síntese e propriedades estruturais e magnéticas de
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síntese e propriedades estruturais e magnéticas de
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FÍSICA RODOLFO ARAUJO VICTOR SÍNTESE E PROPRIEDADES ESTRUTURAIS E MAGNÉTICAS DE MANGANITAS DOPADAS COM COBRE VITÓRIA 2005 RODOLFO ARAUJO VICTOR SÍNTESE E PROPRIEDADES ESTRUTURAIS E MAGNÉTICAS DE MANGANITAS DOPADAS COM COBRE Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Física do Centro de Ciências Exatas da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Física, na área de concentração de Física da Matéria Condensada. Orientador: Prof. Dr. Jair Carlos Checon de Freitas. VITÓRIA 2005 RODOLFO ARAUJO VICTOR SÍNTESE E PROPRIEDADES ESTRUTURAIS E MAGNÉTICAS DE MANGANITAS DOPADAS COM COBRE Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Física do Centro de Ciências Exatas da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Física, na área de concentração de Física da Matéria Condensada. Aprovada em 31 de março de 2005 Comissão Examinadora Prof. Dr. Jair Carlos Checon de Freitas Universidade Federal do Espírito Santo Orientador Prof. Dr. Renato de Figueiredo Jardim Universidade de São Paulo Prof. Dr. Marcos Tadeu D’Azeredo Orlando Universidade Federal do Espírito Santo Prof. Dr. Carlos Larica Universidade Federal do Espírito Santo Ao meu pai, Joseir. Agradecimentos Ao Prof. Dr. Jair C. C. Freitas, pela objetividade e responsabilidade dedicadas à orientação deste trabalho. Ao Prof. Dr. Marcos Tadeu D. Orlando, pela co-orientação e o apoio durante estes dois anos, principalmente nas etapas de preparação e caracterização estrutural das minhas amostras. Ao Prof. Dr. Edson Passamani, pelo pronto auxílio com minhas dúvidas na área de magnetismo. Ao Prof. Dr. Tito J. Bonagamba, cuja ajuda inestimável possibilitou as medidas de RMN nas minhas manganitas. Aos Profs. Dr. Ivan S. Oliveira e Dr. Roberto Sarthour, pelo apoio nas medidas de RMN no Rio de Janeiro. Ao Prof. Dr. Armando Takeuchi, pelo apoio na etapa de caracterização magnética no CBPF e ao amigo Maurício G. das Virgens, pelas medidas e preciosas discussões nesta parte da pesquisa. Ao Prof. Dr. Alfredo G. Cunha, pelo auxílio prestado nas mais diversas etapas do meu trabalho. Ao Dr. Antônio Bloise, pelo auxílio com os experimentos de RMN em São Carlos e ao Ruben Auccaise, pelas noites revezadas garimpando os espectros de RMN no Rio de Janeiro. Ao CNPq, pelos dois anos de bolsa, e às instituições de fomento CAPES, CNPq, FINEP e FAPESP, pelo apoio financeiro aos diversos laboratórios envolvidos nesta pesquisa. Ao amigo José Luiz Passamai Jr., pelo auxílio na preparação das amostras. Ao amigo Bruno Lopes Cunha, pelas imagens de microscopia eletrônica na UFES e ao engenheiro Yukio Nishida, pelas imagens de microscopia eletrônica realizadas na Companhia Siderúrgica de Tubarão. Ao amigo Miguel Ângelo, pelo companherismo e acompanhamento da pesquisa. Aos meus amigos do Laboratório de Materiais Carbonosos e Cerâmicos e Laboratório de Plasma Térmico, pela amizade e convivência agradável no dia-a-dia de trabalho. Aos meus pais, Joseir e Maria Alzira, e irmãos, Joseir Jr. e Douglas, incentivo e apoio constantes e incondicionais. A toda a minha família, parentes meus ou da minha esposa, pelo apoio e compreensão nas horas de ausência. Aos meus filhos, João Pedro e Francisco, minha motivação de cada dia. À minha esposa, Maria Carolina, para quem dedicatórias e agradecimentos não são capazes de traduzir sua importância em minha vida. E a Deus, pela constante presença em cada dia, e a quem mais agradeço pela conclusão de mais esta etapa. “Enquanto existir vontade de lutar, existem esperanças de vencer.” Santo Agostinho Resumo As manganitas atraem grande interesse da comunidade científica desde a década de 1950, devido à complexa e intrigante interação entre suas propriedades estruturais, magnéticas e de transporte elétrico. O exemplo mais conhecido destas interações é o efeito de magnetorresistência colossal, responsável pelo renovado interesse nestes materiais nos últimos anos. As propriedades das manganitas de composição R1−x Ax MnO3 (R–terra rara trivalente, A–metal bivalente) são controladas pela coexistência de íons Mn3+ e Mn4+ , criada pela substituição parcial de R3+ por A2+ . Uma forma interessante de entender melhor as propriedades intrínsecas das manganitas é por meio de dopagem no sítio do Mn, geralmente por íons de outros metais de transição. Este trabalho descreve a preparação e caracterização estrutural e magnética de compostos La0,86 Sr0,14 Mn1−y Cuy O3+δ , com concentrações y = 0; 0,05; 0,10; 0,15 e 0,20. A substituição de Mn por Cu não mostrou forte influência na estrutura cristalina dos compostos, que preservou a simetria romboédrica em todo o intervalo de dopagem estudado. Entretanto, observou-se uma diminuição do volume da célula unitária acompanhada por um ligeiro aumento na distorção da estrutura para amostras com y = 0,15 e 0,20. Imagens de microscopia eletrônica de varredura revelaram microestrutura homogênea em todas as amostras, além de uma tendência a menores grãos e maior porosidade com o aumento do teor de cobre. As propriedades magnéticas demonstraram grande sensibilidade à dopagem com cobre. Medidas de magnetização em função da temperatura revelaram uma transição paramagnética-ferromagnética em todas as amostras, com a temperatura de Curie reduzida e a transição alargada para maiores concentrações de cobre. Uma queda na magnetização das amostras dopadas com cobre também foi encontrada em temperaturas abaixo da temperatura de Curie. Estas observações foram interpretadas em termos de coexistência de fases ferro e antiferromagnéticas em baixas temperaturas, onde a existência da fase antiferromagnética é favorecida pela presença dos íons de Cu na sub-rede do Mn. Os espectros de ressonância magnética nuclear (RMN) de 139 La em campo zero reforçaram esta idéia, uma vez que a forma espectral permaneceu essencialmente inalterada, enquanto a magnetização diminuiu consideravelmente nas amostras dopadas. O sinal detectado de RMN foi associado a regiões ferromagnéticas em todas as amostras. Os resultados indicam coexistência de diferentes fases magnéticas nas manganitas estudadas, embora a estrutura cristalina não tenha apresentado alterações significativas. Abstract Manganites have attracted great interest from the scientific community since the 1950’s, due to the complex and intriguing interaction between their structural, magnetic and electric transport properties. The most known example is the effect of colossal magnetoresistance, responsible for the renewed interest in these materials in the last years. The properties of manganites with composition R1−x Ax MnO3 (R–rare earth, A–divalent metal) are controlled by the coexistence of Mn3+ and Mn4+ ions, created by the substitution of A2+ for R3+ ions. An interesting way to better understand the intrinsic properties of manganites is by doping the Mn site, usually with other transition-metal elements. This work describes the preparation and structural and magnetic characterization of La0.86 Sr0.14 Mn1−y Cuy O3+δ compounds, with y = 0, 0.05, 0.10, 0.15 and 0.20. The Cu for Mn substitution did not show strong influence in the crystal structure of the compounds, which preserved the rhombohedral symmetry in the doping-range investigated. However, the volume of the unit cell decreased and an increase in the rhombohedral distortion was verified for doped samples with y = 0.15 and 0.20. Scanning electron microscopy images revealed homogeneous microstructure in all samples, besides a trend for smaller grains and larger porosity with increasing Cu content. The magnetic properties were found to be quite sensitive to the Cu doping. Magnetization vs. temperature measurements revealed a paramagnetic to ferromagnetic transition in all samples, with lower Curie temperatures and broader transitions for samples with higher Cu contents. A drop in the magnetization of the Cu-substituted samples was also found at temperatures below the Curie temperature. These observations were interpreted in terms of the coexistence of ferro and antiferromagnetic phases at low temperatures, where the existence of the antiferromagnetic phase is favored by the presence of Cu ions in the Mn sub-lattice. Zero-field 139 La nuclear magnetic resonance (NMR) measurements reinforced this assumption, since the spectral shape remained essentially the same, whereas the bulk magnetization was drastically reduced in doped samples. The NMR signal was associated with ferromagnetic regions in all samples. The results indicate a coexistence of different magnetic phases in the studied manganites, although no significant changes in the crystal structure have been observed with increasing Cu substitution. Lista de Figuras 1.1 Diagramas de fases eletrônicas e magnéticas para manganitas. . . . . . . 17 1.2 Correlação entre magnetização, constantes de rede e resistividade elétrica em manganitas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 1.3 Magnetorresistência colossal em um cristal de La0,825 Sr0,175 MnO3 . . . . . 19 1.4 Interação entre resistividade, magnetorresistência colossal e magnetização para La0,8 Sr0,2 MnO3 cerâmico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 1.5 Resultados pioneiros obtidos por Jonker e Van Santen. . . . . . . . . . . 21 1.6 Estrutura cristalina da perovsquita cúbica ideal. . . . . . . . . . . . . . . 23 1.7 Distorções Jahn-Teller do octaedro MnO6 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 1.8 Exemplos de distorções da estrutura perovsquita cúbica ideal. . . . . . . 24 1.9 Diagrama de fases estruturais para manganitas La1−x Srx MnO3+δ em função da dopagem e da pressão parcial de oxigênio na síntese das amostras. 25 1.10 Ocupação dos níveis de energia dos íons de manganês sujeitos ao campo cristalino do octaedro de oxigênio que os cerca . . . . . . . . . . . . . . . 28 1.11 Alguns possíveis modos magnéticos para o Mn em manganitas. . . . . . . 30 1.12 Diagrama de fases estruturais, magnéticas e de transporte elétrico do composto La1−x Srx MnO3+δ para 0 ≤ x ≤ 1. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 1.13 Magnetização em função da temperatura para La1−x Srx MnO3+δ com 0,5 ≤ x ≤ 0,6. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 1.14 Ordenamento orbital e de carga para os íons de Mn . . . . . . . . . . . . 32 1.15 Difração de raios-X para LaMn1−x Cux O3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 2.1 Variação da temperatura no forno durante os tratamentos térmicos. . . . 42 2.2 Análise termogravimétrica para a amostra 0%. . . . . . . . . . . . . . . . 43 2.3 Diagrama de blocos do espectrômetro de RMN utilizado. . . . . . . . . . 48 2.4 Seqüência de pulsos utilizada para aquisição dos espectros de RMN. . . . 48 2.5 Espectro de RMN de 139 La para a amostra 0% antes e depois do procedimento de smoothing. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 Comparação dos difratogramas de raios-X para as amostras 0% e 15% após terceiro e quarto tratamentos térmicos. . . . . . . . . . . . . . . . . 51 3.1 3.2 Difratogramas de raios-X dos reagentes utilizados para a preparação das amostras de manganita. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 Difratogramas de raios-X das amostras de La0,86 Sr0,14 Mn1−y Cuy O3+δ após o quarto tratamento térmico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 3.4 Identificação das fases formadas nos compostos finais. . . . . . . . . . . . 53 3.5 Imagens de MEV para as amostras de manganita, formadas pela detecção de elétrons secundários. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 Comparação das imagens de microscopia eletrônica obtidas por deteção de elétrons retroespalhados e secundários. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 3.7 Imagens de MEV da região interna dos poros formadas por elétrons SE. . 55 3.8 Imagens de MEV para as amostras de manganita, formadas pela detecção de elétrons retroespalhados. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 Desdobramento Kα1 –Kα2 e ajustes gaussianos dos máximos de difração. . 59 3.10 Comparação entre as posições dos picos de DRX observados para a amostra 5% e o padrão de DRX para os GSE pertencentes a H1 . . . . . . . . . 60 3.11 Comparação entre a posição dos picos de DRX observados para a amostra 5% e o padrão de DRX para os GSE pertencentes a H2 . . . . . . . . . . . 60 3.12 Comparação entre as posições dos picos de DRX observados para a amostra 5% e o padrão de DRX para o sistema cúbico. . . . . . . . . . . . . . 60 3.13 Comparação entre as posições dos picos de DRX observados para a amostra 5% e o padrão de DRX para os GSE pertencentes a R1 . . . . . . . . . 61 3.14 Comparação entre as posições dos picos de DRX observados para a amostra 5% e o padrão de DRX para os GSE pertencentes a R2 . . . . . . . . . 61 3.15 Picos referentes ao La2 O3 presente nas amostras de manganita antes e depois da correção do angular do zero obtida por ajuste com o Celref. . . 62 3.16 Varição dos parâmetros da célula unitária romboédrica em função da dopagem com Cu. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 3.17 Estrutura romboédrica compacta. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 3.18 Curvas de magnetização FC e ZFC em função da temperatura para baixo campo aplicado. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 3.19 Exemplo de remoção do efeito de irreversibilidade termomagnética pela aplicação de campos externos mais intensos. . . . . . . . . . . . . . . . . 69 3.20 Curvas de suscetibilidade magnética DC em função da temperatura para as amostras de manganita. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 3.3 3.6 3.9 3.21 Obtenção dos valores de TC , TCpc e TCW para as amostras de manganita. . 70 3.22 Curvas de magnetização em função do campo aplicado para amostras de manganita. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72 3.23 Magnetização de saturação teórica e experimental em 4,2 K em função de y para La2/3 Ca1/3 Mn1−y Cuy O3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 3.24 Espectros de RMN de 75 139 La para as amostras de manganita. . . . . . . . Lista de Tabelas 2.1 Rótulos utilizados para os compostos deste trabalho. . . . . . . . . . . . 40 3.1 Proporções molares de cada íon obtidas por EDS. . . . . . . . . . . . . . 57 3.2 Regras de extinção limitando possíveis reflexões de Bragg para os GSE de padrão semelhante ao apresentado pelas amostras de manganita. . . . . . 62 Parâmetros estruturais refinados dos difratogramas de raios-X das amostras de La0,86 Sr0,14 Mn1−y Cuy O3+δ para o sistema romboédrico R3̄M . . . 63 Comparação entre os valores da aresta da célula unitária calculados a partir dos difratogramas de raios-X e para uma estrutura compacta com δ = 0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65 Quantidade relativa de Mn4+ , raio médio do sítio B e fator de tolerância calculados a partir dos valores encontrados para δ. . . . . . . . . . . . . . 65 Temperaturas de irreversibilidade termomagnética, de Curie, Curie-Weiss, e largura da transição calculadas para as amostras de manganita. . . . . 71 3.7 Comparação entre os momentos paramagnéticos calculados e esperados. . 71 3.8 Magnetização de saturação experimental em 4,2 K e valor máximo teórico calculado para as amostras de manganita. . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 Campo hiperfino transferido no sítio do La em regiões FM, estimado a partir do pico da linha central dos espectros de RMN de 139 La. . . . . . . 76 A.1 Dados do refinamento dos parâmetros estruturais para a amostra 0%. . . 92 A.2 Dados do refinamento dos parâmetros estruturais para as amostras 5% e 10%. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93 A.3 Dados utilizados para o refinamento dos parâmetros estruturais para as amostras 15% e 20%. