ação civil pública - Ministério Público Federal

Transcrição

ação civil pública - Ministério Público Federal
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO MUNICÍPIO DE CRICIÚMA-SC
EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA ____.ª
SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CRICIÚMA/SC
VARA DA
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da
República signatário, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, vem
à presença de Vossa Excelência, em defesa dos interesses sociais, com
fundamento nos artigos 127 e 129, inciso III, ambos da Constituição Federal de
1988, nos artigos 5.º, inciso III, alínea “e” e 6.º, inciso VII, alínea “d”, ambos
da Lei Complementar n. 75/93, bem como nos artigos 1.º, inciso IV, e 5.º,
ambos da Lei n. 7.347/85, propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
com pedido de tutela antecipada
em face de
SOCIEDADE RÁDIO HULHA NEGRA DE CRICIÚMA LTDA.,
pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ n. 79.258.000/0001-46,
localizada na Av. Centenário, n. 6050, Bairro Próspera, município de
Criciúma/SC, que tem como representantes contratuais Álvaro Roberto de
Freitas Arns, brasileiro, casado, administrador de empresas, residente e
domiciliado na Rua José Gaidzinski, 100, apto. 201, no município de
Criciúma/SC, portador do CPF n. 533.054.699-00 e da Cédula de Identidade n.
1.521.144 – SSI/SC, e Daniela Borges de Freitas, brasileira, separada
judicialmente, advogada, residente e domiciliada na Rua Santo Antônio, 374,
apto. 1001, no município de Criciúma/SC, portadora do CPF n. 092.816.528-03
e Cédula de Identidade n. 10.622.121 – SSP/SP (contrato social de fls. 85 do
PA); e
AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES - ANATEL,
entidade integrante da Administração Pública Federal indireta, submetida a
regime autárquico especial e vinculada ao Ministério das Comunicações, com a
função de órgão regulador das telecomunicações, com sede na SAUS, Quadra
06, Blocos E e H, Brasília-DF, CEP 70.070-940
Av. Centenário, n. 3773, Centro Executivo Iceberg , 7.º andar, CEP 88.801.000 - Criciúma/SC
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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
para responderem pelos fatos e fundamentos a seguir
relatados.
1.
DO OBJETIVO DA AÇÃO
Diante da constatação, pela Agência Nacional de
Telecomunicações
–
ANATEL,
da
existência
de
interferências
eletromagnéticas provocadas pelo transmissor e sistema irradiante da
empresa Sociedade Rádio Hulha Negra de Criciúma Ltda., que se encontram
instalados no Bairro Ana Maria, no Município de Criciúma/SC, em aparelhos
eletro-eletrônicos dos moradores do aludido bairro, inclusive obstando ao
funcionamento de vários deles, o Ministério Público Federal ajuíza a presente
Ação Civil Pública, visando à condenação da Rádio, na obrigação de fazer,
consistente na mudança imediata, daquele local, dos seus aparelhos
transmissores, a fim de que não causem mais prejuízos àquela comunidade,
bem como a condenação da Autarquia Federal, determinado que, como órgão
regulador e fiscalizador dos serviços de telecomunicações, tome as medidas
cabíveis ao presente caso, coibindo a prestação dos serviços de radiodifusão
sonora pela Rádio, enquanto continuarem causando prejuízos à população.
2.
DOS FATOS
Em novembro de 2002, moradores do bairro Ana Maria,
no Município de Criciúma/SC, encaminharam “abaixo-assinado” à 11ª
Promotoria de Justiça da Comarca de Criciúma/SC (fls. 06/14), reivindicando
providências para a solução de problemas decorrentes da interferência
eletromagnética causada pelo transmissor e sistema irradiante da empresa
Sociedade Rádio Hulha Negra de Criciúma Ltda., instalados naquele bairro,
em seus aparelhos eletro-eletrônicos.
Determinada a realização de diligências pelo Parquet
Estadual, constatou-se, realmente, a existência das interferências
eletromagnéticas, que, segundo a Agência Nacional de Telecomunicações –
ANATEL (fls. 19/20), só iriam desaparecer com a “mudança de localização do
transmissor e sistema irradiante do Bairro Ana Maria para uma região com
afastamento maior da população nas proximidades”, tendo sido tais
informação ratificadas pelo agente de fiscalização da ANATEL, André
Cerqueira Fidalgo, quando prestou depoimento, na data de 25.08.2003, ao
Parquet Estadual (fls. 64/65).
Às fls. 25/31 dos autos, constam o Laudo de Avaliação de
Parâmetros Técnicos n. 0012SC20030065, o Auto de Infração n.
0013SC20030016, o Laudo de Vistoria Técnica em Emissora de Radiodifusão
em Ondas Médias e Tropicais 120 Metros n. 0013SC20030016, todos referentes
às atividades desenvolvidas pela empresa Sociedade Rádio Hulha Negra de
Criciúma Ltda. no Bairro Ana Maria em Criciúma/SC.
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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Em audiência preliminar, realizada em 29.07.2003, entre
o Ministério Público Estadual, o advogado da Rádio Hulha Negra, os
representantes da ANATEL e o representante da FATMA, foi concedido prazo
ao advogado da emissora para se pronunciar sobre os fatos ocorridos. Foi,
ainda, juntada declaração, datada de 19.03.2002, assinada pelo sócio-gerente
da Sociedade Rádio Hulha Negra de Criciúma Ltda., comprometendo-se em
interromper as transmissões, na ocorrência de interferências indesejáveis
causadas pela emissora, caso não fossem sanadas no prazo estipulado pela
ANATEL (fls. 59/61).
Realizada, na data de 25.08.2003, audiência entre os
representantes do Ministério Público Federal, da empresa Sociedade Rádio
Hulha Negra de Criciúma Ltda., da Agência Nacional de Telecomunicações –
ANATEL, da Fundação do Meio Ambiente – FATMA, da Comunidade do Bairro
Ana Maria (fls. 63), a empresa informou inexistir, de sua parte, interesse em
firmar qualquer acordo visando à resolução dessa situação.
