O tratamento psicossocial de dependentes de substâncias em CT

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O tratamento psicossocial de dependentes de substâncias em CT
O tratamento psicossocial de dependentes de substâncias em comunidade terapêutica
Osvaldo Christen Filho
Ele tinha um pouco mais de 50 anos de idade. Gostava de jogar futebol de vez em
quando; no mais, não era de se excercitar muito. Inscreveu-se para participar de uma corrida um trajeto aproximado de 7.500m. Já corria aproximadamente a metade do percurso, suas
pernas doiam muito, o coração pulsava rápido, o pulmão arfafa, o suor fazia os olhos arder.
Estava para desistir, parar. Outro atleta, passando por ele, disse: “Vamos, cara, vamos, não
para, você vai conseguir!” Ele juntou forças, reanimou-se e prosseguiu. Em um segundo
momento, na subida de mais um morro que fazia parte do percurso, suas forças estavam no
fim. Não aguentava mais. Não iria conseguir. As pernas tremiam; tudo em seu corpo pulsava.
Mal conseguia respirar. Outro atleta, aproximando-se gritou-lhe: “Vamos, cara. Não desista.
Força. Você vai conseguir...!” Ele reuniu forças, “raspou o fundo do tacho”, como se diz, juntou
toda a energia possível
e, quase se arrastando continuou, continuou, continuou... até
completar a corrida. Eufórico, transbordando de alegria, contava sua experiência para nós.
Uma reflexão sobre esse relato verídico, impactante, faz surgir uma pergunta curiosa: no
que consiste o poder da palavra de um homem que consegue mobilizar pensamentos,
músculos e ossos de outro homem, de modo que este último reúna esforços para enfrentar
extremas dificuldades que o separam de alcançar seus objetivos? Como se consegue incutir
um reforço psicológico positivo, empolgante e suficientemente forte para reverter uma
eminente derrota? É da perspectiva do poder da palavra que “O tratamento psicossocial de
dependentes de substâncias em comunidade terapêutica” será abordado.
1. Comunidade Terapêutica – breve histórico
Ações de prevenção, tratamento e reabilitação de dependentes de substâncias podem
ser realizadas sob diversas formas e ambientes1 como consultórios, hospitais, ambulatórios,
hospitais-dia, enfermarias, clínicas e comunidades terapêuticas.
O termo “comunidade terapêutica (CT)” é um termo moderno,
2
atribuindo-se sua
aplicação a tratamentos psiquiátricos na Grã Bretanha, nos anos próximos a 1940. Maxwell
1
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO: Guia Prático sobre Uso, Abuso e Dependência de
Substâncias Psicotrópicas para Educadores e Profissionais da Saúde. São Paulo: Secretaria de
Participação e Parceria, 2006. p.25.
2
De LEON, G. A Comunidade Terapêutica: Teoria, Modelo e Método. São Paulo: Edições Loyola, 2003.
p.14-21.
Jones (1953), um psiquiatra no Reino Unido, foi um dos pioneiros a utilizar o modelo em torno
de 15 anos antes das CTs surgirem como tal na América do Norte. Tratava-se de uma nova
possibilidade de abordagem do paciente, que Deixou de ser exclusivamente individual para ser
também grupal. O modelo de Jones difundiu-se para outras partes da Europa. Nos Estados
Unidos versões modificadas da CT psiquiátrica foram adaptadas para o tratamento de
dependentes de substâncias psicoativas (SPA).
Nos anos de 1960 a 1970, na Europa e na América do Norte, proliferaram programas de
tratamento que remetiam seu programa conceitual ao grupo de Oxford, na Inglaterra (1921),
passando pelos Alcoólicos Anônimos (1935), pelo Synanon (1958) e Daytop Village (1963). Uma
rápida passada nestes precursores da CT psiquiátrica auxilia a compreender o forte
componente espiritual religioso presente na maioria desses centros de tratamento de
dependência de substâncias e a introdução de conceitos técnico-científicos.
O grupo de Oxford foi fundado por Frank Buchman, ministro evangélico luterano,
objetivando um renascimento espiritual dos cristãos acomodados. Transtornos mentais e
alcoolismo foram contemplados pelas preocupações do movimento, pois eram entendidos
como sinais de uma situação espiritual deteriorada. Parte das iDeias e práticas sustentadas,
incluía a ética do trabalho, o cuidado mútuo, a orientação partilhada e os valores evangélicos
da honestidade, da pureza, do altruísmo e do amor, o autoexame, o reconhecimento dos
defeitos de caráter, a reparação por danos causados e o trabalho conjunto.
Os fundadores dos Alcoólicos Anônimos (AA), Bill Wilson, e o dr. Bob Smith, ambos
alcoólicos em recuperação, foram fortemente influenciados por pessoas ligadas ao
mencionado grupo de Oxford. Os 12 Passos e as 12 Tradições por eles desenvolvidos referemse à perda de controle de uma pessoa em relação à substância e à entrega a um poder
superior, o autoexame, a busca de ajuda do poder superior, reparação de males causados a
outros, oração na luta pessoal, e o compartilhamento da experiência com outras pessoas.