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94 3.3 3.4 3.5 3.6 3.9 Lista de Acrônimos • AFM: antiferromagnético. • AFMI: antiferromagnético isolante. • Be : campo magnético efetivo. • CA: spin-canted. Estado de alinhamento em que os spins encontram-se em acoplamento não linear. • CBPF: Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas. • cc: campo cristalino. • CMR: (colossal magnetoresistance) magnetorresistência colossal. • CO: (charge ordering) ordenamento de carga. • DE: (double exchange) interação de dupla troca. • DRX: difração de raios-X. • EDS: (energy dispersive spectrometry) espectrometria por dispersão de energia. • f : fator de tolerância. • FC: (field-cooled ) resfriado(a) na presença de campo (magnético). • FM: ferromagnético. • FMM: ferromagnético metálico. • GCE: gradiente de campo elétrico. • GSE: grupo(s) de simetria espacial. • H1 : conjunto formado pelos GSE R3, R3̄, R32, R3M e R3̄M do sistema hexagonal. • H2 : conjunto formado pelos GSE R3C e R3̄C do sistema hexagonal. • HTSC: (high temperature superconductivity) supercondutividade em altas temperaturas. • I: número quântico de spin nuclear. • JT: Janh-Teller. • LMC: Laboratório de Materiais Carbonosos e Cerâmicos. • LPT: Laboratório de Plasma Térmico. • M : magnetização. • MEV: microscopia eletrônica de varredura. • MR: (magnetoresistance) magnetorresistência. • MS : magnetização de saturação. • OO: (orbital ordering) ordenamento orbital. • PDF: Powder Diffraction Files. • PMI: paramagnético isolante. • P(O2 ): pressão parcial de oxigênio. • Q: momento quadrupolar elétrico. • R1 : conjunto formado pelos GSE R3, R3̄, R32, R3M e R3̄M do sistema romboédrico. • R2 : conjunto formado pelos GSE R3C e R3̄C do sistema romboédrico. • rA : raio do íon que ocupa o sítio A da estrutura perovsquita. • hrA i: raio médio dos íons que ocupam o sítio A da estrutura perovsquita. • rB : raio do íon que ocupa o sítio B da estrutura perovsquita. • hrB i: raio médio dos íons que ocupam o sítio B da estrutura perovsquita. • RET: (elétrons) retroespalhados. • RF: radiofreqüência. • RMN: ressonância magnética nuclear. • rO : raio do íon que ocupa o sítio O da estrutura perovsquita. • SE: (elétrons) secundários. • Tbif : temperatura de bifurcação. Temperatura abaixo da qual as curvas de magnetização FC e ZFC apresentam valores diferentes. • TC : temperatura de Curie. Temperatura em que ocorre a transição FM. • TG: temogravimetria. • TM I : temperatura de transição metal-isolante. • TN : temperatura de Nèel. Temperatura em que ocorre a transição AFM. • x: concentração do dopante no sítio A da estrutura perovsquita. • y: concentração do dopante no sítio B da estrutura perovsquita. • ZFC: (zero-field-cooled ) resfriado(a) em campo (magnético) zero. Sumário 1 Introdução 16 1.1 Breve Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 1.2 Propriedades Estruturais e Eletrônicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 1.2.1 Estrutura Cristalina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 1.2.2 Íon de Mn no Cristal de La1−x Srx MnO3+δ . . . . . . . . . . . . . 26 Propriedades Magnéticas e de Transporte Elétrico . . . . . . . . . . . . . 29 1.3.1 Espectroscopia por RMN em Manganitas . . . . . . . . . . . . . . 33 1.4 Dopagem no Sítio do Manganês . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 1.5 Objetivos do Trabalho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 1.3 2 Materiais e Métodos 40 2.1 Síntese das Amostras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 2.2 Termogravimetria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 2.3 Análise Microestrutural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 2.3.1 Microscopia Eletrônica de Varredura . . . . . . . . . . . . . . . . 43 2.3.2 Espectrometria por Dispersão de Energia . . . . . . . . . . . . . . 44 Análise Cristalográfica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 2.4.1 Difração de Raios-X . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 2.4.2 Refinamento dos Parâmetros de Rede . . . . . . . . . . . . . . . . 45 2.5 Magnetização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 2.6 Ressonância Magnética Nuclear . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 2.4 3 Resultados e Discussão 50 3.1 Síntese das Amostras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50 3.2 Análise Microestrutural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 3.3 Propriedades Estruturais e Magnéticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57 3.3.1 Refinamento dos Parâmetros de Rede . . . . . . . . . . . . . . . . 58 3.3.2 Características Magnéticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66 3.3.3 Espectros de RMN de 74 139 La . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3.4 Considerações Finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78 4 Conclusão 80 Referências 83 A Parâmetros do Refinamento Estrutural 92 16 Capítulo 1 Introdução Os óxidos de metais de transição com estrutura similar ao mineral perovsquita CaTiO3 constituem campo de grande interesse para a Física Moderna, seja do ponto de vista teórico, experimental ou ainda visando aplicações tecnológicas. O fenômeno de supercondutividade em altas temperaturas (HTSC1 ) observado nos cupratos (óxidos de cobre) é um exemplo bem conhecido. Grande parte da atenção atual está voltada para os óxidos com valência mista no metal de transição, o que resulta na interação entre as propriedades estruturais, magnéticas e eletrônicas dos compostos, criando assim uma rica variedade de fases. O trabalho de Imada et al. [1] apresenta, em abordagens teóricas e experimentais, uma rica revisão das características intrínsecas de uma grande variedade desses óxidos. Neste campo, as manganitas (óxidos de manganês) de valência mista R1−x Ax MnO3+δ (R - terras raras, A - metais bivalentes) atraem destacado interesse por suas propriedades peculiares, que vêm sendo estudadas há mais de 50 anos. As pesquisas iniciais foram motivadas pela necessidade de desenvolver ferromagnetos isolantes com grandes magnetizações para a aplicação em altas freqüências. Desde então, os estudos demonstraram complexos diagramas de fases para estes compostos, que podem apresentar diversas propriedades como as de metais e isolantes, cristais iônicos e covalentes, ordenamentos magnéticos, orbital e de carga e, entre outros, transições de fase induzidas por pressão química ou campo magnético externo. Tais propriedades são controladas tanto pelos 1 High temperature superconductivity. 17 parâmetros específicos que caracterizam o material, como a composição e a estrutura cristalina, quanto pelas condições externas existentes, como temperatura e campos aplicados. A Figura 1.1 apresenta diagramas de fases eletrônicas e magnéticas em função da composição e temperatura para três manganitas típicas [2], onde é possível observar a variedade de configurações que estes materiais podem assumir. Figura 1.1: Diagramas de fases eletrônicas e magnéticas para três diferentes manganitas [2]. Legenda: PI-paramagnético isolante; PM-paramagnético metálico; CI-spin canted isolante; FIferromagnético isolante; FM-ferromagnético metálico; AFM-antiferromagnético metálico (tipo A); AFI-antiferromagnético isolante; COI-isolante com ordenamento de carga; CAFI-canted antiferromagnético isolante. As letras entre parênteses indicam o tipo de ordenamento magnético, que será discutido na seção 1.3. As siglas utilizadas nesta figura são diferentes das adotadas no texto, que serão apresentadas mais adiante. Resistividade elétrica, magnetização e estrutura cristalina encontram-se intimamente interligadas em manganitas. A busca pelo entendimento desta correlação tem levado a formulações de conceitos físicos importantes, como a interação de dupla troca [3] e o pôlaron Jahn-Teller (JT) [4]. A Figura 1.2 mostra a correlação entre estrutura, magnetismo e resistividade em compostos de Nd1/2 Sr1/2 MnO3 e Sm1/2 Ca1/2 MnO3 , que apresentam transições de ordenamento orbital (OO2 ) e de carga (CO3 ), cujo efeito é a diminuição da magnetização e o aumento da resistividade. Mudanças nos parâmetros de rede também são observadas na temperatura de transição TCO [2]. O interesse em manganitas na última década foi revivido principalmente devido ao descobrimento do efeito de magnetorresistência colossal (CMR4 ). Trata-se de uma enorme e negativa variação da resistência elétrica em função da aplicação de um campo magnético 2 Orbital ordering Charge ordering 4 Colossal magnetoresistance 3 18 Figura 1.2: Correlação entre magnetização, constantes de rede e resistividade elétrica em manganitas. Em Nd1/2 Sr1/2 MnO3 a temperatura de ordenamento de carga/orbital coincide com a temperatura de Nèel (TCO = TN ≈ 160 K), enquanto em Sm1/2 Ca1/2 MnO3 TCO ≈ 270 K e TN ≈ 170 K [2]. externo (Figura 1.3). A Figura 1.4 evidencia uma estreita correlação entre magnetização, resistividade e magnetorresistência, cujo valor máximo encontra-se próximo à temperatura de Curie (TC ) e à temperatura de transição metal-isolante (TM I ). O interesse no efeito de CMR deve-se ao seu grande potencial tecnológico na indústria de gravação e sensores magnéticos [7]. As manganitas possuem ainda potencial para outras aplicações, baseadas nas suas propriedades físicas e químicas. Aplicações na área química incluem catálise [8, 9], sensores de oxigênio, eletrólitos sólidos para células de combustíveis, redução e decomposição de NO, oxidação de CO e NH3 [8]. Dois trabalhos resumem de forma precisa o que as manganitas representam na atualidade. Segundo Salamon e Jaime [10], “[...] a compreensão dos problemas complexos propostos pelas manganitas certamente produzirá um avanço considerável na teoria da matéria condensada, e eventualmente verterá alguma luz em outros problemas em aberto, como por exemplo a HTSC”. Coey e Viret [8] dizem que “Estes compostos representam [...] a interação entre experimento, teoria e aplicação [...] da Física do Estado Sólido”. 19 Figura 1.3: Resistividade em função da temperatura para um cristal de La0,825 Sr0,175 MnO3 submetido a diferentes valores de campo magnético externo. Os círculos abertos representam a magnitude da magnetorresistência negativa −[ρ(H) − ρ(0)]/ρ(0) com campo de 15 T [5]. Figura 1.4: Resistividade (a), magnetorresistência (b) e magnetização de saturação (c) para La0,8 Sr0,2 MnO3 cerâmico [6]. 20 O composto La1−x Srx MnO3+δ exibe a maioria dos fenômenos mencionados nos parágrafos anteriores, inclusive CMR, que atinge seu valor máximo em torno de x = 0,3 [11,12]. A valência mista Mn3+ /Mn4+ é criada a partir da substituição parcial de La3+ pelo metal alcalino terroso bivalente Sr2+ . As seções seguintes trazem um histórico do início da pesquisa nas manganitas, bem como propriedades estruturais e magnéticas do óxido La1−x Srx MnO3 e a aplicação da técnica de ressonância magnética nuclear (RMN) na investigação das características magnéticas das manganitas. 1.1 Breve Histórico Os primeiros experimentos com manganitas são atribuídos aos físicos holandeses Jonker e Van Santen [13, 14], que em 1950 revelaram uma então surpreendente correlação entre a temperatura de Curie TC , a resistividade elétrica ρ e a magnetização de saturação MS em composições La1−x Ax MnO3 , onde A = Ca, Sr e Ba. Amostras policristalinas de La0,7 Sr0,3 MnO3 apresentaram os valores máximos TCmax ≈ 370K, condutividade elétrica σ max ≈ 300 (Ωm)−1 e MSmax ≈ 90 G/g (Figura 1.5), este último correspondendo à polarização total de todos os elétrons 3d do composto. O termo manganita, do inglês manganese perovskite 7→ manganite, foi atribuído por estes dois pesquisadores no primeiro trabalho [13], onde a observação de diferentes valores de TC para diferentes composições com parâmetros de rede idênticos levou à conclusão de que uma descrição em termos de simples interação de troca não era suficiente para explicar a temperatura de transição ferromagnética em manganitas. No ano seguinte, Zener [3] propôs uma nova forma de interação de troca entre portadores de carga, a chamada dupla troca (DE5 ), modelo que, embora incompleto, permanece até hoje como o cerne do entendimento a respeito dos óxidos magnéticos [10,15]. Na interação de dupla troca ocorre transferência simultânea de um elétron do Mn3+ para O2− e um elétron do O2− para o Mn4+ . O forte acoplamento via regra de Hund induz alinhamento ferromagnético dos spins dos íons de metais de transição e favorece a condução elétrica, uma vez que um elétron de condução tende a manter seu estado de spin ao mover-se de 5 Double exchange 21 Figura 1.5: Resultados pioneiros obtidos nos trabalhos de Jonker e Van Santen. Temperatura de transição (a), magnetização (b) e resistência elétrica (c) em função da dopagem x [13, 14]. um átomo a outro. Zener estabeleceu ainda, usando argumentos clássicos, uma relação entre condutividade elétrica e a temperatura de Curie: σ≈ xe2 TC ah T (1.1) onde x é a fração de Mn4+ , e a carga eletrônica, a o parâmetro de rede da estrutura cúbica perovsquita (distância Mn–Mn), e h a constante de Planck. A Equação 1.1 mostrou excelente concordância com os dados de Jonker e Van Santen e constituiu a primeira descrição qualitativa de relação entre condutividade elétrica e ferromagnetismo. A interação de dupla troca é fundamentalmente diferente da interação de supertroca (SE6 ), onde a interação envolvendo estados excitados favorece o acoplamento antiferromagnético. Em 1954 Volger [6] descobriu uma relação linear entre magnetorresistência (MR) e magnetização, estabelecendo definitivamente a correlação entre magnetismo e condutividade elétrica. No ano seguinte, Anderson e Hasegawa [16] revisaram a teoria de Zener e chegaram ao resultado de que a transferência eletrônica efetiva é proporcional a cos(θ/2), onde θ é o ângulo clássico entre spins da camada 3d de átomos vizinhos, indicando que um ordenamento FM aumenta a condutividade elétrica. Ainda nesse ano apresentou-se o primeiro diagrama de fase magnética de manganitas, obtido por difração de nêutrons em compostos de La1−x Cax MnO3 [17]. 6 Superexchange. 22 Em 1956 Jonker publicou a primeira tentativa de correlacionar estrutura cristalina e propriedades magnéticas à luz da interação de dupla troca [18]. Seu trabalho possibilitou a conclusão de que a interação de dupla troca é mais forte se o ângulo de ligação Mn– O–Mn estiver próximo de 180o , ou seja, quando a estrutura se aproxima da perovsquita cúbica. Outros trabalhos seguiram estes pioneiros na década seguinte. Nos anos 70 e 80, pouco foi feito neste campo, seguindo a crença de que a dupla troca continha os elementos essenciais para o entendimento das propriedades das maganitas. No início dos anos 90 as propriedades desses óxidos eram interpretadas em termos de uma correlação forte elétron-elétron, própria de óxidos de metais de transição, aliada ao comportamento localizado ou não dos elétrons à medida em que a composição química do composto variava [19]. Porém, a descoberta de HTSC [20], peculiar aos cupratos, demonstrou que o entendimento dos processos inerentes a óxidos de metais de transição não era satisfatório, e um refinamento na teoria desenvolvida até então tornou-se necessário. O atual e gigantesco interesse em manganitas deve-se ao descobrimento de CMR, quase simultâneo à HTSC [19]. Estes dois efeitos, aliados à observação de transições estruturais e metal-isolante induzidas por campo magnético [2, 21–24] despertaram tanto em pesquisadores experimentais como em teóricos um grande interesse em reexaminar os vários óxidos de metais de transição e entender os mecanismos envolvidos [25–27]. Atualmente diversos grupos de pesquisa se dedicam ao estudo de manganitas de diferentes composições, seja em investigações experimentais ou interpretações teóricas. Entretanto, um entendimento satisfatório dos processos físicos pertinentes ainda não foi obtido, apesar do esforço empregado. 23 1.2 1.2.1 Propriedades Estruturais e Eletrônicas Estrutura Cristalina A estrutura cúbica do mineral perovsquita CaTiO3 é comum a muitos óxidos de fórmula ABO3 , onde os cátions A e B diferem consideravelmente em tamanho [28]. Nas manganitas, o sítio A é ocupado por íons de terras raras, Bi3+ , íons bivalentes de metais alcalinos terrosos ou ainda Pb2+ , enquanto o sítio B é normalmente preenchido por íons de manganês. A Figura 1.6 ilustra a estrutura da perovsquita ideal. Em torno de cada íon de manganês forma-se um octaedro de íons de oxigênio, aumentando a energia de coesão através de ligações covalentes Mn–O. Os átomos de oxigênio são compartilhados entre octaedros vizinhos, razão pela qual deformações ou rotações desta subestrutura não ocorrem de forma isolada. Figura 1.6: Estrutura cristalina da perovsquita cúbica ideal [28]. Embora as manganitas tenham sua estrutura derivada da perovsquita mostrada na Figura 1.6, poucas apresentam precisamente a simetria cúbica. Efeitos diversos criam deformações no arranjo atômico, dentre os quais citam-se a deformação do octaedro MnO6 devido ao efeito JT [2, 8, 29, Figura 1.7]; pressão química resultante da diferença entre os raios iônicos dos elementos do sítio A nos compostos dopados [19]; conexão entre os MnO6 , formando estrutras romboédricas ou ortorrômbicas [2, Figura 1.8]; temperatura de tratamento e pressão parcial de oxigênio [P(O2 )] durante a síntese do composto [30]. Além disso, transições de fase estrutural também podem ser induzidas por meio de aplicação de campo magnético externo [2, 21–24], como dito anteriormente . A mudança na 24 estrutura cúbica altera o ângulo de ligação Mn–O–Mn e portanto a interação de salto eletrônico e a largura de banda, o que acarreta uma alteração das propriedades magnéticas e de transporte elétrico do composto. Figura 1.7: Superior: distorção Jahn-Teller do octaedro MnO6 [2]. Inferior: distorções da estrutura cristalina devido ao efeito JT [29]. Figura 1.8: Exemplos de distorções da estrutura perovsquita cúbica ideal. Esquerda: ortorrômbica. Direita: romboédrica [2]. Considerando compacta a estrutura mostrada na Figura 1.6, a proporção entre as somas √ dos raios iônicos rA + rO e rB + rO deve ser 1 : 2. Define-se então o chamado fator de tolerância f (Goldschmidt apud Jonker e Van Santen [13], p. 340): f=√ rA + rO . 