rio mira moinhos de maré
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rio mira moinhos de maré
António Martins Quaresma RIO MIRA MOINHOS DE MARÉ WWW.MILFONTES.NET MILFONTES 2001 Rio Mira – Moinhos de Maré Título: Rio Mira – Moinhos de Maré Autor: António Martins Quaresma Fotos: A. M. Quaresma Colecção (em papel): Terra que já foi Terra. 1ª Edição em papel: Novembro de 2000 1ª Edição electrónica: Maio de 2001 Reservados todos os direitos de publicação total ou parcial para língua portuguesa por: SULEDITA, LDA. Reservados todos os direitos de publicação electrónica por: WWW.MILFONTES.NET Composição, montagem e edição electrónica: WWW.MILFONTES.NET Depósito legal da edição em papel: Nº 156655/00 1 Rio Mira – Moinhos de Maré ÍNDICE Nota da edição electrónica Pág. 3 Nota Prévia do autor Pág. 4 Introdução Pág. 5 O Mira: apresentação histórico-geográfica Pág. 7 Moinhos de maré no Rio Mira Pág. 11 Conclusão Pág. 34 Apêndices I. A moagem no concelho de Odemira. Da proliferação à extinção Pág. 41 II. Documentos Pág. 46 Bibliografia Pág. 48 Notas Pág. 51 2 Rio Mira – Moinhos de Maré NOTA DA EDIÇÃO ELECTRÓNICA O site de Vila Nova de Milfontes orgulha-se de publicar pela primeira vez em formato electrónico, uma obra de grande valor cultural para a nossa história e para a nossa cultura. O autor, tendo já colaborado na criação de conteúdo de elevada qualidade para o site Milfontes.net, acedeu generosamente a publicar a sua última obra neste formato inovador, acessível gratuitamente a todos os portugueses e a todas as pessoas do mundo que falam a nossa língua. Com esta iniciativa, o site Milfontes.net pretende contribuir, não só para a divulgação da cultura portuguesa, mas também das novas formas de tornar essa divulgação mais ao alcance dos autores e logo, mais acessível ao leitor. Obra está disponível para download gratuito em www.milfontes.net. 3 Rio Mira – Moinhos de Maré NOTA PRÉVIA DO AUTOR O presente trabalho sobre os moinhos de maré do rio Mira pretende-se fundamentalmente um levantamento histórico das unidades moageiras maremotrizes. Não se trata, porém, de mera listagem dos moinhos, mas da sua apresentação comentada. Ele baseia-se em documentação de arquivo, onde se encontrou a maior parte da informação aduzida, e também no contacto com os sítios e com as gentes locais. À cartografia do Instituto Geográfico do Exército, deve a localização exacta de alguns dos moinhos de todo desaparecidos, fisicamente e da memória colectiva. Como resultado de um levantamento, este texto constituirá, porventura, o início de outros projectos, quer no sentido de aprofundar os conhecimentos, através, por exemplo, de trabalhos de arqueologia industrial, quer no da salvaguarda do património cultural. Aí residirá a sua utilidade. Posteriormente, entendeu-se proveitoso juntar um quadro geral, embora sumário, da moenda tradicional no concelho de Odemira. Fica, finalmente, o agradecimento ao Dr. António Eduardo Mendonça, com quem percorri os caminhos da descoberta da moagem maremotriz no Mira e a quem devo grande parte das referências que enquadram este trabalho. Milfontes, Primavera de 1996 4 Rio Mira – Moinhos de Maré INTRODUÇÃO Os moinhos de maré constituem uma categoria particular dos moinhos hidráulicos. Eles utilizam o efeito das marés, mais concretamente a diferença de nível entre o preia-mar e o baixa-mar, para colocar em funcionamento o aparelho de moagem. Localizam-se, por isso, próximo da costa, onde as marés se fazem sentir, geralmente em estuários com margens alagadiças e esteiros. A água, na enchente, é retida numa grande represa – a caldeira –, podendo ser utilizada para moer no refluxo da maré logo que, no exterior, a roda motriz fica desbloqueada. Esta está colocada horizontalmente no interior de uma câmara, onde se move por acção de um jacto de água lançado sobre o penado (conjunto de pás ou penas da roda), a modo de uma turbina primitiva. O movimento obtido é transmitido directamente à mó andadeira, que gira à mesma velocidade. A roda horizontal – rodízio – é a roda motriz aplicada na generalidade dos moinhos portugueses. Uma variante – o rodete –, em que a roda gira no interior de um poço, teve difusão recente e restrita. Uma excepção à utilização da roda horizontal surge exactamente no rio Mira. Ao contrário, nas costas do norte da Europa (França, Grã-Bretanha) difundiu-se a roda vertical, cujo movimento é transmitido à mó através de uma engrenagem, constituída por uma grande roda dentada – a entrosga – e um carreto, o que permite a multiplicação da potência. 5 Rio Mira – Moinhos de Maré Tanto o rodízio como a roda vertical têm origem remota e foram durante muito tempo empregados apenas nos rios e ribeiras do interior (água doce). O primeiro, aparecido provavelmente fora da zona de influência greco-latina, surge, no início da nossa Era, em lugares tão diferentes como a Jutlândia, o Mediterrâneo oriental e a China; a segunda, também possivelmente oriunda do exterior do mundo mediterrânico, é descrita por Vitrúvio na sua obra De Architectura, escrita no século I a.C.1 Hoje, está difundida a noção de que o moinho de maré é uma realidade Atlântica, de origem europeia, que data da Idade Média2. Quanto a Portugal, no actual estado dos conhecimentos, pensa-se que o Algarve, de onde surgem notícias que remontam ao século XIII, foi o "berço" da moagem maremotriz. No que diz respeito ao rio Mira, verifica-se, após o levantamento histórico efectuado, que o número de engenhos construídos foi bastante superior ao que se poderia supor a priori, e a sua área de difusão estendeu-se até à vila de Odemira, distante mais de vinte quilómetros da foz, graças à extensão do efeito das marés e às margens de morfologia apropriada. 6 Rio Mira – Moinhos de Maré O MIRA: APRESENTAÇÃO HISTÓRICO-GEOGRÁFICA O rio Mira é, do ponto de vista físico, com os seus cerca de 130 Km de extensão e a sua bacia de 1576 Km2, o mais importante curso de água a desaguar na longa linha de costa entre o estuário do Sado e a foz do Guadiana, conquanto, no contexto nacional, não ultrapasse o estatuto de rio secundário. Com o Sado comunga, aliás, a particularidade de correr na direcção SE-NO. Mas delimitemos mais precisamente o espaço/tempo que constituirá o objecto desta apresentação. Tendo em conta os objectivos do presente trabalho, deixemos de lado o Mira doce, a "ribeira", isto é, o troço não influenciado pela maré, e consideremos apenas os quase 30 quilómetros desde a foz até à vila de Odemira (embora a maré suba um pouco a montante desta vila). As suas características são aqui as de um rio envelhecido. Em grande parte da secção meandra, sem desnível patente, no fundo do vale fortemente encaixado entre montes xistosos. Porém, uma longa faixa de vasas e sapal margina o leito do rio, dando origem a esteiros e reentrâncias, muitas vezes à saída dos vales de escorrência erodidos perpendicularmente ao "rio mestre de água salgada" (expressão repetida nos autos de medição dos tombos da câmara de Odemira). Na parte terminal, capturado por um vale de origem tectónica, volta bruscamente para oeste e, cortando transversalmente a planície litoral, encontra o 7 Rio Mira – Moinhos de Maré oceano junto a Vila Nova de Milfontes. A acção dinâmica e salina das marés marca hidrologicamente este troço, influenciado também de forma visível pelas cheias da época chuvosa (principalmente antes de 1968, ano do enchimento da grande barragem de Santa Clara). A relação íntima com os ritmos e os humores marítimos é percebida, por exemplo, pelo pároco de Milfontes, em 1758: "nasce o dito rio do mar largo, onde tem a barra",3 diz e repete, perspicaz, o prior, confundindo aparentemente as coisas. Perspectiva confirmada por pesquisas recentes, que mostram a penetração da massa de água de características marinhas até 7.5 Km para montante, em preia-mar de águas vivas, a partir dos quais descem gradualmente os níveis de salinidade e o impacto das marés.4 No entanto, toda esta secção sofre marés de amplitude significativa, que, no ponto mais distante, em Odemira, atinge os três metros, conforme medição feita por nós durante marés vivas de Outubro, apesar de Adolfo LOUREIRO5 referir uma amplitude de apenas 2 metros. O retardamento das marés relativamente à foz cifra-se aqui em 1.30 h. Apreciemos, por outro lado, um corte temporal diacrónico, cuja profundidade atinge o século XIII, altura da ocupação cristã, não porque constitua ponto de viragem no papel histórico do rio Mira, que cremos não se ter verificado, mas porque um novo conjunto documental escrito permite um estudo mais preciso. A espessura aparentemente exagerada deste corte revela-nos uma persistência estrutural assinalável no que respeita à organização funcional do espaço. A forma como se apresenta a ocupação humana das margens do Mira sugere, desde logo, a sua importância como via de comunicação. Deparamos, até ao fim do século XV, com uma única e antiga povoação: Odemira. Situada no fundo do troço navegável, na convergência dos caminhos e dos produtos da sua área de influência, protegida pelo seu castelo e principalmente pelas cinco léguas de estrada fluvial que (além de a ligar) a separavam do mar e dos seus riscos, Odemira é o porto do rio Mira. Quando os documentos medievais mencionam Odemira referem-se a uma realidade complexa: a vila, o rio, a área polarizada e, implicitamente, a sua articulação. O próprio topónimo, em que se aglutinam os elementos linguísticos que significam a ideia de rio, é disso indiciador. No resto, quanto muito