanhesas), tanto quanto sobre escrita do próprio Maalouf, em que, por
vezes, pequenos detritos autobiográficos emergem, todavia é preciso rapidamente varrêlos e escondê-los sob uma escrita que se superpõe: a da verdade histórica. Também
denunciaria o inverso, a tarefa reprimida do historiador que precisa sufocar o seu relato
e ser um mero compilador - o que daria ao romancista certo sentimento de deleite, de
livre-arbítrio.
Maalouf é um intelectual que admite em seus ensaios não concordar com a guerra.
Ele que se viu forçado a deixar o seu país natal por não apoiar a guerra civil que lá se
desenrolava na década de 70, não a usa como mote de seus romances. Mas não seriam
elas todas iguais? As dores, as mortes, as perdas, os exílios? Ao descrever conflitos
anteriores, Amim Maalouf faz seu exercício de perlaboração sem expor-se ou tornar-se
fatigante, sem tornar a memória excesso. Ao dizer “de quel ricanement, un homme se
découvre soudain étranger au milieu des siens?’’ (MAALOUF, 1993: 279)3, revela que
ser estrangeiro não é apenas uma condição de imigrante, mas principalmente para
aqueles que, como ele, exilaram-se é uma condição anterior, que muitas vezes começa
com a ideia de sentir-se estranho em seu próprio país.
O mistério de Tânios fica sem solução definitiva. Muitos, como Tânios, seguiram
esses “passos invisíveis” e partiram (talvez até ele mesmo, Maalouf) embora nem
sempre pelas mesmas razões. O rochedo de Tânios é o lugar de onde é possível
contemplar ao mesmo tempo o mar e a terra, que inspira o partir e o ficar, podendo ser
entendido como o “entre-lugar”. Descrita como “Lieu de refuge, lieu de passage. Terre
du lait et du miel et du sang. Ni paradis ni enfer. Purgatoire” (MAALOUF, 1993:
279)4, esse ambiente divisor que não serve nem para punir, nem para perdoar, mas para
expurgar os sentimentos é para Amim Maalouf o espaço da ficção, da escrita, a
montanha em que é preciso refugiar-se ou isolar-se para contemplar o mundo.
De igual maneira, em O périplo de Baldassare a “charada” parece em aberto.
Baldassare Embriaco atinge o seu objetivo: a posse do livro, mas sempre as tentativas
de lê-lo fazem com que seus olhos fiquem turvos. Uma repentina cegueira o impede de
decodificá-lo e ele precisa sempre adiar a empreitada. O centésimo nome talvez seja o
nome de Baldassare Embriaco, ou o nome do deus que cada homem que parte em busca
do autoconhecimento - dando forma ao sentido da “viagem”, não apenas como
deslocamento físico - precisa descobrir dentro de si; como nas culturas e religiões
orientais em que repetindo mantras ou recitando o Alcorão o corpo deve ressonar junto
ao espírito e é preciso muito autoconhecimento para ouvir essa voz interior.
Por outro lado, essa cegueira ao ler o centésimo nome enfatiza a probabilidade da
distância entre Deus e homem, suscitando-nos a ideia de que somos seres incompletos e,
devemos, por conseguinte, ceder, a essa eterna busca, a rolar a pedra de Sísifo e de
tempos em tempos partir em pequenos périplos.
Dos quatro cadernos de viagem em que havia colocado seus projetos, desejos e
impressões das cidades, como fizeram outros cronistas no passado, Baldassare nos conta
que nada restou (os dois primeiros foram perdidos e o último fora consumido pelo fogo)
o que intensifica a inverossimilhança, pois afinal como estaria o leitor diante desses
cadernos? Ao voltar para casa somente O centésimo nome o acompanha e talvez tenha
sido o livro o responsável pela salvação do livreiro do fogo, assim como Noé foi salvo,
de acordo com o descrito no Alcorão, n’A viagem noturna: “e concedemos o livro a
Moisés (livro esse) que transformamos em orientação para os israelitas (dizendo-lhes):
Não adoteis além de Mim outro guardião!/ Ó geração daqueles que embarcamos com
Noé! Sabei que ele foi um servo agradecido!” (Alcorão, surata 17: 2,3).
