informativo nº 374

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informativo nº 374
INFORMATIVO Nº 374
Brasília, 13 a 17 de dezembro de 2004 Nº 374
Data (páginas internas): 2 de fevereiro de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
IPI. Alíquota Zero. Não-Tributação. Creditamento - 2
Ato Conjunto e Reajuste de Remuneração
Transferência “Ex Officio” entre Instituições de Ensino e Congeneridade
Crédito-Prêmio do IPI: Delegação de Atribuições - 3
Constituição Estadual: Aplicação, Integração e Interpretação de Legislação Estadual
Extradição. Direito Intertemporal. Dupla Tipicidade. “Abolitio Criminis”. Prescrição - 2
Prerrogativa de Foro e Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca
1ª Turma
Prisão Preventiva e Garantia da Ordem Pública
Representação de Desaforamento e Intimação de Advogado
Crime Continuado - 5
Regime Inicial de Cumprimento e Crime Apenado com Detenção - 2
Prisão Preventiva e Excesso de Prazo
Prisão Preventiva: Crime Hediondo e Prisão Domiciliar
Competência de Auditoria Militar e Furto Qualificado
2ª Turma
Operação Anaconda: Trancamento de Ação Penal e Art. 288 do CP - 2
Interceptação Telefônica. Prazo. Renovação. Falsidade Ideológica. Atipicidade - 3
Crime Hediondo e Substituição de Pena Privativa de Liberdade por Restritiva de Direitos
Prisão Preventiva e Garantia da Ordem Pública - 2
Aplicação de Medida Sócio-Educativa de Internação
Roubo Qualificado e Regime de Cumprimento de Pena
Clipping do DJ
Transcrições
Extradição ativa - Incompetência do Supremo Tribunal Federal - Prerrogativa de Estados soberanos.
(Ext 955/DF)
PLENÁRIO
IPI. Alíquota Zero. Não-Tributação. Creditamento - 2
O Tribunal retomou julgamento de recurso extraordinário interposto pela União contra acórdão do
TRF da 4ª Região que dera parcial provimento a apelação em mandado de segurança para reconhecer o
direito do contribuinte do IPI de creditar o valor do tributo na utilização de insumos favorecidos pela
alíquota zero e pela não-tributação — v. Informativo 361. Após os votos dos Ministros Gilmar Mendes e
Ellen Gracie, que davam provimento ao recurso, na linha do que decidido pelo relator, pediu vista dos
autos o Min. Cezar Peluso.
RE 353657/PR, rel. Min. Marco Aurélio, 15.12.2004. (RE-353657)
Ato Conjunto e Reajuste de Remuneração
O Tribunal concedeu medida cautelar em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República
para suspender, com eficácia ex tunc, o ato Conjunto 1/2004, das Mesas do Senado Federal e da Câmara
dos Deputados, que determina a aplicação de reajuste de 15%, a partir de 1º.11.2004, sobre os estipêndios
dos servidores dessas duas Casas Legislativas e do TCU. O Pleno entendeu presentes o fumus boni iuris,
porquanto o ato normativo impugnado, por não ser lei, a princípio, viola os incisos X do art. 37, IV do art.
51 e XIII do art. 52, todos da CF, e o periculum in mora, já que o reajuste concedido seria implementado
na folha de pagamento de dezembro, onerando os cofres públicos.
ADI 3369 MC/DF, rel. Min. Carlos Velloso, 16.12.2004. (ADI-3369)
Transferência “Ex Officio” entre Instituições de Ensino e Congeneridade
O Tribunal julgou procedente, em parte, pedido de ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da
República contra o art. 1º da Lei 9.536/97 que prevê a possibilidade de efetivação de transferência ex
officio de estudantes — servidores públicos civis ou militares, ou de seus dependentes — entre
instituições vinculadas a qualquer sistema de ensino superior, quando requerida em razão de remoção ou
transferência de ofício desses servidores que acarrete mudança de seu domicílio. Não obstante considerar
consentânea com o texto constitucional a previsão normativa asseguradora do acesso a instituição de
ensino na localidade para onde é removido o servidor, entendeu-se que a possibilidade de transferência
entre instituições não congêneres permitida pela norma impugnada, especialmente a da particular para a
pública, haja vista a envergadura do ensino, a própria gratuidade e a escassez de vagas oferecidas pela
última, acabou por conferir privilégio, sem justificativa, a determinado grupo social em detrimento do
resto da sociedade, a violar os princípios da isonomia, da impessoalidade e da moralidade da
Administração Pública, da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola superior (CF,
art. 206, I) e a garantia do acesso aos níveis mais elevados do ensino (CF, art. 208, V). Por conseguinte,
assentou-se a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 9.536/97, sem redução do texto, no que se lhe
empreste o alcance de permitir a mudança, nele disciplinada, de instituição particular para pública,
encerrando a cláusula “entre instituições vinculadas a qualquer sistema de ensino” a observância da
natureza privada ou pública daquela de origem, viabilizada a matrícula na congênere, isto é, dar-se-á a
matrícula em instituição privada se assim o for a de origem e em pública se o servidor ou o dependente
for egresso de instituição pública.
ADI 3324/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 16.12.2004. (ADI-3324)
Crédito-Prêmio do IPI: Delegação de Atribuições - 3
O Tribunal concluiu julgamento de recurso extraordinário em que se discutia a constitucionalidade
do art. 1º do Decreto-lei 1.724/79, que autoriza o Ministro de Estado da Fazenda a aumentar, reduzir ou
extinguir os estímulos fiscais de que tratam os artigos 1º e 5º do Decreto-lei 491/69 — v. Informativos
356 e 367. Por maioria, negou-se provimento ao recurso e declarou-se a inconstitucionalidade do referido
artigo, no que implicou a delegação de atribuição ao Ministro de Estado da Fazenda para extinguir os
mencionados incentivos fiscais, por ofensa ao princípio da legalidade, haja vista ter-se disposto, por meio
de portaria, sobre crédito tributário, bem como ao parágrafo único do art. 6º da CF/69, que proibia a
delegação de atribuições a qualquer dos Poderes (“Salvo as exceções previstas nesta Constituição, é
vedado a qualquer dos Poderes delegar atribuições...”). Vencido o Min. Maurício Corrêa, relator, que
dava provimento ao recurso.
RE 208260/RS, rel. orig. Min. Maurício Corrêa, rel. p/ acórdão Min. Marco Aurélio, 16.12.2004. (RE208260)
Constituição Estadual: Aplicação, Integração e Interpretação de Legislação Estadual
O Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido de ação direta ajuizada pelo Governador do
Estado do Rio de Janeiro contra o art. 369 — renumerado como art. 368 pela EC 4/91 — da Constituição
fluminense (“Na aplicação, integração e interpretação das leis, decretos e outros atos normativos
estaduais, ressalvada a existência de norma estadual específica, observar-se-ão os princípios vigentes
quanto às da Constituição e das leis federais.”). Afastou-se, inicialmente, a alegação de prejudicialidade
suscitada pela Advocacia-Geral da União em decorrência da renumeração do artigo impugnado, já que
promovido o devido aditamento da inicial. Quanto ao mérito, entendeu-se que o dispositivo em questão
não inova a ordem jurídica, de modo a usurpar a competência legislativa da União, isto é, não dispõe
sobre a interpretação e integração de leis, decretos e outros atos normativos de forma diversa da prevista
na Lei de Introdução ao Código Civil, razão por que não afronta nem o pacto federativo nem a
independência e harmonia entre os Poderes. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto que
declaravam a inconstitucionalidade da referida norma.
ADI 246/RJ, rel. Min. Eros Grau, 16.12.2004. (ADI-246)
Extradição. Direito Intertemporal. Dupla Tipicidade. “Abolitio Criminis”. Prescrição - 2
O Tribunal retomou julgamento de pedido de extradição formulado pelo Governo do Paraguai para
entrega de nacional paraguaio processado, nesse país, pela prática dos crimes de estafa e estafa al estado,
previstos, respectivamente, nos artigos 396 e 397, do Código Penal Paraguaio de 1914 — v. Informativo
366. O Min. Cezar Peluso, em voto-vista, indeferiu a extradição por entender que o pedido não atende ao
requisito da precisa indicação dos fatos imputados ao extraditando na forma exigida pelo art. 2º do
Tratado de Extradição entre os Governos do Brasil e do Paraguai e pelo art. 80 do Estatuto do
Estrangeiro, o que impede a verificação da existência da dupla tipicidade, bem como da ocorrência ou não
da prescrição. Em seguida, o Min. Carlos Britto, relator, pediu vista dos autos para melhor exame. O
Tribunal, por maioria, ainda indeferiu questão de ordem suscitada no sentido de conceder prisão
domiciliar ao extraditando. Vencidos, nesse ponto, os Ministros Marco Aurélio, suscitante, e Gilmar
Mendes.
Ext 925/República do Paraguai, rel. Min. Carlos Britto, 17.12.2004. (Ext-925)
Prerrogativa de Foro e Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca
O Tribunal, por maioria, resolveu questão de ordem em inquérito instaurado contra o Secretário
Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República no sentido de declarar a incompetência do
STF para julgar o feito. Na espécie, o querelado fora denunciado pela suposta prática de crimes contra a
honra, previstos na Lei de Imprensa, que teriam ocorrido quando exercia o cargo de Prefeito de ChapecóSC. Entendeu-se que o Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca, por não ser Ministro de Estado, não
possui a prerrogativa de foro estabelecida no parágrafo único do art. 25, da Lei 10.683/2003, com a
redação dada pela Lei 10.869/2004, e que a extensão de prerrogativas, garantias, vantagens e direitos
equivalentes aos Ministros de Estado a que alude o §1º do art. 38 da referida Lei repercute somente nas
esferas administrativa, financeira e protocolar, mas não na estritamente constitucional. Vencido o Min.
Joaquim Barbosa que declarava a competência desta Corte (Lei 10.683/2003: “Art. 25... Parágrafo único.
São Ministros de Estado os titulares dos Ministérios, o Chefe da Casa Civil, o Chefe do Gabinete de
Segurança Institucional, o Chefe da Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica, o
Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, o Chefe da Secretaria de Coordenação Política
e Assuntos Institucionais da Presidência da República, o Advogado-Geral da União, o Ministro de
Estado do Controle e da Transparência e o Presidente do Banco Central do Brasil ... Art. 38. São criados
os cargos de natureza especial de Secretário Especial do Conselho de Desenvolvimento Econômico e
Social, de Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca, de Secretário Especial dos Direitos Humanos e de
Secretário Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. § 1o Os cargos referidos
no caput terão prerrogativas, garantias, vantagens e direitos equivalentes aos de Ministro de Estado.”).
Inq 2044 QO/SC, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 17.12.2004. (Inq-2044)
PRIMEIRA TURMA
Prisão Preventiva e Garantia da Ordem Pública
Ressaltando a excepcionalidade do caso concreto, a Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus
impetrado em favor de denunciado, juntamente com terceiros, pela suposta prática do crime de homicídio
qualificado de líder ruralista de região conhecida por graves conflitos fundiários. Pretendia-se, na espécie,
a revogação da prisão preventiva decretada na fase inquisitiva e mantida após a instauração da ação penal,
sob a alegação de ausência de fundamentação idônea. Entendeu-se que a prisão do paciente deveria
subsistir com fundamento exclusivo na garantia da ordem pública, tendo em conta a notícia de ameaça a
testemunhas, não obstante a falta de vinculação a réu específico, bem como o temor dessas e a
insegurança na localidade em que o crime fora cometido. Ressaltou-se, ainda, que a necessidade da prisão
ficaria mais evidente em razão de o decreto mencionar outros elementos agravadores da situação,
consistentes na dificuldade de acesso à região e na falta de apoio do Estado, somando-se a isso o reduzido
contigente policial na comunidade. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ por não vislumbrar
que a citada ameaça pudesse ser concretamente atribuída ao paciente.
HC 84680/PA, rel. Min. Carlos Britto, 14.12.2004. (HC-84680)
Representação de Desaforamento e Intimação de Advogado
A Turma deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que entendera não ser obrigatória
a intimação do paciente e de seu advogado da decisão deferitória de pedido de desaforamento formulado
pelo juízo, e, ainda, que a inobservância dessa formalidade não implicaria ofensa aos princípios do
contraditório e da ampla defesa. Asseverou-se que, embora o regimento interno do tribunal de justiça
local adotasse para o julgamento de representação de desaforamento o rito do habeas corpus, dispensando
a sua publicação em pauta, de igual modo não se poderia concluir no sentido de que apenas o paciente, e
não seu defensor, como ocorrera na espécie, devesse ter sido intimado para responder à representação, de
cujo envio ao Tribunal o advogado sequer fora notificado. Writ deferido para cassar o acórdão do tribunal
de justiça, a fim de que, após a prévia notificação do advogado do paciente para responder à
representação, outro seja proferido conforme entender de direito.
HC 85052/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.12.2004. (HC-85052)
Crime Continuado - 5
A Turma retomou julgamento de habeas corpus impetrado em favor de diretor-superintendente de
um grupo de empresas, no qual se pretende a reunião de dezesseis ações penais contra ele instauradas —
v. Informativos 334, 344, 349 e 355. O Min. Cezar Peluso, em voto-vista, concedeu a ordem, de ofício,
para determinar a suspensão dos processos e da prescrição penal, enquanto as pessoas jurídicas
relacionadas ao agente estiverem incluídas no REFIS, por entender, na linha do que decidido no HC
81929/RJ (DJU de 27.2.2004), que a Lei 10.684/2003 possui retroatividade por ser mais benéfica que a
existente ao tempo da impetração (Lei 9.249/95) — a qual previa a extinção da punibilidade quando o
pagamento fosse realizado até o recebimento da denúncia. O Min. Sepúlveda Pertence, relator, reafirmou
o voto proferido na questão de ordem anteriormente suscitada. Após, o julgamento foi adiado em virtude
de novo pedido de vista do Min. Cezar Peluso.
HC 81134/RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.12.2004. (HC-81134)
Regime Inicial de Cumprimento e Crime Apenado com Detenção - 2
A Turma concluiu julgamento de habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática, em
concurso material, dos crimes de porte ilegal de arma e de disparo de arma de fogo em local habitado (Lei
9.437/97, art. 10, caput e §1º, III, respectivamente), a dois anos de detenção e ao pagamento de multa,
sendo a pena privativa de liberdade fixada em regime inicial fechado, ao fundamento de ser incompatível
a sua substituição, já que o paciente encontrava-se preso provisoriamente por outro fato — v. Informativo
372. Deferiu-se o writ para determinar que a pena privativa de liberdade seja cumprida em regime aberto,
haja vista o fato de o juiz haver reconhecido os bons antecedentes do paciente e as circunstâncias judiciais
favoráveis, e, de oficio, anulou-se a sentença para afastar a condenação por disparo de arma de fogo,
reduzindo-se, em conseqüência, a pena para um ano de detenção e pagamento de multa, substituindo-a
por pena restritiva de direito de prestação de serviços à comunidade ou à entidade pública. Entendeu-se
que a sentença seria nula no capítulo em que condenara o paciente no tipo previsto no art. 10, §1º, III, da
citada Lei, porquanto caracterizaria provimento judicial ultra petita, dado que a denúncia descrevera o
disparo de arma de fogo como mero acidente, ou seja, fruto de movimento corpóreo involuntário e
indesejado pelo paciente e que, não havendo previsão expressa no ordenamento jurídico de modalidade
culposa, a conduta do acusado seria atípica. Asseverou-se, ainda, que, em se tratando de mutatio libelli, o
disposto no art. 384 do CPP deveria ter sido observado, embora o feito estivesse sob a competência de
juizado especial criminal, por força do que estabelece o art. 92 da Lei 9.099/95 (“Aplicam-se,
subsidiariamente as disposições dos Códigos Penal e de Processo Penal, no que não forem incompatíveis
com esta Lei.”). Salientou-se, por fim, a inaplicabilidade da suspensão condicional da pena, na espécie,
por ser mais prejudicial ao réu, tendo em conta o período mínimo de prova ser de dois anos (CP, art. 77,
caput). O Min. Carlos Britto, relator, retificou seu voto e aderiu aos fundamentos do voto do Min. Cezar
Peluso.
HC 85043/MS, rel. Min. Carlos Britto, 14.12.2004. (HC-85043)
Prisão Preventiva e Excesso de Prazo
Por excesso de prazo, a Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de acusado pela suposta
prática do crime de homicídio, juntamente com terceiros, cuja prisão preventiva ultrapassava mais de um
ano, sem que tivesse sido prolatada sentença. Entendeu-se que a superação do prazo, que não poderia ser
atribuída ao paciente — o qual se encontrava preso por mais de 100 dias mesmo antes de iniciada a
instrução criminal —, ultrapassava os limites dos juízos de razoabilidade. Considerou-se que o atraso se
dera, inclusive, em decorrência da greve do Poder Judiciário paulista, que resultara no adiamento de
audiência por impossibilidade de condução do paciente, e, ainda, do adiamento de outras duas audiências
por período superior a dois meses: uma pelo não comparecimento de testemunha arrolada pelo parquet e
outra em razão de problemas que teriam impedido a escolta de um dos co-réus.
HC 84907/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.12.2004. (HC-84907)
Excesso de Prazo: Crime Hediondo e Prisão Domiciliar
Também por excesso de prazo, a Turma, resolvendo questão de ordem, deferiu liminar em habeas
corpus impetrado em favor de condenado pela prática do crime de tráfico de entorpecentes (Lei 6.368/76,
art. 12), para permitir que o paciente aguarde o julgamento de seu recurso de apelação em regime de
prisão domiciliar, se por outro motivo não estiver preso. Na espécie, restaria um mês para o cumprimento
integral da pena de três anos imposta ao paciente, preso em flagrante, cuja apelação fora interposta e
ainda não remetida ao órgão de segunda instância competente para apreciar o caso. Salientou-se,
inicialmente, que seria prematuro o julgamento do mérito da impetração, porquanto não houvera
manifestação da Procuradoria-Geral da República nos autos. Ponderou-se, no entanto, que o réu se
encontrava na iminência de cumprir, definitivamente, em sede de prisão cautelar, a integralidade da
sanção que a ele fora imposta, sem que lhe tivesse sido oportunizada a revisão de sua reprimenda em sede
de apelação. Asseverou-se a existência de pronunciamento do Ministério Público no sentido da
absolvição do réu, o que tornaria temerária a sua custódia cautelar. Por fim, ressaltou-se que se o paciente
estivesse em fase de execução da reprimenda, já estaria usufruindo do regime aberto de cumprimento de
pena, não obstante tratar-se de crime hediondo, tendo em conta o posicionamento da Corte no sentido de
conferir liminar enquanto pendente o julgamento do HC 82959/SP em que se discute a
constitucionalidade do §1º do art. 2º da Lei 8.072/90. Determinou-se que seja oficiado o Presidente do
Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, transmitindo-lhe cópia da decisão, e ordenando-lhe
o julgamento imediato da apelação interposta e a remessa, ao STF, da cópia do respectivo acórdão.
Precedentes citados: HC 84122 QO/SP (DJU de 27.8.2004); HC 84734 MC/SP (DJU de 24.11.2004) e
AC 504/SP (DJU de 24.11.2004).
HC 84539 QO/SP, rel. Min. Carlos Britto, 16.12.2004. (HC-84539)
Competência de Auditoria Militar e Furto Qualificado
A Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em habeas corpus interposto pelo Ministério
Público Federal em favor de militares acusados da suposta prática do crime de furto qualificado,
consistente na subtração, mediante arrombamento, de objetos de banca de jornal, cuja ação penal fora
instaurada perante vara de auditoria militar. No caso concreto, a competência da auditoria militar fora
fixada em razão de o STF haver declarado a constitucionalidade do art. 94 da LC 94/93, do Estado de
Rondônia, que dispõe sobre a competência da auditoria militar para processar crimes genéricos, em face
do art. 125, §4º, da CF (ADI 1218/RO, DJU de 8.11.2002). O Min. Marco Aurélio, relator, deu
provimento ao recurso para declarar a competência do Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal de Porto
Velho, no que foi acompanhado pelos Ministros Eros Grau, Carlos Britto e Cezar Peluso. Inicialmente,
conheceu do recurso, ressaltando a jurisprudência sedimentada do STF no sentido de o habeas corpus
poder ser ajuizado pelo Ministério Público. No mérito, tendo em conta os termos da denúncia, asseverou
que deve ser dado alcance consentâneo com a Constituição à nomenclatura do órgão investido do ofício
judicante. Assim, conforme consignado no julgamento da mencionada ADI, a referência ao
processamento de feitos criminais genéricos, contida no art. 94, IX, da referida LC, não abrangeria a
competência da vara de auditoria militar, como juízo natural, para o julgamento de crimes comuns. Após,
pediu vista dos autos o Min. Sepúlveda Pertence.
RHC 85025/RO, rel. Min. Marco Aurélio, 16.12.2004. (RHC-85025)
SEGUNDA TURMA
Operação Anaconda: Trancamento de Ação Penal e Art. 288 do CP - 2
A Turma concluiu julgamento de habeas corpus impetrado em favor de juiz federal denunciado
com terceiros, com base em investigações procedidas na denominada “Operação Anaconda”, pela suposta
prática do crime de formação de quadrilha (CP, art. 288). Sustentava-se, na espécie, o trancamento da
ação penal sob as seguintes alegações: a) ocorrência de violação das normas de processo; b) ausência de
justa causa para a propositura da ação penal, em razão da inépcia da denúncia, bem como da inexistência
de participação em quadrilha e da não descrição da elementar “estabilidade”; c) existência de omissões na
denúncia e d) constrangimento ilegal ocasionado pelo acórdão do STJ que recebera a denúncia — v.
Informativo 373. Por maioria, deferiu-se o habeas corpus, por se reconhecer a inépcia da denúncia
oferecida contra o ora paciente, determinando-se, em conseqüência, quanto a ele, a extinção do processo
penal em que oferecida. Considerou-se a denúncia vaga e indeterminada, a afrontar a proteção judicial
efetiva e o princípio da dignidade humana. Ressaltou-se que, se não fosse a discussão que tramita em
outro processo, não se teria menção alguma com relação à participação do paciente. Vencido o Min.
Joaquim Barbosa, relator, que indeferia o writ. Retificou seu voto a Min. Ellen Gracie.
HC 84409/SP, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, 14.12.2004. (HC84409)
Interceptação Telefônica. Prazo. Renovação. Falsidade Ideológica. Atipicidade - 3
A Turma concluiu julgamento de habeas corpus impetrado em favor de magistrado, denunciado,
com base em investigações procedidas na denominada “Operação Anaconda”, pela suposta prática dos
crimes de falsidade ideológica (CP, art. 299) e interceptação telefônica ilegal (Lei 9.296/96, art. 10).
Sustentava a impetração a atipicidade das condutas imputadas ao paciente e a nulidade das interceptações
telefônicas que deram sustentação à denúncia, haja vista o excesso de prazo em sua renovação — v.
Informativos 367 e 373. Por inépcia da denúncia, a Turma deferiu o writ, para afastar o crime de falsidade
ideológica, extinguindo, quanto a este, o processo penal instaurado contra o paciente, tendo em conta não
restar especificado o fato juridicamente relevante, resultante da suposta falsidade. No que se refere ao
exame da aptidão formal da denúncia quanto ao delito de interceptação telefônica, a Turma, por maioria,
deferiu o habeas corpus, para, também quanto a esse crime, extinguir a ação penal, por considerá-la
inepta, uma vez que não fora demonstrada, na descrição dos fatos, a configuração dos elementos do tipo,
a caracterizar quaisquer condutas, seja na forma tentada, seja na consumada, do art. 10 da Lei 9.296/96,
limitando-se a peça acusatória a transcrever as conversas telefônicas, sem a observância dos requisitos à
persecução penal. Vencidos, nesse ponto, os Ministros Joaquim Barbosa, relator, e Ellen Gracie, que o
denegavam.
HC 84388/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 14.12.2004. (HC-84388)
Crime Hediondo e Substituição de Pena Privativa de Liberdade por Restritiva de Direitos
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia a substituição da pena privativa
de liberdade imposta aos pacientes, condenados por tráfico ilícito de entorpecentes, sob alegação de
estarem presentes os requisitos previstos no art. 44 do CP. Entendeu-se incabível a substituição de pena
privativa de liberdade por restritiva de direito — trazida ao CP pela Lei 9.714/98 — aos crimes elencados
ou equiparados a hediondo, tendo em vista a vedação de progressão do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90,
hipótese em que deve ser estabelecido o regime integralmente fechado para o cumprimento da pena.
Vencido o Min. Gilmar Mendes, relator, que deferia o writ por considerar aplicável à espécie a Lei
9.714/98.
HC 84422/RS, rel. orig. Min. Gilmar Mendes, rel. p/ acórdão Min. Joaquim Barbosa, 14.12.2004. (HC84422)
Prisão Preventiva e Garantia da Ordem Pública - 2
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia, sob alegação de insubsistência
dos requisitos autorizadores da custódia cautelar, a revogação da prisão preventiva decretada contra
denunciada como suposta mandante de crime de homicídio qualificado praticado contra o cônjuge — v.
Informativo 373. Considerou-se que os fundamentos da conveniência da instrução criminal e da garantia
de aplicação da lei penal não se sustentariam, porquanto a negativa de imputação feita pela paciente não
induziria à conclusão de que ela coagiria testemunhas, e, ainda, porque o decreto de prisão teria tratado de
forma genérica a questão relativa à ausência de atividade profissional dos co-réus, deixando de observar
que a paciente possui residência fixa e exercia comércio. Entendeu-se, todavia, que subsistiria o
fundamento da garantia da ordem pública, uma vez que o crime fora de enorme repercussão em
comunidade interiorana, além de restarem demonstradas a periculosidade da paciente e a possibilidade de
continuar a praticar atividades criminosas, fatores suficientes para a manutenção da custódia cautelar.
Vencidos os Ministros Ellen Gracie e Celso de Mello que deferiam a ordem por não vislumbrar o risco à
ordem pública, haja vista ser a denunciada primária, ter bons antecedentes, possuir atividade lícita,
domicílio certo, haver praticado delito único e não ser criminosa habitual.
HC 84498/BA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 14.12.2004. (HC-84498)
Aplicação de Medida Sócio-Educativa de Internação
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se pretende a revogação de decisão que
aplicara a adolescente medida sócio-educativa de internação, por prazo indeterminado, pela realização de
ato infracional equiparado ao delito de seqüestro. Alega-se, na espécie, ausência de motivação na
imposição de medida sócio-educativa mais gravosa, em violação ao previsto nos arts. 227, caput, da CF, e
18 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Lei 8.069/90). Sustenta-se, também, a ofensa ao
direito de proteção especial do adolescente, consubstanciado nos princípios constitucionais da
excepcionalidade de qualquer medida privativa de liberdade e do respeito à condição especial de pessoa
em desenvolvimento (CF, art. 227, § 3º e ECA, art. 121). No caso concreto, o adolescente fora
representado pela prática das condutas tipificadas nos arts. 157, § 2º, I e II, e 148 c/c art. 29, todos do CP,
por haver, em concurso e unidade de desígnios, assaltado, utilizando-se de arma de fogo, e mantido a
vítima em cárcere privado. A sentença de 1º grau, reformada, julgara improcedente a representação ao
fundamento de que o menor agira mediante coação. A Min. Ellen Gracie, relatora, indeferiu o writ.
Inicialmente, ressaltou que, tendo sido a representação julgada procedente no que concerne ao ato
infracional correspondente ao seqüestro, incide, em tese, o disposto no art. 122, I, do ECA (“Art. 122. A
medida de internação só poderá ser aplicada quando: I - tratar-se de ato infracional cometido mediante
grave ameaça ou violência a pessoa”). Entendeu que o acórdão proferido pelo tribunal de justiça estadual
fundamentara suficientemente a imposição da medida, porquanto ficara comprovado não tratar o caso de
coação irresistível, tal como alegado pelo paciente em juízo, tendo em conta as afirmações feitas à técnica
em entrevista na qual dissera que sua atuação fora espontânea no episódio, e ainda, em razão de a vítima
ter declarado que o paciente vigiara o cativeiro por quase uma hora, sem que ali estivesse outra pessoa.
Ademais, a gravidade do fato justificaria a internação porque o paciente revelara inaptidão para conviver
em sociedade. Salientou, por fim, que juízo diverso acerca da adequação da medida sócio-educativa
aplicada, implicaria, necessariamente, o exame de fatos e provas, inviável em habeas corpus. Após, pediu
vista o Min. Joaquim Barbosa.
HC 85148/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 14.12.2004. (HC-85148)
Roubo Qualificado e Regime de Cumprimento de Pena
A Turma, por maioria, indeferiu pedido de habeas corpus impetrado em favor de condenado, por
roubo qualificado, a cumprimento de pena inicialmente no regime fechado. O impetrante alegava que a
condenação se dera com fundamento apenas na gravidade em abstrato do delito, sem que houvesse
motivação concreta para a imposição do regime fechado. Entendeu-se que, ao deferir o writ, ocorreria
abrandamento excessivo no cumprimento da pena, a estimular no criminoso, que faz do crime de roubo
um meio habitual de vida, o sentimento de impunidade. Ademais, ressaltou-se que o paciente fará jus à
progressão de regime com o cumprimento de 1/6 da pena, o que equivaleria, no caso concreto, a
aproximadamente 10 meses em regime fechado, haja vista que lhe fora aplicada a pena de 5 anos e 4
meses. Vencido o Min. Joaquim Barbosa, relator, que, por considerar inexistente qualquer outro
fundamento para embasar o regime mais severo, aplicava os Enunciados das Súmulas 718 (“A opinião do
julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para imposição de
regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada”) e 719 (“A imposição do regime de
cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea”) do STF.
HC 84974/SP, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, 14.12.2004. (HC84974)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias Extraordinárias
15.12.2004 16 e 17.12.2004
14.12.2004
16.12.2004
14.12.2004
——
Julgamentos
19
277
235
CLIPPING
DO
DJ
17 de dezembro de 2004
Inq N. 2.033-DF
RELATOR: MIN. NELSON JOBIM
EMENTA: INQUÉRITO. CRIME DE ASSÉDIO SEXUAL. RECEBIMENTO DE QUEIXA-CRIME. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS DE PROVA. QUEIXA-CRIME REJEITADA.
Para o recebimento de queixa-crime é necessário que as alegações estejam minimamente embasadas em provas ou, ao menos, em
indícios de efetiva ocorrência dos fatos. Posição doutrinária e jurisprudencial majoritária. Não basta que a queixa-crime se limite a
narrar fatos e circunstâncias criminosas que são atribuídas pela querelante ao querelado, sob o risco de se admitir a instauração de
ação penal temerária, em desrespeito às regras do indiciamento e ao princípio da presunção de inocência. Queixa-crime rejeitada.
* noticiado no Informativo 352
HC N. 84.253-RO
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: HABEAS CORPUS - PROCEDIMENTO PENAL - RECONHECIMENTO DE QUE SE CONSUMOU, NA
ESPÉCIE, A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO - PEDIDO, NESSE SENTIDO, FORMULADO PELO
PRÓPRIO MINISTÉRIO PÚBLICO - IMPOSSIBILIDADE DE O “PARQUET”, POR INTERMÉDIO DE NOVO REPRESENTANTE E MEDIANTE REINTERPRETAÇÃO E NOVA QUALIFICAÇÃO DOS MESMOS FATOS, CHEGAR A
CONCLUSÃO DIVERSA DAQUELA QUE MOTIVOU O SEU ANTERIOR PEDIDO DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE SITUAÇÃO QUE IMPEDE O PROSSEGUIMENTO DA PERSECUÇÃO PENAL - PEDIDO DEFERIDO.
- O arquivamento judicial do inquérito ou das peças que consubstanciam a “notitia criminis”, quando requerido pelo Ministério
Público, por ausência ou insuficiência de elementos informativos, não afasta a possibilidade de aplicação do que dispõe o art. 18
do CPP, hipótese em que, havendo notícia de provas substancialmente novas (Súmula 524/STF - RTJ 91/831), legitimar-se-á a
reabertura das investigações penais (RTJ 106/1108 - RTJ 134/720 - RT 570/429 - Inq 1.947/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO,
v.g.).
- Inexistirá, contudo, essa possibilidade, se o Poder Judiciário, ao reconhecer consumada a prescrição penal, houver declarado
extinta a punibilidade do indiciado/denunciado, pois, em tal caso, esse ato decisório revestir-se-á da autoridade da coisa julgada em
sentido material, inviabilizando, em conseqüência, o ulterior ajuizamento (ou prosseguimento) de ação penal contra aquele já
beneficiado por tal decisão, ainda que o Ministério Público, agindo por intermédio de novo representante e mediante
reinterpretação e nova qualificação dos mesmos fatos, chegue a conclusão diversa daquela que motivou o seu anterior pleito de
extinção da punibilidade. Precedentes.
Acórdãos Publicados: 406
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais
aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham
despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Extradição ativa - Incompetência do Supremo Tribunal Federal - Prerrogativa de Estados soberanos.
(Transcrições)
Ext 955/DF*
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
EMENTA: EXTRADIÇÃO ATIVA. FALTA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL. PEDIDO FORMULADO POR PESSOA FÍSICA. INADMISSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE
LEGITIMIDADE ATIVA. PRERROGATIVA QUE APENAS ASSISTE A ESTADOS ESTRANGEIROS.
EXTRADIÇÃO NÃO CONHECIDA.
- O Supremo Tribunal Federal, no sistema constitucional brasileiro, somente dispõe de competência originária para
processar e julgar as extradições passivas, requeridas, ao Governo do Brasil, por Estados estrangeiros. Não
compete à Suprema Corte apreciar, nem julgar da legalidade de extradições ativas, pois estas deverão ser requeridas,
diretamente, pelo Estado brasileiro, aos Governos estrangeiros, em cujo território esteja a pessoa reclamada pelas
autoridades nacionais.
- Os pedidos de extradição, por envolverem uma relação de caráter necessariamente intergovernamental, somente
podem ser formulados por Estados soberanos, falecendo legitimação, para tanto, a meros particulares. Doutrina.
Precedentes.
DECISÃO: Trata-se de pedido de extradição (fls. 02/05), “com antecipação de tutela”, formulado por brasileiro que pretende,
por este meio processual, obter o reconhecimento de que lhe assiste o direito de cumprir, no Brasil, a pena de prisão que lhe foi
imposta, pela prática de dois (02) crimes de roubo, pela Justiça da República Portuguesa (fls. 14/22).
O autor da presente ação de extradição invoca, como fundamento jurídico de sua postulação, o Tratado que a República
Federativa do Brasil e a República Portuguesa celebraram, em Brasília, em 05/09/2001, visando a disciplinar, entre essas Altas
Partes Contratantes, a “Transferência de Pessoas Condenadas”, em ordem a possibilitar “a transferência de uma pessoa
condenada no território de uma delas para o território da outra, para nele cumprir ou continuar a cumprir uma condenação que
lhe foi imposta por sentença transitada em julgado” (Artigo 2º, nº 1).
O pedido ora formulado, tal como deduzido, consubstancia verdadeiro pleito de extradição ativa, revelando-se estranho,
por isso mesmo, à competência originária do Supremo Tribunal Federal, cujas atribuições jurisdicionais, em tema extradicional,
restringem-se, unicamente, aos pedidos de extradição passiva, vale dizer, às postulações extradicionais submetidas, por Estados
estrangeiros, à apreciação do Governo do Brasil.
Isso significa, portanto, que o pleito ora em exame refoge, por completo, à competência originária desta Corte, cuja
disciplina - por derivar de matriz eminentemente constitucional – não pode estender-se a situações estranhas ao rol exaustivo
inscrito no art. 102, I, da Carta Política (RTJ 39/56-59 – RTJ 43/129 – RTJ 44/563 – RTJ 50/72 – RTJ 53/776 – RTJ 159/28 –
RTJ 171/101, v.g.).
Mais do que isso, cumpre advertir que apenas Estados estrangeiros dispõem de legitimidade ativa para deduzir, perante o
Supremo Tribunal Federal, pedidos de extradição passiva (RTJ 99/1003 – Ext 313/Argentina, Rel. Min. LUIZ GALLOTTI),
tendo em vista a norma consubstanciada no art. 102, I, “g”, da Constituição da República:
“Extradição. Pressuposto. Competência.
1. É pressuposto essencial da extradição que seja ela requerida por Governo de país estrangeiro.
2. Pedido não conhecido, visto que formulado por autoridade judiciária estrangeira.”
(RTJ 64/22, Rel. Min. BILAC PINTO - grifei)
“Extradição: inadmissibilidade da formulação do pedido por carta rogatória de juiz estrangeiro, suprida, porém,
em diligência, por manifestação da representação diplomática do Estado de origem: HC por ausência do pedido que se
julga prejudicado.
1. O processo de extradição passiva só se instaura mediante pedido de governo do Estado estrangeiro. (...).”
(RTJ 184/674, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Pleno - grifei)
Não custa ressaltar, neste ponto, na linha da diretriz jurisprudencial firmada por esta Corte, que o processo de extradição
faz instaurar uma relação de caráter necessariamente intergovernamental, o que afasta a possibilidade de terceiros (como os
particulares em geral), desvestidos de estatalidade, formularem pleitos de natureza extradicional.
Esse entendimento – não constitui demasia enfatizar – reflete-se no magistério de autorizados doutrinadores, como resulta
claro das lições de CAROLINA CARDOSO GUIMARÃES LISBOA (“A Relação Extradicional no Direito Brasileiro”, p.
130/131, item n. 2.2.1, 2001, Del Rey), de ALEXANDRE DE MORAES (“Constituição do Brasil Interpretada”, p. 347, item n.
5.91, 2ª ed., 2003, Atlas), de UADI LAMMÊGO BULOS (“Constituição Federal Anotada”, p. 271, 5ª ed., 2003, Saraiva), de
GILDA MACIEL CORRÊA MEYER RUSSOMANO (“A Extradição no Direito Internacional e no Direito Brasileiro”, p. 136,
item n. 4, 3ª ed., 1981, RT) e de YUSSEF SAID CAHALI (“Estatuto do Estrangeiro”, p. 363, item n. 27, 1983, Saraiva), dentre
outros.
Cabe acentuar que o pleito ora deduzido por André Luiz Beltramin Guardia, embora impropriamente formulado por meio
processual inadequado, poderá constituir objeto de apreciação das autoridades competentes, observado o contexto delineado pelo
referido Tratado luso-brasileiro de “Transferência de Pessoas Condenadas”, tão logo essa convenção bilateral complete o ciclo de
sua incorporação ao plano do direito positivo interno brasileiro (RTJ 58/70 – RTJ 174/463-465 – RTJ 179/493-496), eis que – até
o presente momento – o tratado internacional em questão, apesar de celebrado em 2001, não foi, até agora, aprovado, em caráter
definitivo, pelo Congresso Nacional (CF, art. 49, I), o que impede que se pratiquem os atos subseqüentes: a ratificação
presidencial, de um lado, e a ulterior promulgação executiva, por decreto governamental, de outro.
Vê-se, portanto, que, enquanto não se formalizar, em caráter definitivo, a recepção, por nosso ordenamento positivo
interno, da mencionada convenção bilateral, esta não poderá ser aplicada, no plano doméstico, pelas autoridades nacionais
brasileiras.
É que o sistema constitucional brasileiro não consagrou o efeito direto nem acolheu o postulado da aplicabilidade imediata
dos tratados ou convenções internacionais.
Impende referir, neste ponto, observação que o Supremo Tribunal Federal fez no exame desse específico aspecto
concernente ao procedimento de transposição formal, para a ordem jurídica doméstica, dos tratados, acordos, protocolos e
convenções celebrados, pelo Brasil, no plano internacional:
“- A Constituição brasileira não consagrou, em tema de convenções internacionais ou de tratados de integração,
nem o princípio do efeito direto, nem o postulado da aplicabilidade imediata.
Isso significa, de jure constituto, que, enquanto não se concluir o ciclo de sua transposição, para o direito interno,
os tratados internacionais e os acordos de integração, além de não poderem ser invocados, desde logo, pelos particulares,
no que se refere aos direitos e obrigações neles fundados (princípio do efeito direto), também não poderão ser aplicados,
imediatamente, no âmbito doméstico do Estado brasileiro (postulado da aplicabilidade imediata).
- O princípio do efeito direto (aptidão de a norma internacional repercutir, desde logo, em matéria de direitos e
obrigações, na esfera jurídica dos particulares) e o postulado da aplicabilidade imediata (que diz respeito à vigência
automática da norma internacional na ordem jurídica interna) traduzem diretrizes que não se acham consagradas, nem
positivadas no texto da Constituição da República, motivo pelo qual tais princípios não podem ser invocados para legitimar
a incidência, no plano do ordenamento doméstico brasileiro, de qualquer convenção internacional, ainda que se cuide de
tratado de integração, enquanto não se concluírem os diversos ciclos que compõem o seu processo de incorporação ao
sistema de direito interno do Brasil. Magistério da doutrina. (...).”
(RTJ 174/463-465, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
Registre-se, finalmente, que o tratado em questão ainda tramita perante a Câmara dos Deputados, sob a forma de Projeto de
Decreto Legislativo (PDL nº 123/2003).
Em suma: a transferência demandada pelo ora requerente – uma vez concluído o ciclo de integração do tratado em
referência (aprovação congressual + ratificação presidencial + promulgação executiva + publicação oficial) - deverá ser pleiteada,
diretamente, pelo próprio interessado, perante a República Portuguesa (Artigo 4º), em petição dirigida à Procuradoria-Geral da
República daquele Estado, designada, por Portugal, como autoridade central para efeito de exame do pedido em causa (Artigo 5º).
Sendo assim, pelas razões expostas, e considerando, sobretudo, a absoluta impropriedade do meio processual ora utilizado
pelo interessado, não conheço, por incabível, deste “Pedido de Extradição com Antecipação de Tutela (...)” (fls. 02).
Arquivem-se os presentes autos.
Publique-se.
Brasília, 17 de dezembro de 2004.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
* decisão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 375
Brasília, 1º a 11 de fevereiro de 2005 Nº 375
Data (páginas internas): 16 de fevereiro de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Cumulação de Proventos de Inatividade Civil e Militar
Vinculação de Subsídios e Vencimentos
Emolumentos: Art. 98, § 2º, da CF
1ª Turma
ICMS. Importação. Sujeito Ativo - 2
Ação de Danos Morais decorrentes de Acidente do Trabalho: EC 45/2004 e Competência
2ª Turma
Prestação de Serviço de Transporte Público e Licitação - 2
Ruas de Vilas como Logradouro Público: Inconstitucionalidade
Clipping do DJ
Transcrições
Denúncia - Peculato - Governador de Estado - § 2º do Art. 327 do CP (Inq 1769/DF)
Homologação de Sentença Estrangeira - Incompetência Superveniente do STF - EC 45/2004 (SEC
5778/EUA)
PLENÁRIO
Cumulação de Proventos de Inatividade Civil e Militar
O Tribunal deferiu mandado de segurança impetrado, por militar reformado, contra ato do Ministro
Presidente da 1ª Câmara do Tribunal de Contas da União – TCU e do Coordenador-Geral de Recursos
Humanos do Departamento de Administração da Agência Brasileira de Inteligência – ABIN, que
culminara com a cessação do pagamento dos benefícios civis do impetrante. Na espécie, após sua
reforma, em 1979, o impetrante fora contratado como desenhista, sob o regime da CLT, pela Secretaria de
Assuntos Estratégicos da Presidência da República — atual ABIN, emprego de natureza técnica que fora
convertido em cargo público com a instituição do Regime Jurídico Único pela Lei 8.112/90, e no qual se
aposentara, em 1997, vindo a receber, cumulativamente, os proventos da inatividade civil e militar.
Preliminarmente, excluiu-se da legitimação passiva o segundo impetrado, haja vista tratar-se de mero
executor do ato administrativo do TCU. Afastou-se, em seguida, a alegação de decadência administrativa,
em razão de o ato de aposentadoria ser ato administrativo complexo que só se aperfeiçoa com registro
perante o TCU, sem o qual não se operam os efeitos da decadência. No mérito, na linha do que decidido
pelo Pleno no MS 24742/DF (pendente de publicação — v. Informativo 360), entendeu-se que não
haveria, no caso, óbice à acumulação dos proventos da inatividade. Ressaltando o fato de o impetrante ter
sido reformado sob a égide da CF/67, na redação dada pela EC 1/69, cujo § 9º do seu art. 93 permitia a
cumulação de proventos de inatividade dos militares da reserva e dos reformados quanto a contratos para
prestação de serviços técnicos ou especializados, e de ter sido aposentado como servidor civil em 1997,
concluiu-se que não teria ocorrido a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência
a que alude o art. 40 da CF, vedada pelo art. 11 da EC 20/98, mas a acumulação de provento civil (regime
próprio do art. 40, da CF/88) com provento militar (regime próprio do art. 42, da CF/88), situação não
abrangida pela proibição da Emenda. (EC 20/98: “Art. 11. A vedação prevista no art. 37, § 10, da
Constituição Federal, não se aplica aos membros de poder e aos inativos, servidores e militares, que, até
a publicação desta Emenda, tenham ingressado novamente no serviço público por concurso público de
provas ou de provas e títulos, e pelas demais formas previstas na Constituição Federal, sendo-lhes
proibida a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência a que se refere o art. 40
da Constituição Federal, aplicando-se-lhes, em qualquer hipótese, o limite de que trata o § 11 deste
mesmo artigo.”).
MS 25090/DF, rel. Min. Eros Grau, 2.2.2005. (MS-25090)
Vinculação de Subsídios e Vencimentos
Por ofensa ao art. 37, XIII, da CF, que veda a equiparação ou vinculação de subsídios ou
vencimentos, o Tribunal julgou procedente, em parte, pedido de ação direta ajuizada pelo Governador do
Estado de Alagoas contra a segunda parte do art. 74 da Lei Complementar 7/91, na redação dada pela Lei
Complementar 23/2002, ambas daquele Estado, para declarar a inconstitucionalidade da expressão “não
podendo os Procuradores de Estado de 4ª Classe perceber subsídio ou vencimento inferior ao atribuído
ao do cargo de Procurador-Geral” constante do mencionado artigo. (CF, art. 37: “XIII - é vedada a
vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de
pessoal do serviço público;”).
ADI 2895/AL, rel. Min. Carlos Velloso, 2.2.2005. (ADI-2895)
Emolumentos: Art. 98, § 2º, da CF
O Tribunal, por maioria, deferiu medida cautelar em ação direta ajuizada pelo Governador do
Estado de São Paulo em face da Resolução 196/2005, editada pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça
daquele Estado, para suspender a vigência do ato normativo, que elevou o percentual dos emolumentos
relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registros, destinados ao Fundo Especial de
Despesa do referido Tribunal, e alterou a forma de seu recolhimento. Entendeu-se que as objeções
formuladas pelo requerente se revestiam de plausibilidade jurídica, porquanto da interpretação do § 2º do
art. 98 da CF, introduzido pela EC 45/2004, seria difícil extrair uma norma absoluta no sentido de que a
totalidade dos emolumentos destinados ao Poder Público devesse se dirigir exclusivamente ao Poder
Judiciário e, também, porque o ato normativo em questão, a princípio, teria invadido campo reservado à
lei por dispor sobre remanejamento de verbas do Executivo para o Judiciário, sem observar, ainda, as
regras do orçamento de 2005 (CF, arts. 167, VI, e 168). Ressaltou-se o manifesto periculum in mora,
tendo em conta o imediato efeito da Resolução em serviço essencial à administração da justiça, qual seja,
a defesa da população mais necessitada pela Procuradoria de Assistência Judiciária do Estado de São
Paulo, salientando-se, nesse ponto, a conveniência política da suspensão da vigência do ato, haja vista o
conteúdo desagregador da medida adotada pelo referido Tribunal de Justiça com imediata repercussão na
relação entre os Poderes daquele Estado. Vencidos os Ministros Carlos Velloso e Sepúlveda Pertence, que
só concediam a liminar em relação ao art. 1º da norma impugnada. (CF, art. 98, § 2º: “As custas e
emolumentos serão destinados exclusivamente ao custeio dos serviços afetos às atividades específicas da
Justiça.”).
ADI 3401/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 3.2.2005. (ADI-3401)
PRIMEIRA TURMA
ICMS. Importação. Sujeito Ativo - 2
A Turma retomou julgamento de recurso extraordinário no qual se discute a competência
tributária quanto ao sujeito ativo do ICMS na hipótese de importação. Trata-se, na espécie, de recurso
interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo que entendera ser este Estado o
beneficiário do ICMS, haja vista ter sido nele processado o desembaraço da mercadoria — v. Informativo
366. O Min. Carlos Brito, em voto-vista, deu provimento ao recurso por entender, com base no que
decidido no RE 299079/RJ (acórdão pendente de publicação), que o sujeito ativo da relação tributária é o
Estado do Espírito Santo, uma vez que, em se tratando de operação iniciada no exterior, o ICMS é devido
ao Estado em que está localizado o sujeito passivo do tributo, qual seja, aquele que promoveu
juridicamente o ingresso do produto (importador). O julgamento foi adiado com o pedido de vista do Min.
Eros Grau.
RE 268586/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 1º.2.2005. (RE-268586)
Ação de Danos Morais decorrentes de Acidente do Trabalho: EC 45/2004 e Competência
Ressaltando a excepcionalidade do caso concreto, a Turma, por maioria, negou provimento a recurso
extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Alçada do Estado de São Paulo que entendera
competir à Justiça Comum o exame de ação de indenização por danos morais fundada em acidente do
trabalho. Decidiu-se pela manutenção, na espécie, de precedentes da Corte no sentido da competência da
Justiça Comum estadual para o julgamento das causas relativas a indenizações por acidente do trabalho,
por força do disposto no inciso I do art. 109 da CF, não obstante o advento da EC 45/2004 que, ao dar
nova redação ao art. 114 da CF, dispôs expressamente competir à Justiça do Trabalho processar e julgar
as ações de indenização por dano moral ou patrimonial decorrentes da relação de trabalho (CF, art. 114,
VI). Considerou-se que o acórdão recorrido deveria ser preservado em nome do sentido de justiça, uma
vez que seria iníquo declarar, a essa altura, a nulidade do processo até a sentença, inclusive, e determinar
a remessa dos autos à Justiça trabalhista. Vencidos os Ministros Carlos Britto, relator, e Marco Aurélio,
que davam provimento ao recurso para declarar a competência da Justiça do Trabalho.
RE 394943/SP, rel. orig. Min. Carlos Britto, rel. p/ acórdão Min. Eros Grau, 1º.2.2005. (RE-394943)
SEGUNDA TURMA
Prestação de Serviço de Transporte Público e Licitação - 2
A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário interposto pela União contra acórdão do
TRF da 5ª Região que, confirmando decisão de primeira instância reconhecera o direito da recorrida,
empresa de transporte particular, de continuar atividade de transporte interestadual de passageiro,
independentemente de licitação — v. Informativo 367. A Turma deu provimento ao recurso para julgar
improcedente a ação. Entendeu-se que o acórdão recorrido, ao pretender atender ao interesse de
potenciais usuários do serviço de transporte, caracterizando-o como de interesse público, o fizera sem
nenhuma referência a dados ou circunstâncias concretas, desprestigiando aspectos fundamentais da
própria noção de serviço público, a qual traz como implicações necessárias a obrigação de continuidade e
o poder de Fiscalização da autoridade pública. Asseverou-se que a observância do procedimento
licitatório é o único adequado a garantir a efetiva proteção do interesse público e que a omissão
administrativa poderia, quando muito, resultar em responsabilização na esfera administrativa ou
determinação judicial para a realização de certame, mas não justificar a legitimação de uma única
empresa para a exploração direta do serviço. Considerou-se, ainda, que, diante do fato de a empresa estar
explorando o serviço sem licitação desde 1996, a mera eficácia da decisão recorrida estaria interferindo,
sem justificativa, no exercício do poder de polícia da União sobre o transporte interestadual de
passageiros da região.
RE 264621/CE, rel. Min. Joaquim Barbosa, 1º.2.2005. (RE-264621)
Ruas de Vilas como Logradouro Público: Inconstitucionalidade
A Turma negou provimento a recurso extraordinário interposto pela Câmara do Município do
Rio de Janeiro contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que julgara
inconstitucional a Lei municipal 2.645/98, que reconhece como logradouro público as ruas de vila.
Preliminarmente, afastou-se a alegação de incompetência do Tribunal de Justiça estadual para realizar o
controle concentrado da citada norma perante a Constituição estadual, haja vista a jurisprudência do STF
no sentido de que, em se tratando de ação direta de inconstitucionalidade da competência do Tribunal de
Justiça local — lei estadual ou municipal em face da Constituição estadual —, a questão de interpretação
de norma central da Constituição Federal, de reprodução obrigatória na Constituição estadual, autoriza a
admissão do recurso extraordinário. No mérito, entendeu-se que o acórdão recorrido não ofendeu os
dispositivos apontados no recurso, já que a referida Lei municipal, ao determinar drásticas alterações na
política urbanística do município, convertendo áreas particulares em logradouros públicos e impondo ao
Estado o dever de prestação de serviços públicos nessas áreas, a aumentar a despesa sem indicar a
contrapartida orçamentária, de fato usurpou a função administrativa atribuída ao Poder Executivo local.
Precedentes citados: RE 353350 AgR/ES (DJU de 21.5.2004) e ADI 2364 MC/AL (DJU de 14.12.2001).
RE 302803/RJ, rel. Min. Ellen Gracie, 1º.2.2005.(RE-302803)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
2.2.2005
1º.2.2005
1º.2.2005
Extraordinárias
3.2.2005
——
——
Julgamentos
18
88
140
CLIPPING
DO
DJ
4 a 11 de fevereiro de 2005
AC N. 112-RN
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTAS: 1. INTERVENÇÃO DE TERCEIRO. Ação cautelar. Processo eleitoral. Pleito anulado. Candidato que
participou da eleição anulada, em que foi derrotada a chapa que encabeçara. Intervenção indeferida. Falta de interesse
jurídico. A título de assistente, ou de recorrente interessado, não se admite intervenção de terceiro que apresente mero interesse de
fato, capaz de ser atingido pela decisão da causa.
2. RECURSO. Especial. Eleitoral. Ação de investigação judicial eleitoral. Captação ilegal de sufrágio. Sentença que cassou o
prefeito e absolveu o vice-prefeito, cuja diplomação determinou. Recurso apenas do prefeito. Improvimento pelo TRE, com
cassação simultânea e oficial do diploma do vice-prefeito. Alegação de matéria de ordem pública. Acórdão confirmado pelo
TSE, sob fundamento de operância do efeito translativo do recurso ordinário. Inadmissibilidade. Trânsito em julgado do
capítulo decisório que absolveu o vice-prefeito. Matéria não devolvida pelo recurso do prefeito. Restabelecimento da
sentença até o julgamento do recurso extraordinário já admitido. Liminar concedida. Ação cautelar julgada procedente.
Ofensa à coisa julgada. Interpretação do art. 5º, XXXVI, da CF, e dos arts. 2º, 262, 467, 509 e 515, todos do CPC. Sob pena
de ofensa à garantia constitucional da coisa julgada, não pode tribunal eleitoral, sob invocação do chamado efeito translativo do
recurso, no âmbito de cognição do que foi interposto apenas pelo prefeito, cujo diploma foi cassado, por captação ilegal de sufrágio,
cassar de ofício o diploma do vice-prefeito absolvido por capítulo decisório da sentença que, não impugnado por ninguém, transitou
em julgado.
* noticiado no Informativo 372
MI N. 701-DF
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
MANDADO DE INJUNÇÃO - OBJETO. O mandado de injunção pressupõe a inexistência de normas regulamentadoras de direito
assegurado na Carta da República. Isso não ocorre relativamente às sociedades cooperativas e ao adequado tratamento tributário
previsto na alínea “c” do inciso III do artigo 146 da Constituição Federal.
* noticiado no Informativo 363
ACO N. 653-RO
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
MANDADO DE SEGURANÇA. GLEBAS PERTENCENTES À UNIÃO. REGISTRO EM NOME DO ESTADO DE RORAIMA.
LEI 10.303/2001. AUSÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO.
1. Dispondo a Lei 10.303/2001 estarem excluídas, da transferência ao Estado de Roraima, as terras relacionadas nos incisos II, III,
IV, VIII, IX e X do art. 20 da Constituição Federal, e havendo expressa previsão de regulamentação no prazo de 180 dias, tem-se
por antijurídico o precipitado registro das glebas em nome do Estado-membro, antes mesmo de esgotado o referido prazo, e sem a
necessária e prévia identificação daquelas que serão mantidas em nome da União. 2. Segurança concedida.
* noticiado no Informativo 370
MS N. 24.999-DF
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. AGRÁRIO. DESAPROPRIAÇÃO: REFORMA AGRÁRIA. VISTORIA PRÉVIA:
NOTIFICAÇÃO DO PROPRIETÁRIO RURAL. Lei 8.629/93, art. 2º, § 2º. DEVIDO PROCESSO LEGAL: C.F., ART. 5º, LV.
IMÓVEL RURAL: DIVISÃO: SUCESSÃO MORTIS CAUSA: PRINCÍPIO DA SAISINA: Código Civil, 1916, art. 1.572; Código
Civil, 2002, art. 1.784. Estatuto da Terra, Lei 4.504/64, art. 46, § 6º.
I. - Vistoria prévia: notificação: a notificação para a vistoria prévia constitui exigência do devido processo legal (C.F., art. 5º, LV).
Precedente do S.T.F.
II. - Princípio da saisina: aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários: Código
Civil, 1916, art. 1.572; Código Civil, 2002, art. 1.784.
III. - No caso de imóvel rural em comum por força de herança, as partes ideais para os fins da desapropriação serão consideradas
como se divisão houvesse, devendo ser cadastrada a área que, na partilha, tocaria a cada herdeiro e admitidos os demais dados
médios verificados na área total do imóvel. Lei 4.504/1964 (Estatuto da Terra), art. 46, § 6º.
IV. - No caso, não foram notificados os herdeiros para a vistoria prévia, tampouco comprovou a entidade expropriante a prova do
domínio para os fins do art. 185, I, C.F. O ônus dessa prova negativa é da entidade expropriante. Precedente do STF: MS
23.006/PB, Ministro Celso de Mello, “DJ” de 29.8.03.
V. Aplicabilidade, à desapropriação para reforma agrária, do princípio da saisina e da regra do § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra.
Precedentes do STF: MS 23.306, Ministro Octavio Gallotti, “DJ” de 10.8.2000; MS 22.045/ES, Ministro Marco Aurélio, “DJ” de
30.06.95.
VI. - Mandado de Segurança deferido.
* noticiado no Informativo 370
RE N. 201.865-SP
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ESTADO-MEMBRO: PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA.
ÔNIBUS: FRETAMENTO PARA FINS TURÍSTICOS: DECRETO ESTADUAL REGULAMENTADOR. Decreto 29.912, de
1989, do Estado de São Paulo. I. - Fretamento de ônibus para o transporte com finalidade turística, ou para o atendimento do turismo
no Estado. Transporte ocasional de turistas, que reclama regramento por parte do Estado-membro, com base no seu poder de polícia
administrativa, com vistas à proteção dos turistas e do próprio turismo. CF, art. 25, § 1º. Inocorrência de ofensa à competência
privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte (CF, art. 22, XI). II. - RE conhecido e não provido.
HC N. 84.056-DF
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: HABEAS CORPUS. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE. PARCELAMENTO DE TERRAS
PERTENCENTES À UNIÃO. COMPETÊNCIA.
1. A legitimidade do Ministério Público para impetrar habeas corpus tem fundamento na incumbência da defesa da ordem jurídica e
dos interesses individuais indisponíveis.
2. O habeas corpus é instrumento idôneo para eleger o foro competente para o julgamento da causa. Precedente.
3. Compete à Justiça Federal o processamento e julgamento da ação penal proposta para apurar a prática do crime de parcelamento
irregular de terras pertencentes à União. Ordem concedida.
HC N. 84.096-ES
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
JÚRI - TERMO DE VOTAÇÃO - SENTENÇA - ATA DE JULGAMENTO - DESCOMPASSO - PREVALÊNCIA DO
VERIDICTO DOS JURADOS. Possível desencontro de dados, presentes o termo de votação, ata de julgamento e sentença do
Presidente de Tribunal do Júri, resolve-se em favor do primeiro documento, no que estampa, de imediato, a deliberação dos jurados.
HC N. 84.382-SP
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: HABEAS CORPUS. DENEGAÇÃO DA ORDEM NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PENHORA DE
IMÓVEL. DEPÓSITO. ALEGAÇÃO NO SENTIDO DE QUE A CONSTRIÇÃO JUDICIAL RECAI APENAS SOBRE O PODER
DE DISPOR DO BEM, NÃO ABRANGENDO, NA OMISSÃO DO AUTO, OS FRUTOS RESPECTIVOS.
Omisso o auto de penhora quanto à abrangência da constrição, não se pode entender alcançados os frutos obtidos com os alugueres.
Apesar de restringir o poder de disposição sobre o bem constrito, a penhora não paralisa o direito de propriedade do executado,
permanecendo intactos os demais poderes inerentes ao domínio, não havendo, in casu, gravame algum no ato de locar o imóvel.
A penhora deve constranger patrimonialmente o devedor na medida necessária da satisfação do crédito, razão pela qual, se o valor
do bem já é suficiente, a sua eventual locação não transgride os condicionamentos legais impostos pelo gravame.
* noticiado no Informativo 370
HC N. 83.543-SP
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Habeas corpus. 2. Tribunal Superior do Trabalho. Depositário judicial. Ameaça de prisão. 3. Dupla penhora incidindo
sobre os mesmos bens. Não há como se exigirem os bens que foram recebidos em outra execução trabalhista, sob pena de
recolhimento à prisão como depositário infiel. Precedentes. 4. Concessão da ordem.
* noticiado no Informativo 348
RE N. 361.020-MG
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: ESTABILIDADE. C.F./88, ADCT, art. 19.
I.- Prestação de serviço por mais de cinco anos, até 05.10.1988, data da promulgação da Constituição. Breves interrupções
ocorreram no exercício das atividades de professor. Esses breves intervalos nas contratações, decorrentes mesmo da natureza do
serviço (magistério), não descaracterizam o direito do servidor. Precedentes: RREE 158.448/MG, 257.580/MG e 218.323/SP, Min.
Marco Aurélio; RREE 235.742/MG e 378.036-AgR/MG, Min. Carlos Velloso, “D.J.” de 02.02.1999 e 24.10.2003.
II.- RE conhecido e desprovido.
* noticiado no Informativo 363
QUEST. ORD. EM ADI N. 3.319-RJ
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. QUESTÃO DE ORDEM. RESOLUÇÃO Nº 12, DE 13.09.04, DO ÓRGÃO
ESPECIAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. CRIAÇÃO DE NOVOS OFÍCIOS DE
REGISTRO DE IMÓVEIS NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. REORGANIZAÇÃO, POR AGRUPAMENTO DE
BAIRROS, DA DIVISÃO TERRITORIAL DAS SERVENTIAS. FIXAÇÃO DE PRAZO DE TRINTA DIAS PARA O
EXERCÍCIO DO DIREITO DE OPÇÃO PREVISTO NO ART. 29, I DA LEI Nº 8.935/94 E DE SESSENTA DIAS PARA
TRANSFERÊNCIA DOS CARTÓRIOS PARA UMA DAS VINTE E NOVE CIRCUNSCRIÇÕES CRIADAS. 1. O presente caso
reclama julgamento único e definitivo por esta Corte, tendo em vista as dificuldades e transtornos que certamente seriam
enfrentados numa eventual re-instalação das atuais serventias nas freguesias onde já prestam serviço. 2. Questão de ordem resolvida
com a aplicação do procedimento previsto no art. 12 da Lei nº 9.868/99, suspendendo-se por agora, tão-somente, a vigência dos
parágrafos 1º e 2º do art. 4º da Resolução nº 12/04, do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, com
eficácia ex tunc no que diz respeito ao prazo referido no citado parágrafo primeiro.
* noticiado no Informativo 366
EMB.DIV.NOS EMB. DECL.NO RMS N. 22.926-DF
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Embargos de Divergência em Embargos de Declaração em Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. 2.