algumas manchas de povoamento disperso salpicam um vasto espaço geralmente deserto. Os recursos naturais do Mira não se mostravam 8 Rio Mira – Moinhos de Maré suficientes para compensar a fraca aptidão agrícola dos solos xistosos e acidentados da margem direita e, sobretudo, os da charneca arenosa da margem esquerda, que, ainda no século XIX e princípios do XX, é chamada em documentos municipais "charneca do deserto". Na segunda metade do século XV, a rarefacção demográfica sensibiliza o conde de Odemira que, decerto interessado em aumentar as produções do condado, intercede junto de D. Afonso V. Este corresponde: por carta régia de 1475, tenta atrair braços para a agricultura, concedendo a possíveis interessados as vantagens constantes no couto de homiziados de Mértola, fossem eles ou não homiziados. São ainda razões económicas e de segurança, ligadas às capacidades comerciais do rio Mira, que levam D. João II, em 1486, a fundar praticamente ex nihilo a vila de Milfontes, em terras da Ordem de Santiago. Razões que, pressentimos, terão sido apresentadas pelos notáveis odemirenses, aquando da visita real à vila no ano anterior. Povoação de criação administrativa e tardia, implantada na "frente de batalha", Milfontes haveria de sofrer as consequências da exposição aos perigos marítimos. Assaltada e destruída cerca de 1591 (ou um pouco antes), viveria, mesmo após a edificação do seu forte em 1599-1602, no sobressalto contínuo de desembarques estivais da pirataria mourisca, em recrudescimento durante o século XVI. O povoamento desde logo tentado através do velho expediente dos coutos de homiziados, antes aplicado de forma mitigada a Odemira, teria em Milfontes efeitos de duvidosa eficácia. Os perdões, as vantagens fiscais concedidos aos condenados para viverem neste pobre e perigoso local revelaram-se afinal de alcance limitado, fosse pelo insignificante número de aliciados, fosse pela tendência de estes se eximirem às suas obrigações, por vezes com a própria aquiescência real certamente em resposta a pedidos de gente com influência no Paço. O Mira cumpria pois a função de via de escoamento dos produtos regionais, fundamentalmente através da vila de Odemira que, a partir de finais do século XV, se viu complementada com o anteporto de Milfontes. Uma série de pontos intermédios de carga e descarga foram surgindo ao longo das margens, à medida que cresciam núcleos de povoamento, e muitas vezes ligados à exportação de determinados produtos. Embora chamados de "portos", não eram equipados com qualquer estrutura portuária. Um deles, o da Casa Branca, servia a 9 Rio Mira – Moinhos de Maré aldeia de S.Luís, mas só em 1939, em plena euforia das campanhas do trigo e das obras públicas, seria apetrechado com um cais em estacaria de betão armado e um celeiro da Federação Nacional dos Produtores de Trigo. Carregaram-se mercadorias como cereais, carvão, lenha, cortiça, minério, algum mel, cera e vinho, umas revelando notável persistência ao longo dos séculos, como os cereais e os combustíveis, outras sobressaindo em certos períodos, como a cortiça e o minério, ambos ligados à revolução industrial e ao desenvolvimento económico verificados na Europa no século XIX. Apenas dois dos produtos foram objecto de transformação industrial local: a cortiça e o pelame. Quase tudo destinado a Lisboa, cujo mercado ávido de combustíveis, alimentos e outros produtos decidia a estrutura do tráfego marítimo local. Aliás, da praça de Lisboa provinha a maior parte das importações, constituída por vasta gama de mercadorias necessárias à vida da população. Em 1801, o poeta inglês Robert Southey partiu um copo de vidro na estalagem de Milfontes: disseram-lhe que era necessário mandar vir outro de Lisboa.6 Do Algarve e de Setúbal provinha um produto precioso: o sal. As ligações directas com portos estrangeiros ter-se-ão verificado em esporádicos ciclos: ainda na Idade Média, possivelmente com portos franceses; na segunda metade do século XIX, com ingleses, por via do minério de ferro de que a revolução industrial inglesa carecia. No contexto nacional, o movimento comercial do Mira representou uma pequena percentagem do tráfego marítimo português.7 O que, dando embora a noção da importância relativa do Mira como via de escoamento de produtos, oculta, de algum modo, a real importância do porto, em termos regionais e das suas relações com o porto de Lisboa (incluindo as povoações da margem sul do Tejo). A navegação de cabotagem cessaria nos anos 60 deste século, não pelas reais dificuldades operativas, derivadas do assoreamento da difícil barra e de alguns baixios junto a Odemira, mas pelo aparecimento de alternativas preferíveis para o transporte de mercadorias e pessoas. Sofreu o primeiro embate com a abertura da linha férrea do Sul, ainda no século XIX, e cedeu perante a expansão da rede viária e da camionagem, lançada entre as guerras e relançada, definitivamente, após a segunda. 10 Rio Mira – Moinhos de Maré O último ciclo do Mira baseia-se no turismo, sobretudo balnear, na piscicultura e na pesca e marisqueio artesanais.8 Barco de cabotagem MOINHOS DE MARÉ NO RIO MIRA "... os moinhos e os moleiros foram, entre nós, até à introdução e difusão da maquinaria a vapor, eventos históricos muito significativos, e um dos esteios fundamentais da vida da grei". in Joel SERRÃO, Temas Oitocentistas "Por entre os diversos engenhos arcaicos de moenda que existiram ou ainda existem no nosso país - os moinhos de vento, as azenhas, os moinhos de maré - são estes últimos os mais esquecidos e os mais ignorados." in Fernando CASTELO-BRANCO, Os Moinhos de Maré em Portugal A mais antiga referência documental disponível sobre moinhos de maré no rio Mira remonta a 1488, sendo a data da sua construção, portanto, mais antiga. Em carta 11 Rio Mira – Moinhos de Maré régia de 8 de Novembro desse ano9, D. João II concede a D. Luís de Noronha – irmão de D. Maria, condessa de Odemira, e por tal via cunhado de D.Afonso, conde de Faro – os "patrimoniaaes que ficarom de dom afonso que foy comde de Faraã, a saber, hu a vinha da lezira e hu a orta que foi de aluaro mendez e hu pomar e hu as casas e hu a adega e hu moynho que se chama de dom sueiro e o quarto do moinho da mamoa que todo he no Ryo da dita villa dodemira todo em parte de çertas Remdas de que lhe tinhamos feita mercçe na dita villa que demos aa comdessa dona maria sua irmaa." Acrescente-se que foi primeiro conde de Odemira D. Sancho de Noronha, que obteve o título em tempo de D. Afonso V, durante a regência do Infante D. Pedro. D. Maria de Noronha foi segunda condessa, tendo casado com D. Afonso, conde de Faro. Ainda que o documento atrás citado não refira expressamente o tipo de engenhos, não há lugar para dúvidas: trata-se de moinhos de maré. Aliás, o local, ainda hoje denominado de "D. Soeiro", na margem direita do Mira, oferece condições propícias à edificação de um engenho desta natureza, já que o vale apresenta ali requisitos adequados para albergar a caldeira ; e, se parece não existir já qualquer sinal do velho edifício e o coberto vegetal dificulta a leitura da caldeira, alguns actuais moradores das imediações afirmam recordar restos de mós neste local. O próprio topónimo – "caldeira de D. Soeiro" – é elucidativo. Ademais, referências documentais posteriores a este moinho tiram-nos qualquer hesitação sobre a sua classificação. Note-se que a colmatação da área da caldeira, transformada hoje em várzea de cota superior à das águas do Mira, constitui um processo natural. De facto, a deposição de materiais no fundo da caldeira – fossem as areias e vasas carreadas pelas enchentes ou os detritos transportados pelas torrentes de cheia que ali confluíam – constituía um problema sempre latente para os moleiros, eventualmente obrigando mesmo a suspender a laboração do engenho para dragagem e limpeza da área (situação de que, no entanto, no caso do Mira, não há notícia). Uma vez interrompida a actividade do engenho e com ela os cuidados de desassoreamento, área e volume útil da caldeira restringem-se progressivamente, encetando processos de sapalização – que se desenvolvem em paralelo na face exterior dos muretes de terra que delimitam a caldeira, o que, adicionado à erosão que estes vão sofrendo, lhes dilui a definição e consequentemente a nossa percepção da caldeira. 