Brazilian Film Directors

Transcrição

Brazilian Film Directors
Transcribed from the original articles by Andrew Nunes for Dr Traci Roberts-Camps
Brazilian Film Directors
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Monique Gardenberg
19 Tizuka Yamasaki
34 Carmen Santos
38 Gilda Abreu
42 Suzana Amaral
44 Ana Carolina Teixeira Soares
107 Additional Information
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MONIQUE GARDENBERG Direção
Roteiro
Direçao musical
Sobre a adaptação
“Antes mesmo de ler pela primeira vez o livro do Chico Buarque, eu ouvi a descrição da cena em
que Benjamim Zambraia encontra uma ponta de cigarro manchada de batom no banheiro
masculino e aquilo detona o quebra-cabeça das suas memórias. Sempre me interessei por histórias
que começam assim, de um detalhe casual que desperta a curiosidade e acaba desenvolvendo todo
um mundo da imaginação. Mesmo no dia-a-dia, estou sempre ligada nesse tipo de observação, que
me destaca um pouco da realidade circundante. Acho que foi justamente isso o que me levou a
fazer cinema.”
“Inicialmente, guardava muita reverência em relação ao Chico Buarque e ao Jorge Furtado, meu coroteirista, figuras que sempre admirei profundamente. Escrevi sozinha o primeiro tratamento do
roteiro, que seria depois aprimorado juntamente com o Furtado e o Glênio Povoas. Mas só percebi
Benjamim como um filme pleno quando comecei a “desrespeitar” o original literário. Eu quis fazer
um Benjamim com as emoções à flor da pele. Alguém que mantém uma certa dignidade apesar da
aparente decadência.”
“Ao contrário de Jenipapo, meu longa anterior, que era um roteiro original de minha lavra, agora
estava lidando com material alheio. Nesses casos, acho importante trabalhar o material até ele se
tomar um pouco meu também. Colocar um pouco de mim em cada personagem até tornar tudo
mais próximo. Levei quatro anos para escrever a adaptação, levantar a produção e fazer o filme. Foi
tempo bastante para conquistar certa autoria, e a segurança decorrente. Porque a certeza vem da
autoria.”
“Não me senti intimidada pelo eixo marcadamente masculino em que o livro é narrado. Jenipapo
era um filme sobre homens. A paixão, o desejo de entrega total, não têm sexo. Lembro-me de ter
dito ao Chico Buarque, logo no início: ‘Benjamim sou eu’. Conheço bem essa mania de observar as
pessoas e deixar-se transportar pela imaginação.”
Sobre as filmagens
“Algumas pessoas liam o roteiro e achavam de difícil compreensão. Mas eu tinha certeza de que,
quando chegassem as imagens, tudo iria ficar mais claro. Não se pode ter medo do risco quando se
acredita numa história. Durante as filmagens, não recorri a storyboard e só raramente fiz listas de
decupagem prévia. Minha maior preocupação era com o tom de cada cena. Encontrado o tom, era
só comunicá-lo à equipe e dar liberdade para cada um criar dentro daquele tom. Estava
trabalhando com profissionais talentosos, muitos com experiência bem maior que a minha. Tinha
que ver o que eles iriam trazer para o filme. Isso não diminuía em nada a minha autoridade ou a
minha autoria.”
“Para dar conta de uma história do amor em dois tempos, separados por longos 30 anos, eu e o
diretor do fotografia Marcelo Durst escolhemos uma gramática bem definida: as cenas do passado
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foram filmadas em linguagem clássica, com película positiva Ektachrome revelada como negativo,
daí resultando cores explosivas e uma certa granulação que evocam a nostalgia do um tempo do
glamour e inocéncia. O presente é mais frio, nervoso e instável, com muitos planos-seqüência e
câmera na mão. Iso contraria certos cánones narrativos, que costumam atribuir a ausêncla do cor
ao passado. Mas foi essa dsitinção fundamental que orientou todos os setores da equipe, sendo em
boa parte responsável pela unidade que o filme possa apresentar.”
“o choque passado-presente repercute na trilha musical, que evoca as predileções do jovem
Benjamim. Aqui me inspirei na prática do sampling, que consiste em so apropriar da emoção de um
tempo mental, através da música, para impregnar o quo se quer contar. Por conta disso surgem
Elvis Presley, Chet Baker, The Platters, Jacques Brel, Eumir Deodato, Gerry Mulligan e Astor Piazzolla.
Já a música do presente é basicamente eletrônica, com a especial contribuição do Arnaldo Antunes
e Chico Neves”
“A relativa escassez de diálogos no filme levou-me a utilizar muita música nas filmagens. a um de
auxiliar no aquecimento emocional. Esse é um método que não dispenso nem mesmo para botar
minhas idéias no papel. Enquanto escrevia o roteiro de Benjamim, ouvia constantemente Roberto
Carlos, The Temptations. The lsley Brothers, Bill Withers etc. O ato do ouvir música repetidamente e
em alto volume nos retira progressivamente do estado de consciência e nos leva para algum lugar
próximo do sonho acordado. Ficamos em sintonia direta com as emoções.”
“Benjamim tem o material dos meus sonhos do ficcionista: tragédias que acontecem a partir de
atos impensados, vidas duplas, pessoas que caminham para um destino sem se dar conta
totalmente. Curto-circuitos. Talvez por isso o dirigi com tanta naturalidade, como se a câmera fosse
uma extensão do meu próprio braço. O fume estava na minha respiração, era uma coisa orgânica.
Parecia nascer já com a sua linguagem.”
Sobre a equipe
“Desde que comecei a refletir sobre a adaptação, escrevi num caderno de notas: ‘Esse filme terá
que ficar a um palmo do chão’. Ou seja, o eixo narrativo, que são os olhos e o pensamento do
Benjamim mais velho, deveria estar levemente descolado da realidade. Essa escolha se manifestou
nas filmagens, mas foi se definir principalmente na finalização. A montagem do João Paulo Carvalho
e a edicão sonora do Beto Ferraz, ambas altamente criativas, deram o diferencial necessário. Tudo é
regido pela mente de Benjamim, em seu vai-vem pelo tempo.”
“No elenco, pude contar com a inteligência e a suave maestria do grande ator Paulo José, que
soube criar um Benjamim humano e patético nas medidas perfeitas. Em Danton Mello, encontrei
uma profunda compreensão do seu difícil papel e um talento que está patente na tela. A Cleo Pires,
com sua grande sinceridade nas emoções, superou a inexperência e demonstrou ser uma atriz de
mão cheia, numa performance dupla, cheia de enormes desafios.”
“Dediquei o filme a memória da minha irmã, Sylvia Gardenberg (1960-1998), porque,
independentemente do desenrolar da história, eu e Benjamim Zambraia tínhamos motivações
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semelhantes. Eu dividia com ele as sensações, o sofrimento e a felicidade das lembranças de
alguém que se amou muito e se perdeu.
Benjamim é o segundo longa-metragem de Monique Gardenberg, segundo-se a Jenipapo (1996),
com Henry Czerny e Patrick Bauchau, exibido no Festival de Sundance de 1996. Ela estudou cinema
na Universidade de Nova York, onde rodou seu primeiro curta, Day 67. Dirigiu, ainda, o premiado
curta Diário Noturno (1993), diversos videoclipes e dois filmes musicais com Caetano Veloso,
Cabeleiro de Fina Estampa (1996) e Prenda Minha (1999), ambos exibidos na televisão brasileira e
lançados em DVD. Monique é uma das fundadoras da Dueto Produções, empresa que nos últimos 20
anos realizou inúmeros megaeventos musicais de repercussão nacional e internacional, além dos
consagrados Free Jazz Festival, Carlton Dance Festival e Carlton Arts. Em 2002, estreou como
diretora teatral com o espectáculo multimidia Os Setes Afluentes do Rio Ota, indicado para o Prêmio
Shell em cinco categorias.
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Jenipapo
a film by Monique Gardenberg
A reporter forgets his journalist ethics and triggers a process that will change his life
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Um padre que denuncia o drama de quem não tem terra
Um jornalista em busca de sua grande reportagem
Henry Czerny
Patrick Bauchau
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Jenipapo – Distribuição: Rio filme | Praça Floriano 19, 14º andar | Cep 20 031 050 Rio de Janeiro
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Cinema --‘Benjamim’, uma 3x4 da Saudade
Bianca Tinoco
Monique Gardenberg confessa; sim, “Benjamim” é seu canto de despedida para a irmã Sylvia, morta
em 1998, a quem ela dedica o filme. A dificuldade de aceitar essa falta é justamente o que une a
diretora ao personagem Benjamim Zambraia (Danton Mello quando jovem, Paulo José na
maturidade), um ex-modelo atormentado pelo fim de sua amada. No filme, enquanto Zambraia
tenta recuperar o passado, Monique procura exorcizar o seu, tendo o enredo de Chico Buarque
como impulso.
É até engraçado que com tantas canções de partida escritas por Buarque. Monique Gardenberg
tenha escolhido um livro do compositor para traduzir seu sentimento. Desde que leu o romance
“Benjamim” (1986), por indicação de um amigo, a diretora passou a identificar-se com a
desorientação da protagonista. Em plenos anos 80, Benjamim acredita ver na vendedora de móveis
Ariela Masé (Cleo Pires) a materialização de sua musa Castana Beatriz (tambem Cleo), assassinada
pela ditadura militar.
-O Benjamim é nostálgico, vive nas memórias de um tempo que passou, mais glamouroso, cheio de
graça e ingénuo – conta Monique. “Acima de tudo, procurei expressar minha enorme saudade, que
não diminui com a o passar do tempo, como acontece com Benjamim. Talvez por isto o filme seja
tão visceral. É um grito de amor pela pessoa querida que perdi do inicio ao o fim”, avalia.
Enquanto Cleo Pires personifica o objeto de desejo, numa interpretação que lhe valeu o prêmio de
melhor atriz no ultimo Festival do Rio, Paulo José vive o grito de Monique, um Benjamim drenado
por um amor impossível de extravasar. “Paulo foi um grande presente, imprimiu uma melancolia na
alma do personagem. Mesmo quando está contente ou em ação, algo é corrói”, diz a diretora.
Durante a elaboração de roteiro, que durou quatro anos, Monique Gardenberg procurou se
prender as indicações de Chico Buarque mostrando ao escritor todas as versões do script
desenvolvido com Jorge Furtado e Glênio Póvoas. Houve um momento, no entanto, em que ela
precisa se desvencilhar até do autor para encontrar uma leitura particular.
-O Chico não tinha apego às cenas, queria que o filme tivesse vão proprio, que existisse com toda a
liberdade. Mas não é fácil desrespeitar Chico Buarque, mesmo quando ele próprio incentiva isto diz Monique
O toque de transgressão da diretora entrou em cena por meio de elementos como a sonorização,
que sublinham a atmosfera rarefeita. A escolha da trilha sonora, com Arnaldo Antuner e Chico
Neves, é mais uma homenagem a Sylvia Gardenberg parceira de Monique na produção do Free Jazz
Festival ate o fim da vida. “Esse filme é sem duvida, em encontro com ela”, reforça a roteirista e
diretora..
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Benjamim (Paulo José) observa Ariela protagonista persegue susta da amada
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Cléo Pires como Areila: Ela também interpreta a modelo Castana Beatriz
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A agência de propoganda Ogilvy parabeniza a equipe do filme pelo belo trabalho
“Benjamim resultou num belo filme. A atuação de
Paulo José no delicado papel do protagonista é
primorosa... Benjamim provoca um encanto
retardado, o que o aproxima da boa literatura”
Fernando de Bartos Silva – Folha de São Paulo
“O filme de Monique Gardenberg esbanja beleza
tanto na cuidadosa fotografia de Marcelo Durst...
quanto na armação harmônica de soluções
narrativos. E que delicia é ouvir uma trilha curtefossa que junta Sérgio Reis a The Platers.”
Rodrigo Fonseca – Jornal do Brasil, Revista
Programa
“Cleo Pires tem o trabalho mais dificil do filme, e o
faz de forma irrepreensível, (o filme guarda) uma
fidelidade não propriamente ao romance mas a
um cinema sem afetação. Monique Gardenberg
simplesmente toma a benfazeja liberdade de
contar um belo caso de desventura.”
Hélio Ponciano – Revista Braso
“Qualidade da realização é a marca do adaptação
feita por Monique Gardenberg.”
Luiz Zunin Oricchio – O Estado de São Paulo
“A atuação cativante de Paulo José, a surpresa de
Cleo Pires e a habilidade da diretora Monique
Gardenberg para montar o quebra-cabeças de
Chico Buarque fazem valer a sessão.”
Rubio Mazzim – O Dia
“Interpretações e imagens são de encher os olhos.”
Motiana Peixota – Estado de Minas
Benjamim
Classificação Etária: 14 anos
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Cleo rouba a cena
Bruno Porto (Cinema Crítica)
Benjamim—Baseado no livro de Chico Buarque, o segundo longa-metragem de Monique
Gardenberg conta a história de Benjamim Zambraia, um ex-modelo que um dia encontra um moça,
Ariela Masé, que se parece muito com a única mulher que ele amou. O solitário Benjamim se
apaixona por ela e tenta acertar as contas com o passado.
Durante todo o filme, ele observa Ariela com um olhar embasbacado. Quem assistir ao longa
dificilmente reagirá de outra forma à presença na tela de Cleo Pires, que vive a inexperiente Ariela e
é a grande atração de “Benjamim”.
A desenvoltura da estreante Cleo, que também vive a rica e politizada Castana Beatriz, o grande
amor de Benjamim (interpretado por Paulo José na velhice), é impressionante. Se a belíssima filha
de Glória Pires tirou de letra o desafio de debutar no cinema fazendo dois papéis, Monique
Gardenberg não se saiu tão bem na (difícil, vale ressaltar) tareia de adaptar “Benjamim”.
O principal problema do filme é ritmo irregular. “Benjamim” começa bem, mas aos poucos vai
ficando arrastado. Só nos últimos dez minutos Monique consegue botar o filme de volta nos trilhos.
