Tráfico de pessoas em Moçambique: causas principais e

Transcrição

Tráfico de pessoas em Moçambique: causas principais e
3
políticas e programas
Políticas
e Programas
3.A. Actuais Quadros Legislativos
A
pós a 4ª Conferência Mundial sobre a Mulher
realizada em Beijing em 1995 e o Congresso
contra a Exploração Sexual de Crianças realizado
em Estocolmo em 1996, as organizações da sociedade
civil têm estado bastante activas no estudo e formulação
de recomendações, bem como em campanhas de
defesa e apoio visadas à adopção de leis que combatam
a violação dos direitos das mulheres e das crianças.
A falta de recursos suficientes por parte das instituições estatais, tanto humanos
como financeiros, causa constantes atrasos na promoção dos grupos menos
potencializados da sociedade.
Uma iniciativa lançada em 2003 pelo governo juntamente com o apoio da
UNICEF, fortalece o sistema legal para melhor salvaguardar os direitos das crianças.
Esta iniciativa tem por objectivo analisar a legislação existente, bem como as leis
consuetudinárias e práticas judiciais de forma a determinar se estas estão em
conformidade com os tratados sobre os direitos humanos e direitos das crianças. O
objectivo geral é a formulação de um Decreto integral detalhado para Crianças.77
O Plano Nacional de Acção pelas Crianças (PNAC) indica algum avanço
registado através do estabelecimento de políticas e quadros legislativos nesta área.78
Este inclui:
77. “Legal Reform Launched to Protect Children” United Nations Integrated Regional Information Network (Rede de Informação Regional Integrada das Nações Unidas), 1 de Setembro de 2003.
78. Ministério da Acção Social, Draft Plano Nacional de Acção para a Criança (PNAC) 2004-2010, pág. 4.
pp_mozambique_por.indd 45
4/10/06 11:24:01
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
• a ratificação da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Crianças
(na sigla em inglês CRC) em 1994;
• a adopção da Política para Adolescentes e Jovens em 1994;
• a adopção da Política para Acção Social em Abril de 1998;
• a adopção da Estratégia para Assistência Social de Crianças em Junho de
1998;
• a ratificação da Carta Africana dos Direitos e do Bem-estar das Crianças em
Maio de 1998;
• a Lei 6/99 que previne as Crianças de Irem a Clubes Nocturnos e não permite
o Consumo de Bebidas Alcoólicas e de Tabaco pelas mesmas;
• a Lei da Família79 e;
• Reforma da Legislação sobre Crianças iniciada em 2003.
Não existem quaisquer leis específicas que proíbam o tráfico de pessoas. O
tráfico de pessoas pode ser processado através da lei da violação da mão-deobra, lei da imigração e lei da mão-de-obra infantil.
A lei não especifica qualquer idade para consentimento sexual, mas no entanto a
oferta ou obtenção de prostituição e de pornografia seja em que forma for, incluindo
a de crianças, é ilegal em termos do Código Penal. O abuso sexual de uma criança
com menos de 16 anos também é ilegal em termos do Código Penal. As pessoas
envolvidas na prostituição infantil, no uso de crianças para actividades ilícitas, na
pornografia infantil, no tráfico de crianças ou na mão-de-obra forçada ou associada
podem ser punidos por sentenças de prisão e multas.80
Os seguintes instrumentos internacionais podem ser usados para instaurar
processos jurídicos em alguns aspectos de tráfico de pessoas. Esta tabela apresenta os
instrumentos ratificados e/ou assinados (ou não) pelo Governo de Moçambique.
Instrumentos Legais Relevantes relativos ao Tráfico de Pessoas
Convenção da OIT Nº 182 sobre as Piores Formas de Trabalho
Infantil (1999)
Assinatura
Ratificação
16 de Junho de
2003
Convenção das NU contra o Crime Transnacional Organizado
15 de Dezembro de 2000 Não ratificado
(2000)
Protocolo das NU para prevenir, suprimir e punir o tráfico de
pessoas, especialmente de mulheres e crianças (Protocolo de
15 de Dezembro de 2000 Não ratificado
Palermo) (2000), suplemento à Convenção das Nações Unidas
contra o Crime Transnacional
Convenção das NU de 1989 sobre os Direitos da Criança (CRC)
26 de Maio de 1994
79. Esta lei foi aprovada pelo Parlamento em Agosto de 2004. Introduz a idade de 18 anos como idade
mínima para casamento para ambos os sexos, elimina o estatuto de marido de facto como chefe da
família e legaliza as uniões civis, religiosas e por lei consuetudinária. Esta lei esclarece os direitos
legais da mulher em matéria de propriedade, custódia das crianças e outras questões.
80. US State Department, Bureau of Democracy, Human Rights and Labor, 2004.
46
pp_mozambique_por.indd 46
4/10/06 11:24:02
políticas e programas
Protocolo Facultativo à Convenção dos Direitos da Criança na Venda
de Crianças, Prostituição e Pornografia Infantis (2000)
6 de Abril de 2003
Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (2002) Artigo 728 de Dezembro de 2000 Não ratificado
181
Convenção Suplementar das NU sobre a Abolição da Escravatura,
o Comércio de Escravos e Instituições e Práticas Semelhantes à Não assinado
Escravatura (1956)
Não ratificado
Convenção de Hague Nº 33 sobre a Protecção de Crianças e
Não assinado
Cooperação em Matérias de Adopções Inter-países (1993)
Não ratificado
Convenção sobre a Protecção dos Direitos de Todos os Trabalhadores
Não assinado
Migrantes e Membros das Suas Famílias (1990)
Não ratificado
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
contra as Mulheres (1979) (na sigla em Inglês CEDAW)
16 de Abril de 1997
(Adesão)
Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de todas as
Não assinado
Formas de Discriminação contra as Mulheres (1999)
Não ratificado
Convenção para a Supressão do Tráfico de Pessoas e da Exploração
Não assinado
da Prostituição de Outros (1949)
Não ratificado
Carta Africana dos Direitos e do Bem-Estar da Criança (1990)
15 de
1998
Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (1986)
22 de Fevereiro de
1989
Julho
de
9 de Dezembro de
Protocolo à Carta Africana de Direitos do Homem e Direitos dos
15 de Dezembro de 2003
Povos sobre os Direitos das Mulheres em África (1998)
2005
Até que o Protocolo das NU para prevenir, suprimir e punir o tráfico de
pessoas, particularmente de mulheres e crianças (Protocolo de Palermo)82 seja
ratificado e a legislação doméstica seja alinhada com as disposições previstas
no referido protocolo, as mulheres e crianças continuam marginalizadas e
sujeitas à violação dos seus direitos. Tal constituirá a fundação para a legislação
e iniciativas futuras visadas à prevenção e protecção, investigação e processamento
dos traficantes e provisão de assistência às vítimas.83
Esta situação põe em destaque a preocupação da sociedade civil de que a
legislação moçambicana não é efectiva e encontra-se desactualizada e requer uma
reforma urgente para fazer face às novas tendências dos crimes emergentes contra
crianças e mulheres.
Para além das acções legislativas, é necessária uma revisão geral dos sistemas e
processos judiciais de forma a colocá-los em linha com os sistemas judiciais que
defendam e apoiem as crianças e as vítimas.
81
81. De acordo com o artigo 7.1 do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, “Para os efeitos do
presente Estatuto, entende-se por “crime contra a Humanidade” qualquer um dos actos seguintes,
quando cometido no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população
civil, havendo conhecimento desse ataque: […] (c) escravidão; […] Por “escravidão” entende-se o
exercício, relativamente a uma pessoa, de um poder ou de um conjunto de poderes que traduzam
um direito de propriedade sobre uma pessoa, incluindo o exercício desse poder no âmbito do tráfico
de pessoas, em particular mulheres e crianças […].
82. Ainda não ratificado. Está em acção a campanha de apoio para influenciar os organismos legislativos.
83. Ver o Anexo 3: Princípios e Directrizes Recomendados em Matéria de Direitos Humanos e Tráfico de
Pessoas pelo Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos.