2 (rB + rO ) (1.2) Este parâmetro possui um significado geométrico simples e qualitativamente descreve o grau de desvio da estrutura cúbica ideal. Para a perovsquita cúbica compacta, f = 1 e o ângulo da ligação O–B–O é 180o . À medida que f diminui, a rede cristalina se 25 transforma em romboédrica (0,96 < f < 1) e ortorrômbica (f < 0,96), nas quais o ângulo O–B–O desvia-se gradualmente de 180o [2]. A estrutura perovsquita estável é garantida por 0,89 ≤ f ≤ 1,02 [8]. Para manganitas dopadas, os valores dos raios iônicos são tomados como médias ponderadas dos raios iônicos dos átomos presentes em cada sítio da perovsquita. Na literatura encontram-se células cúbicas, tetragonais, romboédricas, hexagonais, ortorrômbicas e monoclínicas para as diversas composições das manganitas. Entretanto, tais distorções são pequenas, de modo que a estrutura encontra-se sempre próxima à cúbica ideal. Mitchell et al. [30] demonstraram através de experimentos de difração de nêutrons que P(O2 ) na síntese do material influencia a estrutura cristalina nos compos- tos La1−x Srx MnO3+δ , apresentando um diagrama de fase estrutural para estes óxidos em função de x e P(O2 ) (Figura 1.9). Hemberger et al. [12] apresentaram um diagrama de fases contendo propriedades estruturais, magnéticas e de transporte elétrico para La1−x Srx MnO3+δ (seção 1.3). Bindu [11], Mori et al. [31] e Hemberger et al. [12] realizaram refinamento Rietveld dos difratogramas de raios-X correspondendo a diferentes regiões da concentração x. A estrutura do composto não dopado LaMnO3+δ é investigada por Lynn et al. [32] através de difração de nêutrons. Figura 1.9: Diagrama de fases estruturais para manganitas La1−x Srx MnO3+δ em função de x e P(O2 ). Fases: romboédrica (círculo cheio), ortorrômbica (quadrado), monoclínica (triângulo) e mista romboédrica-ortorrômbica (círculo vazio) [30]. Em temperatura ambiente e na ausência de campos magnéticos externos, diferentes tipos de ordenamento estrutural têm sido encontrados no composto não dopado LaMnO3+δ (x = 0) como cúbico, ortorrômbico e monoclínico [5, 8, 12, 30–34]. Para o composto estequiométrico LaMnO3,0 , Lynn et al. [32] encontram estrutura ortorrômbica, Yakel [34] 26 relata uma fase monoclínica e Mori et al. [31] uma romboédrica. Para 0 ≤ x ≤ 0,1, Mitchell et al. apresentam estruturas romboédricas, ortorrômbicas e monoclínicas, de- pendendo da P(O2 ) utilizada na síntese do composto. Para x = 0,1, encontram-se na literatura estruturas ortorrômbicas, romboédricas e monoclínicas, dependendo do método de preparação [5, 8, 12, 31, 33]. Bindu [11] encontra para este valor de dopagem uma estrutura com uma fase hexagonal mesclada a uma ortorrômbica. Mori et al. [31] observam transição de fase romboédrica-ortorrômbica quando o teor de oxigênio é ajustado para que todos os íons de manganês tenham valência 3+. No intervalo 0,2 ≤ x ≤ 0,5, as referências [8, 12, 31, 33] trazem estrutura romboédrica, a mesma que Mitchell et al. [30] encontram para suas amostras, independente de P(O2 ), enquanto Bindu [11] obtém uma estrutura hexagonal. Orlando et al. [35] encontram estrutura pseudocúbica para x = 0,22, e Mahendiran et al. [33] apresentam estrutura cúbica para as composições x = 0,4 e x = 0,5. Na região 0,5 ≤ x ≤ 0,8 Hemberger et al. relatam estrutura tetragonal enquanto Bindu [11] encontra estrutura ortorrômbica para as suas manganitas. Para x = 0,9, Mori et al. [31] obtêm uma estrutura hexagonal e Bindu [11] relata uma fase hexagonal misturada a um arranjo ortorrômbico. Para o composto final SrMnO3+δ , Negas e Roth [36] encontram estruturas hexagonais, ortorrômbicas e cúbicas dependendo da estequiometria do oxigênio e da temperatura final de síntese da amostra. Bindu [11] apresenta uma estrutura hexagonal para este composto. Apesar da diversidade de simetrias encontradas, a estrutura cristalina das manganitas geralmente encontra-se próxima à perovsquita cúbica. O método de preparação dos compostos é um fator determinante na estrutura final, e um dos motivos da controvérsia observada no parágrafo acima. 1.2.2 Íon de Mn no Cristal de La1−x Srx MnO3+δ O equilíbrio de carga requer que o manganês possua valência Mn3+ no composto LaMnO3 , enquanto Mn4+ é necessário para balancear o composto SrMnO3 . Desta forma, a substituição de La por Sr ocasiona uma coexistência de íons do metal de transição com diferentes valências. Ademais, a estequiometria do oxigênio nestes materiais geralmente é imperfeita, aditando um outro fator causador de valência mista do manganês. Jon- 27 ker e Van Santen [13] e Wold e Arnot [37] demonstraram de forma independente que a temperatura e a pressão parcial de oxigênio durante a síntese do composto podem ser usadas para controlar a razão Mn3+ /Mn4+ . Altas temperaturas (∼ 1350o C) e atmosferas redutoras produzem baixas concentrações de Mn4+ , enquanto temperaturas menores (∼ 1100o C) e atmosferas oxidantes geram maiores concentrações de Mn4+ . Essa coexistência de valências distintas do Mn é responsável pelos diferentes comportamentos observados nas manganitas quando a temperatura é variada. Átomos neutros de manganês possuem configuração eletrônica [Ar]3d5 4s2 . Nas manganitas, as correlações intereletrônicas são perturbadas pelo campo cristalino eletrostático criado pelos íons de oxigênio que circulam cada íon de manganês, desdobrandro parcialmente os cinco estados degenerados da camada 3d do íon livre em dois multipletos [1, 2]: um tripleto t2g (xy, yz e zx), e um dubleto eg (x2 − y 2 , 3z 2 − r2 ), com um desdobramento de εeg − εt2g ∼ 1,5 eV [8], resultando em uma ocupação eletrônica primeiramente no mul- tipleto t2g e em seguida no eg (Figura 1.10). O íon bivalente Mn2+ tem uma configuração 2↑ estável [Ar]3d5 , uma camada semi-preenchida t3↑ 2g eg com S = 5/2 e uma densidade ele- trônica esfericamente simétrica [8]. O manganês trivalente possui configuração [Ar]3d4 , ↑ 4+ t3↑ é [Ar]3d3 , t3↑ 2g eg com spin S = 2, e o Mn 2g com S = 3/2. Os momentos dipolares magnéticos destes íons livres são, respectivamente, 5µB , 4µB e 3µB [8]. Uma distorção no octaedro diminui a simetria do campo cristalino cúbico e desdobra os níveis de energia dos orbitais t2g e eg , de tal forma que o íon Mn3+ , que possui um único elétron no nível eg , pode diminuir sua energia através da rotação do octaedro que o cerca. Esta é a essência do efeito Jahn-Teller. A Figura 1.10 ilustra o diagrama de níveis para cada um dos três íons Mn. Os elétrons t2g são menos hibridizados com os estados 2p dos íons de oxigênio próximos e tendem a formar um caroço iônico t3↑ 2g mesmo no estado metálico. Os elétrons eg , embora fortemente hibridizados com os estados 2p do oxigênio, são afetados por efeitos de correlação e tendem a se localizar formando o chamado isolante Mott [1]. Entretanto, elétrons eg podem ser itinerantes, e desta forma agir como elétrons de condução, caso vacâncias sejam criadas nos orbitais eg do cristal, o que corresponde à criação de íons itinerantes Mn4+ . Os spins destes elétrons itinerantes eg (S = 1/2) estão sujeitos ao 28 Figura 1.10: Ocupação dos níveis de energia dos íons de manganês sujeitos ao campo cristalino (cc) do octaedro de oxigênio que os cerca [8]. Note que o único íon que pode reduzir sua energia através da distorção JT é o Mn3+ . ∆cc : diferença de energia devido ao desdobramento por campo cristalino. δJT : diferença de energia devido ao desdobramento por efeito JT [8]. acoplamento com o spin eletrônico localizado t2g (S = 3/2). Este acoplamento intrasítio segue a regra empírica de Hund, segundo a qual o estado de mais baixa energia é aquele com o valor mais alto de spin, S = n/2. No limite quando a energia de troca JH (energia de acoplamento via regra de Hund) se torna muito maior que a interação de salto intersítio t0ij de um elétron eg entre sítios vizinhos i e j, a interação de salto efetiva pode ser expressa em termos da relação de Anderson-Hasegawa [16] tij = t0ij cos(θij /2), (1.3) ou seja, o salto efetivo depende, em uma visão semi-clássica, do ângulo relativo entre spins vizinhos (θij ). Esta interação ferromagnética via elétrons de condução é a interação de dupla troca introduzida por Zener [3] e apresentada anteriormente. De acordo com os parágrafos acima, elétrons eg podem saltar de um sítio para outro através da criação de vacâncias eletrônicas resultantes de dopagem ou defeitos estequiométricos, dependendo da configuração local dos spins. A interação de salto eletrônico é maximizada pelo ordenamento ferromagnético de tais spins (θij = 0). Quando a temperatura é elevada para as vizinhanças de TC , os spins dos íons localizados experimentam desordem em sua configuração e conseqüentemente a interação efetiva de salto eletrônico fica também sujeita a desordem e portanto reduzida na média. O efeito dessa redução é o aumento da resistividade elétrica próximo de TC . Assim, o maior efeito de MR é esperado em torno da temperatura de transição magnética, onde os spins podem ser reordenados de forma relativamente fácil através da aplicação de um campo magnético 29 externo, tornando menos aleatório o salto dos elétrons eg e diminuindo a resistividade do material. Esta é a explicação provida pelo modelo de DE para o efeito de MR em torno de TC . Contudo, o modelo de DE não basta para explicar totalmente o efeito de CMR e o complexo diagrama de fases das manganitas, embora seja um bom ponto de partida para entender o fenômeno. Tokura e Tomioka [2] apresentaram exemplos de falhas do modelo de DE. Millis et al. [4] propuseram que uma forte interação elétron-fônon proveniente do desdobramento dos níveis externos da camada d do Mn por efeito JT representa, junto com a dupla-troca, um papel importante na modelagem do sistema La1−x Srx MnO3 . Além deste, outros fatores importantes para a interpretação das características observadas experimentalmente são a interação de supertroca, que induz ordenamento AFM, ordenamento orbital proveniente da interação de troca entre orbitais eg e interação de repulsão coulumbiana inter e intra-sítio entre elétrons eg . Essas interações geralmente competem com a dupla troca, resultando em complicados diagramas de fases como os apresentados na Figura 1.1 e afetando também a resposta do sistema a fatores externos, como CMR e transição de fase estrutural induzida por campo magnético. 1.3 Propriedades Magnéticas e de Transporte Elétrico Igualmente fascinantes são os diagramas de fases magnéticas e de transporte elétrico das manganitas, cujo comportamento depende da razão Mn3+ /Mn4+ e da distorção da estrutura cristalina, e é determinado pela competição entre ordenamento de carga, ordenamento orbital e, principalmente, as interações de dupla troca e supertroca. O trabalho de Mitchell et al. [30] demonstrou que P(O2 ) durante a síntese do material também influencia tais propriedades. Alguns possíveis modos adotados pelas manganitas para a configuração magnética estão ilustrados na Figura 1.11. O trabalho de Hemberger et al. [12] apresenta uma compilação dos dados disponíveis até o ano de 2002 em um diagrama de fases estruturais, magnéticas e de transporte elétrico para a manganita La1−x Srx MnO3 em todo o intervalo de dopagem (Figura 1.12). A seqüência complexa de fases magnéticas observada no diagrama em baixas concentra- 30 Figura 1.11: Alguns possíveis modos magnéticos para o Mn em manganitas. Círculos abertos e fechados representam duas sub-redes antiferromagnéticas [8]. Figura 1.12: Diagrama de fases de La1−x Srx MnO3 para todo o regime de concentração x [12]. Estruturas cristalinas: ortorrômbica com distorção JT (O’); ortorrômbica (O); ortorrômbica com ordenamento orbital (O”); romboédrica (R); tetragonal (T); monoclínica (Mc) e hexagonal (H). Estruturas magnéticas: paramagnética (PM–verde); ordenamento de curto alcance (short-range–SR); spin canted (CA); antiferromagnética tipo A (AFM–amarelo); ferromagnética (FM–azul); separação de fases (phase separeted –PS) e AFM tipo C. Estados eletrônicos: isolante (I–escuro) e metálico (M –claro). 31 ções de Sr é fortemente influenciada pela distorção cooperativa JT da fase O’ e pelo ordenamento orbital da fase O” [12]. Os estados de spin canted 7 (CA) e AFM predominam nesta região [29]. O composto não dopado (x = 0) apresenta-se como antiferromagnético isolante (AFMI), com ordenamento magnético tipo A [5, 17, 30], que permanece para x . 0,05, com TN ∼ 140 K [5,29,30]. A partir desta concentração o comportamento FM surge em meio ao ordenamento AFM [29, 38]. Para 0,1 ≤ x ≤ 0,2 observa-se majorita- riamente a configuração FM [5, 31, 33, 38]. Controvérsias a respeito do comportamento elétrico em baixas temperaturas surgem dos vários trabalhos, que ora classificam esta região de dopagem como tendo comportamento isolante [12, 38] ora metálico [30]. O material é geralmente ferromagnético metálico (FMM) abaixo de TC e paramagnético isolante (PMI) acima de TC para 0,2 < x < 0,5 [5, 12, 29, 30]. Patil et al. [39] observam comportamento metálico acima de TC para 0,46 ≤ x ≤ 0,50. Um efeito interessante surge para concentrações de Sr entre 0,5 e 0,6. Durante o resfriamento, o material sofre uma transição PM–FM seguida por outra transição magnética, desta vez FM–AFM (Figura 1.13). Nestas transições, TC diminui e TN aumenta com o aumento do valor de x. Estes dados indicam que em baixas temperaturas estes materiais apresentam misturas de regiões FM e AFM. Os dados de resistividade e refletividade ótica de Patil et al. [39] apontam a existência de CO em alguns grãos da amostra, o que poderia ser a causa do aparecimento de AFM. Rao e Raveau [29] argumentam que transições de CO não ocorrem em compostos de La1−x Srx MnO3+δ , devido ao alto valor do raio médio hrA i, que determina a largura da banda eg , que por sua vez governa o efeito de CO. Ordenamentos de carga e orbital estão ilustrados na Figura 1.14. A condutividade tem caráter metálico nesta região de dopagem, de acordo com o diagrama da Figura 1.12. Os compostos La1−x Srx MnO3+δ com x > 0,6 são essencialmente AFM [12,29,40], embora regiões Mn3+ –O–Mn4+ FM possam estar presentes no meio AFM [29]. A condutividade possui caráter metálico para 0,6 ≤ x ≤ 0,7 acima e abaixo da temperatura de ordem magnética [12]. Para x > 0,7, o comportamento isolante surge abaixo de TN , enquanto o mesmo comportamento é observado acima e abaixo da temperatura de ordem magConfiguração na qual os momentos magnéticos encontram-se inclinados em relação à configuração paralela. A expressão em inglês será utilizada devido à ausência de um termo equivalente em português. 7 32 Figura 1.13: Magnetização em função da temperatura para La1−x Srx MnO3+δ com 0,5 ≤ x ≤ 0,6. Os diagramas superior e inferior referem-se respectivamente aos trabalhos de Patil et al. [39] e Kikuchi et al. [40]. Figura 1.14: (a) Ordenamento de carga de Mn3+ e Mn4+ em cristal misto com x = 1/2. (b) Ordenamento orbital de Mn3+ quando x = 0. (c) Ordenamento orbital e de carga combinados quando x = 1/2. [8] 33 nética quando x se aproxima de 1. A manganita SrMnO3+δ apresenta-se AFMI, com configuração magnética tipo G [17] (Figura 1.11). 