Através do ofício n. 240/2003 (fls. 69), obedecendo ao
que preceitua o art. 109, I, da Constituição Federal de 1988, o Ministério
Público Estadual declinou de sua atribuição ao Ministério Público Federal,
considerado a responsabilidade, por omissão, da ANATEL (entidade
autárquica).
Do exposto, extrai-se que os problemas trazidos à tona
vêm sendo causados diretamente pela empresa Rádio Hulha Negra de
Criciúma Ltda., decorrente da má localização da instalação do seu
transmissor e do seu sistema irradiante, sendo que o órgão responsável pela
regularização e fiscalização da situação, a Agência Nacional de
Telecomunicações – ANATEL, conforme se fará exposição adiante, nada fez
(e nada tem feito), para resolver os problemas dos moradores do Bairro Ana
Maria, no Município de Criciúma/SC.
3.
DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL
A Constituição Federal de 1988 dispõe, nesses termos:
“Art. 21. Compete à União:
(...)
XII – explorar, diretamente ou mediante autorização,
concessão ou permissão:
a) os serviços de radiodifusão sonora e de sons e
imagens;”.
(...)
“Art. 109. Aos juízes federais compete processar e
julgar:
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I – as causas em que a União, entidade autárquica ou
empresa pública federal forem interessadas na condição
de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de
falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à
Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;”.
A Lei n. 4.117, de 27 de agosto de 1962, que instituiu o
Código Brasileiro de Telecomunicações, aplicável, ainda, no que diz respeito à
matéria penal e aos preceitos relativos à radiodifusão, assevera em seu artigo
10, inciso II:
“Art. 10 - Compete privativamente à União:
(...)
II – fiscalizar os Serviços de telecomunicações por ela
concedidos, autorizados ou permitidos.”.
A Lei n. 9.472, de 16 de julho de 1997, que “dispõe sobre
a organização dos serviços de telecomunicações, a criação e funcionamento
de um órgão regulador e outros aspectos institucionais”, por sua vez, diz
que:
“Art. 1.º Compete à União, por intermédio do órgão
regulador e nos termos das políticas estabelecidas pelos
Poderes Executivo e Legislativo, organizar a exploração
dos serviços de telecomunicações.
Parágrafo único. A organização inclui, entre outros
aspectos, o disciplinamento e a fiscalização da execução,
comercialização e uso dos serviços e da implantação e
funcionamento de redes de telecomunicações, bem como
da utilização dos recursos de órbita e espectro de
radiofreqüências”.
(...)
“Art. 8.º Fica criada a Agência Nacional de
Telecomunicações, entidade integrante da Administração
Pública Federal indireta, submetida a regime autárquico
especial e vinculada ao Ministério das Comunicações,
com a função de órgão regulador das telecomunicações,
com sede no Distrito Federal, podendo estabelecer
unidades regionais.”
O Superior Tribunal de Justiça, julgando o Conflito de
Competência n. 39590, processo originário n. 200301286301/RJ, por seu
relator o Ministro Castro Meira, assim decidiu:
“CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CONCESSIONÁRIAS DE
TELEFONIA.
ANATEL.
AUMENTO
DE
TARIFAS.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. LEI 7.437/85.
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1. Recomendável a reunião das mais de vinte ações que
combatiam o aumento de tarifas autorizado pela
ANATEL às operadoras de telefonia a fim de que fosse
preservada a segurança jurídica nas relações de consumo
do setor, em face da conexão.
2. A competência para julgamento é da Justiça
Federal, nos termos do art. 109, I, da Carta Magna,
por cuidar-se de causa em que entidade autárquica,
como é o caso, integra o pólo passivo da relação
processual.”. (publicado no DJ de 15.09.2003, p. 229) (grifei)
De outro lado, a competência para apreciar e julgar o
presente feito pertence à Justiça Federal, em vista da presença, no pólo
ativo, o Ministério Público Federal.
Nesse sentido decidiu o Superior Tribunal de Justiça, nos
autos do Conflito de Competência n. 4927-0, relator o então Ministro Gomes
de Barros:
“PROCESSUAL. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL-PARTECOMPETÊNCIA-JUSTIÇA FEDERAL Se o Ministério Público
Federal é parte, a Justiça Federal é competente para
conhecer do processo.” (DJ de 04.10.1993, p. 20.482).
O Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, por sua vez,
julgando a Apelação Cível n. 2001.04.01.065054-8/SC, relator o então Juiz
Federal Carlos Eduardo T. F. Lenz, assim se pronunciou:
"EMENTA: PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
LEGITIMIDADE DO MPF. Se a ação proposta pelo MPF está
incluída dentro de suas atribuições, prevista na CF/88 e
na LC n.º 75/93, como é o caso dos autos, basta esse
fato para legitimar o Parquet Federal para a causa e,
conseqüentemente, a Justiça Federal é a competente
para o processo e julgamento do feito. Precedentes da
jurisprudência. Apelação conhecida e provida.” (DJU de
25/04/02, p. 471).
Destaque-se, pois, que, no caso de ações civis públicas,
será competente a Justiça Federal se a ação for proposta pelo Ministério
Público Federal, isso porque ele é um órgão independente da União Federal.
Basta, portanto, que a defesa do bem jurídico objeto da ação civil pública
esteja incluída dentro das atribuições do Parquet Federal, previstas na
Constituição Federal e na Lei Complementar n. 75/93, para que o Ministério
Público Federal possua legitimidade e, conseqüentemente, a Justiça Federal
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seja competente para a causa, ainda que o interesse seja apenas do Parquet
Federal na condição de advogado da sociedade.
Desse modo, ante às razões anteriormente expostas,
principalmente no que diz respeito à existência, no pólo passivo da presente
demanda, da ANATEL, autarquia federal, competente a Justiça Federal para
o seu processo e julgamento.
4.