47
pp_mozambique_por.indd 47
4/10/06 11:24:02
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
3.B Programas e Projectos Actuais
3.B.1 Campanha Nacional Contra o Abuso de Crianças (NCACA)
1. Após o Primeiro Congresso Mundial Contra a Exploração Comercial Sexual
de Crianças (na sigla em Inglês – Commercial Sexual Exploitation of Children –
CSEC) realizado na Suécia, em Agosto de 1996, foi estabelecido um programa
moçambicano para responder às recomendações visadas à luta contra a
exploração comercial de crianças.84 Como resultado foi estabelecido um Grupo
Central com o objectivo de liderar a Campanha Nacional contra o Abuso
e Tráfico de Crianças (na sigla em Inglês National Campaign against Child
Abuse - NCACA). 85
2. Foram implementadas actividades visadas ao combate do abuso de crianças,
usando o slogan “Rompendo o Silêncio” que envolveram actividades de defesa
e apoio à causa, meios de informação e acções de conscientização. A 16 de
Junho de 2000, foi oficialmente lançada, na área fronteiriça de Ressano Garcia,
perto da África do Sul, a Campanha Nacional Contra o Abuso e Tráfico de
Crianças86 com o objectivo de chamar a atenção dos cidadãos e dos governos
de ambos os países para a necessidade de se combater o abuso sexual e tráfico
de pessoas. Estiveram presentes a este lançamento oficial cerca de 3000 pessoas,
incluindo o Ministro da Defesa da Mulher e Coordenação da Acção Social. A
Campanha Moçambicana tornou-se assim parte da Campanha Internacional
Contra o Tráfico de Crianças87 lançada na Europa em Outubro de 2001 pela
Federação Internacional Terre des Hommes. Este evento proporcionou às ONGs
de Moçambique uma oportunidade para adquirirem acesso a conhecimentos e
capacidade institucional para articularem a mensagem de combate ao problema
a diferentes níveis. A campanha moçambicana compreende quatro componentes
principais, nomeadamente: prevenção; protecção, reabilitação e edificação de
capacidade.
Os objectivos desta campanha são:
84. See Annex 1.
85. A Rede é constituída por uma ONG central, a ADDC- “Associação dos Defensores dos Direitos da
criança” e uma equipa executiva de 5 ONGs “Organização da Mulher Moçambicana”(OMM), “Centro de Reabilitação Psicossocial Infantil e Juvenil” (CERPIJ), Rede da Criança, CONTINUADORES,
Fundação para o Desenvolvimento Comunitário (FDC)), 3 organizações internacionais (Terre des
Hommes Alemanha, UNICEF, Save the Children), 3 Ministérios (Ministério da Defesa, Ministério
do Interior e Ministério da Defesa da Mulher e Coordenação da Acção Social) e uma instituição
religiosa (o Conselho Cristão de Moçambique (CCM).
86. Esta campanha considera o tráfico de Crianças, para todos os fins, como Abuso de Crianças e como
uma violação da Convenção dos Direitos da Criança.
87. Site da Internet para a Campanha Internacional contra o Tráfico de Crianças (em inglês): http://
www.stopchildtrafficking.org/site/Campaign.707.0.html
48
pp_mozambique_por.indd 48
4/10/06 11:24:03
políticas e programas
• criar uma conscientização entre o público com relação ao tráfico de crianças;
• influenciar o governo para ratificar e implementar o Protocolo de Palermo
e a Convenção de Hague nº 33, implementar a Convenção das NU sobre os
Direitos da Criança (na sigla em inglês CRC) e a Convenção 182 da OIT;
• influenciar o governo para estabelecer acordos bilaterais e multilaterais para a
protecção de crianças vítimas de tráfico nos países de trânsito e de destino;
• promover a repatriação voluntária das vítimas do tráfico de pessoas;
• estabelecer uma base de dados sobre o tráfico de pessoas;
• criar uma rede de comunicação a nível nacional e regional para dar assistência a pessoas traficadas e para combater o tráfico de pessoas;
• educar a sociedade com relação aos direitos das crianças; e
• assegurar serviços de saúde apropriados para as vítimas bem como a sua
reintegração social.
3. No primeiro encontro regional sobre o tráfico de crianças, realizado em
Moçambique em 2001, foi identificada a dimensão do problema na África
Austral e recomendadas áreas de pesquisa para cada um dos países.
4. O lançamento da Campanha Regional da África Austral contra o Abuso
Sexual e Tráfico Ilegal de Crianças (SANTAC) teve lugar em 2002 em
Moçambique. Os membros da campanha envolveram individualidades de renome
que se tenham distinguido na defesa dos direitos das crianças para apoiarem
as campanhas a nível nacional e regional.88 Graça Machel89 foi convidada para
patrona da campanha. Por sua vez esta intercedeu junto do Arcebispo Desmond
Tutu convencendo-o a se juntar a esta iniciativa. Esta rede é constituída por
Moçambique, África do Sul, Namíbia, Suazilândia, Zâmbia, Zimbabué, Angola e
Malawi. Graça Machel é regularmente consultada e convidada para tomar parte
nas actividades.
Esta campanha incluiu:
• O lobbying de uma Comissão Parlamentar para tomar acção de forma a providenciar protecção para as crianças traficadas na África do Sul e em Moçambique;
88. Moçambique solicitou o envolvimento da Ministro da Defesa da Mulher e da Acção Social, S. Exa.
Dra. Virgília Matabele, e de Fernanda Teixeira, a Presidente da Cruz Vermelha de Moçambique.
89. Graça Machel, viúva do primeiro presidente de Moçambique, Samora Machel, e esposa de Nelson
Mandela, foi a primeira mulher a servir como Ministro em Moçambique. Foi Ministro da Educação
em Moçambique durante o primeiro governo independente, cargo que desempenhou durante dez
anos. Foi Membro do Parlamento até pouco antes das primeiras eleições democráticas de 1994 altura em que decidiu formar a Fundação para o Desenvolvimento Comunitário. Desde então, tem
dedicado os seus esforços a auxiliar as crianças vítimas de minas e de todas as formas de abuso
dentro e fora de Moçambique. Com base neste seu envolvimento, foi convidada para Patrona da
Campanha Regional.
49
pp_mozambique_por.indd 49
4/10/06 11:24:03
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
• Formação de agentes policiais sobre a questão e sobre formas de protegerem
os direitos das crianças (foram treinados agentes policiais de três esquadras
como um projecto piloto sobre o tráfico de crianças e outras violações dos
direitos das crianças);
• Provisão de assistência legal para as crianças vítimas de abuso sexual e de
tráfico ilegal em Moçambique;
• Identificação de crianças traficadas num centro para crianças da rua na África
do Sul; e
• Estabelecimento de um lar de acolhimento para crianças deportadas da África do Sul, perto de Ressano Garcia, o ponto principal de cruzamento entre
Moçambique e a África do Sul, onde as autoridades sul-africanas deixam as
crianças e os adultos que são deportados.90
5. A Sociedade Nacional de Jornalistas Moçambicanos (SNJ), em parceria com
a organização Terres des Hommes, organizou um seminário de formação a
nível nacional. Este evento, que teve como objectivo criar um entendimento
da questão de tráfico de crianças como um desafio emergente em Moçambique,
proporcionou a oportunidade para os jornalistas aprenderem e discutirem
questões éticas relacionadas com os meios de informação na protecção dos
direitos das crianças. Tal resultou num interesse crescente em se divulgarem, em
quase todos os principais meios de comunicação às massas, casos pertinentes a
esta questão. Os meios de informação têm dedicado uma cobertura substancial
às actividades da campanha através da publicação de comunicados de imprensa;
participação em encontros com oficiais do governo bem como encontros
organizados para a disseminação de informação. Para além disso organizaramse debates a nível nacional em cada canal televisivo e estação radiofónica. Os
jornalistas também fizeram uma cobertura do alegado tráfico de órgãos humanos
em Nampula.
3.B.2. Prevenção Através de Projectos de Conscientização
As forças de policiamento de fronteiras e os magistrados foram sensibilizados
e convencidos a desenvolverem um interesse especial no combate ao tráfico de
pessoas nas suas respectivas áreas de influência. Os resultados foram encorajadores
dado todas as partes envolvidas terem demonstrado interesse em discutir em mais
detalhe esta questão e em realizar programas conjuntos.
A polícia solicitou que fosse providenciada formação aos seus quadros
profissionais e aos cadetes nos centros de formação e está a considerar incluir um
módulo sobre o tráfico ilegal no currículo da academia de formação.
90. Dottridge M (2004) Kids as Commodities? Child Trafficking and What to do about it, Terre des hommes.
50
pp_mozambique_por.indd 50
4/10/06 11:24:04
políticas e programas
A 30 de Agosto de 2004, o Procurador-geral Dr. J. Madeira nomeou um oficial
de ligação para trabalhar conjuntamente como a Campanha Nacional de forma a
auxiliar o processar jurídico de perpetradores em casos de negligência comprovada
por parte das autoridades policiais. O FECIV (Fórum de Educação Cívica) é um
Instituto de Educação Cívica que iniciou um programa de formação para agentes
de polícia, unidades de controlo fronteiriço e oficiais de migração com relação a
questões relativas ao tráfico ilegal, incluindo legislação que pode ser aplicada para
punir os traficantes. Durante os cursos de formação são disseminados instrumentos
internacionais para protecção de crianças, bem como cópias do Protocolo para
Prevenir, Suprimir e Punir o Tráfico de Pessoas, Especialmente de Mulheres e
Crianças (“Protocolo de Palermo”).
