Diretrizes da Ação Evangelizadora do Grupo Marista

Transcrição

Diretrizes da Ação Evangelizadora do Grupo Marista
Diretrizes da Ação
Evangelizadora
do Grupo Marista
2ª edição
Diretrizes da Ação
Evangelizadora
do Grupo Marista
2ª edição
Grupo Marista
Curitiba, 2014
realização:
apoio:
Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver
caridade, sou como o bronze que soa, ou como o címbalo que retine.
Produção
Grupo Marista | Setor de Pastoral
Redação e revisão de conteúdo
Ir. Adriano Brollo, Bruno Manoel Socher, César Leandro Ribeiro,
Daiane Meger, Diogo Luiz Santana Galline, Dyógenes Philippsen
Araújo e Marilúcia Antônia de Resende
Coordenação Editorial
(pesquisa, redação, padronização e revisão)
César Leandro Ribeiro e Dyógenes Philippsen de Araújo
Mesmo que eu tivesse o dom da profecia, e conhecesse todos os
mistérios e toda a ciência; mesmo que tivesse toda a fé, a ponto de
transportar montanhas, se não tiver caridade, não sou nada.
Ainda que distribuísse todos os meus bens em sustento dos
pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser
Projeto Gráfico
Estúdio Sem Dublê | Thais Scaglione
Diagramação
Estúdio Sem Dublê | Bruno M. H. Gogolla e Thais Scaglione
queimado, se não tiver caridade, de nada valeria!
A caridade é paciente, a caridade é bondosa. Não tem inveja.
Revisão Ortográfica
José André de Azevedo
A caridade não é orgulhosa. Não é arrogante. Nem escandalosa.
Revisão para 2ª edição
Adriano Brollo, José André de Azevedo e
Marilúcia Antônia de Resende
Não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não guarda
rancor. Não se alegra com a injustiça, mas se rejubila com a
Apoio técnico
Diretoria de Marketing e Comunicação
verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
Grupo Marista
Rua Imaculada Conceição, 1.155, Bloco Administrativo – 9º andar
Prado Velho, Curitiba – PR - 80215-901
Fone: (41) 3271 6400
www.grupomarista.org.br
Este livro, na totalidade ou em parte, não pode ser reproduzido por
qualquer meio sem autorização expressa por escrito.
A caridade jamais acabará. As profecias desaparecerão, o dom das línguas
cessará, o dom da ciência findará. A nossa ciência é parcial, a nossa profecia
é imperfeita. Quando chegar o que é perfeito, o imperfeito desaparecerá.
Quando eu era criança, falava como criança, pensava como criança, raciocinava
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Diretrizes da ação evangelizadora do Grupo
Marista / Grupo Marista. -- 2. ed. -São Paulo : FTD, 2014.
Hoje vemos como por um espelho, confusamente; mas então veremos face
a face. Hoje conheço em parte; mas então conhecerei totalmente,
como eu sou conhecido. Por ora subsistem a fé, a esperança e
ISBN 978-85-322-9301-5
1. Evangelismo - Ensino bíblico 2. Missão da
Igreja 3. Teologia pastoral I. Grupo Marista.
14-03450 como criança. Desde que me tornei homem, eliminei as coisas de criança.
CDD-253.78
Índices para catálogo sistemático:
1. Diretrizes da ação evangelizadora da Igreja:
Cristianismo 253.78
a caridade - as três. Porém, a maior delas é a caridade.
(1 Coríntios 13)
Apresentação da Primeira Edição
A Igreja exorta-nos, desde o Concílio Vaticano II, a que, em todo
trabalho evangelizador, estejamos sempre atentos aos “sinais dos
tempos”, pois é necessário conhecer e entender o mundo, os espaçotempos no qual vivemos.
O Instituto Marista, fiel ao Evangelho, à Igreja e ao legado de
seu fundador, Marcelino Champagnat, reconhece-se vocacionado a ler esses sinais dos tempos e buscar, com audácia, empreendedorismo e vitalidade, novos métodos para tornar Jesus Cristo
conhecido, amado e seguido. O XXI Capítulo Geral nos exorta:
“Com Maria, ide depressa para uma nova terra!”; e isso nos faz
olhar para nossas estruturas como meios dinâmicos e potenciais
que primam pela excelência administrativa, educacional, social e
pastoral com a finalidade de garantir a vitalidade e viabilidade da
missão Marista.
Nesse contexto, nossas frentes apostólicas são concebidas como
“campos de aplicação e vetores de multiplicação” do carisma marista. São meios nos quais a identidade institucional é vivenciada
e pelos quais chegamos com maior eficiência às crianças e aos jovens com a finalidade de ajudá-los a desenvolverem-se em todas
as suas dimensões. Por isso mesmo, acreditamos que a dinâmica
evangélico-pastoral perpassa todas as nossas instâncias, dá significado aos processos desenvolvidos e é responsabilidade de todos.
Considerando esses pressupostos, a Província Marista Brasil
Centro Sul, sensível ao sopro do Espírito e com a responsabilidade de zelar e dinamizar o processo evangelizador na Província,
empenha-se por desenvolver uma proposta de atualização da ação
pastoral em nossas iniciativas de forma corresponsável, organizada, sistemática e orgânica e, ao mesmo tempo, dinâmica, criativa e
inovadora.
8
Diretrizes da Ação Evangelizadora
Nossa gratidão a todos que contribuíram no processo de elaboração das Diretrizes da Ação Evangelizadora. O documento foi
concebido e construído a partir de muitas mãos, mentes e corações.
Agradecemos em especial aos pastoralistas, educadores, colaboradores, gestores e jovens que estiveram presentes nos espaços de
construção coletiva: Assembleia Provincial de Pastoral, Escola
de Pastoral, Grupos de Trabalho para elaboração dos elementos
inculturadores e Direcionamentos Pastorais, videoconferências
com representantes das Unidades. Ainda ressaltamos a participação e colaboração de todos os setores provinciais, dos revisores
teológico-pastorais e gramaticais.
Rogamos a todos que compõem a Província Marista Brasil Centro Sul as bênçãos de
Deus, por intercessão de Maria, nossa Boa Mãe, e de São Marcelino Champagnat.
Ir. Adriano Brollo
Diretor do Setor de Pastoral
Ir. Davide Pedri
Provincial
Grupo Marista
9
Apresentação da Segunda Edição
A vivência do Evangelho é sempre algo que traz novidade à vida
humana; não podemos, entretanto, negar que desde 2011, quando
as Diretrizes da Ação Evangelizadora da Província Marista Brasil
Centro-Sul foram publicadas - oferecendo-nos um itinerário claro
e aberto à ação de Deus em nossas atividades -, tal novidade foi encontrando em nosso cotidiano mais espaço, mais organicidade e
até mesmo certos riscos, visto que “quem arrisca, o Senhor não o
desilude”. 1
Em 2012 a Província Marista Brasil Centro-Sul reestruturou
suas atividades e passou a ser nomeada Grupo Marista; no ano seguinte, em 2013, tivemos a grata surpresa do Espírito: Habemus Papam Franciscum e percebemos em todos nós o desejo de uma clara
consciência daquilo que é fundamental na vivência do cristianismo: “Em qualquer forma de evangelização, o primado é sempre de
Deus”. 2
Estarmos abertos à graça de Deus e fazermos o máximo daquilo
que nos compete, com ternura e vigor: eis o “segredo” de uma ação
evangelizadora e pastoral fecunda; eis o nosso desejo que se expressa em nossas Diretrizes da Ação Evangelizadora, cuja segunda
edição temos a honra de apresentar.
A revisão das Diretrizes mostrou-nos que estamos em comunhão com a Igreja, com o Instituto Marista, em sintonia com as Diretrizes da Ação Evangelizadora para o Brasil Marista/UMBRASIL e
atentos aos sinais dos tempos; a revisão das Diretrizes indicou-nos
que “a alegria evangelizadora refulge sempre sobre o horizonte da
1
2
10
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 03.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 12.
Diretrizes da Ação Evangelizadora
memória agradecida” 3, mas que “ainda temos um longo caminho
a percorrer” (Cf. 1Rs 19,7).
Esperamos, pois, que a presença da Boa Mãe e os ensinamentos
de São Marcelino Champagnat nos impulsionem a realizarmos no
Grupo Marista o desejo da Igreja: “Cada cristão e cada comunidade há de discernir qual é o caminho que o Senhor lhe pede, mas
todos somos convidados a aceitar este chamado: sair da própria
comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que
precisam da luz do Evangelho”. 4
Ir. Joaquim Sperandio
Provincial
3
4
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 13.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 20.
Grupo Marista
11
Sumário
1. NOSSA HISTÓRIA, NOSSA CAMINHADA
12
Orientações para a leitura e o estudo_______________________________________________________26
2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS
28
2.1Evangelização_____________________________________________________________________30
2.2Pastoral _________________________________________________________________________34
2.2.1Apostolado_________________________________________________________________36
2.2.2Planejamento_______________________________________________________________38
2.2.3Organicidade________________________________________________________________40
2.2.4 Flexibilidade metodológica_____________________________________________________42
2.2.5 Atenção aos sinais dos tempos__________________________________________________44
2.2.6Recursos___________________________________________________________________47
2.3Carisma__________________________________________________________________________49
3. ELEMENTOS INCULTURADORES
54
3.1 Dignidade humana _________________________________________________________________59
3.2Educação emancipadora ____________________________________________________________64
3.3Espiritualidade ____________________________________________________________________68
3.4Alteridade _______________________________________________________________________73
3.5Solidariedade Socioambiental _______________________________________________________79
3.6Catequese _______________________________________________________________________86
3.7 Infâncias e Juventudes ______________________________________________________________93
3.8Valores maristas _________________________________________________________________102
4. DIRECIONAMENTOS PASTORAIS
106
4.1Objetivos de Animação Pastoral do Conselho Geral _______________________________________108
4.2 Direcionamentos Transversais_______________________________________________________109
4.3 Direcionamentos Pastorais para as Frentes Apostólicas___________________________________110
4.3.1 Área Corporativa ____________________________________________________________111
Área Corporativa alicerçada nos valores institucionais_______________________________112
Processos organizacionais alinhados aos valores institucionais_______________________112
4.3.2Negócios Suplementares_____________________________________________________113
Processos organizacionais alinhados aos valores institucionais_______________________113
Difusão dos valores humanos, cristãos e maristas, traduzidos à cultura atual ____________114
Produtos e serviços específicos para a evangelização dos colaboradores________________114
4.3.3Educação Profissional________________________________________________________115
Educação para a “cultura do trabalho”___________________________________________115
Desenvolvimento integral do sujeito____________________________________________116
Pastoral transversal, integrada aos processos da Educação Profissional________________117
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
4.3.4 Unidades Sociais da Rede Marista de Solidariedade ________________________________117
Processo educativo-evangelizador visando o protagonismo sociopolítico-eclesial_________119
Pastoral transversal, integrada a todos os processos das Unidades Sociais______________119
Promoção e defesa da vida na perspectiva do direito________________________________119
4.3.5 Área da Saúde______________________________________________________________120
Valores Institucionais assumidos transversalmente como fonte de vitalidade____________120
Atendimento multiprofissional e humanizado ao paciente___________________________121
Abordagem educativo-humanizadora (bioética e humanização)_______________________121
Educação para Prevenção e Promoção à Saúde____________________________________121
Eclesialidade_______________________________________________________________121
4.3.6Ensino Superior_____________________________________________________________122
Comunidade acadêmica em que o Evangelho e os valores institucionais são vitais_________122
Dinamização da relação da fé com a cultura e os diversos saberes______________________122
Espaço privilegiado para o desenvolvimento integral dos jovens_______________________123
Extensão do conhecimento – além-fronteiras______________________________________123
Comunhão eclesial__________________________________________________________123
4.3.7LUMEN____________________________________________________________________124
Ação educativo-pastoral ampliada______________________________________________124
Difusão dos valores humanos, cristãos e Maristas__________________________________125
Produtos e serviços específicos para a evangelização_______________________________125
4.3.8Editora FTD________________________________________________________________125
Desenvolvimento integral do colaborador________________________________________126
Difusão dos valores humanos, cristãos e maristas, traduzidos à cultura atual_____________126
Produtos e serviços específicos para a evangelização_______________________________127
4.3.9Rede de Colégios____________________________________________________________127
Um processo educativo-pastoral que promova o conhecimento,
a vida e os valores inerentes ao Evangelho________________________________________128
Uma escola acolhedora e fraterna______________________________________________128
Formação das infâncias e juventudes tendo em vista o protagonismo eclesial e político____129
Pastoral transversal, integrada e integradora diante dos processos da escola____________129
Formação contínua e conjunta_________________________________________________130
4.3.10 Pastoral Juvenil Marista – PJM_________________________________________________130
O processo de amadurecimento na fé e o desenvolvimento humano____________________131
O protagonismo juvenil_______________________________________________________131
A formação integral__________________________________________________________131
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
134
Grupo Marista
13
1
NOSSA HISTÓRIA,
NOSSA CAMINHADA
1.NOSSA HISTÓRIA, NOSSA CAMINHADA5
[1].
As Diretrizes da Ação Evangelizadora do Grupo Marista nascem com a motivação de animar e orientar as ações pastorais em todos os nossos campos
de atuação. Para tanto, o presente documento reafirma e atualiza os principais ideais e processos pastorais construídos na última década, resultantes
de uma caminhada sólida e comunitária de muitos evangelizadores que não
pouparam esforços em semear e cultivar, de maneira criativa e contextualizada, a “Alegria do Evangelho”, que “enche o coração e a vida inteira daqueles
que se encontram com Jesus”. 6
[2]. A expressão “diretrizes” designa um conjunto de princípios, conceitos,
ideias, aspirações e direcionamentos que contribuem para qualificar os esforços pastorais do Grupo Marista, gerando sinergia, proporcionando uma
visão clara e compartilhada em relação à missão, apontando, desse modo, as
prioridades da missão do Grupo Marista até 2017.
[3]. A construção desse documento sustenta-se nas permanentes e ricas contribuições dos Núcleos de Pastoral, dos Setores Provinciais, dos Irmãos Maristas, das orientações do Governo Geral do Instituto Marista, da Comissão
Nacional de Evangelização – UMBRASIL, nos documentos eclesiais e institucionais (internacionais, nacionais e provinciais) e nas lideranças de todas
as nossas frentes apostólicas. O documento também procura lançar um olhar
atento às transformações da sociedade, às novas tecnologias, assim como absorver as ideias e inspirações originadas na convivência com as novas gerações. Desse modo, a proposta aqui registrada está sempre receptiva às novas
contribuições.
5Entenda-se essa primeira parte como uma Introdução, uma breve recapitulação de nossa história, que pretende contextualizar o presente
documento dentro de um processo de evangelização institucional, que tem como ponto de partida a criação da Província Marista do Brasil
Centro-Sul, em 2002.
6
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 01.
16
Diretrizes da Ação Evangelizadora
[4]. O conteúdo ressalta aspectos essenciais da tradição eclesial ao se fundamentar nos princípios do Evangelho, do Magistério da Igreja e do Instituto Marista. Também introduz na reflexão aspectos inovadores, propondo a adequação
dos referidos princípios às realidades atuais, nem sempre facilmente compreensíveis num mundo marcado por profundas e velozes transformações.
[5]. Sua linguagem é recorrentemente pastoral, de fácil assimilação pelos pastoralistas, embora a preocupação fosse também fazê-la compreensível às lideranças estratégicas do Grupo Marista – nem sempre familiarizadas com
conceitos teológico-pastorais. 7 Afinal, caberá a esse grupo de pessoas, com
formações e experiências tão diversificadas, interpretar o conteúdo aqui reunido e promover os devidos desdobramentos às realidades diversas, com as
traduções necessárias, sem perder a essência.
Contextualização
[6]. A Congregação dos Pequenos irmãos de Maria, conhecida como Instituto dos
Irmãos Maristas, foi idealizada pelo Padre Marcelino José Bento Champagnat (1789-1840) em 1817, na pequena cidade francesa de La Valla. O episódio
fundante remonta à experiência pastoral de Champagnat junto ao leito de
morte de um jovem camponês da família Montagne. O Instituto surgia da indignação do padre frente à miséria e, sobretudo, da sua esperança cristã em
promover a cidadania, a formação religiosa e intelectual de crianças e jovens
empobrecidos e embrutecidos em meio ao caos social, econômico, político e
religioso da França.
[7]. Desde o início, o Instituto foi audaz ao alargar a visão evangelizadora, aliando
fé, educação, solidariedade e compromisso social. Logo soube ultrapassar as
fronteiras geográficas para dedicar-se à humanidade como um todo. Em 2 de
janeiro 2017, celebraremos os 200 anos de fundação do Instituto dos Irmãos
Maristas, motivo de ação de graças e renovação de nossa missão, pois, como
7Nesse sentido, nos alerta o Papa Francisco sobre a necessidade de pensarmos nossas estratégias de comunicação: “[...] convém ser
realistas e não dar por suposto que os nossos interlocutores conhecem o horizonte completo daquilo que dizemos ou que eles podem
relacionar o nosso discurso com o núcleo essencial do Evangelho que lhe confere sentido, beleza e fascínio”. (Evangelii Gaudium, n, 34)
Grupo Marista
17
acreditava Champagnat, “o progresso do instituto deveria ser obra de Deus e
não nossa. É à proteção de Maria, portanto, que devemos esta bênção e todo
sucesso”. 8
[8]. Hoje, o Instituto Marista está presente e atuante em 79 países espalhados pelos cinco continentes. Nossa missão pode ser assim definida: Ser presença
solidária e evangelizadora fortemente significativa entre crianças e jovens
pobres, buscando estilos novos e criativos de educar e de defender os seus direitos. E é missão da comunidade marista – Irmãos, Leigas e Leigos – “tornar
Jesus Cristo conhecido e amado” 9 pela atuação apostólica legada pelo fundador e pela mística de inspiração marial.10
[9]. Há mais de um século 11 no Brasil, os Irmãos Maristas têm se dedicado ao
generoso serviço da evangelização por meio da educação e do atendimento
social, contribuindo efetivamente na formação de bons profissionais, de cidadãos virtuosos e de cristãos comprometidos na construção de uma sociedade
sustentável, justa e solidária. Atualmente o Brasil é um dos campos de missão mais representativos, compreendendo aproximadamente 30% da presença Marista no mundo. 12
[10]. Desde 2002, a Instituição Marista está organizada em nosso país a partir de
quatro unidades administrativas, chamadas de Províncias: Província Marista Brasil Centro-Norte – PMBCN; Província Marista Brasil Centro-Sul
8
Cf. Marcelino Champagnat na carta escrita a Dom Pompallier, em 23 de maio de 1838. (MARCELINO CHAMPAGNAT. Instituto dos Irmãos
Maristas (Org.). Cartas)
9
Para Marcelino Champagnat, esse é substancialmente o núcleo de nossa missão. São palavras suas proferidas para os irmãos e registradas
em cartas em inúmeras ocasiões: “Não posso ver uma criança sem sentir o desejo de dizer-lhe o quanto Jesus a ama”. (Instituto dos Irmãos
Maristas. Constituições e Estatutos. p. 254, art. 2).
10 O termo “marial” designa um conjunto de virtudes e valores inspirados na espiritualidade mariana. No tocante à evangelização, lembranos Papa Francisco: “Há um estilo mariano na atividade evangelizadora da Igreja. Porque sempre que olhamos para Maria, voltamos a
acreditar na força revolucionária da ternura e do afeto”. (Evangelii Gaudium, n. 288)
11 Em 15 de outubro de 1897, os Irmãos Maristas enviados da França desembarcaram no porto do Rio de Janeiro, de onde se deslocaram para
Congonhas do Campo, Minas Gerais, formando a primeira comunidade marista em terras brasileiras. Em seguida, 1900, chegaram mais
irmãos em Bom Princípio, Rio Grande do Sul. Três anos depois, outros fixaram residência em Belém do Pará. Assim começa a trajetória
marista no Brasil. Ver CAVALCANTI. Presença marista: os caminhos da educação e da solidariedade, 2010.
12 Segundo o relatório da UMBRASIL, o Instituto conta com 26 mil Irmãos, Leigos e Leigas, proporcionando educação para 200 mil crianças e
jovens no Brasil e beneficiando mais de 350 mil pessoas no total, por meio de 74 colégios, 3 universidades – sendo uma compartilhada com
outras congregações –, duas faculdades e 109 unidades sociais, 6 hospitais, 3 editoras e 13 veículos de comunicação. (UMBRASIL. Disponível
em http://www.umbrasil.org.br)
18
Diretrizes da Ação Evangelizadora
– PMBCS; Província Marista do Rio Grande do Sul – PMRS; Distrito Marista da Amazônia – DMA. A União Marista do Brasil - UMBRASIL, criada em
2005, com sede em Brasília, é uma associação formada pelas mantenedoras
destas províncias, com a missão de articular e potencializar a ação marista
no Brasil.
[11]. A Província Marista Brasil Centro Sul (PMBCS), criada em julho de 2002 pela
junção da Província de Santa Catarina e de São Paulo, já nascia com uma estrutura administrativa complexa. Suas frentes de atuação incluíam: o ensino
básico, o atendimento social, a promoção vocacional o ensino superior, o ensino técnico, o atendimento na área da saúde, a comunicação de massa e um
conjunto de estruturas e iniciativas voltadas à promoção e defesa dos direitos
das infâncias e juventudes. Um cenário amplo e promissor, mas com grandes
desafios, tanto sob a perspectiva da missão como da sustentabilidade. Para
que a Instituição pudesse ser gerida de modo eficiente, era necessário que o
Conselho Provincial encontrasse um modelo organizacional e administrativo
adequado aos novos tempos.
[12]. Naquele momento, para responder ao desafio da evangelização, o Conselho
Provincial inaugurou o Núcleo Provincial de Pastoral e o incumbiu de fazer o
diagnóstico da ação pastoral-evangelizadora em todos os campos de missão.
13
Em seguida, o Núcleo foi renomeado como Setor de Pastoral 14 da PMBCS.
Em sintonia com os demais Setores Provinciais, criados na mesma época, a
sua atuação foi desenhada de modo a torná-lo uma instância de animação,
formação e profissionalização de pastoralistas, formação de Leigas e Leigos e
de planejamento orgânico em evangelização.
13
Por “campos de missão”, “frentes apostólicas” ou simplesmente “negócios” designamos as iniciativas específicas dessa Província, que,
mediante suas mantenedoras (ABEC-UCE, APC e FTD), têm a responsabilidade de gerir e subsidiar as Escolas, Centros Sociais, Universidades,
Redes de Comunicação, Hospitais, Editoras, comunidade dos Irmãos Maristas, Centro de Espiritualidade e Vivência Marista e demais
negócios suplementares.
14 A equipe do primeiro triênio estava assim constituída: Ir. João Carlos do Prado (Coordenador), Ir. João Batista Pereira (Vice-coordenador),
Adalgisa de Oliveira Gonçalves (Assessora), Clélia Peretti (Assessora), Fabiano Incerti (Assessor), Ney Guimarães (Assessor) e Soeli
Terezinha Pereira (Assessora).
Grupo Marista
19
[13]. O recém-criado Setor de Pastoral coordenou15, a partir de 2003, a construção
do primeiro plano orgânico de Pastoral, publicado três anos depois com o
título de Plano Provincial de Pastoral.16 À luz dos desafios da época, o documento objetivava a organização e a unificação da caminhada pastoral diante
dos novos cenários que se apresentavam, possibilitando uma nova visão pastoral, melhorando a organicidade e fortalecendo a identidade institucional
no cenário eclesial. O processo favoreceu, em todas as frentes apostólicas, a
identificação de pistas de ação, programas e projetos que ampliassem a ação
evangelizadora.
[14]. Destacavam-se no Plano Provincial de Pastoral seis programas: Programa Marista de Formação; Programa Marista de Humanização; Programa Marista
de Cultura da Solidariedade; Programa Marista de Espiritualidade; Programa de Animação Vocacional Marista; Programa de Pastoral Juvenil Marista.
Tais programas alavancaram um leque diversificado de projetos, fomentaram estruturas e contribuíram na otimização das ações pastorais. Os Núcleos Locais de Pastoral atenuaram seu caráter personalista para tornarem-se
mais orgânicos e alinhados às aspirações da Província.
[15]. Desde então, a prática pastoral na PMBCS vem se aperfeiçoando, juntamente
com as estruturas de suporte, sobretudo na qualificação dos Irmãos e colaboradores dedicados à evangelização. O tempo e o acúmulo de experiências
foram revelando acertos e pontos de revisão do processo. Outros contextos
de mundo e a própria reestruturação do modelo organizacional da PMBCS
trouxeram à pauta outros desafios, como o novo desenho de atuação do Setor
de Pastoral, que, a partir de 2008, passa a operar com outras responsabilidades no âmbito estratégico e de assessoramento ao Conselho Provincial. Para
acompanhamento dos projetos in loco foi criada a Assessoria de Pastoral nos Negócios. As frentes apostólicas, já com arcabouço de experiências consistentes,
sinalizavam a necessidade de pensar seu processo de evangelização a partir
15
Optando por uma metodologia participativa, o Setor promoveu relatórios, reuniões, discussões, reflexões, assembleias e planejamentos
participativos, contratações de pastoralistas, qualificação de pessoas e criação de estruturas para a evangelização.
16 PMBCS. Setor de Pastoral. Plano Provincial de Pastoral. 2006. Ressaltamos que até a publicação oficial, o Plano Provincial de Pastoral foi
implementado com base em versões encadernadas, abertas a contribuições e aperfeiçoamentos.
20
Diretrizes da Ação Evangelizadora
da expertise de cada negócio. A questão “Para onde devemos caminhar? Como
os negócios poderiam melhor contribuir com a missão institucional a partir de sua
vocação específica?” foi respondida através da profunda reflexão que culminou na primeira versão do documento denominado Direcionamentos Pastorais
para as Mantenedoras e Negócios da Província Marista Brasil Centro-Sul. 17
[16]. Ao passo que ainda se consolidam alguns processos de animação e governo,
podemos afirmar que a PMBCS tem conseguido implementar com êxito seu
novo modelo organizacional. Em seu Plano Estratégico18, a missão da Província consiste em “formar cidadãos humanos, éticos, justos e solidários para a
transformação da sociedade, por meio de processos educacionais fundamentados nos valores do Evangelho, do jeito marista”. 19 Para tanto, três objetivos
fundamentais foram delineados:
Oferecer excelência educacional na formação de crianças e jovens para a autonomia e cidadania, comprometidos com a promoção da vida e da sociedade.
Oportunizar a formação e o engajamento de Irmãos, Leigas e
Leigos para a vivência de sua vocação, do desenvolvimento profissional e o exercício da missão marista.
Perenizar a vitalidade da missão e a viabilidade econômica da
instituição. 20
[17]. Com o intuito de tornar o carisma marista uma realidade ainda mais compartilhada, foi definido, pelo Conselho Provincial, um núcleo de valores inspirado no espírito do fundador, homem forte, empreendedor, ousado e, ao
mesmo tempo, compassivo, terno e agregador. Esse núcleo de valores está
assim constituído: Simplicidade, Amor ao Trabalho, Justiça, Espiritualidade,
Espírito de Família e Presença Significativa. O conjunto de valores escolhido não esgota outros valores maristas, que são muitos. Ao lado das Pequenas
17
18
19
20
PMBCS. Setor de Pastoral. Direcionamentos Pastorais para as Mantenedoras e Negócios da Província Marista Brasil Centro-Sul, 2009.
PMBCS. Plano Estratégico da Província Marista Brasil Centro-Sul, 2010. (Documento Interno)
PMBCS. Plano Estratégico da Província Marista Brasil Centro Sul. p. 06.
PMBCS. Plano Estratégico da Província Marista Brasil Centro Sul. p. 06.
Grupo Marista
21
Virtudes21, eles apontam para o tempo presente um ethos que anima e orienta
todas as nossas relações de convívio e trabalho.
[18]. Em 2009, o XXI Capítulo Geral22, cujo tema foi “Corações novos para um
mundo novo”, apontou novas perspectivas para o Instituto, por meio do apelo fundamental, que assim refletia: “Sentimo-nos impulsionados por Deus
a sair para uma nova terra, que favoreça o nascimento de uma nova época
para o carisma marista. Isso supõe que estejamos dispostos a mover-nos, a
desprender-nos e a assumirmos um itinerário de conversão, tanto pessoal
quanto institucional, nos próximos anos”. 23 E o capítulo concluía convocando a todos: “Com Maria, ide depressa para novas terras”.
Princípios basilares
[19]. A Caridade, o Evangelho e a Fé constituem os princípios basilares que forjam
nosso ser-cristão e nos movem a agir e consagrar nossas vidas.
[20]. O que é, entretanto, a caridade? Nas Escrituras Sagradas ouvimos dizer que
“Deus é amor: quem permanece no amor, permanece em Deus e Deus permanece nele”. 24 Na mística cristã, esse amor assume a forma de cháris (gratuidade), donde deriva caritas (caridade). Caridade é o amor-gesto, amor-doação,
ação que cria vínculos, solidariza e transforma realidades de sofrimento. Ou
seja, amor e caridade são sinônimos. E Jesus Cristo nos apresenta, por sua
vida e missão, o amor como síntese de toda a Lei 25, apontando-o como juízo de valor universal e definitivo. Desta forma, no cristianismo, a caridade
apresenta-se não apenas como a plenitude da lei, mas como o sentido da vida
21
22
23
24
25
22
As “pequenas virtudes” encontram-se em Avis, Leçons, Sentençes et Instructions. Trata-se da publicação (1927) das anotações feitas pelo
Ir. Jean Baptiste Furet acerca dos ensinamentos proferidos pelo Padre Champagnat nos encontros de formação dos Irmãos.
O Capítulo Geral dos Irmãos Maristas é uma assembleia representativa de todo o Instituto, realizada a cada oito anos, geralmente na
Casa Geral, em Roma. Nesse evento elegem-se o Superior Geral e os oito membros do Conselho Superior, que se ocupam do governo, da
renovação das prioridades e da atualização de questões relacionadas à missão do Instituto no cenário global. Com centralidade em Jesus
Cristo e sob a mística de Maria, desenvolve-se o aspecto místico e missionário do Capítulo, onde todos são convidados a discernir e perceber
as moções do Espírito Santo em seus corações e estarem atentos aos novos desafios apostólicos que se apresentam.
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Conclusões do XXI Capítulo Geral, p. 19.
1 João 4,16.
Mateus 22, 36-40.
Diretrizes da Ação Evangelizadora
humana, constituindo-se em primazia, tanto para vida do cristão quanto para
a ação pastoral da Igreja. É neste contexto que somos desafiados a assimilar
o ensinamento de São Marcelino Champagnat, que dizia: “Para bem educar é
preciso, antes de tudo, amar”.
[21]. A caridade é o sinal visível da fidelidade do cristão e do dever da Igreja, pois,
como disse Jesus, “sempre que fizestes isto [a caridade] a um destes meus
pequeninos, a mim mesmo que o fizeste”. 26 A caridade não é um discurso
vazio. É uma disposição prática que requer empenho no aqui e agora, pois ela
é o amor em/na ação. E o amor encontra no caráter social a sua manifestação
mais clara e eficaz, na medida em que nos faz sair de si para ir ao encontro
do outro, sobretudo quando esse outro é aquele que se encontra empobrecido, violentado em sua dignidade ou fragilizado. Esse princípio deve nortear nossa missão evangelizadora, nossas propostas educativas, nosso agir
cotidiano.27
O amor – caritas – será sempre necessário, mesmo na sociedade mais justa. Não há qualquer ordenamento estatal justo que
possa tornar supérfluo o serviço do amor. Quem desfazer-se do
amor prepara-se para desfazer-se do ser humano enquanto ser
humano. [...] A afirmação de que as estruturas justas tornariam
supérfluas as obras de caridade esconde, de fato, uma concepção materialista do ser humano: o preconceito segundo o qual o
ser humano viveria “só de pão”. (Mt 4, 4; Cf. Dt 8,3). 28
[22]. Embora o amor apareça, muitas vezes, como um termo banalizado, é importante lembrar que “[...] o amor é uma força extraordinária, que impele as pessoas a comprometerem-se, com coragem e generosidade, no campo da justiça
26
27
Mateus 25, 40.
Quem são os sujeitos ou agentes da caridade? Todos os seres humanos. A caridade é um princípio/valor semeado por Deus no coração
humano – logo, devemos aceitar que não se trata de uma prerrogativa unicamente cristã –, portanto, podemos reconhecer seus frutos
em cada cultura e em cada religião que busca sinceramente a verdade. A caridade é a síntese de todas as dimensões do amor (eros,
philia e ágape), pois “todas essas formas de amor, no fim das contas, unificam-se, sendo o amor, apesar de toda a diversidade de suas
manifestações, em última instância, um só”. (BENTO XVI. Deus caritas est. n. 2); Enfim, o amor é o princípio humanizador universal.
28 BENTO XVI. Deus caritas est. 28b.
Grupo Marista
23
e da paz. É uma força que tem a sua origem em Deus, Amor eterno e Verdade
absoluta”. 29 É o “dom maior que Deus concedeu aos homens”. 30 Sendo assim,
o amor “é o princípio não só das micro relações estabelecidas entre amigos,
na família, no pequeno grupo, mas também das macro relações, como os relacionamentos sociais, econômicos, políticos”. 31 Neste contexto, todos nós
somos constituídos “sujeitos de caridade, chamados a nos fazermos instrumentos da graça, para difundir o amor de Deus e tecer redes de caridade”. 32
[23]. Os evangelhos expressam a entrega de amor da pessoa de Jesus, Filho de
Deus, o Cristo. Esses textos sagrados relatam a vida, a atuação pública, o que
Jesus disse, o que proclamou e mandou que se proclamasse ao mundo, a sua
morte na cruz e ressurreição. Etimologicamente, Evangelho significa “boa
notícia”, “boa nova”. Jesus utilizou a expressão para se referir aos sinais e
à natureza do Reino de Deus. De modo complementar, para os apóstolos, a
Boa Nova é a pregação do acontecimento salvífico, que é o próprio Jesus de
Nazaré. 33 O Evangelho constitui o cerne do que a tradição cristã chama de
Palavra de Deus.
