Neve ladina - communication plus

ROTAS | EUROPA
Alta Badia
Neve ladina
Uma vista de cortar a respiração, para a imensidão da cadeia montanhosa Dolomitas, óptimas condições
para esquiar, ou não recebesse provas do Campeonato do Mundo: a região italiana de Alta Badia está
em alta e a pequena aldeia de San Cassiano tem agora o alojamento certo para umas férias perfeitas.
Texto de Teresa Frederico | Fotografia de Pedro Sampayo Ribeiro
Willy Costamoling com
o seu maior achado nas
Dolomitas; a aldeia de San
Cassiano; e o bar/enoteca
Ursus Ladinicus
P
inheiros enormes cobertos de neve,
casinhas de madeira com os telhados
“pintados” de branco e fumo a sair
da chaminé. No ar, frio, sente-se um
agradável cheiro a lenha. Apesar das temperaturas
bem negativas, há quem vá dar uma volta pela
rua principal de San Cassiano. Para quem chega
do “quentinho” de Lisboa, é estranha a vida
social normal num ambiente tão refrescante,
isto para usar um adjectivo comedido…
A aldeia, a 150 quilómetros da austríaca
Innsbruck e a 200 da italiana Veneza, sem muitas
mais ruas do que a principal, é amorosa,
organizada, extremamente acolhedora.
Há pouco comércio, mas não falta nada
e o cenário envolvente, montanhas que integram
a cadeia Dolomitas, em Junho classificada pela
UNESCO como Património Mundial, vale por
tudo e mais alguma coisa.
Além do mais, esta região é particularmente
interessante também pela sua identidade cultural,
com uma língua própria, a ladina, nascida
durante as invasões romanas e ainda falada por
cerca de 30.000 pessoas. É um dos três idiomas
oficiais, juntamente com o alemão e o italiano,
um poliglotismo justificado pela História:
o território pertenceu, entre 1803 e a Primeira
Guerra Mundial, à vizinha Áustria e depois
à Baviera, sendo anexado a Itália em 1919.
Ricas montanhas
San Cassiano é uma das aldeias da Alta Badia,
no coração das Dolomitas, cadeia com nada
menos de 18 picos acima dos 3000 metros
no norte dos Alpes italianos. Diz a própria
UNESCO que as ditas Dolomitas oferecem
“uma das mais belas paisagens de montanha
do mundo, caracterizada por muralhas verticais,
falésias abruptas e uma forte densidade de vales
muito estreitos, longos e profundos”. Tal cenário
impressionou artistas ao longo dos tempos, como
Goethe ou Le Corbusier, que o definiu como
a mais bela obra de arquitectura do planeta.
Depois há que mencionar a grande importância
a nível científico deste local. Willy Costamoling
é a pessoa indicada para falar sobre os fósseis
e tudo o mais que se relacione com
as montanhas. Desde miúdo que se aventurou
com o irmão por encostas e cumes, recolhendo
vestígios de vegetais e animais. Já adultos,
tornaram-se coleccionadores, actividade que
conjugavam com a de professores de esqui.
Hoje Willy tem um simpático bar a 2028 metros
de altitude, onde não se cansa de explicar como
há 250 milhões de anos a zona estava submersa
por um mar tropical e de contar a sua maior
aventura: a descoberta, em 1987, de uma caverna
a 2800 metros com ossos de um urso que
habitara a região há 50.000 anos. Os seus
achados integrarão um museu em San Cassiano,
que inclusive deverá reconstituir a gruta.
De momento é possível apreciar um modelo
de mandíbula que circula de mesa em mesa,
entre aperitivos, para espanto dos clientes.
Histórias de esqui também tem muitas, até
porque faz socorro alpino vai para 40 anos.
Deslizar por estas paisagens únicas faz as delícias
Como ir
Alta Badia fica a 150 km de
Innsbruck, na Áustria, e a 200 de
Veneza, cidade para a qual a TAP
possui voos directos. Preços desde
€170,33 já com taxas incluídas.