Foram produzidos e distribuídos a mais de 10 000 pessoas do público,
especialmente crianças, materiais de informação e de promoção. Foram disseminadas
quatro mensagens principais: (1) o tráfico de crianças existe; (2) os direitos da
criança incluem o seu direito de estar livre de ser traficada; (3) o tráfico de crianças
é muito mais do que somente exploração sexual; e (4) o tráfico de crianças é uma
questão que está interrelacionada com outras questões.
Adoptou-se o uso de eventos desportivos como uma estratégia para fazer chegar
a mensagem a mais pessoas. Em Junho de 2004, 100 crianças envolvidas em
equipas de futebol e envergando roupas de promoção do evento participaram num
jogo amigável de futebol entre Moçambique e o Gana, jogo este a que assistiram
cerca de 40 000 pessoas e que foi transmitido pelo canal televisivo nacional. Os
capitães de ambas as equipas hastearam um estandarte principal para a cerimónia
com a seguinte mensagem “Um objectivo contra o abuso e tráfico de crianças, jogo
limpo”.
Os organizadores da campanha nacional promovem iniciativas visadas à
mobilização de jovens para formarem clubes escolares para prevenir o abuso e tráfico
de crianças. Em Dezembro de 2004, 70 artistas jovens em idade escolar reuniramse num workshop de 3 dias para celebrar o Dia interino de Acção Global contra o
Tráfico de Crianças. Foi-lhes proporcionada a oportunidade de aprenderem sobre
as causas, tipos, perfis e consequências do tráfico de crianças e sobre as barreiras
legislativas que afectam a luta contra o tráfico e o abuso. Estas crianças tiveram
também a oportunidade de reflectir sobre as melhores formas de motivarem os
seus colegas a discutirem técnicas de prevenção mais acessíveis às crianças e que
incorporam a utilização de actividades desportivas, artes visuais, representações
dramáticas e debates. Esta iniciativa teve lugar nos distritos de Xai-Xai e Namaacha,
Chókwe, Bilene Macia, Manjacaze.
A ECPAT International91 providenciou apoio através da Rede da Criança de forma
a capacitar os jovens a agirem como conselheiros dos colegas e a conscientizá-los
91. O acrónimo ECPAT significa em Inglês End Child Prostitution, Child Pornography and Trafficking
of Children for Sexual Purposes (ou seja ‘Acabar com a Prostituição de Crianças, Pornografia de
Crianças e Tráfico de Crianças para Fins Sexuais’)
51
pp_mozambique_por.indd 51
4/10/06 11:24:04
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
sobre o tráfico de crianças, através do alistamento de jovens ´vítimas’ do tráfico para
se dirigirem tanto a possíveis vítimas do tráfico como aos organismos de imposição
da lei.92
3.B.3. Projectos de Reintegração Social
Nas actividades da Campanha Nacional foi introduzida uma componente de
desenvolvimento comunitário. Esta iniciativa consiste de um programa agrícola
para a produção de alimentos excedentes e criação de segurança alimentar em áreas
de alto risco. Existe também uma componente para formação e desenvolvimento
de aptidões. O projecto encontra-se implementado em Mahubo, província do
Maputo.
3.B.4. Projecto de Protecção
1. O Ministério da Defesa da Mulher e Coordenação da Acção Social providenciou
conselheiros para seis dos hospitais principais para auxiliarem as mulheres e
crianças que são vítimas de violência, incluindo do tráfico. Estes conselheiros
recebem orientação básica sobre o tráfico de pessoas e aqueles que se encontram
a trabalhar no Hospital Central de Maputo informam que no último ano têm
sido assistidas pessoas traficadas.93
2. O Ministério da Defesa da Mulher e Coordenação da Acção Social está a
elaborar uma proposta para um Plano de Acção para a Protecção da Crianças.
3. A ADDC (Associação dos Defensores dos Direitos da Criança) oferece
assistência jurídica a crianças marginalizadas, na sua maioria, vítimas de abusos
sexuais e de tráfico ilegal, bem como efectua a disseminação de informação
sobre os direitos das crianças.
4. A ADDC providencia serviços de protecção à criança em cinco esquadras
policiais. Mais de 800 agentes policiais foram treinados em cooperação com o
Ministério do Interior. Este ministério estabeleceu esquadras policiais orientadas
para a protecção de crianças e mulheres e que têm por intenção proteger, em
parte, as pessoas traficadas em Maputo, Beira, Nampula e várias outras cidades
principais na província de Gaza.94 O Ministério do Interior tenciona estabelecer
16 Centros de Protecção de Crianças em esquadras policiais estratégicas a nível
de todo o país.
5. O Ministério da Defesa da Mulher e Coordenação da Acção Social e
outras agências tem trabalhado em conjunto com a UNICEF no sentido
92. UNICEF (2003) Trafficking in Human Beings Especially Women and Children in Africa, pág. 32,
Innocenti Research Centre.
93. Departamento do Estado dos Estados Unidos (2005) Trafficking in Persons Report.
94. Departamento do Estado dos Estados Unidos (2005) Trafficking in Persons Report.
52
pp_mozambique_por.indd 52
4/10/06 11:24:05
políticas e programas
de lançarem uma campanha nacional para o registo de nascimento de
crianças. A maior parte das crianças no país não foram formalmente
registadas, o que limita o seu acesso à educação e aos cuidados de saúde.
6. A UNICEF Moçambique elaborou também uma folha de factos sobre o tráfico
de pessoas que pode ser usada como uma base para os quadros legislativos.
7. A 2 de Maio de 2006 Moçambique inaugurou um lar de acolhimento na
Moamba, Maputo, financiado pela Terre des Hommes, Alemanha.
3.B.5. Projectos de reabilitação
1. Uma organização com base religiosa tem em funcionamento um lar de
acolhimento em Ressano Garcia, onde se auxiliam vítimas de tráfico de crianças
e de abuso sexual. Em Maio de 2006 o FECIV (Fórum de Educação Cívica)
inaugurou um lar de acolhimento melhorado no distrito da Moamba, que tem
capacidade para acomodar 80 pessoas. Regularmente partem da África do Sul
rumo a Moçambique comboios transportando cerca de 800 migrantes ilegais.
Um número considerável destes imigrantes ilegais é constituído por crianças
moçambicanas que entram na África do Sul por vias ilegais. As crianças
acolhidas neste lar relatam histórias sobre as condições inumanas a que foram
sujeitas. A informação recolhida neste projecto está a ser usada numa campanha
de apoio visada a encorajar os Governos de Moçambique e da África do Sul a
introduzirem melhoramentos na forma como lidam com pessoas traficadas de
modo a evitarem uma vitimação dupla.
2. O Hospital Central de Maputo estabeleceu um projecto-piloto que oferece
apoio psicossocial às crianças vítimas de abuso. Esta unidade, gerida pelo CERPIJ
(Centro de Reabilitação Psicológica Infanto-Juvenil) tratou até à data cerca de
400 crianças, incluindo vítimas do tráfico ilegal.
3. A Terre des Hommes promoveu uma colaboração transfronteiriça entre
ONGs da África do Sul e de Moçambique e foram estabelecidos laços com o
Centro ‘Amazing Grace’, também conhecido como Centro de Cuidados de
Malelane (Malelane Care Centre), situado a 50 quilómetros da fronteira com
Moçambique, na província de Mpumalanga. Algumas das crianças aí acolhidas
são de Moçambique e têm sido encorajadas a regressar voluntariamente para as
suas casas.
53
pp_mozambique_por.indd 53
4/10/06 11:24:05
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
3.B.6. Lições Aprendidas
Porta-voz de alto perfil
A presença de uma porta-voz de alto perfil (Graça Machel) que se identifica com a
campanha tem auxiliado a mobilizar a vontade política tanto da parte do Presidente
como do Governo de Moçambique, cuja presença se registou no lançamento da
campanha SANTAC em 2002. A porta-voz participou também em eventos através
dos meios de informação e fez uma contribuição tremenda em assegurar a inclusão
de questões chave sobre a luta contra o tráfico de pessoas nas agendas públicas e
políticas.
Benefícios/resultados da formação de jornalistas sobre questões de tráfico de pessoas
Os jornalistas receberam formação detalhada sobre as ligações entre o tráfico
nacional e a tríade que opera em África, Europa e Ásia. Puderam assim adquirir
um entendimento da vulnerabilidade de um país como Moçambique que tem seis
fronteiras terrestres internacionais e mais de 2700 km de costa, onde cerca de
40% da sua fronteira territorial não é vigiada. Estes aprenderam como lidar com
o problema do tráfico de pessoas em linha com a definição das NU, e também
como o considerarem de um ponto de vista local, tal como a percepção pública
do Tatá Papá e Tatá Mamã. A questão de se evitar o sensacionalismo e de não
se divulgarem os nomes das vítimas e das testemunhas foi também abordada.
