Monografia - Ideias e Música

Transcrição

Monografia - Ideias e Música
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
CENTRO DE HUMANIDADES
CURSO DE MÚSICA
KAMILA RODRIGUES SERPA
INTERFACE E INTERAÇÃO MUSICAL:
O homem e a máquina na técnica circuit-bending
FORTALEZA – CEARÁ
2014
KAMILA RODRIGUES SERPA
INTERFACE E INTERAÇÃO MUSICAL:
O homem e a máquina na técnica circuit-bending
Monografia apresentada à Coordenação do Curso de
Licenciatura em Música do Centro de Humanidades
da Universidade Estadual do Ceará, como requisito
parcial para obtenção do título de Licenciada em
Música.
Orientador: Prof. Dr. Ewelter de Siqueira e Rocha.
FORTALEZA – CEARÁ
2014
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
Universidade Estadual do Ceará
Sistema de Bibliotecas
SERPA, Kamila Rodrigues.
INTERFACE E INTERAÇÂO MUSICAL: O homem e a
máquina na técnica circuit-bending [recurso
eletrônico] / Kamila Rodrigues SERPA. - 2014.
1 CD-ROM: il.; 4 ¾ pol.
CD-ROM contendo o arquivo no formato PDF do
trabalho acadêmico com 77 folhas, acondicionado em
caixa de DVD Slim (19 x 14 cm x 7 mm).
Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) Universidade Estadual do Ceará¡, Centro de
Humanidades, Graduação em Música, Fortaleza, 2014.
Orientação: Prof. Dr. Ewelter de Siqueira e
Rocha.
1. Interação musical. 2. Interface. 3. Circuit-
bending. I. Título.
KAMILA RODRIGUES SERPA
INTERFACE E INTERAÇÃO MUSICAL:
O homem e a máquina na técnica circuit-bending
Monografia apresentada à Coordenação do Curso de
Licenciatura em Música do Centro de Humanidades
da Universidade Estadual do Ceará, como requisito
parcial para obtenção do título de Licenciada em
Música.
Orientador: Prof. Dr. Ewelter de Siqueira e Rocha.
Aprovada em: ____/____/______.
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________
Prof. Dr. Ewelter de Siqueira e Rocha (Orientador)
Universidade Estadual do Ceará – UECE
________________________________________________
Prof. Ms. Pablo Garcia da Costa
Universidade Estadual do Ceará – UECE
________________________________________________
Prof. Ms. Paulo Tadeu Sampaio de Oliveira
Universidade Estadual do Ceará – UECE
Dedico a Luiza Ferreira da Silva, minha avó materna,
que me presenteou com a sua presença por vinte e três
anos. Em 25 de janeiro de 2012 ela se foi, mas o meu
grande afeto é presente e em breve, alegremente, nos
encontraremos.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por me dar fôlego de vida, condições diversas de realização deste curso, razão
de existência e vontade de viver. Agradeço pelo seu grandioso amor, que existe, apesar
de mim.
A minha mãe e amiga, Cezarina Rodrigues, que tanto torce por mim, pela minha
realização e vibra pelas mais singelas conquistas da minha vida. Grande amor tenho
por ela.
A minha família que progressivamente se adaptou à escolha deste curso e me amparou
em todos os momentos. Meu pai Murilo Serpa e meu irmão Murilo Júnior, eu os amo.
Aos meus amigos de curso, que dividiram tantos momentos de desânimo e entusiasmo,
que compartilharam alegrias, empregos, realizações, dificuldades, enfim. Torço por
todos eles!
Ao meu orientador Ewelter Rocha, que me incentivou desde o início deste trabalho,
acreditou que ele seria possível, e teve muita longanimidade diante de vários meses
que se decorreram até o seu fim. Agradeço por ter acreditado, me orientado e me dado
seu voto de confiança!
Aos meus professores de curso que fizeram e fazem parte da minha formação humana,
musical e profissional. Heriberto Porto, Luciana Gifoni, Nelma Dahas, Elídia Aguiar,
Angélica Ellery, Inez Martins, Lu Basile, Marcos Maia, Alfredo Barros obrigada pela
confiança, pela partilha de conhecimentos, e experiências.
A Inez Martins, por ter confiado a mim, durante dois anos, a bolsa de Iniciação
Científica IC/UECE com a qual aprendi muitíssimo, e pela sua longanimidade e apoio
acadêmicos.
Percebi que colocando as primeiras coisas em
primeiro lugar, teremos as segundas a seguir, mas
colocando as segundas em primeiro, perdemos ambas.
Tudo que não é eterno é eternamente inútil. Pois se a
esperança que se tem fosse apenas nessa vida, não
houvesse nada além, nenhum sonho pra sonhar, que
esperança mais perdida!
C. S. Lewis
RESUMO
Este trabalho aborda a interação existente entre músicos e instrumentos eletrônicos, e tem
como foco a prática do circuit-bending, procedimento em que a interação com o instrumento
se dá desde a sua criação até o momento da performance. Inicialmente contextualizamos
historicamente o surgimento de instrumentos eletrônicos e discutimos a noção de interação
musical e de interface como meio de interação. Em seguida, caracterizamos os instrumentos
eletrônicos e digitais, fazendo um paralelo com instrumentos mecânicos tradicionais e
também apresentando os seus componentes de formação (interface, sistema de geração sonora
e mapeamento), para isso, apontamos algumas metodologias de classificação de instrumentos
eletrônicos. Posteriormente caracterizamos a atividade de luteria intitulada circuit-bending, a
qual consiste na alteração de circuitos encontrados em dispositivos eletrônicos, criando curtos
circuitos de forma exploratória a fim de encontrar sons “interessantes”. Nesta prática, além de
alterar circuitos eletrônicos pré-existentes, o artista pode optar pela confecção do instrumento
por inteiro, cabendo-lhe a soldagem de cada componente. Finalmente, apresentamos o
processo de construção de três instrumentos eletrônicos e, partindo do conceito de “obraprocesso” de Cesar Aira, listamos os passos e dificuldades encontradas, os resultados sonoros,
a escolha dos meios de interação, caracterizamos os seus componentes de formação, e, por
fim, classificamos os instrumentos a partir das metodologias apresentadas anteriormente.
Palavras-chave: Interação musical. Interface. Circuit-bending.
ABSTRACT
This research approaches the interaction between musicians and electronic instruments,
focusing on the circuit-bending practice, in which the interaction with the instrument appears
from its inception to the performance time. First of all, we need to contextualize historically
the appearance of electronic instruments and to discuss the notion of musical interaction and
interface as a mean of interaction. Then, we describe the electronic and digital instruments,
making a comparison with the mechanical and traditional ones and showing their composition
(interface, sound generation system and mapping), for that we point some electronic
instruments classification methodologies. After, we describe the lutherie activity named
circuit-bending, which consists in changing circuits found in electronic devices, generating
short circuits in an exploratory way in order to find “interesting” sounds. In this practice,
besides changing preexisting electronic circuits, the artist can choose the making of the
instrument in its entirety, since the welding of each component. Finally, we show the
construction process of three electronic instruments, and following Cesar Aira's “workprocess” concept, we list the steps and obstacles that were found, the sound results, the choice
of the means of interaction, we describe the composition and lastly, we classify the
instruments, following the methodologies above.
Key words: Musical interaction. Interface. Circuit-bending.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Telharmonium...................................................................................................................20
Figura 2 - Leon Theremin (como ficou popularmente conhecido) tocando seu instrumento ................21
Figura 3 - Ondes martenot.................................................................................................................22
Figura 4 - Hammond B-3 ..................................................................................................................22
Figura 5 - John Lord, tecladista da banda Deep Purple, tocando Hammond........................................23
Figura 6 - John Lennon em 1965. The Beatles utilizam o instrumento pela primeira vez na música
“Tomorrow Never Knows”, presente no álbum “Revolver”. ..............................................................23
Figura 7 - Mellotron ..........................................................................................................................24
Figura 8 - Reed Ghazala. ...................................................................................................................28
Figura 9 - Modelo estrutural tripartite de um IMD (PATRÍCIO. 2010, p. 17). ....................................37
Figura 10 - "Nos instrumentos tradicionais, o sistema de geração sonora e a interface que controla esse
sistema formam uma unidade". (IAZZETTA. 1998, p. 116). ..............................................................38
Figura 11 "Um instrumento eletrônico é um gerador universal de sons, um meta-instrumento ao qual
se acopla uma interface”. (IAZZETTA. 1998, p. 117)........................................................................38
Figura 12 - Representação da captação MIDI em guitarras e guitarra com captação MIDI (captador
hexafônico para guitarra GK-3 da Roland). .......................................................................................40
Figura 133 - Eletroímãs sobre as cordas de um piano preparado eletromagneticamente. Os ímãs são
controlados por um patch de Max/MSP e podem fazer com que as cordas do piano ressonem em
diferentes frequências (BLOLAND, 2007, p. 125-126). Max/MSP é um software, um ambiente gráfico
interativo para música, processamento de áudio e multimídia. ...........................................................41
Figura 14 - Controlador MIDI Yamaha WM5 ...................................................................................41
Figura 15 - Guitarra controladora MIDI, Z7-S e Z6S-XPA, ambas produzidas pela Starr Labs...........42
Figura 16 - Representação gráfica do Silent drum e ao lado o seu criador Jaime Oliver em performance
.........................................................................................................................................................42
Figura 17 - Dan Trueman tocando o BoSSA ......................................................................................43
Figura 18 - Audio Shaker ..................................................................................................................44
Figura 19 - Yamaha Disklavier e a direita Celleto de Chris Chafe que funcionam como instrumentos
acústicos ao mesmo tempo em que geram informação digital (MIDI). Outro exemplo é o Trumpet
MIDI System; de Dexter Morril. .......................................................................................................45
Figura 20 - WX11Yamaha, que simula o funcionamento de um instrumento mecânico, o saxofone. ..45
Figura 21 - “Buchla Lightning consiste de dois bastões que contém transmissores de luz infravermelha
cuja posição no espaço pode ser registrada por uma unidade colocada à distância” (Iazzetta, 1997b, p.
5). .....................................................................................................................................................46
Figura 22 - Max/MSP, linguagem de programação desenvolvida e mantida pela Cycling '74. Exemplo
de interface gráfica. ...........................................................................................................................47
Figura 23 - Exemplo comparativo de hipotéticos mapeamentos em um instrumento acústico e em um
IMD. (Patrício, 2010, p. 26) ..............................................................................................................49
Figura 24 - Estratégias de mapeamento explícito (PATRÍCIO, 2010, p. 27). ......................................50
Figura 25 – Em seu sítio DIY, Benderella disponibiliza vários vídeos acerca da construção de circuitos
alterados ...........................................................................................................................................54
Figura 26 - Circuito do Cracklebox ...................................................................................................56
Figura 27 - Montagem do circuito em protoboard (placa de ensaio) ..................................................57
Figura 28 - Montagem dos componentes em placa de fenolite ...........................................................57
Figura 29 - Projeto de configuração do recipiente que receberá o circuito ..........................................58
Figura 30 - Preparação do recipiente (caixa de mdf). Ao lado o circuito soldado em placa de fenolite 58
Figura 31 - Soldagem dos percevejos utilizados como superfícies de contato e do led ........................59
Figura 32 - Cracklebox......................................................................................................................59
Figura 33 - Interface Cracklebox produzida durante a pesquisa. .........................................................59
Figura 34 - Diagrama confeccionado durante a presente pesquisa representando o circuito do
Oscilador onda quadrada a duas vozes .............................................................................................60
Figura 35 - Circuito do oscilador montado em protoboard (placa de ensaio) ......................................61
Figura 36 - Inserção dos componentes em placa de fenolite ...............................................................61
Figura 37 - Circuito no lado esquerdo da imagem e a preparação do recipiente (saboneteira) para
recebê-lo ...........................................................................................................................................62
Figura 38 - Encaixe do circuito no recipiente .....................................................................................62
Figura 39 - Saída de áudio fixada na parte inferior, chave liga/desliga e dois potenciômetros na tampa
.........................................................................................................................................................63
Figura 40 - Interface Oscilador onda quadrada a duas vozes produzida durante esta pesquisa ...........63
Figura 41 - Desenho do circuito do Pulso na oficina Circuit-bending ministrada por Cristiano Rosa ..64
Figura 42 - Desenho confeccionado durante a presente pesquisa representando o circuito da interface
Pulso ................................................................................................................................................65
Figura 43 - Após realizar as soldas necessárias o circuito foi inicialmente armazenado em uma
pequena caixa de papelão ..................................................................................................................65
Figura 44 - Inserção dos componentes em outro recipiente ................................................................66
Figura 45 - Interface Pulso ................................................................................................................66
Figura 46 - Interface Pulso. ...............................................................................................................67
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 13
2 INTERAÇÃO MUSICAL .................................................................................... 15
2.1 Contexto histórico ................................................................................................ 17
2.2 Interação musical ................................................................................................. 29
2.3 Interface ............................................................................................................... 33
3 INSTRUMENTOS MUSICAIS INTERATIVOS/INTERFACES...................... 35
3.1 Instrumentos mecânicos tradicionais .................................................................... 35
3.2 Instrumentos musicais digitais/eletrônicos ........................................................... 36
3.2.1 Interface/dispositivo de entrada ......................................................................... 39
3.2.2 Sistema de Geração Sonora ............................................................................... 47
3.2.3 Mapeamento ..................................................................................................... 49
4 A INTERAÇÃO PRESENTE NA TÉCNICA DO CIRCUIT-BENDING .......... 51
4.1 Sobre a interação no circuit-bending .................................................................... 53
4.2 Construindo interfaces: relato de três experiências ............................................... 55
4.2.1 Cracklebox ........................................................................................................ 55
4.2.2 Oscilador Onda Quadrada a Duas Vozes.......................................................... 60
4.2.3 Pulso ................................................................................................................. 63
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................ 68
REFERÊNCIAS....................................................................................................... 70
ANEXO A – Roteiro do DVD anexo......................................................................... 75
ANEXO B – Regras de hacking de Nicolas Collins ................................................... 76
13
1 INTRODUÇÃO
Na atividade musical o ser humano é capaz de interagir com o instrumento, com
outros músicos tocando em conjunto, ou mesmo com o público. Sobretudo a partir do
desenvolvimento tecnológico ocorrido em meados do século XX, com o surgimento da
música eletrônica e eletroacústica, surgem novos meios de interação que envolvem músicos,
instrumentos musicais tradicionais e dispositivos eletrônicos.
Na década de 60 o americano Reed Ghazala inicia uma busca pela descoberta de
sons “interessantes” a partir da alteração eletrônica de equipamentos eletrônicos de baixa
voltagem, como brinquedos musicais. Essa metodologia de luteria experimental recebeu o
nome Circuit-bending, por intermédio da qual o artista, partindo da experimentação, constrói
o seu instrumento, executa a performance musical e cria sonoridades, interagindo de formas
diversas com o instrumento que foi alterado.