FEDERAL
DA
LEGITIMIDADE
ATIVA
DO
MISTÉRIO
PÚBLICO
Dispõe a Lei n. 6.938/81, em seu artigo 3.º, inciso I, que
“entende-se por meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e
interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a
vida em todas as suas formas;” (grifei).
A autora Helita Barreira Custódio, dissertando acerca do
tema “A questão constituicional: Propriedade, Ordem econômica e Dano
Ambiental. Competência Legislativa Concorrente.”, contido na obra “Dano
Ambiental: Prevenção, Reparação e Repressão”, coord. de Antonio Herman V.
Benjamin, RT, 1993, p. 126, conceitua o “meio ambiente” da seguinte forma:
“Para os fins protecionais, a noção de meio ambiente é
muito ampla, abrangendo todos os bens naturais e
culturais de valor juridicamente protegido, desde o solo,
as águas, o ar, a flora, a fauna, as belezas naturais e
artificiais, o ser humano ao patrimônio histórico,
artístico,
turístico,
paisagístico,
monumental,
arqueológico, além das variadas disciplinas urbanísticas
contemporâneas. Considera-se o meio ambiente humano
o conjunto das condições naturais, sociais e culturais em
que vive a pessoa humana e que são suscetíveis de
influenciar sua existência. O meio ambiente “é tudo
aquilo que nos cerca”. O meio ambiente não é “uma
expectativa utopística, mas um direito para cada pessoa
humana”. “O meio ambiente é, assim, a interação do
conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais
que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida
humana” (grifei).
O inciso III, alínea “a”, do artigo 3.º da Lei n. 6.938/81,
conceitua poluição como sendo a “a degradação da qualidade ambiental
resultante de atividades que direta ou indiretamente prejudiquem a saúde, a
segurança e o bem-estar da população;” (grifei).
A autora supra-referida, à página 125 daquela obra,
caracteriza a poluição ambiental como sendo “os efetivos e iminentes
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impactos danosos contra a vida em geral e contra a saúde pública em
particular, ao mal-estar e ao prejuízo de todos, com o conceito de
propriedade contemporânea, constitucionalmente caracterizado pelo
atendimento de sua função social em prol da vida em geral e da saúde
pública em particular, ao indispensável bem-estar (presente e futuro) de
todos, indistintamente.”.
Por sua vez, o § 1.º do artigo 14 da Lei n. 6.938/81 diz
que o “Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para
propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio
ambiente” .
Assim, todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado. O meio ambiente é bem da natureza, de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. O Poder Público e a
coletividade têm o dever de defender e preservar o meio ambiente para as
presentes e futuras gerações. É o que expressamente consta no art. 225 da
Constituição Federal.
O Ministério Público, a partir da vigência da atual
Constituição Federal, assumiu a missão de advogado da sociedade. Nesse
sentido, é eloqüente a redação do art. 127 da Lei Fundamental, ao
determinar que o “Ministério Público é instituição permanente, essencial à
função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica,
do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.”
O exercício desse encargo público foi garantido pelo
legislador constituinte na Carta Magna, artigo 129, e, de modo mais preciso,
na Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993 – Lei Orgânica do
Ministério Público da União, que estatui nos artigos 5º e 6º, in verbis:
“Art. 5º São funções institucionais do Ministério Público
da União:
I – a defesa da ordem jurídica, do regime democrático,
dos interesses sociais e dos interesses individuais
indisponíveis,
(...)
Art. 6º Compete ao Ministério Público da União:
(...)
XIV – promover outras ações necessárias ao exercício
de suas funções institucionais, em defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais
e individuais indisponíveis, (...)”. (grifei)
Em conformidade com as mencionadas prescrições
normativas, a Lei n. 7.347/85, nominada como Lei da Ação Civil Pública, em
seu art. 5.º, também confere legitimidade ativa ao Ministério Público, tanto
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para propositura da ação principal, quanto para o pedido cautelar.
Colaciona-se, ainda, da obra do autor Hugo Nigro
Mazzillia, “Defesa dos Interesses Difusos em Juízo”, Ed. Saraiva, 13.ª ed.,
2001, p. 143/144, o seguinte trecho:
"A atuação do Ministério Público sempre é cabível em
defesa de interesses difusos, em vista de sua larga
abrangência. Já em defesa de interesses coletivos ou
individuais homogêneos, atuará sempre que: a) haja
manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou
pelas características do dano, ainda que potencial; b)
seja acentuada a relevância do bem jurídico a ser
defendido; c) esteja em questão a estabilidade de um
sistema social, jurídico ou econômico.
(...)
Assim, se a defesa de interesse coletivo ou individual
homogêneo convier à coletividade como um todo, deve o
Ministério Público assumir sua tutela.(...)".
Desse modo, cristalina a legitimidade do órgão
ministerial para a proposição da presente Ação Civil Pública, por haver a
conduta dos réus malferido os interesses da sociedade.
5.
DO DIREITO DE FORMA ESTRITA
Os fatos narrados nestes autos indicam que houve
interferência causada pelas ondas de rádio emanadas do equipamento
transmissor da rádio Hulha Negra no sinal das redes de televisão e nos
eletrodomésticos dos moradores do bairro Ana Maria, que chegaram inclusive
a subscrever abaixo-assinado neste sentido. Já foi mencionado também que,
seja através de laudos técnicos, seja através de vistorias in locu,
efetivamente existe a interferência citada.
O regulamento técnico para emissoras de radiodifusão
sonora, que é anexo da Resolução n.º 116 da ANATEL, de 26 de março de 1999
(fls. 41/58 procedimento PRDC), responsável pela disciplina do tema no
Brasil, dispõe o seguinte sobre o tema, in verbis:
“ (...)
4.3 AUTORIZAÇÃO PARA INSTALAÇÃO DE EMISSORA
(...)
A entidade deverá apresentar, conforme o caso, aos
Escritórios Regionais ou às Unidades Operacionais da ANATEL sob cuja
jurisdição se encontram as instalações propostas, os seguintes documentos:
(...)
