crda - centro de referência em distúrbios de aprendizagem cláudia

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crda - centro de referência em distúrbios de aprendizagem cláudia
1
CRDA - CENTRO DE REFERÊNCIA EM
DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM EDUCAÇÃO ESPECIAL
CLÁUDIA BARLETTA SALVADOR
REFLEXÕES SOBRE A INCLUSÃO
SÃO PAULO
2009
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CRDA - CENTRO DE REFERÊNCIA EM
DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
EM
EDUCAÇÃO ESPECIAL
CLÁUDIA BARLETTA SALVADOR
REFLEXÕES SOBRE A INCLUSÃO
Monografia apresentada como parte
dos requisitos para aprovação no
Curso de Especialização Lato Sensu
em Educação Especial e submetida
ao Centro de Referência em
Distúrbios de Aprendizagem –
CRDA, sob orientação da Profª. Ms.
Fabiana Maria Gomes Lamas
3
A meu marido e meu filho, pais,
irmãos e amigos pelo apoio
recebido durante a elaboração
deste trabalho e todo o curso.
4
ÍNDICE
INTRODUÇÃO.................................................................................................. 8
CAPÍTULO 1
1 INCLUSÃO.................................................................................................... 10
1.1 Inclusão no contexto educacional.............................................................. 10
1.2 Escolas Inclusivas..................................................................................... 15
1.3 Para incluir é preciso recriar o modelo educativo..................................... 17
1.3.1 A importância da Gestão Escolar........................................................... 22
1.4 A formação e atuação do professor.......................................................... 26
1.6 Família/Escola Inclusiva............................................................................ 29
CAPÍTULO 2
2 DESENVOLVIMENTO INFANTIL/NECESSIDADES ESPECIAIS .............. 31
2.1 Períodos do desenvolvimento.................................................................. 33
2.2 Desenvolvimento emocional...................................................................... 37
2.3 As Emoções e as Interações humanas..................................................... 38
2.4 Interação social......................................................................................... 39
2.5 A importância da afetividade no desenvolvimento e na Inclusão...........
40
CAPÍTULO 3
3 INCLUSÃO E LEGISLAÇÃO ATUAL........................................................... 43
3.1 Questão legal............................................................................................ 44
CONCLUSÃO................................................................................................. 58
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................... 60
5
RESUMO
O presente trabalho é uma reflexão acerca da Inclusão, tema de muitos debates,
tanto no contexto social como no contexto escolar, e de como os estímulos
fornecidos pelo educador em conjunto com a família e as leis existentes podem
ampliar o conhecimento e auxiliar os alunos que dela se beneficiam.
A busca pelos direitos sociais iguais vem destacando a importância da educação
escolar das pessoas com necessidades especiais na rede regular de ensino, por
considerar que somente dessa forma as pessoas poderão desenvolver-se
plenamente como seres humanos que são e assim viverem plenamente como
sujeitos sociais.
A inclusão é uma proposta, um ideal. Se quisermos que nossa sociedade seja
acessível e que todas as pessoas possam dela participar com igualdade de
oportunidades, é preciso fazer desse ideal uma realidade a cada dia.
Palavras-chave: inclusão, afetividade, educação, sociedade.
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ABSTRACT
This work is a reflection of the inclusion, the subject of much debate in both the
social context and the school context, and how the incentives provided by the
educator with the family and existing laws may increase the knowledge and assist
students who her benefit.
The quest for equal social rights has been emphasizing the importance of
education for people with special needs in the regular education system,
considering that the only way people can develop themselves fully as human
beings
who
are
living
fully
and
well
as
social
subjects.
Inclusion is a proposal, an ideal. If we want our society to be accessible and that
all people can participate with it opportunities, we must make that ideal a reality
every day.
Keywords: inclusion, affection, education, society.
7
“Ensinar exige risco, aceitação
do novo e rejeição a qualquer
forma de discriminação.”
Paulo Freire
8
INTRODUÇÃO
Para a realização deste trabalho, utilizamos pesquisa bibliográfica,
leituras e conhecimentos adquiridos. A partir disso, registramos nas páginas que
seguem os fundamentos deste Trabalho de Conclusão de Curso.
Coletamos a visão de vários autores como: Mantoan e Pietro (2003,
2005), Aranha (1994), Piaget (1978), Pacheco (2007), Mittler (2003), entre outros,
que de forma semelhante, orientam em sua bibliografia pais e educadores para
lidar com o desenvolvimento infantil e mais especificamente com crianças
inclusivas.
A escolha da bibliografia, e o critério de pesquisa que utilizamos
possibilitou-nos abranger uma parte do problema em suas mais variadas
dimensões. Esta pesquisa não baseou-se em critérios numéricos para garantir a
sua representatividade, mas sim, na qualidade dos autores pesquisados.
Atualmente, a inclusão é tema de muitos debates tanto no contexto social
como no escolar. A idéia que se tem de inclusão é a de fazer parte, inserir-se
numa totalidade. Neste sentido, a inclusão na perspectiva educacional significa
que as escolas devem possibilitar o acesso de todas as crianças aos meios
regulares de ensino sem que haja barreiras de participação dos alunos no
processo de ensino e aprendizagem.
É nesse sentido que, quando se fala em inclusão, é importante deixar
claro que ela não se refere somente a alunos com necessidades educacionais
especiais, mas também a todas as crianças, independentemente de cor, raça,
religião, condição física. Contudo, para que as escolas desempenhem realmente
este papel, há de se reconhecer que é necessária uma série de medidas que
ofereçam essas oportunidades, tendo em vista que a escola sempre esteve
acostumada a trabalhar o ensino de forma homogênea.
Entendemos ainda que, a partir da relação afetiva, qualquer manifestação
comportamental pode ser “aperfeiçoada e modificada” se existir uma troca
significativa entre as pessoas envolvidas. A postura emocional e afetiva melhora a
qualidade de vida das crianças com dificuldades de aprendizagem, a partir do
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comprometimento e envolvimento constantes para integrar essas crianças ao
meio social.
Numa visão mais política educacional, o professor Paulo Freire propõe a
postura do educador como alicerce fundamental para as relações educador e
aluno, partindo do pressuposto que deve existir uma troca constante que servirá
como meio para driblar as dificuldades específicas de cada um.
10
CAPÍTULO I
INCLUSÃO
1.1 Inclusão no contexto educacional
Conceito
É dentro do contexto da educação geral que devem estar presente os
princípios e as propostas que definem a “Política de Educação Especial
Brasileira”.
A expressão necessidades educacionais especiais pode ser utilizada para
referir-se a crianças e jovens cujas necessidades decorrem de sua elevada
capacidade ou de suas dificuldades para aprender. Tornou-se bastante
conhecida no meio acadêmico, no sistema escolar, nos discursos oficiais e
mesmo no senso comum. Surgiu na intenção de atenuar ou neutralizar a acepção
negativa da terminologia adotada para distinguir os indivíduos em suas
singularidades por apresentarem limitações.
A palavra inclusão vem do verbo incluir, que significa, segundo o Dicionário
Melhoramentos (1977) – inserir, introduzir, abranger, compreender, fazer parte.
Segundo Mantoan, em entrevista a Revista Nova Escola,
Inclusão é a nossa capacidade de entender e reconhecer o outro
e, assim, ter o privilégio de conviver e compartilhar com pessoas
diferentes de nós. A educação inclusiva acolhe todas as pessoas,
sem exceção. É para o estudante com deficiência física, para os
que têm comprometimento mental, para os superdotados, para
todas as minorias e para a criança que é discriminada por
qualquer outro motivo. (Mantoan, 2005)
11
Mazzotta (1996), define Educação Especial como:
A modalidade de ensino que se caracteriza por um conjunto de
recursos e serviços especiais organizados para apoiar,
suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços
educacionais comuns.
O termo "inclusão social" tem sido bastante discutido, frente ao conceito
utilizado anteriormente, de "integração social”. Porém, há várias maneiras de
definir este termo, que introduz um novo paradigma em nossa sociedade e marca
uma nova etapa no processo de conquista dos direitos por parte das pessoas com
necessidades especiais.
Segundo Mantoan e Pietro (2006, p.14) o processo de integração escolar
tem sido entendido de diversas maneiras. O uso do vocábulo “integração” referese mais especificamente à inserção de alunos com necessidades especiais nas
escolas comuns, mas seu emprego dá-se também para designar alunos
agrupados em escolas especiais para pessoas com deficiência, ou mesmo em
classes especiais, grupos de lazer ou residências para deficientes.
Os movimentos em favor da inclusão de crianças especiais
surgiram nos Países Nórdicos, em 1969, quando se questionaram
as práticas sociais e escolares de segregação. Sua noção de base
é o princípio de normalização, que, não sendo específico da vida
escolar, atinge o conjunto de manifestações e atividades humanas
e todas as etapas da vida das pessoas, sejam elas afetadas ou
não por uma incapacidade, dificuldade ou inadaptação.
(MANTOAN e PIETRO, 2006, p.14)
Como todo e qualquer cidadão, a pessoa com deficiência tem direito à
educação pública e gratuita assegurada por lei, preferencialmente na rede regular
de ensino e, se for o caso, à educação adaptada às suas necessidades em
escolas especiais, conforme estabelecido nos artigos 58 e seguintes da Lei
Federal 9.394, de 20 de dezembro de 1996, art. 24 do Decreto 3.298/99 e art. 2º
da Lei 7.853/89.
De acordo com os parâmetros curriculares nacionais:
“O direito da pessoa à educação é resguardado pela política
nacional de educação independentemente de gênero, etnia, idade
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ou classe social. O acesso à escola extrapola o ato da matrícula e
implica apropriação do saber e das oportunidades educacionais
oferecidas à totalidade dos alunos com vistas a atingir as
finalidades da educação, a despeito da diversidade na população
escolar." (PCN, 1999)
De acordo com a Lei 9394/96 - Capítulo V - Art. 58 “Entende-se por
educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar,
oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos
portadores de necessidades especiais.”.
Desse modo, inclusão no campo da Educação Especial, tem a intenção de
que todos os alunos sejam incluídos nas escolas regulares e não apenas
colocados nas classes comuns.
A Inclusão não deve ser vista somente como uma palavra bonita, ou um
vocábulo da moda, mas deve sim, ser encarada como mudanças na
compreensão do que sejam as diferenças de um modo natural e sem
preconceitos de nossa parte. A inclusão se aplica a todas as crianças, sem
excluirmos as incapacidades severas.
“As escolas regulares, seguindo esta orientação inclusiva,
constituem os meios mais capazes para combater as atitudes
discriminatórias, criando comunidades abertas e solidárias,
construindo uma sociedade inclusiva e atingindo a educação para
todos; além disso, proporcionam uma educação adequada à
maioria das crianças e promovem a eficiência, numa ótima relação
custo-qualidade, de todo o sistema educativo.” (Declaração de
Salamanca, 1994, p.7)
Baseados nos dados acima, temos então o dever, de lutarmos contra todo
tipo de preconceitos existentes na sociedade em relação ao deficiente e
procurarmos fazer com que suas habilidades se sobressaiam em relação às
incapacidades. Essas medidas farão surgir a escola verdadeiramente Inclusiva.
A questão, entretanto, é que não se deve simplesmente colocar a criança
com deficiência em uma classe comum da escola regular, esse é, sem dúvida, um
passo importante e na direção certa, mas isso não é Educação Inclusiva.
Para que a inclusão ocorra efetivamente, é fundamental que as crianças
com dificuldades tenham o apoio de que precisam, isto é, acesso físico,
equipamentos para locomoção, comunicação ou outros tipos de suporte.
De
acordo com os PCNs a prática da Educação Inclusiva pressupõe que o professor,
13
a família e toda a comunidade escolar estejam convencidos de que o objetivo da
Educação Inclusiva é garantir que todos os alunos com ou sem deficiência
participem ativamente de todas as atividades na escola e na comunidade. (2005,
p. 16 e 20)1
(...) Cada aluno é diferente no que se refere ao estilo e ao ritmo
da aprendizagem. E essa diferença é respeitada numa classe
inclusiva.
- Os alunos com deficiência não são problemas. A Escola
Inclusiva entende esses alunos como pessoas que apresentam
desafios à capacidade dos professores e das escolas para
oferecer uma educação para todos, respeitando a necessidade de
cada um.
- Todos os alunos se beneficiam de um ensino de qualidade e a
Escola Inclusiva apresenta respostas adequadas às necessidades
dos alunos que apresentam desafios específicos.
