Resumo_Brusco1982
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Resumo_Brusco1982
1 The Emilian model: productive decentralisation and social integration O modelo Emiliano: descentralização produtiva e integração social (Brusco, 1982) Introdução Apresenta-se uma análise dinâmica da interação entre a estrutura produtiva, o mercado de trabalho e as instituições políticas principais de Emilia-Romanha (Emilia-Romagna). Escolheuse esta localidade porque (1) nos últimos 15 anos, Emilia-Romanha apresentou um desempenho econômico muito melhor que o de outras regiões da Itália e se mostrou mais resiliente à crise; (2) a estrutural industrial desenvolvida na localidade, e que é base para o seu desempenho econômico, pode também ser encontrada em outras partes da Itália; (3) na localidade, quase todas as autoridades locais são controladas pelo partido comunista, comumente em aliança com o partido socialista. O desempenho econômico superior da Emilia-Romanha A taxa de participação da força de trabalho na Emilia-Romanha alcançou 46%, em 1980, 6% maior do que a média nacional. A taxa de desemprego é, em geral, menor, do que resto do país. A renda salarial na Emilia-Romanha é maior que no resto da Itália e a participação da localidade no total de exportações italianas é, a cada ano, maior. As características da Emilia As diferenças mais significantes se relacionam à estrutura industrial da região, em particular o tamanho da distribuição das firmas. Todas as pequenas firmas, normalmente com menos do que 10 empregados, são frequentemente agrupadas em relativamente pequenas zonas de acordo com sua produção, e dão origem a áreas de monoculturas em que todas as firmas apresentam um grau muito pequeno de integração vertical e o processo de produção é realizado por meio da colaboração de inúmeras firmas. Apenas uma pequena proporção de empresas entrega o produto final, enquanto as outras trabalham como subcontratadas, executando operações comissionadas por aquelas. Assim, a produção se torna altamente descentralizada. Os exemplos desses distritos industriais são variados como roupas e cerâmicas em Modena e Reggio. Há uma clara conexão entre a proliferação de pequenas empresas e o uso de trabalho “escravo” (não são pagas contribuições sociais, pagamentos abaixo do salário mínimo e etc.). Em Emilia-Romanha, o sistema produtivo apresenta essas características. As seções seguintes consideram variados aspectos do sistema industrial da região – estrutura industrial e relações industriais. Relações interfirmas Este estudo foca na indústria do vestuário em Modena, Reggio, Emilia e províncias adjacentes, enquanto um setor marcado por um muito baixo grau de integração vertical. Considerando as maiores indústrias, metade delas empreendem internamente apenas a preparação de Resumo feito por David Bouças ([email protected]) Disponível em: http://turismoadministracaoehospitalidade.wordpress.com 2 amostras e o empacotamento e distribuição do vestuário, enquanto a maior porção do trabalho é descentralizada (pequenas firmas desenvolvem as outras atividades). Nas províncias adjacentes, o cenário é completamente diferente. Os artesãos com acesso direto ao mercado precisam de artesãos da vizinhança ou de províncias secundárias como um baluarte para a sua própria estrutura produtiva. As fontes de descentralização São duas as fontes de descentralização da estrutura produtiva: 1. Poder do sindicato que apresenta força suficiente para proteger seus membros, exercitar um certo grau de controle sobre as condições de trabalho e, até mesmo, impor mudança na organização do trabalho; 2. Emergência de uma demanda significativa, desde meados dos anos 1960, para produtos mais variados e customizados, produzidos em pequenas séries, em vez de padronizados. Exemplificando, observa-se, nesse tempo, um maior número de versões de carros do que existia há 15 anos, mais modelos de roupas e sapatos, mobílias e refrigeradores. Apesar do crescimento na produção em escala nos anos 1950 e 1960, para certas tecnologias não há vantagem em produzir todos os componentes de um produto debaixo de um mesmo teto: se produzem pedaços