O surgimento da Synanon deve-se a Charles Dederich - um dependente do álcool em
recuperação. Ele uniu suas experiências nos AA com conhecimentos filosóficos, práticos e
psicológicos. Deve-se a esse movimento a abertura das reuniões de grupo a usuários abusivos
de qualquer substância, o surgimento da comunidade residencial, a estrutura organizacional
hierarquizada, metas e orientação psicológica.
No Brasil, as comunidades terapêuticas saíram da clandestinidade com o advento da
Resolução de Diretoria Colegiada – RDC 101, da ANVISA, de 30/05/2001 3, recebendo uma
abrangente definição, sendo, porém, revogada pela RDC 29 de 30/06/2011 4. A RDC 29 reforça
a vocação do modelo psicossocial de tratamento de dependentes químicos, sendo as
comunidades terapêuticas um dos principais espaços que oferecem esse serviço.
2. O que o modelo psicossocial de comunidade terapêutica pretende tratar?
A abordagem psicossocial no tratamento a dependentes de drogas em comunidades
terapêuticas pretende fazer frente às principais características da dependência química. O
DSM-IV 5 diz que
“a característica essencial da dependência de substâncias é a presença de um
agrupamento de sintomas cognitivos, comportamentais e fisiológicos indicando
que o indivíduo continua utilizando uma substância, apesar de problemas
significativos relacionados a ela.”
O uso/abuso de substâncias, sob uma ótica genérica, não é um único tipo de adição
conhecido. Autores
6
dizem que adições podem se apresentar com “diferentes conteúdos:
comida, ginástica, internet, jogo, compras, trabalho, sexo e drogas”. Mas, referindo-se
especificamente às drogas que geram dependência, descrevem que 7
A dependência a drogas é um estado mental e, muitas vezes, físico, que resulta
da interação entre um organismo vivo e uma droga psicoativa. A dependência
sempre inclui uma compulsão de usar a droga para experimentar seu efeito
psíquico ou evitar o desconforto provocado pela sua ausência.
3
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Resolução – RDC n. 101: Estabelece exigências
mínimas para o funcionamento de serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso
ou abuso de SPA. Brasília: 2002.
4
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Resolução RDC 29: Dispõe sobre os requisitos de
segurança sanitária para o funcionamento de instituições que prestem serviços de atenção a pessoas
com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de substâncias psicoativas. Brasília: 2011.
5
DSM-IV. Transtornos Relacionados a Substâncias. Porto Alegre, 2000. p. 172-173.
YAZIGI, l.; AMARAL, A.E.de V. Aprofundamento da Avaliação do Usuário de Substâncias Psicoativas.
In: SILVEIRA, D.X. da.; MOREIRA, F.G. Panorama Atual de Drogas e Dependências. 1. ed. São Paulo:
Editora Atheneu, 2006. p.206..
7
DALGALARRONDO, P. Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais. Porto Alegre: Artmed
Editora, 2000, p.212.
6
A dependência química, portanto, é essencialmente psíquica, podendo associar-se ou
não a ela uma dependência fisiológica.
Psicologicamente, então, a dependência de substâncias pode ser descrita como o
resultado de um tipo de relação que o usuário estabelece com as drogas de sua preferência. É
uma interação que ganha um espaço e prioridade significativos sobre os demais aspectos de
vida humanos. Substâncias, de alguma maneira, trazem algum retorno ao indivíduo, assim
entendidos “suportes” ou “auxílios” na realização de certas funções. Ex.: desinibição; uma
forma de prazer; onipotência; relaxamento; um modo de enfrentar seus medos; ser alguém ou
ocupar um lugar de importância. É uma relação construída ao longo do tempo, inespecífica
quanto à constituição física, personalidade, sexo, status social, idade ou raça. Uma vez
satisfeita uma necessidade, associada com o uso de drogas, o indivíduo passa a acreditar na
lógica: “se usar – então me sairei bem (melhor)”. Ele passa a certificar-se de que a substância
esteja presente em seu contexto vivencial, ficando altamente apreensivo em garantir acesso a
ela cotidianamente.
Decorrentes desse estado psicológico, alterações comportamentais são observáveis
dependendo do tipo de droga utilizada - se estimulante, depressora ou alucinógena - mas
também durante o tempo que precede o uso, quando a preocupação do indivíduo se
concentra em: qual droga usar, onde e como obtê-la. Esse é o meio tempo em que
relacionamentos sociais afetivos ou não, de trabalho, estudo e lazer ficam prejudicados. O
usuário dependente experimenta ansiedade, raiva, insônia e outros sintomas enquanto busca
novas doses. A capacidade de raciocínio fica como que refém da busca exclusiva da droga. O
indivíduo experimenta o que é conhecido por fissura - um forte impulso subjetivo para usar
uma substância. Riscos pessoais e de outras pessoas nesses momentos de crise ficam
suspensos; a antecipação de consequências fica anulada; valores morais e éticos perdem seu
poder. Impulsividade e compulsividade descrevem a busca de saciação do desejo de usar
substância, marcadas por comportamentos alterados e desorganizados. Referidas alterações
comportamentais variam de intensidade segundo o perfil do usuário, droga utilizada, e
circunstâncias para obtê-la e/ou usá-la.
