Violências e segurança pública na contemporaneidade

Transcrição

Violências e segurança pública na contemporaneidade
Irme Salete Bonamigo
Luiz Carlos Chaves
(Orgs.)
VIOLÊNCIAS E SEGURANÇA PÚBLICA
NA CONTEMPORANEIDADE:
um desafio às tecnologias e inovações sociais
Chapecó, 2013
Reitor: Odilon Luiz Poli
Vice-Reitora de Ensino, Pesquisa e Extensão: Maria Aparecida Lucca Caovilla
Vice-Reitor de Planejamento e Desenvolvimento: Claudio Alcides Jacoski
Vice-Reitor de Administração: Antônio Zanin
Diretora de Pesquisa e Pós-Graduação Stricto Sensu: Valéria Marcondes
Este livro ou parte dele não podem ser reproduzidos por qualquer meio sem autorização
escrita do Editor.
364.4
V795v
Violências e segurança pública na contemporaneidade : um
desafio às tecnologias e inovações sociais / Irme Salete
Bonamigo, Luiz Carlos Chaves (Orgs.). - Chapecó : Argos,
2013.
343 p. ; 23 cm. - (Perspectiva ; 4)
Inclui bibliografias
ISBN 978-85-7897-122-9
1. Segurança pública. 2. Violência. 3. Violência –
Prevenção. 3. Crime organizado. I. Bonamigo, Irme Salete.
II. Chaves, Luiz Carlos. III. Título. IV. Série.
CDD 364.4
Catalogação elaborada por Caroline Miotto CRB 14/1178
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Coordenador: Dirceu Luiz Hermes
Conselho Editorial
Titulares: Murilo Cesar Costelli (presidente), Clodoaldo Antônio de Sá (vice-presidente),
Celso Francisco Tondin, Dirceu Luiz Hermes, Lilian Beatriz Schwinn Rodrigues,
Maria Aparecida Lucca Caovilla, Ricardo Rezer, Rodrigo Barichello,
Tania Mara Zancanaro Pieczkowski, Vagner Dalbosco, Valéria Marcondes
Suplentes: Irme Salete Bonamigo, Fernando Tosini, Maria Assunta Busato,
Hilário Junior dos Santos, Fátima Ferretti, Arlene Renk
Sumário
Prefácio ......................................................................................................9
Michel Misse
Apresentação ...........................................................................................13
Irme Salete Bonamigo, Luiz Carlos Chaves
Parte 1
Violências e segurança pública
Capítulo 1
A influência das rotinas de atuação das forças de segurança
pública na re(des)construção dos conceitos ligados aos diferentes
paradigmas criminológicos ...................................................................25
Saulo Cerutti, Irme Salete Bonamigo
Capítulo 2
Distribuição espacial e caracterização dos atendimentos de
emergência por violências e acidentes em um serviço sentinela
de Chapecó (SC) .....................................................................................49
Fernanda Moschetta Garim
Capítulo 3
O enfrentamento de violências contra crianças e adolescentes na
perspectiva dos Conselhos de Políticas Públicas de Chapecó (SC) .... 67
Deborah Cristina Amorim, Maira Tellechêa da Silva,
Ana Soraia Haddad Biasi, Patricia Vedana, Irme Salete Bonamigo
Capítulo 4
A singularidade do PCC no “mundo do crime”:
construção da confiança e manutenção da hegemonia ..................... 91
Camila Caldeira Nunes Dias
Capítulo 5
Crime organizado e sistema penitenciário:
considerações sobre os atentados em Santa Catarina ..................... 121
Erni J. Seibel, Andresa Ventura, Gabriela R. Cardoso, Felipe M. Monteiro
Parte 2
Tecnologias e inovação social na gestão de violências
Capítulo 6
O uso de tecnologias para redução da violência urbana
em Santa Catarina ................................................................................... 149
Osvaldir José Kassburg
Capítulo 7
O alvo como centro da investigação criminal, no contexto
das múltiplas mídias de comunicação, num processo de
análise indutiva ........................................................................................ 173
Djan Rosário
Capítulo 8
Polícia comunitária: uma inovação social às organizações
policiais brasileiras? ................................................................................ 185
Aldo Antonio dos Santos Junior, Aldo Antonio Hostins dos Santos,
Luiz Carlos Chaves
Capítulo 9
A mediação como conceito de inovação na área de prevenção
da violência nos centros urbanos brasileiros ..................................... 205
Vilson Groh, Jared Ordway
Parte 3
Violências ambientais e segurança pública
Capítulo 10
Segurança pública, capitalismo e proteção ambiental:
fragmentos reflexivos sobre o trabalho da Polícia Militar
Ambiental de Santa Catarina ................................................................ 239
Luiz Carlos Chaves
Capítulo 11
