SUMÁRIO

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SUMÁRIO
SUMÁRIO
DIDÁTICA I
OBJETIVOS ............................................................................................................... DIDI 1
1.
EDUCAÇÃO E DIDÁTICA .................................................................................. DIDI 3
2.
“ALGUNS CAMINHOS PERCORRIDOS PELA DIDÁTICA” ............................. DIDI 7
3.
CAMINHOS APÓS O SÉCULO XVIII ............................................................... DIDI 11
4.
O PENSAMENTO CONSTRUTIVO DE JEAN PIAGET E O NOVO
OLHAR PARA A ALFABETIZAÇÃO DE EMÍLIA FERREIRO ........................... DIDI 19
5.
VYGOTSKY, PAULO FREIRE E A CONSIDERAÇÃO DO CONTEXTO
SÓCIO-HISTÓRICO NO PROCESSO DE APRENDIZADO ....................... DIDI 27
6.
PHILIPPE PERRENOUD: PENSANDO A EDUCAÇÃO NA ATUALIDADE ....... DIDI 33
7.
ORGANIZANDO A PRÁTICA EDUCATIVA: A IMPORTÂNCIA
DO PLANEJAMENTO ..................................................................................... DIDI 37
8.
OS OBJETIVOS EDUCACIONAIS .................................................................. DIDI 39
9.
OS CONTEÚDOS DE APRENDIZAGEM .......................................................... DIDI 41
10.
COMPETÊNCIAS E HABILIDADES ................................................................ DIDI 45
11.
OS RECURSOS DIDÁTICOS E A IMPORTÂNCIA DA DIVERSIDADE ............ DIDI 47
12.
AS TÉCNICAS DE ENSINO NO PROCESSO PEDAGÓGICO ......................... DIDI 51
13.
A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM .............................................................. DIDI 55
14.
CONTINUANDO NOSSOS CAMINHOS .......................................................... DIDI 59
Didática I
OBJETIVOS
Ao final dos 14 módulos a disciplina contemplará os objetivos abaixo:
zQue
os alunos tenham a visão de uma Didática fundamental,
multidisciplinar, com o compromisso da transformação social,
democratização e a universalização do ensino;
zPossam exercitar o seu lado crítico enquanto educandos em seus
processos de formação e de futuros educadores, politicamente e
socialmente compromissados;
zBusquem metodologias e abordagens que privilegiem a compreensão
do trabalho pedagógico em seu aspecto dialético (ação - reflexão ação).
DIDI
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Didática I
EDUCAÇÃO E DIDÁTICA
CAPÍTULO 1
“Não se pode encarar a educação a não ser como um que
fazer humano. Que fazer, portanto, que ocorre no tempo e
no espaço, entre os homens, uns com os outros.”
(Paulo Freire)
Antes de começarmos a falar sobre o nosso tema, escreva a seguir o
que você pensa sobre o que é educação.
Pois bem, não há como pensar em didática sem falarmos sobre
educação.
No dicionário Aurélio, encontramos a definição de educação como
“processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e
do ser humano em geral, visando à sua melhor integração individual e social.
Aperfeiçoamento integral de todas as faculdades humanas”.
Dermeval Saviani em seu livro Educação: do senso comum à
consciência crítica, considera que a finalidade da educação é a promoção do homem
e para ele, “promover o homem significa torná-lo mais capaz de conhecer os
elementos de sua situação, para intervir nela, transformando-a no sentido de sua
liberdade, da comunicação e da colaboração entre os homens”.
Paulo Freire diz que:
“A educação é uma resposta da finitude da infinitude. A educação é possível
para o homem, porque este é inacabado e sabe-se inacabado. (...) A
educação, portanto, implica uma busca realizada por um sujeito que é o
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Didática I
CAPÍTULO 1
homem. O homem deve ser o sujeito de sua própria educação (...)”
(1988, p.27-28)
Libâneo vem somar a esses autores afirmando que:
“Educação é um conceito amplo que se refere ao processo de
desenvolvimento onilateral da personalidade, envolvendo a formação de
qualidades humanas – físicas, morais, intelectuais, estéticas – tendo em
vista a orientação da atividade humana na sua relação com o meio social,
num determinado contexto de relações sociais”.
(1994, p.22)
Voltando às quatro definições citadas, podemos
observar que no dicionário Aurélio e em Libâneo, a educação
é retratada enquanto processo de evolução que considera o
ser humano em seu todo.
Saviani ressalta a importância da educação
enquanto meio para favorecer a autonomia do ser humano,
gerando transformação em sua vida e também no contexto em
que vive.
Freire reconhece a limitação humana em seu condicionamento histórico
e social; a incompletude e a conseqüente busca por ser mais, querer mais, através da
educação.
Podemos também salientar que as definições trazem o conceito de
educação como um fenômeno social e, como diz Fernando Savater, o ser humano
nasce duas vezes: o nascimento biológico e o nascimento através da EDUCAÇÃO.
Bem, voltemos ao seu conceito de educação formulado no início do
capítulo. Após essas breves considerações, você o modificaria?
Experimente!
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Didática I
CAPÍTULO 1
Mas, e a didática? O que ela tem a ver com tudo isso?
A didática busca compreender o fenômeno educativo através da reflexão
sobre o processo ensino-aprendizagem.
Como considera Vera Maria Candau, “o objeto de estudo da didática é o
processo ensino-aprendizagem”, (1994, p.13) que acontece de forma organizada e
intencional, na escola, na sala de aula.
Ao refletir sobre esse processo, a
didática busca caminhos para a realização de uma
prática pedagógica compromissada com a
transformação social e com um ensino de qualidade.
Para isso, é necessário que se
considerem três dimensões do processo ensinoaprendizagem que, segundo Candau, são: humana,
técnica e política.
A dimensão humana leva em consideração os relacionamentos vividos e
o clima afetivo entre todos os “atores” participantes da escola (educadores,
educandos, pais, gestores, funcionários) e tem sido muito considerada na didática
atual.
Na dimensão técnica, temos a preocupação com a organização do
processo ensino-aprendizagem, pois como já dito nesse texto, tal processo acontece
de modo sistemático e intencional. Portanto, há que se pensar nos objetivos
educacionais, na seleção dos conteúdos, na escolha dos procedimentos
metodológicos, na prática de avaliação, etc.
Enfim, na dimensão técnica organiza-se a ação pedagógica,
contextualizando-a com as questões sociais e com as outras duas dimensões (humana
e política).
Marcos Masetto, recuperando as idéias de Candau, considera que “o
ensino-aprendizagem de que estamos falando acontece numa escola situada em um
local determinado, numa certa época histórica, que segue orientações e diretrizes de
profissionais da educação e das políticas governamentais. Estas últimas têm uma
influência muito grande através da legislação e normas que afetam a escola (...)”
(1996, p.14)
Trata-se da dimensão política ou político-social que permeia todo o
processo ensino-aprendizagem.
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Didática I
CAPÍTULO 1
Em síntese, há uma estreita ligação entre Didática e Educação, e
também com outros campos do conhecimento como a Filosofia, Sociologia,
Psicologia e outras.
Podemos dizer que a Didática contribui com a reflexão sobre o processo
ensino-aprendizagem e com a implementação da prática pedagógica ao levar em
conta uma educação que dê sentido à nossa humanização.
REFERÊNCIAS
CANDAU, Vera Maria F. (org.) A didática em questão, 12. ed. Petrópolis, RJ: Vozes,
1994.
FREIRE, Paulo. Educação e mudança. 14. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1979.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. 6. ed. São Paulo: Cortez, 1994.
MASETTO, Marcos. Didática: a aula como centro. 3. ed. São Paulo: FTD, 1996.
ANOTAÇÕES
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Didática I
“ALGUNS CAMINHOS PERCORRIDOS PELA
DIDÁTICA”
CAPÍTULO 2
“A toda hora, uma história que é preciso estar atento. A toda
hora um movimento que muda o rumo dos ventos”.
(Paulinho da Viola)
Pensando na trajetória da Didática enquanto área de conhecimento,
podemos dizer que ela surge no século XVII com João Amos Comênio (1592-1670),
que acredita ter encontrado uma forma de “ensinar tudo a todos” e organiza uma obra
intitulada Didática Magna, propondo tal princípio.
Antes disso, alguns autores consideram
que o ensino era praticado de forma intuitiva, excluindo
Sócrates (séc. V a.C.) que praticava a maiêutica, ou
seja, “partindo do conhecido para o desconhecido, do
fácil para o difícil, Sócrates vai fazendo a seu discípulo
uma série de perguntas que o leva a refletir, a descobrir
e a formular as próprias respostas” (Haidt, 2001, p. 16).
Reconhecido como “o pai da
didática”,Comênio marca sua atuação na época da Reforma Protestante na Europa e
acreditava ter criado um método que tornasse o ensino mais agradável, eficiente e
rápido. Seu pensamento educacional partia de alguns valores como o
autoconhecimento, o saber com valor instrumental, a escola tornar-se mais atrativa,
dentre outros.
Comênio acreditava em uma educação que aperfeiçoasse o ser humano
para conduzi-lo a Deus, dado seus ideais ético-religiosos.
Desta forma, propunha uma aprendizagem com material didático rico e
variado (livros escolares com ilustrações); ênfase ao exemplo, ressaltando o papel da
imitação na aprendizagem infantil; prioridade à língua materna, pois todo o ensino
nessa época era oferecido em latim, etc.
No século XVIII teremos alguns educadores que irão promover o
afastamento da pedagogia e religião, o que até então era costumeiro, dentre eles
Rousseau (1712-1778), como autor de uma grande revolução didática. Como filósofo
interessado nas questões pedagógicas, Rousseau traz um novo conceito de infância
por considerá-la um momento singular.
Contudo, como afirma Castro (1992, p.17):
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Didática I
CAPÍTULO 2
“A valorização da infância está carregada de conseqüências para a pesquisa
e a ação pedagógicas, mas estas vão ainda aguardar mais de um século
para concretizar-se. Enquanto COMÊNIO, ao seguir as “pegadas da natureza”,
pensava em “domar” as paixões das crianças”, ROUSSEAU parte da idéia
da bondade natural do homem, corrompido pela sociedade. É em sua obra
“O Contrato Social” que discute a reforma da sociedade, tão necessária
quanto a reforma da Educação: por essa vertente de seu pensamento é que
precedeu à Revolução Francesa”.
JEAN JACQUES ROUSSEAU
Jean Jacques Rousseau nasceu em
Genebra, na Suíça, no ano de 1712, e perdeu sua mãe ao
nascer, pois esta morrera no parto.