- É o aluno que produz o resultado educacional, ou seja, a
1
aprendizagem. (2005, p. 16 e 20)
Origens
Segundo Mazzota (1996), o atendimento escolar especial aos
portadores de deficiência no Brasil teve seu início por volta de 1854, quando o
Imperador D. Pedro II fundou, no Rio de Janeiro, o Imperial Instituto de Meninos
Cegos. Três anos após, em 1857, o Imperador criou o Imperial Instituto dos
Surdos-Mudos. Anos depois, 1890, já no período republicano de nossa história, o
primeiro passou a denominar-se Instituto Benjamin Constant – IBC – em
homenagem a seu ex-professor de Matemática e ex-diretor, Benjamin Constant
Botelho de Magalhães. O segundo somente ao completar seu primeiro
centenário, em 1957, é que passou a denominar-se Instituto Nacional de
Educação de Surdos – INES.
_______________________
1
Texto retirado do livro “Educação Inclusiva: o que o professor tem a ver com isso?” Imprensa
Oficial e Ashoka Empreendedores Sociais, São Paulo, 2005, p. 16 e 20.
14
Mazzota (1996), ainda coloca que, no começo deste século, alguns
trabalhos científicos já eram publicados fazendo referência à educação dos
portadores de deficiência mental. Exemplo típico foi à monografia intitulada “Da
Educação e Tratamento Médico - Pedagógico dos Idiotas”, apresentada pelo Dr.
Carlos Eiras, durante o IV Congresso Brasileiro de Medicina e Cirurgia, no Rio de
Janeiro, em 1900.
Destaca-se, então, que até 1950, havia no país cerca de quarenta
estabelecimentos de ensino regular mantidos pelo poder público, que prestavam
algum tipo de atendimento escolar especial a deficientes mentais. Já o
atendimento especializado a deficientes físicos (não-sensoriais) com propósitos
educacionais só foi iniciado na década de 1930, em São Paulo, na Santa Casa de
Misericórdia.
Uma análise retrospectiva da educação especial no Brasil evidencia
que sua trajetória acompanha a evolução da conquista dos direitos humanos.
Partindo desse pressuposto, todos os alunos que tenham alguma deficiência,
devem ser inseridos na escola regular e tratados como crianças normais,
levando-se em consideração o que assegura o Estatuto da Criança e do
Adolescente, que consolida antigas normas que a experiência brasileira mostrou
serem
adequadas
para
a
condição
infanto-juvenil,
inovando
com
o
estabelecimento de princípios que criam condições para a melhoria do padrão de
vida dos brasileiros, lutando sempre pelo exercício de cidadania que lhes é
inerente (MAZZOTTA, 1996).
Assim durante séculos, os deficientes foram considerados seres
distintos e à margem dos grupos sociais. Mas à medida que os direitos do homem
à igualdade e à cidadania tornaram-se motivo de preocupação dos pensadores, a
história da educação especial começou a mudar. É claro que esta mudança é
considerada uma conquista mundial devido aos acordos internacionais que o país
mantém com entidades, como por exemplo, a ONU (Organização das Nações
Unidas), a OMS (Organização Mundial de Saúde) e a OIT (Organização
Internacional do Trabalho).
Há cerca de um século, as iniciativas governamentais, no âmbito da
educação especial, foram assistemáticas e praticamente inexistentes. Pela falta
15
de atendimento, vários segmentos da sociedade organizaram-se no sentido de
criar serviços especializados para os educandos portadores de deficiências.
No Brasil, as iniciativas governamentais em Educação Especial
surgiram em um Movimento Político tipicamente populista (1955 – 1964). Esse
movimento deu origem às associações de pais, amigos, técnicos e professores,
interessados em suprir as carências do sistema governamental.
A partir de 1981, com o advento do Ano Internacional das Pessoas
Portadores de Deficiências declarado pela ONU, houve maior conscientização por
parte desse numeroso segmento, que representa cerca de 10% da população
brasileira. Surgiram, então, as associações fundadas por pessoas portadoras de
deficiência, de condutas típicas e de altas habilidades, com o objetivo de defender
e garantir seus direitos (MEC/PNEE, 1997).
Tais associações tomaram vulto, representando, até hoje, papel
significativo
no atendimento educacional especializado.
Na maioria dos
municípios brasileiros são elas que, em convênio com o Governo, prestam
atendimento educacional. Têm igualmente atuação na conscientização da
comunidade. Desenvolvem importante trabalho para a remoção das barreiras e
preconceitos existentes, contribuindo para o cumprimento da legislação, o
redimensionamento do espaço urbano, para as adaptações nos serviços de
transporte, a organização do mercado de trabalho, e a melhoria da qualidade do
sistema de ensino. Essa atuação tem provocado em última instância, uma
mudança de atitude na sociedade brasileira, tornando-a lenta e progressivamente
mais receptiva à conquista da cidadania por portadores de deficiências (MEC,
1997).
1.2 Escolas Inclusivas
Segundo Mittler (2003), a inclusão não diz respeito a colocar as crianças
nas escolas regulares, mas a mudar as escolas para torná-las mais responsivas
às necessidades de todas as crianças; diz respeito a ajudar todos os professores
a aceitarem a responsabilidade quanto à aprendizagem de todas as crianças nas
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suas escolas e prepará-los para ensinarem aquelas crianças que estão atual e
correntemente excluídas das escolas por qualquer razão. Isto se refere a todas as
crianças que não estão beneficiando-se com a escolarização, e não apenas
àquelas. (MITTLER, 2003, p. 16)
Segundo Mantoan e Pietro (2006, p.15) nos debates atuais sobre inclusão,
o ensino escolar brasileiro tem diante de si um desafio de encontrar soluções que
respondam a questão do acesso e da permanência dos alunos nas suas
instituições educacionais.
Algumas escolas públicas e particulares já adotaram ações nesse
sentido, ao proporem mudanças na sua organização pedagógica,
de modo a reconhecer e valorizar as diferenças, sem discriminar
os alunos nem segregá-los. Apesar das resistências, cresce a
adesão de redes de ensino, de escolas e de professores, de pais
e de instituições dedicados à inclusão de pessoas com
deficiência, o que denota o efeito dessa experiência e, ao mesmo
tempo, motiva questionamentos. Mantoan e Pietro (2006, p.15)
De acordo com as autoras nosso sistema educacional, diante da
democratização do ensino, tem vivido muitas dificuldades para equacionar uma
relação complexa, que é a de garantir escola de qualidade para todos.
E a
inclusão ainda torna esse panorama mais confuso, já que o problema escolar
brasileiro é dos mais difíceis, diante do número de alunos que precisam ser
atendidos, das diferenças regionais, do conservadorismo das escolas, entre
outros fatores igualmente importantes.
A verdade é que o ensino escolar brasileiro continua aberto a
poucos, e essa situação se acentua drasticamente no caso dos
alunos com deficiência. O fato é recorrente em qualquer ponto de
nosso território, na maior parte de nossas escolas, públicas ou
particulares, e em todos os níveis de ensino, mas, sobretudo nas
etapas do ensino básico: educação infantil, ensino fundamental e
ensino médio. (MANTOAN e PRIETO 2006, p.23)
Muito se têm discutido sobre a inclusão, em livros, palestras, artigos, todos
buscando a compreensão e o modo mais adequado de transformar as escolas de
ensino comum em escolas inclusivas. Mas, de acordo com Mantoan ainda
existem muitas barreiras que impedem a transformação de nossas escolas: “O
corporativismo dos que se dedicam às pessoas com deficiência e a outras
minorias, principalmente dos que tratam de pessoas com deficiência mental; a
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ignorância de muitos pais, a fragilidade de grande maioria deles diante do
fenômeno da deficiência de seus filhos.”
1.3 Para incluir é preciso recriar o modelo educativo
“A educação especial, desde o seu surgimento no final do Século
XVIII, atende a dois interesses contraditórios: o de oferecer
escolaridade a crianças anormais, no mesmo tempo em que serve
de instrumento básico para segregação do indivíduo deficiente.
(BUENO, 1997, p.38)
Segundo Mantoan (2003, p. 33) “não se pode encaixar um projeto novo,
como é o caso da inclusão, em uma velha matriz de concepção escolar — daí a
necessidade de se recriar o modelo educacional vigente”.
Para a autora, escolas que reconhecem e valorizam as diferenças
apresentam projetos inclusivos de educação e o ensino que oferecem difere
totalmente do proposto para atender às especificidades dos educandos que não
conseguem acompanhar seus colegas, por problemas de deficiências até outras
dificuldades como a relacional, motivacional ou cultural de seus alunos.
Nesse sentido, elas contestam e não adotam o que é tradicionalmente
utilizado para dar conta das diferenças nas escolas: as adaptações de currículos,
a facilitação das atividades e os programas para reforçar aprendizagens, ou
mesmo para acelerá-las, em casos de defasagem idade/série escolar.
Superar o sistema tradicional de ensinar é um propósito que
temos de efetivar com toda a urgência. Essa superação refere-se
ao “que” ensinamos aos nossos alunos e ao “‘como” ensinamos,
para que eles cresçam e se desenvolvam, sendo seres éticos,
justos, pessoas que terão de reverter uma situação que não
conseguimos resolver inteiramente: mudar o mundo e torná-lo
mais humano. Recriar esse modelo tem a ver com o que
entendemos como qualidade de ensino. (MANTOAN, 2003, p.34)
Mantoan acrescenta que ainda vigora a visão conservadora de que as
escolas de qualidade são as que ensinam a seus alunos datas, fórmulas,
conceitos, fragmentados. Esse tipo de ensino, resulta da supervalorização do
conteúdo acadêmico em todos os seus níveis. Persiste a idéia de que as escolas
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de qualidade são as que centram a aprendizagem no racional, no aspecto
cognitivo do desenvolvimento, e que avaliam os alunos, quantificando respostaspadrão. “Seus métodos e suas práticas preconizam a exposição oral, a repetição,
a memorização, os treinamentos, o livresco, a negação do valor do erro. São
aquelas escolas que estão sempre preparando o aluno para o futuro: seja este a
próxima série a ser cursada, o nível de escolaridade posterior ou os exames
vestibulares!”
Uma escola se distingue por um ensino de qualidade, capaz de
formar pessoas nos padrões requeridos por uma sociedade mais
evoluída e humanitária, quando consegue: aproximar os alunos
entre si; tratar as disciplinas como meios de conhecer melhor o
mundo e as pessoas que nos rodeiam; e ter como parceiras as
famílias e a comunidade na elaboração e no cumprimento do
projeto escolar. (MANTOAN, 2003, p.34)
De acordo com a autora, encontra-se um ensino de qualidade quando as
ações
educativas
se
baseiam
na
solidariedade,
na
colaboração,
no
compartilhamento do processo educativo com todos os que estão direta ou
indiretamente nele envolvidos.
Vale o que os alunos são capazes de aprender hoje e o que podemos
oferecer-lhes de melhor para que se desenvolvam em um ambiente rico e
verdadeiramente estimulador de suas potencialidades.
Em suma, diz a autora:
“As escolas de qualidade são espaços educativos de construção
de personalidades humanas autônomas, críticas, espaços onde
crianças e jovens aprendem a ser pessoas. Nesses ambientes
educativos, ensinam-se os alunos a valorizar a diferença pela
convivência com seus pares, pelo exemplo dos professores, pelo
ensino ministrado nas salas de aula, pelo clima sócio-afetivo das
relações estabelecidas em toda a comunidade escolar — sem
tensões competitivas, mas com espírito solidário, participativo.
Escolas assim concebidas não excluem nenhum aluno de suas
classes, de seus programas, de suas aulas, das atividades e do
convívio escolar mais amplo. São contextos educacionais em que
todos os alunos têm possibilidade de aprender, freqüentando uma
mesma e única turma.” (MANTOAN, 2003, p.35).
Entendemos que a ação pedagógica diferenciada que sugere a autora,
implica em mudanças sociais profundas. Contudo, implica mais especificamente,
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numa mudança de enfoque da aprendizagem, pelo qual o processo é mai
relevante do que produto da aprendizagem e em que o aluno é sujeito ativo do
seu processo educativo.
A inclusão questiona a educação especial, na sua concepção tradicional,
enquanto a modalidade de ensino que, no dizer de Ferreira “consagra a
deficiência na medida em que se distancia da educação” ao dedicar-se
exclusivamente aos alunos com deficiência. (1994, p. 84, 85)
Para incluir todos os alunos, incondicionalmente, nas turmas escolares e
democratizar a educação, muitas mudanças já estão sendo percebidas em
algumas escolas e redes públicas de ensino.
Segundo Laplane (2004), a educação moderna define seus objetivos em
termos de competências a serem atingidos pelos alunos, então a melhor escola é
aquela que oferece um leque variado de competências e habilidades requeridas
por um mercado de trabalho cada vez mais exigente cada vez mais competitiva.
Para Laplane a escola é uma instituição bastante rígida, que tem
dificuldade para receber, aceitar e trabalhar com a diferença, portanto, qualquer
criança que se afaste dos padrões exigidos, tanto por um desempenho inferior
como por um desempenho superior, deverá enfrentar problemas no seu caminho.
Um dos motivos apresentados por Laplane (2004) é a necessidade da
escola produzir resultados, ou seja, promover o maior número de alunos possível.