O presente trabalho tem como objetivo investigar os meios de interação que
relaciona músicos e instrumentos eletrônicos, tendo como foco a metodologia de luteria
intitulada circuit-bending que se insere na música contemporânea e experimental. A escolha
desta metodologia se deu pelo fato de considerarmos contínuo o processo de interação entre
músico e instrumento desde a construção do mesmo até o momento da performance. O
contato e a simpatia pelo tema tiveram início através de uma oficina realizada no ano de 2011
no Museu da Imagem e do Som na cidade de Fortaleza (CE), ministrada por Cristiano Rosa,
um dos maiores responsáveis pela proliferação do circuit-bending no Brasil. Nesta oficina
alguns dispositivos eletrônicos foram alterados, como minigames, aparelhos de rádio e
brinquedos eletrônicos, e, sobretudo, foram construídos novos dispositivos desde a soldagem
de seus componentes. Entre estes instrumentos construídos podemos citar o oscilador onda
quadrada, o qual produz uma onda sonora quadrada que pode ter a frequência regulada por
um potenciômetro ou sensor de luz, por exemplo. Foram obtidos nesta oficina os desenhos
dos circuitos das interfaces pulso e oscilador onda quadrada a duas vozes que foram
construídas para o presente trabalho. Esta experiência obtida durante a oficina foi
compartilhada posteriormente com outros alunos da Universidade Estadual do Ceará
fortalecendo a apreciação e a pesquisa sobre o tema.
Iniciaremos esta reflexão contextualizando historicamente a criação de
instrumentos eletrônicos apontando as formas de interação que estes disponibilizam. São
discutidas as noções de interação musical e de interface como os meios pelos quais se
processam a relação homem-máquina, ampliando a visão acerca dos instrumentos musicais,
14
tradicionais ou não, pelo fato de estes intermediarem a ação do intérprete e o resultado sonoro
obtido.
Posteriormente são pontuados os meios de interação, fazendo um paralelo entre
instrumentos mecânicos tradicionais, que têm características relacionadas ao retorno sonoro,
como a conformação física, os materiais empregados e o modo de acionamento; e
instrumentos eletrônicos e digitais que são relativamente desvinculados desta materialidade.
Em seguida, são apresentados componentes de formação de um instrumento musical
eletrônico ou digital, a saber, a interface, o sistema de geração sonora e as estratégias de
mapeamento, assim como são apresentadas diferentes metodologias de classificação de
instrumentos eletrônicos.
Por fim é caracterizada a metodologia do circuit-bending e são abordadas as
questões de interação nos processos de criação da interface. Como apontado por Patrício
(2010) ao desenvolver o conceito de obra-processo de César Aira, neste trabalho
consideramos como atividade interativa o processo de construção, compreendendo-o como
parte da obra, assim como o momento da performance. Além da reflexão teórica
empreendemos neste trabalho uma aplicação experimental, na qual realizamos a construção
de três interfaces, tratando dos processos de construção de circuitos eletrônicos simples,
detalhando quais foram os passos e que dificuldades foram encontradas. São abordados os
resultados sonoros, o processo de experimentação e a escolha dos meios de interação
disponibilizados pelas interfaces. Realizamos também a classificação das interfaces
produzidas de acordo com as propostas de classificação mencionadas no terceiro capítulo
deste trabalho.
15
2 INTERAÇÃO MUSICAL
Nas últimas décadas do século XX o termo interação tem ganhado destaque,
sobretudo nas áreas ligadas à informática. Este fato é impulsionado pelas novas relações entre
homem e máquina, oriundas dos avanços tecnológicos. Candello mencionando McLuhan
comenta que “as novas tecnologias (...) são abordadas como agentes modificadores da
sociedade, que se consideradas extensões do indivíduo geram mudanças em seu próprio
comportamento” (CANDELLO, 2004, p. 1).
São muitos os produtos da interação presentes no nosso cotidiano, como o
telefone celular, o videogame ou até mesmo o controle remoto. Estes podem funcionar de
maneira eficaz ou trazer problemas relacionados à usabilidade ou ergonomia, por exemplo.
Nesse sentido são realizados estudos voltados não somente para a perspectiva da explicação,
mas também do design de interação. O design investiga o uso dos meios de interação através
de abordagens centradas no ser humano. Preocupa-se com a qualidade de interação que o
agente de interação pode oferecer, apresentando características como eficiência, ergonomia,
funcionalidade e agradabilidade (PREECE, 2005). Sobre isto afirma Iazzetta (1998, p.1): “De
fato, o design de sistemas de interação entre homens e máquinas consiste hoje em um largo
campo de estudo envolvendo o trabalho de pesquisadores de diversas áreas”.
Numa situação de interação entre homem e máquina, o homem age no
comportamento da máquina, e esta, por sua vez, responde de modo não completamente
controlado, isso demanda do homem respostas que não podem ser totalmente previsíveis
(PATRÍCIO, 2010). Acerca da interação entre homem e computador afirma Dobrian 1 (2004,
p.1 apud PATRÍCIO, 2010, p. 35):
Se um computador, a partir de um algoritmo programado, responde
instantaneamente ao som ou aos gestos de um intérprete, isso não é necessariamente
um exemplo de música computacional “interativa”. O programa está reagindo à
entrada de uma forma pré-determinada. Só pode-se presumir o computador como
agindo autonomamente se ele for programado para tomar algumas decisões por si
próprio que não forem completamente previstas pelo algoritmo. Isso implica a
inclusão de alguns elementos de imprevisibilidade.
1
DOBRIAN, Christopher. Strategies for continuous pitch and amplitude tracking in realtime interactive
improvisation software. In: Proceedings of the 2004 Sound and Music Computing Conference (SMC04), Paris,
2004.
16
De acordo com Gluck 2 (2007 apud PATRÍCIO, 2010, p.33) a tecnologia responde
aos gestos humanos de uma forma que não é previsível ao intérprete, cujos gestos podem ser
entendidos, mas não completamente previstos pela tecnologia. Na música, a relação com a
tecnologia possibilitou a criação de novos timbres, processos de gravação e reprodução, quase
sempre valorizando o som em detrimento do gesto que o produz. Essa alteração da ideia de
gesto se dá pela quebra do vínculo entre o gesto físico do músico e o som produzido por ele.
Os objetos tecnológicos alcançaram de várias formas os diversos gêneros
musicais, seja na utilização de efeitos (reverb, delay), em performances ou em gravações. A
tecnologia está ligada ao surgimento de gêneros musicais possíveis somente com a utilização
de equipamentos eletrônicos ou digitais, como a música eletrônica popularizada pelos DJ’s
(disk-jockeys) e a música computacional. A relação entre os participantes do fazer musical foi
alterada, através de novas formas de comunicação que envolve compositores, intérpretes,
instrumentos, público, e demais envolvidos na produção de uma obra. Para melhor
compreensão das relações de interação na música que utilizam instrumentos eletrônicos e
digitais, neste capítulo abordaremos os principais eventos que permearam o desenvolvimento
dos meios de interação musical, desenvolveremos ainda o conceito de interação e a ideia de
interface como mediadora da interação. Entendemos música com características interativas a
música:
que emprega técnicas de criação musical capazes de, através da utilização de
sistemas eletrônicos e digitais, gerar dados (computacionais, visuais, sonoros, dentre
outros) em tempo real, que interfiram de alguma forma ativa no resultado expressivo
de uma apresentação musical (MISKALO, 2009).
Tradicionalmente a performance é tida como a apresentação musical do intérprete.
Até o final do século XIX apenas através da performance é que se poderia ouvir o fazer
musical, mas com o surgimento da gravação essa situação foi alterada. A escuta passou a ser
possibilitada pela vibração de alto-falantes. Na música eletroacústica interativa aspectos como
o virtuosismo, a técnica e precisão do intérprete cedem lugar ao experimentalismo. O
intérprete passa a tomar decisões na obra musical considerando que instrumentos eletrônicos
ou digitais podem subverter a relação de causalidade entre gesto e resultado sonoro. “Um
pequeno gesto pode disparar um som de grande intensidade e uma ação muito curta pode
resultar numa cadeia sonora de longa duração” (IAZZETTA, 2011). Nesse contexto a
performance é vista de modo amplo, como uma apresentação musical que considera vários
2
GLUCK, Robert. “Live electronic music performance: innovations and opportunities”. Tav+, Music, Arts,
Society magazine. Outono, 2007.
17
níveis de interação entre os agentes envolvidos na realização de uma obra, sendo músicos,
intérpretes não músicos, público, equipamentos eletrônicos, sistemas digitais, fatores
ambientais, dentre outros.
2.1 Contexto histórico
No século XX a relação entre música e tecnologia se torna mais intensa e estreita,
isso acontece pelo fácil acesso à energia elétrica e pela ampliação do conhecimento acerca de
aspectos físicos e cognitivos do som, pela aplicação de tecnologias eletrônica e digital na
geração sonora, dentre outros fatores (IAZZETTA, 1997b). Anteriormente o som utilizado
musicalmente era fruto de um mesmo processo, o processo mecânico, pois o som era
produzido através da vibração de algum material elástico (corda, palheta, pele). Com o
surgimento de novas tecnologias foi possibilitada a geração sonora sem a utilização de
instrumentos mecânicos. Para Daniel Gohn (2012) o desenvolvimento tecnológico influencia
as formas de vivenciar a música, entendendo que “nenhuma invenção tecnológica é
completamente neutra, pois a existência de um novo artefato (...) sempre provoca mudanças
de pensamento e novas visões de mundo” (GOHN, 2012, p. 1).
A história dos instrumentos eletrônicos se relaciona com as inovações
tecnológicas aplicadas na música. Uma dessas inovações foi o advento da eletricidade, a
tentativa da sua utilização para a criação e controle dos sons tem registros do século XVIII. A
partir de relatos escritos no ano de 1753, sabe-se da criação do Dennis D’or pelo teólogo
checo Václav Prokop Divis, dispositivo que utilizava arames eletrificados como sensores que
controlavam os parâmetros do som gerado em tempo real (FORNARI, 2012). Em 1759 foi
criado o Clavecin Electrique pelo francês Jean-Baptiste de La Borde. Tratava-se de um
teclado que utilizava cargas eletrostáticas para fazer com que pequenas lâminas metálicas se
chocassem com sinos. Foi desenvolvido em 1874 o Musical Telegraph pelo americano Elisha
Gray. Neste instrumento, circuitos elétricos auto-oscilantes controlavam lâminas de aço que
vibravam e produziam sons (MORAES, R. 2007). Seus sons poderiam ser transmitidos via
telefone e eram controlados por um teclado de piano. Posteriormente foi incorporado um
rústico alto-falante ao instrumento.
Uma conquista muito importante ocorrida no século XIX foi a transdução de
ondas sonoras para energia elétrica. O telefone configurou-se como um dos primeiros
equipamentos capazes de implantar o processo de transdução. O telefone alterou a relação do
ser humano com o som pelo fato de, além de transmitir o som à distância, proporcionar a
18
audição do som sem a visibilidade da sua fonte geradora. Essa atitude é chamada por Pierre
Schaeffer de “escuta acusmática”, na qual ouve-se o som sem que seja identificada a sua
origem. “O microfone e o alto-falante, cujas funções consistem em transformar o som em
eletricidade e a eletricidade em som, configuram a tecnologia da transdução” (ARANGO,
2005, p. 25).
Em 1877 foi inventado o fonógrafo por Thomas Edison, primeiro aparelho capaz
de gravar e reproduzir sons. Dez anos depois, o alemão Emil Berliner cria o gramofone,
aparelho capaz de gravar e reproduzir sons fixando-os em um disco. O surgimento de
equipamentos como o microfone, o fonógrafo e a fita magnética voltou a atenção do trabalho
com o material sonoro para o registro, que trata dos meios de gravação e reprodução do som.
A gravação alterou o modo de audição de música, até então o contato com a
música era um acontecimento único, que se dava através da performance, ou seja, da
apresentação musical do intérprete. O ouvinte passou a dissociar a realização musical ao vivo
da audição musical, a forte relação entre som e a imagem que acompanha a sua produção foi
enfraquecida.
O ouvinte, mesmo que não envolvido diretamente com a produção sonora,
participava da realização musical ao reconstruir internamente, não apenas
seqüências de notas produzidas pelos instrumentos musicais ou as estruturas formais
da composição, mas todo o universo gestual que os acompanha, pois a música era
fruto dos corpos que a produzem e era impossível, para o ouvinte, ficar alheio à
presença desses corpos. (IAZZETTA, 1997a).
No final do século XIX começou o processo de desenvolvimento do rádio 3. Em
1888 o professor alemão Rudolf Heinrich Hertz descobre a existência das ondas
eletromagnéticas. Gugliemo Marconi em 1895 desenvolve a transmissão da eletricidade
através das ondas de rádio, ou ondas hertzianas. O rádio foi um equipamento utilizado
pioneiramente na Primeira Guerra Mundial, posteriormente foi tratado como meio de
comunicação massiva 4 . Na segunda década do século XX o americano Frank Conrad é
responsável pelas transmissões dos primeiros programas de rádio. Foi utilizado como recurso
político, educativo, jornalístico e sobretudo voltado para o entretenimento, criando vínculo
com a indústria fonográfica e se tornando importante meio de difusão musical. A
popularização do rádio disseminou a escuta acusmática e tornou comum a audição de música
3
Em alguns documentos consta a afirmação que, no Brasil, o padre gaúcho Roberto Lendell de Moura, teria
conseguido transmitir sons através de ondas radiais alguns anos antes. Almeida, B. Hamilton, O outro lado das
telecomunicações: a saga do padre Landell. Porto Alegre: Sulina, 1983.
4
O russo David Sarnoff, funcionário da Marconi Telegraph and Signal Company, a primeira companhia a
comercializar a radiotelegrafia, foi pioneiro ao prever a característica de entretenimento do rádio como meio de
comunicação massiva em 1916. (ARANGO, 2005, p. 27).
19
que, aos poucos, desprende-se da unicidade das apresentações em palcos. Vale ressaltar que
os meios de registro sonoro (gravação e reprodução) possibilitam o conhecimento do
repertório musical de outras culturas e outros períodos históricos, dado que este contato se
dava apenas por meio da partitura.
O advento da eletricidade e as novas descobertas no campo da acústica
continuaram atingindo a construção de instrumentos musicais. No entanto, as primeiras
descobertas, no que tange aos instrumentos musicais eletrônicos, não tiveram suporte
financeiro considerável, o que fez com que estes instrumentos fossem agregados aos
processos musicais apenas na segunda metade do século XX. Surgem deste percurso as bases
da luteria eletrônica5.
O desafio consistiu em gerar o som por meio de osciladores elétricos, não por meios
mecânicos. As primeiras tentativas de construir instrumentos musicais eletrônicos
não tiveram o impulso comercial que sustentou a fabricação dos aparelhos de
registro e transmissão. O processo foi mais lento e menos uniforme. (ARANGO,
2005, p.37).
Em 1896 foi patenteado um importante precursor do sintetizador, o
Telharmonium, conhecido também como Dynamophone. Trata-se de um instrumento
eletromecânico 6 desenvolvido por Thaddeus Cahill, constituído por dínamos motores, ou
rodas fônicas7 que ao girar produzem ondas senoidais. Seu primeiro modelo datado de 1901
pesava 7 toneladas e utilizava 35 dínamos 8. Apesar de ser um instrumento gerador de sons
eletrônicos o Thelarmonium era aplicado na difusão, pois foi criado com o objetivo de emitir
seus sons através do telefone. A constatação de que o Thelarmonium interferia na
comunicação militar levou o instrumento ao desuso.
5
O termo luteria eletrônica provém da palavra francesa “luthier” e é utilizada por alguns estudiosos em
referência à técnica de criação de instrumentos eletrônicos. Na música interativa o compositor, por vezes, passa a
incorporar essa técnica nas suas atividades de criação.
6
Instrumentos eletromecânicos são os que combinam produção sonora mecânica com manipulação e/ou emissão
eletrônica. “Davies distingue três categorias: instrumentos eletrônicos, nos quais o som é produzido por um ou
vários osciladores analógicos ou numéricos; os eletromecânicos, nos quais a forma de onda é inscrita numa
banda móvel ou sobre discos rotatórios; e os eletroacústicos, nos quais o movimento vibratório de um artefato é
isolado e amplificado por um microfone especialmente desenhado para tal tarefa” (ARANGO, J. 2005, p. 35).