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c) declaração do responsável legal pela entidade de que
interromperá suas transmissões, em caso de interferência em estações de
telecomunicações regularmente autorizadas e instaladas;
(...) ”
A declaração mencionada pela norma acima mencionada
encontra-se à f. 61 do procedimento PRDC.
As declarações do fiscal da ANATEL, prestadas perante a
11ª Promotoria de Justiça da Comarca de Criciúma, ilustram bem o tipo de
interferência causada, in verbis:
“(...) que fez o trabalho de fiscalização pessoalmente, e
constatou originalmente interferências apenas nos
telefones;
após
haver
a
ANATEL
recebido
correspondência desta Promotoria, também foram
constatadas in loco interferências em outros aparelhos
eletrônicos, como CDs, televisões, rádios, enfim,
produzindo interferências gerais em faixa de freqüência
de ondas médias; que tais interferências são muito
fortes, inclusive com inúmeros aparelhos que
simplesmente não funcionavam em razão da
intensidade do sinal da rádio Hulha Negra para outro
local, com menor intensidade populacional;
(...)
que entre os documentos exigidos pela ANATEL,
encontra-se o do compromisso de interromper as
emissões, acaso ocorram interferências indevidas, sendo
este o documento apresentado às folhas 59 e 60 (fax e
fotocópia); que mesmo tendo assumido o compromisso,
a emissora Hulha Negra tem negado-se a interromper
as transmissões ou a retirar a antena do local,
impropriamente escolhido por ela mesma, sob a
responsabilidade técnica de seus profissionais; que
informa o declarante que não há qualquer outra
solução técnica conhecida, que não a retirada da
antena do local, para a solução do problema; que o
problema é muito grave, pois parte considerável do
bairro é afetada por estas interferências da rádio
Hulha Negra.”. (grifei)
A legitimidade passiva da empresa Sociedade Rádio
Hulha Negra de Criciúma Ltda., por sua vez, decorre, obviamente, por ser
ela a causadora direta dos danos aos moradores do Bairro Ana Maria em
Criciúma/SC, o que restou devidamente comprovado através da
documentação de fls. 19/20, 25/31 e 64/65.
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Ora, se a empresa ré tem causado, já há alguns anos,
através de suas transmissões, interferência em telefones e televisão, e mesmo
assim continua em funcionamento, é evidente que está sendo desrespeitado o
contido no regulamento técnico da ANATEL acima mencionado.
Isto se dá porque se os sinais de telefone e de televisão
chegam ruins aos moradores do bairro Ana Maria em razão do funcionamento
da rádio nas proximidades (como já atestado pelos técnicos da ANATEL), é
porque a rádio causa interferência em estações de telecomunicações já
regularmente autorizadas e instaladas.
Destarte, em não interrompendo suas atividades de
transmissão a empresa ré descumpre o disposto no regulamento técnico da
ANATEL e também o seu compromisso firmado por escrito (f. 61).
Uma vez que a situação já perdura por vários meses
desde que a ANATEL ficou ciente do problema, e apesar da empresa ré ter
tomado algumas atitudes para minimizar os problemas de interferência (sem
ter obtido êxito), a empresa não mostrou interesse em efetuar a mudança de
seus equipamentos, não havendo também interesse em se fazer acordo com o
Ministério Público, conforme consta à f. 63 do procedimento PRDC, restando a
via judicial a este parquet.
Cabe portanto ao poder judiciário apreciar e dar solução
ao prejuízo à sociedade que vem sendo causado pela continuidade do
funcionamento da rádio.
A solução do problema aqui citado é uma só, conforme
salientado pelo fiscal da ANATEL no termo de declarações de fls. 64/65, que é
a retirada dos equipamentos transmissores da rádio do local em que se
encontra e sua transferência para área de baixa densidade populacional, onde
os prejuízos para a comunidade sejam os menores possíveis.
No que diz respeito à Agência Nacional de
Telecomunicações - ANATEL, na qualidade de entidade integrante da
Administração Pública Federal indireta, submetida a regime autárquico
especial e vinculada ao Ministério das Comunicações, com a função de órgão
regulador das telecomunicações, não tomou as medidas cabíveis, após a
constatação da interferência eletromagnética nos aparelhos eletroeletrônicos, para solucionar o incômodo criado pelas atividades desenvolvidas
pela empresa Sociedade Rádio Hulha Negra de Criciúma Ltda. à comunidade
próxima à antena.
A Lei n. 9.472/97 (Lei Geral das Telecomunicações
Brasileiras), disciplina, nesses termos, a competência da ANATEL:
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“Art. 19. À Agência compete adotar as medidas
necessárias para o atendimento do interesse público e
para
o
desenvolvimento
das
telecomunicações
brasileiras, atuando com independência, imparcialidade,
legalidade,
impessoalidade
e
publicidade,
e
especialmente:
(...)
X - expedir normas sobre prestação de serviços de
telecomunicações no regime privado;
XI - expedir e extinguir autorização para prestação
de serviço no regime privado, fiscalizando e
aplicando sanções;” (grifei)
Nessa linha de raciocínio, cumpre trazer à colação,
passagem extraída do voto da Exma. Des. Federal Marga Inge Barth Tessles,
em decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região nos autos
da Apelação Cível n. 1999.71.03.001292-2/RS que, embora se refira às
transmissões executadas pelas rádios comunitárias, cabe fielmente a qualquer
outro tipo de transmissão por ondas eletromagnéticas, seja rádio ou televisão,
in verbis:
“Finalmente, quanto à alegação de que haveria risco nas
comunicações de navegação aérea em razão das
transmissões da rádio comunitária, assevero que não
está impedida a União de proceder às medidas
necessárias para evitar quaisquer interferências em
outros sistemas de comunicação.” (DJU de 13.08.2003 pp.164/165 - Bol.468/2003) - (grifei)
Tem-se, ainda, o voto proferido pela Exma. Juíza Ana
Scartezzini nos autos do Agravo de Instrumento n. 97.03.029318-2/SP, em
decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 3.ª Região, nesses termos:
“Compete à União Federal o serviço de radiodifusão,
podendo, sob determinadas condições delegá-lo aos
particulares. Estes não podem sem qualquer controle ou
fiscalização, sob o pretexto de liberdade de expressão,
utilizar-se de equipamentos em desacordo com as
normas disciplinadoras da matéria.