Portanto, a convivência entre alunos diferentes (idades, gêneros, níveis de
instrução, modos de aprender, que apresentam algum tipo de deficiência ou que
são mais curiosos ou ativos que a maioria) dificulta o processo de ensino e
contribui para a não realização dos objetivos da escola.
Por isso, as escolas ainda hoje são contra a inclusão, pois “essas crianças”
com necessidades especiais atrapalham o desenvolvimento e bloqueiam o
processo dos demais alunos tidos como normais.
É claro que hoje já sabemos que todos temos a ganhar com a inclusão e
que a criança aprende e se desenvolve mais quando em contato com a
diversidade. Em 1980, as idéias de Vygotsky (1989) já destacavam a importância
da linguagem e do outro no desenvolvimento e na aprendizagem, sendo que o
professor possuía um lugar fundamental no processo de ensino - aprendizagem.
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Na teoria prospectiva de Vygotsky (1989), o indivíduo não possui funções
internas que garantem sozinhas seu desenvolvimento. O simples contato com
objetos por si só não possibilita o desenvolvimento, mas sim as relações sociais,
nas
intervenções
das
pessoas,
principalmente
na
linguagem,
que
o
desenvolvimento ocorre. (p.368)
Sanfelice (1989) já alertava no texto “Escola pública e gratuita para todos,
inclusive para os deficientes mentais” que “não é possível, no princípio de
pedagogia formal, tratar igualmente toda a multiplicidade de substantivas
diferenças que as distintas clientelas incorporam por razões históricas, culturais,
sociais ou mesmo físico – mentais” (p.33).
Por isso, devemos estar cientes que dar oportunidades iguais nem sempre
significa dispensar o mesmo tratamento. A escola deve ter como objetivo
possibilitar o mesmo acesso, o que não significa oferecer os mesmos meios e
caminhos a serem percorridos.
As escolas devem estar preparadas para receber os alunos com
necessidades educacionais especiais, portanto, é comum encontrarmos em
nossas escolas, alunos deficientes freqüentando o ensino regular, sem que a
escola tenha passado por um processo de adequação de procedimentos
didáticos, adaptação de materiais, construção de rampas para deficientes físicos,
entre outros requisitos básicos.
Para que a inclusão aconteça efetivamente é necessário alterar o
direcionamento do currículo e das metodologias e estabelecer apoio efetivo ao
professor, sem isso, as escolas não respondem ao compromisso com o
desenvolvimento e a aprendizagem dos alunos com necessidades educativas
especiais.
O primeiro passo a ser dado em direção a escola inclusiva é sensibilizar e
treinar todos funcionários da escola: professores, orientadores e todo o pessoal
que nela trabalham. É muito importante também sensibilizar os pais, sobretudo os
não - deficientes. Todos, escola e comunidade, devem desempenhar um papel
ativo no processo de inclusão, pois o projeto pedagógico para diversidade se
constitui em um grande desafio para o sistema educativo como um todo e deve
pensar a aprendizagem não apenas na dimensão individual, mas de forma
21
coletiva, manifesta nas formas de interação entre pessoas, escola, família e
comunidade.
Para
Cláudia
Werneck
(1997),
quanto
mais
à
criança
interage
espontaneamente com situações diferenciadas, mas ela adquire o raro
conhecimento e então, fica fácil entender porque a segregação não é prejudicial
apenas ao aluno com deficiência. A segregação prejudica a todos, porque impede
que as crianças das escolas regulares tenham oportunidades de conhecer a vida
humana com todas as suas dimensões e desafios.
Para que a escola seja verdadeiramente inclusiva é preciso que ela tenha
um bom projeto pedagógico, que deve começar pela reflexão. De acordo com
Mantoan (2005), um bom projeto deve valorizar a cultura, a história e as
experiências anteriores da turma, segundo ela, as práticas pedagógicas também
devem ser revistas. Os alunos, deficientes ou não, precisam de liberdade para
aprender do seu modo, de acordo com o seu tempo e suas condições.
Além de um bom projeto pedagógico e de adaptações físicas, a escola
precisa também oferecer atendimento educacional especializado paralelamente
às aulas regulares, de preferência no mesmo local.
Para que a inclusão produza bons resultados, é importante para o aluno
com deficiência que ele tenha contato com o diferente, mas também é importante
que ele tenha contato com seu igual. Por isso, é interessante que em uma sala de
aula, ou até mesmo na escola, não tenha apenas um aluno com necessidades
especiais, para que a criança considerada “diferente” não se sinta tão sozinha
nesse ambiente estranho a ela.
Todavia, como diz Bueno, com relação à inclusão de alunos deficientes no
ensino regular, não se pode deixar de considerar,
Que a perspectiva de inclusão exige, por um lado, modificações
profundas nos sistemas de ensino; que estas modificações [...]
demandam ousadia, por um lado e prudência por outro; - que uma
política efetiva de educação inclusiva deve ser gradativa, contínua,
sistemática e planejada, na perspectiva de oferecer às crianças
deficientes educação de qualidade; e que a gradatividade e a
prudência não podem servir para o adiamento “ad eternum” para a
inclusão [...] devem servir de base para a superação de toda e
qualquer dificuldade que se interponha à construção de uma
escola única e democrática (1997, p. 27).
22
Neste sentido MAZZOTTA (1996, p.75) reforça a idéia que:
No contexto da sociedade democrática que pretendemos construir,
temos que propugnar por uma educação de qualidade para todos,
seja através da “escola democrática”, da “escola para todos”, da
“escola compreensiva”, da “escola integradora”, da “escola
inclusiva”, ou da “escola de candanga”. O fundamental é
compreendermos que sua concretização depende de cada um e
de todos nós, já que a inclusão ou não segregação implica
essencialmente um sentimento ou atitude de respeito ao outro
como cidadão. E tal proposta não comporta qualquer exclusão,
sob qualquer pretexto.
A educação inclusiva implica no envolvimento da sociedade como um todo,
respeitando a individualidade e proporcionando que cada um seja sujeito na
construção da aprendizagem, bem como cidadão apto ao exercício da cidadania.
Diante destas colocações e da nossa realidade, acreditamos que ainda
estamos engatinhando para que a inclusão aconteça de forma efetiva. Por outro
lado, a sementinha da inclusão já foi plantada e aos poucos ela está crescendo e
se fortificando em nosso meio.
1.3.1 A importância da Gestão Escolar
Acredita-se que hoje os gestores devem ser profissionais comprometidos
em atender às diversidades dentro de suas singularidades, buscando a formação
integral do indivíduo e com a formação do cidadão, apto a exercer cidadania.
Cabe aos gestores acompanharem e proporcionarem de perto o
desenvolvimento integral dos educandos, buscando promover por um lado às
conquistas individuais e coletivas e por outro lado, trabalhar com o conhecimento
das diferenças individuais e o respeito por elas por meio de discussões, reflexões,
interação com a família, comunidade, corpo docente e os demais no processo
educativo.
O estudo de organização e de gestão denominado democrático
participativo acentua tanto a necessidade de estabelecer objetivos e
metas quanto a de prever formas organizativas e procedimentos
mais explícitos de gestão e de articulação das relações humanas.
A organização torna-se um agrupamento humano formado por
interações entre pessoas com cargos diferentes, especialidades
distintas e histórias de vidas singulares que, entretanto,
23
compartilham objetivos comuns e decidem, de forma pública,
participativa e solidária, os processos e os meios de conquista
desses objetivos (LIBÂNEO, 2003, p.382).
Por meio desse estilo de gestão, democrático-participativo, a educação
pode ser exercida em sua totalidade. Para tanto, os gestores devem mediar as
inter-relações e interações para que ocorra um processo de ensino-aprendizagem
inclusivo e qualitativo, no qual todos os sujeitos terão voz e vez, ou seja, poderão
cumprir os seus deveres e exigir os seus direitos, de forma que estejam sempre
atentos a legislação e as políticas públicas vigentes.
Segundo Aranha (2004, p.12) a direção de uma escola tem um papel
fundamental na condução da prática educacional, tendo por horizonte os
princípios, objetivos e metas estabelecidos no projeto político-pedagógico. A ela
cabe promover a mobilização dos professores e funcionários e a constituição do
grupo enquanto uma equipe que trabalhe cooperativa e eficientemente.
A direção de uma escola precisa ser dinâmica, comprometida e
motivadora para a participação de todos os atores sociais. Ela necessita saber
delegar poderes e estimular a autonomia, valorizando a atuação e a produção de
cada um. Ela precisa ser uma figura presente, ponto de referência da
personalidade e missão da escola. Precisa, também, ser respeitosa nas relações
interpessoais, inclusive nas ocasiões em que tem que promover ajustes no
percurso de cada agente. (Aranha, 2004)
De acordo com Aranha (1994, p.12), outro papel importante da direção é
exercer liderança na comunidade. Trazer as famílias e demais setores da
comunidade para dentro da escola, promover, em todos, o sentido da
responsabilidade e do cuidado de um bem que é de todos. Contar com a
participação da família e da comunidade, fortalece a segurança e faz com que a
escola caminhe na direção de cumprir com sua missão e persiga nos seus
diferentes objetivos.
Para que a educação efetivamente cumpra com seu papel de reflexão
crítica sobre a sociedade e de favorecimento do exercício da cidadania, a escola
precisa parar para refletir, analisar e planejar. Precisa, também, desenvolver a
24
prática da avaliação contínua e da promoção de ajustes de percurso, sempre
tendo como horizonte o projeto político-pedagógico. (ARANHA, 2004, p.13)
Para Mantoan, a reorganização das escolas depende de uma seqüência de
ações que estão centradas no projeto político-pedagógico. Esse projeto, já
nomeado como “plano de curso” entre outros nomes, é uma ferramenta
fundamental para que as diretrizes gerais da escola sejam traçadas com realismo
e responsabilidade.
Os dados do projeto político-pedagógico elucidam o diretor, professores,
coordenadores, funcionários e pais sobre a clientela e sobre os recursos,
humanos e materiais, de que a escola dispõe.
Os currículos, a formação das turmas, as práticas de ensino e a
avaliação são aspectos da organização pedagógica das escolas e
serão revistos e modificados com base no que for definido pelo
projeto político-pedagógico de cada escola. Sem os
conhecimentos levantados por esse projeto, é impossível elaborar
currículos que reflitam o meio sociocultural do alunado.
O ensino individualizado/diferenciado para os alunos que apresentam
déficits intelectuais e problemas de aprendizagem é uma solução que não
corresponde aos princípios inclusivos, pois não podemos diferenciar um aluno
pela sua deficiência.
De acordo com Mantoan, na visão inclusiva, o ensino diferenciado
continua segregando e discriminando os alunos dentro e fora das salas de aula.
A inclusão não prevê a utilização de práticas de ensino escolar específicas
para esta ou aquela deficiência ou dificuldade de aprendizagem. Os alunos
aprendem nos seus limites e se o ensino for de boa qualidade, o educador levará
em conta esses limites e explorará convenientemente as possibilidades de cada
um.
Não se trata de uma aceitação passiva do desempenho escolar, e sim de
agirmos com realismo e coerência e admitirmos que as escolas existam para
formar as novas gerações, e não apenas alguns de seus futuros membros, os
mais capacitados e privilegiados.
Ao serem modificados os rumos da administração escolar, os papéis e a
atuação de diretor, coordenadores, supervisores e funcionários perdem o caráter
controlador, fiscalizador e burocrático e readquirem teor pedagógico, deixando de
25
existir os motivos pelos quais esses profissionais ficam confinados em seus
gabinetes, sem tempo para conhecer e participar mais intensiva e diretamente do
que acontece nas salas de aula e nos demais ambientes educativos das escolas.
A equipe escolar precisa estabelecer vínculos e relações nos espaços
educativos para que o processo seja coletivo e contínuo. Portanto, fica implícito
no Projeto Político Pedagógico que a finalidade da educação deve estar voltada
para os alunos, neste caso oportunizando a “Educação para Todos”, na qual
todos os alunos tenham as mesmas oportunidades de acesso, permanência e
sucesso escolar, cabendo aos gestores mediarem todas as discussões em torno
da educação inclusiva.
Projeto político pedagógico adequado à demanda, bem como o
atendimento de apoio especializado, metodologias, técnicas, estratégias, que
contemplem tanto o corpo docente (formação continuada) como o corpo discente.
Segundo VEIGA (1995, p.14)
A principal possibilidade de construção do projeto político
pedagógico
passa pela relativa autonomia da escola, da sua capacidade de
delinear sua própria identidade. Isso significa resgatara escola
como espaço público, lugar de debate, do dialogo, fundado na
reflexão coletiva. Portanto, é preciso entender que o projeto
político-pedagógico da escola dará indicações necessárias à
organização do trabalho pedagógico (...).