Um olhar sobre o processo histórico de violências ambientais
no oeste de Santa Catarina .................................................................... 255
Eunice Sueli Nodari
Capítulo 12
Violências ambientais no contexto de colonização do oeste
de Santa Catarina: da exclusão à reconversão cabocla .................... 273
Arlene Renk, Silvana Winckler
Capítulo 13
Violência em ambientes aquáticos continentais:
situação da comunidade de peixes do alto rio Uruguai .................. 289
Evoy Zaniboni Filho, Alex Pires de Oliveira Nuñer,
David Augusto Reynalte-Tataje, Renata Maria Guereschi,
Cláudia Machado, Samara Hermes-Silva, Luciano Augusto Weiss,
Giuliano Palemão Maia Huergo
Capítulo 14
A logística reversa de óleos lubrificantes usados ou
contaminados no Brasil ......................................................................... 311
Paulo Roney Ávila Fagúndez, Francisco Rodrigues Santiago da Silva,
Isabele Bruna Barbieri, João Alfredo Ziegler Filho
Sobre os autores ....................................................................................... 337
Prefácio
S
ão muitas as violências, como são as esperanças de paz e equilíbrio, na relação entre os seres humanos e entre estes e a natureza. A criminalização do recurso à violência na resolução de
conflitos entre humanos e, mais recentemente, a criminalização da
violência ao meio ambiente, que é, indiretamente, também uma violência aos humanos, são mais uma marca da modernidade, mais uma
de suas conquistas, mas também mais um de seus desafios.
A criminalização das violências, na sociedade moderna, sucedeu à afirmação cada vez maior do valor da vida humana e à vitória
da ideia de que pertencemos, igualitariamente, a uma mesma humanidade. O desenvolvimento do direito moderno se fez acompanhar
do surgimento da polícia, como instituição destinada a prevenir os
crimes, especialmente os crimes violentos, e a investigar, para processar judicialmente, os crimes que não puderam ser evitados, de modo
a dar à sociedade e às vítimas uma compensação racional, em lugar
da antiga vendeta que transformava a violência em círculo vicioso
infernal.
O elevado nível de complexidade que, ano após ano, vem caracterizando os avanços da sociedade moderna, especialmente na segunda metade do século XX e neste início de novo século, vem exigindo
cada vez mais uma especialização técnica, métodos científicos e a incorporação de novas tecnologias na área de segurança pública.
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Isso ocorre em todo o mundo e não são mais raros os congressos e as exposições de materiais e equipamentos sofisticados produzidos para atender às novas necessidades da segurança e da defesa
social, alimentando o que se convencionou chamar de “indústria do
controle social”, cuja orientação, infelizmente, tem sido a de introduzir a demanda de inovações sob a lógica da acumulação de capital.
Aquilo que deveria responder a necessidades das políticas preventivas de segurança e defesa social e do meio ambiente passa a se
subordinar à lógica do lucro e da competição entre firmas, mais interessadas em seu sucesso empresarial que em atender às reais necessidades da população nessa área. As polícias muitas vezes se sentem
pressionadas a se subordinar a essa mesma lógica, criando um poderoso complexo industrial-policial, semelhante àquele que marcou a
“guerra fria” nos Estados Unidos da América, apelidado de complexo
industrial-militar.
O Brasil ainda partilha em seu território de situações extremas:
polícias altamente capacitadas e com acesso a recursos ultrassofisticados em armamentos e equipamentos operacionais e de proteção nas
grandes cidades e, nas fronteiras do oeste e do norte, bem como nos
sertões do sudeste, do centro-oeste e do nordeste, polícias abandonadas à sua própria sorte, mal remuneradas, sem equipamentos adequados e ainda excluídas das discussões que hoje atravessam todo o
País a respeito da necessária modernização da polícia brasileira e do
sistema de justiça criminal como um todo. Políticas governamentais
recentes buscam superar essa situação, como no caso da atuação da
SENASP – Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério
da Justiça –, que tem procurado induzir mudanças progressivas nessa
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área, enfrentando a resistência de muitos setores que se alimentam do
atraso e acreditam na brutalidade.