Reservas em www.flytap.com.
Deslocações
Pode alugar um automóvel (grupo D)
com quilómetros ilimitados durante
cinco dias por cerca de €280, a
levantar e entregar no aeroporto
de Veneza (www.avis.com.pt).
Se optar por um táxi (tel. 0039 0471
1955 100), saiba que uma viagem até
Cortina pode custar €75 num táxi
para quatro, €18,75 por pessoa.
Num táxi para oito, o valor desce para
€15 por viajante. Combine sempre os
valores com o motorista.
Mais informações
www.altabadia.org
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Onde dormir
Lagació Mountain Residence – Micurà de Rü 48,
S. Cassiano, Alta Badia, Itália; tel. 0039 0471 849 503,
www.lagacio.com
Diárias, de 6 de Fevereiro a 5 de Março, desde €260
(apartamento para duas pessoas) a €700 (quatro
pessoas). O preço inclui pequeno-almoço até às 11h00,
limpeza quotidiana, uso da sauna finlandesa, banho turco,
bio-sauna, zona de relaxamento e ginásio, estacionamento
e transferes. Mediante pagamento estão disponíveis
pequeno-almoço no apartamento, compras
de supermercado, serviços de baby sitting e lavandaria.
Na recepção encarregam-se de reservar restaurantes,
contratar guias e até passeios de helicóptero.
La Palsa, o spa do hotel, proporciona vários tratamentos
com produtos naturais locais ou das marcas Dr. Hauschka,
Niance e Thalgo. Os preços vão dos €44 (banho de feno)
a €110 (tratamento relaxante de 75 min). O tratamento
com mel custa €70, uma massagem €60.
Esqui
O passe de um dia para esquiar na Alda Badia custa €41
por adulto e €29 para jovens até 16 anos. Para três dias,
o valor sobe para €117 e €82, respectivamente. O Skipass
Dolomiti Superski, que permite desfrutar de 1.200 km
de pistas distribuídos por 12 zonas, incluindo, além de Alta
Badia, Marmolada, Val Gardena e a conhecida Cortina
d’Ampezzo, custa, por um dia, €45 por adulto e €32 para
jovens até 16 anos. Para três dias o valor é de €128 e
€90, respectivamente. Mais em www.dolomitisuperski.com.
Aqui as férias na neve podem prolongar-se a um
domínio muito maior, o Dolomiti SuperSki,
com 1200 quilómetros de pistas. Deste conjunto,
uma das mais afamadas estâncias é Cortina
d’Ampezzo, há muito uma das localidades mais
concorridas de Itália e frequentada por
celebridades. Em San Cassiano, ao que consta
escolhida por empresários endinheirados mas
discretos, diz-se que não se modernizou desde que
recebeu os Jogos Olímpicos de 1956. É uma
opinião suspeita, embora facilmente verificável
indo passar o dia a Cortina para fazer compras
– o bom shopping está lá, reconhece-se por cá.
Inspirado nas tradições locais, com uma fachada Chique ecológico
Margareth Canins e o marido, Pio, são
semelhante às antigas casas rurais do vale, os
proprietários do aparthotel Lagació Mountain
o Lagació integra-se na paisagem e homenageia-a Residence, inaugurado há um par de meses
O spa La Palsa.
Na pág. ao lado,
Margareth, proprietária
do Lagació; a sala e a suite
do apartamento 603; e um
dos filhos do casal Canins
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dos fãs da modalidade. Na zona de Alta Badia
podem desfrutar de 130 quilómetros de pistas
(70 fáceis, 52 intermédias e 8 difíceis) servidos
por modernos meios mecânicos e a qualidade
da neve é comprovada pela realização de provas
do Campeonato do Mundo. A última, em
Dezembro, de slalom masculino, revelou a mestria
de alguns dos melhores desportistas na Gran Risa,
a mais temível das pistas. Esquiadores menos
dotados também por lá se atrevem, em prestações
que se prestam a trocadilhos: provocam “gran risate”…
no espaço de uma antiga casa de férias familiar,
situado na rua principal da aldeia e perto
do acesso às pistas. Ambos tinham experiência
em hotelaria e alimentavam o sonho de criar algo
de especial, um lugar onde desejassem passar
os seus próprios momentos de lazer.