12 Rio Mira – Moinhos de Maré Por vezes, a acção natural foi complementada pela intervenção humana, drenando e/ou aterrando a área para a disponibilizar para outros usos – como também frequentemente aconteceu com o sapal original. Para lá das várias reutilizações de razão urbana, que não é altura de abordar, registam-se em meio rural casos de secagem e reconversão parcial ou total das antigas caldeiras para pastorícia e para cerealicultura (de cereal com maior resistência à salinidade do solo, como por exemplo a cevada). Assim terá acontecido em D. Soeiro em finais do século XVIII, dado que em 1770 (ver posturas, em anexo) o moinho ainda funcionava, mas em 1805 já não consta do inventário municipal então efectuado. Em 1815, a "caldeira de D. Soeiro", que tinha outrora pertencido ao condado, era vendida em hasta pública, no Conselho da Fazenda a um Pedro José Lopes, da vila de Odemira, numa altura em que foram alienados diversos bens da Coroa para consecução de receitas destinadas à manutenção do exército.10 Em 1836, (ver posturas, em anexo) já o concelho substituíra os antigos moinhos de D. Soeiro e d'Além, entretanto parados, pelos novos moinhos das Moitas e do Roncão, no papel de abastecedores da vila de Odemira em complemento dos moinhos de vento. Mais problemática se afigura a localização do citado "moinho da Mamoa". A designação, aparentemente relacionada com a topografia do local onde o engenho estava implantado, desapareceu por completo da toponímia – e em nenhum outro documento a reencontrámos. Sugerimos, em tempos, duas hipóteses de localização, atendendo às condições propícias para a moagem maremotriz: junto à acentuada curva que o rio descreve defronte da Cuba, na margem direita, ou no local onde se encontra o moinho das Moitas 11 . Hoje, inclinamo-nos para outra hipótese: o moinho da Mamoa seria o moinho depois chamado moinho d'Além, na margem esquerda. Adiante, voltaremos ao assunto. Atentemos agora na data da carta régia: 1488. Na cronologia dos moinhos de maré da costa portuguesa, podemos considerála relativamente tardia – mesmo suspeitando como razoável a antecipação de algumas décadas na construção dos dois engenhos mencionados no documento. De facto, por finais do século XV, havia moinhos de maré na ria de Aveiro (primeira referência em 1449), e já eles pontuavam as duas áreas ribeirinhas que sempre em maior número os 13 Rio Mira – Moinhos de Maré albergaram: o estuário do Tejo, pressionado pela grossa procura da capital – onde terão surgido em trezentos, de Alcântara (1313) ao Montijo (1386)12 – e, evidentemente, o litoral algarvio, cuja rede hidrográfica e distribuição populacional estimulavam a sua difusão – de Lagos (1457) até Castro Marim (a mais antiga menção destes engenhos em Portugal: 1290).13 De entre as zonas estuarinas e lagunares que em Portugal mais propiciam o aproveitamento do potencial das marés, só no rio Sado a sua génese terá sido mais tardia (Tróia, autorizado em 1502).14 É uma constatação sem estranheza, se lembrarmos que a bacia do Mira apresentava então medíocre densidade demográfica e núcleos “urbanos” diminutos – logo pouco susceptíveis de gerarem pressões de procura que estimulassem qualquer opção precoce pela moagem maremotriz. E não devemos esquecer um freio sempre latente na apropriação económica destas zonas: a solicitude que piratas e corsários por largos séculos dedicaram às implantações vestibulares e costeiras mais indefesas.15 Em todo o caso, é preciso não esquecer que nos séculos XV e XVI se assiste a uma aceleração do crescimento populacional no País e também na região. Poucos anos decorridos sobre a concessão joanina, tem lugar uma "visitação" da Ordem de Santiago a Vila Nova de Milfontes. Estamos em 1517. E o texto refere por duas vezes a possibilidade de estabelecimento de moinhos de água salgada:16 Em primeiro lugar, para valorização dos domínios, exortam-se os comendadores a darem "luguar e liçemça aos que quiserem fazer moinhos daguua doce com tall comdiçam que paguem allgu foro a ordem alem do dizimo ou conheçemça que ouuerem de paguar. E esto daram de em fatiota pera sempre. E omde ouuer salguado se paguara da agoa e teRadeguo o dito foro alem do dito dizymo ou conheçemça." Mais adiante, é regulamentado o pagamento das conhecenças (espécie de imposto industrial): "os moynhos pagam de cada h cimquo allqueires. E estes sã os daguoa doçe e os dagoa salgada pagã de cada mojnho quatorze alqueires." Testemunho da maior produtividade dos engenhos de maré face aos moinhos das ribeiras, frequentemente sujeitos a débitos mais precários e à inconstância sazonal da fonte de alimentação. Embora a laboração dos moinhos de água salgada também enfrente limitações funcionais como por exemplo a variável amplitude das marés, de regime sujeito à influência lunar (circunstância que as minuciosas Memórias 14 Rio Mira – Moinhos de Maré Paroquiais não se esquecerão de salientar), podiam praticamente trabalhar todo o ano. Em 1565, realiza-se nova visita de inspecção a Milfontes. Os visitadores, depois de reagirem contra a falta de pagamento das conhecenças dos moinhos que à Ordem eram devidas (subterfúgios e omissões, ou crise de rentabilidade?), e ainda a propósito de outras irregularidades, citam particularmente um dos engenhos:17 "fomos informados que hos moinhos da gama que estao no termo desta villa no esteiro do comendador he da ord e foreiro a ella hu a dobra de cento e vinte reis o quall nam amostrou titullo dentro no termo que lhe foy noteficado pello cõforme ao Regim to que trazemos de sua Magestade o auemos por deuoluto aa ord para o comendador o possa daar de nouo a qu o aproueite e pague o foro aa ord ". Os moinhos da Gama mencionados no texto correspondiam decerto a um único moinho, equipado, muito provavelmente, com duas moendas. A sua construção num esteiro indicia claramente a forma de energia que utilizava, facto que é corroborado por documentação posterior. Este esteiro merece, aliás, a nossa atenção. Conhecido ainda por esteiro da Gama, do nome da propriedade onde se inclui, a sua designação parece associar-se aos Gama, da alcaidaria de Sines, nomeadamente Estêvão da Gama, pai de Vasco da Gama, senhor de Sines e de Colos e comendador do Cercal (lugar que, a partir de 1486, integraria o novo concelho de Milfontes). A carta de fundação de Milfontes chama-lhe "esteiro de Pomares"; mas surge anos depois (1565) designado por "esteiro do Comendador", alusão quase certa à comenda da Ordem de Santiago. Se refere algum comendador em particular ou, genericamente, o comendador de Santiago, é dúvida que não foi possível esclarecer. "Esteiro da Gama" e sobretudo "Esteiro do Comendador" constituirão portanto formas toponímicas que relacionam o sítio com o senhorio. Apesar de tudo, deixa-nos perplexo o facto de, pelo menos até 1565, a lista dos bens da comenda não incluir qualquer propriedade em Milfontes, mas apenas no Cercal, e nunca termos encontrado nas rendas da comenda qualquer menção a moinhos. Em todo o caso, esta relação com a Ordem de Santiago desaparecerá ainda antes da extinção das ordens religiosas (1834), pois no início do século XIX é o concelho que aí detém direitos de propriedade. 15 Rio Mira – Moinhos de Maré Por este esteiro desce uma linha de água, perene mesmo nos anos mais secos, que desaguava até ao princípio deste século num extenso braço de rio, entretanto murado e destinado a outras serventias. Também este braço de rio merece consideração. Penetrando longamente na perpendicular do curso normal do rio, nele desaguavam três linhas de água: a já citada da Gama, a do Amieiral e a da Samouqueira, as quais tinham nas suas fozes outros tantos moinhos de maré – facto que coloca a questão da importância da água doce no funcionamento desses moinhos, considerados de água salgada na documentação consultada. Depois de murado, após venda pelo Estado a um particular (1912), e interrompida a sua ligação com o curso principal do rio (com excepção de duas comportas), este braço foi parcialmente aproveitado para salicultura. Hoje, grande parte dele está ocupado com uma exploração piscícola de dimensões significativas (confrontar cartas do Exército, levantamentos de 1952 e 1985). A ligação da população local ao "esteiro" (sentido extensivo ao braço de rio), que tradicionalmente era considerado um viveiro natural do rio para espécies piscícolas e mariscos, constitui um problema para os actuais proprietários, obrigados a colocar placas avisadoras, construir vedações, etc. para impedir as pessoas de lá irem pescar. Hoje, o visitante menos atento poderá ter dificuldade, sem a ajuda de qualquer velho habitante, em fazer uma leitura diacrónica do espaço em questão, designadamente quanto à possibilidade de existência de moinhos de maré a uma distância considerável do rio (facto que as Memórias Paroquiais registam). Finalmente, acrescente-se que a carta do Exército (levantamento de 1952) designa o local como Vale do Homem, o que em tempos nos levou a estabelecer uma relação com o comendador de Santiago (homem tal que dispensaria precisões). É preciso, porém, não esquecer que este topónimo é dado, principalmente no Norte, a vários rios e ribeiras, tendo possível base etimológica diferente. 16 Rio Mira – Moinhos de Maré Antigo braço do rio, hoje ocupado por exploração piscícola. Ao funto existiram três moinhos de maré Regressemos à nossa cronologia documental. Para o século XVII, obtivemos alguns dados. O mais preciso reporta-se ao moinho d'Além, o primeiro engenho referenciado na margem esquerda. Em 1651, a Misericórdia de Odemira comprou 20 alqueires de trigo em fateusim, impostos no moinho d'Além, a Beatriz Rafael, que os herdara de seus pais, em razão de estes os possuírem por mercê dos condes de Odemira. Em 1710, este foro era pago pelo licenciado Luís de Amaral da Guerra, que pediu e obteve redução para 12 alqueires, dado que o moinho estava de todo "perdido" e "não rendia coisa alguma". Na mesma data, no mesmo moinho, pelo mesmo motivo, o referido licenciado, obteve o rebatimento de vinte alqueires em outro foro de quarenta alqueires, o que mostra a multiplicidade de ónus a que este moinho estava sujeito 18, situação que, aliás, ocorria em vários moinhos de água doce (e não só em moinhos). A propósito, recorde-se a carta régia de 1488 que dizia terem os condes de Odemira ¼ do moinho da Mamoa, e não podemos deixar de colocar a hipótese, apesar de tudo não completamente comprovada, de identificação do velho moinho da Mamoa com o d'Além. A alteração do nome poderá ter sido consequência de vicissitudes por que passou, designadamente por períodos de inactividade e mesmo de ruína. A designação "d'Além", que significará simplesmente