Pediu-se aos jornalistas que fossem mais investigativos e didácticos de forma que
as pessoas possam aprender, através dos seus artigos, como se defenderem e autoprotegerem.
Disponibilização de informação a 10,000 pessoas
Moçambique tem hoje em dia uma sociedade mais ciente das questões de tráfico
de pessoas. Os membros do parlamento, o Presidente, o Procurador-Geral e os
Ministérios do Interior e da Justiça estão cientes da necessidade de se introduzir
legislação a este respeito e fizeram declarações públicas nesse sentido. Existem
muitas organizações nacionais que foram formadas, como por exemplo, o Fórum
de Drama Contra o Tráfico de Crianças na Zambézia95, a Rede Came - (Rede Contra
o Abuso e Tráfico de Crianças) (que publica um folheto informativo de dois em
dois meses), 400 crianças da Organização dos Continuadores Moçambicanos que
participaram num festival durante uma acampamento no verão em representação
de 128 dos 131 distritos e que foram capacitadas com relação a questões de tráfico
de pessoas e que afirmaram aos meios de informação estarem muito satisfeitas em
aprenderem sobre como prevenir todas as formas de abuso e tráfico de crianças.
95. Zambézia é uma província de Moçambique
54
pp_mozambique_por.indd 54
4/10/06 11:24:05
políticas e programas
Há muitas mais organizações internacionais envolvidas como por exemplo a IOM,
UNODC, UNESCO, UNICEF, Save the Children Noruega, WLRI/CEDPA, USAID,
bem como as Embaixadas da Noruega, do Reino Unido dos Estados Unidos da
América. A maior parte ou estão a gerir e a financiar a pesquisa ou a providenciar
programas de assistência técnica na luta contra o tráfico. A partir de Maio de 2006
a WLRI e a Rede Came, em colaboração com o Ministério da Justiça iniciaram
um processo de elaboração da proposta preliminar para a legislação anti-tráfico
de pessoas em Moçambique. O recentemente publicado estudo sobre o tráfico
de crianças em Moçambique intitulado “Tatá Papá Tatá Mamã”, irá auxiliar neste
processo.
Colaboração Transfronteiriça entre as ONGs
Esta colaboração apoia organizações em Moçambique e na África do Sul,
incluindo representantes governamentais de alto nível que participaram em
comícios realizados nas fronteiras de ambos países, e que se comprometeram a lutar
contra o tráfico de pessoas. As organizações moçambicanas têm casos concretos de
pessoas que foram traficadas e que foram resgatadas. A polícia da África do Sul e
de Moçambique encontra-se envolvida em discussões com as ONGs para partilhar
experiências operacionais sobre como lidar com as vítimas, resgatar as vítimas e
sobre as formas como os traficantes operam. As ONGs têm encontros regulares
transfronteiriços em vários níveis.
Envolvimento das crianças nas campanhas
O envolvimento das crianças foi crucial. Estas marcharam nas áreas fronteiriças
em protesto contra o tráfico de pessoas e puderam tomar parte activa nas discussões
sobre as suas percepções com relação ao tráfico de pessoas e aprenderam mecanismos
de auto-defesa. Em muitas instâncias falaram directamente ao público.
Falta de legislação específica
A falta de legislação para apoiar os esforços de combate ao tráfico continua a
providenciar oportunidades para os traficantes actuarem e fortalece as suas ligações
a nível nacional e internacional.
Visando as mulheres
Não existem presentemente quaisquer actividades de prevenção especificamente
visadas para as mulheres adultas. Esta é uma falha significante que necessita de
alteração imediata.
55
pp_mozambique_por.indd 55
4/10/06 11:24:06
4
recomendaçÕes
Recomendações
A
s intervenções contra o tráfico de pessoas em
Moçambique abordaram, de forma diversa,
a prevenção, protecção e assistência directa.
Não obstante estes esforços, não parece teremse registado desenvolvimentos significantes. As
iniciativas tomadas têm sido em larga medida:
• indiferentes aos géneros;
• sem uma perspectiva de desenvolvimento com base nos direitos;
• indiferentes aos factores que criam a procura de pessoas traficadas;
• micro-projectos, não ligados a macro-projectos e portanto não sustentáveis; e
• sem uma abordagem integrada multi-sectorial.
O tráfico de pessoas tem uma base sócio-económica e política complexa ligada a
processos mais amplos e globais. Não é simplesmente um problema social ou moral
que deve ser tratado com iniciativas fortuitas, uma vez que estas não abordam
a pobreza ou as questões relacionadas de vulnerabilidade e discriminação de
formas estratégicas ou sustentáveis. O tráfico de pessoas é uma preocupação de
desenvolvimento que requer uma abordagem equilibrada, integrada e em vários
níveis, edificada numa fundação de princípios e normas com base nos direitos.
Enquanto que existem indicadores claros das actividades de tráfico tanto de
mulheres como de crianças, os dados, especificamente com relação às mulheres
são inconsistentes e incompletos. Todavia, dados os níveis extremos de pobreza em
Moçambique e a vulnerabilidade das mulheres e crianças ao tráfico, a possibilidade
de crescimento do tráfico e da infiltração de grupos criminais para exploração é
muito elevada.
pp_mozambique_por.indd 57
4/10/06 11:24:06
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
É essencialmente esta possibilidade que é abordada nesta recomenda-ções.
Portanto o foco das recomendações do presente estudo assenta na prevenção.
A prevenção requer um raciocínio a longo prazo e intervenções em três níveis
– primeiro nível (parar as coisas antes destas acontecerem), segundo nível (limitar
os números de casos que ocorrem), terceiro nível (limitar o âmbito dos casos e o
seu impacto prejudicial.)
Propõem-se as recomendações seguintes em conformidade com estas
exigências:
1. Assinar, ratificar e implementar a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Transnacional Organizado, e o Protocolo para Prevenir, Suprimir e Punir o Tráfico de Pessoas, especialmente de Mulheres e Crianças (Protocolo de Palermo).
2. A legislação nacional sobre o tráfico de pessoas deve, no mínimo:96
• definir com precisão o crime do tráfico ilegal de acordo com as normas internacionais e incluir expressamente todas as práticas de exploração abrangidas
pela definição internacional de tráfico ilegal como servidão por motivos de
dívida, mão-de-obra forçada e prostituição forçada;
• assegurar que as definições de tráfico ilegal reflictam a necessidade de meios
de protecção e de cuidados especiais para crianças, incluindo a protecção
legal apropriada;
• assegurar que as pessoas traficadas não sejam punidas por quaisquer ofensas
ou actividades relacionadas com o facto de terem sido traficadas, tais como a
prostituição e violações de imigração;
• assegurar que as vítimas do tráfico ilegal sejam protegidas contra a deportação sumária, ou regresso nos casos onde existam motivos razoáveis para suspeitar que esse regresso poderia constituir um risco de segurança significante
para a pessoa traficada ou para a sua família;
• levar em consideração a residência temporária ou permanente nos países de
trânsito ou de destino (atraso de reflexão) para as vítimas de tráfico em troca
de testemunhos contra alegados traficantes, ou por motivos humanitários ou
de compaixão;
• assegurar que seja proporcionada às vítimas de tráfico ilegal a possibilidade
de obter compensação por danos sofridos;
• incluir penalidades em proporção com os crimes a serem aplicadas a pessoas declaradas culpadas de tráfico ilegal, incluindo ofensas que envolvam o
96. IOM (2003) Seduction Sale and Slavery: Trafficking in Women and Children for Sexual Exploitation in
Southern Africa.
58
pp_mozambique_por.indd 58
4/10/06 11:24:07
recomendaçÕes
tráfico de crianças ou ofensas cometidas ou que envolvam cumplicidade por
parte de oficiais do estado; e
• os rendimentos originados do tráfico de pessoas e ofensas relacionadas devem ser usados para benefício das pessoas traficadas.
3. Liderança a Nível Nacional:
• Identificar um oficial governamental a nível nacional que irá actuar como o
ponto focal em questões de tráfico, e que irá liderar e comandar Forças Especiais Nacionais de Combate ao Tráfico. Este oficial deve ter a autoridade e
autonomia para agir tanto a nível nacional como internacional. Idealmente,
esta posição estará sob a responsabilidade dos mais altos ofícios do governo,
como por exemplo, o Gabinete do Primeiro-ministro.
• Elaborar termos de referência e providenciar recursos para as Forças Especiais Nacionais de Combate ao Tráfico.
• As Forças Especiais Nacionais de Combate ao Tráfico reunirão os ministérios, agências, organizações intergovernamentais, ONGs e representantes da
sociedade civil para desenvolverem e implementarem a política de combate
ao tráfico.
• Este grupo deverá desenvolver uma política e um Plano de Acção Nacional;
aconselhar no que se relaciona com a legislação e desenvolver procedimentos
e directrizes de funcionamento padrão para os vários parceiros de implementação.