Outro problema são alguns trechos do livro que ficaram confusos na tela. A cena da gincana é um
exemplo. Danton Mello vive o Benjamim jovem. Guilherme Leme (ótimo), Chico Diaz, Rodolfo
Bottino, Nelson Xavier e Mauro Mendonça também estão no elenco.
Castana Beatriz (Cleo Pires) e Benjamim jovem (Danton Mello)
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A diretora prepara breve o longa ´Um grito de amor´, protagonizado por Camila Pitanga
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Lux Jornal, O Estado de S.Paulo, 19 Out 1996
“A gente não sabe o que é o Brasil”
Para Tizuka Yamasaki, se existe alguma coisa que pode lhe espantar como cineasta, está aqui
Carlos Alberto de Mattos
Rio – Na continuação da entrevista, Tizuka Yamasaki analisa seu trabalho na televisão. Xuxa, o cinema
nacional, o governo FHC e fala de seus próximos projetos.
Estado – Como você analisa o seu trabalho na televisão?
Tizuka Yamasaki – Eu sempre acho que estou na televisão de passagem, mas já se vão dez anos desde
que fiz O Pagador de Promessas. O Daniel Filho me levou – ou me aceitou – na TV Globo para trazer um
olhar diferente. Eu demorei a me familiarizar com o ritmo rápido de produção da TV, mas me agarrei á
experiência que tinha com o cinema. Em O Pagador de Promessas, eu queria mostrar a cara do sertanejo
nordestino, sulcada pela fome e pela seca . Pedi ao iluminador “luz a favor” para marcar bem aquela
cara que parecia a terra seca. Isso era agressivo, era a verdadeira subversão na Globo. Na minha
ingenuidade, eu queria a verdade fotográfica, que era mais cruel e contundente que o texto, as imagens
ficavam com sua crueza.
Estado – E de lá para cá?
Tizuka – Depois fiz Kananga do Japão, fui chamada para consertar Amazónia, fiz mais recentemente A
Madona de Cedro e curti muito a dirigir o Você Decide. É um programa em que você tem de se ausentar
como diretor autoral. Quanto mais simples fizer, mais facilmente o público vai compreender. Foi um
exercício muito bom de humildade e de contato direto com o público.
Estado – Em 1986, você enfrentou a censura por causa da questão da terra em O Pagador de Promessas.
Hoje O Rei de Gado é sucesso com esse tema. O que mudou nesses dez anos?
Tizuka – O País é que mudou. A Globo muda conforme o desejo do País. Ela vai correndo atrás de ibope.
Em 1986, havia a Constituinte, discutía se a reforma agrária. Era proibido falar de sem-terra querrendo
terra. Hoje, até as crianças falam sobre as invasões.
Estado – Então, não é o País que muda conforme a Globo?
Tizuka – A Globo influencia, claro, mas não é ela que muda o País. Ela tem a inteligência de saber até
onde pode ir.
Estado – Você é craque em antecipar temas. Foi assim também com Gaijin, que antecipou no cinema
brasileiro a questão do multiculturalismo.
Tizuka – Na época, no Brasil como no Japão, as pessoas me desaconselhavam a tocar no tema da
imigração. Depois que eu fiz Gaijin, a TV Bandeirantes fez Os Imigrantes, surgiu aquele personagem
armênio da Aracy Balabanian no Globo. Enfim, o Brasil descobriu que não era só de brasileiros, não era
só de negros e índios, mas também dos imigrantes europeus e asiáticos.
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Estado – Eu faria uma análise de que você é uma cineasta que foi para a televisão a acabou engolida por
ela. Você concorda que Fica Comigo reflete o seu trabalho com a linguagem e a estética da TV, ou seja, o
“falar fácil” que você tanto persegue?
Tizuka – Sim foi engolida suma boa. Eu ouço isso desde Gaijin, porque naquela época eu já tinha feito
programas sobre cinema para a TV Educativa. Eu sempre gostei do close. Agora, o engraçado é que
quando eu comecei na televisão, eu era a cineasta que só gostava de planos abertos. Mas a estética é
sempre conseqüência do que você quer falar . Em Fica Comigo, eu pensei : qual é o assunto, qual é a
emoção que na TV não seriam aceitos ou compreendidos? Quem sai de casa para ir no cinema não quer
encontrar o mesmo que vê na TV. Quem manda é uma mescla do público e da criatividade e ousadia do
cineasta. Nós fizemos uma sessão do Fica Comigo para 800 crianças de 12 a 17 anos e no princípio era
uma algazarra total. Eu fiquei em pânico porque parecia que eles não iam ouvir os diálogos. Depois
cantaram junto com o filme. Dali a pouco estavam participando aos berros ou, então, fazendo silêncio
total nos diálogos mais importantes, Isso confirmou a minha convicção de que essa geração não tem
filme para ver. Não tem filme que fala do seu cotidiano, das coisas em que eles acreditam.
Estado – Como mãe, você recomenda a Xuxa para os seus filhos?
Tizuka – Eu não recomendo nada. Cada um gosta de uma coisa. A única herança que quero deixar para
eles é a independência de lutar pelo que querem e acreditam.
Estado – Mas, só participar da confecção do produto Xuxa, você o está avalizando como artista. Você
recomenda aquele modelo de produção e consumo para o público infantil?
Tizuka – Eu tenho a maior admiração pela Xuxa. Essa mulher tem alguma coisa de especial. Tem um
carisma muito grande e influencia muita criança, até mesmo meus filhos. Ela foi a primeira a se
apresentar no mesmo tom do público infantil. Até então era a vovó, o palhaço etc. Ela disse para as
crianças: “Eu sou igual a você, brinco igual a você, chuto de volta se você me chutar e ainda por cima sou
bonita e gostosa”. Ela é assim naturalmente. As crianças sacam essa naturalidade, daí nasce a
cumplicidade. Ora, eu, que trabalho com comunicação, não posso ignorar essa pessoa. Não me importo
com a opinião dos intelectuais. Eles até hoje me mostraram que têm uma prática distinta dp discurso. A
maioria dos intelectuais brasileiros é colonizada. Eles têm um discurso lindo de morrer, mas na prática
do trabalho e na vida pessoal são conservadores, caretas e opressores.
Estado – Por que você se exclui quando se refere aos intelectuais? Você também trabalha com cultura e
ideias...
Tizuka – Minha formação não é de intelectual. Eu lí poucos livros, ví poucos filmes, Com essa vida de
cuidar dos filhos e fazer cinema e televisão, eu acabo não tendo muito tempo para pensar. Um artista
plástico já disse que eu só penso com as mãos. Eu penso fazendo. Primeiro eu faço o filme, depois eu
reflito. Não conflito naquilo que se diz, mas no que se faz.
Estado – Isso tem que ver com o uso da língua, Como você se posiciona no debate sobre o uso do inglês
em filmes brasileiros?
Tizuka – A questão da língua é complicada para mim. Toda vez que eu me atenho a lingua japonesa,
tenho dificuldade para voltar à língua português. Mas isso não me faz sentir mais brasileira ou menos
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brasileira. O que determina a essência cultural de uma pessoa não é a língua, mas o seu comportamento,
o gestual, o jeito de olhar. É a mesma coisa com os filmes.
Estado – Patriamada falava de restauração do amor pela pátria. Como anda esse sentimento hoje, em
época de multiculturismo e globalização?
Tizuka – Eu levei 30 anos para provar que sou brasileira e não gostaria de trocar minha carreira no Brasil
por um novo começo nos Estados Unidos ou na Europa. Depois, eu não creio que esse lugares e menos
ainda o Japão tenham algo de importante para me oferecer. Se existe alguma coisa de interessante que
poosa me espantar como ser humano é aqui no Brasil. O desafio que me coloco é de passar o resto da
minha vida mostrando o País fantástico que é o nosso. Eu olho para a minha avó e digo “graças a Deus
que você veio parar no Brasil”. A Internet? Eu sou meio antiga nesse assunto (rissos). Eu me emociono
com o Hino Nacional, embora nacionalmente o ache horrível. E, nos meus filmes, eu estou sempre
voltando `questão de discutir o Brasil.
Estado – Você está satisfeita com o governo que ajudou a eleger?
Tizuka – Acho que a gente está sempre culpando o governo. É claro que houve casos cruéis e escalávros
na época ditadura, mas não acho que os governos sejam muitos diferentes entre sí. O que falta é mais
responsabilidade da nossa parte. Só quem está dizendo o que quer é o Movimento dos Sem-Terra e um
pouco o operariado. Mas a classe média não está se manifestando. A grande perda do Cinema Novo foi
de porta-vozes. A gente tinha o Leon Hirszman, o Joaquim Pedro de Andrade, o Gláuber Rocha, o Nelson
Pereira dos Santos. Hoje só ouvimos a voz do Cacá Diegues e do Arnaldo Jabor, que aliás precisou sair do
cinema para ser ouvido. A categoria artística perdeu os portes-vozes que expressavam o nosso desejo.
Nós estamos para ficar cobrando política e posições dos dirigentes. É muito facil criticaar. Mais dificil é
oferecer um plano de trabalhar e dizer o que cada um pode dizer o que cada um pode fazer. O Fernando
Henrique é uma pessoa compentente, que pensa o Brasil e sabe ouvir. Tem tido erros e acertos, mas a
gente precisa se articular para não deixar ele fazer sozinho.
Estado – Como é essa história do artista porta-voz?
Tizuka – Eu acho que os artistas expressam a vontade do povo. A gente tem uma sensibilidade maior
para traduzir o que está ocorrendo em volta
Estado – Será uma sensibilidade maior ou um acesso maior aos veículos?
Tizuka – Não é só acesso. Nós fomos treinado para perceber melhor aquilo que o oficial não vê, ou seja,
aquilo que não está na pauta do Congresso, nas páginas do jornais, nas medidas provisórias do governo,
etc. Essa é a função do artista. No Fica Comigo, por exemplo, eu não queria traduzir o que dizem as
ONGs ou as assistente sociais sobre o imaginário, aquilo que move uma pessoa a viver ou a morrer.
Estado – Onde foi parar o seu projeto de fazer um filme sobre Santos Dumont?
Tizuka – Estou retomando. A imagem conhecida é a do Santos Dumont velho. Eu quero mostrar um
jovem de 18 anos que foi para Paris e fiz uma revolução. O primeiro balão dele, que se chamou Le Brésil,
contrariava todas as pesquisas da época. O Brasil já apareceu internacionalmente pelo seu cinema, sua
música, seu futebol, mas nunca por um avanço tecnológico, Santos Dumont representa isso. Os Estados
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Unidos bancaram na mídia os irmãos Wright, mas quem voou primeiro com o mais pesado que o ar foi o
Santos Dumont. O roteiro está pronto o existe um potencial interesse dos empresários pelo projeto.
Estado—O filme vai ser uma afirmação patriótica?
Tizuka – Não. Eu vou trabalhar essa provocação, mas quero mostrar o garoto que sai do interior de São
Paulo com uma crença infantil que se expressava numa brincadeira. Os garotos gritavam: “Pombo voa?
Voa. Gato voa? Não. Homem voa?” E o Santos Dumont gritava: “Voa!” Quantos homens não morreram
acreditando nisso? Ele acreditou e voou. Foi o Ícaro, ou melhor, o Dédalo que deu certo.
Estado – Mas antes disso tem o Gaijin II, não é?
Tizuka – A gente nunca sabe que filme vai fazer primeiro. Vai ser aquele cujo contrato eu assinar
primeiro. Ainda estou levantando dinheiro para fazer o roteiro. Até agora só tenho garantido um apoio
do IDC, uma companhia telefónica Japonesa que fatura alto com as ligações dos dekassegui para o Brasil.
Estado – Como você está pesquisando a realidade dos dekassegui?
Tizuka – Eu estive com as lideranças deles lá no Japão. Agora, 16 anos depois de Gaijin, eles estão
compreendendo o que eu percebi na época: que não são japoneses, mas brasileiros. Lá eles têm as
qualidades normalmente associadas aos japoneses: são responsáveis, trabalhadores, aptos as progresso,
etc. Mas os japonese mesmo já não querem trabalhar ou estudar tanto. Eles estão em outra. Eu quero
explorar essa ambigüidade no filme. No ano que vem serão comemorados os 90 anos da imigração
Japonesa no Brasil e os dekassegui estão pedindo que eu conte a história deles, assim como contei a de
seus avós. Tudo o que o ser humano quer, desde a era das cavernas, é que a sua história li que registrada
em algum lugar.
Estado – Quais serão as conexões entre Gaijin II e o primeiro filme?
Tizuka – A neta de Titoe (protagonista de Gaijin) vai ao Japão procurar o marido dekassegui que
desapareceu por lá. Mas ela tem uma segunda missão, levar as tranças da avó para, segundo seu desejo,
enterrar no Japão.
Estado – Afinal, Gaijin foi exibido no Japão?
Tizuka – Só em festivais. Os Japonese rejeitam o filme porque não lhes interessava mostrar esse período
triste da história japonesa. Eles se envergonham por não terem conseguido segurar aqueles
trabalhadores lá.
Estado – Bem, Tizuka, já tomei muito o seu tempo.
Tizuka – Antes de terminar eu quero fazer um registro. O Fica Comigo me abriu os olhos para várias
coisas. Primeiro, eu não ganhei nenhum Prêmio Resgate (a verba remanescente da extinta Embrafilme
que seria depois distribuída entre novos projetos). Houve até quem no Itamaraty considerasse meu filme
prejudicial à imagem do País. Depois entrei com o projeto na UIP (distribuidora americana) e mais uma
vez perdí porque o Ministério da Cultura negou uma prorrogação, coisa que até o futebol dá. Acabei
fazendo o filme com dinheiro do Pólo de Cinema do Espirito.
