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20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil Artes têxteis na história Tigre L.A.*, Araujo M.C. Escola de Arte, Ciências e Humanidades, USP, São Paulo- Brasil – 03828-000 *[email protected] Resumo Este artigo mostra conta com um histórico das artes têxteis desde a Antiguidade até os dias de hoje, passando pelas tapeçarias orientais. Após a análise dos dados sobre a tecelagem ocidental e oriental, como forma de expressão cultural, ver-se-á como a tecelagem artística relaciona – se com a história da arte, que é focada na cultura europeia e sempre caminhou ao lado da história das artes têxteis. Poder-se-á ver a relação das artes têxteis com o ensino das artes visuais, e como elas são expostas nos museus tanto do Brasil quanto do mundo. Discutiremos como as peças feitas em teares manuais são vistas hoje, tanto na cultura ocidental, quanto na oriental, utilizando – se exemplos de tapeçarias expostas em museus e tapeçarias vistas apenas como artesanato. Palavras-chaves: história da arte; tapeçarias; artes têxteis; Abstract This article has a history of textile arts from antiquity to the present day, through the oriental rugs. After analyzing the data from the western and eastern weaving as a form of cultural expression, will be seen as related to artistic weaving - with the history, especially the history of art, which is focused on European culture and always walked side of the history of textile arts. You can see the relation of the textile arts in teaching visual arts at prestigious colleges in the world and the best in arts education in Brazil, and as they are exposed in museums both in Brazil and the world. Discuss how tapestry on handlooms are seen today, both in Western culture, as in the eastern, using - are examples of tapestries seen in museums and tapestries seen only as craft. Keywords: history of art, tapestries, textile arts 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil Introdução Este artigo tem por objetivo discutir a relação da tecelagem com o estudo da arte ao longo da história. O tema foi escolhido por ser um assunto importante pouco estudado e com poucas referências em português. Uma revisão histórica mostrou como uma técnica vista como uma das artes mais importantes durante a Antiguidade foi deixada de lado desde a Idade Moderna. Por meio da pesquisa histórica descobriu – se que antigamente a tecelagem e o ato de tecer eram de extrema importância e faziam parte de vários rituais religiosos. Hoje as artes têxteis não tem essa importância e não são muito estudadas, por isso estudou-se, os motivos que levaram a tecelagem ao obscurecimento no ramo dos estudos artísticos. Após a análise dos dados sobre a tecelagem ocidental e oriental, como forma de expressão cultural, o trabalho mostrou como a tecelagem artística associa – se com a história da arte, que é focada na cultura europeia, principalmente, devido as Academias de arte, e como relaciona – se com o estudo das artes visuais hoje. Metodologia Utilizando um método histórico de narrativa das artes têxteis da possível origem até hoje, foi iniciada a pesquisa a partir do artigo da Professora Doutora Ana Paula Simioni Descosturando Gêneros: Da feminização das artes têxteis às subversões contemporâneas. Com a definição do que são artes têxteis foi possível compreender o que os povos da Antiguidade e da Idade Média viam como arte. As tapeçarias orientais também foram pesquisadas, utilizando principalmente o livro Tapetes Orientais, de Michele Campana, por ser uma fonte em português e por ser um livro completo. Foram utilizados também meios eletrônicos, com pesquisas de periódicos e artigos, sendo alguns estrangeiros. Para tal pesquisa foram utilizadas como palavraschaves Tapestry e art, sozinhas e combinadas. A pesquisa eletrônica com essas palavras foi utilizada também no site da biblioteca da Universidade de São Paulo, para encontrar livros sobre tapeçarias, um tipo de arte têxtil muito comum na Idade Média e a palavrachave Tapestries para pesquisar livros sobre tapeçarias orientais. As melhores faculdades do mundo e as melhores faculdades de artes do Brasil também foram pesquisadas, baseadas nos índices de medição do Ministério da Educação e da Times Higher Education do ano de 2013, analisando os currículos on- 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil line das quinze melhores. Sendo possível compreender melhor a