Descabimento dos embargos de divergência na espécie. Art. 546, do Código de Processo Civil. 3. Recurso não conhecido.
* noticiado no Informativo 298
Rcl N. 2.453-MG
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: RECLAMAÇÃO. CONSTITUCIONAL. JUIZ-PRESIDENTE DA 3ª TURMA RECURSAL DO JUIZADO ESPECIAL
CÍVEL DA COMARCA DE UBERLÂNDIA -MG. O Supremo Tribunal Federal sedimentou o entendimento de que os acórdãos
proferidos pelas Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, quando versantes sobre matéria constitucional,
comportam impugnação por meio de apelo extremo - Súmula 640/STF. Exatamente por essa razão é que a jurisprudência desta
colenda Corte também rechaça a obstância, na origem, de agravo de instrumento manejado contra decisão que inadmite recurso
extraordinário. Precedentes. Reclamação julgada procedente para determinar a remessa do agravo de instrumento a esta egrégia
Corte, uma vez que somente ao Supremo Tribunal Federal compete decidir se esse recurso é passível de conhecimento.
Inq N. 2.130-DF
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
CALÚNIA. INFORMATIVO ELETRÔNICO. DIVULGAÇÃO DE CARTA ANÔNIMA. PARLAMENTAR.
1. A divulgação, em informativo eletrônico gerado em gabinete de deputado federal, na Câmara dos Deputados, de fatos que, em
tese, configuram crimes contra a administração pública, não pode ser tida como desvinculada do exercício parlamentar,
principalmente quando tais fatos ocorrem no Estado que o parlamentar representa no Congresso Nacional.
2. Denúncia rejeitada.
* noticiado no Informativo 365
MED. CAUT. EM AC N. 438-RJ
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: MEDIDA CAUTELAR. EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM QUE SE DISCUTE A
ESTABILIDADE DE MILITAR DA AERONÁUTICA. JULGAMENTO DO RECURSO SUSPENSO EM RAZÃO DE PEDIDO
DE VISTA. ART. 21, INCISO IV, DO RI/STF.
Situação que autoriza o deferimento do pedido cautelar, com o objetivo de se impedir o desligamento dos requerentes da
Corporação, até o julgamento definitivo do apelo extremo. Há de se considerar, no caso, que os recorrentes já perfizeram mais de
dez anos no serviço militar, fato que levou o Relator a votar pelo provimento do recurso, antes do pedido de vista, de modo a
conferir um razoável grau de plausibilidade à tese por eles defendida no extraordinário. Medida cautelar deferida.
* noticiado no Informativo 363
HC N. 83.523-SP
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: HABEAS CORPUS. PACIENTE CONDENADO POR INFRAÇÃO AO ART. 157, § 2º, INCISOS I E II, DO CP, COM
IMPOSIÇÃO DE REGIME FECHADO PARA O CUMPRIMENTO DA PENA. ALEGADO CONSTRANGIMENTO
CONSISTENTE NA NÃO-CONCESSÃO DO REGIME SEMI-ABERTO, POR SEREM FAVORÁVEIS AS DIRETRIZES DO
ART. 59 DO CP E A CONDENAÇÃO TER SIDO IMPOSTA NO MÍNIMO LEGAL PREVISTO PARA O DELITO
PRATICADO.
O Supremo Tribunal Federal, a partir do julgamento do HC 77.682, assentou que a gravidade abstrata do chamado “roubo
qualificado” não é suficiente, por si só, para a imposição obrigatória do regime fechado, mormente quando favoráveis as
circunstâncias judiciais.
Caso em que a Corte estadual, após mencionar a gravidade em abstrato do delito, acrescentou um segundo fundamento, suficiente
para a fixação do regime imposto, apontando circunstâncias concretas, próprias do evento criminoso em exame, a demonstrar que a
espécie, de fato, não se enquadra naquelas em que a jurisprudência desta colenda Corte restringe a imposição de regime fechado.
Há contradição em acórdão que, atestando a primariedade do réu, fixa a pena no mínimo possível - considerando o acréscimo das
causas especiais de aumento -, e, logo em seguida, vale-se de condições judiciais desfavoráveis ao acusado para impor regime de
pena mais gravoso do que o teoricamente cabível. Contradição que, todavia, não favorece ao paciente, porquanto as circunstâncias
relacionadas pelo Tribunal estadual para fixar o regime fechado seriam suficientes para aumentar a pena imposta. Assim, em última
análise, o equívoco do acórdão estadual, ao não apontar tais circunstâncias na aplicação da pena, veio a beneficiar o acusado que não
pode se prevalecer do erro para pleitear o cumprimento da condenação em regime mais favorável. Precedentes.
Habeas corpus indeferido.
* noticiado no Informativo 328
RMS N. 24.901-DF
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: ADMINISTRATIVO. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO POR
ATO DE IMPROBIDADE. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PENA MENOS SEVERA.
O órgão do Ministério Público, que oficiou na instância de origem como custos legis (art. 10 da Lei nº 1.533/51), tem legitimidade
para recorrer da decisão proferida em mandado de segurança.
Embora o Judiciário não possa substituir-se à Administração na punição do servidor, pode determinar a esta, em homenagem ao
princípio da proporcionalidade, a aplicação de pena menos severa, compatível com a falta cometida e a previsão legal.
Este, porém, não é o caso dos autos, em que a autoridade competente, baseada no relatório do processo disciplinar, concluiu pela
prática de ato de improbidade e, em conseqüência, aplicou ao seu autor a pena de demissão, na forma dos artigos 132, inciso IV, da
Lei nº 8.112/90, e 11, inciso VI, da Lei nº 8.429/92.
Conclusão diversa demandaria exame e reavaliação de todas as provas integrantes do feito administrativo, procedimento
incomportável na via estreita do writ, conforme assentou o acórdão recorrido.
Recurso ordinário a que se nega provimento.
* noticiado no Informativo 367
HC N. 84.156-MG
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: INQUÉRITO POLICIAL - ARQUIVAMENTO ORDENADO POR MAGISTRADO COMPETENTE, A PEDIDO
DO MINISTÉRIO PÚBLICO, POR AUSÊNCIA DE TIPICIDADE PENAL DO FATO SOB APURAÇÃO - REABERTURA
DA INVESTIGAÇÃO POLICIAL - IMPOSSIBILIDADE EM TAL HIPÓTESE - EFICÁCIA PRECLUSIVA DA DECISÃO
JUDICIAL QUE DETERMINA O ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL, POR ATIPICIDADE DO FATO PEDIDO DE “HABEAS CORPUS” DEFERIDO.
- Não se revela cabível a reabertura das investigações penais, quando o arquivamento do respectivo inquérito policial tenha sido
determinado por magistrado competente, a pedido do Ministério Público, em virtude da atipicidade penal do fato sob apuração,
hipótese em que a decisão judicial - porque definitiva - revestir-se-á de eficácia preclusiva e obstativa de ulterior instauração da
“persecutio criminis”, mesmo que a peça acusatória busque apoiar-se em novos elementos probatórios. Inaplicabilidade, em tal
situação, do art. 18 do CPP e da Súmula 524/STF. Doutrina. Precedentes.
* noticiado no Informativo 367
Acórdãos Publicados: 447
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais
aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham
despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Denúncia - Peculato - Governador de Estado - § 2º do Art. 327 do CP (Transcrições)
(v. Informativo 372)
Inq 1769/DF*
RELATOR: MINISTRO CARLOS VELLOSO
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. PECULATO. Código Penal, art. 312. PRESCRIÇÃO: NÃOOCORRÊNCIA. DENÚNCIA: CPP, art. 41. GOVERNADOR DE ESTADO: Código Penal, art. 327. COISA JULGADA:
NÃO-OCORRÊNCIA.
I. - A denúncia descreve crime em tese, crime de peculato — Código Penal, art. 312 — e contém os requisitos
inscritos no art. 41, CPP. Deve ser recebida, portanto.
II. - Prescrição: não-ocorrência, presente a causa de aumento de pena inscrita no art. 327, § 2º, do Código Penal.
III. - Coisa julgada: não-ocorrência, por isso que a decisão que manda arquivar inquérito ou peças de informação não
causa preclusão. Súmula 524-STF.
IV. - Denúncia recebida.
RELATÓRIO: Trata-se de inquérito que tem como indiciado o Sr. JADER FONTENELLE BARBALHO, atualmente Deputado
Federal, visando à apuração da prática do crime de peculato, em detrimento do Banco do Estado do Pará S.A., por desvio de
cheques administrativos emitidos no ano de 1984.
Às fls. 176-186, deferi pedido de quebra de sigilo bancário e demais diligências requeridas pelo Ministério Público Federal,
dentre as quais a inquirição do indiciado.
Realizadas as diligências e elaborado, pela Polícia Federal, relatório de análise dos dados colhidos, encaminhei os autos ao
Procurador-Geral da República, que, oficiando às fls. 1.018-1.021, ofereceu denúncia e requereu o desmembramento do feito em
relação aos beneficiários e partícipes que não detinham foro por prerrogativa de função.
Pelo despacho de fl. 1.024, deferi o desmembramento e determinei o encaminhamento de cópia dos autos ao Tribunal de
Justiça do Estado do Pará.
Em 08.3.2004, foi oferecida, pelo Ministério Público Federal, denúncia contra JADER FONTENELLE BARBALHO,
imputando-lhe a prática do delito previsto no art. 312, caput, c/c o art. 327, § 2º, ambos do Código Penal.
Segundo a denúncia, o acusado incorreu no crime de peculato (art. 312, caput, c/c o art. 327, § 2º, ambos do Código Penal), por ter
se apropriado de dinheiro pertencente ao Banco do Estado do Pará S/A - BANPARÁ, instituição financeira então pertencente ao
Estado do Pará.
O Sr. Jader Barbalho apresentou a resposta de fls. 1.053-1.116, sustentando, em síntese:
a) existência de manifestação de autoridade policial, agente de polícia, “no sentido de que não houve condições de se afirmar
que o denunciado teria cometido qualquer delito” (fl. 1.054);
b) violação à coisa julgada, pois o Tribunal de Justiça do Estado do Pará deferiu, em 1993, habeas corpus para impedir seu
indiciamento em inquérito policial instaurado para apurar o desvio de recursos do BANPARÁ;
c) inexistência de “provas substancialmente novas” (fl. 1.059), que, nos termos do art. 18 do Código de Processo Penal,
poderiam ensejar a abertura de novo procedimento investigatório (Súmula 524-STF), já que o relatório elaborado pelo Banco
Central em nada inovou no que tange às investigações já realizadas;
d) inépcia da denúncia, por inobservância do art. 41 do Código de Processo Penal, “porquanto não indica as circunstâncias
pelas quais o desvio teria sido perpetrado, limitando-se a sustentar, com muita dificuldade, que o acusado teria sido beneficiário
dos recursos apropriados indevidamente” (fl. 1.068);
e) manipulação dos dados constantes das inspeções realizadas pelo Banco Central, que não mereceram manifestação da sua
procuradoria jurídica, nem da presidência da instituição, tendo sido apenas encaminhados pelo Procurador-Geral do BACEN, sem a
necessária chancela;
f) ocorrência de prescrição, pela superveniência da Lei 7.492/86, que tipifica os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional.
Assim, o denunciado, na qualidade de Chefe do Poder Executivo Estadual, estaria na condição de acionista controlador do
BANPARÁ, incidindo, se fosse o caso, no art. 5º da citada lei, que prevê pena máxima de 6 (seis) anos de reclusão, resultando, de
acordo com o art. 109 do Código Penal, em um prazo prescricional de 12 (doze) anos;
g) impossibilidade de aplicação do disposto no § 2º do art. 327 do Código Penal (causa de aumento de pena) ao denunciado,
“pois o cargo que exercia à época dos fatos era de Governador de Estado não se enquadrando como função de direção a que se
refere o mencionado § 2º” (fl. 1.078), o que reduziria o prazo prescricional do crime de peculato para 16 (dezesseis) anos;
No mérito, a defesa alega, em síntese:
a) incongruência da denúncia, pois os valores decorrentes dos desvios dos cheques administrativos do BANPARÁ
representam apenas a quinta parte dos recursos movimentados pelo denunciado, junto ao Banco Itaú S/A;
b) irrelevância do fato de o denunciado estar presente na agência no dia em que os referidos cheques foram aplicados;
c) intenção deliberada de incriminação do denunciado, pois não se identificou os outros investidores que teriam, em conluio
com o denunciado, emitido cheques que, junto com os cheques administrativos do BANPARÁ, teriam sido utilizados na aquisição
dos Títulos de Renda Fixa ao Portador;
d) falta de apuração, por meio de rastreamento, de quem seria o beneficiário do resgate da aplicação realizada junto ao Banco
Itaú S/A;
e) possibilidade de os cheques emitidos pelo denunciado terem sido utilizados por terceiros, na citada aplicação, já que não
eram exatamente coincidentes com o resíduo existente entre os cheques administrativos e os títulos adquiridos;
f) inconsistência da afirmação de que o acusado foi um dos beneficiários das aplicações financeiras realizadas com os
cheques administrativos, já que, apesar de apontados depósitos em sua conta corrente em valor correspondente à reaplicação dos
Títulos de Renda Fixa, não existem registros de identificação dos beneficiários das outras reaplicações e nem do vínculo desses com
o denunciado;
g) interrupção da seqüência dos números constantes das fichas de registro de caixa dos terminais bancários, o que demonstra
que “foram efetivamente seccionadas para permitir a alegação de implicação do Denunciado” (1.097);
h) inexistência de indicação, documentalmente comprovada, de que os resgates e aplicações realizadas no Banco Itaú S/A
estivessem relacionadas ou vinculadas ao resgate da aplicação de cheques administrativos do BANPARÁ.
Às fls. 1.120-1.121, a defesa requereu juntada de cópia da perícia realizada na Ação Cautelar de Antecipação de Provas
2001.1224391-1, que tramitou no Juízo da 21ª Vara de Justiça Cível de Belém, bem como de cópia dos despachos, proferidos pelo
Presidente do Tribunal de Justiça do Pará, que inadmitiram os recursos extraordinário e especial interpostos contra o acórdão que
confirmou a sentença de homologação da prova constituída judicialmente.
A perícia (fls. 1.125-1.406) analisou o desvio de recursos por meio de 18 (dezoito) cheques administrativos do BANPARÁ,
dentre os quais 10 (dez) foram objeto da presente denúncia. Estas, em síntese, as conclusões da perícia:
a) possibilidade de o produto dos desvios de recursos do BANPARÁ terem produzido reflexos financeiros negativos para a
instituição, já que essa, em virtude de deficiências em sua reserva bancária, recorreu a empréstimos e incorreu em penas pecuniárias.
Os reflexos dos desvios, porém, não poderiam ser precisamente indicados, pois o Estado do Pará assumiu as dívidas da referida
instituição em contratos celebrados em 09.5.85 e 06.12.89;
b) inexistência de prejuízos a terceiros, pois os recursos desviados foram originários do próprio BANPARÁ;
c) impossibilidade de identificação dos mecanismos utilizados e dos efetivos beneficiários dos 10 (dez) cheques
administrativos citados na denúncia, pois o relatório do Banco Central teria sido elaborado sem exame acerca da pertinência das
afirmações ali contidas e sem suporte probatório suficiente.
Sobre os documentos (fls. 1.120-1.411) apresentados em complementação à resposta (Lei 8.038/90, art. 5º), dei vista ao
Ministério Público Federal, que ratificou a manifestação de recebimento da denúncia (fls. 1.415-1.424), aduzindo, em síntese:
a) irrelevância, para o oferecimento da peça acusatória, do relatório policial, que concluiu não ser possível individualizar as
condutas, já que o Ministério Público é o titular privativo da ação penal pública;
b) inexistência de coisa julgada, pois a decisão que arquiva inquérito ou peças de informação “‘não causa a preclusão, sendo
uma decisão tomada rebus sic stantibus, que não produz coisa julgada’ (MIRABETE, Julio F. Código de Processo Penal
Interpretado 3 ed. Atlas: São Paulo. 1995. p. 57)” (fl. 1.416);
c) existência de novas provas a fundamentar a presente denúncia;
d) aptidão da denúncia, que expõe o fato criminoso, suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a classificação do crime;
e) inocorrência de crime contra o Sistema Financeiro Nacional a justificar a ocorrência de prescrição, pois este Tribunal
decidiu que a Lei 7.492/86, que disciplina os referidos crimes, não se aplica a Governadores e Secretários de Estado, por
impossibilidade de se equiparar o Estado a instituição financeira;
f) incidência da causa de aumento de pena prevista no § 2º do art. 327 do Código Penal, pois não há como afastar a função de
Governador de Estado do conceito de “ocupante de função de direção de órgão da administração direta” (fl. 1.423);
g) procedência das afirmações feitas na denúncia, pois não configura contradição o fato de o denunciado ter movimentado,
nas aplicações em Títulos de Renda Fixa, valor superior ao dos cheques administrativos desviados, já que houve a complementação
dos valores por cheques emitidos pelo próprio denunciado e por outros recursos.
Requer, ao final, seja julgada procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia.
É o relatório.
VOTO: A denúncia atribui ao Sr. Jader Barbalho a prática do crime de peculato — Código Penal, art. 312, caput, c/c o art. 327, §
2º, ambos do Código Penal — porque teria ele, quando governador do Estado, se apropriado de dinheiro pertencente ao Banco do
Estado do Pará S/A - BANPARÁ, instituição financeira que pertencia ao Estado do Pará.
Os fatos tidos como delituosos estão assim descritos na denúncia (fls. 02-08):
“(...)
1. No ano de 1984, o hoje Deputado Federal JADER BARBALHO exercia o cargo de Governador do Estado do Pará.
Conforme relatório final produzido pelo Banco Central do Brasil (fls. 3467/3882 - apensos 35/36), bem como demais
elementos carreados aos autos, o ora denunciado, na condição de Chefe do Poder Executivo estadual, apropriou-se de
dinheiro pertencente ao Banco do Estado do Pará S.A. - BANPARÁ, instituição financeira então pertencente ao Estado do
Pará, em ardiloso esquema criminoso como se passa a demonstrar.
2. Resta nitidamente comprovado nos autos que foram desviados 10 (dez) cheques administrativos do BANPARÁ que
compuseram, em parte, as aplicações financeiras em Títulos de Renda Fixa, na modalidade ‘ao portador’, na Agência 0532
(Jardim Botânico-RJ) do Banco Itaú, depositados nas seguintes datas: 17/10, 23/10, 07/11, 08/11, 29/11 e 07/12/1984. Tais
aplicações foram feitas pelo denunciado JADER BARBALHO.
3. A sistemática de utilização dos cheques administrativos desviados do BANPARÁ foi bem explicada no relatório
produzido pelo BACEN. Segundo noticiou, ‘as aplicações compostas em parte de cheques administrativos desviados do
BANPARÁ, são, em sua maioria, de valores expressivos, conforme informações prestadas pelo Banco Itaú S/A por meio de
correspondência de fls. 002 a 005 do Anexo 2 [fls 3929/3932 - apenso 37], as Agências adotavam sistemática especial de
captação de recursos, negociando as condições diretamente junto à Mesa de Renda Fixa localizada em São Paulo.
Negociadas as condições, eram emitidas pela própria Agência, de imediato, as respectivas Ordens de Compra, utilizadas
pelo investidor como comprovante da respectiva aplicação.’
4. Observe-se, por oportuno, que, à época dos fatos ora descritos, verificava-se a corriqueira utilização de cheques e
de títulos ao portador, independentemente do valor nominal ou de face. Destarte, o portador do título permanecia no
anonimato, como astuciosamente o fez o denunciado. Segundo informou o Banco Itaú ‘quando um mesmo investidor
entregava cheques de terceiros para serem aplicados, não cabia ao banco questionar se tal movimentação seria própria ou
não. Porém, como havia a necessidade de controlar os cheques acatados, o funcionário procedia a anotação do número das
Ordens de Compra nos versos desses cheques ou anotava o número dos cheques na 4ª via da própria Ordem de Compra.
Utilizando essas informações foi possível a identificação e vinculação de diversos cheques às aplicações iniciadas com
recursos desviados do BANPARÁ.’ (fls. 3478 - apenso 35, grifo nosso).
5. Em relação aos recursos que compunham as aplicações ou reaplicações em Títulos de Renda Fixa, na modalidade
‘ao portador’, ‘esclarece o Banco Itaú na mesma correspondência que na comparação entre os recursos recebidos pelo
Caixa (cheques ou resgates) e os comprovantes em Títulos de Renda Fixa (saída), poderam ocorrer faltas (resíduos
negativos) ou sobras (resíduos positivos). Eram importancias de pequena monta complementadas em dinheiro ou cheque do
próprio investidor (resíduo negativo), ou então devolvidas no ato ou depositadas em sua conta corrente, a seu pedido’ (fls.
3479 - apenso 35).
6. Ainda, com precisão, assinalou a auditoria do BACEN:
‘Merece registro o fato de que durante todo o período abordado, os levantamentos mostraram a participação
do Sr. Jader Fontenelle Barbalho ora se beneficiando dos resíduos positivos, ora complementando as aplicações
com recursos de sua conta corrente nº 96.650-4 mantida na mesma Agência 0532-Jardim Botânico/RJ do Banco Itaú
onde foram realizadas as aplicações, ora se beneficiando do produto dos resgates, além de sua presença física
naquela Agência em diversos dias em que foram realizadas as aplicações, conforme anotações e assinaturas
consignadas nas folhas do Livro de Registro de Aberturas Normais do Cofre Particular nº 144, que integram o Anexo
004 [fls. 3941/3948 - apenso 37], denotando ser ele o titular das operações compostas em parte com os cheques
administrativos do BANPARÁ. Constatou-se, também, a utilização do produto dos resgates das aplicações em
pagamentos a diversas pessoas físicas e jurídicas que possuíam algum vínculo com o Sr. Jader Fontenelles
Barbalho.’ (fls. 3480 - apenso 35, grifo nosso).
7. Passa-se, agora, a detalhar as aplicações que continham valores apropriados do BANPARÁ:
1. 17/10/1984: foram aplicados Cr$ 900.093.087,00, sendo Cr$ 50.000.000,00 do cheque administrativo do
BANPARÁ n° 648.307 (fls. 4162/4163 do apenso 38), Cr$ 93.000,00, do cheque n° 541423, da conta corrente n°
96.650-4, da agência 0532, emitido em 17/10/1984, por JADER BARBALHO (fls. 4141/4142 do apenso 38) e o
restante proveniente de outros recursos. A seqüência numérica das autenticações mecânicas, a utilização de seu
cheque para complementar o valor aplicado, bem como sua presença física, exatamente no dia da aplicação
(17.10.1984), às 16:00 horas, conforme anotação e assinatura consignadas no Registro de Aberturas Normais do
Cofre Particular n° 144 (fls. 3947 - apenso 37), comprovam ser JADER BARBALHO o titular da referida aplicação.
2. 23/10/1984: foram aplicados Cr$ 470.008.956,00, sendo Cr$ 100.000.000,00 do cheque administrativo do
BANPARÁ n° 648.316 (fls. 4176/4177 do apenso 38), Cr$ 100.000.000,00 do cheque administrativo do BANPARÁ n°
648.317 (fls. 4178/4179 do apenso 38), Cr$ 9.000,00, do cheque n° 541426, da conta corrente n° 96.650-4, da
agência 0532, emitido em 17/10/1984, por JADER BARBALHO (fls. 4171/4172 do apenso 38) e o restante
proveniente de outros recursos. A seqüência numérica das autenticações mecânicas, a utilização de seu cheque para
complementar o valor aplicado, bem como sua presença física, exatamente no dia da aplicação (23.10.1984), às
13:35 horas, conforme anotação e assinatura consignadas no Registro de Aberturas Normais do Cofre Particular n°
144 (fls. 3947 - apenso 37), comprovam ser JADER BARBALHO o titular da referida aplicação.
3. 07/11/1984: foram aplicados Cr$ 1.318.439.358,00, sendo Cr$ 85.000.000,00 do cheque administrativo do
BANPARÁ n° 84/030 (fls. 6205/6206 do apenso 46), Cr$ 500.000.000,00 do cheque administrativo do BANPARÁ n°
84/034 (fls. 6207/6208 do apenso 46), Cr$ 96.733.548,00 do cheque administrativo do BANPARÁ n° 84/036 (fls.
6209/6210 do apenso 46), e o restante proveniente de outros recursos, gerou um resíduo positivo que foi depositado
na conta corrente n° 96.650-4, da agência 0532, de JADER BARBALHO (fls. 6211/6212 do apenso 46). A seqüência
numérica das autenticações mecânicas, o depósito da sobra da aplicação na sua conta corrente, bem como sua
presença física, exatamente no dia da aplicação (07.11.1984), às 18:16 horas, conforme anotação e assinatura
consignadas no Registro de Aberturas Normais do Cofre Particular nº 144 (fls. 3947 - apenso 37), comprovam ser
JADER BARBALHO o titular da referida aplicação.
4. 08/11/1984: foram aplicados Cr$ 796.571.364,00, sendo Cr$ 500.000.000,00 do cheque administrativo do
BANPARÁ n° 84/035 (fls. 7030 do apenso 49), e o restante proveniente de outros recursos. A seqüência numérica das
autenticações mecânicas e sua presença física, exatamente no dia da aplicação (08.11.1984), às 15:05 horas,
conforme anotação e assinatura consignadas no Registro de Aberturas Normais do Cofre Particular n° 144 (fls. 3947
- apenso 37), comprovam ser JADER BARBALHO o titular da referida aplicação. Observe-se que as operações dos
dias 07 e 08/11/1984, tendo sido resgatadas e reaplicadas sucessivas vezes, se juntaram em 29/05/1985.
5. 29/11/1984: foram aplicados Cr$ 1.340.058.912,00, sendo Cr$ 400.000.000,00 do cheque administrativo do
BANPARÁ n° 84/086 (fls. 8860/8861 do apenso 57), Cr$ 400.000.000,00 do cheque administrativo do BANPARÁ n°
84/088 (fls. 8862/8863 do apenso 57), e o restante proveniente de outros recursos, gerou um resíduo positivo que foi
depositado na conta corrente n° 96.650-4, da agência 0532, de JADER BARBALHO (fls. 8866/8867 do apenso 57). A
seqüência numérica das autenticações mecânicas, o depósito da sobra da aplicação na sua conta corrente, bem como
sua presença física, exatamente no dia da aplicação (29.11.1984), às 10:22 horas, conforme anotação e assinatura
consignadas no Registro de Aberturas Normais do Cofre Particular n° 144 (fls. 3947 - apenso 37), comprovam ser
JADER BARBALHO o titular da referida aplicação.
6. 07/12/1984: foram aplicados Cr$ 250.023.483,00, sendo Cr$ 250.000.000,00 do cheque administrativo do
BANPARÁ n° 84/110 (fls. 8875/8876 do apenso 58), e o restante proveniente de uma pequena complementação.
Observe-se que as operações dos dias 29/11 e 07/12/1984, tendo sido resgatadas e reaplicadas sucessivas vezes, se
juntaram em 08/01/1986.
8. Todas as aplicações realizadas foram resgatadas e reaplicadas sucessivas vezes, inclusive com a incorporação de
outras aplicações e recursos de outras origens. Esta cadeia de aplicações está perfeitamente delineada no minucioso
relatório produzido pelo Banco Central a fls. 3467/3882 - apensos 35/36. Ressalte-se que em 31.07.1987 todas as aplicações
antes discriminadas se interligaram, data em que o denunciado compareceu duas vezes na agência às 9:30 horas e à 13:30
horas, conforme anotação e assinatura consignadas no Registro de Aberturas Normais do Cofre Particular n° 144 (fls. 3948
- apenso 37), o que comprova, à toda evidência, ser JADER BARBALHO o grande beneficiado pelos desvios ocorridos no
BANPARÁ no ano de 1984.
9. Ademais, torna-se ainda mais evidente constatar que o ora denunciado é o titular das referidas aplicações em
Títulos de Renda Fixa, quando se verifica que foram beneficiários (destinatários finais) das aplicações o próprio JADER
BARBALHO, além de empresas de sua propriedade, familiares, empregados, consoante conclusão do relatório do BACEN a
fls. 3882 - apenso 36.
10. O vínculo causal existente entre os valores criminosamente desviados do BANPARÁ e os destinatários dos
recursos está exaustivamente demonstrado no excelente trabalho desenvolvido pela auditoria do BACEN (fls. 3467/3882 apensos 35/36). A visualização por meio de gráfico da série de aplicações e reaplicações dos aludidos Títulos de Renda Fixa
está bem delineada a fls. 3949 (apenso 37).
11. Assim sendo, resta comprovado que nos dias 17/10, 23/10, 07/11, 08/11, 29/11 e 07/12/1984, 10 (dez) cheques
administrativos do BANPARÁ n°s. 648.307, 648.316, 648.317, 84/030, 84/034, 84/035, 84/036, 84/86, 84/88 e 84/110 foram
descontados e apropriados pelo denunciado JADER BARBALHO, a fim de compor, em parte, as aplicações financeiras deste
em Títulos de Renda Fixa, na modalidade ‘ao portador’ na Agência 0532 (Jardim Botânico-RJ), do Banco Itaú.
12. Dessume-se, portanto, que o denunciado, agindo com vontade livre e consciente, dirigida à produção do
resultado criminoso, nos dias 17/10, 23/10, 07/11, 08/11, 29/11 e 07/12/1984, apropriou-se de Cr$ 2.481.733.548,00, valor
correspondente a US$ 913.315,86, dinheiro pertencente ao Banco do Estado do Pará S.A. BANPARÁ, instituição financeira
então pertencente ao Estado do Pará, em proveito próprio. Está, pois, incurso nas penas dos art. 312, caput, c/c o art. 327, §
2°, ambos do Código Penal, por dez vezes.
(...).” (Fls. 03-07)
A denúncia, ao que se vê, afirma ter o acusado, então governador do Estado do Pará, se apropriado de dinheiro pertencente
ao Banco do Estado do Pará. Dez cheques administrativos do BANPARÁ foram utilizados pelo acusado para aplicações financeiras,
certo que, segundo auditoria do BACEN, “durante todo o período abordado, os levantamentos mostraram a participação do Sr.
Jader Fontenelle Barbalho ora se beneficiando dos resíduos positivos, ora complementando as aplicações com recursos de sua
conta corrente (...), ora se beneficiando do produto dos resgates, além de sua presença física naquela Agência em diversos dias em
que foram realizadas as aplicações (...) denotando ser ele o titular das operações compostas em parte com os cheques
administrativos do BANPARÁ. Constatou-se, também, a utilização do produto dos resgates das aplicações em pagamentos a
diversas pessoas físicas e jurídicas que possuíam algum vínculo com o Sr. Jader Fontenelle Barbalho” (Denúncia, item 6).
A denúncia, em seguida, conforme vimos, passa a detalhar as aplicações que continham valores que teriam sido apropriados
do BANPARÁ (item 7, subitens 1, 2, 3, 4, 5 e 6). A denúncia, depois, deixa expresso que “as aplicações realizadas foram
resgatadas e reaplicadas sucessivas vezes, inclusive com a incorporação de outras aplicações e recursos de outras origens”, o que
está demonstrado “no minucioso relatório produzido pelo Banco Central às fls. 3.467-3.882 - apensos 35/36” (fl. 06).
Do relatório do Banco Central, referido na denúncia, relatório às fls. 3.467-3.882, apensos 35/36, destaco a sua conclusão:
“7. CONCLUSÃO
‘Os dez cheques administrativos desviados do BANPARÁ, que compuseram, em parte, as aplicações financeiras em
títulos de renda fixa ao portador na Agência 0532-Rio Jardim Botânico, do Banco Itaú S/A, foram ali depositados em seis
datas distintas: 17/10, 23/10, 07/11, 08/11, 29/11 e 07/12/1984.
À exceção do dia 07/12/1984, em todos os outros foi constatada a presença física do sr. Jader Fontenelle Barbalho
na Agência, inclusive com algumas coincidências de horários entre a sua visita à Agência e as autenticações dos
documentos que compuseram as aplicações. Nessas mesmas datas, à exceção dos dias 08/11/1984 e 07/12/1984, existem
registros de movimentações de recursos financeiros em sua conta corrente n° 96.650-4, mantida na mesma Agência 0532Rio-Jardim Botânico do Banco ltaú em que foram realizadas tais aplicações, que correspondem aos resíduos positivos e/ou
negativos das respectivas operações.
As sucessivas aplicações em títulos de renda fixa ao portador, relacionadas com os desvios do BANPARÁ, foram
efetuadas na Agência 0532-Rio Jardim Botânico do Banco Itaú S/A, no Rio de Janeiro, no período de 06/04/1984 a
16/08/1989, em 257 dias úteis.
O gráfico das operações realizadas, objeto do Anexo 005, bem como a descrição constante nos itens 5.1 a 5.6,
relativa a cada uma das ocorrências nos 257 dias úteis em que foram efetuadas, demonstram o vínculo causal existente entre
os recursos desviados do BANPARÁ, as aplicações/resgates/reaplicações em títulos de renda fixa ao portador e os
respectivos beneficiários finais.
Os levantamentos mostram a participação do sr. Jader Fontenelle Barbalho ora se beneficiando dos resíduos
positivos, ora complementando as aplicações com recursos de sua conta corrente n° 96.650-4 mantida na mesma Agência
0532-Jardim Botânico/RJ do Banco Itaú onde foram realizadas as aplicações, além de sua presença física naquela Agência
em diversos dias em que foram realizadas as sucessivas reaplicações, conforme anotações e assinaturas consignadas nas
folhas do Livro Registro de Aberturas Normais do Cofre Particular n° 144, que integram o Anexo 004.
Em algumas operações o sr. Jader Fontenelle Barbalho foi beneficiário não apenas dos resíduos das operações mas
do produto de seus resgates, cabendo destaque para o resgate de duas aplicações sendo: i) parte da aplicação de 17/06/87,
ocorrido em 20/08/87 e ii) parte da aplicação de 20/08/87, ocorrido em 10/08/88, em que além de ser beneficiário direto de
parte das aplicações, utilizou-se do produto dos resgates para pagamento de seus seguros de Acidentes Pessoais à Itaú
Seguros S/A (v. itens 5.122 e 5.200).
Constatou-se a utilização do produto dos resgates das aplicações em pagamentos a diversas pessoas físicas e
jurídicas que possuíam algum vínculo de ligação com o sr. Jader Fontenelle Barbalho e pagamentos a terceiros, por conta
e ordem dessas mesmas pessoas.
Do total de 257 dias úteis em que foram realizadas as operações, em 30 (11,6%) foi constatada a presença física do
sr. Jader Fontenelle Barbalho na Agência; em 52 (20%) os resíduos positivos e/ou negativos foram recebidos e/ou pagos
pelo sr. Jader Fontenelle Barbalho e em 114 (44%) houve pagamentos para o sr. Jader Fontenelle Barbalho e/ou a
pessoas físicas e jurídicas a ele ligadas (Anexo 005).
As aplicações foram efetuadas com recursos que tiveram origem em diversas fontes, a saber: i) nos desvios do
BANPARÁ; ii) em cheques de Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários; iii) em cheques de pessoas físicas e jurídicas
e iv) em recursos cuja origem não foi possível identificar. Esses recursos se juntaram no momento das aplicações, não
havendo como separá-los por fonte nas datas dos resgates uma vez que no momento da aplicação não foi feita tal separação.
As principais origens dos recursos utilizados nas aplicações e os destinatários do conjunto desses recursos, estão
identificados no quadro a seguir, cabendo registrar que, em função do tempo decorrido entre a realização das operações e a
elaboração deste trabalho, não foi possível identificar algumas fontes e destinos.
[...]**
Brasília(DF), 04 de outubro de 2002.
(...).”
A defesa do acusado busca apoio na manifestação do agente policial, no sentido de que não haveria condições de se afirmar
que o denunciado teria cometido o delito. É que o agente policial afirmara que não seria possível individualizar condutas (fls. 1.0001.010). Trata-se, entretanto, como bem registra o Ministério Público Federal, de mera opinião manifestada pelo agente do órgão
policial. Está na manifestação do Ministério Público Federal, fl. 1.416 do volume VI:
“(...)
5. De fato, a polícia federal — em relatório confeccionado por agente de polícia — concluiu não ser possível
individualizar condutas (fls. 1000/1010). Pouco importa! É totalmente irrelevante para o oferecimento da peça acusatória a
‘opinião’ do órgão policial. O Ministério Público, como titular privativo da ação penal pública, é que detém a tarefa de
avaliar os fatos trazidos aos autos e formar livremente sua convicção, vale dizer, concordando ou não com o relatório
produzido pela polícia judiciária. Diga-se, a propósito, que as investigações que duraram quase 3 (três) anos só foram
concluídas depois do excelente trabalho realizado pelo Banco Central, cujo relatório a defesa busca desdenhar.
(...).” (Fl. 1.416)
Sustenta-se, também, ocorrer coisa julgada: os fatos que deram suporte à denúncia foram objeto de outros procedimentos, já
arquivados. O Tribunal de Justiça do Pará deferiu, em 1993, habeas corpus para impedir seu indiciamento em inquérito policial
instaurado para apurar o desvio de recursos do BANPARÁ.
A alegação não tem procedência.
A decisão que manda arquivar inquérito ou peças de informação “não causa preclusão, sendo uma decisão tomada rebus sic
stantibus, que não produz coisa julgada”, segundo a lição de Mirabete (“Cód. de Proc. Penal Interpretado”, 3ª ed., Ed. Atlas, 1995,
p. 57). No mesmo sentido a Súmula 524-STF. Com propriedade, rebate o Ministério Público Federal a alegação da defesa:
“(...)
8. O presente inquérito - INQ 1769 - foi instaurado em 07.08.2001 - em data posterior à manifestação do então ViceProcurador-Geral da República - atendendo a requerimento do Ministério Público Federal, e fundou-se na existência de
provas novas. A respeito deste fato, o pedido de instauração de inquérito exaustivamente relatou todas as investigações
anteriores a que se refere a defesa e apontou com clareza a existência de provas novas a ensejar a reabertura do caso. Para
que não se torne repetitivo sugere-se a leitura dos itens 33 a 57 (fls. 27 a 34), dos quais destacamos alguns verbis:
‘41. Ressalte-se, por oportuno, que é neste momento que surgem fatos novos aptos a ensejar o presente
requerimento de instauração de inquérito penal, pois somente agora, foi possível identificar, com objetividade, os
beneficiários do esquema de desvio de recursos do Banco Estadual do Pará.
42. Por meio do Ofício PRESI 2001/1836, de 19/07/2001, o Presidente do Banco Central apresentou os
servidores daquela autarquia, Srs. ANTÔNIO PEREIRA DE SOUZA e NELSON RODRIGUES DE OLIVEIRA, para
auxiliar nos trabalhos de apuração.
43. Posteriormente, o Presidente do BACEN, por meio dos Ofícios PRESI 2001/1922 e 2001/1937,
respectivamente datados de 27 de julho e 30 de julho, ambos de 2001, esclareceu uma série de questões pertinentes à
matéria. São estes os elementos novos que reputo imprescindíveis para abertura do presente inquérito. Note-se que o
Ministério Público Federal não dispunha destes novos fatos em maio de 2001 [data do último arquivamento]
44. Nos ofícios antes mencionados, o Banco Central esclarece os percursos do dinheiro desviado, bem como
aponta de maneira inquestionável a participação do Senador JADER BARBALHO nas irregularidades praticadas no
BANPARÁ em 1984. Anexo ao Ofício PRESI-2001/1937, a mim dirigido, encontra-se cópia de um quadro
demonstrativo elaborado pelos citados técnicos da autarquia no final de junho do corrente ano, descrevendo o
caminho percorrido pelos cheques administrativos do Banco Estadual, informando a composição das aplicações e
resgates dos recursos desviados em títulos de renda fixa ao portador.
45. Essas percucientes informações prestadas agora pelo Banco Central do Brasil, somadas à Nota Técnica nº
019/2001, elaborada pela da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, de 2/08/2001,
deixam absolutamente claro o fato de que, somente agora, dispõe esta Procuradoria-Geral da República de
elementos novos aptos a embasar o presente requerimento de instauração de inquérito penal originário.
46. Noutro giro, cumpre tecer algumas considerações acerca do Inquérito Policial n.º 900765644, instaurado
pela Portaria nº 023/90-DO/DOPS da SSP-PA e arquivado pela Justiça do Estado do Pará. Tal inquérito teve seu
objeto de investigação delimitado à apuração tão-somente da emissão dos cheques n.º 84/034, 84/035 e 84/036. As
razões para a reabertura deste procedimento, sim, implicam a demonstração da presença de novas provas, de que se
tem notícia, tal como estabelece o art. 18, do Código de Processo Penal, e a Súmula n.º 524, desse Excelso Pretório.’
(fls. 29/30).
9. Portanto, descabe assinalar a ocorrência de coisa julgada. Aliás, bem ressaltou a auditoria do Banco Central que
somente agora, com a quebra do sigilo bancário determinada por V. Exª. é que foi possível reconstituir todos os fatos
criminosos, verbis:
‘Por determinação do E. Supremo Tribunal Federal, foram efetuadas diligências junto a diversas Instituições
Financeiras no sentido de se apurar e identificar a titularidade e os beneficiários das diversas; aplicações em Títulos
de Renda Fixa ao portador efetuadas na Agência 0532-Rio/Jardim Botânico do Banco Itaú S.A, cujos recursos
financeiros tiveram origem, em parte, nos desvios ocorridos no Banco do Estado do Pará S.A - BANPARÁ,
notadamente nos meses de outubro a dezembro de 1984.
Também foi determinado oficiar o extinto Banco Econômico S.A para que remetesse toda a documentação
relativa a um dos cheques desviados do BANPARÁ, o de nº 84/029, de 01/11/84, compensado na Agência Nazaré em
Belém/PA.
A quebra do sigilo bancário foi autorizada de forma ampla de modo a permitir que se definissem os autores
das ordens de aplicação/resgate, nome e CPF dos proprietários das contas de onde teriam saído os recursos para
aplicação, bem como das contas onde os resgates teriam sido depositados.’ (fls. 3.476 - apenso 35)
10. Está demonstrada, pois, a existência de provas novas somente agora obtidas e devidamente analisadas pelo órgão
técnico competente. Ademais, se a verificação da coisa julgada é tão patente como alega a defesa indaga-se por que não foi
impetrado habeas corpus, para trancar o inquérito policial, quando da abertura do presente procedimento investigatório há
3 anos?
(...).” (Fls. 1.417-1.418)
Sustenta a defesa, também, a inépcia da denúncia, que não teria observado o art. 41 do Código de Processo Penal,
“porquanto não indica as circunstâncias pelas quais o desvio teria sido perpetrado, limitando-se a sustentar, com muita
dificuldade, que o acusado teria sido beneficiário dos recursos apropriados indevidamente.” (fl. 1.068).
Não procede o alegado.
A denúncia é minuciosa, contendo os requisitos inscritos no art. 41 do CPP. Ela expõe o fato tido como criminoso, com todas
as suas circunstâncias, descrevendo crime em tese.
No ponto, escreve o Ministério Público Federal, pelo seu ilustre Chefe, o Prof. Cláudio Fonteles:
“(...)
13. Narra a acusação que no ano de 1984, o hoje Deputado Federal JADER BARBALHO, então na condição de
Governador do Estado do Pará, apropriou-se de dinheiro pertencente ao Banco do Estado do Pará S.A. - BANPARÁ em
esquema criminoso minuciosamente relatado pelo Banco Central do Brasil em documento acostado a fls. 3.467/3.882 apensos 35/36. Aponta a narrativa acusatória precisamente o desvio de 10 (dez) cheques administrativos do BANPARÁ que
compuseram, em parte, as aplicações financeiras em Títulos de Renda Fixa, na modalidade ‘ao portador’, na Agência 0532
(Jardim Botânico-RJ) do Banco Itaú, depositados nas seguintes datas: 17/10, 23/10, 07/11, 08/11, 29/11 e 07/12/1984.
Aborda a sistemática de utilização dos cheques administrativos desviados e estabelece com nitidez o vínculo entre os desvios
perpetrados e o acusado, especialmente nos itens 6 e 7 (fls. 4/5). Comprova de forma categórica a presença do Sr. JADER
BARBALHO na agência do Jardim Botânico-RJ nos dias em que as operações foram realizadas, conforme anotação e
assinatura consignadas no Registro de Aberturas Normais do Cofre Particular n° 144 (fls. 3.948 - apenso 37). A denúncia,
pois, individualiza o comportamento criminoso do acusado concluindo:
‘12. Dessume-se, portanto, que o denunciado, agindo com vontade livre e consciente, dirigida à produção do
resultado criminoso, nos dias 17/10, 23/10, 07/11, 08/11, 29/11 e 07/12/1984, apropriou-se de Cr$ 2.481.733.548,00,
valor correspondente a US$ 913.315,86, dinheiro pertencente ao Banco do Estado do Pará S.A. - BANPARÁ,
instituição financeira então pertencente ao Estado do Pará, em proveito próprio. Está, pois, incurso nas penas dos
art. 312, caput, c/c o art. 327, § 2° ambos do Código Penal, por dez vezes.’ (fls. 7).
14. Tem-se, pois, a exposição do fato criminoso, suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a classificação do
crime.
(...).” (Fl. 1.419)
Ademais, o desmembramento do feito relativamente aos acusados que não gozam do foro por prerrogativa de função — que
não têm, portanto, foro privilegiado — em nada prejudica a denúncia formulada. Vale transcrever, também nesta parte, a
manifestação do Ministério Público Federal:
“(...)
15. Com relação ao argumento de que o desmembramento do feito requerido pelo Ministério Público Federal em
relação às pessoas que não gozam de foro por prerrogativa de função, tal circunstância em nada prejudica a denúncia
formulada. Primeiro, pelo singelo fato do denunciado ser o único com direito ao foro por prerrogativa de função a ser
julgado por esse Excelso Supremo Tribunal Federal. Em segundo lugar, não há qualquer contradição em se afirmar que o
único efetivamente beneficiário do esquema criminoso foi o ora denunciado JADER FONTENELLE BARBALHO. A
participação ou não das demais pessoas citadas no presente inquérito nos fatos delituosos é tarefa, agora, da justiça
estadual do Pará. Vale dizer, para o Ministério Público Federal não resta qualquer dúvida da prática de crime pelo
denunciado, tanto é que ofereceu a denúncia, o mesmo não podendo ser dito em relação aos demais. Em suma, refuta-se a
preliminar suscitada.
(...).” (Fl. 1.420)
Sustenta o acusado, ainda, que o relatório do Banco Central teria sido manipulado e contém imprecisões técnicas. Essa é uma
questão que deverá ser objeto da instrução criminal, vale dizer, deverá ser apreciada no contexto probatório.
A alegação da ocorrência de prescrição não procede. É que os fatos, segundo a defesa, estariam a tipificar crime contra o
Sistema Financeiro Nacional e estaria mencionado delito prescrito.
No ponto, assim se manifestou o Ministério Público Federal:
“(...)
16. Aduz a defesa, também como preliminar, a ocorrência da prescrição, pois os fatos teriam correspondência fática
no art. 5° da Lei n° 7.492/86 e não no art. 312 c/c o art. 327, § 2°, ambos do CP. Alega também a impossibilidade de se
aplicar o conceito de função de direção à Governador de Estado.
17. Não há que se sustentar a ocorrência na hipótese de crime contra o sistema financeiro nacional. Disciplina o art.
25 da Lei n° 7.492/86, de forma restrita, quais são os sujeitos ativos dos crimes próprios dó sistema financeiro nacional:
‘Art. 25 - São penalmente responsáveis, nos termos desta lei, o controlador e os administradores de
instituição financeira, assim considerados os diretores, gerentes.
Parágrafo único - Equiparam-se aos administradores de instituição financeira o interventor, o liquidante ou o
síndico.’ (grifo nosso).
18. Não está abrangido no dispositivo legal o Governador de Estado. Esse Supremo Tribunal Federal já reconheceu
a inaplicabilidade da Lei n° 7.492/86 à Estado da Federação, não cabendo responsabilizar Governadores e Secretários de
Estado à luz desse diploma legal. A ementa do acórdão, relatado por V. Exa., está assim disposta verbis:
‘EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. PRECATÓRIOS. SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL:
CRIMES: Lei 7.492, ‘de 1986. artigos 5º, 6° e 7º, II. FALSIDADE IDEOLÓGICA: CÓDIGO PENAL, art. 299,
parágrafo único: DISPENSA IRREGULAR DE LICITAÇÃO: Lei 8.666/93, art. 5°.
I. - Apreciação da denúncia relativamente ao parlamentar que é titular de foro por prerrogativa de função no
Supremo Tribunal Federal.
II. - Delito inscrito tio art. 7°, 11, da Lei 7.492/86: inépcia da denúncia, tio ponto.
III. - Delitos contra o Sistema Financeiro Nacional: Lei 7.492/86, arts. 5°, 6° e 7º, II: impossibilidade de o
Estado ser equiparado a uma instituição financeira: Lei 7.492/86, art. 1º, parágrafo único: o Estado, ao emitir
títulos da dívida pública (Letras Financeiras do Estado) e colocá-las no mercado, para obter recursos para o
Tesouro, não atuou como se fosse instituição financeira. Na aplicação da lei penal, vigora o princípio da reserva
legal. Somente os entes que se enquadrem no conceito de instituição financeira, definidos no art. 1º e parágrafo
único da Lei 7.492/86, é que respondem pelos tipos penais nela estabelecidos.
IV. - Falsidade ideológica: C.P., art. 299, parágrafo único: a terceiros é atribuída a escrituração dos dados
que continham erros, certo que os precatórios pendentes de pagamento não foram levantados pelo acusado,
Secretário de Estado, mas por equipes de diversos órgãos, que teriam cometido as erronias e os equívocos.
Impossibilidade de ser responsabilizado o Secretário de Estado pela prática do fato, a menos que fosse possível a
invocação da responsabilidade objetiva, inadmissível em matéria penal. V. - Delito do art. 89 da Lei 8.666/93:
dispensa irregular de licitação: inocorrência de prova no sentido de que o Secretário de Estado haja determinado,
pessoalmente, o ato. Também aqui, ter-se-ia fato de terceiro.
VI. - Denúncia rejeitada. Extensão da decisão aos demais denunciados pelos delitos contra o Sistema
Financeiro Nacional: Lei 7.492/86, artigos 5° 6° e 7°, II.” (INQ 1690-PE, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, DJ
30.04.2004, grifo nosso).
19. Quanto à interpretação do mencionado art. 25, V. Exa. sustentou que:
‘Tal interpretação, que vê no art. 25 da Lei 7.492/86 unia norma de presunção absoluta de responsabilidade penal,
readmite a proscrita responsabilidade penal objetiva e é manifestamente infringente do direito penal em vigor, informado
pelo princípio do nullum crimen sine culpa, que requisita, como pressuposto, já ao nível da conduta e, pois, da tipicidade, a
efetiva prática ou a participação da e na ação criminosa, em última análise afirmadas desnecessárias.’ (fls. 329/330 do
voto).
20. Vale dizer, o Governador não era diretor, gerente, interventor, liquidante ou o síndico do BANPARÁ S.A., que
contava com diretoria própria. O acusado agiu na qualidade de chefe da administração estadual, caracterizando, portanto,
o crime de peculato e não o delito previsto no art. 5º da Lei nº 7.492/86. Da mesma forma que se apropriou de dinheiro
pertencente ao Banco Estadual poderia ter se apropriado de valores ou bens de qualquer outro órgão público que tinha
ingerência hierárquica. Em resumo, o fato de ter se apropriado de cheques administrativos do BANPARÁ S.A. não faz com
que o denunciado se enquadre como sujeito ativo de crimes contra o sistema financeiro nacional.
(...).” (Fls. 1.420-1.422)
Correto o entendimento.
A Lei 7.492, de 1986, art. 5º, posterior à ocorrência dos fatos, no art. 25, estabelece quais são os sujeitos ativos dos crimes
próprios do Sistema Financeiro Nacional: o controlador e os administradores de instituição financeira, assim considerados os
diretores, gerentes, a estes equiparados o interventor, o liquidante ou o síndico (art. 25, parág. único).
No caso, tem-se o Governador do Estado do Pará, que não era diretor, gerente, liquidante, interventor ou síndico.
A alegação no sentido da impossibilidade de aplicação, no caso, do disposto no § 2º do art. 327 do Código Penal (causa de
aumento de pena) não tem procedência.
No ponto, assim se manifestou o Ministério Público Federal:
“(...)
21. No tocante à causa de aumento de pena prevista no § 2° do art. 327 do CP, na cota que acompanhou a denúncia
está expressamente consignado:
‘10. Cabe neste momento, ainda, algumas observações quanto à causa de aumento de pena prevista no art.
327, § 2º, do CP, acrescentada pela Lei n° 6.799/80 - quando o crime for cometido por ocupante de função de
direção de órgão da administração direta - descrita na denúncia.
11. É oportuno frisar que o BANPARÁ, à semelhança dos demais bancos estaduais, apresenta-se conto
instituição financeira de peculiar feição: consiste em agente do desenvolvimento sócio-econômico do Estado do Pará.
Cuida-se de sociedade de economia mista, com participação do Poder Público e de particulares no seu capital e na
sua administração. Integra, vale dizer, a Administração indireta, sendo espécie do gênero paraestatal, na medida em
que sua criação adveio do próprio Estado, e ao lado do Estado e sob seu controle desempenha as atribuições de
interesse público que lhes foram cometidas (a respeito, Cf. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo
brasileiro. 21ª edição. São Paulo: Malheiros, 1996, páginas 331/339).
12. A situação jurídica do BANPARA tem conto consectário inexorável a participação ativa do Poder Público
na vida e realização da empresa: isto é, reserva-se ao Estado o poder de atuar nos negócios sociais.
13. Essa feição peculiar de que se reveste o BANPARA. assim como todos os bancos estaduais, confere ao
Governador do Estado - chefe do Poder Executivo Estadual - poder de direcionamento e atuação nos seus negócios.
Aliás, foi o próprio JADER BARBALHO, na condição de Governador do Estado do Pará, que nomeou os dirigentes
do BANPARÁ (vide depoimentos dos funcionários do banco). Portanto, resta demonstrada na denúncia a referida
causa de aumento.’ (fls. 1.020/1.021)
22. Não há como, portanto, afastar o Governador de Estado, Chefe de Governo da administração estadual,
autoridade máxima do Poder Executivo Estadual, do conceito de ‘ocupante de função de direção de órgão da administração
direta’ inserto no já mencionado § 2° do art. 327 do Código Penal.
(...)”. (Fls. 1.422-1.423)
Correto o entendimento.
Com efeito.
A regra do § 2º do art. 327 do Código Penal é que a pena será aumentada da terça parte quando o autor do crime for ocupante
de cargo em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista,
empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.
Numa interpretação literal do texto, poder-se-ia concluir que o governador, denunciado pelo crime de peculato, não se
incluiria no dispositivo legal indicado.
Ter-se-ia, com isso, mera interpretação literal. Todavia, a interpretação literal não é interpretação, mas simples leitura do
texto a ser interpretado. A partir dessa leitura, passa-se, então, à interpretação. Esta exige, primeiro que tudo, que se busque a ratio
do texto interpretando, a fim de que seja realizada a sua finalidade. É o que procuraremos fazer. O governador, o prefeito, o
presidente da República, enfim, qualquer autoridade pública pode ser sujeito do crime de peculato. É dizer, tais autoridades estão na
cabeça do art. 312 do Código Penal. Indaga-se agora: qual a razão da regra do § 2º do art. 327 do Código Penal? A razão é esta:
quem exerce cargo em comissão geralmente exerce cargo de direção. Esse servidor tem, pois, relativamente aos servidores que
chefia, responsabilidade maior, e maior, evidentemente, poder de disposição dos bens públicos. Se é assim relativamente ao servidor
que ocupa cargo em comissão, o que dizer exercentes dos cargos de chefia do executivo, do prefeito, do governador ou do
Presidente da República? Evidentemente que esses dirigentes superiores da administração pública têm responsabilidade muito maior
do que o mero exercente de cargo em comissão, do detentor de DAS. E o poder de disposição dos bens públicos, que detêm é,
também, muito maior do que o do mero exercente de cargo em comissão, do mero detentor de DAS.
Observada, então, a ratio legis, a razão da norma inscrita no § 2º do art. 327 do Código Penal, forçoso é convir que está o
governador nela incluído.
O raciocínio acima não implica interpretação analógica ou extensiva, mas, simplesmente, interpretação compreensiva do
texto. Está-se, simplesmente, interpretando a norma, observada a sua razão e a sua finalidade.
Afasto, destarte, a alegação no sentido de que não seria aplicável, no caso, a regra do § 2º do art. 327 do Código Penal.
As demais alegações postas na defesa dizem respeito ao mérito da ação penal e somente serão esclarecidas na instrução
criminal, com a realização das provas requeridas, como bem deixou expresso o Ministério Público Federal:
“(...)
24. A defesa pretende, na realidade, examinar todo o conjunto probatório carreado aos autos, o que certamente não
se coaduna com o presente momento processual de delibação quanto ao recebimento da denúncia. De toda sorte, não
procedem os argumentos trazidos pela defesa.
25. Em primeiro lugar, indaga a defesa como ‘poderia o denunciado ter se beneficiado dos recursos como alega a
acusatória, se os valores dos Cheques administrativos representam a quinta parte dos recursos movimentados pelo
Denunciado’ (fls. 1086). Não há qualquer contradição. Nunca afirmou o Ministério Público Federal, em sua acusação, que
o montante de recursos aplicados nos Títulos de Renda Fixa tenham sido exclusivamente fruto dos cheques administrativos
apropriados do BANPARÁ. Ao contrário, sempre se asseverou que o dinheiro desviado do banco estadual fazia ‘parte’ das
aplicações. Leia-se, a respeito, o item 2 da denúncia:
‘2. Resta nitidamente comprovado nos autos que foram desviados 10 (dez) cheques administrativos do
BANPARÁ que compuseram, em parte, as aplicações financeiras em Títulos de Renda Fixa (..)’ (fls. 3 grifo nosso).
26. Portanto, não há qualquer contradição em se afirmar que o denunciado se apropriou de US$ 913.315,86
pertencentes à instituição financeira estadual, que somados a inúmeros outros valores — pouco importando a origem —
compuseram as aplicações em Títulos de Renda Fixa. Isto está claro na denúncia e muito bem assinalado no relatório do
Banco Central, especialmente a fls. 3882 do apenso 36. Se ao final das inúmeras aplicações e reaplicações o denunciado
obteve ganhos muitos maiores, tal fato em nada afasta sua responsabilidade pessoal pela apropriação de quantia
pertencente ao BANPARÁ.
27. Ademais, o próprio denunciado admite que esteve presente pessoalmente na agência do Jardim Botânico (fls.
1089) nos dias em que foram depositados os cheques desviados do BANPARÁ. Ora, Excelência, só a presença deste indício
seria causa bastante (fumus boni juris) para o recebimento da vestibular acusatória. É de se perguntar: por que cheques do
banco estadual do Pará estavam sendo depositados numa agência de instituição financeira privada, na cidade do Rio de
Janeiro, exatamente nos dias em que o Sr. JADER BARBALHO, então Governador do Estado do Pará, lá esteve presente?
Pergunta, que não cala, não a responde a defesa!
(...).” (Fls. 1.423-1.424)
O que deve ser reconhecido, no caso, é que a denúncia descreve crime em tese, crime de peculato inscrito no art. 312 do
Código Penal. Sujeito ativo do crime de peculato é o funcionário público, considerado este no seu conceito amplo (Código Penal,
art. 327). No que toca ao tipo objetivo do delito, “no peculato próprio, definido no caput do art. 312, as condutas típicas
constituem-se em apropriação ou desvio. No peculato apropriação, o agente se dispõe a fazer sua a coisa de que tem a posse
legítima, pressuposto do crime. Se ilegítima, ou se o bem não está sob a guarda da Administração pode ocorrer outro delito. No
conceito de posse inclui-se não só a detenção material como o poder de disposição dos bens” (Júlio Fabrini Mirabete, “Código
Penal Interpretado”, Ed. Atlas, 2ª ed., 2001, pág. 1.904). Tratando-se de peculato, basta o dolo genérico, vale dizer, a vontade
consciente de apropriar-se do dinheiro de que o agente tem a posse ou o poder de disposição, consumando-se o delito de peculato
apropriação quando o servidor público “torna seu o dinheiro, valor ou bem móvel de que tem a posse em razão do cargo, ou seja,
passa a dispor do objeto material como se fosse seu” (Mirabete, ob. cit., pág. 1.913).
No caso, vale repetir, a denúncia descreve crime em tese, pelo que deve ser recebida.
De todo o exposto, recebo a denúncia.
VOTO (EXPLICAÇÃO): Srs. Ministros, qual é a ratio legis dessa norma? Parece-me a seguinte: aquele que tem a função de
direção, evidentemente que tem maior responsabilidade e facilidade em apropriar-se do dinheiro público. Ora, dizer que somente o
ocupante do DAS, cargo em comissão, de função de direção ou assessoramento de órgão da Administração direta estaria sujeito a
essa regra, e que não estaria sujeito a essa regra o prefeito ou o governador do estado, enfim, a autoridade que tem maior
disponibilidade dos bens públicos, não me parece correto, nem justo. Na verdade, essa interpretação da norma não me parece
correta. É interpretar a norma sem buscar-lhe a razão, a finalidade.
Ouvi, com a maior atenção, a sustentação do eminente Advogado, Professor Malheiros, que tenho razões para admirar.
Porém, com a vênia devida a Sua Excelência, penso que tem aplicação, às inteiras, no caso, a norma do § 2º do artigo 327 do Código
Penal.
Aliás, o eminente Procurador-Geral disse que já teria sustentado tese contrária, mas, como bem afirmou, “somente os tolos
não se reconsideram”. S. Exa. se reconsiderou e, a meu juízo, fez bem em fazê-lo.
* acórdão pendente de publicação
** suprimido tabela, constante do texto, por incompatibilidade com a formatação adotada pelo Informativo.
Homologação de Sentença Estrangeira - Incompetência Superveniente do STF - EC 45/2004 (Transcrições)
SEC 5778/Estados Unidos da América*
RELATOR: MINISTRO CELSO DE MELLO
EMENTA: HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA E CONCESSÃO DE “EXEQUATUR” ÀS CARTAS
ROGATÓRIAS PASSIVAS. EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO NORMATIVO DESSE TEMA NO DIREITO
POSITIVO BRASILEIRO (IMPÉRIO/REPÚBLICA). LIMITES AO PODER DE DELIBAÇÃO DO TRIBUNAL DO
FORO. SISTEMA DE CONTENCIOSIDADE LIMITADA. DOUTRINA. JURISPRUDÊNCIA. PROMULGAÇÃO DA
EC 45/2004. INCIDÊNCIA IMEDIATA DA NOVA REGRA DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL.
SUPERVENIENTE CESSAÇÃO DA COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
ATRIBUIÇÃO JURISDICIONAL AGORA DEFERIDA AO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (CF, ART. 105, I,
“I”). INAPLICABILIDADE, AO CASO, DO POSTULADO DA “PERPETUATIO JURISDICTIONIS” (CPC, ART. 87,
“IN FINE”). REMESSA IMEDIATA DOS AUTOS AO E. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
DECISÃO: Trata-se de ação de homologação de sentença estrangeira que foi ajuizada, originariamente, perante o Supremo
Tribunal Federal, em momento anterior ao da promulgação da EC 45/2004, que atribuiu, ao E. Superior Tribunal de Justiça,
competência para processar e julgar “a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias”
(CF, art. 105, I, “i”).
Cabe relembrar, a título de registro histórico, que, durante o Império, por efeito de mera lei ordinária (Lei nº 2.615, de
1875), e, também, do Decreto nº 6.982, de 1878, elaborado pelo Conselheiro LAFAYETTE RODRIGUES PEREIRA, a atribuição
para homologar sentenças estrangeiras cíveis ou comerciais inseria-se na esfera de competência dos Juízes e Tribunais nacionais
que fossem competentes para julgar a causa, se esta houvesse sido ajuizada em território brasileiro.
