Globalização e Transformações Urbanas

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Globalização e Transformações Urbanas
GLOBALIZAÇÃO E TRANSFORMAÇÕES URBANAS
Henrique Alckmin Prudente
INTRODUÇÃO
Elaboraremos algumas considerações acerca da globalização analisada como um
processo histórico, que apresenta relações desde o declínio do sistema feudal e começa
a se enraizar através do capitalismo comercial já no final do século XV e início do século
XVI. As origens e os primórdios da globalização não se encontram na fibra óptica ou na
internet. Estão situados, na escala do tempo histórico, quando se deu a articulação das
sociedades, através dos aprimoramentos dos sistemas de transportes e comunicações
como alicerces do capitalismo comercial.
Atualmente o processo de globalização se sustenta a partir de dois grandes pilares
estruturadores: a expansão internacional do sistema capitalista, principalmente a partir da
II Guerra Mundial (1939-1945) atingindo magnitude global, e o desenvolvimento técnicocientífico, propagado pela III Revolução Industrial, também conhecida como a Revolução
do Conhecimento. “A rigor, a história do capitalismo pode ser vista como a história da
mundialização, da globalização do mundo. Um processo histórico de larga duração, com
ciclos de expansão e retração, ruptura e reorientação.”1
Concebido como um processo civilizatório, o capitalismo expande-se por todos os
continentes do Planeta Terra, apresentando uma dinâmica que varia de acordo com as
implicações de determinados momentos históricos, tecendo relações de subordinação
frente
aos
povos
colonizados
e
estabelecendo,
paralelamente,
processos
de
concentração do capital e da mais valia. "A burguesia vem abolindo cada vez mais a
fragmentação dos meios de produção, da posse e da população. Ela aglomerou a
população, centralizou os meios de produção e concentrou a propriedade em poucas
mãos".2
1
2
IANNI, Octavio. A Sociedade Global, 1994, p. 55.
MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista, In: Estudos Avançados, 1998, p. 12.
2
PROCESSOS HISTÓRICOS
Estes processos são influenciados pelas diretrizes das nações hegemônicas
fundamentais em nível mundial, estabelecendo períodos que retratam a influência de
determinados países. A partir dos primórdios do capitalismo comercial podemos destacar
a liderança dos países ibéricos, Portugal e Espanha, no comando da expansão marítima
européia, disputando mais tarde esta condição com a Holanda, Inglaterra e França. No
caso dos holandeses constituiu-se, inclusive, um formidável aparato comercial, a
Companhia
das
Índias
Ocidentais,
representando
um
marco
sólido
para
o
desenvolvimento e o aprimoramento do sistema capitalista, resultando também na origem
de grandes corporações financeiras.3
A I Revolução Industrial trouxe um franco desenvolvimento dos sistemas fabris,
relacionados com o avanço tecnológico das máquinas a vapor, utilizadas na indústria
têxtil, que culminaram com a construção das primeiras estradas de ferro. No segundo
quartel do século XIX este processo expande-se pela Europa e pela América e contribui
para fazer do Império Britânico, por meio das colônias em todos os continentes, uma
potência hegemônica durante todo o século até, praticamente, o início da I Guerra
Mundial.
Durante o processo de expansão da I Revolução os meios de transportes e os
sistemas de comunicações passam a estabelecer grandes conexões entre os continentes
por via marítima e também internamente, através das ferrovias, contribuindo para
fomentar o domínio das colônias da África e da Ásia e exercer determinadas influências
na América, estabelecendo relações com o processo de acumulação das metrópoles
européias.
No final do século a II Revolução Industrial se propaga, tendo como carros-chefe as
indústrias pesadas e toda a cadeia produtiva do petróleo, o que representou o grande
desenvolvimento econômico dos Estados Unidos, acompanhado de suas estratégias
geopolíticas de domínio continental, numa primeira etapa consolidando seu território, e de
controle de pontos estratégicos dos oceanos e mares, através da construção do Canal do
Panamá, da ingerência em Cuba (até a Revolução Cubana em 1959) e da ocupação de
alguns arquipélagos do Pacífico.
3
Uma das heranças deste processo é o grupo ABN AMRO Bank, de procedência holandesa, que adquiriu
no Brasil o Banco Real.
3
Todos estes elementos começam a moldar uma economia respaldada nos
interesses da burguesia internacional, em que pese a configuração de circuitos
internacionais de produção e consumo, o que implica no estabelecimento de rotas
marítimas conectadas com os pontos de produção por meio dos equipamentos, dotando
os lugares envolvidos de processos de amplificação dos lucros e da acumulação. "A
necessidade de um mercado cada vez mais expansivo para seus produtos impele a
burguesia por todo o globo terrestre. Ela tem de alojar-se por toda a parte, estabelecer-se
por toda a parte, construir vínculos por toda a parte."4
Com a vitória dos países aliados na II Guerra Mundial e a derrocada dos sistemas
totalitários o mundo assiste, durante a Guerra Fria (1945 - 1989), à expansão do
capitalismo nos países periféricos sob o domínio norte - americano. Favorecido pela
destruição da Europa e pelas pesadas perdas materiais e humanas ocorridas durante o
conflito na União Soviética, a nação ianque passa a sustentar um período de formidável
expansão de suas indústrias, tendo como principal fator o automóvel.
Posteriormente os anos 80 já denunciavam a crise econômica que ocorria na União
Soviética, bem como em alguns dos países do antigo bloco socialista, como a Polônia por
exemplo. O cenário de crise, estreitamente relacionado com a corrida armamentista e
com a disputa pela liderança do setor espacial, desencadeou uma série de
transformações que tonificaram e impulsionaram o processo de globalização, bem como a
penetração do capitalismo angariando novos mercados.
A marcha do processo de globalização prossegue agora tendo como característica
a revolução técnico-científica, através do impulso formidável da área de informática e das
telecomunicações. A "aldeia global"5 se cristaliza, sustentada pelo extraordinário
incremento da mídia, o intelectual orgânico do processo de globalização.6 As relações
econômicas mundiais passam a seguir em consonância com as diretrizes dos interesses
do grande capital, representados pelas grandes corporações multinacionais, que tornamse mundiais, globais, planetárias.
O capital financeiro também passa a se conectar com os mercados mais
expressivos, consolidando um impulso entre as novas relações que se constróem agora
sob a égide do capital especulativo, articulado por amplas e poderosas redes de
4
MARX, K. & ENGELS, F. op. cit., p. 11.
Expressão utilizada pelos teóricos das Ciências da Comunicação, especialmente por Marshall McLuhan,
para designar o mundo no tempo dos meios de comunicação de massa.
Uma das quatro metáforas (as demais são "Fábrica Global", "Torre de Babel" e "Nave Espacial")
empregadas por Octávio Ianni em Teorias da Globalização no capítulo "Metáforas da Globalização" para
retratar a sociedade contemporânea mundial.
5
4
informação que conectam as bolsas de valores, subsidiando processos de fusão e/ou
aquisição de empresas menores, constituindo grandes blocos econômicos que, muitas
vezes superam em vendas o montante do PIB de muitos países de envergadura
considerável. O capital se reproduz, se amplia e se concentra de forma avassaladora e
gritante.
O avanço sistêmico, deliberado e racional do modo de produção capitalista redefine
o papel dos Estados nacionais fragilizando-os. A lógica do mercado passa a se sobrepor
aos interesses do Estado - nação atrofiando seus instrumentos de política econômica e,
ao mesmo tempo, enaltecendo os propósitos e ideais da economia política do liberalismo.
Paralelamente as organizações internacionais assumem uma postura aparente de
estabelecer um equilíbrio em termos de desenvolvimento e crescimento econômico dentre
as regiões do mundo, porém, como já afirmamos, trata-se de um propósito apenas
superficial, pois o que ocorre é o distanciamento social cada vez mais explícito entre os
países, tendo em vista os mecanismos intensos de acumulação.
Dentre os aspectos fundamentais da globalização apontados por Ianni, encontra-se
a "fábrica global"7, que protagoniza um processo de desterritorialização no qual as
empresas globais não mais possuem vínculos e relações estreitas com o lugar de origem
do capital, com o país ou com qualquer outro fator. As grandes corporações não possuem
pátria ou identidade com algum lugar em especial. Articulam e se mobilizam mediante as
implicações dos mercados consumidores, mediante a acumulação dos lucros e mediante
os impulsos do grande sistema econômico mundial.
A fábrica global instala-se além de toda e qualquer fronteira, articulando
capital, tecnologia, força de trabalho, divisão do trabalho social e outras
forças produtivas. Acompanhada pela publicidade, a mídia impressa e
eletrônica, a indústria cultural... dissolve fronteiras, agiliza os mercados,
generaliza o consumismo.8
As transnacionais são corporações simultaneamente localizadas e
desterritorializadas. Enraízam-se nos mais diversos e distantes lugares,
mas também se movem de um a outro todo tempo, de acordo com a
dinâmica das forças produtivas, segundo as exigências da concentração e
centralização do capital, concretizando a reprodução ampliada do capital
em moldes crescentemente globais.9
6
IANNI, Octavio. Teorias da Globalização, 1995, p. 106.