relação entre a arte e o seu ensino. Artes têxteis As artes têxteis são aplicadas em um suporte diferente de uma tela. Podem ser representações em tapetes, almofadas, bordados, cortinas e até mesmo um vestido. Na Grécia antiga as tapeçarias e mantos feitos para os deuses eram consideradas artes, por serem uma tarefa com técnicas regradas e por necessitarem uma perícia. (SCHEID; SVENBRO, 2010 p.22) A arte da tapeçaria, a mais apreciada e estudada arte têxtil, tem origens muito antigas, seu material perecível dificulta localizar com precisão em tempo e lugar. Pinturas murais e baixos-relevos trazem representações e ajudam a documentar sua origem. (CAMPANA, 1991 p.9) Artes têxteis na Antiguidade Durante a Antiguidade as artes mais admiradas eram obras dedicadas aos deuses gregos. Os mantos cobriam as estátuas nos templos e eram entregues como oferendas aos deuses. Neste período foram feitos diversos mitos e relatos que relacionam as artes têxteis com atos políticos e religiosos. O livro "O ofício de Zeus - mito da tecelagem e do tecido no mundo grego" conta como o “colégio” de dezesseis mulheres muito respeitadas na sociedade, mostrando que a guerra entre Pisa e Elis foi sucedida pela paz por meio da tecelagem coletiva de um manto para a estátua da deusa Hera. (SCHEID; SVENBRO, 2010 p.17) A relação das artes têxteis e a religião é constatada também no casamento, pois mesmo no acordo de paz o manto envolve a estátua da deusa Hera, deusa do casamento, da união legítima do marido e da mulher, e não a Atena protetora, entre outras coisas, do ofício de tecer. (SCHEID; SVENBRO, 2010 p.18) A tapeçaria no Oriente A arte da tapeçaria, a mais apreciada e estudada arte têxtil, no ocidente tem a função de enfeite e proteção para o chão, no oriente, porém eles são os únicos elementos “nas grandes salas de recepção”, os talar, os tapetes são usados como assento e para revestir portas, além do chão. São também colocados no umbral para recepcionar visitantes e servem de camas que são estendidas à noite e enroladas durante o dia. A função mais importante do tapete, porém, é a religiosa – inteiramente distinta dos usos especiais do tapete de oração.” (CAMPANA, 1991 p.9 – 10) 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil Os tapetes mais valiosos tem uma grande ligação com as religiões, no Egito antigo as tapeçarias decoravam as paredes de túmulos e o chão como parte da religião egípcia, na religião Islâmica decoravam a Caaba, mesquitas e minaretes totalmente com tapetes, nos templos budistas havia tapetes valiosos. Para os povos do oriente o tapete tem, além de um alto valor e uma carga religiosa, uma crença relacionada com sua execução, acredita – se que cada nó representa um pensamento concebido pelo artesão. (CAMPANA, 1991 p.10) O tapete oriental mais famoso pertence ao povo Persa. O reinado do xá Abbas, o Grande, é o mais importante em relação às tapeçarias, comparado aos governos da Renascença pelo incentivo e patrocínio dado às artes, os tapetes apareceram adornados com ouro, prata, seda, pérolas e pedras preciosas. Após a sua morte, a arte da confecção do tapete começou a declinar e nunca mais voltou a alcançar o antigo esplendor. (CAMPANA, 1991 p.18) Os tapetes persas possuíamç através dessas inscrições, “percebe-se que os desenhistas dos tapetes persas pertenciam à classe culta e eram verdadeiros artistas”. (CAMPANA, 1991 p.26) A tapeçaria passou de grande arte oriental à mera representação em pinturas de grandes pintores renascentista até o século XVIII. Esses artistas retratavam as cores e motivos orientais em suas obras de arte, perdendo o status de arte, que possuíam no Oriente. (CAMPANA, 1991 p.21) Existem vários tipos de tapetes persas, porém alguns tipos destacam – se por sua beleza e valor artístico. O modelo Ispahan é considerado um tesouro artístico da Pérsia, conhecidos como “os tapetes do Xá” este modelo foi produzido com este teor artístico até o século XVIII, os tapetes Kashan eram feitos em um centro artístico muito importante, sendo os mais finos tapetes de lã e seda, o maior representante deste modelo é o “tapete sagrado da Mesquita de Ardabil” disponível hoje no Victoria and Albert Museum mostrando o trabalho do século XVI feita pelo escravo Maksun no ano de 1539. A arte da tapeçaria, tradição oriental começou a perder suas características durante o século XIX, ao ser industrializada por importadores europeus. (CAMPANA, 1991 p.19;26 – 32) (Figura1) 