Com a proclamação da República, e ante a omissão da Constituição Federal de 1891, que nada dispôs a respeito, foi
editada, pelo Congresso Nacional, a Lei nº 221, de 1894, que outorgou, ao Supremo Tribunal Federal, competência, para, em
instância de mera delibação, homologar, ou não, as sentenças estrangeiras que fossem submetidas à sua apreciação.
Daí o registro feito por AGUSTINHO FERNANDES DIAS DA SILVA, que, em obra monográfica destinada à análise do
tema (“Direito Processual Internacional”, p. 26/27, item n. 21, 1971, Rio de Janeiro), deixou consignada a seguinte observação:
“A Constituição de 1891 omitiu a homologação das sentenças estrangeiras, que a jurisprudência, porém, estabeleceu
estar implícita na competência do Supremo Tribunal Federal. Essa omissão foi sanada pela Constituição de 1934 (...),
tornando firme, do ponto de vista constitucional, a competência da Corte Suprema para homologar as sentenças
estrangeiras, conforme dispunha a Lei n. 221, de 1894.” (grifei)
A Lei Fundamental de 1988 - observando uma tradição de nosso constitucionalismo republicano, que foi inaugurada pela
Constituição de 1934 (art. 76, I, g) e mantida, até a promulgação da EC 45/2004, pelos ordenamentos constitucionais subseqüentes
– atribuiu, ao Supremo Tribunal Federal, competência originária para homologar a sentença estrangeira que não se revelasse
ofensiva à soberania nacional, à ordem pública e aos bons costumes (CF, art. 102, I, h; RISTF, art. 216).
O Supremo Tribunal Federal, no exercício dessa competência, dispunha de poderes limitados, pois não lhe cabia rejulgar o
litígio decidido em outro país, considerado o sistema de delibação consagrado pelo ordenamento positivo brasileiro, incompatível
- segundo o magistério de JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA (“Temas de Direito Processual – Quinta Série”, p. 154/155,
1994, Saraiva) – com a revisão de fundo do ato sentencial estrangeiro.
Esse entendimento, apoiado em autorizado magistério doutrinário (HERMES MARCELO HUCK, “Sentença estrangeira e
Lex Mercatoria”, p. 45, 1994, Saraiva; YUSSEF SAID CAHALI, “Dos Alimentos”, p. 860, 2ª ed., 1993, RT, v.g.), sempre
prevaleceu na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
“SENTENÇA ESTRANGEIRA - HOMOLOGAÇÃO - SISTEMA DE DELIBAÇÃO - LIMITES DO JUÍZO
DELIBATÓRIO - PRESSUPOSTOS DE HOMOLOGABILIDADE (...).
- As sentenças proferidas por tribunais estrangeiros somente terão eficácia no Brasil depois de homologadas pelo
Supremo Tribunal Federal.
O processo de homologação de sentença estrangeira reveste-se de caráter constitutivo e faz instaurar uma situação
de contenciosidade limitada. A ação de homologação destina-se, a partir da verificação de determinados requisitos fixados
pelo ordenamento positivo nacional, a propiciar o reconhecimento de decisões estrangeiras pelo Estado brasileiro, com o
objetivo de viabilizar a produção dos efeitos jurídicos que são inerentes a esses atos de conteúdo sentencial.
- O sistema de controle limitado, que foi instituído pelo direito brasileiro em tema de homologação de sentença
estrangeira, não permite que o Supremo Tribunal Federal, atuando como Tribunal do foro, proceda, no que se refere ao ato
sentencial formado no Exterior, ao exame da matéria de fundo ou à apreciação de questões pertinentes ao ‘meritum
causae’, ressalvada, tão-somente, para efeito do juízo de delibação que lhe compete, a análise dos aspectos concernentes à
soberania nacional, à ordem pública e aos bons costumes.
Não se discute, no processo de homologação, a relação de direito material subjacente à sentença estrangeira
homologanda.(...).”
(RTJ 175/521-522, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
Cumpre assinalar, de outro lado, que essa mesma orientação jurisprudencial, pertinente à homologação de sentenças
estrangeiras, também foi consagrada, por esta Suprema Corte, em tema de comissões rogatórias passivas:
“CARTA ROGATÓRIA PASSIVA. IMPUGNAÇÃO. SISTEMA DE CONTENCIOSIDADE LIMITADA.
IMPOSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DO MÉRITO DA CAUSA PERANTE O STF. A QUESTÃO DA COMPETÊNCIA
INTERNACIONAL CONCORRENTE DA JUSTIÇA BRASILEIRA. EFETIVAÇÃO, NO BRASIL, DA CITAÇÃO DE
PESSOA AQUI DOMICILIADA. EXEQUATUR CONCEDIDO.
.......................................................
MÉRITO DA CAUSA - IMPOSSIBILIDADE DE SUA DISCUSSÃO NO PROCEDIMENTO ROGATÓRIO SISTEMA DE CONTENCIOSIDADE LIMITADA.
- Em tema de comissões rogatórias passivas - tanto quanto em sede de homologação de sentenças estrangeiras -, o
ordenamento normativo brasileiro instituiu o sistema de contenciosidade limitada, somente admitindo impugnação
contrária à concessão do exequatur, quando fundada em pontos específicos, como a falta de autenticidade dos documentos,
a inobservância de formalidades legais ou a ocorrência de desrespeito à ordem pública, aos bons costumes e à soberania
nacional.
Torna-se inviável, portanto, no âmbito de cartas rogatórias passivas, pretender discutir, perante o Tribunal do foro
(o Supremo Tribunal Federal, no caso), o fundo da controvérsia jurídica que originou, no juízo rogante, a instauração do
pertinente processo, exceto se essa questão traduzir situação caracterizadora de ofensa à soberania nacional ou de
desrespeito à ordem pública brasileira. Precedentes. (...).”
(CR 8.346/Estados Unidos da América, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 26/04/1999)
Ocorre, no entanto, como precedentemente salientado, que o Congresso Nacional, ao promulgar a EC 45/2004, modificou
a regra de competência anteriormente inscrita no art. 102, I, “h” da Carta Política, deslocando, para a esfera de atribuições
jurisdicionais originárias do Superior Tribunal de Justiça, o poder para apreciar as ações de homologação de sentenças
estrangeiras, de um lado, e para conceder “exequatur” às cartas (ou comissões) rogatórias passivas, de outro.
Com efeito, em virtude da superveniência da referida EC 45/2004, acresceu-se, ao inciso I do art. 105 da Constituição da
República, a alínea “i”, cujo conteúdo normativo assim dispõe:
“Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
I - processar e julgar, originariamente:
...................................................
i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias;” (grifei)
Vê-se, desse modo, que a reforma constitucional em questão suprimiu, ao Supremo Tribunal Federal, a sua antiga
competência originária em tema de concessão de “exequatur” e de homologação de sentenças estrangeiras.
Note-se que tal modificação reveste-se de aplicabilidade imediata, alcançando, desde logo, todos os pedidos de concessão
de “exequatur” de cartas rogatórias e de homologação de sentenças estrangeiras, ainda em curso de processamento no Supremo
Tribunal Federal, quando da promulgação da EC 45/2004.
Não se pode perder de perspectiva, neste ponto, que os preceitos constitucionais aplicam-se imediatamente, projetandose, desde o início de sua vigência, com eficácia “ex nunc” (RTJ 155/582-583, Rel. Min. CELSO DE MELLO), salvo disposição em
sentido contrário neles fundada (RTJ 169/271, 272, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
Impende referir, no ponto, porque inteiramente aplicável ao caso ora em exame, o magistério de PONTES DE
MIRANDA (“Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda nº 1 de 1969”, tomo VI/392-393, 2ª ed./2ª tir., 1974, RT):
“As Constituições têm incidência imediata, ou desde o momento em que ela mesma fixou como aquele em que
começaria de incidir. Para as Constituições, o passado só importa naquilo que ela aponta ou menciona. Fora daí, não.
.......................................................
(...) As Constituições (...) incidem imediatamente (...). As regras jurídicas de jurisdição e competência que estão
insertas na Constituição (...) têm incidência imediata.
(...) Em matéria de competência, a entidade estatal que deixou de ser competente viola a Constituição se exerce
qualquer poder, que se atribuiu a outra entidade (...).” (grifei)
Isso significa, portanto, considerado, no tema, o “princípio da imediata incidência das regras jurídicas constitucionais”
(PONTES DE MIRANDA, “Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda nº 1 de 1969”, tomo VI/385, item n. 2, 2ª ed./2ª
tir., 1974, RT), que, a partir de 31/12/2004 (data da publicação da EC 45/2004), cessou, de pleno direito, a competência originária
do Supremo Tribunal Federal, tanto para conceder/denegar “exequatur” às comissões rogatórias passivas, quanto para homologar
sentenças estrangeiras.
É certo que a presente ação de homologação de sentença estrangeira foi ajuizada em momento no qual o Supremo Tribunal
Federal ainda detinha competência originária para processar e julgar pedidos de homologação de atos sentenciais formados no
exterior.
Não obstante presente esse contexto, revela-se inaplicável, ao caso, seja em face da supremacia da norma constitucional,
seja, ainda, em virtude do que dispõe o art. 87, “in fine”, do Código de Processo Civil, o postulado da “perpetuatio jurisdictionis”,
eis que, alterada a competência em razão da matéria, que tem caráter absoluto (como sucede na espécie), torna-se
excepcionalmente relevante a modificação do estado de direito superveniente à propositura da ação.
Tal entendimento é ressaltado pelo magistério da doutrina (ARRUDA ALVIM, “Manual de Direito Processual Civil”, vol.
I, p. 407, 8ª ed., 2003, RT; JOSÉ FREDERICO MARQUES, “Instituições de Direito Processual Civil”, vol. I, p. 428, 1ª ed., 2000,
Millennium; MOACYR AMARAL DOS SANTOS, “Primeiras Linhas de Direito Processual Civil”, vol. I, p. 261, 14ª ed., 1990,
Saraiva), valendo transcrever, a tal propósito, a expressiva lição de HUMBERTO THEODORO JUNIOR (“Curso de Direito
Processual Civil”, vol. I, p. 151, 39ª ed., 2003, Forense):
“Com relação a essas alterações jurídicas, cumpre distinguir entre a competência absoluta e a relativa. Se a
competência já firmada for territorial ou em razão do valor, em nada serão afetadas as causas pendentes. Mas, se for
suprimido o órgão judiciário perante o qual corria o feito, ou se a alteração legislativa referir-se a competência absoluta
(ratione materiae ou de hierarquia), já então os feitos pendentes serão imediatamente alcançados: os autos, em tal caso,
terão de ser encaminhados ao outro órgão que se tornou competente para a causa. O mesmo deve ser observado quando se
tratar de competência funcional.” (grifei)
Cumpre acentuar que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal também perfilha igual orientação:
“Competência.
1) O princípio da ‘perpetuatio jurisdictionis’ (...) sofre as derrogações oriundas da incompetência superveniente,
sendo exemplo desta a matéria relativa à competência absoluta, em razão da matéria.
2) Recurso extraordinário conhecido e provido.”
(RTJ 71/726, Rel. Min. RAPHAEL DE BARROS MONTEIRO - grifei)
Esse entendimento também é compartilhado pelo E. Superior Tribunal de Justiça:
“- Tratando-se de competência funcional, absoluta, abre-se exceção ao princípio da ‘perpetuatio jurisdictionis’.
Precedente da Quarta Turma.”
(REsp 150.902/PR, Rel. Min. BARROS MONTEIRO - grifei)
Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, reconheço a cessação da competência originária do Supremo
Tribunal Federal para apreciar a presente ação de homologação de sentença estrangeira e determino, por tal motivo, a imediata
remessa destes autos ao E. Superior Tribunal de Justiça, em face do que dispõe o art. 105, I, “i”, da Constituição Federal, na
redação dada pela EC 45/2004.
Publique-se.
Brasília, 10 de fevereiro de 2005.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
* decisão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 376
Brasília, 14 a 18 de fevereiro de 2005 Nº 376
Data (páginas internas): 23 de fevereiro de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
MP: Arquivamento de Inquérito e Irretratabilidade
Responsabilidade Solidária de Assessoria Jurídica - 3
ADI: Ação Cautelar e Exceção de Suspeição
Lei Orgânica da Polícia Civil e Modelo Federal
Ausência de Dosimetria e Manutenção de Prisão
Magistratura e Cumulação com Magistério
Férias Coletivas: EC 45/2004 e Prejudicialidade
1ª Turma
Notícia-Crime e Delação Anônima
Sentença de Pronúncia e Eloqüência Acusatória
2ª Turma
Embriaguez ao Volante e Competência
Crime contra o Sistema Financeiro: Fundo de Pensão e Competência
MS Coletivo: Sindicato e Legitimidade Ativa
Contagem de Tempo de Serviço de Trabalhador Rural Menor de 14 Anos
Clipping do DJ
Transcrições
Ilhas Marítimas - Domínio Insular da União - Terras Devolutas - Usucapião (RE 285615/SC)
Contagem de Tempo de Serviço de Trabalhador Rural Menor de 14 Anos (AI 529694/RS)
Prerrogativa de Foro e Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca (Rcl 2417/SC)
PLENÁRIO
MP: Arquivamento de Inquérito e Irretratabilidade
O Tribunal iniciou julgamento de inquérito em que se imputa a Deputado Federal e outro a suposta
prática de delitos contra a liberdade e contra a organização do trabalho (CP, arts. 149; 203, § 1º, I e 207, §
1º), que teriam sido constatados por Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego
na fazenda do parlamentar, da qual o segundo denunciado seria gerente. A defesa sustenta: a) nulidade
das provas que embasam a denúncia porque produzidas pelo MP; b) inexistência de prova nova a
justificar a reabertura de procedimento investigatório anteriormente arquivado pelo PGR; c) atipicidade
quanto aos crimes previstos nos arts. 149 e 203, § 1º, I, do CP e d) ausência de provas em relação ao tipo
do art. 207, § 1º, do CP. A Min. Ellen Gracie, relatora, não admitiu a denúncia, no que foi acompanhada
pelo Min. Eros Grau. Aplicando precedente do Plenário (Inq 2028/BA, acórdão pendente de publicação),
no sentido de que o pedido de arquivamento pelo órgão do Ministério Público possui caráter irretratável,
não sendo passível, portanto, de reconsideração ou revisão, ressalvada a hipótese de surgimento de novas
provas, entendeu que não seria possível considerar, como prova nova, no caso, a tomada dos depoimentos
dos auditores fiscais, coordenadores e responsáveis pelo procedimento administrativo anteriormente
arquivado pelo antecessor do atual Procurador-Geral da República. O julgamento foi suspenso com o
pedido de vista do Min. Joaquim Barbosa.
Inq 2054/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 16.2.2005. (Inq-2054)
Responsabilidade Solidária de Assessoria Jurídica - 3
O Pleno retomou julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Contas
da União que determinara a audiência de procuradores federais, para apresentarem, como responsáveis, as
respectivas razões de justificativas sobre ocorrências apuradas na fiscalização de convênio firmado pelo
INSS, em razão da emissão de pareceres técnico-jurídicos no exercício profissional — v. Informativos
328 e 343. Em voto-vista, o Min. Gilmar Mendes, ressaltando a possibilidade de os procuradores serem
ouvidos em procedimento administrativo, a fim de elucidar eventuais dúvidas acerca de determinado ato
administrativo, concedeu o writ por considerar, com base em precedente da Corte (MS 24073/DF, DJU de
31.10.2003), que os pareceres em questão seriam, quando muito, mero ato de administração consultiva,
não havendo como se extrair dos mesmos a responsabilidade solidária pela má execução do convênio ou
pela falta de prestação de contas por parte do convenente. Após o voto do Min. Eros Grau, acompanhando
o Min. Gilmar Mendes, e do voto do Min. Carlos Britto, acompanhando o relator, pediu vista dos autos o
Min. Cezar Peluso.
MS 24584/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 16.2.2005. (MS-24584)
ADI: Ação Cautelar e Exceção de Suspeição
O Tribunal não conheceu de ação cautelar ajuizada pela Associação dos Notários e Registradores de
Mato Grosso – ANOREG/MT, na qual se pretendia suspender a eficácia da Lei Estadual 8.033/2003 até o
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade contra ela proposta perante o Tribunal de Justiça
daquele Estado ou até o julgamento de sua liminar ou das exceções de suspeição oferecidas na ADI contra
os Desembargadores do referido Tribunal. Considerado o fato de a maioria dos exceptos ter recusado a
argüição de suspeição, entendeu-se que somente após o acolhimento pelo STF dos incidentes, ainda não
remetidos à Corte, é que se firmaria a competência originária desta para o julgamento de qualquer matéria
ligada à questão de fundo da ação. Ressaltou-se, ademais, não poder a medida cautelar, dada a sua
natureza acessória à ação de cognição exauriente a que presta suporte, servir de guarida às argüições de
suspeição, incabíveis no âmbito do processo objetivo de controle normativo abstrato de
constitucionalidade. Vencido o Min. Marco Aurélio em relação à preliminar de conhecimento, que
declinava da competência para que o Tribunal a quo decidisse a ação.
AC 349/MT, rel. Min. Carlos Britto, 16.2.2005. (AC-349)
Lei Orgânica da Polícia Civil e Modelo Federal
O Tribunal iniciou julgamento de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro
contra o inciso X do parágrafo único do art. 118 da Constituição fluminense, que confere status de lei
complementar à Lei Orgânica da Polícia Civil daquele Estado. O Min. Joaquim Barbosa, relator, julgou
procedente o pedido ante a ausência de simetria entre a norma impugnada e a regra prevista no § 7º do art.
144 da CF, que reserva à lei ordinária a disposição sobre matéria concernente à organização e ao
funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública. Considerou, ademais, que a exigência de
lei complementar para disciplinar o assunto deixa de observar o modelo de separação de Poderes tal como
estruturado na Constituição Federal, uma vez que cerceia indevidamente o poder de iniciativa do
Executivo. O voto do relator foi acompanhado pelos Ministros Eros Grau, Gilmar Mendes, Ellen Gracie e
Carlos Velloso. Em divergência, o Min. Carlos Britto votou pela improcedência do pedido, ao
fundamento de que, na espécie, trata-se de matéria para qual a Constituição Federal prevê a competência
legislativa concorrente dos Estados (CF: “Art. 24. ... XVI – organização, garantias, direitos e deveres das
polícias civis.”), salientando ser demasia recusar à Constituição estadual a faculdade para eleger
determinadas matérias como exigentes de uma aprovação legislativa mais qualificada. Acompanharam o
voto dissidente os Ministros Cezar Peluso, Marco Aurélio e Celso de Mello. Após, pediu vista dos autos o
Min. Sepúlveda Pertence.
ADI 2314/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 16.2.2005. (ADI-2314)
Ausência de Dosimetria e Manutenção de Prisão
O Pleno, por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão da Min.
Ellen Gracie que, no exercício da Presidência do STF, negara seguimento a habeas corpus impetrado
contra decisão denegatória de pretensão liberatória apresentada em favor do paciente, proferida pelo Min.
Presidente do STJ, que entendera que, da ordem parcialmente concedida pela 5ª Turma desse Tribunal,
em que se anulara a parte do acórdão do TRF referente à dosimetria da pena, não decorreria, como
conseqüência lógica, a expedição do alvará de soltura. Entendeu-se, consoante jurisprudência reiterada do
STF, que, em razão de haver condenação, não obstante a ausência da dosimetria da pena, persistiria a
obrigatoriedade de recolhimento para efeito de apelação e de manutenção no cárcere até o
restabelecimento da mínima parcela que houve de alteração. Vencidos os Ministros Marco Aurélio,
relator, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso e Gilmar Mendes, que davam provimento ao recurso para
conceder a ordem, por considerar que, não se encontrando, ainda, aperfeiçoado o julgamento da apelação,
haveria de prevalecer o direito assegurado na sentença e não impugnado pelo Ministério Público de o
paciente recorrer em liberdade.
HC 85340 AgR/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ acórdão Min. Ellen Gracie, 17.2.2005.
(HC-85340)
Magistratura e Cumulação com Magistério
O Tribunal, por maioria, referendou liminar concedida pelo Min. Nelson Jobim, Presidente, em ação
direta ajuizada pela AJUFE - Associação dos Juízes Federais do Brasil em face da Resolução 336/2003,
do Conselho da Justiça Federal, para suspender a eficácia da expressão “único(a)” constante do art. 1º da
norma impugnada (Resolução 336/2003: “Art. 1º Ao magistrado da Justiça Federal de primeiro e
segundo graus, ainda que em disponibilidade, é defeso o exercício de outro cargo ou função,
ressalvado(a) um(a) único(a) de magistério, público ou particular.”). Entendeu-se que a fixação ou a
imposição de que haja apenas uma “única” função de magistério não atende, a princípio, ao objetivo da
Constituição Federal que, ao usar, na ressalva constante do inciso I do parágrafo único do seu art. 95, a
expressão “uma de magistério”, visa apenas impedir que a cumulação autorizada prejudique, em termos
de horas destinadas ao magistério, o exercício da magistratura, sendo a questão, portanto, de
compatibilização de horários, a ser resolvida caso a caso. Vencidos, em parte, os Ministros Marco Aurélio
e Carlos Britto, que indeferiam a liminar.
ADI 3126 MC/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.2.2005. (ADI-3126)
Férias Coletivas: EC 45/2004 e Prejudicialidade
Em virtude da superveniência da EC 45/2004 que, ao incluir o inciso XII ao art. 93 da CF (“a
atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo
grau, funcionando, nos dias em que não houver expediente forense normal, juízes em plantão
permanente;”), alterou substancialmente o citado artigo que serviria de padrão de confronto com o ato
impugnado, o Tribunal julgou prejudicado pedido de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela
Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB contra o art. 253 da Lei 12.342/94, do Estado do Ceará
(Código de Divisão e de Organização Judiciária), que restringe o direito dos magistrados de se
ausentarem de suas comarcas durante o período de férias coletivas.
ADI 3085/CE, rel. Min. Eros Grau, 17.2.2005. (ADI-3085)
PRIMEIRA TURMA
Notícia-Crime e Delação Anônima
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se pretende o trancamento, por falta de justa
causa, de notícia-crime, instaurada no STJ, por requisição do Ministério Público Federal, contra juiz
estadual e dois desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado de Tocantins, pela suposta prática do
delito de tráfico de influência (CP, art. 332). Sustenta o impetrante que a atuação do parquet se fez com
base unicamente em denúncia anônima, o que violaria o inciso IV do art. 5º da CF (“IV – é livre a
manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;”) e o disposto nos arts. 144 da Lei 8.112/90 e
14, § 1º, da Lei 8.429/92, no que versam sobre a inidoneidade da denúncia anônima para os fins quer de
instauração de processo administrativo, quer de ação concernente à improbidade administrativa. O Min.
Marco Aurélio, relator, concedeu a ordem por entender que a instauração de procedimento criminal
originada, unicamente, de documento apócrifo seria contrária à ordem jurídica constitucional, que veda
expressamente o anonimato. Salientando a necessidade de se preservar a dignidade da pessoa humana,
afirmou que o acolhimento da delação anônima permitiria a prática do denuncismo inescrupuloso, voltado
a prejudicar desafetos, impossibilitando eventual indenização por danos morais ou materiais, o que
ofenderia os princípios consagrados nos incisos V e X do art. 5º da CF. Ressaltou, ainda, a existência da
Resolução 290/2004, que criou a Ouvidoria do STF, cujo inciso II do art. 4º impede o recebimento de
reclamações, críticas ou denúncias anônimas. Acompanhou o voto do relator o Min. Eros Grau. Após,
pediu vista dos autos o Min. Carlos Britto.
HC 84827/TO, rel. Min. Marco Aurélio, 15.2.2005. (HC-84827)
Sentença de Pronúncia e Eloqüência Acusatória
Com base na jurisprudência reiterada do STF no sentido de que a motivação da pronúncia há de se
restringir, sem excesso de eloqüência acusatória, aos pressupostos da remessa do caso ao Júri (CPP, art.
408), a Turma deferiu, em parte, habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro que confirmara sentença de pronúncia. Entendeu-se que o acórdão recorrido, no
que concerne à autoria dos delitos, transformara a pronúncia em inadmissível juízo de certeza,
incompatível com os limites de sobriedade e comedimento que devem ser observados nessa fase
processual, sob pena de ilegítima influência sobre o ânimo dos jurados. HC deferido para anular o
acórdão impugnado, a fim de que outro seja proferido, e determinar o desentranhamento da decisão
questionada. Precedentes citados: HC 68606/SP (DJU de 21.2.92); HC 69133/MG (DJU de 26.6.92); HC
73126/MG (DJU de 17.5.96); e HC 77044/PE (DJU de 7.8.98).
HC 85260/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 15.2.2005. (HC-85260)
SEGUNDA TURMA
Embriaguez ao Volante e Competência
Compete à Justiça Comum Estadual o julgamento do delito de embriaguez ao volante (Código de
Trânsito Brasileiro, art. 306: “Conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou
substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem”), cuja pena máxima
é de três anos, haja vista não se tratar de crime de menor potencial ofensivo. Com base nesse
entendimento, a Turma deferiu, em parte, habeas corpus para anular acórdão proferido pela Turma
Recursal da Comarca de Barbacena - MG e determinar a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais para o julgamento da apelação como entender de direito. Rejeitou-se, ainda, a
alegação de nulidade absoluta do processo, porquanto o impetrante não demonstrara o prejuízo na adoção
do rito sumaríssimo, restringindo-se a questão à incompetência da Turma Recursal. Precedente citado:
HC 81510/PR (DJU de 12.4.2002).
HC 85019/MG, rel. Min. Ellen Gracie, 15.2.2005. (HC-85019)
Crime contra o Sistema Financeiro: Fundo de Pensão e Competência
A Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus no qual se pretendia a nulidade
do processo, sob a alegação de incompetência absoluta da Justiça Federal para julgar o recorrente por
crime contra o sistema financeiro nacional praticado no exercício de atividades de entidade fechada de
previdência privada. Sustentava-se, na espécie, que pelo fato de a vítima ser um fundo de pensão
multipatrocinado, não haveria qualquer lesão a bens, serviços ou interesses da União, uma vez que esse
seria pessoa jurídica de direito privado de fins previdenciários, assistenciais e não lucrativos, pertencente
ao sistema previdenciário e não ao financeiro. Entendeu-se que não haveria razão de índole legal ou
constitucional para afastar a competência da Justiça Federal para o delito financeiro praticado no âmbito
de instituição previdenciária. Ademais, o fundo de pensão seria uma instituição financeira por
equiparação, nos moldes do disposto na Lei 7.492/86. Asseverou-se, também, que a EC 40/2003, que
dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar, em nada repercutira na citada Lei, sendo que o
envio das entidades fechadas de previdência para o capítulo constitucional reservado à seguridade social
não teve por conseqüência a exclusão de tais instituições do sistema financeiro nacional. Precedentes
citados: RE 198488/SP (DJU de 11.12.98); HC 83729/SC (DJU de 23.4.2004).
RHC 85094/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 15.2.2005. (RHC-85094)
MS Coletivo: Sindicato e Legitimidade Ativa
Sindicato possui legitimidade para, na qualidade de substituto processual, impetrar mandado de
segurança coletivo para a defesa de direitos subjetivos de parcela de seus associados, ainda que tais
direitos não estejam afetos necessariamente à totalidade dos integrantes da categoria. Com base nesse
entendimento, a Turma deu provimento a recurso extraordinário interposto pelo Sindicato dos Servidores
Policiais do Espírito Santo – SINDIPOL contra acórdão do tribunal de justiça local que, em sede de
apelação, julgara extinto, por ilegitimidade ativa, mandado de segurança impetrado pelo recorrente, no
qual se impugnava ato da Diretoria da Academia de Polícia Civil do referido Estado, que oferecera curso
de especialização somente a alguns policiais, com a instituição de gratificação aos escolhidos que viessem
a ser aprovados. Ressaltou-se, ainda, que a anulação de concurso, em tese viciado, apesar de prejudicar os
interesses de pequeno número de sindicalizados, diz respeito à defesa dos direitos da categoria como um
todo, razão pela qual seria legítima a atuação do sindicato para pugnar pela sua legalidade, a fim de
assegurar a todos os eventuais benefícios dele decorrentes, dentro dos princípios da moralidade, igualdade
que, entre outros, devem reger os atos da Administração Pública e de seus agentes. Precedentes citados:
MS 21070/DF (DJU de 22.2.91); MS 20936/DF (DJU de 11.9.92).
RE 284993/ES, rel. Min. Ellen Gracie, 15.2.2005. (RE-284993)
Contagem de Tempo de Serviço de Trabalhador Rural Menor de 14 Anos
A Turma manteve decisão do STJ que reconhecera o cômputo do tempo de serviço prestado por
trabalhador rural menor de quatorze anos para fins previdenciários, independentemente do recolhimento
das contribuições correspondentes a esse período. Considerou-se que o acórdão recorrido está em
consonância com a jurisprudência do STF, no sentido de que a regra proibitiva de trabalho ao menor (CF,
art. 8º, XXXIII) não deve ser interpretada em detrimento deste. Por conseguinte, o recorrido faz jus aos
benefícios previdenciários, ainda que decorrentes de relação de trabalho declarada inválida, haja vista a
inaplicabilidade de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas.
Precedentes citados: AI 105794 AgR/SP (DJU de 2.5.86); RE 104654/SP (DJU de 25.4.86). Leia a
íntegra do voto condutor na seção Transcrições deste Informativo.
AI 529694/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 15.2.2005. (AI-529694)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
16.2.2005
15.2.2005
15.2.2005
Extraordinárias
17.2.2005
——
——
Julgamentos
13
221
237
CLIPPING
DO
DJ
18 de fevereiro de 2005
ADI N. 3105-DF E ADI N. 3128-DF
RELATOR PARA ACÓRDÃO: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTAS: 1. Inconstitucionalidade. Seguridade social. Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e
pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária. Ofensa a direito adquirido no ato de aposentadoria. Não
ocorrência. Contribuição social. Exigência patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade
tributária absoluta. Emenda Constitucional nº 41/2003 (art. 4º, caput). Regra não retroativa. Incidência sobre fatos
geradores ocorridos depois do início de sua vigência. Precedentes da Corte. Inteligência dos arts. 5º, XXXVI, 146, III, 149,
150, I e III, 194, 195, caput, II e § 6º, da CF, e art. 4º, caput, da EC nº 41/2003. No ordenamento jurídico vigente, não há norma,
expressa nem sistemática, que atribua à condição jurídico-subjetiva da aposentadoria de servidor público o efeito de lhe gerar direito
subjetivo como poder de subtrair ad aeternum a percepção dos respectivos proventos e pensões à incidência de lei tributária que,
anterior ou ulterior, os submeta à incidência de contribuição previdencial. Noutras palavras, não há, em nosso ordenamento,
nenhuma norma jurídica válida que, como efeito específico do fato jurídico da aposentadoria, lhe imunize os proventos e as pensões,
de modo absoluto, à tributação de ordem constitucional, qualquer que seja a modalidade do tributo eleito, donde não haver, a
respeito, direito adquirido com o aposentamento. 2. Inconstitucionalidade. Ação direta. Seguridade social. Servidor público.
Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária, por força de
Emenda Constitucional. Ofensa a outros direitos e garantias individuais. Não ocorrência. Contribuição social. Exigência
patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade tributária absoluta. Regra não retroativa.
Instrumento de atuação do Estado na área da previdência social. Obediência aos princípios da solidariedade e do equilíbrio
financeiro e atuarial, bem como aos objetivos constitucionais de universalidade, equidade na forma de participação no
custeio e diversidade da base de financiamento. Ação julgada improcedente em relação ao art. 4º, caput, da EC nº 41/2003.
Votos vencidos. Aplicação dos arts. 149, caput, 150, I e III, 194, 195, caput, II e § 6º, e 201, caput, da CF. Não é
inconstitucional o art. 4º, caput, da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, que instituiu contribuição
previdenciária sobre os proventos de aposentadoria e as pensões dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações. 3. Inconstitucionalidade. Ação direta. Emenda Constitucional (EC nº
41/2003, art. 4º, § único, I e II). Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência
de contribuição previdenciária. Bases de cálculo diferenciadas. Arbitrariedade. Tratamento discriminatório entre servidores
e pensionistas da União, de um lado, e servidores e pensionistas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de outro.
Ofensa ao princípio constitucional da isonomia tributária, que é particularização do princípio fundamental da igualdade.
Ação julgada procedente para declarar inconstitucionais as expressões “cinquenta por cento do” e “sessenta por cento do”,
constante do art. 4º, § único, I e II, da EC nº 41/2003. Aplicação dos arts. 145, § 1º, e 150, II, cc. art. 5º, caput e § 1º, e 60, § 4º,
IV, da CF, com restabelecimento do caráter geral da regra do art. 40, § 18. São inconstitucionais as expressões “cinqüenta por
cento do” e “sessenta por cento do”, constantes do § único, incisos I e II, do art. 4º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de
dezembro de 2003, e tal pronúncia restabelece o caráter geral da regra do art. 40, § 18, da Constituição da República, com a redação
dada por essa mesma Emenda.
* noticiado no Informativo 357
QUEST. ORD. EM ADI N. 3.331-DF
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LIMINAR. QUESTÃO DE ORDEM. SUSPENSÃO DO ART.
2º, CAPUT, I E II; DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 4º; DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 5º E DO ART. 9º DA
RESOLUÇÃO 6/2004 DA PRESIDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS. RITO
DO ART. 12 DA LEI 9.868/1999. Conveniência de julgamento da ação segundo o rito do art. 12 da Lei 9.868/1999 e configuração
do periculum in mora para deferimento de cautelar. Questão de ordem que se resolve com a suspensão de dispositivos do ato
atacado que se referem a prazos para a implementação de suas disposições. Precedente: ADI 3.319-QO.
* noticiado no Informativo 367
MED. CAUT. EM ADI N. 3.369-DF
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: REMUNERAÇÃO: RESERVA DE LEI. CF,
ART. 37, X; ART. 51, IV, ART. 52, XIII. ATO CONJUNTO Nº 01, DE 05.11.2004, DAS MESAS DO SENADO FEDERAL E DA
CÂMARA DOS DEPUTADOS. I. - Em tema de remuneração dos servidores públicos, estabelece a Constituição o princípio da
reserva de lei. É dizer, em tema de remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei, lei específica. CF, art.
37, X, art. 51, IV, art. 52, XIII. II. - Inconstitucionalidade formal do Ato Conjunto nº 01, de 05.11.2004, das Mesas do Senado
Federal e da Câmara dos Deputados. III. - Cautelar deferida.
* noticiado no Informativo 374
Ext N. 897-REPÚBLICA TCHECA
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: EXTRADIÇÃO PASSIVA DE CARÁTER EXECUTÓRIO - INEXISTÊNCIA DE TRATADO DE
EXTRADIÇÃO ENTRE O BRASIL E A REPÚBLICA TCHECA - PROMESSA DE RECIPROCIDADE - FUNDAMENTO
JURÍDICO SUFICIENTE - DUPLA TIPICIDADE - CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DO DELITO DE ESTELIONATO PRETENDIDA NULIDADE DO JULGAMENTO DO EXTRADITANDO, PORQUE ALEGADAMENTE REALIZADO SOB A
ÉGIDE DE REGIME AUTORITÁRIO - INOCORRÊNCIA - ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE “FAIR TRIAL” E DE
JULGAMENTO POLÍTICO - AFIRMAÇÃO INCONSISTENTE - PRETENDIDA DISCUSSÃO SOBRE A PROVA PENAL
PRODUZIDA PERANTE TRIBUNAL DO ESTADO REQUERENTE - INADMISSIBILIDADE - SISTEMA DE
CONTENCIOSIDADE LIMITADA - EXTRADIÇÃO DEFERIDA.
INEXISTÊNCIA DE TRATADO DE EXTRADIÇÃO E OFERECIMENTO DE PROMESSA DE RECIPROCIDADE POR
PARTE DO ESTADO REQUERENTE.
- A inexistência de tratado de extradição não impede a formulação e o eventual atendimento do pleito extradicional, desde que o
Estado requerente prometa reciprocidade de tratamento ao Brasil, mediante expediente (Nota Verbal) formalmente transmitido
por via diplomática. Doutrina. Precedentes.
EXTRADIÇÃO E RESPEITO AOS DIREITOS HUMANOS: PARADIGMA ÉTICO-JURÍDICO CUJA OBSERVÂNCIA
CONDICIONA O DEFERIMENTO DO PEDIDO EXTRADICIONAL.
- A essencialidade da cooperação internacional na repressão penal aos delitos comuns não exonera o Estado brasileiro - e, em
particular, o Supremo Tribunal Federal - de velar pelo respeito aos direitos fundamentais do súdito estrangeiro que venha a
sofrer, em nosso País, processo extradicional instaurado por iniciativa de qualquer Estado estrangeiro.
O extraditando assume, no processo extradicional, a condição indisponível de sujeito de direitos, cuja intangibilidade há de ser
preservada pelo Estado a que foi dirigido o pedido de extradição (o Brasil, no caso).
- O Supremo Tribunal Federal não deve autorizar a extradição, se se demonstrar que o ordenamento jurídico do Estado
estrangeiro que a requer não se revela capaz de assegurar, aos réus, em juízo criminal, os direitos básicos que resultam do
postulado do “due process of law” (RTJ 134/56-58 - RTJ 177/485-488), notadamente as prerrogativas inerentes à garantia da
ampla defesa, à garantia do contraditório, à igualdade entre as partes perante o juiz natural e à garantia de imparcialidade do
magistrado processante. Demonstração, no caso, de que o regime político que informa as instituições do Estado requerente revestese de caráter democrático, assegurador das liberdades públicas fundamentais.
EXTRADIÇÃO E DUPLA TIPICIDADE.
- A possível diversidade formal concernente ao “nomen juris” das entidades delituosas não atua como causa obstativa da
extradição, desde que o fato imputado constitua crime sob a dupla perspectiva dos ordenamentos jurídicos vigentes no Brasil e no
Estado estrangeiro que requer a efetivação da medida extradicional.
O postulado da dupla tipicidade - por constituir requisito essencial ao atendimento do pedido de extradição - impõe que o ilícito
penal atribuído ao extraditando seja juridicamente qualificado como crime tanto no Brasil quanto no Estado requerente, sendo
irrelevante, para esse específico efeito, a eventual variação terminológica registrada nas leis penais em confronto.
O que realmente importa, na aferição do postulado da dupla tipicidade, é a presença dos elementos estruturantes do tipo penal
(“essentialia delicti”), tais como definidos nos preceitos primários de incriminação constantes da legislação brasileira e vigentes
no ordenamento positivo do Estado requerente, independentemente da designação formal por eles atribuída aos fatos delituosos.
PROCESSO EXTRADICIONAL E SISTEMA DE CONTENCIOSIDADE LIMITADA: INADMISSIBILIDADE DE DISCUSSÃO
SOBRE A PROVA PENAL PRODUZIDA PERANTE O TRIBUNAL DO ESTADO REQUERENTE.
- A ação de extradição passiva não confere, ao Supremo Tribunal Federal, qualquer poder de indagação sobre o mérito da
pretensão deduzida pelo Estado requerente ou sobre o contexto probatório em que a postulação extradicional se apóia.
- O sistema de contenciosidade limitada, que caracteriza o regime jurídico da extradição passiva no direito positivo brasileiro
(RTJ 140/436 - RTJ 160/105 - RTJ 161/409-411 - RTJ 170/746-747 - RTJ 183/42-43), não permite qualquer indagação
probatória pertinente ao ilícito criminal cuja persecução, no exterior, justificou o ajuizamento da demanda extradicional perante o
Supremo Tribunal Federal.
Revelar-se-á excepcionalmente possível, no entanto, a análise, pelo Supremo Tribunal Federal, de aspectos materiais concernentes
à própria substância da imputação penal, sempre que tal exame se mostrar indispensável à solução de controvérsia pertinente (a) à
ocorrência de prescrição penal, (b) à observância do princípio da dupla tipicidade ou (c) à configuração eventualmente política
tanto do delito atribuído ao extraditando quanto das razões que levaram o Estado estrangeiro a requerer a extradição de
determinada pessoa ao Governo brasileiro.
* noticiado no Informativo 362
Inq N. 1.958-AC
RELATOR PARA O ACÓRDÃO: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: INQUÉRITO. DENÚNCIA QUE FAZ IMPUTAÇÃO A PARLAMENTAR DE PRÁTICA DE CRIMES CONTRA A
HONRA, COMETIDOS DURANTE DISCURSO PROFERIDO NO PLENÁRIO DE ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA E EM
ENTREVISTAS CONCEDIDAS À IMPRENSA. INVIOLABILIDADE: CONCEITO E EXTENSÃO DENTRO E FORA DO
PARLAMENTO.
A palavra “inviolabilidade” significa intocabilidade, intangibilidade do parlamentar quanto ao cometimento de crime ou
contravenção. Tal inviolabilidade é de natureza material e decorre da função parlamentar, porque em jogo a representatividade do
povo.
O art. 53 da Constituição Federal, com a redação da Emenda nº 35, não reeditou a ressalva quanto aos crimes contra a honra,
prevista no art. 32 da Emenda Constitucional nº 1, de 1969. Assim, é de se distinguir as situações em que as supostas ofensas são
proferidas dentro e fora do Parlamento. Somente nessas últimas ofensas irrogadas fora do Parlamento é de se perquirir da chamada
“conexão como exercício do mandato ou com a condição parlamentar” (INQ 390 e 1.710). Para os pronunciamentos feitos no
interior das Casas Legislativas não cabe indagar sobre o conteúdo das ofensas ou a conexão com o mandato, dado que acobertadas
com o manto da inviolabilidade. Em tal seara, caberá à própria Casa a que pertencer o parlamentar coibir eventuais excessos no
desempenho dessa prerrogativa. No caso, o discurso se deu no plenário da Assembléia Legislativa, estando, portanto, abarcado pela
inviolabilidade. Por outro lado, as entrevistas concedidas à imprensa pelo acusado restringiram-se a resumir e comentar a citada
manifestação da tribuna, consistindo, por isso, em mera extensão da imunidade material. Denúncia rejeitada.
* noticiado no Informativo 327
RE N. 196.184-AM
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
Constitucional. Processual Civil. Mandado de segurança coletivo. Legitimidade ativa AD CAUSAM de partido político. Impugnação
de exigência tributária. IPTU. 1. Uma exigência tributária configura interesse de grupo ou classe de pessoas, só podendo ser
impugnada por eles próprios, de forma individual ou coletiva. Precedente: RE nº 213.631, rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 07/04/2000. 2.
O partido político não está, pois, autorizado a valer-se do mandado de segurança coletivo para, substituindo todos os cidadãos na
defesa de interesses individuais, impugnar majoração de tributo. 3. Recurso extraordinário conhecido e provido.
* noticiado no Informativo 367
RE N. 253.906-MG
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO E FINANCEIRO. REPARTIÇÃO DO ICMS. ART. 158, IV E 161, I, DA CF/88.
RESERVA DE LEI COMPLEMENTAR. USINA HIDRELÉTRICA. RESERVATÓRIO. ÁREAS ALAGADAS. 1. Hidrelétrica
cujo reservatório de água se estende por diversos municípios. Ato do Secretário de Fazenda que dividiu a receita do ICMS devida
aos municípios pelo “valor adicionado” apurado de modo proporcional às áreas comprometidas dos municípios alagados. 2.
Inconstitucionalidade formal do ato normativo estadual que disciplina o “valor adicionado”. Matéria reservada à lei complementar
federal. Precedentes. 3. Estender a definição de apuração do adicional de valor, de modo a beneficiar os municípios em que se
situam os reservatórios de água representa a modificação dos critérios de repartição das receitas previstos no art. 158 da
Constituição. Inconstitucionalidade material. Precedentes. 4. Na forma do artigo 20, § 1º, da Constituição Federal, a reparação dos
prejuízos decorrentes do alagamento de áreas para a construção de hidrelétricas deve ser feita mediante participação ou
compensação financeira. Recurso extraordinário conhecido e improvido.
QUEST. ORD. EM RE N. 388.846-SC
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
RECURSO EXTRAORDINÁRIO - DECISÃO DE TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS - ADMISSIBILIDADE § 10 DO ARTIGO 14 DA LEI Nº 10.259/01. Cumpre ao presidente da turma recursal, observado o contraditório, o exercício do
crivo primeiro de admissibilidade do extraordinário, presentes os pressupostos gerais de recorribilidade - adequação, oportunidade,
interesse de agir, preparo e representação processual - e os específicos de que trata o inciso III do artigo 102 da Constituição
Federal, não cabendo a retenção prevista no § 3º do artigo 542 do Código de Processo Civil.
* noticiado no Informativo 360
HC N. 84.367-RJ
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: HABEAS CORPUS. PACIENTE DENUNCIADA POR OMITIR DADO TÉCNICO INDISPENSÁVEL À
PROPOSITURA DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA (ART. 10 DA LEI Nº 7.347/85). ALEGADA NULIDADE DA AÇÃO PENAL,
QUE TERIA ORIGEM EM PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO E INCOMPATIBILIDADE
DO TIPO PENAL EM CAUSA COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Caso em que os fatos que basearam a inicial acusatória
emergiram durante o Inquérito Civil, não caracterizando investigação criminal, como quer sustentar a impetração. A validade da
denúncia nesses casos - proveniente de elementos colhidos em Inquérito civil - se impõe, até porque jamais se discutiu a
competência investigativa do Ministério Público diante da cristalina previsão constitucional (art. 129, II, da CF).
Na espécie, não está em debate a inviolabilidade da vida privada e da intimidade de qualquer pessoa. A questão apresentada é outra.
Consiste na obediência aos princípios regentes da Administração Pública, especialmente a igualdade, a moralidade, a publicidade e a
eficiência, que estariam sendo afrontados se de fato ocorrentes as irregularidades apontadas no inquérito civil. Daí porque essencial
a apresentação das informações negadas, que não são dados pessoais da paciente, mas dados técnicos da Companhia de Limpeza de
Niterói, cabendo ao Ministério Público zelar por aqueles princípios, como custos iuris, no alto da competência constitucional
prevista no art. 127, caput. Habeas corpus indeferido.
HC N. 85.052-MG
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Júri: desaforamento: contraditório: representação do Juízo processada e julgada sem a audiência do defensor do
acusado: nulidade.
* noticiado no Informativo 374
Acórdãos Publicados: 256
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Ilhas Marítimas - Domínio Insular da União - Terras Devolutas – Usucapião (Transcrições)
RE 285615/SC*
RELATOR: MINISTRO CELSO DE MELLO
EMENTA: ILHAS MARÍTIMAS (ILHAS COSTEIRAS OU CONTINENTAIS E ILHAS OCEÂNICAS OU
PELÁGICAS). SANTA CATARINA. ILHA COSTEIRA. USUCAPIÃO DE ÁREAS DE TERCEIROS NELA
EXISTENTES. DOMÍNIO INSULAR DA UNIÃO FEDERAL (CF, ART. 20, IV). POSSIBILIDADE JURÍDICOCONSTITUCIONAL DE EXISTIREM, NAS ILHAS MARÍTIMAS, ÁREAS SUJEITAS À TITULARIDADE
DOMINIAL DE TERCEIROS (CF, ART. 26, II, “IN FINE”). A QUESTÃO DAS TERRAS DEVOLUTAS.
INEXISTÊNCIA DE PRESUNÇÃO “JURIS TANTUM” DO CARÁTER DEVOLUTO DOS IMÓVEIS PELO
SÓ FATO DE NÃO SE ACHAREM INSCRITOS NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. INSUFICIÊNCIA DA MERA
ALEGAÇÃO ESTATAL DE TRATAR-SE DE IMÓVEL PERTENCENTE AO DOMÍNIO PÚBLICO.
AFIRMAÇÃO QUE NÃO OBSTA A POSSE “AD USUCAPIONEM”. NECESSIDADE DE EFETIVA
COMPROVAÇÃO, PELO PODER PÚBLICO, DE SEU DOMÍNIO. DOUTRINA. JURISPRUDÊNCIA.
DOMÍNIO DA UNIÃO FEDERAL NÃO COMPROVADO, NO CASO. POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO.
MATÉRIA DE PROVA. PRONUNCIAMENTO SOBERANO DO TRIBUNAL RECORRIDO. SÚMULA
279/STF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO.
DECISÃO: O presente recurso extraordinário foi interposto contra acórdão, que, confirmado, em sede de embargos de
declaração (fls. 173/176), pelo E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região, está assim ementado (fls. 164):
“USUCAPIÃO – SANTA CATARINA – ILHA COSTEIRA – CONSTITUIÇÃO FEDERAL/1967 – TERRAS
DEVOLUTAS – BEM PÚBLICO.
Em que pese a Constituição Federal de 1988 ter incluído nos bens da União as ilhas oceânicas e as costeiras (art. 20,
IV), a Constituição Federal de 1967 estabeleceu no domínio da União somente as ilhas oceânicas.
Na vigência da Constituição Federal de 1967, as terras sem registro público em nome de particular não se
presumiam devolutas, cabendo à União a prova de que se tratava de bens sobre os quais exercia domínio para que fosse
evitada a usucapião.
Usucapião é modo originário de aquisição da propriedade que se consuma com o implemento do lapso temporal
exigido em lei.
A sentença, em ação de usucapião, tem eficácia meramente declaratória.
Adquirida, por usucapião, sob a égide da CF/67, propriedade situada na ilha costeira de Santa Catarina, e não
provado pela União que se tratava de terra devoluta, não há falar em bem de propriedade da União, insusceptível de
usucapião.” (grifei)
A União, ao deduzir este recurso extraordinário, sustenta que o Tribunal “a quo” teria transgredido o art. 20, IV, da
Constituição Federal.
O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. JOÃO BATISTA DE
ALMEIDA, ao opinar pelo não-conhecimento do apelo extremo, assim resumiu e expôs a controvérsia instaurada nesta sede
recursal (fls. 198/201):
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – DIREITO ADMINISTRATIVO - USUCAPIÃO – TERRAS DEVOLUTAS –
ILHA COSTEIRA – NATUREZA SOB A ÉGIDE DA CONSTITUIÇÃO PRETÉRITA – DOMÍNIO DA UNIÃO NÃO
COMPROVADO - ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO ART. 20, INCISO IV, DA CF/88 – ARESTO QUE SE HARMONIZA
COM O ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE O TEMA - MATÉRIA DE PROVA PRECEDENTE - APLICAÇÃO DO ENUNCIADO DA SÚMULA 279/STF - PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO
DO RECURSO.
......................................................
O recurso não merece prosperar. E isto porque, da leitura do aresto hostilizado, observa-se que, nas instâncias
ordinárias, a rejeição à pretendida violação do preceito constitucional aludido como violado (art. 20, IV, da CF/88)
fundou-se em matéria de fato, que, em sede de recurso extraordinário, torna-se irreversível – Súmula 279/STF, consoante
se pode verificar das seguintes passagens do seu voto condutor, in verbis:
‘Ora, no caso dos autos, a União não fez qualquer prova de sua dominialidade sobre as áreas objeto da
ação. Em sentido contrário, os documentos acostados à inicial levam, inclusive, à presunção de que as terras são
privadas, uma vez que se objetiva usucapir o 1/5 do terreno que não pode ser adquirido através do contrato de
compra e venda, por tratar-se de porção de terra que coube a filho desaparecido na partilha de bens deixados em
herança. A parte restante a ser usucapida, segundo os autores resulta de diferença na metragem oriunda da
precariedade em que se realizavam as medições à época em que foram partilhados os bens. Ainda que tal argumento
não pudesse ser considerado, poder-se-ia presumir que a área usucapida era de propriedade dos lindeiros, os quais
não manifestaram qualquer oposição à ação.
Uma vez não havendo prova de que o bem, sobre o qual incidiu a posse mansa e pacífica dos autores, por
mais de vinte anos, era devoluto, e considerando-se, ainda, que tais fatos se deram sob a vigência da Constituição
Federal de 1967, tem-se que se perfectibilizou a usucapião. Adquirida a propriedade, antes da Constituição de 1988,
o direito deve ser ressalvado e declarada judicialmente a usucapião, para fins de transcrição no Registro de
Imóveis.’ (fls. 161/162)
Por outro lado, no mérito o aresto vergastado harmoniza-se com o entendimento desse Pretório Excelso sobre o
tema, como é possível atestar-se do julgamento proferido, ainda sob a égide da Constituição anterior, no RE nº 101.037/SP
(Relator Exmo. Sr. Min. Francisco Rezek, DJ de 19.4.1985, p. 5.457), lavrado com ementa do seguinte teor:
‘ILHAS OCEÂNICAS. C.F., ART-4.-II. HÁ DE SER ENTENDIDA ESTA EXPRESSÃO EM SEU SENTIDO
TÉCNICO E ESTRITO, VISTO QUE O CONSTITUINTE DE 1967 POR CERTO NÃO PRETENDEU INSCREVER,
ABRUPTAMENTE, NO DOMÍNIO DA UNIÃO, BENS SITUADOS EM CENTROS URBANOS, NAS ILHAS
LITORÂNEAS, E INTEGRANTES DO PATRIMÔNIO DE ESTADOS, MUNICÍPIOS E PARTICULARES. MÉRITO
DA SENTENÇA SINGULAR E DO ACÓRDÃO DO T.F.R. HIPÓTESE DE NÃO-CONHECIMENTO DO RECURSO
EXTRAORDINÁRIO DA UNIÃO.’
Ademais, ratificando o inteiro teor do parecer exarado pela Procuradoria Regional da República da 4ª Região
(fls. 141/155), que, aliás, foi adotado na íntegra pelo voto condutor do aresto recorrido, impende dizer que é imprópria a
argüição de ofensa à Súmula 340/STF (fl. 188), em sede de recurso extraordinário, visto não se tratar de norma
constitucional, conforme reiterada jurisprudência desse Colendo Tribunal (RE nº 207.871, Relator Exmo. Sr. Min. Néri da
Silveira, DJ de 28.5.1998, p. 42).
Por fim, a matéria se reduz à aplicação do princípio de que tempus regit actum, salvo eventual aplicação retroativa
da Constituição superveniente, a qual, não dispondo explicitamente sobre tal possibilidade, à evidência, não se presume na
espécie. Ao julgar o AGRAG nº 138.986 (Relator Ministro Moreira Alves, DJ de 10.11.1995) essa Corte firmou
entendimento de que ‘é princípio cediço, em direito constitucional, que a aplicação imediata da Constituição alcança
apenas os efeitos futuros de fatos passados, e não o que já ocorreu no passado, em face da legislação então vigente’. (...).”
(grifei)
Entendo assistir plena razão à douta Procuradoria-Geral da República, especialmente quando opina pelo nãoconhecimento do presente recurso extraordinário, por incidir, na espécie, a Súmula 279/STF.
É que o acórdão ora recorrido, ao decidir a controvérsia relativa à alegada pretensão dominial da União sobre o imóvel em
litígio, dirimiu a questão à luz dos fatos e das provas existentes nos autos, circunstância esta que obsta o próprio conhecimento
do apelo extremo, em face do que se contém na Súmula 279 do Supremo Tribunal Federal.
A mera análise do acórdão em referência demonstra que o E. TRF/4ª Região, para confirmar a sentença proferida em
primeira instância, reconheceu – com apoio em elementos de fato – que a União Federal, ora recorrente, não comprovou que o
imóvel usucapiendo já se achava integrado ao seu domínio patrimonial, havendo destacado, ainda, na linha do douto parecer do
Ministério Público Federal, os seguintes aspectos fático-probatórios subjacentes à decisão que proferiu (fls. 161/162):
“Segundo os dados que foram trazidos aos autos, os autores têm a posse dos terrenos descritos na inicial desde
25.9.63, data em que se realizou o contrato de compra e venda entre os autores e Gercino Francisco Bittencourt e outros
(escritura – fl. 64) de 4/5 dos terrenos transmitidos aos vendedores por herança.
Tendo a posse se iniciado em 25.9.63, no ano de 1983, completou-se o lapso temporal de 20 anos necessários à
usucapião extraordinária.
A posse foi justificada na audiência de 26/2/91 (fl. 97). Presentes estavam, portanto, os requisitos necessários à
aquisição da propriedade por usucapião.
Restaria a discussão quanto à possibilidade de usucapir-se imóvel que não tem Registro Público, porque duvidosa a
sua titularidade. Neste ponto conforme já foi mencionado neste parecer, a questão sobre o caráter devoluto de imóveis
nestas circunstâncias nas ilhas costeiras foi pacificado, sob a ordem jurídica da anterior Constituição, pelo acórdão
101.037-1.
Ora, no caso dos autos, a União não fez qualquer prova de sua dominialidade sobre as áreas objeto da ação. Em
sentido contrário, os documentos acostados à inicial levam, inclusive, à presunção de que as terras são privadas, uma vez
que objetiva-se usucapir o 1/5 do terreno que não pode ser adquirido através do contrato de compra e venda, por tratar-se
de porção de terra que coube a filho desaparecido na partilha de bens deixados em herança. A parte restante a ser
usucapida, segundo os autores, resulta de diferença na metragem oriunda da precariedade em que se realizavam as
medições à época em que foram partilhados os bens. Ainda que tal argumento não pudesse ser considerado, poder-se-ia
presumir que a área usucapida era de propriedade dos lindeiros, os quais não manifestaram qualquer oposição à ação.
Uma vez não havendo prova de que o bem, sobre o qual incidiu a posse mansa e pacífica dos autores, por mais de
vinte anos, era devoluto, e considerando-se ainda que tais fatos se deram sob a vigência da Constituição Federal de 1967,
tem-se que perfectibilizou a usucapião. Adquirida a propriedade, antes da Constituição de 1988, o direito deve ser
ressalvado e declarada judicialmente a usucapião, para fins de transcrição no Registro de Imóveis.” (grifei)
Vê-se, desse modo, que a pretensão recursal extraordinária deduzida pela União Federal revela-se processualmente inviável,
pois – como se sabe – o recurso extraordinário não permite que se reexaminem, considerado o seu estrito âmbito temático,
questões de fato ou aspectos de índole probatória (RTJ 161/992 – RTJ 186/703), quando tais circunstâncias, como sucede na
espécie, se mostrarem condicionantes da própria resolução da controvérsia jurídica, tal como enfatizado no acórdão ora recorrido.
Cabe referir, ainda, neste ponto, por relevante, que idêntica postulação recursal, versando a mesma controvérsia suscitada
na presente causa, foi decidida pelo eminente Ministro CEZAR PELUSO, Relator do AI 421.887/SC, em julgamento – em tudo
coincidente com o ora proferido – que possui o seguinte teor:
“1. Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que indeferiu processamento de recurso extraordinário
interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado:
‘ADMINISTRATIVO. USUCAPIÃO. TERRAS DEVOLUTAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. INOCORRÊNCIA.
1. Mantida a sentença que julgou procedente o pedido de usucapião, pois não ficou comprovado que se
tratasse realmente de terras devolutas. Ademais, ao contrário do entendimento adotado pela decisão monocrática, as
terras devolutas são bens públicos com natureza peculiar, pelo modo como foram concebidas no ordenamento
jurídico; portanto, não há óbice ao usucapião desse tipo de terras. Ademais, restou comprovado o preenchimento dos
requisitos necessários ao reconhecimento do domínio.
2. Apelação e remessa oficial improvidas.’ (fl. 66)
Sustenta a recorrente, com base no art. 102, III, a, a ocorrência de violação aos arts. 20, II, § 2º e 191, parágrafo
único, da Constituição Federal.
2. Inconsistente o recurso.
Diante da impossibilidade de, em recurso extraordinário, rever a Corte as premissas de fato em que, para decidir a
causa, se assentou o Tribunal de origem, à luz da prova dos autos, é evidente que, para adotar outra conclusão, seria
mister reexame prévio do conjunto fático-probatório, coisa de todo inviável perante o teor da súmula 279.
3. Do exposto, nego seguimento ao agravo (art. 21, § 1º, do RISTF, art. 38 da Lei nº 8.038, de 28.05.90, e art. 557 do
CPC).” (grifei)
Mesmo que se pudesse superar o óbice técnico representado pela Súmula 279/STF, ainda assim não se revelaria acolhível
a postulação recursal que a União deduziu na presente causa.
O acórdão objeto do presente recurso extraordinário bem reflete, no ponto, o entendimento que a jurisprudência desta
Suprema Corte já deixara assentado a propósito da possibilidade jurídico-constitucional de existirem, nas ilhas costeiras (ou
continentais), áreas sujeitas à titularidade dominial de terceiros (fls. 159/162).
Com efeito, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ainda sob a égide da Carta de 1969, ao julgar o RE 101.037/SP, Rel.
Min. FRANCISCO REZEK (RTJ 113/1279), pronunciou-se a respeito do tema ora em análise, fixando orientação
consubstanciada em acórdão assim ementado:
“Ilhas Oceânicas. CF, artigo 4º, II.
Há de ser entendida esta expressão em seu sentido técnico e estrito, visto que o constituinte de 1967, por certo, não
pretendeu inscrever, abruptamente, no domínio da União, bens situados em centros urbanos, nas ilhas litorâneas, e
integrantes do patrimônio de Estados, municípios e particulares.
Mérito da sentença singular e do acórdão do TFR.
Hipótese de não conhecimento do recurso extraordinário da União.” (grifei)
Cumpre destacar, por relevante, que o ilustre magistrado federal de primeira instância, em sua bem lançada sentença
declaratória de procedência da ação de usucapião promovida pela parte recorrida, tendo presentes os aspectos que venho de
ressaltar, apreciou, de modo adequado, e com o prestigioso apoio do v. acórdão ora recorrido, o tema em análise, cabendo referir,
no ponto, a seguinte e ilustrativa passagem desse ato sentencial (fls. 119/120):
“Inicialmente, deve ser frisado que o simples fato de terrenos estarem localizados na ilha de Santa Catarina, por si
só, não os faz pertencer ao domínio da União. A própria Constituição Federal excepciona do domínio da União as ilhas
oceânicas e as costeiras quando estiverem sob o domínio dos Estados, Município ou terceiros.
Assim, é necessário que se demonstre, em primeiro lugar, que o imóvel não esteja integrado ao patrimônio do
Estado, Município ou terceiro. Em segundo lugar, deve restar evidenciado que o imóvel usucapiendo se encontra
efetivamente sob o domínio da União.
.......................................................
Por outro lado, o fato de o imóvel se localizar em ilhas costeiras e não estar registrado em nome de particular
também não implica ser terra devoluta, pois, se assim fosse, a União deveria demonstrar que o imóvel não é de domínio
privado, porém de seu próprio domínio, haja vista ser devoluto em ilha marítima.
.......................................................
Neste contexto, é a União quem deveria demonstrar que o referido imóvel já estava integrado em seu domínio, pois
é fato extintivo do direito do autor, sendo que a este incumbe somente demonstrar o tempo de sua posse e a inexistência de
oposição ou interrupção.
No caso destes autos, tenho que não ficou caracterizado e provado que a porção de terras, objeto do pedido desta
ação, já estivesse inserida no domínio da União. O que se extrai dos autos, é que o imóvel está localizado na ilha de Santa
Catarina, ausente qualquer registro de anterior proprietário.” (grifei)
A sentença em questão, em tudo corretamente confirmada pelo E. TRF/4ª Região, merece subsistir, eis que – cumpre não
desconhecer – a mera ausência de registro imobiliário não é suficiente, só por si, para configurar a existência de domínio público,
mesmo porque tal circunstância não induz à presunção, ainda que “juris tantum”, de que as terras destituídas de inscrição no
Registro de Imóveis sejam necessariamente devolutas, consoante tem proclamado a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal,
que exige, do Estado, a prova inequívoca de que lhe pertence a titularidade dominial do bem imóvel:
“USUCAPIÃO – DOMÍNIO PÚBLICO – TERRAS DEVOLUTAS
- Cabe ao Estado o ônus da prova de que a gleba é terra devoluta.”