Um aspecto importante dos avanços que se verificam na área
de segurança pública no Brasil é a crescente presença da universidade
e da pesquisa séria e conscienciosa, muitas vezes em parceria com as
polícias e as secretarias municipais e estaduais de segurança e defesa
social. O impulso na formação pós-graduada do policial brasileiro e
o interesse crescente dos grupos de pesquisa das universidades pela
área temática da segurança pública têm sido responsáveis por importantes estudos e pesquisas em várias partes do País.
Este livro é resultado de um empreendimento desse tipo e seus
organizadores, uma professora doutora em psicologia social, Irme
Salete Bonamigo, e um professor doutor em sociologia política, e
também policial militar, Luiz Carlos Chaves, são o testemunho concreto de que estamos avançando numa parceria estratégica e que
seus resultados, a médio e longo prazos, serão fundamentais para a
consolidação de uma polícia moderna e democrática, capaz de defender a vida de todos os cidadãos, o que engloba desde a prevenção dos
crimes violentos até a defesa intransigente de nosso meio ambiente. A
eles e aos demais autores que contribuíram para esta obra, um futuro
de paz e equilíbrio os saúda, no registro do reconhecimento por esta e
por novas incursões que venham a ser feitas no mesmo sentido.
Rio de Janeiro, 1º de setembro de 2013.
Michel Misse
Coordenador do Núcleo de Estudos da Cidadania,
Conflito e Violência Urbana (NECVU)
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
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Apresentação
Irme Salete Bonamigo
Luiz Carlos Chaves
A
realidade contemporânea nos convida a abordar o tema
violências e segurança pública em sua amplitude e complexidade, articuladamente às experiências atuais e aos desafios relacionados às tecnologias e inovações sociais.
A necessidade de aprofundar essa discussão provocou o encontro entre a Unochapecó e a Polícia Militar de Santa Catarina no
esforço de buscar alternativas/soluções às violências emergentes na
atual conjuntura social, em suas múltiplas dimensões. O mergulho
nessa problemática deu-se por meio da articulação entre pesquisadores e profissionais do Setor de Pesquisa da Polícia Militar (SePe) e da
Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó) – do
Núcleo de Estudos sobre Violências (NESVI), do Mestrado em Polícias Sociais e Dinâmicas Regionais e do Mestrado em Ciências Ambientais, apoiados pela Área de Ciências Humanas e Jurídicas (ACHJ)
da IES.
Essa parceria possibilitou conectar ideias e tecer redes com núcleos de pesquisa, professores, profissionais, universidades, agências
de fomento e patrocinadores, extrapolou a mera reunião de sujeitos e
instituições, resultando na organização do “Seminário Violências, Segurança Pública, Tecnologias e Inovação Social”. Esse evento põe em
questão e procura evidenciar as problemáticas das violências em suas
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dinamizações gerais, abrangendo também singularidades do estado
de Santa Catarina e buscando ampliar a discussão na mesorregião
oeste catarinense.
Assim, a obra “Violências e Segurança Pública na contemporaneidade: um desafio às tecnologias e inovações sociais” surge como
resultado das elaborações textuais dos palestrantes e de alguns convidados à obra, que, estimulados pela temática do seminário, apresentam as suas reflexões e as põem em debate.
O objetivo desta coletânea é compartilhar pesquisas, experiências e reflexões sobre práticas e noções na área da segurança pública
e debater sobre a utilização de novas tecnologias e inovações sociais
para a gestão contemporânea de violências. As contribuições deste
livro são resultantes da articulação de saberes que são fruto de duas
diferentes e importantes fontes: pesquisas acadêmicas, práticas e conhecimentos profissionais, que se cruzam e entrecruzam para potencializar a compreensão acerca das violências no mundo atual.
O livro é composto de 14 capítulos, organizados em três partes.
A primeira parte, denominada “Violências e segurança pública”, apresenta dados da realidade contemporânea, abordando alguns desafios
relacionados à produção e ao enfrentamento de violências em sua articulação com políticas de segurança pública.