A dependência fisiológica, que pode ou não acompanhar a psicológica, caracteriza-se
pela presença de dois componentes: a tolerância e a abstinência. Na tolerância, conforme o
DSM-IV, observa-se “... a necessidade de crescentes quantidades da substância para atingir a
intoxicação”. Por abstinência, compreende-se “que as concentrações de uma substância no
sangue e tecidos declinam em um indivíduo que manteve um uso pesado e prolongado a
substância”, levando ao “desenvolvimento de sintomas desagradáveis”. Referidos sintomas
podem ser atenuados por novo uso da substância em falta, formando um ciclo vicioso.
Os sintomas descritos não são exaustivos. Servem para iniciar o possível diagnóstico do
que se pretende tratar na comunidade terapêutica. O serviço de triagem determinará a
necessidade de internação em CT, geralmente utilizada como recurso último após tentativas
de tratar o dependente sem tirá-lo de seu habitat.
3. Especificidades do atendimento psicossocial em comunidade terapêutica
O internamento em CT pode ser facilmente confundido com reclusão ou tratamento
psiquiátrico ou manicomial. Pseudo-CTs até podem ser confundidas com os citados modelos
de “depósitos humanos” – objeto de extinção pela Luta Antimanicomial brasileira. Algumas
especificidades são relacionadas a seguir, a respeito de CTs que desenvolvem um trabalho
sério, ético e responsável, com o objetivo de diferenciar seu jeito de “internar” e “tratar”:
a) O regime de atendimento psicossocial em CT é residencial, em tempo integral ou
não, diferenciando-se de uma internação hospitalar em alguns aspectos principais:
 Requer participação ativa do recuperando nas atividades oferecidas. Os “remédios”
oferecidos constam de orientações normativas para uma vida significativa, individual
e social, sem o uso de substâncias. Tais orientações podem ou não serem aceitas e
seguidas;
 Na relação médico-paciente, pressupõe-se que o profissional “saiba” a respeito do
corpo do paciente; na relação psicossocial, quem sabe melhor sobre si é o usuário do
serviço, sendo sua personalidade, dependência de drogas, prejuízos biológicos e
sociais elaborados com o auxílio dos profissionais à sua volta;
 No hospital toda a equipe profissional “faz pelo paciente”; na comunidade terapêutica
a equipe profissional e pares “fazem com ele”, em uma relação horizontalizada 8.
 A internação em CT deve contar, necessariamente, com o consentimento do
dependente de substâncias. A CT não pode aplicar quaisquer medidas de contenção
física;
 Algumas CTs podem oferecer serviços de saúde médico-hospitalar se tão somente
seguirem orientações sanitárias e de saúde específicas. Tais serviços, porém, como
por ex., o de desintoxicação, são coadjuvantes do tratamento, não se constituindo
no foco principal que é a atenção psicossocial.
8
FRACASSO, L. Características da Comunidade Terapêutica. 15 abr.2010. Disponível em:
«http://www.restauracaodasvidas.com.br/2010/04/caracteristicas-da-comunidade.html». Acesso em:
01 set.2011.
b) O tratamento de dependentes de substâncias em CT concentra-se, entre outros, nos
aspectos relacionais do ser humano, pelo apoio de pares. A cura pretendida pelo
dependente químico e seus familiares passa, necessariamente, pela abstinência de
substâncias. Assim, a cura pode ser entendida como a capacidade de não usar
drogas. Do ponto de vista da psicologia de aprendizagem, usar drogas é um
comportamento aprendido; por conseguinte, constitui um novo aprendizado
conseguir parar de usá-las. A tarefa à qual o tratamento psicossocial das CTs se
propõe é preparar o dependente químico para viver em um mundo abastado de
drogas, sem, porém, usá-las. Para alcançar esse objetivo, as CTs utilizam contínuos
processos de ensino-aprendizagem. Referidos processos encontram ancoragem, 1)
nas concepções construtivistas-interacionistas de aprendizagem 9, que entendem o
sujeito aprender diretamente na interação com os objetos; 2) nas concepções de
aprendizagem sócio-interacionistas 10, que concebem o aprendizado como resultado
das interações sócio-históricas do sujeito, através de elementos mediadores como
instrumentos (tecnologia), signos (dos quais a linguagem se destaca) e ambiente
humano, e, 3) os processos de ensino-aprendizagem desenvolvidos em CTs podem
ancorar-se na teoria de aprendizagem mediada 11, que acredita na modificabilidade
cognitiva humana, em qualquer fase da vida, focando o papel fundamental do
mediador no processo de aprendizagem do aprendiz.
c) Outras especificidades do atendimento psicossocial em CT:
 Disponibilidade de um ambiente livre de substâncias geradoras de dependência,
requerendo consequente abstinência das mesmas, requisito básico à aprendizagem
em nível neuronal sináptico;
 Saída emergencial de ambientes de alta periculosidade em decorrência do tráfico de
drogas;
 Suspensão da vulnerabilidade à recaídas frequentes;
 Criação de uma trégua nas relações familiares afetadas negativamente;
9
GOMES, C.M.A. Feuerstein e a Construção Mediada do Conhecimento. Porto Alegre: Artmed Editora,
2002, p.35-107, 298 p.