(RDA 134/208, Rel. Min. MOREIRA ALVES - grifei)
Esse entendimento – que encontra apoio na autorizada lição de PONTES DE MIRANDA (“Tratado de Direito Privado”,
tomo XII/528, § 1.419, 2001, Bookseller) – reflete-se, por igual, na jurisprudência dos Tribunais em geral (RT 405/153 - RT
411/120 – RT 419/129 - RT 490/65 - RT 551/110 – RT 520/141):
“O fato de o terreno não estar registrado não torna admissível a presunção de que é de propriedade do Estado,
porque não se concebe o domínio por exclusão ou omissão. Ao Estado cumpre fazer prova de seu domínio sobre as terras
que alega serem devolutas.”
(RT 549/204, Rel. Des. Nélson Konrad - grifei)
Cabe enfatizar, por relevante, que essa mesma orientação é também prestigiada pelo magistério jurisprudencial desta
Suprema Corte (RTJ 65/856 – RTJ 81/191 – RTJ 99/234):
“Também a inexistência de transcrição da gleba em nome de particular não faz presumir que as terras sejam
devolutas. (...). Conseqüentemente, o só fato de não se achar transcrito o imóvel não significa deva tratar-se de gleba
devoluta. “
(RTJ 66/797, 798, Rel. Min. RODRIGUES ALCKMIN - grifei)
Em suma: não basta a mera alegação de ser devoluto o imóvel usucapiendo, pois se torna necessário que o Poder Público
prove que tal bem se inclui em sua esfera de dominialidade (RT 541/131 – RT 555/223 - RT 558/95), eis que – insista-se –
“Inexiste, em nosso Direito, regra que firme a presunção de serem públicas as terras que não forem objeto de transcrição” (RT
537/77-78 - grifei).
O que se mostra irrecusável, considerado o que dispõem o art. 20, IV, e o art. 26, II, ambos da Constituição da República, é
que nem todas as áreas existentes nas ilhas continentais (ou costeiras) acham-se incluídas no domínio patrimonial da União, pois,
como anteriormente ressaltado, a própria Carta Política reconhece que, em tais ilhas, também podem existir bens pertencentes a
terceiros, meros particulares.
Daí a advertência de IVES GANDRA MARTINS, em obra escrita com o saudoso CELSO RIBEIRO BASTOS
(“Comentários à Constituição do Brasil”, vol. 3, tomo II/116, 2ª ed., 2002, Saraiva):
“‘Pertencem à União as áreas que não se encontram no domínio dos Estados, Municípios e de terceiros’ (...).
As áreas podem pertencer a terceiros, como particulares que construam casas de lazer, condomínios fechados,
hotéis, à evidência, não integrando assim nenhuma das entidades federativas.” (grifei)
Cumpria à União Federal, portanto, provar, de modo inequívoco, que as áreas usucapiendas integravam o seu domínio
patrimonial, o que – se efetivamente por ela fosse demonstrado – obstaria a consumação do usucapião.
Tal, porém, não se verificou, como soberanamente afirmado pelo acórdão ora recorrido (RTJ 152/612 – RTJ 153/1019 –
RTJ 158/693), circunstância esta que – ao justificar a plena incidência, no caso, da Súmula 279/STF – torna incognoscível o
apelo extremo ora em exame.
Vê-se, de todo esse quadro, que se mostra processualmente relevante o tópico da decisão emanada do E. TRF/4ª Região,
no ponto em que adverte que a União Federal deixou de comprovar a sua titularidade dominial sobre as áreas objeto da ação de
usucapião, o que implica reconhecer a ocorrência, na espécie, de insuperável obstáculo técnico, representado pela Súmula
279/STF, tal como pude assinalar, precedentemente, nesta decisão.
Sendo assim, e pelas razões expostas, não conheço do presente recurso extraordinário.
Publique-se.
Brasília, 15 de fevereiro de 2005.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
* decisão pendente de publicação
Contagem de Tempo de Serviço de Trabalhador Rural Menor de 14 Anos (Transcrições)
AI 529694/RS*
RELATOR: MINISTRO GILMAR MENDES
EMENTA: Agravo de instrumento. 2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de tempo de
serviço. Art. 11, VII, da Lei nº 8213. Possibilidade. Precedentes. 3. Alegação de violação aos arts. 5°, XXXVI; e 97,
da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de
contratos trabalhistas. Tratamento similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e Itália.
Norma de garantia do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do STJ em conformidade com a
jurisprudência desta Corte. 4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.05.86; e RE
104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86 5. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
RELATÓRIO: O acórdão da 5a Turma do Superior Tribunal de Justiça está assim ementado (fl. 158):
“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO
POR MENOR DE 14 ANOS. QUESTÃO NOVA.
I - Versando a quaestio acerca da possibilidade de averbação do período trabalhado por menor de 14 anos, para fins
previdenciários, e pelo art. 55, § 2°, da Lei n° 8.213/91 determinar o cômputo do tempo de serviço do trabalhador rural,
independente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes (não para contagem recíproca), a e. Terceira Seção,
entendendo que a limitação etária para atividade laborativa é imposta em benefício do infante, pacificou o entendimento de
que comprovado o exercício da atividade empregatícia rural, abrangida pela Previdência Social, por menor de 14 anos, é de
se computar esse tempo de serviço para fins previdenciários.
II - Não se presta o instituto do agravo regimental para sanar omissão apontada na decisão agravada. Ademais,
verifica-se que o agravante levantou questão nova, e, portanto, incabível de ser suscitada em sede de agravo regimental.
Agravo regimental desprovido.”
O agravante, Instituto Nacional do Seguro social – INSS, interpôs recurso extraordinário de fls. 161/169, no qual sustenta:
“Pois bem, o Colendo STJ, ao dar provimento ao recurso especial, reconhecendo o cômputo do tempo de serviço
prestado por menor de quatorze anos, afastou, por meio de órgão fracionário, a norma inserta no art. 11, VII, da Lei n°
8.213/91, que, a contrario sensu, exclui do menor de 14 anos a qualidade de segurado especial. Assim, a lei não reconheceu
ao menor de 14 anos direitos previdenciários.
Atento à negativa de vigência do mencionado dispositivo legal, a Autarquia Previdenciária interpôs agravo
regimental, a fim de que o caso fosse levado a plenário. Não obstante, o recurso restou rejeitado, sob o argumento de que
não se negou a constitucionalidade da referida norma, mas que a mesma foi afirmada.
Não se conformando com o afastamento do art. 11, VII, da Lei n° 8.213/91 e com a violação ao art. 97 da
Constituição Federal, o INSS vem interpor o presente apelo extraordinário, com base no art. 102, III, alínea “a”, da
Constituição Federal.
3.3. Violação ao artigo 5°, XXXVI, da CF/88
Além do disposto no art. 97 da Constituição Federal, também foi ofendido o art. 5°, inciso XXXVI, como veremos.
Com efeito, o exercício de trabalho rural, no regime de economia familiar, por filhos do produtor, parceiro, meeiro,
arrendatário rural, garimpeiro, pescador artesanal ou assemelhado (art. 11, VII da Lei 8.213/91), somente passou a ser
reconhecido como trabalho após o advento da Lei 8.213/91.
Antes da Lei 8.213/91, os filhos dos segurados especiais não eram considerados segurados, mesmo que
eventualmente ajudassem no trabalho, a não ser que tivessem contribuído como autônomos. Como não contribuíram, o
tempo que alegam ter trabalhado não pode ser considerado.
Demonstrado, então, que o menor de 14 que trabalha com a família no campo somente passou a ser considerado
segurado após o advento do art. 11, VII da Lei 8.213/91. Antes ele não era segurado. A contagem recíproca do tempo de
serviço e a extensão de outros benefícios previdenciários não existia antes. Assim, se, no tempo em que trabalhou com
menos de 14 anos em regime de economia familiar, o indivíduo não era considerado segurado, não pode agora ter direito a
contar este tempo de serviço, pois não contribuiu como segurado e não era, à época, considerado beneficiário da
previdência social.
A Lei Complementar nº 11/71, que definiu o conceito de regime de economia familiar como “o trabalho dos membros
da família indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração” (art. 3º, § 1º,
b), estabelecia em seu art. 4º que “Não será devida a aposentadoria a mais de um componente da unidade familiar,
cabendo apenas beneficio ao respectivo chefe ou arrimo”.
Fica claro, então, que somente com a Constituição de 88, regulamentada pelo art. 11, VII, da Lei 8.213/91, é que o
filho do chefe da unidade familiar passou a ter também direito a aposentadoria e mesmo assim, somente após completados
14 anos.
Antes do advento da Lei 8.213/91, o filho do rurícola que trabalhava em regime de economia familiar, sem contribuir
para a previdência, não era segurado, não tinha direito a contar tempo de serviço para aposentadoria. E a Lei 8.213, no seu
art. 11, VII, reconheceu este direito somente aos filhos maiores de 14 anos.
Assim não de pode dar aplicação retroativa da Lei 8.213/91. O autor não tem direito adquirido ao computo de
tempo de serviço porque não era segurado da Previdência Social. E mesmo se aplicando a Lei 8.213/91, somento pode ser
computado o trabalho de maior de 14 anos.
Há que se perceber, também, que o direito ao trabalho nada tem a ver com o direito à previdência social. A regra
constitucional que veda o trabalho do menor protege os direitos trabalhistas dele, não os direitos previdenciários. Os
direitos oriundos da relação trabalhista dizem respeito aos direitos que o trabalhador pode exigir do empregador. Por outro
lado, os direitos previdenciários não surgem simplesmente da relação trabalhista, mas da relação entre o indivíduo e a
previdência social. Se o trabalhador não é segurado da previdência social, não se inscreveu no INSS, não existe relação
entre aquele e esta, logo não pode o não-segurado exigir direitos da Previdência Social. Principalmente quando se trata de
trabalho em regime de economia familiar, para o qual a lei não previa direitos previdenciários sem a respectiva
contribuição.”
Contra a decisão que negou processamento ao recurso extraordinário, foi interposto agravo de instrumento.
É o relatório.
VOTO: Preliminarmente, não houve violação ao art. 97, da Carta Magna. Com efeito, ao apreciar a questão, o Superior Tribunal de
Justiça não declarou a inconstitucionalidade do art. 11, VII, da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991.
Ademais, a tese esposada pelo Tribunal está em consonância com a jurisprudência desta Corte, conforme se depreende do
julgamento do AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.05.86 e do julgamento do RE 104.654, 2ª T., Rel. Francisco
Rezek, DJ 25.04.86, o que por si só afastaria a incidência do artigo 97, da Carta Magna, nos termos do artigo 481, parágrafo único,
do CPC. Observe-se, trecho do voto de Rezek, no RE supra citado:
“Está claro, ainda, que a regra do inciso X do mesmo dispositivo constitucional — proibindo qualquer trabalho ao
menor de doze anos — foi inscrita na lista das garantias dos trabalhadores em proveito destes, e não em seu detrimento.
Não me parece, assim, razoável o entendimento da origem, que invoca justamente uma norma voltada para a melhoria da
condição social do trabalhador, e faz dela a premissa de uma conclusão que contraria o interesse de seu beneficiário, como
que a prover nova espécie de ilustração para a secular ironia summum jus, summa injuria.”
Sobre o tema, destaque-se parecer que ofereci na qualidade de membro do Ministério Público Federal, no RE 104.654, de
29.01.85:
“A Constituição Federal, em seu art. 165, inciso XVI, assegura ao trabalhador o direito à previdência social nos
casos de doença, velhice, invalidez e morte, seguro - desemprego, seguro contra acidentes do trabalho e proteção da
maternidade, mediante contribuição da União, do empregador e do empregado. Trata-se de preceito que concretiza o
Estado Social em um dos seus aspectos mais relevantes, outorgando diretamente ao trabalhador o direito à previdência
social, nos termos nele explicitados.
8. E como se constata, não se está diante apenas de uma norma que, de forma ampla, tem por escopo dar uma
conformação justa e equânime às relações sociais, mas, efetivamente, de princípio assegurador de um direito subjetivo. É o
que ensina José Afonso da Silva, in verbis:
‘A Constituição vigente regula diretamente os direitos dos trabalhadores, no art. 165, onde estatui em termos
inequívocos: ‘A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei
visem à melhoria de sua condição social’. Não parece haver dúvida, todos os direitos constantes dos incisos daquele
artigo (salvos os direitos indicados nos itens V e XVIII, ainda programáticos) foram diretamente conferidos pelo
constituintes aos trabalhadores reservando-se, além deles, outros que, programaticamente, nos termos da lei, visem à
melhoria de sua condição social.
Nem se diga que há direitos, entre os previstos, que não podem ser aferidos de imediato , como o da ‘assistência
sanitária, hospitalar e médica preventiva’ (art. 165, nº XV). Pode ser problemático e até difícil o cumprimento’ do
dever contraposto a este direito. Mas aos trabalhadores corre um reconhecimento de sua exigibilidade, podendo,
para tanto, recorrer as vias judiciais, para constranger as instituições de previdência ao adimplemento da prestação
assistencial prevista.’ (Aplicabilidade das Normas Constitucionais, 1982, pp. 178/179).
9.
Em face dessas conclusões, cumpre indagar se a eventual nulidade do contrato de trabalho é apta a
inviabilizar pretensão aos benefícios previdenciários. De antemão, faz-se mister assinalar que a matéria relativa aos efeitos
da nulidade do contrato de trabalho constitui em diversos sistemas jurídicos autêntica vexata quaestio. Alguns autores
defendem a aplicação ao contrato de trabalho das concepções civilistas, entendendo que, em caso de nulidade do aludido
negócio jurídico, hão de se lhe reconhecer todos os efeitos que lhe atribui o Direito Civil, (Hueck - Nipperdey, Lehrbuch dos
Arbeitsrechts, apud Mario de la Cueva, Derecho Mexicano del Trabajo, Mexico, 1969, t. 1, p. 512). Afirma-se, nessa linha
de entendimento, que eventual prejuízo do empregado haverá de ser composto mediante a propositura da competente ação
de indenização.
10. A doutrina dominante parece perfilhar orientação diversa, sustentando a inaplicabilidade das idéias civilistas em
caso de nulidade de contrato de trabalho, porquanto impossível a restituição das partes à situação anterior. Nesse sentido,
leciona Mario de La Cueva, in verbis:
‘Las anteriores ideas nos parecen inadmisibles, pues, en primer término, la obligacion de pagar el salario es
independiente de que se obtenga una utilidad económica y subsiste aun en el supuesto que se originenn pérdidas. En
las relaciones de trabajo, el riesgo es a cargo del patrono, lo cual implica que, para el derecho del trabajo, toda
prestación de servicios debe ser remunerada, cualquiera sea el resultado económico.
Por otra parte, si se quiere hacer producir a la nulidad sus efectos normales, habría que retrotraer las cosas al
estado que tenían antes de la formación de la relación de trabajo y de la fecha en que se inició la prestación de
servicios, o sea, habría que devolver al trabajador su energía de trabajo, pues, procediendo de otra manera, se hace
producir a la nulidad efectos retroactivos unilaterales, lo que no es admisible; y como la dévolución de esa energía
de trabajo no es posible, es evidente que no queda otro camino que hacerle únicamente producir efectos para el
futuro.
Los ilustres profesores Rouast y Durand expresan que la vieja jurisprudencia francesa sostenía que la nulidade del
contrato de trabajo sustraía a las partes de la aplicación del derecho del trabajo y que, consecuentemente, debían
aplicarse los principios del derecho civil; según esta tesis, si el contrato de trabajo era nulo, no podían los
trabajadores reclamar los beneficios de la legislación sobre accidentes de trabajo y seguros sociales; sin embargo, la
jurisprudencia, al decir de nuestros tratadistas, era dudosa en el problema del pago del salario. En un párrafo
posterior, critican Rouast y Durand la tesis jurisprudencial francesa: El contrato de trabajo es de tracto sucesivo y
sus efectos no pueden desaparecer retroactivamente, pues algunas prestaciones quedaron cumplidas y no puede
volverse sobre ellas; la nulidad no puede producir un aniquilamiento total del contrato, sino cuando se pronuncia
antes de toda ejecución. Esta situación, agregan Rouast y Durand, es más fácil de alcanzar por la idea de la relacion
de trabajo, pues, habiendo existido un estado de subordinación del trabajador al patrono, debe producir alguns
efectos.
Después de esta critica, Rouast y Durand precisan las siguientes conclusiones: a) La nulidad del contrato de trabajo
no dispensa la falta de cumplimiento a las medidas de policía del trabajo (las reglas, a ejemplo, para la prevención
de los infortunios del trabajo). b) La nulidad del contrato no puede hacer desaparecer el estado de subordinación en
que se encontró colocado el trabajador y, según, las últimas leyes francesas, es aplicable la legislación sobre
accidentes de trabajo. c) Los salarios ya pagados no deben restituir-se, porque son la contraprestación de una
prestación definitiva. Si los salarios aun no se pagan, la remuneración se justifica sobre la base del enriquecimento
sin causa, pero tal vez es posible sostener que ‘la obligación de pagar el salario está subordinada a un simple hecho
jurídico: El cumplimiento del trabajo.’
El antiguo profesor de la Universidad de Marburgo ha elaborado una teoría de la nulidad en el derecho del trabajo
para el problema de la capacidad de las partes, que coincide con las ideas que hemos defendido desde hace alguns
años: Recuerda el profesor Krotoschin que la idea del efecto retroactivo de la nulidad no tiene, en el derecho civil, un
valor absoluto y que, sobre todo, se reconoce una excepción en los contratos llamados de tracto sucesivo, ‘de
manera que la nulidad debe ser asimilada a la disolución que sólo produce efectos ex nunc’; consequentemente, ‘las
partes pueden exigir lo que les corresponde en virtud de lo contratado, hasta este momento, como derechos reputados
contractuales’. Y en otro párrafo, justifica plenamente el doctor Krotoshin, la razón de esta solución: ‘Se sostiene,
con razón, que en el. contrato de trabajo no es posible que cada parte restituya a la otra lo que, en virtud del acto
anulado, hubiese recibido. Esta solución es aceptable en el derecho del trabajo, sólo en la hipótesis de que aun no se
haya iniciado el trabajo efectivamente. Pero una vez comenzada la prestación del trabajo, la situación es más
compleja, ya que el empleador no podría restituir al trabajador la energia de trabajo que este hubiera empleado
hasta el momento de invocarse la nulidad.’
(Ob. cit., 1969, pp. 512/513)
11. 0 insigne mestre mexicano afirma que os efeitos da nulidade na relação contratual de trabalho podem ser assim
resumidos:
a) na hipótese do serviço não se ter iniciado, a nulidade impede a formação da relação;
b) no caso da prestação de trabalho já se ter iniciado, não poderá a nulidade produzir efeitos retroativos com
prejuízo para o trabalhador, fundando-se esse entendimento no próprio Direito Civil que também preserva as situações
decorrentes dos chamados contratos de trato sucessivo, colocando-os a salvo da destruição retroativa. Tendo o Direito do
Trabalho o duplo propósito de cuidar da vida e da saúde do trabalhador e de assegurar-lhe, mediante a proteção do salário,
uma posição adequada, a nulidade da relação de emprego se assemelha, nesse aspecto, à rescisão, pondo fim à relação para
o futuro.
12. Em outros sistemas jurídicos, como o alemão, problemas oriundos da nulidade do contrato de trabalho têm sido
arrostados com fundamento na chamada ‘Doutrina das Relações Contratuais Fáticas ‘(Lehre der faktischen
Vertragsverhältnisse’). Tal concepção doutrinária tem o propósito, dentre outros, de oferecer solução adequada às
consequências legais oriundas de um contrato nulo, mormente nas chamadas ‘relações de engajamento’
(Eingliederungsverhältnisse’), como nos contratos de sociedade e de trabalho, já que nesses casos a teoria clássica da
nulidade dos negócios não se tem mostrado capaz de oferecer soluções adequadas. Entende-se que a execução do contrato
não permite que ele seja tido por não verificado (‘ungeschehen’), cuidando-se assim, de uma ‘relação de trabalho
fática’(‘faktisches Arbeitsverhältnis’), de uma ‘sociedade de fato’ (‘faktische Gesellschaft’) J. Esser e E. Schmidt ,
Schuldrecht, Allg. Teil, Heidelberg-Karlsruhe, 1976, pp. 110/116; Werner Flume, Das Rechtsgeschãft Berlim 1979, pp.
95/102; Hans Brox, Allgemeines Schuldrecht, München, 1982, pp. 33/36). Daí considerar essa corrente como válidas (als
gültig) as aludidas relações, pelo menos no que concerne ao passado (Esser, Ob. cit., p. 114).
13. Não obstante a ampla aceitação que logrou nos meios acadêmicos e na jurisprudência, a doutrina do ‘contrato
fático’ tem sido veementemente criticada, entendendo-se que ela constitui verdadeira ruptura com os princípios basilares da
relação contratual (‘Sie hat als eine ‘Atombombe zur Zerstörung ge-setzestreuen juristischen Denkens erwiesen(H.
Lehmann)’ (Brox , Ob . cit., p. 36; Flume, Ob. cit., pp. 101/102). Sustenta Flume que os sectários dessa orientação parecem
ter incidido em equívoco palmar, equiparando a nulidade do negócio jurídico (Nichtigkeit) à sua inexistência
(‘Nichtexistenz’) no sentido das ciências naturais (Der nichtige Vertrag ist kein Nicht-Vertrag. (...) Die-se Zauberei ergibt
sich nur für diejenigen, welche die Nichtigkeit des Rechtsgeschafts als Nichtexistenz im naturwissenchaft lichen Sinne
ansehen”) (Flume, Ob. cit., p. 102, nota nº14ª). “Entenda-se a nulidade, ao contrário, como invalidade e não se mostra
difícil, para aquele que não raciocina de forma doutrinária, limitar a invalidade de maneira justa e apropriada (“Vers-tekt
man dagegen die Nichtigkeit als Nicht-Geltung, so macht es für denjenigen, der nicht doktrinär denkt, keine Schwierigkeiten
die Nicht-Geltung in sachgerechter Weise einzuschränken) (Ob. cit., p. 102, nota 14 a).
14. Ensina Flume que, a despeito da invalidade, há de se reconhecer significação jurídica ao negócio que venha
sendo executado pelas partes nos casos em que as normas relativas ao enriquecimento sem causa (Bereicherungsrecht) se
mostrem inadequadas, como ocorre nos contratos de sociedade, nos contratos de prestação de serviço e de trabalho (Flume,
ob. cit., p. 555; Cfr. também Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, 1984, t. 47, pp. 469/472)). Nesse contexto, a
execução de contrato de trabalho pelo menor de 18 e maior de sete anos (‘beschränkter Geschäftsfähig’) (BGB, § 104, I)
mereceu especial atenção do emérito professor da Universidade de Bonn, como se constata na seguinte passagem, in verbis:
‘Constitui entendimento amplamente majoritário que o menor que, sem autorização de seu representante legal,
celebra um contrato de trabalho ou de prestação de serviço, tem pretensão ao salário ou à remuneração pela
execução do trabalho, como se o contrato tivesse sido eficazmente celebrado, subsistindo seus direitos com
fundamento nas normas jurídicas de proteção. Em geral, essa problemática é tratada sob a epígrafe das ‘relações de
trabalho fáticas’ (‘faktisches Arbeitsverhältnis’), como uma hipótese da chamada ‘relação contratual fática’
(‘faktisches Vertragsverhältnis’). Como a lei determina a ineficácia de contrato celebrado pelo menor sem a
anuência de representante legal tendo em vista precipuamente a proteção do incapaz, não pode corresponder ao
sentido do preceito a recusa à legitimidade das pretensões oriundas do contrato, em caso de sua execução (do
contrato). Daí porque se deve limitar as conseqüências de ineficácia ao efetivo sentido da lei. Fundamento das
pretensões não é apenas o trabalho como fato, senão o próprio contrato.( Es ist allgemeine Meinung, dass der
Minderjährige für die auf Grund eines ohne Zustimmung seines gesetzlichen Vertreters abgeschlossenen Dienst oder Arbeitsvertrages erbrachten Dienstleistungen einen Lohn oder Gehaltsanspruch hat, wie wenn der Ver-trag
wirksam abgeschlossen wäre, und dass auch seine Rechte auf Grund der Schutzvorscnriften in gleicher Weise
bestehen. Im allgemeinen wird die Problematik unter dem Stichwort ‘faktisches Arbeitsverhältnis’ behandelt als einer
der Fälle eines ‘faktis-chen Vertragsverhältnisses’. Da das Gesetz die Unwirksamkeit des vom Minderjährigen ohne
Zustimmung des gesetzlichen Vertreters abgeschlossenen Vertrages nur zum Schutz des Minderjährigen bestimmt,
entspricht es nicht dem Sinn der gesetzlichen Regelung, dem Minderjährigen im Falle des Vollzugs des Vertrages die
vertraglichen Ansprüche zu versagen. Deshalb ist die Unwirksamkeitsfolge entsprechend dem Sinn des Gesetzes zu
beschränken. Grundlage der Ansprüche ist nicht nur die Leistung der Arbeit als ein Faktum, sondern der Vertrag.’
(Ob. cit., p. 206).
15. Também no Direito francês, a doutrina e jurisprudência, considerando o caráter sucessivo do contrato de
trabalho e a necessária proteção do salário, não tem admitido, em principio, a retroatividade dos efeitos mesmo em casos de
infringência a princípio de ordem pública. A propósito, esclarecem G.H. Camerlynck e Gérard Lyon-Caen, in verbis:
‘Conformément aux principes civilistes, si l’une des conditions de validité du contrat de travail fait défaut (absence de
libre consentement, cause immorale ou objet illicite tel l’embauchage d’une femme de chambre dans une maison de
tolérance, d’un mineur de seize ans ou d’un étranger non autorisé, la sanction est la nullité. De plus, la nullité
découlant d’un vice contemporain de la formation du contrat, devrait entreiner en principe des effets rétroactifs.
Se fondant sur le caractère successif du contrat de travail, et obéissant au souci évident d’assurer la protection d’un
salarié, le plus souvent irresponsable, la jurisprudence, approuvée par la doctrine, a écarté la fiction civiliste de
l’anéantissement rétroactif, même dans certains cas de nullité d’ordre public. Notamment le travailleur pourra
réclamer le paiement de la remunération correspondant au travail exé-cuté et prévue par la convention.’ (Droit du
Travail, Paris, 1975, p. 142)
16. Da mesma forma, o Direito italiano exclui expressamente a nulidade retroativa nas relações de trabalho, salvo
quando advenientes da ilicitude de objeto ou de causa. Tal resulta claro da seguinte observação de Santoro-Passarelli, in
verbis:
‘Secondo la legge’ la nullità o l’annullamento non produce effetto per il periodo in cui il rapporto ha avuto
esecuzione, salvo che la nullitá derivi dall’illiceità delloggetto o della causa,’ e resta fermo il diritto del prestatore
alla retribuzione, se nello svolgimento dell rapporto siasi commesa violazione di norme poste a sua tutela (come ad
es., quele che vietano l’assunzione o stabiliscono le pause del lavoro) (art. 2.126). Ciò che la legge vuol dire,
parlando inelegantemente di inefficacia dell’invalidità, è che si applica al rapporto, per il tempo in cui ha avuto
esecuzione, la disciplina per lo stesso stabilita, anche quella specificamente convenuta, malgrado la nullità o
l’annullamento del contratto. Ora ciò non può essere spiegato, a nostro avviso, che nel modo seguente. Se ancora,
trattandosi di un rapporto di durata, può ammettersi che la retroattività dell’annullamento, come quella della
condizione avverata (cfr. n° 71), trovi un limite nell’irripetibilità delle prestazione di lavoro eseguite, il che comunque
non spiega pienamente la conservazione dell’intero rapporto per il corrispondente periodo, data l’invalidità del
negozio, certo exclusivamente dalla legge deriva la conservazione del rapporto, quando il negozio sia radicalmente
nullo. In questo senso si verifica qui l’indicata sostituzione legale dell’autonomia privata.”
(Nozione di Diritto del Lavoro, Napoli, 1969, pp. 147/148)
17. Também entre nós não parece existir razão para que se atribua efeito retroativo à decretação de nulidade do
contrato de trabalho. Na ausência de disposição expressa, como a do Direito Italiano, e à falta de um desenvolvimento
doutrinário, no tocante às ‘Relações Contratuais Fáticas’, há de se admitir a legitimidade das pretensões decorrentes da
relação de emprego, ainda que esta venha a ser declarada inválida. Do contrário , ter-se-ía a norma protetiva aplicada
contra os interesses daquele a quem visa proteger. Esta constitui sem dúvida a única solução compatível com a natureza
tutelar do Direito de Trabalho. Nesse sentido, prelecionam Orlando Gomes e Elson Gottschalk, in verbis:
‘A questão da ineficácia do contrato de trabalho seria resolvida em termos tão simples se fôra possível aplicar ao
mesmo, com todo rigor, a teoria civilista das nulidades. Mas, a natureza especial da relação de emprego não se
compadece com a retroatividade dos efeitos da decretação da nulidade. 0 princípio segundo o qual o que é nulo
nenhum efeito produz não pode ser aplicado ao contrato de trabalho. É impossível aceitá-lo em face da natureza da
prestação devida pelo empregado. Consistindo em força-trabalho, que implica em dispêndio de energia física e
intelectual, é, por isso mesmo, insuscetível de restituição. Se a nulidade absoluta tem efeito retroativo, se repõe os
contraentes no estado em que se encontravam ao estipular o contrato nulo, como se não fora celebrado, nenhuma
parte tem o direito de exigir da outra o cumprimento da obrigação. Donde se segue que o empregado não tem o
direito de cobrar o salário ajustado. Esta seria a consequência inelutável do princípio da retroatividade da nulidade
de pleno direito.
Mas, é conseqüência evidentemente absurda, ainda mesmo se admitindo que o trabalhador possa exigir a
remuneração com fundamento na regra que proíbe o enriquecimento ilícito. Porque a verdade à que a
retroatividade só teria cabimento se o empregador pudesse devolver ao empregado a energia que este gastou no
trabalho. Mas, como isso não é possível, os efeitos da retroatividade seriam unilaterais, isto é, beneficiariam
exclusivamente ao empregador, como pondera DE LA CUEVA, ao criticar a opinião de HUECK-NIPPERDEY.
Deve-se admitir em toda extensão o princípio segundo o qual trabalho feito é salário ganho. Pouco importa que a
prestação de serviço tenha por fundamento uma convenção nula. Em Direito do Trabalho, a regra geral há de ser a
irretroatividade das nulidades. 0 contrato nulo produz efeitos até a data em que for decretada a nulidade. Subvertese, desse modo, um dos princípios cardeais da teoria civilista das nulidades. A distinção entre os efeitos do ato nulo e
do ato anulável, se permanece para alguns, não subsiste em relação a este.’ (Curso Elementar de Direito do
Trabalho, 1963, pp. 115/116)
18. Não parece ser outro o entendimento de Arnaldo Susse-kind (Comentários à Consolidação das Leis do trabalho,
1964, v. 3, pp. 32/35) e de Amauri Mascaro Nascimento,(Contrato de Trabalho, p. 47)
19. Assim, no caso da execução do contrato de trabalho, há de se considerar legítima toda e qualquer pretensão
emanada da relação de emprego, pelo menos no tocante ao passado.
20. No caso em apreço, o v. aresto recorrido considerou que, estando vedado o exercício de atividade laboral, por
força de mandamento constitucional, não poderia o INPS ser responsabilizado pelo acidente sofrido por aquele a quem a
Constituição impede o exercício do trabalho remunerado (CF, art. 165, X) e, conseqüentemente, a vinculação ao regime
previdenciário.
21. Não parece subsistir dúvida de que, ao assim decidir, o Egrégio Tribunal a quo extraiu conclusão contrária ao
sentido e ao conteúdo do preceito constitucional. Como já amplamente demonstrado, hão de se reconhecer os efeitos
jurídicos relevantes dimanados da referida relação, tendo em vista o fundamento da nulidade, não se podendo aplicar a
regra protetiva em desfavor do menor.
22. Acentue-se, outrossim, que não há que se cogitar aqui da responsabilização da Previdência Social por ato ilícito
de outrem, mas tão-somente de reconhecer o direito do trabalhador aos benefícios previdenciários, que não decorrem
propriamente da higidez da relação de emprego, mas, e sobretudo, da prática do ato-fato-trabalho (CF, art. 165, XVI). É o
que se depreende igualmente do magistério de Camerlynk e Lyon-Caen, in verbis:
‘Le Droit du travail rejoint là, et par identité de motifs, les solutions formelles du droit de la Sécurité sociale. Mème
en cas de nulité du contrat de travail, le salarié béneficie de la garantie, que ce soit en matière d’accidents du travail
ou d’assurances, sociales. Certains auteurs verront là une application particuliare de la notion de relation de travail
se substituant à celle de contrat.’ (Ob. cit., p. 143).”
A despeito de terem sido elaboradas sob a vigência da Constituição de 1967, parece que essas lições continuam atuais.
Assim, nego provimento ao agravo.
* acórdão pendente de publicação
Prerrogativa de Foro e Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca (Transcrições)
Rcl 2417/SC*
RELATOR: MINISTRO CARLOS BRITTO
DECISÃO: Vistos, etc.
José Fritsch, Secretário Nacional de Aqüicultura e Pesca, maneja a presente reclamação constitucional. E o faz para impugnar
ato praticado pelo Delegado de Polícia Federal de Florianópolis, consubstanciado na instauração de inquérito policial para apuração
do delito previsto no artigo 323 do Código Eleitoral.
2. Sustenta o acionante que a autoridade reclamada é absolutamente incompetente para dirigir os autos do Inquérito Policial
nº 402/2002, uma vez que, a teor da Medida Provisória nº 103/03, o titular do cargo de Secretário Nacional de Aqüicultura e Pesca
tem prerrogativas, garantias, vantagens e direitos equivalentes aos de Ministro de Estado.
3. Pois bem, prossigo neste breve relato para consignar que, após declinar os fundamentos jurídicos da sua pretensão de
ver julgada procedente esta reclamação, o acionante formula o seu pedido, pugnando, liminarmente, pelo imediato trancamento do
referido procedimento investigatório. Já no tocante ao mérito da causa, o reclamante postula a confirmação do provimento
acautelador requestado.
4. Às fls. 19, indeferi a medida liminar e determinei a remessa destes autos à douta Procuradoria-Geral da República,
para manifestação. Antes, porém, consignei que esta Casa de Justiça estava prestes a julgar a Petição 3.003-QO, na qual se discutiria
se detém ou não este Supremo Tribunal Federal competência para processar e julgar os titulares dos cargos arrolados no art. 38 da
Lei nº 10.683/03 (antiga Medida Provisória nº 103/03).
5. A seu turno, o órgão ministerial público manifestou-se pela procedência parcial da reclamação, com a avocação do
inquérito policial a esta Suprema Corte.
6. Esse o relatório. Passo a decidir.
7. Como anteriormente registrado, no julgamento da questão de ordem suscitada no seio da Petição 3.003, esta egrégia
Corte começou a discutir de quem seria a competência para processar e julgar os titulares dos cargos enumerados no art. 38 da Lei
nº 10.683/03. Naquela ocasião, proferi voto no sentido de que:
“(...)
I - Ministro de Estado é agente do Poder Executivo Federal. Agente político, mais do que simplesmente administrativo, dado
que exercente do próprio Poder de que faz parte como peça essencial. É dizer: Ministro de Estado co-exerce o Poder
Executivo Federal, auxiliando o Presidente da República, a teor do art. 76 da Magna Carta, in verbis:
“O Poder Executivo é exercido pelo Presidente do República, auxiliado pelos Ministros de Estado.”
II - Ele, Ministro de Estado, justamente porque agente político, tem as competências do seu cargo estabelecidas pela própria
Constituição, diretamente, como se percebe desta dicção:
“Art. 87 (...)
Parágrafo único. Compete ao Ministro de Estado, além de outras atribuições estabelecidas nesta Constituição
e na lei:
I - exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área
de sua competência e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República;
II - expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos;
III - apresentar ao Presidente da República relatório anual de sua gestão no Ministério;
IV - praticar os atos pertinentes às atribuições que lhe foram outorgadas ou delegadas pelo Presidente da
República.”
(sem os caracteres em negrito, no original).
III - Além de titular de cargo diretamente nominado pela Lex Legum, o Ministro de Estado é centrado dirigente de órgão
público executivo que também recebe o seu nome da mesma Constituição, por forma direta. Esse órgão, sabe-se, é
chamado de “Ministério”. E vai compor com o seu titular aquela mencionada parelha temática, de maneira a possibilitar
a formação de um claro juízo: ministro é agente que titulariza um ministério. Ministério, circularmente, é órgão
titularizado por um Ministro de Estado. Se se prefere, somente é Ministro de Estado quem dirige, superiormente, um
Ministério. Só há Ministério sob a titularidade de um Ministro de Estado. “Tertius non datur”. Por isso que, do conjunto
normativo que a Lei das Leis devota aos Ministros de Estado, especificamente, figura dispositivo que se vaza na seguinte
estrutura de linguagem: “a lei disporá sobre a criação e extinção dos Ministérios e órgãos da administração pública” (CF,
art. 88).
IV - Se o Poder Executivo Federal é bipolar ou necessariamente dúplice — visto que formado por um Chefe e seus auxiliares
Ministros —, o Ministério é parte integrante de um aparelho estatal executivo que a Lei Maior nomina de “Administração
Pública Direta”; ou seja, aquele aparato de poder que a Lei das Leis chama de “Administração Pública Direta” é formado,
no âmbito do Poder Executivo, de duas porções elementares: “ministérios e órgãos”. É ainda dizer: ministérios, de um lado,
e, de outro, órgãos executivos sem essa explícita qualificação de ministérios. Órgãos não ministeriais, portanto. Embora de
Administração igualmente Direta. É a bipolaridade que ressai desses dois dispositivos constitucionais:
“Art. 48 - Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o
especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:
(...)
XI - criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública;
(...)”.
*******************************************
Art. 61 - (...)
§ 1o - São de iniciativa privativa do Presidente da República leis que:
(...)
II - disponham sobre:
(...)
e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84, VI;
(...)”
V - Esse vínculo funcional que a Magna Carta estabelece entre ministro e ministério não pode sofrer desfazimento por
conduto de lei. A lei menor não pode desenlaçar os dois termos. São coisas inapartáveis, por definição, pois o regime
jurídico de uma e de outra figura, à semelhança do enlace operacional entre Presidência e Presidente, decorre é do Texto
Magno mesmo. Quer dizer, se Presidente da República é somente quem chefia a Presidência da República, o mesmo é de se
dizer para um Ministro de Estado. Somente ele é quem chefia um Ministério, tanto quanto um Ministério é aquela unidade
de serviço executivo que é chefiada por Ministro de Estado. Só e só.
VI - É nessa constitucional condição de titular de um ministério — unidade mais importante de toda a Administração
Pública Federal — que o Ministro de Estado desfruta de foro especial. Foro especial por prerrogativa de função...
ministerial. Tudo resultante de comando ainda uma vez emitido pela Constituição Republicana, diretamente. Insuscetível de
remodelagem por outro cinzel legislativo que não seja daquela mesma estirpe constitucional.
16. Este encadeado raciocínio não recusa à lei menor a força de conferir “status” de ministro, para certos efeitos, a
quem ministro não é. São os contraídos efeitos a que se refere o percuciente Ministro Celso de Mello, já mencionados linhas
atrás. Modo criativo e pragmático de sobrevalorizar determinadas funções e autoridades, mas sem aquela plenitude
eficacial que implicaria até mesmo ampliar o rol das competências do Supremo Tribunal Federal.
17. Esclareça-se que esta mesma lucubração não importa desconhecer que é próprio da lei menor criar ministérios e
os cargos de Ministros de Estado. Evidente. O que se está a negar é a possibilidade de a lei infraconstitucional separar o
que a Constituição uniu. Tal como se diz na liturgia católica dos casamentos, com a frase altissonante: “O que Deus uniu, o
homem não separe”.
18. Uma ponderação, todavia, é de se fazer. Por uma arraigada tradição republicana, entre nós, há um ministério
que não recebe a designação de ministério. Refiro-me à Casa Civil da Presidência da República, esse ministério sem
especialidade operativa. Esse ministério geral, sem especificidade temática, e que por isso mesmo é chamado de “civil”.
Sintomaticamente chamado de “civil”, pelo fato de cuidar daquela porção de atividade corriqueiramente executiva e que
remanesce das outras. Que não se encaixa, pela sua extrema generalidade, em nenhum outro setor particular de atuação
estatal executiva. Mas que tudo coordena e sintetiza, na perspectiva de uma intercalação necessária de todos os outros
ministérios com a Presidência da República.
19. De fora parte esse ministério-ponte, cuja especialidade é não ter especialidade alguma, é do meu pensar que
nenhuma outra exceção ao enlace funcional Ministro/Ministério é de se admitir, na esfera do Poder Executivo e da
Administração Pública Federal.
20. Nessa visão constitucional das coisas, penso inadmissível que a competência estabelecida pelo art. 102 da CF
(que é em numerus clausus), com referência às pessoas dos Ministros de Estado, possa estender-se a cargos de feição
exclusivamente administrativa. Cargos, esses, nominados e formalizados apenas por lei, como no caso em tela (art. 8º, § 1º,
inciso I, da citada Lei nº 10.683/03)”.
8. É verdade que essa instigante discussão restou abortada diante da superveniente perda de objeto do mencionado feito. No
entanto, na Sessão plenária de 17.12.2004, tema idêntico ao presente voltou a ser debatido nesta Casa Maior da Justiça brasileira.
Refiro-me à questão enfrentada por ocasião do julgamento do Inquérito 2.044-QO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence. Na oportunidade,
este Supremo Tribunal Federal declarou a sua incompetência para processar e julgar o feito, ao entendimento de que o Secretário
Especial de Aqüicultura e Pesca, por não ser Ministro de Estado, não possui a prerrogativa de foro estabelecida no parágrafo único
do artigo 25 da Lei nº 10.683/2003, com a redação dada pela Lei nº 10.869/04. Além disso, esta egrégia Corte decidiu que a
extensão de prerrogativas, garantias, vantagens e direitos equivalentes aos Ministros de Estado a que alude o § 1º do art. 38 do
referido diploma legislativo repercute somente nas esferas administrativa, financeira e protocolar, mas não na estritamente
constitucional (Informativo nº 374 do STF).
9. Nessa ampla moldura, frente ao art. 21, § 1º, do RI/STF, nego seguimento à reclamação.
Intime-se.
Publique-se.
Brasília, 17 de fevereiro de 2005.
* decisão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 377
Brasília, 21 a 25 de fevereiro de 2005 Nº 377
Data (páginas internas): 2 de março de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Readmissão de Magistrado: Inconstitucionalidade
Efeito Vinculante e Poder Legislativo
Lei 8.906/94, Art. 79, Caput e § 1º
Voto de Desempate em HC e Vedação
Comunicação de Nova Filiação a Partido e Constitucionalidade
Vício de Iniciativa e Servidores Públicos
Investidura em Cargo Público e Concurso Público - 1 e 2
Ascensão Funcional e Concurso Público
Aprovação em Concurso Público e Direito à Nomeação: Inconstitucionalidade
1ª Turma
Tráfico Internacional de Entorpecentes e Competência
Devido Processo Legal e Vacância de Serventia
2ª Turma
Aumento de Pena e Princípio da Reserva Legal
Interpretação Mais Favorável ao Réu e Ampla Defesa
Clipping do DJ
Transcrições
CPI Estadual e Quebra de Sigilo Bancário (ACO 730/RJ)
PLENÁRIO
Readmissão de Magistrado: Inconstitucionalidade
Por ofensa aos arts. 37, II, e 93, I, da CF, o Tribunal julgou procedente, em parte, pedido de ação
direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República para declarar a inconstitucionalidade do art. 204,
caput e parágrafo único, da Lei 12.342/94, do Estado do Ceará, que dispõe sobre a readmissão de
magistrado exonerado. Entendeu-se que a norma impugnada autoriza a instituição de nova forma de
provimento de cargo não prevista na Lei Orgânica da Magistratura - LOMAN (LC 35/79), sem
observância, ainda, da prévia e necessária aprovação em concurso público. De outro lado, o pedido foi
julgado improcedente em relação ao art. 201 da referida lei estadual, que possibilita a permuta entre os
juízes, em razão de não ter sido contemplada, no citado art. 93, a reserva de iniciativa concernente a essa
matéria, o que conferiria aos Estados a possibilidade dela tratarem por força do disposto no § 1º do art. 25
da CF (“São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta
Constituição.”).
ADI 2983/CE, rel. Min. Carlos Velloso, 23.2.2005. (ADI-2983)
Efeito Vinculante e Poder Legislativo
A eficácia geral e o efeito vinculante de decisão proferida pelo STF em ação declaratória de
constitucionalidade ou direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal não alcançam o
Poder Legislativo, que pode editar nova lei com idêntico teor ao texto anteriormente censurado pela
Corte. Perfilhando esse entendimento, e tendo em conta o disposto no § 2º do art. 102 da CF e no
parágrafo único do art. 28 da Lei 9.868/99, o Plenário negou provimento a agravo regimental em
reclamação na qual se alegava que a edição da Lei 14.938/2003, do Estado de Minas Gerais, que instituiu
taxa de segurança pública, afrontava a decisão do STF na ADI 2424 MC/CE (acórdão pendente de
publicação), em que se suspendera a eficácia de artigos da Lei 13.084/2000, do Estado do Ceará, que
criara semelhante tributo. Ressaltou-se que entender de forma contrária afetaria a relação de equilíbrio
entre o tribunal constitucional e o legislador, reduzindo o último a papel subordinado perante o poder
incontrolável do primeiro, acarretando prejuízo do espaço democrático-representativo da legitimidade
política do órgão legislativo, bem como criando mais um fator de resistência a produzir o inaceitável
fenômeno da chamada fossilização da Constituição.
Rcl 2617 AgR/MG, rel. Min. Cezar Peluso, 23.2.2005. (Rcl-2617)
Lei 8.906/94, Art. 79, Caput e § 1º
O Tribunal iniciou julgamento de ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República contra a
expressão “sendo assegurando aos optantes o pagamento de indenização, quando da aposentadoria,
correspondente a cinco vezes o valor da última remuneração”, contida no § 1º do art. 79 da Lei 8.906/94
(Estatuto da OAB). Pretende-se, ainda, a interpretação conforme o inciso II do art. 37 ao caput do referido
art. 79, no sentido de que seja exigido o concurso público para provimento dos cargos da OAB. Por
maioria, conheceu-se do pedido referente ao caput do art. 79, ao fundamento de que nele há ambigüidade
que enseja mais de uma interpretação, a qual decorreria da dúvida suscitada quanto à natureza jurídica da
OAB. Vencidos, no ponto, os Ministros Eros Grau, relator, Carlos Britto, Celso de Mello, Sepúlveda
Pertence e Nelson Jobim, Presidente, que não conheciam do pedido. Prosseguindo, o Min. Eros Grau, por
entender que a OAB não integra a Administração Pública, deu interpretação conforme no sentido de não
ser exigível o concurso público, no que foi acompanhado pelos Ministros Carlos Britto e Cezar Peluso.
Em divergência, o Min. Joaquim Barbosa, considerando que a OAB é regida por normas de direito
público, deu interpretação conforme no sentido de ser obrigatório o concurso público. O julgamento foi
suspenso com o pedido de vista do Min. Gilmar Mendes. (Lei 8.906/94: “Art. 79. Aos servidores da OAB,
aplica-se o regime trabalhista. § 1º Aos servidores da OAB, sujeitos ao regime da Lei nº 8.112, de 11 de
dezembro de 1990, é concedido o direito de opção pelo regime trabalhista, no prazo de noventa dias a
partir da vigência desta lei, sendo assegurado aos optantes o pagamento de indenização, quando da
aposentadoria, correspondente a cinco vezes o valor da última remuneração.”).
ADI 3026/DF, rel. Min. Eros Grau, 23.2.2005. (ADI-3026)
Voto de Desempate em HC e Vedação
Tendo em conta o disposto no parágrafo único do art. 146 do RISTF - Regimento Interno do STF
(“No julgamento de habeas corpus, pelo Plenário, o Presidente não terá voto, salvo em matéria
constitucional, proclamando-se, na hipótese de empate, a decisão mais favorável ao paciente.”), o
Tribunal, por maioria, resolvendo questão de ordem suscitada em habeas corpus, anulou o voto do Min.
Nelson Jobim, Presidente, no agravo regimental no HC 85340/SP (acórdão pendente de publicação — v.
Informativo 376), para, por conseguinte, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Min. Marco
Aurélio, relator deste, que concedera o writ para que fosse expedido o alvará de soltura, a fim de
assegurar ao paciente o direito de aguardar, em liberdade, a complementação do julgamento da apelação.
Vencidos os Ministros Ellen Gracie, relatora, Joaquim Barbosa e Carlos Britto, que concediam a ordem
para que fosse anulado o voto do Presidente e reapreciada a matéria.
HC 85529 QO/SP, rel. orig. Min. Ellen Gracie, rel. p/ acórdão Min. Cezar Peluso, 24.2.2005. (HC85529)
Comunicação de Nova Filiação a Partido e Constitucionalidade
O Tribunal julgou improcedente pedido de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo
Partido da Frente Liberal - PFL contra a parte final do parágrafo único do art. 22 da Lei 9.096/95, que
exige que a nova filiação a outro partido seja comunicada ao primeiro partido e ao juiz da respectiva Zona
Eleitoral, para fins de cancelamento, sob pena de anulação de ambas as filiações. Salientando a existência
de distinção doutrinária entre liberdade interna e externa dos partidos políticos, esta concernente à relação
do Estado com o partido, e aquela traduzida como exclusão de qualquer controle quanto à
“democraticidade” interior ou ideológica de um partido, afastou-se a alegada ofensa ao princípio da
autonomia partidária (CF, art. 17, § 1º). Entendeu-se que a questão relativa à dupla filiação não se insere
no âmbito da citada liberdade interna, tratando-se, no caso, de ordenação normativa relativa a dois ou
mais partidos, que tem como escopo evitar a interferência de normas internas de um partido em outro.
Asseverou-se, ainda, que a duplicidade de filiações é vedada em face do princípio constitucional da
fidelidade partidária, cuja inobservância ofenderia sensivelmente o sistema eleitoral. Rejeitou-se, por fim,
a assertiva de que a nulidade das filiações, decorrente da dupla filiação, acrescentaria nova espécie de
inelegibilidade não prevista na CF, já que a filiação é pressuposto de elegibilidade, e não de
inelegibilidade, isto é, para que alguém se torne inelegível há de ser, antes, elegível.
ADI 1465/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 24.2.2005. (ADI-1465)
Vício de Iniciativa e Servidores Públicos
Entendendo caracterizada a afronta à reserva de iniciativa do Chefe do Poder Executivo para as leis
que disponham sobre regime jurídico dos servidores públicos (CF, art. 61, § 1º, II, c), o Tribunal julgou
procedente pedido de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Espírito Santo para declarar a
inconstitucionalidade da Lei Complementar 191/2000, do mesmo Estado, de iniciativa parlamentar, que
trata de regra relativa ao provimento de cargos públicos, relacionando os documentos de apresentação
obrigatória para a posse de servidor público.
ADI 2420/ES, rel. Min. Ellen Gracie, 24.2.2005. (ADI-2420)
Investidura em Cargo Público e Concurso Público -1
Diante da violação ao art. 37, II, da CF, o Tribunal julgou procedente pedido de ação direta ajuizada
pelo Governador do Estado de Rondônia para declarar a inconstitucionalidade do art. 56 da LC 67/92, do
mesmo Estado, que viabilizou, independentemente de prévia aprovação em concurso público, a
integração formal de servidores públicos no Quadro de Pessoal de Autarquias ou Fundações Estaduais
daquela unidade da Federação, desde que esses agentes estivessem, no momento da publicação do ato
normativo em referência, à disposição dessas entidades administrativas.
ADI 1350/RO, rel. Min. Celso de Mello, 24.2.2005. (ADI-1350)
Investidura em Cargo Público e Concurso Público - 2
Por aparente ofensa ao art. 37, II, da CF, o Tribunal deferiu pedido de medida cautelar formulado
em ação direta proposta pelo Procurador-Geral da República para suspender a eficácia dos §§ 1º e 2º do
art. 6º da LC 174/2000, do Estado do Rio Grande do Norte, e dos arts. 2º, §§ 1º e 2º, e 4º, ambos da
Resolução 16/2000, do Tribunal de Justiça do mesmo Estado, que possibilitam que os servidores do
quadro efetivo do citado tribunal optem por integrar as Secretarias dos Juízos no cargo de Auxiliar
Técnico.
ADI 3211 MC/RN, rel. Min. Carlos Britto, 24.2.2005. (ADI-3211)
Ascensão Funcional e Concurso Público
Com base na reiterada jurisprudência da Corte no sentido da impossibilidade do provimento
derivado dos cargos públicos, mediante ascensão funcional, em respeito ao art. 37, II, da CF, o Plenário
julgou procedente pedido de ação direta proposta pelo Procurador-Geral da República para declarar a
inconstitucionalidade da expressão “e garantida a ascensão funcional imediata, constatada a existência
de vaga e mediante concurso, sempre que o servidor comprovar qualificação de nível superior ao da
função que exercer”, constante da parte final do art. 48 da Constituição do Amapá.
ADI 3030/AM, rel. Min. Carlos Velloso, 24.2.2005. (ADI-3030)
Aprovação em Concurso Público e Direito à Nomeação: Inconstitucionalidade
O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido de ação direta proposta pelo Procurador-Geral da
República para declarar a inconstitucionalidade do inciso VII do art. 77 da Constituição do Estado do Rio
de Janeiro, que assegura aos aprovados em concurso público, dentro do número de vagas fixado no
respectivo edital, o direito ao provimento no cargo no prazo máximo de cento e oitenta dias, contado da
homologação do resultado. Com base no entendimento fixado no RE 229.450/RJ (DJU de 31.8.2001) no
sentido de que a CF apenas assegura ao candidato aprovado o direito subjetivo à nomeação de acordo
com a respectiva ordem de classificação e no prazo da validade do concurso, ficando o ato de provimento
adstrito ao poder discricionário da Administração Pública, entendeu-se que a norma impugnada viola os
arts. 2º e 37, IV, da CF. Reconheceu-se, ademais, a afronta à reserva de iniciativa do Chefe do Poder
Executivo prevista no art. 61, § 1º, II, c, da CF. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, Celso de Mello e
Sepúlveda Pertence, que julgavam improcedente o pedido.
ADI 2931/RJ, rel. Min. Carlos Britto, 24.2.2005. (ADI-2931)
PRIMEIRA TURMA
Tráfico Internacional de Entorpecentes e Competência
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia a nulidade do processo, desde o
início, sob a alegação de incompetência absoluta da Justiça Federal para o julgamento de crime de tráfico
internacional de entorpecentes. Sustentava-se, na espécie, a competência da Justiça Estadual de
Naviraí/MS, que não é comarca sede de vara do Juízo Federal, em razão do disposto no art. 27 da Lei
6.368/76, já que a droga fora apreendida no interior de aeronave pousada no referido município em
decorrência de pane mecânica; bem como a violação aos princípios contidos nos arts. 70, 90, 383 e 384
do CPP; e dos arts. 5º, LIII e LV e 109, § 3º da CF, porquanto o meio de transporte utilizado não poderia
ser causa suficiente para alterar regra de competência constitucional. Suscitava-se, ainda, incidente de
uniformização de jurisprudência, ante a suposta divergência de decisões sobre o tema entre as Turmas do
STF (HC 80730/MS, DJU de 3.4.2001 e HC 67735/RO, DJU de 27.4.90). Em conseqüência, pleiteava-se,
no ponto, o sobrestamento do processo até pronunciamento acerca do incidente e, uma vez reconhecida a
divergência, fosse o HC submetido ao Plenário. Preliminarmente, considerou-se desnecessária a
submissão da questão ao Pleno, tendo em conta o entendimento firmado em ambas as Turmas do Tribunal
no sentido de se tratar de competência relativa. No tocante ao mérito, asseverou-se a preclusão do tema de
se saber se a competência seria do Juízo Federal ou do Estadual do local onde apreendida a droga, dado
que suscitado pela primeira vez apenas nas alegações finais. Ademais, ressaltou-se ser territorial o critério
de fixação da competência no caso e, por isso, se nulidade houvesse, seria relativa. Salientou-se, também,
o caráter federal da jurisdição exercida por juiz estadual na hipótese do citado art. 27 da Lei 6.368/76 (“O
processo e o julgamento do crime de tráfico com o exterior caberão à justiça estadual com interveniência
do Ministério Público respectivo, se o lugar em que tiver sido praticado, for município que não seja sede
de vara da Justiça Federal, com recurso para o Tribunal Federal de Recursos”), reforçado pelo disposto
no art. 108, II, da CF, que determina caber aos Tribunais Regionais Federais o julgamento de recurso das
causas decididas pelos juízes estaduais no exercício da competência federal da área de sua jurisdição.
Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ, por considerar que a competência seria em razão da
matéria e não territorial, aplicando, destarte, o Enunciado 522 da Súmula do STF (“salvo ocorrência de
tráfico com o exterior, quando, então, a competência será da justiça federal, compete a justiça dos
Estados o processo e o julgamento dos crimes relativos a entorpecentes”).
HC 85059/MS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 22.2.2005. (HC-85059)
Devido Processo Legal e Vacância de Serventia
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário no qual se objetiva a concessão de segurança
para que seja anulado o ato que declarara vago o cargo ocupado pela recorrente. No caso concreto, tratase de mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de
Santa Catarina que afastara a recorrente da titularidade de cartório, sem a instauração de procedimento
administrativo, com base em decisão do STF que declarara a inconstitucionalidade de dispositivo da
Constituição daquele Estado, norma esta que respaldava a nomeação da ora recorrente (ADI 363/DF, DJU
de 3.5.96). Alega-se ofensa aos arts. 2º, 5º, LIV e LV, e 236, caput e §1º, todos da CF, consistente na
inobservância do devido processo legal e na incompetência da autoridade que desconstituira a nomeação,
uma vez que seria atribuição do Governador do Estado. O Min. Marco Aurélio, relator, deu provimento
ao recurso para conceder a segurança e declarar a nulidade do ato impugnado, com as conseqüências
próprias. Entendeu violado o princípio do devido processo legal, já que o contraditório e a ampla defesa
são assegurados aos litigantes em geral. Por outro lado, considerou que o desfazimento do ato deve ser
realizado pela mesma autoridade que o implementa, na espécie, o Presidente do Tribunal de Justiça.
Asseverou não caber potencializar a referência à delegação do Poder Público feita no citado art. 236 da
CF, nem ao veto ocorrido ao art. 2º da Lei 8.935/94, que dispunha competir ao Poder Judiciário operar a
delegação. Após, pediu vista o Min. Carlos Britto.
RE 355856/SC, rel. Min. Marco Aurélio, 22.2.2005. (RE-355856)
SEGUNDA TURMA
Aumento de Pena e Princípio da Reserva Legal
Por ofensa ao princípio da reserva legal, a Turma deferiu habeas corpus, impetrado em favor de
paciente condenado pela prática do delito do art. 157, § 2º, do CP, para anular a sentença condenatória no
ponto relativo à fixação da pena, a fim de que se proceda à nova estipulação dentro dos limites previstos
em lei. Entendeu-se que a juíza sentenciante, ao exacerbar a pena em 3/5, pela incidência de duas causas
de aumento de pena, extrapolara o limite máximo prescrito na norma, impondo ao paciente reprimenda
superior ao legalmente exigido (“Art. 157.... § 2º. A pena aumenta-se de um terço até metade:...”).
HC 84669/SP, Min. Joaquim Barbosa, 22.2.2005. (HC-84669)
Interpretação Mais Favorável ao Réu e Ampla Defesa
Em razão da afronta ao princípio da ampla defesa, a Turma deferiu habeas corpus impetrado contra
acórdão do STJ — que julgara intempestivo recurso de apelação — para desconstituir o trânsito em
julgado de sentença condenatória. Na espécie, carta postal fora enviada pelo paciente, que se encontrava
preso, na qual manifestara seu interesse de recorrer da sentença. Ocorre que o juiz da causa só
determinara a juntada dessa manifestação um dia após o vencimento do prazo recursal, não tendo havido
interposição de recurso pelo defensor nomeado. Entendeu-se que, existindo dúvida acerca da
tempestividade da manifestação da vontade de apelar do paciente, já que não constante dos autos a data
em que recebido esse pedido, haver-se-ia de adotar a interpretação a ele mais favorável, o que também se
aplicaria em relação a divergência entre essa vontade e a inércia do defensor dativo. Em conseqüência,
determinou-se a abertura de novo prazo para a apresentação de razões recursais.
HC 85239/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 22.2.2005. (HC-85239)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
23.2.2005
22.2.2005
22.2.2005
Extraordinárias
24.2.2005
——
——
Julgamentos
17
72
224
CLIPPING
DO
DJ
25 de fevereiro de 2005
HC N. 84.446-SP
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Advogado: imunidade judiciária: (CF art. 133; C.Penal., art. 142, I; EAOAB, art. 7º, § 2º): não compreensão do
crime de calúnia. 1. O art. 133 da Constituição Federal, ao estabelecer que o advogado é “inviolável por seus atos e manifestações
no exercício da profissão”, possibilitou fosse contida a eficácia desta imunidade judiciária aos “termos da lei”. 2. Essa vinculação
expressa aos “termos da lei” faz de todo ocioso, no caso, o reconhecimento pelo acórdão impugnado de que as expressões contra
terceiro sejam conexas ao tema em discussão na causa, se elas configuram, em tese, o delito de calúnia: é que o art. 142, I, do C.
Penal, ao dispor que “não constituem injúria ou difamação punível (...) a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela
parte ou por seu procurador”, criara causa de “exclusão do crime” apenas com relação aos delitos que menciona - injúria e
difamação -, mas não quanto à calúnia, que omitira: a imunidade do advogado, por fim, não foi estendida à calúnia nem com a
superveniência da L. 8.906/94, - o Estatuto da Advocacia e da OAB -, cujo art. 7º, § 2º, só lhe estendeu o âmbito material - além da
injúria e da difamação, nele já compreendidos conforme o C.Penal -, ao desacato (tópico, contudo, em que teve a sua vigência
suspensa pelo Tribunal na ADInMC 1127, 5.10.94, Brossard, RTJ 178/67).
HC N. 83.936-TO
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: SONEGAÇÃO FISCAL E FALSIFICAÇÃO DE SINAIS PÚBLICOS E VALE POSTAL. PRELIMINAR.
PARCELAMENTO DO DÉBITO TRIBUTÁRIO. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO. SUSPENSÃO DA AÇÃO PENAL.
Comprovado nos autos o parcelamento e o regular pagamento do débito tributário junto à Fazenda estadual, é impositiva a
suspensão da ação penal. Ordem concedida de ofício, para suspender a ação penal enquanto houver o parcelamento do débito
tributário devido à Fazenda estadual. Inteligência do art. 9º, caput, da Lei 10.864/2003, c/c Lei Complementar 104/2001, que alterou
o art. 151 do Código Tributário Nacional.
* noticiado no Informativo 359
Acórdãos Publicados: 170
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
CPI Estadual e Quebra de Sigilo Bancário (Transcrições)
(v. Informativo 362)
ACO 730/RJ*
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
Relatório: Trata-se de mandado de segurança, distribuído em 23.06.2004, impetrado pela ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO
ESTADO DO RIO DE JANEIRO contra ato do BANCO CENTRAL DO BRASIL consubstanciado na negativa de quebra de sigilo
bancário requerida pela Comissão Parlamentar de Inquérito estadual destinada a investigar denúncias de irregularidades e de
corrupção na LOTERJ e no RIOPREVIDÊNCIA. Alega a impetrante ameaça ao pacto federativo, para invocar a competência desta
Corte nos termos do art. 102, I, f, da Constituição federal.