7
As rodas fônicas consistem em discos dentados que giram movidos por um motor de corrente alternada
síncrono. Cada disco está associado a um ímã e uma bobina, gera uma frequência específica. Cada dente ao
passar pela bobina produz uma variação de corrente que gera, assim, um sinal oscilante (MORAES, 2007).
8
Synthmuseum.com - Thaddeus Cahill's Teleharmonium. Disponível em:
<http://www.synthmuseum.com/magazine/0102jw.html>. Acesso em:16 ago. 2013.
20
Figura 1 - Telharmonium9
Em 1917 o russo Lev Sergeyevich Termen construiu um instrumento que chamou
de Aetherophone (RATTON, 2001). Em 1920 este instrumento foi patenteado como
Theremin, sua ação consiste de dois osciladores ultra-sônicos e uma caixa que contém um
alto-falante e duas antenas que geram um campo magnético. A antena a esquerda do intérprete
tinha a configuração de um arco metálico e a direita a outra antena se portava como uma barra
vertical.
Seu funcionamento era baseado no princípio heterodino, ou seja, o batimento de
duas freqüências gerando uma terceira. No caso deste instrumento, a sobreposição
de duas freqüências altas, na faixa ultra-sônica, uma delas variável, recebida por um
rádio-receptor, e outra fixa, gerada no próprio rádio-receptor, produzia uma
freqüência mais baixa, na faixa audível. (MORAES, R. 2007).
O destaque deste instrumento estava no sistema de controle de geração sonora que
se dá através do movimento das mãos do intérprete. O controle da intensidade se dá de acordo
com a distância da mão esquerda à antena em forma de aro, e altura do som é controlada pela
distância da mão direita à antena vertical.
9
Disponível em: http://en.wikipedia.org/wiki/Telharmonium. Acesso em: jul. 2014.
21
Figura 2 - Leon Theremin (como ficou popularmente conhecido) tocando seu instrumento
Leon Theremin apresentou seu instrumento a Lênin, que ordenou a construção de
600 unidades para distribuição dentro da União Soviética. Após este fato passou a transitar
pela Europa divulgando o Theremin, visitando cidades como Berlim, Londres, Frankfurt e
Paris. Em 1927 chega a Nova York onde, em parceria com a Radio Corporation of America
(RCA), comercializou o equipamento para todo o país. Variações foram produzidas como o
Terpistone (voltado para a interação com dançarinos), o Rhythmicon, o Theremin de teclado e
o Theremin-violoncelo.
O theremin produz som monofônico e contínuo, apresenta ausência de ataque e
relaxamento e possui timbre fixo. As características do som produzido e a forma de interação
inédita proporcionada pelo theremin chamaram a atenção de músicos até os dias atuais, além
de mostrar-se um pioneiro no estudo de novas formas de interface. Este instrumento atraiu
intérpretes virtuosos, cabendo ressaltar a russa Clara Rockmore e foi utilizado na música
popular, como na música “Good vibrations” de Beach Boys, gravada em 1966 ou na
performance da música “Whole Lotta Love” de Led Zeppellin.
Em 1928 foi criado por Maurice Martenot, o Ondes Martenot, um instrumento
controlado por teclado ou por um anel de metal a deslizar na frente do teclado. Ele é capaz de
alterar o seu timbre através de chaves e, por ter uma interface familiar a pianistas e tecladistas,
foi bem aceito entre os músicos e utilizado tanto em concertos quanto na música popular 10.
10
O compositor francês André Jolivet compõe em 1947 o “Concerto per Ondes Martenot e orchestra”. A banda
Radiohead utiliza o Ondes Martenot na música “The National Anthem”, faixa do álbum “Kid A” gravado em
2000.
22
Algumas obras criadas originalmente para theremin foram adaptadas para o Ondes Martenot,
por exemplo, a peça Ecuatorial de Edgar Varèse.
Figura 3 - Ondes martenot
Posteriormente foi idealizado o órgão Hammond, utilizando o princípio de
geração sonora semelhante ao Telharmonium, as rodas fônicas. Em 1935 o estadunidense
Laurens Hammond lança o primeiro modelo do instrumento que “(...) se tornou o primeiro
instrumento musical eletrônico a estar inserido em um conceito mercadológico de produção”
(MORAES, 2007, p.9).
Figura 4 - Hammond B-3
Era constituído por dois teclados sobrepostos e uma pedaleira. Os sons eram
produzidos por 61 rodas, enquanto outras 30 geravam os harmônicos, e o timbre era alterado
conforme a regulagem de harmônicos que eram somados ao som. Na década de 1960 o
Hammond se populariza entre grupos de pop, além de ser utilizado em estilos diversos, no
23
rock (Deep Purple; Uriah Heep; Emerson, Lake & Palmer), jazz (Jimmy Smith) e na música
brasileira (Walter Wanderley, Djalma Ferreira).
Figura 5 - John Lord, tecladista da banda Deep Purple, tocando Hammond.
Em meados da década de 1960 o americano Harry Chamberlin desenvolve um
equipamento que utilizava fita magnética com o objetivo de reproduzir sons de outros
instrumentos. Tratava-se de um teclado que utilizava fitas de 3/8” com gravações de
instrumentos variados, no entanto, por imperfeições na sua construção, muitas fitas eram
estragadas em seu interior. Seu aperfeiçoamento mecânico foi alcançado através da venda da
patente para a empresa britânica Bradmatic, desse modo o instrumento passou a ser chamado
Mellotron, e se tornou popular em grupos de rock progressivo e psicodélico da década de
1960 e 1970 (MORAES, 2007). Foi utilizado por The Beatles na faixa Strawberry Fields
Forever, pela banda francesa Air e outras como King Crimson, Oasis, Pearl Jam 11.
Figura 6 - John Lennon em 1965. The Beatles utilizam o instrumento pela primeira vez na música “Tomorrow
Never Knows”, presente no álbum “Revolver”.
11
A banda Pearl Jam utiliza o mellotron no álbum “Riot Act”. Este instrumento também é utilizado nas músicas
“Starless” do grupo King Crimson e “Watcher of the Skies” da banda Genesis.
24
Figura 7 - Mellotron
Gradativamente a música incorporou recursos eletrônicos, sobretudo os processos
de registro sonoro (gravação e reprodução) foram responsáveis por importantes alterações na
relação com o trabalho musical, visto que ocasionaram “a formalização social da música por
meio da indústria fonográfica e o deslocamento dos hábitos de escuta e apreciação musical”
(ARANGO, 2005, p. 51). A gravação e a manipulação de sons gravados em fita magnética
foram fundamentais características de uma precursora da música interativa, a música
eletroacústica. Em 1948, no estúdio francês ORTF (Office de Radiodiffusion-Télévision
Française), Pierre Schaeffer compõe cinco estudos manipulando sons pré-gravados
diretamente de seu suporte físico. Esse acontecimento é tido como marco inicial da música
eletroacústica. O compositor lidava com gravações de origens diversas registradas em fitas
magnéticas que eram cortadas e coladas em estúdio para a confecção da obra musical.
Schaeffer utilizava sons concretos pré-gravados em oposição à abstração sonora
proporcionada pelo sistema de notação musical tradicional (TAYLOR, 2001, p. 45). Desse
modo, em 1951, Schaeffer utiliza o termo “música concreta” para esta prática musical, que
tinha como forte pressuposto transformar qualquer som em um som musical, propondo um
novo tipo de escuta.
No mesmo período Meyer-Eppler, Herbert Eimert e Robert Beyer criaram o
estúdio da Rádio de Colônia, situado na Alemanha. Eles também utilizavam técnicas de
gravação e montagem, no entanto exploravam apenas sons de origem eletrônica gravados em
25
fitas magnéticas. Esta foi batizada “música eletrônica”. Rapidamente foram criadas obras
musicais anexando as duas técnicas, desse modo o termo “música eletroacústica” passou a ser
utilizado para designar a produção musical que envolve sons sintéticos e sons acústicos prégravados (MISKALO, 2011).
O contínuo acesso da luteria musical à eletrônica traz a utilização de circuitos
eletrônicos para a síntese 12 de sons. Entre os primeiros equipamentos voltados para a síntese
cito o RCA Mark II Sound Synthesizer, criado por Harry Olson e Herbert Belar em 1959 na
Universidade de Columbia-Princeton; e o DIMI (Digital Music Instrument) criado pelo
finlandês Erkki Kurenniemi. Entretanto, foi a partir dos sintetizadores Buchla e Moog que
pode-se observar a incorporação mais presente de sintetizadores na música popular.
Em 1963, na Califórnia, Donald Buchla construiu seu primeiro sintetizador em
parceria com o estúdio San Francisco Tape Music Center (MORAES, R. 2007). O Buchla
Synthesisers utilizou um sistema modular que funcionava com osciladores controlados por
voltagem (Voltage Controlled Oscillators – VCO), e um painel de controle de informações
musicais como altura e timbre. O primeiro Buchla era controlado por 16 pads sensíveis ao
toque que poderiam emitir sons programados ou simular um teclado convencional a partir da
escala cromática13.
Em 1964, cidade de Nova York (EUA), Robert Moog cria um sintetizador
analógico que apresenta características mais próximas a um instrumento tradicional. O
sintetizador Moog era um instrumento monofônico controlado por teclado. O usuário
dispunha de um painel onde poderia alterar timbres diversificando a conexão entre os
módulos, ou através de chaves e potenciômetros que permitem o ajuste sonoro em tempo
real.14
A partir da década de 1970 a construção de diversos pianos eletrônicos e
sintetizadores obteve interesse comercial. Empresas como Roland, Korg e Yamaha lançam
seus primeiros modelos de sintetizadores. E empresas como a Curtis Electromusic (CEM) e a
Solid State Microtechnology (SSM) se voltam para o desenvolvimento da tecnologia utilizada
por estes sintetizadores, os circuitos integrados.
12
Por síntese, entendemos qualquer tipo de trabalho de geração de sons complexos a partir das componentes
harmônicas fundamentais. A síntese, em nossos dias, tem diversos procedimentos (aditiva, subtrativa, freqüência
modulada, amplitude modulada, moldagem da onda, granulação, entre outras). (ARANGO, J. 2005, p. 55).
13
Dados disponíveis em: <http://www.ufrgs.br/mvs/Periodo03.html>. Acesso em: 02 jun., 2013.
14
Em 22 de maio de 2012 a empresa Google disponibilizou um aplicativo simulador de um sintetizador Moog
para experimentação básica e lúdica dos recursos de um sintetizador. Disponível em:
<http://www.google.com/doodles/robert-moogs-78th-birthday>. Acesso em: jul. 2012)
26
O primeiro sintetizador totalmente digital foi o Synclavier, que foi comercializado
a partir de 1976. Na década seguinte foram utilizados microprocessadores na fabricação de
muitos sintetizadores e instrumentos eletrônicos, o que possibilitou a geração digital dos sons.
No ano de 1978 é produzido o Prophet 5, o primeiro sintetizador polifônico programável,
com capacidade para reproduzir polifonia de até cinco vozes e armazenar até 30
programações de timbre. Esse advento foi possível com a utilização de microprocessadores
integrados ao seu sistema de funcionamento.
Figura 8 - Prophet 5
Na década de 1980 foi desenvolvido por grandes empresas um protocolo de
comunicação entre sistemas sonoros musicais, o protocolo MIDI 15 (Musical Instrument
Digital Interface). “Com este protocolo tornou-se possível estabelecer um canal de
comunicação entre diversos sistemas sonoros digitais, como o sintetizador, o processador de
efeitos, ou o computador” (MISKALO, 2009, p.19).
Na década de 1990, com o barateamento dos microcomputadores e com a
melhoria na sua capacidade de processamento, surgiram aplicações voltadas para o
processamento de áudio. Surgiram os sintetizadores virtuais, programas com capacidade de
processamento de dados e áudio em tempo real como Max-MSP e o Pure Data.
David Jaffe e Andrew Schloss (1994) notam que houve dois modelos básicos de
combinação de meios eletrônicos e instrumentistas ou cantores na música eletroacústica. O
15
Criado em 1983, MIDI é um protocolo padrão da indústria musical que permite que instrumentos musicais
eletrônicos (sintetizadores, baterias eletrônicas), computadores e outros equipamentos eletrônicos (controladores
MIDI, placas de som, samplers) se comuniquem e sincronizem-se uns com os outros. Ao contrário dos
dispositivos analógicos, o protocolo MIDI não transmite sinais de áudio, ele envia mensagens sobre a notação
musical, altura, e intensidade, sinais de controle para parâmetros como vibrato, volume e panorama, pistas e
sinais para definir o tempo. Disponível em: <www.ufrgs.br/mvs/Periodo05-1983-MIDI_NEW.html>. Acesso
em: 20 jun., 2013.
27
primeiro modelo diz respeito à gravação da parte eletroacústica em fita magnética, no qual os
intérpretes tem de sincronizar sua performance, adequando o ritmo, dinâmica e qualidade de
som aos parâmetros de reprodução da fita magnética. Esta combinação tem a fita como um
regente que conduz de forma rígida a performance e isto trouxe certa insatisfação para
compositores e intérpretes. A criação de obras que agregavam as possibilidades da música
mecânica instrumental e sons eletroacústicos, iniciada no fim da década de 50, foi chamada
“música mista” (MISKALO, 2011). Intérpretes se percebiam expressivamente limitados pela
necessidade de acompanhar cronologicamente o material pré-gravado em fita magnética. O
fato de a mobilidade da interpretação humana deter-se na imutabilidade ou rigidez do registro
sonoro resulta em incentivo ao desenvolvimento de ferramentas interativas.
O tempo de uma gravação em fita magnética não é o tempo psicológico, e sim o
tempo cronológico; por outro lado, o tempo de um intérprete – um regente ou um
instrumentista – é psicológico e é praticamente impossível interconectar os dois
(BOULEZ16 apud MISKALO, 2009).
O segundo modelo consta da utilização do teclado eletrônico e sintetizadores,
derivados da expansão da tecnologia MIDI. Aqui o instrumentista não é mais conduzido pelos
meios eletrônicos, mas controla totalmente a produção do som, enquanto “o elemento
eletrônico é relegado ao papel de produção de som e nada mais” (JAFFE E SCHLOSS, 1994).
Sobre isso comenta Iazzetta (1998, p. 2):
Esse modelo baseado na utilização de teclados com funções de sintetizadores e
samplers oferece ao intérprete um controle muito superior ao que é possível na
performance com fita pré-gravada, mas o controle das ações está restrito pelas
habilidades do músico, pelas limitações do protocolo MIDI, e pelas possibilidades
oferecidas pelo aparato gerador de sons eletrônicos.
Além destas formas iniciais de interação apontadas por David Jaffe e Andrew
Schloss (1994), compositores prosseguiram buscando estratégias para a apresentação de
música eletrônica ao vivo. O compositor Gordon Mumma 17 (1975, apud PATRÍCIO, 2010)
aponta cinco estratégias: a reprodução de partes gravadas em fitas magnéticas de forma
simultânea a utilização de instrumentos acústicos (música mista); o uso da fita magnética sem
referências a música tradicional; a adaptação de técnicas de estúdio para utilização em tempo
real; a utilização de dispositivos eletrônicos, vinculados ou não a instrumentos acústicos e o
uso de computadores digitais como ferramentas de composição e síntese.
16
BOULEZ, Pierre. Dialogue de L'Ombre Double. Viena: Universal (1 partitura). 1985.