É pelo Projeto Político Pedagógico que a escola estabelece as relações
com a sociedade na busca de parcerias para sanar ou minimizar as dificuldades
encontradas no decorrer do processo educativo. A escola é desafiada a todo o
momento quando proporciona uma proposta de educação inclusiva, pois é pelas
diversidades que se constroem escolas críticas, responsáveis e comprometidas
com a formação de cidadãos atuantes reflexivos na sociedade em que vivem.
Ressalta-se a importância da construção coletiva do Projeto Político
Pedagógico por todos os envolvidos no processo educativo, logo que por meio
deste documento são propostos momentos e atividades que devem contemplar os
diferentes setores, de maneira que os sujeitos possam participar democrática e
reflexivamente, superando as limitações e batalhando por um ensino interativo e
qualitativo que resulte em uma aprendizagem e crescimento significativos para
todos os envolvidos no processo educativo.
26
Nesta concepção de totalidade cabe os gestores participarem, mediarem,
construírem o processo educativo com os demais envolvidos. E, a equipe gestora
precisa articular o processo da educação inclusiva, oportunizar a integração entre
todos os envolvidos no processo educativo, estabelecer relações e inter-relações
entre toda comunidade escolar e contemplar todos os educandos, considerando
suas diferenças individuais e ressaltando as suas potencialidades.
Todos os setores da escola devem se “comunicar” de maneira que a
proposta, a fala e a ação sejam coerentes.
É imprescindível que a gestão escolar esteja voltada para o que ocorre no
cotidiano escolar (escola, família, comunidade), pois todos os acontecimentos
relacionados ao aluno afetam diretamente seu desempenho escolar e suas
atitudes/ comportamentos. Se o aluno é aceito na sua totalidade sente-se
integrado na escola.
1.4 A formação e atuação do professor
O século XXI tem sido um marco para as transformações para a inserção
na sociedade, com várias tentativas de mudança.
A formação de profissionais da educação tem novas propostas para o
aprimoramento da qualidade. Uma delas diz respeito ao atendimento ás
necessidades educacionais especiais.
Cabe ao professor a responsabilidade de assegurar a todos o direito à
educação. O professor é o centro deste processo.
De acordo com Mittler (2003, p.35) todo professor tem o direito de receber
preparação apropriada na formação e desenvolvimento profissional contínuo
durante sua vida de trabalho.
Essa formação deve ser repesada envolvendo a ampliação de habilidades
para o trabalho inclusivo em seus diversos níveis. Essa formação se torna cada
vez mais necessária devido às dificuldades que os professores têm ao lidar com
alunos especiais. O professor deverá ser formado para detectar diferenças e
necessidades diferenciadas nos alunos, alertando-se para os sinais que apontam
tais diferenças.
27
A LDB (1996) , artigo 59, inciso III, estabelece que alunos com
necessidades especiais terão professores com especialização adequada, em
nível médio e superior, para atendê-los.
Essa capacitação está de acordo com a Resolução CNE/CEB nº2, de
11/09/2001, artigo 18, inciso 1º que diz que para os professores serem
considerados aptos para atuar em classes comuns, com alunos com
necessidades especiais, eles terão que comprovar, em sua formação, conteúdos
didáticos e teóricos sobre educação especial. Essa formação possui perfis
distintos do ensino comum e determina que os professores desenvolvam
competências para que eles sejam capazes de identificar as necessidades
especiais e promovam estratégias de flexibilização, adaptação de currículos,
procedimentos didáticos, pedagógicos e práticas alternativas de atendimento.
A importância não é somente a formação com vistas à inclusão, como
também valorizar as estratégias já existentes, adquiridas na formação inicial, para
o desenvolvimento na formação continuada.
Essa mesma Resolução aponta a possibilidade de oferecimento de
formação continuada aos professores que já exercem o magistério, inclusive em
nível de especialização.
A formação continuada é muito importante no sentido de tornar possível a
atualização novas aprendizagens e reflexões. O trabalho com alunos com
necessidades educacionais especiais nas classes regulares de ensino, requer
uma formação específica para tratar das especificidades de cada tipo de
deficiências ou necessidade, para a completa integração nas classes.
Para se atingir a prática inclusiva enfrenta-se muitas dificuldades. O mais
complicado é a sensibilização de educadores, principalmente professores,
capazes de planejar estratégias de capacitação para o atendimento aos alunos
com necessidades especiais.
A formação de novos professores tem que corresponder às demandas
decorrentes das necessidades pessoais dos alunos. Isso requer uma avaliação de
quais conhecimentos se devem partir, em detrimento de uma capacitação
eficiente. Para tanto tem-se pensado em várias estruturas e lançadas as bases
para o desenvolvimento profissional de que o professor precisa para aquisição de
habilidades para o ensino inclusivo.
28
Por esse motivo, principalmente, o processo de desenvolvimento
profissional requer a formação inicial e a continuada, que assegure a qualificação
com as novas descobertas, temas e tecnologias envolvidas com a educação
inclusiva.
Muito mais que o compromisso de transformação da realidade, a formação
de professores, para a inclusão social, tem um papel importante no processo de
reforma educacional, complementando a formação como um todo.
O acesso de todas as crianças aos meios regulares de ensino tem sido um
grande desafio, levando-se em consideração a necessidade de superação da
qualidade, a conscientização do pleno exercício da cidadania e democracia.
A inclusão surge como uma nova abordagem educacional tornando-se
mais eficiente quando se leva em conta as diferenças individuais.
Apesar de a educação especial ser um campo que exige um preparo
profissional diferenciado, a inclusão requer que todas as crianças sejam atendidas
em escolas regulares e que elas sejam aceitas em todas as esferas da sociedade
sem negar o suporte paralelo oferecido pela educação especial.
Em todo o mundo já existem ações para que a educação inclusiva se torne
possível.
O magistério, bem como qualquer outra profissão, em sua trajetória
histórica, vem sentido a necessidade de se adequar às novas exigências para a
formação e atualização do professor na escola.
A nova concepção de educador está sendo elaborada de acordo com
discussões com temas sociais. Mesmo com algumas medidas de cunho didático,
pesquisas em instituições de ordem social e educacional que viabilizem a
capacitação
do
profissional
da
educação,
ainda
se
revelam
atuações
insatisfatórias de profissionais da educação.
Então o modelo de profissionalismo desejado requer uma fundamentação
mais rígida, criteriosa, com maior atenção voltada á pesquisa.
A
qualificação
específica
para
a
educação
inclusiva
requer
um
compromisso com a esfera social, que, na maioria das vezes, os profissionais não
se sentem preparados.
29
Esse tema implica em intermináveis discussões, onde questões de alta
controversa se fazem sentir. Os pontos de problematização que ele insere vão
carecer de estudos que serão, sem dúvida, o maior desafio para a Educação.
1.5 Família/Escola Inclusiva
O papel dos pais na inclusão de seus filhos é de grande importância. O
relacionamento entre os pais com filhos portadores de necessidades especiais,
professores e profissionais da escola está entre os mais difíceis e, ao mesmo
tempo, duradouros. Quando famílias e profissional interagem com um grande
número de variáveis, afeta o estabelecimento e a manutenção de uma interação
eficaz entre eles.
Os professores se queixam da apatia e indiferença dos pais; falta de
tempo, energia e compreensão em relação às necessidades da escola; a falta de
compreensão do sistema escolar; a ausência do pai nas reuniões escolares; e o
não reconhecimento do trabalho realizado pela escola em benefício de seus
filhos. Por sua vez, os pais queixam-se desde os problemas com horários e a
duração das reuniões e a falta de transporte até os de comunicação entre a
escola e pais (uso de linguagem técnica), sentimentos de inferioridade por parte
deles quando interagem com profissionais e incertezas sobre as dificuldades de
seu filho e suas conseqüências e sobre como eles e a escola podem se ajudar.
Quando esses problemas no relacionamento não são resolvidos, podem criar um
muro invisível separando a família e a escola, desta forma, a tendência é colocar
a culpa no outro.
Hoje em dia tem se percebido que esse muro, aos poucos, vai sendo
demolido e as famílias estão cada vez mais participando do processo de tomada
de decisão sobre procedimentos e condutas a serem adotadas e sendo
informadas sobre o progresso de seu filho.
No que se refere ao papel da família nesse processo de inclusão, a
Declaração de Salamanca demanda que se:
30
“(...) encorajem e facilitem a participação de pais, comunidade e
organizações de pessoas portadoras de deficiências nos processos de
planejamento e tomada de decisão concernentes à provisão de serviços para
necessidades educacionais especiais” (1994, p.2).
Além disso, afirma que “pais possuem o direito inerente de serem
consultados sobre forma de educação mais apropriada às necessidades,
circunstância e aspirações de suas crianças” e que:
“(...) ao mesmo tempo em que escolas inclusivas provêem um
ambiente favorável à aquisição de igualdade de oportunidades e
participação total, o sucesso delas requer um esforço claro, não
somente por parte dos professores e dos profissionais na escola,
mas também por parte dos colegas, pais, famílias e voluntários”
(Declaração de Salamanca, 1994, p. 5).
Afirma também que “pais e voluntários deveriam ser convidados a assumir
participação ativa no trabalho da escola” (p. 11) e que:
“(...) a realização do objetivo de uma educação bem-sucedida de
crianças com necessidades educacionais especiais não constitui
tarefa somente dos Ministérios de Educação e das escolas. Ela
requer a cooperação das famílias e a mobilização das
comunidades e de organizações voluntárias, assim como o apoio
do público em geral” (Declaração de Salamanca, 1994).
Mais especificamente, aponta para uma parceria com os pais:
1. “A educação de crianças com necessidades educacionais
especiais é uma tarefa a ser dividida entre pais e profissionais.
Uma atitude positiva da parte dos pais favorece a integração
escolar e social...”.
2. Pais constituem parceiros privilegiados no que concerne às
necessidades especiais de suas crianças e, desta maneira, eles
deveriam, o máximo possível, ter a chance de poder escolher o
tipo de provisão educacional que eles desejam para suas
crianças.
3. Uma parceria cooperativa e de apoio entre administradores
escolares, professores e pais deveria ser desenvolvida e pais
deveriam ser considerados enquanto parceiros ativos nos
processos de tomada de decisão.
4. Governos deveriam tomar a liderança na promoção de parceria
com os pais, por meio tanto de declarações políticas quanto legais
no que concerne aos direitos paternos... (Declaração de
Salamanca, 1994, p.17).
31
CAPÍTULO II
DESENVOLVIMENTO INFANTIL
NECESSIDADES ESPECIAIS
“O nascimento do pensamento é igual ao nascimento de uma
criança: tudo começa com um ato de amor.
Uma semente há de ser depositada no ventre vazio. E a semente
do pensamento é o sonho”.
Rubem Alves
A sociedade é constituída por indivíduos diferentes entre si, que se
assemelham no anonimato do grupo.
Os alunos de uma sala de aula, membros da sociedade como qualquer
outra pessoa, também são aparentemente semelhantes, quando olhados como
grupo, diferindo, entretanto, fundamentalmente, um do outro, nas peculiaridades
de sua individualidade.
Embora a seqüência das etapas do desenvolvimento seja a mesma para
todos e o processo de construção de conhecimento envolva princípios e leis
comuns a todos, a forma de vivência desses processos, bem como o ritmo com
que são vivenciados difere de um aluno para outro.
Segundo Piaget (1978), o aluno constrói seu próprio conhecimento, sendo
assim, o professor deve agir como mediador e estimulador desse processo.
Buscar interagir com o aluno, proporcionar diversos meios para se alcançar os
objetivos propostos, levando sempre em conta que cada criança tem seu ritmo e
tempo diferentes para aprender.
“O professor é visto, então, como facilitador no processo de busca
de conhecimento que deve partir do aluno. Cabe ao professor
organizar e coordenar as situações de aprendizagem, adaptando
suas ações às características individuais dos alunos, para
desenvolver suas capacidades habilidades intelectuais.” (BRASIL
- PCN, 1999 p. 31)
32
A principal preocupação de Piaget foi o sujeito epistêmico. Estudou o
desenvolvimento do conhecimento da lógica, espaço, tempo, moralidade,
linguagem, estudou diversos processos psicológicos: pensamento, percepção,
memória, imaginação, imitação e ação.
Piaget elaborou a psicologia genética com o intuito de investigar o
processo de formação psicológica que pretende compreender as etapas do
desenvolvimento do conhecimento. Para isso, pesquisou e observou a criança
em desenvolvimento, desde o nascimento até a adolescência. Como podemos
ver, sua preocupação é epistemológica: descobrir os processos do conhecimento
em sua evolução.
Piaget (1978), parte do princípio de que o conhecimento não é um
estado, mas sim um processo contínuo, suscetível de progressos, o
conhecimento é a passagem de um nível de menor conhecimento para outro de
conhecimento mais elaborado.