Baldassare então conclui: “Desejei-o, encontrei-o, recuperei-o, mas quando o abri
ele permaneceu fechado. Talvez eu não o tenha merecido suficientemente. Talvez eu
tivesse medo de descobrir o que ele oculta” (MAALOUF, 2002: 481). Ele parece
resignar-se à ideia de que nossas procuras nem sempre nos permitem encontrar o que
pretendemos. Sua fala alcança tanto os que viveram os anseios do Apocalipse, em 1666,
quanto aqueles que o temiam para o ano 2001. O medo às vezes pode nos impedir de
ver a verdade. Pode ser apenas porque se trata de um “mistério” a que poucos têm
acesso e nós podemos não ser um dos escolhidos.
Esse trecho sugere também certa metalinguagem. Amim Maalouf parece brincar
com o leitor, sempre em busca da “verdade”, da interpretação, do: “o que o autor quis
dizer com...”, muitas vezes abdicando do simples deleite da leitura, em troca do prazer
de “tripudiar” sobre o cadáver do autor morto e dominado.
A intenção do narrador (e por que não dizer de Maalouf?) não é reter a chave do
enigma, mas mostrar que em determinadas ocasiões não há mesmo o que ser
esclarecido; em outras, o conhecimento é simplesmente algo ativo e que se dá no
interior da narrativa. Se o leitor, ao final d’O périplo de Baldassare, não entendeu seu
sentido, não encontrou o centésimo nome, melhor seria relê-lo.
E termina dizendo “Talvez também ele não tivesse nada a ocultar” (MAALOUF,
2002: 481). E às vezes não tem mesmo.
O leitor é por natureza voyeur. Quando se vê diante do pacto autobiográfico sua
curiosidade a respeito da vida do autor é patente e ele, às vezes, desconfia de que algo
possa ser ficção; quando se vê diante do texto ficcional, põe-se a buscar pequenos
“deslizes”, “deixas”, “coincidências” para “provar” que aquele texto ficcional é de fato
autobiográfico.
Ao falarmos sobre a autobiografia é preciso assumir que a publicação de Philippe
Lejeune teve um valor imprescindível na fundamentação do assunto ao tratar da
literatura e dos gêneros confessionais; seu texto foi alvo de crítica, mas ainda hoje rende
a possibilidade de criação literária por parte de outros autores desafiados por aquelas
lacunas a que ele denominou de “pontos-cegos”. Teoria e crítica literária também são
produzidas a fim de dialogar com o pensamento dele. O próprio Lejeune, 25 anos
depois, se viu pronto a repensar e “retificar” a questão autobiográfica assumindo que a
mesma não poderia ser tida como algo a ser “enquadrada”.
Um dos pontos favoráveis, aproximando-se daquilo que havia sido proposto por
Barthes, Foucault ou Mallarmé alguns anos antes, foi reconhecer a imperativa leitura do
texto para que se estabeleça o verdadeiro pacto e, portanto, nesse sentido, a figura do
leitor, bem como a sua condição ativa diante do mesmo, jamais deve ser descartada. A
morte do autor se paga com o nascimento do leitor, no entender de Barthes; uma troca
justa ao que parece.
A categorização do texto pode não passar de taxonomia, de um modismo,
preferindo, ultimamente, as editoras, por razões estratégicas, publicar um texto “sem
gênero”. Na maior parte das vezes, contudo, o grande responsável por essa
categorização é próprio leitor. É ele que, como bem identificou Philippe Lejeune será
responsável por firmar o pacto com o autor. A mera tentativa de classificação de um
texto como autobiográfico ou não, ou a preocupação incessante em encontrar no texto a
voz do autor, os traços ou os biografemas, seria uma tarefa no mínimo reducionista e o
devolveria à condição de gênero menor.
A literatura ao cingir um autor, o faz com sua obra como um todo, o que inclui
seus textos de caráter autobiográfico. A tarefa é identificar nessas escrituras do “eu”
(memórias, diários, confissões), não meros traços autobiográficos, mas uma forma de
ouvir e impressionar-se, sem julgar isoladamente a história do autor; encontrar uma
possibilidade de apreender aqueles que ali estão representados. Daí ser esse o gênero
por excelência dos escritores das ex-colônias e dos exilados.
Como aposta Philippe Vilain (2005), a ficção é uma autobiografia disfarçada e
vice-versa. A memória então funcionaria como uma forma de “colar” os elementos que
interessam ao autor e construir esse novo espaço/tempo. Ao ler A la recherche du temps
perdu, de Marcel Proust, decepcionaram-se aqueles que acreditara encontrar tal e qual o
passado vivido. Só seria possível reviver em seu sentido pleno o passado através da
ficção científica e da construção de “máquinas do tempo”, não pela memória. Nem
mesmo a memória ativada pela famosa Madeleine de Proust, uma memória involuntária
não faz nada além de apontar para uma de suas formas de manifestação - talvez a mais
sutil ou mais aceitável por ser fruto do sensorial; contudo, ainda assim, não deve ser
entendida como reconstrução do passado.