10
MEIER, M. GARCIA, S. Mediação da Aprendizagem. Contribuições de Feuerstein e de Vygotsky.
Curitiba: Edição dos autores, 2008, 212 p.
11
SASSON, D. Del cambio estructural a la autoimagem positiva. In: MARTINEZ, J.M.; & GARBO, R. (Eds).
¿Es modificable la inteligencia? Madrid: Bruño, 1998.cx
0
________. Los componentes del proceso holístico del aprendizaje mediado. In: Memorias del 1
Congreso Latinoamericano de Aprendizaje Mediado. Buenos Aires: Stella. 2001. 65 p.
 Reinserção social em um grupo de pares pelo compartilhamento de moradia,
refeições, realização de tarefas e participação de diversas atividades diárias.
Algumas CTs oferecem o acompanhamento de profissionais da área da saúde, serviço
social, e outras formações, possibilitando ao dependente químico em tratamento:
 Sujeição a exame médico clínico;
 Aprendizado sobre a dependência de substâncias;
 Aprendizado sobre percepção e manejo da fissura, e prevenção à recaídas;
 (Re)aprendizado de valores significativos à saúde e qualidade de vida;
 Elaboração de um projeto de vida para o período;
 Encaminhamentos a serviços complementares;
 Disponibilidade de uma equipe interdisciplinar;
4. O tratamento psicossocial de dependentes químicos em CT
No que consiste, então, o tratamento oferecido a dependentes químicos pelas
comunidades terapêuticas? Uma relação de “boas práticas” pode ser observada na realidade
brasileira, revelando uma diversidade que pode ser mais ou menos aplicada segundo os
recursos econômicos e de pessoal disponíveis em cada CT:
4.1 Espiritualidade
Religião, religiosidade e espiritualidade são frequentemente utilizados como
sinônimos 12. A compreensão destes termos neste artigo, leva em conta as seguintes
definições:
Religião: um sistema organizado de crenças, práticas, rituais e símbolos designados a
facilitar a aproximação ao sagrado ou transcendente (Deus ou poder superior);
Espiritualidade: busca pessoal pelo entendimento de respostas a questões
sobre a vida, seu significado e relações com o sagrado e transcendente, que
pode ou não estar relacionada a propostas de uma determinada religião;
Religiosidade: crença e prática dos fundamentos propostos por uma religião.
A observação prática no Brasil, através de filiações de CTs junto a federações como a
FEBRACT, FETEB, CRUZ AZUL e FENNOCT
13
, permite afirmar que a espiritualidade
12
SANCHES, Z.V.D.M. As Práticas Religiosas Atuando na Recuperação de Dependentes de Drogas: A Experiência
de Grupos Católicos, Evangélicos e Espíritas. Tese de doutorado. São Paulo, 2006. p. 29. Disponível em:
«http://www.hoje.org.br/site/arq/artigos/tese_zila_PhD.pdf». Acesso em 21.09.11.
13
FEBRACT – Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas (de orientação católica); FETEB –
Federação de Comunidades Evangélicas do Brasil (de orientação evangélica); Cruz Azul no Brasil
mais frequente nestes contextos é uma espiritualidade religiosa. As CTs não são uma
religião sob pena de perder sua vocação. O que se observa, são entidades religiosas,
confessionais, operando como fundadoras e/ou mantenedoras que viabilizam a
existência das CTs. Assim, estuda-se e divulga-se a Bíblia nas CTs(coleção de livros
sagrados, divididos em dois “testamentos” o velho e o novo), como registro e
fundamento histórico da fé cristocêntrica, Deixando-se ao dependente químico em
tratamento a opção de frequentar ou não qualquer igreja cristã no pós-tratamento.
Rebuscando novamente a história, o grupo de Oxford na Inglaterra não estudava a
Bíblia especificamente “para recuperar dependentes do álcool”, mas para resgatar
valores que a igreja havia perdido. Dependentes do álcool, porém, frequentavam
esses estudos bíblicos, conquistando sobriedade. Com o tempo, uma assistência a
dependentes de drogas em geral foi tomando formas como atualmente se observa,
mantendo-se a pregação da “Palavra de Deus”.
Destacam-se, a seguir, algumas características da teologia judaico-cristã na
articulação da fé com a realidade humana, cuja contribuição opera na restauração de
vidas afetadas pelas drogas:
a. Visão de mundo e de homem
A teologia judaico-cristã permite-se refletir a cosmovisão criacionista, tendo
Deus como origem e fim de todas as coisas; o conceito antropológico de ser
humano e sentido de sua existência.