1.3.1 Espectroscopia por RMN em Manganitas Os parágrafos anteriores sugerem que separação de fase eletrônica e, portanto, coexistência de fases magnéticas seja uma característica intrínseca das manganitas. Ainda não existe uma completa concordância a respeito da estrutura magnética microscópica destes materiais, ora interpretada como CA [41, 42], ora como coexistência de diferentes ordenamentos magnéticos [43–49]. O conhecimento preciso das configurações magnéticas locais das manganitas é de fundamental importância na discussão dos modelos teóricos que nasceram para a interpretação de suas propriedades, dentre os quais se destacam o proposto por de Gennes [15], que prevê uma fase CA para a manganita não dopada LaMnO3 e a mesma manganita com dopagens leves no sítio A, e o proposto por Wollan e Koehler [17], baseado na coexistência de fases FM e AFM. Nesse contexto, é necessária a caracterização das propriedades microscópicas destes sistemas, e a técnica de RMN, devido à sua natureza local, torna-se valiosa na obtenção de informações a respeito das características especiais do estado magnético das manganitas. Um núcleo de spin I e razão giromagnética γ possui momento de dipolo magnético µ = γ~I. A interação entre o momento de dipolo magnético µ e um campo externo B cria 2I + 1 níveis com energia Em = mγ~B (m = I, I − 1, I − 2, . . . , −I) [50, 51]. A técnica de RMN detecta transições entre níveis m e m′ tais que |m − m′ | = 1, ocasionadas pela excitação do sistema por campo de radiofreqüência (RF) cuja freqüência ν satisfaça a equação de Larmor 2πν = γB. Núcleos com I > 1/2 possuem momento de quadrupolo elétrico Q, que interage com o gradiente de campo elétrico (GCE) oriundo da distribuição de carga em torno do núcleo. Esta interação modifica os níveis de energia Em , resultando em um desdobramento do espectro de RMN em 2I linhas separadas por um intervalo de freqüência ∆νQ , determinado pelo momento quadrupolar e o GCE da estrutura cristalina [50,51]. Como o GCE de uma estrutura cúbica é zero [50,51], a magnitude do desdobramento quadrupolar indica o grau de desvio que a estrutura cristalina apresenta em relação à simetria cúbica. 34 A ressonância magnética nuclear em materiais magneticamente ordenados difere em vários aspectos do fenômeno de RMN em para ou diamagnetos, devido à interação entre o núcleo e os íons magnéticos. Em materiais magneticamente ordenados o núcleo atômico encontra-se sob ação de campos magnéticos locais, chamados campos hiperfinos, que surgem essencialmente das interações elétron-núcleo [50–52]. Estes campos permitem a observação de RMN sem a necessidade de aplicação de um campo externo. O campo magnético oscilante sentido pelos núcleos de materiais FM ou AFM é muito maior que o campo de RF aplicado na amostra, devido ao acoplamento entre este e os spins eletrônicos do material. A razão entre a intensidade do campo sentido no sítio nuclear e a intensidade do campo de RF aplicado é o chamado fator de amplificação η, que assume valores de 10 a 100 dentro de domínios magnéticos e de 103 a 105 em paredes de domínio [50]. A largura de linha do espectro de RMN também é aumentada em experimentos de RMN em materiais magnéticos, devido à distribuição de campos hiperfinos e interações quadrupolares naturalmente encontradas em amostras magnéticas. Além disso, o processo de relaxação é fundamentalmente diferente daquele em materiais não magnéticos devido às ondas de spin, que, dentre outros efeitos [50], podem promover o acoplamento entre dois núcleos distintos já acoplados aos momentos magnéticos de seus respectivos elétrons. Assim, a ressonância magnética nuclear permite o estudo das propriedades magnéticas locais das manganitas via interações hiperfinas. Um núcleo em um campo efetivo Be apresentará ressonância para a freqüência determinada pela equação de Larmor. Como γ é bem conhecido para cada núcleo, o espectro de RMN provê informações a respeito do campo efetivo Be , que reflete a configuração magnética local. Distorções da estrutura cristalina das manganitas também podem ser percebidas por RMN desde que o núcleosonda possua momento quadrupolar elétrico Q 6= 0 (I > 1/2), como dito anteriormente. RMN em campo zero é útil na investigação do ambiente magnético em torno do núcleo utilizado como sonda via campo hiperfino Bhf = A hSi, onde A é a constante de acoplamento hiperfino e hSi o spin eletrônico médio. Assim, RMN de 55 Mn em campo zero [46,53] fornece informações a respeito do próprio íon de manganês, e diferentes estados de valência resultam em diferentes freqüências de ressonância, desde que o tempo de 35 salto eletrônico seja maior que o período de precessão de Larmor dos núcleos do Por outro lado, RMN em campo zero de 139 55 Mn. La [45–47, 49, 53–56], cujo spin eletrônico é igual a zero, proporciona informações a respeito do estado de spin eletrônico dos íons de Mn em torno de núcleo de 139 La via interações hiperfinas transferidas, e é sensível a mudanças locais na configuração dos momentos magnéticos do Mn, bem como a alterações estruturais. Papavassiliou et al. [56] sugerem que tais interações aconteçam indiretamente via ligação π das funções de onda dos orbitais t2g do Mn (|3dxy i, |3dyz i e |3dzx i) e |2pπ i do O, simultaneamente à ligação σ do oxigênio com os estados híbridos |sp3 i do íon La3+ . Sob este ponto de vista, a freqüência na qual ocorre RMN de 139 La ignora a população de elétrons eg e reflete o ordenamento magnético dos momentos t2g do Mn e possíveis deformações na ligação Mn–O–Mn, que alteram a constante de acoplamento hiperfino A. O núcleo de 139 La também é capaz de interagir com o GCE da estrutura cristalina, e assim distorções locais na rede podem ser investigadas utilizando este núcleo como sonda. A aplicação de diferentes valores de campos magnéticos externos modifica de forma diferente a resposta de ambientes FM e AFM, tanto em RMN de 139 La [45, 49, 55–58] quanto em 55 Mn [44, 48, 59], permitindo verificar a coexistência de ambientes magnéticos distintos nas manganitas. Enquanto o espectro de RMN revela informações das propriedades estáticas ou quase estáticas do sistema, medidas de relaxação spin-rede [53, 57] refletem as flutuações magnéticas e da rede. As flutuações magnéticas dominam a relaxação em sistemas magnéticos típicos, mas o processo de relaxação em manganitas pode ser dominado por flutuações no GCE, devido às fortes distorções dinâmicas de rede apresentadas nestes sistemas [57]. Sakaie et al. [57] demonstraram que o mecanismo de relaxação spin-rede é predominantemente magnético em manganitas La2/3 Ca1/3 MnO3 no estado paramagnético, o que sugere que medidas de relaxação spin-rede sondam preferivelmente a dinâmica de spins ao invés da dinâmica de rede. 36 1.4 Dopagem no Sítio do Manganês De acordo com as seções anteriores, a dopagem com um metal bivalente no sítio A da manganita leva a uma valência mista dos íons de manganês (Mn3+ /Mn4+ ). Proporções adequadas de dopantes podem produzir forte acoplamento FM, o que é explicado em uma abordagem simplificada pelo modelo de DE. Além disso, interações elétron-rede também representam um papel importante na magnetorresistência colossal. Em particular, acredita-se que o efeito JT afeta tanto as propriedades magnéticas quanto as de 3+ transporte elétrico em sistemas R1−x A2+ x MnO3+δ [29, 60]. A dopagem no sítio do Mn tem sido utilizada para obter um melhor entendimento destes mecanismos, uma vez que as propriedades eletrônicas e magnéticas das manganitas são governadas pela interação entre os íons de Mn via íons de O. Na literatura encontram-se trabalhos utilizando diferentes tipos de dopantes, em sua maioria metais de transição, dentre os quais citam-se Mg, Ti e Nb [61], Fe [62, 63], Cr [63–65], Co [63, 66, 67], Ni [63], Zn [63] e Cu [60,68–78], este último particularmente empregado devido à sua importância nos supercondutores de alto TC . Embora ainda não provado definitivamente, é geralmente aceito que o cobre na estrutura perovsquita possui valência 2+ [73, 74, 76]. Devido à proximidade entre os raios iônicos do Cu2+ (0,73 Å) e do Mn3+ (0,645 Å), o sítio do Mn pode ser ocupado por um íon de Cu na estrutura da manganita. Este tipo de substituição mostra-se estável em manganitas com concentrações de Cu até 60% [60, 73]. Além disso, a substituição de manganês por um íon bivalente de cobre aumenta a quantidade de Mn4+ para que a neutralidade de carga seja mantida. Efeitos diversos na estrutura cristalina surgem como conseqüência deste tipo de dopagem. A conversão de íons Mn3+ em Mn4+ , de menor raio iônico (0,53 Å), induz uma diminuição no volume da célula unitária, enquanto a substituição de manganês por cobre tende a aumentar este volume, uma vez que o Cu2+ possui maior raio iônico. Estas duas situações obviamente exercem efeitos contrários nos parâmetros da célula unitária [73]. Além disso, o íon Mn3+ é responsável pela distorção Jahn-Teller nas manganitas. A diminuição da quantidade deste íon causada pela dopagem com Cu2+ leva à redução de tal distorção, 37 induzindo a estrutura a uma maior simetria à medida em que aumenta a quantidade de cobre. Este efeito é observado no trabalho de Porta et al. [73] pela aproximação e convolução dos picos desdobrados nos padrões de difração de raios-X de suas manganitas romboédricas LaMn1−x Cux O3 , indicando uma estrutura cúbica observada para x > 0,4 (Figura 1.15). Figura 1.15: Difração de raios-X para LaMn1−x Cux O3 [73]. Os efeitos apresentados nos parágrafos acima podem ser observados na figura: aumento de simetria pela sobreposição dos picos desdobrados e segregação de fases em concentrações de Cu maiores que 60%. As linhas de DRX pertencentes ao LaMnO3.15 encontram-se na parte inferior. Ateriscos e círculos representam respectivamente as linhas de La2 CuO4 e CuO. Os efeitos do cobre na microestrutura de manganitas também vêm sendo estudados. Yuan et al. [77] demonstraram que o tamanho de grão pode ser controlado pela temperatura de síntese em La2/3 Ca1/3 Mn0,96 Cu0,04 O3 . Pi et al. observaram redução no tamanho de grão para maiores teores de Cu. Informações a respeito das propriedades magnéticas podem ser extraídas através da introdução de cobre no sítio B. Em geral, argumenta-se que a introdução de Cu na matriz de Mn induz a interação AFM de SE e destrói gradualmente a interação de DE, levando a uma diminuição de TC e um alargamento na transição magnética [60,68–71,74]. Foi observado que este efeito induzido pelos íons de Cu pode ser reduzido pela adição de SiO2 [74, 75]. 38 A separação de fases magnéticas também parece comum em manganitas de LaSrMnCuO. Pi et al. observaram coexistência de regiões FM acima de TC , em meio a uma matriz PM [68, 69], através de medidas de ressonância de spin eletrônico. Regiões FM em meio AFM também foram encontrados e interpretados em termos de desordem introduzida pelos íons de Cu na matriz de Mn, cujos íons encontram-se sob estado de CO [76]. O mecanismo de transporte elétrico na fase isolante transita de transporte polarônico para variable range-hopping (ρ ∝ e(T0 /T ) 1/4 ) com o aumento da concentração de Cu em La0,825 Sr0,175 Mn1−y Cuy O3 [60, 68]. No regime metálico, o processo é atribuído a espalhamento de mágnons [60,68]. Efeitos de percolação também parecem estar presentes nesta composição para dopagens com Cu acima de 32%, onde a resistividade experimenta uma grande queda e passa a diminuir para maiores teores de Cu. O efeito de CMR também aumenta em concentrações apropriadas de cobre nas manganitas. Uma alta resposta de CMR em baixo campo foi encontrada para baixa dopagem com Cu em manganitas de La2/3 Ca1/3 MnO3 [77, 78]. Efeito magnetocalórico, que consiste em uma mudança adiabática de temperatura intimamente relacionada à mudança de entropia magnética causada pela aplicação de campo magnético, também foi observado em manganitas. Em particular, o trabalho de Phan et al. [79] demonstra este efeito em compostos La0,7 Sr0,3 Mn1−y Cuy O3 com y = 0,05 e 0,10. 1.5 Objetivos do Trabalho O objetivo do presente trabalho é a síntese e caracterização estrutural e magnética de manganitas de La0,86 Sr0,14 Mn1−y Cuy O3+δ na região de baixa dopagem (y = 0; 0,05; 0,10; 0,15; 0,20). As amostras obtidas são analisadas por medidas de difração de raios-X, microscopia eletrônica de varredura, magnetização e RMN. Constituem objetivos específicos: 39 • Síntese dos materiais e identificação das fases formadas. • Caracterização microestrutural. – Influência do Cu na microestrutura e tamanho de cristalito. – Investigação da composição final obtida nas amostras. • Caracterização estrutural. – Avaliação da estrutura cristalina, grupo de simetria espacial e parâmetros de rede. – Alterações provocadas pela introdução de Cu. • Caracterização magnética – Ordenamento magnético e magnetização de saturação nas diferentes composições. – Alteração das propriedades magnéticas provocada pela substituição de Mn por Cu. • Ressonância magnética nuclear – Avaliação das características hiperfinas do núcleo de 139 La e alterações provocadas pela presença de Cu. – Medida de campo hiperfino transferido para este núcleo. 40 Capítulo 2 Materiais e Métodos 2.1 Síntese das Amostras Amostras policristalinas de composição nominal La0,86 Sr0,14 Mn1−y Cuy O3+δ (y = 0; 0,05; 0,10; 0,15 e 0,20) foram preparadas por reação de estado sólido, utilizando como reagentes pós de La2 O3 , SrCO3 , MnO2 e CuO, previamente secados em estufa a 105o C por 2h. A Tabela 2.1 exibe os rótulos que serão utilizados para cada composição deste ponto do texto em diante. Após a mistura das proporções estequiométricas de cada material, as amostras foram prensadas em pastilhas de 10 mm de diâmetro com uma pressão de aproximadamente 4×108 Pa. Tabela 2.1: Rótulos utilizados para os compostos deste trabalho. Composição La0,86 Sr0,14 MnO3+δ La0,86 Sr0,14 Mn0,95 Cu0,05 O3+δ La0,86 Sr0,14 Mn0,90 Cu0,10 O3+δ La0,86 Sr0,14 Mn0,85 Cu0,15 O3+δ La0,86 Sr0,14 Mn0,80 Cu0,20 O3+δ Rótulo 0% 5% 10% 15% 20% Os tratamentos térmicos foram realizados nas dependências do Laboratório de Materiais Carbonosos e Cerâmicos (LMC), do Departamento de Física da UFES, em forno resistivo tubular da marca Quimis, modelo Q320.P, equipado com sistema de controle do 41 fornecimento de potência e monitoramento da temperatura desenvolvido no LMC, utilizando termopar tipo S (Pt/Pt 10% Rh) e taxas de aquecimento e resfriamento iguais a 5o C/min. As amostras foram acomodadas em tubo e cadinhos de alumina e tratadas em atmosfera de oxigênio, com fluxo de aproximadamente 40 ml/min. Após o primeiro tratamento, constituído de patamar único em 850o C por 12h, foi observada perda de massa da ordem de 10% em todas as amostras, atribuída à decomposição do SrCO3 e conseqüênte liberação de CO2 . As amostras foram moídas e repastilhadas nas mesmas condições anteriores para uma maior homogeneidade e submetidas a novo tratamento térmico em 950o C por 12h. Houve novamente perda de massa, desta vez em torno de 3%. Após nova moagem e repastilhamento, seguiu-se o terceiro tratamento, constituído de dois patamares, o primeiro em 1400o C durante 30 min, com o objetivo de melhorar a homogeneidade da amostra, e o segundo em 1100o C durante 24h. Análises por difração de raios-X (seção 3.1) revelaram uma fase manganita formada e outros picos não relacionados a tal fase. Medidas de termogravimetria (seção 2.2) determinaram o último tratamento, idêntico ao terceiro mas com temperatura de patamar igual a 1300o C. Após o tempo de tratamento de 24 h, as amostras em temperatura de 1300o C foram retiradas diretamente para a atmosfera ambiente (∼ 40o C) para um rápido resfriamento com o intuito de manter o teor de oxigênio dos compostos. As perdas de massa nos dois últimos tratamentos foram cerca de 1%. A Figura 2.1 exibe a variação da temperatura do forno em função do tempo durante os quatro tratamentos térmicos. Os resultados finais da síntese serão apresentados no capítulo seguinte. 