Teve uma vida incomum, aventureira e
solitária. Viveu inicialmente com o pai e depois sob a
tutela de um tio. Aos 16 anos iniciou sua vida nômade.
Aventura-se com alguns amigos, buscando
trabalho em outros locais e vai estudando, lendo muito e
aprendendo.
Quando vai para Paris, torna-se amigo dos
Jean Jacques Rousseau
filósofos iluministas e inicia carreira como compositor.
Em 1745, conhece Thérèse Levasseur, com a qual tem cinco filhos e vive
até o fim de seus dias. Rousseau abandona os filhos em orfanatos de Paris, alegando
não ser capaz de criá-los, fato que o faz carregar um grande remorso, explorado por
seus inimigos e que também marcará sua obra.
De 1756 a 1762, permanece no campo e produz suas obras mais
importantes e conhecidas (Do Contrato Social, Emílio e A Nova Heloísa) as quais o
condenam a viver uma vida intranqüila, fugindo de perseguições.
Nos últimos anos de sua vida dedica-se à botânica e a 2 de julho de
1778 vem a falecer e é enterrado na ilha de Choupos.
Em 1793, durante a Revolução Francesa, seus restos mortais são
levados para o Panteão de Paris, monumento dedicado aos heróis da pátria.
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Didática I
CAPÍTULO 2
É através de suas obras Do Contrato Social
e Emílio que Rousseau deixa sua contribuição para o
pensamento educativo.
Rousseau afirma que tudo que não temos ao
nascer nos é dado pela educação e a define como um
processo natural. Aprende-se através dos sentidos, das
emoções, dos instintos. Rousseau é contrário ao intelectualismo que leva ao ensino
formal e livresco e propõe a aprendizagem pela própria experiência, dizia ele: “que a
criança corra, se divirta, caia cem vezes por dia, tanto melhor, aprenderá mais cedo a
se levantar”. Ressalta o papel da mãe como importante figura no processo educativo.
Encara a infância como importante para o início da educação.
Em sua obra Do Contrato Social, Rousseau apresenta a legitimidade do
poder político e discute a formação do homem enquanto cidadão.
Podemos associar a essa obra a frase do próprio Rousseau: “Todo
homem nasce livre”.
Em Emílio, obra considerada um ensaio pedagógico, mas também um
romance, Rousseau apresenta a educação do jovem Emílio do nascimento até os 25
anos, tratando da formação do homem enquanto indivíduo. Podemos associar a essa
obra a frase: “Todo homem nasce bom”.
Aliás, Rousseau se opõe à igreja fazendo tal afirmação, pois para os
religiosos, o homem nasce com o pecado original. Como já dissemos, isso lhe
ocasionou várias perseguições.
Na Coleção “Os Pensadores”, destacam-se os temas dominantes em
suas obras:
1. relações entre natureza e sociedade;
2. moral fundada na liberdade;
3. primazia do sentimento sobre a razão;
4. teoria da bondade natural do homem;
5. doutrina do contrato social.
(Os Pensadores – Rousseau – vol. 1, p.12)
Enfim, através de seus escritos, Rousseau propunha mudanças, tanto no
contexto social como também no contexto educativo. Aí talvez esteja a sua grande
contribuição.
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Didática I
CAPÍTULO 2
REFERÊNCIAS
CASTRO, Amélia Domingues de. A trajetória histórica da didática. Idéias, São Paulo:
FDE, (11), 1992.
FORTES, Luiz Roberto Salinas. Rousseau: o bom selvagem. São Paulo: FTD, 1989.
HAIDT, Regina Célia Cazaux. Curso de didática geral. 7. ed. São Paulo: Ática, 2001.
(Série Educação).
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social / Ensaio sobre a origem das línguas. Os
Pensadores. Trad. de Lourdes Santos Machado. São Paulo: Nova Cultural, 1997. vol.1.
ANOTAÇÕES
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Didática I
CAMINHOS APÓS O SÉCULO XVIII
CAPÍTULO 3
“Quem não se arrisca a abrir novas portas terá sempre a
mesma porta pela frente.”
(Autor desconhecido)
No século XIX, podemos ressaltar John
Frederick Herbart (1776-1841), que busca criar uma
pedagogia científica, com um “corpo” de conhecimentos
próprios. Herbart concebia a educação como instrução e
considerava que “a partir das influências externas, das
representações formadas e de suas combinações” (HAIDT,
2001, p. 20), o ser humano vai se desenvolvendo. “Portanto,
a característica fundamental do ser humano é o seu poder
de assimilação. A teoria educacional de Herbart gravita
assim em torno da noção de função assimiladora, que ele
denominou de apercepção. A apercepção é a assimilação
Johann Friedrich Herbart de novas idéias através da experiência e sua relação com
as idéias ou conceitos já anteriormente formados” (Ibid) .
Nesse sentido, a formação moral e o desenvolvimento intelectual são
fundamentais para a educação.
Levando em consideração as concepções acima expostas, Ghiraldelli
(1996, p.28) expõe sobre a didática de Herbart, proposta em cinco passos:
“(...) preparação, apresentação, associação, generalização e aplicação. A
aula começa, então, com o professor recordando o assunto da aula anterior
(preparação). O assunto antes exposto deve encaminhar para a necessidade
de novos estudos, o que convoca a nova lição (apresentação). Baseandose em analogia, o professor recorre aos procedimentos utilizados na
resolução dos problemas da lição anterior para solucionar os novos
problemas (associação). Em seguida, mostra como as regras recém
aprendidas podem servir para diversos casos (generalização). Por fim, coloca
os alunos no trabalho de resolução de problemas semelhantes ao da aula
dada (aplicação), inclusive com o objetivo de verificar o conhecimento
aprendido.”
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Didática I
CAPÍTULO 3
A didática proposta por Herbart está associada ao ensino tradicional. Parte
do domínio e conhecimento do professor que transmite o saber e leva-se em consideração
mais o produto do que o processo de aquisição desse conhecimento.
Segundo nossa trajetória histórica, parafraseando Castro (1992), o séc.
XIX apresentará dois modos de interpretar a didática: ora com ênfase no sujeito, buscando
a aprendizagem através do interesse, da curiosidade; ora com ênfase no método, como
um caminho traçado pela descoberta do ser humano.
Teremos no final do século XIX e início do séc. XX o movimento da Escola
Nova, que trouxe novos rumos para a educação e que discutiremos logo a seguir.
O que vale a pena ressaltar é que nessa trajetória a didática contou com a
contribuição de várias áreas do conhecimento como a filosofia, a sociologia, a psicologia
e outras, mas a responsável por refletir sobre o processo ensino-aprendizagem é a
didática.
Do século XVII aos dias de hoje podemos perceber a evolução da didática
e em alguns momentos, marcos significativos para uma mudança de paradigma.
Como afirma Castro (1992, p.24):
“O panorama do final do séc. XX não é simples. A Didática está impregnada
de todas as inquietações da época (...).
A associação entre uma tendência psicológica que acentua a relevância da
compreensão da inteligência humana e sua construção e outra que se apóia
na visão sociológica das relações escola-sociedade, parece dominar o
conteúdo da disciplina.”
E diante dessas inquietações, vale
considerar que o foco da didática – o ensino – passou
a “olhar” com maior interesse para a aprendizagem, ou
seja, busca-se o entendimento no “como se aprende”
para se propor “como ensinar”.
Partindo dessa ótica, muitas questões se
colocarão para a didática de nossos dias, como por
exemplo, pensar sobre a estrutura escolar, as relações
de poder que se estabelecem e, dentre outras, o papel
de cada um dos atores envolvidos no processo
educativo.
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Didática I
FREINET E DEWEY: REPRESENTANTES DA
ESCOLA NOVA
Pestalozzi
CAPÍTULO 3
Podemos perceber na história da pedagogia
alguma ressonância das idéias apresentadas por
Rousseau (1712-1778).
Poderíamos citar Pestalozzi (1746-1827),
Ovide Decroly (1871-1932), Froebel (1782-1852), Maria
Montessori (1870-1952), dentre outros.
Percebe-se também um certo adormecimento
de suas idéias até o advento do movimento da Escola
Nova, cujos educadores trataremos na seqüência.
Castro (1992, p.19) considera que:
“Não é coincidência que a era do liberalismo e do capitalismo, da
industrialização e urbanização tenha exigido novos rumos à Educação. Na
burguesia dominante e enriquecida, a Escola Nova vai encontrar ressonância
com seus ideais de liberdade e atividade. (...)
O movimento doutrinário, ideológico, caracteriza-se por sua denominação
mais comum: Escola Nova, também Renovada, Ativa ou Progressista,
conforme as vertentes de sua atuação. Contrapõe-se, pois, a concepções
consideradas antigas, tradicionais, voltadas para o passado. Apresenta-se
com tonalidade crítica, contestadora, revolucionária e seus escritos têm,
muitas vezes, um tom panfletário, proselitista, talvez utópico. É caso de
distinguir-se o significado de novo e de recente, pois o movimento declara,
como precursores, todos aqueles que mesmo em outras eras atendem às
condições da infância e poderiam entrar na fórmula consagrada de atender
às crianças conforme seus interesses, por meio de suas atividades e de um
ambiente de liberdade. Nova seria, sobretudo, a amplidão do movimento e
sua roupagem moderna”.
(Grifo Nosso)
Vale ressaltar dois aspectos considerados por Castro em relação a
Escola Nova:
1. O sentido de NOVO, representado por idéias que fugissem do ensino
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Didática I
CAPÍTULO 3
enciclopédico, formal, independente do TEMPO em que essas idéias
surgissem.
2. O sentido desse movimento, apresentado como uma
tendência que valorizava a ação, a realização do estudante.
Mas vamos então tecer algumas considerações
em relação a dois representantes desse movimento: Freinet e
Dewey.
É consensual entre muitos educadores de que
Célestin Freinet
Célestin Freinet (1896 - 1966) é um dos grandes nomes da
educação do século XX. Nasceu na França e atuou como professor em comunidades
simples, populares, não negando sua origem.
Diferentemente de vários educadores de sua época e até seus
contemporâneos (Maria Montessori e Dewey, por exemplo), não possuía grandes
títulos universitários, mas isso não o impediu de propor e realizar inovações no plano
pedagógico apesar da vida conturbada, cheia de “interrupções” em função da
participação na Primeira e Segunda Guerras Mundiais.
Para Freinet, o que orienta a prática educativa é a atividade (do
aprendiz) e, nesse sentido, propunha a Pedagogia do Trabalho.