[24]. Com apresentações e ângulos diferentes, todos os Evangelhos têm em seu
centro um mesmo objetivo: promover o encontro com Cristo. Pelo encontro
com Jesus Cristo, o ser humano se renova permanentemente e se constitui
num sujeito novo chamado a evangelizar. 34 Como afirma Bento XVI: “Não
se começa a ser cristão por uma decisão ética ou uma grande ideia, mas através do encontro com um acontecimento, com uma Pessoa, que dá um novo
horizonte à vida e, com isso, uma orientação decisiva”. 35 A adesão a Cristo é,
29
30
31
32
33
Bento XVI. Deus caritas est. n. 05.
Cf. 1 João 4, 8 -16.
Bento XVI. Deus caritas est. n. 05.
Bento XVI. Deus caritas est. n. 05.
“Cristo é a ‘Boa Nova de valor eterno’ (Ap 14,6), sendo ‘o mesmo ontem, hoje e pelos séculos’ (Hb 13,8), mas a sua riqueza e a sua beleza são
inesgotáveis. Ele é sempre jovem e fonte de constante novidade. [...] Com a sua novidade, Ele sempre pode renovar a nossa vida e a nossa
comunidade [...]. Na realidade, toda a ação evangelizadora autêntica é sempre ‘nova’.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii
Gaudium, n. 11)
34 “Chegamos a ser plenamente humanos quando somos mais que humanos, quando permitimos a Deus que nos conduza para além de
nós mesmos a fim de alcançarmos o nosso ser mais verdadeiro. Aqui está a fonte da ação evangelizadora.” (PAPA FRANCISCO. Exortação
Apostólica Evangelii Gaudium, n 08)
35 Deus Caritas est, n. 01. .
24
Diretrizes da Ação Evangelizadora
ao mesmo tempo, condição para o exercício pessoal do apostolado e critério
último de qualificação para a ação evangelizadora.
[25]. Acolhendo a Boa Nova de Jesus Cristo, nos imanamos no amor, no projeto
do Reino de Deus e na fração do pão. 36 Formamos em torno da Eucaristia a
Igreja, promotora de vida e do Reino de Deus para cada pessoa e para toda
a sociedade. Portanto, “tornar Jesus Cristo conhecido e amado” supõe viver,
testemunhar e proclamar a mensagem contida no Evangelho. Essa aproximação com Jesus Cristo, essa experiência apostólica encanta o coração, nos
faz discípulos e amplia nossa compreensão do amor.
[26]. São Marcelino Champagnat, mencionando o Salmo 127, repetia continuamente aos Irmãos seu versículo predileto: “Se o Senhor não edifica a casa, em
vão trabalham os que a constroem”. Portanto, pela fé somos constantemente desafiados a permanecer solidamente edificados em Deus, vivenciando os
ensinamentos de Cristo em comunidade. Nossa fé significa que cremos em
Jesus Cristo como Filho de Deus encarnado, cuja morte e ressurreição nos
abriram as portas do Reino de Deus. Ele é nossa Páscoa definitiva – mistério de comunhão e aliança – presente em cada Eucaristia celebrada. Pela fé
em Cristo (confiança filial), aderimos ao projeto de Deus. Nossa fé passa pela
razão (adesão intelectual), embora frequentemente a supere (dom sobrenatural), vinculando-se à esperança que nos incentiva a prosseguir, com projetos
novos e vindouros.
[27]. A fé é irmã da esperança. A esperança é a força que motiva as pessoas e comunidades a interpretarem a realidade em que vivem, apontando para um
futuro promissor, que se concretizará à medida que o construímos juntos.
Assim, a esperança se torna virtude universal: fortalece vínculos entre crentes e não crentes em prol de causas coletivas, para o bem de todos (horizonte
da ética) e o testemunho do Evangelho (horizonte da fé).
36 Fração do Pão: um dos nomes pelos quais se designa a Eucaristia. “É por esse gesto – a fração do pão – que os discípulos o reconhecerão
após a ressurreição e é com essa expressão que os primeiros cristãos designarão suas assembleias eucarísticas. Com isso querem dizer
que todos os que comem do único pão, Cristo, entram em comunhão com ele e já não formam senão um só corpo nele.” (Catecismo da Igreja
Católica, n. 1329)
Grupo Marista
25
Nossa missão compartilhada
[28]. Para o Ir. Séan Sammon, Superior Geral do Instituto Marista de 2001 a 2009,
a circunstância secular e plural em que se encontra a humanidade nos desafia a assumirmos novas e criativas estratégias evangelizadoras. Em suas
palavras: “[...] precisamos estar atentos aos movimentos contemporâneos
e, de modo especial, analisar os valores que neles se manifestam. Qualquer
omissão de nossa parte nesse sentido pode nos atrelar ao passado, no preciso
momento em que um mundo novo se anuncia”. 37 Nesse sentido, é necessário
pensar o carisma institucional como um aspecto dinâmico, que faz contrabalançar os elementos da tradição com os dilemas de um mundo em rápida
transformação.
[29]. O presente documento situa-se no desdobramento dessa importante reflexão. Logicamente ele estabelece um recorte: debruça-se sobre as questões
que dizem respeito ao processo de evangelização, desde sua organização até
a visão de futuro. Não há dúvidas de que vivemos agora, no Grupo Marista, o
tempo oportuno de fazermos um balanço de nossa caminhada pastoral e da
vitalidade de nossa missão, visto que “a alegria evangelizadora refulge sempre sobre o horizonte da memória agradecida”. 38
[30]. Devemos fazer um esforço sincero de abertura de coração e flexibilidade de
pensamento se quisermos realmente dar novos passos na Igreja e no Instituto Marista. Sammon concluía dizendo que “[...] nossos corações devem estar abertos à mudança, mas, ao mesmo tempo, precisam absorver a melhor
herança do passado. Uma renovação genuína jamais o descarta, ainda que
procure libertá-lo das armadilhas da história”. 39 Neste contexto, espera-se
que essas Diretrizes sejam produto de escolhas e decisões influenciadas pelas
experiências significativas do passado e pela interpretação do momento que
vivemos hoje.
[31]. E já não são poucos os agentes da mudança: hoje, Irmãos, Leigas e Leigos são
aqueles que compõem a grande mesa dos vocacionados maristas 40, apóstolos
de Cristo que atuam em muitas frentes de trabalho, com diferentes responsabilidades, mas com um só coração e uma só missão. É por esse motivo que
o presente documento assume a todos como sujeitos da evangelização, que se
colocam em disposição de diálogo com muitos interlocutores. Os sujeitos e
interlocutores da evangelização são as crianças, os adolescentes, os jovens de
nossas unidades de ensino, os educadores, os administradores, os Irmãos, os
Leigos e Leigas, os colaboradores contratados, os expectadores das redes de
comunicação, os pacientes hospitalares, os parceiros e demais agentes do humanismo cristão. Nesse sentido, o Papa Francisco, em sua Exortação Apostólica, ao apresentar sua preocupação pela obra evangelizadora da Igreja, de
modo específico sobre os responsáveis pelo anúncio do Evangelho, assim nos
adverte: “A evangelização é dever da Igreja. Este sujeito de evangelização, porém, é mais do que uma instituição orgânica e hierárquica; é, antes de tudo,
um povo que peregrina para Deus”. 41
[32]. Em nossa Instituição, evangelizar é, portanto, missão de todos. Acolhemos
a todos, segundo suas vocações específicas, com seus modos de vida, com as
peculiaridades culturais e contextuais oriundas das múltiplas experiências
de vida. A corresponsabilidade e a complementaridade são riquezas que nos
possibilitam novos relacionamentos e novas metodologias. Enquanto Grupo
Marista, em comunhão com a União Marista do Brasil (UMBRASIL) e demais Províncias e Distrito, afirmamos nossa identidade cristã, católica e marista. Como Igreja, reconhecemos nossa responsabilidade junto ao processo
de evangelização e a reafirmamos como a razão maior e finalidade última de
todas as nossas iniciativas. Sob o legado do carisma marista, vivenciamos o
apostolado de modo mais intenso entre as crianças e jovens, sobretudo as
40
37
38
39
26
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Corações novos para um mundo novo, p. 20.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 13.
INSTITUTOS DOS IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Corações novos para um mundo novo. Pág. 12.
Diretrizes da Ação Evangelizadora
O sentimento de pertença ao Instituto e de compartilharmos uma missão tem se fortalecido após o XIX Capítulo Geral e da Assembleia
Internacional da Missão Marista, em Mendes, 2007. Em 2009, a Comissão Internacional do Laicato Marista amplia, juntamente com o
Conselho Geral, todas essas reflexões no documento Em Torno da Mesma Mesa: A vocação dos leigos maristas de Champagnat. Mais
elementos sobre o laicato no Grupo Marista podem ser aprofundados no documento PMBCS. Setor de Vida Consagrada e laicato. Vida
Marista: Irmãos, Leigas e Leigos: diretrizes do Setor de Vida Consagrada e Laicato, 2010.
41 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 111.
Grupo Marista
27
mais pobres. Disseminamos o Evangelho, a Palavra de Deus, em todos os
nossos espaços de atuação. 42
Orientações para a leitura e o estudo
[33]. Até o momento, nesse preâmbulo ao leitor (Parte 1), desenvolvemos um retrospecto histórico com a finalidade de contextualizar a fundação do Instituto Marista, sua presença no mundo e no Brasil e a ação evangelizadora no
Grupo Marista, sobretudo nessa última década. De modo conciso, seguimos
recapitulando os princípios basilares que constituem a razão de nossa caminhada cristã - a Caridade, o Evangelho e a Fé -, que são pressupostos pastorais
para a compreensão da proposta evangelizadora em sua integralidade; enfatizamos que somos herdeiros do legado espiritual de Marcelino Champagnat,
herança carismática capaz de congregar em torno de uma missão comum os
Irmãos Maristas, os Leigos e Leigas e demais pessoas de boa vontade. No desencadeamento, veremos esse documento estruturado em mais três partes.
[34]. Na Parte 2 serão apresentados três conceitos fundamentais para o entendimento da ação evangelizadora no Grupo Marista: a) O que é Evangelização e
quais são os conceitos teológicos subjacentes a este âmbito; b) O que é Pastoral
e o conjunto de processos que caracterizam a organização pastoral no Grupo
Marista (apostolado, planejamento, organicidade, flexibilidade metodológica, atenção aos sinais dos tempos e recursos); c) O Carisma enquanto aspecto
místico para a formação da identidade em meio às diferentes maneiras de ser
Igreja.
solidariedade socioambiental, a catequese, as infâncias e juventudes e os valores maristas.
[36]. Por fim, o documento apresenta os Objetivos da Animação Pastoral do Conselho Geral, Direcionamentos Pastorais Transversais e Direcionamentos
Pastorais para as Frentes Apostólicas (Parte 4). Os Direcionamentos ganham
contornos a partir do discernimento da vocação própria de cada frente apostólica, permitindo que as mesmas potencializem sua missão específica e, ao
mesmo tempo, compreendam-se cada vez mais integradas e corresponsáveis
pela missão institucional. É a maneira pela qual se preservam as identidades
e a cultura das frentes apostólicas, engendram-se novas estratégias pastorais
e as maneiras peculiares de contribuir na evangelização e missão marista.
[37]. Ao estudar as páginas que seguem, esperamos que todos se sintam coautores
e protagonistas na missão de evangelizar. Esta é a principal intenção. Sabemos que uma Instituição em Pastoral nasce do esforço coletivo-comunitário e
é sempre consequência de uma adesão pessoal e intransferível. Com Maria,
nosso modelo de seguimento de Jesus Cristo, e com Marcelino Champagnat,
nosso fundador e inspirador, sigamos depressa para fazer do Evangelho uma
realidade mais presente no mundo, na certeza de que “quando a Igreja faz
apelo ao compromisso evangelizador, não faz mais do que indicar aos cristãos o verdadeiro dinamismo da realização pessoal”. 43
[35]. Após a apresentação dos conceitos fundamentais, o documento aprofunda
alguns Elementos Inculturadores do Evangelho (Parte 3). Os Elementos Inculturadores são aspectos positivos da cultura geral e institucional, que abrem
portas para o diálogo entre o ethos e os valores do Evangelho. São eles: a dignidade humana, a educação emancipadora, a espiritualidade, a alteridade, a
42
28
“Não pode haver verdadeira evangelização sem o anúncio explícito de Jesus como Senhor e sem existir uma primazia do anúncio de Jesus
Cristo em qualquer trabalho de evangelização.” (João Paulo II. Exortação Apostólica Ecclesia in Asia, n. 19).
Diretrizes da Ação Evangelizadora
43
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 10.
Grupo Marista
29
2
CONCEITOS
FUNDAMENTAIS
2.CONCEITOS FUNDAMENTAIS
Quem escuta minhas palavras e as põe
em prática parece-se com uma pessoa
prudente que construiu a casa sobre a
rocha. (Mateus 7, 24).
2.1 Evangelização
[38]. Por Evangelização entendemos a missão global da Igreja que, fiel ao projeto
de Cristo, empenha-se incansavelmente na promoção do Reino de Deus44, tornando-se presente entre as pessoas e as culturas45 de maneira significativa, a
fim de promovê-las em dignidade, à luz da fé. 46 Ao referirmo-nos a esse núcleo estruturante de nossas ações – a Evangelização –, devemos ter claro “[...]
que a evangelização é o centro e a prioridade de nossas atividades apostólicas
anunciando a Jesus Cristo e a sua mensagem.” 47 Assim, a evangelização serve
ao desenvolvimento humano integral, com ações plurais e complementares,
na diversidade das comunidades cristãs. 48 A força evangelizadora da Igreja
se edifica na comunhão dos fiéis que, juntos, aderem ao projeto de amor de
Deus-Pai, vivem os valores da “vida nova” que Jesus nos legou com sua morte
44
45
46
47
48
32
A expressão Reino de Deus representa a realeza eterna de Deus e sua ação salvífica na história, por meio de Cristo. Por isso, o Reino designa
tanto a dimensão presente como as realidades futuras. O documento Lumen Gentium, do Concílio Vaticano II, apresenta a relação entre
Igreja e Reino de Deus em duplo movimento. De um lado, ela é o Reino de Deus presente já em mistério; de outro, deve servir ao Reino de
Deus pela proclamação da Palavra, pelo testemunho de comunhão e pela prática da caridade.
Paulo VI, em Evangelii Nuntiandi, n. 19: “Para a Igreja não se trata de pregar o evangelho em faixas geográficas sempre mais vastas ou
a populações sempre maiores, mas também de atingir e como que revolucionar, pela força do Evangelho, os critérios de julgamento, os
valores determinantes, os pontos de interesse, as linhas de pensamento, as fontes inspiradoras e os modelos de vida da humanidade, que
contrastam com a Palavra de Deus e com o projeto da salvação”. Sobre essa temática – a Igreja e as culturas –, consultar ainda Gaudium et
Spes, nn. 57 a 62; No âmbito do Instituto Marista, consultar também Constituições e Estatutos do Instituto dos Irmãos Maristas, n. 91.
Paulo VI, em Evangelii Nuntiandi, n. 17: “Nenhuma definição parcial e fragmentária pode dar conta da realidade rica, complexa e dinâmica,
como é a da evangelização, sem correr o risco de empobrecê-la e até mutilá-la. É impossível entendê-la se não se busca abranger com o
olhar todos os elementos essenciais”. O documento 71 da CNBB, Diretrizes Gerais da ação Evangelizadora no Brasil 2003–2006, evidencia
ainda que a evangelização é um processo no qual a culminância é sempre o anúncio e conhecimento explícito de Cristo, sendo antes, no
entanto, precedido ou acompanhado pelas exigências da presença, do testemunho, do serviço, do diálogo.
UMBRASIL. Diretrizes da Ação Evangelizadora para o Brasil Marista. Brasília: 2013, p. 18.
“A partir do coração do Evangelho, reconhecemos a conexão íntima que existe entre evangelização e promoção humana, que se deve
necessariamente exprimir e desenvolver em toda ação evangelizadora.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 178).
Diretrizes da Ação Evangelizadora
e ressurreição e se deixam guiar e renovar pelo Espírito Santo – força dinamizadora da missão.
[39]. O Reino de Deus constitui o núcleo central da pregação de Jesus. 49 Portanto,
é objeto e objetivo de toda a ação da Igreja e isso nos leva à seguinte conclusão: imperativo: “Evangelizar é tornar o Reino de Deus presente no mundo”.
50
É possível perceber o Reino de Deus acontecendo no mundo por meio de
“sinais do Reino”. Os principais sinais são: as atitudes de amor, de perdão,
de misericórdia, de justiça, de paz, de solidariedade, de unidade, de respeito,
de fraternidade. Por outro lado, sinais de violência, de egoísmo, de destruição, entre outras, equivalem à sua negação. É tarefa fundamental da Igreja
mostrar às pessoas que o Reino de Deus constitui uma dimensão real da existência humana e que é possível vislumbrar em todas as culturas as sementes
desse Reino.
[40]. Para o Instituto Marista, a promoção do Reino de Deus se dá pela forma de
exercer sua missão na educação, no cuidado, na promoção e defesa das crianças e jovens, preferencialmente os empobrecidos, sempre fiéis ao carisma de
Marcelino Champagnat e criativamente sensíveis aos sinais dos tempos, à luz
do Evangelho.
[41]. O processo evangelizador se torna real em nosso meio pelo testemunho autêntico da fé, da esperança e da caridade51; pelo serviço a todas as pessoas
e aos povos52; pela promoção da solidariedade, da justiça, da paz e do bem
comum53; pelo diálogo e promoção da unidade entre as culturas, as religiões e os saberes54; pela oração, ação litúrgica e sacramental; pelo anúncio ou
49
50
51
52
Ver Marcos 1,15 e Lucas 4,16-19.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium. n. 176.
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Constituições e Estatutos, n. 86, 1º parágrafo.
De acordo com o Documento de Aparecida, o serviço aos povos, no contexto da evangelização, “[...] envolve assumir plenamente a
radicalidade do amor cristão, que se concretiza no seguimento de Cristo na cruz [...] o amor de plena doação, como solução ao conflito, deve
ser o eixo cultural ‘radical’ de uma nova sociedade”. (CELAM. Documento de Aparecida, n. 543)
53 Em Redemptor Hominis, n. 15, João Paulo II apresenta a justiça “[...] como elemento essencial da missão da Igreja, indissoluvelmente unido
a ela”; a mesma dimensão da justiça é prevista nas Constituições e Estatutos do Instituto dos Irmãos Maristas, n. 86, 3º parágrafo.
54 As fundamentações para esse diálogo podemos encontrar em Redemptoris Missio, n. 52, Evangelii Nuntiandi, n. 20 e Christifideles Laici, n.
44. (INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Missão Educativa Marista, nn. 83 e 84)
Grupo Marista
33
proclamação do Evangelho, da vida e missão de Cristo; e pela catequese e demais formas de aprofundamento da fé. 55
renova!”. 61 Alicerçados no próprio Cristo, Rocha firme, buscamos inculturar
o Evangelho em nosso meio62, qualificando nossa presença entre as pessoas.
[42]. Todos nós, que aderimos à missão, estamos sob o mandato de Jesus Cristo:
“Ide por todo o mundo e anunciai o evangelho a todo criatura”. 56 Portanto,
torná-lo conhecido e amado, sobretudo entre as crianças e jovens, fazendo
com que sua proposta de vida seja assumida é nosso objetivo permanente,
pois “conhecer a Jesus é o melhor presente que qualquer pessoa pode receber;
tê-lo encontrado foi o melhor que ocorreu em nossas vidas, e fazê-lo conhecido com nossa palavra e obras é nossa alegria” . 57 Todos nós, embora com
funções e graus de envolvimento diferenciados, somos responsáveis pelo
processo evangelizador. 58
[44]. O encontro pessoal com Cristo se dá de formas diversificadas e por caminhos
nem sempre previsíveis, e a própria Igreja “deve aceitar esta liberdade incontrolável da Palavra, que é eficaz a seu modo e sob formas tão variadas
que muitas vezes nos escapam, superando as nossas previsões e quebrando
os nossos esquemas”. 63 Campos privilegiados para esse encontro, dentre outros, são a escuta atenta e a celebração da Palavra; a vivência sacramental, sobretudo eucarística e da reconciliação; a vida de oração; a vivência pastoral e
comunitária; a leitura orante da Bíblia, a presença significativa entre os mais
necessitados; a comunhão com as infâncias e juventudes; o trabalho digno
e sustentável; a construção do conhecimento enquanto busca da verdade e
sabedoria; e a vivência da espiritualidade marial. Esse encontro com Cristo se dá no cotidiano de nossa existência, junto às pessoas e acontecimentos
comuns. O que torna esse encontro possível é sempre o sentido, o porquê e a
finalidade que damos para todas as nossas ações, bem como a dignidade que
adotamos ao vivenciá-las.
[43]. Somos desafiados a tornar atual essa missão evangelizadora 59 de forma a buscar as respostas próprias aos desafios que marcam nossas realidades. Neste
empreendimento, estamos cientes de que, acima de nossos esforços intelectuais e operacionais, o protagonista maior do processo que nos propomos a
perpetuar no tempo e no espaço é o Espírito Santo. Como frisou o Ir. Emili
Turu – Superior Geral -, “a evangelização é obra do Espírito Santo e, sem sua
ação, tudo se resume apenas a palavras e fogos de artifício”. 60 Desta forma,
nossa atitude é de abertura e discernimento; queremos ser terra fértil para
a Sua ação sempre renovadora e ousada, geradora de vitalidade, força, ternura e paz: “Envias o teu Espírito, as criaturas florescem e a terra inteira se
55
56
57
58
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Constituições e Estatutos, n. 86, 2º parágrafo.
Marcos 16, 15.
CELAM. Documento de Aparecida, n. 29.
“Cada cristão é missionário na medida em que se encontrou com o amor de Deus em Cristo Jesus.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica
Evangelii Gaudium, n. 120).
59 O fundamento da evangelização é o próprio Deus Trindade, pois é Ele o seu autor primeiro. Por desígnio do Pai, existimos em Deus e somos
convidados a participar ativamente de seu projeto: vida digna dos seres humanos em comunhão consigo mesmos, com a natureza e com o
próprio Deus. Por Jesus Cristo o propósito divino se torna real em nosso meio. É por meio dele, nele e com Ele que nos tornamos partícipes
da divindade. Por sua vida e missão, o rosto misericordioso do Pai se torna acessível a nós. E é pela ação permanente do Espírito Santo que
a obra iniciada por Cristo se perpetua no tempo, como Igreja, entre os diversos povos, contextos e culturas. A evangelização, portanto, é
um processo que encontra a sua essência na dinâmica do próprio Deus Trindade, que é comunhão, diversidade, partilha, doação e amor. Em
comunhão com Ele, os batizados participam do desígnio divino. Pertencendo, portanto, ao Corpo Místico de Cristo, são sujeitos do processo
evangelizador. Como Igreja, são dotados por Deus pela diversidade de dons e carismas; e se organizam em ministérios, em vista do serviço
ao próximo.
60 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Evangelizadores entre os jovens, p. 10.
34
Diretrizes da Ação Evangelizadora
[45]. Nessa caminhada, temos em nosso meio a constante presença de Maria, Nossa Boa Mãe. Nos seus passos, descobrimos a cada dia o nosso jeito de ser e a
percebemos como “modelo eclesial para a evangelização”. 64 Com Champagnat, consideramo-la a nossa Primeira Superiora. Na presença de Maria estamos mais firmemente unidos ao seu Filho, nosso Senhor. Dela aprendemos,
no cotidiano, a “caminhar depressa”, sempre em busca de “novas terras”,
junto aos jovens e às crianças, bem como das pessoas atendidas por nossas
obras. Dela ouvimos o convite decisivo a respeito de seu Filho: “Fazei tudo o
que Ele vos disser”. 65
61
62
Salmo 104,30.
Enquanto comunidade de fé, a Igreja encontra na Palavra de Deus, contida na Sagrada Escritura e na Sagrada Tradição, a fonte primeira na
qual se edifica para o fortalecimento da fé e da esperança. A partir dessa fonte inesgotável, a Igreja aprofunda a sua caridade, celebrando
e rezando o Mistério Pascal de Cristo, sobretudo por meio da Liturgia, fonte e ápice da vida cristã; e tornando vida as promessas das bemaventuranças.
63 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 22.
64 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 288.
65 João 2,5.
Grupo Marista
35
2.2 Pastoral
[46]. Por Pastoral compreendemos o agir organizado da Igreja no mundo. 66 Caracteriza-se pelo cuidado na condução 67 do processo de evangelização68, para
que este se desenvolva de forma sistematizada69, orgânica, progressiva e permanente, apropriando-se de metodologias diversificadas, com a finalidade
de tornar a mensagem cristã significativa e eficaz em cada realidade e junto a
interlocutores variados. 70
[47]. Na Igreja em geral, o agir pastoral é realizado em diversas instâncias. É incumbência primeira do Colégio Episcopal 71 sob a orientação do Papa. Embora
atuem em meio a diferentes culturas e etnias, os bispos formam um núcleo de
comunhão em torno da autoridade do Papa. “Unidade na diversidade”, como
um corpo saudável, “formado de diferentes membros”. 72 Assim, os bispos
têm a responsabilidade primeira de organizar a ação evangelizadora nas dioceses espalhadas pelo mundo para atender necessidades específicas, como as
de ordem eclesial, espiritual, vocacional, educativa, de ação social, entre outras; ou para atender demandas de determinados grupos de interlocutores,
66
67
68
69
70
71
72
36
LIBÂNIO, João Batista. O que é Pastoral, 1986. Este mesmo conceito é trabalhado na obra de JULIATTO, Ir. Ivo Clemente. Um jeito próprio de
evangelizar: A Pastoral na PUCPR, 2008.
Segundo o Cardeal Dom Eusébio Oscar Scheid – na sua coluna periódica à revista eletrônica Amai-vos –, na cultura bíblica o pastoreio,
embora fosse uma profissão vital, era pouco apreciada pelas elites em virtude da rudeza do trabalho, no qual os pastores eram obrigados
a se sujar, impregnando-se com o cheiro do rebanho. Foi exatamente este o modelo vital com que Cristo quis se identificar: “Eu sou o Bom
Pastor” (Jo 10,11). Colocou-se como aquele que zela pelas ovelhas de seu rebanho, dando a vida, se necessário for, para que elas vivam. A
partir dessa referência, a atividade do pastoreio remete sempre ao cuidado, ao carinho, à presença e, ao mesmo tempo, à perspicácia, à
organização e à coragem. (Disponível em www.amaivos.uol.com.br).
Segundo Antonio Alves de Melo, “a ação pastoral desenvolve-se, pois, em três campos: edificação da comunidade, compaixão da esperança,
luta pelos valores do Reino. Desenvolvendo-se em tamanha amplitude, a Pastoral faz com que as dimensões da vida eclesial penetrem nas
diferentes situações humanas. Também fazem parte da pastoral os projetos operacionalizáveis – planos, diretrizes e opções – que, em cada
época e lugar, promovem o encontro entre a intenção de Jesus e a ação da Igreja. Tais projetos nascem do empenho dos fiéis – pastores e
leigos – na obra comum da evangelização”. (Ver MELO, Antônio Alves de, A evangelização no Brasil, 1996)
“O desenvolvimento da concepção de Pastoral se deu em concomitância com a discussão em torno da necessidade de um planejamento
pastoral [...]. Posto em prática, o planejamento pastoral foi sendo relativizado, até que se alcançou a necessária compreensão de seus
valores, riscos e limitações. Hoje o planejamento pastoral ocupa o lugar que lhe é devido.” (MELO, Antônio Alves de. A evangelização no
Brasil, 1996)
Em sua passagem pelo Brasil, Papa Francisco apresentou de forma estupenda o conceito de Pastoral: “Pastoral nada mais é do que o
exercício da maternidade da Igreja”. (Discurso no Encontro com o Episcopado Brasileiro, 27/07/2013)
Há outras expressões análogas, como "Ordem Episcopal" ou "Corpo de Bispos". Significa a unidade estável (institucional, constitucional e
hierárquica) dos bispos com o papa. Isto é, um grupo de sucessores dos apóstolos, cuja liderança é exercida pelo Pontífice Romano, que na
tradição católica é considerado o legítimo sucessor de Pedro.
CELAM. Documento de Aparecida, n. 277.
Diretrizes da Ação Evangelizadora
como das famílias, dos educadores, dos jovens, dos idosos, das crianças, dos
enfermos, entre outros.
[48]. Em comunhão com o Magistério Eclesial, diversos carismas que compõem
a vida da Igreja são reconhecidos e incentivados. Como instâncias legitimamente autorizadas pela Santa Sé, os Institutos Religiosos também se organizam para atender demandas específicas. Reúnem em si especialistas em
determinadas áreas para que sejam o mais possível assertivos na realização
da missão. Nosso Instituto está inserido nesse contexto.
[49]. A partir das deliberações e conclusões dos Capítulos Gerais realizados no
Instituto Marista, a nossa ação evangelizadora é organizada pastoralmente
com o intuito de atender as crianças e jovens por meio da educação cristã.
Irmãos, Leigas e Leigos (sejam esses colaboradores, familiares, jovens, adolescentes ou crianças), todos formamos comunidades maristas com caráter
educativo-evangelizador.
[50]. No Grupo Marista, a ação evangelizadora envolve todos e cada um possui sua
responsabilidade na proposta pastoral, que busca atualizar-se permanentemente. Com uma missão compartilhada, Irmãos, Leigas e Leigos assumimos
a proposta pastoral deliberada pelo Conselho Provincial e a tornamos viva
em todas as dimensões de nossas ações. Perpassando todas as nossas instâncias, a vitalidade pastoral se dá, basicamente, por duas formas: a) de forma explícita, em iniciativas de anúncio, aprofundamento e/ou vivência da fé; b) em
processos inculturados de forma transversal nas dimensões educativas, sociais,
de comunicação, saúde e gestão que compõem o nosso dia a dia.
[51]. Para que a ação pastoral seja desenvolvida de forma sistematizada e orgânica,
ela deve compreender alguns requisitos: ter caráter permanente de apostolado; ser planejada de acordo com as realidades nas quais está inserida; comportar organicidade das ações, gerando sinergia e comunhão entre os organismos existentes e parceiros; gerar flexibilidade metodológica para que a
criatividade e inovação ganhem espaços e permitam o respeito à diversidade;
Grupo Marista
37
e buscar ser resposta aos sinais dos tempos. Desta forma, é oportuno compreender o conceito de Pastoral integrando as dimensões que seguem.
pelo testemunho vivo da virtude e da fidelidade. Nesse aspecto, o Documento
de Aparecida reconhece que “nossas comunidades levam o selo dos apóstolos
e, além disso, reconhecem o testemunho cristão de tantos homens e mulheres
que espalharam em nossa geografia as sementes do Evangelho”. 78 Ainda enfatiza que o exemplo de vida e santidade dessas pessoas constitui um presente estímulo para que outros cristãos possam “imitar suas virtudes nas novas
expressões culturais da história”. 79
2.2.1 Apostolado
[52]. O apostolado cristão é compreendido como a participação dos fiéis na missão
de Jesus – à semelhança dos apóstolos que Ele enviou –, em vista da afirmação da vida, da dignidade humana, da justiça e da paz, num mundo em
permanente transformação. 73 Aquele que vive o apostolado é alguém que se
descobre apaixonado por Jesus Cristo, a quem reconhece como Mestre e Irmão
que o acompanha.74 Na medida em que vai discernindo o projeto do Reino, o
discípulo “experimenta a necessidade de compartilhar com os outros a alegria de ser enviado, de ir ao mundo para anunciar Jesus Cristo” 75, de “sair
da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que
precisam da luz do Evangelho” 76 e tornar realidade o amor e o serviço. Naturalmente, uma das expectativas do apostolado é contagiar novos corações,
suscitar novos discípulos- missionários para o serviço ao mundo.
Jesus, enviado do Pai, é a fonte e o modelo de nosso apostolado. Pela encarnação ele se une, de certo modo, a cada homem.
Consagrado e enviado pelo Espírito Santo, anuncia a Boa Nova
do Reino. Faz-se servidor de seus irmãos até o dom total da vida.
Morre para congregar na unidade a família de Deus. Ressuscitado, consagra toda a criação e a conduz à plenitude. 77
[53]. Muitos apóstolos e discípulos de Jesus são conhecidos por marcarem o estilo e espiritualidade de nossa Igreja. Maria, João, Pedro, Paulo, Francisco de
Assis, Clara de Assis, Inácio de Loyola, Vicente de Paulo, João Batista de La
Salle, Cura d’Ars e tantos outros ainda nos fascinam, atraem e nos ensinam
73
74
75
76
77
38
“Toda a Igreja é apostólica na medida em que [...] permanece em comunhão de fé e de vida com sua origem. Toda a Igreja é apostólica na
medida em que é ‘enviada’ ao mundo inteiro; todos os membros da Igreja, ainda que de formas diversas, participam desse envio. A vocação
cristã é também por natureza vocação ao apostolado.” (Catecismo da Igreja Católica, n. 863)
Cf. CELAM. Documento de Aparecida, n. 277.
CELAM. Documento de Aparecida. n. 278e.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 20.
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Constituições e estatuto. n. 78. Apud CONCÍLIO VATICANO II. Gaudium et Spes, n. 22.
Diretrizes da Ação Evangelizadora
[54]. O Irmão Seán Sammon aprofunda a discussão afirmando que o apostolado é
um serviço que apresenta três aspectos característicos: a) O compromisso fundamental de tornar Jesus Cristo conhecido e amado. Pois não é suficiente que
nossas frentes apostólicas apenas sejam reconhecidas por serem centros de
excelência, mas também por serem lugares onde o Evangelho é proclamado
e testemunhado. Todavia, é possível que crianças e jovens de outras crenças
estejam sob nossa responsabilidade. Nesse caso, em situações de pluralismo religioso, testemunhamos nosso compromisso de fé encorajando-as a
praticarem também a sua própria fé, de acordo com sua herança religiosa. 80
b) Todos os nossos esforços apostólicos devem ter em vista algum benefício às crianças e jovens. Diversos institutos foram criados para trabalhar com diferentes
grupos humanos. O nosso foi fundado para atender crianças e jovens. O que
não significa excluir, em situações especiais, outros trabalhos, assim como
fez o próprio fundador81, desde que esses esforços não desviem nosso foco.
c) Somos chamados para trabalhar com os empobrecidos e excluídos. 82
78
79
80
CELAM. Documento de Aparecida. n. 275.