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Lux Jornal, O Estado de São Paulo, 19 Out 1996
Tizuka Yamasaki dá recado a adolescentes
‘Fica Comigo’, em cartaz no Rio, é em filme em que ela quis defender os pontos de vista dos pais e ao
mesmo tempo conversar com os jovens, mostrar a eles que os adultos não são tão idiotas quanto eles
pensam
Carlos Alberto de Mattos Especial
Rio- Nesta entrevista ao Estado, concedida entre chopes e shushis num restaurante japonês sugerido
por ela na Zona Sul do Rio, Tizuka Yamasaki dá sua receita de um cinema popular e critica a falta de
canais de comunicação entre os filmes brasileiros e o publico. Elogia o presidente Fernando Henrique e
mais ainda, a primeira-dama Ruth Cardoso. Mas principalmente fala de seus filhos, sua vida, que se
misturam com seus filmes. Aos colegas cineastas ela conclama com o espesso significado da expressão
Fica Comigo. «Já tive fama de brigona, mas agora eu sou de paz e é o momento de ficarmos juntos»,
convida com a ingência de quem conhoce bem as inconstâncias do cinema brasileiro.
Estado: O que você quer dizer aos adolescentes com Fica Comigo?
Tizuka Yamasaki – Eu queria fazer um filme defendesse os pais. Afinal, eu sou mãe de três filhos
adolescentes.Mas eu tambem queria fazer um filme que conversasse com os adolescentes, que dissesse
a eles, «Eu não sou tão babãca quanto vocês pensam». Meus filhos morrem de vergonha de mim, me
acham careta. Tudo o que um filho quer é um pai ou uma mãe para dar um pontapé e dizer, «Eu não
acredito em vocês e vou cuidar da minha vida». O que o filme diz é o siguinte. Estou me lixando para
vocês, adultos. Nós vamos formar a nossa família. Podemos não estar preparados, mas vamos sair e
aprender com a vida.
Estado: Mas o fato de o pai do filme ser adotivo muda bastante a perspectiva disso, não é? Há uma
leitura de que a filha ouve o apelo do sangue, da família natural, embora isso acabe se revelando falso.
Tizuka- Esse apelo é uma fantasia. O que difere uma pessoa de outra e o seu imaginário, a interpretação
que dá nos fatos da vida. Quando se é criança essa interpretação é cheia de fantasias. Nó filme, aquela
familia natural de que a Bel se recorda, tão simpática, pode estar apenas na imaginação dela. Ela pode
ter construido aquilo. O Fábio, meu filho adotivo, não tem essa história, não tem as «fotografias» da
infáncia porque não tinha uma mãe ao lado. Isso dá ao ser humano um sentimento de humilhação
muito grande. É pior do que não ter casa ou bens. De qualquer maneira, o conflito com a autoridade é
sempre o mesmo, tanto faz o filho ser «barriga» ou adotivo. Mãe ou pai não é aquele que cria. O prazer
de ver um filho com a sua sensibilidade, o seu jeito de ser, é uma coisa nossa, de pai. A leitura do filho é
de que pai é aquele que está ao lado impedindo’o de fazer o que quer.
Estado – Você está mais uma vez usando o cinema para fazer sua psicanálise. Guijin resolveu o seu
problema de ser sansei. Parnhyba Mulher Macho cuidou da afirmação da Tizuka mulher. Patriamada
tratou da sua faceta de cidadã diante de um momento dedicado da vida política do País (a campanha
pelas diretas em 1984). Fira Comigo é a mãe natural e adotiva no divã?
Tizuka – Eu já fiz psicanálise, mas agora só acompanho o Fábio nás sessões dele. Na verdade, eu entrei
de gaiata nesse negócio da adoção. Achava que tudo era muito simples. O Ilya queria um irmão e
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naquele momento era mais prático adotar um. Quando o Fábio velo para casa eu quaise pirei. Foi
quando comecei a fazer análise. Passei, então, a me interessar pelo assunto. Para mim, o grande
problema da adoção não é de amor, assistencialismo, etc, mas de identidade. Esse é o assunto que eu
sempre vivi e mais discuto no filmes. A falta de identidade é o grande problema do povo brasileiro.
Ninguém sabe quem é. Sabe teoricamente, mas não assume que somos o resultado de uma
miscigenação e esse é o nosso grande barato. Eu usei recursos e argumentos para dar ao Fábio uma
identidade. Se não tem, vai arrumar uma. Se não consegue arrumar, vai discutir isso.
Estado – No filme, o pai (Antonio Fagundes) conta como escolheu Bel (Luciana Rigeura) para adotar.
Foi daquele jeito que você escolheu o Fábio?
Tizuka – Foi igualzinho. Depois de ouvir a história do Fábio, o Fagundes sugeriu que eu escrevesse
aquela cena. É o que eu acho mais emocionante. Eu fui á Escola Romão Duarte, entrei numa sala de aula
e a assistente social foi me apontando as crianças que estavam livres para adoção. Das dez crianças que
estavam alí, nove vieram se aproximando com a expectativa de que eu fosse sua futura máe. O Fábio
não deu a mínima, continuou desenhando uma árvore linda, colorida, cheia de frutos. Tem essa história
de que criança que desenha árvre com frutos é uma criança que tem alma, que se salva... Mais tarde ele
apareceu na porta do restaurante da escola, me apontou para uns colefas e começou a gritas «kung fu».
Fiquei zangada, mas quando saí dalí o rosto dele era o unico que me vinha à mente. Na segunda visita,
quando levei o Ilya para ele me ajudar a escolher o seu irmão, ele e o Fabio se apaixonaram. Depois eu
soube que ele estava recebendo alta da psiquiatria. Tinha sido rejeitado numa adoção anterior. O que
eu tenho feito é batalhar para invertar os seus valores, principalmente os que o levaram a se sentir
culpado por não merecer uma nova máe ou a felicidade.
Estado – A exemplo da Bel no filme, o Fábio também se sente atraído pela idéia de uma familía
natural?
Tizuka – Há dois anos ele quis procurrar a avó, que estaria em Belo Horizonte. Eu pedi a uma amiga que
eu levasse de carro. Lá ele percebeu que não é assim tão fácil. Isso é um problema dele, eu não tenho de
me envolver. Mas dou as condições para ele resolver. O sobrenome dele é Faria e ele ficou todo
orgulhoso de pertencer à linhagem de uma alddeia com um castelo em Portugal, conforme relato de
Roberto Farias. Quando ele fez 18 anos, dei-lhe de presente uma viagem a Portugal. Isso tudo é munição
parar ele se sentir igual aos outros. Ele está começando a escrever sobre sua vida e eu estou dando a
maior força. Eu gostaria está no lugar dele, com aquele mundo cheio de incógnitas e angústias. Isso é a
matéria-prima dos cineastas.
Estado – Fica Comigo foi exibido para o Comunidade Solidária. Você vê uma utilidade pública nesse
filme?
Tizuka – Fazer um filme exige um esforço emocional e de produção tão grande que a gente quer que ele
seja a coisa mais importante a ser apresentada na sociedade. Essa angústa do cineasta é compreensível.
Quanto ao Comunidade Soidária, eu respeito muito o trabalho da Ruth Cardoso, desde que a conhecí no
Conselho Nacional dos Direitos da Mulher. Votei no Fernando Henrique por causa dela. Então oferecí a
exibição por uma questão de interesse mútuoo. Eu ganhava visibilidade para o filme e o Comunidade
ganhava um tema interessante para discutir. Com isso, o filme adquiria um certo status porque, bem ou
mal, o brasileiro adora autoridade (risos). Eu não sou nenhuma ingénua.
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Estado – O filme paternaliza um pouco os menínos bandidos, edulcora a vida na rua. A Bel sai de casa
para um road movie de felicidade com sua nova turma. Você acha que esse é um tratamento
adequado para o tema?
Tizuka – Não é isso. Pode ter dado essa impressão, mas não é isso. O filme nasceu primeiro dessa
dificuldade de relação com o Fábio. O primeiro tratamento do roteiro, feito em 1987, se chamava
Ugentemente Me Abrace. Desde então, passei a prestar atenção no assunto dos meninos de rua. Vieram
o fenómeno dos arrastões, o massacre da Candelária, etc. En quanto eu não conseguia levantar a
produção, la repassando o texto com meus alunos de interpretação. Eles faziam pesquisas, levavam
crianças de rua para a sala de aula. E descobrimos que elas não tinham só a imagem de criança
esfomeada e aggressiva, mas tinham um humor, uma inteligéncia, uma beleza, uma poesia e uma
autoconsciéncia que nós não imaginávamos, que não apareciam na imprensa. Solicitadas a representar
o papel das pessoas que eram assaltadas na rua, elas eram completamente caricatas. Fazíam peruas
estridentes, er hilário. O fato é que elas tém da gente a mesma visão caricata que temos delas. Daí me
vejo o insight. De que a gente não está sabendo observar essas cranças de rua. No fundo, eu concluí
que elas tém da desejam as mesmas coisas que os meus filhos de classe média privilegiada desejam: se
ver livres livres da autoridade prepotente dos adultos, fazer uma grande fara e provar que tém
capicidade de se atirar no mundo. Às vezes, a gente estranha quando uma criançade rua pede dinheiro a
recusa o copo de leite que lhe oferecemos. Mas vai oferecer um copo de leite para o seu filho de 14
anos para ver se ele aceita.
Estado – Então, a brutalidade de filmes como Kids sería apenas a projeção de criadores adultos que
não conheçem de fato os adolescentes?
Tizuka – Acho que são projeções adolescentes também. Nós todos jà fomos adolescentes rebeldes.
Minha geração talvez tinha sido mais rebelde que a atual, por isso mais gente se suicidou na guerrilha,
nas drogas. A cada geração, é normal que a adolescéncia seja o contraponto da geração adulta. Mas
existe aí uma grande responsibilidade para os pais. O Darey (Ribeíro) já vem falando isso há muito
tempo nós precisamos cuidar melhor dos nossos filhotes. Existe um abismo entre nós, paos da classe
média, e nossos filhos. Eles estão roubando para comprar drogasm estão depredando, matando e se
marginalizando, enquanto nós encobrimos tudo com nosso desconhecimento com a propina para a
polícia na hora de buscar o garoto na delegacia. Nossas crianças estão abndonadas. Não tém a educação
competente como nós tivemos. Ao contrário dos meninos de rua, os nossos não tem nem competéncia
para trabalhar no tráfico.
Estado – Esse seu hábito de fazer filmes de alguma maneira figados a suas questões pessoais e, mais
que isso, assumir essa ligação, dá uma aura de verdade a sua obra, Você acha que essa mistura de
vida profissional com pessoal é uma particularidade feminina?
Tizuka – Bem, para ser reconhecida , eu usei intuitivamente o fato de ser mulher caipira, filhas de
imigrantes japoneses, sem saber direito de onde eu vim, e chegar meio ingénua, fora de qualquer patota,
nesse mundo poderoso da comunicação. Eu era meio E.T. e isso era a única coisa que me diferenciava
dentre as pessoas que eram aplaudidas e queridas. Não era apenas por ser mulher. Tudo mundo precisa
parecer igual a todo mundo para ser aceito. Mas, depois, a gente percebe que para ser querido tem de
ser diferente. Quando não cinsigo resolver um problema na minha vida pessoal, ele vira tema de filme.
Vou ganhar dinheiro com aquilo (risos). No Fico Comigo, as crianças foram assistir às filmagens,
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discutimos o assunto juntos, eu prestei mais atenção neles. Eles até criticaram o título anterior, que era
Gritos de Amor.
Estado – Detalhes da sua vida pessoal sempre fizeram parte da sua finhapública. Rótulos como “sansei”
e “mãe solteira” sempre foram destacados na imprensa. Em fevereiro deste ano, uma enchente
arruinou sua casa em Jacarepaguá e a TV Globo gravou tudo. Os jornais deram páginas inteiras com
você inventariando móveis enlameados, objetos perdidos, os cómodos devassados pelos fotógrafos.
Afinal, onde começa a sua privacidade?
Tizuka – Defender a privacidade dá muito trabalho. Eu até já me preucupei mais com isso, mas nã sei
direito como essa exposiçao acaba acontecendo. No episódio das enchentes, eu pedí que ligassem para
a Globo e avisassem que a gente estava ilhada alí. Era só um jeito prático de de avisar que nós
estavamos vivos. Mas um vezinho me acusou de estar usando a imprensa para aparecer. Foi quando eu
entendí que precisava tomar mais cuidado com isso. Agora, o que eu tenho botado para fora é apenas
meia intimidade. Há um departamento pessoal que não está exposto. São minhas angústias, meus
medos mais íntimos. Se um día eu conseguir colocar isso para fora em forme de filme, esse cinema vai
me satisfazer. Mas aínda não sei se farei esse ato de coragem. Será que valerá a pena tomar isso público
ou será melhor manter como um segredo meu? O artista que conseguir espressar sua intimidade mais
profunda será eterno. Mas tenho dúvidas se quero ser uma verdadeira artista.
Estado – Você poderia adiantar algum dessos temas que ainda não teve coragem de abordar?
Tizuka – Tudos os temas se prestam a expressar a nossa intimidade. O que importa é a abordagem. A
graça da piada é a maneira como é contada. Já roubaram temas meus e o resultado foi completamente
diferente do que eu faría.
Estado – Cite um exemplo.
Tizuka – Em 1986, apresentei à Globo e à Manchete o projeto de uma aventura com uma equipe
mínima e um casal de atores rodando o lirasil e dramatizando histórias e conflitos que a gente
encontrasse no caminho. A idéia era bárbara em nivel experimental. E era uma grande forma de
conhecer a l`ais. Acabou surgindo depois a novela Ana Raío e Zé Trordo, cujo resultando não tinha nada
a ver com a minha idéia original. Então, eu não me peocupo com temas.
Estado – Você acha que o cinema brasileiro atual se encaixa no seu conceito de cinema popular?
Tizuka – Mais ou menos. Acho que o problema não são os filmes mas os canais de comunicação com o
público. Para o lançamento do Fica Comigo, foi deficil descobrir os melos de avisar aos adolescentes que
tinha um filme para eles nas telas. O Paulo Emílio (Sailes Gomes) já disse que todo filme tem um público
compativel com ele. O grande lucro dessa nova saíra de filmesé a diveridade de enfoques e o potencial
de comunicação com públicos tão diferentes. O que falta são canais de divulgação. Meu filme de menor
público, Patriamada (1984) teve 650 mil espectadores e me deu vergonha na época. Hoje sería um
grande sucesso. Gaijin (1986) vendeu 1,2 milhao de ingressos e foi pouco na ocasião. Lua de Cristal
(1990) vendeu quase 5 milhões. O que aconteceu de lá para cá? Alguma coisa está errada e não é com o
filme brasileiro. Não dá mais para diger que o som é ruim. Os técnicos de som de cinema são muito
melhores de que os da televisão e ninguém reclama da TV. O preconceito é arraigado, é antigo, é mau.