As técnicas propostas por Freinet vão atender à idéia de ativismo –
crianças agindo diretamente sobre o meio e funcionalidade do trabalho – as atividades
escolares precisam ter sentido, utilidade e função.
Para a aplicação das técnicas, Freinet considerava também o princípio
da livre expressão entre as crianças e a cooperação, esta última considerada como
grande legado desse educador para a pedagogia do século XX, gerando em 1927 a
criação da Cooperativa de Ensino Leigo (CEL); do Instituto Cooperativo de Escola
Moderna (ICEM), em 1951, e da Federação Internacional de Movimentos da Escola.
(FIMEM) em 1957.
Voltando às técnicas de Freinet, vale ressaltar que o objetivo não é a
utilização ortodoxa, mas a observação e reflexão do professor para as necessidades
de sua sala e das realidades vivenciadas nesse espaço.
Algumas técnicas propostas por Freinet:
Texto livre - elaborado pela criança, partindo de suas próprias idéias, sem
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Didática I
CAPÍTULO 3
tema e prazo pré-fixados.
Revista escolar - os textos livres e outros trabalhos elaborados pelas
crianças podem ser utilizados na revista. Toda organização do trabalho é realizado pelas
próprias crianças.
Aula-passeio - o objetivo desta prática era estimular o contato com o meio
e posteriormente a escrita do texto livre.
Correspondência interescolar - nessa prática, professores e alunos trocam
correspondências com outras classes, possibilitando a aprendizagem da vida cooperativa
e favorecendo a criação de vínculos.
Jornal-mural - como cita Sampaio (1994, p.206):
“nas classes Freinet, as paredes são vivas. (...) cada espaço é ocupado por
alguma coisa considerada importante pelos alunos e pelo professor e
permanecerá lá durante o tempo que for considerado necessário”.
Livro da vida – trata dos escritos, desenhos, fatos, dos acontecimentos
significativos para a turma. A proposta é a elaboração diária dos registros, ilustrações
etc. que acaba tornando-se um documento das “ações” da classe.
Além dessas técnicas temos:
za
imprensa na escola;
zo jornal escolar;
zo fichário escolar cooperativo;
zo estudo do meio;
za biblioteca;
zo fichário autocorretivo;
zos planos de trabalho;
zos cantos de atividades;
Todas as técnicas visam o contato da criança
com o conhecimento de forma a encontrar sentido no que se propõe e no que se faz, o
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Didática I
CAPÍTULO 3
desenvolvimento do senso cooperativo e a alegria de estar na escola.
Freinet, em determinado momento de sua vida, afirmou que “já não estamos
sós”.
Após Freinet, como educadores podemos dizer: “Já não estamos sós”.
Dewey (1859-1952), como outros educadores
já citados, faz parte da Pedagogia Renovada, também
conhecida como Escola Nova. Americano nascido em
Burlington, viveu em um período em que pôde acompanhar
várias mudanças no contexto mundial. Em função disso,
vislumbrava a realidade e os valores como mutáveis e que
deveriam estar a serviço das finalidades sociais.
Dewey estudou arte e filosofia e como alguns
intelectuais de sua época era adepto do pragmatismo.
Para essa corrente, a teoria só faz sentido se contribuir
John Dewey
para a solução de problemas reais do dia-a-dia. Como
afirma Haidt (2001, p.21), “o conhecimento e o ensino
devem estar intimamente relacionados à ação, à vida prática, à experiência. O saber
tem caráter instrumental: é um meio para ajudar o homem na sua existência, na sua
prática”.
Portanto, mais do que reproduzir conhecimento, o papel da escola, para
Dewey, consiste em colocar o estudante em contato com situações-problema reais
para que este busque as soluções, mas sempre de forma coletiva e cooperativa, pois
Dewey acreditava que esses elementos são essenciais para solidificar a vida social e,
portanto, a prática escolar.
Os pensamentos deweyanos repercutiram significativamente no campo
da didática com a proposta da escola-laboratório criada por Dewey e que propunha o
processo e aprendizagem através de cinco passos assim descritos por Ghiraldelli
(1996, p.29):
“(...) atividade, problema, coleta de dados, hipótese e experimentação. O
processo se inicia com o professor propondo trabalhos de diversas ordens
(atividade). As curiosidades diversas e questões oriundas desses trabalhos
são recolhidas pelo professor, que as coloca na forma de problemas teóricos
(problema). Para resolver tais problemas, estudantes e professor devem
recorrer à pesquisa (coleta de dados), procurando informações nas
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Didática I
CAPÍTULO 3
bibliotecas e outros meios disponíveis. Assim, estudantes e professor podem
conjecturar soluções para o problema (hipótese). Por fim, se for o caso, cabe
experimentar as hipóteses selecionadas (experimentação)”.
A proposta de Dewey é hoje reconhecida como reflexiva, que busca o
“aprender a aprender”.
No Brasil, suas idéias foram defendidas por Anísio Teixeira no Movimento
da Escola Nova.
REFERÊNCIAS
CASTRO, Amélia Domingues de. A trajetória histórica da didática. Idéias, São Paulo,
v. 11, p.15-25, 1992.
GHIRALDELLI Júnior, Paulo. O que é pedagogia. 3. ed. rev. e atual. São Paulo:
Brasiliense,1996. (Coleção Primeiros Passos; 193).
HAIDT, Regina Célia Cazaux. Curso de didática geral. 7. ed. São Paulo: Ática, 2001.
(Série Educação).
SAMPAIO, Rosa Maria Whitaker. Freinet: evolução histórica e atualidades. 2. ed. São
Paulo: Scipione, 1994. (Série Pensamento e ação no magistério)
ANOTAÇÕES
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CAPÍTULO 3
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ANOTAÇÕES
Didática I
O PENSAMENTO CONSTRUTIVO DE JEAN
PIAGET E O NOVO OLHAR PARA A
ALFABETIZAÇÃO DE EMÍLIA FERREIRO
CAPÍTULO 4
“... precisamos de alunos ativos, que aprendam a descobrir
por si mesmos, em parte através de sua própria atividade
espontânea, em parte através do material que organizamos
para eles.”
(Jean Piaget)
Podemos dizer que, depois de
Piaget (1896-1980), ou mesmo, durante o período
em que produziu conhecimento, o mundo da
educação jamais foi o mesmo.
Jean Piaget nasceu na Suíça, em
Neuchâtel, a 9 de agosto de 1986, no seio de uma
família rica e culta.
Considerado sempre uma criança
precoce, começa a interessar-se por “ciência” aos
7 anos de idade.
Jean Piaget
Dos 7 aos 10 anos inclina-se para o
estudo de moluscos pela sua abundância nos lagos suíços e também para o estudo de
pássaros, conchas marinhas e mecânica. Aos 10 anos, realiza sua primeira publicação
sobre um pardal parcialmente albino que observara em um parque público.
Aos 11 anos, Piaget trabalha como assistente do diretor do Museu de
História Natural de sua cidade, já havia publicado 25 trabalhos, influenciado por seu
mestre do qual era assistente no museu.
Licenciou-se em 1915 (19 anos) e concluiu seu doutorado em 1918 (22
anos) com uma tese que versava sobre moluscos de Valais. Sua produção chega a 70
livros e 300 artigos sobre psicologia, pedagogia e filosofia.
Após finalizar seus estudos, Piaget passou a investigar
como a inteligência humana se desenvolve e pensou que se
estudasse com profundidade como “as crianças constroem as
noções fundamentais de conhecimento lógico – tais como as de
tempo, espaço, objeto, causalidade etc. – poderia compreender a
gênese e a evolução do conhecimento humano” (Davis e Oliveira,
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Didática I
CAPÍTULO 4
1994, p.37).
Piaget pesquisou utilizando observação direta, sistemática e cuidadosa
de crianças, incluindo seus próprios filhos, Jacqueline, Laurent e Lucienne e, chegou a
uma teoria que revolucionou a compreensão do desenvolvimento intelectual.
Vale ressaltar que, a princípio, o que chamou a atenção de Piaget foram os
erros cometidos pelas crianças.
Azenha (1999, p.9) observa que “o que o fascinava era a compreensão da
lógica subjacente ao erro e à interpretação do percurso intelectual da criança em relação
ao seu desenvolvimento cognitivo global”.
Através de seus estudos, Piaget busca explicar – como já afirmamos– o
desenvolvimento mental do ser humano e percebeu que:
“a criança possui lógica e funcionamento mental que
difere – qualitativamente – da lógica do funcionamento
mental do adulto. Propôs-se conseqüentemente a
investigar como, através de quais mecanismos, a lógica
infantil se transforma em lógica adulta. Nessa
investigação, Piaget partiu de uma concepção de
desenvolvimento envolvendo um processo contínuo de
trocas entre o organismo vivo e o meio ambiente” (Davis
e Oliveira , 1994, p.37).
COMPREENDENDO COMO A INTELIGÊNCIA SE DESENVOLVE
Algumas noções como equilíbrio, organização,
adaptação, dentre outros, são imprescindíveis para a
compreensão da teoria piagetiana.
Piaget considerava que todo ser vivo busca
manter um estado de equilíbrio ou adaptação com o meio
em que vive. Se porventura há o rompimento com esse
estado, o organismo age e tenta obter um novo estado de
equilíbrio.
Para o pesquisador, o encontro desse novo
DIDI
20
Didática I
CAPÍTULO 4
estado se dá através de dois mecanismos fundamentais: adaptação e organização.
A adaptação apresenta outros dois mecanismos que estão
continuamente interligados, embora se coloquem como
processos opostos: a assimilação e a acomodação.
Na ASSIMILAÇÃO, o indivíduo usa as
estruturas psíquicas que já possui.
Se elas não são suficientes, é preciso
construir novas estruturas. Isso é a ACOMODAÇÃO.
Piaget diz que:
“na assimilação e na acomodação se pode
reconhecer a correspondência prática daquilo que
serão mais tarde a dedução e a experiência: a atividade da mente e a pressão
da realidade”. Já a ORGANIZAÇÃO articula esses processos com as
estruturas existentes e reorganiza todo o conjunto. Assim, o indivíduo constrói
e reconstrói continuamente as estruturas que o tornam cada vez mais apto
ao equilíbrio.”
(Lopes, 1996, p.12)
Essas construções e reconstruções que acontecerão em um processo
contínuo serão caracterizadas por períodos ou estágios de desenvolvimento.
DIDI
21
Didática I
CAPÍTULO 4
Vejamos esses quatro estágios no quadro resumo a seguir:
FONTE: Adaptado de B. Eadsworth, Piaget’s Theory of Cognitive Development (Nova york:
David McKay, 1971)
DIDI
22
Didática I
CAPÍTULO 4
Piaget foi um grande defensor da Escola Ativa e dizia que “o mundo deve
ser reinventado pela criança”.