IANNI, Octavio. cp. cit.
8
IANNI, Octavio. op. cit. p. 18.
9
Idem, p. 148.
7
5
A relação espaço-tempo é redimensionada nesta lógica baseada nos avanços das
conexões, prevalecendo o potencial de consumo dos territórios e os atrativos
característicos da acumulação flexível, como qualificação e articulação entre as unidades
de produção e entre os mercados de consumo.
O crescente processo de automação das indústrias, culminando com discussões
acerca da redução da jornada de trabalho em determinados países, relaciona-se com o
avanço sem precedentes da atividade turística, sustentada de modo geral pela mídia e
pelas representações do real, os simulacros, que alimentam o imaginário e
desreferencializa os lugares.
Dá-se um processo de mundialização do modo de produção capitalista através da
internacionalização do processo produtivo, no qual a localização das empresas extrapola
os limites dos países desenvolvidos não mais se restringindo a um conjunto limitado de
nações, mas se caracterizando pela presença em todos os continentes e até mesmo em
algumas áreas metropolitanas de nações subdesenvolvidas que estão conectadas às
redes globais de informação e aos fluxos de mercadorias, como Lagos, na Nigéria, ou
Nairobi, no Quênia, países da África que possuem unidades de produção das indústrias
automobilísticas Renault e Toyota, respectivamente. Há neste sentido uma superação dos
elementos fordistas, predominando agora os interesses do circuito de consumo que cria
segmentos nas economias dos países que se revelam como promissores, direcionados
para o mercado externo, mas que sujeitam os outros segmentos industriais à
marginalização, culminando com processos de sucateamento e atraso tecnológico e,
muitas vezes, alargando as diferenças econômicas e sociais entre determinadas regiões
nestas áreas.
Podemos
destacar
como
resultado
uma
dinâmica
do
capital
marcada
principalmente pela volatilidade dos investimentos no setor financeiro, que assume cada
vez mais amplas proporções, sobretudo se considerarmos a especulação em torno de
conjunturas acerca de Estados nacionais e a questão de agências de investimentos
ligadas a setores bancários, que direcionam capitais através de rankings, mensurando os
riscos dos países freqüentemente por critérios obscuros, com pouca credibilidade e
transparência.
A rigor, o capital financeiro parece adquirir mais força do que em qualquer
época anterior, quando ainda se encontrava enraizado em centros
decisórios nacionais, mais ou menos subordinados ao Estado-nação. Além
da mundialização acelerada e generalizada das forças produtivas, dos
6
processos econômicos, da nova divisão internacional do trabalho, formamse redes e circuitos informatizados, por meio dos quais as transnacionais e
10
os bancos movem o capital por todos os centros do mundo.
Desta forma cria-se um embate entre os pressupostos do mercado e o
planejamento estatal. Em diversas oportunidades os propósitos manifestados pelo
capitalismo financeiro, na medida em que avançam os sistemas de informática, as
estratégias de marketing, acompanhadas pelas pesquisas de mercado (quantitativas e
qualitativas) e as mídias eletrônicas, chegam a se opor frontalmente com as diretrizes
traçadas pelos planos dos governos, em se tratando de cenários para investimentos ou,
em maior grau de periculosidade para as economias nacionais, de instrumentos de
políticas econômicas que atestam ou não a soberania destas economias, como a
valorização das moedas nacionais, as dívidas contraídas no exterior, as políticas de
incentivo à exportação etc.
Contudo, no cenário estabelecido do capitalismo global, as grandes corporações
também se articulam mediante os princípios do planejamento, perfazendo uma rede na
qual insere-se a matriz, determinante na gestão e nos meios de criação e localizada nos
países centrais empregando mão-de-obra qualificada e bem remunerada, as filiais,
marcadas pelos processos de produção e distribuídas em conformidade com os
interesses da empresa às vezes articulados com os incentivos de governos e, por fim, os
fluxos do processo produtivo e os circuitos de consumo internacionais.
Seria ilusório pensar que esta distribuição pudesse trazer uma solidez no
desenvolvimento econômico de nações emergentes, através da instalação de unidades
de produção das corporações transnacionais. A rigor, estes processos produtivos
encontram-se engendrados por algumas características do sistema kanban, como just in
time, estoque zero e alto grau de mecanização, destacando-se a robotização, não se
revelando portanto como fatores que possam garantir um pleno emprego para as
populações. As unidades de produção, desprovidas de qualquer processo que contempla
a criação, a gestão e a necessidade de trabalhadores qualificados, trazendo como
subsídio a localização junto às instituições de pesquisa e universidades, se localizam em
regiões periféricas, que apresentam características de dependência tecnológica,
exportando produtos com reduzido valor agregado.
Américo Pacheco atesta este panorama, afirmando que:
10
IANNI, Octavio. op. cit. p. 57.
7
...para ganhar importância dentro desta estratégia de integração global, os
países em desenvolvimento deveriam servir de alavanca à maior
competitividade das empresas transnacionais. Nesse quadro, alguns
países podem encontrar-se relativamente marginalizados se não oferecem
as vantagens locacionais requeridas pelas firmas globalmente integradas,
tais como trabalho qualificado, comércio aberto, ambiente favorável ao
investimento, infra-estrutura de transporte e telecomunicações e redes de
11
fornecedores locais com as quais as transnacionais possam interagir.
Em verdade a globalização não contempla um desenvolvimento equilibrado das
regiões do planeta, mas ao contrário, contribui para aumentar as diferenças entre as
nações hegemônicas (América Anglo-Saxônica, Europa e Japão) e o restante do mundo,
principalmente em relação à África e a certas regiões da Ásia.
As conseqüências são levas de imigrantes invadindo a Europa (como turcos na
Alemanha, argelinos na França, nigerianos na Holanda, albaneses na Itália, ucranianos
em Portugal) e os Estados Unidos (principalmente mexicanos, chineses e sul-coreanos),
exercendo funções de baixa qualificação e remuneração para os padrões locais. A
globalização parece, ao estabelecer os ciclos de enriquecimento e concentração,
contribuir cada vez mais para provocar efeitos antagônicos em outras áreas, aumentando
a pobreza e tornando a qualidade de vida cada vez mais precária, mesmo em algumas
zonas de metrópoles mundiais centrais, comprometendo inclusive a produção e,
consequentemente, a geração dos lucros. Caberia-nos, frente a isto, citar o que Marx
antevia no "Manifesto do Partido Comunista" ainda no ano de 1848:
As relações burguesas de produção e de circulação, as relações
burguesas de propriedade, a moderna sociedade burguesa, que fez
aparecer meios de produção e de circulação tão poderosos, assemelha-se
ao feiticeiro que já não consegue mais dominar os poderes subterrâneos
que invocou.12
A atual crise visivelmente constatada do capitalismo financeiro é um dos
indicadores do grau acentuado de concentração de poder em poucas grandes
corporações mundiais. Poder este estabelecido por meio das redes de informação e
através da articulação com os processos produtivos em nível global, enfraquecendo o
papel das economias públicas nacionais e gerando uma massa formidável de imigrantes
nas nações subdesenvolvidas ou em desenvolvimento, que partem para os países
hegemônicos em busca de melhores condições de subsistência. "Na verdade, a
globalização identifica-se com um estágio mais avançado do processo histórico de
11
PACHECO, Américo. Fragmentação da Nação, 1998, p. 255.
8
internacionalização do capitalismo. É de se imaginar as conseqüências que um processo
dessa natureza tem para os limites do desenvolvimento das nações e para a autonomia
dos Estados Nacionais".13
As considerações de Ianni sobre o processo de globalização são conduzidas a
partir das categorias marxistas, revelando os elementos contraditórios deste processo e
compreendendo-o a partir de referenciais históricos, muitas vezes atestando o caráter
cultural e o papel exercido pelos meios de comunicação de massa. A rigor a postura de
Marx pode ser analisada como a de um "profeta da Globalização",14 conforme atesta com
muita propriedade Rubens Ricúpero, pois revela ainda no século XIX um discurso que se
mantém, no século XXI, vivo e pertinente, contendo elementos atuais e que mostram o
grau excludente e concentrador que está por detrás dos mecanismos de acumulação por
parte dos blocos hegemônicos de poder.
12
MARX, K. & ENGELS, F. op. cit., p. 13.
PACHECO, A. Fragmentação da Nação, 1998, p. 250-251.
14
RICUPERO, Rubens. Marx Profeta da Globalização In: Estudos Avançados, 1998, p. 61.
13
9
SÃO PAULO: CIDADE MUNDIAL
Vimos anteriormente que o processo de globalização se dá de forma não
homogênea, estabelecendo patamares diferenciados de concentração das áreas
produtivas no globo e contribuindo, desta forma, para o aparecimento de profundas
desigualdades entre os países.