• O Plano de Acção Nacional irá incorporar todas as formas de actividades
orientadas para o combate ao tráfico de pessoas: prevenção, protecção, processamento legal e assistência directa.
4. Actividades de Prevenção Directa:
A prevenção directa inclui a educação e a imposição eficiente da lei mas envolve
também o abordar das causas fundamentais. Por definição exige a potencialização
(empowerment) das pessoas aos níveis mais básicos da organização social; requer o
seu envolvimento activo e encoraja a tomada de decisões por parte das comunidades
sobre como manter a segurança e bem-estar dos seus membros.
• As ONGs, as instituições de governo local e as forças policiais devem trabalhar com os líderes da comunidade através do estabelecimento de comissões
de desenvolvimento ou de outras estruturas existentes (constituídas por homens e mulheres) para formar parcerias orientadas para o combate ao tráfico
como uma manifestação de insegurança.
59
pp_mozambique_por.indd 59
4/10/06 11:24:07
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
• A potencialização (empowerment) económica das mulheres e das jovens irá
promover o seu acesso a recursos produtivos e a mercados e assegurar a sua
mobilidade económica sustentável.
• Intervenções que incluam visitas a grupos de alto risco: tal como por exemplo jovens em áreas rurais, mulheres migrantes, mulheres sem educação
formal.
• Alistar o apoio dos meios de informação para documentar os meios, acções e
resultados do tráfico de pessoas.
• Apoio consistente e contínuo aos quadros envolvidos na monitorização e
investigação activa nas fronteiras de forma a assegurar o seu imediato acesso
a informação e a outros recursos.
• Trabalhar com anteriores ‘vítimas’ que actuarão como conselheiros/orientadores e porta-voz junto de organizações comunitárias para apoiar as iniciativas de prevenção.
• Intervenções que visem os negócios envolvidos na facilitação do comercio,
como por exemplo, empresas de transportes, motoristas de camiões de longa
distância, motoristas de táxis, empresas de autocarros; agências de emprego
e escritórios de recrutamento; pessoal consular responsável por vistos.
• Cuidar das necessidades básicas através da provisão de assistência humanitária a curto prazo a famílias em risco de forma a prevenir o acolhimento de
crianças noutras famílias ou a venda de crianças.97
As organizações da sociedade civil são encorajadas a:
• Estabelecer programas educacionais para a comunidade sobre a prevenção
do abuso e tráfico de crianças, usando crianças como actores principais do
programa. A iniciativa deve incluir acções de conscientização em escolas e
outros locais através de dramatizações, canções, dança, desportos, discursos
e debates sobre as práticas prejudiciais às mulheres e crianças.
• Capacitar os líderes comunitários e as famílias de forma a transformar as
atitudes relacionadas com os géneros e os direitos das mulheres; reconhecer
e apoiar a contribuição económica remunerada e não remunerada das mulheres e reduzir a sua carga de trabalho doméstico; abordar as percepções
sobre o papel da mulher e do homem em associação com o fenómeno do tráfico de pessoas. Uma estratégia desse tipo pode assegurar o apoio dos líderes
comunitários na luta contra o tráfico de pessoas.
97. Dottridge M. (2004) Kids as Commodities? Child Trafficking and What to do about it, Terre des hommes. (Ver o Diagrama 6 com relação aos factores de diferenciação no tráfico de crianças e as diferentes oportunidades para intervenção).
60
pp_mozambique_por.indd 60
4/10/06 11:24:07
recomendaçÕes
5. Educação, Formação e Conscientização:
As campanhas em larga escala com informação dispendiosa têm um valor
questionável se não forem visadas a audiências específicas identificáveis, se não
se exigir qualquer tomada de acção e se os resultados da campanha não forem
avaliados. Quando os recursos e a escala do desafio são equilibrados de forma
desproporcional, é vital estabelecer prioridades e objectivos claros. É provável que
as campanhas especificamente harmonizadas visadas a grupos de alto-risco e a
grupos sociais e profissionais identificáveis sejam mais eficazes.
• Expandir as oportunidades e melhorar o acesso à educação formal por parte
das mulheres, meninas e rapazes em todos os níveis e em vertentes não convencionais.
• Assegurar um equilíbrio entre uma educação melhor e oportunidades de
emprego disponíveis.
• Incorporar os direitos relacionados com os géneros e questões relativas aos
direitos humanos no currículo escolar.
• Incorporar sensibilização e informação nas actividades educacionais informais, nos clubes/desportos/actividades religiosas visadas para as crianças e
para a juventude.
• Melhor formação e capacitação para as meninas, ligadas a actividades viáveis
e sustentáveis de produção de rendimentos.
• Promover o conhecimento das leis nas comunidades marginalizadas e melhorar o acesso a assistência legal financeiramente acessível.
• Efectuar cursos de actualização legal para a imposição da lei que incluam
formação com relação aos géneros e aos direitos bem como informação sobre
a legislação para o tráfico ilegal.
• Efectuar campanhas de informação visadas para as comunidades de alto risco
sobre formas seguras de migração.
• Reforçar a formação dos quadros de imposição da lei, oficiais de imigração
e alfandegários, promotores públicos e juízes, inspectores de mão-de-obra,
diplomatas e professores bem como outros oficiais relevantes à prevenção do
tráfico ilegal.
• Introduzir uma avaliação e monitorização eficientes de todos os programas
de formação de forma a efectuar uma avaliação do sucesso alcançado e repetir, registar lições aprendidas e modificar a instrução de acordo com as mesmas.
• Desenvolver cursos de formação de formadores para as ONGs locais, autoridades civis e outros actores da comunidade de forma a alargar o âmbito das
actividades de conscientização e de informação.
61
pp_mozambique_por.indd 61
4/10/06 11:24:08
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
6. Pesquisa e Recolha de Dados:
As estratégias de prevenção que não estejam ligadas à recolha e análise de dados
regular e coordenada acabam por ser ‘tiros no escuro.’
• É necessário reforçarem-se as capacidades governamentais de forma a estandardizar a recolha de informação estatística e dados de base e a orientar
pesquisa com base na política. Os pesquisadores devem desenvolver metodologias apropriadas à variedade de causas e consequências do tráfico de
mulheres, homens, meninas e rapazes.
• Assegurar a fragmentação dos dados de migração com base na idade, género,
nacionalidade, data e local de entrada e de saída, local de renovação do visto,
estadia prolongada e deportação.
• Pouco se sabe sobre o tráfico de homens adultos. É necessária pesquisa adicional para se poder fazer a distinção entre migração legal, contrabando e
tráfico ilegal – e determinar para que fins.
• Estabelecer canais de comunicação e partilha e disseminação de informação
sobre o tráfico de pessoas numa base regional de forma a apoiar o desenvolvimento de estratégias apropriadas de prevenção.
• Deve ser efectuada pesquisa inter-disciplinar, pró-activa relativamente às
estruturas, redes, bens comercializados e conduta do crime organizado na
região, de forma a antecipar as suas incursões e portanto prevenir o tráfico
de pessoas.
• É necessária pesquisa sobre o ressurgimento e conduta de práticas e crenças
culturais. Enquanto que estas parecem ser prejudiciais essencialmente para
as meninas, é necessário estabelecer-se um entendimento mais aprofundado
das suas causas, objectivos e a possibilidade de existência de consequências
benéficas bem como prejudiciais.
Todas estas actividades devem ser ligadas e suportadas pelo crescente conjunto de
informações sobre Melhores Práticas Internacionais.
62
pp_mozambique_por.indd 62
4/10/06 11:24:08
5
conclusÃo
Conclusão
E
stá-se a registar um crescimento no número de
populações em África vulneráveis ao tráfico, o
que aumenta a oferta de possíveis vitimas para os
traficantes e aumenta também os efeitos devastadores
em todos os segmentos da sociedade africana.
Indicam-se a seguir algumas das possíveis consequências:
Redução irreparável do capital humano
• Efeito negativo nos mercados de trabalho.
• Incapacidade de acesso a educação necessária para quebrar o ciclo de pobreza e de analfabetismo que cria as condições propícias para o tráfico de
pessoas.
• Uma força de trabalho nacional inadequadamente equipada para competir na
economia global onde o sucesso é baseado em mão-de-obra especializada.
• Menor número de pessoas disponíveis para cuidar dos idosos e dos enfermos.
• Desequilíbrio demográfico social.
• Perda de recursos humanos que saem do país para outros países.
Debilitação da saúde pública
• O custo da SIDA para o sistema de saúde pública.
• Exposição à SIDA, Doenças de Transmissão Sexual, violência, condições
perigosas de trabalho, nutrição inadequada, toxicodependência.
• Improbabilidade de participação em programas de imunização de crianças.
• Trauma psicológico relacionado com experiências.