similares ou diferentes, 20 tornos tem substancialmente a mesma produtividade se eles estivessem juntos ou dispersos em prédios separados. Deve-se notar que geralmente os setores em que este tipo de estrutura industrial (justaposição de operações similares) prevalece são aquelas caracterizadas por limitadas economias de integração vertical. Onde essas condições não existem, como no setor de cerâmica, a descentralização é próxima de não existente ou assume formas puramente legais. Apesar de firmas pequenas terem dificuldades em obter matéria-prima ou crédito no mesmo preço pago pelas firmas maiores que apresentam maior poder de barganha, neste contexto é extraordinário observar como esses artesãos e pequenos empreendedores da EmiliaRomanha superaram essas dificuldades, por meio da criação de associações que proporcionam serviços administrativos e coordenam negociações de crédito – além de outras questões importantes como consultorias técnicas, contáveis, marketing – estabelecendo, assim, uma base cooperativa para alcançar uma mínima economia de escala das operações. Relações industriais A primeira premissa é a de que a estrutura industrial é dividida em dois segmentos conforme tamanho: no primeiro setor, o sindicato tem duas características principais – força extrema, pois a legislação de trabalho é quase sempre respeitada e gozam de respeito entre seus membros, e há uma tradição de mobilização popular que, na prática, permitem os sindicatos a bloquear qualquer fechamento de fábrica; o sindicato é, geralmente, “razoável” nas negociações e exigências. Essas características no sindicalismo em Emilia-Romanha asseguram, via de regra, a não violência e a resolução das disputas sindicais. Portanto, mesmo que o sindicato exercite um real controle sobre as condições de trabalho nas indústrias, o empregador goza de um clima seguro que torna possível um maior grau de planejamento do volume de produção e investimento; no segundo setor, em contraste, tudo funciona Resumo feito por David Bouças ([email protected]) Disponível em: http://turismoadministracaoehospitalidade.wordpress.com 3 diferente, a exemplo de evasão de pagamentos de seguridade social, trabalhadores em situação irregular e mulheres e crianças que aceitam trabalho sazonal, temporário e precário de qualquer tipo. Os sindicatos emilianos atentam à regulação de salários, por meio de acordos coletivos com associações artesanais, que em contrapartida pressionam seus membros para regularizar as condições de trabalho de seus empregados e com relação a contratos. Mas o nível de salários é fundamentalmente determinado por três fatores: o nível de demanda para o produto; intensidade do trabalho; e finalmente o nível de habilidade. A segmentação do mercado de trabalho A possibilidade de mobilidade de um segmento do mercado de trabalho para outro, depende dos mesmos fatores que determinam os salários: habilidades, intensidade do trabalho e estado do produto e do mercado de trabalho. Mecanismos de ajuste do mercado de trabalho Existem dois mecanismos de ajuste do mercado de trabalho que são complementares em vez de alternativos. O setor de vestuário proporciona o mais claro exemplo. Nele o impacto da queda de demanda pelos produtos de uma firma em particular depende do seu nível de integração vertical: onde é alta, esta queda produzirá desemprego; onde é baixa, os trabalhadores empregados em firmas subcontratadas irão simplesmente receber seus pedidos de competidores mais bem sucedidos. Ou seja, quando o nível de integração é maior, cada firma circula sua coleção de amostras por meio dos seus próprios agentes; coletam e executam os pedidos; finalizam, empacotam e enviam o produto final. Quando o nível de integração é menor, a firma que preparou as amostras e recebe pedidos, executará os pedidos por meio de subcontratados de quem coletarão o produto final para despacho. Supõe-se que (1) nos dois casos, as firmas são suficientemente numerosas para garantir a competição; (2) a demanda total pelo vestuário é constante, então os pedidos perdidos por uma firma são assumidos por outras; (3) todas as firmas comissionadas pertencem ao