A compreensão de ser humano pela teologia judaico-cristã 14 não obedece uma
visão “di” ou tricotômica de corpo, alma, espírito, mas a integração desses
elementos, fundidos como pessoa, incluídas suas relações sociais. Sendo a
dependência química uma doença que atinge o homem em sua integralidade, se
não tratam, as CTs deveriam tratar o dependente de substâncias como pessoa,
isto é, não um espírito sem corpo, ou uma alma sem corpo ou outros arranjos
possíveis. Até porque saúde também é um conceito holístico. Analogicamente, a
visão antropológica judaico-cristã não descarta quaisquer ciências como saberes
que podem contribuir na recuperação do ser humano; mesmo porque não existe
um saber que, sozinho, dê conta da dependência de substâncias.
(organização cristã, não confessional); FENNOCT – Federação Norte e Nordeste das Comunidades
Terapêuticas (de orientação católica).
14
KIVITZ, E.R. Imago Dei in: Vivendo com Propósitos. A Resposta Cristã para o Sentido da Vida. São
Paulo: Ed. Mundo Cristão, 2003.
Nesse entendimento, o homem traz em si a imago Dei - o espírito que é capaz
de sintonizar-se com o Espírito que o criou, prerrogativa singular do ser humano
quando comparado a qualquer outro ser ou realidade criada. Por consequência,
o ser humano tem o privilégio de carregar a imagem de Deus em si; a alta
responsabilidade de poder distinguir o certo do errado 15; e o relacionar-se com
seu Criador e com outros seres humanos. No entanto, a imago Dei no ser
humano é apenas o que restou de uma comunhão originalmente perfeita entre
o Criador e sua criatura. A teologia judaico-cristã nomeia de “pecado” o
elemento que afasta o homem de Deus, compreendendo-o não somente como
status, mas também como um estado de ser, com consequentes
comportamentos. Ser pecador, portanto, se constitui o principal problema do
homem diante de Deus. Por isso, a transposição do abismo que afasta o homem
de seu Criador é condição primeira à recuperação de uma relação harmônica
com a realidade divina, sendo a recuperação da dependência química, apenas
uma
das
consequências.
Na
teologia
judaico-cristã,
o
esforço
de
restabelecimento da comunhão entre Criador e criatura se dá a partir de Deus,
em direção ao homem, exigindo deste último, tão somente um ato de fé na
Imago Dei humanizada em Jesus Cristo. Em Cristo sintetizam-se “poder da
palavra” e “palavra de poder”, pois visava não só a cura unidimensional
psicofísica, mas espiritual dos que o procuravam 16. Portanto, diante de Deus,
rigorosamente todos – dependentes químicos ou não – são iguais, aproximando
e localizando as pessoas atuantes no tratamento em um mesmo plano. Se, por
um lado, todos são indignos da Graça de Deus, por outro, todos podem, pela
mesma Graça, ter reconstituída sua dignidade de ser humano, com sentido,
propósitos e jeito de Deus. O pecador, em toda a sua dimensão, pode nascer de
novo, iniciar de novo. Desta feita, porém, sintonizado com Deus, encontrando
sentido eterno para sua existência a partir do aqui-e-agora, buscando e
deixando alinhar-se com Jesus Cristo, o Imago Dei perfeito.
b. A prática do amor incondicional
Na teologia judaico-cristã a prática do amor incondicional é uma expressão
daqueles que experimentaram, pela fé, o amor de Deus. O Velho e o Novo
Testamento se unem no mandamento: “Ame o Senhor, seu Deus, com todo o
coração, com toda a alma e com toda a mente” ... e, “Ame os outros como você
15
16
BÍBLIA SAGRADA, Carta de Paulo aos Romanos 1.18-21 e 2.14-16.
Ver BÍBLIA SAGRADA, Evangelho de Mateus 9.1-7 “A cura de um paralítico”.
ama a si mesmo. 17“ Prestar socorro a necessidades de qualquer ser humano é
também uma forma de anunciar o amor de Deus a este. O amor incondicional
divino propicia a prestação de socorro, acolhimento, inclusão, nova
oportunidade direcionadas ao fraco, oprimido e/ou excluído (como o
dependente de substâncias). O amor de Deus é a força mobilizadora de ações
em prol da criação e manutenção de comunidades terapêuticas. Essas ações
podem acontecer a partir de iniciativas individuais ou coletivas;
c. O estudo da bíblia e a oração como formas de “dialogar com Deus”
De um lado, através das Bíblia, Deus revela a si mesmo e a sua vontade para
com o mundo e para com o ser humano. A Bíblia, composta por 66 livros escritos
em diversos estilos literários, apresenta respostas para as perguntas existenciais
do ser humano; aponta para uma vida saudável e abundante segundo
orientações e normas; estipula regras de relacionamento com Deus e regras de
convivência social. A Bíblia incute a lei estigmatizante do “dever ser”, mas, em
contraposição, oferece a graça do “poder ser”; estimula a reflexão sobre o
passado, e o momento atual como delineador do futuro, inclusive pós-morte. As
muitas histórias de pessoas que andaram ou não com Deus, relatadas na Bíblia,
oferecem material didático à aprendizagem espiritual, tanto quanto sóciohistórica. A conversão a Deus é entendida como um ato divino, particular e
único, de abrangência cognitiva profunda, com mudança radical de paradigmas,
sagrado, propícia ao dependente químico que deve zerar completamente com o
estilo de vida aditivo. Tais mudanças implicam, principalmente, em mudança de
referenciais, valores, hábitos, ambientes e companhias. A conversão, para ser
genuína, não pode ser imposta; deve ser o resultado de uma introspecção e
resposta ao convite divino de arrependimento, de oferta de perdão e
possibilidade de construção de um novo projeto de vida.