Podemos afirmar que um dos reflexos destes aspectos no Estado de São Paulo se
configurou no que podemos qualificar como interiorização ou desconcentração industrial,
resultante das novas estratégias do capital em organizar de forma racional e estrutural
suas etapas, como forma de sustentar a acumulação. Também é importante destacar os
fatores endógenos que contribuíram para esta desconcentração, tendo em vista os
aspectos históricos, e aí nos referimos aos inúmeros ciclos da economia brasileira, tanto
no período colonial, como a partir da independência, e também os próprios fatores
intrínsecos do capitalismo no Brasil que não se dissociam, todavia, do contexto do
capitalismo internacional.
Nossa argumentação procura sustentar o que vários autores já anunciam: o papel
importante, lapidar, fundamental exercido pela Metrópole Paulistana neste cenário do
capitalismo internacional, global, concentrando serviços já tidos como avançados e que se
encontram na vanguarda das transformações capitalistas. Ao mesmo tempo como uma
grande cidade que apresentou uma mudança em seu perfil econômico, através de uma
queda constante da participação do setor secundário e, paralelamente, um aumento da
presença do setor de serviços.
Em primeiro lugar torna-se primordial salientarmos o papel também importante do
Estado de São Paulo como unidade da federação que abriga inúmeros investimentos do
setor secundário, contrariando certas proposições que afirmam haver um consistente e
contínuo deslocamento industrial para outros estados.
Na verdade tanto Azzoni como Diniz15 concordam, com pertinência, em não haver
uma inversão da polarização industrial, ou seja que São Paulo continua como pólo
importante, quer na estruturação do setor industrial, quer na configuração de novos ramos
de serviços, o que em certa medida contribui para um inchaço das atividades do setor
terciário, abarcando inúmeras atividades exercidas por trabalhadores com os mais
variados graus de qualificação, desde os vendedores de sanduíches até os consultores
empresariais altamente instruídos. O que nos propomos será destacar os serviços
15
PACHECO, Américo. Fragmentação da Nação, 1998, p. 212-213.
10
qualificados, bem como alguns novos empreendimentos relacionados com os mesmos,
que compreendem a gestão dos processos produtivos envolvendo também novas
técnicas avançadas em gerir a informação, a principal "ferramenta" da sociedade
contemporânea.
Constatamos no Brasil, durante o ciclo de desenvolvimentismo propagado pelo
Governo Militar nos anos 70, um aporte considerável de investimentos do Estado como
agente ativo na configuração de uma estrutura industrial, alicerçada nas indústrias
petroquímicas, na formação de um complexo militar-estratégico, assim como na
implantação da infra-estrutura necessária, quer com a construção de um razoável sistema
rodoviário, quer com a instalação de usinas de energia, utilizando-se também a fonte
nuclear. Ressalve-se, todavia, que estes aportes se basearam em poupança externa
contraída junto a organismos financeiros internacionais, que custaram ao Brasil
transferências de capital consideráveis, como pagamento de juros e amortizações,
sobretudo durante a década posterior, conhecida como "a década perdida".
Mesmo que de modo errático em alguns segmentos16, o Estado Nacional procurava
traçar diretrizes mestras na configuração de novas áreas industriais no interior de São
Paulo e em outras regiões do Brasil17, sendo que nos anos 80, marcado por um período
de recessão em nível mundial iniciado pelo choque do petróleo de 1979, houve uma
interrupção deste processo. Para Américo Pacheco:
... a paralisia do investimento industrial bloqueava um movimento mais
intenso de desconcentração; mas, ao mesmo tempo, o ajuste da economia
brasileira abria alternativas de inversão pontuais nos setores aptos a
beneficiar-se com os estímulos à exportação.18
Este período de recessão foi acompanhado de arrocho salarial, o que fomentou os
movimentos de operários no Grande ABC no final dos anos 70 e início dos anos 80,
culminando com a fundação do Partido dos Trabalhadores, de elevação dos níveis
16
Caberia aqui destacar o sucateamento da malha ferroviária e o total desvirtuamento de políticas públicas
de incentivo regional fomentadas por órgãos como SUDAM e SUDENE.
17
Houve a criação de um complexo industrial - militar - estratégico em São José dos Campos, Vale do
Paraíba paulista, principalmente durante o Governo Geisel (1974 - 1979). Este complexo envolveu
instituições de ensino, como o ITA, Instituto Tecnológico da Aeronáutica, e o CTA, Centro Técnico
Aeroespacial, que instrumentalizavam tanto a EMBRAER, Empresa Brasileira de Aeronáutica (que havia
lançado as aeronaves Bandeirante, utilizado tanto na aviação civil como na militar, e Xavante, como avião
subsônico de caça e treinamento, ambos ainda pertencentes às unidades da Força Aérea Brasileira), como
a ENGESA (que produziu um número considerável de blindados para o Exército Brasileiro, destacando-se
os veículos Cascavel e Urutu) e a AVIBRÁS (fabricante do lançador múltiplo de foguetes Astros, também
utilizado pelo Exército Brasileiro).
18
PACHECO, Américo. Fragmentação da Nação, 1998, p. 228-229.
11
inflacionários e, paralelamente, de uma estagnação da capacidade de investimento do
Estado, trazendo a total inércia e paralisia de alguns setores do Governo Federal.19
São por estes motivos que podemos afirmar que não houve um atrofiamento da
estrutura econômica da Região Metropolitana, havendo sim uma transformação na
periferia da mancha conurbada, ocasionando um desenvolvimento da indústria que gerou
como conseqüência uma interdependência destas atividades com o avanço do setor
terciário, ainda em franca expansão na Capital e em seu entorno.
O cenário que se concretiza é o da consolidação de uma mancha industrial,
apresentando uma continuidade geográfica, o que segundo Azzoni se verifica como
sendo "apenas um espraiamento da indústria, em um processo do tipo desconcentração
concentrada".20
O que também contribui para isto é uma certa debilidade de outras regiões
nacionais como alternativa frente a São Paulo. De fato, a incompetência do aparelho
estatal na integração efetiva do território brasileiro e o aparecimento de áreas muito
prósperas no Centro-Sul apenas fez com que aumentassem os contrastes entre as
regiões brasileiras, acentuando de forma exacerbada as desigualdades existentes.
Ocorre, em verdade, a criação de unidades produtivas complementares em áreas
periféricas que, por sua vez, encontram-se articuladas com os grandes centros urbanos
do Sudeste, em especial São Paulo e Rio de Janeiro.
São Paulo consolida-se como centro de gestão, como território nuclear das ações
estratégicas das empresas havendo, desta forma, uma nova conformação da atividade
produtiva. O deslocamento da indústria para o interior e outras regiões traz, por outro
lado, o crescimento do setor terciário, inclusive com a explosão das atividades de baixa
qualificação, nas quais se amplifica o trabalho informal e o subemprego. Há desta forma
um elemento de ordem social destacado por Américo Pacheco com muita perspicácia e
que se acentua com evidência: a "metropolização da pobreza".21
19
Seria pertinente relembramos o papel desempenhado pelo Banco do Brasil, que até meados dos anos 80
era um dos locais mais procurados para se trabalhar, havendo uma grande disputa na obtenção de vagas
que envolvia profissionais altamente qualificados. Era muito comum ouvirmos que o melhor emprego era ser
funcionário do Banco do Brasil. Durante o início dos anos 80, apenas para ilustrar o impressionante valor
das ações preferenciais do Banco, era possível adquirir, ao final de um ano, valor correspondente para se
comprar uma casa de médio padrão no interior de São Paulo ou um automóvel Fusca, apenas com o
dinheiro obtido com os dividendos de um lote de 100 mil ações. Para se ter uma idéia da desvalorização dos
papéis do Banco, atualmente um mesmo lote de 100 mil ações PN (preferenciais nominais) está cotado na
Bolsa de Valores de São Paulo a R$ 9,95 (cotação de 07.01.03). Muito desta perda se deve ao uso político
desta instituição, principalmente durante o período dos Governos de José Sarney (1985 - 1989) e Fernando
Collor (1990 - 1992).
20
PACHECO, Américo. Fragmentação da Nação, 1998, p. 212-213.
21
Idem, p. 238.
12
Sem perder de vista os elementos presentes na globalização, que dão formas
muito contundentes à nova organização produtiva e organizacional das empresas, a
Região Metropolitana de São Paulo, em especial a Capital, passa a se articular com os
novos ramos industriais através do oferecimento de atividades terciárias qualificadas, que
despontam como as estruturadoras na geração de empregos e renda, tal como ocorre nas
metrópoles dos países centrais.