Assim, o periculum in mora, se há, é para a comunidade
em geral. Divulga-se, com ênfase, o problema da
interferência de rádios nas telecomunicações, e,
inclusive dos aviões. É um risco efetivo.
(...)
Acresce-se, ainda, que o uso indiscriminado de sistema
de radiodifusão pode ensejar a ocorrência de distúrbios
de monta, por interferência em serviços regulares de
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telefonia, televisão, rádios, além de situações
envolvendo o espaço aéreo com prejuízo a aeronaves e
embarcações fluviais ou marítimas.” (DJU de
28.01.1998).
Desse modo, cabível a inclusão da Agência Nacional de
Telecomunicações - ANATEL no pólo passivo da demanda, juntamente com a
empresa Sociedade Rádio Hulha Negra de Criciúma Ltda., uma vez que,
tendo constatado que esta empresa estava realmente causando prejuízos aos
moradores do Bairro Ana Maria, limitou-se, conforme se verifica do seu ofício
de fls. 17/18, em sugerir que houvesse a mudança de localização, pela
empresa, do transmissor e do sistema irradiante daquele local, não tomando
quaisquer medidas para que ela se concretizasse.
As obrigações que pretende o MPF fique a ANATEL
sujeita, em caso de eventual provimento jurisdicional favorável a seu pleito,
são aquelas que a lei já determina, mas que em razão de sua omissão no caso,
não exerceu. Tais obrigações dizem respeito ao levantamento da quantidade
de residências afetadas, bem como atividade fiscalizatória para interromper a
transmissão e lacrar os equipamentos transmissores da empresa ré acaso esta
não mude seus equipamentos de local, além de fiscalizar o novo local de
instalação dos transmissores da rádio. Ou seja, nada mais que suas atividades
específicas, mas que em razão de sua omissão no caso devem ser
determinadas por este juízo, sob pena de pagamento de multa diária.
6.
DO DANO MORAL
O Novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de
2002) estabelece, nesses termos:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito e causar dano
a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito.”
“Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do
dano.”
O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, editou a
seguinte súmula:
“Súmula 37 - São cumuláveis as indenizações por dano
material e dano moral oriundos do mesmo fato.”.
Acerca do tema dano moral, Sílvio de Salvo Venosa, em
sua obra intitulada “Direito Civil: Responsabilidade Civil”, explica o seguinte:
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“Dano moral é o prejuízo que afeta o ânimo psíquico,
moral e intelectual da vítima. Nesse campo, o prejuízo
transita pelo imponderável, daí por que aumentam as
dificuldades de se estabelecer a justa recompensa pelo
dano. Em muitas situações, cuida-se de indenizar o
inefável.
(...)
Será moral o dano que ocasiona um distúrbio anormal na
vida do indivíduo; um inconveniência de comportamento
ou, como definimos, um desconforto comportamental a
ser examinado em cada caso. Ao se analisar o dano
moral, o juiz se volta para a sintomatologia do
sofrimento, a qual se não pode ser valorada por
terceiro,
deve,
no
caso,
ser
quantificada
economicamente.
(...)
Do ponto de vista estrito, o dano imaterial, isto é, não
patrimonial, é irreparável, insusceptível de avaliação
pecuniária porque é incomensurável. A condenação em
dinheiro é mero lenitivo para a dor, sendo mais uma
satisfação do que uma reparação (Cavalieri Filho,
2000:75). Existe também cunho punitivo marcante nessa
modalidade de indenização, mas que não constitui o
aspecto mais importante da indenização, embora seja
altamente relevante.” (vol. 4. 3.ª ed. – São Paulo: Atlas,
2003. pp. 33-35).
Registre-se, também, a existência de diversos julgados
afirmando ser plenamente cabível a indenização por danos morais decorrentes
de perturbação sofrida, in verbis:
“Dano moral. Protesto de títulos. Precedentes.
1. Como assentado na jurisprudência não é necessário
provar o prejuízo em casos como o presente, mas,
apenas, a existência do fato capaz de gerar
constrangimento, sofrimento, perturbação psíquica.
2. O valor do dano moral pode ser fixado ao prudente
arbítrio do Juiz.
3. Recurso especial conhecido e provido.”
(STJ. Terceira Turma. Recurso Especial n. 233597. Rel.
Min. Carlos Alberto Menezes Direito. Processo n.
199900902785/MG. DJ de 30.10.2000. p. 151); (grifei)
“DANO MORAL PURO. CARACTERIZAÇÃO. SOBREVINDO,
EM RAZÃO DE ATO ILICITO, PERTURBAÇÃO NAS
RELAÇÕES PSIQUICAS, NA TRANQUILIDADE, NOS
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ENTENDIMENTOS E NOS AFETOS DE UMA PESSOA,
CONFIGURA-SE O DANO MORAL, PASSIVEL DE
INDENIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E
PROVIDO.”
(STJ. Quarta Turma. Recurso Especial n. 8768. Rel. Min.
Barros Monteiro. Processo n. 199100037745/SP. DJ de
06.04.1992. p. 4.499); (grifei)
“CIVIL. DANO MORAL. INSCRIÇÃO NO SERASA DO NOME
DE MUTUÁRIO, APÓS O PAGAMENTO DE EMPRÉSTIMO
MEDIANTE CONSIGNAÇÃO EM FOLHA. ATRASO INICIAL
DEVIDO À INFORMAÇÃO EXTEMPORÂNEA AO SETOR DE
PESSOAL DO ÓRGÃO EMPREGADOR. ÔNUS DO MUTUANTE.