O primeiro capítulo, escrito por Saulo Cerutti e Irme Bonamigo, surpreende pela atitude investigativa e inquietação que movem os
autores em direção à compreensão quanto às repercussões atuais do
sistema penal. Nessa busca, provoca reflexões sobre a influência das
rotinas de atuação das forças de segurança pública na re(des)construção dos conceitos ligados aos paradigmas criminológicos de reducionismo e eficientismo penal. A discussão é resultante de pesquisa rea14
lizada na realidade de Chapecó (SC) que investigou o modo pelo qual
os diferentes paradigmas desenvolvidos na seara acadêmica são recepcionados pelas rotinas de atuação das forças envolvidas no sistema
repressivo que compõem a segurança pública. Os autores destacam a
importância de se conhecer o cotidiano social dos trabalhadores da
segurança pública, seus anseios e necessidades, concebendo-os como
protagonistas do processo de transformação e recriação da realidade.
Fernanda Garim, no segundo capítulo, apresenta estudo descritivo de corte transversal sobre a distribuição espacial e o perfil dos
atendimentos de emergência por violências e acidentes no município
de Chapecó (SC). O ineditismo da análise realizada pela autora é revelado pela sistematização de informações que compõem um mapa
pormenorizado da morbimortalidade – morte causada por fatores
externos –, evidenciando dados consistentes na busca de mecanismos
preventivos aos acidentes e às violências. Para tal efetivação, sugere o
planejamento de ações conjuntas protagonizado pelo setor de saúde
em parceria com outros setores inter-relacionados, garantindo espaços saudáveis a toda a população.
No terceiro capítulo, Deborah Amorim, Maira da Silva, Ana
Biasi, Patricia Vedana e Irme Bonamigo, sustentadas pelo referencial
da pesquisa-intervenção, realizam uma intensa pesquisa sobre as estratégias e ações adotadas para o enfrentamento às violências contra
crianças e adolescentes nos conselhos municipais de Chapecó. Identificam fragilidades, uma delas a ausência de plena autonomia dos
conselhos para exercerem seu poder de fiscalização. Ressaltam a necessidade de se constituir espaços conjuntos e articulados que possam
entrelaçar atores (escolas, serviços de saúde, serviços da assistência
social, comunidades, governos, organizações e outros) envolvidos na
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reflexão e no enfrentamento de situações que tendem a produzir violências.
O crime organizado, grande ameaça para a segurança pública,
é discutido nos capítulos 4 e 5. O quarto capítulo aborda a dinâmica
do Primeiro Comando da Capital (PCC) em São Paulo. Com propriedade, Camila Dias sustenta o argumento de que a construção de uma
base relativamente sólida de confiança – dentro e fora do grupo – e
o consequente aumento da previsibilidade nas relações sociais constituem o elemento-chave à compreensão acerca da permanência da
unidade interna e da manutenção do poderio econômico e domínio
político desta facção no mundo do crime.
No quinto capítulo, Erni Seibel, Andresa Ventura, Gabriela
Cardoso e Felipe Monteiro, apoiados em investigação hemerográfica
e nos dados do sistema prisional catarinense, à maneira do artesão intelectual, reúnem informações sobre a história recente desse sistema.
Analisam os vestígios da formação do crime organizado no estado
de Santa Catarina e os fatos mais relevantes durante as três recentes
ondas de atentados no estado (entre 2012 e 2013), que tiveram como
protagonista o Primeiro Grupo Catarinense (PGC). O fio condutor
do texto ampara-se na indagação que acompanhou os atentados: “Por
que em Santa Catarina?”, dada a condição histórica que concede ao
estado o status de não violento.
A segunda parte, constituída pelo tema “Tecnologias e inovação social na gestão de violências,” é composta pelos capítulos 6, 7, 8
e 9, que descrevem e analisam novas tecnologias disponíveis, experiências em inovação social e desafios atuais na prevenção e gestão de
violências.