O capitalismo, organizado mundialmente, expande-se em direção a novas áreas,
as cidades mundiais, trazendo implicações que marcam profundamente os respectivos
territórios. É o caso de São Paulo: uma cidade que contempla certos pré-requisitos
locacionais, culminando com o desenvolvimento do setor terciário sofisticado e, ao
mesmo tempo, permanece como líder na estruturação produtiva do Brasil. Desta forma
podemos acentuar, concordando com Luiz Ablas22, que o Município de São Paulo
consolida-se como um centro com dupla função: propiciar a reprodução do sistema
capitalista ao articular a economia brasileira com o sistema produtivo internacional e, na
condição de maior cidade do país, ser o principal centro de referência econômica.
O aglomerado urbano de São Paulo enquadra-se em grande medida nessa
caracterização de cidade mundial situada em um país subdesenvolvido,
mas fazendo parte da semiperiferia do sistema capitalista mundial, o que
leva a metrópole paulistana a assumir um papel integrativo entre o
capitalismo mundial e a economia brasileira.23
As redes globais de informação bem como as transformações técnicas trazem a
necessidade imperiosa de maior articulação entre as empresas com as demais unidades
de produção a partir de seus pontos de gestão, implicando em "requisitos locacionais
novos",24 conforme as considerações de Américo Pacheco. Estes confirmam a liderança
do Estado de São Paulo como importante pólo concentrador de centros de pesquisa e
tecnologia (destacando-se o IPT, Instituto de Pesquisas Tecnológicas), universidades
(USP, UNESP e UNICAMP), apresentando ainda uma diversidade de facetas no campo
cultural e de lazer, como cinemas, teatros, museus, centros culturais, livrarias,
exposições, eventos variados, etc.. Estes atributos dotam a Região Metropolitana de uma
mão - de - obra qualificada que está pronta a atender alguns destes requisitos locacionais
demandados pelos segmentos do setor terciário mais avançado ou superior, resultando
22
ABLAS, L. São Paulo: Cidade Mundial ou Metrópole Subdesenvolvida ?, In: São Paulo em Perspectiva,
vol. 7, no 2. Revista da Fundação SEADE, abril/junho, 1993.
23
Idem p. 47.
24
PACHECO, Américo. Fragmentação da Nação, 1998, p. 249.
13
também em ganhos salariais maiores se comparados com regiões com sistemas
educacionais e culturais pouco desenvolvidos.
O que se evidencia, diante deste diagnóstico, é a importância das novas
tecnologias da informação, o que para Jordi Borja e Manuel Castells25 se revelam como
um dos segmentos de vanguarda na atual conjuntura de reorganização administrativa e
produtiva dos grandes conglomerados mundiais. O fato é que as grandes metrópoles do
mundo assumem uma importância cada vez maior tendo em vista dois aspectos que se
fortalecem, na medida em que o processo de globalização caminha; a dispersão espacial
das unidades de produção e a crescente articulação mediada pelos sistemas eletrônicos
de comunicação, cada vez mais potentes, e pelos sistemas de transportes, cada vez mais
integrados, conectando as grandes metrópoles através dos aeroportos internacionais,
estes formidáveis e gigantescos equipamentos de transportes do mundo globalizado.
Para Borja e Castells estas grandes cidades, conhecidas como mundiais,
apresentam quatro importantes funções, a saber:
Primeiro como pontos direcionais da organização da economia mundial,
altamente concentrados;
Segundo como localizações chave para finanças e firmas de serviços
especializados;
Terceiro como lugares de produção, incluindo a produção de inovação em
setores avançados de serviços, e
Quarto como mercados para os produtos e inovações produzidas.26
As grandes empresas se apropriam destas inovações tecnológicas que
caracterizam a III Revolução Industrial e passam a incorporar em suas estratégias de
gestão e expansão estas novas "ferramentas", possibilitando-as a dispersarem suas
respectivas unidades de produção e, ao mesmo tempo, reintegrarem a diretriz básica
traçada pela matriz, isto é o "norte", por meio destas novas tecnologias. Borja e Castells
colocam a importância dos meios de inovação tecnológica também como fator decisivo
para definir a localização industrial e para a constituição das "redes globais de conexão
entre os territórios descontínuos".27 Assim as grandes metrópoles assumem um papel
estruturador, pois "concentram as funções superiores de direção, produção e gestão do
25
BORJA, J. & CASTELLS, M. El Impacto de la Globalización sobre la Estructura Social y Espacial de las
Ciudades, in: Local y Global. La Gestón de las Ciudades en la Era de la Información. Madrid:
Taurus/Pensamiento, 1997, p. 35-74.
26
Idem, p. 41.
27
Idem, p. 46 a 49.
14
planeta; os centros de poder político, o controle dos meios de comunicação, a capacidade
simbólica de criação e difusão das mensagens dominantes".28
São Paulo se insere neste contexto como grande metrópole concentradora destes
serviços, repercutindo inclusive em seu tecido urbano as transformações desencadeadas
por este processo. As centralidades podem testemunhar este episódio, mesmo a partir de
um resgate histórico, enumerando territórios como o Centro Histórico e a orla ferroviária, a
Avenida Paulista e a Avenida Luís Carlos Berrini, bem como toda a região da várzea do
Rio Pinheiros. Cada uma destas áreas se vincula a um cenário econômico específico,
abrangendo ainda uma elite dirigente, uma organização da produção também peculiar
retratando, de certa forma, os diferentes momentos do capitalismo no Brasil.
No caso particular do eixo de desenvolvimento da região Sudoeste da Capital
podemos apontar vários agentes desencadeando profundas transformações que estão
alicerçadas nos empreendimentos imobiliários, através da iniciativa privada, como a
construção de conjuntos comerciais, escritórios, shoppings centers, e nos investimentos
públicos, como a Linha 5 do Metrô (Capão Redondo-Santo Amaro) inaugurada em
Setembro de 2002, a Linha Sul da CPTM29 (que atravessa toda a várzea do Rio
Pinheiros) recentemente remodelada e ampliada, a Avenida Águas Espraiadas, a
extensão da Avenida Faria Lima, o Túnel Presidente Jânio Quadros, etc. Também
merecem destaque os equipamentos já existentes como CEASA, Centro Empresarial
Santo Amaro, Cidade Universitária, Instituto Butantã, Jockey Club, Parque Villa-Lobos,
shoppings Eldorado, Morumbi e Villa-Lobos, etc. "A nova elite gerencial e tecnocrática que
ocupa o ápice do novo sistema cria seus espaços exclusivos, tal como a anterior elite
burguesa".30
Os megaprojetos imobiliários, especificamente, realizados muitas vezes pelo
capital externo, trazem grandes modificações na configuração da Metrópole. Elaboram-se
novas técnicas de construção, edificam-se arrojadas estruturas, utilizam-se novos
materiais, revitalizam-se áreas abandonadas e incorporam-se novos usos e tendências,
acompanhando uma diretriz de fragmentação do tecido urbano como um todo. Fora do
eixo Marginal Pinheiros e Região Sudoeste (compreendendo os bairros como Itaim Bibi,
Moema, Campo Belo e Jardins), podemos destacar o recém inaugurado Centro
Empresarial Água Branca na Zona Oeste, margeando uma área desvalorizada do entorno
28
Idem p. 50-51.
Companhia Paulista de Trens Metropolitanos; empresa vinculada à Secretaria de Estado dos Transportes
Metropolitanos.
29
15
ferroviário paulistano, mas próxima do Shopping Center West Plaza, da Sociedade
Esportiva Palmeiras e do Terminal Intermodal da Barra - Funda, estação terminal da Linha
3-Vermelha do Metrô.
O megaempreendimento, na verdade, indica uma tendência que deve
pautar os futuros investimentos determinantes na reestruturação urbana de
São Paulo, grandes projetos de desenvolvimento imobiliário e urbano
promovidos pelo capital internacional, apontando a potencial inserção de
São Paulo no sistema das grandes cidades globais.31
Agências de investimentos e de fomento ao setor financeiro passam a fornecer
subsídios para os investimentos em nível mundial, classificando países e estabelecendo
escalas de segurança de retorno mediante o capital empregado. Seguindo este raciocínio
a tabela 1 apresenta um ranking que traz as cidades mais caras do mundo, segundo uma
agência de investimentos da República da Irlanda, a Finfacts.
As grandes metrópoles passam, portanto a se comunicar e se articular com as
demais áreas do mundo a partir dos aeroportos internacionais, grandes estruturas que se
localizam em áreas afastadas dos centros e que apresentam uma racionalidade e
padronização como forma de expressão do processo de globalização, marcado pelo
capitalismo financeiro.
Diante disto tornam-se novas centralidades, exigindo formas de conexão com as
demais localidades da cidade ou do entorno em questão e também implicando no
oferecimento de serviços como hotéis, shopping centers ou centros de convenções, de
forma a atender a crescente demanda causada pelo incremento da atividade turística e
pela própria expansão do setor terciário qualificado.