a localização relativamente à vila 17 Rio Mira – Moinhos de Maré de Odemira (além = margem oposta) poderia ter substituído a certa altura o antigo topónimo "Mamoa". A decisão fica, contudo, em aberto. O moinho d'Além deixou de funcionar entre 1770 e 1805, datas, respectivamente, das posturas do concelho que referem a sua laboração, e do inventário municipal onde ele já não é mencionado. A sua localização é precisável dado que o topónimo ainda persiste, tal como, entre os moradores, a memória da sua existência (mas não a lembrança de vestígios físicos, há muito desaparecidos). A antiga caldeira, colmatada, é hoje várzea utilizada como pastagem. Percorre-a uma vala de drenagem, como em D. Soeiro. Em notícia de 1700, é mencionado junto à própria vila de Odemira um "moinho da Vila", pertença do Condado.19 Trata-se possivelmente de um moinho de maré, dada a sua localização na margem direita do rio, em sítio hoje colmatado por aterros e integrado no perímetro urbano, mas até há algumas dezenas de anos inundável pelas suas águas. A natureza do terreno ficou bem visível durante a recente abertura de caboucos para um edifício construído junto à empresa rodoviária, em que sob cerca de 3 a 4 metros de entulhos se encontrou o solo de vasa da antiga margem. Aliás, a amplitude das marés (cerca de 3 metros em águas vivas) é neste local suficiente, cremos, para permitir a moagem maremotriz. No entanto, verificamos que ali desaguava uma linha de água que escorria pelo Vale de Água (Água Férrea, actualmente), facto que aliás acontecia com alguns outros moinhos de maré do Mira, e que deixa a dúvida sobre a verdadeira natureza do engenho. Quase um século depois, em 1791, nova notícia parece indicar que o moinho da Vila (ou da Longueira, como também era chamado) estava desactivado, situação natural tendo em conta que já então estava a laborar pelo menos um moinho de vento junto à vila.20 Em meados do século XVIII, o pároco de Vila Nova de Milfontes conta seis moinhos, exclusivamente na sua paróquia21; referia-se, sem dúvida ao número de moendas: duas por cada um dos moinhos existentes. Mas o eclesiástico não se limitou à contabilidade; reservou-nos igualmente uma detalhada caracterização dos engenhos: 18 Rio Mira – Moinhos de Maré "Existem no destrito desta villa muytos moinhos de moer paõ, mas todos naõ obstante, moem com a suas agoas salgadas, estaõ todos retirados do mesmo Rio em distancia da quarta parte de huã legoa, em pequenos braços do mesmo Rio a que por cá chamaõ Esteyros; os quais moinhos nos seus sítios tem bons aSudes, que por huã comporta recebem as agoas nas enchentes das marés, e a conservaõ nas caldeiras dos mesmos aSudes, e entrando a vazar a maré, com a mesma agoa vazante fecha a comporta e fás emcaminhar aos cubos, ou cáles dos moinhos, e encanando para os rodizios os fas moer, the que a maré torne a encher que he o espasso de seis horas, porque tantas gasta a maré em vazar, e outras // e outras seis a emcher. So porem nas mares grandes de agoas vivas, que saõ nos quartos em que a Lua he nova, ou chea, he que as caldeyras dos ditos moinhos, que neste destrito saõ seis, tomaõ agoa suficiente para faze llos moer; porque nos quartos crecentes, e minguantes, que se diz serem agoas mortas, naõ sobem aos ditos moinhos agoas que enchaõ suas caldeyras para os fazer moer. E pello rio assima, ja no termo de Odemira há muytos semelhantes moinhos que tem agoa do mesmo modo..." Pela mesma altura, pelas contas do pároco do Salvador (Odemira), eram seis os engenhos de maré existentes no Mira22, enquanto o pároco de Santa Maria (Odemira) reduzia este número para cinco.23 Ambos enumeravam certamente os moinhos e não os casais de mós; um deles enganou-se, ou terão talvez contabilizado diversamente algum engenho já mais abandonado e imprestável, e por isso menos visível no quotidiano e na memória. Acrescente-se que, ainda nesta ocasião, o pároco de S. Luís revelava que na sua área de jurisdição só havia engenhos moentes com água salgada da maré24 – testemunho da aparente suficiência da oferta moageira existente, e que vem comprovar a tardia difusão dos moinhos de vento por esta região. De resto, na mobilização moageira das energias naturais, o engenho eólico é o benjamim da família, e recurso frequentemente serôdio e complementar de outros sistemas. Na segunda metade do século XVIII, ocorre um surto de construção de moinhos de maré, segundo informações do tombo dos bens do concelho de Odemira, realizado em 1805.25 Por essa altura, temos o surgimento da moagem eólica em Odemira. Factos que estão de acordo com o crescimento demográfico que então se terá verificado. Constam do mencionado tombo os seguintes moinhos de maré: O moinho do Roncão, edificado em fins do século XVIII ou mesmo no início do XIX na herdade do Roncão (freguesia do Salvador, de Odemira), tinha dois aferidos de que o “possante” pagava uma "propina" de 200 réis ao Concelho. Pelo 19 Rio Mira – Moinhos de Maré auto de medição, achou-se ter de comprimento nove varas e meia e de largura quatro varas.26 Deixou de funcionar nos anos 40 do nosso século. A ele voltaremos mais adiante. O moinho do Alference, construído na herdade de Vale de Gomes (ou Vale de Egomes ou Vale de Agomes, como então se grafava, e ainda hoje se pronuncia) em 1791, tinha no início três aferidos, de que pagava 300 réis ao Concelho. Acrescentaram-lhe depois mais um aferido, passando a pagar pelos quatro a quantia de 400 réis. O edifício tinha de comprimento doze varas e de largura quatro e meia. Com os seus quatro aferidos terá sido o maior moinho do Mira, mas, tudo indica, o de vida mais curta, atendendo a que poucos anos depois estava "demolido"27, e dele não se encontram mais referências. Das razões da fugacidade deste moinho é impossível saber sem mais informações. Situação susceptível de sofrer estragos e avarias com as cheias do Mira? Vicissitudes da vida dos proprietários? O moinho do Roncão de Baixo (freguesia de S. Luís) trabalhava com três aferidos, de que pagava 300 réis. Tinha de "fundo" dez varas e de frente quatro varas e meia28. Desconhece-se a data de construção. Na herdade das Dobadouras (freguesia de S. Luís) moía um pequeno moinho de um único aferido. Pagava 100 réis e tinha as dimensões de quatro varas por quatro. A construção, de final do século XVIII.29 Na fronteira do concelho de Odemira com o de Vila Nova de Milfontes encontrava-se o último moinho constante do inventário citado: o moinho da Samouqueira, num esteiro da herdade do mesmo nome. Tinha dois aferidos, de que pagava 200 réis ao concelho. Dimensões: nove varas de "fundo" e quatro e meia de frente. Da data de construção sabe-se apenas que é anterior a 1747, pois já constava de um tombo desse ano.30 Em 1822, há notícia31 de um moinho cuja caldeira se situava no "porto da Eira", cerca de 200 metros a jusante do porto do Peguinho (tradicional porto fluvial de Odemira). Pelo teor desta notícia, o referido moinho havia sido abandonado ainda no século XVIII, pois o lavrador da Crata (herdade junto ao rio, na margem oposta) ouvira em criança os mais velhos referirem-se a ele. A caldeira estava em 1822 transformada em várzea cultivada de milho e trigo, este próximo da cabeceira, decerto por ser menos atingida pelo salgado, e era atravessada por um caminho de acesso ao 20 Rio Mira – Moinhos de Maré porto da Eira, onde atracavam barcos da cabotagem. A existência desta serventia levou a uma contenda judicial entre o proprietário, de um lado, e a câmara e os mestres dos barcos, do outro. Nessa data, do edifício do moinho apenas subsistia a memória entre os habitantes. Pela localização e configuração da margem, trata-se quase seguramente de um moinho de maré. A proximidade da vila de Odemira, conduz-nos a supor que, tal como o moinho da Vila, se destinava a abastecer em primeiro lugar a população urbana. Ainda no princípio do século XIX, os moinhos de maré de Vila Nova de Milfontes aparecem arrolados no tombo dos bens do concelho32. E são três, a saber: Primeiro, o já citado moinho da Gama, no esteiro do Comendador, confrontando com as herdades ditas da Gama e do Barranco e com o termo de Odemira (herdade da Samouqueira, S. Luís). Dele pouco mais subsistia do que o nome, dado já então estar totalmente arruinado. Ainda vive quem se lembra de ver, junto à comporta da Gama, o "chão" do moinho e duas passagens de água, certamente correspondentes aos dois aferidos (Joaquim "Ratinho", de 70 anos, morador nos foros do Freixial). Pagava 300 réis de foro, não pela moagem, mas pelo uso da sua várzea cerealífera (o que permite suspeitar uma sensível colmatação ou drenagem da caldeira), que tinha de "circunferência" 827 varas.33 Neste esteiro, surge pela primeira vez notícia da cultura de arroz junto ao rio Mira, já no século XIX, graças à água abundante e perene do ribeiro que descia pelo Barranco (o qual, a montante, ainda mostra as ruínas ou vestígios de outros três moinhos apenas de água doce). Segundo, o moinho do Amieiral, que ficava no esteiro do Amieiral, sítio do Bate-Pé. Confrontava com as herdades do Galeado, do Amieiral e da Gama. Reza o texto que tinha duas moendas em bom estado, pagando 300 réis de foro.34 O esteiro ou caldeira tinha de "circunferência" 1290 varas. A sua construção é anterior a 1746, data em que já o concelho era reconhecido por senhor directo do moinho e do esteiro. Nos nossos dias, ainda há a lembrança de que moía com água salgada e com água doce (Jorge José, nascido em 1898 e falecido em 1994), graças ao ribeiro