CELAM. Documento de Aparecida. n. 275.
Ao referir-se ao diálogo religioso, assim assinala o Papa Francisco: “São tantas e tão valiosas as coisas que nos unem! E, se realmente
acreditamos na ação livre e generosa do Espírito, quantas coisas podemos aprender uns dos outros! Não se trata apenas de receber
informações sobre os outros para os conhecermos melhor, mas de recolher o que o Espírito semeou neles como um dom também para nós.”
(Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 246)
81 MARCELINO CHAMPAGNAT. Instituto dos Irmãos maristas (Org.). Cartas, n. 27.
82 Em tempos de “reforma da Igreja”, imbuídos pelo espírito do Papa Francisco, não podemos esquecer que “no coração de Deus ocupam lugar
preferencial os pobres, tanto que até Ele mesmo ‘Se fez pobre’ (2Cor 8,9). Todo o nosso caminho de salvação está assinalado pelos pobres”.
(Evangelii Gaudium, n. 197). E mais: “Para a Igreja, a opção pelos pobres é mais uma categoria teológica que cultural, sociológica, política
ou filosófica [...]. Por isso, desejo uma Igreja pobre para os pobres. Eles têm muito a nos ensinar [...]. É necessário que todos nos deixemos
evangelizar por eles. A Nova Evangelização é um convite a reconhecer a força salvífica das suas vidas e a colocá-las no centro do caminho da
Igreja”. (Evangelii Gaudium, n. 198)
Grupo Marista
39
[55]. No cumprimento dessa missão apostólica, Maria ocupa uma posição privilegiada na vida dos maristas de Champagnat, posição plenamente confirmada
pelo XXI Capítulo Geral. Maria é modelo também de apostolado, é caminho
que nos conduz a Jesus Cristo, na medida em que suas virtudes inspiram nosso modo de ser 83 e agir e nos desafiam a caminhar rumo a novas formas de
serviço. Com Maria nos sentimos amparados e encorajados.
[58]. O planejamento pastoral é um recurso importante na otimização dos esforços para a construção do Reino de Deus. Essa foi a grande tônica do primeiro
Plano Provincial de Pastoral. Planejar pressupõe desenhar trajetórias, assumir responsabilidades, compartilhar sonhos, racionalizar recursos, comprometer-se vocacionalmente com decisões e ações que impactam a vida pessoal
e comunitária.
[56]. O apostolado marista é caracterizado, ainda, por uma relação de parceria e
complementaridade entre Irmãos, Leigas e Leigos, respeitando-se os estados
de vida e expressões da vida cristã, onde se inclui a vida consagrada e o laicato. No caso dos Leigos e Leigas, são eles “cristãos e cristãs que atenderam
ao chamado de Deus para viver o carisma de Champagnat e a ele respondem
a partir de seu estado de vida laical”. 84 A natureza e especificidade que caracteriza cada um desses apostolados encontram-se muito bem contextualizada nos documentos Em torno da mesma mesa e Vida Marista: Irmãos Leigas
e Leigos.85
[59]. Para responder às necessidades e atender as novas demandas do processo de
sistematização e de organização da ação evangelizadora no Grupo Marista,
buscou-se, desde o início, privilegiar um processo de planejamento participativo, compreendido como processo político, no qual sujeitos interagem em
função das necessidades, interesses e objetivos comuns. Quando acolhemos
os sujeitos comprometidos com a Instituição e os convidamos a participar,
oportunizamos relações dialogais ao mesmo tempo em que sinalizamos a
pessoa como valor essencial e imprescindível do processo.
2.2.2 Planejamento
[57]. Planejar é necessidade vital para a eficácia de qualquer atividade. No caso
da evangelização, esta também “exige”, de certa forma, uma ação planejada.
A ação pastoral, enquanto cuidado, acompanhamento, organização e sistematização do processo evangelizador, tem, entre outras atribuições, a função
de planejar iniciativas evangelizadoras, considerando realidades e interlocutores diversificados. Neste contexto, há que se compreender o planejamento
como algo aberto, que agregue e gere espaço para o desenvolvimento de iniciativas diversas. O grande autor da evangelização em nosso meio é o Espírito
Santo 86 e, nesse sentido, planejar deve ser compreendido como uma iniciativa que visa acolher o sopro do Espírito, de forma dinâmica.
[60]. Um bom planejamento pastoral requer o conhecimento da realidade, da missão da Instituição e a clareza de onde se quer chegar. 87 Três questões essenciais orientam o planejamento: primeiro, a utopia: O que se quer alcançar?
Segundo, o diagnóstico: A que distância se está daquilo que se quer alcançar?
Terceiro, a ação programada: O que fazer concretamente para diminuir essa
distância? Portanto, planejar é optar por uma direção; ter clareza do cenário; organizar a ação; implantar um processo intencional de intervenção na
realidade; realizar um conjunto de ações e propostas para aproximar uma
realidade de um ideal; pôr em ação um conjunto de técnicas e recursos para
atingir objetivos. 88
[61]. Aqui, entretanto, devemos estar atentos às orientações do Papa Francisco no
tocante às nossas estratégias pastorais: a realidade é mais importante do que as
87
83
84
85
86
40
Para aprofundar, ver INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Constituições e Estatutos, n. 4; n. 48; n. 84.
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Em torno da mesma mesa. A vocação dos Leigos Maristas de Champagnat, n. 12.
PMBCS. Setor de Vida Consagrada e Laicato. Vida Marista: Irmãos, Leigas e leigos, 2010.
“Em qualquer forma de evangelização, o primado é sempre de Deus [...]. Em toda a vida da Igreja, deve-se sempre manifestar que a iniciativa
pertence a Deus.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 12)
Diretrizes da Ação Evangelizadora
Esse esquema é justamente aquele empregado por Francisco em sua Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, com a qual propõe “diretrizes
que possam encorajar e orientar, em toda a Igreja, uma nova etapa evangelizadora, cheia de ardor e dinamismo” (Evangelii Gaudium, n. 17).
Na Exortação, o Papa realiza uma análise da realidade, abordando a crise do compromisso comunitário (Capítulo II); após, aborda a natureza
mesma da Igreja: missionária-evangelizadora (Capítulo III); por fim, no último capítulo (Capítulo V) apresenta a razão de tudo isso: somos
evangelizadores com espírito, ou seja, temos um ponto de partida e um ponto de chegada: a ternura de Deus.
88 Cf GANDIN, Danilo. A prática do planejamento participativo, p. 18-19.
Grupo Marista
41
ideias. Conscientemente, assim assinala o Bispo de Roma: “Existe também
uma tensão bipolar entre a ideia e a realidade: a realidade simplesmente é,
a ideia elabora-se. Entre as duas, deve estabelecer-se um diálogo constante,
evitando que a ideia acabe por separar-se da realidade. É perigoso viver no
reino só da palavra, da imagem, do sofisma. Por isso, há que postular um [...]
princípio: a realidade é superior à ideia. Isto supõe evitar várias formas de
ocultar a realidade: os purismos angélicos, os totalitarismos do relativo, os
nominalismos declaracionistas, os projetos mais formais que reais, os fundamentalismos anti-históricos, os eticismos sem bondade, os intelectualismos
sem sabedoria”. 89 Tal apelo fundamental desafia-nos a pensar o modo como
estamos evangelizando, o processo, o planejamento e as estruturas pastorais
do Grupo Marista. Partimos da constatação de que há um “horizonte”, um lugar profético para o qual somos convidados a caminhar. Há também o “tempo
presente” como momento histórico-cultural que necessita ser constantemente interpretado. Há um tempo para viver, um caminho para percorrer e um
lugar para se chegar.
2.2.3 Organicidade
[62]. Um dos critérios inerentes ao seguimento de Jesus Cristo é a unidade na
diversidade: somos ramos diferentes da videira (Cristo), animados pela seiva vivificante (Espírito Santo), para produzir bons frutos (evangelização)
– conforme lemos em João 15,1-8. O apóstolo Paulo amplia esta perspectiva:
somos Igreja-Corpo, na variedade de carismas e ministérios, articulados
por “juntas e ligaduras”. 90 Com funções diversificadas, de modo a tornar
nossas iniciativas abrangentes, formamos um agir harmônico, complementar e, consequentemente, mais eficaz. 91 As “juntas e ligaduras” se referem às
instâncias de discernimento e deliberação, que servem ao agir corporativo.
Focados numa evangelização orgânica, como Instituto Marista buscamos
criar sinergia entre as orientações do Magistério Eclesial, os direcionamentos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e entre nossas
89
90
91
42
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 231.
Cf. Ef 4,15-16.
“A Igreja não é jamais uniformidade, mas diversidades.” (PAPA FRANCISCO. Discurso no Encontro com o Episcopado Brasileiro, 27/07/2013)
Diretrizes da Ação Evangelizadora
próprias forças internas (como as demais províncias e a UMBRASIL), conjugando funções e expertises.
[63]. Atualmente, no Brasil, os Maristas estão organizados em três unidades administrativas, a saber: Província Brasil Centro-Norte, Província do Rio Grande
do Sul e Grupo Marista. Também atuam em território amazônico, no denominado Distrito da Amazônia. Todas essas unidades administrativas formam
uma aliança através da União Marista do Brasil (UMBRASIL), que é o organismo que articula, integra e potencializa a atuação Marista no país. A partir
dessa instância, o trabalho em rede, para a ampliação dos resultados e seus
impactos, passa a ser uma necessidade vital para nossa Instituição. 92
[64]. Quando se pensa a partir da abrangência territorial e da complexidade das
estruturas, percebemos que a tarefa é desafiadora, mas não impossível. O
Grupo Marista abrange os estados do Paraná, Santa Catarina, São Paulo,
Mato Grosso do Sul e Goiás, bem como o Distrito Federal, com várias frentes
de atuação: Ensino Fundamental, Ensino Superior, Educação Profissional,
Comunicação, Solidariedade, Saúde, Editora FTD e estruturas de formação e
residências dos Irmãos Maristas.
[65]. Em todas essas frentes a Pastoral deve empenhar-se para gerar processos
que congreguem os esforços educativos, de gestão, solidariedade e assistência social, comunicação, cuidado em saúde, tendo em vista os mesmos fins,
sendo o principal “tornar Jesus Cristo conhecido e amado, sobretudo entre
as crianças e os jovens”. Em rede, somos desafiados a cultivar iniciativas interligadas, sejam internamente ou em parceria com instâncias eclesiais diversas ou setores da sociedade em geral. No agir orgânico é que se constrói
92
Além de ser uma necessidade vital, o trabalhar em rede atende aos desejos do Papa Francisco, que, em diversas ocasiões, expressou o seu
desejo de uma “Igreja das Cercanías”: “A proximidade cria comunhão e pertença, dá lugar ao encontro” (Discurso no Encontro com o Comitê
de Coordenação do CELAM, 28/07/2013). E ainda: “Não podemos ficar enclausurados em nossas paróquias, em nossa comunidade, em nossa
instituição paroquial ou em nossa instituição diocesana quando tantas pessoas estão esperando o Evangelho. Sair, enviados. Não se trata
de um simples abrir a porta para que venham, para acolher, mas sair pela porta para buscar e encontrar. Empurremos os jovens para que
saiam. Não tenhamos medo! Pensemos com decisão na pastoral desde a periferia, começando pelos que estão mais afastados, os que não
frequentam a paróquia. Eles são os nossos convidados ‘VIP’”. (Homilia na Santa Missa com os bispos, sacerdotes, religiosos e seminaristas,
27/07/2013)
Grupo Marista
43
uma Instituição em Pastoral, na qual as iniciativas sejam sinérgicas, de forma
a atingir o mesmo fim.
parceiras. Não utilizava respostas preestabelecidas, mas procurava contribuir para que cada um pudesse tornar significativo para seu próprio contexto
as verdades da fé. Nos passos de Cristo, também Champagnat e os primeiros
Irmãos souberam permanentemente se adaptar ao seu tempo de forma flexível, mantendo, no entanto, a preocupação de garantir às crianças e jovens um
processo educativo que lhes envolvesse de forma integral.
2.2.4 Flexibilidade metodológica
[66]. O Documento 94 da CNBB afirma aquilo que, de certa maneira, já vínhamos
constatando pelas nossas experiências em evangelização: “Instrumentos e
métodos que deram certo em outros momentos históricos, com resultados
que nos alegram profundamente, podem não apresentar, em nossos dias,
condições de transmitir e sustentar a fé”. 93 O Papa Francisco, nesse aspecto,
é muito assertivo: “A pastoral em chave missionária exige o abandono deste
cômodo critério pastoral: ‘fez-se sempre assim’. Convido a todos a serem ousados e criativos nesta tarefa de repensar os objetivos, as estruturas, o estilo e
os métodos evangelizadores [...]. Uma identificação dos fins sem uma condigna busca comunitária dos meios para alcançá-los está condenada a traduzir-se em mera fantasia”. 94
[67]. Tantas quantas forem as necessidades e formas de vidas humanas, tantos devem ser os métodos a serem empreendidos tendo em vista a evangelização.
A partir da pedagogia de Jesus, aprendemos que o ponto de partida é sempre
o contexto daquele que se apresenta diante dos projetos como interlocutor.
Com cada pessoa ou grupo o próprio Cristo utilizava abordagens diversificadas, respeitando sempre a linguagem, os interesses e os limites de cada um. 95
Essa forma de agir é o que caracteriza a dinamicidade do Espírito Santo que
sempre suscita novas formas de evangelizar.
[69]. A flexibilidade sempre foi uma característica presente no modo de agir do
Instituto Marista. Em meio aos inúmeros desafios advindos da Igreja e do
Estado no período da França revolucionária, o fundador vislumbrava possibilidades que superavam a visão de muitos dos seus contemporâneos. “O
seu cristianismo era prático: era capaz de encontrar soluções para os problemas que surgiam e ainda tirar o melhor proveito deles. E, quando as dúvidas
e preocupações lhe sobrevinham, sua simplicidade, a crença inabalável na
presença de Deus e a confiança em Maria e sua proteção o sustentavam.” 96
Talvez por isso Champagnat e os primeiros irmãos não estivessem muito preocupados em criar uma nova teoria pedagógica, mas em se apropriar, com
discernimento e fidelidade aos seus princípios, daquilo que já havia na época.
Tal flexibilidade de pensamento permitiu que os irmãos focassem nos métodos 97 que melhor respondessem as necessidades de educação e evangelização, não excessivamente às fórmulas prontas. Buscavam estar sensíveis “[...]
às necessidades da idade infantil, os meios de satisfazê-las e os segredos para
conquistar seus corações, orientá-las para o bem, inspirar-lhes a piedade e
formar-lhes as faculdades da alma”. 98
[68]. No entanto, é possível identificar nas ações de Jesus alguns elementos constantes, que são oportunos também a nós. Por métodos variados, buscava sempre envolver as pessoas na proposta do Reino, tornando-as protagonistas,
[70]. Ao contemplarmos o tempo presente, nosso desafio consiste em discernir a
eficiência das linguagens que utilizamos para “comunicar” Jesus Cristo. É indispensável a elaboração de modos que facilitem a descoberta das pessoas
93
94
95
44
CNBB. Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja do Brasil, 2011-2015. Doc. 94, n. 25.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 33.
“[...] sem diminuir o valor do ideal evangélico, é preciso acompanhar, com misericórdia e paciência, as possíveis etapas de crescimento
das pessoas, que se vão construindo dia após dia.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 44) “Vemos assim que
o compromisso evangelizador se move entre as limitações da linguagem e das circunstâncias.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica
Evangelii Gaudium, n. 45) “Muitas vezes é melhor diminuir o ritmo, pôr à parte a ansiedade para olhar nos olhos e escutar, ou renunciar às
urgências para acompanhar quem ficou caído à beira do caminho.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 46)
Diretrizes da Ação Evangelizadora
96
97
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Tornar Jesus Cristo conhecido e amado. p. 45.
Ver em Guia das escolas o modo como os Irmãos avaliavam os sistemas gerais de ensino da época: o individual, o simultâneo e o mútuo.
Depois de analisar as vantagens e desvantagens de ambos, e percebendo a inviabilidade do método individual, chega-se à conclusão de que
“é fácil conjugar os métodos simultâneo e mútuo e aproveitar as vantagens de ambos. [...] Os dois métodos assim combinados formam o que
se chama de ensino simultâneo-mútuo [...] que julgamos ser o mais apropriado [...]”. (INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. II Capítulo Geral do
Instituto dos Pequenos Irmãos de Maria 1852-1853-1854. Guia das escolas, p. 151).
98 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. II Capítulo Geral do Instituto dos Pequenos Irmãos de Maria 1852-1853-1854. Guia das escolas, p. 149.
Grupo Marista
45
de hoje em relação ao Evangelho. Eles necessitam perceber e experienciar a
verdade cristã fecundando seu ambiente, apontando valores perenes e orientando projetos de vida. Se diferentes grupos têm sua linguagem própria, sua
maneira de pensar, de viver, de comunicar, todos eles necessitam de uma mediação pastoral que lhes é específica. O conteúdo do Evangelho é sempre o
mesmo – “verdade sempre antiga e sempre nova” –; mas as formas e métodos
de transmiti-los são sempre dinâmicos e fluídos. Por isso, não podemos deixar de mencionar o desejo do Papa Francisco: “Se pretendemos colocar tudo
em chave missionária, isso se aplica também à maneira de comunicar a mensagem [...] as enormes e rápidas mudanças culturais exigem que prestemos
constante atenção ao tentar exprimir as verdades de sempre numa linguagem
que permita reconhecer a sua permanente novidade; é que no depósito da
doutrina cristã, ‘uma coisa é a substância [...] e outra é a formulação que a reveste’ (João XXIII. Discurso na inauguração do Concílio Vaticano II) [...]. Por vezes [...] somos fiéis a uma formulação, mas não transmitimos a substância”. 99
[71]. No Grupo Marista, as ações pastorais buscam a transversalidade, adaptando-se aos respectivos contextos nas quais se incultura. A linguagem adotada
é sempre própria à Instituição e às particularidades das pessoas e estruturas
envolvidas. Como interlocutor e protagonista do Reino, cada um é convidado
a enriquecer o diálogo com sua inteligência, com sua experiência de vida e
fé, de modo que todos são convidados a tornarem-se sujeitos nos processos
pastorais.
“Nova Evangelização” 100 depende dessa capacidade de fazermos a leitura crítica da realidade, leitura atenta dos “sinais dos tempos”, suscitada ao povo de
Deus, que, no conjunto dos seus ministérios, se constitui em Igreja de comunhão. O documento conclusivo da Conferência de Aparecida reconhece tal
necessidade, acentuando que “a Igreja é chamada a repensar com fidelidade e
audácia sua missão nas novas circunstâncias latino-americanas e mundiais”.
101
Somos, assim, orientados a assumir os contornos da América Latina e acolher as culturas e cenários que a compõe, pois “não faria justiça à lógica da
encarnação pensar num cristianismo monocultural e monocórdio”. 102
[73]. O cenário contemporâneo é marcado por realidades complexas, além do já
conhecido embate entre as cosmovisões da modernidade e pós-modernidade.
103
Segundo o Ir. Seán Sammon, a modernidade, que teve início com o Iluminismo, ganhou envergadura com a Revolução Industrial e permaneceu forte
até meados do século XX. Essa época foi marcada por um rápido progresso científico e pela crença de que a razão humana, e apenas ela, seria capaz
não apenas de explicar a natureza, mas de melhorá-la. O individualismo,
uma grande confiança na razão científica e a crença ilimitada no progresso
material seriam os aspectos característicos da modernidade. Tal cosmovisão
deslocou a religião para a esfera subjetiva, tornando o simbolismo, a fé e o
mistério como elementos secundários da vida.
2.2.5 Atenção aos sinais dos tempos
[72]. Há “sinais dos tempos” que precisam ser discernidos à luz do Espírito, que
atua na história – enfatizava João Paulo II. Se, por um lado, reconhecemos
que a Boa Nova é portadora de valores imutáveis, por outro também compreendemos que os métodos e as estratégias de evangelização precisam responder aos novos desafios que vão se apresentando na história. A eficácia de uma
99
46
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, nn. 40.41.
Diretrizes da Ação Evangelizadora
100 A expressão Nova Evangelização foi utilizada publicamente por João Paulo II em uma homilia proferida na Polônia, em 1979. Em 1983,
falando na XIX Assembleia do CELAM, no Haiti, o Papa volta a usar a expressão no sentido de que no processo evangelizador das Américas
se deve vislumbrar um ardor e métodos renovados no jeito de ser Igreja. A expressão se apresentou de uma maneira quase profética, mais
como um desejo do que como uma sistematização da ação da Igreja. O arcabouço teológico e conceitual da Nova Evangelização, entretanto,
coube a Bento XVI, que convoca o Sínodo dos Bispos, em 2012, para debater a proposta da Nova Evangelização, que deve ser entendida não
apenas no tocante às expressões da fé, mas no questionamento dos fundamentos da própria fé. A Nova Evangelização, por conseguinte,
é a tentativa de tornar Cristo conhecido, é a proposta de encontrarmos caminhos e situações que nos façam realmente experienciar, a
partir do Espírito de Jesus, a ternura do Pai. Acolhendo as orientações do Sínodo da Nova Evangelização, Papa Francisco publica a Exortação
Apostólica Evangelii Gaudium, a qual conclama a Igreja a uma revisão de sua pastoral e da evangelização.
101 CELAM. Documento de Aparecida, n. 11.
102 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 117.
103 Ver a diferenciação entre modernidade e pós-modernidade trazida no documento preparatório para o XXI Capítulo Geral. (INSTITUTO DOS
IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Corações Novos para um Mundo Novo, n. 4 e 8)
Grupo Marista
47
[74]. Nesse tempo, alguns setores mais conservadores da Igreja apenas se defenderam104 diante das mudanças que se anunciavam. A Igreja tendeu fechar-se em sua própria estrutura, até que, corajosamente, o Concílio Vaticano II
abriu novas janelas e portas com a Constituição Pastoral sobre a Igreja no Mundo Moderno – intitulada “Alegria e esperança” (Gaudium et Spes). O Concílio
Vaticano II foi um sinal claro de que a Igreja finalmente aceitava dialogar com
modernidade. No entanto, quando a Igreja decidiu enfrentar a modernidade,
os princípios que a sustentavam passam a ser questionados pelo pensamento
pós-moderno.
[75]. Embora difícil de ser definida com clareza, a pós-modernidade caracteriza-se
por não aceitar verdades acabadas; por colocar em xeque a razão como forma
legítima de apreensão da realidade; por não aceitar a ciência como verdade
absoluta, levando em conta a sua contextualidade e provisoriedade; por promover a tolerância, acolher a diversidade e a pluralidade; pelo retorno à religião e à espiritualidade, especialmente entre os jovens. A pós-modernidade
abre muitas portas, porém, apresenta sérios desafios à Igreja: “O individualismo pós-moderno e globalizado favorece um estilo de vida que debilita o
desenvolvimento e a estabilidade dos vínculos entre as pessoas e distorce os
vínculos familiares. A ação pastoral deve mostrar ainda melhor que a relação
com o nosso Pai exige e incentiva uma comunhão que cura, promove e fortalece os vínculos interpessoais”. 105
[76]. Nosso carisma sempre ousou capturar e responder ao conjunto de necessidades do seu tempo. Hoje, necessitamos desenvolver uma nova inteligência
e sensibilidade para interagir com o mundo em seus diferentes contextos.
A “atenção aos sinais dos tempos” revela nossa preocupação com uma ação
evangelizadora historicamente situada. Desenvolvemos tal característica à
medida que nos esforçamos para desenvolver competências que nos ajudem
104 Vale ressaltar que outros setores da Igreja foram na direção contrária: citamos, por exemplo, o Movimento Bíblico, Movimento Ecumênico,
Movimento Catequético, Movimento Litúrgico, Movimento Patrístico e Movimento Missionário. A esses seis moveres é atribuído o estopim
para o Concílio Vaticano II. O Vaticano II foi resultado de passos anteriores, de amplos setores que não se fecharam na autodefesa eclesial.
Daí as temáticas dos principais documentos do Concílio: Dei Verbum, Unitatis Redintegratio, Sacrosanctum Concilium, Ad Gentes, Nostra
Aetate e Gaudium et Spes.
105 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 67.
48
Diretrizes da Ação Evangelizadora
a ler as transformações do mundo (as análises de conjuntura, as análises situacionais, os clamores sociais e do povo oprimido), a avaliar tendências, desafios e oportunidades, sem perder de vista nossa essência.
[77]. Como aconteceu em outros momentos históricos – com seus respectivos paradigmas –, também o atual milênio nos oferece, ao mesmo tempo, crises e
oportunidades. Urge discernir e agir conjuntamente com as ciências, com as
novas tecnologias, com as demais religiões organizadas, abrindo o tesouro do
Evangelho aos novos cenários sem sentimento de culpa ou constrangimentos. “O diálogo entre ciência e fé também faz parte da ação evangelizadora
que favorece a paz. [...] A Igreja propõe um caminho que exige uma síntese
entre um uso responsável das metodologias próprias das ciências empíricas
e os outros saberes como a filosofia, a teologia e a própria fé que eleva o ser
humano até ao mistério que transcende a natureza e a inteligência humana
[...]. A evangelização está atenta aos progressos científicos para iluminá-los
com a luz da fé e da lei natural, tendo em vista procurar que sempre respeitem
a centralidade e o valor supremo da pessoa humana em todas as fases da sua
existência. Toda a sociedade pode ser enriquecida através deste diálogo que
abre novos horizontes ao pensamento e amplia as possibilidades da razão.” 106
[78]. Desse modo, olhando para a nossa realidade e responsabilidade apostólica, é
preciso que nos perguntemos sempre: Como tal realidade toca nossa missão?
Quais são os desafios aos quais devemos fazer frente nesse momento da história? Como é possível nos apropriarmos desses traços da contemporaneidade no intuito de aperfeiçoarmos nossas estratégias de evangelização?
2.2.6 Recursos
[79]. Nas variadas instâncias da organização há pessoas e/ou setores com a responsabilidade de animar, articular, empreender, gerir, planejar e acompanhar as ações, de modo a garantir o alinhamento, a sinergia, a disseminação dos valores, o comprometimento e a espiritualidade. Esse movimento só
se torna possível com a gestão qualificada dos recursos. No Grupo Marista,
106 PAPA FRANSCISO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 242.
Grupo Marista
49
todos os nossos esforços são direcionados para o cumprimento da missão,
que é eminentemente educativo-evangelizadora. Na ação pastoral, os recursos - humanos, econômicos, estruturais e comunicacionais - tornam-se propulsores da missão. Nossa identidade cristã deve também ser compreendida como dimensão de empreendimento, na medida em que empreendemos
ações para um mundo melhor, com mais justiça e dignidade para todos.
[80]. A literatura da administração e governança é unânime ao apontar o “capital
humano” como o elemento mais precioso em uma organização, seja ela de
qualquer natureza. Essa afirmação deve ser exponenciada nas organizações
de caráter educativo. Por isso, todos os agentes envolvidos no desenvolvimento dos processos sociais, educativos, de gestão, de comunicação, de saúde e
tantos outros merecem receber sólida formação, tendo em vista o desenvolvimento humano, profissional, cristão e marista. 107 Respeitando as dimensões
pessoais e as características das diferentes frentes apostólicas que compõem
o Grupo Marista, o carisma marista deve ser um dom partilhado com todos
que compõem nossas comunidades. Deve ser fonte de inovação, constante
qualificação, bem como proporcionar abertura ao mundo das ciências, da
cultura, com visão sempre ampliada e intenção agregadora.
[81]. Compreendemos que os recursos econômicos também são valores que estão
a serviço da missão. Segundo o Papa Bento XVI, a “área econômica não é
nem eticamente neutra nem de natureza desumana [...]. Pertence à atividade
do homem; e, precisamente porque humana, deve ser eticamente estruturada e institucionalizada”. 108 Portanto, ela está inserida num contexto da vida
humana e, por consequência, no contexto da evangelização. É provisão necessária para a caminhada, para a potencialização e expansão da missão. Os
recursos devem ser administrados por pessoas qualificadas tanto nas competências técnicas como morais. Buscamos a inserção assertiva no mundo
da economia, pois “cada decisão econômica tem consequências de caráter
107 “A formação dos leigos e a evangelização das categorias profissionais e intelectuais constituem um importante desafio pastoral.” (PAPA
FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 102)
108 BENTO XVI. Caritas in Veritate, n. 36.
50
Diretrizes da Ação Evangelizadora
moral”. 109 Por isso, temos um compromisso claro com o “uso evangélico dos
bens”. 110
[82]. Marcelino Champagnat, desde a fundação do Instituto, zelava muito pela garantia de estruturas físicas adequadas para potencializar a realização do trabalho cotidiano. Os recursos físicos ou estruturais também são importantes
para o desenvolvimento de nossos processos, desde que a organização dessas
coisas subordine-se à ordem das pessoas e não ao contrário. Nesse sentido,
interroga-se o Papa Francisco: “Às vezes interrogo-me sobre quais são as pessoa que, no mundo atual, se preocupam realmente mais com gerar processos
que construam um povo do que com obter resultados imediatos que produzam ganhos políticos fáceis, rápidos e efêmeros, mas que não constroem a
plenitude humana”. 111 São meios – como espaços físicos (capelas, salas para
encontros ou reuniões, auditórios etc.), recursos didáticos, estruturas e serviços, novas tecnologias – que melhoram as condições de trabalho, da educação, da integração, do bem estar, do serviço e da participação. 112 Do ponto de
vista estético, bem como do funcional, devem tornar-se meios acolhedores e
eficientes, colocados a serviço da missão.
2.3 Carisma
[83]. O termo “carisma” é incorporado à tradição cristã a partir do Novo Testamento, sobretudo quando Paulo apóstolo dirige-se à comunidade de Corinto para ilustrar a existência de muitos dons espirituais, dádivas distribuídas
por Deus aos homens e mulheres. Paulo proclama que “existem carismas
diferentes, mas um único Espírito; existem ministérios diferentes, mas um
único Senhor; existem atividades diferentes, mas um único Deus que realiza
tudo em todos. A cada um é dado uma manifestação do Espírito para o bem
109
110
111
112
BENTO XVI. Caritas in Veritate, n. 37.
Vide mais reflexões sobre o tema em: OST, Ir. Pedro. Uso evangélico dos bens, 2009.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 224.
Aqui é interessante notar o testemunho de Santa Teresa D’Ávila (1515-1582) sobre a questão do uso dos bens; ao ser questionada sobre o
papel do dinheiro na missão cristã, responde: “Teresa sozinha é uma boa mulher; Teresa com Deus é uma santa; Teresa com Deus e dinheiro
é uma potência”. Citado por SCIADINI, Patrício. Contemplando o mundo e o céu com Santa Tereza. São Paulo: OCD. 2000.
Grupo Marista
51
comum”. 113 A ideia da existência de carismas diferenciados tornou-se um elemento importante para a animação pastoral na história cristã.
[84]. Paulo VI, ao escrever para o Concílio Vaticano II, enfatizou a importância da
diversidade dos carismas no dinamismo da ação evangelizadora da Igreja114,
preferindo relacioná-lo à missão. Mais tarde, João Paulo II optou por aproximá-lo do termo consagração. Estas palavras, (carisma, missão e consagração) às vezes se equivalem, embora, de modo geral, compreenda-se o carisma
como “um dom do Espírito oferecido para o bem da Igreja, que se estende a
toda a humanidade”. 115
[85]. O carisma é o efeito da presença do Espírito no meio do povo. O Concílio Vaticano II enfatizava que é impossível impedir a ação do Espírito Santo ou,
pela razão humana, impor limites à generosidade de Deus à humanidade. O
carisma manifesta-se com mais força na história justamente nas condições de
maior adversidade. Portanto, não nos soa estranho o fato de que Marcelino
Champagnat tenha fundado o Instituto e o feito progredir num dos cenários
políticos mais anticlericais e antirreligiosos da história recente do Ocidente.
Desse modo, entendemos que “o carisma do Instituto é nada mais nada menos do que a presença do Espírito Santo” 116 atuando na humanidade por meio
de pessoas.
[86]. Uma magnífica reflexão sobre o carisma e as implicações desse na Instituição
religiosa foi tecida na Carta Circular Tornar Jesus Cristo conhecido e amado, do
Ir. Seán Sammon. Para Sammon, é necessário distinguir o carisma em duas
perspectivas: o carisma pessoal e o carisma institucional. Na primeira perspectiva, cada pessoa é desafiada a discernir a maneira pela qual Deus escolheu agir por intermédio da subjetividade em benefício do coletivo. Ou seja,
113 1Cor 12, 1-7.
114 Paulo VI, na Exortação Apostólica Evangelica Testificatio, versa sobre a Renovação da Vida Religiosa segundo os ensinamentos
do Concílio Vaticano II. Disponível em <http://www.vatican.va>.
115 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Tornar Jesus Cristo Conhecido e Amado, p. 28.
116 A vida do fundador oferece muitos exemplos da presença do Espírito: a maneira com que encarava os fracassos e sucessos pelos olhos da fé,
por isso assumia riscos quando os incrédulos aconselhavam prudência; o surgimento de duas vocações dois meses após chegar em La Valla;
a crise de vocações e construção de Hermitage; a confiante proteção em Maria, parceira na obra de fé. (Cf. INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS.
Seán Sammon. Tornar Jesus Cristo Conhecido e Amado, p. 30)
52
Diretrizes da Ação Evangelizadora
o modo pelo qual cada um é capaz de reconhecer-se como instrumento nas
mãos de Deus em vista de um projeto que transcende sua individualidade.