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil Figura1. The Ardabil Carpet Os turcos também possuíam uma grande tradição nas artes da tapeçaria. A população da região onde hoje se localiza a Turquia é geralmente tida como turca, porém há uma mistura de muitos outros povos. Esse cenário de estratificação de raças, religiões e civilizações, foi retratado fielmente no tapete anatoliano. (CAMPANA, 1991 p.54) Os tapetes turcos também podem ser vistos nas obras de grandes pintores da época, especialmente os italianos, representando principalmente, o Ushak. Durante a metade final do século XV, durante o reinado de Maomé II, o tapete anatoliano foi enriquecido ainda mais com elementos decorativos de origem Persa e Chinesa. A religião é fundamental para a execução dos tapetes no Oriente, e para os turcos influenciavam inclusive nas cores e motivos utilizados. (CAMPANA, 1991 p.56) Cada região do reino turco, assim como os persas, tem um tipo de tapete. Os mais famosos são os Damascenos, ou Sírios, os tapetes antigos eram feitos nas oficinas do sultão em Constantinopla, esse tipo de tapetes são encontrados apenas em Museus e coleções importantes, assemelham – se a mosaicos miúdos e bem compactos. Outro modelo turco muito famoso é o Ghiordes ou Bassra Ghiordes, a técnica com nó Ghiordes é usada na maior parte dos tapetes orientais, ficou famoso na antiguidade com Alexandre Magno, constituem os exemplos mais típicos do trabalho anatoliano. Até o século XIX os tapetes guiordes estavam entre os mais finos do Oriente pela inspiração artística. O Ushak no passado produziu tapetes incomparáveis, hoje, porém a qualidade é malfeita e inferior. (CAMPANA, 1991 p.60-98) (Figura2) 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil Figura2. Tapete Bassra Ghiordes , Fred Moheban Gallery A Ásia central foi o berço do tapete de nós feitos à mão. A linhagem turcomana, junto com um grupo mongol, separou – se em numerosas tribos nômades e necessitavam proteger – se do frio, e diferenciar as tribos quanto a cultura, e essas necessidades deram origem aos trabalhos feitos verdadeiramente com nós. Após essas mudanças, as tendas passaram a ser totalmente forradas com os tapetes. Houve um avanço artístico bem grande neste período, porém foi destruído com a invasão de Gêngis Khan na Mongólia para conquistar a Pérsia. (CAMPANA, 1991 p.107-109) A tapeçaria na Idade Média No Ocidente a tapeçaria era realizada nos monastérios, pois a lã era exclusiva destes. As peças mostravam uma dedicação à beleza e à casa de Deus. A origem das técnicas em si permanece um enigma, é possível apenas fazer hipóteses, como a influência que a invasão à Arábia durante as Cruzadas pode ter tido nas ideias dos desenhos representados. (HAMLYN, VIALE, 1966 p.9) A primeira tapeçaria Ocidental denominada The Cloth of St. Gereon possui apenas fragmentos que estão distribuídos entre museus em Berlim, Lyon, Londres e em Nuremberg e foram pegos do local de origem, a igreja de St. Gereon em Cologne. Alguns experts consideram o trabalho semelhante ao Oriental, mas a ornamentação da borda e o fundo são inspirações Ocidentais, semelhantes as ilustrações a mão do século XI. Nenhum outro exemplo sobreviveu, até os painéis da catedral de Halberstadt, o mais velho é uma representação chamada Abraham and the Archangel Michael foi provavelmente tecido por volta de 1175, a representação Christ with the Apostles pode ser datada uma ou duas décadas depois, enquanto o terceiro, Charlemagne among the Four Philosophers datado de meados do século XIII. (HAMLYN, VIALE, 1966 p. 1516) (Figura3) 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil Figura3. The Cloth of St. Gereon (fragmento) Nas tapeçarias de St. Gereon os motivos decorativos são repetidos idênticos com intervalos regulares sobre toda a superfície. No painel de Halberstadt há uma mudança definitiva, a qual afetaria o futuro da Tapeçaria Ocidental, figuras históricas aparecem no painel como tema. O painel de Charlemagne pode ser comparado com outros trabalhos de tecelagem, como o famoso carpete tricotado de Quedlinburg, do estúdio do convento de Badessa Agnese, completado por volta de 1203. (HAMLYN, VIALE, 1966 p.16) No último quarto do século XIV grandes estúdios surgiram em Paris e Arras, alguns mais modestos estavam em atividade em Tournai, pequenos ateliês esporadicamente em Brabant, Hainault, Flanders, e cidades vizinhas. (HAMLYN, VIALE, 1996 p.23) (Figura4) Figura4. The Legend