que aí desaguava, o qual teve mais três moinhos apenas de água doce, a montante do do Bate-Pé. 21 Rio Mira – Moinhos de Maré Terceiro, o moinho do esteiro do Freixial, que partia com as herdades do Freixial e do Galeado. Tinha duas moendas em bom estado e pagava 400 réis de foro. O esteiro ou caldeira tinha 608 varas de "circunferência". Constava já do tombo de 1746 como foreiro ao concelho.35 Conhecido, desde pelo menos a segunda metade do século XIX, como "moinho da Asneira", (nome que surge também num moinho de água doce da ribeira de Odeceixe), não sabemos se foi rebaptizado ou se essa designação já existia no falar do povo. A estes engenhos se referiria em 1758 o pároco de Milfontes quando dizia existirem seis moinhos de maré no termo deste antigo concelho, significando o número de moendas (duas por moinho). Não foi possível obter a data da construção destes moinhos; o da Gama é certamente o mais antigo, vistos os elementos documentais já aduzidos e o facto de ser o primeiro a deixar de laborar. O do Freixial (da Asneira) e o do Amieiral (Bate-Pé) remontarão possivelmente ao século XVII ou, o mais tardar, à primeira metade do XVIII. No princípio do século XX, constatamos a existência dos seguintes moinhos, de montante para jusante: do Roncão, das Moitas, do Loural, do Bate-Pé e da Asneira. O moinho do Roncão, perto da foz da ribeira do Torgal, deixou de laborar há mais de 40 anos, segundo o testemunho de antigos trabalhadores da Casa Amarela, a casa agrícola a que o moinho era contíguo e que muito possivelmente o integrava na exploração. O edifício do moinho já desapareceu, e a própria caldeira se esbateu na paisagem, quando o alastramento da cultura do arroz também aqui veio impor a drenagem e enxugo da área e a abertura de valas de regularização. Aliás, a caldeira deste moinho era relativamente diminuta, apenas constituída por alguns carreiros. Conserva-se a antiga casa do moleiro, próxima mas sobranceira, tal como acontece com o moinho das Moitas, decerto por cautela de cheias e inundações, as ameaças que os moleiros mais receavam – especialmente quando os picos de cheia coincidiam com a preia-mar, que tamponava o escoamento das águas para o mar. Por volta de 1949, em meados de Setembro, uma das temíveis cheias desceu, inesperadamente, pela vizinha ribeira do Torgal, após uma trovoada na zona dos Ameixiais, na bacia desse afluente do Mira, inundando o moinho até à altura das janelas; por sorte não havia qualquer enchente no rio e a maré estava vazia. 22 Rio Mira – Moinhos de Maré Deste moinho, a memória colectiva recorda ainda um paradoxo técnico de todo inesperado: a presença, a um canto do interior do edifício, de um par de pequenas mós pertencentes a um moinho manual para o milho. Estes pequenos moinhos eram frequentes na região e destinavam-se geralmente a produzir farinha para as papas, de que os pobres se alimentavam. Aliás, o milho, de cuja cultura há abundante documentação na região desde a primeira metade do século XVIII (ver por exemplo as Memórias Paroquiais de 1758, referentes a Milfontes) nunca aqui foi panificado – mas foi moído nos moinhos de maré (e noutros), como veremos adiante a propósito do moinho da Asneira. O moinho da Moitas, cujo edifício, contendo algumas mós, ainda existe, iniciou a laboração em princípios do século XIX e deixou de funcionar há mais de 40 anos. Foi um dos maiores moinhos de maré do Mira (três aferidos), juntamente com o efémero moinho do Alference (quatro aferidos) e o moinho do Roncão de Baixo (três aferidos). Importa relativizar esta primazia, pois a maioria dos moinhos do Mira não excedia os dois aferidos, reduzida dimensão que, juntamente com a evidente rusticidade dos engenhos, indicia a sua condição rural. Lembremos ainda que, por exemplo, os moinhos do estuário do Tejo tinham em média cinco a seis moendas. 36 A leitura técnica e arquitectónica do moinho das Moitas e da sua envolvente são hoje prejudicadas por sensíveis alterações paisagísticas, das quais se destacam: A colmatagem e sapalização da margem, pois a vasa e a espessa vegetação já ocultam os arcos dos rodízios, o que nem mesmo nos permite verificar visualmente o seu número; A drenagem da antiga caldeira, hoje uma várzea inculta e de contornos difusos (a caldeira estendia-se para jusante do moinho; é preciso não confundir com o represamento de água existente a montante, que a carta do Exército, na sua 2ª edição, representa); O alargamento do acesso ao moinho e à casa sobranceira, que transformou o estreito caminho de pé posto (que se equilibrava no topo do murete, cinturando a caldeira, e atravessava inclusive o próprio moinho), numa via hoje carroçável. Nas traseiras do moinho, esta nova estrada implicou um largo aterro que cobriu a boca dos canais de entrada da água para os rodízios (o mesmo aconteceu com o moinho da Asneira, que apreciaremos adiante). 23 Rio Mira – Moinhos de Maré Restam ainda, no interior do moinho, três casais de mós que poderão corresponder à estrutura técnica original, entretanto camuflada pela deposição de sedimentos e pela vegetação. Mas o moinho das Moitas teria moído com quatro ou cinco casais de mós, como afiança quem diz recordar-lhe a laboração, colocando-se a hipótese, neste caso, da instalação de um ou dois casais de mós accionadas por correias de transmissão ligadas às mós originais, para o descasque de arroz. Acrescente-se ainda que na 1ª edição da carta do Exército está assinalado, certamente por lapso, um outro moinho nas proximidades do moinho das Moitas. Moinho das Moitas – Não são visíveis as câmaras dos rodízios colmatadas pela vasa e pela vegetação. Moinho das Moitas – Interior. 24 Rio Mira – Moinhos de Maré Moinho das Moitas – Vista da casa do moleiro. 25 Rio Mira – Moinhos de Maré Porta da casa do moleiro. A maior parte dos moinhos de maré do Mira situa-se na margem direita do rio – ainda que a margem esquerda se mostre, do ponto de vista físico, igualmente adequada à sua construção. Nesta escolha da margem mais soalheira influiu, decerto, a distinta ocupação humana de cada uma das bandas do rio, ela própria condicionada pela diferente hospitalidade das duas zonas: enquanto a região situada na margem direita, sem nunca atingir fortes índices de povoamento, alberga, no troço tocado pelas marés, três povoações de algum relevo (Vila Nova de Milfontes, S. Luís e Odemira), para lá de pequenos núcleos dispersos – já a margem esquerda do rio corresponde à "charneca", extenso areal quase deserto, cuja colonização é recente. Na margem esquerda, existe ainda um moinho, o do Loural, que deixou de moer em finais dos anos 50, mas continuou a descascar arroz nos anos 60 e 70. De construção tardia parece sublinhar a diferença com a sua tipologia original. Este moinho constitui, sem dúvida, o mais inesperado dos moinhos de maré do rio Mira, com a sua roda motriz vertical e de propulsão inferior. No litoral atlântico acima dos Pirinéus, esta tecnologia alastrou a partir de fulcros técnicos e económicos desde os 26 Rio Mira – Moinhos de Maré finais da Idade Média, depressa superando os velhos moinhos ditos de "rodízio" – de roda motriz horizontal – e tornando-se claramente dominante.37 Entre nós , apenas a temos por certa neste caso isolado e tardio, construído já em finais do século passado (é assim o mais recente dos engenhos do Mira), e indissociável da peculiar personalidade do seu construtor e também proprietário e moleiro – que um seu descendente (José Maria Lourenço, de 73 anos, morador na Longueira, neto do construtor) hoje recorda como homem "de algumas letras e muito engenho". O moinho, de um só aferido (ainda que o neto do construtor recorde que esteve projectado para dois; em todo o caso, chegou a ter mais um casal de mós accionadas por correia de transmissão, para descasque de arroz, actividade ilegal devido à protecção legislativa do descasque fabril), tinha uma caldeira de cerca de três hectares de área, considerada grande tendo em atenção o único aferido. Na tradição moleira da zona, a principal vantagem atribuída ao uso da roda motriz vertical – e que terá provavelmente suscitado a sua aplicação a este moinho – era o alargamento do horário de funcionamento do engenho. De facto, o período útil de laboração destes moinhos não excede as três a quatro horas em cada ciclo de maré (como no moinho da Asneira). O uso da roda motriz vertical, cuja velocidade era regulada pela maior ou menor abertura da comporta, permitia minimizar esta limitação, já que uma roda assim não "empegava", isto é, não ficava bloqueada pela água (no pego) quando a subida da maré atingia a roda motriz, como acontece com os rodízios dos engenhos tradicionais. No litoral algarvio, esta limitação técnica foi superada com a substituição dos velhos rodízios pelos "rodetes" – pequenas turbinas hidráulicas que funcionam submersas. Todavia, a difusão desta tecnologia moageira, provavelmente ocorrida durante o século XIX a partir do litoral andaluz, nunca chegou a abranger a costa ocidental portuguesa. Com a sua roda vertical, o moinho do Loural podia assim moer durante cinco a seis horas em cada ciclo da maré, podendo transformar em farinha até 12 alqueires de cereal. Outra característica vantajosa da roda vertical era a possibilidade de, com a transmissão indirecta do movimento e a desmultiplicação das velocidades, obter maior rendimento. Mas o moinho do Loural poderá não ter sido o único engenho de maré de roda motriz vertical na costa portuguesa. Segundo Jorge CUSTÓDIO, as azenhas da foz do rio Ave, no litoral minhoto, valer-se-iam simultaneamente da corrente do rio e do potencial das marés. Na mesma obra, é realçado igualmente o caso das chamadas 27 Rio Mira – Moinhos de Maré Azenhas de Dom Prior, em Viana do Castelo. Segundo o autor, teria sido instalado neste moinho, tardiamente, uma roda motriz vertical no sítio da anterior comporta, para permitir igualmente o aproveitamento moageiro da enchente, (seria portanto um moinho de efeito duplo, caso único no nosso litoral).38 Hoje, o moinho do Loural é propriedade de um cidadão belga, que inicialmente lhe fez algumas obras de manutenção (reboco das paredes em cimento, e telhado novo em telha "lusa"), mas que aparentemente não lhe prestou mais atenção, o que levou já ao desaparecimento da roda motriz. Do moinho do Amieiral (Bate-Pé), restam hoje as ruínas do edifício, sem câmaras de rodízios nem mós, dado que o moinho foi adaptado a abrigo para o gado. Junto dele continua a correr o ribeiro do Amieiral, mas o “rio de água salgada” está agora longe, devido ao dique que o sustém em preia-mar. É verdade que as comportas desse dique ainda permitem a entrada de água salgada, mas apenas segundo as necessidades da exploração piscícola. Moinho do Loural. 