Não era favorável ao empirismo e nem ao inatismo para a concepção de
um modelo explicativo para o desenvolvimento cognitivo, mas, sim o CONSTRUTIVISMO
como proposta para o estudo e desenvolvimento da gênese do conhecimento.
No Brasil, passamos a ter contato com as obras de Piaget a partir de 1936,
mas foi na década de 80 que suas idéias passaram a ser alvo de estudo e discussão.
Também no início da década de 80 morre em Genebra esse grande
estudioso, no dia 16 de setembro.
EMÍLIA FERREIRO
Talvez possamos ousar em afirmar que não há professor alfabetizador
brasileiro, na atualidade, que não tenha ouvido falar de Emília Ferreiro.
Seu nome e pensamento começaram a ser “ouvidos” e divulgados no
Brasil a partir da década de 80, quando os educadores tiveram acesso a seu primeiro
livro escrito em parceria com Ana Teberosky, traduzido em nosso país: Psicogênese
da língua escrita.
A obra trazia uma mudança de
paradigma, pois concebia a alfabetização de modo
singular, como até então não se enxergara.
Emília Ferreiro, psicolingüista
argentina, foi aluna e colaboradora de Piaget em
suas pesquisas. Estudou na Universidade de
Genebra e concluiu seu doutorado orientado pelo
mestre aqui citado. Inicialmente, trabalhou em
parceria com Ana Teberosky em seu país de origem,
realizando pesquisas empíricas. Como considera
Azenha (1999, p.35):
Emília Ferreiro
“(...) do ponto de vista teórico, as pesquisas de Ferreiro & Teberosky trazem
uma contribuição original. Tomam como objeto de estudo um conteúdo ao
qual Piaget não se dedicava – resgatam os pressupostos epistemológicos
DIDI
23
Didática I
CAPÍTULO 4
centrais de sua teoria, para aplicá-los à análise do aprendizado da língua
escrita. Na contramão de outros estudos teóricos, o objetivo de suas
investigações não é a prescrição de novos métodos para o ensino da leitura
e da escrita. (...)
Ao contrário desta tendência, as investigações de Ferreiro articulam-se para
demonstrar a existência de mecanismos do sujeito do conhecimento (sujeito
epistêmico), que, na interação com a linguagem escrita (objeto de
conhecimento), explicam a emergência de formas idiossincráticas de
compreender o objeto.”
Ou seja, Ferreiro queria demonstrar que a lógica da criança para se
apropriar da língua escrita enquanto sistema de representação não é a mesma lógica
do adulto. A criança transita por fases e essas demonstrarão os esquemas de
assimilação e acomodação já demonstrados por Piaget.
De modo sintético, podemos apresentar quatro fases principais, mas
existem as fases intermediárias que também são significativas para o
desenvolvimento e evolução da criança. São elas:
Pré-silábica: não faz a associação das letras (registro escrito) aos sons da
fala;
Silábica: inicia-se, pela criança, a tentativa de relacionar os sons da
linguagem com o registro escrito. De acordo com Azenha (1999, p.72), “o fato crucial
que evidencia a sua utilização pela criança é atribuição de
um valor silábico a cada marca produzida como parte de uma
totalidade registrada”;
Silábico-alfabética: é um momento de transição
em que a criança utiliza a fase anterior mas tenta aproximar-se
da escrita alfabética, acrescentando letras;
Alfabética: nessa fase a criança já superou os
obstáculos conceituais para o entendimento da escrita e
escreve utilizando as letras adequadas a seus valores sonoros.
Emília Ferreiro mora atualmente no México e trabalha como professora
titular do Centro de Investigação e Estudos Avançados do Instituto Politécnico Nacional.
Já esteve várias vezes no Brasil para falar aos educadores brasileiros.
O que podemos ressaltar é que, em todo trabalho realizado por Ferreiro,
DIDI
24
Didática I
CAPÍTULO 4
percebe-se um forte comprometimento com o contexto social e educacional da América
Latina.
Suas pesquisas vieram mostrar que todas as crianças são capazes de
aprender e que necessitamos acabar com a retenção e buscar compreender como nossas
crianças aprendem. O foco precisa estar na aprendizagem.
REFERÊNCIAS
AZENHA, Maria da Graça. Construtivismo: de Piaget a Emília Ferreiro. 7. ed. São
Paulo: Ática, 1999. (Série Princípios)
DAVIS, Claudia e OLIVEIRA, Zilma de. Psicologia na educação. 2. ed. São Paulo:
Cortez, 1994.
LOPES, Josiane. Piaget: a lógica própria da criança como base do ensino. Nova
Escola, São Paulo, p.9-15, agosto, 1996.
ANOTAÇÕES
DIDI
25
Didática I
CAPÍTULO 4
DIDI
26
ANOTAÇÕES
Didática I
VYGOTSKY, PAULO FREIRE E A
CONSIDERAÇÃO DO CONTEXTO SÓCIOHISTÓRICO NO PROCESSO DE APRENDIZADO
CAPÍTULO 5
“Na ausência do outro, o homem não se constrói homem.”
(Lev S. Vygotsky)
Escrever sobre Vygotsky (1896-1934) é
recuperar a trajetória de um estudioso brilhante que,
embora tenha vivido pouco (morre de tuberculose aos 37
anos), deixou uma vasta obra que só tornou-se acessível
ao mundo ocidental, aproximadamente na década de 60 e
no Brasil, em final da década de 70 através de
pesquisadores que estudaram no exterior.
Até em seu próprio país, Rússia, suas obras
ficam proibidas no período de 1936 a 1956 por questões
políticas.
Piaget lamentou que os dois não tivessem
Lev S. Vygotsky
se encontrado para dialogar sobre seus estudos e
convicções.
No início do século XX, período em que Vygotsky com mais alguns jovens
intelectuais (Luria e Leontiev) começam a trabalhar, buscando construir um novo
conceito de Psicologia, os dois tipos de abordagens psicológicas existentes eram:
1. Psicologia como ciência natural – “procurava explicar processos
elementares sensoriais e reflexos, tomando o homem basicamente como
corpo. Essa tendência relaciona-se com a psicologia experimental, (...)”
preocupando-se com a quantificação de fenômenos observáveis”.
(Oliveira, 1995, p.22)
2. Psicologia como ciência mental – “descrevia as propriedades dos
processos psicológicos superiores, tomando o homem como mente,
consciência, espírito”. (Oliveira, 1995, p.22-23)
Essas duas abordagens, para Vygotsky, com seus postulados, não eram
suficientes para compreender os processos psicológicos superiores (percepção,
atenção, memória, capacidade para solucionar problemas).
DIDI
27
Didática I
CAPÍTULO 5
Dessa forma, busca-se uma nova abordagem para a psicologia, apoiada
em três idéias básicas para o pensamento vygotskyano, de acordo com Oliveira
(1995, p. 23-24).
As funções psicológicas têm um suporte biológico pois são produtos da
atividade cerebral (o cérebro não é um sistema de funções fixas e imutáveis, mas um
sistema aberto, de grande plasticidade, cuja estrutura e modos de funcionamento são
moldados ao longo da história da espécie e do desenvolvimento individual. Dadas as
imensas possibilidades de realização humana, essa plasticidade é
essencial: o cérebro pode servir a novas funções, criadas na história do homem, sem
que sejam necessárias transformações no órgão físico).
O funcionamento psicológico fundamenta-se nas relações sociais entre o
indivíduo e o mundo exterior, as quais desenvolvem-se num processo histórico (o
homem transforma-se de biológico em sócio-histórico, num processo em que a cultura
é parte essencial da constituição da natureza humana. Não podemos pensar o
desenvolvimento psicológico como um processo abstrato, descontextualizado,
universal: o funcionamento psicológico, particularmente no que se refere às funções
psicológicas superiores, tipicamente humanas, está baseado fortemente nos modos
culturalmente construídos de ordenar o real).
A relação homem/mundo é uma relação mediada por sistemas
simbólicos (a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas uma
relação mediada, sendo os sistemas simbólicos os elementos intermediários entre o
sujeito e o mundo).
Mas como essas considerações podem
contribuir na educação?
Segundo o estudioso, é no convívio com outros
seres humanos e no contato com a cultura que desenvolvemos
as funções psicológicas superiores, que se constituem como
características essencialmente humanas.
O desenvolvimento ou evolução do ser humano
vai acontecendo pela organização das informações recebidas
do meio em que vive, e, como considera Claudia Davis (apud
Lopes, 1996, p.34), “as informações nunca são absorvidas
diretamente do meio. São sempre intermediadas, explícita ou
implicitamente, pelas pessoas que rodeiam a criança,
carregando significados sociais e históricos”.
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28
Didática I
CAPÍTULO 5
Confirmando as considerações de Davis, Oliveira diz que “todas as
funções no desenvolvimento da criança apareceram duas vezes: primeiro, no nível
social, e , depois, no nível individual; primeiro entre as pessoas (interpsicológica), e,
depois, no interior da criança (intrapsicológica)” (1995, p.38-39).
Para explicar a evolução intelectual, Vygotsky utiliza-se de três conceitos
desenvolvidos por ele, de acordo com o que segue no quadro explicativo:
Essas idéias desenvolvidas por Vygotsky e muitas outras acabaram por
influenciar o entendimento do processo educativo, do papel do professor, como o aluno
aprende, etc.
As idéias de Vygotsky, com certeza, na atualidade, fazem parte do
ideário pedagógico e muitos estudiosos brasileiros têm se dedicado a estudar e
escrever sobre esse brilhante pesquisador.
DIDI
29
Didática I
CAPÍTULO 5
PAULO FREIRE
Com certeza, Paulo Régulos Neves
Freire - o nosso Paulo Freire - é o mais conhecido e
renomado educador brasileiro. Nascido em 1921 e
falecido em 1997, viveu momentos de calmaria e
também de conflitos em relação a situação política no
Brasil, a ponto de viver exilado de 1964 (Golpe Militar)
até1980 quando volta para nosso país.
Paulo Freire ficou conhecido por suas
idéias em defesa do “oprimido”, do excluído e por sua
proposta de alfabetização colocada em prática no início
da década de 60.
Paulo Freire
Em seu último livro - Pedagogia da
autonomia – finalizado entre 1996-1997, o autor admite
que “mudar é difícil, mas é possível” e de certa forma, retoma suas certezas e
incertezas quanto ao caminho que a educação deve trilhar. Falemos um pouco sobre
essa obra.