Em São Paulo algumas intervenções testemunham este episódio, como a recente
construção do Shopping Internacional em Guarulhos, junto à Rodovia Presidente Dutra, e
o projeto de trem expresso ligando estações do metrô da Linha 3-Vermelha (antiga Leste Oeste) ao Aeroporto Internacional. No nível mundial podem ser destacados os recentes
empreendimentos da rede francesa de hotéis Accor, construindo unidades dos Grupos
Ibis, Novotel e Mercure nas proximidades dos aeroportos europeus e de estações de
trem, expandindo-se também no Brasil frente a crescente demanda pelos serviços de
hotelaria, no caso das unidades Ibis, referentes à categoria econômica, um segmento em
30
BORJA, J. & CASTELLS, M. El Impacto de la Globalización sobre la Estructura Social y Espacial de las
Ciudades, In: Local y Global. La Gestón de las Ciudades en la Era de la Información. 1997, p. 56-57.
31
BRISSAC, N. Espaços Estruturados e Informes: São Paulo Diante da Globalização. Cidade Global:
Anotações Críticas sobre um Conceito, In: São Paulo em Perspectiva, 2000, p. 100.
16
franca expansão tendo em vista o turismo de eventos e de negócios. Em Paris, no próprio
Aeroporto Internacional Charles DeGaulle, está em construção um hotel em seu interior
com isolamento acústico total, justamente atestando que estes grandes terminais também
se constituem como pontos de integração e, sobretudo, de conexão com outros
estabelecimentos em diferentes localidades.
Como conseqüência observa-se um crescente aumento do tráfego aéreo
internacional, tanto em relação ao volume de cargas transportadas como em relação ao
número de passageiros, como aponta a tabela 2. Não seria exagero colocarmos que o
setor aéreo torna-se estratégico para os países tendo em vista a importância dos fluxos
que ligam os grandes aeroportos do mundo, tornando-se cruciais na cadeia produtiva de
determinados segmentos industriais e de serviços, desencadeando o aparecimento de
empresas de entregas de cargas, encomendas e correspondências em geral, conhecidas
como courrier.
Tabela 1 - Cidades Mais Caras do Mundo
Referência: Nova York = 100 - Ano 2001
CIDADE
ÍNDICE
1
Tóquio (Japão)
134.0
2
Moscou (Rússia)
132.4
3
Hong - Kong (China)
130.0
4
Pequim (China)
124.4
5
6
Osaka (Japão)
116.7
Xangai (China)
114.3
7
São Petersburgo (Rússia)
106.5
8
Nova York (EUA)
100.0
9
Guangzhou (China)
97.4
10
Seul (Coréia do Sul)
95.3
11
Hanói (Vietnã)
94.3
12
Taipé (Taiwan)
92.9
13
Londres (Reino Unido)
92.9
14
Shenzhen (China)
90.8
15
Ho Chi Minh (Vietnã)
88.4
16
Cingapura (Cingapura)
86.4
17
White Plains (EUA)
85.5
18
Tel Aviv (Israel)
85.0
19
San Francisco (EUA)
84.4
20
Chicago (EUA)
84.3
17
21
Kiev (Ucrânia)
83.8
22
Beirute (Líbano)
83.8
23
Buenos Aires (Argentina)
83.6
24
Los Angeles (EUA)
83.4
25
Miami (EUA)
83.0
Fonte: William M. Mercer 2001 - Cost of Living Survey,
Finfacts Worldwide 2001 Cost of Living Survey, City Rankings.
Torna-se evidente, ao observarmos a tabela 2, que os movimentos de passageiros
e de cargas denunciam um caráter concentrador na circulação das riquezas em nível
internacional. Dos 30 aeroportos mais movimentados do mundo em número de
passageiros, 17 localizam-se nos Estados Unidos; em relação ao montante de carga
transportada o número cai para 14, mas se analisarmos os pousos e decolagens há nada
menos do que 26 aeroportos norte - americanos, sendo que os 4 restantes são os
grandes terminais europeus, Charles DeGaulle em Paris, Heatrow em Londres, Frankfurt
e Schipol em Amsterdã. Apenas alguns aeroportos de países emergentes figuram nas
classificações, demonstrando a inserção de algumas economias no sistema global de
produção e circulação.
Na lógica da expansão industrial para as áreas além da Região Metropolitana de
São Paulo, destacando-se Campinas, São José dos Campos e Sorocaba, a Secretaria de
Estado dos Transportes desenvolveu o PDDT Vivo, ou seja, o Plano Diretor de
Desenvolvimento de Transportes (Anexo 3), prevendo, em um prazo de 20 anos e
investimentos de cerca de R$ 34 bilhões, uma série de obras que terão como objetivos:
•
•
•
•
promover uma expansão regrada da oferta de transportes;
reduzir a dependência excessiva do modal rodoviário e estimular o
desenvolvimento do transporte por ferrovias;
promover o casamento entre os diferentes modais;
induzir à desconcentração do transporte no quadrilátero formado pelos
municípios de Santos, São José dos Campos, Campinas e Sorocaba onde trafega 50 % da carga movimentada no Estado - transformando o
transporte em indutor de desenvolvimento em outras regiões
paulistas32 (marcador nosso).
O PDDT prevê a construção de sete CLIs, Centros Logísticos Integrados, sendo
nas zonas Norte, Oeste e Leste da Capital, em Campinas, Taubaté, Santos e São
Sebastião. Dentre as obras programadas encontram-se o sistema de navegação de
32
O Estado de São Paulo, 17.12.2000, p. B-12.
18
cabotagem entre Santos e São Sebastião, a construção do Rodoanel, do Ferroanel e de
um sistema de transporte ferroviário de alta velocidade, tanto para cargas como para
passageiros, ligando Campinas, São Paulo, Vale do Paraíba e Rio de Janeiro, passando
pelos aeroportos internacionais de Guarulhos e Tom Jobim, o que deverá implicar em
investimentos também do Governo Federal.
Nos Centros Logísticos Integrados haverá a integração de diferentes modais,
agregando rodovias, ferrovias e dutovias com terminais de transporte, incluindo terminais
aeroportuários, destacando-se em especial o intenso volume de cargas transportadas
através do Aeroporto de Viracopos em Campinas, racionalizando desta forma os custos e
o tempo de viagem.
Este Plano atesta a formação de uma grande região funcional, extrapolando os
limites da Região Metropolitana, que tem a importante função de gestão e comando,
chegando a municípios que são centros regionais de relevância fora da Grande São Paulo
e que passaram por processos de industrialização junto aos eixos rodoviários que saem
da Capital de forma radial a saber: Anhangüera-Bandeirantes no sentido de Campinas,
Castelo Branco-Raposo Tavares no sentido de Sorocaba e Presidente Dutra-Ayrton
Senna/Carvalho Pinto no sentido do Vale do Paraíba.
Esta grande região funcional, marcada por um elevado grau de produção e de
gestão, demanda uma intensa mobilidade através dos equipamentos de transportes,
imprescindíveis para a plena conexão com a rede global, justificando a elaboração do
PDDT pelo Governo do Estado de São Paulo.
Seguindo esta linha de pensamento Sandra Lencioni afirma que:
A reestruturação da metrópole de São Paulo, produto dos processos de
concentração e centralização do capital, se traduz num fenômeno sócio espacial novo, criação e reiteração de uma região metropolitana mais
complexa, fragmentada e hierarquizada, em que a conurbação de cidades,
o crescimento relativamente menor de algumas ou exacerbado de outras .
. . não significam processos autônomos de metropolização. Ao contrário,
são manifestações constitutivas da expansão do espaço metropolitano
paulista, que se configura numa 'macro - metrópole' que é reforçada e não
negada pela dispersão das suas atividades.33
Assumindo algumas características desta mundialização a Grande São Paulo
insere-se também como localidade concentradora de serviços avançados, destacando-se
as novas formas de armazenagem de informação. Um exemplo marcante é a expansão
19
das atividades do Grupo Kraft34, sediado no município de Barueri, por meio de três de
suas quatro empresas: a Store, a DataSafe e a StoreTech, todas elas atuando há cerca
de 4 anos neste novo segmento de serviços que atesta o papel importante
desempenhado pela Região Metropolitana junto ao contexto da economia global.
A expansão recente destas empresas, que trabalham com sofisticados softwares,
hardwares e sistemas de armazenagem e acondicionamento, testemunha o aspecto vital
da informação gerencial como a verdadeira essência das corporações, exigindo um
cuidado sem precedentes em seus processos de arquivamento. Certamente se as
empresas sediadas no World Trade Center dispusessem de arquivos de segurança fora
de suas sedes de gestão elas não se extinguiriam, pois a sede física diante da informação
passa a ser secundária. A perda da informação provocou, especificamente no caso dos
ataques de 11 de Setembro, danos irreversíveis. "Este espraiamento das atividades foi
historicamente tornado possível pela tecnologia, principalmente por aquelas capazes de
33
LENCIONI, S. Reestruturação Urbano Industrial no Estado de São Paulo: A Região da Metrópole
Desconcentrada, in: Espaço e Debates, 1994, p. 59.