Numa cultura de tendência individualista, o desafio está no fato de que “a
maioria raramente se considera portador de um dom especial do Espírito a
ser colocado a serviço do bem de todos”. 117 Na segunda perspectiva, quando
utilizado para referir-se a um instituto religioso, o carisma institucional assume sentido diferenciado daquele atribuído a uma só pessoa. Há duas razões
para isso: geralmente o carisma de um instituto é constituído pela influência de muitas pessoas, o que lhe favorece uma longa permanência no tempo.
Permanência no tempo e a construção coletiva são fatores que transferem o
carisma do domínio individual para o domínio coletivo, que é o domínio da
comunidade-Igreja. 118
[87]. Marcelino Champagnat foi um homem marcado pela fé em Jesus Cristo, pela
devoção à Maria Santíssima – a quem carinhosamente intitulava Boa Mãe
– e pelo contato com o sofrimento humano, vivenciado, sobretudo, no atendimento pastoral-sacramental. Como sabemos, a fundação do Instituto Marista tem como marco desencadeador a experiência de sofrimento e morte
do pobre jovem Jean-Baptiste Montagne. Diante dos olhos de Champagnat,
o Espírito lhe fazia ver que Montagne era a imagem de milhares de jovens
camponeses que viviam sob as mesmas condições de pobreza, de ignorância
intelectual e religiosa. E os primeiros Irmãos foram seduzidos pela experiência carismática de Champagnat, pelo seu caráter firme, pelo seu projeto de
sociedade e Igreja, cuja transformação passava audaciosamente pela educação com característica mariana; daí maristas.
[88]. Ainda pequena, a comunidade dos Irmãos Maristas vivia sob um encantamento místico, que delineava aos poucos a identidade daquele grupo, suas
características operacionais e suas estratégias de atuação, embora, muitas
vezes, fossem guiados pela intuição. Tem-se em torno da figura do fundador
117 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Tornar Jesus Cristo Conhecido e Amado, p. 28.
118 O Ir. Seán Sammon enfatiza que os carismas institucionais apresentam características peculiares, como “fidelidade ao Senhor, atenção aos
sinais dos tempos, iniciativas ousadas, doação pessoal persistente, humildade para lidar com as diversidades e desejo de fazer parte da
Igreja.” (INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Tornar Jesus Cristo Conhecido e Amado, p. 29)
Grupo Marista
53
uma tradição religiosa em constituição. Num segundo momento, quando os
Irmãos Maristas tornam-se numerosos, foi necessário que a tradição se institucionalizasse em regras119 e hábitos, com o intuito de gerir a unidade e identidade do grupo.
[89]. É incontestável o fato de que as estruturas mudem ao longo do tempo, sobretudo em resposta às novas conjunturas e cenários de mundo. A sociedade
sustenta-se a partir de paradigmas. Paradigmas são sistemas de ideias e valores que nos ajudam a tomar consciência de nossa vida. São úteis na medida
em que ajudam a compreender a realidade. Quando isso não mais ocorre, é
natural que um novo sistema de ideias e valores force um movimento de revisão, favorecendo que ocorram “transições paradigmáticas”. 120
[90]. Se o paradigma que orienta nossa missão está mudando, a expressão de nosso carisma também é inexoravelmente forçada a mudar. Diante disso, algumas instituições mudam de maneira lenta e resistente, outras progressivamente e outras por meio de rupturas inesperadas. Isso nos desafia, como
Instituição, a fazermos um duplo movimento: de um lado, retornar ao espírito original para descobrir sua essência carismática mais pura; de outro,
ressignificar o carisma à luz dos sinais dos tempos. Na prática, carisma é
aquilo que define o estilo de ser e atuar de uma pessoa ou instituição. Portanto, conhecer e aderir a um carisma é fundamental para a efetividade de
qualquer missão dentro da Igreja.
importante que isso possa ser – ou um conjunto de qualidades marcantes da
vida do Fundador”. 121 Portanto, “não é possível reduzir carisma apenas à tradição. O carisma de todo Instituto, o nosso incluído, é sempre vibrante e inspirador. Constitui-se uma tradição que vai se atualizando ao longo do tempo,
cujas raízes se fixam na interação entre a tradição do passado e o apelo do
Espírito Santo para assumir os desafios do presente e do futuro.” 122 É preciso
então “ressignificar o carisma, renovando-o à luz dos sinais dos tempos”. 123
É nessa perspectiva que o Instituto tem se posicionado nas últimas décadas.
[92]. Portanto, por meio do Instituto Marista a Igreja intensifica a sua presença no
mundo. A partir do carisma herdado de São Marcelino Champagnat, a ação
evangelizadora eclesial se faz presente de modo específico e mais eficaz no
âmbito da educação de crianças e jovens. A missão marista, como expressão
significativa do rosto marial da Igreja, é dom de Deus concedido à humanidade. Como comunidade marista, somos convidados a partilhar nossa experiência de fé com todas as pessoas, independente de suas condições sociais,
econômicas, religiosas ou culturais.
[91]. Desse modo, define o Ir. Seán Sammon, “o carisma oferecido à Igreja e ao
mundo por mediação de Marcelino Champagnat é, portanto, muito mais que
um conjunto de trabalhos considerados coerentes com sua visão original,
um estilo de oração referente a uma determinada espiritualidade – por mais
119 Referimo-nos, por exemplo, às Regras de Vida dos Pequenos Irmãos de Maria em Constituições e Estatutos, de 1837. Com o passar do
tempo é comum que os carismas gerem estruturas em vista da necessidade de garantir uma identidade. Por vezes os carismas também
acabam por se confundir com a própria identidade da instituição.
120 Seán Sammon assim descreve as transições paradigmáticas: “O teólogo Jon Sobrino as compara às dobradiças de uma porta. Há momentos
de crise e perturbação quando dobradiças velhas e enferrujadas não suportam o peso da porta. Essa situação impõe a criação de novas
dobradiças para que a porta volte a abrir e fechar bem”. (INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Tornar Jesus Cristo Conhecido e
Amado, p. 33)
54
Diretrizes da Ação Evangelizadora
121 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Tornar Jesus Cristo Conhecido e Amado, p. 29.
122 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Tornar Jesus Cristo Conhecido e Amado, p. 34-35.
123 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Seán Sammon. Tornar Jesus Cristo Conhecido e Amado, p. 34.
Grupo Marista
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3
ELEMENTOS
INCULTURADORES
3.ELEMENTOS INCULTURADORES
124
A pessoa versada nas coisas do Reino é
como alguém que sabe tirar de seu tesouro
coisas novas e antigas. (Mateus 13,52).
[93]. Chamamos de Elementos Inculturadores 125 a um conjunto de componentes interdependentes (que podem ser interpretados como conceitos-chave, espaços, temas ou dimensões) que julgamos ser prioritários para a dinamização
da ação evangelizadora na cultura atual. Acreditamos que os Elementos Inculturadores favorecem o diálogo entre os princípios e valores do Evangelho
com as culturas contemporâneas, sustentando um processo de evangelização
historicamente contextualizado. 126 Portanto, são respostas possíveis aos desafios que emergem na realidade de mundo e do Grupo Marista.
[94]. O documento conclusivo da Conferência de Santo Domingo 127 é lembrado
por inaugurar o princípio teológico da inculturação como referencial metodológico salutar para a evangelização na contemporaneidade, de modo que a
linguagem e os métodos pastorais possam melhor se aproximar das novas realidades culturais e existenciais. Tal princípio está relacionado ao projeto de
uma Nova Evangelização: “A Nova Evangelização tem como ponto de partida
124 O termo “elemento” designa a “parte constitutiva de um todo”, que em sua natureza singular possui a potencialidade de se ligar a outros
elementos de diversas maneiras, tanto para formar “estruturas” simples, como estruturas complexas. “O todo sem a parte não é todo. A
parte sem o todo não é parte. Mas se a parte faz o todo sendo a parte, não se diga que é parte, sendo todo.” (Gregório de Matos – Século XVII)
125 O entendimento sobre o significado e abrangência de cada um dos elementos inculturadores foi delineado por Grupos de Reflexão,
representativos de todas as frentes apostólicas. Houve um esforço por fazer com que cada realidade de atuação pudesse se reconhecer no
texto, de modo a torná-lo significativo e inspirador para a prática pastoral cotidiana.
126 “O anúncio às culturas implica também um anúncio às culturas profissionais, científicas e acadêmicas. É o encontro entre a fé, a razão e as
ciências, que visa desenvolver um novo discurso sobre a credibilidade, uma apologética original que ajude a criar as predisposições para
que o Evangelho seja escutado por todos. Quando algumas categorias da razão e da ciência são acolhidas no anúncio da mensagem, tais
categorias tornam-se instrumentos de evangelização; é a água transformada em vinho.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii
Gaudium, n. 132)
127 A conferência de Santo Domingo ocorreu na República Dominicana, de 12 a 28 de outubro de 1992. Foi convocada e inaugurada por João
Paulo II. Seu tema foi “Nova Evangelização, promoção humana, cultura cristã.” Seu lema: “Jesus Cristo ontem, hoje e sempre”.
58
Diretrizes da Ação Evangelizadora
a certeza de que em Cristo há uma riqueza insondável (Ef 3, 8) que nenhuma
cultura, de qualquer época, extingue, e à qual nós, seres humanos, sempre
poderemos recorrer para enriquecer-nos”. 128
[95]. Ocorre, porém, que a riqueza contida no Evangelho nem sempre é comunicada de maneira suficientemente compreensível. Nem sempre somos capazes de traduzir a essência da mensagem de Jesus Cristo de modo assertivo
para iluminar as problemáticas dos contextos nos quais atuamos. Cristãos,
crentes de outras religiões e até não crentes compartilham de expectativas
semelhantes em relação a um projeto de mundo melhor, com “vida em abundância” para todos, muito embora tais grupos formulem seus sonhos com
linguagem e expressões que lhes são próprias. Parece haver, entre as pessoas
de boa vontade, muito mais uma dificuldade de comunicação dos projetos
comuns a todos do que um problema de apatia ou desesperança em relação
à humanidade. O Documento de Aparecida pontua que “em geral, na pastoral,
persistem também linguagens pouco significativas para a cultura atual e em
particular para os jovens. [...] as linguagens utilizadas parecem não levar em
consideração a mutação dos códigos existencialmente relevantes nas sociedades influenciadas pela pós-modernidade”. 129 Reiterando, o Papa Francisco
aponta: “Se pretendemos colocar tudo em chave missionária, isso se aplica
também à maneira de comunicar a mensagem. [...] convém ser realistas e não
dar por suposto que os nossos interlocutores conhecem o horizonte completo
daquilo que dizemos ou que eles podem relacionar o nosso discurso com o
núcleo essencial do Evangelho que lhe compete sentido, beleza e fascínio”. 130
[96]. Somos Igreja peregrina que, a exemplo de Cristo, caminha ao encontro das
pessoas para anunciar a Boa Nova, seja nos campos ou nas cidades, seja nos
espaços mais inusitados ou desafiadores. As pessoas, às quais a Igreja vai
ao encontro, podem ser das massas populares, das elites dominantes, podem
128 CELAM. Documento de Santo Domingo, n. 24.
129 CELAM. Documento de Aparecida, n. 100b.
130 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 34. Aqui se faz necessário recordar a orientação de João XXIII quando da
abertura do Concílio Vaticano II: “[...] uma coisa é a substância [...] e outra é a formulação que a reveste” (Discurso de Inauguração do Concílio
Vaticano II, 11/10/1962). Assim, a Igreja é chamada a dialogar com o homem contemporâneo a partir de suas bases de compreensão de
mundo e de existência.
Grupo Marista
59
ser os intelectuais, os artistas, as crianças e os jovens, os comunicadores midiáticos, os não crentes, etc. Também podemos encontrá-las em meio às novas tecnologias, no ambiente das ciências, nos espaços políticos de tomada
de decisão, nos espaços onde sofrem pela omissão, violência ou ignorância.
Não obstante, “a inculturação é algo a se fazer inclusive na própria sociedade
cristã” 131 com o intuito de reanimar os cristãos que se encontram desmotivados ou fragilizados na fé. Nessa peregrinação ao encontro do outro, devemos
reconhecer e exaltar os valores que convergem e/ou coincidem com a mensagem do Evangelho, promovendo nas culturas aquilo que elas possuem de
melhor e mais autêntico.
A inculturação do Evangelho é um processo que supõe reconhecimento dos valores evangélicos que se têm mantido mais ou
menos puros na atual cultura; e o reconhecimento de novos valores que coincidem com a mensagem de Cristo. [...] assumindo
o que de bom existe nelas [as culturas], e renovando-as a partir
de dentro. 132
[97]. Tornam-se fundamentais algumas orientações do Papa Francisco sobre o
processo de inculturação do Evangelho:
A salvação, que Deus realiza e a Igreja jubilosamente anuncia, é
para todos e Deus criou um caminho para se unir a cada um dos
seres humanos de todos os tempos. Escolheu convocá-los como
povo, e não como seres isolados [...]. Este Povo de Deus encarna-se nos povos da Terra, cada um dos quais tem a sua cultura própria. A noção de cultura é um instrumento precioso para compreender as diversas expressões da vida cristã que existem no
povo de Deus. Trata-se do estilo de vida que uma determinada
sociedade possui, da forma peculiar que têm os seus membros
de se relacionar entre si, com as outras criaturas e com Deus.
131 CELAM. Documento de Santo Domingo, n. 119.
132 CELAM. Documento de Santo Domingo, n. 230.
60
Diretrizes da Ação Evangelizadora
Assim entendida, a cultura abrange a totalidade da vida de um
povo [...] O ser humano está sempre culturalmente situado: natureza e cultura encontram-se intimamente ligadas. A graça supõe a cultura, e o dom de Deus encarna-se na cultura de quem o
recebe [...]. Não faria justiça à lógica da encarnação pensar num
cristianismo monocultural e monocórdio [...] o Evangelho [...]
possui um conteúdo transcultural. 133
[98]. No presente documento, os Elementos Inculturadores estão assim representados: dignidade humana; educação emancipadora; espiritualidade; alteridade; solidariedade socioambiental; catequese; infâncias e juventudes; valores
maristas. Cremos que esse conjunto, que reflete alguns aspectos favoráveis
em meio a tantos outros possíveis, permite ampliar nosso modo de ver a cultura, a pessoa humana, a sociedade e conexões relevantes para a ação pastoral. Os Elementos Inculturadores estão em sintonia com as exigências objetivas
da fé cristã, com a tradição pastoral institucional e as aspirações humanas
universais. Portanto, conclamamos que os Elementos Inculturadores sejam absorvidos, enriquecidos e enaltecidos por todas as frentes apostólicas durante
a concepção de seus projetos e ações, fomentando novas conectividades e a
criatividade evangelizadora.
3.1 Dignidade humana 134
Não é possível que a morte por enregelamento de um idoso sem
abrigo não seja notícia, enquanto o é a descida de dois pontos
na Bolsa. Isto é exclusão. (Papa Francisco)
[99]. Existe o absolutamente sagrado valor da vida humana e esse é um princípio
fundamentalmente religioso, ao qual a Igreja nomeia princípio da dignidade
133 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium. nn. 113-117.
134 Contribuíram nessa reflexão: Ana Cristina de Carvalho (TECPUC), Carolina Feltrin (APC– Diretoria de Recursos Humanos), Ione Anhaia dos
Santos (Centro Social Ir. Walmir - Criciúma), Juliana Schwarz (ABEC-UCE – Recursos Humanos), Maria Helena Negrão (Colégio Marista de
Londrina – PR), Marco Aurélio Ghislandi (DERC), Raimundo Policarpo de Souza (APC - Logística), Tupiná Machado (Aliança Saúde) e Vera Lúcia
Costa da Silva (PUCPR - Núcleo de Pastoral).
Grupo Marista
61
inalienável da pessoa humana. A dignidade diz respeito à consciência da pessoa quanto ao seu valor inestimável e universal. Não se trata de uma concessão social, mas “a dignidade da pessoa humana é um valor transcendente e,
como tal, será sempre reconhecida por todos aqueles que se entregaram sinceramente à busca da verdade”. 135 Portanto, a vida humana e a sua dignidade
transcendente são ontológica e moralmente inseparáveis. Essa é a premissa
básica da antropologia cristã.
[100]. A Declaração Universal dos Direitos Humanos 136 promulgada pela ONU também reconhece a dignidade inerente a todos os membros da família humana,
os seus direitos iguais e inalienáveis pautados nos princípios da liberdade, da
justiça e da paz. Sob o enfoque do direito, a Declaração representa um grande
avanço ético e político nas relações humanitárias globais. Portanto, deve ser
acolhida, amparada e defendida por todos os povos e nações. Não obstante,
mesmo ao ratificarmos a Declaração e a ela dedicarmos esforços efetivos, é
preciso enfatizar que o humano é criatura sagrada, anterior a qualquer credo,
nacionalidade ou legislação. Tal compreensão religiosa nos suscita a denunciar que é injusta e inaceitável toda lei que se oponha a essa inviolabilidade
da dignidade humana ou quando a mesma despreza os direitos que resultam dessa dignidade, ainda que a lei em questão tenha sido deliberada pelos
meios políticos formais. 137
[101].Ademais, qual é o fundamento da inviolabilidade de alguns direitos humanos? Nós cristãos dizemos que é a Criação: 138 “O humano, criado à imagem e
135
136
137
138
62
JOÃO PAULO II. Mensagem para o XXXII Dia Mundial da Paz, 1º de janeiro de 1999, n 2. Disponível em: <http://www.vatican.va>.
Adotada e proclamada pela resolução 217 (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948.
RATZINGER, Joseph; D’ARCAIS, Paolo F. Deus existe? p. 66-67).
Aqui parece haver um ponto de discordância entre crentes e não crentes, apontado por D’Arcais, que podemos resumir no seguinte
problema: Quando se estabelece que o núcleo intocável de valores e o fundamento dos direitos/deveres sociais é a Criação, corremos o
risco de nos apoiar num princípio religioso que não se sustenta numa sociedade laicizada. A Criação é uma certeza apenas para quem crê.
Nesse caso, numa sociedade pluralista, na qual muitos não aderiram a nenhuma das religiões monoteístas ou deístas, o fundamento da
dignidade deve estar além do conceito de Criação. A fé não pode pretender ser a culminância da razão. Aquilo que chamamos de “direitos
humanos” deveríamos ter a coragem de chamá-los de “direitos civis”, encarando-os como escolhas negociadas, racionalizadas sobre o
modo como desejamos fundamentar nossa convivência. Não são direitos naturais, uma vez que o homem viveu milhares de anos sem eles,
mas consubstanciais à natureza social do homem, o que não os torna menores. (RATZINGER, Joseph; D’ARCAIS, Paolo F. Deus existe? p. 7273)
Diretrizes da Ação Evangelizadora
semelhança de Deus139, é capaz de conhecer e amar o seu criador e as demais
criaturas” 140; logo, a pessoa humana “está em relação constante com quantos
se encontram revestidos da mesma dignidade”. 141 E é por compreendermos
que alguns direitos são inalienáveis, podemos estabelecer barreiras morais e
exigir limites a certos comportamentos.
[102].No cenário inter-religioso, marcado pelo diálogo fraterno entre diferentes
crenças e Igrejas, tem crescido a preocupação em afirmar e defender a dignidade humana, especialmente frente às ameaças e violências oriundas do
sectarismo, da perseguição étnica e do terrorismo. 142 Lideranças mundiais
indicam que tal violência tem agravantes que, além de motivações de credo,
são econômicos, territoriais e culturais. Entre os esforços inter-religiosos
para afirmação da dignidade humana estão o Diálogo de Civilizações (ONU), o
Programa Justiça, Paz e Integridade da Criação (Conselho Mundial de Igrejas),
o Parlamento Mundial das Religiões (WPR), as Jornadas de Assis pela Paz (Santa
Sé) e a recente diretriz internacional Testemunho Cristão em um Mundo Multi-religioso – Recomendações para a Conduta (Conselho Mundial de Igrejas e Santa Sé). Essas iniciativas oferecem também coordenadas éticas, antropológicas
e religiosas para nosso apostolado, tendo em vista da convivência cidadã e
fraterna entre povos e credos diferenciados.
[103].Quanto ao diálogo com os não crentes, em tempos de relativismo ético, a questão básica consiste em saber qual é o núcleo de valores verdadeiramente inalienáveis, capaz de ser compartilhado numa sociedade plural e que, portanto,
assume valoração sagrada, pétrea. Nesse caso, a doutrina cristã propõe que
139 Gênesis 1, 26-28.
140 Gaudium et Spes, n. 12.
141 JOÃO PAULO II. Mensagem para Celebração do XXXII Dia Mundial da Paz. 1º de Janeiro de 1999. Disponível em <http://www.vatican.
va>.
142 “Este diálogo inter-religioso é uma condição necessária para a paz no mundo e, por conseguinte, é um dever para os cristãos e também para
outras comunidades religiosas. Este diálogo é, em primeiro lugar, uma conversa sobre a vida humana ou simplesmente – como propõem
os Bispos da Índia – ‘estar aberto a eles, compartilhando as suas alegrias e penas’. Assim aprendemos a aceitar os outros, na sua maneira
diferente de ser, de pensar e de se exprimir. Com este método, poderemos assumir, juntos, o dever de servir a justiça e a paz, que deverá
tornar-se um critério básico de todo o intercâmbio. Um diálogo, no qual se procurem a paz e a justiça social, é, em si mesmo, para além do
aspecto meramente pragmático, um compromisso ético que cria novas condições sociais. Os esforços à volta de um tema específico podem
transformar-se num processo em que, através da escuta do outro, ambas as partes encontram purificação e enriquecimento. Portanto,
estes esforços também podem ter o significado de amor à verdade.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 250)
Grupo Marista
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seja a centralidade da defesa da vida. De acordo com Ratzinger, “[...] a atenção à defesa da vida humana, hoje, é maior que no passado e, nesse sentido,
também há uma característica específica de nosso século, no qual vivemos,
aliás, também uma crueldade e um desprezo pelo ser humano que deveriam
nos fazer despertar”. 143
Como crentes, sentimo-nos próximo também de todos aqueles
que, não se reconhecendo parte de qualquer tradição religiosa, buscam sinceramente a verdade, a bondade e a beleza, que,
para nós, têm a sua máxima expressão e a sua fonte em Deus.
Sentimo-los como preciosos aliados no compromisso pela defesa da dignidade humana, na construção de uma convivência pacífica entre os povos e na guarda da criação. Um espaço peculiar
é o dos chamados novos Areópagos, como o “Átrio dos Gentios”,
onde crentes e não crentes podem dialogar sobre os temas
fundamentais da ética, da arte e da ciência, e sobre a busca da
transcendência. Também este é um caminho de paz para o nosso
mundo ferido. 144
[104].Nosso primeiro Plano Provincial de Pastoral (2003-2011) já enfatizava que o
Evangelho de Jesus Cristo é, certamente, o melhor norteador pedagógico da
humanização, pois anuncia, de maneira clara, os preceitos e valores fundamentais para o equilíbrio das relações humanas. Portanto, “contemplando
a vida de Jesus, apreendemos os valores essenciais que fundamentam um
projeto de humanização adaptado à nossa realidade, [...] em sociedade justa,
fraterna e solidária” 145, donde resulta “[...] a felicidade, a vida em abundância
para todos”. 146
[105].O ser humano deve estar no centro de todo planejamento e desenvolvimento da sociedade, pois “nada é tão fundamental na perspectiva de um
143
144
145
146
64
RATZINGER, Joseph; D’ARCAIS, Paolo F. Deus existe?, p. 70.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 257.
Cf. PMBCS. Setor de Pastoral. Plano Provincial de Pastoral, p. 145.
PMBCS. Setor de Pastoral. Plano Provincial de Pastoral, p. 145.
Diretrizes da Ação Evangelizadora
desenvolvimento integral como colocar o ser humano em primeiro plano,
possibilitando-lhe, ao lado do progresso técnico, uma descoberta de seu valor como pessoa”. 147 Sendo assim, uma sociedade justa só pode ser realizada
no respeito pela dignidade transcendente da pessoa e “[...] a ordem social e
seu progresso devem ordenar-se incessantemente ao bem das pessoas, pois
a organização das coisas deve subordinar-se à ordem das pessoas e não ao
contrário”. 148
[106].O princípio da dignidade inalienável da pessoa humana encontra-se no cerne
da visão cristã do ser humano e do seu desenvolvimento. É um tronco a partir
do qual vão se desdobrar todos os demais princípios e conteúdos da Doutrina
Social da Igreja, dentre os quais destacamos o princípio do bem comum149; o
princípio da subsidiariedade150; e o princípio da solidariedade. Esses princípios
nos conduzem a outros complementares151, primazias que ajudam a orientar
a vida pessoal e as relações sociais.
[107].De modo geral, a dignidade das pessoas que integram a Instituição Marista
torna-se mais evidente:
147 ANTONCICH, Ricardo; SANS, José Miguel M. Ensino Social da Igreja, p. 98.
148 PONTIFÍCIO CONSELHO “JUSTIÇA E PAZ”. Compêndio da Doutrina Social da Igreja. Refere-se à Gaudium et Spes, nn. 26, 58, 1046 e 1047.
149 O princípio do bem comum convoca a todos a empenharem-se por uma ordem justa. A conciliação entre o bem comum e o bem particular se
dá pela via da caridade, que supera o egoísmo e possibilita a experiência da gratuidade e da justiça em relação às necessidades e direitos.
O bem comum difere do interesse geral e interesse particular. O interesse geral, por vezes, pode subentender o sacrifício e exclusão
de alguns, geralmente os mais fracos, em detrimento de outros. Já o bem comum visa envolver todos os indivíduos, de acordo com as
possibilidades específicas de cada um.
150 O princípio da subsidiariedade fundamenta-se na premissa de que Deus, em sua sabedoria infinita, não quis exercer sozinho o governo
de todas as coisas que criou. O Criador confiou a cada criatura um conjunto diversificado de dons, os quais são exercidos segundo a sua
natureza e discernimento. O princípio da subsidiariedade incentiva que a pessoa (ou nação, no sentido macro) desempenhe seu papel social
com amor, responsabilidade e solicitude. Por exemplo, num sistema hierárquico, organizacional, ou político, uma “instância superiora”
(uma autoridade constituída, de maior força, um intelecto desenvolvido, uma pessoa/organização/nação com melhores recursos ou maior
poderio econômico) não deve intervir autoritariamente na vida de outrem. A intervenção das instâncias superiores deve ser supletiva e
respeitosa, no sentido de assegurar a vida, a criatividade, a solidariedade, o bem comum e a dignidade. (PONTIFÍCIO CONSELHO “JUSTIÇA E
PAZ”. Compêndio da Doutrina Social da Igreja)
151 Por exemplo: a primazia da destinação universal dos bens sobre a apropriação individual alerta-nos que os bens, criados por Deus ou pelo
trabalho humano, devem visar o benefício de toda família humana. A apropriação individual - chamado direito de propriedade – é uma via
legítima para realizar essa destinação, desde que, situada à luz do princípio, ela seja entendida como um tipo de responsabilidade social e
não como privilégio excludente, pois devemos lembrar que "sobre toda a propriedade privada pesa uma hipoteca social". (JOÃO PAULO II.
Laborem Exercens, n. 11); a primazia do trabalho sobre o capital assegura que o capital "só é legítimo na medida em que serve ao trabalho".
(JOÃO PAULO II. Laborem Exercens, n 14)
Grupo Marista
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a) Na primazia da pessoa em relação ao cargo ou atividade que exerce.
b) Na valorização de seu empenho profissional, apostólico, estudantil e
solidário.
c) Pelo reconhecimento dos dons e talentos colocados a serviço da missão.
d) Ao acolherem-se, Irmãos, Leigas e Leigos, em “torno da mesma mesa”,
como partícipes de uma mesma comunidade de esperança.
e) Ao focarmos as crianças, adolescentes e jovens, sobretudo os mais pobres, como prioridade em nossas decisões. Ao formarmos os jovens
mais abastados para a consciência do serviço à sociedade e ao próximo,
e não para servirem-se da sociedade.
f) Ao propiciarmos espaços acolhedores para todos.
g) Na sensibilidade em ajudar as pessoas a superar suas dores e limitações.
Por outro lado, na celebração das suas conquistas e alegrias da vida.
3.2 Educação emancipadora 152
Ninguém é tão pequeno que não possa ensinar, nem tão grande
que não possa aprender. (Cora Coralina).
[108].A educação é um processo histórico-cultural e exigência constitutiva do ser
humano. Por ela se desenvolvem as capacidades e os fatores de apreensão da
realidade, da criação de saberes e valores, as sensibilidades éticas e estéticas,
as habilidades críticas e analíticas, as competências técnicas e relacionais, as
motivações pessoais e coletivas, a subjetividade e, em síntese, toda cultura
em sua complexidade. O termo educação é, certamente, algo amplo, podendo
englobar expressões técnicas como “formação”, “instrução”, “treinamento”,
“desenvolvimento de pessoas” e outras terminologias usadas segundo processos educativos específicos.
[109].A Instituição Marista, pelo caráter educativo que lhe é intrínseca, concebe
a educação com um processo amplo, contínuo e integrado ao cotidiano das
152 Contribuíram nessa reflexão: Ascânio Sedrez (Colégio Arquidiocesano – SP), Elaine Nascimento (TECPUC), Ir. Lauro Pazeto (LUMEN), Luiza
Helena Giraud (APC - Aliança Saúde), Mari Anastácio (PUCPR - Projeto Comunitário), Neuzita de Paula Soares (DEAS), Silmara de Souza (APC
– Diretoria de Comunicação e Marketing) e Viviane Flores Bazzoli (FTD).
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
pessoas. Se, comumente, a ideia de educação foi delimitada às estratégias de
aprendizagem escolar-acadêmica, há hoje uma percepção mais abrangente de
processos, mediações, meios e espaços que educam. A educação não apenas se
reserva aos ambientes formais (a sala de aula, os eventos acadêmicos, os cursos, etc.), mas é algo que perpassa todas as relações estabelecidas no ambiente de trabalho, no ambiente hospitalar, na relação entre parceiros e clientes,
na comunicação veiculada nos meios de comunicação social e mídias. Desse
modo, há uma predisposição educacional em tudo aquilo que fazemos.
[110].Toda educação leva em conta o tipo de ser humano que se pretende formar e
que tipo de sociedade que se pretende construir. Pode-se afirmar que a educação é sempre um processo intencional de orientação dos sujeitos e que, portanto, não se isenta das relações de poder, podendo cumprir tanto um papel
alienador (conformador ou deturpador da realidade) quanto de emancipação
dos sujeitos nela implicados. Especial cuidado devemos ter com os processos
de educação demasiadamente verticalizados, quando cabe somente a “uns
a autoridade de ensinar” e a “outros a obediência de aprender”. Quando há
uma inteligência privilegiada sobrepondo-se arbitrariamente à outra inteligência, estamos favorecendo situações de embrutecimento. 153 Nesse tipo de
relação, geralmente unilateral, embora possa ter havido ensino, nem sempre
é possível atestar que houve emancipação. Se não considerarmos o sujeito
interlocutor como protagonista de sua educação, certamente corremos o risco de favorecer situações de manipulação ou domesticação, justificadas por
interesses pessoais ou ideológicos.
[111]. Emancipar os sujeitos significa conduzi-los a usar sua própria inteligência
com liberdade, a descobrir seus potenciais e suas responsabilidades para
consigo, para com os outros e para com o mundo. Sem sombra de dúvidas, o
153 Cf. RANCIERE, Jacques. O mestre Ignorante, 2002. Ranciere é propagador das ideias do pedagogo francês Joseph Jacotot, do início do século
XIX. O que Jacotot chamou de embrutecimento, no Brasil aproxima-se da ideia de “educação bancária” que Freire acusou ser uma educação
domesticadora, que prega o conformismo, que treina o educando para o desempenho de suas destrezas. Nessa relação educativa, o
professor é um ser superior que ensina a ignorantes, o dono da verdade dotado de um saber que deve “depositar” no aluno, que se tornam
recipientes passivos do depósito do educador. Contrariando a esta concepção, a educação libertadora percebe a ação educativa como um
processo dialético, fruto de uma práxis, onde professor e alunos conscientizam-se de sua realidade histórica e num processo crítico de
construção e reconstrução da mesma, atuam nela com criticidade. A mesma lógica pode ser aplicada à educação evangelizadora.
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caráter emancipador da educação é aquilo que devemos enaltecer e propagar
em nossos esforços cotidianos.
[112]. A educação emancipadora é aquela que concede ao indivíduo a oportunidade
de reconhecer a si e ao outro como sujeitos autônomos e interdependentes
num processo gerador de humanização. Nesse sentido, “ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo. Os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo” - defendia Freire. A educação assume caráter emancipador
quando cria oportunidades para os sujeitos desenvolverem suas potencialidades e seu livre pensar, incorporando diferentes saberes, conhecimentos
técnicos, linguagens e tecnologias na promoção da investigação, da reflexão,
no posicionamento crítico frente à realidade, fomentando o protagonismo e a
solidariedade, considerada a virtude cristã de nosso tempo.
[113].A emancipação não deve ser considerada subproduto do processo educativo, mas,
sim, a sua prerrogativa definidora. A emancipação deve valer para todas as dimensões da educação: acadêmica, espiritual, afetiva, corporal, religiosa, social,
cultural. Temos, assim, uma educação integral/integradora, que corresponda aos
anseios da vida plena (vida em abundância), tema central da evangelização. 154
[114].Do ponto de vista pastoral, evangelização e educação formam um continuum
onde se fomentam os valores humanos e cristãos, bem como a integração entre
fé e vida. Ter uma visão integradora da pessoa e do seu desenvolvimento significa concebê-la em sua inteireza. Por isso, para Bento XVI, a educação deve ser
considerada “um dos desafios mais urgentes que a Igreja e suas instituições estão
chamadas a enfrentar”. Foi nesse sentido que o XX Capítulo Geral também quis
reafirmar a “educação como espaço privilegiado de evangelização e promoção
humana”. Nesse caso, é dever institucional oportunizar a educação em amplitude, intencionalmente evangelizadora e adequada às questões contemporâneas.