Como o título bem coloca, o livro busca refletir sobre a formação docente
e os saberes necessários a uma prática educativa transformadora, progressista, em
favor da autonomia de educandos e educandas, educadores e educadoras. E para
atingir essa educação transformadora, Paulo Freire propõe uma pedagogia fundada
na ética e no respeito à dignidade destes educandos.
E como seria essa pedagogia? O que ela prioriza?
Prioriza o ser humano e seu crescimento histórico, social e político; a construção da
cidadania através do diálogo crítico; enfatiza a urgência de professoras e professores
“progressistas” em assumirem a dignidade da profissão e lutarem por seus direitos,
repensando a eficácia das greves e reinventando “a forma (...)
histórica de lutar” (p.76), o que significa, na prática, atuação no
sindicato, clareza política e a não aceitação pela condição de
“objetos”, mas sim “sujeitos”, protagonistas de suas vidas.
Ressalta também a importância da coerência entre
o discurso e a ação, entre o saber-ser e o saber-fazer
pedagógicos. É a rejeição do velho ditado: “faça o que eu mando,
mas não faça o que eu faço”. Enquanto educadores/educadoras
não apenas se importarem em ensinar os conteúdos, mas
também ensinarem a “pensar certo” e “quem pensa certo está
DIDI
30
Didática I
CAPÍTULO 5
cansado de saber que as palavras a que falta a corporeidade do exemplo pouco ou
quase nada valem. Pensar certo é fazer certo” (p.38).
Enfim, pensar certo tem a ver com a atitude de disponibilidade ao risco;
aceitação do novo e também do velho que preserva sua
validade, sua tradição; rejeição a qualquer forma de
discriminação; disposição a favor da justiça, da liberdade,
do direito de expressão e de respeito mútuo entre
educadores e educandos. Além disso, essa pedagogia
salienta e reforça o investimento nos processos de
formação científica e permanente, momento propício e
fundamental para reflexão sobre a prática, para a
superação constante da curiosidade ingênua (senso comum) em direção à
“curiosidade epistemológica” através da pesquisa, pois, para Paulo Freire, não há
ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino.
Tudo isso, sem esquecer-se da afetividade, do bem querer aos
educandos que torna o ato de educar alegre, significando “disponibilidade à alegria de
viver” (p.160), lembrando também do cumprimento ético da prática docente, do
exercício da autoridade (e não do autoritarismo), importantes para a composição do
espaço pedagógico.
Trata-se, sem dúvida, de um livro relevante para o ideário pedagógico,
principalmente para os educadores e educadoras que vislumbram nas idéias
progressistas a pedagogia das possibilidades, o caminho para uma ação docente que
considere a dimensão social, política e histórica da formação humana e contrária a
qualquer prática de desumanização e exclusão.
REFERÊNCIAS
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.
17.ed. São Paulo: Paz e Terra, 2001. 165p. (Coleção leitura).
LOPES, Josiane. Vygotsky: o teórico social da inteligência. Nova escola, São Paulo,
nº 99, p.33-38, dez. 1996.
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Didática I
CAPÍTULO 5
OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento – um processo
sócio-histórico. 3. ed. São Paulo: Scipione, 1995. (Coleção Mestres da Educação).
VYGOTSKY, Lev Semyonovich. A formação social da mente: o desenvolvimento dos
processos psicológicos superiores. Tradução José Cipolha Neto, Luís Silveira Menna
Barreto, Solange Castro Afeche. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
ANOTAÇÕES
DIDI
32
Didática I
PHILIPPE PERRENOUD: PENSANDO A
EDUCAÇÃO NA ATUALIDADE
CAPÍTULO 6
“O aluno acumula saberes, passa nos exames, mas não
consegue usar o que aprendeu em situações reais”
(P. Perrenoud)
Philippe Perrenoud nasceu na Suíça em 1944. Doutor em Sociologia e
Antropologia, leciona nas Faculdades de Psicologia e Ciências da Educação da
Universidade de Genebra nas áreas de Currículo, Práticas Pedagógicas e Instituições
de Formação, além de participar de Congressos e Seminários de Educação,
conversando com educadores pelo mundo todo.
No Brasil, Perrenoud tornou-se um nome
respeitado por trazer à tona, em seus livros, reflexões
sobre “profissionalização de professores”, avaliação
escolar, educação por competências, chegando até a
influenciar com suas idéias na elaboração de documentos
oficiais como a construção dos PCNs (Parâmetros
Curriculares Nacionais) e na organização do sistema
escolar por ciclos, como o caso da Progressão Continuada.
Várias obras do autor já foram traduzidas para o português. Dentre elas:
z Pedagogia
Diferenciada
z Construir as competências desde a escola
z Dez novas competências para ensinar
z Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens
zEnsinar: agir na urgência, decidir na incerteza. Saberes e competências
em uma profissão complexa
zOs ciclos de aprendizagem: um caminho para combater o fracasso
escolar
Algumas idéias de Perrenoud:
Saber
Perrenoud considera que, na atualidade, buscar o “saber pelo saber”
DIDI
33
Didática I
CAPÍTULO 6
distancia o aluno da realidade vivente. Por isso, o interessante seria desenvolver
saberes como “ferramentas para compreender o mundo e agir sobre ele”.
Nesse sentido, o autor propõe a base do conhecimento no
desenvolvimento de COMPETÊNCIAS.
Competência
Para Perrenoud, “... é a faculdade de mobilizar um conjunto de recursos
cognitivos (saberes, capacidades, informações, etc.) para solucionar uma série de
situações”, e exemplifica: “localizar-se numa cidade desconhecida mobiliza as
capacidades de ler um mapa, pedir informações”.
Muitas outras idéias são desenvolvidas por Perrenoud, mas poderíamos
dizer que, em relação à formação e profissionalização de professores, deixa-nos a
mensagem de que ser educador é compreender a necessidade de investimento,
organização, planejamento, conhecimento do seu “ofício” e que tudo isso nunca está
acabado. É um processo contínuo de busca e formação.
Como diz o próprio autor, “sempre que o aluno não aprende em sala de
aula temos matéria para refletir”.
E POR FIM
Através desses capítulos iniciais, falamos sobre o significado da didática
enquanto área que contribui para a reflexão sobre o processo ensino-aprendizagem,
buscando, para tal, o apoio de teorias de ensino, de propostas pedagógicas que
trazem a possibilidade de pensar sobre a escola, sua
função, seu sentido.
Para isso, recuperamos de forma breve
alguns percursos da didática e selecionamos alguns
nomes que auxiliaram e ainda nos auxiliam a
compreender e a fazer educação.
Alguns de nossos selecionados, não
desmerecendo a obra e o trabalho de outros aqui não
mencionados, tornaram-se clássicos em função da projeção universal e das idéias que
DIDI
34
Didática I
CAPÍTULO 6
marcaram o processo educativo em vários tempos e espaços.
Sebarroja (2003, p.10) refere-se a alguns de nossos autores como:
“(...) pessoas aventureiras e carismáticas, têm caráter e
autoridade,convicções profundas e esperançosas no futuro da humanidade,
com o qual estão fortemente comprometidas, sempre com um pé no ensino
e outro na sociedade. São capazes de manter a tensão intelectual e
emocional necessária para converter dificuldades em possibilidades, como
diz Freire, e concretizar, com muito empenho e convicção, pequenas e
grandes utopias”.
Portanto, tomar contato com as propostas desses pesquisadores/
educadores é sempre motivo para aprender, para encontrar respostas, mas também
levantar questionamentos.
Comênio, Herbart, Rousseau, Freinet, Dewey, Piaget, Vygotsky, Paulo
Freire, Emília Ferreiro, Philippe Perrenoud, todos, de certo modo, trazem marcas
singulares expostas através de seus pensamentos, mas também trazem em suas
respectivas épocas históricas, o desejo de MUDANÇA nas formas de aprender, de
ensinar, na formação e função do educador, na maneira
de conceber a escola e a educação, confirmando Jaume
Carbonell ao dizer que “as novas idéias surgem sempre
a partir de reelaborações de idéias anteriores”.
A maioria defende a democratização do
ensino, contrapõe-se aos princípios da escola
tradicional; alguns propõem novos métodos, reivindicam
o “fazer” do educando e sugerem um educador que seja orientador, mediador,
companheiro, ético, também aprendiz e preocupado com sua própria formação.
Como disse Maria Montessori, “toda proposta educativa deixa de ser
válida se permanece tal e qual for apresentada nos seus primórdios”.
Desse modo, que possamos, por meio do contato e conhecimento das
idéias e obras desses educadores/pesquisadores, escrever o “nosso capítulo” na
trajetória da didática e da educação, buscando sempre uma prática educativa de
qualidade.
DIDI
35
Didática I
CAPÍTULO 6
REFERÊNCIAS
MARAGON, Cristiane e LIMA, Eduardo. Os novos pensadores da educação. Nova
Escola, São Paulo, p.19-25, agosto, 2002.
SEBARROJA, Jaume Carbonell (org.) Pedagogias do século XX. Trad. Fátima Murad.
Porto Alegre: Artmed, 2003.
ANOTAÇÕES
DIDI
36
Didática I
ORGANIZANDO A PRÁTICA EDUCATIVA: A
IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO
CAPÍTULO 7
“Ela está no horizonte
me aproximo dois passos
ela afasta dois passos
caminho dez passos
e o horizonte corre dez passos
por mais que caminhe
jamais alcançarei
Para que serve a utopia?
Serve para isso
para caminhar.”
(Eduardo Galeano)
Nos próximos capítulos estaremos conversando sobre como organizar a
prática educativa, sem nos esquecermos das dimensões do processo ensinoaprendizagem considerados pela Didática: humana, político-social e técnica.
Organizar a prática educativa significa projetar, sonhar, planejar o que se
deseja, da mesma forma como planejamos e investimos em nossos “projetos
pessoais”.
A grande maioria dos seres humanos não vive sem fazer planos.
Libâneo considera que, no processo educativo, “o planejamento é uma
atividade de reflexão acerca das nossas opções e ações; se não pensarmos
detidamente sobre o rumo que devemos dar ao nosso trabalho, ficaremos entregues
aos rumos estabelecidos pelos interesses dominantes na sociedade” (1994, p. 222).
E acrescenta:
“A ação de planejar, portanto, não se reduz ao simples
preenchimento de formulários para controle administrativo;
é, antes, a atividade consciente de previsão das ações
docentes, fundamentadas em opções políticopedagógicas, e tendo como referência permanente as
situações didáticas concretas (isto é, a problemática social,
econômica, política e cultural que envolve a escola, os
professores, os alunos, os pais, a comunidade, que
DIDI
37
Didática I
CAPÍTULO 7
integram no processo de ensino)” (Ibid).