MUMMA, Gordon. Live-electronic music. In: APLETON, Jon H. PERERA, Ronald C. (ed.). The
development and practice of electronic music. Englewood Cliffs: Prentice-Hall, 1975.
17
28
Em 1992 o americano estadunidense chamado Qubais Reed Ghazala cria o termo
“circuit-bending” para a revista Experimental Music Instrument (GHAZALA, 2005, p. 12).
Refere-se a “um processo eletrônico de auto descoberta e incrivelmente simples de criação de
instrumentos musicais experimentais de circuitos de áudio pré-existentes” 18 (GHAZALA,
tradução nossa), são dispositivos eletrônicos que funcionam em tempo real. Trata-se da
modificação ou criação de circuitos eletrônicos alimentados por baixa tensão (baterias, pilhas)
para a criação de novos instrumentos e descoberta de sons atípicos. Podendo ser apontados
como precursores John Cage, que chamou atenção para o ruído e para o silêncio nas suas
obras, como a obra 4’33 composta em 1952, na qual os músicos não produzem sons, no
entanto os sons do ambiente são ouvidos pelo público. Vale ressaltar também o movimento do
Futurismo Italiano, que teve início na primeira década do século XX, o qual o artista Luigi
Russolo escreveu o manifesto The Art of Noises e construiu instrumentos geradores de ruído
(FERNANDEZ, 2013, p. 14).
Figura 8 - Reed Ghazala.
Já no final do século XX, com o desenvolvimento das tecnologias digitais que
possibilitaram o controle em tempo real de dispositivos eletrônicos, surgiu o interesse por
diversos pesquisadores em explorar a interação entre instrumentos acústicos e equipamentos
eletrônicos na performance. A prática musical denominada “live electronics” passou a ser
utilizada para denominar obras nas quais o intérprete interage com estas tecnologias. Nesse
contexto encontra-se a obra “Mikrophonie I” de Karlheinz Stockhausen para 2 microfones,
tam-tam, 2 filtros com potenciômetros e 6 intérpretes.
As novas tecnologias trouxeram consigo discussões e formas distintas de agir e
pensar (CANDELLO, 2004). O desenvolvimento tecnológico provoca situações inovadoras
18
GHAZALA. Website mantido por Reed Ghazala. Disponível em : <http://www.anti-theory.com/bio/>. Acesso
em: 10 ago. 2013.
29
de relacionamento com as máquinas, dentre elas destaca-se o computador como importante
meio de interação na sociedade atual. No entanto observa-se que a interação com os
computadores tem se tornado cada vez mais diferenciada da interação do homem com outras
máquinas. Iazzetta (1996) levanta algumas justificativas para este fato. Primeiro, as máquinas
geralmente desempenham papéis definidos, tem uma função específica, enquanto o
computador destina-se a solucionar problemas de vários âmbitos. Segundo, “as máquinas não
trazem a possibilidade de modificar seu comportamento” (IAZZETTA, 1996, p. 99), no
entanto o computador é uma máquina configurável, capaz de se adaptar a distintas funções
através de variados softwares.
E, terceiro, a maioria das máquinas realiza tarefas bem
definidas, elas atendem a comandos específicos, já o computador por lidar com situações
diversas precisa ter flexibilidade de comunicação com o usuário.
A proliferação do uso de computadores em diversos setores atribuiu complexidade
a este nível de comunicação, desse modo, trouxe importância para o estudo da interação entre
pessoas e computadores. Áreas ligadas à informática tiveram a capacidade de aprofundar o
estudo de processos interativos, no entanto diversas áreas do conhecimento buscam ampliar a
compreensão de processos de interação entre homens e máquinas.
A idéia de interação é particularmente importante para a modelização de sistemas
biológicos, nos estudos ligados à organização social, ou para compreensão de
modelos comunicacionais. De fato, o design de sistemas de interação entre homens e
máquinas consiste hoje em um largo campo de estudo envolvendo o trabalho de
pesquisadores de diversas áreas, entre elas, psicologia, engenharia, ciência da
computação e medicina. (IAZZETTA, 1998, p. 2).
2.2 Interação musical
No início do século XX, com o surgimento dos processos de gravação e
reprodução de áudio, inicia-se o desligamento da música de sua fase artesanal de produção,
fundamentada na composição e performance. Até então, pode-se conceber a música como
uma atividade predominantemente coletiva, pois a apresentação individual de um músico é
recente, tendo em vista a extensão cronológica da história musical. Segundo Iazzetta (1998, p.
2) “a música sempre foi dependente de pelo menos dois níveis de interação”, a saber, a
interação entre os integrantes de um mesmo grupo, tratando-se de um grupo de amigos que
praticam música por lazer, de uma banda popular, ou de uma orquestra sinfônica na qual o
nível de interação entre os membros está intrinsecamente ligado ao bom desempenho do
grupo. O autor aponta também a interação do músico com o seu instrumento, justificando-a
pelo fato de cada instrumento permitir um determinado grau de controle na geração sonora.
30
O instrumento musical coloca-se entre a composição e a escuta assumindo o papel
de mediador da performance (IAZZETTA, 2005). De acordo com o autor a estrutura da
música ocidental torna-se mais elaborada conforme o crescimento do domínio dos
instrumentos musicais e das técnicas de produção sonora. Afirma ainda que a produção
musical está ligada ao funcionamento do instrumento (IAZZETTA, 1998). A linguagem
musical é fundamentada na possibilidade de produção de sons e é a través do instrumento que
se pode controlar essa produção. Daí a importância em estudar a relação entre homem e
instrumento musical.
Existem também outras formas de interação, a saber, a interpretação, apontada por
Figueiró (2008) como o nível de interação entre performer e obra. O autor ainda aponta a
complexidade da interatividade na relação do ouvinte com a obra considerando que esta
“depende de outros fatores como o meio pelo qual está sendo transmitida a obra, a bagagem
cultural e o nível de percepção cognitiva do ouvinte” (FIGUEIRÓ, 2008, p. 2).
Os instrumentos eletrônicos e computadores acrescentaram novas formas de
comunicação entre os agentes do fazer musical, passaram a interferir na performance musical,
não apenas respondendo de modo previsível aos comandos do intérprete. Para Iazzetta (1994)
o computador possibilitou ao homem a intervenção nas diversas fases da produção musical, o
que ameniza a separação aguda entre as funções de compositor, intérprete e ouvinte. Tornouse necessário o desenvolvimento de um processo de comunicação entre homem e máquina, no
qual a máquina deixa de ser um recurso de prolongamento de aptidões motoras, sendo capaz
de interferir na performance, de ser agente cognitivo no processo musical.
De acordo com o dicionário Aurélio, interação é a “ação que se exerce
mutuamente entre duas ou mais coisas, ou duas ou mais pessoas, etc.”. Já o dicionário
Houaiss define interação como “influência mútua de órgãos ou organismos interrelacionados” ou “intervenção e controle, feitos pelo usuário, do curso das atividades num
programa de computador, num CD-ROM etc.” (Houaiss, 2009). Nos dois verbetes interação é
entendida como uma “ação entre” agentes. A interação se dá em forma de comunicação
recíproca, pressupondo a existência de um ou mais canais de comunicação que permitem que
a comunicação ocorra em dois sentidos (COCHARRO, 2012). Podemos ter um diálogo como
exemplo de forma de interação entre duas pessoas, no entanto se apenas um entre eles é o
falante, a situação deixa de ser um diálogo e passa a ser um discurso, um monólogo. Desse
modo, a interação entre os agentes fica debilitada pelo fato de só haver comunicação em um
sentido.
31
A interação é “um processo de semiose que não é unidirecional, mas pode ocorrer
virtualmente a partir de qualquer um dos agentes envolvidos” (IAZZETTA, 1996, p. 118).
Compreende-se por semiose o processo de produção de significado, desse modo um signo,
que representa algo, age sobre quem entra em contato com ele. Um livro, por exemplo,
representa uma porção de conhecimento e de ideias do autor que, ao entrar em contato com o
leitor, produz interpretação e provoca uma reação no leitor. Do mesmo modo a partitura
carrega ideias do compositor e provoca uma reação no intérprete no momento de sua leitura.
Dizer que este processo não é unidirecional significa que a cada mensagem recebida o
intérprete elabora uma nova resposta. O compositor transmite informações através da
partitura, o músico as assimila e responde executando de acordo com a sua interpretação.
A atenção voltada para o estudo da interação em música foi impulsionada por dois
principais fatores (IAZZETTA, 1996). O primeiro refere-se à eliminação da performance
proposta pela música eletroacústica em detrimento da interpretação. Inicialmente as obras de
música eletrônica eram produzidas em estúdio pelo compositor e por assistentes. Esse
processo aparentava um ganho qualitativo, pois a obra abandonaria as imperfeições
decorrentes de uma performance ao vivo. E, ao compositor era atribuída não somente a
criação, mas também a execução da obra, o que eliminava a sujeição da obra à visão de um
intérprete e dava total controle da mesma ao compositor. Sem intérprete, a música eletrônica
ficou, obviamente, sem interpretação, a “capacidade de reelaborar e polir as ideias do
compositor que instrumentistas e cantores desenvolveram com o apoio de uma tradição cujo
início se perde na história” (IAZZETTA, 1996). Tais compositores tiveram de admitir que a
interação é um elemento fundamental para a realização de obra artística musical. Ainda que o
estúdio eletroacústico tenha ganhado novas ferramentas de composição e geração sonora,
computadores, sintetizadores e aparelhos, notava-se a dificuldade de se obter articulações tão
complexas quanto às de um intérprete virtuoso. A ausência do intérprete fez com que fosse
notada a sua importância, não apenas pela sua capacidade técnica, mas pela compreensão
musical transmitida para a audiência através de gestos e reações ao contexto.
O segundo fator levantado por Iazzetta é o desenvolvimento do computador e suas
interfaces, dada a sua presença diante das mais diversas situações, sua multiplicação e
sofisticação de seu potencial. As primeiras experiências musicais que utilizaram o
computador datam da década de 50. Nas quais o computador era nutrido por algoritmos, que
resultavam numa longa lista de números, que deveria ser interpretada e reescrita na forma de
notação musical para então ser interpretada por um músico. O computador desempenhava a
32
função de assistente do compositor, como exemplo temos a obra Illiac Suite for String
Quartet de 1957, composta por Lejaren Hiller e Leonard Isaacson.
Posteriormente, foi possibilitada a geração digital de som através de máquinas
digitais. No início dos anos 60, nos laboratórios da Bell Telephone, em Nova Jersey (EUA),
Max Mathews desenvolve os primeiros programas voltados à síntese sonora (MUSIC III,
MUSIC IV e MUSIC V). Até hoje estes constituem a estrutura básica de funcionamento para
muitos programas de síntese. Essa estrutura compreende três fases: orchestra, score e o
resultado sonoro. A orchestra estabelece características de timbre e forma sonora do
“instrumento” através de algoritmos. O score estabelece parâmetros do instrumento sonoro
criado, como altura, amplitude e o início e término de cada som. Após esse processo acontece
a terceira fase, a compilação dos dados advindos das fases anteriores tendo como resultante a
produção sonora.
O computador, nos primeiros processos de síntese, não fornecia meios para
interação, pela distância entre a sua linguagem no código de programação e a escrita musical,
e pela impossibilidade de escuta imediata. Essa situação melhora a partir do protocolo MIDI e
da construção de computadores mais potentes e baratos, assim se desenvolve formas de
comunicação mais eficientes entre computador e usuário.
A interação é “um processo que engloba as ações do usuário sobre a interface de
um sistema, e suas interpretações sobre as respostas reveladas por esta interface”
(CANDELLO, 2004). O termo interface está relacionado àquilo que liga dois sistemas e é
entendido, na forma empregada pelo autor, como o meio pelo qual transpassam as ações do
intérprete, chamado de usuário, e as respostas produzidas por esta interface, que voltam a
interferir nas ações do intérprete.
Abordaremos aqui a ideia de interação voltada para o controle de parâmetros
sonoros a partir das ações e movimentos do músico, que se dá por intermédio de novos
instrumentos musicais e novas interfaces. Adiante este tema será retomado e desenvolvido
mais detidamente.
2.3 Interface
O homem passou a interagir com novas tecnologias a ele apresentadas e em
constante desenvolvimento, para isso passou a estudar, desenvolver e experimentar meios que
promovam essa interação. A estes meios de interação é atribuído o termo interface. A
33
interface pode ser vista como um dispositivo que interliga sistemas, como uma ferramenta de
transdução. O vocábulo transdução é utilizado na física apontando para transformação de uma
energia em uma energia de natureza diferente, aqui, a transdução adquire o sentido de
passagem ou conversão entre meios, como da dimensão humana, corporal, gestual, para o
digital ou eletrônico, ou mesmo do particular, do imaginário para o espaço social.
(...) interface é uma superfície de contato, de tradução, de articulação entre dois
espaços, duas espécies, duas ordens de realidades diferentes: de um código para
outro, do analógico para o digital, do mecânico para o humano (...). Tudo aquilo que
é tradução, transformação, passagem, é da ordem da interface. (LÉVY, 1993, p.181).
Para Dertouzos (1997, p. 85) a interface pode ser entendida como o ponto de
encontro entre o humanismo e a tecnologia. Vale ressaltar a confluência entre humanismo e
tecnologia de modo abrangente, não apenas considerando relações entre movimentos do
performer e a estrutura física da interface, os códigos de programação ou os sinais elétricos,
mas também a dimensão sensorial e cognitiva construída entre estes. Nespoli (2012), citando
Gell (1988), aponta o momento da performance que utiliza instrumentos sonoros19 como a
conversão de processos mentais em respostas no espaço coletivo. O jogo de relações entre a
imaginação do intérprete, as ações de controle maquínico e até mesmo a ocorrência do
inesperado fazem da performance artística um mecanismo sensorial e perceptivo, no qual
signos sociais transpassam o espaço mental, ou imaginário, atingindo o espaço coletivo.
(...) a idéia de máquina não se encontra aqui focada somente nas propriedades
estruturais do dispositivo técnico, mas na relação entre o dispositivo e os modos de
relação que se desdobram dos esquemas corporais, intelectuais e sensoriais que
efetivam resultados na rede social (GELL, 1988). Neste sentido, as máquinas
sonoras possuem componentes materiais, mas também componentes energéticos,
subjetivos e imaginários. (NESPOLI, 2012, p. 120).
O termo interface adquire uma série de significados diferentes. Pode-se observar
que no computador a interação homem-máquina se efetiva basicamente através das interfaces
teclado e o mouse. Do mesmo modo, a ideia de interface pode referir-se a softwares, pois
estes configuram a interação entre usuário e computador (JOHNSON, 2001) 20 . Os
instrumentos musicais, sejam estes mecânicos, digitais ou eletrônicos, configuram interfaces
diversas utilizadas pelos músicos. Para Iazzetta (1996) a interface é o meio que traduz a
informação transmitida entre agentes em interação.
19
O termo “instrumento sonoro” é utilizado pelo autor como instrumentos inerentes à arte sonora, que pode
associar processos criativos híbridos que incluem a integração entre os meios sonoro, visual, plástico, assim
como o espaço e a exploração de tecnologias (NESPOLI, 2012).
20
“A interface, em seu sentido mais simples, refere-se a softwares que dão forma à interação entre o usuário e o
computador” (JOHNSON, 2001, p. 5).
34
Interface é aquilo que conecta dois agentes ou objetos, permitindo que os mesmos se
comuniquem entre si. A função da interface é prover uma base representacional
comum aos agentes desenvolvidos de modo a gerar um espaço sígnico comum a
esses agentes. Ou seja, a interface codifica e traduz a informação a ser trocada entre
diferentes agentes. (IAZZETTA, 1996, p. 105).