of Herkenbald. Trajan's Justice. Tournai. Antes de 1461. Historisches Museum, Berne A explicação para a expansão da técnica de tecelagem pelos países FrancoFlamengos é fácil visto que imperadores e papas, príncipes e aristocratas, sacerdotes, peregrinos e andarilhos estavam sempre se mudando e teciam as tapeçarias em seus próprios teares. Nos vastos salões dos castelos decorados, as tapeçarias serviam como papel de parede para proteger do frio e do vento. Elas eram indispensáveis em viagens e 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil foram levadas até mesmo para a Guerra. Essas aplicações práticas explicam em parte a apreciação pelas peças, mas elas também tinham um considerável valor. Possuir uma tapeçaria era um sinal de riqueza, grandeza e poder, e em ocasiões públicas, elas eram expostas como uma evidência da importância social de seus possuidores. (HAMLYN, VIALE, 1996 p.23-24) As tapeçarias eram quase que exclusivamente feitas por monges artesões e pessoas com prestígio social associadas a comunidade dos monastérios, incluindo padres, bispos e santos. (FOYS, OVERBEY, TERKLA, 2009 p.5) Apenas no meio do século XIV as tapeçarias começaram a receber desenhos mais complexos, contendo histórias verdadeiras separadas em painéis, cada um mostrando um capitulo com séries de histórias completas. Às vezes essas histórias eram bem longas como Les Aventures Des Enfans de Renaud de Montauban. No terceiro quarto do século XIV este tipo de historia começou a se estabelecer. Vários nobres como Carlos V da França, Felipe II, Duque da Borgonha, Luis I, Duque de Anjou eram mecenas de tecelões parisienses como Nicolas Bataille, Pierre Beaumetz e Jacques Dourdin. Eles ficaram conhecidos como tecelões, mas eram na verdade “empregadores de tecelões”. (HAMLYN, VIALE, 1996 p.25-26) Os poucos trabalhos do século XIV que sobreviveram são os maiores da história da tapeçaria. Da série Apocalypse of St John apenas duas ou três permaneceram, esta série foi feita para Luis I, Duque de Anjou, entre 1375 e 1377 no ateliê de Bataille. A preparação foi longa e detalhada, o desenhista foi Jehan de Bondolf, que consultou manuscritos sobre o apocalipse antes do trabalho ser feito. Essa consulta prova que as tapeçarias nunca estiveram, nem mesmo neste período, totalmente livres da influência de outras artes, a pintura principalmente. (HAMLYN, VIALE, 1996 p.26) (Figura5) Figura5. Apocalypse of St. John St. Michael and the Devil. Designer, Henrique de Bruges; Tecido, Nicolas Bataille. Paris. Ultimo quarto do seculo XIV. Musée des Tapisseries, Angers 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil As tapeçarias com temas religiosos tinham a função de propagar e manter a fé, funcionando como uma espécie de painel narrativo, com uma função narrativa e didática de contar temas históricos e bíblicos. (VIERA, 1990 p.30) A tapeçaria mais estudada desta época é a “Bayeux” ou A conquista da Inglaterra pelos Normandos. (FOYS, OVERBEY, TERKLA, 2009 p.5) (figura6) Figura6. Tapeçaria Bayeux Como já foi dito, havia um desenhista que realizava o desenho antes do tecelão fazer o trabalho. Este estudo de desenho nem sempre era criado pelo tapeceiro. O artista executava o trabalho conforme um modelo de um cartão criado por um pintor, o que reforçava a visão da tapeçaria como uma arte menor. Segundo a autora a escritora russa Birioukova afirma que, durante a Idade Média, os artistas tinham o hábito de desenhar seus próprios cartões. Somente mais tarde os desenhistas e pintores passaram a elaboras os modelos. Mas ainda assim, Vieira afirma, que há criatividade por tratar – se de outra mídia, o pintor no cartão e o tapeceiro no bordado ou tecelagem. (VIERA , 1990 p.31) A diferença entre os mecenas da Idade Média e os do Renascimento é que até hoje não se sabe ao certo se eles participavam da execução das obras ou como os mecenas renascentistas apenas davam instruções de como ela deveria ser. (FOYS, OVERBEY, TERKLA, 2009 p.5) A estética e as artes têxteis Para estabelecer a estética, em seu sentido moderno, foi preciso definir o que era arte, pois ainda se tinha a ideia grega desta. “A palavra arte, herdeira desde o século XI, de sua origem latina (ars= atividade, habilidade), designa até o século XV, no ocidente, apenas um conjunto de atividades ligadas à técnica, ao ofício, à perícia, isto é, a tarefas essencialmente manuais”. Porém a definição de arte como habilidade manual foi substituída no momento