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Neoplasias sólidas de ovário: análise sistematizada e ensaio iconográfico / D’Ippolito G et al. Ensaio Iconográfico Neoplasias sólidas de ovário: análise sistematizada e ensaio iconográfico Giuseppe D’Ippolito1, Ana Carolina Mori Lima2, Luís Pecci Neto2, Roberta Morgado Ferreira3, Luís Ronan Marquez Ferreira de Souza4 Resumo Com o objetivo de restringir o número de diagnósticos diferenciais das neoplasias ovarianas sólidas, apresentamos uma análise racional e sistematizada, levando-se em consideração fatores epidemiológicos, relevância clínica e aspectos radiológicos, através de revisão bibliográfica e análise retrospectiva de casos. Os critérios utilizados foram: a) faixa etária; b) quadro clínico e laboratorial; c) unilateralidade ou bilateralidade; d) homogeneidade/heterogeneidade; e) comportamento de realce; f) comportamento de sinal na ressonância magnética; g) sinais associados. Foram considerados, entre os diagnósticos diferenciais, os seguintes tumores de ovário: a) teratoma; b) tuDescritores: Neoplasias ovarianas; Ovário; Ultra-sonografia; Tomografia computadorizada; Ressonância magnética. mor de Brenner; c) disgerminoma; d) fibroma/fibrotecoma; e) tumor de células da granulosa; f) tumor estromal esclerosante; g) tumores metastáticos. Ao se avaliar uma lesão sólida de ovário, é possível propor algumas alternativas diagnósticas pertinentes, fundamentadas em uma análise sistemática dos principais aspectos epidemiológicos e de imagem do tumor. O s tumores ovarianos são mais freqüentemente císticos ou com componente cístico predominante. Quando se apresentam com aspecto sólido nos diversos métodos de imagem, podemos restringir as hipóteses diagnósticos a um grupo menor de neoplasias[1]. O objetivo deste estudo foi apresentar uma análise racional e sistematizada das neoplasias de ovário levando-se em consideração fatores epidemiológicos, relevância clínica e aspectos radiológicos. DESCRIÇÃO DO MATERIAL Recebido para publicação em 17/7/2006. Aceito, após revisão, em 25/7/2006. Trabalho realizado na Scopo Diagnóstico – Serviço de US, TC e RM do Hospital São Luiz, São Paulo, SP. 1 Professor Adjunto Doutor do Departamento de Diagnóstico por Imagem da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Médico Radiologista Responsável pelo Setor de US/TC/RM do Hospital São Luiz. 2 Médicos Residentes do Setor de US/TC/RM do Hospital São Luiz. 3 Graduanda em Medicina da Universidade de Marília, SP. 4 Professor Assistente Doutor da Disciplina de Radiologia e Diagnóstico por Imagem da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Correspondência: Prof. Dr. Giuseppe D’Ippolito. Rua Doutor Alceu de Campos Rodrigues, 95 (Centro Diagnóstico), Vila Nova Conceição. São Paulo, SP, 04544-000. E-mail: [email protected] Rev Imagem 2006;28(3):165–170 Através de revisão bibliográfica e análise retrospectiva de casos com diagnóstico de neoplasia de ovário e apresentação predominantemente sólida nos exames de imagem — ultra-sonografia (US), tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética RM) —, propomos uma metodologia de propedêutica da imagem que permita estreitar as alternativas diagnósticas. Os critérios utilizados foram os seguintes: a) faixa etária; b) quadro clínico e laboratorial; c) unilateralidade ou bilateralidade; d) homogeneidade/heterogeneidade; e) comportamento de realce; f) comportamento de sinal na ressonância magnética; g) sinais associados. Foram considerados, entre os diagnósticos diferenciais, os seguintes tumores de ovário: a) teratoma; b) tumor de Brenner; c) disgerminoma; d) fibroma/fibrotecoma; e) tumor de células da granulosa; f) tumor estromal esclerosante; g) tumores metastáticos. Não abordamos, nesta revisão, lesões císticas de ovário que podem simular tumores sólidos, por exemplo, cistos hemorrágicos e endometriomas. 