segmento primário e todas as subcontratadas ao secundário; (4) os subcontratados estão dispostos a trocar facilmente a produção de um modelo para outro. Com alta integração vertical, a crise atingirá todos os trabalhadores envolvidos nas várias fases de produção, ainda que possam ser contratados por outras firmas mais bem sucedidas. Neste caso, o sistema alcançou um novo equilíbrio por meio da redistribuição de trabalhadores entre as firmas. Com baixa integração vertical, a firma em crise não emprega tecelões, cortadores, costureiros, prensadores e quem faz o acabamento; emprega apenas os que trabalham em protótipos, empacotamento e despacho. A maioria dos trabalhadores continuará a trabalhar como antes para as empresas que os subcontratavam. O equilíbrio é restaurado não tanto pela troca de força de trabalho, mas por troca nos pedidos. A assunção que se faz é a de que as firmas comissionadas pertencem ao segmento primário e as subcontratadas ao secundário (a conclusão que se tem é a de que pequenas firmas Resumo feito por David Bouças ([email protected]) Disponível em: http://turismoadministracaoehospitalidade.wordpress.com 4 independentes que trabalham em cooperação são menos afetadas por crises do que as grandes que possuem alto nível de integração vertical). O quão plausível é a hipótese de que as firmas emilianas facilmente trocam a produção de um produto por outro? Deve-se notar a variação entre a produção de componentes e a montagem, e a experiência de cada setor. Na indústria de malharias, por exemplo, aparentemente não há dificuldades em trocar modelos, nem na produção, nem na montagem; no caso de roupas femininas, a produção dos componentes é altamente flexível, enquanto a adaptação das linhas de montagem impõem alguns problemas, embora facilmente solucionados. Mas no setor de engenharia, a produção de componentes é mais flexível do que a linha de montagem. Conclusivamente, a hipótese de que é possível trocar rapidamente e facilmente a produção de produto para outro é certamente verdadeira para muitas firmas e muitas indústrias. E este fato está intimamente relacionado à capacidade das firmas emilianas de produzir em curtas séries. A solidez da estrutura industrial A capacidade do modelo Emiliano de sobreviver à competição estrangeira se sustenta em três fatores: 1. Flexibilidade da força de trabalho; 2. Alto nível técnico do maquinário empregado; 3. O tipo de estrutura industrial fomenta as habilidades e iniciativas dos seus empreendedores de maneiras variadas, a exemplo da capacidade extraordinária de oferecer uma grande variedade de produtos, muitos inovadores, que se adéquam às necessidades dos consumidores e mudam seus gostos. Um exemplo é o setor de vestuário, em que seria impossível para poucas grandes firmas produzirem uma enorme quantidade de estilos que são criados por centenas de pequenas firmas (atualmente, esta ideia é quebrada por empresas como a Zara). Por fim, a capacidade das pequenas firmas de desenvolver novos produtos e conceber novas máquinas é fortalecida tanto pela proximidade de tantos empreendedores engajados em atividades similares, quanto pela extensa colaboração entre trabalhadores habilidosos e técnicos dentro de cada firma. Isso é característico de área monoculturais, em que se elimina a ideia de que pesquisa é apenas o que os cientistas e técnicos fazem em seus laboratórios das grandes firmas, mas sim a criatividade de pessoas comuns que sabem suas próprias necessidades. É o caso da indústria da cerâmica em que não há pesquisa formal, mas o desenvolvimento por meio da colaboração de firmas de cerâmica com pequenas empresas de engenharia. Emilia: um caso interstício? A ideia de interstício se relaciona à visão de que a produção pode ser dividida em dois grupos: 1. Produção em longas séries por firmas grandes, com trabalho altamente subdividido e fortes economias de escala; 2. Produção concentrada em pequenas firmas, considerada intersticial. No primeiro grupo, os produtos são considerados tecnologicamente avançados, enquanto os do segundo, atrasados, superados. Ademais, há a assunção de que os produtos produzidos em Resumo