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No capítulo 6, Osvaldir Kassburg apresenta uma importante reflexão sobre o uso de tecnologias para redução da violência urbana
em Santa Catarina e descreve as principais implementações tecnológicas atualmente postas à disposição da atividade policial: o pós-crime, o sistema de videomonitoramento, o Sistema de Monitoramento
de Frota e o Plano de Comando. No decorrer de sua análise, o autor
alerta para a concepção de que tais ferramentas contribuem para a
redução de violências mas não são suficientes para levar as ações de
polícia ostensiva a outra dimensão que não a do trabalho repressivo.
O capítulo 7, de autoria de Djan Rosário, discute o atual cenário investigativo do crime, constatando a predominância de uma
atividade fragmentada, em que o analista se volta para a ferramenta
especializada de tratamento dos dados na construção da prova criminal, perdendo a visão acerca de todas as inter-relações entre as informações do alvo em questão. O autor propõe o conceito de plataforma
tecnológica aplicada ao processo de investigação, com fontes e instrumentos capazes de assegurar amplas possibilidades de integração
de tecnologias, com total compartilhamento de dados, informações
e conhecimentos para a resolução e prevenção de atividades ilícitas.
O oitavo capítulo discute a polícia comunitária como uma possibilidade de inovação social às organizações policiais brasileiras. Aldo
dos Santos Junior, Aldo Antonio dos Santos e Luiz Carlos Chaves, com
base em suas experiências e em pesquisa bibliográfica realizada, reconhecem o esforço das instituições policiais e os avanços promovidos
pelas tentativas destas em aprimorar seus processos de trabalho por
meio da introdução da filosofia da polícia comunitária. No entanto,
analisam que a forma estrutural e a técnica operativa, atual e hegemô-
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nica nas agências policiais, em especial nas militares, têm inviabilizado a prática efetiva dessa filosofia.
No nono capítulo, Vilson Groh e Jared Ordway, a partir de relatos e da análise de suas experiências de mediação em comunidades
de Florianópolis, propõem a mediação como uma inovação social
na prevenção de violências em centros urbanos brasileiros, constituída por ações e intervenções que não se classificam dentre as práticas convencionais da mediação na sua orientação legal ou comercial.
Compreendem que o processo de mediação de violências possibilita
restaurar a dignidade e a conexão humanas, interrompendo a violência direta, para criar caminhos em direção a mudanças em termos de
desafios estruturais para a produção de um futuro melhor.
A terceira e última parte desta coletânea apresenta uma instigante e reveladora reflexão sobre violências ambientais e segurança
pública, inteiramente alinhada ao fio condutor da temática do livro.
Os autores abordam com propriedade e responsabilidade intelectual
e profissional os impactos de violências ambientais contemporâneos, extrapolando o reducionismo peculiar das abordagens sobre meio
ambiente, sem atomizar o conceito de violência. A temática proposta
é problematizada nos capítulos 10, 11, 12, 13 e 14 tendo em vista a
dialética social que a permeia.
No décimo capítulo, Luiz Carlos Chaves, amparado pela categoria “historicidade”, sistematiza sua reflexão acerca da presença da segurança pública na dimensão ambiental catarinense. Tendo como referência empírica a instituição Polícia Militar Ambiental, põe em questão a chamada “crise ambiental”, destacando o caráter capitalista contraditório dela, o qual, ao mesmo tempo que proporciona a geração de
bens e serviços tornados fundamentais à sociabilidade humana atual,
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produz incertezas, exclusão social, fome e crimes ambientais. Nessa realidade contraditória, o autor situa a importância da dimensão
socioeducativa como elemento constitutivo do processo de trabalho
desenvolvido por profissionais policiais militares ambientais e aponta
para a necessidade da integralização de uma formação humanística
que transforme a proteção ambiental em sinônimo de preservação da
vida planetária.
No décimo primeiro capítulo, ao apresentar sua reflexão sobre
o processo histórico de violências ambientais no oeste catarinense, a
autora Eunice Nodari não se rende às aparências e literalmente põe
o “dedo na ferida”. Fundamentada em suas próprias pesquisas e em
autores e pesquisas referenciados internacionalmente, mostra que estudar uma região sem analisar a natureza acaba gerando o registro
de uma história estéril. Nessa esteira, por meio da História Ambiental, problematiza a dinâmica social e processual da violência contra
o meio ambiente resgatando a ação e a influência da colonização europeia na disseminação de violências contra a natureza. As análises
apresentadas extrapolam a focalização espacial e explicitam conexões
socioprodutivas hegemônicas que na prática seguem a lógica sistêmica contemporânea da criação destruidora. Nessa direção, a autora
aponta o modelo de integração agroindustrial, a expansão da monocultura de pinus e eucaliptos, as usinas hidrelétricas e a monocultura
da soja e, também, a falta de saneamento básico como potências à
institucionalização de violências ambientais.