Do outro lado, através da oração, o ser humano reage a essas questões
transcendentes. A oração pode ser individual, como compartilhada por duas ou
mais pessoas. A oração que conta com a participação de mais pessoas evidencia
acolhimento, afeto, sentimento de pertença, partilhar de preocupações e
igualdade na condição de pedintes. Ela também pode ser intercessória,
deslocando o foco para terceiros. De qualquer maneira, ela é relacional. Através
da oração, o adorador de Deus libera suas tensões emocionais, expressa sua dor,
17
BÍBLIA SAGRADA, Mateus 22.36-40
seus medos, sua angústia, verbaliza seus sentimentos, se organiza
cognitivamente, se prepara a priori ao enfrentamento de problemas e conta,
pela fé, com o auxílio de Deus, em uma relação de dependência filial. A oração
filial com o Pai difere de um monólogo vazio, sem sentido, ou de vãs repetições.
Ela é criativa, gera novas formas de pensar e de enfrentar dificuldades. A oração
também requer silêncio. É falar e estar com Deus. Não existe mais o abismo
outrora existente entre Deus e seu adorador. Observa-se que o ato de orar baixa
a ansiedade, apazigua, renova o ânimo, cria empatia e une as pessoas,
fortalecendo o vínculo com Deus.
d) Reinserção social
A prática da espiritualidade judaico-cristã também representa um elemento póstratamento muito importante. Ela viabiliza a prevenção de recaídas e de
reinserção social do dependente de drogas. A prática da espiritualidade judaicocristã (re)iniciada na CT pode ter continuidade fora dela, por existir uma rede
muito grande de igrejas cristãs à disposição na sociedade. A proposta
psicossocial das CTs nada mais é do que a replicação de um ambiente social
familiar integrado em um ambiente social maior – a sociedade. Esta sociedade
abarca um sem-número de grupos, incluídos os de cunho religioso. Assim, o
apoio de pares recebido na comunidade terapêutica é substituído por pares que,
no caso, seguem a tradição de fé judaico-cristã. De modo geral, as igrejas cristãs
também representam um ambiente relativamente livre de álcool e drogas, e
mantêm mecanismos de entrada aos diversos subgrupos que organiza. Esses
grupos abarcam não só o dependente químico, mas também sua família,
possibilitando apoio ao grupo familiar como um todo.
Concluindo, há que se ressaltar que blá blá blá espiritual tira o poder da palavra. Por
isso, não ser hipócrita representa um desafio permanente àqueles que desejam
seguir os preceitos de Jesus Cristo, dentro ou fora de uma CT, seja no papel de
cuidadores, quanto de cuidados. A postura honesta de um cristão que reconhece
suas falhas, esforçando-se em vir-a-ser a imago Dei em Cristo, o diferencia de
charlatanismos.
4.2 Atividades práticas
As comunidades terapêuticas adotam um sistema de participação do dependente de
substâncias em tratamento na realização de tarefas cotidianas, geralmente
domésticas, ou ligadas à produção de horta ou fruticultura, criação de animais de
pequeno porte, jardinagem, oficinas, artesanato, entre outras. Alguns argumentos
em favor destas atividades práticas podem ser:
Atividades físicas e intelectuais trazem ao ser humano um ritmo e desenvolvimento.
Fatores como ordem, regularidade e disciplina podem trazer equilíbrio à saúde física
e psíquica, uma vez que não sejam superestimadas as forças e habilidades
individuais. Realização de tarefas retribui com sentimentos de satisfação seja através
de movimentos motores ou pelo alcance de resultados almejados, ou através de
ambos.
Realização de tarefas possibilita contato com pessoas e coisas; pode
estimular o sentimento de pertença, responsabilidade mútua, o desenvolvimento de
autoestima e de autonomia. Labor exige descanso e lazer - outro desafio ao
dependente de substâncias em conseguir preencher tal tempo sem o uso de drogas e
que deve ser objeto de ensino-aprendizagem na atenção psicossocial inter e extra CT.