Em síntese, expõe a impetrante, in verbis:
“No caso ora submetido à suprema apreciação dessa Egrégia Corte, um órgão da União Federal - BANCO
CENTRAL DO BRASIL - afirma não poder fornecer dados protegidos por sigilo bancário a um órgão do Estado do Rio de
Janeiro - Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembléia Legislativa Fluminense - simplesmente por ser tal órgão
estadual.” (Fls. 4)
Antes de apreciar o pedido de liminar, solicitei informações, em despacho de 24.06.2004, as quais foram devidamente
prestadas (fls. 30-36), tendo retornado os autos a meu gabinete em 08.07.2004. O BANCO CENTRAL DO BRASIL sustenta a incompetência desta Corte para julgar a impetração. Justifica o ato pela literalidade da redação do art. 4º da Lei Complementar
105/2001, para não atender ao requerimento da CPI estadual de quebra do sigilo bancário do senhor Waldomiro Diniz. Transcrevo o
dispositivo legal invocado:
“Art. 4o O Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários, nas áreas de suas atribuições, e as
instituições financeiras fornecerão ao Poder Legislativo Federal as informações e os documentos sigilosos que,
fundamentadamente, se fizerem necessários ao exercício de suas respectivas competências constitucionais e legais.
§
1o As comissões parlamentares de inquérito, no exercício de sua competência constitucional e legal de ampla
investigação, obterão as informações e documentos sigilosos de que necessitarem, diretamente das instituições financeiras,
ou por intermédio do Banco Central do Brasil ou da Comissão de Valores Mobiliários.
§ 2o As solicitações de que trata este artigo deverão ser previamente aprovadas pelo Plenário da Câmara dos
Deputados, do Senado Federal, ou do plenário de suas respectivas comissões parlamentares de inquérito.” (Grifos nossos)
Indeferi o pedido de liminar e abri vista à Procuradoria-Geral da República, indicando a urgência da questão.
Em seu parecer, o ilustre procurador-geral opina pelo conhecimento da presente impetração, pela alínea f do inciso I do art.
102 da Constituição. E destaca, in verbis:
“Assim, então, vista a questão, ou seja que as comissões parlamentares são instrumentos vitais à atuação do Poder
Legislativo por certo os textos das Constituições estaduais, que as reproduzem, sob este aspecto, o modelo federal, tais
textos sintonizam-se perfeitamente não permitindo a ruptura interpretava, redutora, que o réu está a fazer.” (Fls. 43)
Manifesta-se ainda pela procedência da ação, para que se determine ao Banco Central do Brasil o fornecimento da
documentação requerida pela CPI estadual.
Na sessão de 26.08.2004, o Pleno decidiu, em questão de ordem, pela competência deste Supremo Tribunal Federal para
processar e julgar a presente impetração.
É o relatório.
Voto: Sr. Presidente, em despacho de 09 de agosto último, indeferi a liminar, atento, de um lado, à ponderável argumentação do
BANCO CENTRAL DO BRASIL no sentido de que o princípio da presunção de constitucionalidade estaria a militar em favor do
art. 4º da Lei Complementar 105/2001, o que ipso facto subtrairia à impetração um dos requisitos da concessão da liminar, qual seja,
o do fumus boni iuris. Por outro lado, deixei de conceder a liminar tendo em vista o imperativo de prudência que me parece
incontornável em matéria de concessão de cautelares, as quais, em certos casos, como na hipótese dos autos, podem assumir eficácia
satisfativa, esgotando por completo o objeto da ação mandamental postulada perante a composição plenária da Corte.
Noto ainda que as ações que atacam a Lei Complementar 105 (ADI 2.386, ADI 2.390 e ADI 2.397) não tratam do art. 4º em
questão, e o assunto, ao que parece, é novidade que se apresenta à Corte.
Adianto que, melhor refletindo sobre o problema, revi minha primeira leitura do pedido e votarei pela concessão parcial da
segurança, com as seguintes considerações.
Vejamos, inicialmente, o conteúdo do ato atacado neste mandado de segurança. O Banco Central do Brasil recusou-se a
proceder à quebra de sigilo bancário solicitada pela Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, alegando o seguinte:
“Reportamo-nos ao Ofício 59, de 24.3.04, recebido neste Banco Central em 2.4.04, em que V.Exa., como Presidente da
Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, criada pela Resolução ALERJ
n° 425/2004 para investigar as denúncias de irregularidades e corrupção na Loterj e no Rioprevidência, solicita
‘informações de movimentação bancária, financeira e de crédito envolvendo o Sr. WALDOMIRO DINIZ - CPF: [suprimido],
ora investigado’, no período que assinala.
2. De ordem do Sr. Presidente deste Banco Central e consoante esclarecimentos prestados pelo setor jurídico, consignamos
a V.Exa. que esta Autarquia está impossibilitada de atender à solicitação de V.Exa., em razão das disposições contidas na
Lei Complementar 105, de 10.1.01, referentes ao sigilo bancário, que não autorizam o Poder Legislativo Estadual a ter
acesso às operações ativas e passivas e aos serviços prestados pelas instituições financeiras.
3. Assim sendo, na hipótese em tela, a não ser que haja expressa autorização do investigado, ou específica determinação
judicial, a solicitação de V.Exa. não poderá ser atendida por este Banco Central.” (Fls. 22)
O Banco Central fez no caso uma leitura meramente textual, formalista, da questão e concluiu que as assembléias legislativas
estaduais não têm o poder de determinar a quebra de sigilo bancário, porque a lei federal de regência da matéria a elas não se refere
expressamente.
Começo com uma consideração prévia, que poderia ser suscitada como óbice à concessão da ordem: pretendo deixar claro
que não ignoro o fato de estarmos tratando de matéria que para muitos se insere no campo dos direitos fundamentais, cuja proteção a
Constituição confia a esta Corte como uma das suas magnas atribuições.
Para aqueles que conferem ao sigilo bancário uma fundamentalidade extremada, com a qual eu não concordo, qualquer
restrição a esse direito haveria de superar obstáculos rigorosos, entre os quais a exigência de legalidade estrita para o
estabelecimento de qualquer tipo de restrição (é a questão dos limites dos limites aos direitos fundamentais).
Mas essas são alegações ancilares, que estão prejudicadas ante a constatação de que o sigilo bancário não é protegido de
forma absoluta em nosso sistema.
A meu ver, a interpretação formalista do Banco Central do Brasil seria válida apenas se a proteção garantida pela ordem
constitucional atual ao sigilo dos dados bancários fosse uma proteção de natureza absoluta, traduzida pela exigência de
incontornável reserva legal para legitimar a determinação de quebra do sigilo.
No entanto, no julgamento do MS 21.729 (Pleno, 05.10.1995, rel. min. Néri da Silveira), quando se discutia a possibilidade
de o Ministério Público Federal requisitar informações ao Banco do Brasil, esta Corte ressaltou justamente a relativização dessa
proteção. A despeito das peculiaridades daquele caso, permito-me destacar as seguintes considerações do voto do eminente ministro
Sepúlveda Pertence proferido naquela ocasião:
“Não entendo que se cuide de garantia com status constitucional. Não se trata da ‘intimidade’ protegida no inciso X
do art. 5º da Constituição Federal. Da minha leitura, no inciso XII da Lei Fundamental, o que se protege, e de modo
absoluto, até em relação ao Poder Judiciário, é a comunicação ‘de dados’ e não os ‘dados’, o que tornaria impossível
qualquer investigação administrativa, fosse qual fosse. Reporto-me, no caso, brevitatis causae, a um primoroso estudo a
respeito do Professor Tércio Sampaio Ferraz Júnior.
Em princípio, por isso, admitiria que a lei autorizasse autoridades administrativas, com função investigatória e
sobretudo o Ministério Público, a obter dados relativos a operações bancárias.
(...)
No caso, entretanto, há um dado, para mim bastante, já acentuado por vários dos Senhores Ministros: a revelação de
que o mecanismo da equalização das taxas de juros importa utilização de recursos públicos, de recursos do Tesouro
Nacional para viabilizar as questionadas operações de crédito privilegiado à lavoura canavieira. Há pois, como objeto das
indagações do Procurador-Geral ao Banco do Brasil, não operações bancárias comuns, mas atos de gestão de dinheiros
públicos. Ora, em matéria de gestão de dinheiro público, não há sigilo privado, seja ele de status constitucional ou
meramente legal, a opor-se ao princípio basilar da publicidade da administração republicana.”
Também nesse sentido, o pronunciamento do ministro Francisco Rezek naquela oportunidade:
“Parece-me, antes de qualquer outra coisa, que a questão jurídica trazida à corte neste mandado de segurança não
tem estatura constitucional. Tudo quanto se estampa na própria Carta de 1988 são normas que abrem espaço ao tratamento
de determinados temas pela legislação complementar. É neste terreno, pois, e não naquele da Constituição da República,
que se consagra o instituto do sigilo bancário - do qual já se repetiu ad nauseam, neste país e noutros, que não tem caráter
absoluto. Cuida-se de instituto que protege certo domínio - de resto nada transcendental, mas bastante prosaico - da vida
das pessoas e das empresas, contra a curiosidade gratuita, acaso malévola, de outros particulares, e sempre até o exato
ponto onde alguma forma de interesse público reclame sua justificada prevalência.
Não que ainda não se tenha tentado levar ao texto constitucional a garantia do sigilo bancário, qual sucedeu, sem
êxito, em 1984, conforme lembrado nestes autos pelo Vice-Procurador-Geral Moacir Machado Silva - numa das peças mais
consistentes, e de maior brilho, que o Ministério Público tem produzido em feitos da competência desta casa. O
empreendimento frustrou-se, e a mesma lei de 31 de dezembro de 1964, sede explícita do sigilo bancário, disciplina no seu
artigo 38 exceções, no interesse não só da justiça, mas também no do parlamento e mesmo no de repartições do próprio
governo - mal se entendendo por quê um diploma ulterior, como a Lei Complementar 75/93, não as poderia modificar ou
estender.
Tenho dificuldade extrema em construir, sobre o artigo 5º, sobre o rol constitucional de direitos, a mística do sigilo
bancário somente contornável nos termos de outra regra da própria Carta. O inciso X afirma invioláveis ‘a intimidade, a
vida privada, a honra e a imagem das pessoas’, valores que não têm merecido, diga-se de passagem, maior respeito por
parte da sociedade brasileira de nossa época - e dos meios de comunicação de massa, que em última análise atendem à
demanda e ao gosto, ainda no que têm de menos nobre ou construtivo, dessa mesma sociedade.”
É nesses termos que esse tipo de sigilo parece não encerrar um valor próprio, mas freqüentemente vinculado a outras
garantias constitucionais, especialmente à inviolabilidade da intimidade do cidadão.
Daí se entender que a prerrogativa de que dispõem as comissões parlamentares de inquérito é lida por esta Corte a partir dos
princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, que representam a pedra de toque do controle jurisdicional da atividade dessa
importante função fiscalizadora do Poder Legislativo.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é rica no delineamento dos limites dos poderes investigatórios das comissões
parlamentares de inquérito, notadamente quando se trata de coibir quebra de sigilo bancário em decisão sem fundamentação (cf. MS
23.452, rel. min. Celso de Mello; MS 23.619 e MS 23.668, rel. min. Octavio Gallotti; MS 23.843, rel. min. Moreira Alves, v.g.).
Firmou-se, desse modo, o entendimento segundo o qual se exige das comissões de inquérito a “demonstração da existência de causa
provável” para justificar o requerimento de quebra do sigilo (cito o MS 24.217, rel. min. Maurício Corrêa, e o MS 24.028, rel. min.
Néri da Silveira).
Observo, contudo, que neste caso a alegação é de natureza diversa, tratando da própria noção de equilíbrio federativo e da
garantia, aos estados-membros, de exercício, por um de seus poderes, de prerrogativas essenciais em nossa atual conformação das
instituições públicas.
Surge das posições contrapostas na presente ação a seguinte indagação: prevalece a literalidade do § 3º do art. 58 da
Constituição federal, de aplicação geral temperada pela jurisprudência do STF, ou prevalece a omissão da legislação específica?
Para uma possível resposta, acredito seja necessário fixar entendimento sobre os seguintes tópicos:
(i) Impõe a Constituição de 1988 a simetria entre as disciplinas aplicáveis às esferas estaduais e federal sobre a
delimitação dos poderes das comissões parlamentares de inquérito?
(ii) Sendo a disciplina do sistema financeiro competência legislativa exclusiva da União, poderia esta, por ato
legislativo, restringir os poderes de CPI estadual em casos de investigação de dados protegidos pelo sigilo bancário?
O fato, Sr. Presidente, é que entendo que essa matéria há de ser examinada à luz do princípio federativo. Em outras palavras,
a questão deve ser vista sob uma perspectiva estrutural e sistemática, tendo como norte o princípio federativo.
Já advertiu o eminente ministro Sepúlveda Pertence, no julgamento da ADI 98 (cf. igualmente a ADI 1.749, rel. min.
Sepúlveda Pertence, Pleno, 18.12.1997), ao tratar do princípio da separação de poderes, que para este não há “fórmula universal
apriorística”, sendo necessário extrair da atual Constituição o traço essencial da atual ordem, para efeito de controle de
constitucionalidade das normas constitucionais estaduais, sobretudo em face do que o ministro descreve como “uma terceira
modalidade de limitações à autonomia constitucional dos Estados: além dos grandes princípios e das vedações - esses e aqueles,
implícitos ou explícitos - hão de acrescentar-se as normas constitucionais centrais que, não tendo o alcance dos princípios, nem o
conteúdo negativo das vedações, são, não obstante, de absorção compulsória - com ou sem reprodução expressa - no ordenamento
parcial dos Estados e Municípios”.
Entendo que a possibilidade de criação de comissões parlamentares de inquérito seja uma dessas normas de “absorção
compulsória” nos estados-membros, destinada a garantir o potencial do poder legislativo em sua função de fiscal da administração.
Assim, em nossa estrutura federativa, um dos traços fundamentais da separação de poderes - que é a fiscalização da
administração pelo Legislativo reforçada pelos meios a ela inerentes - não autoriza eventual pretensão restritiva dos estadosmembros. Esta Corte, ao examinar alegações de excesso dos constituintes estaduais, sistematicamente procura assegurar a
reprodução nas Constituições estaduais das noções de equilíbrio na separação de poderes estaduais (v.g., ADI 165, rel. min.
Sepúlveda Pertence, Pleno, 07.08.1997; ADI 217, rel. min. Ilmar Galvão, Pleno, 28.08.2002), de impossibilidade de renúncia à
autonomia estadual (ADI 1.425, rel. min. Marco Aurélio, Pleno, 1º.10.1997) ou de competências concorrentes (ADI 2.544, rel. min.
Sepúlveda Pertence, Pleno, 12.06.2002). A extensa relação de julgados em que se constatou o excesso por parte dos estados não
eclipsa, por outro lado, as ressalvas desta Corte sobre a disciplina de questões orgânicas, a exemplo do que ocorre em questões
referentes à organização das casas legislativas (cf. Rp 1.245-RN, rel. min. Oscar Corrêa, Pleno, 15.10.1986; ADI 792-RJ, rel. min.
Moreira Alves, Pleno, 26.05.1997) ou a normas procedimentais para a eleição indireta destinada a suprir a vacância dos cargos de
governador e vice-governador para exercício de mandato residual (ADI 1.057-MC, rel. min. Celso de Mello, Pleno, 20.04.1994),
ressalvas essas que avançam até mesmo para uma compreensão mais elaborada dos meandros das relações entre entes da Federação.
Destaco, a esse respeito, dois julgados interessantes. Na ADI 2.452-MC (rel. min. Nelson Jobim, Pleno, 24.09.2003),
decidiu-se que um estado-membro, ao proceder a projeto de desestatização, poderia estabelecer restrições à participação de
empresas estatais de outros estados-membros, como medida de garantia de autonomia da política estadual de serviços públicos.
Na ADI 1.001 (rel. min. Carlos Velloso, Pleno, 08.08.2002), declarou-se a constitucionalidade de norma da Constituição
gaúcha que prevê a possibilidade de requerimento de informações, pelas câmaras municipais, a órgãos da administração estadual
situados no município.
Registro ainda a decisão liminar monocrática da eminente ministra Ellen Gracie no MS 23.866-MC (DJ 14.02.2001),
impetrado pela União, para determinar a suspensão da CPI da CODEBA, sociedade de economia mista federal, a partir da
plausibilidade da alegação, fundada na incompetência da CPI estadual.
Esses julgados indicam inegável tendência da Corte à manutenção de esferas necessárias de autonomia dos entes federados,
dentro do que é permitido em nosso modelo substancialmente centrípeto de federalismo.
Não é de estranhar, portanto, que, ainda na vigência da Constituição anterior e da Lei 4.595/1964, cujo art. 38, hoje revogado,
continha a mesma omissão do art. 4º da Lei Complementar 105/2001, ora impugnada, esta Corte tenha se manifestado pela
legitimidade de criação de comissão parlamentar de inquérito por Câmara Municipal. Cito o RE 96.049 (rel. min. Oscar Corrêa,
Primeira Turma, 30.06.1983), do qual destaco o seguinte trecho:
“(...) parece-nos indubitável que as Câmaras Municipais podem criar Comissões de Inquérito sobre fato determinado
e prazo certo, nos moldes que a Constituição Federal autoriza à Câmara e ao Senado, as Constituições Estaduais autorizam
às Assembléias Legislativas e a Lei Orgânica dos Municípios do Estado de São Paulo autoriza às Câmaras Municipais, ou,
mais longe ainda, o próprio Regimento Interno destas pode prever, respeitados os parâmetros federal e estadual.
Cremos, mesmo que é de todo interesse sejam elas criadas pelo legislativo municipal. Há cerca de 28 anos, na
Câmara dos Deputados, debatendo a matéria, referíamos que ‘o poder de criar comissões de inquérito é implícito, é ínsito
ao Poder Legislativo, pela própria natureza da função, que lhe cabe, de legislar, de fiscalizar e de controlar, exercendo
tarefa permanente de vigília sobre todos os negócios públicos’ (D. do Congresso Nacional, Seção I, 28/6/1955 - p.
3684/3686).
E o limite que a essa função se põe é apenas o do respeito à independência e harmonia com os demais poderes,
dentro do texto constitucional. E há de ser informando-se das condições do desempenho da administração municipal - do
Governo Municipal - que a Câmara Municipal bem cumprirá as suas funções.
Não vemos, pois como recursar-lhe a competência para criá-las.”
Ressalvo que, embora me ponha inteiramente de acordo com a essência do precedente supracitado, que consagra a
viabilidade constitucional de criação de CPIs por câmaras municipais, não estendo aos legislativos municipais a prerrogativa que
preconizo, neste voto, para as assembléias estaduais - isto é, a possibilidade de quebra de sigilo bancário.
Voltemos ao tema central da impetração.
A quebra de sigilo bancário, quando regularmente determinada por comissões parlamentares de inquérito, constitui
ferramenta indispensável ao exercício da função de fiscalização pelos órgãos legislativos. Como se sabe, a fiscalização exercida
pelos órgãos legislativos, aí incluídos os legislativos estaduais, é um mecanismo essencial dos checks and counterchecks por meio
dos quais um ramo do poder controla o outro, assegurando, assim, um certo equilíbrio no exercício das funções governamentais,
tendo por objetivos derradeiros a liberdade e a satisfação do bem comum. Dessa ferramenta de fiscalização muitas vezes depende a
efetividade das investigações levadas a efeito pelas comissões parlamentares de inquérito. Não é por outra razão que a Constituição
federal, em seu art. 58, § 3º, afirma que essas comissões têm poderes investigatórios próprios das autoridades judiciais. Esse
dispositivo ilustra bem a importância que a Carta Magna atribui à função fiscalizadora exercida pelo Legislativo, conferindo a esse
Poder os meios eficazes de exercer a sua missão constitucional.
Aliás, essa importância conferida à função de fiscalização decorre talvez de uma simples constatação daquilo que já foi
avançado por alguns juristas mais argutos: o fato de que, na configuração moderna do Estado, a função de fiscalização tende a
superar em relevo a própria função legislativa do Estado.
No quadro constitucional e federativo brasileiro, a fiscalização dos órgãos da Administração exercida sem exclusividade
pelos órgãos legislativos constitui um pendant necessário, uma decorrência natural de um princípio constitucional sensível, o
princípio da obrigatoriedade da prestação de contas da administração pública, direta e indireta (art. 34, VII, d), princípio esse cujo
descumprimento pode ensejar o mais traumático dos eventos constitucionais suscetíveis de ocorrer em um Estado federal: a
intervenção federal no estado-membro.
Ora, se a Constituição federal autoriza a União a intervir no estado-membro em razão de descumprimento do princípio da
prestação de contas da Administração, parece-me juridicamente insustentável o ato do Banco Central, uma entidade integrante da
estrutura administrativa da União, de recusar à assembléia legislativa um instrumento fundamental para o exercício da sua função
fiscalizadora, cujo acionamento pode dar-se, entre outras hipóteses, precisamente na de violação, pela Administração, do princípio
constitucional da prestação de contas.
Para sintetizar esse primeiro e mais importante fundamento do meu voto, eu diria que a quebra de sigilo bancário pelas
comissões parlamentares de inquérito constitui instrumento inerente ao exercício da função fiscalizadora ínsita aos órgãos
legislativos e, como tal, dela também podem fazer uso as CPIs instituídas pelas assembléias legislativas, desde que observados os
requisitos e as cautelas preconizadas em inúmeras decisões desta Corte acerca do tema.
O contrário, ou seja, retirar dos legislativos estaduais a possibilidade de se utilizarem desse instrumento, equivale a criar um
elemento adicional de apoucamento das já institucionalmente fragilizadas unidades integrantes da nossa Federação.
A respeito desse tópico, concluo, portanto, que em termos gerais, ressalvadas diferenças orgânicas entre o Legislativo federal
e os estaduais, o art. 58, § 3º, da Constituição pressupõe inegável semelhança entre as comissões parlamentares de inquérito federais
e estaduais, do que resulta a impossibilidade de os estados-membros as vedarem.
Dessa primeira conclusão decorre a impossibilidade de a legislação federal limitar os Legislativos estaduais ou estabelecerlhes proibições desproporcionais. Tanto seria assim que acredito que a expressa exclusão das CPIs estaduais e municipais da
redação original do projeto de lei complementar (emenda apresentada pelo senador Vilson Kleinübing na Comissão de Assuntos
Econômicos do Senado Federal, no Projeto de Lei do Senado 219/1995, Parecer 58/1998) não tem resultado prático, pois não tem o
condão de negar a aplicação natural da Constituição federal sobre os poderes das CPIs.
É que a possibilidade de as CPIs estaduais determinarem a quebra de sigilo permanece, ainda que sem tratamento legal
específico, por aplicação direta da Constituição federal e das normas estaduais aplicáveis, sendo impossível ignorar que a
Constituição do Estado do Rio de Janeiro legitima a atuação da CPI em questão.
Reforça ainda minha convicção o fato de que a lei complementar de regência da matéria viabilizou o fornecimento de dados
bancários a órgãos fiscalizadores puramente administrativos (como a COAF do Ministério da Fazenda e a CVM) e até mesmo a
entidades privadas (entidade de proteção ao crédito - SERASA - v. art. 1º, § 3º, II, da LC 105/2001), mantendo-se, contudo, omissa
quanto às CPIs estaduais.
Do exposto, voto pelo conhecimento e provimento parcial do mandado de segurança, para que se determine ao Banco Central
do Brasil que forneça as informações requeridas pela Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembléia Legislativa do Estado do
Rio de Janeiro, destinada a investigar irregularidades na LOTERJ e no RIOPREVIDÊNCIA.
* acórdão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 378
Brasília, 28 de fevereiro a 4 de março de 2005 Nº 378
Data (páginas internas): 9 de março de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
ADI e Lei do Petróleo - 3
Emenda Parlamentar e Vício de Iniciativa - 3
Princípio da Simetria e Processo Legislativo
Aumento de Remuneração e Vício de Iniciativa
Servidor Público e Vício de Iniciativa
Emenda Parlamentar e Vício de Iniciativa
Telecomunicações: Competência Legislativa
Crime de Redução a Condição Análoga à de Escravo e Competência
Recondução de Vogal e Inconstitucionalidade
ADI e Bingo Eletrônico
Mensalidades Escolares e Prazo para Pagamento
1ª Turma
Produção Antecipada de Provas: Impossibilidade
2ª Turma
Pronúncia e Fundamentação de Qualificadora
Regressão de Regime: Falta Grave e Interrupção de Prazo
Clipping do DJ
Transcrições
Mandado de Injunção - Pressupostos. EC 45/2004 (Julgamento das Causas sem Dilações Indevidas)
(MI 715/DF)
PLENÁRIO
ADI e Lei do Petróleo - 3
O Tribunal retomou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Governador
do Estado do Paraná contra diversos dispositivos da Lei federal 9.478/97, que dispõe sobre a política
energética nacional, as atividades relativas ao monopólio do petróleo, institui o Conselho Nacional de
Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo e dá outras providências — v. Informativos 361 e
362. O Min. Marco Aurélio, em voto-vista, julgou procedente, em parte, o pedido para declarar a
inconstitucionalidade da expressão “conferindo-lhe a propriedade desses bens, após extraídos”, contida
no art. 26, caput, e seu § 3º, dos incisos I e III do art. 28, do parágrafo único do art. 43 e do parágrafo
único do art. 51, todos da Lei 9.478/97. Após apresentar breve histórico sobre o monopólio do petróleo no
Brasil, concluiu não ser possível a coexistência desse regime com a transferência total da propriedade de
sua lavra, a qual afeta a soberania nacional e o interesse público. Salientou que, em razão das crises
internacionais do petróleo e do receio de que os contratos de risco pudessem prejudicar os interesses
nacionais, adotou-se, na CF/88, tratamento diferenciado referente à exploração dos recursos minerais em
geral (CF, art. 176) e do petróleo em particular (CF, art. 177), o que já vinha sendo feito desde 1938,
quando se reconheceu o caráter estratégico do petróleo para soberania do país. Afirmou que da leitura do
caput do art. 173 da CF depreende-se que a exploração direta da atividade econômica do Estado somente
pode ocorrer quando for necessária aos imperativos de segurança nacional ou de relevante interesse
coletivo e que o monopólio da União, previsto no art. 177, foi estabelecido justamente para poder
obedecer a tais ditames. Esclareceu que a flexibilização do regime monopolista decorrente da EC 9/95
(CF, art. 177, §§ 1º e 2º) não implicou quebra de monopólio, que continua pertencendo à União, mas
apenas permitiu que a execução da atividade não mais ficasse a cargo, exclusivamente, da PETROBRÁS,
e sim pudesse ser compartilhada com outras empresas privadas. Ressaltou que, de acordo com o inciso I
do § 2º do art. 177, a lei que estipular as condições por meio das quais a União poderá contratar com
empresas privadas deverá obrigatoriamente determinar a garantia do fornecimento dos derivados de
petróleo em território nacional, previsão esta que revela a destinação específica do petróleo e a limitação
ao livre exercício de sua propriedade, impedindo que o petróleo seja alienado por mera disponibilidade de
vontade da Administração Pública. Destacou, também, a importância de serem resguardadas as reservas
nacionais de petróleo para o abastecimento interno e o fato de o Brasil estar a um passo da autosuficiência, prevista para o ano de 2006. O Min. Marco Aurélio indeferiu o pedido quanto ao art. 60,
caput, por considerar que o setor petrolífero demanda supervisão permanente, sendo que a criação da
ANP – Agência Nacional do Petróleo, como entidade reguladora, e conforme previsão constitucional,
visa afastar práticas abusivas pelas empresas privadas exploradoras de petróleo, condutas
anticoncorrenciais ou concentrações empresariais, bem como garantir a qualidade da produção, o
abastecimento do mercado interno, a continuidade do serviço, o respeito às questões ambientais, em prol
da preservação do interesse público. Após, o Min. Eros Grau pediu vista dos autos.
ADI 3273/DF, rel. Min. Carlos Britto, 2.3.2005. (ADI-3273)
Emenda Parlamentar e Vício de Iniciativa - 3
O Tribunal, em conclusão de julgamento, não conheceu de recurso extraordinário interposto contra
acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que negara a ex-prefeitos do Município de
Belo Horizonte o direito de continuarem a receber o subsídio mensal vitalício previsto no art. 21 da Lei
municipal 3.052/79, resultante de emenda parlamentar, posteriormente revogado pela Lei municipal
5.714/90 — v. Informativos 245 e 363. Entendeu-se inexistente o direito adquirido à pensão em questão,
já que inserida em lei violadora do princípio da iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo (CF/69,
art. 65, caput, § 1º), vício este que não poderia ser sanado em virtude da não submissão da norma ao
controle abstrato de inconstitucionalidade nem pela superveniência de regulamento da referida vantagem
por meio de decreto e nem pelo fato de seu pagamento não ter sido interrompido com o advento da
CF/88, cujo inciso I do art. 63, de observância compulsória pelos Estados e Municípios, veda aumento de
despesa prevista em projetos de iniciativa exclusiva do Presidente da República. (CF/69: “Art. 65. É da
competência do Poder Executivo a iniciativa das leis orçamentárias e das que abram créditos, fixem
vencimentos e vantagens dos servidores públicos, concedam subvenção ou auxílio ou, de qualquer modo,
criem ou aumentem a despesa pública. § 1º Não será objeto de deliberação a emenda de que decorra
aumento de despesa global ou de cada órgão, fundo, projeto ou programa, ou que vise a modificar-lhe o
montante, a natureza ou o objetivo.”).
RE 290776/MG, rel. orig. Min. Ilmar Galvão, rel. p/ acórdão Min. Carlos Velloso, 2.3.2005. (RE290776)
Princípio da Simetria e Processo Legislativo
O Tribunal iniciou julgamento de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Piauí contra os
incisos III, VII, VIII, IX e X do parágrafo único do art. 77 da Constituição estadual, que impõe a edição
de lei complementar para disciplinar o Estatuto dos Servidores Públicos Civis e dos Servidores Militares,
a Lei Orgânica do Magistério Público do Estado; a Lei Orgânica da Administração Pública, o Estatuto da
Polícia Civil e o Estatuto Administrativo do Fisco Estadual. O Min. Eros Grau, relator, julgou o pedido
procedente por entender que os dispositivos impugnados ferem o princípio da simetria, pois exigem lei
complementar para regulação de matérias para as quais a Constituição do Brasil prevê o processo
legislativo ordinário. O julgamento foi suspenso com o pedido de vista do Min. Sepúlveda Pertence.
ADI 2872/PI, rel. Min. Eros Grau, 2.3.2005. (ADI-2872)
Aumento de Remuneração e Vício de Iniciativa
Em razão da manifesta usurpação da competência privativa do Chefe do Poder Executivo para
dispor sobre aumento de remuneração de cargos, empregos ou funções referentes à Administração direta
(CF, art. 61, § 1º, II, a), de observância obrigatória pelos Estados-membros, o Tribunal julgou procedente
pedido de ação direta proposta pelo Governador do Estado do Rio Grande do Norte para declarar a
inconstitucionalidade da Lei 6.619/94, do referido Estado, que, resultante de emenda parlamentar, estende
aos policiais militares os mesmos percentuais alcançados pelos professores com diploma de nível
superior.
ADI 1124/RN, rel. Min. Eros Grau, 2.3.2005. (ADI-1124)
Servidor Público e Vício de Iniciativa
Por afronta à reserva de iniciativa do Chefe do Poder Executivo para as leis que disponham sobre
servidores públicos, seu regime jurídico, e provimento de cargos (CF, art. 61, § 1º, II, c), de observância
obrigatória pelos Estados-membros, o Tribunal julgou procedente pedido de ação direta proposta pelo
Governador do Estado do Rio Grande do Sul para declarar a inconstitucionalidade do art. 25 da Lei
11.672/2001, do mesmo Estado, que, resultante de emenda parlamentar, assegura a todo servidor a opção
para o Plano de Carreira dos Servidores de Escola, independentemente do quadro a que pertencer, desde
que seja comprovado o exercício de suas funções em escola ou órgão da Secretaria da Educação.
Ressaltou-se, ademais, que o preceito impugnado, ao regular o provimento de cargos de servidores sem
concurso prévio, viola o art. 37, caput, e II, da CF.
ADI 2804/RS, rel. Min. Eros Grau, 2.3.2005. (ADI-2804)
Emenda Parlamentar e Vício de Iniciativa
Por ofensa ao art. 61, § 1º, II, a, da CF — que diz ser de iniciativa privativa do Chefe do Poder
Executivo as leis que disponham sobre criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração
direta e autárquica, ou impliquem aumento de sua remuneração —, bem como ao art. 63, I, da CF (“Não
será admitido aumento da despesa prevista:... I - nos projetos de iniciativa exclusiva do Presidente da
República, ressalvado o disposto no art 166, §§ 3º e 4º”), o Tribunal julgou procedente pedido de ação
direta ajuizada pelo Governador do Estado do Amapá para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 2º
e 5º da Lei 645/02, do mesmo Estado, decorrentes de emenda parlamentar que suprimiu regra anterior do
projeto de lei original, que vedava o recebimento da gratificação de ensino modular por servidores não
ligados ao “Sistema Modular de Ensino”. Entendeu-se que os dispositivos impugnados ampliaram as
hipóteses de concessão de gratificação a servidor público, gerando aumento de despesa.
ADI 3177/AP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 2.3.2005. (ADI-3177)
Telecomunicações: Competência Legislativa
O Tribunal iniciou julgamento de mérito de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado de
Santa Catarina contra a Lei 11.908/2001, do mesmo Estado, de iniciativa parlamentar, que fixa as
condições de cobrança dos valores da assinatura básica residencial dos serviços de telefonia fixa. O Min.
Eros Grau, relator, julgou procedente o pedido por entender caracterizada a ofensa aos arts. 21, XI, e 22,
IV, da CF (“Art. 21. Compete à União ... XI - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão
ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos
serviços, a criação de um órgão regulador... Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:...
IV -... telecomunicações...”), no que foi acompanhado pelos Ministros Cezar Peluso, Gilmar Mendes e
Carlos Velloso. Após, pediu vista dos autos o Min. Carlos Britto.
ADI 2615/SC, rel. Min. Eros Grau, 3.3.2005. (ADI-2615)
Crime de Redução a Condição Análoga à de Escravo e Competência
O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do TRF da 1ª
Região que declarara a incompetência absoluta da justiça federal para processar e julgar o crime de
redução a condição análoga à de escravo (CP, art. 149). O Min. Joaquim Barbosa, relator, deu provimento
ao recurso para anular o acórdão recorrido e determinar sua devolução ao TRF para julgamento da
apelação. Entendeu que quaisquer condutas que violem não só o sistema de órgãos e instituições que
preservam, coletivamente, os direitos e deveres dos trabalhadores, mas também o homem trabalhador,
atingindo-o nas esferas em que a Constituição lhe confere proteção máxima, se enquadram na categoria
dos crimes contra a organização do trabalho, se praticadas no contexto de relações de trabalho. Concluiu
que, nesse contexto, o qual sofre influxo do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana,
informador de todo o sistema jurídico-constitucional, a prática do crime em questão se caracteriza como
crime contra a organização do trabalho, de competência da justiça federal (CF, art. 109, VI).
Acompanharam o relator os Ministros Eros Grau, Carlos Britto e Sepúlveda Pertence. Em divergência, o
Min. Cezar Peluso negou provimento ao recurso, ao fundamento de que os crimes contra a organização
do trabalho são aqueles que tipicamente, e tipificadamente, dizem respeito à relação do trabalho e não os
que eventualmente tenham essa relação, como no crime sob análise. O Min. Carlos Velloso também
negou provimento ao recurso, mantendo a jurisprudência do STF no sentido de que apenas compete à
justiça federal o julgamento de crimes contra a organização do trabalho que afetem diretamente o sistema
de órgãos e instituições do trabalho. Após, o Min. Gilmar Mendes pediu vista dos autos.
RE 398041/PA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 3.3.2005. (RE-398041)
Recondução de Vogal e Inconstitucionalidade
O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido de ação direta proposta pelo Procurador-Geral da
República para declarar a inconstitucionalidade da expressão “admitida a recondução da metade destes
por mais um período”, contida no § 1º do art. 7º, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado
de Pernambuco, que dispõe sobre a composição do Conselho da Magistratura. Considerando ser este um
órgão de direção, entendeu-se que o preceito regimental questionado viola a competência legislativa
prevista no art. 93 da CF (“Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre
o Estatuto da Magistratura,...”), bem como não observa a regra contida no art. 102 da LOMAN (LC
35/79), recepcionada pela CF/88, que, disciplinando o período dos mandatos dos membros dos órgãos
colegiados de direção, veda a recondução. Vencidos os Ministros Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio e
Carlos Britto, que julgavam o pedido improcedente.
ADI 1985/PE, rel. Min. Eros Grau, 3.3.2005. (ADI-1985)
ADI e Bingo Eletrônico
O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada
pelo Procurador-Geral da República contra o § 2º do art. 62 da Lei 7.156/99, do Estado do Mato Grosso,
que versa sobre instalação de máquinas de exploração do jogo do bingo. Na linha do que decidido no
julgamento da ADI 2847/DF (DJU de 26.11.2004), entendeu-se que o dispositivo impugnado usurpa a
competência privativa da União para legislar sobre sistemas de consórcios e sorteios, terminologia esta
que abrange loterias e bingos (CF, art. 22, XX), bem como sobre direito penal (CF, art. 22, I), tendo em
vista que a exploração de loteria se dá como derrogação excepcional das normas de direito penal,
constituindo serviço público exclusivo da União insuscetível de concessão, nos termos do art. 1º do
Decreto-lei 204/67. Os Ministros Carlos Britto, Gilmar Mendes e Sepúlveda Pertence fizeram ressalva
quanto a essa última ofensa, por entender que o parágrafo atacado não trata de matéria penal. Vencido o
Min. Marco Aurélio que julgava improcedente o pedido, por considerar que compete também aos Estados
legislar sobre a matéria.
ADI 2948/MT, rel. Min. Eros Grau, 3.3.2005. (ADI-2948)
Mensalidades Escolares e Prazo para Pagamento
O Tribunal iniciou julgamento de mérito de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela
Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino - CONFENEN contra a Lei 10.989/93, do Estado
de Pernambuco, que fixa o último dia do mês em que ocorrer a prestação dos serviços educacionais como
prazo para pagamento das mensalidades escolares naquele Estado. O Min. Eros Grau, relator, julgou
procedente o pedido, por considerar que a norma impugnada trata de ordenação normativa de relações
contratuais, tema de direito civil, cuja competência legislativa é da União (CF, art. 22, I), no que foi
acompanhado pelo Min. Cezar Peluso. Asseverou que, embora os serviços de educação possam ser
prestados pelo setor privado independentemente de concessão, permissão ou autorização, não se cuida de
relação de consumo, a ensejar a competência concorrente do Estado para legislar sobre a matéria (CF, art.
24, V), haja vista que a relação contratual, na espécie, é firmada entre o prestador de serviço e o usuário
do serviço público, isto é, um cidadão e não um mero consumidor. O Min. Carlos Velloso acompanhou o
relator, mas por fundamento diverso, qual seja, a observância ao princípio da segurança jurídica, tendo em
conta a suspensão da eficácia da Lei 10.989/93 por aproximadamente 12 anos, contados do julgamento da
medida cautelar. Em divergência, os Ministros Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Celso de Mello julgaram
improcedente o pedido, por entender que a hipótese habilita os Estados-membros a legislarem
concorrentemente sobre a matéria (CF, art. 24, § 1º). Após, pediu vista dos autos o Min. Joaquim
Barbosa.
ADI 1007/PE, rel. Min. Eros Grau, 3.3.2005. (ADI-1007)
PRIMEIRA TURMA
Produção Antecipada de Provas: Impossibilidade
A Turma deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus para restabelecer decisão de
primeiro grau que indeferira requerimento de antecipação da produção da prova testemunhal feito pelo
Ministério Público em processo suspenso com base no art. 366 do CPP (“Se o acusado, citado por edital,
não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo
prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes...”).
Tendo em conta que a antecipação probatória, por ser medida cautelar, sujeita-se à verificação de motivos
concretos que autorizem a concessão da medida excepcional, nos termos do art. 366, que prevê a
possibilidade da produção antecipada de provas, e do art. 225, que fornece parâmetros que autorizam a
antecipação da oitiva de testemunhas, ambos do CPP, entendeu-se que, no caso, os fundamentos do
pedido do parquet, quais sejam, a possibilidade de a testemunha esquecer detalhes importantes dos fatos,
em virtude do decurso de tempo, ou deixar seu domicílio, não sendo mais localizada, consubstanciariam
meras conjecturas, desacompanhadas de quaisquer elementos aptos a revelar a real necessidade da
medida. Precedente citado: RHC 83709/SP (acórdão pendente de publicação).
RHC 85311/SP, rel. Min. Eros Grau, 1º.3.2005. (RHC-85311)
SEGUNDA TURMA
Pronúncia e Fundamentação de Qualificadora
Por ausência de motivação da sentença de pronúncia, a Turma deferiu habeas corpus impetrado em
favor de condenado pela prática do crime de homicídio, cuja pronúncia referira-se, de modo genérico, às
qualificadoras de motivo fútil e de recurso que dificultara a defesa da vítima, afirmando que estas
deveriam ser acolhidas, já que não manifestamente improcedentes. Inicialmente, não obstante a
superveniência de anulação da decisão condenatória que, em sede de embargos infringentes e de nulidade,
determinara fosse o paciente submetido a novo julgamento pelo Tribunal do Júri, conheceu-se do writ por
se considerar processualmente viável a reforma da sentença que pronunciara o réu, enquanto não
realizado o referido julgamento. No mérito, entendeu-se que a inclusão de circunstância qualificadora na
sentença de pronúncia exige, ainda que sucintamente motivado, um juízo positivo do magistrado
pronunciante, que deve, em conseqüência, proclamar, com fundamento em prova idônea, a existência
dessa circunstância. HC concedido para anular a sentença de pronúncia e determinar ao juízo de origem
que outra seja prolatada, observando-se as diretrizes apontadas neste acórdão.
HC 84547/MS, rel. Min. Ellen Gracie, 1º.3.2005. (HC-84547)
Regressão de Regime: Falta Grave e Interrupção de Prazo
A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo exigido para a concessão do benefício da
progressão de regime prisional. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que
se sustentava a possibilidade da utilização do prazo de 1/6 da pena cumprida pela paciente antes de sua
fuga do estabelecimento prisional, para fins de nova progressão, quando de sua recaptura. Entendeu-se
que, havendo regressão de regime nos termos do art. 118 da LEP (“A execução da pena privativa de
liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência para qualquer dos regimes mais
rigorosos, quando o condenado: I – praticar fato definido como crime doloso ou falta grave.”), a paciente
deverá cumprir 1/6 da pena, além de obedecer aos requisitos subjetivos para a obtenção de novo benefício
(LEP, art. 112). Asseverou-se, ainda, que seria inócua a regressão para o regime fechado após a fuga da
condenada se, imediatamente depois de sua recaptura, ela pudesse pleitear novamente a progressão para o
regime semi-aberto, sob o fundamento de que ostenta bom comportamento.
HC 85049/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 1º.3.2005. (HC-85049)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
2.3.2005
1º.3.2005
1º.3.2005
Extraordinárias
2.3.2005
——
——
Julgamentos
19
200
66
CLIPPING
DO
DJ
4 de março de 2005
ADI N. 1.505-ES
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 187 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO ESPÍRITO
SANTO. RELATÓRIO DE IMPACTO AMBIENTAL. APROVAÇÃO PELA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. VÍCIO
MATERIAL. AFRONTA AOS ARTIGOS 58, § 2º, E 225, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
1. É inconstitucional preceito da Constituição do Estado do Espírito Santo que submete o Relatório de Impacto Ambiental - RIMA ao crivo de comissão permanente e específica da Assembléia Legislativa.
2. A concessão de autorização para desenvolvimento de atividade potencialmente danosa ao meio ambiente consubstancia ato do
Poder de Polícia — ato da Administração Pública — entenda-se ato do Poder Executivo.
3. Ação julgada procedente para declarar inconstitucional o trecho final do artigo § 3º do artigo 187 da Constituição do Estado do
Espírito Santo.
* noticiado no Informativo 371
ADI N. 2.925-DF
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. MARCO AURÉLIO
PROCESSO OBJETIVO - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI ORÇAMENTÁRIA. Mostra-se adequado o
controle concentrado de constitucionalidade quando a lei orçamentária revela contornos abstratos e autônomos, em abandono ao
campo da eficácia concreta.
LEI ORÇAMENTÁRIA - CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO - IMPORTAÇÃO E
COMERCIALIZAÇÃO DE PETRÓLEO E DERIVADOS, GÁS NATURAL E DERIVADOS E ÁLCOOL COMBUSTÍVEL CIDE - DESTINAÇÃO - ARTIGO 177, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. É inconstitucional interpretação da Lei
Orçamentária nº 10.640, de 14 de janeiro de 2003, que implique abertura de crédito suplementar em rubrica estranha à destinação do
que arrecadado a partir do disposto no § 4º do artigo 177 da Constituição Federal, ante a natureza exaustiva das alíneas “a”, “b” e
“c” do inciso II do citado parágrafo.
* noticiado no Informativo 334
ADI N. 3.022-RS
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. RITO DO ART. 12 DA LEI 9.868. ART. 45 DA
CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. ALÍNEA A DO ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR
9.230/1991 DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. ATRIBUIÇÃO, À DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL, DA DEFESA DE SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS PROCESSADOS CIVIL OU
CRIMINALMENTE EM RAZÃO DE ATO PRATICADO NO EXERCÍCIO REGULAR DE SUAS FUNÇÕES. OFENSA AO
ART. 134 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
1. Norma estadual que atribui à Defensoria Pública do estado a defesa judicial de servidores públicos estaduais processados civil ou
criminalmente em razão do regular exercício do cargo extrapola o modelo da Constituição Federal (art. 134), o qual restringe as
atribuições da Defensoria Pública à assistência jurídica a que se refere o art. 5º, LXXIV.
2. Declaração da inconstitucionalidade da expressão “bem como assistir, judicialmente, aos servidores estaduais processados por
ato praticado em razão do exercício de suas atribuições funcionais”, contida na alínea a do Anexo II da Lei Complementar estadual
10.194/1994, também do estado do Rio Grande do Sul. Proposta acolhida, nos termos do art. 27 da Lei 9.868, para que declaração
de inconstitucionalidade tenha efeitos a partir de 31 de dezembro de 2004.
3. Rejeitada a alegação de inconstitucionalidade do art. 45 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul.
4. Ação julgada parcialmente procedente.
* noticiado no Informativo 355
AO N. 1.023-PI
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 22ª REGIÃO. MANDADO DE
SEGURANÇA CONTRA ATO ADMINISTRATIVO QUE DISPENSA SERVIDORES OCUPANTES DE CARGOS EM
COMISSÃO NÃO INTEGRANTES DO QUADRO DE CARREIRA DO TRIBUNAL. INEXISTÊNCIA DE SUSPEIÇÃO DOS
MEMBROS DO TRIBUNAL. JURIPRUDÊNCIA DO STF. EXCEÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. COMPETÊNCIA DO
TRT - 22ª REGIÃO PARA APRECIAR O WRIT.
- Mandado de segurança contra ato administrativo praticado pela juíza presidente do TRT da 22ª Região, que dispensou e devolveu
aos respectivos órgãos de origem servidores ocupantes de cargos em comissão não integrantes do quadro de carreira do Tribunal.
- Alegada suspeição dos membros da Corte Regional, em razão da conseqüente redução do quadro de pessoal de seus gabinetes.
Possível interesse dos magistrados no deslinde do writ.
- Suspeição inexistente, ante a ausência de dados objetivos referentes à parcialidade dos juízes excetos. Jurisprudência do STF.
Competência do TRT da 22ª Região para apreciar o mandado de segurança.
- Exceção de suspeição julgada improcedente.
Acórdãos Publicados: 170
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Mandado de Injunção - Pressupostos. EC 45/2004 (Julgamento das Causas sem Dilações Indevidas)
(Transcrições)
MI 715/DF*
RELATOR: MINISTRO CELSO DE MELLO
EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. ALEGAÇÃO (INCONSISTENTE) DE INÉRCIA DA UNIÃO
FEDERAL NA REGULAÇÃO NORMATIVA DO DIREITO À CELERIDADE NO JULGAMENTO DOS
PROCESSOS, SEM INDEVIDAS DILAÇÕES (CF, ART. 5º, INCISO LXXVIII). EMENDA CONSTITUCIONAL Nº
45/2004. PRESSUPOSTOS CONSTITUCIONAIS DO MANDADO DE INJUNÇÃO (RTJ 131/963 – RTJ 186/20-21).
DIREITO SUBJETIVO À LEGISLAÇÃO/DEVER ESTATAL DE LEGISLAR (RTJ 183/818-819). NECESSIDADE DE
OCORRÊNCIA DE MORA LEGISLATIVA (RTJ 180/442). CRITÉRIO DE CONFIGURAÇÃO DO ESTADO DE
INÉRCIA LEGIFERANTE: SUPERAÇÃO EXCESSIVA DE PRAZO RAZOÁVEL (RTJ 158/375). SITUAÇÃO
INOCORRENTE NO CASO EM EXAME. AUSÊNCIA DE “INERTIA AGENDI VEL DELIBERANDI” DO
CONGRESSO NACIONAL. “PACTO DE ESTADO EM FAVOR DE UM PODER JUDICIÁRIO MAIS RÁPIDO E
REPUBLICANO”. O DIREITO INDIVIDUAL DO CIDADÃO AO JULGAMENTO DOS LITÍGIOS SEM DEMORA
EXCESSIVA OU DILAÇÕES INDEVIDAS: UMA PRERROGATIVA QUE DEVE SER PRESERVADA (RTJ
187/933-934). DOUTRINA. PROJETOS DE LEI JÁ REMETIDOS AO CONGRESSO NACIONAL, OBJETIVANDO A
ADOÇÃO DOS MEIOS NECESSÁRIOS À IMPLEMENTAÇÃO DO INCISO LXXVIII DO ART. 5º DA
CONSTITUIÇÃO (EC Nº 45/2004). CONSEQÜENTE INVIABILIDADE DO PRESENTE MANDADO DE INJUNÇÃO.
DECISÃO: Trata-se de mandado de injunção impetrado em face de alegada “(...) ausência de norma regulamentadora de
competência privativa da União Federal (art. 22, inciso I, CF)”, que – segundo sustenta a parte impetrante – “vem tornando
inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais” (fls. 03).
Postula-se, na presente sede processual, “a total concessão da ordem de injunção, para ‘viabilizar’ e ‘operacionalizar’
normas infraconstitucionais necessárias à ‘razoável duração do processo’ e aos ‘meios’ que garantam a celeridade de sua
tramitação (inciso LXXVIII, art. 5º, da Constituição Federal, EC nº 45), sugerindo, com a devida vênia, às impetradas, neste
ponto específico da questão, que elaborem projeto de lei para ampliar o Código de Processo Civil, no concernente às disposições
da sentença parcial de mérito ou resolução definitiva-fracionada da causa, ambas com autoridade de ‘coisa julgada dita
reservada’ (...)” (fls. 13 - grifei).
O exame dos elementos referidos pela parte ora impetrante impõe que se analise, preliminarmente, a questão pertinente à
admissibilidade, no caso, do presente mandado de injunção.
Como se sabe, o “writ” injuncional tem por função processual específica viabilizar o exercício de direitos, liberdades e
prerrogativas diretamente outorgados pela própria Constituição da República, em ordem a impedir que a inércia do legislador
comum frustre a eficácia de situações subjetivas de vantagem reconhecidas pelo texto constitucional (RTJ 131/963 – RTJ
186/20-21).
Impende enfatizar, neste ponto, que as omissões inconstitucionais do Poder Legislativo não podem ser toleradas, eis que
o desprestígio da Constituição – resultante da inércia de órgãos meramente constituídos – representa um dos mais tormentosos
aspectos do processo de desvalorização funcional da Lei Fundamental da República, ao mesmo tempo em que estimula,
gravemente, a erosão da consciência constitucional, evidenciando, desse modo, o inaceitável desprezo dos direitos básicos e das
liberdades públicas pelos Poderes do Estado.
Essa repulsa à inércia governamental, no adimplemento de imposições legiferantes estabelecidas no texto constitucional,
tem sido posta em destaque pelo magistério da doutrina (ANNA CÂNDIDA DA CUNHA FERRAZ, “Processos Informais de
Mudança da Constituição”, p. 217/218, 1986, Max Limonad), eis que – como bem adverte o eminente Professor JOSÉ AFONSO
DA SILVA (“Aplicabilidade das Normas Constitucionais”, p. 226, item I, nº 4, 6ª ed., 2002, Malheiros) -, não basta “ter uma
Constituição promulgada e formalmente vigente; impende atuá-la, completando-lhe a eficácia para que seja totalmente cumprida”
(grifei).
Presente esse contexto, cumpre reconhecer que o mandado de injunção - considerada a sua específica destinação
constitucional (RTJ 186/20-21) - busca neutralizar as conseqüências lesivas decorrentes da ausência de regulamentação
normativa de preceitos inscritos na Carta Política e que, revestidos de eficácia limitada, dependem da intervenção concretizadora
do legislador, para permitir o exercício efetivo de determinados direitos diretamente fundados no próprio texto constitucional.
Vê-se, desse modo, que o mandado de injunção traduz significativa reação jurídico-institucional do vigente ordenamento
político, que o estruturou como instrumento destinado a impedir o desprestígio da própria Carta da República, o que justifica a
correta observação de JOSÉ AFONSO DA SILVA (“Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 448, item n. 32, 24ª ed., 2005,
Malheiros), no sentido de que a principal finalidade do mandado de injunção “consiste (...) em conferir imediata aplicabilidade à
norma constitucional portadora daqueles direitos e prerrogativas, inerte em virtude de ausência de regulamentação” (grifei).
Cabe assinalar, no entanto, que o direito à legislação só pode ser invocado pelo interessado, quando também existir simultaneamente imposta pelo próprio texto constitucional - a previsão do dever estatal de emanar normas legais (RTJ 183/818819). Isso significa que o direito individual à atividade legislativa do Estado apenas se evidenciará naquelas estritas hipóteses em
que o desempenho da função de legislar refletir, por efeito de exclusiva determinação constitucional, uma obrigação jurídica
indeclinável imposta ao Poder Público.
Para que possa atuar a norma pertinente ao instituto do mandado de injunção, revela-se essencial que se estabeleça a
necessária correlação entre a imposição constitucional de legislar, de um lado, e o conseqüente reconhecimento do direito
público subjetivo à legislação, de outro, de tal forma que, ausente a obrigação jurídico-constitucional de emanar provimentos
legislativos, não se tornará possível imputar comportamento moroso ao Estado, nem pretender acesso legítimo à via injuncional.
De qualquer maneira, no entanto, não basta que apenas exista essa necessária correlação, pois é também inafastável presente determinado contexto de tempo – que se positive situação de omissão abusiva no adimplemento da prestação legislativa.
O retardamento abusivo na regulamentação legislativa do texto constitucional qualifica-se, portanto, como requisito
condicionante do ajuizamento da ação de mandado de injunção, pois, sem que se configure o estado de mora legislativa –
caracterizado pela superação excessiva de prazo razoável -, não há como reconhecer-se ocorrente o próprio interesse de agir em
sede injuncional.
É por essa razão que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o MI 361/RJ, Rel. p/ o acórdão Min.
SEPÚLVEDA PERTENCE (RTJ 158/375), enfatizou esse específico aspecto da questão, em decisão que restou consubstanciada,
no ponto, em acórdão assim ementado:
“Mora legislativa: exigência e caracterização: critério de razoabilidade.
A mora – que é pressuposto da declaração de inconstitucionalidade da omissão legislativa -, é de ser reconhecida,
em cada caso, quando, dado o tempo corrido da promulgação da norma constitucional invocada e o relevo da matéria, se
deva considerar superado o prazo razoável para a edição do ato legislativo necessário à efetividade da Lei Fundamental;
vencido o tempo razoável, nem a inexistência de prazo constitucional para o adimplemento do dever de legislar, nem a
pendência de projetos de lei tendentes a cumpri-lo podem descaracterizar a evidência da inconstitucionalidade da
persistente omissão de legislar.” (grifei)
Cabe destacar, neste ponto, que a parte ora impetrante, valendo-se do presente mandado de injunção, “busca suprir a falta
de norma regulamentadora infraconstitucional (direito processual) necessária à operatividade de comando constitucional inserido
pela Emenda Constitucional n.º 45 (inciso LXXVIII, art. 5º, da Constituição Federal)” (fls. 03 - grifei).
Não vejo, contudo, como reconhecer ocorrente, no caso ora em análise, situação de mora legislativa - que constitui
pressuposto necessário ao adequado exercício do mandado de injunção (RTJ 180/442) -, por ainda não se mostrar possível o
reconhecimento, no caso, da superação abusiva de prazo razoável, pelo Congresso Nacional, para a regulamentação legislativa da
EC nº 45/2004, no ponto em que esta, expressamente invocada pelo autor deste “writ”, proclamou o direito de todos ao
julgamento, sem dilações indevidas, dos processos judiciais e administrativos, prevendo, para esse efeito, a instituição dos meios
destinados a garantir a celeridade da tramitação dos processos em geral (CF, art. 5º, LXXVIII).
Como precedentemente referido, revela-se prematuro o ajuizamento da presente ação injuncional, eis que sequer
caracterizada, no caso em exame, a hipótese de abusivo retardamento na efetivação da prestação legislativa ora reclamada,
considerado, para esse efeito, o critério de aferição da inércia legiferante consagrado pela jurisprudência constitucional desta
Suprema Corte (RTJ 158/375, Rel. p/ o acórdão Min. SEPÚLVEDA PERTENCE).
A evidente ausência de mora legislativa decorre, na espécie, do fato de que a norma inscrita no referido inciso LXXVIII
do art. 5º da Carta Política tornou-se vinculante para o Estado somente a partir de 31 de dezembro de 2004, data em que
publicada a EC nº 45/2004 (art. 10), sendo certo, ainda, que o Congresso Nacional apenas iniciou os trabalhos legislativos em 15
de fevereiro de 2005 (CF, art. 57, “caput”).
O mero cotejo entre as datas mencionadas basta para evidenciar que não se tem como imputar, ao Congresso Nacional, a
situação anômala de “inertia deliberandi”, sobretudo se se considerar que este mandado de injunção foi impetrado durante o
período de recesso constitucional do Poder Legislativo da União.
Ora, torna-se evidente que não há como atribuir, ao Congresso Nacional, a omissão apontada pelo ora impetrante, pois,
quando iniciada a vigência da EC nº 45/2004 (o que só ocorreu em 31/12/2004), a Câmara dos Deputados e o Senado Federal
ainda se achavam, como já referido, em período de recesso, por efeito de expressa determinação constitucional (CF, art. 57,
“caput”).
De todo modo, no entanto, e apesar do exíguo intervalo de tempo decorrido desde a promulgação da EC 45/2004, cumpre
ressaltar, por necessário, que houve a celebração do denominado “Pacto de Estado em favor de um Judiciário mais Rápido e
Republicano”, formalizado pelos Chefes dos Poderes da República.
Imbuídos desse espírito, os Senhores Presidentes da República, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Supremo
Tribunal Federal, por considerarem que “a morosidade dos processos judiciais e a baixa eficiência de suas decisões retardam o
desenvolvimento nacional, desestimulam investimentos, propiciam a inadimplência, geram impunidade e solapam a crença dos
cidadãos no regime democrático”, propuseram, dentre outras medidas, (1) a implementação da Reforma Constitucional do
Judiciário (EC 45/2004), (2) a reforma do sistema recursal e dos procedimentos, por meio de apresentação dos concernentes
projetos de lei, apoiados em propostas formuladas por juristas, magistrados e entidades da sociedade civil, (3) a constituição de uma
Comissão para apresentar metas claras para a progressiva ampliação da Defensoria Pública da União, (4) a coordenação, pelo
Ministério da Previdência Social, de um diálogo com os juízes, para que os procedimentos observados na concessão de benefícios
previdenciários e assistenciais sejam aperfeiçoados, melhorando o atendimento aos cidadãos e desonerando a máquina judicial, (5) a
viabilização de soluções relativamente às execuções fiscais, com base em proposta já formalizada pelo Conselho da Justiça Federal,
(6) a realização de debates e audiências de conciliação visando à construção de modelos institucionais e à adoção de providências
que resultem na superação do problema dos precatórios vencidos, (7) a implementação de um banco de dados no qual serão
identificados todos os casos de graves violações contra os direitos humanos, a partir da plena integração do Brasil nos Sistemas
Internacionais de Proteção aos Direitos Humanos, (8) a inclusão, na agenda parlamentar, de projetos de lei que visem a regular e
incentivar os procedimentos eletrônicos no âmbito judicial, (9) o funcionamento do Banco Nacional de Dados sobre o Poder
Judiciário e a implementação, sob a coordenação do Supremo Tribunal Federal, do Centro Nacional de Estudos e Pesquisas
Judiciais, (10) a realização de um esforço de coerência entre a atuação administrativa e as orientações jurisprudenciais já
pacificadas, com a edição de súmulas administrativas e, finalmente, (11) o incentivo à aplicação de penas alternativas.
Torna-se necessário reconhecer, ainda, que, em razão do mencionado “Pacto de Estado”, foram encaminhadas, ao
Congresso Nacional, pelo Senhor Presidente da República, as seguintes proposições legislativas, todas elas visando a tornar real e
efetiva a desejada celeridade na tramitação dos processos:
(a) o PL 4.723/04 (que dispõe sobre a uniformização de jurisprudência no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis e
Criminais);
(b) o PL 4.724/04 (que altera artigos do Código de Processo Civil, relativamente à forma de interposição de
recursos);
(c) o PL 4.725/04 (que altera dispositivos da Lei nº 5.869/73, possibilitando a realização do inventário, partilha,
separação consensual e divórcio consensual por via administrativa);
(d) o PL 4.726/04 (que altera artigos do Código de Processo Civil concernentes à incompetência relativa, meios
eletrônicos, prescrição, distribuição por dependência, exceção de incompetência, revelia, carta precatória e rogatória, ação
rescisória e vista dos autos);
(e) o PL 4.727/04 (que dá nova redação a artigos do Código de Processo Civil, relativos ao agravo de instrumento e
ao agravo retido);
(f) o PL 4.728/04 (que dispõe sobre a racionalização do julgamento de processos repetitivos);
(g) o PL 4.729/04 (relativo ao julgamento de agravos); e
(h) os Projetos de Lei ns. 4.730/04, 4.731/04, 4.732/04, 4.733/04, 4.734/04 e 4.735/04, que introduzem modificações
na CLT, em ordem a conferir celeridade à tramitação dos processos trabalhistas.
Vê-se, portanto, que não se apresenta configurada qualquer situação de omissão abusiva ou de superação excessiva de
tempo razoável, por parte do Congresso Nacional, no que concerne à adoção de medidas destinadas a viabilizar,
instrumentalmente, a plena incidência do inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição da República.
Cumpre registrar, finalmente, que já existem, em nosso sistema de direito positivo, ainda que de forma difusa, diversos
mecanismos legais destinados a acelerar a prestação jurisdicional (CPC, art. 133, II e art. 198; LOMAN, art. 35, incisos II, III e VI,
art. 39, art. 44 e art. 49, II, v.g.), de modo a neutralizar, por parte de magistrados e Tribunais, retardamentos abusivos ou dilações
indevidas na resolução dos litígios.
Não custa destacar, neste ponto, considerada a perspectiva ora em análise, a indiscutível importância que assume o
reconhecimento, em favor dos cidadãos, do direito de ver julgados, em prazo razoável, sem demora excessiva ou dilações
indevidas, os litígios submetidos à apreciação do Poder Judiciário, tal como o preconiza o magistério da doutrina (JOSÉ ROGÉRIO
CRUZ E TUCCI, “Tempo e Processo: Uma análise empírica das repercussões do tempo na fenomenologia processual – civil e
penal”, p. 87/88, item n. 3.5, 1998, RT; LUIZ FLÁVIO GOMES, “O Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos
Humanos e o Direito Brasileiro”, p. 242/245, 2000, RT, v.g.), com inteiro apoio da jurisprudência que o Supremo Tribunal
Federal firmou na matéria em causa:
“O JULGAMENTO SEM DILAÇÕES INDEVIDAS CONSTITUI PROJEÇÃO DO PRINCÍPIO DO DEVIDO
PROCESSO LEGAL.