• Vício do crime e da violência sexual.
pp_mozambique_por.indd 63
4/10/06 11:24:08
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
Desmantelamento do tecido social
• Perda da rede de apoio familiar o que facilita o tráfico de pessoas, debilita
os relacionamentos, enfraquece os laços e influência familiares, interrompe
a transmissão de valores culturais e conhecimentos de uma geração para a
outra, debilitando assim o núcleo da sociedade africana.
• Cada vez mais as vítimas ficam sem lugar nenhum para onde ir.
Crime
• Ligações a outras redes criminais, de drogas e de armas.
• Os lucros são canalizados para outras actividades criminais, como quadrilhas
de roubo de carros, comercialização de drogas, grupos terroristas.
Debilitação da autoridade do governo
• Dificulta as tentativas do governo de imposição de autoridade, debilita a
segurança do público.
• O fracasso por parte do governo de alcançar a sua responsabilidade fundamental, debilita a sua capacidade de combater a corrupção através da imposição da lei e do poder judiciário.
Violações dos direitos humanos
• Perpetuam a desigualdade e injustiça social.
64
pp_mozambique_por.indd 64
4/10/06 11:24:09
REFERÊNCIAS
Abrahams,N. “The linguistic heritage of Cape Muslims”, em Athlone News, (22 de
Setembro de 2004)
Baden Sally, “Post-conflict Mozambique: Women’s special situation, Population Issues
and Gender Perspectives: to be integrated into skills training and employment
promotion” Report of a consultancy for the Action Programme on Skills and
Entrepreneurship in countries emerging from armed conflict, International Labour Office
(Geneva), Junho 1997.
Bagnol, B. e Chamo, E. “Como Entender o Fenómeno dos ‘Titios’ e ‘Pisa-Paga’ em
Pebane e Quelimane,” Draft apresentado durante um seminário realizado em
Setembro de 2003 organizado pela PGM/DFID em Quelimane, Moçambique.
Bagnol Brigitte, “Appraisal of sexual abuse and commercial sexual exploitation of
children in Maputo and Nampula” Maputo, March 1997, Royal Netherlands
Embassy.
Baleira, S “Factors Influencing Child Rights Violation, Prostitution and Sexual Abuse-A
Study Case of Ressano Garcia,” Maputo, 2001.
Barros, J. e Taju, G. “Prostituição, Abuso Sexual e Trabalho Infantil em Moçambique:
o caso específico das províncias de Maputo, Nampula e Tete, Maputo, Gabinete da
Campanha Contra Abuso Sexual,” 1999.
Braga Carla, (2000) “They are squeezing us: Gender, Matriliny, Power and Agricultural
Policies” University of Eduardo Mondlane.
Chingono, M.F., (1996) “The State, Violence and development: the political economy of war
in Mozambique, 1975-1992” The Making of Modern Africa Series, Avebury, Aldershot.
Corner Lorraine, A Gender Perspective to Combat Trafficking, Strategy Paper on an
Integrated Approach to Livelihood Options for Women & Girls, Seminar on
Promoting Gender Equality to Combat Trafficking in Women and Children,
Bangkok, Outubro 2002.
Dottridge M, (2004) ‘Kids as Commodities? Child Trafficking and What to do about it” Terre
des Hommes.
D’Cunha, Jean (2002) Expert Meeting on Trafficking in Women and Girls, Glen Cove, New
York.
ECPAT International, The Commercial Sexual Exploitation of Children in Southern
Africa 2001.
Fitzgibbon Kathleen, “Modern Day Slavery? The Scope of Trafficking in Persons in
Africa” African Security Review Vol. 12 Nº 1, 2003.
Gbadamosi Esq, Olaide (2006) International Perspectives and Nigerian Laws on Human
Trafficking, Network for Justice and Democracy, Benin City, Nigeria.
Global Alliance Against Trafficking in Women (1999) Human Rights Standards for the
Treatment of Trafficked Persons, Bangkok, Thailand.
65
pp_mozambique_por.indd 65
4/10/06 11:24:09
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
Gastrow P, e Mosse M., “Mozambique: Threats posed by the penetration of criminal
networks” Paper delivered at the Institute for Security Studies Regional Seminar held on
18 and 19 April 2002.
Gastrow P, “Trafficking in Persons” South Africa Law Commission, Issue paper 25, Project
131, 2004.
ICRC: The Bellagio Task Force Report On Transplantation, Bodily Integrity, and the
International Traffic in Organs, 1997.
ILO- IPEC (2002) Unbearable to the human heart: Child trafficking and action to eliminate it,
Geneva.
IOM, (2003) “Seduction Sale and Slavery: Trafficking in Women and Children for sexual
exploitation in Southern Africa”.
Johns Hopkins University Protection Project Annual Human Rights Report on the
Trafficking of Persons, Especially Women and Children March 2002.
Kane, J. e Saghera, J. (2001) Trafficking in Children for Sexual Purposes UNICEF.
Kelly, L. “Journeys of Jeopardy: A Commentary on Current Research on Trafficking of
Women and children for Sexual Exploitation Within Europe,” EU/IOM Conference on
Preventing and Combating Trafficking in Human Beings: A global Challenge for the 21st
Century, 2002.
Kelly, L. “From Aspirations to Intervention: Trends, Issues, Priorities and Lessons
Learned” Keynote to the COE Conference Protection of Children Against Sexual
Exploitation, European Preparatory Conference for Yokohama, Budapest, November
2001.
Koen, K. and Van Vuuren, B. “Children in Domestic Service the Case of the Western
Cape,” Terre des Hommes, Switzerland, 2002.
Koh, H., Country Reports on Human Rights Practices for 1999, Testimony before
the subcommittee on International Relations and Human Rights, U.S. House of
Representatives, Washington DC, March 2000.
Lyday, Corbin B., “The Shadow Market in Human Beings: An Anti-Corruption
Perspective” USAID.
Martens, J., Pieczkowski, M.M and Van Vuuren Smyth, B. (May 2003) Seduction, Sale
and Slavery: Trafficking in Women & Children for Sexual Exploitation in Southern Africa,
IOM.
Relatório sobre o Ponto de Situação em Massungulo, ONG de Moçambique sita em Ressano
Garcia, Fevereiro 2004.
Moela, S. “Not All Girls have the Luxury of a Real Childhood”, in City Press, Setembro
1999.
Molo Songololo, “The trafficking of children for Purposes of Sexual Exploitation, South
Africa August” 2000.
Moser, Caroline O.N., Clark, Fiona C. “Victims, Perpetrators or Actors? Gender, Armed
Conflict and political Violence,” Zed Books, 2001.
Mozambican Attorney General Report, 2004 (Relatório do Procurador Geral da República
de Moçambique).
66
pp_mozambique_por.indd 66
4/10/06 11:24:09
referÊncias
Mozambican Social Welfare Ministry, Draft Plano Nacional de Acção para a Criança
(PNAC) 2004-2010 (Ministério da Acção Social de Moçambique).
National Campaign, UNICEF and Terre des Hommes (12 March 2004) Report of the
Meeting for the formulation of the National Action Plan for Prevention of child
trafficking, Maputo.
O’Connell Davidson, J. and Sanchez Taylor, J. (1996) Prostitution and Child Sex Tourism:
South Africa, ECPAT International.
O’ Connell Davidson, J. The Sex Exploiter, NGO Group for the Convention on the
Rights of the Child, 2001.
Omelaniuk Irena, “Trafficking in Human Beings,” UN Expert Group on International
Migration and Development, Department of Economic and Social Affairs, Julho 2005
Perschler-Desai, Viktoria, “Childhood on the market: Teenage prostitution in Southern
Africa” African Security Review, Vol 10 Nº 4, 2001.
Raymond Janice G., A Guide to the new UN Trafficking Protocol – Protocol to prevent,
suppress and punish trafficking in persons, especially women and children,
supplementing the United Nations Convention Against Transnational Organised
Crime, 2001.
Dr Scharlowski, B. How Trafficked Children are Exploited in Europe, Statement, EU
Forum on the prevention of organized crime, Roundtable: “EU action against
child trafficking and related forms of exploitation”, organized by the European
Commission Directorate-General Justice and Home Affairs, Brussels, Borschette
Centre, 26 Maio 2004.
Scheper Hughes, Nancy “The Global Traffic in Human Organs”: A Report Presented to
the House Subcommittee on International Operations and Human Rights, United
States Congress, 27 de Junho, 2001.
Skinneder, E., Kran M., Adamson R. and Townsend-Gault I. “Illegal labor movements
and trafficking of women: International dimensions in the era of globalization”
in Proceedings of the 1997 Regional Conference on Trafficking in Women and Children:
Bangkok, Mekong Regional Law Centre, 1997.
Truong, Thanh-Dam (2006) “ Poverty, Gender and Human Trafficking in Sub-Saharan
Africa: Rethinking Best Practices in Migration Management,” UNESCO.