A formação do ser humano para viver no século XXI não é a
mesma que a requerida em tempo anteriores.
No mundo contemporâneo, temos buscado superar alguns
modelos educacionais, dando ênfase a uma sociedade democrática, que
se fundamente no diálogo constante e na ética para firmar as relações
humanas.
Em relação ao conhecimento, superar a fragmentação dos saberes,
buscando concebê-los de maneira interdisciplinar.
Os conteúdos passam a ser desenvolvidos, visando não apenas os
aspectos cognitivos (saber), mas procedimentos (saber fazer) e atitudes (saber ser),
para atender a uma formação integral. Se coloca também como instrumento para o
desenvolvimento de competências (como vimos no capítulo sobre Perrenoud) e
habilidades.
Há que se pensar também na organização do
tempo, do espaço, das metodologias, dos recursos, da
avaliação ... enfim, tudo visando uma formação humana
voltada para as necessidades do nosso mundo.
A escola que planeja suas ações e busca
concretizá-las, rompe com a prática do planejamento como
momento burocrático, esvaziado de sentido,
Ao contrário, caminha para alcançar uma utopia possível.
Por isso o planejamento é importante: para levantarmos muitos
questionamentos sobre como desejamos nossa escola e como pensamos “fazer”
educação.
REFERÊNCIA
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. 6. ed. São Paulo: Cortez, 1994.
DIDI
38
Didática I
OS OBJETIVOS EDUCACIONAIS
CAPÍTULO 8
“Por acaso, o papel da escola deve ser seletivo e
propedêutico? Ou deve cumprir outras funções? Não há
dúvida de que esta é a primeira pergunta que temos que
nos colocar. Quais são nossas intenções educacionais? O
que pretendemos que os alunos consigam?”
(Antoni Zabala)
Vimos no capítulo anterior que o planejamento se reveste de importância
porque é o momento de pensar o ser humano que se deseja formar.
Para isso, temos algumas etapas que auxiliarão a organizar a prática
educativa. Uma dessas etapas trata da definição de objetivos.
Ao buscarmos estabelecer os objetivos, estamos nos perguntando: para
que e por que ensinar? Quais resultados alcançar? E ao propô-los, estamos
explicitando metas, finalidades, rumos da ação docente e discente.
Como diz Masetto (1996, p. 88):
“O estabelecimento de objetivos orienta o professor para selecionar o
conteúdo, escolher as estratégias de ensino e elaborar o processo de
avaliação. Orienta também o aluno, que fica sabendo o que se espera dele
nesse curso, disciplina, série ou aula”.
Nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) os objetivos estão
expressos como capacidades a serem trabalhadas ao longo do processo de
escolarização. São elas: capacidades de ordem cognitiva, capacidade física, afetiva,
de relação interpessoal, capacidade estética, ética e de inserção social.
Se observarmos, tais capacidades visam a formação integral dos
educandos, pois não se preocupa apenas com o desenvolvimento cognitivo que, de
uma certa forma, foi a grande preocupação de alguns
modelos educacionais em voga.
Além disso, os PCNs consideram que é
primordial estabelecer os objetivos como capacidades
para que possam manifestar-se numa diversidade de
comportamentos (desejados).
Ao redigir um objetivo, seja ele mais
DIDI
39
Didática I
CAPÍTULO 8
amplo (geral) ou específico, o professor expõe em uma frase afirmativa o que se
espera atingir com todos os alunos ou o que se espera que sejam capazes, ao finalizar
um determinado estudo, projeto, curso ou ciclo.
Por exemplo:
zNo
trabalho com alunos das séries iniciais em relação à
construção do conceito de tempo:
- confeccionar relógios de Sol, ampulhetas, relógios de
água (clepsidra). (PCNs, vol. 5, 1997, p. 88).
zNo trabalho com os alunos sobre unidades de medida:
- saber aplicar adequadamente as medidas de
comprimento, massa, volume etc, em várias situações
sociais reais (Libâneo, 1994, p. 236).
Vale ressaltar a estreita relação dos objetivos com outra etapa do
processo: a avaliação, pois é através desta que o professor terá condições de refletir
sobre o sucesso da aprendizagem e se os alunos conseguiram atingir as metas
estabelecidas e, a partir dessa reflexão, tomar as decisões necessárias: prosseguir
com a caminhada ou retomar os objetivos não alcançados.
REFERÊNCIAS
BRASIL – Secretaria de Educação Fundamemtal. Parâmetros Curriculares Nacionais:
introdução. Brasília: MEC/SEF, 1997.
MASETTO, Marcos. Didática: a aula como centro. 3. ed. São Paulo: FTD, 1996
DIDI
40
Didática I
OS CONTEÚDOS DE APRENDIZAGEM
CAPÍTULO 9
“Viver é muito perigoso.
Porque ainda não se sabe.
Porque aprender a viver
é que é viver, mesmo.”
(Guimarães Rosa)
Neste capítulo, continuaremos a apresentar as etapas que auxiliam a
organizar a prática educativa e trataremos dos conteúdos.
Mas, o que vem a ser conteúdo?
Para responder a essa questão,
precisaremos atentar que a concepção de conteúdo foi se
modificando na trajetória da educação e também na
Didática.
Se perguntássemos para um aluno, talvez
este dissesse que conteúdo é a matéria que o professor
transmite em suas aulas.
Para nós, é muito mais que isso. Conteúdo
tem a ver com conhecimento, com saber, mas não apenas
um saber erudito, conceitual ou propedêutico, como diria Zabala.
Historicamente, o sentido de conteúdo ampliou-se e, na atualidade,
procuramos compreendê-lo como tudo que é possível conhecer.
Zabala o define como:
“(...) tudo quanto se tem que aprender para alcançar determinados objetivos
que não apenas abrangem as capacidades cognitivas, como também
incluem as demais capacidades. Deste modo, os conteúdos de
aprendizagem não se reduzem unicamente às contribuições das disciplinas
ou matérias tradicionais. Portanto, também serão conteúdos de
aprendizagem todos aqueles que possibilitem o desenvolvimento das
capacidades motoras, afetivas, de relação interpessoal e de inserção social.”
(1998, p. 30)
DIDI
41
Didática I
CAPÍTULO 9
Podemos acrescentar a essa definição o pensamento de Libâneo (1994,
p. 129) que observa:
“(...) os conteúdos retratam a experiência social da humanidade no que se
refere a conhecimentos e modos de ação, transformando-se em instrumentos
pelos quais os alunos assimilam, compreendem e enfrentam as exigências
teóricas e práticas da vida social (...)”.
Portanto, ao tratar dos conteúdos, estamos nos preocupando com o
saber (factuais/conceituais), com saber fazer (procedimentais) e com o ser
(atitudinais).
Ao propormos essa tipologia para os conteúdos, estamos considerando
a formação escolar de modo mais integral, incorporando não apenas os conteúdos
formais com os quais a escola trabalhava e valorizava anteriormente, mas também
conteúdos que valorizem as experiências pessoais, sociais, éticas, estéticas, motoras,
etc. de todos os educandos.
Vale ressaltar que essa divisão se dá para fins didáticos a nós
educadores, pois no exercício da prática educativa eles
acontecem integrados, sem fragmentações.
Zabala propõe que para os alunos das
séries iniciais priorize-se os conteúdos procedimentais
e atitudinais que valorizam o “fazer” do aluno, suas
vivencias e experiências e, conforme aconteça a
evolução do processo escolar, se incremente os
conteúdos conceituais, pois o aluno terá um maior
repertório para elaborar sua idéias e representações.
Zabala também considera que:
“(...) a tipologia de conteúdos pode nos servir de instrumento para definir as
diferentes posições sobre o papel que deve ter o ensino. Portanto, num
ensino que propõe a formação integral a presença dos diferentes tipos de
conteúdos estará equilibrada; por outro lado, um ensino que defende a função
propedêutica universitária priorizará os conceituais.”
(1998, p. 33)
DIDI
42
Didática I
CAPÍTULO 9
Finalizando, é importante esclarecer que a proposta desta tipologia está
em sintonia com o reconhecimento de um mundo em constate mudança e a
valorização de uma educação permanente que se faz ao longo da vida e com os
quatro pilares da educação (aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a viver
juntos, aprender a viver com os outros e aprender a ser) sugeridos no “Relatório para a
UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI”, organizado
por Jacques Delors e colaboradores.
REFERÊNCIAS
DELORS, Jacques. (org). Educação: um tesouro a descobrir. 5. ed. São Paulo: Cortez;
Brasília, DF: MEC; UNESCO, 2001. (CAPÍTULO IV)
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. 6. ed. São Paulo: Cortez, 1994.
ZABALA, Antoni. A prática educativa: como ensinar. Trad. Ernani F. da F. Rosa. Porto
Alegre: Artmed, 1998.
ANOTAÇÕES
DIDI
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Didática I
CAPÍTULO 9
DIDI
44
ANOTAÇÕES
Didática I
COMPETÊNCIAS E HABILIDADES
CAPÍTULO 10
“O homem só é feliz se puder desenvolver e utilizar todas
suas capacidades e habilidades”
(Jostein Gaarder – Inspirado em Aristóteles)
“Saber e não fazer ainda não é saber”
(Provérbio Zen)
Temos considerado através dos capítulos que a prática educativa não é
neutra e que ao fazermos algumas opções, estamos apostando em um tipo de
formação que acreditamos ser a mais adequada e também escolhendo as bases
teóricas que darão o alicerce para essa formação.
Trabalhar desenvolvendo competências e habilidades requer uma nova
visão de formação do professor e uma nova relação deste com os seus alunos, com o
conhecimento, com as metodologias propostas e com a avaliação.
Logo, propostas em que o professor é visto
como figura central do processo ensino-aprendizagem,
considerado como o detentor do saber e o conteudismo
precisam ser superados, pois já não formam para as
urgências do contexto atual e, conseqüentemente do
aluno que aí vive.
Para alguns teóricos, estamos vivendo na
Era da Comunicação e o “instrumento” necessário para
usufruir esse momento é o conhecimento.
Mas, o que vem a ser um trabalho voltado para o desenvolvimento de
competências e habilidades?
Parafraseando Vasco Moretto, as competências se organizam num
conjunto de conhecimentos que nos habilita a enfrentar e solucionar situaçõesproblemas vivenciadas.