2.2 Termogravimetria (TG) A análise por TG mede alterações na massa da amostra durante processos de aquecimento e resfriamento ou em temperaturas fixas. Os fenômenos analisados por esta técnica incluem evaporação, sublimação, decomposição, oxidação, redução, adsorção e dessorção de gases [80]. Neste trabalho a TG foi utilizada para determinar a temperatura final de tratamento térmico. Temperatura do forno (ºC) 42 1000 800 600 400 200 0 0 1500 1200 900 600 300 0 0 1º 5 10 15 20 0 2º 5 10 15 3º 10 20 30 40 0 20 4º 10 20 30 Tempo de tratamento (h) Figura 2.1: Variação da temperatura no forno durante os tratamentos térmicos. A linha tracejada ao final do quarto tratamento representa o resfriamento rápido das amostras. As medidas de TG foram feitas em um equipamento Shimadzu TGA-50H, instalado no LMC, em cadinho de alumina, sob fluxo de oxigênio de 40 ml/min e curvas de temperatura que simulam o tratamento térmico, utilizando cerca de 15 mg de amostra em cada medida. A Figura 2.2 mostra a análise para a amostra 0% após o terceiro tratamento, em atmosferas de argônio e oxigênio. Observa-se um aumento de massa nas duas etapas de análise, resultante da absorção de oxigênio pelo material. O aumento inesperado na etapa em argônio resulta provavelmente de impurezas no gás utilizado. O maior valor para a massa da amostra é atingido na rampa de resfriamento da segunda etapa, a uma temperatura de aproximadamente 1370o C. O valor de 1300o C como temperatura de patamar para o quarto tratamento térmico foi utilizado por encontrar-se na região de máxima absorção e mais afastado da temperatura limite atingida pelo forno, igual a 1400o C. 43 Massa (%) 1500 101,4 1200 101,1 900 100,8 600 100,5 300 100,2 Argônio O2 0 99,9 0 2 4 6 8 10 12 Temperatura (ºC) Massa T 101,7 14 16 18 20 Tempo (h) Figura 2.2: Análise termogravimétrica para a amostra 0%. 2.3 2.3.1 Análise Microestrutural Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) A microscopia eletrônica fornece informações morfológicas e topográficas das superfícies dos sólidos. Em um microscópio eletrônico de varredura, a superfície da amostra é varrida com um padrão de rastreamento com um feixe energético de elétrons. Os sinais produzidos pela superfície neste processo incluem elétrons retroespalhados, secundários e Auger, fótons de raios-X e fótons de outras energias [81, 82]. Os dois sinais mais comuns utilizados em estudos de superfícies são os provenientes dos elétrons retroespalhados e secundários, discutidos brevemente no parágrafo abaixo. O mecanismo de formação de raios-X é bem conhecido [81–85] e será omitido deste texto. Sua emissão é a base da análise com microssonda eletrônica, apresentada na seção seguinte. Os elétrons retroespalhados (RET) são produzidos por espalhamento elástico na superfície do material, ou seja, elétrons que após numerosas colisões modificam sua trajetória e saem do material com sua energia inalterada. Estes não são adequados para análise topográfica, uma vez que o feixe por eles formado se move em linha reta e, portanto, não podem revelar detalhes de qualquer parte da amostra que não esteja na direção 44 do detector. Entretanto, a emissão deste tipo de elétrons é fortemente dependente do número atômico dos elementos da amostra [81], possibilitando diferentes contrastes em regiões de diferentes composições químicas. Elétrons secundários (SE) são produzidos como resultado de interações entre os elétrons energéticos do feixe e elétrons de condução fracamente ligados ao sólido, o que leva à ejeção de elétrons da banda de condução. Imagens formadas predominantemente por elétons secundários são as que possibilitam maior resolução em MEV [81] e podem revelar detalhes finos da superfície da amostra, sendo por esta razão amplamente utilizadas para análise topográfica. 2.3.2 Espectrometria por Dispersão de Energia (EDS1 ) A microanálise eletrônica é baseada na detecção de raios-X característicos emitidos de uma região da amostra bombardeada por um feixe de elétrons. A utilização de microsonda eletrônica possibilita a análise localizada de pequenas regiões sem a necessidade de separação física do material, o que constitui uma vantagem sobre os métodos de análise química convencional. O espectrômetro de EDS [81] utiliza o princípio de que a energia E de um fóton está relacionada à sua freqüência ν pela relação E = hν. Esta, juntamente com a equação de √ Moseley ν ∝ Z − C (Z-número atômico, C-constante), relaciona a energia de um fóton ao elemento químico correspondente, o que torna possível a identificação das proporções molares entre os íons no material. O resultado deste tipo de análise é confiável para raios-X emitidos por elementos com Z ≥ 10, para os quais as perdas por absorção na amostra não são grandes [81]. Por esta razão, os resultados dos espectros de EDS para o oxigênio (Z = 8) nas amostras de manganita não serão apresentados no capítulo 3. As imagens de MEV foram obtidas através da observação da superfície de fragmentos das pastilhas. Imagens com ampliação de até 2.000× foram registradas em um microscópio eletrônico Cambridge LEICA S440I, pertencente à Companhia Siderúrgica de Tubarão em Vitória-ES e equipado com link Oxford para microanálise por EDS, efetuada em regiões microscópicas das amostras para a investigação da composição final obtida em 1 Energy dispersive spectrometry. 45 cada composto. As imagens com ampliação de 10.000× foram registradas em microscópio eletrônico JEOL 35CF, de responsabilidade do Laboratório de Plasma Térmico (LPT) do Departamento de Física da UFES. 2.4 2.4.1 Análise Cristalográfica Difração de Raios-X (DRX) Os difratogramas de raios-X foram obtidos das amostras em forma de pó em temperatura ambiente e sem campos magnéticos externos aplicados, utilizando um difratômetro Rigaku Geigerflex, pertencente ao Departamento de Física da UFES, equipado com um monocromador de LiF e utilizando a radiação Cu-Kα . O ângulo 2θ foi medido no intervalo 20–110o com passo de 0,05o . Como referência utilizou-se uma amostra policristalina de Si pulverizado a 200 Mesh. Os picos dos difratogramas foram ajustados a curvas gaussianas e os máximos dessas curvas tomados como máximos de difração. Este procedimento visa minimizar a limitação imposta pelo passo de 0,05o , que se torna grande para picos estreitos e pouco intensos. A identificação das fases dos compostos foi feita por meio de comparação com as fichas do banco de dados Powder Diffraction Files (PDF) [86]. 2.4.2 Refinamento dos Parâmetros de Rede Foi utilizado para este fim o software Celref 3 [87], um programa de refinamento de parâmetros cristalográficos para difração de raios-X (método de pó) ou de nêutrons. Os parâmetros de entrada são os ângulos de Bragg medidos e os parâmetros iniciais da célula unitária. Com estes últimos dados, Celref cria uma lista com os índices (hkl) e as respectivas distâncias interplanares e posições angulares dos máximos de difração. Os valores de 2θ observados e a lista de valores calculados são utilizados para o refinamento dos parâmetros de rede, que são calculados segundo o procedimento a seguir [87]: 46 A expressão do ângulo de Bragg medido é θ = ∆θ + Arcsen λ 2d (2.1) onde ∆θ é o desvio angular do ponto zero, λ o comprimento de onda da radiação utilizada e d a distância correspondente aos planos (hkl). O desvio do zero pode ser constante, em caso de erro na calibração do goniômetro, ou variar com θ, se existir um desvio de excentricidade e da amostra: ∆θ = e cosθ R (2.2) onde R é o raio do difratômetro. Se a∗ , b∗ , c∗ , α∗ , β ∗ e γ ∗ são os parâmetros da rede recíproca, é válida a expressão 1 = (ha∗ )2 + (kb∗ )2 + (lc∗ )2 + 2hka∗ b∗ cosγ ∗ + 2klb∗ c∗ cosα∗ + 2lhc∗ a∗ cosβ ∗ 2 d (2.3) A equação 2.1 depende de N valores desconhecidos, pertencentes ao grupo ∆θ, λ, a∗ , b∗ , c∗ , α∗ , β ∗ , γ ∗ e variando de acordo com a simetria da estrutura e os parâmetros a serem refinados. Como exemplo, na simetria cúbica N pode variar de 1 a 3 (a∗ , ∆θ e λ) e na simetria triclínica N assume valores de 6 a 8 (todo o grupo acima). Esta expressão é ajustada para M valores observados utilizando o método de mínimos quadrados não linear. De posse dos parâmetros ajustados a∗ , b∗ , c∗ , α∗ , β ∗ , e γ ∗ calculam-se os parâmetros da rede direta a, b, c, α, β, γ. As incertezas de cada parâmetro são calculadas como desvios quadráticos médios: σ= 1 M −N q (θobs − θcalc )2 . Maiores detalhes sobre o programa podem ser encontrados na literatura [88]. (2.4) 47 2.5 Magnetização As medidas de magnetização foram efetuadas em um magnetômetro de amostra vibrante [89] pertencente ao Laboratório de Magnetismo do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), Rio de Janeiro-RJ. A magnetização em função do campo foi medida em temperatura constante de 4,2 K com campos de até 25 kOe. As medidas de magnetização em função da temperatura foram feitas com campos de até 400 Oe no intervalo de temperatura de 4,2–200 K, resfriando a amostra em campo zero, aplicando o campo e medindo a magnetização enquanto o sistema era aquecido até 200 K (magnetização ZFC2 ), resfriando em seguida o sistema enquanto o valor da magnetização era novamente registrado (magnetização FC3 ). A massa utilizada para cada amostra variou de 20 a 42 mg e uma amostra de Ni foi utilizada para a calibração do magnetômetro. 2.6 Ressonância Magnética Nuclear (RMN) Medidas de RMN pulsada em campo zero e temperatura de 4,2 K foram realizadas no espectrômetro montado no Laboratório de Ressonância Magnética Nuclear do CBPF, um espectrômetro de banda larga, com freqüência nominal de 20–200 MHz. O espectro de freqüência é registrado ponto a ponto integrando-se os sinais de eco de spin para cada freqüência irradiada [90]. O diagrama de blocos deste espectrômetro encontra-se na Figura 2.3. O bloco transmissor é responsável pela excitação da amostra, e é constituído por um amplificador de potência ENI de 100 W (5–400 MHz), um sintetizador Fluke 6061A, um atenuador programável P556 Wavetek, um programador de pulsos Mini Pulse Kit da Tecmag controlado por computador, um Switch e um modulador duplamente balanceado (DBM), utilizado para modulação da radiofreqüência (RF) com os pulsos. Os pulsos RF gerados no modulador são amplificados e enviados à bobina e excitam a amostra, que se encontra na sonda de RMN. A sonda alimenta a amostra, acoplando o campo RF aos spins e coleta o sinal de RMN por ela induzido, com amplitude de microvolts, que é passado ao receptor. 2 3 Zero-field-cooled Field-cooled 48 Figura 2.3: Diagrama de blocos do espectrômetro utilizado [90]. O estágio de aquisição dos sinais emitidos pela amostra é representado pelo bloco Receptor, que é constituído por defasadores, DBM’s (para demodulação do sinal), um relé para RF, um amplificador de áudio de 40 dB, um pré-amplificador Doty Scientific LN2L de 500 MHz e 31 dB e um osciloscópio digital TDS 520A Tektronix. O sinal da amostra é amplificado e demodulado pelo receptor, tomando como referência a freqüência de excitação. Após a demodulação os sinais são novamente amplificados, desta vez por um amplificador de áudio de baixo ruído, e mostrados em um osciloscópio digital, responsável pela digitalização dos dados para aquisição e análise posterior. A seqüência de pulsos utilizada neste trabalho foi a sequência de spin-eco com ciclagem de fases [51], onde o sinal para cada transiente é tomado como média de quatro sinais, cada um resultante de uma excitação por pulsos defasados de 0o , 90o , 180o e 270o respectivamente. Cada seqüência utiliza dois pulsos com duração de 1 e 2 µs, separados por um intervalo de 25 µs e tempo de repetição igual a 10 ms (Figura 2.4). 1 µ s, φ 2 µ s, φ 25 µ s 10 ms φ = 0º, 90º, 180º, 270º Figura 2.4: Seqüência de pulsos utilizada para aquisição dos espectros de RMN. O intervalo de freqüências utilizado foi 15−25 MHz para a amostra sem cobre e 18−28 MHz para as amostras dopadas com cobre, com passos de 0,1 MHz. Devido à baixa relação sinal/ruído, foi necessário um acúmulo de cerca de 20.000 transientes em cada espectro, sendo o tempo total de aquisição em torno de três dias para cada amostra. 49 O ruído dos espectros resultantes foi adicionalmente minimizado por um procedimento de smoothing de média adjacente com n = 5, efetuado no software Origin 6.1, que consiste em tomar o valor do i-ésimo ponto como a média entre os pontos do intervalo [i − (n − 1)/2, i + (n − 1)/2] inclusive. A Figura 2.5 ilustra este processo para o espectro da amostra 0%. 17,5 20,0 22,5 Freqüência (M Hz) 25,0 17,5 20,0 22,5 25,0 Freqüência (M Hz) Figura 2.5: Espectro de RMN de 139 La para a amostra 0% antes (esquerda) e depois (direita) do procedimento de smoothing. 50 Capítulo 3 Resultados e Discussão 3.1 Síntese das Amostras A Figura 3.1 mostra os difratogramas de raios-X das amostras 0% e 15% após o 3◦ e o 4◦ tratamentos térmicos. Nenhuma mudança significativa é observada do 3◦ para o 4◦ tratamento, indicando que os picos não relacionados à fase de manganita provavelmente resultaram de imperfeição na proporção dos reagentes, o que levou à conclusão de que impurezas poderiam estar presentes nos mesmos durante a preparação das amostras. Difratogramas de raios-X levantados para os reagentes (Figura 3.2) confirmaram a hipótese do parágrafo anterior. O difratograma de raios-X do reagente La2 O3 apresenta grande quantidade de La(OH)3 e o do reagente MnO2 possui fases MnO e Mn5 O8 . Isto provavelmente é resultado do curto tempo de secagem e da manipulação dos pós, feita em ambiente atmosférico, principalmente pelo alto caráter higroscópico revelado pelo La2 O3 . Análises termogravimétricas poderiam determinar o tratamento prévio adequado. Entretanto, como se observa na Figura 3.1, o produto final é majoritariamente composto de fase manganita e por esta razão decidiu-se prosseguir com a caracterização dos compostos obtidos, com a cautela de identificar as demais fases formadas e determinar a composição da manganita resultante. Na Figura 3.3 encontram-se os difratogramas de raios-X para as cinco amostras. Não 51 0% 15% o 4 tratamento o 3 tratamento 20 40 60 80 100 20 40 60 2θ ( º ) 80 100 2θ ( º ) Figura 3.1: Comparação dos difratogramas de raios-X para as amostras 0% e 15% após terceiro e quarto tratamentos térmicos. Os círculos na amostra de 15% indicam os picos associados à manganita, indexados por comparação com o padrão para La0,8 Sr0,2 MnO3 , contido na ficha PDF no 40-1100 [86]. Os picos acima de 80o foram indexados após ajuste inicial com o software Celref. \La O (a) \ \ 20 La(O H ) 2 30 40 2θ ( º ) V (c) z zVz z 20 Vz V aa V VV V 40 60 2θ ( º ) 3 50 60 VMnO 20 40 80 100 C uO 2 5 60 3 2θ ( º ) (d) z MnO a Mn O 8 V 80 SrC O 3 \ (b) 100 30 45 60 75 2θ ( º ) 90 105 Figura 3.2: Difratogramas de raios-X dos reagentes de composição nominal La2 O3 (a), SrCO3 (b), MnO2 (c) e CuO (d), utilizados na preparação das amostras de manganita. 52 foram observadas alterações significativas no padrão dos difratogramas, indicando que não há mudança de estrutura dentro do intervalo de dopagem adotado e evidenciando a ocupação do sítio B da estrutura perovsquita por íons de Cu. Este é um resultado esperado, de acordo com os argumentos da seção 1.4, que afirmam que a substituição de (031) (013) (113) (131) (113) (222) (222) (223) (223) (123) (132) (231) (122) (003)(221) (022) (022) (112) (121) (112) (012) (012) (002) (111) (111) (001) (011) (011) Mn por Cu preserva totalmente a estrutura perovsquita até 60% de Cu [60, 73]. 20% 15% 10% 5% 0% 20 40 60 80 100 2θ ( º ) Figura 3.3: Difratogramas de raios-X das amostras de La0,86 Sr0,14 Mn1−y Cuy O3+δ após o quarto tratamento térmico. Os índices (hkl) da fase manganita, descobertos no processo de refinamento (seção 3.3.1), encontram-se indicados na figura. A identificação das demais fases formadas tornou-se possível apenas após o ajuste do desvio angular do ponto zero do difratômetro de raios-X (∆θ, seção 3.3.1), que permitiu a comparação correta das posições dos picos experimentais com as fichas PDF. Os picos espúrios são os mesmos em todos os difratogramas e estão exemplificados na Figura 3.4 para a amostra 20%. Observa-se a formação de La2 O3 segregado, indicando excesso de La na mistura dos reagentes, como esperado devido ao alto grau de hidratação obser- 53 vado no reagente La2 O3 . Os picos mais intensos do composto La2 MnO4 também foram observados, fato atribuído ao erro induzido pela fase MnO, que resulta em um pequeno excesso de Mn na mistura dos reagentes. Nenhum composto contendo Sr ou Cu foi encontrado nos difratogramas de raios-X, indicando que todo Sr e Cu foram incorporados à manganita. La 0,86Sr0,14Mn 0,80Cu 0,20O 3+ La 2O 3 La 2MnO 4 20 40 δ 60 2θ ( º ) 80 100 Figura 3.4: Identificação das fases formadas nos compostos finais. Observam-se as mesmas fases em todos os compostos e a figura apresenta o difratograma de raios-X da amostra 20%. 