USAID, “Women as Chattel: The Emerging Global Market in Trafficking” in Gender
Matters Quarterly No.1 Fevereiro 1999.
UNAIDS, UNICEF, USAID (2004) Children on the Brink 2004: A joint report of new orphan
estimates and a framework for action, www.unicef.org/publications/index_22212.
html.
UNICEF, (2003) “Trafficking in Human Beings Especially Women and Children in Africa,”
Innocenti Research Centre.
UNIFEM Asia (2002) “Trafficking in Persons: A gender and rights perspective,” Briefing Kit.
UNIFEM 2001: Reader - Women Land and Property Rights in Situations of Conflict
and Reconstruction: Rachel Waterhouse, “Women’s Land Rights in Post-War
Mozambique,” Action Aid Mozambique and University of Cape Town (1998).
US State Department Trafficking in Persons Report, 2005.
67
pp_mozambique_por.indd 67
4/10/06 11:24:10
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
ANEXO 1
O Primeiro Congresso Mundial Contra a Exploração Sexual Comercial de Crianças
realizado em Estocolmo, Suécia, a 28 de Agosto de 1996 recomendou dez tarefas a
todos os 122 Governos representados nesse encontro. Apresentam-se a seguir estas dez
recomendações:
Conceder máxima prioridade de acção contra a exploração sexual e comercial
de crianças, e designar recursos adequados para este fim;
• Promover uma cooperação sólida entre os países e todos os sectores sociais
para prevenir a participação de crianças no comércio sexual e reforçar o papel
da família na protecção das crianças contra a exploração sexual e comercial;
• Divulgar, como matérias delituosas, criminosas, a exploração sexual e comercial de crianças, assim como outras formas de exploração sexual, condenando e castigando todos os delinquentes envolvidos, sejam estes locais ou
estrangeiros, e garantir que as crianças alvo dessas práticas fiquem isentas de
qualquer culpa;
• Examinar e Revisar, quando possível, a legislação, as políticas, os programas e as práticas vigentes com o intuito de eliminar a exploração sexual e
comercial de crianças;
• Aplicar a legislação, as políticas e os programas para proteger as crianças diante da exploração sexual e comercial e reforçar a comunicação e cooperação
entre as autoridades encarregadas da execução da lei;
• Promover a adopção, implementação e disseminação das leis, políticas e
programas com o apoio dos mecanismos pertinentes a nível local, nacional e
regional, contra a exploração sexual e comercial de crianças;
• Desenvolver e implementar planos e programas integrais, que incluam as
diferenças de género, para prevenir a exploração sexual e comercial de crianças, protegendo e assistindo às vítimas infantis com o intuito de facilitar sua
recuperação e reintegração dentro da sociedade;
• Criar uma situação adequada através da educação, mobilização social e actividades de desenvolvimento para garantir que os pais e responsáveis possam cumprir seus direitos, obrigações e responsabilidades para proteger as
crianças contra a exploração sexual e comercial;
• Mobilizar os políticos e outros aliados importantes, as comunidades nacionais e internacionais, englobando as organizações intergovernamentais e as
ONGs, para ajudar aos países na eliminação da exploração sexual e comercial
de crianças; e
68
pp_mozambique_por.indd 68
4/10/06 11:24:10
anexos
• Ressaltar a importância do papel da participação popular, que engloba as
próprias crianças, na prevenção e eliminação sexual e comercial de crianças.
ANEXO 2
Extractos de – Perfil da Exploração Sexual de Crianças98
Não existe perfil típico daqueles que fazem a exploração sexual de crianças e
eles “não podem ser distinguidos por qualquer qualidade interior específica, traço
de personalidade ou mesmo por tendência sexual.”99 A única característica que os
distingue é que todos eles exploram sexualmente as crianças. Esta exploração sexual
é feita “numa variedade de contextos ambientais sociais, e por uma variedade de
razões.”100 As pessoas que têm relações sexuais com crianças variam desde aquelas
que optam por se envolver neste tipo de variedade, àquelas que não se importam
e ainda àquelas que não se apercebem que o seu parceiro sexual é uma criança.
Assim “é impossível falar-se no explorador sexual de crianças como constituindo um
tipo único de pessoa que possui algumas características específicas ou um conjunto
único de características.”101 (Com a ênfase no original)
No entanto é possível distinguir certas categorias distintas de exploradores
sexuais de crianças dentro deste grupo amorfo. Estas categorias são: os pedófilos,
os exploradores de sexo de situação e os exploradores de sexo preferencial.
Em primeiro lugar e aqueles que se distinguem mais facilmente – mas que se
encontram numa minoria – são os pedófilos. São homens que têm uma preferência
marcada por terem relações sexuais com crianças na idade de pré-puberdade.
Em segundo lugar, existem pessoas que não se importam se o seu parceiro sexual
é ou não uma criança e têm relações sexuais com crianças sem se questionar sobre
a idade do seu parceiro. De salientar neste grupo aqueles a que geralmente se refere
como “turistas de sexo”. Enquanto que existem neste grupo alguns indivíduos que
viajam especificamente para terem relações sexuais com crianças, a maior parte,
contudo, em circunstâncias “normais” não escolheria ter relações com crianças,
mas acabam por o fazer por uma variedade de motivos. Estes incluem: a liberdade
de estar a gozar férias num local estrangeiro “exótico”, estar embriagado ou sob a
influência de drogas, por ignorância ou falta de atenção em identificar a possibilidade
98. Excerto de um estudo de pesquisa comissionado pela UNESCO (2005) Human Trafficking, especially
of Women and Children in Southern Africa (South Africa, Lesotho and Mozambique), coordenado por
Elize Delport, Mhlava Consulting Services (África do Sul).
99. O’ Connell Davidson, J. (2001) The Sex Exploiter, Grupo ONG para a Convenção dos Direitos da Criança, pág. 7 100.Ibid, pág. 7.
101.Moela, S. (19 Setembro 1999) “Not All Girls have the Luxury of a Real Childhood”, em City Press.
69
pp_mozambique_por.indd 69
4/10/06 11:24:11
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
de a pessoa oferecida para sexo é menor. Este grupo designa-se por exploradores
de sexo de situação.
Estes envolvem-se em relações sexuais com crianças porque geralmente não
discriminam de um ponto de vista moral e/ou sexual e desejam “ter experiências
sexuais” com crianças, ou se encontram em situações em que as crianças que reúnem
os seus ideais de atracção física se encontram acessíveis para sexo, ou existem certos
factores de desinibição que lhes permitem ou iludir-se a eles próprios com relação
à verdadeira idade das crianças ou com relação à natureza do consentimento da
criança.
No entanto, o fluxo globalizado de dinheiro aumentou a procura por sexo
comercial e muitos exploradores de sexo são homens locais, muitas vezes utilizadores
regulares do sexo comercial, e que não fazem distinções com base em idade. No
contexto sul-africano estes indivíduos têm sido descritos como “homens de todas
as idades, raças, credos e orientações religiosas.”102
Em terceiro lugar encontram-se aqueles cuja procura de sexo com crianças é
baseada na convicção de que é menos provável que as crianças tenham tido parceiros
múltiplos e portanto existe menos probabilidade de transmissão de infecções. Este
grupo enquadra-se na categoria daqueles considerados como exploradores de
sexo preferencial.
…. a maioria dos homens que exploram sexualmente as crianças, que se
encontram já enquadradas na indústria de sexo comercial, são essencialmente
os exploradores de sexo situacional que utilizam regularmente os serviços de
prostitutas. Estes tornam-se exploradores de sexo com crianças através do seu uso
de prostitutas e não ao contrário. Assim, ao contrário dos exploradores de sexo
preferencial e dos pedófilos, os exploradores de sexo de situação não procuram
nem consistente nem conscientemente crianças como parceiros sexuais, e muitas
vezes é uma questão de indiferença, da parte deles, se as parceiras sexuais têm 14
ou 24 anos, desde que estejam ‘aptos’ a tal e sejam ‘atractivas’. Este tipo de ofensor
não pode necessariamente ser descrito como sexualmente “perverso” 103 (no sentido
de se desviar das normas sexuais culturalmente prescritas). As características físicas
que o atraem muitas vezes estão em conformidade com os ideais culturais de beleza
‘jovem’ feminiza ou masculina e não a ideais culturais de inocência infantil.
De um ponto de vista físico as crianças desenvolvem a níveis diferentes, e por
exemplo, uma moça de 14 ou 15 anos de idade pode combinar as características
físicas associadas com uma mulher adulta com os atributos característicos da
juventude o que a torna muito admirada. A este respeito tem-se observado que:
102.Idem.
103.Kelly, L. (November 2001) From Aspirations to Intervention: Trends, Issues, Priorities and Lessons
Learned: Keynote to the COE Conference Protection of Children Against Sexual Exploitation, European Preparatory Conference for Yokohama, Budapest. (Conferência Europeia de Preparação para
Yokohama, Budapeste).