O décimo segundo capítulo, elaborado por Arlene Renk e Silvana Winckler, apresenta inicialmente uma consistente reflexão teórico-filosófica sobre o conceito “violências”. Amparadas em Pierre Bourdieu, Paul Ricoeur e Irme Bonamigo, as autoras relacionam violências
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ambientais aos danos ocorridos ao meio ambiente e às pessoas. Sem
descolar da totalidade que circunscreve a temática, leem e releem aspectos da colonização e do fenômeno da etnização ocorrida no oeste
catarinense, evidenciando o caso de Chapecó, onde a ocupação dos
espaços naturais para fins de colonização não ocorreu sem violências
ambientais. O núcleo duro da análise centra-se nos processos de expropriação e mercantilizarão dos caboclos – os chamados “brasileiros” –
como vetores de violências ambientais nem sempre de fácil percepção.
O décimo terceiro capítulo, escrito por Evoy Zaniboni Filho,
Alex Pires de Oliveira Nuñer, David Reynalte-Tataje, Renata Guereschi,
Cláudia Machado, Samara Hermes-Silva, Luciano Weiss e Giuliano
Huergo, ressalta o processo de disseminação das usinas hidrelétricas
como gerador de violências ambientais em ambientes aquáticos.
Numa reflexão com sofisticado rigor teórico e técnico, os autores
desnudam a aparência serena e progressista dos empreendimentos
hidrelétricos – em especial, os existentes na bacia do rio Uruguai – e
mostram o que resulta à vida aquática da geração de energia elétrica.
Os autores denunciam a dificuldade quase intransponível colocada
à sobrevivência de muitas espécies de peixes que povoam as águas
do rio Uruguai e a drástica diminuição da atividade pesqueira,
sobretudo na região do alto Uruguai catarinense, onde há registro
de desaparecimento de várias espécies de peixes migradores. Na
contramão dessa prática desenvolvimentista, os autores apresentam
possibilidades tecnológicas e de inovação social desenvolvidas
pelo Laboratório de Biologia e Cultivo de Peixes de Água Doce da
Universidade Federal de Santa Catarina (LAPAD/UFSC), com vista
à manutenção e à proteção das populações de peixes migradores
atingidos pela ação danosa das hidrelétricas.
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No décimo quarto capítulo, os autores – Paulo Fagúndez,
Francisco da Silva, Isabele Barbieri e João Ziegler Filho – abordam
a problemática da acomodação e do destino do rejeito dos óleos lubrificantes usados e/ou contaminados. Apoiados nas condicionantes
da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) e em um quadro
referencial considerável, fiéis a proposta metodológica, explicitam a
importância da logística reversa como meio de prevenção e redução
de danos ambientais e, sob a mesma lógica, como fonte de redução
de gastos.
Esta coletânea contribui para subsidiar experiências e debates
sobre violências e segurança pública no Brasil. Convidamos você,
leitor, a compartilhar de nossas práticas, ideias e reflexões e a dialogar conosco, quiçá identificando elementos e perspectivas que nos
tenham passado despercebidos.
21
Sobre os autores
Aldo Antonio dos Santos Junior
Mestre em Relações Econ. e Soc. Internacionais pela Universidade do Minho,
Portugal. Tenente Coronel da Polícia Militar de Santa Catarina.
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Aldo Antonio Hostins dos Santos
Graduando em Direito da Universidade do Vale de Itajaí (Univali – Balneário
Camboriú).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Alex Pires de Oliveira Nuñer
Mestre e doutor em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal
de São Carlos. Professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Ana Soraia Haddad Biasi
Mestre em Educação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos).
Assistente Social do Ministério Público de Santa Catarina, comarca de Chapecó.