A teoria e prática de Grupos Operativos 18 auxilia na organização e desenvolvimento
na realização de tarefas, transcendendo sua aplicabilidade para contextos sóciofamiliares. Os conceitos que Grupos Operativos abordam são, entre outros, trabalho
em equipe, responsabilidade, pontualidade e comunicação. Atividades práticas
proporcionam oportunidades ao surgimento de material terapêutico a ser tratado de
modo grupal e/ou personalizado. Se o dependente de substâncias em tratamento
queixar-se por “pagar para trabalhar”, possivelmente a equipe profissional não está
consciente da importância das atividades práticas nos aspectos terapêuticos e não o
comunica suficientemente para ele; ou o dependente em tratamento, por algum
motivo, não compreendeu ainda o papel das atividades físicas e intelectuais na
recuperação.
4.3 O apoio de pares
Uma definição possível para “rede de apoio social” pode ser definida como um
“conjunto de sistemas e de pessoas significativas que compõem os elos de
relacionamentos recebidos e percebidos pelo indivíduo”
18
19
. Relacionamentos
BERSTEIN, M. Contribuições de Pichón-Rivière à psicoterapia de grupo. In: OSÓRIO, L.C. Grupoterapia
Hoje. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986.
19
SIQUEIRA, A.C.; BETTS, M.K.; DELL´AGLIO, D.D. A Rede de Apoio Social e Afetivo de Adolescentes
Institucionalizados no Sul do Brasil. Revista Interamericana de Psicologia/Interamerican Journal of
humanos significativos possuem um componente afetivo que auxilia no
enfrentamento de situações que apresentem riscos. O apoio social, segundo alguns
autores, funciona como fator de adaptação a situações estressantes. Seus efeitos são
percebidos como protetivos, desenvolvendo capacidades de enfrentamento de
adversidades, adaptabilidade e resiliência. Ora, a família é o lugar onde o ser humano
nasce, se desenvolve, mas também se complica. O ambiente das CTs passa a ser um
importante aliado de apoio social para o dependente químico, uma vez que, na
maioria dos casos, os vínculos familiares e outros ainda existentes se encontram
fragilizados. A CT, por modo semelhante à família, oferece acolhimento e relações
sociais, e com uma vantagem: não se encontra contagiada, nem afetada pelo
desgaste dos relacionamentos. Por um tempo determinado, colaboradores e pares
na CT desempenharão o papel de “filho”, “esposa”, “mãe” e “pai” do dependente de
substâncias em tratamento, pois o modo como este lidava com as pessoas próximas
a ele, repetir-se-á na CT. Porém, o feedback deste “outro”, destes novos
interlocutores, em um novo espaço, soará de um modo diferenciado ao ciclo vicioso
instalado na família de origem. O intenso convívio humano na CT replica a realidade
pelo conjunto diferenciado dos indivíduos que nela convivem. A vivência próxima
neste ambiente estimula o surgimento de rico material terapêutico, oportunizando
desequilíbrios para novos aprendizados de relacionar-se assertivamente. Os efeitos
dessa proximidade humana podem ser intrigantes. Discussões, diferentes pontos de
vista, diferentes idades, diferentes culturas, “aquecem”, frequentemente, o clima
vivencial - ingredientes necessários ao laboratório de resolução de conflitos, com o
detalhe de não utilização de quaisquer substâncias para “auxiliar” no processo.
A influência que os pares podem exercer uns sobre os outros também encontra
respaldo nas teorias de aprendizagem. É muito comum que dependentes de
substâncias que passaram pelo tratamento exerçam papel de colaborador nas CTs.
Excluídos os casos de institucionalização ou cronificação de internados, à luz do qual
cada CT deve julgar seus reais motivos em utilizar-se dessa mão-de-obra, verdade é
que a ação destes pode mostrar-se bastante efetiva. “Alunos que ensinam outros
alunos” 20é um arranjo de ensino-aprendizagem utilizado em escolas públicas para
atender necessidades particulares do corpo discente, por não contar com recursos
Psycology. n. 2, v. 40, 2006. p. 149-158. Disponível em: «
http://www.psicorip.org/Resumos/PerP/RIP/RIP036a0/RIP04017.pdf». Acessado em 14.09.11.
20
NOGUEIRA FINO, C. Vygotsky e a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP): três implicações
pedagógicas. Revista Porguesa de Educação, v.14, n. 2, p.273-291. Disponível em
«www3.uma.pt/carlosfino/publicacoes/11.pdf». Acesso em 21.09.11
financeiros suficientes para contratar um corpo docente necessário. Pode-se
denominar esse recurso de ensino horizontal como um processo de ensinoaprendizagem mediado por pares. Um segundo argumento a favor da atividade
desenvolvida por dependentes de substâncias mais aptos em favor dos menos aptos
durante o tratamento são as teorias sócio-construtivista de aprendizagem e
aprendizagem mediada. Essas teorias creditam o desenvolvimento de habilidades
internas e reguladoras de controle próprio à participação do aprendiz em atividades
mediadas por outro ser humano. Ganhos cognitivos nos referidos processos de
interação, acontecem em ambos: pelo par mais apto e pelo par menos apto.