- O direito ao julgamento, sem dilações indevidas, qualifica-se como prerrogativa fundamental que decorre da
garantia constitucional do ‘due process of law’.
O réu (...) tem o direito público subjetivo de ser julgado, pelo Poder Público, dentro de prazo razoável, sem demora
excessiva nem dilações indevidas. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, ns. 5 e 6). Doutrina.
Jurisprudência.
- O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário (...), traduz situação anômala que
compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra
um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas e com todas as
garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional.”
(RTJ 187/933-934, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Sendo assim, tendo em consideração as razões expostas, não conheço da presente ação de mandado de injunção, por não se
achar (ainda) caracterizado o estado de mora legislativa do Congresso Nacional.
Arquivem-se os presentes autos.
Publique-se.
Brasília, 25 de fevereiro de 2005.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
* decisão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 379
Brasília, 7 a 11 de março de 2005 Nº 379
Data (páginas internas): 17 de março de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Indenização por Danos Decorrentes de Acidente do Trabalho: Competência
Lei 8.880/94: Demissão Sem Justa Causa e Indenização Adicional
Contribuição Sindical Patronal e Isenção
ADI e Trânsito - 1 a 4
Composição de Tribunal de Contas e Modelo Federal
Decreto Expropriatório. Transmissão “Mortis Causa”. Partes Ideais
1ª Turma
Poder Investigativo do MP: Nova Denúncia e Vício de Origem - 2
Competência de Auditoria Militar e Furto Qualificado - 2
2ª Turma
Aplicação de Medida Sócio-Educativa de Internação - 2
ISS e Locação de Bens Móveis
Transcrições
Imunidade Parlamentar Material e Exclusão da Responsabilidade Civil (AI 473092/AC)
ADI - Transcendência dos Motivos Determinantes - Reclamação (Rcl 2986 MC/SE)
PLENÁRIO
Indenização por Danos Decorrentes de Acidente do Trabalho: Competência
As ações de indenização propostas por empregado ou ex-empregado contra empregador, quando fundadas em
acidente do trabalho, continuam a ser da competência da justiça comum estadual. Com base nesse entendimento, o
Tribunal, por maioria, deu provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão do extinto Tribunal de
Alçada do Estado de Minas Gerais que, confirmando decisão do juízo de 1ª instância, entendera ser da competência
da justiça do trabalho o julgamento de ação de indenização por danos morais decorrentes de acidente do trabalho,
movida pelo empregado contra seu empregador. Ressaltando ser, em tese, da competência da justiça comum estadual
o julgamento de ação de indenização baseada na legislação acidentária, entendeu-se que, havendo um fato histórico
que gerasse, ao mesmo tempo, duas pretensões — uma de direito comum e outra de direito acidentário —, a
atribuição à justiça do trabalho da competência para julgar a ação de indenização fundada no direito comum, oriunda
do mesmo fato histórico, poderia resultar em decisões contraditórias, já que uma justiça poderia considerar que o fato
está provado e a outra negar a própria existência do fato. Salientou-se que deveria intervir no fator de discriminação e
de interpretação dessas competências o que se chamou de “unidade de convicção”, segundo a qual o mesmo fato,
quando tiver de ser analisado mais de uma vez, deve sê-lo pela mesma justiça. Vencidos os Ministros Carlos Britto,
relator, e Marco Aurélio, que negavam provimento ao recurso, e declaravam a competência da justiça do trabalho.
RE 438639/MG, rel. orig. Min. Carlos Britto, rel. p/ acórdão Min. Cezar Peluso, 9.3.2005. (RE-438639)
Lei 8.880/94: Demissão Sem Justa Causa e Indenização Adicional
O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do TST, que mantivera
decisão na qual se determinara o pagamento de indenização a obreiro, demitido sem justa causa, com base no art. 31
da Lei 8.880/94, que estabelece que a indenização adicional, nas demissões sem justa causa, durante o período de
vigência da Unidade Real de Valor – URV, é equivalente a 50% da última remuneração recebida. O Min. Marco
Aurélio, relator, deu provimento ao recurso por entender que a norma em questão fere o art. 7º, I, da CF — que exige
lei complementar para dispor sobre indenização compensatória nos casos de despedida arbitrária ou sem justa causa
— bem como o art. 10, I, do ADTC — que limita o valor da referida indenização em até quatro vezes a percentagem
fixada no art. 6º, caput e § 1º, da Lei 5.107/66, isto é, 40% do saldo do FGTS. O julgamento foi suspenso com o
pedido de vista do Min. Nelson Jobim, Presidente.
RE 264434/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 9.3.2005. (RE-264434)
Contribuição Sindical Patronal e Isenção
O Tribunal iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade proposta pela Confederação Nacional do
Comércio – CNC contra o § 4º do art. 3º da Lei 9.317/96, e contra a expressão “e a Contribuição Sindical Patronal”,
contida no § 6º do art. 3º da Instrução Normativa SRF 9/99, que dispensam as microempresas e empresas de pequeno
porte inscritas no SIMPLES – Sistema de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
do pagamento das demais contribuições instituídas pela União. O Min. Eros Grau, relator, após não conhecer do
pedido na parte relativa à Instrução Normativa e rejeitar a preliminar de inépcia da inicial levantada pelo AdvogadoGeral da União, confirmando o que decidido no julgamento da cautelar, julgou improcedente o pedido, para
reconhecer a constitucionalidade da isenção relativa à contribuição sindical patronal. Entendeu que se trata, na
espécie, de isenção de tributo instituído com fundamento no art. 149 da CF, cabendo à lei ordinária regular a matéria,
tendo o Poder Público, ao editar a norma impugnada, agido dentro dos limites estabelecidos pela CF. Afastou, ainda,
a apontada ofensa ao princípio da isonomia — já que o tratamento dispensado às microempresas e empresas de
pequeno porte não caracteriza discriminação arbitrária, eis que obedece a critérios razoáveis adotados com o
propósito de compatibilizá-los à previsão do art. 179 da CF —, bem como a ofensa aos princípios da autonomia e da
liberdade sindicais, porquanto a criação do SIMPLES não impede os sindicatos de atuar na busca do alcance de suas
finalidades. Após, pediu vista dos autos o Min. Marco Aurélio.
ADI 2006/DF, rel. Min. Eros Grau, 9.3.2005. (ADI-2006)
ADI e Trânsito - 1
Por ofensa ao art. 22, XI, da CF, que atribui à União a competência privativa para legislar sobre trânsito e
transporte, o Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade
proposta pelo Governador do Estado do Rio Grande do Norte contra a Lei 7.723/99, do mesmo Estado, que autoriza o
parcelamento do pagamento de multas decorrentes de infrações de trânsito, sem nenhum acréscimo. Vencido o Min.
Marco Aurélio que julgava improcedente o pedido.
ADI 2432/RN, rel. Min. Eros Grau, 9.3.2005. (ADI-2432)
ADI e Trânsito - 2
O Tribunal julgou procedente, em parte, pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada
pelo Governador do Estado de Santa Catarina contra a Lei 11.373/2000, do mesmo Estado, que determina que o
DETRAN-SC e o DER-SC enviem simultaneamente ao infrator, o valor da multa e a foto do momento da infração
captada por foto-sensor. Por entender que a obrigação de instalar o referido equipamento eletrônico em todo o Estado
ofende a competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte (CF, art. 22, XI), deu-se
interpretação conforme ao dispositivo impugnado de modo a reduzir o seu alcance às hipóteses em que houver, no
local, sistema de foto-sensor.
ADI 2816/SC, rel. Min. Eros Grau, 9.3.2005. (ADI-2816)
ADI e Trânsito - 3
Por ofensa ao art. 22, XI, da CF, que atribui à União a competência privativa para legislar sobre trânsito e
transporte, o Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta proposta pelo ProcuradorGeral da República contra a Lei 10.331/99, do Estado de São Paulo, que dispõe sobre o estacionamento de veículos
em frente a farmácias. Vencido o Min. Marco Aurélio, que julgava improcedente o pedido.
ADI 2928/SP, rel. Min. Eros Grau, 9.3.2005. (ADI-2928)
ADI e Trânsito - 4
Por ofensa ao art. 22, XI, da CF, que atribui à União a competência privativa para legislar sobre trânsito e
transporte, o Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta proposta pelo Governador do
Distrito Federal contra a Lei distrital 3.425/2004 que, alterou o art. 3º da Lei 812/94, condicionando o licenciamento
de veículos com tempo de uso superior a quinze anos à prévia vistoria anual efetuada pelo DETRAN-DF. Vencido o
Min. Marco Aurélio que julgava improcedente o pedido.
ADI 3323/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 9.3.2005. (ADI-3323)
Composição de Tribunal de Contas e Modelo Federal
Tratando-se de tribunal de contas estadual composto por sete conselheiros, composição esta que impede
aritmeticamente a adoção do modelo federal da terça parte (CF, art. 73, § 2º e art. 75), é firme a jurisprudência do
STF no sentido de que quatro conselheiros devem ser escolhidos pela Assembléia Legislativa e três pelo Chefe do
Poder Executivo estadual, cabendo a este escolher um dentre auditores do Tribunal de Contas e outro dentre membros
do Ministério Público junto àquele órgão, necessariamente, e um terceiro à sua livre escolha. Com base nesse
entendimento, o Tribunal deferiu medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade proposta pela Associação
dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil – ATRICON, para suspender a eficácia do § 1º, incisos I e II e do §
3º, do art. 78, da Constituição do Estado de Minas Gerais, que prevêem que dois Conselheiros do Tribunal de Contas
estadual serão nomeados pelo Governador e cinco pela Assembléia Legislativa, sendo que, das duas vagas a serem
providas pelo Governador, uma será preenchida por livre escolha, e a outra, alternadamente, por Auditor e por
membro do Ministério Público junto ao Tribunal.
ADI 3361 MC/MG, rel. Min. Eros Grau, 10.3.2005. (ADI-3361)
Decreto Expropriatório. Transmissão “Mortis Causa”. Partes Ideais
O Tribunal retomou julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente da República
que, por meio de decreto, declarara de interesse social, para fins de reforma agrária, imóvel rural — v. Informativo
367. O Min. Eros Grau, em voto-vista, abriu divergência e indeferiu a segurança. Ressaltou a necessidade de se
interpretar o art. 1.784 em conjunto com o disposto no art. 1.791 e seu parágrafo único, ambos do CC, concluindo que
a saisine somente torna múltipla a titularidade do imóvel, o qual permanece uma única propriedade até a partilha,
unidade que não pode ser afastada quando da apuração da área do imóvel para fins de reforma agrária, razão por que
não se pode tomar cada parte ideal como propriedade distinta. Salientou não ser aplicável, à espécie, o § 6º art. 46 do
Estatuto da Terra (Lei 4.504/64), já que a expressão “para os fins desta Lei” nele contida teria o objetivo apenas de
instrumentar o cálculo do coeficiente de progressividade do Imposto Territorial Rural – ITR, não servindo o
procedimento previsto de parâmetro para o dimensionamento de imóveis rurais destinados à reforma agrária, matéria
afeta à Lei 8.629/93. No que tange ao apontado erro de cálculo da área do imóvel, afirmou que, para os fins dessa
última lei, deve ser levada em conta a área global, sem dedução das áreas não aproveitáveis e da reserva legal (Lei
4.771/65, art. 16, § 2º), o que seria considerado somente no cálculo da produtividade do imóvel (Lei 8.629/93, art.
6º). Com base nisso, e tendo em conta o laudo técnico do INCRA, considerou o imóvel em questão uma grande
propriedade rural improdutiva passível de desapropriação. Afastou as demais alegações dos impetrantes, por
considerar que as mesmas demandam dilação probatória, incabível na via eleita. Em seguida, o Min. Marco Aurélio
negou a juntada de petição apresentada pelos impetrantes, no que foi acompanhado por unanimidade, e, aditando o
voto primitivo quanto a não se ter propriedade em razão dos módulos capaz de ensejar a reforma agrária, manteve a
concessão da ordem. Acompanharam a divergência os Ministros Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Cezar Peluso.
Após, pediu vista dos autos o Min. Gilmar Mendes.
MS 24924/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 10.3.2005. (MS-24924)
PRIMEIRA TURMA
Poder Investigativo do MP: Nova Denúncia e Vício de Origem - 2
A Turma retomou julgamento de recurso ordinário em habeas corpus em que se pretende a suspensão do feito
até que a questão relativa à competência investigativa realizada pelo Ministério Público seja apreciada pelo Plenário
do STF — v. Informativo 367. O Min. Eros Grau, em voto-vista, não conheceu do recurso por entender tratar-se de
hipótese de prejudicialidade preexistente, uma vez que a decisão deste recurso seria inócua, já que não poderia
projetar-se sobre a segunda denúncia para anulá-la. Ademais, afirmou que, inexistindo decisão sobre o recebimento
da denúncia, eventual ato coator somente poderia ser imputado ao parquet e não ao Tribunal de Justiça local. Após,
pediu vista dos autos o Min. Cezar Peluso.
RHC 84404/SP, rel. Min. Carlos Britto, 8.3.2005. (RHC-84404)
Competência de Auditoria Militar e Furto Qualificado - 2
A Turma, concluindo julgamento, negou provimento, por maioria, a recurso ordinário em habeas corpus
interposto pelo Ministério Público Federal em favor de militares acusados da suposta prática do crime de furto
qualificado, cuja ação penal fora instaurada perante vara de auditoria militar. No caso concreto, a competência da
auditoria militar fora fixada em razão de o STF haver declarado a constitucionalidade do art. 94 da LC 94/93, do
Estado de Rondônia, que dispõe sobre a competência da auditoria militar para processar crimes genéricos, em face do
art. 125, § 4º, da CF (ADI 1218/RO, DJU de 8.11.2002) — v. Informativo 374. Entendeu-se que não existe óbice à
acumulação, pelo mesmo juiz de direito, das competências de juiz auditor da justiça militar estadual e de juiz criminal
comum. Asseverou-se que, não possuindo o Estado de Rondônia quadro isolado de juízes auditores da justiça militar,
ao Tribunal de Justiça comum caberá o julgamento dos crimes militares. Vencido o Min. Marco Aurélio, relator, que
dava provimento ao recurso para declarar a competência do Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal de Porto Velho. Os
Ministros Eros Grau, Carlos Britto e Cezar Peluso retificaram os votos proferidos na sessão de 16.12.2004.
RHC 85025/RO, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ acórdão Min. Sepúlveda Pertence, 8.3.2005. (RHC
85025)
SEGUNDA TURMA
Aplicação de Medida Sócio-Educativa de Internação - 2
A Turma, concluindo julgamento, deferiu, por maioria, habeas corpus para anular acórdão do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo na parte em que determinara a aplicação de medida sócio-educativa de internação a
adolescente, por prazo indeterminado, pela realização de ato infracional equiparado ao delito de seqüestro – v.
Informativo 374. Entendeu-se que o acórdão fundamentara-se unicamente na gravidade em abstrato do delito, sem
especificar nenhum fato concreto para afastar a aplicação de outra medida sócio-educativa. Ademais, não teriam sido
analisadas as circunstâncias e a capacidade do menor para cumprir essa medida, consoante determina o § 1º do art.
112 do ECA. Considerou-se, também, que do § 2º do art. 122 do referido diploma — que dispõe que “em nenhuma
hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida adequada” — se extrai a regra de que, em se tratando de
ato infracional, é de se aplicar uma das medidas sócio-educativas previstas nos incisos I a V do art. 112 do ECA ou
qualquer das medidas de proteção previstas em seu art. 101, I a VI. Assim, somente na impossibilidade de aplicação
de tais medidas, o juiz deve aplicar a internação em estabelecimento educacional, sob pena de inobservância dos
princípios da excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, previstos no inciso V
do § 3º do art. 227 da CF. Determinou-se que seja proferido novo acórdão, com a devida fundamentação, permitindose que o paciente aguarde em liberdade assistida a prolação de novo decisório se por outro motivo não deva
permanecer internado. Vencida a Min. Ellen Gracie, relatora, que indeferia o writ.
HC 85148/SP, rel. orig. Min. Ellen Gracie, rel. p/ acórdão Min. Joaquim Barbosa, 8.3.2005. (HC-85148)
ISS e Locação de Bens Móveis
A Turma, em questão de ordem, por entender presentes a plausibilidade jurídica das razões do recurso
suscitadas e os demais requisitos necessários à concessão da medida requerida, referendou decisão do Min. Celso de
Mello, relator, que, em ação cautelar, deferira pedido de liminar para outorgar efeito suspensivo a recurso
extraordinário, já admitido e interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, o qual
rejeitara embargos de declaração em recurso interposto contra decisão que entendera ser hipótese de incidência para o
ISS a atividade de locação de veículos realizadas a partir de 2001. Considerou-se precedente do STF (RE 116121/SP,
DJU de 25.10.2001), no qual, incidentalmente, se reconhecera a inconstitucionalidade da cobrança do ISS sobre
contrato de locação de veículos, tendo em vista que a locação de bens móveis não se qualifica como serviço.
AC 661 QO/MG, rel. Min. Celso de Mello, 8.3.2005. (AC-661)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
9.3.2005
8.3.2005
8.3.2005
Extraordinárias
10.3.2005
——
——
Julgamentos
16
104
130
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Imunidade Parlamentar Material e Exclusão da Responsabilidade Civil (Transcrições)
AI 473092/AC*
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
EMENTA: IMUNIDADE PARLAMENTAR EM SENTIDO MATERIAL (INVIOLABILIDADE). DISCURSO PROFERIDO
POR DEPUTADO DA TRIBUNA DA CASA LEGISLATIVA. ENTREVISTA JORNALÍSTICA DE CONTEÚDO IDÊNTICO
AO DO DISCURSO PARLAMENTAR. IMPOSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DO MEMBRO DO PODER
LEGISLATIVO. PRESSUPOSTOS DE INCIDÊNCIA DA GARANTIA CONSTITUCIONAL DA IMUNIDADE
PARLAMENTAR. PRÁTICA “IN OFFICIO” E PRÁTICA “PROPTER OFFICIUM”. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
- A garantia constitucional da imunidade parlamentar em sentido material (CF, art. 53, “caput”) exclui a responsabilidade civil
do membro do Poder Legislativo, por danos eventualmente resultantes de manifestações, orais ou escritas, desde que motivadas pelo
desempenho do mandato (prática “in officio”) ou externadas em razão deste (prática “propter officium”), qualquer que seja o
âmbito espacial (“locus”) em que se haja exercido a liberdade de opinião, ainda que fora do recinto da própria Casa legislativa.
- A EC 35/2001, ao dar nova fórmula redacional ao art. 53, “caput”, da Constituição da República, consagrou diretriz, que, firmada
anteriormente pelo Supremo Tribunal Federal (RTJ 177/1375-1376, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE), já reconhecia, em favor
do membro do Poder Legislativo, a exclusão de sua responsabilidade civil, como decorrência da garantia fundada na imunidade
parlamentar material, desde que satisfeitos determinados pressupostos legitimadores da incidência dessa excepcional prerrogativa
jurídica.
- Essa prerrogativa político-jurídica - que protege o parlamentar em tema de responsabilidade civil - supõe, para que possa ser
invocada, que exista o necessário nexo de implicação recíproca entre as declarações moralmente ofensivas, de um lado, e a prática
inerente ao ofício legislativo, de outro, salvo se as declarações contumeliosas houverem sido proferidas no recinto da Casa
legislativa, notadamente da tribuna parlamentar, hipótese em que será absoluta a inviolabilidade constitucional. Doutrina.
Precedentes.
- Se o membro do Poder Legislativo, não obstante amparado pela imunidade parlamentar material, incidir em abuso dessa
prerrogativa constitucional, expor-se-á à jurisdição censória da própria Casa legislativa a que pertence (CF, art. 55, § 1º).
Precedentes: RE 140.867/MS, Rel. p/ o acórdão Min. MAURÍCIO CORRÊA (Pleno) – Inq 1.958/AC, Rel. p/ o acórdão Min.
CARLOS BRITTO (Pleno).
DECISÃO: A controvérsia jurídica suscitada na presente causa envolve questão impregnada do mais alto relevo político-constitucional,
pois concerne à discussão em torno do alcance, no plano da responsabilidade civil, da garantia da imunidade parlamentar em sentido
material.
Mostra-se oportuno observar, presente esse contexto, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, mesmo antes da
promulgação da EC 35/2001, que deu nova fórmula redacional à regra inscrita no art. 53, “caput”, da Constituição, já havia firmado
entendimento no sentido de estender o alcance da imunidade material ao plano da responsabilidade civil, em ordem a impedir que o
membro do Poder Legislativo pudesse ser condenado ao pagamento de indenização pecuniária, por palavras, opiniões, votos ou críticas
resultantes da prática do ofício legislativo.
Cumpre relembrar, neste ponto, que o Plenário desta Suprema Corte, ao julgar o RE 210.917/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA
PERTENCE, assim se pronunciou:
“A imunidade parlamentar material se estende à divulgação pela imprensa, por iniciativa do congressista ou de terceiros,
do fato coberto pela inviolabilidade.
A inviolabilidade parlamentar elide não apenas a criminalidade ou a imputabilidade criminal do parlamentar, mas também
a sua responsabilidade civil por danos oriundos da manifestação coberta pela imunidade ou pela divulgação dela: é conclusão
assente, na doutrina nacional e estrangeira, por quantos se têm ocupado especificamente do tema.” (grifei)
Essa diretriz jurisprudencial – que reconhece, uma vez satisfeitos determinados pressupostos, que a exclusão da responsabilidade
civil do membro do Poder Legislativo qualifica-se como projeção decorrente da prerrogativa da imunidade parlamentar material – tem sido
observada pelo Supremo Tribunal Federal:
“(...) A inviolabilidade parlamentar alcança, também, o campo da responsabilidade civil. (...).”
(RTJ 169/727, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - grifei)
“(...) As manifestações dos parlamentares, ainda que feitas fora do exercício estrito do mandato, mas em conseqüência
deste, estão abrangidas pela imunidade material, que alcança, também, o campo da responsabilidade civil. (...).”
(RE 226.643/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – grifei)
Impõe-se registrar, por necessário, na linha dos precedentes referidos, que o exercício do mandato atua como verdadeiro suposto
constitucional, apto a legitimar a invocação dessa especial prerrogativa jurídica, destinada a proteger, por suas “opiniões, palavras e
votos”, o membro do Poder Legislativo, independentemente do “locus” em que proferidas as expressões eventualmente contumeliosas.
Cabe assinalar que a teleologia inerente à cláusula de inviolabilidade prevista no art. 53, “caput”, da Constituição da República
revela a preocupação do constituinte de dispensar efetiva proteção ao parlamentar, em ordem a permitir-lhe, no desempenho das
múltiplas funções que compõem o ofício legislativo, o amplo exercício da liberdade de expressão, qualquer que seja o âmbito espacial em
que concretamente se manifeste (RTJ 133/90), ainda que fora do recinto da própria Casa legislativa (RTJ 131/1039 – RTJ 135/509-510 –
RT 648/318), desde que as declarações emanadas do membro do Poder Legislativo – quando pronunciadas fora do Parlamento (Inq
1.958/AC, Rel. p/ o acórdão Min. CARLOS BRITTO, Pleno) - guardem conexão com o desempenho do mandato (prática “in officio”) ou
tenham sido proferidas em razão dele (prática “propter officium”), conforme esta Suprema Corte tem assinalado em diversas decisões (RTJ
155/396-397, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno, v.g.).
É por essa razão que a jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal tem destacado o caráter essencial do
exercício do mandato parlamentar, para efeito de legitimar-se a invocação da prerrogativa institucional assegurada em favor dos membros
do Poder Legislativo, sempre enfatizando, nas várias decisões proferidas - quer antes, quer depois da promulgação da EC 35/2001 - que a
proteção resultante da garantia da imunidade em sentido material somente alcança o parlamentar nas hipóteses em que as palavras e
opiniões por ele expendidas o tenham sido no exercício do mandato ou em razão deste (Inq 1.775-AgR/PR, Rel. Min. NELSON JOBIM,
Pleno), de tal modo que cessará essa especial tutela de caráter político-jurídico sempre que deixar de existir, entre as declarações
moralmente ofensivas, de um lado, e a prática inerente ao ofício legislativo, de outro, o necessário nexo de causalidade (RTJ 104/441, Rel.
Min. ALDIR PASSARINHO - RTJ 112/481, Rel. Min. SOARES MUÑOZ – RTJ 129/970, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – RTJ
135/509, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RTJ 141/406, Rel. Min. CÉLIO BORJA - RTJ 155/396-397, Rel. Min. CELSO DE MELLO RTJ 166/844, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - RTJ 167/180, Rel. Min. FRANCISCO REZEK – RTJ 169/969, Rel. Min. CELSO DE
MELLO – Inq 810-QO/DF, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA), ressalvadas, no entanto, as declarações contumeliosas que houverem sido
proferidas no recinto da Casa legislativa, notadamente da tribuna parlamentar, hipótese em que será absoluta a inviolabilidade
constitucional:
“O art. 53 da Constituição Federal, com a redação da Emenda nº 35, não reeditou a ressalva quanto aos crimes contra a
honra, prevista no art. 32 da Emenda Constitucional nº 1, de 1969. Assim, é de se distinguirem as situações em que as supostas
ofensas são proferidas dentro e fora do Parlamento. Somente nessas últimas ofensas irrogadas fora do Parlamento é de se perquirir
da chamada ‘conexão com o exercício do mandato ou com a condição parlamentar’ (INQ 390 e 1.710). Para os pronunciamentos
feitos no interior das Casas Legislativas, não cabe indagar sobre o conteúdo das ofensas ou a conexão com o mandato, dado que
acobertadas com o manto da inviolabilidade. Em tal seara, caberá à própria Casa a que pertencer o parlamentar coibir eventuais
excessos no desempenho dessa prerrogativa.
No caso, o discurso se deu no plenário da Assembléia Legislativa, estando, portanto, abarcado pela inviolabilidade. Por
outro lado, as entrevistas concedidas à imprensa pelo acusado restringiram-se a resumir e comentar a citada manifestação da
tribuna, consistindo, por isso, em mera extensão da imunidade material.
Denúncia rejeitada.”
(Inq 1.958/AC, Rel. p/ o acórdão Min. CARLOS BRITTO, Pleno - grifei)
Essa diretriz jurisprudencial mostra-se fiel à “mens constitutionis”, que reconhece, a propósito do tema, que o instituto da
imunidade parlamentar em sentido material existe para viabilizar o exercício independente do mandato representativo, revelando-se,
por isso mesmo, garantia inerente ao parlamentar que se encontre no pleno desempenho da atividade legislativa (PONTES DE MIRANDA,
“Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda nº 1 de 1969”, tomo III/10 e 43, 2ª ed., 1970, RT; JOÃO BARBALHO,
“Constituição Federal Brasileira”, p. 64, edição fac-similar, 1992, Senado Federal; PINTO FERREIRA, “Comentários à Constituição
Brasileira”, vol. 2/625, 1990, Saraiva; JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, “Comentários à Constituição de 1988”, vol. V/2624-2625, item n.
204, 1991, Forense Universitária; PEDRO ALEIXO, “Imunidades Parlamentares”, p. 59/65, 1961, Belo Horizonte; CELSO RIBEIRO
BASTOS, “Comentários à Constituição do Brasil”, vol. 4, tomo I/187, 1995, Saraiva; RENÉ ARIEL DOTTI, “Curso de Direito Penal Parte Geral”, p. 398, item n. 25, 2001, Forense, v.g.).
Impende referir, no ponto, o correto magistério de MICHEL TEMER (“Elementos de Direito Constitucional”, p. 129, item n. 5,
18ª ed., 2002, Malheiros):
“A inviolabilidade diz respeito à emissão de opiniões, palavras e votos.
Opiniões e palavras que, ditas por qualquer pessoa, podem caracterizar atitude delituosa, mas que assim não se configuram
quando pronunciadas por parlamentar. Sempre, porém, quando tal pronunciamento se der no exercício do mandato. Quer dizer: o
parlamentar, diante do Direito, pode agir como cidadão comum ou como titular de mandato. Agindo na primeira qualidade não é
coberto pela inviolabilidade. A inviolabilidade está ligada à idéia de exercício de mandato. Opiniões, palavras e votos proferidos
sem nenhuma relação com o desempenho do mandato representativo não são alcançados pela inviolabilidade.” (grifei)
Essa mesma orientação - que se projeta na autorizada lição de DAMÁSIO E. DE JESUS (“Direito Penal - Parte Geral”, vol.
1/684, item n. 8, 24ª ed., 2001, Saraiva), de FERNANDO CAPEZ (“Curso de Processo Penal”, p. 53/54, item n. 6.2, 7ª ed., 2001, Saraiva),
de ÁLVARO MAYRINK DA COSTA (“Direito Penal - Parte Geral”, vol. I, tomo I/488, item n. 12, 6ª ed., 1998, Forense), de UADI
LAMMÊGO BULOS (“Constituição Federal Anotada”, p. 705/707, 4ª ed., 2002, Saraiva), de ALEXANDRE DE MORAES
(“Constituição do Brasil Interpretada”, p. 1.016/1.017, item n. 53.2, 2002, Atlas), de LUIZ ALBERTO DAVID ARAUJO/VIDAL
SERRANO NUNES JUNIOR (“Curso de Direito Constitucional”, p. 297, item n. 3, 6ª ed., 2002, Saraiva) e de HELENO CLÁUDIO
FRAGOSO (“Lições de Direito Penal - Parte Geral”, p. 130, item n. 113, 12ª ed., 1990, Forense, v.g.) - foi exposta, em lapidar abordagem
do tema, pelo saudoso e eminente RAUL MACHADO HORTA (“Estudos de Direito Constitucional”, p. 597/598, item n. 3, 1995, Del
Rey), que assim analisou a matéria em questão, examinando-a sob a perspectiva da responsabilidade civil:
“(...) A inviolabilidade abrange os discursos pronunciados, em sessões ou nas Comissões, os relatórios lidos ou publicados,
e assim os votos proferidos pelos Deputados ou Senadores. Protege o congressista ou parlamentar pelos atos praticados na
Comissão Parlamentar de Inquérito. Na tribuna, um deputado acusa funcionário de concussão; fornecedor do Estado, de furto;
afirma que determinada pessoa é agente de potência estrangeira. Profere, afinal, palavras que, pronunciadas por outros, exporiam
o seu autor à ação penal ou à responsabilidade civil. Mas, no caso do membro do Poder Legislativo, ele está protegido por ampla
irresponsabilidade, que envolve os discursos, as palavras, os votos e as opiniões, manifestadas no exercício do mandato. A
inviolabilidade obsta a propositura de ação civil ou penal contra o parlamentar, por motivo de opiniões ou votos proferidos no
exercício de suas funções. (...). É absoluta, permanente, de ordem pública. A inviolabilidade é total. As palavras e opiniões
sustentadas no exercício do mandato ficam excluídas de ação repressiva ou condenatória, mesmo depois de extinto o mandato. É a
‘insindicabilità’ das opiniões e dos votos, no exercício do mandato, que imuniza o parlamentar em face de qualquer
responsabilidade: penal, civil, ou administrativa, e que perdura após o término do próprio mandato.
(...) O Deputado, na tribuna, pode injuriar; caluniar; atingir levianamente pessoas estranhas ao Poder Legislativo, que não
poderão contestá-lo de imediato; incitar militares à desobediência. Só estará sujeito, para correção dos excessos ou dos abusos, ao
poder disciplinar previsto nos Regimentos Internos. (...). É necessário fixar, todavia, que a inviolabilidade (...) está vinculada ao
exercício do mandato ou das funções legislativas. (...). A cláusula que subordina a inviolabilidade ao exercício do mandato impõe
acatamento ao caráter teleológico da imunidade.” (grifei)
Cumpre enfatizar, a respeito desse específico aspecto do tema, que alguns eminentes autores, mesmo antes do advento da
EC 35/2001, já proclamavam que a garantia da imunidade parlamentar em sentido material estendia-se, no domínio de sua específica
proteção constitucional, ao plano da responsabilidade civil (MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, “Comentários à Constituição
Brasileira de 1988”, vol. 2/45, 1992, Saraiva; PONTES DE MIRANDA, “Comentários à Constituição de 1946”, vol. II/243, 2ª ed., 1953,
Max Limonad; CARLOS MAXIMILIANO, “Comentários à Constituição Brasileira”, vol. II/49, item n. 297, 5ª ed., 1954, Freitas Bastos;
PAULO M. DE LACERDA, “Princípios de Direito Constitucional Brasileiro”, vol. II/173, item n. 387, Erbas de Almeida e Cia;
MARCELO CAETANO, “Direito Constitucional”, vol. II/183, item n. 71, 1978, Forense).
Esse entendimento reflete-se, hoje, notadamente a partir da promulgação da EC 35/2001, em autorizado magistério doutrinário
(UADI LAMMÊGO BULOS, “Constituição Federal Anotada”, p. 757, item n. 3, 5ª ed., 2003, Saraiva; JOSÉ AFONSO DA SILVA,
“Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 534, item n. 15, 24ª ed., 2005, Malheiros; ALEXANDRE DE MORAES, “Constituição do
Brasil Interpretada”, p. 1.020/1.021, item n. 53.2, 2ª ed., 2003, Atlas; RUI STOCO, “Tratado de Responsabilidade Civil”, p. 886/887,
item n. 40.00, 6ª ed., 2004, RT, v.g.).
O exame dos elementos produzidos na causa em que interposto o recurso extraordinário põe em evidência, quanto ao ora recorrente,
dois (2) fatos incontroversos: (1) o de que as imputações consideradas moralmente ofensivas foram por ele proferidas da própria tribuna
da Assembléia Legislativa (fls. 110) e (2) o de que as declarações alegadamente contumeliosas, também versando o mesmo tema veiculado
no discurso parlamentar, foram exteriorizadas em entrevista jornalística concedida em programa noticioso de televisão, em conexão com o
desempenho do mandato parlamentar.
Esse caráter incontroverso, que qualifica os fatos pertinentes às declarações questionadas, resulta evidente da própria petição inicial,
pois, nesta, a autora – parte ora recorrida - reconhece que “...o Requerido (...) utilizou-se da tribuna da Assembléia...” (fls. 110) para
praticar as supostas ofensas.
Delineado esse contexto fático, reconheço que o discurso parlamentar que o ora recorrente proferiu da própria tribuna da
Assembléia Legislativa local, de um lado, e a entrevista jornalística por ele concedida, de outro, acham-se abrangidos pela cláusula
constitucional da imunidade parlamentar em sentido material, apta a exonerá-lo de qualquer responsabilidade civil pelos danos
eventualmente resultantes de tais declarações, eis que inafastável, na espécie, a constatação de que tais atos resultaram de contexto
claramente vinculado ao exercício do ofício legislativo.
Não constitui demasia assinalar, considerada a própria jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou no tema ora em
exame, que os discursos proferidos na tribuna das Casas legislativas estão amparados, quer para fins penais, quer para efeitos civis, pela
cláusula da inviolabilidade, pois nada se reveste de caráter mais intrinsecamente parlamentar do que os pronunciamentos feitos no âmbito
do Poder Legislativo, a partir da própria tribuna do Parlamento (RE 140.867/MS, Rel. p/ o acórdão Min. MAURÍCIO CORRÊA - RE
278.086/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA), hipótese em que será absoluta a inviolabilidade constitucional (Inq 1.958/AC, Rel. p/ o
acórdão Min. CARLOS BRITTO, Pleno), como resulta, de forma bastante clara, da expressiva lição ministrada por ROSAH
RUSSOMANO DE MENDONÇA LIMA (“O Poder Legislativo na República”, p. 140/141, item n. 2, 1960, Freitas Bastos):
“Em conseqüência de tal determinação, o congressista usufrui de uma proteção ampla, integral, ininterrupta, sempre que
atua no exercício do mandato.
Sua palavra é livre, desconhece peias e limitações. Vota pelo modo que lhe parecer mais digno e que melhor se coadune com
os reclamos de sua consciência. Emite opiniões desafogadamente, sem que o atormente o receio de haver incidido em algum crime
de calúnia, de injúria ou de difamação.
.......................................................
Há, pois, em verdade, uma ampla irresponsabilidade, que não tem outros limites, senão aqueles traçados pela Constituição.
Deste modo, se o congressista ocupar a tribuna, diga o que disser, profira as palavras que proferir, atinja a quem atingir, a
imunidade o resguarda. Acompanha-o nos instantes decisivos das votações. Segue-o durante o trabalho árduo das comissões e em
todas as tarefas parlamentares, dentro do edifício legislativo. Transpõe, mesmo, os limites do Congresso e permanece, intangível, a
seu lado, quando se trata do desempenho de atribuições pertinentes ao exercício do mandato.” (grifei)
Impõe-se reconhecer, ainda, que a garantia constitucional da imunidade parlamentar material também estende o seu manto
protetor (1) às entrevistas jornalísticas, (2) à transmissão, para a imprensa, do conteúdo de pronunciamentos ou de relatórios produzidos
nas Casas Legislativas (RTJ 172/400-401, Rel. Min. ILMAR GALVÃO) e (3) às declarações feitas aos meios de comunicação social
(RTJ 187/985, Rel. Min. NELSON JOBIM), eis que – tal como bem realçado por ALBERTO ZACHARIAS TORON (“Inviolabilidade
Penal dos Vereadores”, p. 247, 2004, Saraiva) – esta Suprema Corte tem reafirmado “(...) a importância do debate, pela mídia, das
questões políticas protagonizadas pelos mandatários”, além de haver enfatizado “a idéia de que as declarações à imprensa constituem o
prolongamento natural do exercício das funções parlamentares, desde que se relacionem com estas” (grifei).
Vale destacar, neste ponto, por oportuno, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Inq 579/DF, Rel. Min. CÉLIO
BORJA (RTJ 141/406, 408), pôs em evidência, de modo bastante expressivo, no voto vencedor proferido pelo eminente Ministro PAULO
BROSSARD, o caráter absoluto da inviolabilidade constitucional que protege o parlamentar, quando expende suas opiniões da tribuna
da Casa legislativa:
“(...) para palavras ditas da tribuna da Câmara dos Deputados, Pontes de Miranda diz que não há possibilidade de infração
da lei penal, porque a lei não chega até ela. O parlamentar fica sujeito à advertência ou à censura do Presidente dos trabalhos, mas
falando na Câmara, não ofende a lei penal.” (grifei)
Esse mesmo entendimento foi perfilhado pelo eminente Ministro CARLOS VELLOSO, quando do julgamento do RE 140.867/MS,
Rel. p/ o acórdão Min. MAURÍCIO CORRÊA, também decidido pelo Plenário desta Suprema Corte:
“(...) se a manifestação do Vereador é feita da tribuna da Câmara, a inviolabilidade é absoluta. Indaga-se se não haveria
corretivo para os excessos praticados da tribuna. Há sim. Os excessos resolvem-se no âmbito da Câmara. Pode vir até a perder o
mandato, por falta de decoro e outras transgressões regimentais. Certo é que, se a manifestação ocorreu da tribuna, repito, a
inviolabilidade é absoluta.” (grifei)
Essa orientação jurisprudencial foi expressamente consagrada em recentíssimo julgamento emanado do Plenário do Supremo
Tribunal Federal, cujo acórdão está assim ementado:
“INQUÉRITO. DENÚNCIA QUE FAZ IMPUTAÇÃO A PARLAMENTAR DE PRÁTICA DE CRIMES CONTRA A
HONRA, COMETIDOS DURANTE DISCURSO PROFERIDO NO PLENÁRIO DE ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA E EM
ENTREVISTAS CONCEDIDAS À IMPRENSA. INVIOLABILIDADE: CONCEITO E EXTENSÃO DENTRO E FORA DO
PARLAMENTO.
A palavra ‘inviolabilidade’ significa intocabilidade, intangibilidade do parlamentar quanto ao cometimento de crime ou
contravenção. Tal inviolabilidade é de natureza material e decorre da função parlamentar, porque em jogo a representatividade do
povo.
O art. 53 da Constituição Federal, com a redação da Emenda nº 35, não reeditou a ressalva quanto aos crimes contra a
honra, prevista no art. 32 da Emenda Constitucional nº 1, de 1969. Assim, é de se distinguirem as situações em que as supostas
ofensas são proferidas dentro e fora do Parlamento. Somente nessas últimas ofensas irrogadas fora do Parlamento é de se perquirir
da chamada ‘conexão com o exercício do mandato ou com a condição parlamentar’ (INQ 390 e 1.710). Para os pronunciamentos
feitos no interior das Casas Legislativas, não cabe indagar sobre o conteúdo das ofensas ou a conexão com o mandato, dado que
acobertadas com o manto da inviolabilidade. Em tal seara, caberá à própria Casa a que pertencer o parlamentar coibir eventuais
excessos no desempenho dessa prerrogativa.
No caso, o discurso se deu no plenário da Assembléia Legislativa, estando, portanto, abarcado pela inviolabilidade. Por
outro lado, as entrevistas concedidas à imprensa pelo acusado restringiram-se a resumir e comentar a citada manifestação da
tribuna, consistindo, por isso, em mera extensão da imunidade material.
Denúncia rejeitada.”
(Inq 1.958/AC, Rel. p/ o acórdão Min. CARLOS BRITTO, Pleno - grifei)
Impõe-se registrar, neste ponto, uma última observação: se o membro do Poder Legislativo, não obstante amparado pela
imunidade parlamentar material, incidir em abuso de tal prerrogativa, expor-se-á à jurisdição censória da própria Casa legislativa a que
pertence, tal como assinala a doutrina (RAUL MACHADO HORTA, “Estudos de Direito Constitucional”, p. 597, item n. 3, 1995, Del
Rey; CARLOS MAXIMILIANO, “Comentários à Constituição Brasileira”, vol. II/49, item n. 297, 5ª ed., 1954, Freitas Bastos, v.g.) e
acentua, com particular ênfase, a jurisprudência constitucional firmada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (RE 140.867/MS, Rel.
p/ o acórdão Min. MAURÍCIO CORRÊA – Inq 1.958/AC, Rel. p/ o acórdão Min. CARLOS BRITTO).
Concluindo: a análise dos elementos constantes destes autos permite-me reconhecer que o comportamento do ora agravante – que
era, então, à época dos fatos, Deputado Estadual – subsume-se, inteiramente, ao âmbito de incidência da proteção constitucional fundada
na garantia da imunidade parlamentar material, em ordem a excluir, na espécie, a responsabilidade civil do parlamentar em questão.
Sendo assim, pelas razões expostas, conheço do presente agravo, para, desde logo, conhecer e dar provimento ao recurso
extraordinário interposto por João Correia Lima Sobrinho (CPC, art. 544, § 4º), em ordem a julgar improcedente a “ação de indenização
e reparação de danos morais” ajuizada pela parte ora agravada (fls. 97/112), restaurando-se, em conseqüência, a sentença do magistrado
estadual de primeira instância, proferida no âmbito do Juizado Especial Cível da comarca de Rio Branco/AC (Processo nº 001.00.025408-9
– fls. 165/174).
Publique-se.
Brasília, 07 de março de 2005.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
*decisão pendente de publicação
ADI – Transcendência dos Motivos Determinantes – Reclamação (Transcrições)
Rcl 2986 MC/SE*
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
EMENTA: FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE. RECONHECIMENTO, PELO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL, DA VALIDADE CONSTITUCIONAL DA LEGISLAÇÃO DO ESTADO DO PIAUÍ QUE DEFINIU,
PARA OS FINS DO ART. 100, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO, O SIGNIFICADO DE OBRIGAÇÃO DE PEQUENO VALOR.
DECISÃO JUDICIAL, DE QUE ORA SE RECLAMA, QUE ENTENDEU INCONSTITUCIONAL LEGISLAÇÃO, DE
IDÊNTICO CONTEÚDO, EDITADA PELO ESTADO DE SERGIPE. ALEGADO DESRESPEITO AO JULGAMENTO, PELO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, DA ADI 2.868 (PIAUÍ). EXAME DA QUESTÃO RELATIVA AO EFEITO
TRANSCENDENTE DOS MOTIVOS DETERMINANTES QUE DÃO SUPORTE AO JULGAMENTO, “IN ABSTRACTO”, DE
CONSTITUCIONALIDADE OU DE INCONSTITUCIONALIDADE. DOUTRINA. PRECEDENTES. ADMISSIBILIDADE DA
RECLAMAÇÃO. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.
DECISÃO: Sustenta-se, nesta sede processual - presentes os motivos determinantes que substanciaram a decisão que esta Corte proferiu
na ADI 2.868/PI - que o ato, de que ora se reclama, teria desrespeitado a autoridade desse julgamento plenário, que restou
consubstanciado em acórdão assim ementado:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 5.250/2002 DO ESTADO DO PIAUÍ. PRECATÓRIOS.
OBRIGAÇÕES DE PEQUENO VALOR. CF, ART. 100, § 3º, ADCT, ART. 87.
Possibilidade de fixação, pelos estados-membros, de valor referencial inferior ao do art. 87 do ADCT, com a redação dada
pela Emenda Constitucional 37/2002.
Ação direta julgada improcedente.”
(ADI 2.868/PI, Rel. p/ o acórdão Min. JOAQUIM BARBOSA - grifei)
O litígio jurídico-constitucional suscitado em sede de controle abstrato (ADI 2.868/PI), examinado na perspectiva do pleito ora
formulado pelo Estado de Sergipe, parece introduzir a possibilidade de discussão, no âmbito deste processo reclamatório, do denominado
efeito transcendente dos motivos determinantes da decisão declaratória de constitucionalidade proferida no julgamento plenário da já
referida ADI 2.868/PI, Rel. p/ o acórdão Min. JOAQUIM BARBOSA.
Cabe registrar, neste ponto, por relevante, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no exame final da Rcl 1.987/DF, Rel.
Min. MAURÍCIO CORREA, expressamente admitiu a possibilidade de reconhecer-se, em nosso sistema jurídico, a existência do
fenômeno da “transcendência dos motivos que embasaram a decisão” proferida por esta Corte, em processo de fiscalização normativa
abstrata, em ordem a proclamar que o efeito vinculante refere-se, também, à própria “ratio decidendi”, projetando-se, em conseqüência,
para além da parte dispositiva do julgamento, “in abstracto”, de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade.
Essa visão do fenômeno da transcendência parece refletir a preocupação que a doutrina vem externando a propósito dessa
específica questão, consistente no reconhecimento de que a eficácia vinculante não só concerne à parte dispositiva, mas refere-se,
também, aos próprios fundamentos determinantes do julgado que o Supremo Tribunal Federal venha a proferir em sede de controle
abstrato, especialmente quando consubstanciar declaração de inconstitucionalidade, como resulta claro do magistério de IVES GANDRA
DA SILVA MARTINS/GILMAR FERREIRA MENDES (“O Controle Concentrado de Constitucionalidade”, p. 338/345, itens ns.
7.3.6.1 a 7.3.6.3, 2001, Saraiva) e de ALEXANDRE DE MORAES (“Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional”,
p. 2.405/2.406, item n. 27.5, 2ª ed., 2003, Atlas).
Na realidade, essa preocupação, realçada pelo magistério doutrinário, tem em perspectiva um dado de insuperável relevo políticojurídico, consistente na necessidade de preservar-se, em sua integralidade, a força normativa da Constituição, que resulta da indiscutível
supremacia, formal e material, de que se revestem as normas constitucionais, cuja integridade, eficácia e aplicabilidade, por isso mesmo,
hão de ser valorizadas, em face de sua precedência, autoridade e grau hierárquico, como enfatiza o magistério doutrinário (ALEXANDRE
DE MORAES, “Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional”, p. 109, item n. 2.8, 2ª ed., 2003, Atlas; OSWALDO
LUIZ PALU, “Controle de Constitucionalidade”, p. 50/57, 1999, RT; RITINHA ALZIRA STEVENSON, TERCIO SAMPAIO FERRAZ
JR. e MARIA HELENA DINIZ, “Constituição de 1988: Legitimidade, Vigência e Eficácia e Supremacia”, p. 98/104, 1989, Atlas;
ANDRÉ RAMOS TAVARES, “Tribunal e Jurisdição Constitucional”, p. 8/11, item n. 2, 1998, Celso Bastos Editor; CLÈMERSON
MERLIN CLÈVE, “A Fiscalização Abstrata de Constitucionalidade no Direito Brasileiro”, p. 215/218, item n. 3, 1995, RT, v.g.).
Cabe destacar, neste ponto, tendo presente o contexto em questão, que assume papel de fundamental importância a interpretação
constitucional derivada das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função institucional, de “guarda da Constituição”
(CF, art. 102, “caput”), confere-lhe o monopólio da última palavra em tema de exegese das normas positivadas no texto da Lei
Fundamental, como tem sido assinalado, com particular ênfase, pela jurisprudência desta Corte Suprema:
“(...) A interpretação do texto constitucional pelo STF deve ser acompanhada pelos demais Tribunais. (...) A não-observância da decisão desta Corte debilita a força normativa da Constituição. (...).”
(RE 203.498-AgR/DF, Rel. Min. GILMAR MENDES – grifei)
Impende examinar, no entanto, antes de quaisquer outras considerações, se se revela cabível, ou não, na espécie, o emprego da
reclamação, quando ajuizada em face de situações de alegado desrespeito a decisões que a Suprema Corte tenha proferido em sede de
fiscalização normativa abstrata.
O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar esse aspecto da questão, tem enfatizado, em sucessivas decisões, que a reclamação
reveste-se de idoneidade jurídico-processual, se utilizada com o objetivo de fazer prevalecer a autoridade decisória dos julgamentos
emanados desta Corte, notadamente quando impregnados de eficácia vinculante:
“O DESRESPEITO À EFICÁCIA VINCULANTE, DERIVADA DE DECISÃO EMANADA DO PLENÁRIO DA
SUPREMA CORTE, AUTORIZA O USO DA RECLAMAÇÃO.
- O descumprimento, por quaisquer juízes ou Tribunais, de decisões proferidas com efeito vinculante, pelo Plenário do
Supremo Tribunal Federal, em sede de ação direta de inconstitucionalidade ou de ação declaratória de constitucionalidade,
autoriza a utilização da via reclamatória, também vocacionada, em sua específica função processual, a resguardar e a fazer
prevalecer, no que concerne à Suprema Corte, a integridade, a autoridade e a eficácia subordinante dos comandos que emergem de
seus atos decisórios. Precedente: Rcl 1.722/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO (Pleno).”
(RTJ 187/151, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
Cabe verificar, de outro lado, se terceiros – que não intervieram no processo objetivo de controle normativo abstrato – dispõem,
ou não, de legitimidade ativa para o ajuizamento de reclamação perante o Supremo Tribunal Federal, quando promovida com o objetivo de
fazer restaurar o “imperium” inerente às decisões emanadas desta Corte, proferidas em sede de ação direta de inconstitucionalidade ou de
ação declaratória de constitucionalidade.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, a propósito de tal questão, ao analisar o alcance da norma inscrita no art. 28 da Lei nº
9.868/98 (Rcl 1.880-AgR/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA), firmou orientação que reconhece, a terceiros, qualidade para agir, em
sede reclamatória, quando necessário se torne assegurar o efetivo respeito aos julgamentos desta Suprema Corte, proferidos no âmbito de
processos de controle normativo abstrato:
“(...) LEGITIMIDADE ATIVA PARA A RECLAMAÇÃO NA HIPÓTESE DE INOBSERVÂNCIA DO EFEITO
VINCULANTE.
- Assiste plena legitimidade ativa, em sede de reclamação, àquele – particular ou não – que venha a ser afetado, em sua
esfera jurídica, por decisões de outros magistrados ou Tribunais que se revelem contrárias ao entendimento fixado, em caráter
vinculante, pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos processos objetivos de controle normativo abstrato instaurados
mediante ajuizamento, quer de ação direta de inconstitucionalidade, quer de ação declaratória de constitucionalidade. Precedente.
(...).”
(RTJ 187/151, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
Vê-se, portanto, que assiste, ao ora reclamante, plena legitimidade ativa “ad causam” para fazer instaurar este processo
reclamatório.
Impende verificar, agora, se a situação exposta pelo Estado de Sergipe, na presente reclamação, pode traduzir, ou não, hipótese
de ofensa à autoridade da decisão que o Supremo Tribunal Federal proferiu, com eficácia vinculante, em sede de fiscalização normativa
abstrata, no julgamento de ação direta ajuizada em face de diploma legislativo editado por outra unidade da Federação.
Ou, em outras palavras, cumpre analisar, presente o contexto ora em exame, se a “ratio decidendi”, que substancia o julgamento
desta Corte proferido na ADI 2.868/PI, apresenta-se, ou não, revestida de efeito transcendente, em ordem a viabilizar, processualmente, a
utilização do instrumento reclamatório.
Parece-me que sim, ao menos em juízo de estrita delibação, especialmente se considerada a decisão que o Plenário do Supremo
Tribunal Federal proferiu na Rcl 1.987/DF, Rel. Min. MAURÍCIO CORREA:
“(...) Ausente a existência de preterição, que autorize o seqüestro, revela-se evidente a violação ao conteúdo essencial do
acórdão proferido na mencionada ação direta, que possui eficácia erga omnes e efeito vinculante. A decisão do Tribunal, em
substância, teve sua autoridade desrespeitada de forma a legitimar o uso do instituto da reclamação. Hipótese a justificar a
transcendência sobre a parte dispositiva, dos motivos que embasaram a decisão e dos princípios por ela consagrados, uma vez que
os fundamentos resultantes da interpretação da Constituição devem ser observados por todos os tribunais e autoridades, contexto
que contribui para a preservação e desenvolvimento da ordem constitucional.”
(Rcl 1.987/DF, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - grifei)
Essa mesma orientação, que reconhece o caráter transcendente e vinculante dos fundamentos determinantes de decisão do
Supremo Tribunal Federal, proferida em sede de controle normativo abstrato, veio a ser reafirmada no julgamento plenário da Rcl
2.363/PA, Rel. Min. GILMAR MENDES, quando o eminente Relator da causa fez consignar, em expressiva passagem do seu douto voto,
o que se segue:
“(...) Assinale-se que a aplicação dos fundamentos determinantes de um ‘leading case’ em hipóteses semelhantes tem-se
verificado, entre nós, até mesmo no controle de constitucionalidade das leis municipais.
Em um levantamento precário, pude constatar que muitos juízes desta Corte têm, constantemente, aplicado em caso de
declaração de inconstitucionalidade o precedente fixado a situações idênticas reproduzidas em leis de outros municípios.
Tendo em vista o disposto no ‘caput’ e § 1º-A do artigo 557 do Código de Processo Civil, que reza sobre a possibilidade de o
relator julgar monocraticamente recurso interposto contra decisão que esteja em confronto com súmula ou jurisprudência
dominante do Supremo Tribunal Federal, os membros desta Corte vêm aplicando tese fixada em precedentes onde se discutiu a
inconstitucionalidade de lei, em sede de controle difuso, emanada por ente federativo diverso daquele prolator da lei objeto do
recurso extraordinário sob exame.
.......................................................
Não há razão, pois, para deixar de reconhecer o efeito vinculante da decisão proferida na ADIn.
Nesses termos, meu voto é no sentido da procedência da presente reclamação.” (grifei)
Assentadas tais premissas, passo a apreciar o pedido de medida cautelar ora formulado nesta sede processual.
Trata-se de reclamação, na qual se sustenta que o ato judicial ora questionado - emanado do Juízo da 5ª Vara do Trabalho de
Aracaju/SE - teria desrespeitado a autoridade da decisão do Supremo Tribunal Federal proferida no julgamento final da ADI 2.868/PI,
Rel. p/ o acórdão Min. JOAQUIM BARBOSA.
É que o Juízo da 5ª Vara do Trabalho de Aracaju/SE, ao ordenar a efetivação do seqüestro ora impugnado nesta via reclamatória,
apoiou-se, para tanto, em razões, cujo teor antagoniza-se com os fundamentos subjacentes ao acórdão desta Corte, que, proferido na
referida ADI 2.868/PI, é invocado como paradigma de confronto pela parte ora reclamante.
Eis, no ponto, o conteúdo da decisão judicial ora reclamada (fls. 43):
“No que respeita ao procedimento da execução mediante dispensa do precatório, verifica-se que a matéria encontra-se
definida nestes autos, nos termos da decisão de fls. 146/150, transitada em julgado conforme certidão de fl. 153, revelando-se,
portanto, incabível o seu reexame.
Por outro lado, considerando que o valor constante do ofício requisitório de fl. 162 excede ao limite estabelecido para
créditos de pequeno valor, fixado nos termos do artigo 87 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, tendo em vista ainda
a manifestação expressa do exeqüente pela renúncia da quantia executada excedente a tal limite, consoante petição de fl. 101,
expeça-se novo ofício requisitando à executada o pagamento do valor equivalente a 40 salários mínimos – R$ 10.400,00 (dez mil e
quatrocentos reais) em favor do exeqüente, no prazo de 60 (sessenta dias), sob pena de seqüestro, tudo de acordo com o art. 17,
‘caput’ e § 2º da Lei nº 10.259/2001. Intime-se.” (grifei)
Vê-se, portanto, que o ato judicial de que ora se reclama parece haver desrespeitado os fundamentos determinantes da decisão do
Supremo Tribunal Federal proferida no julgamento final da ADI 2.868/PI, precisamente porque, naquela oportunidade, o Plenário desta
Suprema Corte reconheceu como constitucionalmente válida, para efeito de definição de pequeno valor e de conseqüente dispensa de
expedição de precatório, a possibilidade de fixação, pelos Estados-membros, de valor referencial inferior ao do art. 87 do ADCT, na
redação dada pela EC 37/2002, o que foi recusado, no entanto, no âmbito do Estado de Sergipe, pelo órgão judiciário ora reclamado.
Na realidade, o caso versado nos presentes autos parece configurar hipótese de “violação ao conteúdo essencial” do acórdão
consubstanciador do julgamento da referida ADI 2.868/PI, o que caracterizaria possível transgressão ao efeito transcendente dos
fundamentos determinantes daquela decisão plenária emanada do Supremo Tribunal Federal, ainda que proferida em face de legislação
estranha ao Estado de Sergipe, parte ora reclamante.
Sendo assim, e presentes as razões expostas, defiro a medida liminar ora postulada (fls. 07, item IV) e, em conseqüência, suspendo
a eficácia da decisão reclamada (Processo nº 01.05-1212/00 – 5ª Vara do Trabalho de Aracaju/SE – fls. 43 e 52), sustando-se a prática de
qualquer outro ato processual e/ou administrativo que se relacione com o questionado ato decisório.
Comunique-se, com urgência, encaminhando-se cópia da presente decisão ao Juízo da 5a Vara do Trabalho de Aracaju/SE.
2. Requisitem-se informações à ilustre autoridade judiciária que ora figura como reclamada nesta sede processual (Lei nº 8.038/90,
art. 14, I).
Publique-se.
Brasília, 11 de março de 2005.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
* decisão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 380
Brasília, 14 de março de 2005 Nº 380
Data (páginas internas): 23 de março de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
ADI e Lei do Petróleo – 4
ADI e Lei do Petróleo – 5
Processo Administrativo Disciplinar : Comissão de Inquérito e Devido Processo Legal
Remoção de Servidor e Ajuda de Custo
Servidores Não-Efetivos e Regime de Previdência
Emissão de Notas Fiscais e Livre Exercício de Atividade Econômica
ICMS: Redução de Base de Cálculo e Estorno de Crédito
1ª Turma
Prisão Preventiva e Fundamentação
2ª Turma
Clipping do DJ
Transcrições
Transferência “Ex Officio” entre Instituições de Ensino e Congeneridade
PLENÁRIO
ADI e Lei do Petróleo – 4
O Tribunal concluiu julgamento de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Governador
do Estado do Paraná contra diversos dispositivos da Lei federal 9.478/97, que dispõe sobre a política
energética nacional, as atividades relativas ao monopólio do petróleo, institui o Conselho Nacional de
Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo e dá outras providências — v. Informativos 361,
362 e 378. Por maioria, julgou-se improcedente o pedido. Salientando-se a necessidade de se interpretar a
Constituição dentro do contexto histórico em que ela se dá, entendeu-se inexistir incompatibilidade de
qualquer ordem entre os preceitos atacados pela ADI e a Constituição Federal. Inicialmente, rejeitou-se a
apontada inconstitucionalidade do art. 26 da norma impugnada. Ressaltou-se a diferença entre o
monopólio e a propriedade, concluindo-se estar aquele ligado a uma atividade empresarial que não se
presta a explicitar características desta. Assim, o art. 177 da CF enumera as atividades que constituem
monopólio da União, e seu art. 20, os bens que são de sua exclusiva propriedade, razão pela qual seria
possível a União atribuir a terceiros o resultado da propriedade das lavras das jazidas de petróleo, gás
natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, sem ofensa à reserva de monopólio contemplado no citado
art. 177. Afirmou-se que a propriedade da lavra das jazidas de produtos minerais conferida ao
concessionário pelo art. 176 da CF é inerente ao modo de produção social capitalista, sendo que essa
concessão seria materialmente impossível sem que o proprietário se apropriasse do produto da exploração
das jazidas, o que também se daria quanto ao produto resultante das contratações (e não concessões) com
empresas estatais ou privadas nos termos do § 1º do art. 177 da CF, consubstanciando escolha política a
opção por uma das inúmeras modalidades de contraprestação atribuíveis ao contratado. Asseverou-se que
a EC 9/95 tornou relativo o monopólio do petróleo, extirpando do § 1º do art. 177 a proibição de se ceder
ou conceder qualquer tipo de participação na exploração da atividade petrolífera, permitindo a
transferência ao “concessionário” da propriedade do produto da exploração das jazidas a que alude, bem
como dos riscos e resultados decorrentes da atividade, observadas as normas legais. Além disso, com a
relativização do monopólio, a Petrobrás teria perdido a qualidade de sua executora, atribuída pela Lei
2.004/53, estando a atuar na qualidade de empresa estatal que explora atividade econômica em sentido
estrito e não serviço público, e sujeita à contratação pela União mediante processo de licitação pública
(CF, art. 37, XXI).
ADI 3273/DF, rel. orig. Min. Carlos Britto, rel. p/ acórdão Min. Eros Grau, 16.3.2005. (ADI-3273)
ADI e Lei do Petróleo - 5
Em seguida, afastou-se a alegação de que o § 3º do art. 26 seria inconstitucional por traduzir
conduta negativa da Administração, eis que a lei dá regulação, neste ponto, ao chamado “silêncio da
Administração”, tratando-se, portanto, de matéria infraconstitucional. Em relação aos demais preceitos
atacados (incisos I e III do art. 28, parágrafo único do art. 43 e parágrafo único do art. 51), também não se
visualizou ofensa à CF, porquanto são próprios às contratações de que se cuida, admitidas expressamente
no § 2º do art. 177 da CF. Considerou-se, ainda, ser falaciosa a leitura isolada do art. 60, caput, o qual
refere-se à possibilidade da exportação do produto, administrada pela União, observando-se, para tanto, o
disposto no art. 4º da Lei 8.176/91, atendidas as políticas aprovadas pelo Presidente da República,
propostas pelo Conselho Nacional de Política Energética – CNPE. Por fim, concluiu-se que a Agência
Nacional do Petróleo – ANP é autarquia, sob a direção do Presidente da República, nos termos do inciso
II do art. 84 da CF. Vencidos os Ministros Carlos Britto, relator, Marco Aurélio e Joaquim Barbosa, que
julgavam procedente, em parte, o pedido, nos termos de seus votos.