Já as habilidades demandam colocar em prática as competências já
adquiridas. Ambas (competências e habilidades) dependem da ação do sujeito e se
desenvolvem no trabalho com os conteúdos (saber, saber fazer, saber conviver e saber
ser).
Vejamos alguns exemplos:
Ler é uma competência.
DIDI
45
Didática I
CAPÍTULO 10
Saber ler em voz alta é uma habilidade.
“Decidir seu caminho em uma cidade
desconhecida requer as capacidades de ler um mapa,
localizar-se e pedir informações. E também diversos
saberes, como ter noção de escala, elementos da
topografia ou referências geográficas”. (Perrenoud apud
Gentile e Bencini, 2000, p. 13)
Como destacamos na epígrafe do capítulo
6, Perrenoud afirma que o aluno acumula conhecimentos,
é aprovado nas provas e exames, mas não consegue utilizar o que aprendeu nas
situações reais do dia-a-dia.
Precisamos, portanto, reverter essa situação, considerando o professor
como mediador, orientador do processo de construção do conhecimento pelo aluno e
organizador de situações de aprendizagem.
O aluno, por sua vez, seja visto como um eterno aprendiz situado em um
contexto e que, ao invés de memorizar regras, fórmulas, conceitos, possa exercitar
habilidades para conquistar competências.
Os conteúdos não serão descartados, ao contrário, servirão de
instrumento para o desenvolvimento das habilidades e competências.
Como ressalta Kátia S. Smole (apud Gentile e Bencini, 2000, p. 14), “o
conhecimento deve ser visto como uma rede de relações na qual o educador ajuda os
jovens a fazer as conexões necessárias”.
Finalizando, vale lembrar o que diz Moretto1 , “a palavra de comando é
educar para as competências, através da contextualização e da interdisciplinaridade.
É preciso dar significado ao que se fala em sala de aula; sem isso não há âncora para
a aprendizagem”.
REFERÊNCIA
GENTILE, Paola e BENCINI, Roberta. Para aprender (e desenvolver) competências.
Nova Escola, São Paulo, p. 12-14, set. 2000.
1
Nota 10 - Jornal Mensal sobre Educação – Ano I – nº 4 ago/99
DIDI
46
Didática I
OS RECURSOS DIDÁTICOS E A IMPORTÂNCIA
DA DIVERSIDADE
CAPÍTULO 11
“A tarefa do professor é mostrar a fruta. Comê-la diante
dos olhos dos alunos. Provocar a fome. Fazê-los babar de
desejo, querendo saber. Acordar a inteligência adormecida.
Aí a cabeça fica grávida: engorda com idéias. E quando a
cabeça engravida, não há nada que segure o resto do corpo.”
(Adaptado de um texto de Rubem Alves)
Os recursos didáticos são importantes para auxiliar professores e alunos
a encaminharem o processo ensino-aprendizagem.
Se analisarmos os livros de didática,
encontraremos várias terminologias e/ou expressões
para definir tais recursos como: material didático,
material pedagógico, recursos didáticos, materiais
curriculares, etc.
Vale, então, definir o que estamos
entendendo por recursos didáticos para que possamos
refletir sobre eles, sua função e uso, visando a melhoria e eficiência da aprendizagem.
Estamos entendendo por recursos didáticos “tudo o que possa apoiar
uma prática pedagógica com vista à aprendizagem”. (Campos e Dantas, p. 2).
Zabala (1998, p. 167-168) considera que:
“Os materiais curriculares ou materiais de desenvolvimento curricular são
todos aqueles instrumentos que proporcionam ao educador referências e
critérios para tomar decisões, tanto no planejamento como na intervenção
direta no processo ensino/aprendizagem e em sua avaliação. Assim, pois,
consideramos materiais curriculares aqueles meios que ajudam os
professores a responder aos problemas concretos que as diferentes fases
dos processos de planejamento, execução e avaliação lhes apresentam”.
Poderíamos, então, dizer que os recursos didáticos se apresentam como
aspectos que auxiliam na organização da dinâmica da sala de aula, procurando
explicitar os fundamentos contidos em sua aplicação, ou seja, os recursos didáticos
serão selecionados de acordo com as intenções do professor, com a organização dos
conteúdos, com a disponibilidade e possibilidades da escola e com a proposta de
DIDI
47
Didática I
CAPÍTULO 11
avaliação.
Desse modo, através do olhar sobre a prática educativa em vários
momentos históricos, iremos perceber que inúmeros foram os recursos didáticos
utilizados, de acordo com o tipo de formação que se almejava para o ser humano
daquela época.
Haidt (2001, p. 226) relata que :
“Alguns registros históricos que descrevem as salas de aula de tempos
remotos relatam que os mestres da Antiguidade e da Idade Média já
dispunham de certos recursos para facilitar o ensino, como grandes tábuas
que serviam de lousa, material para o ensino do cálculo aritmético,
documentos cartográficos, globos, cartas, murais de astronomia e livros com
iluminuras”.
De lá pra cá, vimos educadores que defenderam o verbalismo, o
enciclopedismo; outros, opostos a essas propostas, buscavam uma educação voltada
para a experiência; outros sugeriam uma educação que explorasse os sentidos antes
da razão. Cada qual, demandando diferentes recursos didáticos.
Alguns criaram seus próprios recursos, como o caso de Maria
Montessori , Froebel, Freinet.
Na atualidade, inúmeros são os recursos didáticos e talvez possamos
afirmar que se definem ”mais pelo uso que por suas características intrínsecas”.
(Campos e Dantas, p. 03).
Textos, livros didáticos, paradidáticos, jornais,
revistas, gibis, mapas, propagandas, cartazes, bússolas,
placas, rótulos, documentários, filmes, vídeos, programas de
TV, relógios, músicas, sites, softwares, receitas, murais,
sólidos geométricos ... tudo dependerá das intenções e da
proposta de utilização.
Campos e Dantas consideram que a
apresentação e trabalho em sala de aula de uma diversidade de recursos é
imprescindível, pois o aluno convive com esse universo fora da mesma.
Se desejamos uma escola que desperte e seduza o aluno para o
conhecimento, precisamos estar sensíveis a tudo que possa nos servir como recurso
didático para evitar a mesmice.
DIDI
48
Didática I
CAPÍTULO 11
Para finalizar, a adoção dos recursos didáticos são fundamentais para
um trabalho que priorize o desenvolvimento de habilidades e competências e que
visualize os conteúdos como instrumentos para tal desenvolvimento.
Nesse sentido, Zabala (1998, p. 168-169) alerta que:
“Conforme os conteúdos e a maneira de organizá-los, podemos encontrar
materiais com pretensões integradoras e globalizadoras, que tentam abarcar
conteúdos de diferentes matérias, e outros com enfoques claramente
disciplinares. Também encontraremos materiais específicos vinculados a
conteúdos estritamente procedimentais: blocos, fichas ou programas de
computador para domínio dos algoritmos das operações matemáticas, da
ortografia, do desenho, da interpretação de planos e
mapas, etc. Existem outros que se referem ao âmbito
dos conteúdos conceituais, como a maioria dos livros
didáticos, especialmente os das áreas de ciências
sociais e naturais, monografias, programas
audiovisuais, etc; ou para conteúdos atitudinais, por
exemplo, propostas para os professores, livros para o
aluno, programas multimídia para a educação para o trânsito e outros temas
transversais, etc”.
REFERÊNCIAS
CAMPOS, Maria Tereza Arruda e DANTAS, Eva Margareth. Materiais pedagógicos e
aprendizagem: a importância da diversidade. São Paulo: Programa de Melhoria e
Expansão do Ensino Médio, SEE/SP, 14p. (Apostila mimeo).
HAIDT, Regina Célia Cazaux. Curso de didática geral. 7 ed. São Paulo: Ática, 2001.
(Série Educação).
ZABALA, Antoni. A prática educativa: como ensinar. Trad. Ernani F. da F. Rosa. Porto
Alegre: Artmed, 1998.
DIDI
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Didática I
CAPÍTULO 11
DIDI
50
ANOTAÇÕES
Didática I
AS TÉCNICAS DE ENSINO NO PROCESSO
PEDAGÓGICO
CAPÍTULO 12
“Desde Bacon que afirmava que a natureza está a serviço
do homem, ou desde Comênio que defendera que “outra
coisa não exige a arte de ensinar do que uma engenhosa
distribuição do tempo, dos objetos e do método”, as técnicas de ensino, mais do que nunca, se incorporaram à
teorização educacional.”
(Vários autores)
Nesse capítulo pretendemos discorrer brevemente sobre o lugar das
técnicas de ensino no processo de ensinar e aprender.
De Comênio (citado na epígrafe) para nossos
dias, muitas concepções se modificaram em relação às
técnicas. Alguns educadores de tempos atrás sustentavam que
para ensinar e aprender, bastava servir-se de boas técnicas.
Esse tipo de abordagem chegou a ter destaque no cenário
pedagógico nas décadas de 60/70 no Brasil e tornou-se conhecida como tecnicismo
pedagógico.
No volume I dos Parâmetros Curriculares Nacionais (1997, p. 41) temos
uma análise sobre tal abordagem:
“Nos anos 70 proliferou o que se chamou de “tecnicismo educacional”,
inspirado nas teorias behavioristas da aprendizagem e da abordagem
sistêmica do ensino, que definiu uma prática pedagógica altamente
controlada e dirigida pelo professor, com atividades mecânicas inseridas
numa proposta educacional rígida e passível de ser totalmente programada
em detalhes. A supervalorização da tecnologia programada de ensino trouxe
conseqüências: a escola se revestiu de uma grande auto-suficiência,
reconhecida por ela e por toda a comunidade atingida, criando assim a falsa
idéia de que aprender não é algo natural do ser humano, mas que depende
exclusivamente de especialistas e de técnicas. O que é valorizado nessa
perspectiva não é o professor, mas a tecnologia; o professor passa a ser um
mero especialista na aplicação de manuais e sua criatividade fica restrita
aos limites possíveis e estreitos da técnica utilizada. A função do aluno é
reduzida a um indivíduo que reage aos estímulos de forma a corresponder
às respostas esperadas pela escola, para ter êxito e avançar. Seus interesses
DIDI
51
Didática I
CAPÍTULO 12
e seu processo particular não são considerados e a atenção que recebe é
para ajustar seu ritmo de aprendizagem ao programa que o professor deve
implementar. Essa orientação foi dada para as escolas pelos organismos
oficiais durante os anos 60, e até hoje está presente em muitos materiais
didáticos com caráter estritamente técnico e instrumental”.