165 D’Ippolito G et al. / Neoplasias sólidas de ovário: análise sistematizada e ensaio iconográfico Tumores sólidos ovarianos mais freqüentes Teratoma – O teratoma cístico benigno ou maduro é a neoplasia ovariana mais freqüente entre mulheres jovens. Representa, aproximadamente, 40% a 50% de todos os tumores do ovário até os 40 anos de idade[2,3]. É, indiscutivelmente, a neoplasia germinativa mais freqüente. Representa 10% a 20% de todos os tumores ovarianos. Apresenta bilateralidade em 20% a 25% dos casos em adultos (Fig. 1), e nas crianças 90% a 100% são unilaterais. Seu aspecto à US, TC e RM varia desde puramente cístico, também denominado cisto dermóide, até heterogêneo com componente sólido, gordura e calcificação (Fig. 2), sendo estes dois componentes os que respondem pelo seu aspecto patognomônico aos exames de imagem[4]. À US os teratomas podem ser hipo Fig. 1 – Teratoma bilateral. A TC demonstra duas massas anexiais com componente de gordura (e diferentes densidades) e calcificações periféricas. ou hiperecogênicos (Figs. 3 e 4), dependendo da sua composição. Apresentam aspectos ultra-sonográficos típicos como o promontório (nódulo dermóide), que tem aspecto de massa hiperecóica na parede cística sem fluxo ao Doppler colorido, além do conteúdo com aspecto “espesso”. Na TC, a medida de densidade (ROI) negativa é característica na maior parte dos exames. No estudo de RM, os teratomas maduros apresentam hipersinal em T1 com queda nas seqüências com saturação de gordura (“fat sat”)[3]. Geralmente, os teratomas apresentam realce tênue pelo contraste. Fibroma/fibrotecoma – São tumores benignos que acometem mulheres pré- e pós-menopausadas. Apesar de benignos, podem estar associados a ascite, caracterizando a síndrome de Meigs, em até 40% dos casos[5]. O seu abundante componente fibrocolagenoso confere um aspecto típico de hipossinal homogêneo em T1 e T2, com pouco ou nenhum realce após a injeção de contraste (Fig. 5). À US e TC apresentam aspecto sólido homogêneo e inespecífico, podendo simular lesão maligna e apresentando calcificações com freqüência[6]. Tumor de Brenner – Representa cerca de 2% a 3% dos tumores de ovário, é raramente maligno e mede, geralmente, menos que 2,0 cm, podendo alcançar até mais de 10 cm de diâmetro[7]. Pode estar associado a outras massas ovarianas em até 30% dos casos. O tumor de Brenner apresenta-se geralmente como pequena Fig. 2 – Teratoma em ovário esquerdo (setas), paciente de 36 anos. Nódulo hiperintenso em T1 (a) e T2 (b), com queda de sinal na seqüência de supressão de gordura (c) e sem realce após a injeção de contraste (d). 166 Rev Imagem 2006;28(3):165–170 Neoplasias sólidas de ovário: análise sistematizada e ensaio iconográfico / D’Ippolito G et al. Fig. 3 – Teratoma, paciente de 81 anos. Massa heterogênea, predominantemente hipoecogênica à US (setas em a). A TC (b) demonstra massa com diferente densidade de gordura (UH: –36/–136). Nota-se “plug dermóide”, como nódulo no interior da massa. Fig. 4 – Teratoma, paciente de 29 anos. Nódulo hiperecogênico à US (setas em a) e com densidade de gordura na TC (b). É interessante notar como a mesma densidade na TC pode correlacionar-se com imagens hipo ou hiperecogênicas à US (ver Fig. 3). lesão sólida e homogênea[8], cujo componente fibroso confere hipossinal nas imagens de RM ponderadas em T2 e calcificações na TC, que o tornam indistinguível do fibroma/fibrotecoma, exceto pelo fato de apresentar maior realce após o contraste. Disgerminoma – É tumor relativamente raro, sendo a neoplasia maligna mais freqüente em pacientes jovens e crianças. Apresenta-se, geralmente, como massa volumosa e com septos fibrovasculares proeminentes que se realçam após o contraste e confere um aspecto bastante característico à lesão (Figs. 6 e 7). Assim como o teratoma, o tumor de Brenner e o fibroma/fibrotecoma, também pode conter calcificações[1,5]. Tumor de células da granulosa – É o tumor de ovário produtor de estrógeno mais comum e por isto freqüentemente associado a hiperplasia de endométrio, pólipos