34
A Store - Sistemas Inteligentes de Armazenagem - é uma empresa sediada em Barueri, município da
Região Metropolitana de São Paulo, e pertence ao Grupo Kraft. O Grupo iniciou suas atividades em
setembro de 1988 em Santo Amaro, zona sul, como empresa transportadora de mudanças em geral, guarda
móveis e terceirização de almoxarifados. As origens da Store remontam ao ano de 1991, quando um cliente
mostrou-se interessado na guarda do arquivo morto. Um ano depois, em maio, foi criada a Store - Sistemas
Inteligentes de Armazenagem - que aos poucos passou a aumentar a participação no mercado através da
conquista de novos clientes. Em março de 1996 foi construída uma nova sede em Alphaville, bairro
residencial de alto padrão localizado em Barueri, mas que apresenta também áreas de uso misto,
mesclando uso residencial, comercial e de serviços. Um ano depois, em 1997, ocorreu a desativação da
sede original em Santo Amaro. No final de 1998 um dos clientes, a empresa de assistência médica Classes
Laboriosas, solicitou à Store a guarda de fitas de back - up, nas quais constava seus arquivos e informações
internas. Este pedido fez com que a Store levasse 1 ano para montar um sistema em armazenagem de
segurança. Em 2000, através do já implantado Departamento de Armazenagem, cria-se a DataSafe, a
terceira empresa do Grupo que emprega a armazenagem em cofres de altíssima segurança utilizando-se o
sistema Off Site Storage para Segurança da Informação. No final do mesmo ano surge a StoreTech, a
quarta empresa que tem como carro - chefe as seguintes atividades: microfilmagem, digitalização de
imagens, atividades COM - computer to microfilm (que compreende uma redução de cerca de 60 vezes o
tamanho original do documento com qualidade fotográfica em formato de negativo; a visualização se dá
através de um leitor de microficha), e atividades COLD - computer output to laser disc (na qual cria-se um
relatório dentro de um CD e pesquisa-se posteriormente utilizando-se um software apropriado, semelhante a
programas de busca). Em todos os processos citados gera-se um back - up, ou seja um sistema de arquivos
de reserva. O Grupo possui atualmente 870 funcionários e arquiva cerca de 1 milhão e 100 mil caixas de
arquivo, constituindo um volume impressionante de 3 bilhões e 850 mil folhas de papel (considerando que
cada caixa comporta 3 mil e 500 folhas). Suas instalações ocupam 31 mil m2 estando distribuídas da
seguinte forma: 3 mil m2 em Recife - PE, 13 mil em Campo Limpo Paulista, município próximo de Campinas,
e 15 mil m2 em Barueri, unidade principal onde se realiza a gestão do Grupo. Dentre os principais clientes
(no total são cerca de 450) destacam-se os bancos, como ABN AMRO Real, Bradesco, Nossa Caixa Nosso
Banco, construtoras, como a OAS, e empresas do setor de informática, AOL, Microsoft e UOL. O objetivo
das empresas do Grupo Kraft é o de recuperar informações de maneira rápida, garantindo a pronta
localização e disponibilização das mesmas, atuando com segurança, precisão e maximização de tempo e
espaço físico.
20
processar e explorar informações, permitindo unir a descontinuidade espacial do processo
de produção".35
Tabela 2 - Maiores Aeroportos do Mundo - Movimentação em Janeiro e Fevereiro - Ano 2002
Passageiros
Cargas (toneladas)
Pousos e Decolagens
1
Atlanta (EUA)
2
Tóquio - Haneda (Japão) 8995458 Hong - Kong (China)
3
Chicago (EUA)
4
Londres (Reino Unido) 8823140 Anchorage (EUA)
5
Los Angeles (EUA)
6
10777208
543475 Chicago (EUA)
139454
325167 Atlanta (EUA)
137726
253327 Dallas (EUA)
117741
253230 Los Angeles (EUA)
98504
8082173 Incheon (Coréia do Sul)
250082 Phoenix (EUA)
84096
Dallas (EUA)
7666621 Tóquio - Narita (Japão)
244704 Minneapolis (EUA)
76771
7
Paris (França)
6625170
Miami (EUA)
242223 Paris (França)
76700
8
Frankfurt (Alemanha)
6543995
Frankfurt (Alemanha)
238458 Las Vegas (EUA)
76303
9
Bangcok (Tailândia)
5458588
Cingapura (Cingapura) 238424 Detroit (EUA)
75592
10
Amsterdã (Holanda)
5191290
Louisville (EUA)
233515 Cincinnati (EUA)
75166
11
Hong - Kong (China)
5148000
Nova York (EUA)
212000 Charlotte (EUA)
75038
12
Houston (EUA)
5138049
Paris (França)
200044 Miami (EUA)
74052
13
Las Vegas (EUA)
5121271
Amsterdã (Holanda)
195451 Filadélfia (EUA)
73361
14
Phoenix (EUA)
5079394
Londres (Reino Unido) 192913 Londres (Reino Unido) 72900
15
Denver (EUA)
4984566
Chicago (EUA)
186430 Houston (EUA)
72576
16
Miami (EUA)
4955504
Taipé (Taiwan)
183764 Denver (EUA)
72553
17
Minneapolis (EUA)
4763200
Bangcok (Tailândia)
143398 St. Louis (EUA)
71530
18
Madri (Espanha)
4670898
Indianápolis (EUA)
135691 Pittsburg (EUA)
71049
19
Cingapura (Cingapura) 4472906 Newark (EUA)
118000 Frankfurt (Alemanha)
69469
20
San Francisco (EUA)
4357868
Osaka (Japão)
112302 Phoenix (EUA)
68626
21
Detroit (EUA)
4188224
Atlanta (EUA)
111690 Newark (EUA)
63000
22
Orlando (EUA)
4175699
Dubai (Emirados)
106179 Salt Lake City (EUA)
62648
23
Newark (EUA)
3929200
Dallas (EUA)
106036 Sanford (EUA)
62102
24
Tóquio - Narita (Japão)
3904816 Tóquio - Haneda (Japão)
103587 Memphis (EUA)
61943
25
Sidney (Austrália)
3833988
Oakland (EUA)
100055 Oakland (EUA)
61601
26
Toronto (Canadá)
3737397
Filadélfia (EUA)
86843
Amsterdã (Holanda)
61618
27
Pequim (China)
3705298
San Francisco (EUA)
85455
Daytona (EUA)
60618
28
St. Louis (EUA)
3629765
Guangzhou (China)
84275
Boston (EUA)
59544
29
Nova York (EUA)
3599800
Colônia (Alemanha)
82439
Washington (EUA)
57756
30
Filadélfia (EUA)
3468490
Bruxelas (Bélgica)
80980
Santa Ana (EUA)
57519
8844486
Memphis (EUA)
Los Angeles (EUA)
Fonte: ACI - Airports Council International, Genebra, Suíça.
35
Idem.
21
Como espaços que contemplam os fluxos, as grandes metrópoles, qualificadas por
Borja e Castells como "megacidades",36 moldam um cenário no qual há uma perda das
relações humanas, minimizando a escala pedestre em detrimento dos corredores de
circulação. A frota da cidade São Paulo já ultrapassa cinco milhões de veículos, o que
produz uma proporção alarmante de praticamente meio automóvel para cada habitante!
Este modelo contrapõe-se à cidade tradicional, marcada pelas relações sociais de
vizinhança e pelos referenciais históricos de cada indivíduo. "Um mundo residual: é o que
restou depois que a área foi desprovida de toda vida comunitária e memória histórica.
Refúgio do ilegal e do incontrolável, sujeito a infinitas manipulações".37
Da mesma forma como atesta o uso predatório do espaço da Cidade, Nelson
Brissac38 defende, com a mesma veemência, um papel ativo do Poder Público na
configuração de estratégias que possam se contrapor a estas exigências meramente
especulativas, combatendo a expropriação do espaço urbano com gênese principalmente
a partir dos megaprojetos imobiliários.
Independentemente do grau de desenvolvimento dos países, estando no Centro ou
na Periferia, no "Norte" ou no "Sul", nos países desenvolvidos, em desenvolvimento ou
nos países subdesenvolvidos, as "megacidades conectam a chamada economia global,
processos e funções que afetam centenas de milhões de pessoas".39
36
BORJA, J. & CASTELLS, M. El Impacto de la Globalización sobre la Estructura Social y Espacial de las
Ciudades, in: Local y Global. La Gestón de las Ciudades en la Era de la Información. Madrid:
Taurus/Pensamiento, 1997, p. 35-74.
37
BRISSAC, N. Espaços Estruturados e Informes: São Paulo Diante da Globalização. Cidade Global:
Anotações Críticas sobre um Conceito, in: São Paulo em Perspectiva, p. 101.