[115].Educar para a vida significa enaltecer a vida como valor universal, respeitar e defender a dignidade do ser humano como premissa da educação,
154 Cf. João 10,10.
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
proporcionando a cada indivíduo a oportunidade de autoconhecimento, de
constatar as diferenças interpessoais e culturais e acolher o outro como verdadeiro outro, com suas limitações, crenças e ideias. Talvez o maior desafio
da educação emancipadora resida na dificuldade de superar o utilitarismo
economicista que lhe dá contornos para permeá-la de valores humanos. Ou
seja, de como se incorporam à educação os valores positivos, construídos,
aprimorados ou revelados por Deus ao longo da evolução humano-social.
[116].Face ao relativismo das sociedades atuais, os valores educacionais, sociais,
políticos, morais e religiosos estão continuamente sendo contestados, postos
em dúvida e até mesmo substituídos por contra valores. Tal situação desafia-nos a comunicar a perenidade dos valores cristãos de modo eficiente e contextualizado155, sobretudo testemunhando-os na prática.
[117].Iniciativas pastorais organizadas sob a lógica da educação emancipadora devem atentar aos seguintes pontos:
a) Privilegiar temáticas contemporâneas, que ajudem a compreender e solucionar os dilemas reais da vida e contribuam no desenvolvimento de
uma visão ampla de pessoa humana.
b) Optar por metodologias que propiciem o diálogo aberto, a participação,
a fala esclarecedora, privilegiando reflexões que ajudem as pessoas a reconhecerem os problemas sob diferentes perspectivas: da ciência, da fé
e da doutrina cristã.
c) Orientar a educação evangelizadora como um processo dialógico supõe
superar a ideia de que trabalhamos com “públicos” ou “destinatários
da evangelização”. É tarefa difícil evangelizar o outro de modo unilateral, embora seja possível criarmos as condições internas e externas de
abertura de coração para evangelizarmo-nos mutuamente. Portanto, no
processo evangelizador é preferível encontrar “interlocutores”. Assim,
é necessário ter escuta sensível, evitando que o ponto de partida do diálogo seja a verdade acabada, o fundamento da autoridade constituída.
155 BUARQUE, Cristóvam. VERVIER, Jacques. Fé, política e cultura: desafios atuais, 1992.
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d) Adequar a linguagem sem perder a essência da mensagem original. A
educação evangelizadora orienta-se a partir da cultura e seus elementos
simbólicos, introduzindo nela novos significados, levando em conta as
características geracionais, regionais, profissionais, sociais e morais.
3.3 Espiritualidade 156
É preciso cultivar sempre um espaço interior que dê sentido cristão ao compromisso e à atividade. (Papa Francisco).
[118].Há várias definições para “espiritualidade”. Numa visão ampla, a espiritualidade pode ser entendida como o dinamismo que motiva e qualifica por inteiro a vida do ser humano, ora enraizada na pessoa, ora na relação com uma
fonte transcendente – um ser superior ou outras compreensões. A espiritualidade se fará visível num projeto compartilhado (instituição religiosa), no
comprometimento ético ou na consagração da vida por uma causa altruísta.
Neste sentido, podemos dizer que este mover-se por uma causa que nos arrasta para além da superfície material, para além de nosso limite cotidiano,
é uma característica intrínseca ao gênero humano, indiferente de credos ou
culturas. Há, portanto, um sentido antropológico de espiritualidade anterior
ao seu sentido religioso.
[119].De modo geral, em diferentes aspectos da vida o ser humano tende a transcender, a ultrapassar o limite do mundo concreto e material – “imanente”,
em sentido lato. Neste nível antropológico, a espiritualidade não está ligada
necessariamente à confessionalidade religiosa, pois ela pode ser pura expressão do espírito humano, em sua natureza própria, independente de ter recebido influência de ensinamentos ou doutrinas. O ser humano é, por natureza,
homo religiosus, que se religa ao transcendente e, assim, relê continuamente a
156 Contribuíram nesta reflexão: Ana Langner (PUCPR - Núcleo de Pastoral), Iliana Biscaia (TECPUC), Ir. Luiz Adriano Ribeiro (Centro Social Ir.
Justino – SP), Ir. Roque Brugnara (Colégio Marista de Joaçaba – SC), Marco Aurélio Ghislandi (DERC), Marilúcia Resende (Setor de Pastoral),
Telma Argolo (APC – Diretoria de Recursos Humanos) e Vanessa Ruthes (Gerência Setor de Humanização – Aliança Saúde).
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
si mesmo e ao mundo onde se insere (religio vem justamente de relegere: religar e/ou reler).
[120].Contudo, há de se reconhecer uma riqueza antiga e sempre nova que emana
das espiritualidades confessionais históricas. As grandes tradições religiosas
têm muito a ensinar ao mundo atual, pois conservam em seu bojo incontáveis legados espirituais, filosóficos e simbólicos: virtudes morais, elementos
identitários, cosmologias, celebração do tempo e dos ciclos naturais, entendimento da natureza e seus poderes, respostas às angústias e sofrimentos humanos. Sem contar o princípio ético áureo compartilhado entre as grandes
religiões: “Não faze ao próximo o que não queres que te façam!”. A partir
do legado de um líder inspirador (profetas, ancestrais, avatares, santos ou
heróis), surgem nuances possíveis que dão à espiritualidade horizontes diferenciados no tempo e no espaço, com linhas muitas vezes convergentes e
complementares. O diálogo fraterno com tantas tradições religiosas é sinal
de maturidade e respeito.
[121]. No âmbito cristão, o termo espiritualidade tem sua raiz etimológica na palavra
spiritus (em latim), como tradução da palavra grega pneuma – usada no Novo
Testamento. Esta, por sua vez, não se fixa no horizonte filosófico dos gregos,
mas é uma versão do termo hebraico ruah – que significa sopro, vento, fôlego
e respiração. Na tradição judaico-cristã, ruah habita o universo como um todo
e também cada criatura; é respiro que move a matéria e vivifica o corpo; é
vento que espalha sementes no deserto, fazendo os oásis florescerem. Ruah é
vínculo, dinamismo e fecundidade. É promotor e aliado da vida humana, planetária e cósmica. Por isso vem simbolizado pelos elementos naturais, como
vento, fogo e água. Esta compreensão de ruah foi sedimentada na tradição
judaica e passou a ser traduzida, no Novo Testamento, como Espírito Santo –
chamado de Fogo, Vento e Água Viva.
[122].No cristianismo, a espiritualidade tem base trinitária: é a vida no Espírito a
partir da vida de Jesus Cristo, o Filho que revela o rosto de Deus como Pai.
Portanto, “quando mencionamos a espiritualidade cristã, referimo-nos ao
fogo inextinguível que arde em nós e nos impregna da paixão pela construção
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71
do Reino de Deus”. 157 Para os cristãos, o sentido da espiritualidade será sempre assimilar Jesus e seu Evangelho, onde se inclui também a ação prática, o
investimento pessoal no projeto de uma “nova humanidade”.
[123].A partir dessa referência, a espiritualidade cristã diz respeito a uma vivência
cotidiana que se concretiza como doação e serviço ao próximo, sobretudo aos
mais necessitados, em seguimento de Jesus Cristo que, sendo Senhor e Messias, lavou os pés dos apóstolos e se fez servidor de todos.158 A partir da liberdade dos filhos de Deus, aderir e vivenciar a espiritualidade cristã significa
aceitar a proposta de Cristo de servir com amor incondicional:
Tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; era
peregrino e me acolhestes; nu e me vestistes; enfermo e me visitastes; estava na prisão e viestes a mim. [...] Senhor, quando foi que
te vimos com fome e te demos de comer, com sede e te demos de
beber? [...] todas as vezes que deixastes de fazer isso a um destes
pequeninos, foi a mim que o deixastes de fazer. (Mt 25, 42-46).
[124].O carisma marista, ao lado de tantos outros, compõe o variado mosaico multicor da fé cristã e católica. São Marcelino Champagnat foi um homem profundamente aberto à ação do Espírito e às necessidades concretas de seu tempo.
Soube transmitir esse legado aos seus Irmãos, a quem chamava de “maravilhosos companheiros”. Portanto, tendo no Evangelho a sua pedra fundamental, a espiritualidade marista emerge na Igreja a partir do fundador, Marcelino Champagnat, com a missão de ser vida plena entre as crianças e jovens,
por meio de processos educativos. O caráter apostólico e marial constituem
o diferencial dessa espiritualidade marista, profundamente prática, com o
olhar fitando o futuro e, ao mesmo tempo, centrada na solidez de Jesus Cristo.
[125].Na medida em que integramos as coisas cotidianas ao nosso projeto de
vida no Espírito, vai se formando o que entendemos por espiritualidade.
157 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Água da Rocha, p. 14.
158 Cf. João 13.
72
Diretrizes da Ação Evangelizadora
“A espiritualidade constrói o modo como compreendemos o mundo, as pessoas, Deus e como nos relacionamos com eles”. 159 Quando dizemos “eu sou
marista”, afirmamos possuir uma espiritualidade específica, que nos conecta
a um conjunto de pessoas (espírito de família) e define nosso ser-em-missão.
Portanto, é uma espiritualidade que se identifica com a tradição de Marcelino. Daí vem nosso amor por Jesus, por Maria e pelas crianças e jovens.
[126].Nossa espiritualidade é apostólica. Isso significa dizer que existimos para tornar
Jesus Cristo conhecido entre as crianças e jovens, por meio dos processos educativos, de forma sempre dinâmica, atualizada e fiel à Igreja. Marcelino dizia
com frequência: “Não posso ver uma criança sem sentir o desejo de ensinar-lhe
o catecismo, sem desejar fazer-lhe compreender quanto Jesus Cristo a amou”.
Incansavelmente, buscamos proporcionar às crianças e aos jovens espaços e
oportunidades em que possam desenvolver a espiritualidade e os valores relacionados ao conhecimento, à liberdade, à responsabilidade, à transcendência,
em vista de se tornarem “bons cristãos e virtuosos cidadãos”.
[127].Nossa espiritualidade é também mariana. Marcelino denominou-nos maristas
por reconhecer em Maria um modelo de seguimento a Jesus. Ela foi considerada pelo fundador como sendo a Primeira Superiora do Instituto, a Conselheira que apontava sempre o caminho a ser seguido. Por isso, também hoje, Maria deve ser considerada como um dos principais legados da nossa herança
espiritual, uma vez que continua apontando para o essencial, para o centro,
para Jesus Cristo, segundo nos ensinou Marcelino: Maria nos leva para Jesus,
pois está sempre com o Filho, ou nos braços ou no coração. Isso inspira uma
maneira própria de acolher e ouvir o chamado de Deus.
Dando-nos o nome de Maria, o Padre Champagnat quis que vivêssemos do seu espírito. Convencido de que ela tudo fez entre
nós, chamava-a Recurso Habitual e Primeira Superiora. Contemplamos a vida de nossa Mãe e Modelo para impregnar-nos de seu
espírito. Suas atitudes de perfeita discípula de Cristo inspiram e
159 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Água da rocha, p. 14.
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pautam nossa maneira de ser e de agir. Havendo Deus dado seu
Filho ao mundo por Maria, queremos torná-la conhecida e amada
como caminho que leva a Jesus. Atualizamos assim nosso lema:
‘Tudo a Jesus por Maria, tudo a Maria para Jesus. 160
[128].Pela espiritualidade marista, alicerçada no Evangelho, encontramos o sentido para todas as nossas iniciativas. Ela abrange todos os âmbitos de nossa
vida. Seria impossível defini-la sem deixar ainda muito a dizer. Ela é também
mistério, habitada pela graça de Deus, embora profundamente humana. Ao
vivê-la, no entanto, ela (a espiritualidade) também deve ser encarnada, atualizada, inculturada; ou seja, deve responder aos desafios do tempo presente e
ser, o quanto possível, a realidade que nos une, que aproxima as diferenças,
que cria sinergia e dá vigor ao nosso existir pessoal e comunitário. É nesse
sentido que nos alerta Francisco:
Do ponto de vista da evangelização, não servem as propostas
místicas desprovidas de um vigoroso compromisso social e missionário, nem os discursos e ações sociais e pastorais sem uma
espiritualidade que transforme o coração. Estas propostas parciais e desagregadoras alcançam só pequenos grupos e não têm
força de ampla penetração, porque mutilam o Evangelho. É preciso cultivar sempre um espaço interior que dê sentido cristão
ao compromisso e à atividade. Sem momentos prolongados de
adoração, de encontro orante com a Palavra, de diálogo sincero
com o Senhor, as tarefas facilmente se esvaziam de significado,
quebrantamo-nos com o cansaço e as dificuldades, e o ardor
apaga-se. 161
160 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS, Constituições e Estatutos, p. 23.
161 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 262.
74
Diretrizes da Ação Evangelizadora
3.4 Alteridade 162
Ou aprendemos a viver como irmãos ou
vamos morrer juntos como idiotas. (Martin Luther King).
[129].O termo da alteridade nos remete à atitude do sujeito (ou da Instituição) em se
abrir ao diálogo respeitoso e ao acolhimento fraterno da diferença do outro,
na qual a diferença é percebida como possibilidade de enriquecimento dos
significados da vida e do mundo. A alteridade, seja motivada pelo senso de
cidadania ou pela virtude religiosa, opõe-se à atitude arrogante que por vezes
limita nossa capacidade de reconhecer no outro a sua dignidade, de identificar significados e sentidos na existência do outro.
[130].A questão da alteridade vem ganhando terreno em muitos âmbitos da sociedade, no meio educacional, político, filosófico ou teológico. Boas contribuições emergem do pensamento do filósofo judeu Emmanuel Levinás. Sobretudo em sua obra intitulada Totalidade e Infinito163, Levinás aborda alternativas
para se pensar a subjetividade no mundo contemporâneo: não mais pensar o
outro a partir da centralidade do eu, mas pensar o lugar do outro em minha
vida, na experiência vital em geral. A partir de sua diferença, ou mesmo de
sua indigência, o rosto do outro se apresenta como revelação, como uma epifania. A atitude que fundamentalmente nos humaniza é o acusativo “Eis-me
aqui”: a sensibilidade e responsabilidade que sentimos pelo outro, a disposição para colocarmo-nos a serviço do outro. Certamente a revelação cristã se
identifica e se aproxima dessas ideias, da abertura solidária e disponível para
um serviço que, muitas vezes, pode ir até as últimas consequências. Sendo
assim, jamais o outro poderia ser concebido como um inferno para o eu – parafraseando “O inferno são os outros” de Sartre –, motivo de inúmeros conflitos, ódio e intolerância.
162 Contribuíram nessa reflexão: Ascânio Sedrez (Colégio Arquidiocesano – SP), Elaine Nascimento (TECPUC), Ir. Lauro Pazeto (LUMEN), Luiza
Helena Giraud (APC - Aliança Saúde), Mari Anastácio (PUCPR - Projeto Comunitário), Neuzita de Paula Soares (DEAS), Silmara de Souza (APC
– Diretoria de Comunicação e Marketing) e Viviane Flores Bazzoli (FTD).
163 LEVINAS, Emmanuel. Ética do Infinito, 1992; LEVINAS, Emmanuel. Totalidade e infinito, 1992.
Grupo Marista
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[131].A alteridade é formulada frente à percepção da existência da diversidade, de
que o mundo é diverso em suas configurações e manifestações. A diversidade
foi engendrada por Deus e é, portanto, expressão da sua infinita sabedoria e,
“se for bem entendida, a diversidade [...] não ameaça a unidade da Igreja”. 164
Deus mesmo se revela como variedade de três Pessoas na comunhão da única
divindade – Pai e Filho e Espírito Santo. Como cristãos, acolhemos a Criação
e as criaturas, ao passo que procuramos desenvolver as sensibilidades necessárias para escutar e acolher o outro em sua dignidade, como ser legítimo e
autêntico, com suas crenças, ideias, limitações e potencialidades. Não obstante, posicionamo-nos de maneira profética e educativa diante das crenças
que ameaçam o valor da vida ou promovem a injustiça.
[132].No âmbito social, temos a percepção de que a sociedade na qual vivemos hoje
é muito mais plural e diversificada do que foi no passado. A dinâmica social
é marcada contundentemente pelos efeitos da globalização econômico-cultural e informacional.
Reconhecemos igualmente que a globalização permitiu à humanidade avançar no campo das comunicações, o que supõe maior
abertura para conhecer outras realidades, ultrapassar fronteiras e sentir que o planeta no qual vivemos é a “casa de todos”.
[...] Além disso, ficou mais fácil trabalhar em rede, em âmbitos
como a defesa da vida, da saúde, dos direitos humanos e do cuidado com o meio ambiente. Finalmente podemos dizer que hoje
conquistaram maior visibilidade algumas realidades humanas
que não eram reconhecidas nem aceitas. 165
[133].Se, por um lado, o mundo tornou-se bem menor nas distâncias, por outro o
mundo tornou-se vasto e complexo nas suas expressões e valores culturais.
Essa fluidez de coisas, de ideias, comportamentos e valores vai, naturalmente,
provocando a dissolução de uma aparente ordem tradicional, causando-nos
164 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 117.
165 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Evangelizadores entre os jovens, n. 7.
76
Diretrizes da Ação Evangelizadora
medo e insegurança. O Ir. Sammon diria que vivemos num momento de
“transição paradigmática”, fenômeno que gera crise em muitas instituições,
sobretudo as religiosas; por sua vez, Papa Francisco analisa o momento atual
como “uma viragem histórica [...]. Esta mudança de época foi causada pelos
enormes saltos qualitativos, quantitativos, velozes e acumulados que se verificam no progresso científico, nas inovações tecnológicas e nas suas rápidas
aplicações em diversos âmbitos da natureza e da vida”. 166
[134].Emerge também no cenário das ciências humanas e políticas as questões da
diferença: o diferente não mais visto como ameaça ou abominação, mas como
ser legítimo em seu tempo e contexto. As diferenças encaradas como aspectos
constituintes da formação humana e da construção social e histórica. O ser
humano é mais propriamente alguém cujo sentido só pode ser encontrado na
sua relação com o outro. É nesse conjunto de discussões características da
pós-modernidade que se insere também o problema da alteridade, do caráter
do que é outro, da diversidade em todas as suas nuances.
[135].No geral, na contemporaneidade, a diversidade cultural é um problema que
assume relevante importância. A pensadora Danah Zohar167 assevera que, ao
sermos perturbados pelas relações de diferença168, geralmente lançamos mão
de três estratégias: a primeira estratégia consiste na dominação, na total eliminação das diferenças por um processo de colonização, na qual os dominadores impõem, por vezes com violência, sua concepção de mundo aos dominados; a segunda estratégia consiste no apartheid, quando se erguem barreiras
físicas, jurídicas ou morais para excluir o outro como indesejável, impuro,
não-semelhante em dignidade; terceira estratégia é a coexistência liberal, que
considera a possibilidade de tolerar o outro como diferente na esfera privada,
enquanto é igual na esfera pública. A coexistência pacífica depende da disposição que temos em tolerar e, em troca, sermos também tolerados.
166 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 52.
167 Autora de O Ser Quântico, A Sociedade Quântica, que propõe aplicar os princípios da física quântica na compreensão da consciência
humana, da psicologia e da organização social. Também autora de Cérebro Corporativo, QS: Inteligência Espiritual e Capital Espiritual.
168 ZOHAR, Danah. Sociedade Quântica: a promessa revolucionária de uma liberdade verdadeira, 2000.
Grupo Marista
77
[136].A alteridade nos remete ao paradigma da multiculturalidade169, a qual propõe que
não só os sujeitos sejam respeitados em suas diferenças, mas que todas as construções culturais sejam consideradas autênticas, opondo-se a uma visão cultural
hegemônica ou homogeneizante. “O multiculturalismo passou a ser a realidade
comum em muitas partes do mundo e isso tem contribuído para a valorização das
diferenças, que vão deixando de ser uma ameaça e passam a se tornar uma oportunidade.” 170 Uma cultura, ao se fechar em si mesma, deixa de compreender que é
fundamental acolhermos os iguais, mas também os diferentes de nós, mesmo no
campo das divergências. 171 A disposição ao diálogo é sempre a melhor solução
para aproximar as pessoas e favorecer a unidade social em meio às diferenças.
[138].Nossa Instituição pode ser pensada como um lugar que permite vivermos
como sujeitos em busca de sentido para suas vidas, que trazem em si sentimentos, crenças, pensamentos e práticas. Desse modo, devemos levar em
consideração a existência da diversidade étnica, cultural e religiosa no seio
da Instituição. Essa diversidade se encontra no âmbito restrito do ambiente
de trabalho, no âmbito Provincial e, de maneira mais marcante, na internacionalidade do Instituto Marista. Para tanto, o XXI Capítulo reforça que devemos nos esforçar em “promover o diálogo intercultural e inter-religioso,
baseado no respeito, crescimento mútuo e nas relações em pé de igualdade
entre diferentes culturas, etnias e religiões”. 174
[137].Qual é, porém, o papel da evangelização na compreensão das diferenças? O
primeiro passo do discípulo, sem sombra de dúvidas, é seguir o exemplo de
Jesus, que saía sem reservas ao encontro do outro. 172 Portanto,
[139].Precisamos fomentar um projeto evangelizador que transcenda as preocupações dogmatizantes e seja capaz de dialogar com a ciência, com diferentes
campos do conhecimento, com as demais religiões, a fim de redescobrir quais
são as raízes morais e éticas da sociedade que nos ensinam a conviver fraternalmente. 175 Mas isso não se faz sem antes nos abrirmos a uma revolução interior, a uma revolução do coração. Se quisermos modificar o coletivo, devemos começar por modificar as nossas percepções interiores, a nossa maneira
de pensar o outro, a nos dispormos a aprender uma linguagem inteiramente
nova, pois alterações superficiais do pensamento não geram transformação
profunda, não convencem, não modificam o ethos social.
As atitudes de alteridade e gratuidade marcam a vida do discípulo missionário de todos os tempos. Alteridade se refere ao
outro, ao próximo, àquele que, em Jesus Cristo, é meu irmão ou
minha irmã, mesmo estando do outro lado do planeta. É o reconhecimento de que o outro é diferente de mim e esta diferença
nos distingue, mas não nos afasta. As diferenças nos atraem e
nos complementam, convidando ao respeito mútuo, ao encontro, ao diálogo, à partilha e ao intercâmbio de vida e solidariedade. Gratuidade e alteridade são, portanto, modos de compreender o que há de mais decisivo em Jesus Cristo. 173
169 De acordo com o Projeto Educativo para o Brasil Marista (PEBM), “O multiculturalismo consiste em um movimento que afirma a necessidade de
incorporar [à nossa visão de mundo] variados cenários – sociais, culturais e políticos –, as tradições culturais (saberes, fazeres, gostos, estéticas,
identidades, subjetividades, visões de mundo, linguagens) de diferentes grupos sociais.“ (UMBRASIL. Projeto Educativo para o Brasil Marista, p. 33
apud SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de Identidade: uma introdução às teorias do currículo, 1999).
170 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Evangelizadores entre os jovens, n. 7.
171 “O conflito não pode ser ignorado ou dissimulado; deve ser aceito. Mas se ficarmos encurralados nele, perdemos a perspectiva, os
horizontes reduzem-se e a própria realidade fica fragmentada. Quando paramos na conjuntura conflitual, perdemos o sentido da unidade
profunda da realidade.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 226).
172 “[...] o Evangelho convida-nos sempre a abraçar o risco do encontro com o rosto do outro, com a sua presença física que interpela, com seus
sofrimentos e suas reivindicações, com a sua alegria contagiosa permanecendo lado a lado. A verdadeira fé no Filho de Deus feito carne é
inseparável do dom de si mesmo, da pertença à comunidade, do serviço, da reconciliação com a carne dos outros. Na sua encarnação, o Filho
de Deus convidou-nos à revolução da ternura.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 88)
173CNBB. Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja do Brasil, 2011-2015, n. 8. 12.
78
Diretrizes da Ação Evangelizadora
[140].À luz da fé, as novas realidades, os novos cenários culturais e o conhecimento
são “novos areópagos” 176 para os quais a atenção evangelizadora deve estar
sensível. Os novos areópagos também são os cenários organizacionais da Instituição, os centros de decisões, os quais precisam ser animados pelos valores
174 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Conclusões do XXI Capítulo Geral, p. 15.
175 Cf. PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, nn. 238-258.
176 Enquanto os apóstolos pregavam na região da Palestina, Paulo, cumprindo o mandato de ser testemunha de Cristo até os extremos da
terra (Cf. At 1,8), deparou-se com a cultura helênica. Depois de pregar com vigor em praças públicas, foi conduzido ao Areópago de Atenas
pelos filósofos epicuristas e estoicos que queriam compreender um pouco mais de sua nova doutrina, que aparentava ser loucura para
os padrões gregos. Paulo foi astuto, pois, em meio à diversidade cultural, anunciou Jesus e a Ressurreição. “Atenienses, percebo que
sois extremamente religiosos. Pois andando e observando os seus lugares de culto, encontrei um altar com essa inscrição: AO DEUS
DESCONHECIDO. Pois bem, eu vos anuncio aquele que venerais sem conhecer. É o Deus que fez o céu, a terra e tudo que eles contêm. Ele é o
Senhor do céu e da terra...” (At 17, 25-25).
Grupo Marista
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maristas e humano-cristãos e, assim, possam desempenhar com fidelidade
sua missão.
[141].A Instituição Marista, embora de explícita identidade cristã e católica, não
coloca obstáculos à diversidade religiosa. Ao contrário, defendemos a fé e a
espiritualidade como dimensões constitutivas do ser humano. A diversidade religiosa é uma das facetas da alteridade, que, portanto, nos convida ao
diálogo. 177 Nesse sentido, respeitamos e incentivamos que as pessoas vivam
a sua fé com fidelidade e coerência. No diálogo ecumênico e inter-religioso
é necessário levar em conta que os sistemas religiosos estão fundados em
tradições e experiências religiosas milenares, que já consolidaram ritos,
doutrinas, conteúdos simbólicos, visões de mundo, crenças em relação ao
sentido da vida, do sofrimento, morte e além-morte. No entanto, apesar de
distintas, há valores e princípios que permitem um núcleo comum de atuação entre os crentes, como o amor, a sacralidade da vida, a responsabilidade
para com os mais fracos, a vocação transcendente da pessoa humana, etc.
As possíveis tensões produzidas pela diversidade serão certamente amenizadas pela solidariedade.
[142].Importa recordar, ainda, que a abertura dialógica a outros sujeitos e culturas,
não é negação do Evangelho, mas exercício de seus valores, destinados a “todas as nações”. 178 Isto se verifica claramente no dia de Pentecostes, quando o
discurso de Pedro é compreendido na multiplicidade de idiomas e culturas.
179
Nosso encontro com o diverso, com o outro, se baseia na encarnação da
Palavra de Deus, Jesus Cristo, o Verbo que ilumina toda a humanidade, além
de nossas fronteiras habituais. 180 Longe de qualquer relativismo, trata-se de
uma nova via de testemunho cristão. 181
177 “Os Padres Sinodais lembraram a importância do respeito pela liberdade religiosa, considerada um direito humano fundamental”. (PAPA
FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 255).
178 Mateus 28,19.
179 Cf. Atos 2,5-11.
180 Cf. João 1,9.
181 CELAM. Documento de Aparecida, n. 239.
80
Diretrizes da Ação Evangelizadora
[143].Para a Igreja, o Evangelho é como um fermento, capaz de elevar em qualquer
cultura aquilo que ela tem de melhor e mais autêntico. Mas efeito contrário
pode ocorrer quando os evangelizadores, em nome da verdade, desprezam
a necessidade da escuta sensível e da alteridade. Nesse sentido, é um cuidado
pastoral promover o diálogo, possibilitando a inclusão de todos e todas em
comunidades de esperança com propósitos éticos, onde todos possam aprender a experimentá-los juntos.
3.5 Solidariedade Socioambiental 182
Solidariedade é a determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum; ou seja, pelo bem de todos e de cada
um, porque todos nós somos verdadeiramente responsáveis
por todos. (João Paulo II).
[144].O tema da solidariedade transita por diversos campos de sentido, nem sempre
ligados à base etimológica solidum (em latim), cujo significado aproxima-se de
consolidar, confortar. Nos últimos anos, o Instituto Marista tem se empenhado
em alinhar a compreensão do tema como também das políticas que tornam a
prática da solidariedade mais efetiva e sistêmica, sobretudo em relação ao seu
caráter de assistência social, promoção e defesa dos direitos das infâncias e juventudes. No Grupo Marista, a Rede Marista de Solidariedade (RMS) tem zelado para que a solidariedade incorpore-se à cultura institucional, ajuste-se ao
marco legal e seja fortalecida através das redes de solidariedade, de maneira
a concretizar a missão institucional, que se expressa tanto na evangelização
quanto na ação social. Para a Rede Marista de Solidariedade, “a solidariedade
é um convite pessoal e coletivo, que usualmente se traduz em uma causa de
interesse comum que congrega pessoas e recursos, a fim de melhorar a ‘Casa
de todos. ’”.183 Em consonância com esse conjunto de reflexões, o sentido que
182 Contribuíram nessa reflexão: Ana Cristina de Carvalho (TECPUC), Carolina Feltrin (APC– Diretoria de Recursos Humanos), Ione Anhaia dos
Santos (Centro Social Ir. Walmir - Criciúma), Juliana Schwarz (ABEC-UCE – Recursos Humanos), Maria Helena Negrão (Colégio Marista de
Londrina – PR), Marco Aurélio Ghislandi (DERC), Raimundo Policarpo de Souza (APC - Logística), Tupiná Machado (Aliança Saúde) e Vera Lúcia
Costa da Silva (PUCPR - Núcleo de Pastoral).
183 GRUPO MARISTA. Diretrizes e Direcionamentos para a Rede Marista de Solidariedade, 2012.
Grupo Marista
81
pretendemos abordar no presente documento se refere ao caráter virtuoso,
ético e espiritual da solidariedade.
[145].Observa-se que o empenho para promover a cultura da solidariedade em
tempos atuais aponta, em geral, para dois caminhos complementares: no primeiro, temos a relação de cooperação dos sujeitos entre si, entre as comunidades e nações. Ou seja, nesse caso a ênfase recai nas relações humanas; no
segundo caminho, vemos ênfase nas relações de simbiose e interdependência
entre os seres humanos com a natureza e demais seres que compartilham do
mesmo ecossistema. Não obstante, nada impede que as duas perspectivas caminhem juntas, de maneira complementar. Sendo assim, desejamos fomentar uma cultura de solidariedade de caráter social e ambiental, favorecendo
as condições pastorais necessárias para a constituição dos sujeitos solidários,
seja nas relações humanas como nas relações com a natureza e seus sistemas.
Solidariedade, no sentido de “cuidado com o planeta”, nunca deve prescindir
do “cuidado com os pobres, oprimidos, excluídos”. 184
[146].O termo solidariedade ganha maior relevância a partir do século XX. Não
é um vocábulo encontrado nas Escrituras Sagradas, embora sua semântica
coincida com a mensagem do Evangelho, equivalendo-se à prática da caridade, da generosidade, da fraternidade e amor ao próximo, lições recorrentes
nos textos sagrados, sobretudo nos evangelhos. Neste sentido, a solidariedade é uma tradução recente daquilo que o Evangelho propõe como prática das
“bem-aventuranças”. “A palavra ‘solidariedade’ significa muito mais do que
alguns atos esporádicos de generosidade; supõe a criação de uma nova mentalidade que pense em termos de comunidade, de prioridade da vida de todos
sobre a apropriação dos bens por parte de alguns.” 185
todas as relações sociais concretas. Somente pelo caminho da solidariedade é possível integrarmos as pessoas, as nações e a natureza como partícipes do banquete da vida apregoado por Jesus Cristo, para o qual todos são
igualmente convidados.
[148].O princípio da solidariedade – maneira como é comumente abordada na Doutrina Social da Igreja – assevera que o ser humano cresce em valor e dignidade na medida em que investe suas capacidades e seu dinamismo na promoção do outro, na dignificação do próximo. Desenvolver a “pessoa solidária”
187
como projeto para a nova humanidade é um dos objetivos centrais da antropologia cristã. É pela solidariedade que se chega à justiça, pois “não há
pessoa solidária sem compromisso com a vida de todos, particularmente dos
pobres”. 188 Dessa maneira, “a pessoa solidária é o sujeito, o cidadão, o cristão
protagonista que enxerga as situações de injustiça e se mobiliza efetivamente
em prol de causas”. 189
[149].Em relação à preocupação da Igreja diante das causas sociais, o Papa Paulo
VI exortava:
Nosso primeiro dever neste campo é afirmar os princípios, observar e analisar as necessidades, declarar os valores primordiais, apoiar os programas sociais e técnicos verdadeiramente
úteis e marcados com o selo da justiça, em seu caminho rumo a
uma ordem nova e ao bem comum, formar sacerdotes e leigos
no conhecimento dos problemas sociais, encaminhar os leigos
bem preparados para a grande obra da solução de tais problemas, considerando tudo sob a luz cristã que nos faz descobrir o
homem em primeiro lugar e os demais bens subordinados à promoção total do homem no tempo é à salvação na eternidade. 190
[147].Na Doutrina Social da Igreja, a solidariedade aparece como “a virtude cristã dos nossos tempos, um imperativo moral para toda a humanidade” 186,
ou seja, é um princípio ético cuja aplicabilidade vale analogicamente para
184 BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano, p. 133 -140.
185 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 188.
186 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Missão Educativa Marista, n. 153.
82
Diretrizes da Ação Evangelizadora
187
188
189
190
ANTONCICH, Ricardo; SANS, José Miguel M. Ensino Social da Igreja, p. 14.
ANTONCICH, Ricardo; SANS, José Miguel M. Ensino Social da Igreja, p. 87.
GRUPO MARISTA. Diretrizes e direcionamentos para a Rede Marista de Solidariedade.
Discurso de Paulo VI na Abertura da II Conferência Episcopal Latino Americana em Medelín. III – Orientações Sociais. Disponível em: <http://
www.vatican.va>.