ou carcinoma. A maior parte dos casos ocorre em mulheres acima de 40 anos de idade, sendo unilateral em 85% dos casos[9]. Apresenta aspecto bastante variável e atípico, devendo-se suspeitar desse diagnóstico na presença de volumosa massa de ovário associada a alterações endometriais. Tumor estromal esclerosante – É tumor benigno raro, mais comum em jovens da segunda e terceira décadas de vida. Apresenta aspecto típico que se caracteriza por intenso realce periférico e centrípeto após a injeção do contraste, com realce prolongado na região central devido à presença de fibras de colágeno[7,10]. O tumor de células de Sertoli-Leydig apresenta aspectos Fig. 5 – Fibroma em ovário esquerdo (setas), paciente de 40 anos. Nódulo sólido calcificado (a), com discreto realce após a injeção de contraste. Isointenso em T1 (b), hipointenso em T2 (c) em virtude do componente fibroso e nitidamente destacado do útero. Diagnóstico diferencial com leiomioma uterino subseroso pediculado. Os miomas uterinos costumam apresentar intenso realce. Rev Imagem 2006;28(3):165–170 167 D’Ippolito G et al. / Neoplasias sólidas de ovário: análise sistematizada e ensaio iconográfico Fig. 6 – Disgerminoma, paciente de 29 anos. Grande massa sólida e heterogênea e com realce após a injeção do contraste (a). A massa é hipointensa em T1 (b), hipo e hiperintensa em T2 (c) e com nítido plano de clivagem com o útero, no plano sagital (d). Notam-se septos no interior do tumor, o que é bastante característico deste tipo de lesão (ver também a Fig. 7). Fig. 7 – Disgerminoma, paciente de 19 anos. Grande massa hipointensa em T1 (a), discretamente hiperintensa em T2 (b), sem queda de sinal na supressão de gordura (c) e realce após a injeção de contraste (d). Notam-se septos no interior do tumor (setas). 168 Rev Imagem 2006;28(3):165–170 Neoplasias sólidas de ovário: análise sistematizada e ensaio iconográfico / D’Ippolito G et al. semelhantes, porém está mais freqüentemente associado a síndromes virilizantes. Tumores metastáticos – Representam aproximadamente 5% das neoplasias ovarianas. Os tumores que mais freqüentemente enviam metástases para o ovário são os de estômago e cólon, seguidos de mama, pulmão e ovário contralateral. As metástases ovarianas de adenocarcinomas mucinosos intestinais são denominadas tumor de Krukenberg[11,12]. Os tumores metastáticos podem ser indistinguíveis dos tumores primários de ovário. A bilateralidade, apesar de freqüente, é observada com prevalência semelhante nos tumores primários. Um aspecto considerado bastante característico consiste em uma volumosa massa, predominantemente sólida, com múltiplos cistos de permeio, lembrando um “cacho de uva” (Fig. 8). A identificação da lesão primária ajuda a definir o diagnóstico (Fig. 9). O trato geniturinário está raramente acometido pelo linfoma, e quando isto ocorre, é geralmente por disseminação sistêmica do tipo não-Hodgkin. Raramente ocorre infiltração primária e ainda menos nos ovários, que são os órgãos mais raramente acometidos. A infiltração linfomatosa dos ovários apresenta aspecto indiferenciável do tumor de Krukenberg ou de outros tumores sólidos de ovário (Fig. 10). A presença de extensa linfonodomegalia retroperitoneal e hepatoesplenomegalia pode sugerir este diagnóstico. Na Tabela 1 apresentamos os principais diagnósticos diferenciais das neoplasias sólidas de ovário em função das características de imagem. Fig. 8 – Tumor de Krukenberg por adenocarcinoma de apêndice, paciente de 39 anos. Grande massa sólida e heterogênea com cistos de permeio (setas), caracterizada à US (a) e à RM (b–e). T1 (c); T2 (b,d); fase pós-contraste (e). Fig. 9 – Tumor de Krukenberg por adenocarcinoma de sigmóide, paciente de 44 anos. Paciente com tumor de sigmóide (setas em a), ascite e grande massa pélvica heterogênea (asterisco em b). Rev Imagem 2006;28(3):165–170 169 D’Ippolito G et al. / Neoplasias sólidas de ovário: análise sistematizada e ensaio iconográfico