4.4 Regulamento Interno
A vida social de pares em comunidade terapêutica é regida por um regulamento. Sua
contribuição
terapêutica
consiste
em
desenvolver
novamente
hábitos
regulamentadores da vida cotidiana particular e social. Pretende introduzir
novamente hábitos que primem pela regularidade sono-vigilância, assunção de
compromissos, respeito mútuo, servir e deixar-se servir, ordem, agendas, garantia de
um ambiente livre de álcool/drogas, entre outros. O Regulamento Interno auxilia na
(re)organização interna do dependente de substâncias; (re)introduz a lei e seus
benefícios; condiciona o comportamento pela aplicação de conseqüências.
4.5 Abstinência
A abstinência do uso de drogas é condição básica para o tratamento e pretendida
cura. O sistema nervoso central (SNC) apreende e registra em memórias através de
sinapses neuroquímicas. Substâncias psicoativas encontram seus receptores
exatamente entre os neurônios e neurotransmissores – ambiente essencial para que
ocorra aprendizagem. Sem sinapses não há aprendizagem; o SNC pouco ou nada
aprende sob efeito de drogas, comprometendo todo o método de ensino-processo
de recuperação e manutenção de abstinência pelo uso (ainda que moderado) de
qualquer droga, lícita ou ilícita. Para dar suporte ao dependente em abstinência,
algumas CTs se utilizam de medicamentos prescritos pela medicina. A medicação
auxilia no manejo da fissura, na baixa da ansiedade, na adesão ao programa de
tratamento, sem contar sua ação no controle de dores e tratamento de
comorbidades.
4.6 Tempo
Contrapondo o mundo imediatista e mágico das drogas, a atenção psicossocial em CT
exige outro importante aliado nos processos de ensino-aprendizagem: o tempo. Não
apenas o transcorrer de um tempo calendário - cultura frequentemente observável
que credita a reabilitação à passagem do tempo. Nas CTs, esse tempo varia entre três
e doze meses. Um tempo em que a CT se permite oferecer sua proposta de
tratamento; um tempo para conhecer as particularidades e necessidades do
indivíduo e viabilizar a articulação teórico-prática. A recuperação do equilíbrio
mental, a localização espaço-temporal, o levantamento de prejuízos decorrentes da
vida aditiva, a terapia individual e familiar, a construção de um projeto de vida, a
reinserção sócio-profissional, prevenção de recaídas, requerem tempo para serem
elaborados. Preencher esse tempo construtivamente requer uma equipe
interdisciplinar treinada e paciente, centrada primordialmente no processo de
tratamento, sendo o resultado desejado uma consequência.
Eventualmente, não alcançadas aptidões necessárias para o dependente de
substâncias retornar ao seu domicílio de origem, a migração para uma proposta de
reinserção sócio-profissional focada pode ser oferecida. O programa de reinserção
social deve atender objetivos estabelecidos, resistindo à tentação de, simplesmente,
acrescentar mais um período calendário ao final do prazo proposto para o
tratamento.
O tempo de tratamento pode, ainda, ser dividido em fases. Fases estas, porém,
vinculadas ao alcance dos objetivos propostos por parte do dependente em
tratamento em conjunto com sua família e com a equipe profissional da CT. Para a
análise de alcance de objetivos, consensualmente, devem ser realizadas avaliações
intermediárias durante o tempo de tratamento. Tais avaliações devem ter seu
conteúdo conhecido desde cedo pelo dependente em tratamento, para que saiba
efetivamente objetivos e itens que deve esforçar-se em alcançar.
4.7 Outros métodos terapêuticos
Uma série de métodos ainda faz parte do repertório de abordagens psicossociais em
uma comunidade terapêutica: aconselhamentos individuais; feedback; terapias de
grupo; terapias com familiares; o acompanhamento médico/medicamentoso;
palestras e reuniões sócio-educativas; as oficinas lúdicas e de artesanato; aulas de
música e de teatro; cursos profissionalizantes de curta duração; ensino formal;
esporte e lazer; interações sócio-comunitárias; filmes; entre outros.
5. Conclusão
Em suma, o tratamento psicossocial em CT é permeado pela palavra e seu poder.
A palavra, como bisturi, intervém e fere, denuncia e abre; mas também sutura;
A palavra pode desanimar, mas também animar;
Pode provocar, atiçar, mas também consolar, acalmar e curar.
A palavra pode derrubar, mas também edificar;
Condenar, mas também anunciar o perdão;
A palavra possibilita o anúncio de boas-novas, esperança e sentido para a existência
humana.
Pode criar; criar novas oportunidades, novos aprendizados, novos caminhos, sabedoria.
Pela palavra, Deus criou o mundo; em Jesus Cristo, a Imago Dei se tornou Palavra;
Experimentada, a Palavra torna-se força concreta para mobilizar uma pessoa em toda a
sua dimensão e concretude.

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