28 Rio Mira – Moinhos de Maré Moinho do Loural – Comportas. Moinho do Loural – Roda Motriz. 29 Rio Mira – Moinhos de Maré Moinho do Bate-Pé – Ruínas do edifício, transformado nos anos 20. Por último, uma referência ao moinho da Asneira, que deixou de laborar regularmente nos anos sessenta, mas continuou operativo durante mais uns dez anos. O Sistemas de Moagem mostra uma fotografia deste moinho ainda em época de laboração39. Segundo a viúva do último moleiro morador (D.Virgínia Costa, viúva de António Domingos dos Santos, vulgo António Casa-Branca), este comprou o moinho ao lavrador da Samouqueira, nos anos 50, por 22 contos. Recuperaram-no, pois estava em muito mau estado, e lá estiveram nove anos. Era um sítio com muita vida, dissenos, pois as pessoas atravessavam o moinho (o caminho passava pelo seu interior), o sítio era um atracadouro de botes de gente dali e havia o movimento dos próprios utentes. As pessoas da vila (Milfontes) e suas redondezas traziam frequentemente o milho de cuja farinha faziam as papas, enquanto as das herdades (Dobadouras, etc.) traziam trigo. Venderam finalmente o moinho a D. Luís de Castro e Almeida, proprietário do castelo de Milfontes e morador nesta vila, tendo a moagem continuado precariamente por mais alguns anos. Nos anos 70, foi vendido a um cidadão inglês, que manteve uma disputa com os moradores da zona por causa do direito de passagem que estes tradicionalmente tinham. Posteriormente, foi adquirido por um empresário holandês. 30 Rio Mira – Moinhos de Maré Convertido actualmente em empreendimento turístico, está desactivado, tendo o próprio aparelho de moagem sido desmantelado. Subsiste o edifício, destinado a outras funções e algo discreto no conjunto das instalações turísticas. Moinho da Asneira – Vista da margem esquerda do rio. Moinho da Asneira – Em baixa-mar. 31 Rio Mira – Moinhos de Maré MOINHOS DE MARÉ DO RIO MIRA Designação Aferidos M. d´Além Data de construção Anterior a 1651 1791 Data de desactivação Situação Actual Fim do séc. XVIII Desaparecido Depois de 1805 Desaparecido M.do Alferense 4 M. da Asneira 2 Anterior a 1746 Finais dos anos 60/ princípios dos 70 Existe edifício e caldeira alterada. M. do Bate-Pé 2 Anterior a 1746 Primeiro Quartel do séc. XX (antes de 1921) Fins do séc. XVIII Existem ruínas do edifício, anteriormente transformado. Desaparecido Séc. XIX Desaparecido Meados do séc. XVIII Desaparecido Fins do séc. XVIII/ início do XIX Deixou de moer nos anos 50 (descascou arroz até 1980) Desaparecido Finais dos anos 40 Existe edifício com mós no interior. Câmaras dos rodízios colmatadas por vasa. Desaparecido M. de D. Soeiro M. das Dobadouras M. da Eira 2 (?) Anterior a 1488 1 Fins do séc. XVIII M. da Gama 2 M. do Loural 1 M. da Mamoa Moinho das Moitas 3 M. do Roncão 2 Anterior a 1565 Fins do séc. XIX Anterior a 1488 Princípios do séc. XIX Fins do séc. Fins dos anos 40 XVIII M. do Roncão 2 2ª metade do 2ªmetade do séc. XIX de Baixo séc. XVIII (?) M. da 2 Anterior a Séc. XIX Samouqueira 1747 M. da Vila* Anterior a Séc. XVIII 1700 *Hipotético moinho de maré e de água doce Existe edifício com aparelho de moagem (excepto roda motriz). Desaparecido Desaparecido Desaparecido Desaparecido 32 Rio Mira – Moinhos de Maré MOINHOS DE MARÉ DO RIO MIRA 33 Rio Mira – Moinhos de Maré CONCLUSÃO Esclareceremos brevemente, à laia de conclusão, algumas questões sugeridas pela abordagem histórica que fizemos dos moinhos do Mira, parte delas já afloradas nas páginas precedentes, a saber: os moinhos mistos, melhor dizendo intermediários (no sentido, entenda-se, em que eles utilizaram, para além das águas salgadas, as águas doces para enchimento das caldeiras), o abastecimento de mós, a propriedade dos moinhos e os problemas da recuperação e preservação. Portanto, uma primeira e uma segunda questões técnicas, uma terceira especificamente histórica, e uma quarta relacionada com o futuro a dar às unidades ainda existentes. A maioria dos moinhos de maré do Mira encontrava-se na confluência de leitos de cheia, por via dos barrancos que desaguavam na área das suas caldeiras. Nuns casos, esses barrancos escorriam apenas as águas das grandes chuvas, noutros, debitavam ribeiros permanentes. Nos primeiros, as águas que entravam nas caldeiras, embora as ajudassem a encher, não tinham significado em termos moageiros e eram indesejadas pois traziam detritos que entupiam os cubos (como no moinho da Asneira); porém, às vezes, tinham resultados positivos, pois ajudavam a limpar os 34 Rio Mira – Moinhos de Maré carreiros no interior das caldeiras, onde se haviam depositado lodos (como no moinho do Loural). Nos segundos, era possível o aproveitamento das águas doces para ajudar a encher a caldeira (como no moinho do Bate-Pé, classificado na documentação consultada de moinho de água salgada). Recorde-se que, pelo menos nos moinhos de Vila Nova de Milfontes, a água salgada só chegava às caldeiras em marés vivas, conforme o pároco de Milfontes escreve em 1758. Não nos foi, porém, possível determinar exactamente qual o papel relativo da água doce e da água salgada no funcionamento dos moinhos onde ambas estavam permanentemente presentes (moinhos do Bate-Pé e da Gama, em Milfontes, e da Vila, em Odemira). Estes moinhos utilizaram, ao longo dos tempos, mós de diversas proveniências. Não sendo a região (predominantemente xistosa) propícia à obtenção de mós, estas foram importadas, por muitos anos, através da via marítima, pelo menos no que se refere aos moinhos de maré, e decerto em relação a muitos outros moinhos de água e de vento. Ainda hoje se encontram inúmeras mós calcárias vindas de fora. As primeiras referências que encontrámos acerca do comércio de mós estão contidas nos forais manuelinos de Vila Nova de Milfontes e de Odemira, mas o seu valor documental deve ser relativizado dado que os forais eram documentos em grande parte estereotipados. São do século XIX as primeiras menções concretas, avulsas, sobre a importação de mós por via marítima: em 25 de Agosto de 1817, o caíque "Senhora do Livramento", proveniente de Lagos, transportou mós de moinho para Odemira40; em 3 de Julho de 1864, o iate "Senhora da Conceição", vindo de Lisboa, trouxe carga de mós, provavelmente de Cascais.41 Relativamente à primeira metade do século XX, temos testemunhos orais que referem o desembarque de mós no cais de Odemira. Também o último moleiro do moinho do Loural recorda a vinda de mós de Porto de Mós. Surgem então as mós de S. Luís, de que certos moleiros diziam valer as "francesas", e serem consideravelmente mais baratas do que estas42, exagero (não quanto ao preço) que o moleiro do moinho de vento da Laje (S. Luís) denuncia. No entanto, as mós de S. Luís são comummente consideradas as melhores, com excepção das de proveniência francesa. Elas terão aparecido por necessidade de obtenção de mós locais, face à dificuldade e ao elevado custo de transporte, a que deram resposta os filões de boa e rija pedra existente na serra de S. Luís (Cercal). Com efeito, o 35 Rio Mira – Moinhos de Maré complexo vulcano-silicioso da região Cercal-Odemira, que se inclui na faixa piritosa ibérica, é formado por um conjunto variado de rochas ácidas, que compreendem nomeadamente felsitos, felsófiros e tufos granulares de composição riolítica a quartzo-queratofírica, tufos aglomerados, tufos “lapilli”, chertes, jaspes e tufitos.43 Hoje, está em exploração uma pedreira perto de S. Luís, constante da relação das pedreiras do Instituto Mineiro, na Internet (onde a substância explorada é classificada de “quartzitos”). Os sucessivos exploradores desta pedreira têm sido unânimes em referir a grande dureza e a característica abrasiva da pedra, prejudiciais para as máquinas que a trabalham. Com estas rochas ao seu dispor, alguns naturais (moleiros e não moleiros) fabricaram excelentes mós, tais como as descritas por REYNOLDS: "... para o fabrico de farinhas finas estas pedras (calcário, das melhores também, granito ou outra pedra granulosa) acabaram por ser superadas pelas pedras francesas, de rochas siliciosas, de Ferté-Sous-Jouarre, perto de Paris, feitas de pequenos blocos talhados à feição, ligados cuidadosamente com cimento e firmados com cintas de ferro".44 As mós de S. Luís tiveram ampla utilização local e foram também enviadas para outros pontos do País. Mó de São Luís (moinho da Asneira). 