O autor considera que a própria criança constrói sua inteligência e seus
conhecimentos, tal construção não é devida unicamente à experiência
perceptiva, visto toda experiência comportar uma estruturação cuja importância a
filosofia empirista ignora.
Em seus estudos, Piaget concluiu que a inteligência progride por
construções sucessivas em diferentes níveis e procede da ação geral. O
conhecimento está sempre ligado à ação. É, portanto, interagindo com o meio,
que a criança constrói sua inteligência.
Para o autor no caso do desenvolvimento cognitivo, o ser vive em
constante processo de equilíbrio entre o todo e a parte. O organismo interage
continuamente com os objetos do meio. Essa integração é denominada
assimilação, e a modificação que decorre dela, acomodação. Assim, a
adaptação, implica tanto a assimilação como a acomodação.
Piaget. In: Bringuier, p.61
“[...] A acomodação é determinada pelo objeto, enquanto a assimilação
é determinada pelo indivíduo. Então, assim como não há acomodação
sem assimilação, já que é sempre a acomodação de uma coisa que é
assimilada [...] de igual modo não pode haver assimilação sem
acomodação [...] Adaptação é o equilíbrio entre a assimilação e a
acomodação. Porque na adaptação você tem sempre dois pólos: você
33
tem o pólo indivíduo-assimilação e o pólo objeto-acomodação [...].”
(BRINGUIER, 1993, p.63)
O autor mostra que o indivíduo estabelece desde o nascimento a
relação de interação com o meio. E, é dessa relação com o mundo físico e social
que acontece o desenvolvimento cognitivo da criança e conseqüentemente dessa
relação se dá o conhecimento.
Assim, a assimilação refere-se aquilo que é essencial a todo o
conhecimento, já a acomodação representa o diferente, proporcionando a base
para a mudança e conseqüentemente a aprendizagem.
Piaget busca elaborar uma teoria do conhecimento, que possa explicar
como o organismo conhece o mundo. Para o autor, existe uma realidade externa
ao sujeito do conhecimento, e a presença desta realidade é que regula e corrige
o desenvolvimento adaptativo.
Entendemos então que, os processos de assimilação e acomodação são
complementares e encontram-se presentes durante toda a vida do indivíduo,
permitindo o desenvolvimento intelectual.
Para podermos entender melhor a teoria de Piaget, devemos partir do
princípio de que é no dia-a-dia, acompanhando os progressos das crianças, que
compreenderemos o que o autor chama de períodos do desenvolvimento.
Piaget elaborou uma estrutura de desenvolvimento cognitivo baseado
em estágios: sensório-motor, pré-operatório, período das operações concretas e
período das operações formais.
2.1 Períodos do desenvolvimento
Para a estruturação da intervenção educativa é fundamental
distinguir o nível de desenvolvimento real do potencial. O nível de
desenvolvimento real se determina como aquilo que o aluno pode
fazer sozinho em uma situação determinada, sem ajuda de
ninguém. O nível de desenvolvimento potencial é determinado
pelo que o aluno pode fazer ou aprender mediante a interação
com outras pessoas, conforme as observa, imitando, trocando
idéias com elas, ouvindo suas explicações, sendo desafiado por
elas ou contrapondo-se a elas, sejam essas pessoas o professor
ou seus colegas. Existe uma zona de desenvolvimento próximo,
dada pela diferença existente entre o que um aluno pode fazer
34
sozinho e o que pode fazer ou aprender com a ajuda dos outros.
(BRASIL - PCN, 1998 p. 38)
De acordo com La Taille (1992, p. 15), os estágios de desenvolvimento
de Piaget, caracterizam-se pelas diferentes formas do sujeito interagir com a
realidade, de organizar seus conhecimentos visando a sua adaptação. Esse
movimento deve-se ao amadurecimento físico, psicológico e social e é neste
fenômeno que se dá a construção da inteligência. É o indivíduo, que desde
criança, vai construindo o seu desenvolvimento mental. O estágio, forma de
organização mental, deve ser considerado do ponto de vista motor, intelectual e
afetivo.
Estágio sensório-motor
Segundo La Taille,
(...) nesse estágio, Piaget considera abusivo falar em real
socialização efetiva da inteligência. Essa é essencialmente
individual, pouco ou nada devendo às trocas sociais.
Em compensação, a partir da aquisição da linguagem, inicia-se
uma socialização efetiva da inteligência. (LA TAILLE 1992, p.15)
No estágio sensório-motor, a concepção de espaço, tempo e
casualidade começa a ser construída, possibilitando à criança novas formas de
ação prática para lidar com o meio.
Esquemas cada vez mais complexos são construídos, de forma a
preparar e dar origem ao aparecimento da função simbólica, ou seja, a
capacidade de representar eventos futuros.
O aparecimento da função simbólica altera a forma como à criança lida
com o meio e anuncia uma nova etapa, denominada estágio pré-operatório.
Pelo que entendemos é nesta fase que a criança tem maior necessidade
de manipular objetos e vivenciar as situações do cotidiano de acordo com seus
interesses para que assim, consiga assimilar os conceitos pertinentes a essa
faixa etária.
35
E, é neste momento, que a observação do adulto é da máxima
importância, para que interfira positivamente, estimulando o amadurecimento que
proporcionará a aprendizagem.
Estágio das operações concretas
Esta etapa é dividida em dois sub-estágios:
1 Estágio pré-operatório
De acordo com La Taille (1992, p. 15), o estágio pré-operatório é
marcado pelo aparecimento da linguagem por volta dos dois anos, a criança
entra em um mundo inteiramente novo, repleto de coisas para aprender e
compreender, tornando-a capaz de lidar com suas experiências. A criança tornase mais ativa, ampliando seu universo social e individual. Seu mundo, nesta fase,
é mágico, e o jogo do “faz de conta” domina todas as suas atividades.
O estágio pré-operacional é caracterizado, então, pelo pensamento
egocêntrico, onde o raciocínio da criança é muito influenciado por suas próprias
vontades e desejos, suas percepções e explicações refletem apenas do seu
ponto de vista.
Outra característica do pensamento deste estágio é o animismo. A
criança estende suas vivências pessoais a brinquedos, animais e objetos,
atribuindo-lhes sentimentos e intenções do ser humano.
Ainda neste estágio, a criança tende a passar por uma transição, pois se
inicia a aquisição da linguagem lhe proporcionando maior facilidade de expor
seus sentimentos e vontades, porém se vê diante de um conflito, onde terá que
aceitar o mundo que a cerca conscientizando-se de que faz parte dele, porém
ainda acredita que seus pensamentos estão voltados para si. Ainda encontra
dificuldade em se colocar no ponto de vista do outro, fato que a impede de
estabelecer relações de reciprocidade.
2 Estágio operatório-concreto
Tem início aproximadamente aos 7 anos.
Neste estágio a criança
apresenta modificações consideráveis no seu comportamento, na sua linguagem,
36
nas suas interações com os colegas e principalmente na qualidade de raciocínio.
O egocentrismo e a fantasia diminuem e a criança torna-se capaz de relacionarse com a realidade física e social de maneira mais objetiva, poderá simbolizar
informações, transformando-as e organizando-as a fim de solucionar problemas.
O pensamento é chamado operatório porque é reversível: o sujeito pode
retornar, mentalmente, ao ponto de partida, ele agora se baseia mais no
raciocínio do que na percepção. A criança operatória já possui noção quanto à
massa, peso e volume dos objetos.
Estágio operatório-formal
Nesse estágio, o pensamento torna-se livre das limitações da realidade
concreta. Este período ocorre a partir dos treze anos de idade. O adolescente
pode pensar de modo lógico e correto mesmo com um conteúdo de pensamento
incompatível com o real, permitindo, assim, trabalhar com a realidade. Pela
primeira vez o raciocínio pode trabalhar com hipóteses e buscar conseqüências
lógicas.
Segundo La Taille (1992), ao chegar nessa etapa, o adolescente atinge
o grau mais complexo de seu desenvolvimento cognitivo, a abstração, que lhe
possibilita “refletir” e criar novas hipóteses e caminhos para que consiga agir
coerentemente por si só.
As faixas etárias previstas para cada etapa não são rígidas e
demarcadas. Mas são sugeridas por preponderar nas faixas etárias pesquisadas
por Piaget.
Nem sempre o desenvolvimento de uma criança ocorre de maneira
considerada normal. Através da comparação com o desenvolvimento da maioria
das crianças podemos observar alguns fatos ou comportamentos que se desviam
dos padrões de normalidade. Quando um atraso no desenvolvimento físico,
mental, emocional ou na aquisição da fala for observado é conveniente consultar
o pediatra, que poderá confirmar ou não a suspeita de um problema.
Podem ocorrer atrasos globais ou específicos. Uma criança pode
apresentar desenvolvimento físico normal e não falar, ou falar bem e não
aprender.
Mesmo
possuindo
inteligência
normal,
pode
ter
dificuldades
37
específicas, que estejam impedindo a aprendizagem. Todos os atrasos merecem
atenção, pois a criança pode precisar de ajuda para superá-los.
2.2 Desenvolvimento Emocional
Sabe-se que desde que nasce, enquanto cresce e se desenvolve a
criança precisa sentir-se amada, para crescer emocionalmente equilibrada e
desenvolver na vida adulta todo seu potencial humano.
Quanto a emoção ser inata ou adquirida, há uma grande polemica, porém
todos aceitam que o recém nascido apresenta reações que denotam sentimentos
de prazer e desprazer. O estudo das emoções tem demonstrado que em sua
formação há componentes orgânicos responsáveis pelo aparecimento de reações
emocionais à medida que o indivíduo se desenvolve e amadurece.
Segundo Davidoff, (1983) a emoção é um estado complexo, que envolve
aumento da percepção de um objeto ou situação, grandes mudanças físicas,
apreciação de atração ou repulsa sentidas, e organização do comportamento no
sentido de aproximação ou afastamento.
O comportamento emocional é determinado por um complexo jogo de
predisposições hereditárias e condicionadas.
As emoções básicas são: prazer, tristeza, raiva e medo. Entretanto, todas
elas têm uma enorme escala de variação. Por exemplo, o prazer pode variar de
satisfação ao êxtase, sendo que nesta escala estão incluídos o amor, a alegria,
etc.; a tristeza pode variar do desapontamento ao desespero; o medo, da timidez
ao terror; a raiva, do descontentamento ao ódio.
Quanto ao papel da aprendizagem no desenvolvimento emocional os
estudiosos apontam três processos de aquisição de respostas emocionais:
Imitação – consiste na observação de um modelo e na posterior
incorporação das respostas do mesmo.
Condicionamento – uma resposta é aprendida através da associação de
um estímulo neutro a outro capaz de provocar uma reação emocional.
38
Compreensão – através dos processos racionais e lógicos. A razão nos
faz compreender as conseqüências de determinados eventos, e isto nos leva a
sentir emoção.
2.3 As Emoções e as Interações Humanas
Gosto de ser gente porque, inacabado, sei que sou um ser
condicionado, mas, consciente do inacabamento, sei que posso ir
mais além dele. Esta é a diferença profunda entre o ser
condicionado e o ser determinado. A diferença entre o inacabado
que não se sabe como tal e o inacabado que histórica e
socialmente alcançou a possibilidade de saber-se inacabado.
Gosto de ser gente porque, como tal, percebo afinal que a
construção de minha presença no mundo, que não se faz no
isolamento, isenta da influência das forças sociais, que não se
compreende fora da tensão entre o que herdo geneticamente e o
que herdo social, cultural e historicamente, tem muito a ver comigo
mesmo. (FREIRE, 1996 p.30)
Freire nos fala da importância das interações sociais, dos sentimentos e
emoções, da importância de nos entendermos como seres incompletos em
constante transformação e crescimento.
"Não há educação fora das sociedades humanas e não há homem no
vazio" (Paulo Freire, 1996)
Para darmos início a essa questão, analisemos a seguinte afirmação:
“O homem é um ser essencialmente social, impossível, portanto,
de ser pensado fora do contexto da sociedade em que nasce e
vive. Em outras palavras, o homem não social, o homem visto
como independente das influências dos diversos grupos que
freqüenta, o homem visto como imune aos legados da história e
da tradição, este homem simplesmente não existe.” (LA TAILLE,
1992, p. 11).
Segundo Piaget, se tomarmos a noção do social nos diferentes sentidos do
termo, isto é, englobando tanto as tendências hereditárias que nos levam à vida
em comum e à imitação, como as relações dos indivíduos entre eles, entendemos
39
que, desde o nascimento, o desenvolvimento intelectual é, simultaneamente, obra
da sociedade e do próprio individuo.
Todavia,
como
escreve
Piaget
em
seguida,
tal
postulado
é
demasiadamente amplo e, por conseguinte, vago. Uma interpretação possível
seria afirmar que o futuro da razão individual é erguer-se acima desta base social
comum, de lhe ser superior. Outra seria pensar que, no seu desenvolvimento, a
razão é esculpida pelas determinações sociais, em suma, afirmar que o homem é
ser social ainda não significa optar por uma teoria que explique como este social
interfere no desenvolvimento e na capacidade da inteligência humana.