3.2 Análise Microestrutural Imagens de MEV com ampliação de 1000× revelaram microestrutura homogênea para as amostras de manganita (Figura 3.5), semelhante às observadas em outros trabalhos [60, 73, 91]. Nota-se um aumento na densidade de poros para maiores concentrações de Cu. As regiões atribuídas aos poros correspondem às regiões escuras semelhantes observadas nas imagens obtidas com elétrons RET e SE e estão exemplificadas na Figura 3.6. Uma diminuição do tamanho de cristalito nas amostras dopadas também foi observada em imagens com ampliação de 10.000×, tomadas na região interna dos poros das amostras (Figura 3.7). Na Figura 3.8 encontram-se as micrografias obtidas com elétrons RET para as cinco amostras. Observam-se basicamente três regiões de contrastes distintos. As regiões mais 54 Figura 3.5: Imagens de MEV para as amostras de manganita, ampliadas 1.000× e formadas pela detecção de elétrons secundários. Figura 3.6: Imagens de MEV obtidas por deteção de elétrons RET (esquerda) e SE (direita) para a amostra 5%, com ampliação de 1.500×. A comparação entre as duas imagens sugere que os pontos escuros do modo SE correspondem a poros nos materiais. As regiões claras deste mesmo modo de detecção são formadas por acúmulos locais de cargas estáticas. 55 Figura 3.7: Imagens de MEV da região interna dos poros formadas por elétrons SE, com ampliação de 10.000×. 56 escuras correspondem aos poros da estrutura, como discutido anteriormente. Medidas de EDS na região clara, realizadas em uma área de aproximadamente 230 µm2 , revelaram que estas são relativas à fase manganita formada nas amostras. As proporções molares obtidas dos espectros de EDS encontram-se na Tabela 3.1. A microanálise em pontos das regiões intermediárias indicaram mistura da fase manganita com as fases espúrias detectadas nos difratogramas de raios-X. Figura 3.8: Imagens de MEV para as amostras de manganita, ampliadas 2.000×, formadas pela detecção de elétrons retroespalhados. Os resultados de EDS para as proporções molares nas regiões claras encontram-se próximos aos valores nominais com exceção do sítio B para a amostra 15%. Entretanto, os 57 dados da Tabela 3.1 referem-se a uma estimativa local realizada em apenas uma região de cada amostra. Se esta proporção fosse válida para todo o volume, seriam observadas anomalias nos difratogramas de raios-X e nas curvas de magnetização para a amostra 15%. Estes no entanto apresentaram variação sistemática com o teor de cobre, como será discutido adiante. Por este motivo, os valores nominais dos compostos serão deliberadamente adotados para a interpretação dos resultados deste trabalho. Tabela 3.1: Proporções molares de cada íon obtidas por EDS. Os valores encontram-se normalizados para os sítios A e B da perovsquita. Os dados referentes ao oxigênio foram omitidos por não serem confiáveis devido ao baixo número atômico deste elemento. Amostra 0% 5% 10% 15% 20% 3.3 Íon La Sr Mn La Sr Mn Cu La Sr Mn Cu La Sr Mn Cu La Sr Mn Cu Reg. clara Reg. interm. 0,87 0,99 0,13 0,01 1,00 1,00 0,86 0,75 0,14 0,25 0,96 0,84 0,04 0,16 0,78 0,89 0,22 0,11 0,82 0,91 0,18 0,09 0,93 0,86 0,07 0,14 0,64 0,59 0,36 0,41 0,92 0,86 0,08 0,14 0,74 0,80 0,26 0,20 Propriedades Estruturais e Magnéticas Antes de discutir as propriedades estruturais e magnéticas da série, é interessante analisar como a introdução de Cu altera o comportamento do estado de oxidação do Mn, uma vez que este é um dos fatores principais que determinam as características exibidas pelas manganitas. 2− 2+ v̄ v Para o composto La3+ 1−x Srx Mn1−y Cuy O3+δ , a neutralidade de carga requer que a valência ′ 58 média do manganês seja v̄ = 3 + x + 2δ − v ′ y . 1−y (3.1) É geralmente aceito que o Cu substitui o Mn na estrutura perovsquita com estado de valência 2+. Este estado, embora ainda não definitivamente provado, é assumido pela maior parte dos autores [63,73,74,76,78] e será utilizado na interpretação dos resultados deste trabalho. Assim, a proporção n = Mn4+ /(Mn3+ + Mn4+ ) assume a forma x + 2δ + y x + 2δ + (3 − v ′ ) y = × 100%, n = v̄ − 3 = 1−y 1−y (3.2) e explicita o fato de que a introdução do Cu2+ aumenta a quantidade de Mn4+ no composto. O raio iônico médio do sítio B pode então ser calculado pela expressão hrB i = [(1 − n)rM n3+ + n rM n4+ ] (1 − y) + y rCu2+ , (3.3) e o limite superior para a magnetização de saturação MS , calculado com os momentos dipolares magnéticos de 4µB para o Mn3+ , 3µB para o Mn4+ e 1µB para o Cu2+ , fica definido pela expressão MSmax = = 3.3.1 [(1 − n) × 4µB + n × 3µB ] (1 − y) + 1µB × y (3.4) [4 − 2δ − x − 3y] µB /sítio B. Refinamento dos Parâmetros de Rede Os picos nos difratogramas de raios-X das manganitas revelaram, além do desdobramento por diminuição de simetria, um desdobramento adicional devido à presença dos comprimentos de onda das linhas Kα1 e Kα2 do Cu no feixe de raios-X. A identificação dos pares provenientes de cada desdobramento é conseqüência direta da lei de Bragg: 2d senθ = nλ =⇒ λ1 senθ1 = , senθ2 λ2 (3.5) onde os índices 1 e 2 referem-se às linhas Kα1 e Kα2 respectivamente. Para o cálculo dos parâmetros de rede foram utilizados apenas os picos referentes à linha Kα1 e seu com- 59 primento de onda λ1 (=1,54056 Å). A Figura 3.9 ilustra este desdobramento juntamente com o ajuste gaussiano comentado na seção 2.4.1, utilizado para diminuir a incerteza na posição dos picos. Kα Kα 67,8 20 40 1 68,1 60 1 Kα Kα 2 2 68,4 2θ ( º ) 80 68,7 69,0 100 2θ ( º ) Figura 3.9: Desdobramento Kα1 –Kα2 e ajustes gaussianos dos máximos de difração. O difratograma acima refere-se à amostra 5%. A simetria da estrutura cristalina foi identificada utilizando a posição dos picos da amostra 5%, por ser a que possui menor grau de dopagem com Cu imediatamente após a amostra 0%, que apresenta menor relação sinal/ruído que as demais. Os sistemas investigados foram hexagonal, romboédrico e ortorrômbico, por serem os mais relatados na região de dopagem com Sr escolhida (seção 1.2.1). Para o sistema hexagonal, os valores iniciais dos parâmetros da célula unitária a = 5,5325 Å e c = 13,3511 Å foram retirados da referência [11]. Somente alguns grupos de simetria espacial (GSE) apresentaram padrão de difração semelhante ao observado experimentalmente. Dentre estes, existem apenas dois padrões diferentes e por esta razão foram reunidos em dois outros grupos: H1 = {R3, R3̄, R32, R3M , R3̄M } e H2 = {R3C e R3̄C}. O GSE R3̄C reportado na referência acima encontra-se presente em H2 . As Figuras 3.10 e 3.11 apresentam os padrões correspondentes aos dois grupos acima. A diferença entre os dois padrões é o desdobramento dos picos devido à menor simetria no grupo H1 e ambos exibem seis regiões de máximos de difração que não são observadas 60 nos difratogramas das amostras. Figura 3.10: Comparação entre as posições dos picos de DRX observados para a amostra 5% (painel superior) e o padrão de DRX para os GSE pertencentes a H1 (painel inferior). Figura 3.11: Comparação entre a posição dos picos de DRX observados para a amostra 5% (painel superior) e o padrão de DRX para os GSE pertencentes a H2 (painel inferior). Para o sistema romboédrico, os valores iniciais dos parâmetros de rede foram estimados a partir do sistema cúbico, variando a até obter o padrão da Figura 3.12 com a = 3,88 Å e finalmente variando α, cuja estimativa inicial foi 90,5o . Figura 3.12: Comparação entre as posições dos picos de DRX observados para a amostra 5% (painel superior) e o padrão de DRX para sistema cúbico (painel inferior). O resultado encontra-se nas figuras 3.13 e 3.14. Novamente os GSE puderam ser reunidos em dois outros grupos: R1 = {R3, R3̄, R32, R3M , R3̄M } e R2 = {R3C, R3̄C}. O grupo R1 mostra-se o mais adequado, uma vez que os GSE pertencentes a R2 não apresentam vários máximos de difração observados experimentalmente. Este resultado é diferente daquele obtido por Mitchell [30] e Bindu [11], onde o GSE encontrado foi R3̄C. Para o sistema ortorrômbico os valores iniciais dos parâmetros foram retirados da referência [38]: a = 5,5308 Å, b = 5,5137 Å e c = 7,7844 Å. Entretanto, não foram 61 Figura 3.13: Comparação entre as posições dos picos de DRX observados para a amostra 5% (painel superior) e o padrão de DRX para os GSE pertencentes a R1 (painel inferior). Figura 3.14: Comparação entre as posições dos picos de DRX observados para a amostra 5% (painel superior) e o padrão de DRX para os GSE pertencentes a R2 (painel inferior). observados padrões semelhantes ao experimental para nenhum dos GSE deste sistema. A Tabela 3.2 reúne as regras de extinção, que limitam possíveis reflexões de Bragg, para cada GSE cujo padrão se assemelha ao experimental. Dos três sistemas estudados, o sistema romboédrico mostrou-se o mais adequado para os difratogramas obtidos. Os parâmetros de rede das amostras foram calculados utilizandose o GSE R3̄M , escolhido dentre os grupos pertencentes a R1 , de padrão de DRX igual ao experimental. As distâncias interplanares para cada família de planos (hkl) e os valores de 2θ do processo de refinamento estão explícitos no apêndice A. A Tabela 3.3 apresenta os resultados finais dos parâmetros da célula unitária para a série La0,86 Sr0,14 Mn1−y Cuy O3+δ , juntamente com a correção angular do zero (∆θ), o número p de picos utilizados e o desvio padrão σ do ajuste, calculado pela expressão qP 1 ¯ − 2θi . 2θ σ = p−1 i Os valores irregulares de ∆θ podem ser confirmados pelos picos referentes ao La2 O3 presente nas amostras, uma vez que sua posição obviamente independe da quantidade de Cu, o que torna tal fase um bom calibre interno. A Figura 3.15 mostra, antes e depois da correção angular, os picos mais intensos do La2 O3 presente nas amostras de manganita e esclarece quaisquer dúvidas a respeito dos valores obtidos. 62 Tabela 3.2: Regras de extinção limitando possíveis reflexões de Bragg para os GSE de padrão semelhante ao apresentado pelas amostras de manganita [85, 87, 92]. Sistema GSE R3C e R3̄C Regras −h + k + l = 3n h = −k, l = 2n h = 0, l = 2n k = 0, l = 2n R3, R3̄, R3M e R3̄M −h + k + l = 3n R3̄ −h + k + l = 3n h = 0, k = 0, l = 3n R3, R3̄, R32, R3M e R3̄M Nenhuma R3C e R3̄C h = k, l = 2n k = l, h = 2n l = h, k = 2n Hexagonal Romboédrico 20% 15% 10% 5% 0% 27 28 29 2θ ( º ) 30 31 27 28 29 30 31 2θ ( º ) Figura 3.15: Picos referentes ao La2 O3 presente nas amostras de manganita antes (esquerda) e depois (direita) da correção angular do zero obtida por ajuste com o Celref. 63 Tabela 3.3: Parâmetros estruturais refinados dos difratogramas de raios-X das amostras de La0,86 Sr0,14 Mn1−y Cuy O3+δ para o sistema romboédrico R3̄M . a: aresta da célula unitária (distância Mn–Mn); α: ângulo entre as arestas; V : volume da célula unitária; ∆θ: correção angular do zero do difratômetro; p número de picos utilizados no refinamento; σ: desvio padrão do ajuste. 0% a (Å) 3,884(2) α (o ) 90,46(1) V (Å3 ) 58,58(3) ∆θ (o ) 0,2273 p 22 σ 0,01080 5% 3,880(1) 90,460(6) 58,38(2) 0,0641 29 0,00480 10% 15% 3,8785(9) 3,877(1) 90,460(4) 90,480(4) 58,34(1) 58,26(1) 0,0607 0,0019 29 29 0,00258 0,00360 20% 3,875(2) 90,490(9) 58,20(2) 0,0445 27 0,00658 Os valores de p referem-se à quantidade de picos utilizados para o refinamento. A célula romboédrica R3̄M apresenta 30 picos na região angular utilizada (20–100o ). Os picos relativos aos planos (003) e (221̄) encontram-se sobrepostos, restando 29 ao todo. O menor valor de p para as amostras 0% e 20% devem-se a picos de baixa intensidade, excluídos do processo de refinamento por estarem camuflados pelo ruído presente nos difratogramas. Nenhum pico foi excluído por critérios de desvios da média. Naturalmente, a menor relação sinal/ruído do difratograma da amostra 0% se relfete no maior valor para o desvio padrão σ. A Figura 3.16 apresenta a variação dos parâmetros refinados da célula unitária primitiva em função da concentração de cobre. Observa-se que a diminui continuamente com o aumento do valor de y, enquanto α experimenta um ligeiro aumento a partir de y = 0,15. A diminuição contínua de V com o aumento do teor de cobre é uma conseqüência direta do comportamento de a e α. Como comentado na seção 1.4, dois efeitos principais, provenientes da substituição por Cu, competem entre si na variação dos parâmetros da célula unitária: a substituição de Mn3+ por Mn4+ , que, para coordenação octaédrica, possuem raios iônicos respectivamente iguais a 0,645 Å e 0,53 Å [73], e a substituição de Mn por Cu2+ , cujo raio iônico é igual a 0,73 Å [73]. De acordo com a Equação 3.2, a introdução de íons Cu2+ leva ao aumento da concentração de Mn4+ , de maneira que o raio iônico médio do sítio B diminua, o que acarreta uma redução no comprimento médio de ligação e na aresta da célula unitária. Este é o comportamento apresentado pelo parâmetro a refinado a partir 64 3,888 90,50 α (º) a (Å) 3,884 3,880 3,876 90,48 90,46 3,872 0 5 10 15 90,44 20 0 5 y (%) 10 15 20 y (%) 58,50 3 V (Å ) 58,65 58,35 58,20 0 5 10 15 20 y (%) Figura 3.16: Varição dos parâmetros da célula unitária romboédrica em função da dopagem com Cu. dos difratogramas de raios-X. Os valores de a encontram-se próximos ao comprimento médio da aresta de uma estrutura romboédrica compacta [28] (Figura 3.17), acomp = 2 (hrB i + rO ). A Tabela 3.4 apresenta uma comparação entre o valor de a obtido do refinamento e o calculado para uma estrutura compacta com δ = 0, utilizando rO = 1,32 Å [13]. A diferença entre estes dois fatores pode ser entendida se o valor de δ nas amostras deste trabalho for ligeiramente diferente de zero. Figura 3.17: Estrutura romboédrica compacta, com α = 90o (esquerda) e α = 100o (direita). 65 Tabela 3.4: Comparação entre os valores da aresta da célula unitária calculados a partir dos difratogramas de raios-X (a) e para uma estrutura compacta com δ = 0 (acomp = 2 (hrB i + rO )). Amostra a (Å) 0% 3,884(2) 5% 3,880(1) 10% 3,8785(9) 15% 3,877(1) 20% 3,875(2) acomp (Å) 3,898 3,895 3,892 3,889 3,886 Assim, o valor real de δ pode ser estimado a partir de a, utilizando as equações 3.2, 3.3 e a expressão acomp = 2 (hrB i + rO ). O resultado encontra-se na Tabela 3.5, e mostra que o teor de oxigênio está próximo ao estequiométrico, dentro da região de ±1% observada em outros trabalhos com processo de síntese semelhante ao utilizado na preparação destas amostras [42, 93–95]. Os valores positivos obtidos justificam-se pela utilização de atmosfera de oxigênio durante a síntese [13, 37]. Tabela 3.5: Quantidade relativa de Mn4+ (n), raio médio do sítio B (hrB i) e fator de tolerância (f ) calculados a partir dos valores encontrados para δ. Amostra 0% 5% 10% 15% 20% δ 0,030(4) 0,032(2) 0,029(1) 0,026(2) 0,023(4) n(%) 20,0(8) 26,7(4) 33,1(2) 40,2(5) 47,8(5) hrB i (Å) 0,622 0,620 0,619 0,619 0,618 f 0,927 0,928 0,929 0,929 0,930 O 4◦ tratamento térmico foi realizado em duas etapas, pois um gradiente de temperatura dentro do forno utilizado limitou a três o número de amostras que podiam ser simultaneamente submetidas à temperatura registrada pelo termopar. O primeiro conjunto envolveu as amostras 0%, 5% e 10%, e o segundo as duas restantes. O resultado obtido para δ mostra-se coerente com o tratamento térmico, pois valores semelhantes foram encontrados para amostras dentro do mesmo conjunto. Este método de estimativa de δ, embora menos preciso, mostrou boa concordância com os dados de Mahendiran et al. [33] para La1−x Srx MnO3+δ , onde a distância Mn–O foi calculada por refinamento Rietveld dos difratogramas de raios-X e a quantidade de Mn4+ foi obtida por titulação iodométrica. De posse do valor encontrado para δ, calculam-se os demais parâmetros (equações 3.2, 3.3 e 1.2), que também se encontram na Tabela 3.5. 66 A diminuição de hrB i também foi observada por Porta et al. [73], e tem por conseqüência um aumento do fator de tolerância, que se aproxima de 1 à medida em que aumenta a concentração de cobre, o que implica em uma tendência à simetria cúbica nos compostos com maiores índices de dopagem. Tal tendência não foi observada nos valores refinados de α, que se afastam ligeiramente de 90o com o aumento da concentração de cobre. Isto provavelmente se deve à pressão química resultante da substituição de íons Mn por outro de maior raio iônico, da mesma forma que a substituição de La por Sr deforma a estrutura de La1−x Srx MnO3 [19]. Os baixos valores de y utilizados neste trabalho são responsáveis pela baixa variação no valor de f e a ligeira distorção da estrutura cúbica para romboédrica, cujo ângulo entre as arestas da célula unitária, idealmente 90o , atinge o valor máximo de 90,490(9)o na amostra 20%. É interessante também observar que o fator de tolerância está sempre abaixo de 0,96, região comumente relacionada à estrutura ortorrômbica [2,5,8,12,38]. Entretanto, como discutido na seção 1.2.1, outros fatores também exercem influência na estrutura final das manganitas, e o sistema romboédrico também é encontrado nesta região de dopagem do sítio A [11, 30, 33]. Além disso, os valores de n encontram-se entre 20 e 48%, região atribuída ao sistema romboédrico no diagrama de fases de Hemberger et al. [12] (Figura 1.12). 