36 Rio Mira – Moinhos de Maré Reaproveitamento das mós (moinho da Asneira). Com a difusão da cultura do arroz, na primeira metade do século XX, multiplicou-se igualmente o seu descasque pelos moinhos, podendo haver um par de mós exclusivamente destinado a esse fim. O pouso era então forrado com placas de cortiça, solução utilizada também nas moinholas de descasque que, por essa altura, proliferaram (as mós, mais pequenas, eram de arenito das rochas de duna consolidada do Malhão e da Ribeira da Azenha, a norte de Vila Nova de Milfontes). A dupla função moagem/descasque dos moinhos era então aplicada na grande fábrica de moagem e de descasque e branqueamento de arroz, de Odemira (Miranda, L.da), que, inclusivamente, descascava e branqueava arroz vindo de fora, por via marítima, para o efeito. 37 Rio Mira – Moinhos de Maré Vestígios de extracção de mós para moinho e moinhola nos arenitos do Malhão, a norte de Milfontes. Vestígios de extracção de mó nos arenitos do Malhão, a norte de Milfontes. No que respeita à propriedade dos moinhos, em termos históricos, o assunto precisa de ser estudado com recurso a outras fontes para sua melhor compreensão. No entanto, é possível avançar com algumas (meramente indicativas) notas provenientes da documentação consultada. Os primeiros moinhos de que temos notícia pertenciam 38 Rio Mira – Moinhos de Maré aos condes de Odemira, total (moinho de D. Soeiro) ou parcialmente (moinho da Mamoa); em 1698, o capitão-mor de Odemira, Manuel Fogaça de Vasconcelos, rendeiro do Condado, arrenda, por sua vez, o moinho de D. Soeiro a um Manuel Pinheiro, por três anos, a sete moios e vinte alqueires (!) de trigo, por ano.45 Por essa altura, o moinho de água doce dos Ameixiais de Cima pagava de renda quatro moios e meio (!) de trigo, o que confirma a importância relativa dos dois tipos de engenhos. Também o moinho da Vila, em Odemira, pertencia ao Condado. O moinho da Gama, em Vila Nova de Milfontes, era no século XVI da propriedade da Ordem de Santiago, a quem o moleiro pagava, ou devia pagar, foro; mais tarde, surge na propriedade concelhia. Quanto ao moinho d'Além, vemo-lo parcialmente da Misericórdia de Odemira (antes tinha sido do Condado) e aforado a um licenciado; possivelmente, o moleiro detinha o moinho em regime de subenfiteuse ou de arrendamento. No princípio do século XIX, os moinhos do termo de Odemira pagavam um foro, melhor dizendo uma "propina" (termo que também aparece nos arrolamentos) ao concelho. Parte destes moinhos eram propriedade útil dos moradores das herdades onde se situavam, moradores que nalgumas situações são também identificados como proprietários das herdades. No caso, por exemplo, do moinho da Samouqueira, os primeiros proprietários são os lavradores da herdade da Samouqueira, que o vendem a Ãngelo José de Sousa Prado, pessoa da “nobreza letrada” (escrivão) de Odemira e residente nesta vila. É possível que, neste caso, os moleiros fossem rendeiros ou até assalariados, mas não passa de hipótese. A ligação destes moinhos às propriedades agrícolas a que eram contíguos parece indicar que se destinariam a garantir e a enfatizar a auto-suficiência das casas agrícolas (o que não obsta à existência de uma "área de influência" de cada moinho; recorde-se o papel abastecedor da vila de Odemira). O mesmo sucederia com o moinho da Asneira quando estava nas mãos do lavrador da Samouqueira; mas não quando passou para as de António Casa-Branca, moleiro a tempo inteiro e sem ligação a qualquer propriedade rural (em cuja família não constava, aliás, qualquer moleiro). Relativamente ao moinho do Loural, ocorre uma situação em que o moinho está ligado a uma propriedade rural e em que as funções de moleiro são passadas de pai para filho; possivelmente, o rendimento do moinho passou, com a divisão da propriedade, por herança, a representar cada vez mais no orçamento familiar, evoluindo a maquia de 7 a 9%, nos tempos mais antigos, até 24%, nos mais recentes. Aliás, com a concorrência das moagens e dos negociantes 39 Rio Mira – Moinhos de Maré de farinha, o moinho passou, nos últimos tempos, por dificuldades em conseguir grão para moer; o moleiro, com uma carroça, tinha de procurar fregueses em "áreas de influência" de outros moinhos, o que não era bem visto pelos moleiros destes. Finalmente, quanto aos problemas da recuperação e protecção, apresentam-se situações diferentes. Abreviando, apenas no moinho das Moitas se afigura a priori viável um projecto de recuperação. O proprietário, já garantiu mesmo estar aberto a qualquer solução, tendo em vista recuperar e reutilizar o velho moinho. Entretanto, a Câmara Municipal e o Parque Natural também mostraram interesse. Acrescente-se que a primeira é proprietária de dois moinhos de vento, que mantém a funcionar (na vila de Odemira e na povoação da Longueira), e da antiga fábrica Miranda, de moagem e descasque de arroz, ainda com parte do equipamento industrial, o que poderia viabilizar, com o moinho de maré, um projecto de circuito museológico do "pão" ou da "farinação", além do mais ilustrativo do papel das energias renováveis. Projecto que obviamente incluiria um estudo arqueológico dos moinhos de maré do Mira, onde ele fosse possível. 40 Rio Mira – Moinhos de Maré APÊNDICES I - A Moagem no Concelho de Odemira. Da Proliferação à Extinção. O concelho de Odemira, com 1720 Km2 de área, é o maior do País, condição que advém, parcialmente, das reformas territoriais do século passado. Ele alberga, assim, a maior parte da bacia hidrográfica do Mira. Do século XVIII à primeira metade do XX, houve, tudo indica, proliferação de moinhos de água e de vento e de fábricas de moagem em todo o concelho. Num levantamento efectuado há alguns anos (mas referindo-se, parece, à situação nos anos 50 e 60) nos registos da repartição de finanças de Odemira (pelo Sr. Octávio Campos dos Santos, funcionário da repartição e proprietário de um moinho de água), foram inventariados, entre moinhos em actividade e desactivados, 195 engenhos, dos quais 96 de vento (12 inactivos) e 99 de água (15 inactivos). Para as freguesias históricas do concelho, podemos fazer comparação com o registo das décimas de 1843/4646, 41 Rio Mira – Moinhos de Maré comparação que revela um aumento de cerca de 100% entre meados do século XIX e meados do XX. O que está de acordo com o aumento da produção cerealífera e da população, então verificado. Para avaliarmos melhor a sua capacidade moageira, acrescentaremos que a regra, com raríssimas excepções, é a de um casal de mós por engenho. É preciso, com efeito, falarmos em moagem maremotriz para esta regra ser excedida (moinho da Asneira, 2 aferidos; moinho das Moitas, 3 aferidos). Hoje, passadas quatro a cinco décadas, a situação modificou-se radicalmente. A maioria dos moinhos quedou-se imóvel, ao ponto de apenas restarem quatro moinhos de vento (um dos "moinhos juntos", em Odemira, e o moinho da Longueira, ambos propriedade da Câmara, o da Laje, em S. Luís, e o das Vidigueiras, em Luzianes) e dois moinhos de água ( o da Foz da Brunheira, na freguesia de Sabóia, e o da Borralheira, na de S. Teotónio). Dos moinhos de maré, como se viu, nenhum resta em actividade. O moleiro do "moinhos juntos", Leonel Maria Guilherme, tem 60 anos, 45 dos quais na profissão. É natural de Relíquias, onde já o pai e o avô haviam sido moleiros, e trabalhou quase 30 anos no seu moinho do Carvalhal, naquela freguesia (nota posterior: parado em Janeiro de 1997). Há seis anos, a Câmara contactou-o para trabalhar no "moinhos juntos", que havia adquirido e recuperado. Aceitou a mudança para a vila e o seu novo estatuto de funcionário público, porque em Relíquias o negócio estava cada vez mais fraco devido ao abandono do cultivo de cereais e ao facto de haver cada vez menos pessoas a precisar de farinha para o fabrico de pão caseiro. Entretanto, o seu filho trocou a profissão de moleiro pela de pedreiro. Hoje não lhe falta cereal para moer – trigo, milho e centeio, este ultimamente menos – pois cada moinho que fecha nas proximidades deixa-lhe novos clientes (como aconteceu com o do Cabeço Queimado, perto do Cavaleiro, parado há um ano). A maquia devida à Câmara é de 15%. Nos tempos livres, o moleiro faz maquetas do moinho para vender aos turistas. Em Vale Bejinha, perto de S. Luís, trabalha o moinho da Laje, edificado em 1923, conforme inscrição gravada na velha mó que serve de soleira da porta. O moleiro e proprietário, Caetano da Costa Guerreiro, de 60 anos bem conservados, também de família de moleiros proveniente de Relíquias, é o mais "industrial" dos moleiros ainda em actividade. Com ele trabalha um filho, que deseja ter o seu próprio moinho. Para aumentar a produtividade, adaptou um motor ao moinho, o que lhe 42 Rio Mira – Moinhos de Maré permite moer mesmo sem vento. Peças e mós não têm faltado, pois os moinhos que vão parando e as moagens já desactivadas fornecem-lhe as necessárias. Leva a maquia de 20%, excepto se tiver que transportar o cereal de longe, caso em que cobra 25%. Na freguesia de Sabóia, funciona o moinho de água da Foz da Brunheira, situado junto a um ribeiro que corre para o rio Mira. Foi construído "no fim da guerrilha que houve antigamente", portanto nos anos 40 ou princípios dos 50 do século passado. O moleiro, Inácio Francisco Luís, de 70 anos, filho e irmão de moleiros, afirma que não vai moer durante muito mais tempo, pois tem a reforma da Casa do Povo que lhe permite viver. Mantém ainda