em que a “arte é reconhecida e se reconhece, através de seu conceito, como atividade intelectual, irredutível a qualquer outra tarefa puramente técnica”, surgindo a ideia de estética. (JIMENEZ, 1997 p. 32) 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil A mudança coincide com o surgimento “da ideia de um sujeito criador autônomo” durante o século XV “ ela contribui para o reconhecimento do artista que goza doravante de um status social mais elevado do que o do artesão da Idade Média”. (JIMENEZ, 1997 p.39) Na tradição ocidental, as artes aplicadas passaram a ocupar um espaço inferior desde o início da montagem da história da arte enquanto disciplina, durante o Renascimento. (CHADWICK, 1996; apud SIMIONI, 2008 p.12). As artes têxteis estão ligadas também a uma produção artesanal, a um modo de produção capitalista, o que influi de modo decisivo na posição social do artista. (JIMENEZ,1997 p.41) Apesar deste reconhecimento do artista, ainda decorre dois séculos antes que entre em uma esfera totalmente autônoma. No entanto o artista já afirmou – se como artista criador e deixou de ser artesão, assim o artista corta sua relação com a religião, que não aceita outro criador além de Deus. (JIMENEZ, 1997 p.43) Com o surgimento das academias de arte em 1562 (VASARI,1991 p. vii), as artes aplicadas foram ainda mais subjugadas, e durante a divisão dos ateliês receberam os ateliês menores e menos prestigiados, principalmente as artes têxteis, por serem consideradas atividades de labor e por isso não necessitarem de intelecto para serem praticadas. (SIMIONI, 2008) A arte têxtil no Brasil A arte estava profundamente mergulhada na cultura indígena e a expressão têxtil desempenhava um dos principais papéis, os índios ensinaram os jesuítas, porém a cultura de tecelagem indígena estava longe de ser assimilada pelas novas sociedades em formação, a não ser no seu aspecto funcional. Os jesuítas, que se empenharam em educar os índios, jamais registram sua arte e cultura. (CAÚRIO, 1985 p.64) Foram trazidos os negros africanos, e os dois principais grandes grupos de escravos africanos foram deslocados para o Brasil a partir do século XVI, os Bantus e os Sudanes. A maioria das peças artísticas, e as melhores produções de “arte negra”, são provenientes do oeste e do centro da África, local de onde foram deslocados os grupos para o Brasil pelo português. Entretanto o maior marco das culturas africanas é a sua religião. (CAÚRIO, 1985 p.67) O fenômeno da aculturação dificulta a identificação de uma “arte negra” e a miscigenação intensifica essa dificuldade. A “arte negra” esta intimamente ligada à religiosidade do negro, encontrando-se basicamente a serviço da tradução de sua 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil espiritualidade, mitos e crenças. Para o negro a arte não existe no conceito ocidental, assim como não existe o “artista”. A arte africana é transmitida de pai para filho, sempre a serviço da manutenção de uma tradição, o que explica o alto grau de perfeição atingindo em certos casos. (CAÚRIO, 1985 p.68) Os negros já dominavam a tecelagem na África, produzindo tecidos para o uso próprio de uma rica indumentária. A tecelagem africana era geralmente praticada pelos homens, fato encontrado também nas outras etnias estudadas. (CAÚRIO, 1985 p.68) O Brasil colonial teve a sua educação e as suas artes estreitamente ligadas à Igreja, já que os jesuítas, além da função religiosa, se ocuparam diretamente das outras por mais de dois séculos. Toda a iconografia artística produzida era voltada para a religião, inicialmente as figuras eram mais próximas das crenças dos indígenas. Para os jesuítas a arte deveria ser útil e ter uma função, fazendo oficinas de utilidade pratica para negros e índios, entre essas a oficina de tecelagem. (CAÚRIO, 1985 p.70) A história da tecelagem no Brasil tem vários estágios até o século XX. A expressão têxtil esteve desde o inicio ligada à confecção de tecidos úteis na vida cotidiana e, posteriormente, ligada a produção industrial, só neste segundo período e que se buscou uma estética. O trabalho para consumo próprio se estendeu por todo o período colonial, tendo sido salvaguardada pela Metrópole mesmo em épocas de crises políticas. (CAÚRIO, 1985 p.70) Os primeiros mestres-tecelões brasileiros foram os indígenas, pois esse ofício era desconhecido dos jesuítas. Nem todas as tribos indígenas teciam e, além disso, muito poucas foram as que chegaram