O público brasileiro tem vergonha de si mesmo e de que faz.
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Estado – Cinema popular seria, no fundo, é televisão?
Tizuka – Não. O cinema para mim é uma produção independente que tem de ser cada vez mais criativa
e original, trazendo dados que a TV não dá. Cinema é o alternativo, a forma contandente de pensar
sobre o país, são as emoções mais escondidas. O cinema tem de ser subversivo em termos de idéias e
sentimentos. É isso o que o público espera encontrar na cinema. Esse é o cinema popular.
Estado – Você acha que resolve bem isso, sendo uma espécia de operária na TV e autora no cinema?
Tizuka – Sou operária nos dois meios. Eu hoje conheço bem os meus limites na TV, sei quanto amor ela
aceita e quanto rejeita. No cinema eu compenso aquilo que não posso dar na TV. Mas faço ambos com
igual carinho. Por isso, as equipes da TV me adoram. Todo mundo quer trabalhar comigo. O que eu
quero é ser diretora. De qualquer coisa (risos).
Tizuka Yamasaki: “A gente não sabe observar as crianças de rua”
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´Fica Comigo´: “Problema da adoção não é amor, mas identidade”
Antonio Fagundes e Luciana Rigueira, em cena: pai e filha adotiva
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“O artista que expressar sua intimidade mais profundo será eterno”
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Lafayette Cunha, 1925 – Arquivo Cinédia
Carmen Santos. Uma das maiores personalidades femininas do Cinema Brasileiro
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Carmen
- Foi por preconceito que os três primeiros filmes de Carmen Santos como atriz nem chegaram às telas:
o ciumento pai do filhos dela sumiu com todas as cópias. Quando ela finalmente estreou, em Sangue
Mineiro, de Humbertro Mauro, em 1929, o crítico Pedro Lima reconheceu-lhe o talento, mas não
aceitou “a mulher amasiada”. De preconceito, Carmen Santos chegou lá. Depois de trabalhar como atriz,
virou produtora, criou a Vita Filmes e, por fim, tornou-se uma cineasta total, escrevendo, produzindo,
intrpretando e dirigindo Inconfidência mineira. Esta façanha pioneira cusou-lhe sete anos de trabalho
(de 1941 a 48). Tinha apenas 48 anos quando morreu, em 1952.
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Gilda De Abreu. Atriz de Bonequinha de Seda e diretora do grande sucesso O Ébrio
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Gilda Abreu, a estréla de opereta, libretista de “Mestiça”, vedeta do filme “Bonequinha de Seda” e
hoje consagrada como diretora cinematográfica, tendo realizado “O Ébrio” e ora dirigindo “Pinguinho
de gente”
Revista “Armário da cara do Artista” - 1947
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Suzana Amaral
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Mai 1989
Cinema
Trilogia de Ana Carolina
Em busca de uma identidade feminina
A trilogia complea de Ana Carolina a chegar as telas. A partir de quinta 1º, o Cine Belas Artes de São
Paulo exibe Mar de Rosas, Das Tripas Coração, e Sonho de Valsa. Estes três últimos filmes da diretora
revelam uma busca em torno da identidade feninina, com suas angústias e medos.
Ana costuma definir assim seus três filmes: “Mar de Rosas é o começo do mergulho, Das Tripas Coração
é a chegada ao fundo e Sonho de Valsa a volta à superficie”. O colega Arnaldo Jabor elogia dizendo qye
assistir a um filme de Ana “é uma experência equivocante. É antidático, zero em comportamento, divide,
não sintetiza, põe o sujeto em crise”. A trilogia da mais inquieta cineasta merece ser prestigiada.
Além de Sonho de Valsa, com o cantor Ney Matogrosso (foto), serão exibidos também os filmes Mar de
Rosa e Das Tripas Coração
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Ana Carolina
(Como Preparar o suco verde)
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São Paulo 21 Dez 1977
Diretora brasileira entusiasma a critica
Das Sucursais
Depois de um recente sucesso internacional (no festival de Cinema de París), a cineasta Ana Carolina
Teixeira Soares, está começando a trocar de papel. Agora é protagonista. Ao invés de filmar, está sendo
filmada, fotografada e descrita. O sucesso da diretora começou com “Mar de Rosas” um longametragem que brevemente estará sendo projetado em São Paulo no Museu da Imagem e do Som e, em
circuito comercial já no princípio do ano. Exibido no III Festival de Cinema de Paris, o filme foi
considerado pelo crítico do “Le Quotidien de Paris”, uma “planta cheia de espinhos no solo de um Brasil
tão pouco conhecido na Europa”.
Para Ana Carolina Soares, entretando, “Mar de Rosas” não chega a tanto. “É uma produção tipo B,
situada entre a pronochanchada e dispendiosas produções como “Xica da Silva” – diz. E, apesar do
críticos franceses escreverem também que “ele explode nas telas como uma pequena tonelada da
dinamite” Ana Carolina não chega a afirmar que seu filme tenha sido “sua explosão como cineasta” –
embora não negue que tenha sido através dele, que seu nome foi protejado. Por isso, valoriza a
confiança do produtor Mario ?olcof – “Ele acreditou em mim – na minha idéia” – afirma. Além disso, ele
me ajudou a comprar o bilhete de entrada para o fechado clube dos diretores, um feudo ainda
masculino, mesmo na Europa, onde o trabalho de uma Lina Wertmuller e de uma Nadine Tritignange já
respeitado por colegas e críticos”. O resultado da confiança do produtor , por isso, já está se fazendo
sentir: brevemente a diretora irá para Berlim onde fará parte do júri internacional do importante festival.
E um exibidor francês ja programou para 1978 “Mar de Rosas” em três salas pariaterses.
Espelho
“Mar de Rosas” conta a história de uma persiguição, onde o culpado, na realidade não existe. Viajando
de carro para o rio, três personagens, Sérgio (Hugo Carvana), um rico industrial; Felicidade (Norma
Benguel), sua mulher e a filha Betinha (Chistina Pereira) tentam pela última vez a salvação de um
casamento infeliz. A viagem, entretando, se transforma numa fuga aparentemente absurda e
descontrolada. Segundo a diretora, trata-se de “uma comédia dramática que examina com humor e
ironia, os caminhos de uma família comum”. Na opinião da cineasta, o enredo poderia ser um espelho
da família classe média brasileira.
Sem Rótulos
Embora Ana Carolina seja ainda relativamente desconhocida, muitos críticos brasileiros já insistem
rotulá-la como “novíssima”. De fato, se forem computados os sete filmes (cinco curtas, a co-direção de
um média metragem, e seu documentário “Getúlio Vargas”) Ana Carolina, atualmente com 33 anos, já
se poderia considerar uma cineasta mais ou menos consagrada. Mas o fato de ter passado alguns anos
“brincado de cinema”, como diz, não lhe dão ainda certeza de ser uma verdadeira cineasta. Isso só teria
acontecido recentemente – e não em 1967, quando Ana Carolina abandanou o curso de medicina para
se dedicar ao cinema. Segundo a própria Ana Carolina, porém, haveria uma diferença fundamental
entre a “fase da Ana Carolina adolescente que fazia cinema para a Ana Carolina cineasta”. Agora, por
isso, tudo parece estar mudando “Acabou a fantasia de que o cinema é o caminho para se tomar a
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dianteira cultura e política – diz – hoje vejo o cinema como meu caminho de vida e por isso faço um
cinema adulto, consciente e sem rótulos. Ou seja, para mim, não se trata de cinema feminista ou coisa
que o valha, mas sim de um cinema de cineasta e aí não importa se o realizador é homem ou mulher.
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A cara do cinema
“Sonho de valsa precisa de um milhão de e meio de espectadores para se pagar. Em 1987 dos filmes
nacionais, apenas Eu, de Walter Hugo Khoury, antigiu essa marca. Nenhum outro – como A cor do seu
destino, Um trem para as estrelas, Baixo Gávea, Besame mucho, chegou aos 300 mil espectadores. O
publico simplesmente não foi ver. Não concordo muito com essa tese de que cuando o Brasil vai mal o
brasileiro não gosta de se ver na tela. Acho, por um lado, que o público recuou com o fracasso do
Cruzado I. Em 1986 a curva do crescimento do cinema brasileiro foi de 150%, sobrava uma grana para
camiseta, disco, livro, filme. Mas o brasileiro não se identifica com o cinema brasileiro ha muito tempo.
O cinema brasileiro ainda não mostrou ao público que cara tem e o público não descobriu a cara do
filme brasileiro. Ainda não foram apresentados um ao outro”
A cineasta do “sob”
“Em Getúlio eu percebí que não dominava o assunto. Na verdade, eu não domino nenhum assunto. Eu
não fiz um filme sobre Getúlio, más sob Getúlio. Não faço filmes sobre as mulheres. Faço filmes sob as
mulheres para os homens.Falei da menina em Mar de Rosas, da adolescente em Das Tripas..., de uma
mulher da minha idade em Sonho de Valsa. Meus filmes não são bigoráficos – tem um tempero da
minha biografia. Mas é ótimo que o público pense ser biográfico, e diga “ah, ela sente isso, que bom, eu
também”. Sei que um dia vou fazer um filme sobre a velhice. Sob a velhice. Quando eu tiver 63 anos,
vou estar falando da velhice”.
Feminismo
“Faço filmes sob as mulheres. Me irrito cuando dizem que faço um cinema feminista. Isto seria muito
comodo, muito comfortavel e meu cinema não e tão simples. As mulheres que reclamam são mulheres
do joelho para baixo. Meu filme e um grito profundo para que a mulher se libere, para que ame um
homem e não imaginario”
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Trilogia de Ana Carolina
Ana Carolina é “antes de tudo um forte”. Porque ela resiste bravamente a todas as tentações da
facilidade, a um ponto que chega a isolar seu cinema, um “forte Apache” que ela defende como a
heroína de western, descabelada, ferida, carabina na mão contra as bandidas que a cercam. O que mais
ela defende é a sua virginidade, pois apesar do estupro inevitável ela não relaxa e não aproveita!
Ana Carolina só filma ela mesma, a câmera não fica virada para fora, num manso tripé, ela se volta para
dentro da moça e invade, cai no fundo do poço, pulsa em planos de detalhe, como um pássaro na mão
sendo asfixado.
Ana Carolina não tem uma uma câmera na mão e uma idéia na cabeça. Seu cinema não é unívoco, lógico.
Servindo as idéias. As idéias é que poderão sair dele.
Ana Carolina é a atríz principal de todos os seus filmes. É uma adolescente problema querendo dançar
na festa, querendo ser tirada para dançar, mas desprezando os pares, atacando seus galãs, dividida
entre sonhos e distruindo saus mais queridos desejos. Ela se oferece em sacrificio, e, se atacando, se
mostramdo, sabotando do seus sonhos, ela derrota as dondoncas, as filhinhas da mamãe, ela corta a
onda das puras, das plácidas, das peruas.
Mas não em apenas uma missão fiminista ou coisa assim.
Ana Carolina não é feminista. Ia ser muito fácil, ela recusa a boa consciência até o fim; não há uma idéia
onde ela posse descansar a cabeça. Ana Carolina não quer sossego, nem sucesso (pelo menos sabota o),
ela parece às vezes, uma Emily Dickinson desregrada, que em vez de uma “finura impalpável”, de uma
“sede assumida e desértica” escolheu um pouco o cinema desagradável que rima com o teatro
desagradável de Nelso Rodrigues.
Assistir a um filme de Ana Carolina é sempre uma experência equivocante.
É antidático, zero em comportamento, divide, não sintetiza, põe o sujeito em crise, cria problemas.
E, além disso, é personagem de seus filmes não apenas como estilo não: ela é o assunto, ela é o
argumento e o roteiro dela mesma, espêcie de cobra mordendo de sua vida. Mar de Rosas, Das Tripas
Coração, Sonho de Valsa são filmes raros na cinematográfia mundial, pois tem muito pouco cineasta na
história do cinema que sabe, que discrobiu que o cinema é uma arte lunar, noturna, como os sonhos. A
maioria vira a câmera para fora e filma o retángulo do teatrinho dos enredos. Há cineastas que
acreditam na imagem e outros que acreditam na realidade.
Ana Carolina não acredita nem numa coisa nem na outra. Ana Carolina debocha das duas. Ana Carolina
acredita é no deboche metafísico. Ela acredita no desmascaramento total das hipocrisias, ela acredita
que há uma realidade mais além do desprazer: além do deboche poderá sair uma donzela do fundo do
poço, uma epifania após a auto-exposição, uma ressurreição de Cristo, um negócio meio religioso.
Ana Carolina acha que a verdade é um negócio que se atinge depois de todas as descrenças; só o ateu
verá a Deus.
As influências do cinema de Ana Carolina são difíceis de achar, geralmente quem pensa como ela, não
filma.
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Escreve, faz poesia, vai ser psicanalista, ou entra para uma ordem. Mas dá para achar os literatos no
meio do Mar de Rosas, e dos outros.
Dá pra ver um pouco de Clarice Lispector, seus desejos de sangrar, de mostrar feridas, seu gosto de
mostrar um excesso de visão dolorida.
Não é Clarice uma religiosa?
Dá pra ver também um cineasta que ela nunca viu, que aliás pouco se viu, por aqui nestes tempos
grossos, é o primeiro Skolimovski, não o Jerzy de Londres, mas o antigo, o polonés, o Godard em
Walkover ou Départ.
Dá pra ver um pouco do Nelso Rodrigues, dá pra ver o Bunuel do Áge d´or, dá pra ver o Fritz Lang de
Espiões, em suma, um cinema de tricksters (truques) , que manifestaavam a coisa física e inocente dos
primeiros filmes para o povinho, o cinema de gags profundas, um cinema intelectual, poético, com avós
populares, de tortas na cara, um cinema contra o ridículo.