38
Idem.
39
BORJA, J. & CASTELLS, M. El Impacto de la Globalización sobre la Estructura Social y Espacial de las
Ciudades, in: Local y Global. La Gestón de las Ciudades en la Era de la Información, 1997, p. 51.
22
TRANSFORMAÇÕES NO VALE DO PARAÍBA
O processo de urbanização recente no Vale do Paraíba, tomando-se como
referência cronológica o fim dos anos 70, foi caracterizado pelo avanço da mancha
urbana ao longo do eixo da Rodovia Presidente Dutra, resultando atualmente em uma
área conurbada entre as cidades de São José dos Campos e Jacareí. Tal característica
também marca o eixo entre Taubaté e Pindamonhangaba ao longo da vicinal SP-062,
área que sofreu profundas modificações com a instalação de empresas de médio e
pequeno porte, estabelecimentos de serviços e um número considerável de loteamentos
residenciais e condomínios fechados. Com menores proporções a conurbação no Vale
também se dá entre os municípios de Guaratinguetá e Aparecida, Santuário Eucarístico
Nacional, ao longo do percurso da Avenida Padroeira do Brasil.
A urbanização crescente expandiu os perímetros urbanos para áreas rurais,
utilizadas até então para a pecuária bovina leiteira e culturas com reduzida produção,
sendo caracterizadas por pequenas propriedades, provocando ainda o surgimento de
distritos industriais em determinados municípios como Eugênio de Mello, em São José
dos Campos, e Moreira César, em Pindamonhangaba40.
Desta forma o Vale do Paraíba se consolidava como um dos pólos de
desenvolvimento econômico e de crescimento urbano mais contundentes do interior de
São Paulo, atestando o processo de dispersão industrial ao longo da Rodovia Presidente
Dutra, fato que se repetiu, respeitadas as devidas peculiaridades, com outras regiões do
Estado, como Sorocaba pela Castelo Branco e Campinas pelo sistema Anhangüera Bandeirantes, ambos destacados de modo geral por Sandra Lencioni.
A política de descentralização industrial significou, sobretudo, dispersão
abrangendo um raio de cerca de 150 Km a partir da capital e, indo além
desta distância, ao longo dos principais eixos rodoviários. A presente
dispersão não nega os processos históricos de concentração industrial no
40
Neste último caso vale a pena destacar o interesse de parte da população do distrito em se emancipar de
Pindamonhangaba, episódio que ocorreu durante a infinidade de emancipações de distritos no Estado de
São Paulo em 1991 (as primeiras eleições municipais para as recém criadas municipalidades foram
realizadas no ano seguinte, em 1992). Por sediar as empresas Villares e Confab a emancipação de Moreira
César causaria sérias conseqüências para a Prefeitura de Pindamonhangaba, pois empobreceria a Cidade
já que o Poder Público perderia a arrecadação de ICMS para o recém criado município vizinho, Moreira
César. Contudo o processo de emancipação do Distrito não encontrou respaldo junto ao restante de
Pindamonhangaba e verificou-se como sendo desnecessário e não prioritário, tendo em vista a reduzida
distância que separa o Distrito do Centro da Cidade (cerca de 10 Km).
23
território paulista, mas reforça a expansão da metrópole como condição e
41
elemento deste processo.
Segundo pesquisa realizada pela empresa de consultoria Simonsen Associados42,
no início do ano de 2001, "... o interior de São Paulo é o destino de metade dos
investimentos divulgados no ano passado para todo o Estado".43
O estudo também revelou que:
... o interior paulista recebeu dezenas de novas empresas, foi palco da
reestruturação de grande parte delas e permitiu a consolidação do jeito
'caipira' de fazer negócio, mesmo no ambiente globalizado e concorrido no
qual essas grandes e médias organizações atuam. Mostram ainda o
quanto podem ser bem - sucedidas estratégias que unam informalidade à
infra - estrutura logística, possibilidade de recrutar profissionais formados
em excelentes universidades, contar com funcionários mais tranqüilos e de
maior estabilidade no emprego.44
O Vale do Paraíba, ao lado de Campinas e Sorocaba, se destaca frente às demais
regiões do Estado de São Paulo por contar com importantes vantagens locacionais que
direcionam os novos investimentos, complementando as funções a partir do eixo da
Metrópole Paulistana. Este desenvolvimento privilegiou as regiões contínuas à Grande
São Paulo, já detentoras de certa infra - estrutura (rodovias, ferrovias, oferta de energia,
distância próxima de portos, melhorias urbanas, etc.) e de atividades de serviços
(universidades, centros de pesquisa, pólos comerciais, etc.), permitindo uma articulação
entre unidades de produção e centros estratégicos de gestão, o que corrobora as
considerações de Aurílio Caiado, complementando o raciocínio de Sandra Lencioni.
Na verdade, além dos centros industriais já consolidados de Campinas,
São José dos Campos, Sorocaba e Santos, e seus respectivos entornos, a
localização industrial em São Paulo tem se orientado pelos grandes eixos
de ligação à capital, privilegiando as cidades com melhor infra - estrutura
do seu entorno.45
41
LENCIONI, S. Reestruturação Urbano Industrial no Estado de São Paulo: A Região da Metrópole
Desconcentrada, in: Espaço e Debates, 1994, pág. 56.
42
O Estado de São Paulo, 11.03.2001 - pág. B-1.
43
Idem.
44
Idem.
45
CAIDADO, A. Desenvolvimento Regional. Novos Requisitos para a Localização Industrial em São Paulo,
in: São Paulo em Perspectiva, 1996, pág. 57.
24
"No eixo formado pelas rodovias Presidente Dutra e Carvalho Pinto, destacam-se
Jacareí, Taubaté, Lorena e Guaratinguetá, extrapolando-se a divisa estadual para
algumas cidades do Rio de Janeiro".46
Por outro lado podemos dizer que este desenvolvimento, não se revelando de
forma homogênea no Estado, provoca o aparecimento de relevantes contrastes entre
regiões do interior, sujeitando algumas áreas a realizarem funções secundárias e,
economicamente, sem grande importância, tais como os centros regionais de Araçatuba,
Marília, Presidente Prudente (região do Pontal do Paranapanema) e Registro (região do
Vale do Ribeira).
Tabela 3 - Maiores Empresas Industriais do Brasil Por Origem do Capital, Vendas e Setor
Ano 1999
Empresas
Sede/UF
Origem do Capital
Vendas
Setor
(US$ milhões)
1
Petrobrás
RJ
Brasil (estatal)
22 451.5
Química e petroquímica
2
Volkswagen
SP
Alemanha
4 746.9
Automotivo
3
General Motors
SP
EUA
4 153.2
Automotivo
4
Fiat Automóveis
MG
Itália
3 790.0
Automotivo
5
Souza Cruz
RJ
Reino Unido
3 286.9
Fumo
6
Gessy Lever
SP
Reino Unido/Holanda
2 875.1
Higiene, limpeza e cosméticos
7
Brahma
RJ
Brasil (privado)
2 800.8
Bebidas
8
Vale do Rio Doce
RJ
Brasil (privado)
2 669.6
Mineração
9
Nestlé
SP
Suíça
2 364.2
Alimentos
10
Ford
SP
EUA
2 481.1
Automotivo
11
Mercedez - Benz
SP
Alemanha
2 091.3
Automotivo
12
Ericson
SP
Suécia
2 056.3
Eletroeletrônico
13
CSN
RJ
Brasil (privado)
2 035.8
Siderurgia e metalurgia
14
Embraer
SP
Brasil (privado)
1 943.7
Automotivo
15
Ceval
SC
Bermudas
1 767.5
Alimentos
16
Sadia
SC
Brasil (privado)
1 765.3
Alimentos
17
Cargill
SP
EUA
1 712.4
Alimentos
18
Gerdau
RJ
Brasil (privado)
1 672.7
Siderurgia e metalurgia
19
Siemens
SP
Alemanha
1 526.9
Eletroeletrônico
20
Usiminas
MG
Brasil (privado)
1 481.0
Siderurgia e metalurgia
21
Basf
SP
Alemanha
1 391.2
Química e petroquímica
46
Idem.
25
22
Copene
BA
Brasil (privado)
1 307.8
Química e petroquímica
23
Perdigão
SP
Brasil (privado)
1 090.8
Alimentos
24
Multibrás
SP
Brasil (privado)
1 083.6
Eletroeletrônico
25
Novartis
SP
Suíça
1 066.8
Farmacêutica
26
Motorola
SP
EUA
1 000.0
Eletroeletrônico
27
Alcoa
MG
EUA
928.3
Siderurgia e metalurgia
28
CST
ES
Brasil (privado)
904.2
Siderurgia e metalurgia
29
Copesul
RS
Brasil (privado)
898.8
Química e petroquímica
30
Cosipa
SP
Brasil (privado)
882.7
Siderurgia e metalurgia
Fonte: Revista Exame/Maiores e Melhores.