Grupo Marista
83
[150].Ao anunciar o seu conceito de solidariedade, o Papa João Paulo II a designava
como “determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum;
ou seja, pelo bem de todos e de cada um, porque todos nós somos verdadeiramente responsáveis por todos”. 191 Essa ideia é inovadora no pensamento
cristão contemporâneo, na medida em que
[João Paulo II] distingue solidariedade-fato (todos nós somos
verdadeiramente responsáveis por todos) de solidariedade-dever (determinação firme e perseverante de se empenhar pelo
bem comum). Está claro que, para João Paulo II, a solidariedade
é uma virtude cristã muito próxima da caridade e que, pela fé,
pode revestir-se de dimensões especificamente cristãs. 192
[151].Gutierrez, teólogo, expressa uma compreensão do tema muito próxima à de
João Paulo II: “[...] enquanto o papa sugere uma firme determinação em favor
da comunhão, Gutierrez propõe um ‘amor eficaz’”. 193 De certa forma, é análoga à percepção de Champagnat ao afirmar que “para bem educar, é necessário
amar”, ou seja, que o amor é precondição para a eficácia da educação, da solidariedade, da catequese e demais aspectos da atuação apostólica.
[152].O sentido de amor eficaz nos impele, enquanto Grupo Marista, a otimizar investimentos e recursos na ampliação e qualificação do atendimento social, na
oferta da educação formal, na educação profissionalizante, no apoio socioeducativo, no atendimento à saúde, no monitoramento, promoção e defesa dos
direitos das crianças, jovens, além de iniciativas de suporte à suas famílias
e comunidades. Multiplicam-se, em todas as nossas frentes apostólicas, os
projetos de voluntariado que favorecem a imersão de jovens e pessoas de boa
vontade no atendimento humanitário. Há também apoio institucional a um
conjunto significativo de iniciativas governamentais e não governamentais
que visam a construção de uma sociedade mais justa e solidária. Isso porque
compreendemos que “o resgate da dignidade humana não pode limitar-se à
191 JOÃO PAULO II. Sollicitudo rei socialis, n. 38.
192 ALMEIDA, João Carlos. Teologia da solidariedade, p. 235.
193 ALMEIDA, João Carlos. Teologia da solidariedade, p. 236.
84
Diretrizes da Ação Evangelizadora
assistência emergencial, mas exige a transformação da sociedade, numa ordem voltada para o bem comum” 194, pois “a necessidade de resolver as causas
estruturais da pobreza não pode esperar”. 195
[153].Tanto no sentido ético quanto político, podemos afirmar que o ser humano
é desafiado a assumir sua “cidadania planetária”, ou seja, assumir o “compromisso ético-político com uma prática sociocultural que respeita a vida em
toda a sua complexidade e diversidade, orientando para a construção da cidadania terrena e para a criação de um sentimento de pertença, de que somos
partícipes de uma comunidade planetária”. 196 Nesse caso, nosso outro, ou
nosso próximo – conforme aprendemos no Evangelho segundo Lucas 10, 29
–, não poderia também ser a natureza em suas incontáveis expressões vitais?
[154].“O movimento ecologista, diante das destruições do mundo e dos perigos que
nos espreitam, entendeu o seguinte: que a natureza nos traz uma mensagem
e temos de prestar atenção a essa mensagem da natureza”. 197 É visto que a natureza também clama por justiça e se expressa, por vezes, de modo não verbal, de maneira a impor limites às nossas ambições. As novas gerações já têm
entendido tal recado, tendo acolhido a ideia do planeta como casa-comum198,
como comunidade ampliada onde tudo de bom ou ruim é compartilhado globalmente. Nesse sentido, fomentar uma cultura solidária de caráter ambiental vem tornando-se um imperativo vital para o mundo globalizado; somos
interpelados, nessa questão, pelas palavras do Papa: “Nós, os seres humanos,
não somos meramente beneficiários, mas guardiões das outras criaturas [...]
Não deixemos que, à nossa passagem, fiquem sinais de destruição e de morte
que afetem a nossa vida e a das gerações futuras”. 199
[155].Harmonizando fé e razão, os cristãos são desafiados a desenvolver uma consciência ecológica e a assumirem uma posição mais contundente em prol da
194
195
196
197
198
199
CNBB. Exigências Evangélicas e Éticas de Suspensão da Miséria e da Fome, n. 20.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 202.
UMBRASIL. Projeto Educativo do Brasil Marista, p. 18.
RATZINGER, Joseph; D’ARCAIS, Paolo F. Deus existe?, p. 78.
Cf. BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano, p. 27.
PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 215.
Grupo Marista
85
sustentabilidade e da justiça socioambiental. Como salienta o Documento de
Aparecida200, na crise ambiental ouvimos o clamor da Criação pelo respeito e
manutenção da biodiversidade201, como também ouvimos o clamor dos povos
ribeirinhos, dos indígenas, das sociedades extrativistas e outras frente a um
sistema econômico voraz. Todos eles dependem da preservação dos recursos
naturais para sua sobrevivência, manutenção de suas identidades e culturas.
ambiental e investimentos que priorizem o meio-ambiente. Unem-se, portanto, três aspectos de nossa coabitação terrestre: o ecológico, que pressupõe o
respeito às lógicas da Casa-Terra; o econômico, que defende a prioridade da
Casa-Terra sobre outros interesses de mercado; e o ecumênico, que apregoa
a concórdia dos habitantes para o bem da Casa-Terra. Note-se que estes três
aspectos da vida humana/planetária derivam do mesmo termo: oikos, casa.
[156].Da posição de dominadores – resultado, talvez, de uma interpretação equivocada do mandato “crescei e multiplicai-vos, enchei e dominai a terra. Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais
que se movem na terra...” 202 –, passamos pouco a pouco ao paradigma do ser
humano “cuidador”, desafiado a desenvolver em sua ética a sensibilidade do
cuidado com a vida. 203 A natureza, além de sagrada, é um grande sistema
vivo que interliga204, de maneira complexa e complementar, todos os seres
que a habitam. O ser humano, imagem e semelhança de Deus, é parte desse
grande e complexo sistema. Isso pressupõe o desenvolvimento de uma consciência de justiça e não de superioridade diante da diversidade planetária.
[158].A missão do Grupo Marista é bastante assertiva ao propor “formar cidadãos
humanos, éticos, justos e solidários em vista da transformação da sociedade,
fundamentada nos valores do Evangelho, do jeito Marista”. 206 Como maristas, inspirados no modelo de Maria, mãe e mulher, a lógica do cuidado e da
solidariedade não nos parece nada estranha. A dimensão da solidariedade
(Maria que visita sua prima Isabel) e a dimensão do cuidado (Maria que traz
o Menino Jesus em seus braços) constituem nosso alicerce pedagógico.
[157].O cuidado é um paradigma de inspiração bíblica: “Deus plantou um jardim
em Éden e ali colocou o ser humano para cultivar e guardá-lo”.205 A dimensão
do cuidado, tão apregoada atualmente, precisa ultrapassar a visão afetiva ou
meramente mítica da natureza e do planeta. A consciência de que habitamos
uma casa-comum (oikos, em grego) pede revisão de comportamentos, educação
200 Ver CELAM. Documento de Aparecida, nn. 83 a 87.
201 Cf. Romanos 8,20-25.
202 Disse Deus: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Domine sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais
domésticos, sobre os animais selvagens e sobre todos os répteis que rastejam pela terra”. 27Deus criou o ser humano à sua imagem, criou-o
à imagem de Deus. Ele o criou homem e mulher. 28Deus abençoou-os, dizendo: “Crescei e multiplicai-vos, enchei e dominai a terra. Dominai
sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se movem na terra”. 29Disse Deus: “Dou-vos todas as plantas com
semente que existem em toda a superfície da terra, assim como todas as árvores de fruto com semente, para que vos sirvam de alimento.
30
E a todos os animais da terra, a todas as aves do céu e a todos os seres vivos que se movem na terra dou as plantas verdes como alimento”.
E assim sucedeu. (Gn 1,26-30).
203 Para Leonardo Boff, “cuidar é mais que um ato; é uma atitude. Portanto, abrange mais que um momento atenção, de zelo e de desvelo.
Representa uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro. [...] O cuidado entra na
natureza e na constituição do ser humano. O modo-de-ser cuidado revela de maneira concreta como é o ser humano”. Cf. BOFF, Leonardo.
Saber cuidar: ética do humano, p. 33-34.
204 Capra aprofunda essa ideia no que ele chama de “paradigma da ecologia profunda”. (Cf. CAPRA, Fritjof. A teia da vida, p. 25.
205 Gênesis 2,15.
86
Diretrizes da Ação Evangelizadora
[159].A solidariedade é, portanto, uma experiência espiritual, expressão da fé cristã encarnada, na medida em que não envolve apenas conhecer a realidade do
outro, mas intervir na realidade do outro e também amar o outro. Pressupõe
ter compaixão, dedicar amor, partilhar o pão. A Palavra de Deus nos desafia
a nos colocarmos em ação junto à realidade das pessoas mais fragilizadas.
Nesse ponto, até os céticos207 reconhecem que o Evangelho permite ampliar o
núcleo de valores comuns entre crentes e não crentes.
[160].São grandes desafios, oportunidades e perspectivas para colocarmos a termo
uma solidariedade ampliada, de caráter interpessoal, social e ambiental. Para
tanto, nos projetos e ações pastorais faz-se necessário:
a) Fomentar práticas solidárias no âmbito interno e externo da Instituição
Marista, com ênfase em ações sociais emancipatórias e comunitárias.
b) Formar redes de solidariedade com o intuito de agregar forças transformadoras construtivas, engajadas em causas sociais e humanitárias.
206 PMBCS. Plano Estratégico da Província Marista Brasil Centro-Sul, 2010.
207 Intelectuais não crentes, como D’Arcais, reconhecem que “carecer de fé torna muito mais difícil a capacidade de renunciar ao egoísmo, de
sacrificar-se pelos outros”. A pedra de tropeço dos céticos é, sem dúvida, a dificuldade em superar o individualismo, de sacrificar a si para
ter fé no outro. (RATZINGER, Joseph; D’ARCAIS, Paolo F. Deus Existe?, p. 81)
Grupo Marista
87
c) Educar para as escolhas de consumo que impactem o mundo de maneira
menos predatória e mais sustentável, assegurando melhores condições
de vida para as futuras gerações.
d) Aperfeiçoar pessoas, espaços e direcionar recursos para projetos de solidariedade consistentes.
e) Fomentar a formação de voluntários e/ou projetos de voluntariado em
nível local, regional, interprovincial e internacional.
3.6 Catequese 208
Fale-me e esquecerei; mostre e lembrarei; envolva-me e, então, entenderei.
(Confúcio).
[161].No amplo processo de evangelização, a catequese desponta como a dimensão de educação e amadurecimento continuado da fé. Sua especificidade é
transmitir ou ecoar fielmente a Palavra de Deus na comunidade de discípulos – que é a Igreja. Daí o caráter essencialmente confessional e eclesial da
catequese. Assim, pela catequese a Igreja “deve tornar a fé viva, explícita e
prática”, conduzindo cada batizado “à maturidade cristã”. 209
[162].A palavra “catequese” deriva do verbo grego katechein, que indica a ação de
ressoar, ou seja, soar novamente, fazer eco. Ela deve ser entendida como uma
continuação do keryssein, do anunciar a Palavra (kerygma = anúncio). Ela necessita do didaskein, do ensinar, mas não se limita a ele e deve, por fim, levar
ao martýresthai, ao testemunhar a Palavra. Temos, portanto, um itinerário
pedagógico intrínseco à catequese: anúncio da Palavra (kerygma); ressoar
da Palavra nos corações (katechein), aprendizado continuado da Palavra (didaskalia); testemunho prático da Palavra (martyria).
208 Contribuíram nesta reflexão: Ana Langner (PUCPR - Núcleo de Pastoral), Iliana Biscaia (TECPUC), Ir. Luiz Adriano (Centro Social Ir. Justino
– SP), Ir. Roque Brugnara (Colégio Marista de Joaçaba – SC), Marco Aurélio Ghislandi (DERC), Marilúcia Resende (Setor de Pastoral), Telma
Argolo (APC – Diretoria de Recursos Humanos) e Vanessa Ruthes (Gerência Setor de Humanização – Aliança Saúde).
209 SANTA SÉ. Diretório Geral para a Catequese, n. 21.
88
Diretrizes da Ação Evangelizadora
[163].Percebe-se, assim, que a catequese não se constitui um simples ensino. Ela
necessita de técnicas que a auxiliem210, mas não se limita a elas. Não se constitui um primeiro anúncio; contudo, na sociedade laical, necessita também
suscitar a fé. 211 Não é o testemunho da Palavra, mas deve levar a este. 212 Como
uma ação eclesial, deve estar unida à Igreja particular213, para que possa realizar o processo gradativo de formação e de inserção nos mistérios de fé. 214
Assim, a catequese pode ser compreendida como uma ação eclesial que se
constitui em Ministério da Palavra, que a partir das fontes da Revelação (Sagrada Escritura e Tradição) busca gerar um aprofundamento gradativo na fé,
que leve o catequizando a “conhecer, acolher, celebrar e vivenciar o mistério
de Deus”. 215
[164].A catequese, portanto, se constitui em processo gradativo de formação na
fé, “trata, de forma sistemática, de um todo elementar e coerente, que forneça base sólida para a caminhada rumo à maturidade em Cristo”. 216 Ela se
estabelece um itinerário “prolongado de preparação e compreensão vital,
de acolhimento dos grandes segredos da fé, da vida nova revelada em Cristo
Jesus e celebrada na liturgia”. 217 Algumas passagens da Sagrada Escritura são ilustrativas neste sentido, em especial a passagem dos discípulos de
Emaús. 218 Nela encontram-se todos os elementos necessários para compreender a catequese como itinerário: o caminho219; o aproximar-se de Jesus220;
a formação que é feita enquanto caminham221; a necessidade de pertença222;
210
211
212
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218
219
220
221
222
Cf. JOÃO PAULO II. Catechesi tradendae, n. 46; CNBB. Diretório Nacional da Catequese, n. 151.
Cf. CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 29.
Cf. CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 34.
Cf. SANTA SÉ. Diretório Geral para a Catequese, n. 265; CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 231-232.
Cf. CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 233.
CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 43.
CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 38.
CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 37.
Cf. Lc 24, 13-35.
Lc 24, 13.
Lc 24, 15.
Lc 24, 25-27.
Lc 24, 29.
Grupo Marista
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a celebração como fecundidade da vida de fé223; o testemunho como impulso
de ardor e zelo. 224
[165].Todos esses elementos permeiam o itinerário catequético e, a partir deles,
com o auxílio das ciências pedagógicas225, deve-se estruturar “um processo
de educação gradual e progressivo, respeitando os ritmos de crescimento”. 226
A variedade de métodos é grande227, mas todos eles devem estar pautados na
pedagogia divina. A finalidade última de todo processo catequético é o encontro existencial com Jesus Cristo em meio à comunidade de fé. 228
[166].A catequese possui diferentes interlocutores: crianças, adolescentes, jovens e
adultos, tornando-se importante levar em conta os aspectos antropológicos,
psicológicos e teológicos, a fim de melhor integrá-los no caminho de fé. 229
[167].A partir desta perspectiva comunitária, é fundamental ressaltar que a “liturgia é fonte inesgotável da catequese. Nela se encontram a ação santificadora
de Deus e a expressão orante da fé da comunidade”. 230 Ela é “o cimo para o
qual se dirige a ação da Igreja e, ao mesmo tempo, a fonte donde emana a sua
força” 231, é através dela que “Deus fala a seu povo [...] e esse responde com
cânticos e orações” 232, tornando-se, portanto, um itinerário de formação na
fé. Assim, pois, a proclamação da Palavra, a homilia, as oblações, orações,
ritos sacramentais, a vivência dos diferentes tempos litúrgicos e solenidades
se constituem momentos de aprofundamento na fé.
[168].A catequese pode apresentar-se de diferentes formas: como um processo de
iniciação à fé; como um processo permanente; como o intuito de receber os
223 Lc 24, 30-31.
224 Lc 24, 32-33.
225 Cf. CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 150.
226 CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 41.
227 Cf. JOÃO PAULO II, Catechesi Tradendae, n. 51; CNBB. Diretório Nacional de Catequese, ns. 152-164.
228 Cf. CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 144.
229 Cf. CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 180.
230 CNBB. Catequese Renovada. 89; Cf. Sacrosanctum Concilium, n. 14.
231 Sacrosanctum Concilium, n. 10.
232 Sacrosanctum Concilium, n. 33.
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
sacramentos de iniciação cristã; realizada de forma ocasional; e no âmbito
familiar. Assim, para uma melhor compreensão da dinâmica catequética, se
torna importante compreender, na sequência, cada uma dessas formas.
[169].Catequese como processo de iniciação à vida de fé: a iniciação religiosa é uma
prática que remonta às antigas culturas; seu objetivo é inserir o fiel em um
itinerário de vida e fé, que gere uma adesão às verdades que este confessa. A
catequese como iniciação não se constitui em uma “supérflua introdução na
fé, um verniz ou um cursinho de admissão à Igreja” 233; é muito mais do que
ensinar uma doutrina, pois ultrapassa uma mera compreensão racional da
fé, tratando-se de uma adesão a Jesus Cristo. A iniciação deve ser compreendida como um processo a ser percorrido, com metas, exercícios e ritos. É
um itinerário prolongado de preparação e compreensão vital, de acolhimento
dos grandes segredos da fé, dos mistérios e da vida nova revelada em Cristo
Jesus e celebrada na liturgia. Esse deve ser estruturado de forma elementar e
coerente, integrando as seguintes dimensões:234 antropológica, afetivo-interpretativa, cristológica, pneumatológica, celebrativa, comunitário-participativa, sociotransformadora e inculturada, intelectual, ecumênica e ecológica.
[170].Catequese como processo permanente: outra compreensão da catequese é de
que deve ser um processo permanente. O Papa João Paulo II ressaltou que
ela deve possuir um sentido lato, isto é, um sentido amplo, pois constitui o
aprofundamento das verdades que tocaram o coração humano no querigma
(kerygma = anúncio do Evangelho). Esse processo não está em contradição
com o sentido estrito de catequese entendido como iniciação, mas dela é prolongamento, visando uma formação contínua dos fiéis: um aprofundamento
contínuo da fé235, como também um revigoramento desta. 236 Essa forma de
catequese pode ser reconhecida por meio dos cursos de formação para leigos,
233 CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n.37.
234 Cf. CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 38.
235 No Brasil essa concepção se tornou clara em 1983 com a publicação do Documento Catequese Renovada, que, demonstrando as
modificações ocorridas no século XX, ressalta a necessidade de “um tipo de catequese que, além de uma sólida fundamentação da fé, seja
capaz de ajudar o cristão a converter-se e a comprometer-se no seio de uma comunidade cristã para a transformação do mundo”. (CNBB.
Catequese Renovada, n. 19)
236 Cf. JOÃO PAULO II. Catechesi tradendae, n. 25; CELAM. Documento de Aparecida, nn. 295-299.
Grupo Marista
91
círculos bíblicos, grupos de reflexão, grupos de oração e vivência e tantas
outras formas que buscam um aprofundamento permanente de sua fé. Cabe
ressaltar que esse processo catequético deve procurar unir: “fé e vida; dimensão pessoal e comunitária; instrução doutrinária e educação integral; conversão a Deus e atuação transformadora da realidade; celebração dos mistérios e
da caminhada com o povo”. 237
[171].Catequese Ocasional: a catequese nem sempre é sistemática, pois existem algumas ocasiões propícias nas quais se pode evangelizar238, principalmente
quando se trata de adultos. Assim, busca-se interpretar e viver as diversas
circunstâncias da vida pessoal (aniversário), familiar (casamentos, funerais,
etc.), social (visita aos enfermos) e eclesial (festas litúrgicas), a partir da perspectiva da fé. 239
[172].Catequese Sacramental: a catequese está intrinsecamente ligada com a ação litúrgica e com os sacramentos. 240 Contudo, a sua finalidade não é “recepção
sacramental” como objetivo final, mas, sim, ser um processo que “conduz a
entrega do coração a Deus, à comunhão com a Igreja e à participação em sua
missão”. 241 A catequese sacramental não se fixa no rito, mas quer levar ao
discipulado nutrido pelos sacramentos. Assim, percebe-se a necessidade de
mudança de uma concepção sacramentalista de catequese para uma concepção iniciática.
[173].Catequese Familiar: a família é considera a “Igreja Doméstica” 242, “é a escola
de fé” 243; portanto, “os pais devem ser para seus filhos os primeiros mestres
da fé” 244, ser os doadores dos primeiros fundamentos da consciência religiosa. 245 Assim, é necessário, por parte da Igreja, não só orientar os pais para
237 CNBB. Catequese Renovada, n. 29.
238 JOÃO PAULO II. Catechesi tradendae, n. 21.
239 Cf. SANTA SÉ. Diretório Geral para a Catequese, n. 71.
240 Cf. JOÃO PAULO II. Catechesi tradendae, n. 23.
241 CNBB. Diretório Nacional de Catequese, n. 43.
242 Lumem Gentium, n 11.
243 CELAM. Documento de Aparecida, n. 114.
244 Gaudium et Spes, n. 2.
245 SANTA SÉ. Diretório Geral para a Catequese, n. 255.
92
Diretrizes da Ação Evangelizadora
“darem uma formação consciente e cristã aos filhos, mas para eles mesmos
crescerem em seu compromisso cristão”. 246 Um dos grandes desafios da
atualidade é a crise (estrutural e de fé) pela qual as famílias estão passando,
sendo, portanto, importante criar estratégias de ação pastoral integradas e
efetivas, pois não se pode abrir mão da importância dessas no processo de
educação na fé, tendo em vista que a “catequese familiar precede, acompanha
e enriquece todas as outras formas de catequese”. 247
[174].No Grupo Marista, a ação catequética contempla formas elementares: sistemática, sacramental, de iniciação, ocasional e familiar. Pela ação pastoral, ela
deve estar presente em nossas iniciativas apostólicas: nas homilias proferidas nas celebrações, nos momentos formativos realizados com alunos, educadores, colaboradores, familiares e Leigos Maristas em geral; nas ocasiões
comemorativas realizadas permanentemente; e nas ocasiões específicas de
imersão na vivência sacramental. Enquanto processo permanente, necessário se faz compreender a catequese no Grupo Marista como uma ação eclesial
que deve focar e vivência comunitária “além-fronteiras”.
[175].As nossas frentes apostólicas são tidas como espaços privilegiados de educação da fé, embora tendo muitos de seus interlocutores em caráter de transitoriedade. Desta forma, a ação pastoral e catequética deve levar os interlocutores à imersão na comunidade eclesial em geral, seja ela de caráter paroquial
ou diocesano. A dimensão permanente de catequese implica um processo
formativo na fé realizado por cada interlocutor até o fim de sua vida. E isso
se dá no seio da Igreja, em suas mais diversas instâncias evangelizadoras. 248
[176].Outro aspecto catequético que nos desafia enquanto comunidades educativas
é a dimensão da linguagem. No Grupo Marista a catequese deve ser realizada
246 CNBB. Catequese Renovada, 123.
247 JOÃO PAULO II. Catechesi tradendae, n. 68.
248 “As [...] instituições eclesiais, comunidades de base e pequenas comunidades, movimentos e outras formas de associação são uma riqueza
da Igreja que o Espírito suscita para evangelizar todos os ambientes e setores. Frequentemente trazem um novo ardor evangelizador e
uma capacidade de diálogo com o mundo que renovam a Igreja. Mas é muito salutar que não percam o contato com esta realidade muito
rica da paróquia local e que se integrem de bom grado na pastoral orgânica da Igreja particular. Esta integração evitará que fiquem só com
uma parte do Evangelho e da Igreja, ou que se transformem em nómades sem raízes.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii
Gaudium, n. 29)
Grupo Marista
93
de forma inculturada, buscando a aproximação dos conteúdos fundamentais
da Sagrada Escritura e do Magistério Eclesial às realidades de nossos educandos, familiares, educadores, colaboradores e Leigos Maristas em geral,
como nos aconselha o Bispo de Roma: “Portanto, convém ser realistas e não
dar por suposto que os nossos interlocutores conhecem o horizonte completo
daquilo que dizemos ou que eles podem relacionar o nosso discurso com o
núcleo essencial do Evangelho que lhe confere sentido, beleza e fascínio. Uma
pastoral em chave missionária não está obcecada pela transmissão desarticulada de uma imensidade de doutrinas que se tentam impor à força de insistir.
Quando se assume um objetivo pastoral e um estilo missionário, que chegue
realmente a todos sem exceções nem exclusões, o anúncio concentra-se no
essencial, no que é mais belo, mais importante, mais atraente e, ao mesmo
tempo, mais necessário. A proposta acaba simplificada, sem com isso perder profundidade e verdade, e assim se torna mais convincente e radiosa”.
249
Essa dimensão de inculturação é realizada tanto na dimensão catequética
propriamente dita, com caráter explícito, como quando considerada instância de diálogo cultural.
[177].Nos processos catequéticos explícitos, buscamos tornar evidentes os elementos doutrinais confessionais católicos próprios daqueles que já abraçaram
essa confissão de fé. Essa dimensão catequética é sempre opcional, pois necessita em si mesma de uma prévia adesão de resposta afirmativa do interlocutor ao anúncio evangelizador realizado a partir da Igreja de forma geral. E
mesmo aos que livremente aderem à fé católica, a catequese deve ser profundamente significativa. Deve ser também resposta aos anseios das pessoas de
hoje, com suas expectativas próprias de um contexto global, com pertinência
planetárias e em constante e acelerada mutação.
[178].Nos processos educativos em geral, buscamos identificar os elementos que
são comuns entre a educação formal e a educação na fé, e reforçamos aqueles
que promovem a dignidade humana em sua totalidade. A doutrina cristã e
a vivência das comunidades de fé têm muito a contribuir com a cultura, a
249 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, nn. 34.35.
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
ciência e os interesses éticos que compõem a sociedade atual. Neste âmbito,
o respeito aos membros de nossas comunidades educativas que processam
outras confissões religiosas é também um indicador e objetivo da educação
católica. Como Maristas, temos a ação catequética como vocação, sobretudo
quando realizada entre as crianças e os jovens.
3.7 Infâncias e Juventudes 250
Acreditamos que estamos convidados a
nos tornarmos uma referência da Igreja no que se refere à evangelização de
crianças e jovens pobres, onde quer que
eles estejam. (Emili Turu).
Não meçais esforços na formação dos jovens. (Papa Francisco).
[179].Precisamos nos indagar com certa regularidade sobre o lugar reservado às
crianças e jovens em nossas prioridades. Lembremos que eles estão no cerne
de nossa missão, são eles os sujeitos para os quais Marcelino Champagnat dedicou toda a sua obra apostólica. Hoje, nosso compromisso com as infâncias,
adolescências e juventudes se materializa, sobretudo, na oferta da educação
cristã, na catequese, na solidariedade, na defesa, promoção e garantia dos direitos desses sujeitos.
[180].As Constituições Maristas conclamam: “Vamos aos jovens lá onde eles estão.
Vamos com ousadia aos ambientes, talvez inexplorados, onde a espera de
Cristo se revela na pobreza material e espiritual”. 251 Mesmo quando não é
possível estar presencialmente nos lugares aonde os jovens se encontram, é
nossa missão oportunizar às crianças e aos jovens, através de nossas escolhas
250 Contribuíram nessa reflexão: Caroline Fagundes (LUMEN), Diogo Galline (Setor de Pastoral), Eduardo de Oliveira Filho (Aliança Saúde),
Fernanda Mazzolli (PUCPR - Núcleo de Pastoral), Glaucio Luiz Mota (DEAS), Osmar Rezende (Colégio Marista Glória - SP), Pollyana Nabarro
(ABEC-UCE - Marketing) e Renata Alessandra Bueno (FTD).
251 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Constituições e Estatutos, n. 83.
Grupo Marista
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administrativas, um variado leque de produtos e serviços, ações e projetos,
experiências e espaços que lhes imprimam os valores cristãos e humanitários
e que promovam o sentido de sua dignidade. É nosso dever empenharmo-nos
por melhorar as condições políticas, econômico-sociais, ambientais, cognitivas e afetivas que impactam positivamente no desenvolvimento das infâncias
e juventudes.
[181].Por infância compreendemos o “espaçotempo252 da construção das culturas
infantis, da produção de conhecimentos, de posicionamento no mundo pelos
pequenos e pelas pequenas” 253. Desta forma, amplia-se a visão de que a infância é apenas uma fase da vida na qual a criança se apresentava passiva no
processo de constituição de si, passando a ser reconhecida como “um ser capaz de produzir ideias, cultura, objetos concretos e simbólicos; de desenvolver sentimentos que serão válidos por toda a vida; de questionar a realidade
que a cerca e a que está distante no tempo e no espaço; de produzir significados sobre si, sobre o outro e sobre o mundo”. 254
[182].Os novos cenários globais e locais nos desafiam a lançar um olhar mais aguçado sobre esse universo diversificado. 255 As crianças e jovens protagonizam processos sociais extremamente complexos, conforme os espaços, tempos e contextos em que estão inseridos. Diferentes segmentos juvenis geram demandas
diferenciadas, constroem novas identidades, respostas e caminhos específicos.
Nesse sentido, é prudente que reconheçamos a pluralidade dos modos de ser 256
252 “Espaçotempo” é um termo elementar do Projeto Educativo do Brasil Marista. Deve ser concebido como um continuum que se refere ao
espaço e ao tempo de modo inter-relacionado. Nessa perspectiva, se pensam fatos, processos, fenômenos e situações-problema de modo
inter-relacionado, considerando simultaneamente suas especificidades espaciais e temporais. Ver UMBRASIL, 2011. p. 26.
253 PMBCS. DERC. Projeto Marista para a Educação Infantil, p. 51.
254 PMBCS. DERC. Projeto Marista para a Educação Infantil, p. 49.
255 “A pastoral juvenil, tal como estávamos habituados a desenvolvê-la, sofreu o impacto das mudanças sociais. Nas estruturas ordinárias,
os jovens habitualmente não encontram respostas para as suas preocupações, necessidades, problemas e feridas. A nós, adultos, custanos ouvi-los com paciência, compreender as suas preocupações ou as suas reivindicações, e aprender a falar-lhes na linguagem que eles
entendem. Pela mesma razão, as propostas educacionais não produzem os frutos esperados. A proliferação e o crescimento de associações
e movimentos predominantemente juvenis podem ser interpretados como uma ação do Espírito que abre caminhos novos em sintonia com
as suas expectativas e a busca de espiritualidade profunda e de um sentido mais concreto de pertença. Todavia é necessário tornar mais
estável a participação destas agregações no âmbito da pastoral de conjunto da Igreja.” (PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii
Gaudium, n. 105).
256 Vide UMBRASIL. Projeto Educativo para o Brasil Marista, p. 56 e 57.
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
da criança e do jovem. Somos instigados a concebê-los no plural, como infâncias e juventudes, respeitando sua complexidade e dinamicidade.
[183].Reconhecemos que existem muitos abismos estruturais que colocam as juventudes em mundos antagônicos. Se observarmos com atenção nossos espaços de atuação, veremos jovens em condições economicamente favoráveis,
que vão postergar seus compromissos adultos (independência econômica,
trabalho, casamento e outros) para depois dos 30 anos; enquanto outros, ainda na infância, já precisam trabalhar ou encontrar meios próprios de sobrevivência, abreviando essa fase tão salutar para o desenvolvimento corpóreo,
cognitivo e afetivo. A criança e o jovem pobre não dispõem do mesmo tempo
e das oportunidades de que dispõe o jovem das classes economicamente privilegiadas. Essa falta de equidade é considerada uma das principais causas
do empobrecimento. Portanto,
Seguindo Jesus e vivendo a missão, somos inspirados pela paixão e pelo estilo prático de Marcelino. Com um coração dedicado
às crianças e aos jovens pobres, os apóstolos Maristas procuram dar respostas concretas à dolorosa condição em que essas
crianças e jovens vivem. 257
[184].Num mundo fragmentado e com forte tendência ao individualismo, somos
todos desafiados a formar “[...] pessoas integradas e de esperança, com profundo senso de responsabilidade social”. 258 Como bem orienta o XXI Capítulo
Geral, devemos ser “uma presença fortemente significativa entre as crianças
e jovens pobres” 259, uma vez que somos para elas, muitas vezes, o único sinal
de esperança; levemos a sério as palavras do Papa em sua visita ao Brasil:
Hein, jovens! Vocês, queridos jovens, possuem uma sensibilidade especial frente às injustiças, mas muitas vezes se desiludem com notícias que falam de corrupção, com pessoas que, em
257 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Água da Rocha, p. 76.
258 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Missão Educativa Marista, p. 39.
259 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Conclusões do XXI Capítulo Geral, p. 25 e 26.
Grupo Marista
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vez de buscar o bem comum, procuram o seu próprio benefício.
Também para vocês e para todas as pessoas repito: nunca desanimem, não percam a confiança, não deixem que se apague a
esperança. A realidade pode mudar, o homem pode mudar. Procurem ser vocês os primeiros a praticar o bem, a não se acostumarem ao mal, mas a vencê-lo com o bem. A Igreja está ao lado
de vocês, trazendo-lhes o bem precioso da fé, de Jesus Cristo,
que veio “para que todos tenham vida, e vida em abundância”. 260
[185].O documento Evangelização da juventude – Desafios e perspectivas pastorais 261
nos apresenta a novidade de considerar o jovem como um lugar teológico na
Igreja. “Reconhecendo a juventude como lugar teológico, o nosso amor a ela
é gratuito, independente do que possa nos oferecer.” 262 Portanto, como instituição católica e Marista, queremos também
[...] renovar a opção afetiva e efetiva de toda a Igreja pela juventude na busca conjunta de propostas concretas que favoreçam
uma verdadeira evangelização desta parcela da sociedade. A
responsabilidade de anunciar Jesus Cristo e seu projeto aos jovens convoca-nos a uma constante vigilância para que a vontade
de Deus e os sinais dos tempos sejam respondidos de modo adequado, principalmente em uma época de mudanças.263
[186].Ouse saber! 264 Encontramos nessa expressão um ponto de partida para pensar
nossos jovens, pois a ousadia e a vontade de conhecer parecem ser qualidades
próprias das juventudes, que se expressam no desejo de liberdade, customização, ceticismo, colaboração, inovação e velocidade. 265 Um grande desafio das
instituições que lidam com jovens refere-se à incapacidade de acolher, entender
260 PAPA FRANCISCO. Discurso na visita à comunidade de Varginha, 25/07/2013.
261 Documento oficial aprovado na 45º Assembleia Geral da CNBB, em 2007. Refere-se à evangelização da juventude. Ver CNBB. Evangelização
da juventude, DOC. 85.