Ana Carolina tem também uma coisa espanhola, um negócio meio tourada entre quatro paredes,
touradas de salão, um negócio meio sangrento. Às vezes um scent de Lorca, vermelhos, façadas, gritos e
mantilhas. Ana Carolina sem dúvida é uma castradora, espanhola com navalha, perigosa. Em matéria de
influências eu vejo isto.
Ah... tem também Jean Vigo... Não dá para analisar os filmes dela com vagar e critério como fazem os
críticos metódicos, porque Ana Carolina é um despropósito numa época de desilusões oportunistas: há
algo de antigo no seu desejo de manter uma a tal da virginidade. Porque a maioria da rapariada grita
hoje em dia;
“Óba, chegou a pós–modernidade sem caráter”
Ana Carolina não quer saber disso. Defende sua individualidade com unhas vermelhas.
A tendéncia hoje é considerar isto tudo uma auto complacência total.
A própria arte já não é vista com bons olhos , como se fosse um desvio personalista dentro do grande
picadeiro da cultura de massas.
A tendência seria considerar o cinema de Ana Carolina como auto-indulgente, a palavra chave do crítico
sistémico americano. Até podemos concordar... mas, diremos, parodiando Jay Cocks a propósito de
Fellini... É... auto-indulgente... self-indulgent... mas. Que “self”! e que “indulgência”!
Amalda Jóbio, Jan 1989
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Ana Carolina
Mar de Rosas
Ana Carolina
Das Tripas Coração
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(Ana Carolina ??)
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Tribuno Da Imprensa – Rio de Janeiro – 31/10/1978
Cartas
Manobras Virulentas
Sr. Redator:
Sob este título a cineasta Ana Carolina acusa, em carta aberta ao JE, o Sr Hélio Fernandes de ter
detonado uma escandalosa campanha em escala (isto existe?), tentando influir na opinião pública ...,
colocando todos (isto é, a patota de Embrafilme) num injusto muro. Faltou á missivista, talvez por
distração, a lembrança de esclarecer se no “injusto” muro, onde o Sr Hélio Fernandes a teria colocado,
ela se encontra em cima dele (do muro), ou em arrière, e para completar a descrição, se com os joelhos
juntos ou separados, pois segundo consta, esta questão de joelhhos é importantíssima. É voz corrente,
não sei bem, porque não entendo lá muito destes assuntos, mas dizem que joelhos assumidamente
separados, teriam aiso órgãos de segurança que quando relaxados, facilitam a penetração das mais
antigas formas de corrupção, via de regra, pelos canais competentes.
Continuando, Ana Carolina diz: tudo o que vem sendo mostrado como corrupção, nada mais é do que
operações normais (pombas!), em andamento dentro da empresa (Embrafilme), e que já seria tempo de
cessar de vez com todos estes mal-entendidos, altamente desagradáveis.
Taí, eu asistí a todos os filmes de Ana Carolina e acho que principalmente pelo seu último trabalho
(trazido a público), o excelente “Mar de Rosas” e gardadas as devidas proporções, ela pode
tranqüilamente ser qualificada como a Lina Werthmuller ou a Agnés Warda tupiniquim. Como
comentarista de cinema, por ofício de fé e não renumerado, e dada a forma “séria” que caracteriza oos
meus escritos (procuro por meio da galhofa induzir o público leitor a desligar a TV, amordaçar a sobra,
dar 12 tiros no ambiente e ir ao cinema), mas menos assim sendo, sempre prestigiel as boas realizações
desta cineasta, que além do mais me é simpática por causa do seu bem sonante sobrenome, berço e
origem da minha família, desde que há mais de quatro gerações, quanndo meus antepassados tiveram
por bem (e bota bem nisso) abandonarem as terras chucrutes e se instalarem nos campos gerais do
Coronel Texeira Soares, a oeste de Curtiba. Tudo bem.
Advogado, por profissão de fato (e de dereito), e com a agravante de ter estudado ao tempo em que nos
obrigavam a decorar os textos de Cicero, e em latim, ainda por cima, minha primeira reação foi a de
responder a carta “MANOBRAS VIRULENTAS”, sob a forma de uma catilinária, destilada em tons
igualmente virulentes. Porém relendo o texto da carta, com mais atenção, conclui-se sem maiores
dificuldades, que isto seria absolutamente desnecessário, pois o desabafo de Ana Carolina em cima de
Hélio Fernandes, não é uma carta para ser levada a sério. Antes pelo contrário, é uma piada, uma
missiva de humor, qualidades que desconheciamos na cineasta, por cuja faceta ela merece os mais
respeitos cumprimentos, pois o seu lado humorístico até que é bacaninha.
Porque se Ana Carolina tivesse escrito uma carta séria ela não diria as gracinhas acima, entre outras, e
sim responderia a pelo menos algumas das preguntas que hoje, não apenas o jornalista Hélio Fernades
faz, mas depois dele, toda a imprensa em geral, desde o JB, até o Estadão, do semanário de Arapiraca,
ao hebdomadário de Piraquara, (inclusive este obscuro cronista, além do Zig, aquele rato depravado!),
querendo apenas saber respostas para a malversação (palavrita antigua, pero complidora), de dinheiros,
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que em última análise, avieram do bolso do povo brasileiro, este sofrido silencioso, porém digno povo
brasileiro, acompanhado do seu maravilhoso cheiro natural.
Se fosse uma carta séria, Ana Carolina responderia, por exempo, aquilo que se denuncia exatamente à
páginas adiante, daquele mesmissimo caderno do JB, o pelo respeitável Ely Azeredo, cujo matéria versa
sobre o caso absolutamente escandaloso a escroto até, do financiamento concedido, em palavras sem
rodeio, a si próprio, do Sr. Roberto Farias, diretor-geral da Embrafilm, para a firma da qual é titular
comanditário, a Roberto Farias Produções Cinematográficas, no caso especifico da distribuição do filme
“Barra Pesada”.
Se fosse uma carta a ser levada á sério, a cineasta em tela daria uma explicação as ordens e
determinações vindas do “alto”, no sentido de encher o bolso, do dinheiro, aos cineastas “de esquerda”,
a fim de que produzam pornochandas e outras titicas afitis, e que estão aí nas telas dos cinemas,
torrando em nós, comentaristas e críticos, aquilo que papal-noel carrega ás costas e que eis obviamente
não possue.
A dar-se crédito á opinião de dona Texeira Soares, seria o caso de se falar das facilidades conhecidas
para a produção do Sr Gustavo Dahl, igualmente figura de proa na direção da Embrafilm, o “Uirá, um
indo á procura do OURO”.
Não fossem escritas com o propósito de divertir a opinião pública, as palavras de Ana Carolina versariam
sobre a peculiar e curiosa história da sonorização na Franca do “produto nacional típico”, que recebeu
na pia batismal o nome AMOR BANDIDO, ungido em nação de champanha e caviar, provavelmente.
Bem, seria desnecessário tomar mais espaço, aqui da minha TRIBUNA DA IMPRENSA, para delongar
assuntos já tratados à exaustão por jornalistas que o fazem bem e melhor do que eu. De qualquer
maneira, quis apenas de público transmitir a minha gratidão à cineasta, pelos bons instantes de riso que
me proporcionaram os momentos de leitura da sua carta aberta. Sábios dizeres de Carlos Eduardo do
Novais, ao exaltar outro dia, a classe dos firmamento do humor, Ana Carolina Texeira Soares, quem
dirigia heim? Agora, pelo amor de Deus, não pare, vá em frente, que você é uótchima!
Silvio Putziger
Cinema – Tribuna Da Imprensa
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Lux Jornal
Jornal do Brasil, Rio de Janeiro
Um Ladrão de cinema
Cineasta perde roteiro
24 Jan 1990
O inspetor Silas de Argoio Silva e a diretora de cinema Ana Carolina divertem-se registrando a queixa
O roteiro roubado
Trés fazendeiras mineiras – ama tia, ama sobrinha e ama agragada – por circumstâncias diversas chegam
ao Rio em 1965. Este é o tema do próximo filme e do roteiro roubado de Ana Carolina, uma coprodução
com a Secretaria de Cultura de São Paulo. A Diretora define o filme como “um choque cultural, um
fenômeno de Pororoca entre a Belle Époque mineira e a agitação do Rio”. As três mulheres comem o
pão que o diabo amassou em sua temporada carioca são roubada, sofrem extorsão, não recebem o
dinheiro devido. “Em resumo, tudo tipo de mal-entendido entre estrangeiros e mineiros”, adianta a
diretora. As mineiras não passam mais que um ano na Cidade Maravilhosa e voltam para casa no final.
“Tiveram sorte”, constatou Ana Carolina a saida da 12 DP de Copacabana. “Hoje, a cidade está muito
pior”. Em tempo: Ana Carolina é paulista.
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Ana Carolina
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Clause C Meyer (photographer)
Ana Carolina e sua batalha para fazer Cinema
Aparentamente fragil, ela transmite a imagem de Rita ou Maria Luisa, de Machado de Assis: no rosto
abatido, nos cabelos, nos olhos, nas primeiras palavras. Tem-se a impressão de que ela acredita em
cartomante e esconde o tornozelo na barra do vestido. Na verdade, Ana Carolina Texeira Soares, 32
anos, não é nada disso. Diretora e produtora de cinema, há quase dez anos, com uma bagagem de cerca
de doze filmes (incluindo os curtas-metragems), dois cursos abandonados (inclusive a faculdade de
medicina) e a sucessão de batalhas inerentes à profissão, ela só entra em pánico (“arranco os cabelos”),
nos meses de baixa, “quando falta dinheiro para pagar o aluguel”.
Agora, está produzindo seu segundo longa-metragem, um policial que talvez se chame Escravos de Jó e
que tem oito atores, entre os quais Norma Benguell, Ary Fontoura e Miriam Muniz. Aos sábados, após a
filmagem, geralmente a equipe se reúne na casa de alguem, para o balanço semanal. Ana Carolina
respira cinema a semana inteira. Segunda-feira, arranja uma folga. Cansada, abatida, tossindo muito.
-- É isso. Agora, estou filmando. Acordo às quatro da manhã, filmo o dia inteiro. Fico exausta, nervosa,
preocupada com dinheiro, datas, tudo isso. Quando não há filme, eu tenho que me virar em trabalho,
seja agradável ou não. Geralmente, faço fotografia. Mas não gosto.
O apartamento de Leblon, na quadra da praia, tem o suficiente para servir de refúgio durante a noite.
De dia, Ana Carolina “batalha”. Depois de Getúlio – o documentário sobre o ex-presidente, que deu
muito o que falar – Carolina começou a guerrapelo segundo longa-metragem. Esperou a aprovação da
Embrafilme durante quase um ano, de maio a setembro. Ficou feliz da vida: “Eu comecei a filmar dia 10
de janeiro. A vida é essa. A gente começa a filmar quando está carente, voraz, ansiosa e, ao mesmo
tempo, ameaçada. Não pode errar. Então, quando a gente consegue dizer ação, já está com a lingua de
fora...“
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Ana Carolina enfrenta os problemas comuns de quem tem audácia de fazer cinema no Brasil.
Prinicpalmente os problemas do mercada, que dá menos de 30% dos dias do ano aos filmes nacionais:
“Está havendo uma média de noventa filmes brasileiros anuais que ficam na lata. O número de
estragieros é duas vezes maior. Quer dizer: o mercado de cinema brasileiro não é de quem faz cinema. É
dos filmes estrangeiros”.
Apesar de tudo, Ana Carolina sabe que não poderia fazer outra coisa. Assim como sabe que não
enfrenta nem mais nem menos do que um homem em seu lugar. Por isso, suas análises não partem
nunca de comparações: “Acho que esse negócio de mulher está muito exagerado. Tá virando clube da
Luluzinha. Talvez, há dez anos atrás, eu tivesse a necissidade de falar sobre o assunto. Hoje, não. Eu me
nego a colocar na minha pauta de vida qualquer referência deste tipo, com a prioridade que se costuma
dar ao assunto. Eu acho que esse negócio está na base daqueleas coisas de colégio, de reunir as alunas
para mostrar os borbados, sabe? Aliás, esta história de ter raiva de homem é doença pura. Eu só
acredito numa coisa: a grande revolução é o encontro da mulher com o trabalho. Só através do trabalho,
ela pode se libertar”.
Desde Indústria, o primeiro filme, Ana Carolina fez a sua guerra e apprendeu a se virar nos piores
momentos. No ano passado, ficou oito meses sem emprego. Alteradissima. Mas oi em frente. Este ano,
está enfrentando os problemas da filmagem, com atores, prazos e pagamentos, numa casa do subúrbio,
no Rio.
-- O cinema é muito isso: é você abrir uma brecha na cabeça do outro e colocar algumas coisas. Pra sair,
no final, parecido com aquilo que você tinha na cabeça.
Se tudo der certo desta vez, Ana Carolina vai rodar o próximo filme, sozinha, com verba própria, no
começo do ano que vem. Por enquanto, Ana Carolina só se preocupa com uma coisa, seguir em frente:
“Quando eu comecei, fazendo continuidade, tinha muitos planos na cabeça. Tinha trocado a faculidade
de medicina pelo curso de ciências sociais, screvia roteiros, fazia grandes fantasias. Mas as coisas se
tornaram imviáveis. Os tempos tempos mudaram, eu tive que criar outros projetos, outra maneira de
falar.
Ana Caromina está cansada, dorme pouco, mas consegue sorrir das pequenas misérias. As batalhas do
cotidiano fizeram dela uma pessoa muito mais forte, que é capaz de troçar de si mesma e que, entre
outras coisas, aprendeu a viver só:
-- Eu tive o momento de amarrar o pé na cadeira, sabe como é? Pra não sair correndo pra casa da
primeira pessoa amiga. Mas essa fase passou. Viver só foi uma escolha, e eu tive de aprender. E é uma
coisa boa, pra qualquer pessoa, ter uma fase assim – em que se pára e se fica, em que se faz uma
viagem para dentro. Hoje em dia, eu gosto muito de viver sozinha. Gosto mesmo.