Contudo, apesar do tecnicismo pedagógico, desejamos refletir sobre o
valor das técnicas de ensino de uma outra forma e poderíamos levantar alguns
questionamentos: que relações podemos estabelecer entre técnica de ensino e a
prática de ensinar e aprender? As técnicas estariam atreladas aos conteúdos? Como
pensar as técnicas de ensino sem cair no tecnicismo?
O sentido etimológico da palavra técnica vem dos gregos expressando
arte, habilidade. No dicionário Michaelis (1998, p. 2030) encontramos o verbete como
“conhecimento prático; prática. Conjunto dos métodos e pormenores práticos
essenciais à execução perfeita de uma arte ou profissão”.
Desse modo, as técnicas estão ligadas ao
fazer, à dimensão da prática.
No livro “Técnicas de ensino: por que não?”
– organizado por Ilma Veiga e escrito por vários autores –
podemos ver na apresentação a seguinte afirmação:
“(...) as técnicas de ensino não são naturais ao processo de ensinar, mas
elas são condições que dão acesso ao mesmo. Portanto, nesse sentido,
elas são compreensíveis como “arti-fícios”, que se interpõem na relação entre
o professor e o aluno, submissas à autoridade e à intencionalidade do
primeiro, Assim sendo, as técnicas de ensino não são algo mecânico que
se sobrepõe à relação humana como quer certa tendência pedagógica”.
(1996, p. 8)
O que podemos ressaltar da afirmação é que as técnicas de ensino
devem estar a serviço do ser humano; tornam-se importantes a partir do momento em
que auxiliam no processo ensino-aprendizagem. Portanto, precisam estar atreladas
aos propósitos educativos, ao conteúdo e não o inverso.
Possuímos inúmeras técnicas que foram e ainda são utilizadas pelos
professores e na concepção de alguns autores, podemos classificá-las em
DIDI
52
Didática I
CAPÍTULO 12
individualizantes, socializantes e também socioindividualizantes. Essa classificação se
fará de acordo com a estrutura e organização da técnica e conforme um planejamento
das etapas a serem desenvolvidas.
É importante considerar que dificilmente encontraremos uma técnica
sendo utilizada em seu “estado puro” em termos de classificação; geralmente o que
acontece é a predominância de uma forma, sem excluir a outra.
Poderíamos apontar como técnicas individualizantes, de acordo com
levantamento de Sant’Anna e Menegolla: fichas didáticas, estudo dirigido
individualizado, estudo de texto, instrução
programada, estudo de caso, etc.
Como técnicas socializantes, os autores
apontam: explosão de idéias, dramatização,
seminário, painel ou mesa-redonda, técnica de
projetos, “role playing” ou desempenho de papéis, júri
simulado, simpósio, discussão e debate, Phillips 66 e
outras.
Já em relação às técnicas socioindividualizantes, Sant’Anna e Menegolla
(1997, p. 44) consideram “que ocupam uma posição mediadora como as técnicas de
projetos, estudo dirigido, solução de problemas, estudo de caso, etc. as quais,
dependendo dos procedimentos estabelecidos, serão principalmente individualizantes,
socializantes ou um misto de ambas (...)”.
Uma técnica de ensino relevante e que tem sido considerada por vários
educadores é o Estudo do Meio, às vezes até elevada à condição de método.
De acordo com Balzan (1969, p. 106 apud Feltran e Filho, 1996, p. 119)
o estudo do meio:
“é uma técnica de grande importância, pois é através dela que se leva o
aluno a tomar contato com o complexo vivo, com um conjunto significativo
que é o próprio meio, onde a natureza e cultura se interpenetram.”
Além disso, é uma técnica que se utiliza da dimensão científica,
buscando trabalhar com a pesquisa.
Por essas e muitas outras razões que consideramos relevante a
utilização das técnicas de ensino no processo escolar.
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53
Didática I
CAPÍTULO 12
REFERÊNCIAS
BRASIL – Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:
introdução. Brasília: MEC/SEF, 1997.
FELTRAN, Regina Célia de S.; FILHO, Antonio Feltran. Estudo do meio. In: VEIGA, Ilma
Passos A. (org.) Técnicas de ensino: por que não? Campinas, SP: Papirus, 1996. cap.
7, p. 115-129.
SANT’ANNA, Ilza Martins; MENEGOLLA, Maximiliano. Didática: aprender a ensinar. 5.
ed. São Paulo: Loyola, 1997. (Coleção Escola e Participação).
ANOTAÇÕES
DIDI
54
Didática I
A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM
CAPÍTULO 13
“... é o risco que define a função docente: será que fiz tudo
para fazer dos meus alunos os homens que eu desejaria
que eles fossem?”
(Georges Snyders)
Falar de avaliação é sempre árduo porque trata-se de um tema
polêmico.
Ao atentarmos para a prática da avaliação ao longo da história da
educação veremos que houve momentos em que avaliação era sinônimo de castigo,
punição, julgamento.
A supervalorização desse momento através de provas e exames fazia
(ou ainda faz) com que os alunos se sentissem incompetentes, gerando às vezes o
fracasso escolar.
Luckesi (2002) salienta que, sociologicamente falando, a
supervalorização de provas e exames como princípio avaliativo só traz a seletividade
social porque a avaliação está relacionada com a retenção.
Na atualidade, muitos autores se colocam sobre tal tema e o que se tem
buscado é vivenciar uma prática avaliativa que está ligada a todo o processo de
aprendizagem. Sendo assim, a avaliação não é vista como um momento único,
estanque, cristalizado.
Podemos então dizer que a avaliação deve
estar a serviço da aprendizagem e não da nota.
Desse modo, alguns autores consideram
três momentos significativos na prática da avaliação:
avaliação inicial, reguladora e final.
A avaliação inicial é o momento de conhecer
qual é a situação de partida levando-se em conta os
objetivos estabelecidos. O professor faz o levantamento
dos conhecimentos prévios dos alunos, ou seja, busca conhecer o que os alunos
sabem. A avaliação inicial é também conhecida como avaliação diagnóstica.
A avaliação reguladora propõe o acompanhamento do aprendizado do
aluno, fazendo os ajustes necessários no decorrer do processo.
Para a realização da avaliação reguladora, é importante levar em
consideração dois aspectos:
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Didática I
CAPÍTULO 13
1. Ponto de Partida: o que o aluno já sabe (Zona de desenvolvimento
real);
2. Onde se quer chegar: o que desejo que meus alunos aprendam (zona
de desenvolvimento potencial). Para isso, o professor precisa
estabelecer critérios e ao propor atividades e avaliação, estas girarão
em torno destes e das metas
estabelecidas. Para se chegar onde se
deseja, o professor pode utilizar vários
instrumentos de avaliação como:
trabalhos em grupo, debate, relatório
individual, provas escritas, autoavaliação etc. não perdendo de vista a
aprendizagem e a reorientação do processo caso seja necessário.A
avaliação final significa chegar a determinados resultados, após um
tempo de intervenção/mediação. É também denominada de avaliação
somativa.Gentile e Andrade (2001, p. 21) ressaltam que:
“Segundo os especialistas, não se pode perder de vista que os
resultados interessam a quatro públicos:
zao
aluno, que tem o direito de conhecer o próprio processo de
aprendizagem para se empenhar na superação das necessidades;
zaos pais, também responsáveis pela educação dos filhos e por parte
significativa dos estímulos que eles recebem;
zao professor que precisa constantemente avaliar a própria prática;
zà equipe docente, que deve garantir continuidade e coerência no
percurso escolar da criança e do jovem”.
Finalizando, Luckesi considera no capítulo IX de seu livro “Avaliação da
aprendizagem escolar” que:
“A avaliação da aprendizagem na escola tem dois objetivos: auxiliar o
educando no seu desenvolvimento pessoal e responder à sociedade pela qualidade
do trabalho educativo realizado. Articuladas com esses objetivos básicos estão as
funções de:
a) propiciar a autocompreensão do educando e do educador;
b) motivar o crescimento do educando;
DIDI
56
Didática I
CAPÍTULO 13
c) aprofundar a aprendizagem;
d) auxiliar a aprendizagem.
Podemos assim dizer que o objetivo é propor
uma prática avaliativa que acolha, inclua, que traga a
perspectiva de uma educação de sucesso, que faça a
diferença na vida do educador, do educando e na sociedade.
REFERÊNCIAS
GENTILLE, Paola e Andrade, Cristina. Avaliação nota 10. Nova Escola, São Paulo, p.
15-21, nov. 2001.
LUCKESI, Cipriano C. Avaliação da aprendizagem escolar. São Paulo: Cortez, 2006.
ANOTAÇÕES
DIDI
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Didática I
CAPÍTULO 13
DIDI
58
ANOTAÇÕES
Didática I
CONTINUANDO NOSSOS CAMINHOS
CAPÍTULO 14
“Por favor, não me ofenda perguntando se esta história
aconteceu. Escrever o que se vive é coisa de pouca ou
nenhuma graça. O desafio está em viver o que se escreve”.
(Eduardo Galeano)
Em nossa jornada pelos 13 capítulos da disciplina Didática, discorremos
sobre sua definição, sobre os caminhos percorridos por essa disciplina e a
contribuição de vários educadores/pesquisadores na construção do principal elemento
da didática que é a reflexão sobre o processo ensino-aprendizagem.
Falamos também sobre a organização da prática educativa na
atualidade e os quesitos para uma formação holística e humanizadora.
A dimensão técnica não foi esquecida e apresentamos as etapas a
serem consideradas ao organizarmos a ação pedagógica: o estabelecimento de
metas (objetivos), a seleção dos conteúdos, os aspectos metodológicos, a escolha de
técnicas de ensino que possam auxiliar na aprendizagem e a avaliação como parte
integrante de todo o processo de ensinar e aprender.
Tratamos dessas etapas por que elas serão encontradas em todas as
formas de organização da prática educativa, seja esta
através de um plano de aula, de um plano de ensino
ou projeto didático, ou ainda, na elaboração do projeto
político-pedagógico da escola.
Nossa intenção é não parar por aqui,
pois a educação enquanto um projeto de vida requer
uma discussão constante de temas que merecem ser
abordados à luz da Didática como: a importância das novas tecnologias e sua
utilização no processo educativo; os encaminhamentos didáticos através de projetos; a
interdisciplinaridade; o projeto político-pedagógico e muitos outros temas que
poderíamos aqui citar.
Mas, além de continuarmos nossas reflexões, importante também se faz
praticá-las, como sugere Galeano na epígrafe deste capítulo.
Portanto, continuemos nossa jornada, tentando “viver o que se escreve”.
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