Na construção de interfaces almeja-se a adaptação da interação entre homem e
máquina. A qualidade da interface está diretamente relacionada à qualidade de interação entre
os agentes participantes do processo, como por exemplo, entre usuário e computador.
35
3 INSTRUMENTOS MUSICAIS INTERATIVOS/ INTERFACES
3.1 Instrumentos mecânicos tradicionais
Na busca por qualidade sonora ou por um maior controle na produção do som, os
instrumentos mecânicos sofrem alterações tecnológicas referentes às necessidades de
produção musical de cada período histórico. Conforme Iazzetta (1998), nos instrumentos
mecânicos tradicionais o som produzido está relacionado a três características: à conformação
física, aos materiais empregados e à forma de acionamento.
A relação de conformação física se dá pelo fato de o tamanho e a forma de
instrumentos mecânicos tradicionais influenciarem na produção do som. O autor exemplifica,
recorrendo à semelhança entre violino e violoncelo, instrumentos que possuem timbres
diferenciados basicamente pela variação do tamanho entre eles. Da mesma forma o baixo
elétrico sem trastes realiza sonoridades que um baixo com trastes é incapaz de realizar, devido
a essa alteração física na sua construção.
A segunda característica aponta para os materiais que constituem os instrumentos,
dado que estes podem soar diferentemente, conforme os materiais que os constituem. Nos
instrumentos tradicionais é tão clara a relação entre o resultado sonoro e os materiais
empregados que, numa orquestra, eles são agrupados conforme este critério (instrumentos de
corda, madeira e metais).
A terceira característica apontada pelo autor é o modo de acionamento do
instrumento. Segundo Iazzetta (1998) uma característica comum dos instrumentos acústicos é
o seu acionamento através de um estímulo mecânico, pelo fato de o som estar relacionado ao
tipo de estímulo mecânico que o produz, como a fricção de um arco, o sopro, o pinçar uma
corda, o percutir, o dedilhar; por isso é utilizada a nomenclatura: instrumentos mecânicos.
Como exemplo, observemos quão diferente é a sonoridade de um instrumento de corda
friccionada quando tocado com um arco e quando utiliza a técnica de pizzicato21 , embora
possa tratar-se da vibração oriunda de uma mesma corda, os sons possuem características
singulares.
A materialidade dos instrumentos é um dos pontos principais para o agrupamento
organológico, visto que este fator se relaciona proximamente ao som produzido. Para melhor
compreensão da ideia geral de instrumento será assinalada a classificação instrumental mais
21
Pizzicato é o modo de tocar os instrumentos de corda pinçando as cordas com os dedos.
36
difundida, que é conhecida como Hornbostel-Sachs. Esta classificação foi publicada pela
primeira vez em 1914 por Eric Hornbostel e Curt Sachs e apresenta quatro grandes grupos:
idiofones, produzem som através da vibração de seu próprio corpo (clave, sino, triângulo);
membranofones, produzem som através da vibração de membranas (tambores); cordofones,
produzem som pela vibração de cordas (violão, violino); e aerofones que produzem som por
meio da passagem do ar (flauta, clarinete).
F. W. Galpin, em 1937, acrescentou a esta classificação a categoria intitulada
eletrofones. Esta abrangeria todos os instrumentos que utilizam a eletricidade para o seu
funcionamento, não somente para a amplificação do som (GALLAGHER, 2009, p. 65).
Dentro dessa classificação os instrumentos digitais e eletrônicos estariam enquadrados na
categoria eletrofones. No entanto as características distintas dos vários instrumentos existentes
tornariam esta categoria muito abrangente e vaga.
Para os instrumentos digitais ou eletrônicos os critérios dirigidos para a
materialidade (conformação física, materiais empregados e modo de acionamento) têm fraca
influência ou podem não possuir influência alguma na produção do som. Um instrumento em
forma de guitarra eletrônica, por exemplo, pode vir a soar como tambores, caso designado
para isto. Vejamos então algumas características dos instrumentos digitais e eletrônicos.
3.2 Instrumentos Musicais Digitais/ Eletrônicos
Para Iazzetta (1998, p. 5) os instrumentos eletrônicos e digitais são formados por
dois principais âmbitos, de um lado, o controlador, ou seja, a interface de controle da
produção sonora, de outro, o sistema de geração sonora. Patrício (2010, p. 18) considera estes
mesmos dois componentes como constituintes do modelo básico de um Instrumento Musical
Digital (IMD22). O autor aponta a interface, que também chama “dispositivo de entrada”, e a
unidade de geração sonora como características intrínsecas aos instrumentos musicais digitais.
Neste contexto a interface é o hardware, isto é, o equipamento ou dispositivo
designado para a conversão das ações do performer em sinal digital ou eletrônico. A interface
é responsável pelo controle da produção do som, e o som por sua vez é concebido pela
unidade de geração sonora. Notemos o que Iazzetta comenta acerca destes dois âmbitos
principais presentes nos instrumentos digitais, e como a visão de Patrício (2010) corrobora e
complementa a noção de interface e unidade ou sistema de geração sonora.
22
Terminologia e sigla utilizadas por Wanderley no artigo Instrumentos Musicais Digitais - Gestos, Sensores e
Interfaces (2006).
37
De fato, os instrumentos digitais são formados por dois âmbitos distintos. Um deles
é o controlador, ou seja, a interface que irá disparar e controlar o comportamento do
som. Outro é o sistema de geração sonora, quer dizer, os componentes que irão
produzir o som propriamente dito (IAZZETTA. 1998, p. 5).
A interface gestual corresponde ao hardware destinado a transduzir, de alguma
forma, ações, gestos físicos do performer em informação digital que é utilizada para
controlar os recursos da unidade de geração sonora. (PATRÍCIO, 2010, p. 19).
Tendo em vista estes dois parâmetros (a interface e sistema de geração sonora)
presentes em um instrumento musical digital ou eletrônico, se faz necessária a conexão entre
as ações do intérprete lidas pela interface e o resultado provocado pelo gerador sonoro
decorrente destas ações. Segundo Miranda e Wanderley (2006) estes dois componentes, o
controlador e a unidade de geração sonora, são módulos independentes que se relacionam
através de estratégias de mapeamento.
Os gestos do intérprete podem ser captados pelos dispositivos de entrada através
de diversos recursos, como potenciômetros, sensores, botões de acionamento, placas de
prototipagem, dentre outros. O mapeamento é a correspondência entre estas informações de
entrada e os comandos remetidos para a geração sonora. Dada a importância do mapeamento
nestas relações, adota-se o modelo tripartite como estrutura de um IMD, fundamentado nos
parâmetros: interface gestual, mapeamento e unidade de geração sonora.
Figura 9 - Modelo estrutural tripartite de um IMD (PATRÍCIO. 2010, p. 17).
Nos instrumentos mecânicos tradicionais a interface e o gerador sonoro
constituem uma unidade que não sofre transformações sem que o resultado sonoro também
seja alterado. Em um violão o som é produzido pela interação de fatores como a madeira
utilizada na construção do instrumento, o gesto das mãos do violonista, se ele utiliza palheta,
as unhas ou a carne dos dedos, a força que exerce sobre as cordas, a forma de pinçar a corda
(com apoio ou sem apoio). O próprio instrumento recebe as ações do intérprete e do mesmo
modo é a fonte das vibrações sonoras, constituindo-se, portanto, em uma unidade
indissociável.
38
Figura 10 - "Nos instrumentos tradicionais, o sistema de geração sonora e a interface que controla esse sistema
formam uma unidade". (IAZZETTA. 1998, p. 116).
Já no meio eletrônico/digital equipamentos utilizados como interfaces, podem
estar na forma de sintetizadores, computadores, samplers. Um sintetizador, por exemplo, pode
receber comandos através de um dispositivo óptico, ou pelo acionar de uma tecla, ou pelo
sinal digital de um computador e produzir o som de uma flauta. Nesse caso o som é produzido
através de circuitos eletrônicos e independe do dispositivo que o aciona.
Nos instrumentos musicais acústicos o dispositivo de geração sonora é inseparável
do dispositivo de controle humano [...]. No entanto, no caso dos instrumentos
musicais eletrônicos (onde o dispositivo de interação – ou entrada – é independente
do dispositivo de síntese sonora) não há qualquer mapeamento implícito de um para
o outro. (HUNT, 2000 p. 209)
Figura 11 "Um instrumento eletrônico é um gerador universal de sons, um meta-instrumento ao qual se acopla
uma interface”. (IAZZETTA. 1998, p. 117).
Discutindo características de instrumentos tradicionais, eletrônicos e digitais se
torna válido apontar a ideia de instrumento musical. Patrício (2010) aponta algumas
considerações acerca da noção de instrumento. Para o autor se faz necessário considerar não
somente a capacidade de geração ou reprodução de sons, dado que tocadores de fita
magnética ou compact disc utilizados de modo cotidiano poderiam se enquadrar como
instrumentos musicais pelo fato de possuir essa capacidade. Patrício (2010) leva em conta
também o uso que se faz destas ferramentas de geração ou reprodução sonora. Para o autor
“a partir do momento em que um determinado dispositivo extrapola sua funcionalidade e é
usado em uma busca estética, musical, ele deixa de ser somente uma ferramenta para se
configurar um instrumento musical” (PATRÍCIO, 2010, p. 16).
39
Abordaremos separadamente os três âmbitos que caracterizam a estrutura tripartite
de um IMD.
3.2.1 Interface/ Dispositivo de entrada
Como já relatado anteriormente, a interface é um meio que promove a interação
entre elementos, e neste trabalho abordamos a interação entre homens e máquinas. Nesse
contexto, a interface é o componente responsável por captar os gestos e ações do performer e
convertê-los em sinal digital ou eletrônico para controle do sistema de geração sonora. Este
componente também pode ser chamado controlador gestual (WANDERLEY, 2006) ou
dispositivo de entrada.
O gesto aqui mencionado vai além de um simples movimento no espaço, sendo
entendido como um “movimento capaz de expressar algo” (IAZZETTA, 1997a), ou como
“um movimento corporal que transmite informação” (SHARON, 2004, p.1). O gesto é um
fenômeno de expressão que se manifesta através de um movimento. Tomando este sentido
amplo do termo, movimentos rotineiros podem não ser vistos como gestos musicais. O ato de
digitar um texto em um teclado de computador pode não ser considerado gestual, dado que
indiferentemente de quem, o que, ou de que modo essa ação foi realizada, o resultado é o
mesmo, não há significado em cada movimento de acionar uma tecla. Já em uma performance
musical, o resultado depende em vários aspectos do gesto do instrumentista, dada a dinâmica,
interpretação, até mesmo a visualidade que conferem significação à peça (IAZZETTA,
1997a). Girar botões ou acionar alavancas podem ser atitudes corriqueiras do cotidiano, mas
quando inseridos no fazer musical, se anexam ao resultado sonoro e/ou interpretativo
adquirindo um significativo poder de expressão 23.
Para estabelecer comunicação entre ações físicas e o ambiente computacional
surgiram dispositivos padrão como teclado e mouse. Todavia, com os recursos tecnológicos,
surgiram inúmeros equipamentos com a capacidade de detectar e mensurar gestos diversos,
como gestos de manipulação direta de uma interface ou mesmo gestos sem contato físico com
esta. Para categorização destes dispositivos de entrada existem critérios diversos.
Miranda e Wanderley (2006) classificam os dispositivos de entrada a partir do
critério de semelhança aos instrumentos tradicionais, apontando quatro grupos: instrumentos
23
Para mais informações conferir Zagonel, 1992.
40
aumentados; semelhantes a instrumentos tradicionais; inspirados em instrumentos tradicionais
e alternativos.
Os instrumentos aumentados também são chamados hiper-instrumentos, este foi
um termo elaborado por Tod Machover, do MIT (Massachusetts Institute of Technology,
E.U.A.) e descreve instrumentos acústicos que tem suas possibilidades sonoras e expressivas
expandidas por meio de recursos eletrônicos. Os instrumentos aumentados têm as suas
possibilidades de interação com o músico potencializadas através da utilização de sensores
que captam diversos aspectos da performance. Um exemplo de interface hiper-instrumento é a
guitarra com captação MIDI
24
. Os captadores acoplados a esta retém cada corda
separadamente e transformam a informação recebida em dados MIDI. O sinal analógico
proveniente da captação magnética da guitarra é agregado ao sinal gerado por um módulo de
som externo acionado pela captação MIDI.
Figura 12 - Representação da captação MIDI em guitarras e guitarra com captação MIDI (captador hexafônico
para guitarra GK-3 da Roland).
Outro exemplo de dispositivo de entrada hiper-instrumento é o Piano Preparado
Eletromagneticamente 25 . Trata-se de um piano de cauda no qual são acoplados doze
eletroímãs posicionados sobre as cordas. Em um alto-falante a corrente elétrica recebida faz
com que o eletroímã e o ímã conectado com o cone se empurrem para frente e para trás,
gerando ondas sonoras. No piano preparado eletromagneticamente a ideia é de que estes
24
As guitarras MIDI foram desenvolvidas possibilitando duas abordagens distintas: utilizando captadores que
transformam as informações captadas em informações MIDI; ou utilizando a concepção ampla da guitarra como
interface, na qual as casas são substituídas por botões e existem cordas presas ao corpo do instrumento para
ataque das notas através da mão direita. Esta segunda abordagem classificaremos como interface semelhante a
instrumentos tradicionais.
25
O Electromagnetically Prepared Piano foi desenvolvido por Per Bloland em colaboração com Steven Backer,
Ed Berdahl, Andrew McPherson, do Laboratório de Instrumentação da Universidade de Miami.
41
eletroímãs recebem uma corrente e geram vibrações sonoras a partir das próprias cordas do
piano (fig. 13).
Figura 133 - Eletroímãs sobre as cordas de um piano preparado eletromagneticamente. Os ímãs são controlados
por um patch de Max/MSP e podem fazer com que as cordas do piano ressonem em diferentes frequências
(BLOLAND, 2007, p. 125-126). Max/MSP é um software, um ambiente gráfico interativo para música,
processamento de áudio e multimídia.
O segundo grupo apontado por Miranda e Wanderley (2006) são os semelhantes a
instrumentos tradicionais. De modo geral são versões eletrônicas de instrumentos acústicos.
Estas interfaces possuem mecanismos de controle, estrutura física e modos de execução
semelhantes a instrumentos tradicionais. O controlador Yamaha WX5, por exemplo, possui
chaves que podem ser configuradas para diferentes tipos de dedilhado e o seu bocal possui
sensores capazes de simular a entrada de ar de instrumentos com ou sem palheta. Ele se
assemelha a instrumentos acústicos de sopro.
Figura 14 - Controlador MIDI Yamaha WM5
42
Neste grupo também podemos inserir a Guitarra MIDI. Esta guitarra possui
longos botões dispostos em fileira, sendo equivalentes a cada casa do braço da guitarra. O
acionamento do som se dá através de seis cordas de curto comprimento que são tocadas pela
mão direita, se assemelhando ao modo de acionamento da guitarra convencional.
Figura 15 - Guitarra controladora MIDI, Z7-S e Z6S-XPA, ambas produzidas pela Starr Labs
O terceiro grupo trata das interfaces inspiradas em instrumentos tradicionais.