3.3.2 Características Magnéticas A Figura 3.18 mostra o comportamento da magnetização FC (MF C ) e ZFC (MZF C ) em função da temperatura para baixo campo (H < 400 Oe). Todas as curvas de MF C indicam transição PM–FM quando as amostras são resfriadas. As curvas também evidenciam irreversibilidade termomagnética (MF C 6= MZF C ) imediatamente abaixo da temperatura de Curie, a partir de um valor de temperatura denotado por Tirr . Embora estudos anteriores tenham atribuído o fenômeno de irreversibilidade termomagnética ao comportamento de vidros de spin para perovsquitas de diferentes composições [61, 65, 66, 68, 70], trabalhos recentes demonstraram que esta histerese nas curvas de M ×T em materiais ferromagnéticos pode ser também devido a efeitos de aprisionamento 67 1,00 0,75 U 20% H = 300 Oe 0,50 0,25 0,00 U 1,00 0,75 15% H = 300 Oe 0,50 M/Mmax 0,25 0,00 1,00 U 0,75 0,50 10% H = 400 Oe 0,25 0,00 1,00 U 0,75 0,50 5% H = 200 Oe 0,25 0,00 1,00 U 0,75 0,50 0,25 0,00 0 50 100 0% H = 200 Oe 150 200 T (K) Figura 3.18: Curvas de magnetização em função da temperatura para baixo campo aplicado. As curvas FC e ZFC estão representadas respectivamente pelos círculos fechados e abertos. Os valores diferentes do campo aplicado foram utilizados para eliminar a magnetização remanente na bobina entre as medidas das diferentes amostras. Os triângulos indicam as temperaturas Tirr , cujos valores encontram-se na Tabela 3.6. 68 (pinning) de paredes de domínio [67, 96, 97], uma vez que irreversibilidade termomagnética também é observada em muitos outros sistemas cujo ordenamento ferromagnetico é bem conhecido [98–102] e em geral, nos sistemas que apresentam histerese nas curvas de magnetização em função do campo [97]. No trabalho de Joy et al. [103] encontra-se uma relação entre as curvas de suscetibilidade FC e ZFC através do campo coercivo, que é uma medida da anisotropia magnética. Assim, a diferença observada nas curvas de magnetização FC e ZFC pode ser atribuída ao processo de ordenamento ferromagnético, sem a necessidade de recorrer a mecanismos de frustração magnética usualmente associados aos vidros de spin [50]. Seguindo as idéias de Chaudhary et al. [67], quando o composto é resfriado sob efeito de um campo magnético aplicado, este último proporcionará uma direção preferencial para o alinhamento dos momentos magnéticos do material, impelindo a magnetização a seu valor máximo à medida em que a desordem térmica diminui. Desta forma, MF C representa os valores de equilíbrio da magnetização em função da temperatura. Ao resfriar a amostra sem campos aplicados, a formação dos domínios magnéticos se dará de forma aleatória, influenciada principalmente pela anisotropia magnetocristalina local que, junto com defeitos na estrutura do material como vacâncias e deslocamentos, constitui os obstáculos ao movimento das paredes de domínio. Desta forma, a magnetização é pequena em campos externos pouco intensos, como observado no início das curvas ZFC. Entretanto, com o aumento da temperatura, o movimento das paredes de domínio é termicamente ativado, de forma que o sistema pode gradualmente atingir sua configuração estável MF C em temperaturas maiores que Tirr . Esta explicação sugere que a irreversibilidade termomagnética pode ser removida do sistema pela aplicação de campos externos suficientemente intensos. De fato, este efeito foi observado por Raj Sankar e Joy [97] em manganitas auto-dopadas La1−x MnO3 (Figura 3.19). Curvas de suscetibilidade DC (χDC = M/H) obtidas das medidas de magnetização FC em baixo campo encontram-se na Figura 3.20. A temperatura de Curie foi calculada pela intercessão da tangente no ponto de máxima variação de χDC com o eixo da temperatura [104], e o comportamento da largura de transição através da diferença entre TC e a temperatura de pico da curva dχDC /dT , aqui denominada TCpc . A temperatura de CurieWeiss foi obtida através da extrapolação da parte linear da curva 1/χDC × T para o eixo 69 Figura 3.19: Exemplo de remoção do efeito de irreversibilidade termomagnética pela aplicação de campos externos mais intensos. As três curvas resultam de medidas de magnetização ZFC em La0,937 MnO3 [97]. das temperaturas. Os valores destes três parâmetros, juntamente com Tirr encontram-se na Tabela 3.6. 4,0 3,0 (200 Oe) (200 Oe) (400 Oe) (300 Oe) (300 Oe) 20 30 2,5 2,0 χDC (10 emu/gOe) 1,5 3,6 3,4 3,2 -2 -2 χDC (10 emu/gOe) 3,5 0% 5% 10% 15% 20% 1,0 3,0 2,8 0,5 0 10 40 50 T (K) 0,0 0 50 100 150 200 250 T (K) Figura 3.20: Curvas de suscetibilidade magnética DC (χDC = MF C /H) em função da temperatura para as amostras de manganita. Os valores de campo utilizados em cada medida estão indicados na legenda. Com o aumento da dopagem com Cu, observa-se uma diminuição tanto em TC quanto em TCW , e a transição é alargada, indicando menor homogeneidade magnética dos materiais, um comportamento semelhante ao encontrado em outros trabalhos [60, 68–70, 76]. Observa-se ainda uma diferença entre os valores de TC e TCW , principalmente nas amos- 70 0,5 5,0 20% 0,0 0,4 4,0 -0,3 20% 0,3 3,0 -0,7 0,2 2,0 -1,0 0,1 1,0 PC TC 0,0 TC TCW -1,4 3,0 0,0 15% 0,0 4,0 2,5 2,0 -3,0 3,0 -6,0 2,0 15% 1,5 1,0 1,0 -9,0 0,5 2,5 -3,0 2,0 10% -6,0 4,0 3,0 2,0 -4 1,5 10% 1,0 -9,0 0,5 0,0 -12,0 3,0 1,0 0,0 5% 0,0 5,0 2,5 4,0 -3,0 2,0 3,0 1,5 5% -6,0 2,0 1,0 0,5 0,0 3,5 3,0 2,5 2,0 1,5 1,0 0,5 0,0 -9,0 1,0 0,0 0,0 4,0 0% -4,0 3,0 -8,0 0% 2,0 -12,0 1,0 -16,0 0 50 100 T (K) 150 -20,0 200 0 50 100 150 0,0 200 T (K) Figura 3.21: Obtenção dos valores de TC , TCpc e TCW para as amostras de manganita. 3 3,0 1/χDC (10 g Oe/emu) 0,0 0,0 dχDC/dT (10 emu/g Oe K) -2 χDC (10 emu/g Oe) 0,0 71 Tabela 3.6: Temperaturas de irreversibilidade termomagnética (Tirr ), de Curie (TC ), CurieWeiss (TCW ), e largura da transição (TC − TCpc ) calculadas para as amostras de manganita. Todos os valores estão expressos em K. Amostra Tirr 0% 120 5% 95 10% 77 15% 57 20% 38 TC TCpc 135 127 126 111 113 98 99 82 83 46 TC − TCpc 8 15 15 17 37 TCW 139 144 132 114 84 TCW − TC 4 18 19 15 1 tras 5%, 10% e 15%, sugerindo que algum ordenamento de curto alcance ainda permaneça logo após a transição para o estado PM [47, 50, 105]. Esta hipótese é confirmada pelos momentos paramagnéticos efetivos µef , calculados a partir das curvas de suscetibilidade magnética na região PM [50, 105] (T > TC ), cujos valores encontram-se maiores que os momentos esperados µesp , calculados a partir dos momentos paramagnéticos efetivos dos íons de Mn3+ , Mn4+ e Cu2+ , considerando somente a contribuição de spin eletrônico [50, 105] (Tabela 3.7). Tabela 3.7: Comparação entre os momentos magnéticos efetivos no estado paramagnético µef , calculados pela inclinação da parte linear das curvas 1/χDC × T e os valores máximos esperados µesp , calculados considerando somente a contribuição de spin. Amostra µef (µB /sítio B) 0% 5,69 5% 4,69 10% 5,35 15% 6,24 20% 6,58 µesp (µB /sítio B) 4,69 4,48 4,28 4,07 3,87 A introdução de Cu diminui a magnetização dos compostos, de acordo com a Figura 3.20. As amostras 15% e 20% experimentam ainda uma redução adicional da magnetização abaixo de 45 K, indicando um estado CA ou a coexistência de estados FM e AFM neste regime de temperatura. De acordo com resultados de difração de nêutrons [17, 106], um estado misto FM+AFM é mais provável que o estado CA em manganitas. Esta idéia é reforçada por medidas de RMN [44–46, 48, 49], onde é freqüênte a observação de diferentes fases magnéticas em manganitas com homogeneidade estrutural e química. Evidências adicionais de coexistência de fases encontram-se nas curvas de magnetização 72 em função do campo levantadas para as cinco amostras em 4,2 K e campos de até 25 kOe (Figura 3.22). Os resultados indicam comportamento tipicamente FM para amostras com y ≤ 15%, onde a magnetização inicialmente apresenta um rápido crescimento e tende a aumentar muito lentamente para maiores valores de campo magnético. Nenhum comportamento de saturação é observado para a amostra 20% no intervalo de valores de campo magnético utilizado. Entretanto, o comportamento inicial da curva sugere a existência de uma pequena fase FM, o que está de acordo com as curvas de magnetização da Figura 3.18 e com os resultados de RMN que serão apresentados na seção 3.3.3. M agnetização (emu/g) 45 y: 0% 5% 10% 15% 20% 40 35 30 25 20 15 10 5 0 0 4 8 12 16 20 24 H DC (kOe) Figura 3.22: Curvas de magnetização em função do campo para as amostras de manganita em temperatura igual a 4,2 K. Os valores para a magnetização de saturação MS , calculados pela extrapolação da parte linear das curvas de M × H −1 para H −1 = 0, encontram-se na Tabela 3.8, juntamente com o valor máximo teórico, que supõe alinhamento perfeito dos momentos magnéticos de todos os íons Mn e Cu com máximo valor de spin, calculado pela Equação 3.4 com os valores de δ obtidos dos difratogramas de raios-X. Em todas as amostras, MS está muito abaixo de MSmax , efeito acentuado à medida em que aumenta a concentração de cobre na manganita. Na amostra 0%, aproximadamente 20% dos íons de manganês encontram-se no estado de oxidação 4+ (Tabela 3.5), uma região do diagrama de fases de Hemberger (Figura 1.12) atribuída ao ordenamento FM. O baixo valor de MS poderia ser justificado por um estado CA nesta amostra. Entretanto, como será visto nos resultados de RMN (seção 3.3.3), o ambiente FM permanece essencialmente inalterado nas cinco amostras, o 73 que afasta a hipótese de estado CA e levanta a suspeita de uma fase AFM na amostra 0%, mesmo que nenhuma transição desta natureza seja visível na curva correspondente de magnetização em função da temperatura. Apesar do valor calculado de n para a amostra 0% prever ferromagnetismo segundo Hemberger [12], a suspeita de coexistência de fases encontra suporte no trabalho de Rao e Raveau [29], que argumentam que manganitas La1−x Ax MnO3 exibem tanto características FM quanto AFM na região 0,1 . x . 0,3. Tabela 3.8: Magnetização de saturação experimental (extrapolada) em 4,2 K e valor máximo teórico calculado para as amostras de manganita. Amostra MS (µB /sítio B) MSmax 0% 1,99 5% 1,79 10% 1,43 15% 1,20 20% 1,19 (µB /sítio B) 3,80 3,60 3,40 3,20 3,01 MS /MSmax ∼ 52% ∼ 50% ∼ 42% ∼ 38% ∼ 40% Uma maior concentração de íons bivalentes no sítio A provavelmente resultaria em uma magnetização extrapolada próxima do valor máximo teórico, como nos resultados de Yuan et al. [76] em manganitas de La2/3 Ca1/3 Mn1−y Cuy O3+δ para y ≤ 0,1 (Figura 3.23), onde o valor de n varia de 30 a 45%, uma região em que os diversos diagramas de fases concordam que o ordenamento FM é bem definido [5, 12, 29]. Figura 3.23: Magnetização de saturação teórica (linha sólida) e experimental (círculos) em 4,2 K em função de y para La2/3 Ca1/3 Mn1−y Cuy O3 [76]. Existem ainda duas outras possíveis contribuições para o baixo valor de MS . A primeira lembra as fases espúrias detectadas nos difratogramas de raios-X. Como o sinal obtido no magnetômetro é dividido pela massa de amostra utilizada na medida, a contribuição das fases espúrias nesta divisão reduz o valor obtido para a magnetização por unidade 74 de massa. Entretanto, como se observa pelos difratogramas de raios-X e pelas imagens de MEV por elétrons retroespalhados, estes óxidos representam apenas pequena parte das amostras, de forma que dificilmente seriam responsáveis pela diminuição de 40–50% da magnetização de saturação. Além disso, não se observam saturações efetivas nas curvas de magnetização da Figura 3.22 para os valores de campo aplicados. Entretanto, uma comparação com o trabalho de Yuan et al. [76], que utiliza campos de até 10 T, indica que a diferença entre a magnetização de saturação calculada por extrapolação das curvas da Figura 3.22 e seu valor real não é significativa a ponto de sozinha justificar a discrepância entre MS e MSmax , mesmo para a amostra 20%. 3.3.3 Espectros de RMN de 139 La Para um melhor entendimento da configuração magnética local, foram efetuadas medidas de RMN de 139 La em campo zero a 4,2 K nas amostras em forma de pó. Os espectros resultantes encontram-se na Figura 3.24a. A linha mais intensa em torno de 22 MHz está contida na região onde a freqüência do 139 La é geralmente encontrada em manganitas La1−x Ax MnO3 e relacionada à resposta da fase FM [45, 46, 53, 54, 56]. A observação desta linha central, principalmente na amostra 20%, reforça a suspeita de coexistência de fases magnéticas, pois o sinal está associado à fase FM e não se observam alterações significativas na forma do espectro em função do teor de Cu, ao contrário das medidas de magnetização. De acordo com Allodi et al. [45], o núcleo de 139 La experimenta um campo local efetivo dado por Be = X 2π gµ Aj Sj + µ0 H + µ0 Hdip , B 139 γ j (3.6) onde H é o campo externo, cujo valor nos experimentos realizados neste trabalho é igual a zero, 139 γ 2π = 6, 0145 MHz/T é a razão giromagnética do núcleo de 139 La e Hdip é o campo gerado pelos momentos dipolares dos íons de Mn. O somatório na expressão acima se expande sobre os momentos gµb Sj dos oito Mn vizinhos mais próximos e o tensor de acoplamento hiperfino Aj se reduz a escalares devido à contribuição principal 75 22,5 (a) 20% (b) ν p (M H z) 22,4 22,3 22,2 22,1 22,0 15% 21,9 21,8 90,50 10% (c) α (º) 90,49 90,48 90,47 90,46 5% 90,45 90,44 3,886 (d) 3,884 0% 1 a (Å) 3,882 2 3,880 3,878 3 3,876 3,874 19 20 21 22 23 24 3,872 0 Freqüência (MHz) Figura 3.24: (a) Espectros normalizados de RMN de 5 10 15 20 y (%) 139 La em campo zero para as amostras de manganita. As linhas sólidas e pontilhadas representam respectivamente o ajuste gaussiano de cada espectro e as componentes destes ajustes. (b) Variação da freqüência do pico da linha central em função da dopagem com Cu. (c) Ângulo entre as arestas da célula unitária primitiva obtido por refinamento dos difratogramas de raios-X. (d) Comprimento da aresta da célula unitária primitiva obtido por refinamento dos difratogramas de raios-X. 76 proveniente da superposição dos orbitais Mn com os orbitais O, e destes com os orbitais do La (seção 1.3.1). Os campos dipolares se cancelam no centro de uma estrutura com simetria cúbica e, ainda de acordo com Allodi et al. [45], a contribuição dipolar para o espectro de pó de uma estrutura cúbica distorcida tem primeiro momento igual a zero, contribuindo desta forma apenas para alargamento das linhas de ressonância, e não para a freqüência média de cada linha. Assim, o campo no sítio do La dado pela Equação 3.6 se reduz à contribuição hiperfina, dada por (3.7) Bhf = A hSi , onde A é a chamada constante de acoplamento hiperfino. Na Tabela 3.9 encontram-se os valores de Bhf calculados pela linha central dos espectros de RMN de 139 La. Tabela 3.9: Campo hiperfino transferido Bhf no sítio do La em regiões FM, estimado a partir do pico da linha central dos espectros de RMN de 139 La. Amostra Bhf (T) 0% 3,70 5% 3,71 10% 3,72 15% 3,69 20% 3,66 A Figura 3.24b mostra a variação da freqüência dos picos νP em função da concentração de Cu. O valor de νp para a linha central aumenta ligeiramente com o teor de Cu até y = 10%, concentração a partir da qual νP decresce, indicando um valor máximo de campo hiperfino transferido observado na amostra 10%. A variação de freqüência é, entretanto, pequena, e uma comparação com os dados da literatura [45, 46, 55, 56] sugere que tal variação dificilmente surge de mudanças na configuração magnética local dos ambientes responsáveis pela linha mais intensa dos espectros. Uma interpretação mais provável [46, 47] seria em termos das variações estruturais causadas pela dopagem com Cu, encontradas após o refinamento dos difratogramas de raios-X. Os valores de a e α encontram-se reapresentados nas figuras 3.24c e 3.24d. A explicação dada na seção 1.3.1 para a origem do campo hiperfino transferido propõe que uma diminuição no comprimento médio de ligação dhM n−Oi = a/2, e , portanto, uma maior sobreposição das funções de onda do Mn e do O, leva a um aumento da constante de acoplamento 77 hiperfino A, e conseqüentemente ao deslocamento da freqüência de ressonância para valores maiores. Este é o comportamento observado para as amostras 0%, 5% e 10%, onde o ângulo α permanece inalterado, dentro da incerteza do ajuste. O aumento na distorção refletido pelo comportamento de α nas amostras 15% e 20% é responsável