Maria Helena Malta
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Ana Carolina Texeira Soares:
“Da Vida Agora, só quero a Mais-Valia”
Quem vê essa moça de aparência suave, pele branca, cabelos pretos soltos nos ombros, golinha
comportada surgindo por baixo da suéter de cachemire marrom, não pode supor o volcão que se
esconde por trás desse ar de “jeune fille de Sion” que tem Ana Carolina Texeira Soares.
Obsessiva, perfeccionista, contundente, trágica sutilmente irónica, ela é considerada,
internacionalmente, a melhor cineasta do Brasil.
O clima da sua trilogia, que se enlaça de um filme para o outro, reflete a própria busca de identidade de
Ana Carolina e das mulheres da sua geração – o que sobra depois 40?
Foi em torno disso (e de seus filmes) que conversamos.
Marisa: Ana, parece que em Sonho de Valsa você encontrou uma resposta para a pergunta da sindrome
da Cinderela: eu quero um príncipe encantado e ele não existe.
Ana Carolina: Depois que passam essas síndromes, as de Édipo, de Cinderela, esses aparentes
depositários de um amor que, teoricamente, valem mais do que tudo, se descobre que essa busca deixa
de ter sentido.
Marisa: O que é sobra, então, a solidão?
Ana Carolina: A solidão é uma posição que você pode ter, ou não. A solidão não é o pior dos castigos. O
pior dos castigos é não ter amor pelo trabalho. Ai de quem não tem pelo trabalho, pelos amigos, pelos
companheiros pelo País! Tudo está aí. So você chega as 40 anos e não acredita nisso, você vai dançar.
Marisa: No momento, qual é a paixão de trabalho que você está tendo?
Ana Carolina: Eu estou na fas de crise de trabalho que sinto sempre entre um filme e outro. Para fazer
um filme você tem que ser indispor, inclusive fisicamente, o sofrimento físico é uma coisa de que tenho
verdadeiro horror. Amo o cinema, mas ele me exaure...
Marisa: Mas você não tive sem ele...
Ana Carolina: Eu vou tentar viver... só que estou começando a escrever um outro projeto, estou tendo
tessão por um outro projeto. Sou uma pessoa romântica e mesmo sabendo que o amor ideal não existe,
nem o filme ideal, ainda continuo querendo fazer um filme mais resolvido, mais interessante, mais
inteligente: mesmo sentindo esse abismo do Terceiro Mundo que deixa na gente um sabor meio amargo.
O que a gente faz aqui, são coisas bem melhores do que as que se passam lá fora, mas você não tem o
prêmio da vitória.
Marisa: Valter Clark me disse que o cinema é atividade para fascinores. Você concorda com isso?
Ana Carolina: Eu acho, particularmente, que ele foi muito vilipendiado pelo setor.
Marisa: Ana, você acha que na curva perigosa dos quarenta a busca da identidade continua, ou se fecha
o circulo, como você fez na sua trilogia, em “Sonho de Valsa”?
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Ana Carolina: A inútil busca cessa aos 40 anos. Ela vai 14 anos aos 40. Esses 30 anos de busca são a
minha trilogia.
Marisa: E depois, sem chance?
Ana Carolina: Nenhuma chance.
Marisa: E aí, fazemos oo que?
Ana Carolina: O melhor de tudo começa agora, porque não tem mais busca.
Marisa: Isso seria o entero das emoções violentas?
Ana Carolina: Não há mais ilusão.
Marisa: (depois de uma pausa): Ana, como vai você?
Ana Carolina: Eu vou bem, muito bem. Quero sobreviver, realizar coisas, acolher só o que vem. Eu estou
calma. É bom ter o controle de você, o dominio de você, a consciéncia do seu trabalho.
Marisa: O que é que você espera da vida?
Ana Carolina: Nada. Rigorosamente nada. Então para mim, está tudo bem. Eu quero trabalhar, rir,
comer, beber, fazer minha ginástica. Eu, da voda, agora, só quero o lucro, a mais-valia. Ter chegado à
terra, até aqui, obrigada. Ana Carolina? Presente.
Nesse momento chega Nair Belo. As duas vieram juntas para o coquetel onde nos encontramos. Nair,
junto com Mariam Muniz, foi uma das atrizes que participou de “Sonho de Valsa”. As duas faziam o
papel de diretoras do colégio Sion. Cena filmada in loco, no quarto andar do colégio. Não posso imaginar
Nair, tão hilária, nos filmes altamente intelectualizados de Ana Carolina.
Marisa: Nair, como foi trabalhar com Ana Carolina?
Nair Belo: Achei bonito a Ana confiar em mim. Ela é uma intelectual. Só que tive que assistir o filme dela
três vezes para entender. (Rimos todas).
Marisa: Nair, para você, qual foi o momento mais dificil de interpretar?
Nair Belo: Ah, foi o texto final! Como era mesmo, Ana?
Ana Carolina recita, com fina ironia: “...existe o bombom, o eterno não perceber, existem as varizes,
existe o sexo... melhor mesmo é tomar um balde de soda cáustica”.
Nair continua, no se jeito descontraido:
-- Trágico, não é? Quando eu fiz essa cena, eu não entendi, decorei mas depois interpretei como a Ana
queria. Dramática mesmo foi nossa ida para o Festival de Gramado. Filme Intelectual, você sabe, eu
tinha certezade que ia ser premiada. Sabe quem ganhou? Fiqeui p... da vida: a Silvia Bandeira!
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Por mais paradoxal que seja, a cena me lembrou outra, passada na no segundo filme da trilogia de Ana
Carolina, quando Ari Fontoura entra no banheiro e encontra Norma Benguel lá. Com naturalidade, ele
pergunta, quando a vê no vaso sanitário:
--O que você está fazendo aí?
Norma responde:
--Das tripas, coração.
Marisa Raja Gabaglia
Marcos Borelli (Photographer)
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A retrospectiva semanal da trilogia de Ana Carolina Texeira Soares: Mar de Rosas (1977), Das Tripas
Coração (1982), e Sonho de Valsa (1987), encerrou essa semana em São Paulo e começa a percorrer o
Brasil, chegando no Rio no dia 13 do Julho. Ana Carolina fala dos três filmes que tiveram mais de 2
milhões de espectadores, de si mesma, e da identidade da mulher na curva dos 40.
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Meu filme é badalado não porque sou cineasts, mas porque sou mulher, e isso é uma distorção
Economicamente uma produção B, com uma linguagem nova que consegue chegar as telas, uma
projeção internacional, inclusive. E vem atrás dele “Lira do Delirio”, “Tudo Bem”, quer dizer uma
linguagem moderna., vendo saidas, queimando uma etapa, o desánimo, aquela coisa intelectual. E o
Cacá que me desculpe, mas as patrulhas ideológicas não existem e eu acho ótimo que não existam no
cinema brasileiro, sabe. Deixa eles brincarem agora, deixa. E já que a gente tem 133 dias, que a gente
tem um mercado teoricamente conquistado, cabe “Dama do Lotação”, cabe “Dona Flor”, cabe “Chuvas
de Verão”, cabe... deixa eles brincarem umpouco, porque eu acho que numa dessas a gente acerta, sabe.
Então eu acho que realmente “Mar de Rosas” tem tudo isso de filme otimista, que tem algum lance
político dessa nossa geração. E vamos fazer um parênteses, não estamos num cinema oba, oba, ufanista,
porque me ufano de meu pais, eu acho não estamos. Isso de um lado. De outro lado, eu acho que, como
o cinema brasileiro não é uma industria, é mentira, é um castelo de cartas, é uma indústria rarefeita, é
uma porção de coisas cheia de problemas, com uma classe desunida, um sindicato que não atua, etc, etc,
por outro lado, o cinema brasileiro, que tá detirminado pela economica, o cinema, a poesia e o
escambau de Madureira, são determinados pela economia, já podendo fazer filmes de produção baiza
que dão uma curva da realidade brasileira de várias clases. Claro que ninguém vai poder fazer a “Dama”
o ano inteiro. Nem digo a “Dama” que é um filme barao, mas vamos dizer “Dona Flor” ou uma produção
de gabarito A. Não dá pé. É talvez economicamente ja esteja sendo permitida uma licença poética pro
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cinema brasileiro fazer uma produção barata que fale uma verdade, que fale uma coisa que seja real,
que dê uma abertura, que tenha qualidade, que tenha dramaturgia própria.
Você acabou de dizer que não existe uma indústria de cinema no Brasil, mas ao mesmo tempo classifica
o teu filme como B, quando essa é, inclusive, uma classificação criada pelo cinema de Hollywood?
-- Ele é uma produção B dentro de uma gabaritagem económica. E um filme B que cumpre as etapas de
filme B e fala o que quer falar, porque tem muito filme B que fica no meio do caminho.
E você acha que já é hora de classificar as nossas produções em A, B e C?
-- Já, já pode.
Já pode e vale?
--Não sei se vale. Não vale porque isso determina pro diretor brasileiro um esforço, um furo de
reportagem que eu não sei se ele aguenta. Porque a Embrafilme e o exibidor, a economica do cinema
brasileiro, botou a coisa no seguinte pé: filme A é aquele que da X de renda, você tem que investir e não
sei o que. Então o cara que vai jogar em cima do Bruno Barreto, vai jogar menos. Tá determinada uma
gabaritagem de produção, a partir daí, e já que tá, dá pra falar em produção A, B e C.
Mas como eu disse, essa divisão, que é uma coisa do sistema de produção americana e que está sendo
determinado pelo investidor e pelo exibidor, vair criar mais um vicio de mercado.
--Sobre isso o Glauber deu uma entrevista maravilhosa, falando que o diretor brasileiro só pensa no
acréscimo de não sei o que, e cinema mesmo, arte mesmo, não tá se fazendo, e não tá mesmo. De uma
certa maneira, alguns diretores, dos melhores, as pessoas mais preocupadas com a cultura brasileira,
têm que prestar muita atenção com essa brincadeira de faixas de mercado. Porque senão você acaba
cedenco, você fala assim não vou fazer um bom filme, vou fazer um filme B, não vou fazer um filme bom,
vou fazer um filme A. Começa uma loucura. Eu acho que o Glauber deu um alerta legal. Essa disociação
da economia e da cultura, dentro do cinema brasileiro, que cria um espaço mágico na cabeça do diretor,
e que é uma grande contradição, como adequar a economia e a qualidade ou a cultura, porque o que é
bom não dá dinheiro, o que é ruim dá dinheiro. O cara que faz um filme bom, de qualidade, se sente
culpado porque tá ganhando dinheiro. Nosse espaço mágico entram as 100 patrulhas ideológicas e aí
que a gente sifu, né.
Já que você citou Glauber e Cacá, como você vê esse pessoal do Cinema Novo, hoje?
--Eu sou filha do Cinema Novo, mas do Cinema Novo paulista, quer dizer, distante do movimento
mesmo. E quando eu tava começando a fazer cinema o Cinema Novo tava no auge. Então eu sou filhote,
o que eu acho uma péssima sindrome. A sindrome do Cinema Covo teve seu momento, tudo bem,
saramos, vamos em frente. Porque o Cinema Novo atravancou demais os jovens cineastas, se a gente
pensar. Anos e anos se vivia em função de uma coisa que era dirigida e manipulada por duas ou três
pessoas, do maior talento , é verdade, algumas são hoje os pilares da Embrafilme, do cinema brasileiro.
Mas a sindrome do Cinema Nova, ao nivel cultural...
Acabou se transformando num certo fascimo cultural...
-- Eu acho.
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Porque só se podia fazer cinema dentro daquele esquema ideológico.
-- Claro, fica tampondo. Então você vai fazer um filme e faz o que, você procura a linguagem o que era,
um plano sequência enorme, com a câmera longe, onde a história que está sendo contado, o espectador
não sabe quem é aquele cara que entrou no cuadro, etc. Enfim, acontecem coisas na tela que não
contem a história. Aí começa a neura. A sindrome do Cinema Novo prá cultura brasileira foi curada,
saramos, sabe. Agora tamos com problema noutro lugar. Forget Cinema Novo.
Você é uma diretora paulista e o teu filme mais elogiado é uma produção carioca. Esse problema de São
Paulo ter sempre ficado de fora na divisão do dinheiro da Embra...
--Porque São Paulo está longe do centro nevrálgico da Embra...
Certo. Mas há diretores importantes em São Paulo que nunca receberam colher de chá.
--Eu acho que São Paulo tem diretores do maior talento. Candelas, por exemple é um diretor pelo qual
eu tenho uma grande estima. Eu acho é que São Paulo tem aquela coisa empresarial, vamo lá e faz, mas
certas coisas a intituição São Paulo fica com raiva e acaba abandonado. Isso aconteceu também com
relalação à Embra. Cè vai lá, batalha a 1ª a 2ª a 3ª vez, não dá, o cara vai prá rua do Triunfo e descola
alguma coisa. Eu acho que a cineasta paulista – eu me considero uma cineasta paulista, mas na Via
Dutra, porque estou entre Rio e São Paulo – devia ser mais audacioso no nivel cultural.
Mas exited na “Boca” um imediatismo muito grande de faturar.
--O determinismo económico que veio através da “Boca” é que propiciou um mercado predatório do
cinema. Os caras lá falam assim: a gente faz um filme por trezentos milhões, com a Marleide não sei das
quantas, que fica pelada e fatura seiscentos milhões. Quer dizer, uma renda porcaria, um filme porcaria,
que vai atingir uma coisa regional, que não resulta em nada. Isso eu acho que é um ónus que o cinema
paulista tem que sanar. É típico da Boca o cinema predatório que atrapalhou os bons cineastas paulistas,
baixou o nivel e tal. Não têm expressão nenhuma esses filmes que estão sendo produzidos pela Boca há
anos. Não querem dizer nada e não têm um bom mercado. Tudo isso num nivel cultural absolutamente
insignificante. Do repente vem qualquer cara do Rio ou produzido pela Embrafilme com um tchan
cultural, que o que dá, que é você fazer alguma coisa que mexa nisso aqui, né. Eu, por motivos de
pressão individual, fui batalhar produção no Rio e consegui.