ADI 3273/DF, rel. orig. Min. Carlos Britto, rel. p/ acórdão Min. Eros Grau, 16.3.2005. (ADI-3273)
Processo Administrativo Disciplinar: Comissão de Inquérito e Devido Processo Legal
O Tribunal iniciou julgamento de mandado de segurança impetrado contra decreto do Presidente da
República, que demitira o impetrante do cargo de fiscal do trabalho, do Ministério do Trabalho, pela
prática de diversas infrações previstas na Lei 8.112/90, apuradas por comissão de inquérito. O impetrante
alega ser vítima de trama planejada por desafeto seu, com participação dos membros da referida
comissão, e que o processo administrativo contra ele instaurado está eivado de ilegalidades. A Min. Ellen
Gracie, relatora, denegou a ordem. Entendeu que a análise do conjunto probatório produzido em sede
administrativa, necessária à verificação da procedência da primeira alegação, é incompatível com a via
eleita, devendo o impetrante, para tanto, recorrer às vias ordinárias. Ressaltou que, apesar de o relatório
final apresentado pela comissão de inquérito conter redação inadequada à boa técnica administrativa, com
trechos em que há referências pejorativas sobre o impetrante, tal inconveniente, por si só, não macularia o
procedimento administrativo realizado, já que as conclusões a que chegou o mencionado relatório não
vinculariam a autoridade julgadora, conforme precedente da Corte (MS 21280/DF, DJU de 20.3.92).
Além disso, a censura, quanto a esse ponto, feita pelas diversas instâncias administrativas pelas quais
tramitou o processo consistiria numa demonstração de que a autoridade julgadora não teria sido
influenciada pelas impropriedades contidas no relatório. Por fim, asseverou não ter ocorrido cerceamento
de defesa, porquanto não teriam sido arroladas como testemunhas as pessoas que o impetrante afirmava
não terem sido ouvidas pela comissão.Divergindo, o Min. Cezar Peluso concedeu a ordem por considerar
caracterizada a ofensa ao devido processo legal, consubstanciada na ausência de sobriedade com a qual
teria a comissão produzido o aludido relatório. Após os votos dos Ministros Gilmar Mendes, Marco
Aurélio e Sepúlveda Pertence, que acompanhavam a divergência, pediu vista dos autos o Min. Joaquim
Barbosa.
MS 22151/PR, rel. Min. Ellen Gracie, 16.3.2005. (MS-22151)
Remoção de Servidor e Ajuda de Custo
O Tribunal iniciou julgamento de mandado de segurança impetrado contra decisão do TCU, que
negara a servidor de seu quadro o direito à concessão de ajuda de custo, em razão de seu retorno para a
lotação de origem. O Min. Joaquim Barbosa, relator, concedeu a ordem por entender que o direito do
impetrante à vantagem pleiteada decorre do Decreto 1.445/95, com a redação dada pelo Decreto 1.637/95,
que, vigente à época dos fatos, regulamentou a Lei 8.112/90, e conferiu ao servidor ajuda de custo para
retorno à localidade de origem, desde que tivesse exercido por mais de 12 meses o cargo para o qual havia sido removido por interesse da Administração e não fizesse jus a auxílio da mesma espécie por outro
órgão ou entidade (art. 4º, § 1º). Em seguida, o Min. Marco Aurélio indeferiu o writ, por considerar ser
inaplicável à espécie o referido decreto, já que editado para reger relação do Poder Executivo com o
servidor, salientando, ademais, o fato de o impetrante não ter sido transferido para exercer a função da
qual destituído ex officio, bem como de o retorno à origem ter se dado a seu pedido. O julgamento foi
suspenso com o pedido de vista do Min. Gilmar Mendes.
MS 24089/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 16.3.2005. (MS-24089)
Servidores Não-Efetivos e Regime de Previdência
O Tribunal iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo ProcuradorGeral da República contra os artigos 79 e 85 da Lei Complementar 64/2002, do Estado de Minas Gerais,
este tanto em seu texto original quanto na redação conferida pela Lei Complementar 70/2003, que,
respectivamente, assegura o regime de previdência estadual para os servidores não-efetivos e institui
contribuição para o custeio da assistência à saúde, ambos benefícios fomentados pelo Regime Próprio de
Previdência dos Servidores daquele Estado. O Min. Eros Grau, relator, julgou procedente o pedido no
tocante ao art. 79 da Lei, no que foi acompanhado pelo Min. Joaquim Barbosa. Entendeu que o artigo
questionado afronta o art. 40, § 13 da CF, que determina a filiação ao regime geral da previdência social
dos ocupantes, exclusivamente, de cargo em comissão. Asseverou, ainda, que esse dispositivo dispõe de
forma adversa à norma geral de previdência social estabelecida pela União, qual seja, a Lei federal
9.717/98 (art. 1º, V). O Min. Eros Grau também declarou a inconstitucionalidade da expressão “definidos
no art. 79”, no art. 85, caput, da Lei Complementar 64/2002, mantido pela Lei Complementar 70/2003,
ambas do Estado de Minas Gerais, bem como do vocábulo “compulsoriamente”, contido no § 4º do
mesmo art. 85, na redação original, e no § 5º do referido art. 85, com a redação dada pela Lei
complementar 70/2003. Considerou violado o art. 149, § 1º da CF, na medida em que instituída
contribuição compulsória em relação à saúde, área excluída da atuação da seguridade social pelo
constituinte. Ressaltou não haver óbice para que os serviços de assistência médica, hospitalar,
odontológica, social e farmacêutica sejam fomentados mediante o pagamento de contribuição facultativa.
Após, pediu vista o Min. Cezar Peluso.
ADI 3106/MG, rel. Min. Eros Grau, 17.3.2005. (ADI-3106)
Emissão de Notas Fiscais e Livre Exercício de Atividade Econômica
Por entender caracterizada a ofensa à garantia do livre exercício do trabalho, ofício ou profissão
(CF, art. 5º, XIII) e de qualquer atividade econômica (CF, art. 170, parágrafo único), o Tribunal, por
maioria, deu provimento a recurso extraordinário, para declarar a inconstitucionalidade do inciso IV e do
§ 4º do art. 19, do Decreto 3.017/89, do Estado de Santa Catarina, que, regulamentando o Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços naquele Estado, possibilitam que os órgãos da Diretoria de
Administração Tributária proíbam a impressão de documentos fiscais para empresas em débito com a
Fazenda estadual, condicionando-as a requerer ao fisco a emissão de nota fiscal avulsa a cada operação
realizada. Vencido o Min. Eros Grau que desprovia o recurso por não vislumbrar restrição à atividade
mercantil.
RE 413782/SC, rel. Min. Marco Aurélio, 17.3.2005. (RE-413782)
ICMS: Redução de Base de Cálculo e Estorno de Crédito
O Tribunal, por maioria, negou provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que entendera ser legal a exigência do estorno do crédito do
ICMS, relativo à entrada de insumos, proporcional à parcela correspondente à redução da base de cálculo
do imposto incidente na operação de saída do produto industrializado. Entendeu-se se tratar, na espécie,
de um favor fiscal que, mutilando o aspecto quantitativo da base de cálculo, corresponderia à figura da
isenção parcial, sendo aplicável, dessa forma, o art. 155, § 2º, II, b, da CF/88, que determina a anulação
do crédito relativo às operações anteriores na hipótese de isenção ou não-incidência nas subseqüentes.
Vencido o Min. Marco Aurélio, relator, que, considerando ser regedora do conflito em questão a CF/69
— que não previa a referida hipótese da atual, dava provimento ao recurso e declarava a
inconstitucionalidade do art. 32, II, do Convênio 66/88 e do art. 41, IV, da Lei 6.374/89, do Estado de São
Paulo, que tratam da matéria.
RE 174478/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ acórdão Min. Cezar Peluso, 17.3.2005. (RE174478)
PRIMEIRA TURMA
Prisão Preventiva e Fundamentação
A Turma retomou julgamento de habeas corpus, em que se pretende seja expedido alvará de soltura
em favor de acusado, preso desde 1º.6.2004, pela suposta prática dos crimes de corrupção ativa (CP, art.
333) e de impedir ou tentar impedir o livre exercício das atribuições de membro de CPI (Lei 1.579/52, art.
4º, I, parte final). Na sessão do dia 1º.3.2005, o Min. Marco Aurélio, relator, deferiu liminarmente o writ
por entender presente o excesso de prazo na formação da culpa, bem como por considerar existente
descompasso dos fundamentos do decreto com a ordem jurídica em vigor, pois estaria fundado apenas em
aspectos ligados à própria prática do crime que se imputa. Na ocasião, o Min. Eros Grau também deferiu
a ordem, mas, de ofício, sob o fundamento de excesso de prazo da prisão, não invocado pela impetração.
Prosseguindo no julgamento, o Min. Carlos Britto, em voto-vista, indeferiu o pedido de liminar por
entender que o decreto de prisão preventiva encontra-se devidamente fundamentado na garantia da ordem
pública. Com base em precedente do STF no sentido de que é válida a justificação da prisão preventiva no
eventual abalo à credibilidade de um dos poderes da República (HC 80717/SP, DJU de 5.3.2004),
considerou que o acusado, em liberdade, poderia fazer uso de seu poder econômico para práticas ilícitas.
Ressaltou, ademais, que, conforme o decreto de prisão, há indícios de formação de organização criminosa
envolvendo autoridades e “com possível ingerência em órgãos públicos”, potencializando risco à ordem
pública. Afastou, também, a possibilidade de concessão da ordem de ofício com apoio em eventual
excesso de prazo, já que a instrução criminal encontra-se encerrada. Por fim, reputou inconsistente a
afirmação da impetração de que, com a abertura de inquérito contra deputado — com vista a apurar as
circunstâncias que envolveram as gravações de conversas estabelecidas entre este último e o paciente — é
provável que este passe da condição de sujeito ativo do crime de corrupção para a de vítima do crime de
concussão, porquanto todo acusado que se encontra preso cautelarmente tem a possibilidade de,
posteriormente, vir a ser absolvido. O Min. Eros Grau retificou o seu voto e acompanhou o Min. Carlos
Britto. Após, pediu vista o Min. Cezar Peluso.
HC 85298 QO/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 15.3.2005. (HC-85298)
SEGUNDA TURMA
Não houve sessão ordinária no dia 15.3.2005.
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
16.3.2005
15.3.2005
——
Extraordinárias
17.3.2005
——
——
Julgamentos
15
19
——
CLIPPING
DO
DJ
18 de março de 2005
ADI N. 3.030-AP
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ASCENSÃO FUNCIONAL: INCONSTITUCIONALIDADE. C.F., art. 37, II. Constituição do Estado do Amapá, art. 48.
I. - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não admite a ascensão funcional, espécie de provimento derivado vertical. C.F.,
art. 37, II. II. - Inconstitucionalidade de dispositivo da Constituição do Amapá que admite a ascensão funcional, art. 48. III. - ADI
julgada procedente.
Ext N. 936-REPÚBLICA ITALIANA
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. PENAL. EXTRADIÇÃO. ENTORPECENTES: TRÁFICO. Lei 6.368/76, artigos 12 e 14.
SISTEMA DE CONTENCIOSIDADE LIMITADA. Lei 6.815/80, art. 85, § 1º. EXTRADITANDO CONDENADO PELA
JUSTIÇA BRASILEIRA PELOS MESMOS FATOS.
I. - Fatos delituosos tipificados como crime na lei penal italiana. Decreto do Presidente da República, nº 309/1990, artigos 73, § 1º, e
§ 6º, 80, § 2º; Código Penal, arts. 56 e 112; artigo 74, § 1º, § 2º e § 3º, Decreto do Presidente da República nº 309/1990. Lei
brasileira: Lei 6.368/76, artigos 12 e 14.
II. - Pedido de extradição instruído com os documentos exigidos pelo Estatuto dos Estrangeiros, Lei 6.815/80, art. 80.
III. - Vigora, na ordem jurídica brasileira, em tema de extradição, o sistema de contenciosidade limitada, artigo 85, § 1º, da Lei
6.815/80. É dizer, a defesa versará sobre a identidade da pessoa reclamada, defeito de forma dos documentos apresentados ou
ilegalidade da extradição, certo que a constitucionalidade desse dispositivo legal - § 1º do art. 85 - foi reconhecida pelo Supremo
Tribunal Federal: Ext 669/EEUU, Ministro Celso de Mello (RTJ 161/409).
IV. - Extraditando condenado pela Justiça brasileira pelos mesmos fatos: se, pelos mesmos fatos em que se fundar o pedido
extradicional, o extraditando tiver sido condenado, a extradição será indeferida. É o que ocorre, no caso, relativamente ao delito de
tentativa de importação de 592 Kg de cocaína, em que o extraditando foi condenado à pena de 9 (nove) anos de reclusão.
V. - Extradição deferida, em parte, observando-se a ressalva inscrita no art. 89 c/c os arts. 67 e 90, da Lei 6.815/80.
MS N. 24.008-DF
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Magistrado: aposentadoria com proventos de Juiz Togado do TRT/12ª Região: preenchimento dos requisitos
necessários previstos no primitivo art. 93, VI, da Constituição antes da promulgação da EC 20/98. 1. Retificada pela Justiça
Trabalhista a data da posse do impetrante para a data em que se dera a rejeição ilegal de seu acesso ao TRT/12ª Região, tem-se que,
para efeitos de aposentadoria, desde a mesma data deve ele ser considerado como integrante daquela Corte. 2. Preencheu, portanto,
todos os requisitos para a sua aposentadoria (trinta anos de serviço e cinco de magistratura) antes da EC 20/98, aplicando-se-lhe o
seu art. 3º, que assegura a concessão de aposentadoria aos que - até a data da publicação da Emenda - tenham cumprido os requisitos
previstos na legislação antes vigente (antigo art. 93,VI, CF), sem a exigência atual de cinco anos no cargo (art. 40, § 1º, III, CF):
donde, o direito do impetrante aos proventos de juiz togado do Tribunal.
Rcl N. 2.155-RJ
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Reclamação ajuizada pelo Estado do Rio de Janeiro em que se postula a cassação de ordem de seqüestro determinada
pelo Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região com o objetivo de ver cumprido precatório judicial. 2. Precatório derivado de
reclamação trabalhista. 3. Cumprimento da ordem cronológica dos precatórios. 4. Interpretação do art. 100, § 2º, em combinação
com o art. 78, § 4º, do ADCT. 5. Violação ao conteúdo da decisão liminar proferida na ADI 1662 (Rel. Min. Maurício Corrêa), em
que o STF teria reconhecido que somente a hipótese de preterição no direito de precedência autoriza o seqüestro de recursos
públicos, a ela não se equiparando as situações de não-inclusão da despesa no orçamento, de vencimento do prazo para quitação e
qualquer outra espécie de pagamento inidôneo, casos em que ficaria configurado o descumprimento de ordem judicial, sujeitando o
infrator à intervenção. 6. Reclamação julgada procedente.
* noticiado no Informativo 359
HC N. 85.212-RJ
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
COMPETÊNCIA - HABEAS CORPUS - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. A competência do Supremo Tribunal Federal para
julgar habeas corpus, considerado ato do Superior Tribunal de Justiça, pressupõe adoção de entendimento por este último,
excepcionado o caso de concessão de ofício.
QO EM HC N. 85.270-RJ
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
PENA - CUMPRIMENTO - REGIME - PROGRESSÃO - PLENÁRIO - MATÉRIA PENDENTE DE JULGAMENTO - HABEAS
CORPUS - PROCESSO - SOBRESTAMENTO - LIMINAR. A pendência, no Plenário do Supremo Tribunal Federal, de processo
em que argüida a inconstitucionalidade de norma reveladora da imposição do regime de cumprimento da pena integralmente
fechado - Habeas Corpus nº 82.959-7/SP - conduz ao sobrestamento dos processos sobre idêntico tema e ao deferimento de liminar
que possibilite o afastamento da cláusula limitativa, em relação à qual é alegada a transgressão do princípio constitucional da
individualização da pena - artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal.
HC N. 85.299-RJ
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Crime material contra a ordem tributária (L. 8.137/90, art. 1º, incisos III e IV): lançamento do tributo pendente de
decisão definitiva do processo administrativo: falta de justa causa para a ação penal, suspenso, porém, o curso da prescrição
enquanto obstada a sua propositura pela falta do lançamento definitivo: precedente (HC 81.611, Pertence, Inf. STF 333).
QO EM HC N. 85.374-MS
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
PENA - CUMPRIMENTO - REGIME - PROGRESSÃO - PLENÁRIO - MATÉRIA PENDENTE DE JULGAMENTO - HABEAS
CORPUS - PROCESSO - SOBRESTAMENTO - LIMINAR. A pendência, no Plenário do Supremo Tribunal Federal, de processo
em que argüida a inconstitucionalidade de norma reveladora da imposição do regime de cumprimento da pena integralmente
fechado - Habeas Corpus nº 82.959-7/SP - conduz ao sobrestamento dos processos sobre idêntico tema e ao deferimento de liminar
que possibilite o afastamento da cláusula limitativa, em relação à qual é alegada a transgressão do princípio constitucional da
individualização da pena - artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal.
HC N. 83.115-SP
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: Penal. Processual Penal. Habeas Corpus. Crime de uso de documento falso. Código Penal, art. 304 c/c art. 297,
parágrafo único, e art. 92, I. Lei 8.137/90, art. 2º, I.
I. - Inquérito STJ nº 300: ação penal STJ nº 238/SP: uso de documento falso. Inquérito STJ nº 281: apuração de eventual
enriquecimento ilícito no exercício do cargo.
II. - O documento falso foi apresentado numa investigação que poderia resultar, em tese, em mais de um delito: o delito contra a
ordem tributária e possível ou possíveis delitos decorrentes de enriquecimento ilícito no exercício de cargo público. O pagamento do
tributo não elide o crime de falso, por isso que, da investigação, em que o documento falso teria sido apresentado, poderia originarse outro ou outros delitos, decorrentes de enriquecimento ilícito, que o pagamento do tributo não elidiria.
III. - Prematuro concluir, ademais, no julgamento do habeas corpus, que o crime de falso não pode ser tratado como crime
autônomo.
IV. - Exame de provas: impossibilidade no processo de habeas corpus.
V. - H.C. indeferido.
* noticiado no Informativo 346
HC N. 84.547-MS
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
PRONÚNCIA. ART. 121, §2º, II E IV. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. 1. É certo que a pronúncia, decisão que declara a
viabilidade da acusação, deve, sob pena de nulidade, ser redigida em linguagem sóbria e comedida, evitando a análise valorativa da
prova que possa influenciar o conselho de sentença. No entanto, também padece de nulidade aquela em que se inclui qualificadora
sem a necessária fundamentação. 2. Ordem concedida para anular a sentença de pronúncia, determinando ao juízo de origem que
outra seja prolatada, observando-se as diretrizes apontadas neste acórdão.
HC N. 84.622-SP
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. EXECUÇÃO PENAL. REGIME ABERTO. CONDENAÇÃO SUPERVENIENTE.
REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA. LEP, ART. 111, parágrafo único.
I. - Pretensão inviável do paciente de ver restabelecido o regime aberto, dados a natureza do crime referente à condenação
superveniente, o montante da pena e o regime ali estabelecido.
II. - H.C. indeferido.
HC N. 85.098-RJ
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
COMPETÊNCIA - HABEAS CORPUS - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. A competência do Supremo Tribunal Federal para
apreciar habeas corpus impetrado contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça pressupõe a emissão de entendimento quanto à
causa de pedir veiculada na inicial.
EXECUÇÃO DA PENA - MANDADO DE PRISÃO - TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA RECURSO DA DEFESA - INVIABILIDADE DE AFASTAMENTO DA CLÁUSULA. Constando da sentença a condição de
somente se expedir o mandado de prisão uma vez transitada em julgado, dessa parte não recorrendo o Ministério Público, por sinal
em exemplar homenagem ao princípio da presunção da não-culpabilidade - inciso LVII do artigo 5º da Carta Federal -, mostra-se
conflitante com a ordem jurídico-constitucional, a mais não poder, provimento de órgão revisor pela imediata expedição de tal
documento.
Acórdãos Publicados: 247
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Transferência “Ex Officio” entre Instituições de Ensino e Congeneridade* (Transcrição)
(v. Informativo 374)
ADI 3324/DF**
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
Relatório: Esta ação direta de inconstitucionalidade faz-se dirigida contra o artigo 1º da Lei nº 9.536/97:
Art. 1º A transferência ex officio a que se refere o parágrafo único do art. 49 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de
1996, será efetivada, entre instituições vinculadas a qualquer sistema de ensino, em qualquer época do ano e independente
da existência de vaga, quando se tratar de servidor público federal civil ou militar estudante, ou seu dependente estudante,
se requerida em razão de comprovada remoção ou transferência de ofício, que acarrete mudança de domicílio para o
município onde se situa a instituição recebedora ou para a localidade mais próxima desta.
O artigo 49 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, estabeleceu as diretrizes e bases da educação nacional:
Art. 49. As instituições de educação superior aceitarão a transferência de alunos regulares, para cursos afins, na
hipótese de existência de vagas, e mediante processo seletivo.
Parágrafo único. As transferências ex officio dar-se-ão na forma da lei.
Assevera-se que o preceito encerra a possibilidade de egressos de instituições privadas virem a ser transferidos para
instituições públicas, com ofensa ao disposto nos artigos 5º, cabeça e inciso I; 37, cabeça; 206, inciso I a VII; 207, cabeça; 208,
inciso V, da Constituição Federal.
Eis as razões apresentadas (folha 4):
I - PRINCÍPIO DA ISONOMIA E DA PROPORCIONALIDADE – IGUALDADE DE ACESSO AOS NÍVEIS MAIS
ELEVADOS DE ENSINO – ART. 5º, CAPUT E I; 37, CAPUT; 206, I A VII; 208, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA.
Busca-se demonstrar que o tratamento diferenciado encerra exceção e que há de estar assentado em relação de causa e
efeito bem como na proporcionalidade entre o meio utilizado para a tutela de bem individual ou de grupo e os efeitos da medida,
considerada a coisa pública. Ter-se-ia o menosprezo aos citados princípios. Daí sustentar-se a violência ao princípio da igualdade de
acesso ao ensino, previsto no artigo 206, inciso I, da Constituição Federal, e ao princípio republicano – a coisa pública pertence a
todos –, a desaguar no ingresso mediante o critério meritocrático de seleção, via o vestibular, tal como previsto no inciso V do artigo
206 da Constituição Federal, prevalecendo os princípios da impessoalidade e da moralidade, consagrados no artigo 37 do citado
diploma. Reconhece-se a freqüência, no caso dos militares, das transferências, em vista da própria carreira, mostrando-se, portanto,
aceitável o direito, alcançados os dependentes estudantes, à viabilização da continuidade dos estudos, objetivo maior almejado.
Refuta-se a possibilidade de, a partir desse enfoque, chegar-se à transferência de um estabelecimento privado de ensino para uma
instituição pública. Evoca-se artigo de ex-Presidente da Corte, ministro Maurício Corrêa, no jornal Correio Braziliense, de 4 de
outubro de 2004, sobre a questão, publicado com título sugestivo – “Apelo ao Bom Senso”, segundo o qual a transferência que se
pretende glosada extravasa o propósito de assegurar a educação do servidor. Faltaria correlação lógica entre meio e fim, ficando
configurada a transgressão do artigo 5º, cabeça e inciso I, e 206, inciso I, da Constituição Federal, implicando o artigo 1º da Lei nº
9.536/97 desrespeito ao princípio da proporcionalidade, com privilégio para determinado grupo social. Absorvidas as vagas
existentes, restaria afastada a possibilidade de ingresso do conjunto social, em benefício de alguns poucos. Então, diz-se
obstaculizado o acesso da sociedade à educação.
Diante das limitações do Estado na promoção do ensino público, argumenta-se que há de prevalecer o critério da seleção,
concorrendo os candidatos, no vestibular, às vagas existentes. O grande número de instituições privadas estaria a revelar via mais
larga de acesso em contraposição às dificuldades do setor público, a tornar menor a entrada nas faculdades públicas. Assim, o
ingresso do militar oriundo do estabelecimento particular de ensino superior em instituição de natureza pública acabaria por burlar a
igualdade consagrada na Constituição Federal, violando o artigo 208, inciso V, nela contido, presente a ênfase, no acesso aos níveis
mais elevados do ensino, da capacidade de cada um. Conclui-se pela necessidade de o artigo 1º da Lei nº 9.536/97 ser interpretado
de forma harmônica com os mandamentos constitucionais, colando-se, para a transferência de ofício, o critério da congeneridade.
Evoca-se o artigo 99 da Lei nº 8.112/90, no que, relativamente ao servidores civis, prevê a matrícula em instituição congênere –
artigo 99. A existência de regime jurídico próprio aos militares não consubstanciaria, consoante as razões expendidas, fator
suficiente a respaldar o tratamento diferenciado. Cita-se a análise de Jorge Miranda à norma do artigo 13 da Carta da República de
Portugal, salientando-se o destaque dado à capacidade própria de cada indivíduo bem como à preservação da qualidade do ensino.
II - PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA – VIOLAÇÃO AO ARTIGO 207 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
De acordo com a inicial, o princípio repousaria na liberdade de convicção e expressão, afastando-se ingerências e
assegurando-se a liberdade. Por isso, assevera-se que as restrições decorrentes da lei deveriam estar lastreadas no princípio da
proporcionalidade, utilizando-se os meios menos gravosos para a realização do fim buscado. A transferência de instituição privada
para a pública estaria a desatender a esse princípio. Daí a vulneração ao artigo 207 da Carta Federal. Esclarece-se que, ante
divergência entre as consultorias jurídicas do Ministério da Defesa e do Ministério da Educação, a Advocacia-Geral da União veio a
emitir parecer – AGU/RA-02/2004 – que ficou assim sintetizado (folha 84):
I – O servidor militar transferido ex officio, bem como seus dependentes, têm direito à matrícula em estabelecimento
de ensino superior público, mesmo na hipótese de ter ingressado originariamente em faculdade particular, ainda que no
novo domicílio exista instituição de ensino privado.
II – O servidor militar e seus dependentes estão sujeitos exclusivamente à disciplina da Lei nº 9.536, de 11 de
dezembro de 1997, a qual não faz referência ao termo “congênere”.
III – O termo “congênere”, previsto no art. 99 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, não deve ser aplicado nas
hipóteses em que o servidor militar é transferido, consoante a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça.
Sob o ângulo da concessão da medida acauteladora, assevera-se a relevância do tema e o risco de manter-se com plena
eficácia o quadro. O processo seletivo de alunos para as universidades federais já estaria em andamento, podendo vir a ser
prejudicado. Alude-se ao exemplo verificado na Universidade de Brasília - UnB, no que suspenso o vestibular para o curso de
Direito e sinalizada a adoção de idêntica medida relativamente aos cursos de Administração e Medicina. Afirma-se que no curso de
Direito, apenas em 2004, setenta e nove alunos ingressaram por transferência obrigatória, cinqüenta deles originários de instituições
particulares. Em 2003, o saldo fora de cento e onze estudantes militares transferidos, conforme notícia do Decanato de Ensino de
Graduação da UnB, havendo sido oferecidas apenas cinqüenta vagas para cada vestibular, configurando-se, como regra, o ingresso
de estudantes por transferência e, como exceção, a entrada mediante vestibular; o privilégio tornara-se regra e o mérito, a exceção.
Alega-se que as universidades públicas estão compelidas a observar o parecer da Advocacia-Geral da União, por força do artigo 40,
§ 1º, da Lei Complementar nº 73/93.
O item concernente ao pleito final mereceu desmembramento, formulando-se pedidos sucessivos. Na hipótese de não se
decidir pela interpretação conforme a Constituição do artigo 1º da Lei nº 9.536/97, adotando-se a óptica da transferência segundo a
espécie de instituição na origem, requer-se seja declarada a inconstitucionalidade do teor do artigo – folha 2 a 28. À inicial
juntaram-se os documentos de folha 29 a 122.
À folha 125, prolatei decisão, acionando a norma do artigo 12 da Lei nº 9.868/99, isso em 11 de outubro de 2004.
As informações do Presidente da República estão calcadas em pronunciamento do Consultor-Geral da União, doutor
Manuel Lauro Volkmer de Castilho, que, por sua vez, reporta-se à manifestação da Advocacia-Geral da União. Argúi-se a
impossibilidade jurídica do pedido. O Procurador-Geral da República não teria demonstrado divergência na interpretação do artigo
1º da Lei nº 9.356/97, formulando pleito que, a rigor, estaria voltado à declaração de constitucionalidade do texto. Indispensável
seria atentar para o disposto nos artigos 13 e seguintes, especialmente o 14 da Lei nº 9.868, de 1999. Em última análise, o pedido
alcançaria a introdução, no texto, de restrição não prevista, descabendo ao Supremo atuar como legislador ativo. Assevera-se, então,
que “a interpretação pretendida pelo autor incorre em dois equívocos, pois, a um só tempo, afasta a lei posterior (Lei nº 9.356/97),
que resumidamente revogou a lei anterior (Lei nº 8.112/90), porque com ela é incompatível, e propõe interpretação da lei posterior
com a restrição da lei anterior, o que se revela inteiramente inadequado. A garantia contida no artigo 1º da Lei nº 9.536/97 de
transferência independentemente de vagas preserva aquelas destinadas ao vestibular” – folha 132 a 189.
Ao processo veio a informação do Legislativo – folha 191 a 200. Sob o ângulo da concessão de medida acauteladora,
argumenta-se com a falta de urgência e do bom direito. Consoante as razões expendidas, não se tem, no texto atacado, o
estabelecimento de privilégio, a revelar o favorecimento com um sistema de ensino gratuito quando, na origem, fora obtido o direito
ao ensino pago. Assevera-se que a interpretação conforme pretendida resulta na inobservância da separação dos Poderes.
À folha 202 à 214, está a manifestação do Advogado-Geral da União, segundo a qual o pedido não encontra amparo no
direito em vigor. Assevera-se que somente poderia ser veiculado caso acionado o antigo instituto da representação interpretativa,
abolido pela Carta de 1988. Evoca-se o que externado pelo ministro Moreira Alves na Representação nº 1.417/DF. Aduz-se que os
limites da interpretação conforme à Constituição inviabilizam o julgamento do pleito formalizado. A impossibilidade jurídica
adviria de se pretender interpretação que estaria a contrariar o entendimento comum sobre o alcance do texto. Quanto ao segundo
pedido, formulado para o caso de não se acolher o de interpretação conforme a Carta, aponta-se a inconveniência de desaguar em
vácuo legislativo. Evoca-se o que decidido no Recurso Extraordinário nº 174.516/SP, relatado pelo ministro Carlos Velloso, que lhe
negou seguimento, ante a preservação dos princípios da isonomia e da autonomia universitária. No precedente, teria sido discutida a
possibilidade de transferência de alunos e a preservação da autonomia universitária. No Recurso Extraordinário nº 134.795-3/DF,
por mim relatado, mais uma vez fora proclamado que a transferência de alunos não conflitaria com a autonomia universitária.
Busca-se apoio no inciso X do § 3º do artigo 142 da Constituição Federal, no que remete à lei a consideração de situações especiais
dos militares. Transcreve-se parte da Exposição de Motivos nº 152, de 25 de março de 1996, relativa à Emenda nº 18, de 5 de
fevereiro de 1998. A lei atacada não disciplinaria o acesso, em si, ao ensino superior, cuidando apenas de transferência entre
instituições.
O Procurador-Geral da República emitiu o parecer de folha 224 a 248, pela procedência do pedido, ficando a peça assim
sintetizada:
Ação direta de inconstitucionalidade contra o art. 1º da Lei nº 9.536/97, que dispõe sobre transferências de
estudantes entre instituições de ensino superior.
Preliminar. Possibilidade jurídica do pedido.
Interpretação conforme à Constituição.
Mérito. Princípios da igualdade, proporcionalidade e autonomia universitária. A realidade do processo de
transferências nas universidades. Cláusula da reserva do possível.
Necessidade de se dar à norma impugnada interpretação conforme à Constituição para que as transferências
obedeçam à regra da congeneridade dos estabelecimentos de ensino.
Esclareço que, antes desse pronunciamento, despachei, atendendo a pedido formulado pelo Fiscal da Lei no sentido de se
afastar o julgamento final, examinando-se o pleito de concessão de medida acauteladora – folha 282.
O Presidente da República, representado pelo Advogado-Geral da União, voltou a peticionar, ressaltando, quanto ao
julgamento da medida liminar, não se encontrarem presentes os pressupostos que lhe são próprios, evocando-se os dois precedentes
citados – Recurso Extraordinário nº 174.516/SP e Recurso Extraordinário nº 134.795-3/DF – e a jurisprudência sobre a importância
da data da edição do ato impugnado. A Lei nº 9.536/97 teria alcançado aperfeiçoamento em 11 de dezembro de 1997.
O processo veio-me concluso em 1º de dezembro de 2004, e, em 6 imediato, lancei visto, indicando a inclusão em pauta
para julgamento definitivo do pedido.
Voto: Afasto a impossibilidade jurídica aventada. O Direito conta com instrumentos, expressões e vocábulos com sentido próprio,
não cabendo a mesclagem, quando esta se faz a ponto de ensejar regime diverso, construção que não se afina com o arcabouço
normativo. Há de se distinguir a ação direta de inconstitucionalidade da ação declaratória de constitucionalidade. São irmãs, cujo
alcance é chegar-se à conclusão quer sobre o vício, quer sobre a harmonia do texto em questão com a Carta da República. O que as
difere é o pedido formulado. Na ação direta de inconstitucionalidade, requer-se o reconhecimento do conflito do ato atacado com a
Constituição Federal, enquanto, na declaratória de constitucionalidade, busca-se ver proclamada a harmonia. A nomenclatura de
cada qual das ações evidencia tal diferença.
Pois bem, os artigos 13 e seguintes e, como dito, especialmente o 14, todos da Lei nº 9.868/99, cuidam da ação
declaratória de constitucionalidade, e o pedido formulado neste processo não a revela. A ambigüidade que pode suscitar o pleito de
julgamento visando à interpretação conforme a Carta longe fica de implicar a confusão. Se julgado procedente, chega-se, sem
redução do texto, ao afastamento de regência tida por inconstitucional e esta é, justamente, de acordo com a peça inicial, a de
viabilização, pelo artigo 1º da Lei nº 9.536/97, de transferência de instituição particular para pública. O que se busca ver assentado é
que, à luz dos textos constitucionais aludidos, a cláusula “... entre instituições vinculadas a qualquer sistema de ensino...” não
alberga a transferência sem a observância necessária do caráter privado ou público das instituições envolvidas. Rejeito a preliminar
evocada.
Antes de adentrar o exame de fundo, esclareço que os precedentes evocados e referidos no relatório não têm a
especificidade que os tornaria afinados com a matéria em discussão neste processo. Tanto o de minha lavra, quanto o da relatoria do
ministro Carlos Velloso, ambos formalizados em processos subjetivos e não objetivos, longe ficaram de envolver a matrícula em
instituição pública quando, na origem, integrado o servidor ou o dependente em estabelecimento particular. Sob o ângulo da
dualidade de regência, considerado o artigo 99 da Lei nº 8.112/90 e o artigo 1º da Lei nº 9.536/97, afasto a conclusão sobre a
revogação do primeiro diploma. As leis cuidam de temas diversos, ou seja, a 8.112/90, da transferência de servidor civil, e a
9.536/97, de servidor militar.
Realmente, o princípio da isonomia não encerra identidade absoluta, deixando de prevalecer se razoável o fator de
discriminação. Então é dado encontrar o ponto em comum da normatização, no tocante a servidores públicos civis e servidores
públicos militares, isto é, a transferência do local de trabalho. O artigo 99 da Lei nº 8.112/90 e o 1º da Lei nº 9.536/97 repousam em
razão de ser única - a conveniência e, diria mesmo, a necessidade de ato da Administração Pública, de ato de interesse do Estado,
não resultar em prejuízo na área sensível que é a da educação. A nova matrícula do servidor ou do dependente, seja ele civil ou
militar, é, social e constitucionalmente, aceitável, preservando-se a situação existente e, com isso, eliminando-se o prejuízo, no que
buscado aperfeiçoamento que, em última análise, reverte em benefício da administração pública, alfim da própria sociedade. É dado
assentar uma premissa: mostra-se em harmonia com a Carta da República texto que assegure a matrícula em instituição de ensino no
local de destino, evitando-se o dano que adviria do fato de a Administração Pública haver exigido a prestação de serviços, o
trabalho, em outra localidade.
O teor do artigo 1º da Lei nº 9.536, de 11 de dezembro de 1997, presente a referência a instituições vinculadas a qualquer
sistema de ensino, viabiliza entendimentos diversos. A Advocacia-Geral da União, no Parecer RA–02/2004, concluiu estar
contemplada a transferência de instituição particular para pública. Sob essa óptica, surge o conflito do texto em exame com a Lei
Máxima, tendo em vista valores maiores nesta previstos. O trato dos efeitos da transferência no campo da educação afigura-se
desigual, favorecendo servidores militares em detrimento do grande todo, ou seja, do acesso à universidade pelo critério que norteia
a realização do vestibular. É sabido que este, em instituição privada, não apresenta as mesmas dificuldades notadas no ingresso em
instituição pública. Pois bem, abandonando-se a relação de causalidade própria aos diplomas legais, ter-se-á que, a persistir o artigo
1º da Lei nº 9.536/97, na óptica da Advocacia-Geral da União, o ato de transferência do servidor resultará em vantagem que não
encontra justificativa, fugindo à simples razão de ser do texto - preservar a continuidade dos estudos. A matrícula logicamente
sempre será pretendida na instituição pública, levando em conta não só a envergadura do ensino, como a própria gratuidade,
absorvendo-se vagas que devem e precisam, de acordo com a Constituição Federal, ser oferecidas, presente o mérito dos candidatos,
a toda a sociedade, viabilizando-se a participação igualitária em disputa que hoje é acirrada, ante a situação precária do ensino
público, notada a flagrante escassez de vagas oferecidas.
Sim, é consentânea com a Carta da República previsão normativa asseguradora, ao militar e ao dependente estudante, do
acesso a instituição de ensino na localidade para onde é removido. Todavia, a transferência do local do serviço não pode se mostrar
verdadeiro mecanismo para lograr-se a transposição da seara particular para a pública, sob pena de se colocar em plano secundário a
isonomia – artigo 5º, cabeça e inciso I -, a impessoalidade, a moralidade na Administração Pública, a igualdade de condições para o
acesso e permanência na escola superior, prevista no inciso I do artigo 206, bem como a viabilidade de chegar-se a níveis mais
elevados do ensino, no que o inciso V do artigo 208 vincula o fenômeno à capacidade de cada qual. Há mais. Sobressai a
contrariedade ao princípio isonômico, no que vieram a ser tratados, de forma desigual, civis e militares, sem que o fator de
discriminação mereça agasalho. Enquanto, à luz do artigo 99 da Lei nº 8.112/90, a transferência de civis há de observar a similitude,
a igualdade de situações, procedendo-se à matrícula em instituição congênere àquela de origem, os servidores militares têm algo que
não lhes homenageia a postura elogiável notada na defesa do respeito a prerrogativas e direitos, ou seja, contam com verdadeiro
plus, que é a passagem automática, em virtude da transferência, de uma situação onerosa e que veio a ser alcançada ante parâmetros
singulares, para a reveladora de maior vantagem, presentes a gratuidade e a envergadura do ensino. Considerada a autonomia
universitária, tomada em sentido maior, admite-se, é certo, a adequação do princípio da legalidade, a submissão à lei, mas
indispensável é que se tenha disciplina calcada na proporcionalidade.
Quanto aos pedidos sucessivos, e não alternativos, já que não cabe a terceiro a escolha do cumprimento do que vier a ser
decidido, acolho o que se mostrou, ao requerente, ao Procurador-Geral da República, de maior importância e que, portanto, foi
formalizado em primeiro lugar. Julgo-o procedente para, sem redução do texto do artigo 1º da Lei nº 9.536, de 11 de dezembro de
1997, assentar-lhe a inconstitucionalidade, no que se lhe empreste o alcance de permitir a mudança, nele disciplinada, de instituição
particular para pública, encerrando a cláusula “entre instituições vinculadas a qualquer sistema de ensino” a observância da natureza
privada ou pública daquela de origem, viabilizada a matrícula na congênere. Em síntese, dar-se-á a matrícula, segundo o artigo 1º da
Lei nº 9.536/97, em instituição privada, se assim o for a de origem, e em pública, caso o servidor ou dependente for egresso de
instituição pública.
* texto sem revisão final
** acórdão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 381
Brasília, 21 de março a 1º de abril de 2005 Nº 381
Data (páginas internas): 6 de abril de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
ADI e Medida Provisória 144/2003 - 8
FGTS: Termo de Adesão e Ato Jurídico Perfeito
Extinção de Punibilidade: Estupro de Vítima Menor de 14 Anos e União Estável
1ª Turma
Assistência Judiciária e Intimação Pessoal
Unicidade Sindical e Especialização de Atividades
Poder Investigativo do MP: Nova Denúncia e Vício de Origem - 3
Prisão Preventiva e Fundamentação - 2
Revogação de Competência e Art. 25 do ADCT
2ª Turma
Lei 10.409/2002: Inobservância do Rito e Prejuízo
Opção de Nacionalidade e Requisitos
Aumento da Despesa e Agravamento do Estado de Inconstitucionalidade
Administração Municipal e Publicidade de Bebidas Alcoólicas ou de Cigarros
Transcrições
Direito Tributário. Sanções Políticas. Inadmissibilidade. Restrição indevida à liberdade de
empresa ou de profissão (RE 374981/RS)
PLENÁRIO
ADI e Medida Provisória 144/2003 - 8
O Tribunal retomou julgamento de medidas cautelares requeridas em duas ações diretas ajuizadas
pelo Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB e pelo Partido da Frente Liberal - PFL contra a
Medida Provisória 144/2003, que dispõe sobre a comercialização de energia elétrica, altera as Leis
5.655/71, 8.631/93, 9.074/95, 9.427/96, 9.478/97, 9.648/98, 9.991/2000, 10.438/2002, e dá outras
providências — v. Informativos 335 e 355. O Min. Gilmar Mendes aditou seu voto, ratificando o
entendimento quanto à plausibilidade do direito invocado quanto ao art. 246, da CF, e concedeu a liminar
para dar interpretação conforme a Constituição para considerar inaplicável não só a medida provisória
como a lei de conversão a qualquer atividade relacionada à exploração do potencial hidráulico para fins
de produção de energia, no que foi acompanhado pelo Min. Sepúlveda Pertence. Em seguida, o Min. Eros
Grau divergiu, votando no sentido afastar a alegada afronta ao art. 246 da CF, por entender que a EC 6/95
não promoveu alteração substancial na moldura do setor elétrico, mas restringiu-se a, em razão da
revogação do art. 171 da CF, substituir a expressão “empresa brasileira de capital nacional” pela
expressão “empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no país” no
§ 1º do art. 176. Considerou, ademais, que a medida provisória em questão não se volta a dar eficácia a
inovação introduzida pela EC 6/95, eis que versa sobre a matéria que trata o art. 175 da CF, qual seja, o
regime de prestação de serviços públicos no setor elétrico. O Min. Eros Grau asseverou, por fim, que
eventual vício formal teria o condão exclusivamente de comprometer a medida provisória, não
contaminando os efeitos prospectivos da lei de conversão. Acompanharam a dissidência quanto ao ponto
concernente à não aplicação do art. 246 à espécie os Ministros Joaquim Barbosa, Carlos Britto, Cezar
Peluso e Nelson Jobim, Presidente. Após, pediu vista dos autos a Min. Ellen Gracie.
ADI 3090 MC/DF e ADI 3100 MC/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 30.3.2005. (ADI-3090) (ADI3100)
FGTS: Termo de Adesão e Ato Jurídico Perfeito
O Tribunal, por maioria, deu provimento a recurso extraordinário interposto pela Caixa Econômica
Federal contra decisão de juiz relator da 1ª Turma dos Juizados Especiais Federais da Seção Judiciária do
Rio de Janeiro que, recebendo agravo regimental como embargos de declaração, negara seguimento ao
recurso, com base no Enunciado 26 das Turmas Recursais dos Juizados Especiais daquela Seção
Judiciária (“Decisão monocrática proferida pelo relator não desafia recurso à Turma Recursal”). A
decisão recorrida mantivera sentença que afastara o acordo firmado entre as partes por meio do termo de
adesão a que alude a LC 110/2001 e condenara a CEF ao pagamento referente às diferenças decorrentes
da aplicação dos índices expurgados das contas vinculadas de FGTS, fundando-se no Enunciado 21 das
referidas Turmas Recursais [“O trabalhador faz jus ao crédito integral, sem parcelamento, e ao
levantamento, nos casos previstos em lei, das verbas relativas aos expurgos de índices inflacionários de
janeiro de 1989 (42,72%) e abril de 1990 (44,80%) sobre os saldos das contas de FGTS, ainda que tenha
aderido ao acordo previsto na Lei Complementar n. 110/2001, deduzidas as parcelas porventura já
recebidas.”]. Preliminarmente, conheceu-se do recurso para efeitos diversos, sem anular a decisão
recorrida, afastando-se o alegado vício de procedimento, concernente à aplicação do citado Enunciado 26,
haja vista tanto a relevância jurídica da matéria de fundo quanto a informação prestada pela Presidente
das Turmas Recursais no sentido de que, desde janeiro de 2004, os julgamentos dos relatores em questões
sumuladas estariam sendo submetidas ao referendo do colegiado, o que não teria alcançado, entretanto, o
presente feito. Vencidos, no ponto, os Ministros Sepúlveda Pertence, Carlos Britto e Marco Aurélio, que,
por entender inexistir possibilidade de haver outra via apta a corrigir o relator que assim processa o
agravo regimental, violando a colegialidade da turma recursal prevista no art. 98, I, da CF, conheciam do
recurso para que o referido agravo fosse processado e julgado na origem. No mérito, considerou-se
caracterizada a afronta à cláusula de proteção ao ato jurídico perfeito (CF, art. 5º, XXXVI). Salientou-se
ser incabível a proclamação em abstrato, por meio da aplicação do Enunciado 21, do apontado vício de
consentimento, bem como não se ter vislumbrado cabimento na desconstituição do acordo em face de
eventual desrespeito a normas do CDC, tendo em conta entendimento do STF de que o FGTS tem
natureza estatutária e não contratual, devendo, assim, ser por lei regulado. Ressaltou-se, por fim, a
natureza constitucional da controvérsia, porquanto o afastamento geral dos acordos firmados com base na
LC 110/2001 implicaria o total esvaziamento dos preceitos encerrados nos seus artigos 4º, 5º e 6º, que
disciplinam os termos e condições do ajuste, o que equivaleria a uma declaração de inconstitucionalidade.
Vencido o Min. Carlos Britto, que negava provimento ao recurso.
RE 418918/RJ, rel. Min. Ellen Gracie, 30.3.2005. (RE-418918)
Extinção de Punibilidade: Estupro de Vítima Menor de 14 Anos e União Estável
O Plenário iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se discute a possibilidade de se
aplicar a regra prevista no inciso VII do art. 107 do CP em favor de condenado por estupro, que passou a
viver em união estável com a vítima, menor de 14 anos, e o filho, fruto da relação. O Min. Marco Aurélio,
relator, deu provimento ao recurso para declarar a extinção da punibilidade. Salientando a necessidade de
se analisar o caso pautando-se pela prudência, e levando-se em conta o confronto dos valores relativos à
preservação dos costumes e à integridade e sobrevivência de uma família, as mudanças verificadas entre o
contexto social da época em que editada a referida norma penal — cujo objetivo seria o de proteger não o
agente em si, mas a família surgida — e o atual, e ainda a repercussão negativa da condenação na vida do
filho do casal, entendeu que deveria ser aplicada ao caso, por analogia, a referida causa extintiva de
punibilidade, ante a regra do § 3º do art. 226 da CF, que confere proteção do Estado à união estável entre
homem e mulher, reconhecendo-a como entidade familiar. Em divergência, o Min. Joaquim Barbosa,
acompanhado pelos Ministros Eros Grau e Cezar Peluso, negou provimento ao recurso, sob o fundamento
de que somente o casamento teria o condão de extinguir a punibilidade, ressaltando, ademais, as
circunstâncias terríveis em que ocorrido o crime, bem como o advento da Lei 11.106/2005, que revogou
os incisos VII e VIII do art. 107 do CP. Após, o julgamento foi suspenso com o pedido de vista do Min.
Gilmar Mendes (CP: “Art. 107. Extingue-se a punibilidade:... VII – Pelo casamento do agente com a
vítima, nos crimes contra os costumes...”).
RE 418376/MS, rel. Min. Marco Aurélio, 31.3.2005. (RE-418376)
PRIMEIRA TURMA
Assistência Judiciária e Intimação Pessoal
A Turma iniciou julgamento de questão de ordem em habeas corpus na qual se discute quem deve
ser pessoalmente intimado de julgamento, realizado perante o STF, de recurso interposto por defensor
público estadual: este ou a Defensoria Pública da União. No caso concreto, não obstante a expedição, pela
Secretaria deste Tribunal, de mandado de intimação dirigido ao Defensor Público Geral da União, dandolhe ciência do acórdão que indeferira o writ, a Procuradoria de Assistência Judiciária do Estado de São
Paulo solicitara que a citada intimação fosse feita à representante daquele órgão em Brasília, com a
restituição do prazo recursal. O Min. Carlos Britto, relator, proferiu voto no sentido de indeferir a petição
da impetrante, no que foi acompanhado pelo Min. Cezar Peluso. Asseverou estar correto o procedimento
realizado pela Secretaria, tendo em conta que amparado em decisão da Presidência do STF no Processo
Administrativo 317.732 (de 12.11.2003) e na petição avulsa no AI 503261/AM (DJU de 27.10.2004).
Ademais, considerou que a atuação da Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo, no exercício da
assistência judiciária, só se justificaria na ausência do órgão constitucional incumbido da defesa dos
necessitados, qual seja, a Defensoria Pública da União (LC 80/94, arts. 22 e 23), que já se encontra
organizada e desempenhando regularmente suas atividades. Assim, faltaria a tal Procuradoria amparo
legal para atuação no STF, em sede recursal. Em divergência, o Min. Marco Aurélio, salientando a
possibilidade de a defensoria estadual impetrar habeas corpus e fazer sustentação oral nesta Corte, deferiu
a petição, por entender que o procurador do Estado que está atuando no processo deve ser intimado
pessoalmente da decisão. Após, pediu vista dos autos o Min. Sepúlveda Pertence.
HC 83523 QO/SP, rel. Min. Carlos Britto, 22.3.2005. (HC-83523)
Unicidade Sindical e Especialização de Atividades
É possível o desmembramento de sindicato a partir da especialização de atividades ou profissões
representadas, observado o princípio da unicidade sindical (CF, art. 8º, II). Com esse entendimento, a
Turma negou provimento a recurso ordinário em mandado de segurança interposto pelo Sindicato dos
Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo, em que se pretendia a nulidade da concessão de
registro, pelo Ministério do Trabalho, a novos sindicatos relacionados a estabelecimentos de educação no
Município de São Paulo, sob a alegação de ofensa ao princípio da unicidade sindical. Asseverou-se que a
Constituição veda a duplicidade sindical na mesma base territorial correspondente à área de atuação do
município e que, na espécie, os segmentos do sindicato recorrente apenas desmembraram-se em
sindicatos específicos, conforme o grau de ensino. Salientou-se, ainda, a inviabilidade da análise, em
mandado de segurança, da representatividade do recorrente quanto à sobreposição de sindicatos na base
territorial do município, ressalvada a via ordinária.
RMS 24069/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 22.3.2005. (RMS-24069)
Poder Investigativo do MP: Nova Denúncia e Vício de Origem - 3
Concluindo julgamento, a Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus em que
se pretendia a suspensão de feito até que a questão relativa à competência investigativa realizada pelo
Ministério Público seja apreciada pelo Plenário do STF — v. Informativos 367 e 379. Entendeu-se que,
independentemente da controvérsia acerca do embasamento ou não da nova denúncia nos dados colhidos
em CPI, a notícia de uma nova peça acusatória, sequer apreciada, faria desaparecer qualquer resquício de
constrangimento ilegal, originalmente alegado. Assim, considerou-se que, pendente de exame a segunda
denúncia pelas instâncias ordinárias, não seria possível ao STF antecipar-se ao juízo de sua validade, sob
pena de supressão de instância.
RHC 84404/SP, rel. Min. Carlos Britto, 29.3.2005. (RHC-84404)
Prisão Preventiva e Fundamentação - 2
A Turma, por maioria, indeferiu liminar em habeas corpus, em que se pretende seja expedido alvará
de soltura em favor de acusado pela suposta prática dos crimes de corrupção ativa (CP, art. 333) e de
impedir ou tentar impedir o livre exercício das atribuições de membro de CPI (Lei 1.579/52, art. 4º, I,
parte final) — v. Informativo 380. Entendeu-se que o decreto de prisão preventiva encontra-se
devidamente fundamentado na garantia da ordem pública. Os Ministros Cezar Peluso e Sepúlveda
Pertence acompanharam o voto do Min. Carlos Britto somente quanto ao fundamento da necessidade da
prisão preventiva para garantir a instrução processual, já que o réu poderia, se solto, utilizar seu poder
econômico para práticas ilícitas. Vencido o Min. Marco Aurélio, relator, que deferia a liminar.
HC 85298 QO/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ acórdão Min. Carlos Britto, 29.3.2005.
(HC-85298)
Revogação de Competência e Art. 25 do ADCT
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário, interposto por instituição financeira, em que
se pretende a desconstituição de acórdão que, embora reconhecendo não ser auto-aplicável o § 3º do art
192 da CF, determinara a redução de juros ao montante 12% consoante o disposto no Decreto 22.626/33,
por entender revogada, pelo art. 25 do ADCT, a Lei 4.595/64, na parte em que outorga poderes ao
Conselho Monetário Nacional para dispor sobre as taxas de juros bancários, razão pela qual o
mencionado decreto teria voltado a viger em sua integralidade (ADCT, art. 25, caput: “Ficam revogados,
a partir de cento e oitenta dias da promulgação da Constituição, sujeito este prazo a prorrogação por
lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo competência
assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional...”). O Min. Sepúlveda Pertence, relator, deu
provimento ao recurso para determinar que o Tribunal a quo reaprecie a demanda, tendo em conta o
disposto na Lei 4.595/64. Entendeu não haver que se falar em revogação desta lei, haja vista que,
conforme se depreende da redação do art. 25 do ADCT, o objeto da revogação, quando ultrapassado o
prazo de 180 dias da promulgação da CF, é a competência atribuída ou delegada a órgão do Poder
Executivo pela legislação pré-constitucional (quando se tratar de matéria incluída na competência do
Congresso Nacional), e não as normas editadas quando vigente a delegação. Salientou que, no julgamento
da ADI 4/DF (DJU de 25.6.93), o Tribunal declarou constitucionais o parecer do Consultor Geral da
República e a circular do Banco Central que, respectivamente, considerou não auto-aplicável o § 3º do
art. 192 da CF, e determinou a observância da legislação anterior à Carta Federal, até o advento da lei
complementar reguladora do Sistema Financeiro Nacional. Concluiu que as normas objeto dessa ação são
válidas, já que editadas dentro do prazo previsto na norma transitória, quando o Poder Executivo possuía
competência para dispor sobre instituições financeiras e suas operações, sendo indiferente, para sua
observância, ter ou não havido a prorrogação prevista no art. 25 do ADCT. Acompanharam o voto os
Ministros Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Após, pediu vista o Min. Marco Aurélio.
RE 286963/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 29.3.2005. (RE-286963)
SEGUNDA TURMA
Lei 10.409/2002: Inobservância do Rito e Prejuízo
A ausência de demonstração de prejuízo, por parte da defesa, decorrente da inobservância do rito
previsto no art. 38 da Lei 10.409/2002, impede a declaração de nulidade do processo. Com base nesse
entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática do crime
previsto no art. 12, caput, c/c art. 18, IV da Lei 6.368/76, em que se pretendia a nulidade do processo,
desde o recebimento da denúncia, em razão do não atendimento do referido procedimento legal [Lei
10.409/2002: “Art. 38. Oferecida a denúncia, o juiz, em 24 (vinte e quatro) horas, ordenará a citação do
acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias...”]. Entendeu-se que a
possibilidade, prevista na lei, de apresentação de defesa antes do recebimento da denúncia, permite a
invocação de questões pertinentes aos arts. 41 e 43 do CPP, com o objetivo de convencer o julgador a
rejeitar a inicial acusatória e que, na espécie, toda a matéria que se pretendia alegar na defesa preliminar
fora efetivamente deduzida em outros momentos processuais (defesa prévia e alegações finais), não tendo
a mesma o condão de demonstrar a nulidade da ação. Ademais, considerou-se que a denúncia teria
preenchido os requisitos exigidos pelo art. 41 do CPP, não havendo que se falar nem em ausência de justa
causa, nem em prejuízo que poderia advir de eventual desclassificação do delito, já que réu defende-se
dos fatos e não da capitulação constante da denúncia.
HC 85155/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 22.3.2005. (HC-85155)
Opção de Nacionalidade e Requisitos
A opção pela nacionalidade, prevista no art. 12, I, c, da CF/88 (alterado pela ECR 3/94), tem caráter
personalíssimo, somente podendo ser manifestada depois de alcançada a capacidade plena, não suprida
pela representação dos pais. Assim, atingida a maioridade civil, enquanto não manifestada a opção, esta
passa a constituir-se em condição suspensiva da nacionalidade brasileira. Essa foi a orientação adotada
pela Turma para negar provimento a recurso extraordinário, em que se pretendia a concessão da
nacionalidade brasileira a menores impúberes, sob a alegação de que o referido dispositivo constitucional
não exige que o interessado atinja a maioridade para que possa exercitar a opção (CF/88: “Art 12. São
brasileiros: I – natos:... c) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que
venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade
brasileira;”). Precedente citado: AC 70 QO/RS (DJU de 8.10.2003).
RE 418096/RS, rel. Min. Carlos Velloso, 22.3.2005. (RE-418096)
Aumento da Despesa e Agravamento do Estado de Inconstitucionalidade
A Turma negou provimento a recurso extraordinário em que o recorrente, ocupante de cargo em
comissão, pretendia receber complementação dos proventos de sua aposentadoria, correspondente à
diferença entre o que percebe do INSS e os vencimentos do cargo no qual se aposentara. Sustentava o
recorrente que a Lei 2.241/89, do Município de Mauá, que acrescentou o parágrafo único do art. 147 da
Lei 1.046/68, e instituiu limite de tempo para a concessão desse benefício, seria inconstitucional, já que
sofrera emenda na Câmara dos Vereadores, a qual, alterando a redação original do projeto enviado pelo
Prefeito, reduzira de 15 para 12 anos o aludido limite temporal, o que seria vedado por se tratar de matéria
de iniciativa do Poder Executivo, qual seja, regime jurídico do servidor público. Rejeitou-se a alegação de
inconstitucionalidade formal do dispositivo, haja vista entendimento do STF no sentido de ser permitido a
parlamentares apresentarem emendas a projeto de iniciativa privativa do Executivo, desde de que tais
modificações não inovem o tema veiculado no projeto remetido e tampouco acarretem aumento de
despesas, em obediência ao disposto no art. 63, I, da CF. Entendeu-se, ainda, que o aumento de despesa
não poderia ser invocado para a declaração pretendida, porquanto, se o mencionado artigo fosse retirado
do mundo jurídico, desapareceria qualquer exigência de tempo mínimo para a aquisição do benefício
pleiteado, o que ensejaria dano muito maior às finanças municipais, agravando o estado de
inconstitucionalidade. Por fim, asseverou-se que o recorrente não atingira o tempo mínimo necessário a
fazer jus à aposentadoria com proventos integrais, nos termos do dispositivo impugnado.
RE 274383/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 29.3.2005. (RE-274383)
Administração Municipal e Publicidade de Bebidas Alcoólicas ou de Cigarros
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto pelo Presidente da Câmara
Municipal de São Paulo e pela Câmara Municipal de São Paulo contra acórdão do tribunal de justiça do
mesmo Estado que, em sede de ação direta de inconstitucionalidade, julgara inconstitucional lei municipal
que proibira a realização de eventos patrocinados por empresas distribuidoras de bebidas alcoólicas ou de
cigarros em propriedades municipais (Lei 12.643/98). A Min. Ellen Gracie, relatora, negou provimento ao
recurso por considerar que o acórdão recorrido não viola os dispositivos questionados. Preliminarmente,
asseverou que a discussão acerca da nulidade do julgamento da instância de origem, por suposta
deficiência de motivação, é matéria infraconstitucional, consoante entendimento pacificado no STF.
Quanto ao mérito, entendeu que a casa legislativa municipal usurpara de atribuição típica do Chefe do
Poder Executivo Municipal, a quem compete, a partir de um juízo de conveniência e oportunidade,
avaliar os benefícios para o município do emprego das praças esportivas e demais prédios públicos em
eventos produzidos ou patrocinados pela iniciativa privada. Afirmou, também, que foge à competência
municipal a regulação da propaganda de bebidas alcoólicas e de derivados do tabaco (CF, art. 220, § 3º, II
e § 4º). Após, pediu vista o Min. Joaquim Barbosa.
RE 305470/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 29.3.2005. (RE-305470)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
30.3.2005
22 e 29.3.2005
22 e 29.3.2005
Extraordinárias
31.3.2005
——
——
Julgamentos
10
414
370
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Direito Tributário. Sanções Políticas. Inadmissibilidade. Restrição indevida à liberdade de empresa ou de
profissão (Transcrições)
RE 374981/RS*
RELATOR: MINISTRO CELSO DE MELLO
EMENTA: SANÇÕES POLÍTICAS NO DIREITO TRIBUTÁRIO. INADMISSIBILIDADE DA UTILIZAÇÃO,
PELO PODER PÚBLICO, DE MEIOS GRAVOSOS E INDIRETOS DE COERÇÃO ESTATAL DESTINADOS A
COMPELIR O CONTRIBUINTE INADIMPLENTE A PAGAR O TRIBUTO (SÚMULAS 70, 323 E 547 DO STF).
RESTRIÇÕES ESTATAIS, QUE, FUNDADAS EM EXIGÊNCIAS QUE TRANSGRIDEM OS POSTULADOS DA
RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO, CULMINAM POR INVIABILIZAR,
SEM JUSTO FUNDAMENTO, O EXERCÍCIO, PELO SUJEITO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA, DE
ATIVIDADE ECONÔMICA OU PROFISSIONAL LÍCITA. LIMITAÇÕES ARBITRÁRIAS QUE NÃO PODEM SER
IMPOSTAS PELO ESTADO AO CONTRIBUINTE EM DÉBITO, SOB PENA DE OFENSA AO “SUBSTANTIVE DUE
PROCESS OF LAW”. IMPOSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL DE O ESTADO LEGISLAR DE MODO ABUSIVO
OU IMODERADO (RTJ 160/140-141 – RTJ 173/807-808 – RTJ 178/22-24). O PODER DE TRIBUTAR – QUE
ENCONTRA LIMITAÇÕES ESSENCIAIS NO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL, INSTITUÍDAS EM FAVOR
DO CONTRIBUINTE – “NÃO PODE CHEGAR À DESMEDIDA DO PODER DE DESTRUIR” (MIN. OROSIMBO
NONATO, RDA 34/132). A PRERROGATIVA ESTATAL DE TRIBUTAR TRADUZ PODER CUJO EXERCÍCIO NÃO
PODE COMPROMETER A LIBERDADE DE TRABALHO, DE COMÉRCIO E DE INDÚSTRIA DO
CONTRIBUINTE. A SIGNIFICAÇÃO TUTELAR, EM NOSSO SISTEMA JURÍDICO, DO “ESTATUTO
CONSTITUCIONAL DO CONTRIBUINTE”. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECURSO EXTRAORDINÁRIO
CONHECIDO E PROVIDO.
DECISÃO: O litígio em causa envolve discussão em torno da possibilidade constitucional de o Poder Público impor
restrições, ainda que fundadas em lei, destinadas a compelir o contribuinte inadimplente a pagar o tributo e que culminam, quase
sempre, em decorrência do caráter gravoso e indireto da coerção utilizada pelo Estado, por inviabilizar o exercício, pela empresa
devedora, de atividade econômica lícita.
No caso ora em análise, põe-se em destaque o exame da legitimidade constitucional de exigência estatal que erigiu a prévia
satisfação de débito tributário em requisito necessário à outorga, pelo Poder Público, de autorização para a impressão de
documentos fiscais.