A literatura parece ser então o caminho para trabalhar esse tempo, já que se trata
de um conceito de sentido subjetivo e abstrato. Muitas vezes ela vai antecipar o trabalho
do historiador ou mesmo abrir o caminho para que novas escavações históricas sejam
feitas.
Desse modo, a autobiografia ou qualquer tipo de texto que dela se avizinhe deverá
ser entendida como uma forma de escrita do “eu”, uma forma de revelar-se
literariamente e, se não fosse assim, estaríamos diante de carteiras de identidade,
certidões de nascimento, registros meramente referenciais, mas sem qualquer valor
artístico.
Todo o esforço para encarecer a escrita autobiográfica, antes considerada como
gênero menor, que vem sendo exercido por teóricos de diferentes áreas e pelos próprios
escritores que ainda hoje se esmeram em inovar, construir e desconstruir paradigmas,
não deve ser, portanto, em vão. Assim como a identidade de uma pessoa não é
constituída apenas pela quantidade de elementos que figuram nos registros oficiais,
também a autobiografia, o romance autobiográfico e a autoficção não deve limitar-se
àquilo que é postulado nos manuais. Avaliar o foco narrativo, as coincidências
onomásticas no que diz respeito ao autor, ao narrador e ao personagem, o tipo de pacto
firmado, a existência de elementos verossímeis, todos esses são subsídios que os
associam, porém que por vezes os marginalizam. Funcionam como articuladores
reducionistas, não observando que são justamente eles que fazem a riqueza de cada um,
seu valor individual, que permitem que cada ser seja singular e potencialmente
insubstituível.
No livro Les identités meurtrièrs, ao dizer “Mon identité c’est qui fait que je ne
suis identique à aucune autre personne.” (MAALOUF, 1998: 16)5 tratando a
problemática da identidade, não estaria também Amim Maalouf ponderando a questão
da escrita? A necessidade de dizer “pertence” ou “não pertence”, “é” ou “não é”,
associada à identidade do sujeito, estende-se muito bem à forma exaustiva com que
tentamos emoldurar os gêneros literários.
Como propõe Amim Maalouf, às vezes é preciso fazer um exame de identidade,
assim como se faz um exame de consciência e cuidar para que essa identidade não se
torne assassina; o que vale para as pessoas, tanto quanto para os gêneros literários.
Deixemos então as últimas palavras para o próprio Maalouf: “car c’est notre regard qui
eferme souvent les autres dans leurs plus étroites appartenances, et c’est notre regard
aussi qui peut les libérer” (MAALOUF, 1998 : 29)6.
Recebido em setembro de 2009
Aprovado em outubro de 2009
REFERÊNCIAS
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1988. p. 49-53.
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Tradução: Inês Autran Dourado Barbosa. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 2001.
v. III (Coleção ditos e escritos).
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Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1984. pp. 95-106.
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______. La mémoire saturée. Paris: Sock, 2003.
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Letras, 2003.
VILAIN, Phillippe. Défense de Narcise. Paris: Grasset & Fasquelle, 2005.
1
“A particularidade da imaginação autobiográfica é justamente derivada de sua capacidade de
desdobramento narcísico que permite ao sujeito se inventar um duplo, ideal ou não, e tornar possível uma
forma de autoficcionalização’.
2
“Um livro estranho, desigual, desnorteante. Em certas páginas, o tom é pessoal, a pena se inflama e se
libera, deixamo-nos levar por alguns vôos, por alguns exageros audaciosos, acredita-se estar em presença
de um verdadeiro escritor. E então de súbito, como se temesse o pecado por orgulho, o monge se retrai,
apaga-se, seu tom se achata para fazer penitência ele se rebaixa ao papel de piedoso de compilador.”
3
“de que zombaria, um homem descobre-se de repente estrangeiro no meio dos seus?”
4
“Lugar de refúgio, lugar de passagem. Terra do leite e do mel e do sangue. Nem paraíso nem inferno.
Purgatório.”
5
6
“Minha identidade é o que faz com que eu não seja idêntico a nenhuma outra pessoa.”.
“porque é nosso olhar que fecha frequentemente os outros nas suas mais estreitas pertenças e é o nosso
olhar também que pode libertá-los”.

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