Mas você começou a fazer os teus primeiros filmes aqui, não?
-- Tudo aqui, até “O Sonho Acabou”. Depois eu fiz “Getúlio” no rio. Eu não consequi produção pra esse
filme aqui. Eu tinha um projeto sobre o Jánio, longa também, o do Getúlio e vários nesse nivel. Aí eu
propus pro Nei Stroulevitch, no Rio, cheguei de cara, né, eu quero fazer um longa, documentário político
com material de arquivo que eu já tenho pesquisado. Era governo Geisel, récem-entratado, um filme
não comercial, branco e preto, material do DIP, politico, já era um bode, né. E ele topou. Isso não
aconteceu em São Paulo, prá mim. Aí resolvi ficar no Rio, vou forçar até onde der. E foi dando. Depois do
“Getúlio” fiz assisténcia do Cacá num documentário para TV de um hora sobre Nelso Pereira dos Santos.
Eu achei um espaço de trabalho no Rio que me foi favorável e que eu só tenho que explorar.
--Acho que dá pra explicar. Dá pra explicar não sei se corretamente, poque eu estou dentro de barato.
Primeiro porque, injustamente é mais importante ser mulher que trabalha, do que o filme. Então o foco
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tá errado. Ele é badalado porque sou mulher eu não porque eu fiz um filme. Ele é badalado não porque
sou cineasta, mas porque sou mulher. Isso é uma distorção, porque na verdade eu sou cineasta. Essa
distorção acaba até sendo a meu favor, eu capitalizo isso, até. Segundo: eu acho que é um filme honesto,
com uma linguagem nova com um assunto delicado e bem transado. Ele tem a favor dele coisas boas. É
um flme que deu certo.
Ana Carolina para de falar, olha prá mim e diz:
--Você não tem nenhuma pregunta bombástica pra me fazer?
E, não. É você não tem nenhuma declaração bombástica pra me dar?
--Eu não tenho. Nunca tenho. Sabe aquelas coisas que o Cacá faz? Eu não sei fazer.
(Candidamente) Que coisas?
--Ah eu fiquei com raiva daquele negócio das patrulhas ideológicas. Porque na verdade o Cacá tá falando
como se ele fosse um cineasta perseguido pela direita, persiguido pela esquerda, persiguido pelo
público, e não é. Ele tá na dele, pó. E a policia interna dele que o deve estar acusando de ter ganho
dinheiro com Xica da Silva. Ele começa falar uma coisas que vão ficando complicadas, tudo mundo
querendo saber o que é isso. Fica inclusive alertando a direita pra determinadas coisas qu não se
justificam e levanta uma poeira péssima. Isso é uma loucura dele, que devia transar quieto e não ficar
dando declaração.
E o que você acha de “Chuvas de Verão”?
-- Eu acho que o Cacá quis ficar com um pé lá e outra cá, o que é muito justo, porque quem não é né. Faz
Xica da Silva e depois Chuvas... Tudo bem, mas não se denuncie, não seia Ubaldo, o paranóico.
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Folha Da Tarde, São Paulo. 31 Mai 1989
Ana Carolina em dose tripla no Belas Artes
Cena de “Mar de Rosas”
Três semanas para assitir aos filmes da polêmica cineasta Ana Carolina. O cine Belas Artes (Avenida
Paulisda esquina com a Consolação) programou uma pequena mostra, com produções que foram a
trilogia da diretora: “Mar de Rosas”, “Das Tripas Coração” e “Sonho de Valsa”.
A mostra começa amanhã, com “Mar de Rosas”, onde Ana Carolina faz um retrato da vida familar, que
vai culminar com uma louca perseguição. A historia é sobre um casal (Hugo Carvana e Cristina Pereira),
que um día discute na frente da filha (Cristina Pereira). Elese estão viajando para o Rio, mas depois da
discussão decidem se seperar. A mulher, assim que chega na cidade, tranca o marido num quarto de
hotel e depois corta seu pescoço com uma lâmina.
Desesperada, foge com a filha e na estrada percebe que está sendo seguida pelo capanga de seu marido.
A partir daí, ela cria as mais absurdas situações para tentar se livrar do homem. Paralelo a isso, uma
dentista e poeta falido vivençia as mais banais experiências com sua família.
Na sequência, día 8, os fãs de Ana Carolina podem ver o segundo filme da trilogia, “Das Tripas Coração”,
no qual a diretora reafirma seu estilo inovador e irreverente. Novamente a alma feminina é o ponto de
partida da trama. Um colégio de moças da alta classe está para ser fechado, por motívos financeiros e
administrativos.
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Assim, um interventor é disignado para encerrar as atividades do lugar. Enquanto aguarda a cerimônia,
ele cochile e sonh com as meninas do colégio. Em sua rápida soneca, ele tem os mais loucos e sensuais
sonhos com as garotas. Só mesmo depois disso, ele compreenderá um ouco mais os anseios femininos.
Para encerrar, a partir de 15 de junho, o cine Belas Artes exibe “Sonho de Valsa”, uma das mais
comentadas fitas da Ana Carolina. Por meio do universo de uma mulher dominado pelo pai, pelo irmão
e pelo namorado, a diretora conta a história de Tereza (Xuxa Lopes, mulher de Hector Babenco), que
como na cantiga popular “em três quedas foi ao chão”. Ela sonha encontrar seu príncipe encantado,
mas para isso precisa trilhar um caminho difícil, onde não faltam espinhos.
De sua vivência com cada um destes homens, Tereza descobre uma nova faceta de sua personalidade,
entendendo finalmente que primeira precisa amar a si própria para chegar a um relacionamento
maduro. Usando e abusando das figuras de linguagem, Ana Carolina coloca sua Tereza nas mais
absurdas situações. Quando ela diz que entrou pelo cano, não está mentindo. A cena seguinte mostra a
personagem engatinhando por um imenso e interminável cano.
Os filmes ficarão em cartaz uma semana cada um, numa excelente oportunidade para conhocer o
trabalho de Ana Carolina.
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Nas Telas: Flávio Cândido
A Trilogina de Ana Carolina em Niterói
Cena de Sonho de Valsa
Depois de exibida com sucesso no Cineclube Estação Botafogo, está em plena exibição no Cine Arte UFF
a “Trilogia de Ana Carolina”, com posta dos filmes Mar de Rosas, de 1977, Das Tripas Coração, de 1982
e finalmente Sonho de Valsa, de 1987. Durante dez anos, Ana Carolina escreveu sobre seus fantasmas
femininos e masculinos nascidos na cultura ocidental de um modo geral e na adolescência,
particularmente. Dona de um estilo anárquico, beirando à historia feminina, Ana Carolina realizou a
trajetória de Tereza, seu personagem emblemáticoe seu alter ego, de maneira desigual, indo do
exercício cinematográfico confuso de Mar de Rosas à liberdade autoral e o discurso encadeado de Das
Tripas Coração.
Xuxa Lopes, que encarnou o personagem a partir do segundo filme, está bellisima em Sonho de Valsa,
com certeza o mais fraco dos três filmes da série. Xuxa Lopes é um dos raros exemplos de atrizes
brasileiras que alcançaram o estrelato exclusivamente através do cinema, pelo menos na história
recente do cinema brasileiro. Sua beleza, sua sensualidade, seu talento profissional despontaram ainda
na década de 70 e fulgura até hoje. Da forte presença na tele, sabendo dialogar com a câmara de
cinema, como poucas da sua geração, Xuxa Lopes é uma das poucas unanimidades do cinema nacional.
Hoje está sendo exibido Mar de Rosas, com Cristina Periera, Norma Bengell, Ary Fontoura e Otávio
Augusto. Amanhã e domingo, é a vez de Das Tripas Coração, com Dina Sfat (em um de seus melhores
desempenhos), Antônio Fagundes e Xuxa Lopes. Na segunda-feira, não haverá exibição de nenhum filme
no Cine Arte UFF, por causa da apresentação da Orquesta Sinfônica Nacional da UFF. Na terça-feira,
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emfim, será exibido Sonho de Valsa, que, além de Xuxa Lopes, traz Daniel Dantas, Arduíndo Colassanti e
Ney Matogrosso. Pela primeira vez como ator. Sonho de Valsa será exibido também na quarta-feira.
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Os Gritos e Sussuros de Ana Carolina
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A atriz Xuxa Lopes teve torcida, no FestRio, que a queria premiada
Quem acompanha a obra da cineasta Ana Carolina certamente vai se surpreender com o seu último
trabalho, Sonho de Valsa, que estréia, hoje, no Cine Park 2. Não que o filme esteja desvinculado de suas
duas obras anteriores – Mar de Rosas e Das Tripas Coração – pois formam uma trilogia, mas sim, pelo
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seu tom menos agressivo e pela maior linearidade do enredo. A própria Ana Carolina o classifica de
“cordial e gentil” sem, no entanto descartar a agressividade esta que é, na sua opinião, a razão principal
do seu processo criativo.
Num lançamento simuntáneo do filme em São Paulo, Brasilia, Recife e Salvado – no Rio de Janeiro já
está em cartaz há 14 semanas – Ana Carolina fez a divulgação pessoal em São Paulo e, agora, em rasilia,
em detrimento das outras duas capitais, por ter um carinho especial com a capital federal. “O público e
a emprensa local sempre me deram muito apoio, desde o Festival de Cinema de Brasilia de 69, quando
eu concorri com meu segundo curta-metragem”.
Num exercicio de simplificação, a estória de Sonho de Valsa seria: uma mulher, em torno de trinta anos,
Teresa (Xuxa Lopes) desperta de um sonho com uma sensação que a persegue há tempos, a angústia de
não ter encontrado quem a ame o suficiente. O cenário é uma casa ampla, onde vive com seu pai
(Arduíno Colassanti) e o irmão Bernado (Ney Matogrosso), com os quais Teresa tem uma relação intensa,
próximo ao incesto. A familia se dirige a uma festa onde Tereza vai ao encontro do homem com quem
realiza seu mrimeiro casamento, certa de que havia encontrado seu principe encantado. Mas o principe
é roubado por uma sereia. Começa, então, a “via crucis” de Tereza, que carrega a marca de todos os
homens que a desejaram.
O árduo caminho percorrido pela personagem faz com que ela se liberte de fantasias inúteis e, depois
de sustos, fantasias e sacraficios ela se vé livre. Está madura e consciente de sua condição e pode ir ao
encontro de seu grande amor. Ana Carolina difine o filme como uma busca da individualidade e da
identidade feminina, processi iniciado em Mar de Rosas, início da busca; segue em Das Tripas Coração,
a chegada ao fundo do poço e termina em Sonho de Valsa, que segundo a cineasta é a subida de volta à
superfície.
“Esse era o precurso previsto”, avisa Ana Carolina, “o que , de certa forma, é uma coisa meio tenebrosa,
pois você avisa, vou dar um mergulho, tenho que ter fólego para chegar ao fundo e subir de novo. Mas
vocês fiquem atentos e, qualquer coisa, puxem a corda. O mergulho é uma coisa solitária, individual,
mas tem que ser feito, eu tinha plena consciência disso. Tanto que, quando me sentei para escrever Mar
de Rosas, pensei: vou ficar enganchada aqui por um bom tempo”.
Mas o término do trabalho, que a cineasta chama de “hercúleo”, parece té-la deixado satisfeita, pois ao
cumpri-lo, com “muito rigor e empenho”, ela diz sentir uma felicidade enorme por ter conseguido
realizar uma obra sobre o condição feminista e acrescenta que Sonho de Valsa é um fecho definitivo,
pois não pretende voltar a esse assunto. “Tenho a impressão de que agora estou pronta para ser
cineasta”.
A atuação de Xuxa Lopes, uma atriz de filmes underground, como Assuntina da Américas, de Luiz
Rosemberg, lhe valeram elogios rasgados da crítica e até a torcida do público do IV FestRio (onde o filme
concorria), para que levasse o prêmio de melhor atriz. Não levou, mas ganhou a simpatia geral e a
declaração da diretora de que a atriz se entregou de corpo e alma ao personagem, resultando num
trabalho de alto nível.
Já Ney Matogrosso, que era aguardado impacientemente na sua estréia como ator, foi classificado como
muito timido em cena e até meio apagado. Mas na opinião da diretora ele correspondeu às suas
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expectativas. “O personagem do Ney era pequeno, discrito e contido e, po estarmos acostumados à
exuberância do cantor, isto pode ter acarretado uma certa perplexidade na platéia”.
Muito receosa, antes do lançamento do filme, com o mercado cinematográfico nacional de 87, que
levou ao fracasso de bilheteria filmes de alto nivel, como A Cor de Seu Destino, de Jorge Durán e A
Dança dos Bonecos, de Helvécio Raton, a cineasta tem motivos para se orgulhar da performance de
Sonho de Valsa, até o momento. No Rio, ele já está em cartas há 14 semanas, fato explicado pela
diretora devido a boa repercussão que o filme teve no IV FestRio e ter sido imediatamente lançado no
mercado. Sem hesitar, conclui: “tem sucesso de público, por ser, principalmente, um bom filme”.
Indagada sobre a sua opinião nas modificações implantadas na EmbraFilme, Ana Carolina se esquiva de
comentar sobre a empressa, mas manda um recado ao Ministro da Cultura, Celso Furtado, de que
gostaria de ter uma audiência com ele e alerta: “o ministro tem que acordar, se não vamos ficar todos
roxos e esganados”.
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Paulista, 30 anos, Ana Carolina abandonou o quarto ano de Medicina e o diploma de ciências sociais
para realizar seu primeiro filme curto, A Feira. Seguiram-se Lavrador (co-direção de Paulo Rufino),
Indústra (prêmio da Comissão Estadual de Cultura de SP), Três Desenhos (prêmio do Centro de
Educação e Arte de SP), Monteiro Lobato (co-direção de Geraldo Sarno), Panntanal, Guerra do Paraguai,
A Fiandeira; o média-metragem O Sonho Acabou e o longa-metragem Getúlio Vargas. Nada para ela foi
conseguido facilmente, mas conquistado com muita luta.