Fig. 10 – Linfoma primário de ovário bilateral. Presença de grandes massas sólidas pélvicas (M), em projeção anexial (a), acompanhadas de linfonodomegalia retroperitoneal (seta em B) e ascite (asterisco). TABELA 1 – Diagnósticos diferenciais das neoplasias sólidas de ovário em função de suas características de imagem. Associação com alteração endometrial • Carcinoma endometrióide • Tumor das células da granulosa • Tecoma/fibrotecoma Hipersinal em T1 e redução na saturação de gordura • Teratoma Hipossinal em T2 • Fibroma/fibrotecoma • Tumor de Brenner Calcificação • • • • Realce intenso Teratoma Tumor de Brenner Fibroma/fibrotecoma Tumor de Krukenberg • Tumor estromal esclerosante • Tumor de células de SertoliLeydig 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. the Radiology Diagnostic Oncology Group Study. Radiology 2001;219:213–8. Souza LRMF, Caetano S, Faintuch S, et al. Bilateral ovarian fibroma with extensive calcification. J Women’s Imaging 2005; 7:122–5. Outwater EK, Marchetto B, Wagner BJ. Virilizing tumors of the ovary: imaging features. Ultrasound Obstet Gynecol 2000;15: 365–71. Moon WJ, Koh BH, Kim SK, et al. Brenner tumor of the ovary: CT and MR findings. J Comput Assist Tomogr 2000;24:72–6. Morikawa K, Hatabu H, Togashi K, Kataoka ML, Mori T, Konishi J. Granulosa cell tumor of the ovary: MR findings. J Comput Assist Tomogr 1997;21:1001–4. Scoutt L, McCarthy S, Lange R, Bourque A, Schwartz P. MR evaluation of clinically suspected adnexal masses. J Comput Assist Tomogr 1994;18:609–18. Ha HK, Baek SY, Kim SH, Kim HH, Chung EC, Yeon KM. Krukenberg’s tumor of the ovary: MR imaging features. AJR Am J Roentgenol 1995;164:1435–9. Outwater EK, Dunton CJ. Imaging of the ovary and adnexa: clinical issues and applications of MR imaging. Radiology 1995; 194:1–18. CONCLUSÃO Ao se avaliar uma lesão sólida de ovário, é possível propor alternativas diagnósticas pertinentes, fundamentadas em uma análise sistemática dos principais aspectos epidemiológicos e de imagem do tumor. REFERÊNCIAS 1. Jung SE, Lee JM, Rha SE, Byun JY, Jung JI, Hahn ST. CT and MR imaging of ovarian tumors with emphasis on differential diagnosis. RadioGraphics 2002;22:1305–25. 2. Outwater EK, Siegelman ES, Hunt JL. Ovarian teratomas: tumor types and imaging characteristics. RadioGraphics 2001;21:475– 90. 3. Guinet C, Buy JN, Ghossain MA, et al. Fat suppression techniques in MR imaging of mature ovarian teratomas: comparison with CT. Eur J Radiol 1993;17:117–21. 4. Souza LRMF, Faintuch S, Goldman SM, Louveira MH, Ajzen SA, Szejnfeld J. Avaliação por ressonância magnética de massas pélvicas. Rev Imagem 2003;25:5–11. 5. Brown DL, Zou KH, Tempany CM, et al. Primary versus secondary ovarian malignancy: imaging findings of adnexal masses in 170 Abstract. Solid ovarian tumors: iconographic essay. With the objective to substantially narrow the number of differential diagnosis of solid ovarian tumors, we present a rational and systematical analysis, based on epidemiological findings, clinical relevance and radiological features, guided by bibliographical revision and retrospective analysis of the cases. The criteria used have been: a) age; b) clinical and laboratorial findings; c) unilateral or bilateral; d) homogeneity/heterogeneity; e) enhancement; f) signal behavior in magnetic resonance imaging; g) associated findings. The following ovary tumors have been considered in the differential diagnosis: a) teratoma; b) Brenner tumor; c) dysgerminoma; d) fibroma/fibrothecoma; e) granulosa cell tumor; f) esclerosing estromal tumor; g) metastatic tumors. During the evaluation of a solid ovary tumor, it is possible to consider some important diagnostic alternatives, based on a systematic analysis of the main epidemiological and imaging findings. Keywords: Ovarian neoplasms; Ovary; Ultrasound; Computed tomography; Magnetic resonance imaging. Rev Imagem 2006;28(3):165–170
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