Estas têm apenas parte de sua estrutura física, modo de funcionamento ou execução baseados
em um instrumento acústico. Um exemplo é o Silent Drum26, que tem formato semelhante a
um tambor, e apresenta um tecido elástico no lugar da pele. Ele possui uma abertura na sua
lateral por onde incide luz e uma câmera capta as deformações sofridas pelo tecido elástico
durante a performance.
Figura 16 - Representação gráfica do Silent drum e ao lado o seu criador Jaime Oliver em performance
Outro dispositivo de entrada inserido neste grupo é o BoSSA (Bowed-SensorSpeaker-Array). Esta interface é inspirada pela estrutura física de um violino, mas sua técnica
26
Observe Anexo A, A1.
43
de execução é diferenciada. BoSSa (fig. 18) é formado por um conjunto de doze alto-falantes
organizados em formato de esfera, um conjunto de esponjas que fazem correspondência com
as cordas do violino, um braço de violino com um sensor linear de posição e um arco
adaptado com sensores de pressão (TRUEMAN e COOK, 2000, p. 121).
Figura 17 - Dan Trueman tocando o BoSSA
O último grupo apontado por Miranda e Wanderley (2006) refere-se aos dispositivos
de entrada alternativos. Eles não apresentam semelhança alguma com um instrumento
tradicional acústico. Um exemplo é o Audio Shaker (sacudidor de som), sua estrutura física se
assemelha a uma coqueteleira e ele remete à ideia de que os sons emitidos próximos a sua
entrada são armazenados por ele. Os sons capturados reagem aos movimentos do sacudidor,
se a tampa for aberta e o Audio Shaker27 inclinado se pode “derramar” os sons que foram
capturados por ele.
27
Observe Anexo A, A2.
44
Figura 18 - Audio Shaker
Joseph A. Paradiso, pesquisador do laboratório MIT Media Lab (Massachusetts
Institute of Technology, E.U.A.), divide os dispositivos de entrada de acordo com o seu
aspecto estrutural geral. Desse modo ele elenca os grupos: interfaces que se utilizam de
teclado; percussivas; semelhantes a instrumentos de cordas; instrumentos aumentados ou
hiper-instrumentos; semelhantes a batutas; interfaces vestíveis (luvas e sensores de sinais
biológicos) e interfaces que prescindem de contato algum do performer.
Sergi Jordà, professor e pesquisador do grupo de Tecnologia Musical da
Universidade Pompeu Fabra (UPF) em Barcelona, toma a classificação de Wanderley e
Miranda, fundamentada na semelhança aos instrumentos acústicos e adiciona uma categoria:
dispositivos de controle barato e tomados de empréstimo (cheap and borrowed controllers)
(JORDÀ, 2005, p. 30). Ele se refere à utilização de equipamentos que não foram
desenvolvidos especificamente para atividades musicais, como controles de jogos (joysticks),
mesas digitalizadoras, superfícies de controle MIDI.
Fernando Iazzetta (1997b, p. 5) propõe um método de classificação de
instrumentos eletrônicos e digitais levando em conta a independência entre a interface e o
sistema de geração sonora. Apresenta três categorias de interfaces: físicas, conceituais e
biológicas.
As interfaces físicas foram divididas em três subcategorias. Interfaces baseadas na
extensão eletrônica de um instrumento mecânico (os sons oriundos das vibrações geradas pelo
instrumento são captados e processados eletronicamente expandindo as possibilidades
ofertadas originalmente por esse instrumento).
45
Figura 19 - Yamaha Disklavier e a direita Celleto de Chris Chafe que funcionam como instrumentos acústicos ao
mesmo tempo em que geram informação digital (MIDI). Outro exemplo é o Trumpet MIDI System; de Dexter
Morril.
A segunda subcategoria corresponde às interfaces modeladas a partir de um
instrumento mecânico (são inspiradas em instrumentos tradicionais, no entanto são utilizadas
para controlar um sistema eletrônico de geração sonora).
Figura 20 - WX11Yamaha, que simula o funcionamento de um instrumento mecânico, o saxofone. 28
E a terceira subcategoria corresponde às novas interfaces, estas “ampliam os modos de
controle de geração sonora pelo interprete e não estão baseadas nos modelos clássicos de
28
Observe Anexo A, A3.
46
instrumentos” (IAZZETTA, 1997b, p. 5). Como exemplo, temos o Theremin e o Buchla
Lightning (fig. 21).
O segundo grupo apontado por Iazzetta é o das interfaces conceituais que “estão
ligadas ao desenvolvimento do computador e separam o conceito de instrumento da interface
física” (Id., 1997b, p. 5). Estas se subdividem em: (1) linhas de comando, instrumentos
virtuais que começaram com a linguagem MUSIC V, nos quais o compositor digita
algoritmos e dados que são processados pelo computador, outros exemplos são Csound e
Cmix; (2) interfaces gráficas, que são “programas que criam ambientes gráficos para a
manipulação sonora” (Id., 1997b, p. 5), como exemplo temos a linguagem MAX/MSP, que
fornece opções para obter o seu próprio som e a oportunidade para definir como ocorrerá a
interação com o computador, sendo um ambiente de manipulação de áudio em tempo real
(fig. 22). O terceiro grupo é o das interfaces biológicas, que são “interfaces que captam sinais
biológicos para produzir ou controlar sons” (Ibid.), utilizando sensores que captam ondas
eletromagnéticas do cérebro, o batimento do coração ou o ritmo da respiração, por exemplo,
para usar em composições musicais.
Figura 21 - “Buchla Lightning consiste de dois bastões que contém transmissores de luz infravermelha cuja
posição no espaço pode ser registrada por uma unidade colocada à distância” (Iazzetta, 1997b, p. 5).
47
Figura 22 - Max/MSP, linguagem de programação desenvolvida e mantida pela Cycling '74. Exemplo de
interface gráfica.
3.2.2 Sistema de geração sonora
Outro elemento de constituição dos instrumentos eletrônicos e digitais, segundo o
modelo tripartite, é o sistema de geração sonora. Ele é o responsável pela produção do som,
seja transformando um som preexistente, produzindo som através de técnicas de síntese
sonora, ou reproduzindo amostras digitais de um som.
Fernando Iazzetta classificou os sistemas de geração sonora em três âmbitos: por
transformação, por síntese e por amostragem. A geração sonora por transformação parte “de
um som ou representação desse som preexistente para transformá-lo em um outro signo
48
acústico” (IAZZETTA, 1997b, p. 5). A música concreta foi um dos primeiros movimentos a
explorar processos de transformação.
Sistemas de geração sonora por síntese “produzem artificialmente um sinal que irá
produzir características acústicas específicas” (idem, 1997b, p. 5). Os sintetizadores
analógicos utilizam osciladores controlados por tensão elétrica em contínua variação e são
monofônicos, existem também os sintetizadores digitais que utilizam microprocessadores para
programar e controlar os parâmetros de síntese e são polifônicos. Os principais processos de
síntese são a síntese aditiva e a subtrativa. A síntese aditiva apoia-se na premissa de que
qualquer som pode ser construído a partir da fusão de ondas sonoras senoidais 29 . Nesse
processo ondas senoidais com características próprias (frequência, amplitude) são somadas
para a formação de um novo timbre. Na síntese subtrativa utilizam-se filtros para modificar as
características dos componentes ou harmônicos de determinada amostra, modificando a
estrutura do aspecto sonoro. Outros exemplos são a síntese granular, por modelagem física,
síntese FM, entre outros.
A geração sonora por amostragem, processo também chamado de sampling,
“consiste em medir discretamente a amplitude de uma onda sonora a intervalos constantes”
(IAZZETTA, 1997b, p. 6). As amostras obtidas podem ser então, armazenadas, reproduzidas
ou utilizadas para recriar outras ondas sonoras, podendo ser modificadas com variações de
amplitude ou de frequência.
Eduardo Patrício (2010) aponta também para a utilização de recursos de
processamento de áudio, como equalização, efeitos, como delay, reverb, controle panorâmico,
de envelope sonoro. Além de poder incluir softwares com programações algorítmicas que
estejam vinculados ao sistema de geração sonora. Nesse âmbito, o software, sendo
responsável pela organização e execução de estruturas musicais pré-estabelecidas, se
assemelha a sistemas musicais interativos podendo lidar com estruturas musicais compostas
anteriormente ou com níveis distintos de imprevisibilidade. Diante disso comenta Patrício:
Um IMD pode possuir uma partitura digital interna que se desenvolva ao longo do
tempo, de forma fixa, executando e controlando eventos e processamentos sonoros,
ou implementações algorítmicas mais ou menos complexas que executem ‘decisões’
em tempo real em resposta a diferentes ações de cada performance, criando
situações interativas, onde o computador ‘improvisa’. (PATRÍCIO, 2010. p. 28)
29
De acordo com o Teorema de Fourier, qualquer forma de onda pode ser decomposta em uma soma de ondas
senoidais. A senóide é a representação matemática de um movimento vibratório periódico em um sistema de
eixos cartesianos retratando a amplitude da onda função do tempo. São poucos os movimentos vibratórios desse
tipo encontrados na natureza, no âmbito sonoro, correspondem aos chamados “sons puros”, cujo efeito acústico
se assemelha o som emitido pelo diapasão e pelos geradores de sinal.
49
3.2.3 Mapeamento
O mapeamento é a forma de interconectar o dispositivo de entradas/interface ao
sistema de geração sonora, de modo a permitir uma performance em tempo real. Aponto aqui
a
importância do
mapeamento tanto
no desempenho
funcional do
instrumento
eletrônico/digital como na apreensão, por parte do público, de alguma relação entre gesto e
resultado sonoro. Como anteriormente comentado, em instrumentos musicais eletrônicos ou
digitais, a interface é dissociada do sistema de geração sonora, portanto não há conexão direta
entre cada ação do músico e um evento sonoro específico.
Figura 23 - Exemplo comparativo de hipotéticos mapeamentos em um instrumento acústico e em um IMD.
(Patrício, 2010, p. 26)
Patrício (2010) aponta duas implicações:
(1) em um IMD, qualquer ação humana pode ser direcionada a qualquer tipo de geração ou
processamento sonoros, várias ações podem conduzir a um só evento, ou ainda, uma só
ação pode desencadear diversos processos. Tudo isso em função da estruturação lógica de
cada IMD, definida sobretudo no estágio de mapeamento. (2) Teoricamente, não há limites
nem para os modos de execução de cada instrumento (em função da variedade de
dispositivos de entrada), nem para o tipo de som que será gerado, em função da
possibilidade do uso de qualquer técnica de síntese e processamento de som. (PATRÍCIO,
2010, p. 26).
Em estruturas de mapeamento, nas quais existe relação explícita entre ação sobre
a interface e o resultado sonoro, são apontadas três situações: um-para-um, na qual uma ação
é relacionada a um parâmetro30 ou processo do sistema de geração sonora; divergente, uma
ação é relacionada a vários parâmetros ou processos do sistema de geração sonora;
convergente, na qual várias ações são necessárias para controlar um parâmetro ou processo do
30
Como exemplo de parâmetros, temos altura, intensidade e duração.
50
sistema de geração sonora (ROVAN 31 apud PATRÍCIO, 2010, p. 26). Frequentemente é
utilizada mais de uma estratégia de mapeamento e em combinações diversas.
Figura 24 - Estratégias de mapeamento explícito (PATRÍCIO, 2010, p. 27).
31
ROVAN, Joseph Butch et al. Instrumental gestural mapping strategies as expressivity in computer music
performance. In: Proceedings of Kansei - The Technology of Emotion workshop. Genova. 1997.
51
4 A INTERAÇÃO PRESENTE NA PRÁTICA DO CIRCUIT-BENDING
Inserido na música interativa e apresentando forte caráter experimental está a
prática do “circuit-bending” mencionada no primeiro capítulo deste trabalho. Essa prática
teve inicio em 1967, através de Reed Ghazala 32, quando acidentalmente uma ferramenta em
sua gaveta entrou em contato com o circuito de um mini amplificador provocando um curtocircuito e consequentemente um sinal sonoro inusitado. Diante de um som tão interessante
provocado por um curto-circuito acidental, Ghazala se perguntou o que aconteceria ao curtocircuitar dispositivos propositalmente. E, se resultados sonoros interessantes surgiram de um
circuito utilizado corriqueiramente para amplificar sons, ele se indagou o que poderia resultar
ao curto-circuitar dispositivos projetados com a finalidade de produzir sons, como teclados e
jogos eletrônicos. Desse modo passou a procurar circuitos para alterar criando instrumentos
musicais diversos.
O Circuit-bending consiste na busca de sons interessantes através da conexão de
fios no circuito de forma exploratória e experimental. Conecta-se um fio a um ponto do
circuito e a outra extremidade em outro ponto de forma arbitrária, alterando o fluxo elétrico
dentro dos circuitos, “se você ouvir um som interessante, então você deve soldar o fio no
lugar” (GHAZALA, 2005, p. 4, tradução nossa). Consiste também na criação de circuitos
eletrônicos simples, não se fazendo necessário profundo conhecimento de eletrônica. Segundo
Ghazala o circuit-bending é um ato que “busca o caos dentro da lógica” (FERNANDEZ,
2013, p. 10), prática que chama de clear illogic. “O que nós descobrimos é que o circuitbending é um ato de clara ausência de lógica, ele próprio é um sistema científico de aplicação
de acordo com as leis naturais de probabilidade” 33 (GHAZALA, 2005, p. 16, tradução nossa).
A palavra inglesa bend, segundo o dicionário Michaelis, tem significados
diversos, como flexão, curva, torcer, dobrar, arquear. A tradução literal do termo Circuitbending poderia ser “curvando circuito”, “entortamento de circuito”, “torcendo circuito”, ou
“distorcendo circuito” (FERNANDEZ, 2013, p. 15). A técnica do bend nos instrumentos de
corda não tem tradução para o português e consiste em curvar a corda com a mão esquerda,
no caso dos instrumentistas destros, elevando a altura da nota. Desse modo o termo circuitbending será mantido neste trabalho para se referir de forma mais ampla à técnica em questão.
32
“Circuit-Bending: Build Your Own Alien Instrument” de Q. Reed Ghazala e “Handmade Electronic Music:
The art of hardware hacking” de Nicolas Collins são duas referências fundamentais para o tema.
33
“What we’ve discovered is that circuit-bending is an act of clear illogic, itself a scientific system of application
following the natural laws of chance” (GHAZALA, 2005, p. 16).
52
Fernandez (2013) adota o termo “circuito alterado” englobando as metodologias do circuitbending e hardware hacking 34 (técnica que possui muitas similaridades com o circuitbending). Nos deteremos a discutir questões acerca do circuit-bending, ainda que o termo
“circuito alterado” possa vir a ser utilizado para se referir a instrumentos criados pelo circuitbender.
No processo de criação de circuitos alterados são adicionados componentes aos
dispositivos para ajuste do sinal sonoro, como potenciômetros, resistores sensíveis à luz,
sensores capacitivos (detectam a massa ao seu redor), ou até mesmo pontos de contato para o
corpo. Estes recursos são responsáveis pela captação das ações do performer, que interage
com o novo instrumento de maneira singular e em tempo real. A interação está presente desde
o momento de criação do instrumento, dado o fato de o artista escolher os materiais a serem
utilizados, optar pelas alterações em circuitos pré-existentes para fabricar o seu instrumento
ou confeccioná-lo por inteiro. O performer também desempenha papel de luthier, compositor,
instrumentista e ouvinte, nesse âmbito, as separações entre criar um instrumento, compor,
tocar e ouvir se dissolvem. A interação homem e máquina também se assinala na
performance, na qual o artista age sobre o instrumento que, por sua vez, reage de modo não
completamente previsível, o que demanda respostas diversas do performer. O instrumentista
utiliza o corpo em contato com os componentes e valoriza o ato de contínua descoberta o que
resulta em apresentações singulares. Essa interação redireciona a atenção das habilidades
técnicas do instrumento, para a ação, a intenção e para as decisões do intérprete dado o
elevado número de possibilidades de geração de som a serem exploradas.