RENOVAÇÃO DE ATOS LESIVOS À IMAGEM DO MUTUÁRIO
E CAUSADORES DE PERTURBAÇÃO E SOFRIMENTO,
MESMO DEPOIS DA QUITAÇÃO TOTAL DO MÚTUO.
APELAÇÃO IMPROVIDA.”
(TRF5. Segunda Turma. Apelação Cível n. 281421. Rel.
Des.
Fed.
Lázaro
Guimarães.
Processo
n.
200182000013161/PB. DJ de 11.09.2003. p. 680). (grifei)
A legislação e os julgados acima citados ressaltam no
direito brasileiro a consolidação da possibilidade de indenização por danos
morais, em caso de prejuízo ocorrido e que afete o cidadão, inclusive na
forma de incômodos e perturbações.
Para a possibilidade de configuração de prejuízo passível
de ser indenizado a título de danos morais por parte de empresa privada,
alguns requisitos devem estar presentes.
Primeiramente, deve haver uma ação por parte daquele
ao qual se imputa o dano, que no caso é uma rádio, sendo que tal ação é o
próprio funcionamento da rádio, por meio de seus equipamentos
transmissores, que na instrução destes autos não foi questionado.
Em segundo lugar, a existência de dano, que no caso dos
autos também não é questionado, já que o fato de os aparelhos de televisão e
de telefone, bem como demais eletrodomésticos não operarem com a nitidez,
sonoridade e eficiência necessários causa incômodos por demasia: a televisão
é instrumento de lazer na vida moderna, no qual as pessoas relaxam após a
rotina de trabalho a que se submetem diariamente; o telefone é um dos mais
importantes instrumentos de comunicação da atualidade; os eletrodomésticos
funcionam como instrumentos de maximização dos árduos trabalhos
domésticos desenvolvidos no passado.
Em terceiro lugar, a existência do nexo causal entre a
ação daquele ao qual se imputa o dano e o dano em si, o que também se
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afigura presente nos autos, uma vez que os laudos técnicos e a declaração do
fiscal da ANATEL, bem como depoimento de moradores são neste sentido, ou
seja, de que os equipamentos transmissores da rádio causam a interferência
em telefones, televisores e demais eletrodomésticos.
Por fim, deve haver a existência de culpa daquele que
causa o dano, o que também está comprovado nos autos, já que a empresa ré,
desde o início das audiências narradas nestes autos, sabia que causava a
interferência na comunidade, tanto que tentou minimizar tal interferência,
mas não tomou a atitude pela qual estava obrigada pelo regulamento técnico
da ANATEL e pela qual se obrigou por meio de declaração de seu sóciogerente, que seria a mudança de local dos equipamentos de transmissão,
permitindo que o prejuízo dos moradores do bairro Ana Maria se perpetuasse.
Destarte, presentes todos os requisitos que configuram o
instituto do dano moral, deve a empresa ré ser instada a efetuar o pagamento
de indenização a este título às famílias do bairro Ana Maria, a partir de
levantamento a ser realizado pela ANATEL das residências afetadas.
Quanto ao valor das indenizações, temos, seguindo o
rastro jurisprudencial, que a indenização por dano moral não serve para
enriquecer ou substituir os prejuízos morais sofridos, mas sim para amenizar
os danos causados.
Nesse sentido, cita-se passagem extraída do texto
“Indenização do Dano Moral”, de Galeno Lacerda, publicado no vol. 728 da
Revista dos Tribunais, p. 94/101, in verbis:
“A doutrina nacional, baseada no direito estrangeiro,
especialmente o francês, acentua que o sentido da
indenização do dano moral não é reparatório, pois “a
dor não tem preço”. O que se pretende, sob a
perspectiva do ofendido, é proporcionar-lhe um status
material diferenciado de conforto, minimizando a dor
que sofreu. Dá-se à vítima, através do que o dinheiro
pode comprar, uma alegria que contrabalance o
sofrimento.
Do ponto de vista do ofensor, o ato de pagar há de
produzir a mesma eficácia de despojamento que, numa
sociedade mais espiritualizada, sofreria o indivíduo ao
pedir desculpas humildemente à vítima.
(...)
E há ainda o aspecto social: a agressão ilegítima ao
patrimônio imaterial de um indivíduo fere o coletivo. E
por aí a indenização tem o sentido restaurador desse
arranhão que o ilícito produz no universo social que se
insere.
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Essas são, portanto, as três perspectivas a serem
observadas segundo a doutrina.”.
(RT, vol. 728, ano 85, junho de 1996)
No presente caso, temos certeza de que, se os moradores
do bairro Ana Maria pudessem escolher, prefeririam não ter passado pelos
transtornos dos últimos anos a ganhar quantia em dinheiro como indenização.
De qualquer forma, a quantia a ser paga não pode ser
ínfima, para não menosprezar os incômodos causados aos moradores, e
também para servir como medida educativa ao causador do dano.
Desta forma, entendemos que o valor de R$ 1000,00 (mil
reais), por residência afetada, é o adequado para a mensuração da
indenização a ser paga a título de danos morais pela empresa ré.
Quanto à ANATEL, também deve arcar com a
responsabilidade pelos danos morais no caso em questão, uma vez que, de sua
conduta também advieram os incômodos a que ficaram sujeitos os moradores
do Bairro Ana Maria nos últimos anos.
Toda a configuração do dano moral no presente caso já
foi delimitada acima, restando apenas quanto á ANATEL a configuração de sua
conduta e de seu nexo causal com os danos sofridos.
Sua conduta no presente caso, como já ressaltado
anteriormente, foi a omissão em seu dever de ofício, que seria fazer a
empresa ré cumprir o regulamento técnico da ANATEL, bem como a
declaração do sócio-gerente da rádio, e, não havendo tal cumprimento,
interromper as atividades da rádio e lacrar seus transmissores até sua
remoção para local apropriado.