Segundo La Taille (1992), o esclarecimento que Piaget dá a essa questão
passa por dois momentos. O primeiro: definir de forma mais precisa, o que se
deve entender por “ser social”. O segundo: verificar como os fatores sociais
aparecem para explicar o desenvolvimento intelectual .
Para Piaget, o ser social é aquele que consegue relacionar-se com seus
semelhantes de forma equilibrada. Não se trata de traçar uma fronteira entre o
social e o não social, mas sim de, a partir de uma característica importante das
relações possíveis entre pessoas de nível operatório – que representa o grau
Maximo de socialização do pensamento - , comparar graus anteriores de
socialização. “Ás principais etapas do desenvolvimento das operações lógicas-,
escreve ele, correspondem, de maneira relativamente simples, estágios
correlativos do desenvolvimento social (... )”.(La Taille, 1992)
É importante notar que na teoria de Piaget no que se refere às influências
da interação social no desenvolvimento cognitivo. Em geral, quando se pensa em
tais influências, aborda-se a questão da cultura: determinadas ideologias,
religiões, classes sociais, sistema econômico, presença ou ausência de
escolarização, características da linguagem etc. Isso significa que Piaget pensa o
social e suas influências sobre os indivíduos pela perspectiva da ética.
2.4 Interação social
De acordo com Vygotsky (1989), ao chegar à escola, a criança possui um
repertório cognitivo, social, emocional, fruto da interação de seu organismo com o
40
meio, e também faz parte deste repertório, o vínculo que esta tem com os objetos
internos e externos. A compreensão deste vínculo, a partir do comportamento
habitual que a criança apresenta, é para seus professores um elemento a ser
considerado no processo de aprendizagem.
Uma criança cujas relações vinculares desde muito cedo estiveram
comprometidas pela ausência da figura materna, primeira a exercer a função de
ensinante na aprendizagem humana, tenderá a apresentar dificuldades no
estabelecimento de vínculo com o professor, ou manterá o modelo de vínculo que
vivenciou quando bebê.
Buscar compreender como os alunos se relacionam com o professor, que
projeções fazem nesta figura, o que querem dele, como o vêem nos aspectos de
sua função, é importante para a atuação do professor, não mais para saber que
conteúdos devem ser trabalhados, ou que metodologia deve ser estudada, mas
para saber como se relacionar com esse aluno, como contribuir na construção de
um vínculo que seja favorável ao processo de aprendizagem.
Segundo Pacheco
Uma das noções centrais da inclusão em escolas é ser aceito na
comunidade social da escola, interagindo com os colegas e
participando de atividades regulares. As escolas precisam
construir uma política que promova esse pensamento em todos os
níveis do funcionamento escolar, Encorajar a interação social, a
participação e os relacionamentos é uma maneira de implementar
essa política. (PACHECO, 2007, p.51)
2.5 A importância da afetividade no desenvolvimento e na Inclusão
Não podemos negar que a afetividade é crucial para que aconteça a
inclusão, desde um simples toque, um beijo, um abraço.
A teoria de Wallon (apud Dantas, 1992) considera o desenvolvimento da
pessoa completa integrada ao meio em que está imersa, com os seus aspectos
afetivo, cognitivo e motor também integrados. Assim, a ênfase é para a
afetividade e para a integração, entre organismo e meio e entre as dimensões
cognitiva, afetiva, e motora na constituição da pessoa. A afetividade evolui
41
conforme as condições de cada pessoa e com formas de expressões
diferenciadas, que se configuram como um conjunto de significados que o
indivíduo adquire nas relações com o meio, com a cultura, ao longo da vida. Os
significados representam para cada pessoa as diferentes situações e experiências
vivenciadas num determinado momento e ambiente social. Por este motivo
afetividade não permanece imutável ao longo da trajetória da pessoa.
Afetividade segundo Wallon
“A dimensão afetiva ocupa lugar central, tanto do ponto de vista
da construção da pessoa quanto do conhecimento. Ambos se
iniciam num período que ele denomina impulsivo-emocional e se
estende ao longo do primeiro ano de vida. Neste momento a
afetividade reduz-se praticamente às manifestações fisiológicas
da emoção, que constituem o ponto de partida do psiquismo.
(WALLON apud DANTAS, 1992)
Wallon dedicou-se ao estudo de vários aspectos do desenvolvimento
infantil (afetivos, cognitivos e motor). Nos domínios afetivos, cognitivos e motor,
procurou mostrar como cada um deles se desenvolve, relaciona os vínculos entre
cada um desses domínios, enfim, sua teoria resulta em quatro temas
fundamentais: a afetividade, o movimento, a inteligência e a formação do eu como
pessoa.
Ao nível psicomotor, porque o ser humano desenvolve necessidades
fisiológicas, gostos e atitudes corporais, que são condicionados pelos sistemas
social e cultural. Ao nível afetivo, porque a expressão dos sentimentos é veiculada
pelas modalidades, pelas restrições e pelas sanções que constituem os sistemas
social e cultural. Ao nível mental, porque o processo de socialização fornece ao
indivíduo as tipificações, as representações, as imagens, os conhecimentos, os
preconceitos e os estereótipos que estruturam os sistemas de conhecimento.
Para Wallon (Apud Dantas,1992) a emoção é a fonte principal do
conhecimento, portanto conhecimento e afetividade encontram-se em sua teoria
como algo indissociável.
Hoje sabemos que as dificuldades de aprendizagem, podem se manifestar
por diversas causas.
Causas presumidamente devido a uma disfunção no
sistema nervoso central, e pode ocorrer apenas por um período na vida.
42
Problemas de controle de comportamento, percepção social e interação
social podem existir junto com as dificuldades de aprendizagem, mas elas não
constituem por si só uma desordem de aprendizagem. Ela pode ter uma origem
orgânica, intelectual/cognitiva, emocional (incluindo-se aí a estrutura familiar),
sócio-cultural; porém, o que se percebe na maioria dos casos é que há um
entrelaçamento destes fatores, responsável pela complexidade da situação.
Entendemos que a relação afetiva entre os sujeitos envolvidos no processo
ensinar-aprender, o exercício do diálogo, compartilhar, o respeito pelo outro, o
manter-se aberto, o saber escutar, configuram-se como elementos de
fundamental importância para a aprendizagem.
Sabe-se que na prática pedagógica, podem surgir entre professor e aluno,
sentimentos de atração ou de repulsão. Essas atitudes sentimentais têm o poder
de influenciar a metodologia com risco de alterá-la, provocando no aluno, grandes
transformações afetivas mais ou menos desfavoráveis ao ensino.
A dimensão afetiva é um importante fator a ser considerado quando se
pretende compreender o desenvolvimento da aprendizagem da criança. É
indiscutível a importância da afetividade para o processo educacional. Pesquisas
recentes têm demonstrado que afetividade e inteligência caminham juntas no
processo de construção da personalidade da criança, conseqüentemente, essa
relação tem influências sobre a aprendizagem escolar e fundamentalmente na
inclusão de crianças com necessidades especiais na rede regular de ensino.
43
CAPÍTULO III
INCLUSÃO E LEGISLAÇÃO ATUAL
A busca pelos direitos sociais iguais vem destacando a importância da
educação escolar das pessoas com necessidades especiais na rede regular de
ensino, por considerar que somente dessa forma as pessoas poderão
desenvolver-se plenamente como seres humanos que são e assim viverem
plenamente como sujeitos sociais.
Na legislação brasileira atual, observamos que, pela primeira vez, numa Lei
de diretrizes e bases, é dedicado um capítulo à inclusão de portadores de
necessidades especiais.
A Educação Inclusiva (EI) é uma prática mundialmente difundida e que
possui na Declaração de Samalanca, documentada em dezembro de 1990, sua
principal arma de ação. Foi nessa declaração que inúmeros países, entre eles, o
Brasil, assinaram um compromisso de fazer desse ideal uma realidade até 2010.
(BRASIL, 1997, p.23)
Muito se discutiu, mas as dúvidas e a exclusão ainda permanecem. Um
exemplo concreto disso é o resultado do Censo 2000 do IBGE (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística), que mostrou que a universalização do Ensino
Fundamental ainda não chegou aos portadores de necessidade especiais. Em
2000, apenas 5,5% das crianças de 7 a 14 anos estavam fora da escola no Brasil.
Entretanto, quando se analisa as crianças com NEE pertencentes a essa mesma
faixa etária, percebe-se que a porcentagem aumenta significativamente: 11,4%.
Aqueles que possuem um grau maior de deficiência e que estão fora da escola
apresentam um número ainda mais preocupante, 25,1%, o que representa cerca
de um quarto da população de 7 a 14 anos. (BRASIL, 1997, p.23)
44
O IBGE utilizou como parâmetro para a sua pesquisa um padrão amplo em
deficiência, comum em países desenvolvidos. Assim, uma pessoa com alguma
dificuldade para enxergar, mesmo com uso de óculos escuros, foi considerada
portadora de deficiência visual e os portadores de deficiência grave foram aqueles
que disseram ser totalmente incapazes ou ter grande dificuldade para enxergar,
ouvir ou caminhar.
3.1 Questão legal
Ao abordar a questão legal, é importante conhecer e contextualizar os
embasamentos legais que ampararam a área. O atendimento à pessoa com
necessidades educacionais especiais pauta-se no respeito à dignidade do ser
humano e no seu direito ao pleno desenvolvimento. Postura esta sinalizada por
uma consciência crítica nacional e internacional, consolidada nos princípios e
recomendações dos compromissos definidos em nível nacional, bem como em
convenções, acordos e declarações internacionais das quais o Brasil é signatário
(MEC, 1997)
•
Em princípios baseados na Declaração Universal de Direitos
Humanos (1948)
Todo ser Humano é elemento valioso qualquer que seja a idade, sexo,
idade mental, condições emocionais e antecedentes culturais que
possui, ou grupo étnico, nível social e credo a que pertença. Seu valor é
inerente à natureza do homem e às potencialidades que traz em si; em
todas as suas dimensões, é o centro e o foco de qualquer movimento
para sua promoção. O princípio é válido tanto para as pessoas
consideradas normais ou ligeiramente afetadas, como também para as
gravemente prejudicadas, que exigem uma ação integrada de
responsabilidade e de realizações pluridimensionais; tem direito de
reivindicar condições apropriadas de vida, aprendizagem e ação, de
desfrutar de convivência condigna e de aproveitar das experiências que
lhe são oferecidas para desempenhar-se como pessoa e membro
atuante de uma comunidade.
•
Na Convenção sobre os Direitos da Criança – Adotada pela
assembléia Geral das Nações Unidas – 20/11/89:
45
Artigo 2º. Os Estados Partes respeitarão os direitos enunciados na
presente Convenção e assegurarão sua aplicação a cada criança sujeita
a sua jurisdição, sem distinção alguma, independentemente de raça, cor,
sexo, idioma, crença, opinião política ou de outra índole, origem
nacional, étnica ou social, posição econômica, deficiências físicas,
nascimento ou qualquer outra condição da criança, de seus pais ou de
seus representantes legais.
Segundo Carvalho (2002), a educação Especial tem sido uma
preocupação tanto do Brasil como em outras partes do mundo. Assim passamos
a mencionar algumas recomendações dos organismos internacionais:
•
Declaração de Sunderberg – Espanha/1981: Conferência
Mundial sobre as Ações e Estratégia para a Educação,
Prevenção e Integração dos Impedidos. Enfatiza a igualdade de
oportunidades de educação, lazer e trabalho.
•
Declaração Mundial sobre Educação para Todos – Jomtien
(Tailândia)/1996: Representa o consenso mundial sobre o papel
da educação fundamental e traduz-se em compromisso de
garantir
o
atendimento
às
necessidades
básicas
de
aprendizagem a todas as crianças, jovens e adultos.
•
Seminário
Organização
Regional
da
Sobre
Educação
Políticas,
Integrada
Planejamento
para
alunos
e
com
Necessidades Especiais – Caracas (Venezuela) 1992. O eixo
temático girou em torno da aplicação das recomendações da
conferência Mundial de Educação para Todos, para as pessoas
com necessidades educativas especiais, “a educação tornou-se
o eixo do atendimento, entendendo-se que todos os indivíduos
podem e devem se apropriar do saber, do saber fazer e do saber
pensar” (CARVALHO, 2002, p. 44). A proposta do Seminário foi
sintetizada por Carvalho:
A educação especial deixa de ser entendida como uma educação
diferente para alunos diferentes, e se converte num conjunto de meios
pessoais e materiais postos à disposição do sistema educativo, para que
possa responder satisfatoriamente às necessidades particulares de
todos os alunos (MEC, p.10 apud, CARVALHO, 2002, p.45).