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Andresa Ventura
Pós-graduada em Administração, Gestão Pública e Políticas Sociais pela Universidade Dom Bosco. Servidora da Prefeitura Municipal de Florianópolis e
colaboradora do Núcleo Interdisciplinar de Políticas Públicas (NIPP).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
337
Arlene Renk
Doutora em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Docente Permanente dos Programas stricto sensu em Ciências Ambientais
e Políticas Sociais e Dinâmicas Regionais da Universidade Comunitária da
Região de Chapecó (Unochapecó).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Camila Caldeira Nunes Dias
Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). Professora
adjunta da Universidade Federal do ABC (UFABC), pesquisadora do Núcleo
de Estudos de Violência da USP (NEV/USP).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Cláudia Machado
Mestre em Aquicultura pela Universidade Federal de Santa Catarina, graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Santa Catarina. Técnica de laboratório na Universidade Federal de Santa Catarina, vinculada ao
Laboratório de Biologia e Cultivo de Peixes de Água Doce (LAPAD/UFSC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
David Augusto Reynalte-Tataje
Doutor em Ecologia de Ambientes Aquáticos Continentais pela Universidade
Estadual de Maringá, mestre em Aquicultura pela Universidade Federal de
Santa Catarina. Biólogo da Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária, vinculado ao Laboratório de Biologia e Cultivo de Peixes de Água
Doce (LAPAD/UFSC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Deborah Cristina Amorim
Mestre em Serviço Social pela Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC). Docente da Área de Ciências Humanas e Jurídicas da Universidade
Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
338
Djan Rosário
Especialista em Gestão da Administração Pública pela Universidade Castelo
Branco, em parceria com o Exército Brasileiro (2008). Assessor de Projetos
Especiais da Dígitro Tecnologia Ltda (Florianópolis, SC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Erni J. Seibel
Doutor em Ciência Política pela Freie Universität Berlin (1993). Professor
voluntário do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e coordenador do Núcleo Interdisciplinar de Políticas Públicas (NIPP).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Eunice Sueli Nodari
Doutora em História do Brasil pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, mestre em História pela University of California, Davis. Professora Associada III da Universidade Federal de Santa Catarina, no mestrado e doutorado do Programa de Pós-Graduação em História e no Programa
de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas. Coordenadora do
Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Evoy Zaniboni Filho
Pós-doutor pelo Instituto Politécnico da Virgínia (Virginia Tech, Estados
Unidos), doutor em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal
de São Carlos, mestre em Biologia de Água Doce e Pesca Interior pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. Professor da Universidade Federal
de Santa Catarina (UFSC), Centro de Ciências Agrárias, Departamento de
Aquicultura, Laboratório de Biologia e Cultivo de Peixes de Água Doce.
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
339
Felipe M. Monteiro
Mestre em Sociologia Política. Professor da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) e pesquisador do NIPP.
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Fernanda Moschetta Garim
Mestre em Epidemiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Enfermeira efetiva no setor de vigilância
epidemiológica da Prefeitura Municipal de Chapecó (SC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Francisco Rodrigues Santiago da Silva
Pós-graduando em Direito e Gestão Ambiental pelo Complexo de Ensino
Superior de Santa Catarina (CESUSC). Pesquisador voluntário no Grupo de
Pesquisa Direito Ambiental na Sociedade de Risco da Universidade Federal
de Santa Catarina (UFSC), coordenado pelo professor doutor José Rubens
Morato Leite.
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Gabriela R. Cardoso
Mestre em Sociologia Política. Pesquisadora do Núcleo Interdisciplinar de
Políticas Públicas (NIPP) e Técnica em Assuntos Educacionais da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Giuliano Palemão Maia Huergo
Mestre em Aquicultura pela Universidade Federal de Santa Catarina, graduado em Oceanografia pela Universidade do Vale do Itajaí. Bolsista PNPD-CAPES junto ao Programa de Pós-Graduação em Aquicultura da Universidade
Federal de Santa Catarina, vinculado ao Laboratório de Biologia e Cultivo de
Peixes de Água Doce (LAPAD/UFSC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
340
Irme Salete Bonamigo (Org.)
Doutora em Psicologia Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Docente do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Políticas
Sociais e Dinâmicas Regionais e do Curso de Psicologia da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Isabele Bruna Barbieri
Especialista em Economia do Meio Ambiente pela Universidade Estadual
de Londrina, graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do
Paraná.
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Jared Ordway
Professor do Champlain College/Woodbury Mediation Institute, Graduate
Program in Mediation and Applied Conflict Studies.