a ter contato com os jesuítas, por essa razão foi necessário importar mais mão de obra, alem dos tecelões enviados por Portugal, visando uma rápida difusão técnica e o incremento produtivo local. (CAÚRIO, 1985 p.70-71) A tecelagem de “panos grossos” influiu de maneira negativa no desenvolvimento da tecelagem brasileira. O ofício de tecelão em Portugal era considerado de baixa reputação e no Brasil herdou essa tradição de ver a profissão de forma indigna, devido às lembranças árabes na Península Ibérica. Devido à utilidade prática dos objetos, foram rapidamente assimilados pelas novas culturas que chegaram ao território onde hoje é o Brasil, e essa introduziram a produção de outros produtos, tudo fabricado em crescentes quantidades, sem qualquer conteúdo simbólico e até mesmo decorativo. (CAÚRIO, 1985 p.71) 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil O Brasil recebeu povos de outras culturas ainda na época colonial. A expedição holandesa de Mauricio de Nassau trouxe pessoas de diferentes áreas para fazer registros sobre o país, porém não consta nos registros dessa expedição a presença de um tapeceiro. (CAÚRIO, 1985 p.73) No fim do século XVII teve início uma fase de produção mais eficiente e de melhor qualidade, mostrando uma autonomia brasileira em relação à fabricação de tecidos. Essa eficiência foi adquirida pelo aprimoramento da técnica de tecelagem manual, com a adição do tear horizontal e com pedais, e o acrescimento do uso de rocas e fusos, e facilitou a formação das primeiras indústrias caseiras. Cada vez mais as manufaturas preocupavam – se com uma produção de qualidade. (CAÚRIO, 1985 p.74) Portugal, que até então não havia se manifestado diante do crescimento da indústria têxtil em quase todo o território brasileiro, começou a se preocupar com a diminuição das importações brasileiras de tecidos da Inglaterra, uma vez que a Metrópole havia assinado o Tratado de Methuen, em 1703, segundo o qual Portugal e suas colônias se obrigavam a importar tecidos ingleses em troca de importar vinhos lusitanos e, principalmente, devido à dependência militar da Inglaterra. (CAÚRIO, 1985 p.74) Desde 1755 a coroa portuguesa já pensava em extinguir as manufaturas brasileiras. Em 1759 os jesuítas foram expulsos do Brasil, mas a tecelagem sofreu realmente 1785, quando a rainha Maria I assinou o Alvará que proibia todas as fabricas, manufaturas ou teares de galeões, de tecidos ou bordados de ouro ou prata. Somente alguns teares clandestinos foram preservados, dando origem à arte popular das comunidades rurais do Brasil. A fixação do bandeirante deu origem às pequenas fazendas, onde se instalaram o labor feminino da tecelagem. (CAÚRIO, 1985 p.74) Somente a partir de um novo Alvará assinado por D. João VI em 1808 foi liberado oficialmente a tecelagem no Brasil. As manufaturas desativadas no século XVIII foram pouco a pouco se estabelecendo e criando sementes para a expressão têxtil artística. Os tecidos ingleses eram muito caros, o que fazia a produção manual ser uma ocupação rentável e de interesse feminino. (CAÚRIO, 1985 p.75) As artes têxteis estavam completamente marginalizadas das iniciativas oficiais de incremento das artes tupiniquins ocorridas com a mudança da Família Real para o Brasil, das quais a vinda da Missão Francesa em 1816 foi de grande importância. A França, maior centro produtor de tapeçarias no século XIX, não enviou em sua comitiva 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil um representante da área. “Nessa ocasião, só mesmo a engenhosidade e a imaginação populares manufaturaram tecidos e composições que, preconceituosamente vistos como “arte aplicada” ou “arte menor”, não chegaram a constituir objeto das preocupações eruditas”. (CAÚRIO, 1985 p.75) A retomada das artes têxteis Após a Revolução Industrial a tecelagem e a tapeçaria já estavam ligadas com o trabalho braçal e automático, perdendo as características que as faziam serem vista como uma arte. (PEVSNER, 2002). As Academias sofreram um declínio em seu prestígio, e a situação dos artesanatos começou a se transformar. Durante os movimentos Art Nouveaux e, especialmente, pelos movimentos Arts & Crafts, liderados por William Morris, houve uma revalorização dos suportes têxteis. Porém, mesmo com essa retomada dos métodos artesanais, não houve uma aceitação universal dos objetos têxteis como “artes elevadas”. (SIMIONI, 2008 p.13) Após a criação das academias qualquer um que tentasse