feito por David Bouças ([email protected]) Disponível em: http://turismoadministracaoehospitalidade.wordpress.com 5 longas séries em grandes fábricas só podem ser reproduzidos com grande dificuldade em países do terceiro mundo, ao contrário do segundo tipo. Contudo, muitos bens produzidos em pequenas séries são fruto de empresas que empregam tecnologias avançadas e tem poder real de mercado. É também verdade que alguns produtos produzidos em curtas séries são vulneráveis à competição nos países de terceiro mundo. Mas, no geral, os produtos dos países subdesenvolvidos focam em mercados menos exigentes. Produtos para públicos mais exigentes podem apenas ser produzidos com dificuldade por estes países subdesenvolvidos porque dada a distância dos principais mercados consumidores, há dificuldade em prever mudanças de gosto, tendências, e também por conta do baixo nível da força de trabalho (assim, segundo o autor, as pequenas firmas emilianas tem poder de competição nos mercados mais exigentes porque tem alta qualificação de mão de obra, empregam maquinário avançado tecnologicamente, o que resulta em qualidade e variedade dos produtos). Portanto, a noção de interstícios parece fraca e de limitado valor. Agricultura A renda de muitos agricultores é equiparada a da indústria na Emilia-Romanha, ainda que existam ainda alguns camponeses pobres que equivalem a um terço de toda mão de obra da agricultura da região. A prosperidade, em geral, da agricultura apresenta três explicações principais: 1. A extrema fertilidade do solo, que não explica sozinha a prosperidade, pois há áreas ainda mais férteis na Itália; 2. A presença de cooperativas que influenciam fortemente o mercado para uma grande variedade de produtos agrícolas, eliminando os intermediários que ainda persistem em outras regiões; 3. Transformação das relações das propriedades rurais desde a guerra, em que boa parte das terras foi assumida para camponeses com grandes conhecimentos técnicos. O governo local e estadual A coleta de impostos é menor em Emilia-Romanha do que em qualquer outro lugar, assim a região contribui menos com o estado do que qualquer outra rica região do país. Por outro lado, o estado contribui menos com Emilia-Romanha, uma vez que há menos empresas públicas e semipúblicas do que em outras regiões. Outra questão importante, o governo municipal da Emilia é extraordinariamente eficiente em organizar intervenções públicas, fornecer recursos financeiros, mobilizar forças locais para suportar as demandas relacionadas ao estado. Resumos e conclusões 1. A agricultura emergiu com força por conta da reorganização das últimas duas décadas; 2. Há um setor primário com avançada tecnologia, habilidades de inovação, altos salários e considerável presença dos sindicatos. O setor industrial secundário, formado por pequenas firmas, compartilha com o setor primário sua avançada tecnologia, sua capacidade inovadora e sua habilidade de competir no mercado mundial e, pelo menos quando os negócios estão bons, pagam salários similares para a maioria da sua força de trabalho; Resumo feito por David Bouças ([email protected]) Disponível em: http://turismoadministracaoehospitalidade.wordpress.com 6 3. O governo local ajuda a elevar os salários e melhorar a qualidade de vida. O estado, por outro lado, tem um papel menor do que nas outras regiões, o que dá liberdade ao trabalhador para atuar conforme seus desejos (abrir negócio próprio, trabalhar na firma que escolher, alternar períodos de trabalho e descanso); 4. Flexibilidade e empreendedorismo produzem altas taxas de crescimento, o que aumenta a renda familiar; altas rendas permitem melhor educação e a acumulação de habilidades; 5. Em Emilia, uma harmoniosa mistura de elementos discordantes: eficientes instituições apesar da ausência de estado, e sindicatos ativos que controlam metade da força de trabalho; Referência completa BRUSCO, S. The Emilian model: productive decentralisation and social integration. Cambridge Journal of Economics, 6, 167-184, 1982. Resumo feito por David Bouças ([email protected]) Disponível em: http://turismoadministracaoehospitalidade.wordpress.com