262 CNBB. Evangelização da Juventude, n. 248.
263 CNBB. Evangelização da juventude, n. 4.
264 O filósofo Immanuel Kant, na reflexão intitulada O que é o esclarecimento?, propõe-nos um lema instigante: Sapere aude! (Ouse saber!).
265 TAPSCOTT, Don. A hora da geração digital, p. 91 – 119.
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
e integrar as novidades que as juventudes apresentam. Afinal, novidade é o atributo que as melhor define enquanto sujeitos, cuja busca é entender a si, pertencer a um grupo (identidade), mudar o mundo, dar sentido para a vida e ser feliz.
[187].Nossa sociedade, cada vez mais urbana e globalizada, assim como tem padronizado processos produtivos e econômicos, busca desenvolver um discurso
homogeneizador para definir a infância e a juventude. Há sempre o risco de
que comportamentos artificializados, mitos e preconceitos sejam absorvidos
por nós como modelos legítimos para ambas, por parecerem cientificamente
plausíveis ou de apelo midiático.
[188].Nesse sentido, o documento Evangelizadores entre os Jovens alerta:
É difícil, para nós, conceituar a juventude, pois é impossível abranger as diversas situações que os jovens vivem, dependendo de
suas raízes e origens étnicas, das influências culturais de seus
meios ou das diferentes condições políticas, sociais e econômicas. Os jovens não constituem uma categoria homogênea. 266
[189].Um possível risco de desencontro ocorre quando nos aproximamos dos jovens a partir de ideologias prontas. Portanto, acolhemos a contribuição dos
discursos que categorizam as gerações de maneira equilibrada, com entusiasmo e moderação. Assim, entender a dinâmica geracional e Inter geracional se
torna fundamental na aproximação com as juventudes. Por outro lado, leva-se em conta que existem anseios inerentes ao ser humano que extrapolam a
historicidade das gerações.
[190]. Assim como fez Jesus Cristo ao perguntar aos companheiros de Emaús “O
que é que vocês andam conversando pelo caminho?” 267, as instituições devem
fazê-lo, num processo dialogal com os jovens, obtendo-se por eles um termômetro da vida e da sociedade, visto que a “juventude é a janela pela qual o
266 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Evangelizadores entre os jovens, n. 13.
267 Lucas 24, 17.
Grupo Marista
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futuro entra no mundo”.268 “O percurso que Jesus faz com os dois discípulos,
no caminho de Emaús, é um paradigma para a evangelização juvenil hoje.”
269
O apelo capitular para “olharmos o mundo com os olhos das crianças [e
jovens]” propõe que nos despojemos de nossas posições (intelectuais, hierárquicas, ideológicas, etc.) para absorvermos as expectativas que eles têm em
relação a nós. Essa parece ser uma importante chave de leitura para compreendermos profundamente quem são os jovens e quais são seus principais
anseios. “Conhecer o jovem é condição prévia para evangelizá-los” 270, afirma a Igreja. Do mesmo modo, o documento Evangelizadores entre os Jovens 271
destaca o interesse do Conselho Geral em situar a evangelização dos jovens
no coração de nossa prática pastoral e, assim, tornarmo-nos uma referência
para Igreja.
[191].Devemos estar muito mais atentos às situações reais que afetam a dignidade
das juventudes do que aos discursos legitimantes e ideológicos que as enquadram em categorias pré-formatadas. Na perspectiva da “presença significativa entre os jovens”, as juventudes tornam-se objeto de estudo e acompanhamento prático. Precisamos entender melhor os sentidos do que é ser jovem
segundo os próprios jovens, para rever muito do que se tem dito sobre eles,
colaborando para a superação de todo tipo de preconceitos que se inscrevem
na ideia de juventude. Portanto, as ações pastorais junto às juventudes precisam considerar quem são esses jovens e qual a melhor forma de aproximar-se
deles, agregando os recursos que utilizam, as ideias que os movem.
[192].Abre-se diante de nós a questão de como nos posicionamos em relação à inclusão dos jovens nos espaços e fóruns que lhes são de direito e que dizem
respeito à promoção de sua dignidade e desenvolvimento integral da pessoa; citamos o acesso à educação de qualidade, às oportunidades de participação social ampla, à formação para o trabalho, à formação em valores que
contribuem na constituição de seu caráter, à saúde, etc., constituindo-se em
268
269
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271
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PAPA FRANCISCO. Discurso na Cerimônia de Boas-vindas ao Brasil, 22/07/2013.
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Evangelizadores entre os jovens, n. 171.
CNBB. Evangelização da juventude, n. 10.
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Evangelizadores entre os jovens, 2011.
Diretrizes da Ação Evangelizadora
preocupação de cada um de nós e das autoridades governamentais quanto à
definição de políticas públicas específicas.
[193].Em relação aos espaços ocupados por crianças e jovens, necessário se faz
destacar a importância que as tecnologias da comunicação assumem na vida
desses sujeitos. São ferramentas e espaços que constituem os novos areópagos272 dessa geração. Observamos com entusiasmo a democratização quase
universalizada do acesso amplo à informação entre os mais jovens. No entanto, o maior desafio parece ser integrar na informação um processo de educação imbuída de valores.
[194].No ambiente virtual, transmitir informações significa, com frequência, inseri-las e intercambiá-las em redes sociais, devido à vontade das pessoas em
interagir. Elas já estavam interagindo antes das tecnologias digitais por outras vias, nem melhores nem piores. Ocorre que hoje elas podem fazer isso
mais rápido e encurtando distâncias. Também é necessário avaliar os novos
riscos273 advindos da utilização inapropriada dessas novas ferramentas. Esta
dinâmica contribuiu para uma nova avaliação do papel da comunicação, considerada primeiramente como diálogo, intercâmbio, solidariedade e criação
de relações sociais.
Neste tempo em que as redes e demais instrumentos da comunicação humana alcançaram progressos inauditos, sentimos
o desafio de descobrir e transmitir a “mística” de viver juntos,
misturar-nos, encontrar-nos, dar o braço, apoiar-nos, participar
nesta maré um pouco caótica que pode transformar-se numa
verdadeira experiência de fraternidade, numa caravana solidária, numa peregrinação sagrada. Assim, as maiores possibilidades de comunicação traduzir-se-ão em novas oportunidades de
encontro e solidariedade entre todos. Como seria bom, salutar,
272 BENTO XVI. Carta para o 45º dia Mundial das Comunicações. Disponível em:
<http://www.vatican.va>.
273 Pirâmide de segurança digital: O Que é Uma Pirâmide de Confiança? Extraído do site <http://www.miudossegurosna.net/artigos/2007-02-27.
html>.
Grupo Marista
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libertador, esperançoso, se pudéssemos trilhar este caminho!
Sair de si mesmo para se unir aos outros faz bem. Fechar-se em
si mesmo é provar o veneno amargo da imanência, e a humanidade perderá com cada opção egoísta que fizermos. 274
[195].Do ponto de vista evangelizador, justifica-se, portanto, o interesse em reconhecer e problematizar cada vez mais o potencial educativo das tecnologias
da comunicação. Desconsiderar essa influência constitui um equívoco histórico e estratégico, sobretudo ao se pensar o processo de desenvolvimento
integral dos sujeitos jovens. Tal percepção nos convida a aprofundarmos a
reflexão sobre o papel do comunicador-educador. O conceito educomunicação
subentende certa capacidade de intervenção transformadora por intermédio
dos meios de comunicação de massa. Nesse sentido, interessa sabermos até
que ponto nós, profissionais da comunicação, reconhecemo-nos como agentes provocadores da reflexão dos diversos temas que afetam a vida, em vista
da formação do sujeito crítico que almejamos.
[196].Há uma expectativa institucional em relação aos profissionais da comunicação do Grupo Marista, cuja orientação ética baseia-se no valor da educação
como instrumento de emancipação dos sujeitos. Necessitamos de educomunicadores produtores e multiplicadores de conteúdo relevante que gerem
impacto positivo, adesão e interação, com consequente aprendizado a respeito interpessoal nas diferentes tecnologias da comunicação que dispomos. O
grande desafio parece ser o modo como comunicamos os valores cristãos de
modo eficiente para nossos interlocutores. Comunicar o Evangelho significa
não só inserir conteúdos religiosos nas plataformas dos diversos meios, mas
também testemunhar com coerência, no próprio perfil digital e no modo de
comunicar escolhas, preferências, juízos que sejam profundamente coerentes com o Evangelho, mesmo quando não se fala explicitamente dele. Aliás,
em qualquer espaço, não pode haver anúncio de uma mensagem sem um testemunho coerente por parte de quem anuncia.
[197].Uma comunicação integradora pode favorecer o protagonismo infanto-juvenil, como é forma de posicionamento cristão no mundo. Entre eles, as propostas evangelizadoras mais eficazes parecem ser aquelas com forte “expressão
vivencial”. 275 Assim, o Grupo Marista fortalece a construção do documento
Pastoral na Educação Infantil: referenciais para a ação Pastoral-Pedagógica e a
Pastoral Juvenil Marista com o objetivo de estabelecer um processo de formação integral de crianças e jovens.
[198].“A PJM é um meio privilegiado para essa evangelização, embora, seguramente, não seja o único meio”. 276Além da PJM, outras iniciativas de promoção
e evangelização juvenil são apoiadas e incentivadas pelo Grupo Marista, segundo as necessidades específicas de cada realidade.
[199].“O que os jovens esperam de nós?” 277 Essa pergunta nos leva a refletir sobre
o que as crianças e jovens esperam de nós a partir do trabalho realizado pelo
Grupo Marista. Assim, elegemos alguns apelos que nos parecem ir ao encontro de seus anseios:
a) Receptividade em relação às propostas e anseios das infâncias e juventudes: escuta sensível e canais de participação.
b) Acompanhá-los em seu caminho e em suas escolhas vocacionais, gerando oportunidades para que possam vislumbrar um futuro além das próprias fronteiras.
c) Promover trabalhos voluntários na comunidade local, favorecendo o encontro grupal e a solidariedade. Formar jovens com ardor missionário.
d) Ocupar os espaços de definição de políticas públicas para as infâncias e
juventudes, com vistas a um mundo mais justo e ético. 278
e) Ajudá-los a crescer na relação consigo, com Deus, com a natureza e com
os demais. Educação da fé e do caráter cidadão.
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277
278
274 PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 87.
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Evangelizadores entre os jovens, n. 23.
INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Evangelizadores entre os jovens, n. 368.
Cf. INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Evangelizadores entre os jovens, n. 43.
Nesse sentido, conferir o documento Conselhos de Juventudes. Grupo Marista, 2013, um subsídio de orientação às juventudes maristas
sobre o processo de inserção nos espaços representativos.
Grupo Marista
103
f) Trabalhar mais profundamente a dimensão vocacional e o encontro com
Cristo, sobretudo com a PJM.
g) Potencializar a vivência em grupo como primeiro ambiente eclesial.
h) Estudar sistematicamente os fenômenos que impactam as infâncias e
juventudes.
3.8 Valores maristas 279
Não se mede o valor de um homem pelas
suas roupas ou pelos bens que possui; o
verdadeiro valor do homem é o seu caráter, suas ideias e a nobreza dos seus ideais. (Charles Chaplin).
[200]. A palavra “valor” é adotada de maneira ampla na cultura atual. Ela é facilmente empregada em campos diversificados: filosóficos, sociológicos, econômicos, éticos, religiosos, dentre outros. De modo geral, os valores podem ser
compreendidos como um conjunto de pontos de vista, deveres, julgamentos,
preferências e padrões de associação que determinam a visão de mundo de
um indivíduo. Sua importância reside no fato de que, uma vez internalizado,
torna-se, consciente ou inconscientemente, um padrão ou critério de conduta.
[201].Muitas instituições que vêm se consolidando na história possuem um conjunto de valores que orientam suas ações, potencializando a realização de
sua missão. Desta forma, os valores se fazem presentes no mundo organizacional com o propósito tanto de servirem como base para a estruturação
das formas de atuação e do próprio sistema de gestão, quanto de tornarem o
trabalho mais significativo. Espera-se que os mesmos possam ser traduzidos
para todos os negócios, setores, processos e, principalmente, para todas as
pessoas envolvidas. Entretanto, um valor só ganha “vida”, de fato, quando é
279 Contribuíram nessa reflexão: Elizabeth Mendes Loureiro (FTD - Desenvolvimento de Pessoas), Eneida Ribas (TECPUC), Ernesto Siena (PUCPR
- Núcleo de Pastoral de São José dos Pinhais), Guilherme Lorenzi (Aliança Saúde – Plano de Saúde Ideal), Hélio Amaral (APC– AIDN), José Leão
Cunha (Colégio Maristão - DF) e Nanci Alexandra Prochnow (Centro Social de Pouso Redondo - SC).
104
Diretrizes da Ação Evangelizadora
legitimado socialmente por seus membros, ao perceberem que sua utilização
garantirá resultados positivos.
[202].As instituições visionárias que se perpetuaram na história foram capazes de
realizar permanentemente um duplo dinamismo: de um lado, possuírem um
conjunto claro de missão e valores e a eles foram fiéis; do outro, conseguiram
concretizar esses mesmos ideais em ações inovadoras, eficientes e eficazes
aos desafios de cada época.
[203].A missão de uma instituição anuncia seus valores. A partir do momento em
que os valores se apresentam como base para o modo de conhecer e manusear conhecimento, aumentam as chances de que os processos e atos sejam
autênticos e convincentes. Quando isso ocorre, é possível observar a intenção
que conecta as decisões e as pessoas. É à percepção clara dessa conexão que
chamamos de equilíbrio e coerência entre teoria e prática. Noutras palavras:
a missão vai realizando-se e renovando-se.
[204]. Em nossa Instituição existe um estilo de condução dos processos baseado
em valores próprios do Evangelho e do carisma marista, herdados de São
Marcelino Champagnat e dos primeiros Irmãos. Consiste na preservação
do núcleo referencial dos valores que é, ao mesmo tempo, estímulo ao autodesenvolvimento e ao alto desempenho organizacional. É missão de cada
um de nós sermos, para o mundo, o testemunho vivo do Evangelho em tudo
o que realizarmos.
[205].Muitos são os valores que emergem da missão e identidade cristã e marista.
Eles são descobertos no dia a dia de cada um de nós, em meio aos desafios e
às atividades. Como organização, na dimensão corporativa – depois de um
grande processo participativo e reflexivo, com o envolvimento dos irmãos e
de representantes de todas as frentes apostólicas –, o Grupo Marista optou
por tornar evidentes seis valores que nos são referenciais. São eles um recorte dos inúmeros valores possíveis que fazem parte do Evangelho e da vida
marista. Acreditamos que ao focar esse núcleo valorativo possamos desenvolver de forma mais eficaz nossas ações cotidianas: Simplicidade; Amor ao
Grupo Marista
105
Trabalho; Justiça; Espiritualidade; Espírito de Família (Sensibilidade Comunitária); e Presença Significativa.
[206]. Os valores são complementares e interdependentes entre si; iluminando as
escolhas em saberes, comunicam nossas crenças. A intenção maior consiste
em possibilitar o desenvolvimento e o cultivo de uma cultura organizacional
marista forte, fiel às origens e condizente com o caráter visionário, empreendedor e transformador do próprio fundador. Empreender em estilo marista é
dar um testemunho profético ao mundo: é possível empreender com sucesso
negócios iluminados por princípios oriundos do Evangelho. Cremos ser possível organizar negócios que se tornem sustentáveis, onde as pessoas se realizem no presente e vislumbrem futuro não apenas do ponto de vista material,
como também, e principalmente, espiritual. Buscamos, antes de tudo, impactar positivamente o público final de nossas iniciativas, colaborando para que
todos sejam protagonistas na construção de uma sociedade mais humana,
justa, ética e solidária.
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
Grupo Marista
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DIRECIONAMENTOS
PASTORAIS
4.DIRECIONAMENTOS PASTORAIS
4.1 Objetivos de Animação Pastoral do Conselho Geral 280
[207]. O Conselho Geral, no que se refere à atuação pastoral, guiar-se-á nos próximos anos segundo os seguintes objetivos:
a) Favorecer o desenvolvimento do “rosto mariano” da Igreja para que esta
se faça mais próxima dos jovens e das necessidades do mundo de hoje.
b) Promover no Instituto um estilo de liderança participativa, de maneira
que cada membro possa melhor exercer a autoridade que lhe compete, a
serviço da missão do Instituto.
c) Acompanhar o discernimento nas Unidades Administrativas e nas regiões com vistas a descobrir o alcance do “ir para uma nova terra” em seu
próprio contexto.
d) Favorecer aos Irmãos o reencontro e encanto com a própria vocação, a
fim de vivê-la e testemunhá-la com radicalidade, abertura e alegria na
Igreja e no mundo de hoje.
e) Suscitar e/ou acompanhar novas formas de viver o carisma marista, tanto entre Irmãos quanto entre os Leigos e promover o desenvolvimento
da vocação do Leigo Marista, construindo uma nova relação que nos
enriqueça mutuamente e reconheça a fecundidade atual da herança de
Champagnat.
f) Continuar desenvolvendo a missão marista, como parte de nossa identidade e alimento de nossa espiritualidade, especialmente em três dos
aspectos destacados pelo Capítulo Geral: maior proximidade às crianças e jovens pobres; a evangelização; e a defesa dos direitos das crianças e jovens.
280 Disponível no site oficial do Instituto Marista : <http://www.champagnat.org/pt/610.php?caso=view_1909&num=1775>
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
g) Promover uma maior compreensão e apreço da internacionalidade e
multiculturalidade, vivendo a globalização de maneira alternativa, e favorecendo uma maior disponibilidade missionária para responder às
novas necessidades.
h) E, finalmente, dar continuidade à promoção e aplicação do “Uso
evangélico dos bens” e ao exercício da solidariedade em todos os níveis do Instituto.
4.2 Direcionamentos Transversais
[208]. Os Direcionamentos Transversais referem-se a orientações pastorais válidas para todas as frentes apostólicas, independendo a especificidade:
a) Centralidade em Jesus Cristo, expressão máxima da pessoa inteira e
integrada.
b) Apropriação e disseminação do legado de Marcelino Champagnat por
meio da espiritualidade mariana e vivência dos valores institucionais.
c) Ação evangelizadora assumida como finalidade primeira de todas as
frentes apostólicas que compõem o Grupo Marista.
d) Evangelização e sua organização pastoral adotadas como processos que
perpassam todas as estruturas da organização e assumidas como responsabilidade de todos.
e) Todas as Frentes Apostólicas (Negócios) são campos de evangelização e
vetores de multiplicação da missão marista.
f) Inculturação do Evangelho de acordo com a identidade, linguagem e
missão de cada frente apostólica, a partir das potencialidades e necessidades de seus interlocutores.
g) Desenvolvimento contínuo de pessoas, em todos os níveis hierárquicos,
para atuação com visão e competência evangelizadora.
h) Investimento financeiro parametrizado em processos evangelizadores.
i) Comunhão com a Igreja e articulação com organismos e redes eclesiais
nos níveis local, nacional e internacional.
j) Comunhão e sinergia com as diversas instâncias institucionais (Casa
Geral; Secretariado de Missão; União Marista do Brasil; Setores Provinciais, Mantenedoras e Negócios).
Grupo Marista
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k) Foco preferencial na evangelização e promoção dos direitos das infâncias, adolescências e juventudes.
4.3 Direcionamentos Pastorais para as Frentes
Apostólicas
[209]. Desde o Concílio Vaticano II a Igreja nos exorta a que, em todo trabalho
evangelizador, estejamos sempre atentos aos “sinais dos tempos”, pois “é
necessário conhecer e entender o mundo no qual vivemos, suas esperanças,
suas aspirações e sua índole”. 281
[210].O Instituto Marista, fiel ao Evangelho, à Igreja e ao legado de seu fundador,
Marcelino Champagnat, reconhece-se vocacionado a ler os sinais dos tempos
e buscar, com audácia, empreendedorismo e vitalidade, sempre novos métodos para tornar Jesus Cristo conhecido, amado e seguido. O XXI Capítulo Geral nos exorta: “Com Maria, ide depressa para uma nova terra!”; e isso nos faz
olhar para nossas estruturas como meios dinâmicos e potenciais que primam
pela excelência administrativa, educacional, social e pastoral com a finalidade de garantir a vitalidade e viabilidade da missão Marista.
[211]. Nesse contexto, nossos “espaços” 282 são concebidos como “campos de aplicação e vetores de multiplicação do carisma marista”. São meios nos quais a
identidade institucional é vivenciada e pelos quais chegamos com maior eficiência às crianças e aos jovens com a finalidade de ajudá-los a serem pessoas
plenas em todas as suas dimensões – psíquica, física, social e espiritual. Por
isso mesmo, acreditamos que a dinâmica evangélico-pastoral perpassa todas
as nossas instâncias, dá significado aos processos desenvolvidos e é responsabilidade de todos.
281 Gaudium et Spes, n. 4.
282 Mantenedoras – Área Corporativa, Negócios e Unidades.
112
Diretrizes da Ação Evangelizadora
[212].Considerando esses pressupostos, o Setor Provincial de Pastoral, sensível ao
sopro do Espírito283 e com a responsabilidade de zelar e dinamizar o processo
evangelizador no Grupo Marista propôs a atualização da ação pastoral em
nossos espaços de forma corresponsável, organizada, sistemática e orgânica
e, ao mesmo tempo, dinâmica, criativa e inovadora. Assim, apresenta o horizonte pastoral para as iniciativas das Mantenedoras.
[213].Trata-se de direcionamentos que devem iluminar ações e dinamizar os esforços, bem como servir de base para as necessárias elaborações ou atualizações dos planejamentos dos negócios e áreas corporativas das mantenedoras
e dos planos específicos de pastoral. Aos responsáveis maiores - conforme
o fluxo de gestão estabelecido no Grupo Marista - cabe a atribuição de tornar esses direcionamentos presentes na cultura organizacional, nos processos e operações já estabelecidos e a implantação de novas iniciativas, quando
necessárias.
4.3.1 Área Corporativa
[214].As áreas corporativas das mantenedoras APC, ABEC/UCE e FTD cumprem
seus objetivos de apoiar, orientar e controlar os Negócios a elas ligados, alicerçados nos princípios que fundamentam a missão Marista.
[215].Desta forma, inspiradas nos ideais da educação marista e nos valores institucionais, empenham-se por atingir a excelência técnica, profissional e humana, com caráter pastoral em todas as suas ações e processos por meio de
alguns posicionamentos organizacionais:
283 “O vento sopra onde quer, e ouves a sua voz; mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito”
(Jo 3, 8).
Grupo Marista
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Área Corporativa alicerçada nos valores institucionais
[216].Os valores institucionais – justiça, espírito de família, presença significativa,
amor ao trabalho, espiritualidade e simplicidade 284 – são difundidos entre os
colaboradores da Instituição e traduzidos em suas ações cotidianas.
[217].Além disso, aqueles que recebem o cargo de gestão empenham-se por incorporar em suas práticas o estilo marista próprio de administrar, com força e
ternura. Sem prescindir da competência técnica, e exercendo a sua função
com profissionalismo, cabe a estes alinhar as dimensões técnicas e profissionais à missão e valores institucionais e oportunizar às suas equipes de trabalho condições de engajamento.
Processos organizacionais alinhados aos valores institucionais
[218].Ao lado do potencial humano, técnico e profissional dos colaboradores e gestores, todos os processos de Gestão de RH – atração, retenção, desenvolvimento, avaliação, motivação e rescisão 285 – devem estar permanentemente
alinhados aos valores institucionais.
Identidade marista como fonte de sinergia e qualificação da cultura
organizacional
[219].Todo empenho por alinhar o trabalho cotidiano à missão marista é refletido na cultura e clima organizacionais. Neste âmbito, a vivência do carisma
284 Os valores aqui apresentados foram escolhidos por um grupo de trabalho aprovado pelo Conselho Provincial e composto por colaboradores
das áreas de RH das mantenedoras ABEC/UCE, APC e FTD, do Setor de Pastoral e por alguns Irmãos Maristas dos Setores Provinciais. A partir
do estudo detalhado de fontes maristas, o referido grupo providenciou a conceituação de cada um dos valores e a tradução dos mesmos em
comportamentos mensuráveis, preocupando-se em utilizar uma linguagem apropriada para a área corporativa. A finalidade maior desse
trabalho consiste em orientar os colaboradores de nossas Mantenedoras e Negócios no exercício de nossa missão marista de servir às
crianças e jovens, ajudando-os a enriquecer o significado de suas ações. Aos gestores maiores de nossa Instituição cabe a responsabilidade
de difundir esses valores na corporação, tornando-os pertinentes ao cotidiano, sobretudo por meio dos processos de gestão de RH.
285 Esses processos podem ter os seguintes detalhamentos: Admissão de colaboradores/Atração: Solicitação de pessoal, Acompanhamento
de processos estratégicos. Manutenção dos colaboradores/Retenção: Avaliação de desempenho, Programa Trainee, Avaliação de Potencial,
Movimentação Interna, Benefício, Clima Organizacional, Indicadores da DRH, Planejamento Pessoal, Minimizar riscos trabalhistas,
Advertência e Suspensão. Desenvolvimento dos colaboradores/Treinamento: Gestão por competência, Transição por liderança, LNT –
Avaliação de desempenho, Coaching, Desenvolvimento de equipe, Planejamento e Sucessão. Reconhecimento/Motivação: Políticas de
Graduação e Pós, Meritocracia, Programa de valorização de Funcionários, Gestão Social Corporativa. Rescisão: Programa de Preparação e
aposentadoria, Entrevista de desligamento, Relatórios estatísticos de desligamento.
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Diretrizes da Ação Evangelizadora
herdado de Champagnat exige de todos a sensibilidade comunitária, que
pode ser permanentemente dinamizada por momentos significativos de convivência e celebração da vida. 286 Essa postura intensifica a sinergia entre as
diversas áreas e enriquece o sentido das relações humanas. A organização há
que ser atrativa aos colaboradores, bem como cada colaborador evidenciar os
valores institucionais como um diferencial da Instituição para que seja atrativo à organização.
4.3.2 Negócios Suplementares
[220]. A área de Negócios Suplementares tem por missão colaborar para a sustentabilidade, melhoria dos processos educacionais e expansão da Instituição
por meio da disponibilização de infraestrutura de excelência e da viabilização
de modelos inovadores de negócio. Partindo da identidade institucional, deve
alinhar-se ao Plano Estratégico dos Negócios das mantenedoras APC, ABEC
e UCE, utilizando prioridades baseadas no âmbito da cultura organizacional,
que são:
Processos organizacionais alinhados aos valores institucionais
[221].Rigor absoluto à ética e à adequação permanente da evolução do marco legal
e normativo, desempenhando seus processos produtivos da forma eficiente,
por meio de pessoas competentes, comprometidas, empreendedoras. Agilidade, flexibilidade, adaptabilidade, permeabilidade e sintonia com a sociedade, visando entrega de produtos e serviços inovadores desenvolvidos para
satisfazer suas necessidades e expectativas alinhadas à identidade e aos valores Maristas.
286 Os momentos celebrativos aqui referidos compreendem: a) Pequenas comemorações no cotidiano dos colaboradores: por ocasião
de aniversários, maternidades e ou paternidades, premiações ou conquistas de pessoas ou grupos, etc. b) Comemorações de datas
significativas para o Instituto Marista: Dia do Marista, Dia de Champagnat, ou por orientações dos Conselhos Gerais e ou Provincial,
conforme momentos próprios da caminhada marista. c) Comemorações significativas para nossos âmbitos de atuação: Dia do Professor,
Dia do Médico, Dia do Estudante, Dia do Comunicador, etc. d) Comemorações significativas para a família humana em geral: Dia dos Pais, Dias
das Mães, Dia Internacional da Mulher, etc. e) Celebrações do Ano Litúrgico da Igreja: Páscoa, Natal, Assunção de Nossa Senhora, etc.
Grupo Marista
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Difusão dos valores humanos, cristãos e maristas, traduzidos
à cultura atual
[222].Como prestadora de serviços e fornecedora de produtos para a sociedade,
atendendo às comunidades interna e externa à organização, a área de Negócios Suplementares deve buscar a vocação e a oportunidade de atingir escala
comercial, visando sustentabilidade e viabilidade econômica de cada infraestrutura já existente ou, quando convir, propor a agregação de novas estruturas para atender novas demandas.
[223].Os valores cristãos e maristas devem ser explicitados: no relacionamento
com o cliente, oferecendo-lhe atendimento individual e respeitoso; na relação
com alunos, contribuindo na realização de seus objetivos pessoais, oferecendo cursos preparatórios, áreas de estágio e materiais didáticos modernos e
com qualidade; quer promovendo a contextualização do ensino, da pesquisa e da extensão em sintonia com os avanços tecnológicos das ciências; quer
como pessoas que necessitam de recuperação de documentos e informações
armazenados em bases confiáveis; como também por meio de venda de produtos de forma saudável e justa.
Produtos e serviços específicos para a evangelização dos
colaboradores
[224].Fazer com que o trabalho seja produtivo e o trabalhador possa se realizar
como pessoa, alinhado ao compromisso social, fortalecendo valores pessoais
e desenvolvendo habilidades e mecanismos de comunicação e relacionamento com as diversas áreas e unidades da Instituição, com conhecimento da dinâmica e oportunidades do ambiente de negócios sempre atualizado.
[225].Desenvolver a cultur a da solidariedade, fazendo com que os benefícios conquistados pelos negócios sejam revertidos para a consecução da missão.
Criar sinergia com os setores, buscando desenvolver ações conjuntas que
possam apoiar o desenvolvimento de ações sociais, de educação formal, saúde e comunicação.
116
Diretrizes da Ação Evangelizadora
4.3.3 Educação Profissional
[226].A área de Educação profissional do Grupo Marista é representada pelo Centro de Educação Profissional TECPUC, sendo gradativamente ampliada
para as unidades educacionais da ABEC-UCE. Assim, somos desafiados a
integrar a excelência educacional com missão institucional. Ao final de uma
trajetória de estudos, almejamos que os alunos egressos da Educação Profissional tenham desenvolvido seu juízo crítico, compreendido os valores humanos integrados aos conteúdos que estudam287 e sejam reconhecidos como
profissionais diferenciados.
[227].Atendendo uma demanda social importante e crescente, o Grupo Marista
vem ampliando suas estruturas físicas, de atendimento à comunidade e formação continuada de professores e educadores para consolidar os processos
educacionais nesta modalidade de ensino.
[228].Compreendemos a Educação Profissional como uma oportunidade ímpar
para o aperfeiçoamento da integralidade do ser humano e da sensibilização
para relações sociais mais abrangentes e solidárias. Formamos, portanto, cidadãos éticos e de esperança, encorajando-os no esforço de superação pessoal e para serem protagonistas no progresso288 da sociedade. Fiéis à missão
evangelizadora marista, concebemos a educação profissional como “educação integral com ênfase no trabalho”.
Educação para a “cultura do trabalho”
[229].Os ambientes que educam para o trabalho são espaços privilegiados de relacionamento, desenvolvimento humano e conscientização social. Conforme
assevera a Encíclica Mater et Magistra 289, cabe também à empresa esforçar-se
287 Cf. INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Missão educativa marista, n. 135-136.
288 “Paulo VI tinha uma visão articulada do desenvolvimento. Com o termo ‘desenvolvimento’ queria indicar, antes de mais nada, o objetivo
de fazer sair os povos da fome, da miséria, das doenças endêmicas e do analfabetismo. Isto significa, do ponto de vista econômico, a
sua participação ativa e em condições de igualdade no processo econômico internacional; do ponto de vista social, a sua evolução para
sociedades instruídas e solidárias; do ponto de vista político, a consolidação de regimes democráticos capazes de assegurar a liberdade e a
paz.” (BENTO XVI. Caritas in veritate, n. 21)
289 JOÃO XXIII. Mater et Magistra, n. 53.
Grupo Marista
117
para ser comunidade nas suas relações, funções e situações. Tal perspectiva
se torna mais evidente na medida em que houver o empenho conjunto das
pessoas290 que convivem nesses espaços de trabalho – não importando, nesse caso, em distinguir os níveis hierárquicos dos sujeitos que trabalham –
pela busca da justiça, caridade e o bem comum. Educar para ser comunidade
pressupõe que o trabalhador não deva ser concebido como um passivo executor de tarefas ou vil instrumento para o lucro. 291 Deste modo, favorecemos o
entendimento daquilo que seria uma autêntica “cultura do trabalho” 292, fator
que ajuda os trabalhadores a se desenvolverem de modo plenamente humano, seja coletivamente no mundo do trabalho ou em sua atividade profissional individual.
Desenvolvimento integral do sujeito
[230].Embora o exercício da profissão escolhida enfatize um conjunto de competências específicas, a educação integral para o trabalho visa a formação do sujeito
em sua totalidade. Isso consiste, por um lado, em ensinar-lhe objetivamente
o ofício, as tecnologias, as habilidades e competências necessárias para o eficiente desempenho da função. Por outro lado, cabe também conscientizá-lo
do valor das subvenções sociais; das responsabilidades profissionais amplas;
da ética profissional (deontologia), social e ecológica; dos valores religiosos
universais; do caráter moral e da busca pela justiça. Educar para o trabalho,
nesse sentido, significa oferecer muito mais do que os conhecimentos técnicos inerentes à tarefa produtiva: significa educar o indivíduo trabalhador na
sua integralidade, sobretudo no reconhecimento da própria dignidade, dos
direitos humanos e das habilidades sociais que constituirão o seu diferencial,
tanto no campo das relações humanas como no mundo do trabalho.