pela diminuição de A, o que conduz νP da linha central novamente a valores menores. Medidas de DRX ou outra técnica de caracterização estrutural em baixa temperatura poderiam confirmar a interpretação acima. De volta à Figura 3.24a, observam-se ainda duas linhas adicionais aproximadamente eqüidistantes da posição central do espectro. Estas linhas estão mascaradas pela relação sinal/ruído nas amostras 15% e 20%. Estas transições possivelmente são resultados de interações quadrupolares entre o núcleo de 139 La e o GCE resultante da estrutura cristalina cúbica distorcida da amostra. Esta conclusão é sustentada pela pequena largura de linha dos picos individuais da Figura 3.24a, da ordem de 1 MHz, quando comparados com outros trabalhos semelhantes, cujo alargamento não é menor que 5 MHz [45,46,53,54,56]. É possível que as transições resultantes de interações quadrupolares estejam disfarçadas pelo alargamento de linha nestes trabalhos. Um outro fator que contribui para esta interpretação das linhas satélites é a freqüência de desdobramento ∆ν, em torno de 2,5 MHz. Este valor é ligeiramente menor que os 3 MHz atribuídos a manganitas ortorrômbicas [49], e justifica-se pela maior simetria da estrutura romboédrica, resultando em um menor GCE. Outras interpretações podem ainda ser dadas para as linhas satélites dos espectros. Yoshinari et al. [55] observaram duas linhas adicionais em seu espectro de RMN de 139 La em campo zero em La0,5 Ca0,5 MnO3 : a linha principal, atribuída à região com os momentos dos oito íons de Mn alinhados ferromagneticamente, e uma linha menos intensa em freqüência ligeiramente superior, associada a regiões onde os núcleos de La experimentam ligações mais intensas com os oito primeiros vizinhos Mn. Seguindo este raciocínio, as linhas satélites no espectro da Figura 3.24 podem ser associadas a regiões de maior e menor interação La–Mn. O mesmo artigo [55] fornece uma interpretação alternativa para a linha em maior freqüência, em termos de paredes de domínio entre as fases FM e AFM. Em geral, paredes de 78 domínio envolvem variação espacial da orientação dos spins em seu interior, e necessitam de espessura apropriada para alcançar o equilíbrio entre os dois domínios vizinhos, o que resultaria em desdobramento do espectro devido a diferentes ambientes magnéticos. O levantamento de espectros de RMN em função da potência do campo de RF poderiam elucidar esta interpretação, através da medida do fator de amplificação η. 3.4 Considerações Finais Os resultados experimentais demonstraram que a substituição de íons de manganês por íons de cobre altera significativamente o comportamento magnético de manganitas La0,86 Sr0,14 Mn1−y Cuy O3+δ (0 ≤ y ≤ 0,2), embora sua estrutura cristalina permaneça essencialmente a mesma. As curvas M × T demonstraram transição PM–FM em todas as amostras, mas o baixo valor da magnetização de saturação obtido das curvas M × H em relação ao valor máximo previsto sugere que, em baixas temperaturas, os estados FM e AFM coexistam nestas composições, mesmo que esta coexistência não seja evidente pelas curvas de suscetibilidade magnética. O valor de n igual a 20% para a amostra 0% justifica tal coexistência segundo Rao e Raveau [29] que argumentam coexistência de fases em La1−x Ax MnO3 para x entre 0,1 e 0,3. Nas amostras dopadas a quantidade de íons Mn4+ é aumentada pela introdução de íons de Cu2+ , deslocando o valor de n para a região ferromagnética dos diagramas de fases para manganitas não dopadas no sítio B [5, 12, 29]. Entretanto, a suscetibilidade magnética e a magnetização de saturação diminuem em baixas temperaturas, e a temperatura de Curie é reduzida enquanto se alarga a transição magnética à medida em que aumenta a quantidade de cobre no composto, indicando uma diminuição da fase FM das amostras induzida pela presença dos íons de cobre, como discutido anteriormente. Estes efeitos são ainda mais notáveis na amostra 20%, provavelmente pelo antiferromagnetismo induzido pelo cobre e o induzido pela tendência do valor de n para 50%, uma região do diagrama de fases de La1−x Srx MnO3+δ de fronteira FM–AFM [5, 29]. É geralmente aceito que a introdução de Cu na matriz de Mn induz a interação AFM de SE e diminui a interação FM de DE, levando a uma diminuição de TC e um alargamento 79 na transição magnética [60, 68–71, 74], como já discutido na seção 1.4. A substituição de Mn por íons de Cu destrói gradualmente as ligações Mn3+ –O–Mn4+ e localiza os elétrons eg [60]. Como a DE é mediada pelos elétrons eg itinerantes, a localização destes gradualmente enfraquece tal interação, resultando em um alinhamento FM dos momentos em temperaturas mais baixas, ou seja, uma diminuição no valor de TC . Os resultados de MEV também corroboram a hipótese de enfraquecimento da interação de DE. A crescente porosidade e a diminuição do tamanho do cristalito com o aumento da dopagem com Cu reduzem gradualmente o canal de condução, criando sítios de espalhamento de elétrons, o que também diminui a dupla-troca. A diminuição do tamanho do cristalito sugere um aumento na contribuição dos contornos de grão, que distorcem as ligações Mn–O–Mn e dificultam a interação de dupla-troca entre os íons de manganês. 80 Capítulo 4 Conclusão Amostras policristalinas de manganitas com a composição La0,86 Sr0,14 Mn1−y Cuy O3+δ (y = 0; 0,05; 0,10; 0,15; 0,20) foram sintetizadas e suas propriedades estruturais e magnéticas investigadas. Apesar da falha na proporção dos reagentes devido às impurezas, o processo de síntese obteve sucesso e a manganita resultante revelou fase única. O La2 O3 formado no material final constituiu um calibre interno para o ajuste do ângulo zero dos difratogramas de raios-X, necessário à obtenção dos valores corretos dos parâmetros de rede. A análise por MEV revelou microestrutura homogênea em todas as amostras. Aumento na quantidade de poros e diminuição no tamanho de cristalito para maiores concentrações de cobre também foram observados. Os resultados de EDS, embora originários de apenas uma região microscópica das amostras, apresentaram boa concordância com os valores nominais. Os difratogramas de raios-X não apresentaram evolução significativa, denotando uma estrutura cristalina essencialmente inalterada, o que significa que os íons de Cu ocuparam o sítio dos íons de Mn. Análise da posição dos picos dos difratogramas de raios-X revelaram sistema romboédrico, com diminuição da aresta da célula unitária e ligeiro aumento no ângulo entre tais arestas com o aumento do valor de y, resultando em uma diminuição do volume da célula unitária nas amostras contendo maiores quantidades 81 de cobre. Evidências de estrutura cristalina compacta possibilitaram a proposta de um método alternativo para o cálculo do teor de oxigênio. Embora a estrutura cristalina tenha permanecido praticamente inalterada, a introdução dos íons de Cu modificou significativamente a estrutura magnética destes compostos, como observado pelas medidas de suscetibilidade magnética. Todas as amostras apresentaram transição FM, mas a dopagem com cobre no sítio do manganês reduziu a temperatura de Curie e diminuiu a homogeneidade magnética, resultando em alargamento da transição. Os resultados de magnetização e RMN demonstraram evidências de coexistência de diferentes fases magnéticas nas amostras. A diferença entre os valores de TC e TCW indicou a permanência de ordem magnética de curto alcance em temperaturas acima da temperatura de transição magnética, em um meio predominantemente PM. Os valores encontrados para os momentos paramagnéticos efetivos corroboraram esta interpretação. Em baixas temperaturas, a diminuição da suscetibilidade e da magnetização de saturação sugerem uma crescente fase AFM, favorecida pela interação de supertroca entre os íons de Cu e Mn e pelo enfraquecimento da interação de dupla-troca como resultado de diferentes efeitos produzidos pela presença do cobre. Em particular, os espectros de RMN não demonstraram variação significativa, indicando que a fase FM permanece mesmo na amostra 20%, cuja curva M × H difere consideravelmente das demais composições e aponta para uma fase AFM majoritária. Entretanto, investigações adicionais das características magnéticas são necessárias para a confirmação da hipótese de coexistência de fases. Medidas de RMN de 55 139 La e de Mn com campo aplicado poderiam refinar esta interpretação, uma vez que as fases FM e AFM respondem de maneira diferente a campos externos aplicados. RMN de 63 Cu nestas amostras também constitui uma promissora complementação do trabalho, através da investigação do ambiente magnético formado em torno dos núcleos de cobre. Como uma continuação natural desta linha de pesquisa, serão estudados os efeitos produzidos pela dopagem com Cu nas propriedades de transporte elétrico da manganita La1−x Srx MnO3+δ , como resistividade e magnetorresistência. 82 O efeito magnetocalórico também constitui uma interessante continuação da pesquisa, não só pelas interações entre magnetismo e estrutura cristalina, que resultam em uma alteração adicional da entropia magnética, mas pelas peculiaridades apresentadas pelas propriedades magnéticas nas composições aqui utilizadas. 83 Referências [1] IMADA, M.; FUJIMORI, A.; TOKURA, Y. Metal-insulator transitions. Reviews of Modern Physics, v. 70, n. 4, p. 1039-1263, Oct 1998. [2] TOKURA, Y.; TOMIOKA, Y. Colossal magnetoresistive manganites. Journal of Magnetism and Magnetic Materials, v. 200, p. 1-23, 1999. [3] ZENER, C. Interaction between the d-shells in transition metals: II. ferromagnetic compounds of manganese with perovskite structure. 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Physical Review Letters, v. 76, n. 21, p. 4046-4049, May 1996. 92 Apêndice A Parâmetros do Refinamento Estrutural Tabela A.1: Dados do refinamento dos parâmetros estruturais para a amostra 0%. Pico hkl dhkl (Å) 2θobs (o ) 2θobs − ∆θ (o ) 1 (001̄) 3,8835 23,105 22,8777 2 (011̄) 2,7573 32,693 32,4657 3 (011) 2,7349 32,948 32,7207 4 (111̄) 2,2482 40,277 40,0497 5 (111) 2,2240 40,741 40,5137 6 (002̄) 1,9417 46,998 46,7707 7 (012̄) 1,7424 52,777 52,5497 8 (012) 1,7311 53,081 52,8537 9 (112̄) 1,5919 58,166 57,9387 10 (121̄) 1,5876 58,335 58,1077 11 (112) 1,5747 58,781 58,5537 12 (022̄) 1,3786 68,154 67,9267 13 (022) 1,3674 68,802 68,5747 14a (122̄) 1,2992 15a (003) 1,2945 16a (221̄) 1,2945 17 (122) 1,2852 73,891 73,6637 18 (031̄) 1,2311 77,664 77,4367 19 (013) 1,2251 78,087 77,8597 20a (113̄) 1,1752 21a (131̄) 1,1718 22a (113) 1,1649 23 (222̄) 1,1241 86,726 86,4987 24 (222) 1,1120 87,891 87,6637 25a (023̄) 1,0811 26a (023) 1,0731 27 (123̄) 1,0422 95,452 95,2247 28 (132̄) 1,0409 95,654 95,4267 29 (231̄) 1,0373 96,194 95,9667 30 (123) 1,0313 96,859 96,6317 a: picos de baixa intensidade desconsiderados devido gaussiano não confiável. 2θcalc (o ) 22,8809 32,4442 32,7174 40,0726 40,5275 46,7439 52,4724 52,8425 57,8768 58,0503 58,5690 67,9351 68,5687 72,7270 73,0320 73,0320 73,6464 77,4670 77,9187 81,9040 82,1990 82,7880 86,5076 87,6860 90,8750 91,7510 95,3133 95,4611 95,9046 96,6446 ao ajuste Tabela A.2: Dados do refinamento dos parâmetros estruturais para as amostras 5% e 10%. 5% hkl dhkl (Å) 2θobs (o ) 2θobs − ∆θ (o ) 2θcalc (o ) (001̄) 3,8792 22,927 22,8629 22,9064 (011̄) 2,7542 32,560 32,4959 32,4810 (011) 2,7319 32,828 32,7639 32,7543 (111̄) 2,2458 40,210 40,1459 40,1187 (111) 2,2216 40,673 40,6089 40,5737 (002̄) 1,9396 46,889 46,8249 46,7984 (012̄) 1,7405 52,612 52,5479 52,5347 (012) 1,7292 52,975 52,9109 52,9049 (112̄) 1,5902 58,016 57,9519 57,9467 (121̄) 1,5858 58,186 58,1219 58,1203 (112) 1,5730 58,727 58,6629 58,6392 (022̄) 1,3771 68,074 68,0099 68,0204 (022) 1,3659 68,731 68,6669 68,6543 (122̄) 1,2978 72,883 72,8189 72,8173 (003) 1,2931 73,191 73,1269 73,1254 1,2931 73,191 73,1269 73,1254 (221̄) (122) 1,2838 73,788 73,7239 73,7401 (031̄) 1,2297 77,636 77,5719 77,5683 (013) 1,2237 78,093 78,0289 78,0204 (113̄) 1,1740 82,033 81,9689 82,0107 (131̄) 1,1705 82,371 82,3069 82,3080 (113) 1,1636 82,956 82,8919 82,9021 (222̄) 1,1229 86,691 86,6269 86,6265 (222) 1,1108 87,884 87,8199 87,8062 (023̄) 1,0800 91,044 90,9799 90,9994 (023) 1,0719 91,947 91,8829 91,8834 (123̄) 1,0410 95,574 95,5099 95,4522 (132̄) 1,0398 95,708 95,6439 95,6002 (231̄) 1,0362 96,035 95,9709 96,0443 (123) 1,0302 96,855 96,7909 96,7854 desconsiderado no ajuste por estar sobreposto ao pico no 16. Pico 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15b 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 hkl (001̄) (011̄) (011) (111̄) (111) (002̄) (012̄) (012) (112̄) (121̄) (112) (022̄) (022) (122̄) (003) (221̄) (122) (031̄) (013) (113̄) (131̄) (113) (222̄) (222) (023̄) (023) (123̄) (132̄) (231̄) (123) dhkl (Å) 3,8781 2,7534 2,7312 2,2451 2,2212 1,9391 1,7400 1,7288 1,5897 1,5854 1,5727 1,3767 1,3656 1,2974 1,2927 1,2927 1,2835 1,2294 1,2234 1,1736 1,1702 1,1633 1,1226 1,1106 1,0796 1,0716 1,0407 1,0395 1,0359 1,0300 10% 2θobs (o ) 22,915 32,544 32,820 40,175 40,647 46,884 52,603 52,977 58,022 58,187 58,717 68,101 68,741 72,873 73,223 73,223 73,806 77,651 78,104 82,071 82,433 82,985 86,720 87,890 91,087 91,975 95,581 95,705 96,145 96,871 2θobs − ∆θ (o ) 22,8543 32,4833 32,7593 40,1143 40,5863 46,8233 52,5423 52,9163 57,9613 58,1283 58,6563 68,0403 68,6803 72,8123 73,1623 73,1623 73,7453 77,5903 78,0433 82,0103 82,3723 82,9243 86,6593 87,8293 91,0263 91,9143 95,5203 95,6443 96,0843 96,8103 2θcalc (o ) 22,9127 32,4912 32,7624 40,1309 40,5826 46,8118 52,5515 52,9190 57,9660 58,1383 58,6533 68,0438 68,6731 72,8427 73,1485 73,1485 73,7586 77,5951 78,0438 82,0407 82,3358 82,9256 86,6581 87,8292 91,0346 91,9122 95,4905 95,6374 96,0783 96,8141 93 Pico 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15b 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 b: pico Tabela A.3: Dados utilizados para o refinamento dos parâmetros estruturais para as amostras 15% e 20%. 20% 2θobs (o ) 22,982 32,603 32,890 40,256 40,727 46,956 52,660 53,050 58,088 58,250 58,807 68,152 68,821 72,954 73,262 73,262 73,917 77,711 78,189 82,123 82,430 83,079 86,760 88,002 95,551 95,727 96,208 96,989 2θobs − ∆θ (o ) 22,9375 32,5585 32,8455 40,2115 40,6825 46,9115 52,6155 53,0055 58,0435 58,2055 58,7625 68,1075 68,7765 72,9095 73,2175 73,2175 73,8725 77,6665 78,1445 82,0785 82,3855 83,0345 86,7155 87,9575 95,5065 95,6825 96,1635 96,9445 2θcalc (o ) 22,9278 32,5038 32,7933 40,1506 40,6326 46,8441 52,5760 52,9683 57,9900 58,1740 58,7238 68,0731 68,7449 72,8772 73,2038 73,2038 73,8552 77,6400 78,1192 82,0808 82,3961 83,0259 86,7089 87,9597 91,0990 92,0370 95,5381 95,6951 96,1661 96,9522 94 15% Pico hkl dhkl (Å) 2θobs (o ) 2θobs − ∆θ (o ) 2θcalc (o ) Pico hkl dhkl (Å) 1 (001̄) 3,8764 22,895 22,8931 22,9228 1 (001̄) 3,8756 2 (011̄) 2,7526 32,526 32,5241 32,5007 2 (011̄) 2,7524 3 (011) 2,7297 32,798 32,7961 32,7819 3 (011) 2,7287 4 (111̄) 2,2444 40,165 40,1631 40,1449 4 (111̄) 2,2440 5 (111) 2,2195 40,656 40,6541 40,6132 5 (111) 2,2185 6 (002̄) 1,9382 46,863 46,8611 46,8333 6 (002̄) 1,9378 7 (012̄) 1,7394 52,587 52,5851 52,5693 7 (012̄) 1,7392 8 (012) 1,7278 52,974 52,9721 52,9503 8 (012) 1,7273 9 (112̄) 1,5892 58,014 58,0121 57,9840 9 (112̄) 1,5891 10 (121̄) 1,5848 58,182 58,1801 58,1627 10 (121̄) 1,5845 11 (112) 1,5716 58,715 58,7131 58,6968 11 (112) 1,5710 12 (022̄) 1,3763 68,080 68,0781 68,0658 12 (022̄) 1,3762 13 (022) 1,3648 68,733 68,7311 68,7184 13 (022) 1,3644 14 (122̄) 1,2970 72,875 72,8731 72,8681 14 (122̄) 1,2969 15b (003) 1,2922 73,223 73,2211 73,1853 15b (003) 1,2919 16 (221̄) 16 (221̄) 1,2922 73,223 73,2211 73,1853 1,2919 17 (122) 1,2826 73,818 73,8161 73,8180 17 (122) 1,2821 18 (031̄) 1,2289 77,635 77,6331 77,6268 18 (031̄) 1,2288 19 (013) 1,2228 78,099 78,0971 78,0922 19 (013) 1,2224 20 (113̄) 1,1733 82,073 82,0711 82,0704 20 (113̄) 1,1732 21 (131̄) 1,1697 82,364 82,3621 82,3765 21 (131̄) 1,1695 22 (113) 1,1626 82,998 82,9961 82,9882 22 (113) 1,1622 23 (222̄) 1,1222 86,689 86,6871 86,6943 23 (222̄) 1,1220 24 (222) 1,1098 87,903 87,9011 87,9090 24 (222) 1,1093 25 (023̄) 1,0793 91,051 91,0491 91,0691 25a (023̄) 1,0790 26 (023) 1,0710 91,962 91,9601 91,9794 26a (023) 1,0705 27 (123̄) 1,0404 95,525 95,5231 95,5264 27 (123̄) 1,0403 28 (132̄) 1,0391 95,675 95,6731 95,6788 28 (132̄) 1,0390 29 (231̄) 29 (231̄) 1,0354 96,109 96,1071 96,1362 1,0352 30 (123) 1,0293 96,884 96,8821 96,8995 30 (123) 1,0289 a: picos de baixa intensidade desconsiderados devido ao ajuste gaussiano não confiável. b: pico desconsiderado no ajuste por estar sobreposto ao pico no 16.