retomar os bordados, a tecelagem e a tapeçaria como uma técnica artística era excluído dos movimentos artísticos e das galerias. Durante a semana de arte moderna de 1922 alguns artistas foram excluídos do evento por serem artistas aplicados. A artista brasileira Regina Graz, pioneira do art decó no país, é um caso do obscurecimento devido à escolha de materiais. Seu caso é usado como exemplo da dificuldade de trazer o estatuto de artísticas às obras têxteis. (SIMIONI, 2008 p.17) Da metade do século XX até agora Durante os anos de 1960, 1970 e 1980 várias artistas se dedicaram a trabalhar com as técnicas das artes ditas menores por serem consideradas um trabalho feminino. Dedicaram – se, principalmente, a uma retomada “política” dos suportes chamados de artesanais, dando ênfase maior aos têxteis. (RECKITT; PHELAN, 2001; apud SIMIONI, 2008 p. 19) A Bienal de Tapeçaria de Lausanne foi fundada para expor obras têxteis. Mesmo com a criação do evento, não houve um abandono ou uma contestação dos valores que já sustentavam o campo das artes. (SIMIONI, 2008 p.19) Hoje as tapeçarias conquistaram um espaço no ramo das artes e algumas exposições apenas com tapeçarias estão ganhando mais viabilidade, como a mostra “A Arte da tapeçaria – Tradição e modernidade (A Manufatura de Portalegre na FIESP)”, 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil que reuniu pela primeira vez no Brasil 48 tapeçarias de Portalegre, do Alentejo. Esse evento foi o primeiro com as tapeçarias, porém peças do tipo já compõem acervos importantes, como as peças permanentes do MASP (Museu de Arte de São Paulo). Um exemplo é “Verdure - Tapeçaria com Animais, uma tapeçaria do século XVII”. (Figura7). Figura 7. Verdure - Tapeçaria com Animais As tapeçarias que vieram pela primeira vez ao Brasil e fazem parte do acervo do Museu da Tapeçaria de Portalegre Guy Fino, contando com o apoio do Instituto Português de Museus. Foram encontrados muitos museus que exibem tapeçarias orientais ou medievais, período que elas passaram a ser feitas no ocidente, inclusive museus apenas com peças desse estilo, como o Musée des Tapisseries, que existe desde 1993, na França, e expõe peças do oriente, deixadas de lado na história da arte, e faz exposições temporárias com artistas têxteis contemporâneos, e com “artes decorativas” como o Musée des arts décoratifs, também na França foi criado um museu inspirado na tapeçaria Bayeux, com o seu nome. Na Inglaterra as tapeçarias mais famosas estão no Victoria and Albert Museum, um importante museu de design. Fora da Europa o Metropolitan Museum of Art expõe diversas tapeçarias em seu arcevo. No Brasil não há um museu específico desta categoria Arte e artesanato A arte da tapeçaria caminha ao lado da História da Arte. Desenvolve – se de maneira diferente em cada região, porém em todas as épocas há homens que usarão a tapeçaria como expressão artística. . (VIERA, 1990 p.30) Segundo o Dicionário Houaiss “artesanato” significa arte ou técnica do trabalho manual, peça ou conjunto de peças artesanais. Peças artesanais são peças não industrializadas, sem sofisticação, rústicas. “Arte” significa produção de algo belo ou extraordinário; conjunto de regras para essa produção; habilidade. Artesanato são peças 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil feitas sem nenhum conhecimento aprofundado de técnicas e estudos sobre “regras” para a produção das peças. Estudo da tecelagem nas artes visuais Hoje existem diversos cursos e departamentos de arte em faculdades consideradas pela Times Higher Education as melhores faculdades do mundo. Por meio da analise das quinze primeiras colocadas foi percebido que aulas de tecelagem não estão inclusas no curso de artes visuais destas faculdades. A descrição dos cursos inclui pintura, escultura e gravura (em metais e madeira). A California Institute Of Technology possui equipamento e sala para estampa em tecido, mas não há menção de tecelagem, e a University of California, em San Diego, possui ensino de artes asiáticas, porém na descrição da aula não diz se é ensinada a tapeçaria. Nas escolas de Belas Artes da Europa o cenário permaneceu o mesmo, a Academia de Belas Artes de Florença, entretanto possui aulas de história das artes aplicadas nos cursos de três anos. Este curso, todavia não ensina a produzir esse tipo de arte. No Brasil foram analisados os melhores cursos de arte segundo o Ministério da Educação e Cultura. Nenhuma possui artes