A tabela 3 nos aponta alguns subsídios que atestam o importante papel exercido
pelo Estado de São Paulo na configuração de investimentos industriais em relação ao
Brasil, considerando seu parque produtivo já instalado, a proximidade com o mercado
consumidor, a infra - estrutura existente e a nova complexidade que se elabora na Região
Metropolitana, potencializando a complementação das atividades industriais através das
atividades relacionadas com os segmentos de gestão administrativa, finanças,
armazenagem da informação e outros serviços adicionais acompanhados pelo
desenvolvimento tecnológico. Neste mesmo prisma o Vale do Paraíba revela-se como
uma região que tem um papel a cumprir frente a esta lógica, sendo palco de constantes
empreendimentos encabeçados pelas grandes corporações em nível nacional ou mundial.
Analisando a tabela 3 podemos constatar que dentre as 30 maiores empresas
industriais instaladas no Brasil, 16 estão sediadas no Estado de São Paulo, o que
eqüivale a uma participação de 53 %. São elas: Volkswagen, General Motors, Gessy
Lever, Nestlé, Ford, Mercedez - Benz, Ericson, Embraer, Cargill, Siemens, Basf, Perdigão,
Multibrás e Novartis. Em relação à procedência do capital, 14 das 30 empresas têm
procedência brasileira e destas apenas 4 têm origem no Estado de São Paulo: Cosipa,
Embraer, Perdigão e Multibrás, todas com a predominância de capital privado, sendo que
a Embraer pertencia ao Governo Federal e seu processo de privatização ocorreu durante
o início da década de 90.
A região do Vale do Paraíba apresenta uma relevante importância na localização
de algumas destas empresas, pois 10 delas possuem unidades de produção junto ao eixo
da Rodovia Presidente Dutra de Jacareí até Guaratinguetá. Em São José dos Campos
podemos enumerar a Refinaria da Petrobrás Henrique Lajes, uma das unidades da
General Motors do Brasil, assim como uma de suas maiores concessionárias a Veibrás,
às margens da Dutra, a sueca Ericson do setor eletroeletrônico e as instalações da
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Embraer - Empresa Brasileira de Aeronáutica - que deve deslocar para o município de
Gavião Peixoto, região de Araraquara, a produção de aviões militares e do jato executivo
Legacy, mantendo em São José a unidade central responsável pelas aeronaves civis
destinadas aos mercados nacional e internacional.
Em Jacareí destacamos a fábrica da Companhia de Cervejaria Brahma, agora
pertencente à AmBev, Companhia de Bebidas das Américas. Em Caçapava encontra-se
uma das principais instalações da Nestlé, responsável pela fabricação de chocolates.
Taubaté revela-se como um importante pólo econômico regional, tanto pelo número de
estabelecimentos industriais instalados quanto pela variedade oferecida em relação ao
setor de serviços, possuindo por exemplo uma universidade, a UNITAU - Universidade de
Taubaté - e um shopping center de médias dimensões o Taubaté Shopping. No setor
industrial podemos salientar o segmento automobilístico através das instalações da Ford
Motor Company e da Volkswagen do Brasil. Contudo o maior investimento realizado no
Município se deu através da Siderúrgica Rio Negro, pertencente ao Sistema USIMINAS,
instalada estrategicamente às margens da Rodovia Presidente Dutra, agora sob
concessão sendo administrada pelo consórcio Nova Dutra, e junto também à Rodovia
Carvalho Pinto e à linha tronco da Estrada de Ferro Central do Brasil, operada também
sob regime de concessão pelo grupo também privado MRS Logística. Em Guaratinguetá
localiza-se uma das fábricas do Grupo BASF do Brasil responsável pelo setor químico,
sendo que dentre os recentes investimentos da Empresa no Município podemos citar a
construção do ramal ferroviário com cerca de 2 quilômetros de extensão unindo seus
pátios com a linha tronco da Central, da mesma forma como procedeu a USIMINAS em
Taubaté.
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Tabela 4 - Participação da Região Administrativa de São José dos Campos no
Total de Investimentos do Estado de São Paulo - Ano 2001
N º de
Valor (1)
Participação
Empreendimentos
(US$ milhões)
(%)
RA São José dos Campos
194
1 754,58
7,47
RG Caraguatatuba
17
52,63
RG Cruzeiro
1
5,51
RG Guaratinguetá
17
59,35
RG São José dos Campos
99
1 231,93
RG Taubaté
60
405,16
Estado de São Paulo (2)
1 519
23 488,61
100,00
Fonte: Fundação Seade.
Notas:
(1) Os valores divulgados em reais foram convertidos em dólares pela cotação média mensal do mês em
que foi publicado o anúncio.
(2) Segundo a metodologia adotada neste trabalho, todos os investimentos anunciados na imprensa são
confirmados junto às empresas para verificação do valor anunciado, do local e do setor de atividade.
Em relação à tabela 4 podemos observar que há uma clara concentração de
empreendimentos e de valores, dentro da Região Administrativa de São José dos
Campos, em duas regiões de governo: a própria região de São José, que abrange
Jacareí, municípios praticamente conurbados, e a região de Taubaté, que engloba
também Pindamonhangada, município que tem apresentado um considerável crescimento
econômico atraindo novos investimentos, consolidando-se como o quarto mais populoso
do Vale do Paraíba e Litoral Norte, atrás apenas de São José dos Campos, Taubaté e
Jacareí e suplantando municípios tradicionais como Guaratinguetá e Lorena. Além disto
Pindamonhangaba conta, desde o final da década de 70, com grandes instalações do
Grupo Villares, da Confab e da ALCAN. Juntas as duas regiões de governo respondem
por 93 % dos investimentos realizados em 2001.
A tabela 4 também pode nos apontar uma relação com os investimentos no
conjunto global do Estado de São Paulo. Desta forma podemos afirmar que a participação
do Vale do Paraíba não se mostra tão contundente, pois representa 7,5 % do total do
Estado. Mesmo assim trata-se da terceira região em investimentos, com números
inferiores apenas aos da Região Metropolitana de São Paulo (41,47%) e da Região de
Campinas (15,89%), superando outras áreas do Estado como a Região Metropolitana da
Baixada Santista (5,79%) e Regiões de Bauru, (2,65%), Ribeirão Preto (2,41%) e
Sorocaba (2,97%).
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Configura-se, portanto, seguindo o eixo da Rodovia Presidente Dutra, uma região
do Vale do Paraíba impregnada com aspectos urbano - industriais, sendo marcada por
intensas atividades econômicas que se articulam com a Região Metropolitana de São
Paulo e com as matrizes das grandes corporações transnacionais: BASF na Alemanha,
Villares na Espanha, Nestlé na Suíça, General Motors nos Estados Unidos, etc..
Desenvolvendo-se em um eixo natural "paralelo" à mancha densamente habitada e
urbanizada, encontra-se o Vale Histórico, marcado pelo avanço significativo da atividade
turística. Este "outro" Vale, praticamente atua como função complementar ao núcleo
econômico da planície fluvial, tendo como principais municípios São Luís do Paraitinga,
recém criada Estância Turística, Cunha (Estância Climática), Silveiras (município
conhecido pelas tradições do tropeirismo), Bananal (apresentando sedes de grandes
fazendas de café) dentre outros.
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BIBLIOGRAFIA
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Perspectiva, vol. 7, no 2. Revista da Fundação SEADE, abril/junho, 1993, pág.45-49.
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BRISSAC, N. Espaços Estruturados e Informes: São Paulo Diante da Globalização.
Cidade Global: Anotações Críticas sobre um Conceito, in: São Paulo em Perspectiva, vol.
14, no 4. Revista da Fundação SEADE, outubro/dezembro, 2000, pág. 99-104.
CAIDADO, A. Desenvolvimento Regional. Novos Requisitos para a Localização Industrial
em São Paulo, in: São Paulo em Perspectiva, vol. 10, no 2. Revista da Fundação SEADE,
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Teorias da Globalização. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1995.
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Metrópole Desconcentrada, in: Espaço e Debates, no 38, 1994, pág. 54-61.
MARX, K. & ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista, in: Estudos Avançados, vol. 12,
no 34, Revista do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo,
setembro/dezembro, 1998, pág. 7-43.
PACHECO, A. Os Dilemas da Nova Problemática Regional, in: Fragmentação da Nação.
Campinas: UNICAMP, IE. 1998, pág. 207-269.
Sites consultados:
www.seade.gov.br,
www.stm.sp.gov.br,
www.store.com.br,
www.finfacts.ie
e
www.yahoo.com.
* Bacharel e licenciado em Geografia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas e pela
Faculdade de Educação da USP; Mestre em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e
Artes da USP; pesquisador do CELACC - Centro de Estudos Latino-Americanos sobre Cultura e
Comunicação da ECA/USP e Professor dos cursos de Geografia, História e Turismo do Centro UNISAL Lorena.