46
•
Declaração de Salamanca – Espanha/1994. Reafirmou-se o
direito à educação de cada indivíduo, independentemente de
suas
condições
lingüísticas
físicas,
ou
outras.
intelectuais,
Muitas
sociais,
crianças
emocionais,
experimentam
dificuldades de aprendizagem e têm, portanto, necessidades
educacionais
especiais
em
algum
momento
de
sua
escolarização. As escolas têm que encontrar a maneira de
educar com êxito todas as crianças, inclusive as que têm
deficiências graves.
Embora o Brasil não tenha estado presente efetivamente em todos
estes encontros; todos eles refletiram na elaboração de leis, decretos, pareceres
e outros que vieram a favorecer uma melhor articulação dentro da Educação
Especial no país. A Declaração de Salamanca, por exemplo, é o princípio
norteador de todas as nossas políticas educacionais especiais na atualidade.
No Brasil, na Constituição de 1946 a educação especial vem sendo
tratada em suas Cartas Magnas:
No capítulo II – Da educação e da Cultura, artigo 172º: cada Sistema
de Ensino terá, obrigatoriamente, serviço de assistência educacional que
assegurem aos alunos necessitados, condições de assistência escolar.
Em 1967 o título IV – Da Família, da Educação e da Cultura, artigo
169º, § 2º: Cada sistema de ensino terá, obrigatoriamente, serviços de
assistência educacional que assegurem, aos alunos necessitados, condições de
eficiência escolar.
Na emenda Constitucional 1969 reformulou no artigo, 175, § 2º que a
Lei especial disporá sobre a assistência à maternidade, à infância e à
adolescência e sobre a educação de excepcionais.
47
Já na emenda de 1978 é assegurada aos deficientes a melhoria de sua
condição social e econômica; isto mediante, como está descrito em seu artigo I, a
uma educação especial e gratuita.
Na Constituição do Brasil – 05/10/1988, no seu artigo 205, estabelece
que é direito de todos à educação de qualidade:
Artigo 205º. “A educação, direito de todos e dever do e Estado e da
família, será promovida e incentivada com colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Título VIII - Da Ordem Social. Capítulo III - Da Educação, da Cultura e
do Desporto, artigo 208º, § 3º: atendimento educacional especializado aos
portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.
Nas duas primeiras constituições citadas (1946 e 1967), o texto é
praticamente o mesmo, a diferença entre eles é que a primeira menciona
condições de “assistência” escolar; isto é, condições para que o aluno assista, tão
somente, às aulas. A segunda, por sua vez, fala de condições de “eficiência”
escolar aos necessitados de educação especial, no sentido de que eles possam
chegar a graus de qualificação considerados satisfatórios.
Por sua vez, na Emenda Constitucional de 1969 falava-se na existência
de Lei especial para tratar do assunto, enquanto que na emenda de 1978, já se
enunciava o direito assegurado a uma educação especial e gratuita aos
necessitados.
Na atual Carta Magna (1988), é estabelecido que a Educação Especial
deva ser oferecida, preferencialmente, na rede regular de ensino; ao invés de
instituições centralizadoras; isto, claro, quando possível.
Nas Leis de Diretrizes e Base da Educação Nacional
Lei 4.024/61. Título X – Da Educação de Excepcionais, artigo 88º: A
educação de excepcionais deve, no que for possível, enquadrar-se no sistema
geral de educação, a fim de integrá-los na comunidade. Artigo 89º: toda iniciativa
48
considerada eficiente pelos conselhos estaduais de educação e relativa à
educação de excepcionais, receberá dos poderes públicos tratamento especial
mediante bolsas de estudo, empréstimos e subvenções.
Lei 5.692/71. Capítulo I – Do Ensino de 1º e 2º Graus, artigo 9º: Os
alunos que apresentam deficiências físicas ou mentais, os que se encontram em
atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados
deverão receber tratamento especial, de acordo com as normas fixadas pelos
competentes Conselhos de Educação.
No âmbito político-administrativo, ainda em 1971, o MEC criou um
grupo para realizar uma completa avaliação da educação especial no Brasil nos
anos seguintes, foi criado o CENESP – Centro Nacional de Educação Especial –
com a finalidade de promover, em todo o território nacional, a expansão e
melhoria do atendimento aos excepcionais; marcados, portanto, o início das
sistematizadas do atendimento educacional especial prestado no Brasil.
Lei 9.394/96. Capítulo V – Da Educação Especial:
Artigo 58º: Entende-se por educação especial, para efeitos desta lei, a
modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede
regular de ensino, para educandos portadores de necessidades
especiais.
Esta Lei ainda dispõe sobre a qualificação do professor que atua em
Educação Especial, sobre currículos e recursos específicos para as necessidades
dos portadores entre outras.
Nas leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, editadas em
1961 e 1971, a Educação Especial era apenas um título dentro do conjunto de
leis, na qual evidenciava que esta modalidade de educação devia na medida do
possível, enquadrar-se no sistema geral, com o objetivo da integração junto à
comunidade.
Indubitavelmente, na atual Lei de Diretrizes e Bases (1996), é que a
Educação Especial ganhou um maior espaço, recebendo um capítulo inteiro para
embasá-la (Capítulo V); refletindo as recentes preocupações e propostas
49
advindas dos encontros mundiais sobre educação especial; além de confirmar e
ajustar o princípio estabelecido na Constituição Federal: ser oferecida,
preferencialmente, na rede regular de ensino.
Além das Constituições também a partir de 1990 podemos citar o
Estatuto da Criança e do Adolescente:
Título II – Dos Direitos Fundamentais. Capítulo I – Do Direito à vida e à
Saúde, artigo 11, § lº; a criança e o adolescente portadores de deficiência
receberão atendimento especializado. O § 2º acrescenta que incumbe ao poder
público fornecer gratuitamente àqueles que necessitarem os medicamentos,
próteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação.
Capítulo IV – Do Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer.
Artigo 54, § 3º: atendimento educacional especializado aos portadores de
deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.
Neste estatuto reforça-se o direito ao ensino especial aos necessitados,
de preferência, na rede regular de ensino; além de mencionar a incumbência do
poder público em fornecer próteses, medicamentos e outros recursos necessários
aos portadores de necessidades especiais. O que se vê, porém, é que
pouquíssimo tem sido feito neste sentido.
Como se percebe, os parâmetros legais já outorgam o direito de todos
à educação, faltando agora à conquista desses direitos dentro das próprias
escolas,
somente
possível
com
a
participação
de
todos:
pedagogos,
administradores escolares, pais, psicólogos, professores, alunos, funcionários e
os que fazem a comunidade.
A intenção não é mascarar a realidade pela qual passam a maioria das
escolas, sucateadas pela política governamental que acelera o desmonte da
educação, mas consideramos ser essa uma luta de todos que almejam uma
escola de qualidade para os filhos das classes trabalhadoras, que são
discriminados por serem pobres economicamente, aí incluídos deficientes que
sofrem uma estigmatização na nossa sociedade.
Assim, uma escola que prioriza a qualidade do ensino terá lugar para
todos, lugar que não aparecerá pronto e acabado nos padrões ideais. Mas um
50
espaço que será construído e experimentado em ações concretas, em tentativas
de acertos, que serão consolidadas em constantes avaliações e discussões,
viabilizadas na vivência de um projeto político na escola.
Na Política Nacional de Educação Especial – 1993
A Política Nacional de Educação Especial – PNEE compreende um
conjunto de objetivos destinados a garantir o atendimento educacional ao
alunado portador de necessidades especiais. Serve como fundamentação e
orientação do processo global da educação de pessoas portadoras de
deficiências, de condutas típicas e altas habilidades, criando condições
adequadas para o desenvolvimento pleno de suas potencialidades, com vistas ao
exercício consciente da cidadania. Aponta que a pessoa portadora de deficiência
tem o direito às oportunidades educacionais, não só à educação.
A PNEE deverá também inspirar a elaboração de planos de ação que
definam
responsabilidade
dos
órgãos
públicos
e
das
entidades
não-
governamentais, cujo êxito dependerá da soma de esforços e recursos das três
esferas de governo e da sociedade civil.
Atualmente, é a Secretaria de Educação Especial – SEESP / MEC, que
se responsabiliza pela Educação Especial no Brasil. Em consonância com as
atribuições do Ministério da Educação e do Desporto, coordena ações voltadas à
formulação de políticas.
Além de seguir os princípios democráticos de igualdade, liberdade e
respeito à dignidade, a educação especial norteia sua ação pedagógica por
princípios, que são, entre outros: princípios da normalização (oferecer aos
portadores as mesmas condições e oportunidades a que outras pessoas têm
acesso); princípio da integração (ações interativas exercidas com reciprocidades
entre pessoas ou instituições); princípio da individualização (adequar o
atendimento educacional às necessidades, respeitando as diferenças individuais);
princípio da legitimidade (participação dos portadores de deficiências ou de seus
51
representantes legais, na elaboração de programas). Estes princípios vão se
adaptar nos currículos dos PCNs.
Assim, as adaptações nos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais),
constituem, possibilidades educacionais de atuar diante das dificuldades de
aprendizagem dos alunos.
Pressupõe que se realize a adaptação do currículo regular, quando
necessário, para torná-lo apropriado às peculiaridades dos alunos com
necessidades especiais. Não se trata de um novo currículo, mas de um currículo
dinâmico, alterável, passível de ampliação, para que atenda realmente todos os
educandos. As questões colocadas são: o que o aluno deve aprender; que
formas de organização do ensino são mais eficientes para o sucesso de
aprendizagem; o que, como e quando avaliar o aluno.
O objetivo é fazer com que os estudantes especiais possam participar
integralmente, em um ambiente rico de oportunidades educacionais. Para isso,
alguns aspectos precisam ser considerados, como a preparação e a dedicação
da equipe educacional e dos professores, o apoio adequado e recursos
especializados, quando forem necessários.
Dentre adaptações curriculares e de acesso ao currículo que facilitam
o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, destacam-se:
a flexibilidade – isto é, a não obrigatoriedade de que todos os alunos atinjam o
mesmo grau de abstração ou de conhecimento, num tempo determinado – e a
consideração de que, ao planejar ativamente para uma turma, deve-se levar em
conta a presença de alunos com necessidades especiais e contemplá-los na
programação (MEC, 1999. nº 12).
Falar de necessidades educacionais especiais, portanto, deixa de se
pensar nas dificuldades específicas dos alunos e passa a significar o que a
escola pode fazer para dar respostas às suas necessidades, de um modo geral,
bem como aos que apresentam necessidades específicas muito diferentes dos
demais.
Segundo Sassaki (1997, p. 150),
52
(...) são cada vez mais necessárias as leis de caráter inclusivista,
caminho ideal para que todas as pessoas, deficientes ou não,
possam sentir que realmente pertencem à sociedade, com
oportunidades iguais de participação como cidadãs de cada país.
A inclusão ainda não existe de fato. O que presenciamos são aspectos da
integração e até mesmo da exclusão social. A legislação, nesse sentido, torna-se
de extrema importância, pois, mesmo que apenas teoricamente, as diretrizes de
um país estão ligadas a ela.
Sassaki (1997, p. 147) ainda acrescenta que “o grau de inclusividade de
uma sociedade poderia, então, ser medido pela maior ou menor incidência de leis
inclusivas sobre as leis integracionistas”.
Mesmo sob a garantia da lei, podemos encaminhar o conceito de
diferença para a vala dos preconceitos, da discriminação, da
exclusão, como tem acontecido com a maioria de nossas políticas
educacionais. Temos de ficar atentos! (MANTOAN 2003)
De acordo com Mantoan (2003, p.23) a maioria dos alunos das classes
especiais é constituída pelos que não conseguem acompanhar os seus colegas
de turma, os indisciplinados, os filhos de lares carentes, os filhos de negros e
outros. Pela ausência de laudos periciais competentes e de queixas escolares
bem fundamentadas, esses alunos correm o risco de serem admitidos e
considerados como PNEE.
Segundo Mantoan, as indefinições da clientela justificam todos os
desmandos e transgressões ao direito à educação e a não-discriminação que
algumas escolas e redes de ensino estão praticando, por falta de um controle
efetivo dos pais, das autoridades de ensino e da justiça em geral.
O caráter duvidoso da educação especial, de acordo com a autora, é
acentuado pela imprecisão dos textos legais que fundamentam os planos e as
propostas educacionais e, ainda hoje, fica patente a dificuldade de se distinguir o
modelo médico-pedagógico do modelo educacional-escolar dessa modalidade de
ensino. Essa falta de clareza faz retroceder todas as iniciativas que visam à
adoção de posições inovadoras para a educação de alunos com deficiência.