70
pp_mozambique_por.indd 70
4/10/06 11:24:11
ANEXOS
“É também importante registar-se aqui muitos modelos utilizados na produção de
pornografia orientada para homens ‘normais’ e não para pedófilos, são na realidade
modelos com menos de 18 anos de idade e que um adulto que seja sexualmente
estimulado por alguém que seja legal e cronologicamente uma criança, mas que
seja fisicamente ‘madura’ e/ou se aproxime dos ideias culturais de beleza sexual,
não pode ser necessariamente considerado como sexual ou psicologicamente
‘aberrante’.”104
ANEXO 3
Directrizes sobre os Direitos Humanos no Tráfico (ALTO COMISSÁRIO DAS NAÇÕES
UNIDAS PARA OS DIREITOS HUMANOS - OHCHR)
Os Princípios e Directrizes Recomendados em matéria de Direitos Humanos e o Tráfico
de Pessoas foram desenvolvidos de forma a providenciar uma orientação prática
com base nos direitos humanos para a prevenção do tráfico e protecção dos direitos
das vítimas do tráfico de pessoas.
O objectivo destas Directrizes é promover a integração dos direitos humanos em
leis, políticas e intervenções nacionais, regionais e internacionais visadas contra o
tráfico de pessoas.
Os Princípios e Directrizes são usados como o quadro estrutural principal e ponto
de referência quanto ao trabalho desenvolvido pelo Gabinete do Alto Comissário
das Nações Unidas Para os Direitos Humanos. Estas Directrizes foram apresentadas
pelo Alto Comissário para os Direitos Humanos ao Conselho Económico e Social
das NU em 2002.
Directriz 1: Promoção e protecção dos direitos humanos integrados em
todas as actividades de forma a prevenir e pôr termo ao tráfico de seres
humanos.
Directriz 2: Identificação de pessoas traficadas e dos traficantes, fazendo a distinção entre vítimas do tráfico e contrabando de migrantes e
identificação dos traficantes, incluindo aqueles envolvidos no controlo
e exploração de pessoas traficadas.
104.Consultar, por exemplo Molo Songololo (2000) Trafficking of Children for Purposes of Sexual Exploitation: A Report, Cape Town, pág. 37. Koen, K. e Van Vuuren, B. (2002) Children in Domestic Service
the Case of the Western Cape, Terre des hommes, Switzerland.
71
pp_mozambique_por.indd 71
4/10/06 11:24:12
Tráfico de Pessoas em Moçambique: causas principais e recomendaçÕes
Directriz 3: Pesquisa, análise, avaliação e disseminação para a elaboração
de estratégias efectivas para combater o tráfico na base de informação,
experiência e análise exactas e actuais.
Directriz 4: Assegurar um quadro legal adequado em conformidade com
as normas e instrumentos internacionais.
Directriz 5: Assegurar uma reacção adequada contra o tráfico de pessoas
através da imposição da lei com a cooperação de pessoas traficadas e
de outras testemunhas.
Directriz 6: Protecção e apoio sem discriminação às pessoas traficadas,
prestando a devida atenção às necessidades das vítimas
Directriz 7: Prevenção do tráfico de seres humanos, levando em consideração a procura e a causa de base, bem como os factores que contribuem para o aumento da vulnerabilidade ao tráfico, tais como a
desigualdade, a pobreza e todas as formas de discriminação e preconceitos.
Directriz 8: Medidas especiais para a protecção e apoio a crianças vítimas de tráfico levando em consideração os melhores interesses das
crianças e prestando especial atenção aos pontos de vista das crianças
bem como aos seus direitos e dignidade em qualquer acção efectuada
em seu nome.
Directriz 9: Acesso a recursos adequados e apropriados sensibilizandose as pessoas traficadas sobre os seus direitos a recursos.
Directriz 10: Obrigações dos responsáveis pela manutenção da paz, polícia civil e pessoal humanitário e diplomático no sentido de tomarem
medidas efectivas para prevenir que os cidadãos dos seus países e trabalhadores se envolvam no tráfico de pessoas e exploração relacionada.
Directriz 11: Cooperação a nível internacional, multilateral e bilateral e
coordenação entre os Estados e regiões, em particular entre aqueles
envolvidos nas diferentes fases da cadeia do tráfico de seres humanos.
(Extraído de OHCHR (2002) Recommended Principles and Guidelines on
Human Rights and Human Trafficking, Geneva – OHCHR (2002) Princípios e Directrizes recomendados em matéria de Direitos Humanos e
Tráfico de Seres Humanos, Genebra)
72
pp_mozambique_por.indd 72
4/10/06 11:24:12
BdVbW^fjZ‚ZhhZcX^VabZciZjbeV†hYZdg^\ZbZYZig}ch^ideVgVVXi^k^YV"
YZhYZig{ÒXdYZeZhhdVhgZ\^hiVcYd"hZVfj^ÓjmdhYZig{ÒXdYZeZhhdVhiVcid
Vc†kZa^ciZgcdXdbd^ciZgcVX^dcVa#
6XVYZ^VYZig{ÒXdYZeZhhdVh‚Xdchi^ij†YV!cVhjVkVhiVbV^dg^V!edgbja]Z"
gZhZXg^VcVhZbBdVbW^fjZ#IVa‚dgZhjaiVYdYdh[VXidgZhYZegZhhdfjZ
hZ ZcXdcigVb ZcgV^oVYdh cV edWgZoV! cV YZh^\jVaYVYZ Z Y^hXg^b^cVd! fjZ
gZhjaiVbZbZhigVi‚\^VhYZhdWgZk^k„cX^VfjZZmeZbVfjZaZhbV^hbVg\^cV"
a^oVYdhVh^ijVZhYZZmeadgVdZYZVWjhd#Dh[VXidgZhYZVigVXd^cXajZb
dVa^X^VbZcidedgdedgijc^YVYZhZZcdgbZhY^[ZgZcX^V^hZXdc‹b^XdhfjZ[VoZb
XdbfjZbZhbdgZ\^Zhk^o^c]VhgZaVi^kVbZciZedWgZhhZVegZhZciZbXdbd
egdk{kZ^h[dciZhYZhjhiZcid0eVgVVa‚bYdXdb‚gX^dajXgVi^kdYZVYdedZYZ
igVcheaVciZYZ‹g\dh]jbVcdh#
:bBdVbW^fjZ!V[VaiVYZfjVYgdhaZ\^haVi^kdhZYZeda†i^XVhgZ\jaVYdgVh^b"
eZYZbdYZhZckdak^bZcidYZjbVVWdgYV\Zb^ciZ\gVa|hZm^\„cX^VhY^kZghVh!
bVh gZaVX^dcVYVh! YZ egZkZcd! egdiZXd Z ^chiVjgVd YZ egdXZhhdh _jY^"
X^V^h#
9ZhYZ&..+aVcVgVb"hZk{g^VhXVbeVc]VhcVX^dcV^hZgZ\^dcV^hXdcigVdig{"
ÒXdYZeZhhdVh#:bhZ\j^bZcidVZhiZhZkZcidh![dgVb^c^X^VYdhegd\gVbVh
Zb Y^[ZgZciZh {gZVh! Xdbd edg ZmZbead! egd_ZXidh YZ XdchX^Zci^oVd! egd"
iZXd!gZ^ciZ\gVdZgZVW^a^iVdhdX^V^h#
8dcijYd!Xdci^cjVbVZm^hi^gbj^idhYZhVÒdh#DVjbZcidYgVb{i^XdcVZe^YZ"
b^VYVH>96!VeZgh^hi„cX^VYZeg{i^XVhXjaijgV^hegZ_jY^X^V^h!dVjbZcidcVh
egdedgZh Z ^cÓj„cX^V Yd Xg^bZ dg\Vc^oVYd WZb Xdbd V eZgYV Xdci†cjV YZ
bdVh_dkZchZYZXg^VcVhhj_Z^iVh|ZmeadgVdhZmjVaZigVWVa]dh[dgVYdh
gZfjZgZbjbVViZcdXdchiVciZZ]Vgbdc^oVYV#
EVgVhZXdbWViZg!YVbZa]dg[dgbVedhh†kZa!dig{ÒXdYZeZhhdVhZbBdVb"
W^fjZ! WZb Xdbd dh gZhjaiVciZh Z[Z^idh egZ_jY^X^V^h eViZciZh cV hdX^ZYVYZ
bdVbW^XVcV!hdcZXZhh{g^dhZh[dgdh!iVaZcidhZgZXjghdh\dkZgcVbZciV^h!
YZdg\Vc^oVZh^ciZgcVX^dcV^h!YVhDC<hWZbXdbdYVhdX^ZYVYZX^k^a#