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(Ana Carolina)
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Lux Lornal
Folha de São Paulo
24 Out 1982
Os seus filmes, Ana Carolina, para muitas pessoas, são extremamente tristes. Você assume essa
tristeza?
Não. Eu acho que ellas são uma espécie de “Chop Suey” doce-amargo. Afinal, ao longo desses 15 anos
em que eu me fiz mulher fazendo cinema, e fiz cinema me fazendo mulher, o cinema tirou de mim a
tristeza de impossibilidade; pois me deu a possibilidade de me conhecer, de conhocer ao nosso pais; me
deu a possibilidade de ser.
Como você consiguiu dosar o humor e o trágico no “Das Tripas Coração”, sem que nenhum perdesse a
intetensidade? Por que é um filme qu a gente não sabe muitas vezes se é para rir ou chorar?
Tenho um humor muito particular, porque ele sempre repousa sobre a minha tristeza,minhas próprias
angústias e impossiblidades. Quando inventei esse filme, os dois gabaritos onde eu podia me mexer
dramaticamente eram “Ivan, o Terrivel” e o “Muppet Show”. E aí no meio, você imagina o que cabe, né?
(risos) Falei isso para os atores e, quando trabalhávamos, eu virava e dizia: “Mais Ivan! Agora menos
Ivan e mais Muppet!” Sabe? Para equilibrar, proque pesa muito se a gente for só falar das coisas
angustiantes – que eu adoro-, e eu por mim falaria só das coisas que me incomodam, porque quem é
muito feliz não tem a história. Agora, a tragédia, o conflito, o absurdo, isso dá história. Mas não dá para
falar só disso, também. Então, tem mesmo é que correr no meio do “Ivan” e do “Muppet Show”.
Como você vè as pornochanchadas?
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Não sou contra as pornochanchadas, contra o “Caligula”: sou contra a censura. Mas aceito a censura da
faixa etaria. Acho que o mercado brasileiro tem espaço desde a pornochanchada até o meu filme. O
problema é que a economia do cinema de repente ficou um poucoo deformada e predatória por causa
da quantidade de pornochanchadas que tiveram que ser feitas, como uma resposta imediata de
trabalho. O mercado forçou, deformou uma enormidade desses filmes. O que não quer dizer que o
brasileiro só goste disso. Foi uma resposta económica. Não é cultural, não.
Ana Carolina, no caso do Brasil, um país de capitalismo salvagem, como você vè a produção cultural
cinematográfica de nossos días?
A jovem Embrafilme tem mais é que levar um trabalho no sentido do “I Love Brasil” e não “I Love New
York”. E isso não quer dizer que cuando sai nos jornais que o cinema brasileiro anda fazendo sucesso lá
fora, com “Peixote”, “Eu te Amo”, “Bye Bye Brasil”, “Black Tie” eu fique achando ruim. Mas,
evidentemente, a filosofia do “I love Brasil” tem que ser implantada: nosso preduto tem que ter um
mercado aqui. Então vamos trabalhar para construir e possuir o nosso mercado, arrumar a nossa
dramática e talvez com o tempo, ter mercado latino-americano, e ?? vorecer a burguesia nacional a
ocupar esse espaço, por que isso vai facilitar a vida do cinema brasileiro. ??? obrigado.
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O universo feminino de Ana
Dando prosseguimento ao ciclo Ana Carolina, o Belas Artes exibe a partir de hoje o último filme de sua
trilogia, Soho de Valsa, e tambem o mais acessivel dos trabalhos que compõem sua ccomplexa carreira.
Aqui, ela mergulha no universo feminino através de saga simbólica de uma mulher idealista (Xuxa Lopes),
que vive à espera de seu prícipe encantado.
Desencontros amorosos e viagem existenciais fazem parte do filme, bem concebido visualmente, apesar
do baixo orçamento com que foi produzido. Ana relaciona texto e imagem sem qualquer vistígio de
sutileza, ao mesmo tempo que contrói imagens inrigantes e surrealistas. Quando a sofrida heraína diz
que entrou pela cano ela realmente o faz. O mesmo acontece quando ela afirma que está no fundo do
poço, ou que carrega uma cruz muito pesada.
Os romances cor-de-rosas e as idealizações do ser masculino são todoss colocados no lixo e até o irmão
(Ney Matogrosso, em péssima aparição) e o pai (Alduino Colossanti, ainda pior) fazem parte do
imaginário romaceado da protagonista. Pode ser que não seja um filme acessível a todos os gostos, mas
marece atenção especial de quem se interessa pelo cinema brasileiro.
Sonho de Valsa. Brasil, 87. Direção de Ana Carolina. Com Xuxa Lopes, Ney Matogrosso, e Alduino
colassanti.
Ana Carolina dé um mergulho no universo feminino com Sonho de Valsa
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Ana Carolina
A mulher que fez (pelo cinema) das tripas coração
“Não sou feminista porque sou cineasta” diz Ana Carolina
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Gente | Lux Jornal São Paulo
Sabado/Domingo 23 e 24 Setembro de 1978
Cinema Mulher
“Mar de Rosas” é o 11º filme de Ana Carolina e o primeiro de ficção, uma comédia, segundo a cineasta,
“pois o humor é a maneira mais sábia de se falar de todas as coisas”. O filme foi exibido no Rio, com
sucesso e a partir de segunda-feira, entra em dois cinemas da cidade.
“A mulher, raramente, foi bem tratada pelo cinema nacional”
Ricardo Redischi
Depois de realizar uma serie de documentarios a partir de 1967, a cineasta Ana Carolina estrela agora no
“cinema de verdade”, ou seja na fleção, com o filme “Mar de rosas”, que ficou em cartas no Rio de
Janeiro durante quatro semanas, de 16 de fevereiro a 20 de março, onde teve uma boa acolhida por
parte da crítica:
“Inevitamente, nessa epoca, eu tive que ir para a Alemanha e se você não fica aqui em cima do exibidor,
o seu filme corre um risco muito grande, como realmente aconteceu. O exibidor ficou jugando com o
meu filme, transferindo-o de cinema para cinema, numa jogada que confunde o espectador, pois ele
não sabe que, na verdade, o filme foi transferido para uma outra sala, de acordo com a vontade do
exibidor”.
Em 1967, cuando ainda estudava na Faculdade da Medicina da USP – onde participou ativamente da
política universitaria da epoca – Ana Carolina resolveu que escreveria para cinema a acabou trabalhando
como continuista. Em 1968, já dirigia o seu primeiro longa-metragem, “Indústria”.
“Nessa época, o cinema aparecia, para mim, como o caminho capaz de oferecer soluções sociais e
culturais coerentes com o momento. Tinha certeza que o caminho do documentario seria – através da
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pesquisa e da inovação de sua linguagem – uma eficiente abertura para que tomássemos a dianteira
cultural e politica que a circunstância apresentava”.
Tudo pessoa que se interessa ou que faz cinema está preocupada com a cabeça das pessoas e pela
cultura, pela politica, isso me parece bem óbvio. E cinema, para mim, sempre foi uma forma de entrar
no nivel da decisão da inteligencia nacional. O cinema floresce onde existe solações sociais, económicas
e afetivas entre as pessoas.
Segundo Ana, o cinema, posteriormente, torna-se uma profissão como qualqier outra, mas ele sempre
era um ideal para seguir e atingir:
Desde que comecei a fazer documentários, eu sempre me preucupei, especificamente, com os
problemas da minha geração, ou seja, a geração que segurou o rojão de 1968, uma geração que pensou
que ia matar a charada, ficou alegre com essa possibilidade, mas que, no fim, levou aquela cacetada que
todos nós vimos e vivemos. Agora, no nivel da ficção, essas preocupações continuam a existir.
“Feminismo que não vai para a rua fica limitado”
No folheto de propaganda de seu filme “Mar de Rosas” está escrito que o filme é uma comédia
fantastica. Na verdade, o termo fantastico tem uma função publicitaria, pois Ana considera seu filme
uma comédia sem nada de fantastico.
“Eu, realmente, acho que “Mar de Rosas é uma comédia, pois o humor é o único jeito de se faltar das
coisas mais importantes da vida. Todas as situações de “Mar de Rosas” são sérias, mas elas são tratadas
com humor. Por exemplo, as relações entre filhos e pais e entre mulher e marido são relações que tudo
o mundo conhece, ninguem escapa delas. Eu recuei a classe-média tipicamente brasileira não é
chamada classe-média emergente e joguei as situações em cima dessa classe pois a gente só fala das
coisas que nos conhecemos.”
De fato, o filme tem, como personagem principal, a jovem Betinha, (Cristina Pereira), filha de um casal
separado, que é quem detona as situações, procura novas respostas em situações que aparentemente
não tem saidas. Ana acredita que o fato de ter feito um filme em que a personagem principal é uma
mulher, representa um Sabo fato inédito no quadro do cinema brasileiro.
“O cinema nacional não tem ainda um tradição de a mulher ser o personagem principal ou forte. São
poucas as mulheres atuantes que aparecem no cinema brasileiro, de uma maneira geral. A mulher,
raramente foi bem tratado pela cinema brasileiro, então, talvez, a Betinha seja uma proposta nova de
uma mulher que procura saidas".
“Embora Batinha seja a personagem forte – prossegue Ana –, o filme é equilibrado e todas as
personagens tem o mesmo valor. Só que ela é mais jovem e, portanto, procura mais”.
Em relação ao feminismo , Ana Carolina diz que não é uma feminista e sim uma cineasta. Para ele, a
colaboração que ela pode prestar à liberação da mulher está, exclusivamente, em seu trabalho:
“Qualquer mulher que trabalha sente isso. O feminismo fechado em si mesmo, que não sai para a rua é
limitado. Eu acho que qualquer coisa que você queira fazer terá de ser feito ao nivel do trabalho,
politicamente falando, e isso vale e muito para a mulher. Eu não tenho tempo de ser feminista em
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horario integral pois eu tenho que fazer que fazer o meu trabalho e é meio que eu me realizo, como
mulher e como pessoa.”
“É dificil ser respeitada profissionalmente”
Apesar do que se poderia pensar a primeira vista. “Mar de Rosas” não é um filme feminista e Ana diz
que “nada ou tudo no meu filme pode ser visto como uma posição feminista. Uma médica, quando
opera, não opera feministamente, ela está aluindo, e eu acredito que se a pratica feminina e masculina
pode levar a liberaçao, ou, em outras palavras, ninguem aprende a andar se não andar. A personagem
de Betinha não foi feita em função de um estado anterior ou de uma nicação clara, mesmo porque, em
cinema, você pensa uma coisa e depois sai outra. Eu sei mais como é uma menina de 14 anos de que um
menino da mesma idade”
Aos 33 anos de idade, Ana diz que foi um "barrão" o que ela enfrentou para ser respeitada,
profissionalmente, como cineasta:
"Você sabe como é aquela história, não é: um homem, para provar a sua capacidade profissional tem
que tirar uma nota 5, sendo que a mulher tem que atingir o dobro para ser respeitada , ou seja, tirar
nota 10. No começo, eu sentia uma postura bastante paternalista por parte nos homens em relação ao
meu trabalho e tive que fazer muitos filmes para passar para os outros a sensação de que eu já não era
mais uma amadora. Na verdade, eu já havia saído do amadorismo há muito tempo, mas as pessoas se
negavam a ver isso".
Para Ana, o grande divisor de águas de sua carreira foi em 1973/74, quando realizou o documentário
"Getúlio Vargas"; pois a partir dele é que as pessoas começaram a respeitá-la como cineasta:
"Nesse documentário, eu tive que batalhar as piores condições para botar o filme na tele, com muita
audácia". Em relação à produção, Ana destaca o papel do produtor Mario Valcoff, "pois ele foi a pessoa
que realmente entrou com o dinheiro. Sem ele, "Mar de Rosas não teria sido possível".
"Mar de Rosas" pose ser lido de diversas maneiras – feminismo ou exorcismo –, mas isso é público que
vai dizer, mesmo porque eu não estou interessada em defini lo. Para mim, o filme foi experiência
maravilhosa com as pessoas e comigo mesma. Foi um encontro com o meu humor e, além disso, é uma
etapa muito importante para mim em termos profissionais, que eu consegui ultra passar. Agora, a coisa
vai fluir com mais facilidade".
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Mar de Rosas teve entre 300 e 400 mil espectadores. Das Tripas Coração dobrou este número para 700
mil e Sonho de Valsa bateu nos 900 mil espectadores. Nada mau para qem sofre a acusação de
bombardear o público com seus excessos. Ana Carolina realmente adora trabalhar os clichês, vendo
neles instrumentos válidos para estabelecer a comunicação com o público. Mas seus clichês não se
assemelham em nada aos da produção hollywoodiana corrente. Basta citar algumas imagens de Sonho
de Valsa. Teresa, a personagem principal, interpretada por Xuxa Lopes, acha que sua vida é muito dificil
– isto é, que carrega uma cruz –, e Ana Carolina realmente a mostra assim em cena. Teresa se dá mal no
casamento – entrar pelo cano, como se costuma dizer –, e lá aparece Xuxa Lopes encanada. Sente-se
como auma mãe do seu companheiro, e pronto:lá vem a recriação da Pietá
Tudo isso é muito desconcertante, mas constitui a marca registrada de Ana Carolina, uma bela mulher
de 42 anos que, a despeito de sua aparência frágil e delicada é acima de tudo, uma forte em seu
trabalho. A própria Ana recorre a adjetivos como exigente, obsessiva e perfeccionista para definir-se. A
eles deceria acrescentar mais uma instintiva. Ela já esteve nas duas pontas da psicanálise.
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A list of Brazilian women directors compiled from Wikipedia Portugal:
Ana Carolina Teixeira Soares
Ana Luíza Azevedo
Ana Maria Magalhães
Anna Muylaert
Carla Camurati
Danielle Cony
Eliana Fonseca
Eliane Caffé
Gilda Abreu
Laís Bodanzky
Lúcia Murat
Monique Gardenberg
Norma Bengell
Sandra Werneck
Suzana Amaral
Tata Amaral
Tizuka Yamasaki

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