O nexo causal se faz presente na medida em que, se
tivesse agido como deveria a partir do momento em ficou ciente do
acontecido, os danos não teriam se perpetuado até a presente data.
Quanto à existência de culpa, e sem entrar no mérito da
responsabilidade objetiva da administração pública em caso de omissão,
temos que é clara a existência de culpa da ANATEL neste caso, na medida em
que sabia do acontecido desde meados de 2003 e permitiu que a rádio
continuasse em funcionamento, mesmo em desrespeito ao regulamento
técnico da ANATEL e da obrigação assumida pela rádio em interromper suas
atividades em caso de interferência em outras estações transmissoras, como
reconheceu o fiscal da ANATEL em suas declarações de fls. 64/65.
Destarte, entendemos que a responsabilidade da ANATEL
pelos prejuízos passíveis de indenização a título de danos morais existe, mas
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em caráter subsidiário, acaso não se consiga executar os valores da empresa
ré, uma vez que a atuação da ANATEL foi omissiva; ou, caso Vossa Excelência
não entenda desta forma, que a ANATEL seja responsabilizada solidariamente
com a empresa ré pelo pagamento de indenização a título de danos morais.
É importante ressaltar que, independentemente de
violação das normas técnicas da ANATEL a empresa ré causou prejuízo à
comunidade, que poderia ter sido evitado pela não instalação da rádio no
local ou por sua mudança, tão logo se descobriu que causava incômodos aos
moradores do bairro Ana Maria.
Apenas este fato, ante o disposto no art. 186 do Código
Civil, já é suficiente para dar azo à indenização em prol da comunidade, ainda
mais tendo-se em conta que as rádios são instrumentos para benefício da
sociedade, não podendo se privilegiar, neste caso específico, atividade
empresarial que visa ao lucro, em detrimento de toda uma comunidade que
vem sofrendo com os incômodos causados pelo funcionamento da rádio no
bairro Ana Maria.
7.
DA TUTELA ANTECIPADA
Por tudo o que envolve o direito de ação, indiscutível é a
existência de um fator preponderante que motiva a busca da solução dos
conflitos pela via judicial: esse fator se expressa na concretização do pedido
apresentado, algo que, supõe-se de antemão, é requerido na esperança da
tutela célere ao direito do autor.
Preceitua Luiz Guilherme Marinoni, em sua obra "Tutela
Cautelar e Tutela Antecipatória", São Paulo, Revista dos Tribunais, 1992, p.
15/16, in verbis:
"Uma das questões que emerge quando tratamos do tema
da efetividade do processo, o que é o ponto fundamental
a inspirar a razão de ser deste trabalho, é a da equação
do problema rapidez-segurança. É que 'se o tempo é a
dimensão fundamental na vida humana, no processo
desempenha ele idêntico papel; não somente porque,
como diz Carnelutti, processo é vida, mas também
porquanto, tendendo o processo a atingir seu fim moral
com a máxima presteza, a demora na sua conclusão é
sempre detrimental, máxime quando se cuida de evitar
os empeços à sua própria eficácia na atuação do direito
objetivo' "
É pelas razões acima avultadas que foi criado o instituto
da tutela antecipada, a qual visa o resguardo de um direito que se encontra
em risco de ser afetado de forma letal, sendo impossível a sua reparação.
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Antecipa-se a tutela no intuito de se assegurar a manutenção do objeto de
petição do autor, zelando-se para que o curso do processo não seja lesivo ao
que se pretende na ação.
O eminente professor Cândido Rangel Dinamarco, em “A
Reforma do Código de Processo Civil”, 2.ª. ed, rev. e ampl., São Paulo,
Malheiros Editores, 1995, traduz a alma do instituto supracitado:
"O novo art. 273 do Código de Processo Civil, ao instituir
de modo explícito e generalizado a antecipação dos
efeitos da tutela pretendida, veio com o objetivo de ser
uma arma poderosíssima contra os males corrosivos do
tempo no processo.".
Dispõe o artigo 273 do Código de Processo Civil:
"O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar,
total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida
no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca,
se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil
reparação;".
Do texto legal se depreende que os requisitos para a
concessão da tutela antecipada são: prova inequívoca dos fatos;
verossimilhança da alegação e fundado receio de dano irreparável ou de difícil
reparação. Demonstrar-se-á que, no presente caso, todos os requisitos
necessários ao deferimento da medida pleiteada estão presentes.
É conveniente que os requisitos prova inequívoca e
verossimilhança da alegação sejam analisados conjuntamente, por guardarem
estreita relação entre si.
A expressão legal prova inequívoca dos fatos não deve
ser interpretada literalmente, pois, se assim fosse feito, o valioso instituto da
antecipação de tutela jamais seria aplicado, tendo-se em vista que o processo
civil busca a verdade formal - aquela que se caracteriza pelo convencimento
do juiz, advindo da verossimilhança das alegações (bem como da adequação
do direito trazido aos autos ao caso concreto) de uma das partes. Não faria
sentido, em sede de antecipação de tutela, exigir um grau de certeza ainda
maior do que o propugnado pelos próprios princípios do direito processual
civil, sabendo-se que sequer para a sentença que julga o mérito é necessária a
demonstração da verdade real. Por tal, constata-se que a exigência de prova
inequívoca se caracterizaria não só como obstáculo à tutela antecipada como
também ao processo civil como um todo.
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Nesse sentido, cumpre observar mais uma vez os
ensinamentos de Cândido Rangel Dinamarco:
“O art. 273 condiciona a antecipação da tutela à
existência de prova inequívoca suficiente para que o juiz
se convença da verossimilhança da alegação a dar peso
ao sentimento literal do texto. Seria difícil interpretá-lo
satisfatoriamente porque prova inequívoca é prova tão
robusta que não permite equívocos ou dúvidas,
infundindo no espírito do Juiz o sentimento de certeza e
não
mera
verossimilhança.