Inspirado nas tradições locais, com uma fachada
semelhante às antigas casas rurais do vale
e utilizando madeiras recicladas, oriundas de
velhas quintas, o edifício integra-se na paisagem,
homenageia-a, com a entrada dos apartamentos
ornamentada por fósseis que lhes dão os nomes,
e respeita a Natureza, facto atestado pelo
certificado Casa Clima A, atribuído às unidades
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Onde comer
Maso Runch-Hof – Pedraces, Alta Badia; tel. 0039
0471 839 796. Para provar típica comida ladina, feita
com ingredientes produzidos pelo proprietário. O preço
médio de uma refeição ronda os €26 sem bebidas.
La Siriola – Hotel Ciasa Salares, Prè de Vì Strasse 31,
Armentarola, San Cassiano; tel. 0039 0471 849 445,
www.siriolagroup.it. Restaurante dirigido pelo chef
Claudio Melis e detentor de uma estrela Michelin. Fica
dois quilómetros do centro de San Cassiano na direcção
de Cortina. Um menu de degustação custa €142.
Enoteca Ursus Ladinicus/Ütia Punta Trieste
– Corvara, Alta Dabia; tel. 0039 0471 836 643
A 2028 metros, acessível pela telecadeira Planac,
a enoteca oferece as necessárias bebidas para aquecer.
Mesmo ao lado, a Ütia Punta Trieste tem boas pastas, por
exemplo, e um tiramisù, doce italiano feito com camadas
de biscoitos envolvidos em café entremeadas por creme,
muito afamado. O preço de uma refeição ronda os €15.
hoteleiras que se distinguem pela sua eficiência
energética. Esta comunhão com o meio
envolvente estende-se aos interiores. Quer nos
espaços comuns quer nos 24 apartamentos
predominam materiais como a pedra e a madeira
da região, tecidos como o feltro e o linho. Cada
peça da decoração foi escolhida por Margareth,
que habilmente conseguiu criar um ambiente
moderno, apelando ao tradicional, simples
mas também sofisticado.
O dia começa da melhor maneira no
apartamento 603, um dos melhores, com uma
suite e um quarto duplo, uma sala confortável,
dotada de lareira, kitchenette e até sauna. As
grandes vidraças permitem ver que um sol radioso
ilumina a imponente montanha, numa imagem
digna de folheto turístico. Após o pequeno-almoço, à base de produtos regionais, sair para
desfrutar das pistas é a opção óbvia, mas há
alternativa para quem prefere mimar-se: o spa
La Palsa, palavra que em ladino significa relaxar.
Não é grande, tem apenas quatro salas de
tratamentos, além de banho turco e sauna
finlandesa. Mais uma vez, no entanto, se verifica
que o tamanho pouco interessa – neste caso,
ao usufruir de um tratamento com mel local,
o eleito entre as diversas propostas, que abrangem
desde técnicas oriundas da Índia ao Hawai, todas
inspiradas na Natureza. Utilizado sobre pontos
fulcrais ao longo da coluna, o mel funciona como
terapia, alegadamente transmitindo a energia dos
milhares de abelhas que contribuíram para a sua
produção. O mel cola, a massagem não
é propriamente afectuosa, melada. O final surge
mais adocicado, suave, feito com óleo, também
de mel, aquecido. Falta experimentar o tradicional
banho de feno, apanhado acima dos 2000 metros
de altitude, e por isso com especiais efeitos
Aqui as férias na neve podem prolongar-se a um
domínio muito maior, o Dolomiti SuperSki, que
abrange a conhecida estância Cortina d’Ampezzo
benéficos para a saúde, mas fica para outro dia.
Agora segue-se o jantar, feito a gosto no aconchego
do “lar”, com produtos biológicos previamente
encomendados na recepção.