O circuit-bending qualifica-se como uma metodologia de luteria experimental na
qual a interação caracteriza fortemente as múltiplas ações do artista e a sua relação com os
circuitos alterados. As interfaces feitas à mão geram retornos sonoros ou visuais em tempo
real e interferem no resultado expressivo de uma obra, pelo fato de proporcionarem respostas
não completamente previstas pelo intérprete, desse modo associamos a prática do circuitbending à música interativa.
34
Hardware Hacking é uma técnica iniciada por Nicolas Collins, motivado pela necessidade de extrapolar o
contato ao som proporcionado pelo teclado ACSII e mouse. “Colins busca a construção de novos aparelhos
musicais a partir de aparelhos eletrônicos descartados, ou ainda, criados desde o início, utilizando componentes
eletrônicos simples” (FERNANDEZ, 2013, p. 11). Collins orienta os hackers a evitarem curtos circuitos para
conter a queima de componentes, e não tem a aleatoriedade como fundamento. É uma prática que possui fortes
semelhanças ao circuit-bending, no entanto não será foco deste trabalho. Observe Anexo B.
53
4.1 Sobre a interação no circuit-bending
Caleb Kelly chama de Cracked Media a ação que se iniciou em meados do século
XX na qual, artistas e músicos passaram a manipular e “quebrar” tecnologias de mídia de
áudio para produzir novos sons e novas performances. Tendo em vista que a Cracked Media
engloba as metodologias do circuito alterado, vale ressaltar que “o interesse mais óbvio [dos
artistas envolvidos com as metodologias da Craked Media] é o uso das tecnologias além da
sua intenção e projeto originais” (KELLY 35 2009 apud FERNANDEZ, 2013, p. 19). A
metodologia do circuit-bending utiliza instrumentos tecnológicos, tendo intenções que vão
além do objetivo para o qual foram construídos e aponta para o reaproveitamento de objetos
eletrônicos descartados, dando-lhes novo significado. Dentre estes objetos podemos listar
aparelhos telefônicos, jogos e brinquedos eletrônicos, aparelhos de rádio, teclados,
amplificadores e passam a ser exploradas as sonoridades, os ruídos e distorções.
A atividade de criação do seu próprio instrumento musical demanda do circuitbender uma série de tomadas de decisões que retratam a interação do luthier com os aparelhos
e equipamentos eletrônicos, dado que as opções e ações do artista sobre o aparelho têm
reações não completamente previsíveis, podendo ocorrer até mesmo a queima de
equipamentos (fato que deve ser considerado pelo circuit-bender como parte do processo).
Listamos algumas decisões: a escolha do aparelho a ser alterado, as alterações que serão
impressas sobre este aparelho, as sonoridades realizadas por ele, a estrutura física que
comportará o circuito, os meios de interação a disposição do intérprete (potenciômetros,
sensores, interruptores) além da opção da criação desde o início. Estas alternativas realizadas
durante a criação do instrumento/interface preestabelecem, ainda que imprecisamente, uma
proposta de performance e um campo de improvisação sobre o circuito alterado. A atividade
de criação do instrumento se confunde com a atividade de composição, sobre isso afirma
Iazzetta (2009, p. 209):
O trabalho experimental de associação entre gestos musicais e instrumentos
eletrônicos fez com que o compositor fosse obrigado a investigar, ele mesmo, o
funcionamento e as conexões entre esses elementos. Mesmo porque, muitas vezes, o
trabalho de composição se confunde com o trabalho de criação dos instrumentos que
serão usados na composição.
35
Kelly, Caleb. Cracked Media: The Sound of Malfunction. Massachussets / Londres: The MIT Press, 2009.
54
A cultura do faça você mesmo (Do It yourself – DIY) é incorporada pelo circuitbending, constituindo uma reação ao refinamento elitista das Belas Artes e da música de
concerto, ou, até mesmo, como uma crítica ao consumismo, dado que o indivíduo pode criar
um instrumento ao invés de comprá-lo, e uma crítica ao sistema segregacional, observando
que pode-se adquirir habilidades para produzir tarefas em detrimento da contratação de
especialistas (IAZZETTA, 2011).
Figura 25 – Em seu sítio DIY, Benderella disponibiliza vários vídeos acerca da construção de circuitos
alterados36
Para Nicolas Collins, compositor norte-americano, “desenhar circuitos era como
compor uma peça, a peça e o circuito eram a mesma coisa. O circuito era a partitura, o
circuito pode até ser chamado de performer” (KELLY 37 2009 apud FERNANDEZ 2013).
Nesse âmbito, o circuito funciona não apenas como instrumento musical, mas como
“plataforma composicional”, dadas as suas reações durante a criação e durante a performance,
dada a imprevisibilidade existente no seu retorno sonoro. O processo de construção entendido
como processo de composição e até mesmo, parte da obra.
Aira acredita não haver mais sentido em insistir na feitura de obras a partir de
modelos tradicionais, pois elas se encontrariam esgotadas, sem possibilidades de
gerar novidade. Aira sugere, então, que o principal papel de um autor na realidade
contemporânea seria elaborar novos modelos, novos processos para criação de
obras. Ou seja, um autor se dedicaria, principalmente, à elaboração e divulgação de
novos processos criativos. A isso ele nomeia “obra-processo”. O mérito do artista
seria propor novas formas de estruturar o material artístico, novos processos. Em vez
de um reprodutor de formas tradicionais, ele seria um multiplicador de processos,
alimentado o universo artístico com mais “caminhos” para a construção de obras de
arte. (PATRÍCIO, 2010, p. 39).
36
Disponível em: http://www.ehow.com/videos-on_2547_do-circuit-bending-kid_s-toy.html. Acesso em: 13.
jan. 2014.
37
Kelly, Caleb. Cracked Media: The Sound of Malfunction. Massachussets / Londres: The MIT Press, 2009.
55
4.2 Construindo interfaces: relato de três experiências
Para um melhor detalhamento das sutilezas que perpassam o processo de
construção de instrumentos musicais interativos, dedicaremos este tópico ao relato de três
experiências que realizamos durante a pesquisa. Como já antecipado, a nossa perspectiva
teórica supõe que o processo de elaboração da interface é parte essencial da obra, uma obraprocesso que incorpora as várias decisões tomadas, a escolha dos circuitos e o manuseio dos
componentes utilizados. Durante a narrativa, serão descritos os diagramas dos circuitos, os
materiais, as dificuldades encontradas, as decisões e as soluções tomadas, a forma de
interação e o resultado sonoro das seguintes interfaces: Cracklebox, Oscilador onda quadrada
a duas vozes e Pulso.
4.2.1 Cracklebox
O Cracklebox foi uma interface idealizada por Michel Waisvisz e Geert
Hamelberg no final dos anos 60 e comercializado pela empresa STEIM na década seguinte.
Podendo ser chamado também de Kraakdoos, trata-se de uma caixa de madeira que comporta
circuitos instáveis e possui alguns pontos de contato sensíveis ao toque. A ideia é de a pele do
artista fazer parte do circuito, ser uma variável na produção sonora.
A partir da pesquisa acerca da construção do Cracklebox encontramos alguns
tutoriais, como o vídeo no site youtube intitulado Tutorial construyendo la crackle Box, que
apresenta um circuito menor e mais simples, porém com resultados sonoros mais limitados,
produzindo ruídos com menor variação de acordo com o toque. Também foi encontrado o
desenho do circuito no site http://www.eam.se/kraakdoos/, que foi utilizado para a construção
do Cracklebox desta pesquisa. Este diagrama foi publicado por Johan Boberg 38 com a
permissão de Michel Waisvisz para fins não comerciais e educacionais.
Os componentes listados à direita da figura (fig. 27) foram encontrados em lojas
de dispositivos eletrônicos no centro da cidade de Fortaleza/CE. A primeira dificuldade
imposta foi encontrar o componente U1, o 709 op-amp39. No site já havia menção quanto à
dificuldade de obter este circuito. O capacitor cerâmico foi substituído pelo capacitor 222
devido à disponibilidade do componente no momento da compra. O circuito foi montado em
38
39
Johan Boberg é sueco, compositor e intérprete de música eletroacústica e live electronics.
Trata-se do circuito LM709, MC709 ou uA709.
56
placa de ensaio (protoboard) e após alguns testes e modificações ele funcionou. O nosso
conhecimento limitado em eletrônica tornou a construção do instrumento mais tátil e intuitiva,
contudo não comprometeu o rigor do processo de construir um instrumento eletrônico, ainda
que oriundo de um circuito relativamente pequeno e simples.
Figura 26 - Circuito do Cracklebox40
O Cracklebox produz ruídos de acordo com o corpo em contato com ele através
de seis pontos sensíveis ao toque, reagindo de modo diferente decorrendo do objeto posto em
contato com ele. O circuito foi armazenado em uma pequena caixa de madeira (fig. 31). Entre
os seis contatos existem alguns que oferecem pouca variação do som, outros que, se tocados
de forma singular não alteram o resultado sonoro, mas em conjunto com outros pontos de
contato provocam nuances de timbre, altura, intensidade. Percebe-se que dois pontos de
contato são responsáveis pela maior variação de possibilidades sonoras. A seguir algumas
imagens do processo de construção da interface 41.
40
41
Disponível em: <http://www.eam.se/kraakdoos/>. Acesso em: ago. 2013.
Observe Anexo A, A4.
57
Figura 27 - Montagem do circuito em protoboard (placa de ensaio)
Figura 28 - Montagem dos componentes em placa de fenolite
58
Figura 29 - Projeto de configuração do recipiente que receberá o circuito
Figura 30 - Preparação do recipiente (caixa de mdf). Ao lado o circuito soldado em placa de fenolite
59
Figura 31 - Soldagem dos percevejos utilizados como superfícies de contato e do led
Figura 32 - Cracklebox
Figura 33 - Interface Cracklebox produzida durante a pesquisa.
60
4.2.2 Oscilador onda quadrada a duas vozes
O circuito do Oscilador onda quadrada a duas vozes foi obtido a partir de oficina
ministrada por Panetone (Cristiano Rosa) na cidade de Fortaleza no ano de 2011. Esta
interface tem como dispositivo de entrada dois potenciômetros, para a saída de áudio foi
colocado um jack p2, cada potenciômetro é responsável pelo controle de uma onda quadrada
emitida. Como o nome da interface denuncia soam duas ondas sonoras quadradas
simultaneamente que têm suas frequências reguladas através de potenciômetros. A partir de
experimentações no momento de construção da interface foram encontradas maiores
variações sonoras com a substituição do potenciômetro 1M conectado nos pinos 1 e 2 do
circuito integrado 40106, pelo potenciômetro de 50kohms. Os componentes são: 2 resistores
10k, capacitor eletrolítico 1µF/100v; capacitor 103, circuito integrado 40106; conector de
bateria 9v; potenciômetro 1M; potenciômetro 50K; saída de áudio 42.
Figura 34 - Diagrama confeccionado durante a presente pesquisa representando o circuito do Oscilador onda
quadrada a duas vozes
42
Observe Anexo A, A5.
61
Figura 35 - Circuito do oscilador montado em protoboard (placa de ensaio)
Figura 36 - Inserção dos componentes em placa de fenolite
62
Figura 37 - Circuito no lado esquerdo da imagem e a preparação do recipiente (saboneteira) para recebê-lo
Figura 38 - Encaixe do circuito no recipiente
63
Figura 39 - Saída de áudio fixada na parte inferior, chave liga/desliga e dois potenciômetros na tampa
Figura 40 - Interface Oscilador onda quadrada a duas vozes produzida durante esta pesquisa
4.2.3 Pulso
O circuito do Pulso foi obtido em oficina de circuit-bending ministrada por
Panetone (Cristiano Rosa). A seguir está o desenho do circuito que foi construído. Apenas
64
uma mudança foi feita, foi adicionado um interruptor “liga/desliga” entre o positivo da bateria
e o pino 8 do circuito integrado 555.
Os componentes utilizados foram: capacitor eletrolítico 1µF/100v, potenciômetro
de 1MΩ, circuito integrado 555, resistor 10kΩ, conector de bateria 9v, jack p2, cabos para
conexão dos componentes, e bateria 9v para alimentação. Foi utilizada também uma placa de
fenolite ilhada para comportar os componentes, que foram comprados em lojas de
equipamentos eletrônicos no centro da cidade de Fortaleza. É um circuito pequeno e simples
por utilizar poucos componentes eletrônicos. Em poucos minutos foi possível montar o
circuito em uma protoboard. Foi inevitável a particular e silenciosa comemoração pelo fato
de, no primeiro teste, o circuito funcionar.
Figura 41 - Desenho do circuito do Pulso na oficina Circuit-bending ministrada por Cristiano Rosa
Seu retorno sonoro origina o nome da interface, ele produz pulsos de duração
regular, sendo que alterna em um pulso mais intenso e outro menos. O potenciômetro foi o
meio de interação utilizado para regular a velocidade do pulso, podendo variar entre um pulso
lento a um som de frequência mais alta, dada a maior velocidade das oscilações, chegando ao
silêncio quando regulado no limite positivo da frequência 43.
O componente de interação utilizado foi o potenciômetro, no entanto outros
sensores poderiam ser utilizados, como o fotorresistor LDR (light-dependent resistor), que
43
Observe Anexo A, A6.
65
reage de acordo com a intensidade da luz emitida sobre ele. Pensando na possibilidade de
utilizar as interfaces de interação de modo conjunto foi escolhido este meio de interação entre
instrumento e performer, o potenciômetro. Desse modo o “pulso” poder se manter constante
enquanto outra interface é manipulada.
As preferências do alterador de circuito, as possibilidades de performance do
instrumento, a resposta da funcionalidade do circuito ou até mesmo, as possibilidades de
componentes à disposição do luthier no momento da construção da interface interferem
consideravelmente na construção e no resultado sonoro da interface.
Figura 42 - Desenho confeccionado durante a presente pesquisa representando o circuito da interface Pulso
Figura 43 - Após realizar as soldas necessárias o circuito foi inicialmente armazenado em uma pequena caixa de
papelão
66
Figura 44 - Inserção dos componentes em outro recipiente
Figura 45 - Interface Pulso
67
Figura 46 - Interface Pulso.
68
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com as propostas de classificação mencionadas nesta pesquisa
tentaremos caracterizar os instrumentos que construímos. Segundo a classificação proposta
por Miranda e Wanderley (2006) podemos categorizá-los como dispositivos de entrada
alternativos, pois não apresentam semelhança alguma com um instrumento tradicional
acústico.
Na classificação de Sergi Jordà poderíamos enquadrar os instrumentos produzidos
a partir da alteração de brinquedos ou de equipamentos eletrônicos diversos como dispositivos
de “controle barato” e “tomados de empréstimo” (cheap and borrowed controllers) (JORDÀ,
2005, p. 30). Dado que estes instrumentos provêm de equipamentos que não obrigatoriamente
foram desenvolvidos especificamente para atividades musicais e que, de modo geral, são de
baixo custo financeiro. De acordo com a classificação proposta por Fernando Iazzetta
podemos inseri-los no grupo das novas interfaces, pelo fato de não serem baseadas nos
modelos clássicos de instrumentos.