290 Desse modo, evidenciamos a necessidade de uma educação que favoreça relações coerentes entre empresários e/ou dirigentes, por um
lado, e trabalhadores, por outro. Relações mediadas pela ética, pelo respeito, pela estima, pela compreensão, pela solidariedade e apreço
pelo bem comum.
291 Cf. LEÃO XIII. Rerum Novarum, n.13.
292 Cf. JOÃO PAULO II. Centesimus Annus, n. 15.
118
Diretrizes da Ação Evangelizadora
Pastoral transversal, integrada aos processos da Educação
Profissional
[231].A Pastoral, entendida como ação evangelizadora, é mais que o Núcleo de
Pastoral do Centro de Educação Profissional TECPUC. A Pastoral busca integrar-se transversalmente aos processos pedagógicos, administrativos e de
gestão, caracterizando uma “Escola em Pastoral” 293, na qual todos se sentem
corresponsáveis em evangelizar. A Pastoral tem reflexos na tradução dos valores cristãos e institucionais para a comunidade educativa.
4.3.4 Unidades Sociais da Rede Marista de Solidariedade 294
[232].Para responder concretamente às principais necessidades das crianças e
dos jovens, nas suas mais variadas realidades sociais, “a Educação Marista
ultrapassou as fronteiras da educação escolar formal, concretizando-se em
outras obras, estruturas e ações educacionais de natureza pastoral e social”.
295
Dessa forma, renovamos nossa opção pela educação solidária e pela ação
pastoral e social emancipatória, tendo as Unidades Sociais296 como um dos
principais lugares para efetivar tal intencionalidade.
293 O desafio pastoral da Escola Católica consiste em compreender-se na complexidade de seu conjunto: ela é um corpo com diferentes órgãos
que, embora cada qual tenha diferentes funções, harmonizam-se em função dos mesmos objetivos. Assim deve ser a sua organicidade
pastoral. “A Escola católica existe para evangelizar. Como instância avançada da Igreja no campo da cultura, no mundo da educação, e
sem em nada diminuir a sua função humanizadora [...] a escola católica é a própria Igreja em Estado de missão, sinal de presença de Deus
no amadurecimento humano”. (PANINI, J. Cadernos da AEC do Brasil, n. 67, p. 21). Para maiores referências, ver: PANIN; CUNHA, 1999, n.
65; PANINI, Joaquim. A Pastoral da Escola Católica, n. 69. Ver também “Universidade em pastoral” em Carta de Betânia: uma Universidade
Católica em ‘pastoral´. In CNBB, 1988, p. 333-335 (Documento conclusivo do I Encontro nacional dos Grupos de PU das IESCs, realizado em
Campinas, na Casa Betânia Franciscana, de 6 a 10/09/ 1987).
294 A Rede Marista de Solidariedade (RMS) tem foco de atuação: a) na promoção dos direitos das crianças e dos jovens: refere-se ao
atendimento direto, com qualidade e continuado; b) na defesa dos direitos das crianças e dos jovens: acontece no âmbito da articulação
em rede, com outros atores e organizações sociais, na participação e representação em espaços de formulação e controle de políticas
públicas; c) na educação para a solidariedade: consiste em desenvolver projetos voltados para os públicos internos, sejam colaboradores
e/ou aqueles que utilizam nossos serviços, com o intuito de promover o compromisso com os pobres, aproveitando os diversos espaços
educativos existentes nas múltiplas Frentes Apostólicas do Grupo Marista.
295 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Missão Educativa Marista, p. 14.
296 Centros Sociais e ProAção (ABEC-UCE/APC) integram a Rede Marista de Solidariedade e desenvolvem projetos de educação básica e
assistência social a crianças e jovens em situação de vulnerabilidade pessoal e social. O Centro Marista de Defesa da Criança (APC) atua na
defesa dos direitos de crianças e jovens no desenvolvimento de projetos que analisam a situação das infâncias e juventudes no país, na
articulação em rede e na representação em espaços de controle e formulação de políticas públicas.
Grupo Marista
119
[233].As Unidades Sociais da Rede Marista de Solidariedade são lugares autênticos de expressão da missão e da vivência da Espiritualidade Cristã297, sendo consideradas espaçotempos298 do carisma marista, pois são iniciativas que
evidenciam a opção originária do Instituto em evangelizar crianças e jovens,
sobretudo os que estão em situação de vulnerabilidade pessoal e social. Nestas Unidades, a ação pastoral é um processo efetivo que integra a proposta
socioeducativa299, empoderando300 seus envolvidos para o senso crítico propositivo, para o protagonismo e para a participação, na perspectiva socioambiental e política.
[234].A Educação para a Solidariedade, promovida pelas Unidades Sociais, além
de apresentar uma irrestrita identidade com o legado de Champagnat e com
o estilo de Maria – sua inspiração educativa –, está convicta de que devemos
“[...] ver o mundo com os olhos das crianças e jovens pobres e assim mudar
nossos corações e atitudes [...]” 301, consolidando nossa missão educativa e a
comunhão com a Igreja frente aos desafios da contemporaneidade. Para deliberar essa proposta temos como base os referenciais dos direitos humanos,
eclesiais e das políticas nacionais302, pautando-os à luz da Palavra de Deus.
[235].A realização da missão marista requer empenho dos educadores em oferecer
uma formação integral e promover a justiça social. 303Efetivamos a missão a
partir do exemplo de Champagnat, tornando Jesus Cristo conhecido e amado304, por meio da formação contínua de nossos educadores e do desenvolvi-
297 A Espiritualidade Cristã é fonte geradora de esperança para transformar a sociedade à luz da Palavra de Deus.
298 UMBRASIL. Projeto Educativo do Brasil Marista, p. 53.
299 Ação fundamentada em pesquisas teóricas e na investigação prática, por meio da formação continuada dos educadores, a partir da
construção coletiva de saberes e fazeres da ação social em desenvolvimento (PMBCS. Projeto marista para o ofício de aluno, p. 7).
300 Da expressão empowerment, utilizada em escritos de Paulo Freire, como um processo de ação social em que indivíduos tomam posse de
poder gerando consciência crítica e ações efetivas que transformam a sociedade.
301 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Conclusões do XXI Capítulo Geral, p. 25.
302 Referenciais: A Declaração Universal de 1948, a Declaração dos Direitos da Criança de 1959, a Convenção sobre os direitos da Criança de
1989, a Convenção Ibero-Americana sobre os Direitos da Juventude de 2005 e a Carta da Terra. A Doutrina Social da Igreja é assumida como
um dos principais referenciais teóricos da ação social para a Rede Marista de Solidariedade, pois compreende documentos que posicionam
a igreja na perspectiva evangelizadora, missionária, ecumênica e sociotransformadora. A Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do
Adolescente preconizam a “Doutrina da Proteção Integral” ao reconhecer toda criança e adolescente como sujeito de direitos e em situação
peculiar de desenvolvimento.
303 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Missão Educativa Marista, n. 204.
304 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Missão Educativa Marista, n. 69.
120
Diretrizes da Ação Evangelizadora
mento apostólico da Identidade Marista nas Unidades Sociais. Sendo assim,
sinalizamos os seguintes Direcionamentos Pastorais:
Processo educativo-evangelizador visando o protagonismo
sociopolítico-eclesial
[236].A ação pastoral empenha-se na Educação para a Solidariedade, apresentando-a como virtude cristã dos nossos tempos, um imperativo ético para toda
a humanidade.305 Para isso, a pastoral suscita a formação de novas lideranças cristãs, favorecendo o protagonismo sociopolítico-eclesial, por meio das
ações pastorais da Igreja, da incidência política em espaços de promoção e
defesa de direitos, e o exercício da cidadania, para educandos, educadores
e comunidade. “Desta forma, respaldados e apoiados, eles poderão erguer a
voz, mobilizar as forças e lutar pelo sagrado direito de viver com dignidade e
esperança.” 306 Neste sentido, buscamos integrar fé e política307 como dimensões essenciais da evangelização.
Pastoral transversal, integrada a todos os processos das Unidades
Sociais
[237].A ação pastoral deve integrar transversalmente todos os processos da unidade social, configurando um ambiente no qual todos os educadores se sentem
corresponsáveis pela evangelização. Sinalizamos a importância da organicidade pastoral nos projetos socioeducativos, na acolhida, no diálogo ecumênico e inter-religioso, no uso evangélico dos bens e na reflexão dos demais
valores humano-cristãos, ajudando a comunidade educativa a conviver com
base no amor e na justiça. Neste sentido, a pastoral se articula e se estende a
todo o território em que a unidade está inserida.
Promoção e defesa da vida na perspectiva do direito
[238].A ação profética na promoção e na defesa dos direitos das infâncias e das
juventudes contribui na edificação do Reino de Deus anunciado por Jesus
Cristo. Na Rede Marista de Solidariedade a ação profética se materializa no
305 JOÃO PAULO II Sollicitudo rei socialis. Apud INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Missão Educativa Marista, n. 153.
306 CNBB. Exigências evangélicas e Éticas de Superação da Miséria e da Fome, p. 18.
307 CNBB. Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil, n. 115 e 201.
Grupo Marista
121
atendimento de qualidade nos projetos socioeducativos. A defesa dos direitos
das crianças e dos jovens acontece por meio da denúncia diante das violações
dos direitos, na articulação em rede e na representatividade nos espaços de
formulação de políticas públicas, visto que “a partir do coração do Evangelho, reconhecemos a conexão íntima que existe entre evangelização e promoção humana, que se deve necessariamente exprimir e desenvolver em toda a
ação evangelizadora”. 308
4.3.5 Área da Saúde
[239].Os hospitais que compõem a Aliança Saúde, por sua identidade cristã, católica e marista, dedicam-se à promoção da vida humana, por meio do serviço da
saúde, com caráter educativo. A harmonia entre os conhecimentos produzidos, as tecnologias disponíveis, o potencial humano e profissional, e a espiritualidade institucional é a fonte de vitalidade e o diferencial de nossas ações.
[240]. Desta forma, em todos os processos que dinamizam a Aliança Saúde, do
ponto de vista pastoral, alguns posicionamentos são permanentemente
implementados:
Valores Institucionais assumidos transversalmente como fonte de
vitalidade
[241].A transversalidade da ação evangelizadora do Instituto exige que nossas lideranças exerçam suas funções a partir de valores éticos, cristãos e maristas. Isto é necessário para que o processo de gestão das relações, processos e
procedimentos sejam permeados pelo caráter humanizador dos valores Institucionais. Encontramos nas pessoas do Pe. Champagnat e do Ir. Francisco
modelos de inspiração. Além das lideranças, é necessário que todos os colaboradores que atuam na área da saúde fundamentem suas relações, processos e procedimentos nos valores Institucionais. Para tanto, é imprescindível
a criação de espaços de formação, ambientes de valorização e rotinas que promovam um comportamento que traduza os valores no cotidiano.
Atendimento multiprofissional e humanizado ao paciente
[242].Compreendendo o ser humano como multidimensional (bio-psico-sócio-espiritual), afirmamos que o atendimento humanizado ao paciente é a razão
de todos os nossos processos. Para que ele possa caracterizar-se como tal, é
necessário que a abordagem multiprofissional seja efetiva e eficaz. Portanto,
a constituição de equipes e protocolos multiprofissionais é fundamental.
Abordagem educativo-humanizadora (bioética e humanização)
[243].Possuindo em nossa Organização unidades hospitalares universitárias, é
nossa missão desenvolver uma atividade educativo-humanizadora com os
médicos residentes e corpo clínico. Estes também são sujeitos importantes
do jeito próprio de cuidar que constitui o nosso diferencial. Para tanto, é indispensável o alinhamento aos valores institucionais, a criação de espaços de
debate de temas do âmbito da bioética e da humanização, a fim de gerar uma
reflexão comum. Neste processo, a partir de seus profissionais, a Aliança
Saúde busca expressão significativa junto à sociedade adequando-se aos documentos da Política Nacional de Humanização, bem como às orientações do
Ministério da Saúde, Secretaria Estadual da Saúde e da Secretaria Municipal
da Saúde; tornando-se, assim, proativa em processos educacionais.
Educação para Prevenção e Promoção à Saúde
[244]. Iluminados pelo legado de Marcelino Champagnat, somos impelidos a desempenhar um serviço de prevenção em saúde junto à sociedade, com caráter
educativo. Quando os conhecimentos construídos por nossos profissionais
da saúde são partilhados com a população, sobretudo com as pessoas que se
encontram em situação de vulnerabilidade, além de ser um serviço de prevenção em saúde, é promoção da cidadania.
Eclesialidade
[245].Como parte do Instituto Marista, a Aliança Saúde está em comunhão com
a Igreja e a ajuda, por meio da difusão da saúde, no processo de edificação
do Reino de Deus. Para isto, em todas as suas unidades promove espaços de
308 Papa Francisco. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 178.
122
Diretrizes da Ação Evangelizadora
Grupo Marista
123
vivência espiritual e religiosa, como também precisa atuar em níveis eclesiásticos local, regional e nacional.
4.3.6 Ensino Superior
[246].A Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR, por sua identidade
cristã, católica e marista, assim como o Centro Universitário Católica de Santa
Catarina, têm a missão de dedicar-se sem reservas, por meio da educação, à
causa da verdade. Por isso, tornam-se espaços nos quais os conhecimentos
são partilhados, confrontados, sistematizados, constituídos em sabedoria e
colocados a serviço da vida. Como universidades católicas, primam pela formação de um ser humano integral e de uma sociedade justa, ética e solidária,
tendo o Evangelho como referência.
[247].Desta forma, ao lado do empenho pela excelência profissional-acadêmica,
para a realização de sua missão, cabe às Instituições de Ensino Superior (IES)
maristas priorizar alguns posicionamentos evangélico-pastorais:
Comunidade acadêmica em que o Evangelho e os valores
institucionais são vitais
[248].As IES maristas empenham-se permanentemente por constituir-se em comunidades nas quais o Evangelho e o carisma marista sejam traduzidos à
linguagem e aos desafios acadêmicos. Estes elementos são vitais e orientam
permanentemente os seguintes âmbitos: nosso ideal de ser humano e de sociedade; nosso jeito de educar, de pesquisar, de aprender e de partilhar o conhecimento; nossos processos pedagógicos, de planejamento, de formação
e avaliação; nossos posicionamentos políticos, opções estratégicas e sociais;
nosso jeito de administrar, de conviver e de se relacionar com a pluralidade;
nosso jeito de celebrar e de dar sentido à vida em suas diversas dimensões.
Dinamização da relação da fé com a cultura e os diversos saberes
[249].A comunidade acadêmica centrará esforços para a promoção, articulação e
dinamização do diálogo entre Fé, Ciência e Cultura, considerando as diversas
áreas de conhecimento. Com isso, ela oferece ao público acadêmico, à sociedade e à Igreja, de forma coerente e atualizada, reflexões devidamente fundamentadas sobre a convergência entre fé e razão, sobre os desafios relacionados à defesa da vida, sobretudo das infâncias e juventudes. Nesse processo, a
“cátedra do professor” é o lugar por excelência da promoção do diálogo entre
fé e ciência.
Espaço privilegiado para o desenvolvimento integral dos jovens
[250].Em todo seu empenho educativo, as IES maristas consideram como sua riqueza maior os jovens universitários e valorizam o seu potencial de transformação da sociedade. Desta forma, sob a inspiração do legado de Marcelino
Champagnat, elas garantem espaços de reflexão, debate, intercâmbios de experiências, participação e protagonismo social, com a finalidade de gerar lideranças jovens criativas, empreendedoras, com consciência cristã solidária,
sensibilidade ecológica e comprometimento sociotransformador.
Extensão do conhecimento – além-fronteiras
[251].A comunidade acadêmica se dedica à busca da verdade e está comprometida
com a justiça. A diversidade dos saberes constitui-se em um grande dom que,
profeticamente, está a serviço da dignidade do ser humano e da sua libertação integral. Por isso, estende os conhecimentos produzidos em seu seio à sociedade e à Igreja, por meio de eventos formativos309, projetos socioeducativos
emancipatórios e missões “além-fronteiras”. 310
Comunhão eclesial
[252].As IES maristas estão em comunhão com a Igreja Local; contam com o serviço eclesial oferecido pela Paróquia Universitária Jesus Mestre (no caso da
PUCPR, em Curitiba) e com as parcerias diversas realizadas com as arqui/
dioceses, nos demais campi e nas unidades da Católica de Santa Catarina.
Enquanto comunidades educativas de Ensino Superior Católicas, oferecem
a seus membros a dinamização dos sacramentos, da liturgia e orientação
309 Como, por exemplo, cursos específicos de extensão para agentes de pastoral, lideranças juvenis, comunidades do entorno, dentre outros.
310 Por “missões além-fronteiras” consideramos as iniciativas que ultrapassam as possíveis barreiras que podem ser constituídas nos âmbitos
pessoal, cultural, geográfico, político e religioso.
124
Diretrizes da Ação Evangelizadora
Grupo Marista
125
espiritual, cultivando, sobretudo na Eucaristia, a sabedoria que fundamenta
nossa ação educativa.
4.3.7 LUMEN
[253].Os meios de comunicação social (MCS/mass-media) estão diretamente relacionados ao desenvolvimento tecnológico. Tais tecnologias, caracterizadas
pelos novos meios de comunicação, estabelecem profundas mudanças na
cultura e nas relações humanas. Sobretudo hoje se torna quase impossível
pensar a humanidade sem eles. Além do rádio e da TV, a expansão e aperfeiçoamento da Internet – na sua competência de fazer convergir todos os meios
e linguagens da comunicação – consolida-se como ferramenta de grande relevância social, afetando de modo imensurável as gerações contemporâneas e
futuras, especialmente as crianças e jovens – que são caras ao nosso carisma
– e que crescem em estreito contato com mundo digital, com a comunicação
midiática e todo seu potencial educativo. A Igreja reconhece o potencial extraordinário dessas novas tecnologias. 311 Diante dessas considerações, a ação
pastoral no LUMEN leva em conta:
Ação educativo-pastoral ampliada
[254].Os Meios de Comunicação Social Maristas precisam ser reconhecidos como
instrumentos que influenciam de maneira contundente a dimensão ético-cultural. Por isso, ao lado da qualificação técnica que caracteriza a expertise
do LUMEN, a sua missão educativo-pastoral o desafia a ser espaço de conscientização, de desenvolvimento do senso crítico, de sensibilidade planetária,
de solidariedade, da cultura do diálogo e da amizade, do advocacy 312, em vista
311 “Dada a importância fundamental que [os meios de comunicação] têm na determinação de alterações no modo de ler e conhecer a
realidade e a própria pessoa humana, torna-se necessária uma atenta reflexão sobre a sua influência principalmente na dimensão éticocultural da globalização e do desenvolvimento solidário dos povos. [...] devem ser buscados no fundamento antropológico. Isto quer dizer
que os mesmos podem tornar-se ocasião de humanização, não só quando, graças ao desenvolvimento tecnológico, oferecem maiores
possibilidades de comunicação e de informação, mas também e sobretudo quando são organizados e orientados à luz de uma imagem da
pessoa e do bem comum que traduza os seus valores universais. [...] é preciso que estejam centrados na promoção da dignidade das pessoas
e dos povos, animados expressamente pela caridade e colocados ao serviço da verdade, do bem e da fraternidade natural e sobrenatural.
[...] Os mass media podem constituir uma válida ajuda para fazer crescer a comunhão da família humana e o ethos das sociedades, quando
se tornam instrumentos de promoção da participação universal na busca comum daquilo que é justo.” (BENTO XVI. Caritas in veritate, n. 73)
312 Advocacy, em linhas gerais, equivale à expertise do Instituto em atuar na defesa de algum dos direitos humanos. Por exemplo: da parte
dos Irmãos Maristas, o interesse maior se dirige à promoção e defesa dos Direitos da Criança. O termo já aparece nessa mesma grafia –
“advocacy”, sem tradução para o português – em alguns documentos e orientações institucionais.
126
Diretrizes da Ação Evangelizadora
da aproximação da grande família humana. Bem usadas, estas tecnologias
são um verdadeiro dom para a humanidade.
Difusão dos valores humanos, cristãos e Maristas
[255].É insuficiente, sob o ponto de vista cristão, restringir os meios de comunicação à sua competência de interligar as pessoas, de informar, de entreter,
de fazer circular ideias, de vender produtos e serviços. A coerência ética do
LUMEN confere-lhe o papel de promover o ethos da sociedade por meio da
difusão dos valores cristãos e maristas, na busca do bem comum e daquilo
que é justo. Nesse sentido, a tradução, a compreensão de nossa história e o
acolhimento dos valores institucionais se efetiva na medida em que eles se
encarnam em nossos produtos, no conteúdo veiculado, no nosso modo de
empreender e passam a ser percebidos e reverenciados pelo público externo.
Produtos e serviços específicos para a evangelização
[256].“O anúncio de Cristo no mundo das novas tecnologias supõe um conhecimento profundo das mesmas para se chegar à sua conveniente utilização”.
313
O LUMEN constitui-se como um “dom de Deus para a sociedade” 314 na
medida em que comunga com o Instituto Marista da mesma missão e se faz
reconhecido pela sua excelência técnica e estética. Da mesma maneira, com o
intuito de potencializar as ações pastorais da Igreja e demais segmentos maristas, coloca sua expertise a serviço, no suporte e na elaboração de produtos
específicos315 para a evangelização.
4.3.8 Editora FTD
[257].A Editora FTD, no contexto do Instituto Marista, está inserida na missão
de educar, em busca da formação de um ser humano pleno e de uma sociedade justa, ética e solidária. Por meio da excelência na criação, produção e
313 BENTO XVI. Caritas in veritate, n. 73.
314 Cf. Mensagem do Papa Bento XVI para o 43º Dia Mundial das Comunicações Sociais: Novas tecnologias, novas relações. Promover uma
cultura de respeito, de diálogo, de amizade. 24 de Maio 2009. Disponível em: <http://www.vatican.va>.
315 Por serviços e produtos específicos entende-se: assessoria técnica em tecnologias da comunicação, edição de vídeos, documentários,
spots de TV, spots de rádio e similares.
Grupo Marista
127
distribuição de subsídios de qualidade, apoia o educador e seus processos
educacionais.
[258].Para que isso aconteça, algumas prioridades no âmbito da cultura organizacional, a partir da identidade institucional, são estabelecidas:
Desenvolvimento integral do colaborador
[259].Fazer com que o trabalho seja produtivo e o colaborador possa se realizar
como pessoa, alinhado ao compromisso social, fortalecendo valores pessoais e desenvolvendo habilidades, competências e mecanismos de comunicação e relacionamento com as diversas áreas e unidades da instituição,
com conhecimento da dinâmica e oportunidades do ambiente de negócios
sempre atualizado.
[260]. Desenvolver a cultura da solidariedade, fazendo com que os benefícios
conquistados pelos negócios sejam revestidos para a consecução da missão.
Criar sinergia com os setores, buscando desenvolver ações conjuntas que
possam apoiar o desenvolvimento de ações sociais, de educação formal, saúde e comunicação.
Difusão dos valores humanos, cristãos e maristas, traduzidos à
cultura atual
[261].Como difusora do conhecimento junto à sociedade, por meio da criação,
produção e distribuição de subsídios didáticos de qualidade, a Editora FTD
encara suas tecnologias como um verdadeiro dom para a humanidade, pelo
qual presta serviço a todas as comunidades.
[262].Os valores corporativos da FTD – conduta ética, credibilidade, integração,
autonomia responsável, compromisso com a sustentabilidade, espiritualidade e inovação, fundamentados nos valores cristãos e maristas da justiça,
espirito de família, presença significativa, amor ao trabalho, espiritualidade e
128
Diretrizes da Ação Evangelizadora
simplicidade – são traduzidos nas dimensões ética e estética com a finalidade
de tornar presentes em suas publicações a opção pela vida em sua integralidade, o desenvolvimento da autonomia do sujeito, sobretudo das crianças e
dos jovens, a promoção da solidariedade, da alteridade, da sensibilidade ecológica e da aproximação da grande família humana.
Produtos e serviços específicos para a evangelização
[263].A autêntica educação visa ao aprimoramento da pessoa humana em relação
a seu fim último e ao bem das sociedades. Neste processo, a educação cristã
tem muito a contribuir, beneficiando particularmente os jovens, que constituem a esperança da sociedade. 316 Compreendendo a sua missão, a FTD
constitui-se como um dom de Deus para a sociedade, na medida em que se
faz reconhecida por sua excelência técnica e, na sua abrangência, vai além
dos limites das unidades maristas. Por isso, compromete-se também em elaborar produtos e prestar serviços específicos para a evangelização317, com a
finalidade de potencializar as ações pastorais do Grupo Marista, do Instituto
Marista e da Igreja.
4.3.9 Rede de Colégios
[264].O documento Missão Educativa Marista, bem como outros documentos institucionais (Projeto Educativo do Brasil Marista), afirma de forma contundente
que “um Colégio Marista é um centro de aprendizagem, de vida e de evangelização, que harmoniza fé, cultura e vida”. 318 É lugar que deve propiciar um
processo educacional coerente com a visão que temos do ser humano na sua
integralidade. Deste modo, como Escola Católica, cumpre-nos estabelecer um
processo pedagógico-pastoral que seja coerente com a visão de ser humano
que temos, onde as crianças, adolescentes, jovens e demais participantes da
comunidade educativa, sejam parte ativa do processo319, favorecendo assim a
promoção de sujeitos cidadãos, capazes de serem fermento na comunidade
316 Cf.Gravissimum Educationis, n. 1503 a 1505.
317 Serviços de diagramação, desenvolvimento de arte e impressão de materiais didáticos – livros, cadernos, coleções, jogos interativos, etc. –
com a finalidade de apoiar iniciativas pastorais nos seguintes âmbitos de atuação: catequese, pastorais de juventude, pastorais que atuam
com crianças e adolescentes, pastoral da Educação, pastoral da Cultura e equivalentes.
318 Cf. INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Missão Educativa Marista, n 126.
319 PMBCS. DERC. Projeto marista para o ofício de aluno, p. 146-153.
Grupo Marista
129
humana, em vista da construção do Reino de Deus.”. 320 Isso será plenamente
possível na medida em que nossos colégios estabeleçam uma cultura organizacional participativa, que cause, entre todos os envolvidos, um sentimento
de pertença e corresponsabilidade quanto à proposta pedagógico-pastoral,
favorecendo uma ação educativa-evangelizadora, coerente, planejada e organizada. Desta forma, comprometidos com a realização da missão legada por
Champagnat, a Rede de Colégios Marista sinaliza as seguintes prioridades:
Um processo educativo-pastoral que promova o conhecimento, a vida
e os valores inerentes ao Evangelho
[265].A partir de uma proposta pedagógico-pastoral que permite a articulação de
conteúdos educativo-pastorais em projetos e ações elaborados e desenvolvidos de forma integrada e integradora, favorecendo o espírito crítico, a participação, a liberdade, a responsabilidade, a espiritualidade e a solidariedade
dos envolvidos, somos convidados a ter um constante olhar sobre os movimentos da realidade escolar, abrindo caminho para que a dimensão da fé
apareça sempre articulada com os demais saberes, de modo orgânico e não
impositivo. Por isso, a comunidade educativa empenha-se para que a proposta pedagógico-pastoral seja assimilada como instância fundamental ao desenvolvimento integral do sujeito.
Uma escola acolhedora e fraterna
[266].No contexto pluralista de nossas escolas, expomos Jesus Cristo e a Igreja de
maneira atualizada como itinerários capazes de orientar uma vida plena.
Para tanto, sinalizamos a importância da acolhida, do diálogo ecumênico e
inter-religioso, que permita a valorização da identidade de cada sujeito, ajudando a comunidade educativa a conviver com respeito e paz, aproveitando
as potencialidades desta diversidade no processo educativo-pastoral, onde a
evangelização aproxime as pessoas em torno do mesmo Deus e que nos ensina a ver na comunhão um profundo gesto de amor, que promove relações
mais justas e fraternas. Uma escola que internamente fortifique os vínculos
320 Cf. Gravissimum Educationis, n. 1517.
130
Diretrizes da Ação Evangelizadora
entre seus sujeitos com perspectiva de que tal atitude seja realizada e ampliada também externamente.
Formação das infâncias e juventudes tendo em vista o protagonismo
eclesial e político
[267].Reconhecemos que as crianças e jovens estão em processo de amadurecimento na fé e discernimento de seu papel social e político. Por isso, devemos cuidar para que as experiências promovidas sejam cada vez mais participativas
desde sua concepção, fazendo com que a dimensão pessoal, comunitária e
social encontre maior significado para eles. Assim, respeitamos os tempos
do desenvolvimento das infâncias e juventudes, ajudando-lhes a formar um
caráter ético e colaborando no discernimento de sua vocação.
Pastoral transversal, integrada e integradora diante dos processos da
escola
[268].A Pastoral, entendida como “ação evangelizadora”, é mais que uma área da
escola. Ela busca integrar-se transversalmente aos processos pedagógicos,
administrativos e de gestão, caracterizando uma “Escola em Pastoral” 321, na
qual todos se sentem corresponsáveis em evangelizar. A Pastoral tem reflexos na tradução dos valores cristãos e institucionais para a comunidade educativa tanto quando propõe como quando partilha de processos articulados
por outras áreas da escola. Neste sentido, entendemos que a ação evangelizadora se fortalece no diálogo com as famílias, bem como com os atores do
entorno da unidade.
321 O desafio pastoral da escola católica consiste em compreender-se na complexidade de seu conjunto: ela é um corpo com diferentes órgãos
que, embora cada qual tenha diferentes funções, harmonizam-se em função dos mesmos objetivos. Assim deve ser a sua organicidade
pastoral. “A Escola Católica existe para evangelizar. Como instância avançada da Igreja no campo da cultura, no mundo da educação, e sem
em nada diminuir a sua função humanizadora [...] a escola católica é a própria Igreja em estado de missão, sinal da presença de Deus no
amadurecimento humano”. (PANINI, 1999ª, n. 67, p. 21. Para mais referências, ver: PANINI; CUNHA, 1999, n. 65.; PANINI, 1999b, n. 69). Ver
também “Universidade em pastoral” em: Carta de Betânia: uma Universidade Católica em ‘pastoral’. In CNBB, 1988. P. 333-335.
Grupo Marista
131
Formação contínua e conjunta
[269].A escola marista deve promover, indistintamente, formação para os sujeitos
de sua comunidade educativa, de maneira orgânica e processual, conforme a
realidade em que está inserida. Deve zelar, para que, de modo coerente, a formação favoreça o reconhecimento e aprimoramento da proposta pedagógico-pastoral entre os participantes da comunidade educativa a fim de que todos
possam ser considerados corresponsáveis no processo de evangelização.
[270].Em particular, para aqueles que possuem o interesse e possibilidade de aprofundar o carisma marista322, é necessário assegurar o acesso à qualificação
permanente, valorizando iniciativas e o empenho dos colaboradores que comunicam e vivem o carisma institucional com profissionalismo e coerência.
4.3.10 Pastoral Juvenil Marista – PJM
[271].A Pastoral Juvenil Marista (PJM) tem por objetivo estabelecer um processo de formação integral que desenvolva os aspectos da espiritualidade,
da eclesialidade, da autonomia, do aprofundamento no carisma marista,
do protagonismo juvenil e da intervenção na sociedade. É uma proposta
educativo-evangelizadora323 que almeja, por meio da escuta e participação
dos jovens, capacitá-los para encontrar respostas autênticas aos anseios e
necessidades fundamentais das juventudes e da evangelização. “Ao contemplar os horizontes da Pastoral Juvenil Marista sonhamos com uma juventude solidária, protagonista, com valores evangélicos, comprometida com a
cidadania e com o conhecimento científico, inserida na realidade, portadora
de esperança e transformadora da sociedade”. 324 A PJM é uma proposta
que busca desenvolver:
322 Conforme a política de formação em identidade institucional, que está organizada em quatro níveis: integração, imersão, aprofundamento
e adesão.
323 INSTITUTO DOS IRMÃOS MARISTAS. Missão Educativa Marista, 2003.
324 UMBRASIL. Diretrizes Nacionais da Pastoral Juvenil Marista, n. 368.
132
Diretrizes da Ação Evangelizadora
O processo de amadurecimento na fé325 e o desenvolvimento humano
[272].A fundamentação e a mística da PJM propõem um processo a ser percorrido em grupos. Os grupos de PJM nascem com a finalidade de ser lugar
em que o jovem possa se expressar, entrar em contato com outros jovens,
criar e recriar sua identidade e, dessa maneira, vivenciar experiências que
proporcionam o amadurecimento na fé e o crescimento enquanto pessoa,
permitindo-lhes ampliar o sentido da vida. Todo o processo vivido contribui para que o jovem perceba sua importância na transformação do mundo
e descubra sua vocação.
O protagonismo juvenil
[273].Em sua essência, a PJM promove a participação do jovem e do adulto como
corresponsáveis de um processo pastoral, com a “cara do jovem”, com a sua
linguagem e jeito de ser. Para ser efetiva, a ação evangelizadora deve favorecer o protagonismo em diferentes âmbitos, dentre os quais enfatizamos: a)
participação eclesial: no envolvimento com a Igreja local, despertando o jovem
para encontrar nela espaços de referência da vivência comunitária da fé, partindo do pressuposto de que o projeto de Jesus é um projeto de fraternidade;
b) participação político-social: inserção em espaços nos quais o jovem tenha
a possibilidade de vivenciar a cidadania, sendo semente de transformação
social, participando de espaços democráticos de decisão, reconhecendo-se
como sujeito de direitos.
A formação integral
[274].A PJM é organizada de maneira a dialogar com a dinâmica do desenvolvimento dos adolescentes e jovens e com as dimensões da vida. Sua proposta
dá suporte aos grupos para que seus participantes possam trilhar uma caminhada de vida baseada nas descobertas e nas relações consigo, com os outros,
com Deus, com a sociedade e com a natureza.
325 UMBRASIL. Caminho da Educação e Amadurecimento na Fé. A Mística da Pastoral Juvenil Marista, 2008.
Grupo Marista
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141
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