Problemas conceituais, desrespeito a preceitos constitucionais,
interpretações tendenciosas de nossa legislação educacional e
53
preconceitos distorcem o sentido da inclusão escolar, reduzindo-a
unicamente à inserção de alunos com deficiência no ensino
regular. Essas são, do meu ponto de vista, grandes barreiras a
serem enfrentadas pelos que defendem a inclusão escolar,
fazendo retroceder, por sua vez, as iniciativas que visam à
adoção de posições inovadoras para a educação de alunos em
geral. Estamos diante de avanços, mas de muitos impasses da
legislação. (FÁVERO, 2004, p.19)
A Constituição Federal de 1988 respalda os que propõem avanços
significativos para a educação escolar de pessoas com deficiência, quando elege
como fundamentos da República a cidadania e a dignidade da pessoa humana
(art. 1º, incisos II e III) e, como um dos seus objetivos fundamentais, a promoção
do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação (art. 3º, inciso IV). Ela garante ainda o direito à
igualdade (art. 5U) e trata, no artigo 205 e seguintes, do direito de todos à
educação. Esse direito deve visar ao “pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para a cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Além disso, a Constituição elege como um dos princípios para o ensino:
“A igualdade de condições de acesso e permanência na escola”
(art. 206, inciso I), acrescentando que o ‘‘‘dever do Estado com a
educação será efetivado mediante a garantia de acesso aos
níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação
artística, segundo a capacidade de cada um” (art. 208, inciso V).
Segundo Mantoan, quando garante a todos o direito à educação e ao
acesso à escola, a Constituição Federal não usa adjetivos e, assim sendo, toda
escola deve atender aos princípios constitucionais, não podendo excluir nenhuma
pessoa em razão de sua origem, raça, sexo, cor, idade ou deficiência.
Para a autora, apenas esses dispositivos já bastariam para que não se
negasse a qualquer pessoa, com ou sem deficiência, o acesso à mesma sala de
aula que qualquer outro aluno.
No Capítulo III — Da Educação, da Cultura e do Desporto —, artigo 205, a
Constituição prescreve em seu artigo 208 que o dever do Estado com a educação
será efetivado mediante a garantia de [...] atendimento educacional especializado
aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. O
“preferencialmente” refere-se a “atendimento educacional especializado”, ou seja:
o que é necessariamente diferente no ensino para melhor atender às
54
especificidades
dos
alunos
com
deficiência,
abrangendo
principalmente
instrumentos necessários à eliminação das barreiras que as pessoas com
deficiência naturalmente têm para relacionar-se com o ambiente externo, como,
por exemplo: ensino da Língua Brasileira de Sinais (Libras), do código braile, uso
de recursos de informática, e outras ferramentas e linguagens que precisam estar
disponíveis nas escolas ditas regulares.
Na concepção inclusiva e na lei, esse atendimento especializado
deve estar disponível em todos os níveis de ensino, de
preferência na rede regular, desde a educação infantil até a
universidade. A escola comum é o ambiente mais adequado para
se garantir o relacionamento dos alunos com ou sem deficiência e
de mesma idade cronológica, a quebra de qualquer ação
discriminatória e todo tipo de interação que possa beneficiar o
desenvolvimento cognitivo, social, motor, afetivo dos alunos, em
geral. (FÁVERO, 2004, p.19)
Na interpretação evolutiva das normas educacionais, há, portanto, que se
entender e ultrapassar as controvérsias entre a nova Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB de 1996) e a Constituição Federal de 1988.
Segundo Mantoan, há mais uma razão para que a inclusão seja um mote
em nossa educação escolar, ultrapassando-se os impasses de nossa legislação.
A Constituição admite que o atendimento educacional especializado também
pode ser oferecido fora da rede regular de ensino, em qualquer instituição, já que
seria apenas um complemento, e não um substitutivo, do ensino ministrado na
rede regular para todos os alunos. Mas na LDB (art. 58 e seguintes), consta que a
substituição do ensino regular pelo ensino especial é possível.
Segundo a opinião de juristas brasileiros ligados ao Ministério Público
Federal (Fávero e Ramos, 2002), essa substituição não está de acordo com a
Constituição, que prevê atendimento educacional especializado, e não educação
especial, e somente prevê esse atendimento para os portadores de deficiência,
justamente por este atendimento referir-se ao oferecimento de instrumentos de
acessibilidade à educação.
Práticas escolares que contemplem as mais diversas necessidades dos
estudantes, inclusive eventuais necessidades especiais, devem ser regra no
ensino regular e nas demais modalidades de ensino (como a educação de jovens
55
e adultos, a educação profissional), não se justificando a manutenção de um
ensino especial, apartado.
Além do mais, após a LDB de 1996 surgiu uma nova legislação, que
revoga as disposições anteriores que lhe são contrárias. Trata-se da Convenção
Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra
as Pessoas Portadoras de Deficiência, celebrada na Guatemala, em maio de
1999. (MANTOAN, 2004, p.19)
O Brasil é signatário desse documento, que foi aprovado pelo Congresso
Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 198, de 13 de junho de 2001, e
promulgado pelo Decreto nº 3.956, de 8 de outubro de 2001, da Presidência da
República. Esse documento, portanto, tem valor legal, já que se refere a direitos e
garantias fundamentais da pessoa humana. A importância dessa convenção está
no fato de que deixa clara a impossibilidade de diferenciação com base na
deficiência, definindo a discriminação como
[... ] toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em
deficiência, antecedente de deficiência, conseqüência de
deficiência anterior ou percepção de deficiência presente ou
passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anular o
reconhecimento, gozo ou exercício por parte das pessoas
portadoras de deficiência de seus direitos humanos e suas
liberdades fundamentais (art. 1º, nº 2 “a”).
A
mesma
convenção
esclarece,
no
entanto,
que
não
constitui
discriminação:
[...] a diferenciação ou preferência adotada para promover a
integração social ou o desenvolvimento pessoal dos portadores de
deficiência, desde que a diferenciação ou preferência não limite
em si mesma o direito à igualdade dessas pessoas e que elas não
sejam obrigadas a aceitar tal diferenciação ou preferência (art. 1º,
nº 2 “b”).
De acordo com Mantoan, em nossa Constituição consta que educação visa
ao pleno desenvolvimento humano e ao seu preparo para o exercício da
cidadania (art. 205), qualquer restrição ao acesso a um ambiente marcado pela
diversidade, que reflita a sociedade como ela é, como forma efetiva de preparar a
pessoa para a cidadania, seria uma “diferenciação ou preferência” que estaria
limitando “em si mesma o direito à igualdade dessas pessoas”.
56
Essa norma, portanto, não se coaduna com a LDB de 1996, que diferencia
a educação com base em condições pessoais do ser humano — no caso, a
deficiência — admitindo a substituição do direito de acesso à educação pelo
atendimento ministrado apenas em ambientes “especiais”.
A LDB de 1996 não contempla o direito de opção das pessoas com
deficiência e de seus pais ou responsáveis, limitando-se a prever as situações em
que se dará a educação especial, normalmente, na prática, por imposição da
escola ou da rede de ensino.
Para essa nova corrente de interpretação jurídica da educação para
pessoas com deficiência, as escolas atualmente inscritas como “especiais”
devem, então, por força dessa lei, rever seus estatutos, pois, pelos termos da
Convenção da Guatemala, a escola não pode intitular-se “especial” com base em
diferenciações fundadas nas deficiências das pessoas que pretende receber.
Segundo nossos juristas (Fávero e Ramos, 2002), nada impede, portanto,
que os órgãos responsáveis pela emissão de atos normativos “infralegais” e
administrativos relacionados à educação (Conselhos de Educação de todos os
níveis, Ministério da Educação e Secretarias) emitam diretrizes para a educação
básica, em seus respectivos âmbitos, considerando os termos da Convenção da
Guatemala no Brasil, com orientações adequadas e suficientes para que as
escolas em geral recebam com qualidade todas as crianças e adolescentes.
Para os defensores da inclusão escolar é indispensável que os
estabelecimentos de ensino eliminem barreiras arquitetônicas e
adotem práticas de ensino adequadas às diferenças dos alunos
em geral, oferecendo alternativas que contemplem a diversidade,
além de recursos de ensino e equipamentos especializados que
atendam a todas as necessidades educacionais dos educandos,
com ou sem deficiências, mas sem discriminações (Mantoan,
1999, 2001).
Todos os níveis dos cursos de formação de professores devem sofrer
modificações nos seus currículos, de modo que os futuros professores aprendam
práticas de ensino adequadas às diferenças.
O acesso a todas as séries do ensino fundamental (obrigatório) deve ser
incondicionalmente garantido a todos. Para tanto, os critérios de avaliação e de
promoção, com base no aproveitamento escolar e previstos na LDB de 1996 (art.
24), devem ser reorganizados, de forma a cumprir os princípios constitucionais da
57
igualdade de direito ao acesso e à permanência na escola básica, bem como do
acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística,
segundo a capacidade de cada um.
Os serviços de apoio especializados, tais como os de intérpretes de língua
de sinais, aprendizagem do sistema braile e outros recursos especiais de ensino e
de aprendizagem, não substituiriam, como ainda ocorre hoje, as funções do
professor responsável pela sala de aula da escola comum.
As creches e escolas de educação infantil, dentro de sua atual e
reconhecida função de cuidar e educar, não podem mais deixar de receber
crianças PNEE, a partir de zero anos (art. 58, parágrafo 3º, LDB c.c. o art. 2º,
inciso I, alínea “a”, da Lei nº. 7.853/89), oferecendo-lhes cuidados diários que
favoreçam sua estimulação precoce, sem prejuízo dos atendimentos clínicos
individualizados, que, se não forem realizados no mesmo ambiente, devem ser
disponibilizados por meio de convênios, para sua facilitação.
Como se esses motivos não bastassem para que a inclusão escolar
revirasse o nosso quadro educacional de cabeça para baixo, a fim de que o
conhecêssemos pelo avesso, temos ainda de considerar a organização
pedagógica de nossas escolas. (MANTOAN, 2004, p.24)
58
CONCLUSÃO
Desde muito cedo, a escola torna-se para a criança o centro da vida
extra-familiar, ocupando a maior parte de seu dia-a-dia. Os professores que a
criança tem, os métodos de ensino e os tipos de livros aos quais é exposta, terão
efeitos importantes não apenas para o processo acadêmico, como também na
capacidade geral para encarar a vida, dominar problemas e desafios novos,
levando-a a adquirir autoconfiança e auto-estima.
Podemos perceber que a maturação e a aprendizagem são processos
diferentes, intimamente ligados, pois a maturação cria condições para que as
aprendizagens ocorram.
O desenvolvimento afetivo, o desenvolvimento motor e o desenvolvimento
intelectual encontram-se no ser humano indissociáveis.
Assim, para que a criança tenha um desenvolvimento saudável e
adequado dentro do ambiente escolar, e conseqüentemente no social, é
necessário que haja um estabelecimento de relações interpessoais positivas,
como aceitação e apoio, possibilitando assim o sucesso dos objetivos educativos.
Podemos dizer que é no interior das relações sociais que os indivíduos
têm possibilidades de internalizar e transformar aquilo que aprenderam. A pessoa
deficiente é também um ser sócio histórico, e através de sua relação com o meio
desenvolverá todo o seu potencial de forma independente e autônoma.
Para que haja a inclusão, é preciso que ocorram mudanças em vários
níveis: nas escolas, nos equipamentos, no instrumental, nas informações
disponíveis e nas atitudes dos profissionais envolvidos na tarefa da educação.
Realizadas essas etapas, e rompendo as barreiras arquitetônicas, a escola terá
melhores condições de atender aos alunos portadores de necessidades especiais
em classes comuns.
Entre os recursos humanos salientamos a necessidade de capacitação
dos profissionais envolvidos no trabalho escolar. Essa capacitação exige desde o
aumento ou implementação dos conhecimentos relativos à própria noção de
deficiência até os recursos e técnicas pedagógicas que conduzam a equipe a um
trabalho reconhecidamente produtivo e eficaz.
59
O papel do professor destaca-se como recurso humano essencial, a sua
capacidade de contribuição com o processo educacional deve ser reconhecida e
desenvolvida através de projetos de capacitação continuada, em que o professor
se envolva integralmente, em condições adequadas de trabalho e cumprimento
satisfatório de suas obrigações e responsabilidades éticas.
Enfim, a escola, para ser considerada um espaço inclusivo, precisa deixar
de ser uma instituição burocrática, que apenas cumpre as normas estabelecidas
pelos níveis centrais. Para tal deve transformar-se num espaço de decisão,
ajustando-se ao seu contexto real e respondendo aos desafios que se
apresentem.
A inclusão é uma proposta, um ideal. Se quisermos que nossa sociedade
seja acessível, que dela todas as pessoas com deficiência possam participar em
igualdade de oportunidades, é preciso fazer desse ideal uma realidade a cada dia.
A ação de cada um de nós, das instituições e dos órgãos, deve ser pensada e
executada no sentido de divulgar os direitos, a legislação e implementar ações
que garantam o acesso de todos.
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