têxteis em seus cursos de artes visuais. Discussão Ao longo da pesquisa descobriu-se que a tecelagem é vista como um tipo de arte têxtil, cuja origem é desconhecida. Até o século XVIII as artes têxteis caminhavam ao lado das chamadas “artes nobres”, como uma arte oriental e posteriormente, com as invasões e as cruzadas, como uma forma de ornamentar e aquecer os enormes castelos medievais. A funcionabilidade das tapeçarias garantiu por um tempo um grande reconhecimento, porém no momento em que o desenho foi reconhecido como a origem de todas as artes, as “artes aplicadas” passaram a ser inferiorizadas. Com o surgimento da estética e a criação das Academias de arte, as artes têxteis, também chamadas de “artes aplicadas”, foram vistas como uma tarefa artesanal, principalmente por ser uma tarefa mais manual. As tapeçarias orientais carregavam símbolos e significados, representações da cultura oriental. Com as exportações para países europeus, alguns desses símbolos foram esquecidos e a qualidade das tapeçarias foi afetada, perdendo muito do que tornava as peças uma das mais importantes artes orientais. Após a invasão árabe em 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil Portugal, o trabalho de tecelão passou a ser mal visto, por carregar péssimas lembranças para o povo português. Quando os jesuítas portugueses chegaram ao Brasil aprenderam a técnica de tecelagem com os nativos e posteriormente os negros demonstraram também terem o conhecimento do trabalho de tecelão, e que já era uma atividade mal vista, ganhou mais uma carga negativa. Nenhum fidalgo ou descendente de português queria realizar uma atividade manual ligada aos escravos e aos índios, considerados inferiores. Os Alvarás de proibição da tecelagem fizeram do trabalho têxtil no Brasil uma atividade clandestina, esse tipo de trabalho deu origem aos trabalhos mais artesanais, o que explica o fato de no Brasil a tecelagem artística não ser um campo muito explorado pelos artistas. Quando o ensino da arte se iniciou no Brasil, tentava imitar as Academias europeias. Apesar de existir o Liceu de artes e ofícios, as artes têxteis foram ignoradas no ensino das artes no Brasil. Com a pesquisa realizada nos currículos das melhores Universidades do Brasil no curso de artes visuais, foi possível perceber que até hoje não é ensinada arte têxtil junto com as “artes acadêmicas”. A arte têxtil esta conquistando um espaço importante nos museus pelo mundo e no Brasil esta começando a ganhar espaço, com novos artistas que trabalham com arte têxtil, embora não tenhamos peças do histórico brasileiro, exposições de arte contemporânea podem contar com peças têxteis. Conclusão Foi possível investigar a trajetória das artes têxteis, principalmente as tapeçarias, e descobrir quais fatos fizeram com que este tipo de manifestação artística fosse das mais apreciadas e valiosas às artes inferiores. No ocidente, se concentra a história da arte desde que o conceito de história e a ideia de estética surgiram, muitos motivos explicaram a atual situação das tecelagens artísticas, nos cursos e no mundo das artes. Atualmente as artes têxteis não são ensinadas nos cursos de artes visuais, porém os museus pelo mundo apresentam muitas obras do gênero, apesar disso são peças feitas em uma época em que as artes ainda não eram uma disciplina e ainda não carregavam cargas negativas de trabalho manual e de trabalho feminino. No Brasil não houve uma tradição da tecelagem, principalmente artística, o que talvez explique porque nos museus com obras até o século XIX, como na Pinacoteca, 20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil por exemplo, não há tapeçarias ou qualquer outro tipo de manifestação de têxtil artística. O histórico artigo mostrou os motivos que levaram a arte têxtil, à ser vista como uma forma de artesanato, realizada por um artesão. A definição de tapeçaria não se refere à uma peça de arte, mas à uma tecido para forrar moveis, assoalhos e paredes, ou seja, abrange a funcionabilidade das peças de tapeçarias, não mencionando o lado estético. Apesar de artesanato estar ligado com a arte, em sua definição, não é reconhecida pelos críticos de arte e pessoas socialmente reconhecidas como artistas. As artes têxteis caminham lentamente para o reconhecimento, embora ainda tenha que vencer questões como o método acadêmico de produção artística e de formação de críticos de artes. 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