o macho e o carro, que pouco cereal transportarão daqui para diante, segundo diz. A família possuiu em tempos o moinho de vento da "Eira do Malhão", com o qual o moinho da Foz da Brunheira trabalhou em complementaridade. O de vento trabalhava no Verão, e o de água no Inverno. O moinho da Eira do Malhão deixou de funcionar há alguns anos, sendo a causa próxima dessa paragem a plantação, em volta, de um eucaliptal, que cortou os ventos. Entretanto, o moleiro tem tempo para semear uma pequena courela e para fazer peças tradicionais para a fiação do linho, adquiridas por proprietários de lojas de artesanato do litoral, que "batem" a serra em busca de artesãos e seus trabalhos. Os 14% de maquia sobre o trigo, o milho e alguma cevada branca que mói fornecem-lhe o cereal de que necessita, algum do qual vende (nota posterior: o moinho parou por morte do moleiro, pouco tempo depois de redigido este trabalho). Quanto ao moinho da Borralheira, o seu proprietário e moleiro, Manuel Maria da Silva, vendeu-o a alemães, com a condição de continuar a moer. Moleiro, por via do sogro, de quem herdou o moinho, possuiu também um moinho de vento, que trabalhava em regime de complementaridade com o de água (este, no Inverno, aquele, no Verão). A certa altura comprou ainda uma moagem, perto de Sabóia. À actividade de moleiro, chegou a juntar a de comerciante, com duas tabernas/mercearias, o que o obrigava a ter empregados, principalmente para a recolha do cereal. Hoje, com 70 anos (nasceu em 1926), continua a moer algum trigo e milho, à maquia de apenas 10% (facto de que se orgulha), mas, afirma, por pouco tempo. No moinho, duas velhas mós, vindas de Cascais, ainda por via marítima, não moerão certamente tempo suficiente para serem substituídas. Nos arredores, vários montes desabitados e arruinados fazem-nos recordar outros tempos. 43 Rio Mira – Moinhos de Maré Moinho da Laje (São Luís). Antiga fábrica de moagem e descasque de arroz (Odemira). 44 Rio Mira – Moinhos de Maré Moinho da Foz da Brunheira. Moinho da Foz da Brunheira – Rodízio e cubo. 45 Rio Mira – Moinhos de Maré Moinho de vento em Milfontes, c.ª de 1827 (gravura inglesa) II - Documentos AHMO, Posturas da Câmara de Odemira, c.ª 1770, AB 4/1 ... Posturas sobre os Mulleyros Acordaraõ que todos os muleyros venhaõ tomar juramento a Camara em termo de vinte dias naõ o tendo ja tomado como taõbem darem fiança pellos seos acarretadores no sobredito termo, o que faltar com penna de mil reis. Acordaraõ que os mesmos molleiros naõ possaõ ter nos ditos moinhos ca ns, porcos, nem galinhas o que se entende dentro da caza do mesmo moinho com penna de trezentos reis. Acordaraõ que nenhum molleiro possa molinhar em moinho algum sem carta de examinaçaõ, e ser primeiro ajuramentado com penna de quinhentos reis. Acordaraõ que todo o molleiro tenha panal de linho com penna de quinhentos reis. Acordaraõ que nenhum molleiro desta villa e seu termo posa moer trigo a pessoa de fora havendo pessoa da terra, ou seu termo que queira moer. E havendo trigo para moer das padeiras obrigadas se moerá primeiro com penna de mil reis. E poderá 46 Rio Mira – Moinhos de Maré encoimar qualquer do povo com huã testemunha para o Concelho. Acordaraõ que toda a pessoa a que faltar farinha do trigo, que entregar ao carretador entregando lho por medida e ressebendo a farinha por ella em sua prezença será crida por juramento para lhe satisfazer a dita falta. Acordaraõ que nenhum molleiro ande calçado emquanto molinhar com penna de quinhentos reis. Acordaraõ que os carretadores venhaõ todo o anno a buscar o trigo as portas asim de Veraõ, como de Inverno com penna de quinhentos reis. Acordaraõ que todo o molleiro do moinho d'Além, e de Dom Sueyro seja obrigado vir a esta villa com os seos barcos todos os estos duas vezes a trazer farinha, e levar trigo para a fartura da terra com penna de dois mil reis. E na mesma penna de dois mil reis incorreraõ naõ querendo levar trigo de qualquer pessoa podendo hir no barco. Acordaraõ que toda a rez, ou cavalgadura que se achar pastando dentro das caldeiras ou levadas dos moinhos deste rio e termo pello prejuízo que cauzam aos ditos moinhos por lhe entulharem as mesmas caldeiras e levadas assim que pagaram de coima para o Concelho quinhentos reis e todo o gado meudo como ovelhas, cabras, porcos pagaram por cabessa quarenta reis e por rebanho que sam vinte e sinco pagaraõ mil reis. E podera emcoimar o mesmo dono com duas testemunhas. Idem, 1836, AB 4/2 ... Deliberaraõ, todo o moleiro deste termo que moer trigo, ou segundos a pessoa de fora deste, tendo no moinho graõ de pessoas habitantes neste dito termo, possa ser acoimado em quinhentos reis. Deliberaraõ, toda a pessoa, que lhe faltar farinha do graõ que entregou ao carregador, entregando-lho por medida e recebendo-a por ella, em sua prezença, será crida por juramento para lhe satisfazer a dita falta, e multado em quinhentos reis. Deliberaraõ que, molleiro algum, emquanto molinhar naõ ande calcado, e naõ poderaõ ter caes, nem galinhas dentro do moinho, com pena de quinhentos reis. Deliberaraõ que, os moleiros dos moinhos das Moitas, e Roncaõ, sejaõ obrigados a vir com suas lanxas, cada esto duas vezes a trazer farinha, e levar graõ para a fartura da terra, com pena de mil reis e na mesma pena incorreraõ naõ querendo levar trigo, podendo levalo. 47 Rio Mira – Moinhos de Maré BIBLIOGRAFIA ALEGRIA, Maria Fernanda, "A Organização Portuária Portuguesa e a sua Evolução de 1848 a 1910", in Revista de História Económica e Social, n.º 15, Lisboa, Livraria Sá da Costa Editora, Janeiro-Junho 1985, pp. 1-27. ANDRADE, Francisco Arnaldo de Leite, O Estuário do Mira: Caracterização e Análise Quantitativa dos Macropovoamentos Bentónicos, Lisboa, 1986 (tese de doutoramento apresentada à Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa). BOITHIAS, J.-L. e A. DE LA VERNHE, Les Moulins à Mer et les Anciens Meuniers du Litoral, s/l, Créer, s/d. 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GALHANO, Fernando, Moinhos e Azenhas de Portugal, Lisboa, Associação Portuguesa dos Amigos dos Moinhos, 1978. LOUREIRO, Adolfo, Os Portos Marítimos de Portugal e Ilhas Adjacentes, vol. IV, Lisboa, Imprensa Nacional, 1909, pp. 115-131. LOUREIRO, João José Mimoso, Maria Noémia da Fonseca NUNES e Orlando Ferreira BOTELHO, Monografia hidrológica do Rio Mira, Évora, Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos e Comissão de Coordenação da Região do Alentejo, 1984. NABAIS, António J. C. Maia, Moinhos de Maré, Património Industrial, Seixal, Câmara Municipal, 1986. OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, Fernando GALHANO, e Benjamim PEREIRA, Tecnologia Tradicional Portuguesa - Sistemas de Moagem, Lisboa, INIC, 1983. 49 Rio Mira – Moinhos de Maré QUARESMA, António Martins, Apontamento Histórico sobre Vila Nova de Milfontes, Milfontes, 1988. QUARESMA, António Martins e António Eduardo MENDONÇA, "Moinhos de Maré do Mira", in III Congresso sobre o Alentejo, Elvas, 1989, pp. 309-315. SERRÃO, Joel, Temas Oitocentistas, I, Lisboa, Livros Horizonte, 1980. SOUTHEY, Robert, Journals of a Residence in Portugal (...), Oxford, at the Claredon Press, (editado por Adolfo Cabral), 1960. Siglas utilizadas no texto ADB = Arquivo Distrital de Beja AHMO = Arquivo Histórico Municipal de Odemira AMO = Arquivo da Misericórdia de Odemira IAN/TT = Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo 50 Rio Mira – Moinhos de Maré NOTAS 1 Borges, 1981, pp.68-70. Custódio, 1989, pp. 356 e 358, nomeadamente. 3 IAN/TT, Memórias Paroquiais, vol. 23, n.º 142, fs. 12 e 12v. 4 Andrade, 1986, pp. 272-277; cf. Loureiro et al., 1984. 5 Loureiro, 1909, p. 118. 6 Southey, 1960, p. 59. 7 Cf. Alegria, 1985, pp. 15-19. 8 Cf. Quaresma, 1988, pp. 87-100. 9 IAN/TT, Leitura Nova, Livro 4 de Odiana, fs. 204 e 204v.; Cf. Chancelaria de D. João II, livro 14, f. 82v. 10 Idem, Ch. de D. João VI, l. 16, f. 288v. 11 Quaresma e Mendonça, 1989, p. 310. 12 Nabais, 1986, p. 20, nomeadamente. 13 Castelo-Branco, 1965, pp.49 e 50. 14 Castelo-Branco, 1959, pp. 35-36; Custódio, 1989, pp.378, 379, etc. 15 Quaresma e Mendonça, 1989, p. 311. 16 IAN/TT, Conventos Diversos, Ordem de Santiago, Visitação n.º 165, fs. 19 e 21, respectivamente. 17 Idem, Visitação n.º 212, fs. 10v. e 11. 18 AMO, Livro de escrituras, n.º 3, fs. 74-80v. 19 AHMO, Documentos da Albergaria da Barca, AE 6/1, fs. 31v.-33v. 20 Idem, Tombos do concelho, AE 1/1, fs. 510-512v.; Docs. da Albergaria da Barca, AE 6/2, fs. 345 e 245v. 21 IAN/TT, Memorias Paroquiais, vol. 23, n.º 142, fs. 14v. e 15. 22 Idem, vol. 26, n.º 4, f. 39. 23 idem, vol. 26, n.º 4, f. 52. 24 Idem, vol. 21, n.º 157, f. 1341. 25 AHMO, AE 1/1. 26 Idem, fs. 517 e 518. 27 Idem, fs. 377-379. 28 Idem, fs. 499-501. 29 Idem, fs. 496-498. 30 Idem, fs. 492-495. 31 IAN/TT, Desembargo do Paço (Alentejo e Algarve), M.º 728, n.º 28. 32 AHMO, DE 1/1. 33 Idem, fs. 11, 46v., 115-117. 34 Idem, fs. 12, 46, 115-117. 35 Idem, fs. 12, 47v., 48, 114 e 115. 36 Custódio, 1989, Listagem dos moinhos de maré em Portugal. 37 Boithias e De La Vernhe, s/d, p. 127. 38 Custódio, 1989, pp. 354 e 355. 39 Veiga de Oliveira et al., 1983, p. 131. 40 IAN/TT, Inspecção de Saúde Pública, impressos de entradas e saídas de navios enviados pelos guardas-mores de saúde, M.º 29, n.º 15. 41 Diario de Lisboa, 1864, saídas de Lisboa a 3 de Julho. 42 Veiga de Oliveira et al., 1983, p. 348. 43 Carvalho, 1976, p. 218. 44 Veiga de Oliveira et al., 1983, p. 347. 45 ADB, CNODM, l. 3/cx. 1 c: 3/E 10/P5. 46 AHMO, AF 1/1. 2 51