Natureza e arte
O tempo corre tranquilo em San Cassiano,
entre os dias passados nas pistas, as refeições
“domésticas” e serões junto à lareira no Lagació.
Ao entardecer, um copo no bar permite
Prova de slalom masculino
na Gran Risa; cavalos de
uso turístico; o restaurante
de comida ladina Maso
Runch-Hof e a telecadeira
Planac. Na pág ao lado, as
impressionantes Dolomitas
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Onde comer
Ristorante St. Hubertus – Hotel & Spa Rosa Alpina,
Strada Micura de Rü, 20, San Cassiano; tel. 0039 0471
849 500; www.rosalpina.it; www.n-n.it
Fica situado no Hotel & Spa Rosa Alpina, membro da rede
Relais & Châteaux, e o Guia Michelin atribuiu-lhe duas das
suas cobiçadas estrelas. O preço médio de uma refeição
é de €100 sem vinhos. O menu de degustação, com sete
pratos, custa €150 sem bebidas.
Compras
Delizius – San Cassiano; tel. 0039 0471 840 155
www.altabadia.it/delizius
Para adquirir excelentes produtos regionais, desde pastas
a queijos e chouriços, cogumelos, vinhos e bebidas
destiladas. É uma verdadeira tentação.
Quem segue os ditames da Natureza não precisa
de receitas, diz Norbert Niederkofler, chef do St.
Hubertus, com duas estrelas Michelin
San Cassiano
ao entardecer. Na pág
ao lado, o chef Norbert
Niederkofler, uma
das suas sobremesas e o
restaurante St. Hubertus,
além de uma árvore
insólita a 2000 metros
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aprofundar conhecimentos sobre a vida
de antigamente na montanha.
Não era fácil. A Alta Badia vivia isolada do
mundo, sendo apenas acessível a pé. Os produtos
alimentares, por exemplo, eram os cultivados
pelas famílias, pouco variados, e daí resultou uma
gastronomia pobre, assente em ingredientes
como a carne de porco, cogumelos, favas,
espinafres, leite e derivados. Os doces reflectem
a localização geográfica, sendo tão popular
o austríaco strudel como o italiano tiramisù.
Hoje o panorama é muito diferente. San
Cassiano, afinal um pequeno paese perdido
do mundo, possui um par de restaurantes
galardoados com estrelas Michelin: La Siriola fica
na saída da povoação, a caminho de Cortina,
mas o St. Hubertus é praticamente ao lado
do Lagació, pelo que não há desculpa para não
ir conhecer as criações de Norbert Niederkofler.
Criações é como quem diz. O chef tem uma
máxima curiosa: “quem segue os ditames
da Natureza não precisa de receitas”. No mesmo
caminho segue a sua opinião quando se fala
de cozinha e arte. Não se vê como artista,
acrescentando ironicamente que na arte
contemporânea não se percebe nada…
Reconhece que as ousadias do espanhol Ferran
Adrià, a maior referência no meio, são de génio,
mas defende que é preciso voltar às origens, aos
alimentos tal como são. Aprecia a Natureza,
portanto acredita que é errado mudá-la.
São considerações a ter em conta uma vez que
Norbert, italiano, trabalhou durante uma dúzia
de anos com chefs detentores de estrelas em vários
países, e que possui duas desde 2006.
O seu método tem regras simples. Usa grandes
matérias-primas da região, adquiridas junto
de pequenos produtores, com os quais desenvolve
relações pessoais, recorre às técnicas actuais para
tirar o máximo partido dos alimentos sem
os alterar e só associa, no máximo, três sabores
pois o palato não consegue apreciar mais. Pessoa
especial, diz que a melhor cozinha é a que se faz
em sua casa, porque partilhada em família ou
com amigos. Em Portugal é fã do Vila Joya, no
Algarve, que visita frequentemente e recomenda.
Ao provar os seus pratos constata-se que pode
estar enganado, parecem mesmo uma forma
de arte. É comer para crer. FEVEREIRO 2010
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