Convencer-se
da
verossimilhança, ao contrário, não poderia significar
mais do que imbuir-se do sentimento de que a realidade
fática pode ser como descreve o autor. Aproximadas as
duas locuções formalmente contraditórias contidas no
art. 273 do Código de Processo Civil (prova inequívoca e
convencer-se da verossimilhança), chega-se ao conceito
de probabilidade, portador de maior segurança do que a
mera verossimilhança.”.
Assim, para a concessão da tutela antecipada se exige o
que seria um meio termo entre "prova inequívoca" e "verossimilhança": uma
grande probabilidade de as alegações do Requerente serem verdadeiras,
probabilidade esta que no presente caso afigura-se indiscutível, dada a
manifesta lesão causada pela empresa Sociedade Rádio Hulha Negra de
Criciúma Ltda. aos moradores do Bairro Ana Maria em Criciúma/SC,
decorrente da interferência eletromagnética, provocada por seu transmissor e
sistema irradiante, nos aparelhos eletro-eletrônicos daquela comunidade, com
o respaldo da Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL ao assumir
ela conduta omissiva, por não tomar medidas eficazes para a solução desse
problema.
Se não restam dúvidas, no âmbito da presente demanda,
em relação ao preenchimento dos requisitos da prova inequívoca e da
verossimilhança das alegações, de maneira nenhuma poder-se-á duvidar do
atendimento ao requisito da existência de fundado receio de dano irreparável
ou de difícil reparação, pois os fatos nesta peça narrados, bem como sua
excepcionalidade e continuidade, são demonstrados pelo reconhecimento de
que a permanência dos equipamentos da aludida rádio, naquele local,
continuarão provocando, como bem salientado no Termo de Declarações de
fls. 64/65, prestado pelo agente de fiscalização da ANATEL, interferências nos
equipamentos eletro-eletrônicos, inclusive obstando ao funcionamento de
vários deles.
À vista do exposto, requer o Ministério Público Federal a
concessão de TUTELA ANTECIPADA, para que:
Av. Centenário, n. 3773, Centro Executivo Iceberg , 7.º andar, CEP 88.801.000 - Criciúma/SC
FONE/FAX: (0xx48) 433-8753/8165 – e-mail: [email protected]
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a) Seja a empresa Sociedade Rádio Hulha Negra de
Criciúma Ltda. compelida na obrigação de fazer no sentido de que, no prazo
de trinta (30) dias, efetue a mudança de localização de seu transmissor e de
seu sistema irradiante, instalando-os em local previamente autorizado pela
ANATEL, condicionando a referida instalação em local que não venha mais a
causar danos a quaisquer pessoas, sob pena de multa cominatória, no valor de
R$ 1000,00 (mil reais), por dia de atraso no atendimento.
b) Seja a ANATEL compelida na obrigação de fazer no
sentido de que, escoado o prazo mencionado no item anterior (acaso
deferido) para a empresa ré efetuar a mudança de seu transmissor e sistema
irradiante, interromper as transmissões da empresa e lacrar seu sistema
transmissor até o cumprimento do determinado por este juízo, no prazo de
cinco (05) dias, sob pena de multa cominatória, no valor de R$ 500,00
(quinhentos reais), por dia de atraso no atendimento.
c) Seja a ANATEL compelida na obrigação de fazer no
sentido de, no prazo de quinze (15) dias, efetue vistoria nas proximidades da
atual sede irradiadora da rádio, afim de delimitar, antes da eventual mudança
da mesma, as residências afetadas pela interferência mencionada nestes
autos, indicando uma pessoa de cada residência, que representará a família
para recebimento de indenização , com o fito de preservar nos autos a
memória daquelas famílias afetadas para fins de execução de sentença, sob
pena de multa cominatória, no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), por dia
de atraso no atendimento, dando-se vista ao MPF após a realização da
vistoria.
8.
DO PEDIDO PRINCIPAL
Por todo o exposto, requer o Ministério Público Federal:
a) a citação das demandadas, na forma da lei, para,
querendo, contestar a presente ação, com as advertências de praxe, inclusive
quanto à confissão da matéria de fato, em caso de revelia, e para produzirem
a prova que quiserem, e se verem processar até a condenação final, na forma
do pedido abaixo especificado;
b) o deferimento dos pedidos antecipatórios acima
mencionados e sua posterior confirmação em sentença definitiva;
c) a fixação de multa diária pelo eventual
descumprimento da antecipação de tutela a partir de seu deferimento, nos
termos postulados no pedido liminar;
d) a condenação da ré Sociedade Rádio Hulha Negra de
Criciúma Ltda ao pagamento de indenização a título de danos morais aos
moradores das residências afetadas pela interferência causada pela rádio, que
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serão identificadas conforme o pedido liminar para fins de eventual execução
de sentença, sendo que o valor deverá ser fixado em, no mínimo, R$ 1000,00
(mil reais) por residência;
e)
a
condenação
da
Agência
Nacional
de
Telecomunicações - ANATEL, tendo em vista a sua condição de órgão
fiscalizador e regulador dos serviços de telecomunicações, bem assim sua
omissão demonstrada nestes autos, na obrigação subsidiária de pagamento de
indenização a título de danos morais às famílias afetadas pela interferência
causada pela rádio, nos valores e nos termos acima mencionados, ou
alternativamente, caso Vossa Excelência não entenda desta forma, a
condenação solidária da ANATEL neste sentido;
f) a condenação das demandadas ao pagamento das
custas e honorários advocatícios, a serem revertidos para o fundo de
reconstituição dos interesses supraindividuais lesados, criado pelo art. 13 da
Lei n. 7.347/85.
Requer-se, ainda, a juntada da documentação em anexo
e a produção de todas as provas em direito admitidas, especialmente a
testemunhal e a pericial.
Dá-se à causa o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
Termos em que pede e espera deferimento.
Criciúma/SC, 14 de maio de 2004.
RICARDO KLING DONINI
Procurador da República
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