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
João Alfredo Ziegler Filho
Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina (PPGD/UFSC). Tenente Coronel, chefe do setor de
pesquisa (SePe) da Polícia Militar de Santa Catarina.
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Luciano Augusto Weiss
Doutorando em Aquicultura no Programa de Pós-Graduação em Aquicultura da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestre em Aquicultura pela Universidade Federal de Santa Catarina. Bolsista junto ao Programa
de Pós-Graduação em Aquicultura da Universidade Federal de Santa Catarina, vinculado ao Laboratório de Biologia e Cultivo de Peixes de Água Doce
(LAPAD/UFSC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
341
Luiz Carlos Chaves (Org.)
Doutor em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC). Policial militar ambiental catarinense, professor titular da Faculdade
Concórdia (FACC) e professor convidado da Universidade do Contestado
(UnC) campus Concórdia.
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Maira Tellechêa da Silva
Mestre em Enfermagem pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Docente da Área de Ciências da Saúde da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Osvaldir José Kassburg
Graduado em Direito pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó
(Unochapecó), especialista lato sensu em Administração de Segurança Pública para o Mercado de Trabalho e para o Exercício do Magistério pela Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul). Tenente Coronel da Polícia Militar
de Santa Catarina.
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Paulo Roney Ávila Fagúndez
Pós-doutor em Direitos Especiais pelas Universidades Lusíada de Lisboa e
do Porto, Portugal. Professor associado I da Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Patricia Vedana
Assistente Social graduada pela Universidade Comunitária da Região de
Chapecó (Unochapecó).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
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Renata Maria Guereschi
Pós-doutora pela Universidade Federal de Santa Catarina, mestre e doutora em
Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal de São Carlos. Bióloga
da Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária, vinculada ao
Laboratório de Biologia e Cultivo de Peixes de Água Doce (LAPAD/UFSC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Samara Hermes-Silva
Doutora em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal de São
Carlos, mestre em Aquicultura pela Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC), graduada em Ciências Biológicas pela UFSC. Bolsista PNPD-CAPES junto ao Programa de Pós-Graduação em Aquicultura da Universidade
Federal de Santa Catarina, vinculada ao Laboratório de Biologia e Cultivo de
Peixes de Água Doce (LAPAD/UFSC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Saulo Cerutti
Mestre em Políticas Sociais e Dinâmicas Regionais, especialista lato sensu em Direito Público com ênfase em Direito Administrativo e Constitucional e graduado
em Direito pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Silvana Winckler
Doutora em Direito pela Universidade de Barcelona. Docente permanente do
Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais (Mestrado Acadêmico)
e do Núcleo de Pesquisa stricto sensu em Direito da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
Vilson Groh
Mestre em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Presidente do Instituto Vilson Groh (Florianópolis, SC).
Endereço eletrônico: <[email protected]>.
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Argos Editora da Unochapecó
www.unochapeco.edu.br/argos
Título
Organizadores
Coleção
Coordenador
Assistente editorial
Assistente de vendas
Secretaria e divulgação
Vendas e distribuição
Projeto gráfico
Capa
Diagramação
Violências e segurança pública na
contemporaneidade: um desafio às
tecnologias e inovações sociais
Irme Salete Bonamigo
Luiz Carlos Chaves
Perspectivas, n. 4
Dirceu Luiz Hermes
Alexsandro Stumpf
Neli Ferrari
Leonardo Favero
Neli Ferrari e Andressa Cazalli
Alexsandro Stumpf e Caroline Kirschner
Alexsandro Stumpf
Alexsandro Stumpf, Caroline Kirschner e
Kamila Kirschner
Preparação dos originais
Araceli Pimentel Godinho
Revisão
Araceli Pimentel Godinho
Finalização editorial
Formato
Tipologia
Papel
Carlos Pace Dori
16 X 23 cm
Minion Pro e FontleroyBrown
entre 10 e 14 pontos
Capa: Supremo 280 g/m2
Miolo: Pólen Soft 80 g/m2
Número de páginas
343
Tiragem
800
Publicação
Impressão e acabamento
2013
Gráfica e Editora Pallotti – Santa Maria (RS)
Este livro está à venda:
www.travessa.com.br
www.livrariacultura.com.br