Já o sistema de geração sonora, de acordo com a proposta de Iazzetta,
classificaríamos como sistema de geração sonora por síntese, porque as interfaces construídas
produzem artificialmente um sinal que emitirá características acústicas específicas. Assim
como os sintetizadores analógicos, estas interfaces (Cracklebox, Oscilador a duas vozes e
Pulso) originam uma onda sonora a partir da manipulação direta de correntes elétricas, no
caso corrente de baixa tensão (9volts).
São observadas ações de mapeamento distintas. No Pulso o mapeamento se dá
de um-para-um, o potenciômetro regula a frequência das oscilações, trazendo variações
sonoras de andamento, métrica, e poucas variações em relação à altura do som de acordo com
a maior frequência atingida por ele.
No Oscilador onda quadrada a duas vozes o mapeamento se dá de um-para-um,
cada potenciômetro regula a altura do som, de acordo com a velocidade das oscilações. Os
dois reguladores interagem não sendo duas vozes totalmente independentes, mas interferindo
simultaneamente no resultado sonoro também. No Cracklebox acredita-se haver a estratégia
de mapeamento divergente, dado que uma ação é relacionada a vários processos do sistema de
geração sonora. O som proveniente é relativamente indeterminado e imprevisível, sabe-se
também que determinados pinos tem maior atuação na produção do som, no entanto, a
interface reage com nuances de sonoridade distintas decorrente do corpo em contato com ela,
69
e com variações de timbre, altura, e intensidade do som e ruído produzido de acordo com as
combinações de utilização dos pinos de contato.
Nesta pesquisa, acerca da interação entre homens e instrumentos eletrônicos
presente na música contemporânea, no que tange à metodologia do circuit-bending, foram
realizados estudos teóricos a fim de explanar o conceito de interação em música, assinalados
registros históricos acerca da interação presente durante os vários períodos e acerca da
evolução de instrumentos eletrônicos e digitais. Foi abordada a ideia de interface como o meio
pelo qual é realizada a interação e os demais âmbitos que caracterizam a estrutura de um
instrumento musical eletrônico ou digital, a saber as estratégias de mapeamento e o sistema de
geração sonora.
Realizou-se uma revisão de literatura acerca dos vários temas relacionados, como
interação, instrumentos musicais digitais, eletrônica, circuit-bending, hardware hacking,
música eletroacústica, música experimental. É trabalhada a concepção de obra-processo que
norteou a feitura dos instrumentos desta pesquisa, havendo adaptações e algumas mudanças
durante a sua construção.
Pode-se dizer que a construção de instrumentos alterados é capaz de ampliar a
percepção sonora do indivíduo, dado que os ruídos e sons não naturais passam a ganhar novos
significados como resultado de um planejamento e envolvimento com a criação deste novo
som. Além de ser ainda uma atividade que pode ter adeptos de diversas áreas do
conhecimento, ampliando a visão de mundo acerca destas áreas, como acontece com os
conhecimentos em eletrônica, ainda que básicos.
Tendo em vista as diversas maneiras de compreensão acerca da construção dos
instrumentos eletrônicos ou digitais e da interatividade, não é intensão deste trabalho levantar
conceitos fechados ou definitivos. Tentamos contribuir com uma fonte de pesquisa em torno
da interação musical e da metodologia do circuit-bending, uma atividade de luteria que pode
ser utilizada como meio de inserção de alunos de música no universo do ruído e na música
experimental, sem comprometer a ludicidade e o encantamento que deve perpassar toda e
qualquer atividade artística.
70
REFERÊNCIAS
ARANGO, Julián. Áudio interativo na Arte Sonora: interação física. Seminário
Softborders. São Paulo, SP. 2010.
______. Homens, máquinas e homens-máquinas: o surgimento da música eletrônica.
Dissertação de Mestrado em Multimeios. Campinas, UNICAMP, 2005.
CAESAR, Rodolfo. Novas interfaces e a produção eletroacústica. In: Anais do SBCM,
Brasília, 1997.
CAETANO, Alexandra. CIBERINTERFACES. 9° Encontro Internacional de Arte e
Tecnologia. 2010.
CAMPESATO, L.; IAZZETTA, F. Som, espaço e tempo na arte sonora. Anais do XVI
Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música (ANPPOM).
Anppom, 2006. v. 1, p. 775-780.
CANDELLO, Heloisa Caroline de Souza Pereira . INTERFACES SONORAS. Revista
Sonora, Campinas-SP, v. 2, 2004.
COCHARRO, Diogo. Condução em tempo-real de Algoritmos Musicais: Implementação
de um Sistema Musical Interativo com o Kin.Rhythmicator. Dissertação de mestrado. 2012.
COLLINS, Nicolas. Handmade Electronic Music: The Art of Hardware Hacking. Nova
Iorque: ed. Routledge, 2006.
CRACKLE. Página acerca de Michel Waisvisz e suas obras. Disponível em:
<http://www.crackle.org/>. Acesso em: ago 2013.
DOBRIAN, Christopher. Strategies for continuous pitch and amplitude tracking in
realtime interactive improvisation software. In: Proceedings of the 2004 Sound and Music
Computing Conference (SMC04), Paris, 2004. Disponível em:
<http://music.arts.uci.edu/dobrian/PAPER_051.pdf>. Acesso em: jan. 2013.
DODGE, Charles; JERSE, Thomas. Computer Music: Synthesis, Composition and
Performance. Ed. Schirmer, Nova York, 1997. 2ª ed.
FERNANDEZ, Alexandre. Circuito alterado em três atos: abrir, tatear e multiplicar.
Dissertação de mestrado. São Paulo, 2013.
FERRAZ, Silvio. Criação musical com suporte tecnológico. In: Anais da Anppom, 1999.
FIQUEIRÓ, Cristiano. Estratégias composicionais na interação homem-máquina. Revista
Universitária do Audiovisual. São Carlos: UFSCar. 2008.
FLORES, Rodrigo Dias. Computação Musical – Uma visão geral. Disponível em
<http://www- usr.inf.ufsm.br/~dflores/elc1020/t1/artigo.pdf>. Acesso em: 25 maio 2012.
71
FOGLIATTO, João Antonio. Uma Visão Geral sobre Aplicativos de Computador
Destinados à Utilização na Música. Disponível em: <http://wwwsr.inf.ufsm.br/~jaf/elc2010/seminario/ELC1020_artigo_JoaoAntonioFogliatto.pdf>.
Acesso em: 19 jun. 2012.
FORNARI , José. Da Assinatura Gestual à Expressividade Musical. Dennis D’or. Anais do
III Encontro de Música Ubíqua. III UbiMus, 2012.
FREIRE, Sérgio . Pandora: uma caixaa tocada à distância. In: XI Simpósio Brasileiro de
Computação e Música, 2007, São Paulo. Proceedings of the 11th Brazilian Symposium on
Computer Music. São Paulo: IME/ECA - Usp, 2007. v. único. p. 25-34.
GAMBIOLOGIA. Coletivo brasileiro de alteração de aparelhos. Disponível em:
<http://www.gambiologia.net/blog/>. Acesso em: 27 out. 2013.
GELL, Alfred. Technology and Magic. Anthropology Today. Grã Bretanha-Irlanda, vol. 4.
1988.
GHAZALA, Reed. Circuit-bending: Build Your Own Alien Instruments. Indianápolis:
Wiley Publishing Inc, 2005.
GIMENES, M. e Manzolli, J. Crítica ao Design de Interfaces Musicais: dos Instrumentos
Tradicionais aos Novos Dispositivos com Suporte Tecnológico. 2010.
GLUCK, Robert. Live electronic music performance: innovations and opportunities.
Tav+, Music, Arts, Society magazine. Outono, 2007.
GOHN, Daniel. Aspectos tecnológicos da experiência musical. 2012. Disponível em:
<http://www.ime.usp.br/?option=com_eventlist&view=details&id=984:dispositivos-moveiscomo-instrumentos-musicais&Itemid=44>. Acesso em: 17 set. 2012.
HORA, Daniel. Perspectivas históricas da arte_hackeamento. 9° Encontro Internacional de
Arte e Tecnologia. 2010.
HOW TO DO CIRCUIT BENDING WITH A KID'S TOY. Benderella. Vídeos tutoriais
acerca da construção de circuitos alterados. Disponível em: <http://www.ehow.com/videoson_2547_do-circuit-bending-kid_s-toy.html>. Acesso em: 13 jan. 2014.
HUNT, A. WANDERLEY, Marcelo M. KIRK, Ross. Towards a Model for Instrumental
mapping in Expert Musical Interaction. In: Proceedings of the 2000 International
Computer Music Conference. San Francisco, 2000. p. 209-212.
IAZZETTA, Fernando. A importância dos dedos para a música feita nas coxas. Anais do
15º Congresso da Anppom. Rio de Janeiro: Anppom - Associação Nacional de Pesquisa e
Pós-Graduação em Música, 2005. v. 1, p. 1238-1245.
______. A Música, o Corpo e as Máquinas. Revista Opus IV (4). 1997a. p. 27-44.
72
______. Interação, Interfaces e Instrumentos em Música Eletroacústica. 1998.
Disponível em: <http://www.unicamp.br/~ihc99/Ihc99/AtasIHC99/AtasIHC98/Lazzetta.pdf>.
Acesso em: jul. 2012.
______. Música e mediação tecnológica. São Paulo: Perspectiva, 2009.
Disponível em: http://mitpress.mit.edu/books/cracked-media. Acesso em: 19 fev. 2014.
______. Performance na Música Experimental. In: PERFORMA ´11 – ENCONTROS
DE INVESTIGAÇÃO EM PERFORMANCE. Aveiro: 2011. Disponível em:
<http://performa.web.ua.pt/pdf/actas2011/FernandoIazzetta.pdf>. Acesso em: abr. 2014
______. Revendo o papel do instrumento na música eletroacústica. In: Anais do II
Encontro de Música Eletroacústica. Brasília, 1997b. Disponível em:
<http://www.eca.usp.br/prof/iazzetta/tutor/audio/sintese/sintese.html>. Acesso em: 08 dez.
2013.
______. Sons de Silício: Corpos e Máquinas Fazendo Música. Tese de Doutorado em
Comunicação e Semiótica, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 1996.
______. Um novo músico chamado usuário. Anais do I Simpósio Internacional de
Computação e Música, Caxambú, Minas Gerais, Agosto de 1994.
INUDGE. Web arte interativa, composição em loop. Disponível em:
<http://www.inudge.net/index.en.html>. Acesso em: 25 ago. 2013.
JAFFE, D. A., & Schloss, W. A. The Computer-Extended Ensemble. Computer Music
Journal, 18(2), 78-86. 1994.
JOHNSON, Steven. Cultura da interface como o computador transforma nossa maneira
de criar e comunicar. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.
JORDÀ, Sergi. Digital Luthieri: crafting musical computers for new music’s
performance and improvisation. Tese. Universitat Pompeu Fabra. Barcelona, 2005b.
KELLY, Caleb. Cracked Media: The Sound of Malfunction. Massachussets / Londres: The
MIT Press, 2009.
KOELSE. Coletivo finlandês de alteradores de circuito. Disponível em:
<http://koelsedoc.wordpress.com/>. Acesso em: 10 jan. 2014.
LEE, Allan S. C. Granular Synthesis in Csound. In: The Csound Book, MIT Press ,
Massachussets, 2000.
LEVY, Pierre. As tecnologias da inteligência. Rio de Janeiro: 34, 1993.
MENEZES, Flo. Acústica musical em palavras e sons. Ateliê Editorial, São Paulo, 2004.
MESSA DI VOCE. Desenvolvido por: Jaap Blonk e Joan La Barbara. Descrição de
performances e instalações audiovisuais. Disponível em: <http://www.tmema.org/messa/>.
Acesso em: 25 nov. 2013.
73
MILETTO, Evandro Manara. Introdução à Computação Musical. IV Congresso Brasileiro
de Computação, Itajaí, 2004.
MIRANDA, Eduardo Reck. WANDERLEY, Marcelo. New Digital Instruments: control and
interaction beyond keyboard. Middletown: A-R Editions, 2006.
MISKALO, V. K. . Dimensões temporais da obra musical e a influência da performance
na criação de música eletroacústica interativa. In: Simpósio Rumos Arte Cibernética, São
Paulo, 2011. Disponível em:
<http://sites.itaucultural.org.br/rumosartecibernetica/papers.html>. Acesso em: 12 mar. 2013.
______. A Performance enquanto Elemento Composicional na Música Eletroacústica
Interativa. Dissertação de mestrado, 2009.
MORAES, R. B. ANÁLISE E SÍNTESE DE INSTRUMENTOS MUSICAIS DE SOPRO
DE MADEIRA. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brazil. 2007.
NESPOLI, Eduardo. Reflexões acerca da metamorfose maquínica nos instrumentos
sonoros. IV Seminário Música Ciência e Tecnologia: fronteiras e rupturas. 2012.
PANETONE. Desenvolvido por: Cristiano Rosa. Apresenta algumas de suas performances e
projetos. Disponível em: <http://panetone.net/>. Acesso em: 16 jun. 2012.
PATRÍCIO, E. L. B. Instrumentos musicais digitais – uma abordagem composicional. 2010.
PREECE, Jennifer; ROGERS, Yvone; SHARP, Helen. Design de Interação: Além da
Interação homem computador. Editora Bookman, São Paulo, 2005.
PUCKETTE, Mille. Theory and Techniques for Electronic Music. Ed. Miller Puckette.
RATTON, M., “Tecnologia dos Instrumentos Eletrônicos”, Revista Áudio, Música &
Tecnologia, edição 119, agosto de 2001.
ROCHA, Cleomar. Três concepções de interfaces computacionais na arte tecnológica. 9°
Encontro Internacional de Arte e Tecnologia. 2010.
SÁ, Simone Pereira. A música na era de suas tecnologias de reprodução. ANAIS da XV
COMPÓS. Bauru, 2006.
TRUEMAN, Dan; COOK, Perry. BoSSA: the deconstructed violin reconstructed. Journal
of New Music Research. vol. 29, n. 2, p. 121-130. jun. 2000.
TUBINGISCHE. Berichte von gelehrten Sachen. XXX, 1754, p. 395.
VEDANA, Viviane. Diálogos entre a imagem visual e a imagem sonora: a experiência de
escritura do sonoro nos documentários etnográficos. UFRGS, 2011.
WANDERLEY, Marcelo. Instrumentos Musicais Digitais - Gestos, Sensores e Interfaces.
In: ILARI, Beatriz (Ed.). Em Busca da Mente Musical. Curitiba, Brasil: Editora da
Universidade Federal do Paraná, 2006.
74
ZAGONEL, B. O Que É Gesto Musical. São Paulo: Brasiliense, 1992.
ZUBEN, Paulo. Música e tecnologia: o som e seus novos instrumentos. Editora Irmãos
Vitale, 2004.
75
ANEXO A – Roteiro do DVD anexo
Para ilustrar e exemplificar alguns aspectos de nossa pesquisa, elaboramos uma coletânea de
arquivos audiovisuais relacionados aos principais efeitos sonoros mencionados do texto.
A1 –Silent Drum - Jaime Oliver
Jaime Oliver executando sua composição “Silent Construction” para Silent Drum (2009).
A2 – Audio Shaker
Interface criada por Mark Hauenstein e Tom Jenkins.
A3 – Yamaha WX11
Controlador monofônico WX11 produzido pela Yamaha Corporation.
A4 – Cracklebox
Interface construída nesta pesquisa.
A5 – Oscilador onda quadrada a duas vozes
Interface construída nesta pesquisa.
A6 – Pulso
Interface construída nesta pesquisa.
76
ANEXO B – Regras de hacking de Nicolas Collins

Documentos relacionados