A E. Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ao admitir o recurso extraordinário interposto pela
empresa ora requerente, ressaltou, de modo bastante expressivo, esse aspecto da controvérsia (fls. 272):
“Mesmo a v. decisão recorrida tendo consignado que o exercício de atividades mercantis e profissionais está
condicionado a disposições da legislação ordinária, o que não se contesta, ao entender legítima a exigência de garantias
para a autorização de impressão de documentos fiscais coibiu o livre exercício dessas atividades, que poderiam, inclusive,
garantir ao contribuinte meios para saldar o débito com a Fazenda Pública.
A exigência do Estado, de condicionar a autorização para impressão de notas fiscais ao pagamento dos tributos
e/ou prestação de fiança, confronta com as Súmulas nºs 70, 323 e 547 do STF, que proclamam não ser admissível coagir o
devedor ao pagamento do tributo devido, modo indireto, atingindo seu livre exercício de atividade lícita, quando previstos
mecanismos próprios para a cobrança do crédito da Fazenda...”. (grifei)
Cabe acentuar, neste ponto, que o Supremo Tribunal Federal, tendo presentes os postulados constitucionais que
asseguram a livre prática de atividades econômicas lícitas (CF, art. 170, parágrafo único), de um lado, e a liberdade de exercício
profissional (CF, art. 5º, XIII), de outro - e considerando, ainda, que o Poder Público dispõe de meios legítimos que lhe permitem
tornar efetivos os créditos tributários -, firmou orientação jurisprudencial, hoje consubstanciada em enunciados sumulares
(Súmulas 70, 323 e 547), no sentido de que a imposição, pela autoridade fiscal, de restrições de índole punitiva, quando
motivada tal limitação pela mera inadimplência do contribuinte, revela-se contrária às liberdades públicas ora referidas (RTJ
125/395, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI).
Esse entendimento - cumpre enfatizar - tem sido observado em sucessivos julgamentos proferidos por esta Suprema
Corte, quer sob a égide do anterior regime constitucional, quer em face da vigente Constituição da República (RTJ 33/99, Rel.
Min. EVANDRO LINS - RTJ 45/859, Rel. Min. THOMPSON FLORES - RTJ 47/327, Rel. Min. ADAUCTO CARDOSO RTJ 73/821, Rel. Min. LEITÃO DE ABREU - RTJ 100/1091, Rel. Min. DJACI FALCÃO - RTJ 111/1307, Rel. Min. MOREIRA
ALVES - RTJ 115/1439, Rel. Min. OSCAR CORREA - RTJ 138/847, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - RTJ 177/961, Rel. Min.
MOREIRA ALVES - RE 111.042/SP, Rel. Min. CARLOS MADEIRA, v.g.):
“CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ICMS: REGIME ESPECIAL. RESTRIÇÕES DE CARÁTER PUNITIVO.
LIBERDADE DE TRABALHO. CF/67, art. 153, § 23; CF/88, art. 5º, XIII.
I. - Regime especial de ICM, autorizado em lei estadual: restrições e limitações, nele constantes, à atividade
comercial do contribuinte, ofensivas à garantia constitucional da liberdade de trabalho (CF/67, art. 153, § 23; CF/88, art.
5º, XIII), constituindo forma oblíqua de cobrança do tributo, assim execução política, que a jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal sempre repeliu (Súmulas nºs 70, 323 e 547).
II. - Precedente do STF: ERE 115.452-SP, Velloso, Plenário, 04.l0.90, ‘DJ’ de 16.11.90.
III. - RE não admitido. Agravo não provido.”
(RE 216.983-AgR/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - grifei)
É certo – consoante adverte a jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal - que não se reveste de natureza
absoluta a liberdade de atividade empresarial, econômica ou profissional, eis que inexistem, em nosso sistema jurídico, direitos e
garantias impregnados de caráter absoluto:
“OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS NÃO TÊM CARÁTER ABSOLUTO.
Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo
porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam,
ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou
coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição.
O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas estão sujeitas - e
considerado o substrato ético que as informa - permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de
um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades,
pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e
garantias de terceiros.”
(RTJ 173/807-808, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
A circunstância de não se revelarem absolutos os direitos e garantias individuais proclamados no texto constitucional não
significa que a Administração Tributária possa frustrar o exercício da atividade empresarial ou profissional do contribuinte,
impondo-lhe exigências gravosas, que, não obstante as prerrogativas extraordinárias que (já) garantem o crédito tributário, visem,
em última análise, a constranger o devedor a satisfazer débitos fiscais que sobre ele incidam.
O fato irrecusável, nesta matéria, como já evidenciado pela própria jurisprudência desta Suprema Corte, é que o Estado
não pode valer-se de meios indiretos de coerção, convertendo-os em instrumentos de acertamento da relação tributária, para,
em função deles - e mediante interdição ou grave restrição ao exercício da atividade empresarial, econômica ou profissional constranger o contribuinte a adimplir obrigações fiscais eventualmente em atraso.
Esse comportamento estatal - porque arbitrário e inadmissível - também tem sido igualmente censurado por autorizado
magistério doutrinário (HUGO DE BRITO MACHADO, “Sanções Políticas no Direito Tributário”, in Revista Dialética de
Direito Tributário nº 30, p. 46/47):
“Em Direito Tributário a expressão sanções políticas corresponde a restrições ou proibições impostas ao
contribuinte, como forma indireta de obrigá-lo ao pagamento do tributo, tais como a interdição do estabelecimento, a
apreensão de mercadorias, o regime especial de fiscalização, entre outras.
Qualquer que seja a restrição que implique cerceamento da liberdade de exercer atividade lícita é inconstitucional,
porque contraria o disposto nos artigos 5º, inciso XIII, e 170, parágrafo único, do Estatuto Maior do País.
.......................................................
São exemplos mais comuns de sanções políticas a apreensão de mercadorias sem que a presença física destas seja
necessária para a comprovação do que o fisco aponta como ilícito; o denominado regime especial de fiscalização; a recusa
de autorização para imprimir notas fiscais; a inscrição em cadastro de inadimplentes com as restrições daí decorrentes; a
recusa de certidão negativa de débito quando não existe lançamento consumado contra o contribuinte; a suspensão e até o
cancelamento da inscrição do contribuinte no respectivo cadastro, entre muitos outros.
Todas essas práticas são flagrantemente inconstitucionais, entre outras razões, porque: a) implicam indevida
restrição ao direito de exercer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, assegurado pelo
art. 170, parágrafo único, da vigente Constituição Federal; e b) configuram cobrança sem o devido processo legal, com
grave violação do direito de defesa do contribuinte, porque a autoridade que a este impõe a restrição não é a autoridade
competente para apreciar se a exigência é ou não legal.” (grifei)
Cabe referir, a propósito da controvérsia suscitada no recurso extraordinário em questão - recusa de autorização estatal para
impressão de notas fiscais -, a lição de EDISON FREITAS DE SIQUEIRA, em obra monográfica que versou o tema das chamadas
“sanções políticas” impostas ao contribuinte inadimplente (“Débito Fiscal - análise crítica e sanções políticas”, p. 1/62, item 2.3,
2001, Sulina):
“Portanto, emerge incontroverso o fato de que uma empresa, para que possa exercer suas atividades, necessita de
sua inscrição estadual, bem como de permanente autorização da expedição de notas fiscais, sendo necessário obter nas
Secretarias da Fazenda de cada estado da federação onde vendam seus produtos, o respectivo reconhecimento de direito à
utilização de sistemas especiais de arrecadação, bem como na transferência de créditos acumulados, além da obtenção da
respectiva Autorização para Impressão de Documentos Fiscais (AIDF), em paralelo às notas fiscais.
Salienta-se que qualquer ação contrária do Estado, quanto à concessão e reconhecimento dos direitos inerentes às
questões no parágrafo anterior referendadas, constitui ‘sanção política’, medida despótica e própria de ditadores, porque
subverte o sistema legal vigente.
Nesse sentido, vale tecer algumas considerações do efetivo SIGNIFICADO DA NOTA FISCAL para uma empresa ou
profissional que mantenha a atividade lícita ‘trabalho’, até porque, o instrumento alternativo posto à disposição do
contribuinte, notas fiscais avulsas, é situação equivalente à marginalidade, além de tratar-se de meio absolutamente inviável
a uma atividade econômica significativa (volumosa).
A importância da nota fiscal ou AIDF para o desenvolvimento das atividades comerciais de uma empresa seja ela
de indústria ou comércio, decorre do fato de que somente por meio destas é que se torna possível oficializar e documentar
operações de circulação de mercadorias, a ponto de que sem essas, a circulação de mercadoria é atividade ilícita, punível,
inclusive, com a respectiva apreensão das mesmas.
Neste sentido, revela-se, pois, totalmente imprópria à figura da nota fiscal avulsa, solução muito justificada por
fiscais de ICMS e Procuradores de Estado em audiências que solicitam ao Poder Judiciário, mas que, na prática, constitui
artimanha muito maliciosa que só serve para prejudicar o contribuinte, em circunstância totalmente defesa em lei, como
adiante ficará elucidado.
Não raro, a fiscalização aponta, como recurso em situações de desagrado ao contribuinte, o uso das chamadas
‘notas fiscais avulsas’. Fazem-no, por certo, por desconhecimento de toda a gama de obtusa burocracia que envolve a sua
expedição, ou pretendendo iludir os órgãos do Poder Judiciário, caso esses sejam chamados a impor ‘poder de controle’
contra exacerbação do exercício do poder de tributar, por parte do Poder Executivo.” (grifei)
Cumpre assinalar, por oportuno, que essa percepção do tema, prestigiada pelo saudoso e eminente Ministro ALIOMAR
BALEEIRO (“Direito Tributário Brasileiro”, p. 878/880, item n. 2, 11ª ed., atualizado por Misabel Abreu Machado Derzi, 1999,
Forense), é também compartilhada por autorizado magistério doutrinário que põe em destaque, no exame dessa matéria, o direito
do contribuinte ao livre exercício de sua atividade profissional ou econômica, cuja prática legítima – qualificando-se como
limitação material ao poder do Estado – inibe a Administração Tributária, em face do postulado que consagra a proibição de
excesso (RTJ 176/578-580, Rel. Min. CELSO DE MELLO), de impor, ao contribuinte inadimplente, restrições que configurem
meios gravosos e irrazoáveis destinados a constranger, de modo indireto, o devedor a satisfazer o crédito tributário (HUMBERTO
BERGMANN ÁVILA, “Sistema Constitucional Tributário”, p. 324 e 326, 2004, Saraiva; SACHA CALMON NAVARRO
COÊLHO, “Infração Tributária e Sanção”, in “Sanções Administrativas Tributárias”, p. 420/444, 432, 2004, Dialética/ICET;
HUGO DE BRITO MACHADO SEGUNDO, “Processo Tributário”, p. 93/95, item n. 2.7, 2004, Atlas; RICARDO
LOBO TORRES, “Curso de Direito Financeiro e Tributário”, p. 270, item n. 7.1, 1995, Renovar, v.g.).
A censura a esse comportamento inconstitucional, quando adotado pelo Poder Público em sede tributária, foi registrada,
com extrema propriedade, em precisa lição, por HELENILSON CUNHA PONTES (“O Princípio da Proporcionalidade e o
Direito Tributário”, p. 141/143, item n. 2.3, 2000, Dialética):
“O princípio da proporcionalidade, em seu aspecto necessidade, torna inconstitucional também grande parte das
sanções indiretas ou políticas impostas pelo Estado sobre os sujeitos passivos que se encontrem em estado de
impontualidade com os seus deveres tributários. Com efeito, se com a imposição de sanções menos gravosas, e até mais
eficazes (como a propositura de medida cautelar fiscal e ação de execução fiscal), pode o Estado realizar o seu direito à
percepção da receita pública tributária, nada justifica validamente a imposição de sanções indiretas como a negativa de
fornecimento de certidões negativas de débito, ou inscrição em cadastro de devedores, o que resulta em sérias e graves
restrições ao exercício da livre iniciativa econômica, que vão da impossibilidade de registrar atos societários nos órgãos do
Registro Nacional do Comércio até a proibição de participar de concorrências públicas.
O Estado brasileiro, talvez em exemplo único em todo o mundo ocidental, exerce, de forma cada vez mais criativa, o
seu poder de estabelecer sanções políticas (ou indiretas), objetivando compelir o sujeito passivo a cumprir o seu dever
tributário. Tantas foram as sanções tributárias indiretas criadas pelo Estado brasileiro que deram origem a três Súmulas
do Supremo Tribunal Federal.
Enfim, sempre que houver a possibilidade de se impor medida menos gravosa à esfera jurídica do indivíduo infrator,
cujo efeito seja semelhante àquele decorrente da aplicação de sanção mais limitadora, deve o Estado optar pela primeira,
por exigência do princípio da proporcionalidade em seu aspecto necessidade.
.......................................................
As sanções tributárias podem revelar-se inconstitucionais, por desatendimento à proporcionalidade em sentido
estrito (...), quando a limitação imposta à esfera jurídica dos indivíduos, embora arrimada na busca do alcance de um
objetivo protegido pela ordem jurídica, assume uma dimensão que inviabiliza o exercício de outros direitos e garantias
individuais, igualmente assegurados pela ordem constitucional.
.......................................................
Exemplo de sanção tributária claramente desproporcional em sentido estrito é a interdição de estabelecimento
comercial ou industrial motivada pela impontualidade do sujeito passivo tributário relativamente ao cumprimento de seus
deveres tributários. Embora contumaz devedor tributário, um sujeito passivo jamais pode ver aniquilado completamente o
seu direito à livre iniciativa em razão do descumprimento do dever de recolher os tributos por ele devidos aos cofres
públicos. O Estado deve responder à impontualidade do sujeito passivo com o lançamento e a execução céleres dos tributos
que entende devidos, jamais com o fechamento da unidade econômica.
Neste sentido, revelam-se flagrantemente inconstitucionais as medidas aplicadas, no âmbito federal, em
conseqüência da decretação do chamado ‘regime especial de fiscalização’. Tais medidas, pela gravidade das limitações que
impõem à livre iniciativa econômica, conduzem à completa impossibilidade do exercício desta liberdade, negligenciam, por
completo, o verdadeiro papel da fiscalização tributária em um Estado Democrático de Direito e ignoram o entendimento já
consolidado do Supremo Tribunal Federal acerca das sanções indiretas em matéria tributária. Esta Corte, aliás,
rotineiramente afasta os regimes especiais de fiscalização, por considerá-los verdadeiras sanções indiretas, que se chocam
frontalmente com outros princípios constitucionais, notadamente com a liberdade de iniciativa econômica.” (grifei)
É por essa razão que EDUARDO FORTUNATO BIM, em excelente trabalho dedicado ao tema ora em análise (“A
Inconstitucionalidade das Sanções Políticas Tributárias no Estado de Direito: Violação ao ‘Substantive Due Process of Law’
(Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade)” in “Grandes Questões Atuais do Direito Tributário”, vol. 8/67-92, 83,
2004, Dialética), conclui, com indiscutível acerto, “que as sanções indiretas afrontam, de maneira autônoma, cada um dos
subprincípios da proporcionalidade, sendo inconstitucionais em um Estado de Direito, por violarem não somente este, mais ainda
o ‘substantive due process of law’” (grifei).
Cabe relembrar, neste ponto, consideradas as referências doutrinárias que venho de expor, a clássica advertência de
OROSIMBO NONATO, consubstanciada em decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (RE 18.331/SP), em acórdão no
qual aquele eminente e saudoso Magistrado acentuou, de forma particularmente expressiva, à maneira do que já o fizera o Chief
Justice JOHN MARSHALL, quando do julgamento, em 1819, do célebre caso “McCulloch v. Maryland”, que “o poder de tributar
não pode chegar à desmedida do poder de destruir” (RF 145/164 – RDA 34/132), eis que – como relembra BILAC PINTO, em
conhecida conferência sobre “Os Limites do Poder Fiscal do Estado” (RF 82/547-562, 552) - essa extraordinária prerrogativa
estatal traduz, em essência, “um poder que somente pode ser exercido dentro dos limites que o tornem compatível com a liberdade
de trabalho, de comércio e de indústria e com o direito de propriedade” (grifei).
Daí a necessidade de rememorar, sempre, a função tutelar do Poder Judiciário, investido de competência institucional
para neutralizar eventuais abusos das entidades governamentais, que, muitas vezes deslembradas da existência, em nosso sistema
jurídico, de um “estatuto constitucional do contribuinte”, consubstanciador de direitos e garantias oponíveis ao poder impositivo
do Estado (Pet 1.466/PB, Rel. Min. CELSO DE MELLO, in “Informativo STF” nº 125), culminam por asfixiar, arbitrariamente, o
sujeito passivo da obrigação tributária, inviabilizando-lhe, injustamente, o exercício de atividades legítimas, o que só faz conferir
permanente atualidade às palavras do Justice Oliver Wendell Holmes, Jr. (“The power to tax is not the power to destroy while this
Court sits”), em “dictum” segundo o qual, em livre tradução, “o poder de tributar não significa nem envolve o poder de destruir,
pelo menos enquanto existir esta Corte Suprema”, proferidas, ainda que como “dissenting opinion”, no julgamento, em 1928, do
caso “Panhandle Oil Co. v. State of Mississippi Ex Rel. Knox” (277 U.S. 218).
Não se pode perder de perspectiva, neste ponto, em face do conteúdo evidentemente arbitrário da exigência estatal ora
questionada na presente sede recursal, o fato de que, especialmente quando se tratar de matéria tributária, impõe-se, ao Estado, no
processo de elaboração das leis, a observância do necessário coeficiente de razoabilidade, pois, como se sabe, todas as normas
emanadas do Poder Público devem ajustar-se à cláusula que consagra, em sua dimensão material, o princípio do “substantive due
process of law” (CF, art. 5º, LIV), eis que, no tema em questão, o postulado da proporcionalidade qualifica-se como parâmetro
de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais, consoante tem proclamado a jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal (RTJ 160/140-141 – RTJ 178/22-24, v.g.):
“O Estado não pode legislar abusivamente. A atividade legislativa está necessariamente sujeita à rígida observância
de diretriz fundamental, que, encontrando suporte teórico no princípio da proporcionalidade, veda os excessos normativos e
as prescrições irrazoáveis do Poder Público.
O princípio da proporcionalidade - que extrai a sua justificação dogmática de diversas cláusulas constitucionais,
notadamente daquela que veicula a garantia do substantive due process of law - acha-se vocacionado a inibir e a
neutralizar os abusos do Poder Público no exercício de suas funções, qualificando-se como parâmetro de aferição da
própria constitucionalidade material dos atos estatais.
A norma estatal, que não veicula qualquer conteúdo de irrazoabilidade, presta obséquio ao postulado da
proporcionalidade, ajustando-se à cláusula que consagra, em sua dimensão material, o princípio do substantive due
process of law (CF, art. 5º, LIV).
Essa cláusula tutelar, ao inibir os efeitos prejudiciais decorrentes do abuso de poder legislativo, enfatiza a noção de
que a prerrogativa de legislar outorgada ao Estado constitui atribuição jurídica essencialmente limitada, ainda que o
momento de abstrata instauração normativa possa repousar em juízo meramente político ou discricionário do legislador.”
(RTJ 176/578-580, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
Em suma: a prerrogativa institucional de tributar, que o ordenamento positivo reconhece ao Estado, não lhe outorga o
poder de suprimir (ou de inviabilizar) direitos de caráter fundamental, constitucionalmente assegurados ao contribuinte, pois este
dispõe, nos termos da própria Carta Política, de um sistema de proteção destinado a ampará-lo contra eventuais excessos
cometidos pelo poder tributante ou, ainda, contra exigências irrazoáveis veiculadas em diplomas normativos por este editados.
A análise dos autos evidencia que o acórdão proferido pelo E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul diverge
da orientação prevalecente no âmbito do Supremo Tribunal Federal, reafirmada em julgamentos recentes emanados desta Suprema
Corte (RE 413.782/SC, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Pleno – RE 09.956/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – RE 09.958/RS,
Rel. Min. GILMAR MENDES - RE 414.714/RS, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA – RE 24.061/RS, Rel. Min. SEPÚLVEDA
PERTENCE - RE 434.987/RS, Rel. Min. CEZAR PELUSO, v.g.).
Sendo assim, e considerando as razões expostas, conheço e dou provimento ao presente recurso extraordinário (CPC, art.
557, § 1º - A), em ordem a conceder o mandado de segurança impetrado pela parte ora recorrente. No que concerne à verba
honorária, revela-se aplicável a Súmula 512/STF.
Publique-se.
Brasília, 28 de março de 2005.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
* decisão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 382
Brasília, 4 a 8 de abril de 2005 Nº 382
Data (páginas internas): 13 de abril de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
ADI e Vício de Iniciativa - 1 a 4
Relatório de Impacto Ambiental e Autorização do Poder Legislativo
ADI e Princípio da Não-Cumulatividade
ADI e Lombadas Eletrônicas
ADI e Material Escolar
ADI: Veículos Apreendidos e Perda da Propriedade
ADI e Pesca Artesanal
ADI e Armas de Fogo
ADI e Direito Processual
ADI e Valor da Causa
Competência Originária do STF: Empresa Pública e Conflito Federativo
Ação Popular: Hipótese Reservada a ADI por Omissão
1ª Turma
Falso Advogado e Falta de Defesa Técnica
2ª Turma
Homicídio Culposo e Socorro à Vítima
Sursis Processual e Prazo de Revogação
Transcrições
Opção de Nacionalidade e Requisitos (RE 418096/RS)
Justiça estadual - Ingresso da União no processo - Deslocamento da causa para a Justiça Federal (AI
514634/RJ)
PLENÁRIO
ADI e Vício de Iniciativa - 1
Por entender caracterizada a afronta à competência privativa do Chefe do Poder Executivo para
dispor sobre a criação de órgãos e entidades da administração pública (CF, art. 61, § 1º, II, e), de
observância obrigatória pelos Estados-membros, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação
direta ajuizada pelo Governador do Estado do Espírito Santo para declarar a inconstitucionalidade da Lei
Complementar 239/2002, de iniciativa da Assembléia Legislativa daquele Estado, que, alterando as Leis
Complementares 81/96 (que institui o Sistema Estadual de Política Agrícola, Agrária e Pesqueira do
Estado) e 169/99, dispõe sobre a criação, extinção, liquidação e composição de entidades públicas, bem
como autoriza o Poder Público a abrir créditos adicionais para o cumprimento da lei.
ADI 2750/ES, rel. Min. Eros Grau, 6.4.2005. (ADI-2750)
ADI e Vício de Iniciativa - 2
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ações diretas ajuizadas uma pelo Partido da
Frente Liberal – PFL e outra pelo Governador do Estado de Mato Grosso do Sul para declarar a
inconstitucionalidade da Lei 14.162/2003, do Estado do Paraná, que veda o cultivo, a manipulação, a
importação, a industrialização e a comercialização de organismos geneticamente modificados, no âmbito
daquela unidade federada. Entendeu-se que a norma impugnada afronta a competência privativa da União
para legislar sobre comercialização (CF, art. 22, I), importação e exportação (CF, art. 22, VIII), e regime
dos portos (CF, art. 22, X), bem como, ao fixar disciplina de caráter geral, extrapola a competência
residual do Estado para tratar de matérias (CF, arts. 24, V, VI, XII), cuja competência é concorrente entre
Estados e União, que já se encontram, ampla e diversamente, regulamentadas em normas federais (MP
131/2003, convertida na Lei 10.814/2003 e Lei 9.874/95, entre outras).
ADI 3035/PR e ADI 3054/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 6.4.2005. (ADI-3035) (ADI-3054)
ADI e Vício de Iniciativa - 3
Por entender caracterizada a ofensa à competência privativa do Chefe do Poder Executivo para
dispor sobre militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções,
estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva (CF, art. 61, § 1º, II, f), de observância
obrigatória pelos Estados-membros, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta
ajuizada pelo Governador do Estado de Mato Grosso para declarar a inconstitucionalidade da Lei
Complementar 107/2002, de iniciativa da Assembléia Legislativa daquele Estado, que determina que os
servidores militares que foram transferidos para a inatividade com vencimento do posto ou graduação
imediatamente superior serão promovidos ao posto ou graduação que serviu de base para atribuição de
seus proventos, independentemente do preenchimento dos requisitos legais previstos para essa promoção.
ADI 3267/MT, rel. Min. Joaquim Barbosa, 6.4.2005. (ADI-3267)
ADI e Vício de Iniciativa - 4
Por considerar caracterizada a ofensa à competência privativa do Chefe do Poder Executivo para
dispor sobre militares das Forças Armadas e seu regime jurídico (CF, art. 61, § 1º, II, f), de observância
obrigatória pelos Estados-membros, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta
ajuizada pelo Governador do Estado de Rondônia para declarar a inconstitucionalidade da Emenda
Constitucional 29/2002, daquele Estado, de iniciativa parlamentar, que determina que os militares eleitos
para dirigir entidades associativas nos cargos de presidente, secretário, tesoureiro e diretor social, ficam à
disposição de suas respectivas entidades, com ônus para a corporação de origem. Ressaltou-se, ademais, o
entendimento do STF no sentido de que as matérias de iniciativa do Executivo não podem ser reguladas
por emendas constitucionais propostas por parlamentares. Precedentes citados: ADI 199/PE (DJU de
7.8.98); ADI 1690 MC/AP (DJU de 13.8.99); ADI 2393 MC/AL (DJU de 21.6.2002) e ADI 2050/RO
(DJU de 2.4.2004).
ADI 2966/RO, rel. Min. Joaquim Barbosa, 6.4.2005. (ADI-2966)
Relatório de Impacto Ambiental e Autorização do Poder Legislativo
O Tribunal concedeu a liminar requerida em ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo
Governador do Estado de Rondônia, para suspender a vigência e a eficácia da Lei 1.315/2004, de
iniciativa da Assembléia legislativa daquele Estado, que altera a atribuição da Secretaria Estadual de
Desenvolvimento Ambiental - SEAM e estabelece como requisito, para emissão de licenças para as
atividades dependentes de recursos ambientais, a prévia autorização legislativa. Com base em recente
precedente do Plenário (ADI 1505/ES, DJU de 4.3.2005), entendeu-se que a norma impugnada, a
princípio, viola o art. 2º da CF, pois, ao condicionar a aprovação de licenciamento ambiental à prévia
autorização da Assembléia Legislativa, implica uma indevida interferência do Poder Legislativo na
atuação do Poder Executivo. Salientou-se, ainda, que as normas gerais relativamente ao licenciamento
ambiental são de competência da União (CF, art. 24, IV).
ADI 3252 MC/RO, rel. Min. Gilmar Mendes, 6.4.2005. (ADI-3252)
ADI e Princípio da Não-Cumulatividade
O Tribunal iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Governador do
Estado de Santa Catarina contra a Lei estadual 11.362/2000, de iniciativa parlamentar, que determina que
a concessão de redução de base de cálculo ou de isenção, facultada pelo Convênio ICMS 36/92, às
operações internas com os insumos agropecuários nele especificados, implica a manutenção integral do
crédito fiscal relativo à entrada dos respectivos produtos. O Min. Eros Grau, relator, julgou parcialmente
procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade da expressão “ou de isenção”, contida no art. 1º
da norma impugnada. Inicialmente, afastou a alegação de inconstitucionalidade formal, por vício de
iniciativa, com base em precedente do STF no sentido de que o preceito constante do art. 61, § 1º, II, b, da
CF, não é de observância obrigatória para os Estados-membros, mas somente para os Territórios (ADI
2474/SC, DJU de 25.4.2003). Quanto à apontada inconstitucionalidade material, consistente na ofensa ao
princípio da não-cumulatividade, entendeu que, por força do disposto no art. 155, § 2º, II, a, da CF,
apenas a isenção ou a não-incidência não implicam crédito para compensação com o montante devido nas
operações ou prestações seguintes, vedação que não abrange a hipótese de redução da base de cálculo.
Em divergência, o Min. Marco Aurélio votou pela improcedência do pleito, ao fundamento de que o
inciso II do art. 155 da CF teria aberto exceção para que o legislador estadual decidisse sobre a
manutenção do crédito, salientando, ainda, que a exigência de lei complementar para disciplinar essa
matéria (CF, art. 155, § 2º, XII, f) apenas se referiria aos casos de remessa para outro Estado e exportação
para o exterior (CF, art. 155, § 2º: “II – a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da
legislação: a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou
prestações seguintes:”). Após, pediu vista dos autos o Min. Cezar Peluso.
ADI 2320/SC, rel. Min. Eros Grau, 6.4.2005. (ADI-2320)
ADI e Lombadas Eletrônicas
Por entender caracterizada a ofensa à competência privativa da União para legislar sobre trânsito
(CF, art. 22, XI), o Tribunal julgou procedente pedido de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado
do Rio Grande do Sul para declarar a inconstitucionalidade da Lei 11.824/2002, de iniciativa da
Assembléia Legislativa daquele Estado, que dispõe sobre a utilização de lombada eletrônica para a
fiscalização de velocidade de veículos nas rodovias estaduais e federais administradas pelo referido
Estado. Ressaltou-se que a lei impugnada produz impacto na vida dos motoristas, que poderão sofrer
multas por excesso de velocidade e, caso reunidas as circunstâncias, até mesmo perder a habilitação.
ADI 2718/RS, rel. Min. Joaquim Barbosa, 6.4.2005. (ADI-2718)
ADI e Material Escolar
O Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta de
inconstitucionalidade ajuizada pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino CONFENEN contra a Lei 6.586/94, do Estado da Bahia, que estabelece normas para a adoção de material
escolar e de livros didáticos pelos estabelecimentos particulares de ensino pré-escolar, de 1º e 2º graus,
bem como para a cobrança desses materiais. Entendeu-se que a norma impugnada não se afastou do
âmbito da competência concorrente dos Estados-membros (CF, art. 24, IX e § 2º). Salientou-se, também,
que, em razão de a medida cautelar ter sido indeferida há dez anos, o dispositivo questionado estaria,
desde então, produzindo efeitos. Vencido o Min. Marco Aurélio, que julgava procedente o pedido, por
considerar que o tema somente poderia ser regido por lei federal.
ADI 1266/BA, rel. Min. Eros Grau, 6.4.2005. (ADI-1266)
ADI: Veículos Apreendidos e Perda de Propriedade
O Tribunal julgou procedente, em parte, pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador
do Estado do Rio de Janeiro para declarar a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 3.867/2002, de
iniciativa da Assembléia Legislativa daquele Estado, que determina que os veículos apreendidos pelas
polícias militar e civil, que tenham sido roubados ou furtados, se não reclamados no período de 3 anos,
serão levados a hasta pública, repartindo-se o produto do leilão entre o Estado e o Município. Entendeu-se
que a norma impugnada viola o art. 22, I, da CF, que dispõe ser da competência privativa da União
legislar sobre direito civil, já que trata de perda da propriedade.
ADI 2819/RJ, rel. Min. Eros Grau, 6.4.2005. (ADI-2819)
ADI e Pesca Artesanal
O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido de ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da
República para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 2º, 4º e 5º da Lei 10.164/94, do Estado do Rio
Grande do Sul, que, respectivamente, define pesca artesanal, determina que a Federação dos Sindicatos
dos Pescadores e Colônias de Pescadores do referido Estado será responsável pelo cadastramento, e
determina que caberá ao Poder Executivo regulamentar esse cadastramento. Entendeu-se que o Estado do
Rio Grande do Sul usurpou de sua competência suplementar para legislar, porquanto a norma impugnada,
ao definir, em seu art. 2º, pesca artesanal como espécie do gênero pesca profissional, ampliou a definição
estabelecida no texto federal, em desconformidade com o preceito inserto no inciso VI do art. 24 da CF,
que autoriza o Estado-membro a regular de forma específica aquilo que a União houver regulado de
forma geral. Em razão de guardarem relação de dependência com a acepção de pesca artesanal, os arts. 4º
e 5º da referida lei também foram considerados inconstitucionais. Vencido o Min. Marco Aurélio, que
julgava improcedente o pleito.
ADI 1245/RS, rel. Min. Eros Grau, 6.4.2005. (ADI-1245)
ADI e Armas de Fogo
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador do Estado
de Rondônia para declarar a inconstitucionalidade da Lei 1.317/2004, de iniciativa da Assembléia
Legislativa daquele Estado, que determina que as armas de fogo apreendidas poderão ser utilizadas pelas
polícias civil e militar do Estado “após o trânsito em julgado dos autos do processo a que estão
vinculadas”. Entendeu-se que a norma em questão viola a competência da União para autorizar e
fiscalizar a produção e o comércio de material bélico (CF, art. 21, VI), bem como para legislar sobre
direito penal (CF, art. 22, I).
ADI 3258/RO, rel. Min. Joaquim Barbosa, 6.4.2005. (ADI-3258)
ADI e Direito Processual
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador do Estado
de São Paulo para declarar a inconstitucionalidade do art. 26 da Lei Complementar 851/98, daquele
Estado, que fixa que se observará o art. 28 do CPP, no âmbito do Juizado Especial, nas seguintes
hipóteses: a) quando o juiz deixar de acolher proposta do MP para a aplicação imediata de pena restritiva
de direito ou multa (Lei 9.099/95, art. 76); b) quando o juiz entender cabível a proposta não oferecida
pelo MP; c) quando o juiz deixar de acolher a suspensão do processo proposta pelo MP (Lei 9.099/95, art.
89). Salientando ser de conteúdo processual e não meramente procedimental a matéria tratada pela norma
impugnada, concluiu-se pela afronta ao art. 22, I, da CF, que estabelece a competência privativa da União
para legislar sobre direito processual.
ADI 2257/SP, rel. Min. Eros Grau, 6.4.2005. (ADI-2257)
ADI e Valor da Causa
Por entender caracterizada a afronta ao art. 22, I, da CF, que dispõe ser da competência privativa da
União legislar sobre direito processual, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta
para declarar a inconstitucionalidade do Decreto Judiciário 6/99, editado pelo Presidente do Tribunal de
Justiça do Estado da Bahia, que dispõe sobre a fiscalização do valor da causa no ato da distribuição.
Ressaltou-se que o valor da causa é matéria atinente ao direito processual (CPC, arts. 258 a 261) e que o
ajustamento desse valor deve ser discutido em sede de processo instaurado, sendo inadmissível que a
petição a ser protocolizada sofra juízo de admissibilidade extrajudicial.
ADI 2052/BA, rel. Min. Eros Grau, 6.4.2005. (ADI-2052)
Competência Originária do STF: Empresa Pública e Conflito Federativo
O Tribunal iniciou julgamento de questão de ordem suscitada em ação cível originária proposta pela
Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT contra o Estado do Rio de Janeiro, em que se pretende
afastar a cobrança do IPVA, bem como as sanções decorrentes da inadimplência do tributo. Na espécie, o
juízo federal de origem declinara de sua competência para o STF com base em precedentes da Corte
(ACO 515 QO/DF, DJU de 27.9.2002; ACO 503/RS, DJU de 5.9.2003; ACO 471/PR, DJU de 25.4.2003
e Rcl 2050/RS, decisão pendente de publicação). O Min. Marco Aurélio, relator, resolveu a questão de
ordem no sentido de determinar o retorno do processo àquele juízo, por entender não incidir a norma do
art. 102, I, f, da CF (“Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal... : I - processar e julgar,
originariamente:... f) as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal,
ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta;”). Tendo em conta a
natureza jurídica da autora, qual seja, empresa pública, ressaltou que os três primeiros precedentes citados
não se aplicam ao caso, já que tratam de ações cíveis originárias em que figura, na relação processual,
autarquia, sendo que o último precedente assenta a incompetência do STF pela alínea f, quando a
demanda cuidar de pessoa jurídica de direito privado. Asseverou, ainda, que ante o alcance do aludido
preceito constitucional, a referência a entidades da administração indireta está ligada ao envolvimento de
pessoas jurídicas de direito público e, mesmo assim, em hipótese de conflito de repercussão maior, o que
não seria o caso, em se tratando de cobrança de tributo - IPVA relativamente a veículos de propriedade de
empresa pública, pessoa jurídica de direito privado. Após, o julgamento foi suspenso com o pedido de
vista do Min. Eros Grau.
ACO 765 QO/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 7.4.2005. (ACO-765)
Ação Popular: Hipótese Reservada a ADI por Omissão
O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em reclamação proposta pelo
Procurador-Geral da República contra a tutela antecipada deferida nos autos de ação popular, pela qual se
determinara às autoridades nomeadas na inicial — Presidentes da República, do Senado, da Câmara e do
STF — a tomada de providência quanto à limitação dos vencimentos e proventos dos agentes políticos, de
acordo com a EC 19/98. Entendeu-se que a decisão contestada usurpara a competência do STF (CF, art.
102, I, l), porquanto a pretensão deduzida na ação popular objeto da reclamação se identificaria como a
própria de uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão, concorrendo a essa identificação tanto a
causa petendi — omissão de providências administrativas necessárias à efetividade do art. 29 da EC
19/98 — quanto o pedido — provimento mandamental que ordene a purga da mora denunciada.
Ressaltou-se que, tendo a Constituição previsto uma única via processual apta a alcançar determinado
provimento jurisdicional, enumerando taxativamente os legitimados para propô-la, a todos os demais
negou a iniciativa. Assim, a parte ilegítima para propor, no juízo competente, a única ação adequada, não
se tornaria legítima ao propô-la sob rótulo dissimulado e em juízo incompetente. Em conseqüência,
cassou-se a tutela concedida e, como medida adequada à observância da jurisdição da Corte (RISTF, art.
161, III), determinou-se a extinção da ação popular. Vencido o Min. Marco Aurélio, que julgava
improcedente o pedido.
Rcl 1017/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 7.4.2005. (Rcl-1017)
PRIMEIRA TURMA
Falso Advogado e Falta de Defesa Técnica
A defesa patrocinada por pessoa não inscrita na OAB é causa de nulidade do processo (Estatuto da
OAB, art. 4º: “São nulos os atos privativos de advogado praticados por pessoa não inscrita na OAB...”).
Com base nesse entendimento, a Turma deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus para
anular o processo que resultara na condenação do recorrente pelo crime de tráfico ilícito de entorpecentes
(Lei 6.368/76, arts. 12 e 14), a partir do interrogatório, inclusive, e determinar a expedição de alvará de
soltura. Considerou-se evidente a falta de defesa técnica, já que incontroverso o fato de a defesa ter sido
realizada, até a apelação, por falso advogado. Asseverou-se a impossibilidade de ratificação dos atos
processuais por aquele praticados (CPP, art. 568), haja vista se tratar de nulidade absoluta. Salientou-se o
prejuízo ao recorrente, consubstanciado na sua condenação. Precedentes citados: HC 76526/ PR (DJU de
15.12.2000); HC 71705/SP (DJU de 4.8.95); HC 61889/RJ (DJU de 16.11.84).
RHC 83800/RJ, rel. Min. Cezar Peluso, 5.4.2005. (RHC-83800)
SEGUNDA TURMA
Homicídio Culposo e Socorro à Vítima
Não se presta à exclusão da circunstância especial de aumento de pena, no homicídio culposo, a
alegação de que as lesões causaram a morte imediata da vítima. Com base nesse entendimento, a Turma
indeferiu habeas corpus em que se pretendia afastar da condenação do paciente a aplicação do § 4º do art.
121 do CP (“§ 4º. No homicídio culposo, a pena é aumentada de um terço, se o crime resulta de
inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato
socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em
flagrante. ...”), tendo em vista a morte instantânea da vítima. Considerou-se que o acusado tinha
condições de promover ou auxiliar no socorro da vítima, o que não fizera. Salientou-se, ainda, que não
cabia a ele proceder à avaliação quanto a eventual ausência de utilidade do socorro, e que tal interpretação
acabaria por esvaziar o sentido da referida regra, no que toca à reprovação da omissão do agente. Vencido
o Min. Celso de Mello, que deferia o writ por entender inaplicável a causa de aumento de pena no caso
concreto, e, conseqüentemente, declarava a extinção de punibilidade do paciente.
HC 84380/MG, rel. Min. Gilmar Mendes, 5.4.2005. (HC-84380)
Sursis Processual e Prazo de Revogação
A Turma, nos termos do art. 150, § 3º, do RISTF (“Art. 150. O Presidente da Turma terá sempre
direito a voto...§ 3º Nos habeas corpus e recursos em matéria criminal, exceto o recurso extraordinário,
havendo empate, prevalecerá a decisão mais favorável ao paciente ou réu.”), deferiu habeas corpus para
trancar ação penal, declarando extinta a punibilidade do paciente, por reconhecer a ilicitude da decisão do
juiz a quo que revogara sursis processual, concedido anteriormente, após expirado o respectivo prazo de
prova. No caso, o acusado descumprira uma das condições impostas pelo juízo durante o período do
sursis. Entendeu-se que a verificação do descumprimento dessas condições, após expirado o prazo do
sursis processual, não enseja a revogação do benefício, pois o § 3º do art. 89 da Lei 9.099/95 (“§ 3º A
suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou
não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano.”) só tem incidência no curso do prazo do sursis
processual, que, por sua vez, não está sujeito à prorrogação prevista no § 2º do art. 81 do CP para a
suspensão condicional da pena. Salientou-se que o emprego dessa prorrogação seria a aplicação de uma
analogia in malam partem, proibida no direito quando se trata de matéria de caráter penal. Vencidos os
Ministros Joaquim Barbosa e Carlos Velloso que indeferiam o writ por entender possível a revogação na
hipótese.
HC 84661/SP, rel. Min. Celso de Mello, 5.4.2005. (HC-84661)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
6.4.2005
5.4.2005
5.4.2005
Extraordinárias
7.4.2005
——
——
Julgamentos
44
108
147
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Opção de Nacionalidade e Requisitos (Transcrições)
(v. Informativo 381)
RE 418096/RS*
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: - CONSTITUCIONAL. NACIONALIDADE: OPÇÃO. C.F., ART. 12, I, c, COM A EMENDA
CONSTITUCIONAL DE REVISÃO Nº 3, DE 1994. I. – São brasileiros natos os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro
ou de mãe brasileira, desde que venham a residir no Brasil e optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira. II. – A
opção pode ser feita a qualquer tempo, desde que venha o filho de pai brasileiro ou de mãe brasileira, nascido no estrangeiro,
a residir no Brasil. Essa opção somente pode ser manifestada depois de alcançada a maioridade. É que a opção, por decorrer
da vontade, tem caráter personalíssimo. Exige-se, então, que o optante tenha capacidade plena para manifestar a sua vontade,
capacidade que se adquire com a maioridade. III. – Vindo o nascido no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, a
residir no Brasil, ainda menor, passa a ser considerado brasileiro nato, sujeita essa nacionalidade a manifestação da vontade
do interessado, mediante a opção, depois de atingida a maioridade. Atingida a maioridade, enquanto não manifestada a
opção, esta passa a constituir-se em condição suspensiva da nacionalidade brasileira. IV. – Precedente do STF: AC 70QO/RS, Ministro Sepúlveda Pertence, Plenário, 25.9.03, “DJ” de 12.3.04. V. – RE conhecido e não provido.
RELATÓRIO: - O acórdão recorrido, proferido pela Terceira Turma do Eg. Tribunal Regional Federal da 4ª Região, está assim
ementado:
“CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. OPÇÃO DE NACIONALIDADE. REQUISITOS. PREENCHIMENTO.
ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA.
1. Mantida a sentença que extinguiu o processo sem julgamento de mérito com base no art. 267, IV, do CPC, pois
sendo os autores menores impúberes, absolutamente incapazes, a demanda deveria ter sido ajuizada pelos seus
representantes, no caso, os pais.
2. A opção de nacionalidade, por outro lado, é questão personalíssima para a qual se exige capacidade plena, não
suprida pela representação dos pais. Logo, essencial a maioridade, não obstante a ausência de previsão constitucional.
3. Apelação improvida.” (Fl. 37-v)
Daí o RE, interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, fundado no art. 102, III, a, da Constituição Federal,
sustentando, em síntese, o seguinte:
a) ofensa ao art. 12, I, c, da Constituição, dado que o mencionado dispositivo não exige que o interessado atinja a
maioridade para que possa optar pela nacionalidade brasileira;
b) necessidade de concessão da nacionalidade brasileira aos recorrentes para que possam exercitar todos os direitos
fundamentais inerentes à pessoa humana, valendo salientar que o registro provisório, a despeito de amenizar os óbices causados pela
legislação nacional aos estrangeiros residentes no Brasil, não assegura a crianças e adolescentes todas as oportunidades e facilidades
conferidas aos nacionais.
Admitido o recurso, subiram os autos.
A Procuradoria-Geral da República, em parecer lavrado pelo ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner de
Castro Mathias Netto, opinou pelo não-provimento do recurso.
Autos conclusos em 26.5.2004.
É o relatório.
VOTO: Destaco do parecer da Procuradoria-Geral da República, fls. 57-58, lavrado pelo ilustre Subprocurador-Geral, Dr. Wagner
de Castro Mathias Neto:
“(...)
Alega o recorrente contrariedade ao Artigo 12, inciso I, c, porquanto a maioridade dos demandantes não seria
exigível para o reconhecimento definitivo da nacionalidade.
O pleito não merece acolhida.
De fato, não há como negar que o texto constitucional, após alterado, deixou estabelecida a liberdade do indivíduo
em exercer a opção de nacionalidade antes mesmo de completar a maioridade.
Existem, entretanto, peculiaridades inerentes ao caso capazes de afastar a aplicação da regra.
Se a opção decorre unicamente da vontade do optante, subentende-se daí seu caráter personalíssimo, a ser
manifestado por indivíduo atribuído de capacidade civil plena.
O momento da fixação da residência no País constitui o fator gerador da nacionalidade, que fica sujeita a uma
condição confirmativa, qual seja, a opção.
Assim, parece-nos mais sensato aguardar que os menores, hoje considerados brasileiros natos, possam requerer a
nacionalidade, convictos de sua escolha.
Ademais, não se vislumbra na espécie a ocorrência de qualquer dano que enseje, no momento, o reconhecimento
definitivo da nacionalidade.
Do exposto, opina o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL pelo desprovimento do recurso.
(...).” (Fls. 57-58)
O acórdão, vimos de ver, decidiu no sentido de que a opção de nacionalidade, por ser questão personalíssima, “exige
capacidade plena, não suprida pela representação dos pais. Logo, essencial a maioridade, não obstante a ausência de previsão
constitucional”.
A Constituição de 1988, vigente, dispõe, no art. 12, I, c, com a redação introduzida pela Emenda Constitucional de Revisão
nº 3, de 1994:
“Art. 12. São brasileiros: (ECR nº 3/94 e EC nº 23/99)
I – natos:
c) – os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que venham a residir na República
Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira;”
..................................
Na CF/1946, a matéria era assim tratada:
“Art. 129 – São brasileiros:
I. ...................................
II. Os filhos de brasileiro ou brasileira, nascidos no estrangeiro, se os pais estiveram a serviço do Brasil, ou, não
estando, se vierem a residir no país. Neste caso, atingida a maioridade, deverão, para conservar a nacionalidade brasileira,
optar por ela, dentro de quatro anos;”
..................................
A Constituição de 1967, com a EC 1/69, dispunha da seguinte forma:
“Art. 145. São brasileiros:
I. – natos:
............................
c) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, embora não estejam estes a serviço do Brasil,
desde que registrados em repartição brasileira competente no exterior ou, não registrados, venham a residir no território
nacional antes de atingir a maioridade; neste caso, alcançada esta, deverão, dentro de quatro anos, optar pela
nacionalidade brasileira;”
Na CF/1946, art. 129, II, residindo no Brasil o nascido no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, deveria, para
conservar a nacionalidade brasileira, optar por ela, dentro de quatro anos da maioridade.
A Constituição anterior, CF/67, art. 145, I, c, estabelecia duas hipóteses: a) o filho de pai brasileiro ou mãe brasileira, nascido
no estrangeiro, desde que registrado na repartição brasileira competente no exterior, seria brasileiro nato; b) não registrado na
repartição brasileira no exterior, vindo a residir no Brasil antes de atingida a maioridade, deveria, dentro de quatro anos desta, optar
pela nacionalidade brasileira.
A maioridade, no caso, seria a de direito privado, 21 (vinte e um) anos, mais benéfica.
A CF/1988, vigente, art. 12, I, c, inovou:
É brasileiro nato o nascido no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que venha a residir no Brasil e opte, em
qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira.
Não exige a CF/88, está-se a ver, que a opção pela nacionalidade brasileira se faça nos quatro anos da maioridade. É dizer, a
opção pode ser feita a qualquer tempo, desde que venha o filho de pai brasileiro ou de mãe brasileira, nascido no estrangeiro, a
residir no Brasil.
Certo, entretanto, que essa opção somente pode ser manifestada depois de alcançada a maioridade. É que a opção, por
decorrer da vontade do optante, apresenta, bem decidiu o acórdão recorrido, caráter personalíssimo. Exige-se, então, que o optante
tenha capacidade plena para manifestar a sua vontade. Essa capacidade plena somente se adquire com a maioridade, que há de ser de
direito civil. Esclareça-se, entretanto, que, vindo o nascido no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, a residir no Brasil,
ainda menor, passa a ser considerado brasileiro nato, sujeita essa nacionalidade à manifestação da vontade do interessado, vale dizer,
à opção pela nacionalidade brasileira, depois de atingida a maioridade. Atingida a maioridade, enquanto não manifestada a opção,
esta passa a constituir-se em condição suspensiva da nacionalidade brasileira.
Assim decidiu o Supremo Tribunal Federal na AC 70-QO/RS, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, portando o acórdão a
seguinte ementa:
“EMENTA: I. Nacionalidade brasileira de quem, nascido no estrangeiro, é filho de pai ou mãe brasileiros, que
não estivesse a serviço do Brasil: evolução constitucional e situação vigente.
1. Na Constituição de 1946, até o termo final do prazo de opção – de quatro anos, contados da maioridade –, o
indivíduo, na hipótese considerada, se considerava, para todos os efeitos, brasileiro nato sob a condição resolutiva de que
não optasse a tempo pela nacionalidade pátria.
2. Sob a Constituição de 1988, que passou a admitir a opção ‘em qualquer tempo’ – antes e depois da ECR 3/94, que
suprimiu também a exigência de que a residência no País fosse fixada antes da maioridade, altera-se o status do indivíduo
entre a maioridade e a opção: essa, a opção - liberada do termo final ao qual anteriormente subordinada –, deixa de ter a
eficácia resolutiva que, antes, se lhe emprestava, para ganhar – desde que a maioridade a faça possível – a eficácia de
condição suspensiva da nacionalidade brasileira, sem prejuízo – como é próprio das condições suspensivas -, de gerar
efeitos ex tunc, uma vez realizada.
3. A opção pela nacionalidade, embora potestativa, não é de forma livre: há de fazer-se em juízo, em processo de
jurisdição voluntária, que finda com a sentença que homologa a opção e lhe determina a transcrição, uma vez acertados os
requisitos objetivos e subjetivos dela.
4. Antes que se complete o processo de opção, não há, pois, como considerá-lo brasileiro nato.
II. Extradição e nacionalidade brasileira por opção pendente de homologação judicial: suspensão do processo
extradicional e prisão domiciliar.
5. Pendente a nacionalidade brasileira do extraditando da homologação judicial ex tunc da opção já manifestada,
suspende-se o processo extradicional (CPrCiv art. 265, IV, a).
6. Prisão domiciliar deferida, nas circunstâncias, em que se afigura densa a probabilidade de homologar-se a
opção.” (“DJ” de 12.3.2004)
Destaco do voto do Relator, eminente Ministro Sepúlveda Pertence:
“(...)
A partir daí, alterou-se, e corretamente, a leitura da doutrina.
Já não se podia conceber uma nacionalidade nata sob condição resolutiva potestativa, sem limite temporal.
Por isso – antes ou depois da ECR 3/94, que, de sua vez, suprimiu também a exigência de que a residência no Brasil
fosse fixada antes da maioridade, a opção – liberada do termo final ao qual anteriormente subordinada –, deixa de ter a
eficácia resolutiva que, antes, se lhe emprestava, para ganhar – desde que a maioridade a faça possível – a eficácia de
condição suspensiva da nacionalidade brasileira, sem prejuízo – como é próprio das condições suspensivas –, de gerar
efeitos ex tunc, uma vez realizada (v.g., José Afonso da Silva – Direito Constitucional Positivo, 22ª ed., Malheiros, 2003, p.
327; Francisco X. S. Guimarães – Nacionalidade – aquisição, perda e reaquisição, Forense, 2002, p. 36; Wilba Maia
Bernardes – Da Nacionalidade, Del Rey, 1996, p. 171; Alexandre de Moraes – Constituição do Brasil Interpretada, 2ª ed.,
Atlas, 2003, p. 517; José Roberto F. Gouveia, Nota sobre a transcrição do termo de nascimento..., RT 685/252, 254; Cíntia
Burhal de Nina – A capacidade civil como requisito subjetivo para a opção de nacionalidade (RDCI, ed. RT, 40/292).
Nelson Jobim, quando relator da revisão constitucional de 1993, da qual resultou o texto da ECR 3/94, vigente,
retratou com precisão a communis opinio doctorium (cf., Alexandre de Moraes, ob. cit., p. 518):
‘A opção pode agora ser feita a qualquer tempo. Tal como nos regimes anteriores, até a maioridade, são
brasileiros esses indivíduos. Entretanto, como a norma não estabelece mais prazo, podendo a opção ser efetuada a
qualquer tempo, alcançada a maioridade essas pessoas passam a ser brasileiras sob condição suspensiva, isto é,
depois de alcançada a maioridade, até que optem pela nacionalidade brasileira, sua condição de brasileiro nato fica
suspensa. Nesse período o Brasil os reconhece como nacionais, mas a manifestação volitiva do Estado torna-se
inoperante até a realização do acontecimento previsto, a opção. É lícito considerá-los nacionais no espaço de tempo
entre a maioridade e a opção, mas não podem invocar tal atributo porque pendente da verificação da condição.’
Certo a opção é condição potestativa, porque, em termos substanciais, depende unicamente da vontade do optante
que reúna os pressupostos constitucionais de sua validade e eficácia, é dizer, a filiação de brasileiro ou brasileira, a
residência no País e a maioridade.
Não é, porém, de forma livre: há de fazer-se em juízo, em processo de jurisdição voluntária, que finda com a sentença
que homologa a opção e lhe determina a transcrição, uma vez acertados os requisitos objetivos e subjetivos dela.
(...).”
Assim posta questão conheço do recurso e lhe nego provimento.
.
* acórdão pendente de publicação
Justiça estadual - Ingresso da União no processo - Deslocamento da causa para a Justiça Federal
(Transcrições)
AI 514634/RJ*
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
EMENTA: JUSTIÇA FEDERAL. REGRA DE COMPETÊNCIA FUNDADA EM MATRIZ CONSTITUCIONAL.
CARÁTER ABSOLUTO DA COMPETÊNCIA “RATIONE PERSONAE” DA JUSTIÇA FEDERAL COMUM (CF, ART.
109, I). IMPOSSIBILIDADE DE A JUSTIÇA LOCAL RECONHECER, OU NÃO, EM DETERMINADA CAUSA, A
EXISTÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO DA UNIÃO FEDERAL (OU DE AUTARQUIAS E EMPRESAS PÚBLICAS
FEDERAIS). RECURSO IMPROVIDO.
- O ingresso da União Federal numa causa, vindicando posição processual definida (RTJ 46/73 - RTJ 51/242), gera a
incompetência absoluta da Justiça local (RT 505/109), pois não se inclui, na esfera de atribuições jurisdicionais dos
magistrados e Tribunais estaduais, o poder para aferir a legitimidade do interesse da União Federal em determinado processo
(RTJ 93/1291 - RTJ 95/447 – RTJ 101/419). A legitimidade do interesse manifestado pela União só pode ser verificada,
em cada caso ocorrente, pela própria Justiça Federal (RTJ 101/881), pois, para esse específico fim, é que ela foi instituída
(RTJ 78/398): para dizer se, na causa, há ou não interesse jurídico da União (RTJ 164/359-361, Rel. Min. CELSO DE
MELLO).
DECISÃO: O recurso extraordinário – a que se refere o presente agravo de instrumento – foi interposto contra decisão, que,
emanada do E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, acha-se consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 488):
“Ação proposta pela Clínica Nossa Senhora de Lourdes em face da Fundação de Seguridade Social - GEAP
objetivando haver crédito por serviços contratados e prestados e indenização por perdas e danos.
Requerimento da União Federal para que fosse admitida como assistida, bem como fosse declarada a
incompetência do juízo prolator da sentença com a remessa dos autos à Justiça Federal.
Segundo o artigo 5° da Lei 9469/97, a União poderá intervir nas causas em que tiver interesse e figurarem como
autoras ou rés as autarquias, as fundações públicas, as sociedade de economia mista e as empresas públicas federais.
Somente à Justiça Federal compete dizer se, em determinada causa, há ou não, interesse da União Federal, pois,
para esse fim específico, é que a Justiça Federal foi instituída: para dizer se, na causa, há ou não, interesse jurídico da
União (RTJ 78/398).
O ingresso da União Federal numa causa, vindicando posição processual definida (RTJ 46/73; RTJ 51/242;
RTJ 164/359) gera a incompetência absoluta da Justiça local (RT 505/109), pois não se inclui, na esfera de atribuições
jurisdicionais dos magistrados e tribunais estaduais, o poder para aferir e dizer da legitimidade do interesse da União
Federal, em determinado processo (RTJ 93/1291).
Matéria de ordem pública.
Competência absoluta apreciável em qualquer grau de jurisdição.
Anulação do processo instaurado perante a Justiça Estadual.
Remessa dos autos à Justiça Federal.” (grifei)
Em conseqüência da oposição de embargos infringentes, esse julgamento foi reafirmado pela colenda Corte judiciária local
(fls. 532):
“Embargos infringentes. Ação de conhecimento objetivando a cobrança de crédito oriundo de prestação de serviços
e indenização por perdas e danos, que, em sede de apelação, por maioria, teve sua competência deslocada para a Justiça
Federal ante a manifestação da União de interesse na causa. Voto vencido, reconhecendo a competência da Justiça
Estadual. Preclusão não verificada, pois, sendo a competência absoluta, matéria de ordem pública, pode ser apreciada, de
ofício, em qualquer grau de jurisdição. Inteligência do art. 113, ‘caput’, do CPC. Jurisprudência pacificada no sentido de
que compete à Justiça Federal cogitar da existência ou inexistência de interesse da União. Recurso improvido.” (grifei)
Assinalo que essa decisão foi mantida em sede de embargos de declaração (fls. 542/543).
O exame das decisões em causa revela que a orientação firmada nos julgamentos mencionados ajusta-se, com absoluta
exatidão, à jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal consagrou na matéria em análise (RTJ 101/881 – RTJ 121/691 - RTJ
149/890 – RTJ 163/1114-1115 – RTJ 177/415-416, v.g.).
O v. acórdão ora recorrido, emanado do E. Tribunal de Justiça local, reconhecendo o caráter absoluto da competência
constitucional da Justiça Federal (CF, art. 109, I) - e afastando, em conseqüência, a alegada ocorrência, na matéria, de preclusão
“pro judicato” (CPC, art. 113, “caput”) -, assinalou que a intervenção da União Federal basta, por si só, para deslocar a causa para o
âmbito da Justiça Federal.
Impende acentuar, neste ponto, que cabe à Justiça Federal, e somente a esta, “dizer se há, na causa, interesse da União,
apto a deslocar o processo da justiça comum para sua esfera de competência” (RT 541/263).
Na realidade, a legitimidade do interesse manifestado pela União só pode ser verificada, em cada caso ocorrente, pela
própria Justiça Federal (RTJ 101/881), pois, para esse específico fim, é que a Justiça Federal foi instituída: para dizer se, na
causa, há, ou não, interesse jurídico da União, ou de autarquia federal, ou, ainda, de empresa pública federal (RTJ 78/398).
Daí a precisa observação do eminente Ministro ATHOS GUSMÃO CARNEIRO (“Jurisdição e Competência”, p.
149/150, item n. 109, 11ª ed., 2001, Saraiva), cujo magistério assinala a imprescindibilidade do deslocamento da causa para a
Justiça Federal, sempre que a União Federal, autarquias federais ou empresas públicas federais, manifestando interesse jurídico,
ingressarem em processo instaurado perante o Poder Judiciário local:
“Se uma demanda foi ajuizada perante a Justiça comum, e a União ou ente público federal manifesta interesse (deve
ser necessariamente um interesse ‘jurídico’) em nela ingressar como ‘assistente’ (tanto litisconsorcial como assistente
simples), ou apresenta ação de ‘oposição’ (CPC, art. 56), ou a lide é ‘denunciada’ à União ou ente público federal (...),
caberá ‘ao juiz federal’ (e não ao juiz da causa) apreciar conclusivamente da legitimidade do pedido de intervenção ou de
oposição, e aceitá-lo ou não.
.......................................................
Se o magistrado federal entende inexistir interesse da União na causa, denegando, v.g., a denunciação da lide à
União Federal ou excluindo do processo o ente federal, determinará a devolução ou a remessa dos autos ao juízo estadual;
e o eventual reexame dessa decisão caberá mediante agravo ao Tribunal Regional Federal.” (grifei)
Cumpre enfatizar que esse entendimento tem o beneplácito jurisprudencial desta Suprema Corte:
“O ingresso da União Federal numa causa, vindicando posição processual definida (RTJ 46/73 - RTJ 51/242), gera
a incompetência absoluta da Justiça local (RT 505/109), pois não se inclui, na esfera de atribuições jurisdicionais dos
magistrados e Tribunais estaduais, o poder para aferir a legitimidade do interesse da União Federal em determinado
processo (RTJ 93/1291 - RTJ 95/447 – RTJ 101/419). A legitimidade do interesse manifestado pela União só pode ser
verificada, em cada caso ocorrente, pela própria Justiça Federal (RTJ 101/881), pois, para esse específico fim, é que ela foi
instituída (RTJ 78/398): para dizer se, na causa, há ou não há interesse jurídico da União.”
(RTJ 164/359-361, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Não custa rememorar, neste ponto, que a inobservância, pelos órgãos do Poder Judiciário dos Estados-membros, da
cláusula constitucional de competência da Justiça Federal (CF, art. 109, I) revela-se comportamento processual eivado de
insanável defeito jurídico, tanto que, quando ocorrente, autoriza, até mesmo, a própria invalidação da autoridade da coisa julgada
(CPC, art. 485, II). Por isso mesmo, e registrando-se tal hipótese, revelar-se-á possível, à parte interessada, consoante adverte
ARRUDA ALVIM (“Manual de Direito Processual Civil”, vol. 1/293, item n. 103, 5ª ed., 1996, RT), “o uso da ação rescisória
contra a sentença prolatada por juiz não federal, quando se desobedeça à regra absoluta do regime jurídico da competência a ela
pertinente...” (grifei).
Somente a Justiça Federal, desse modo, pode dizer se a União é, ou não, interessada na causa (Súmula 150/STJ). Com a
intervenção da União (ou de autarquia federal, ou, ainda, de empresa pública federal), desloca-se, desde logo, a competência para
a Justiça Federal comum (RTJ 167/1018), à qual caberá aceitá-la ou recusá-la (RTJ 108/391 - RTJ 121/286 - RTJ 134/843). Se a
recusar, o processo retornará à Justiça estadual, para que prossiga na causa (RSTJ 45/28).
Em suma: esta Suprema Corte, em reiteradas decisões, tem enfatizado que compete, unicamente, à Justiça Federal,
“emitir juízo de valor sobre o interesse manifestado pela União” (RE 140.480/RJ, Rel. Min. CARLOS VELLOSO), cabendo-lhe,
por isso mesmo, “avaliar a realidade, ou não, desse interesse” (RE 197.628/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA), pois a Justiça
Federal foi instituída, precisamente, para dizer se existe, ou não, na causa, interesse jurídico da União Federal (RTJ 78/398 - RTJ
99/1382 - RTJ 164/359).
O que se evidencia irrecusável, no caso ora em exame, é que a União Federal, de maneira expressa e inequívoca,
manifestou interesse jurídico apto a legitimar-lhe, ao menos em tese, a intervenção processual na causa, especificando, de modo
concreto, a razão justificadora dessa pretensão.
Essa circunstância - considerada a regra de competência absoluta definida no art. 109, I, da Constituição - impunha o
deslocamento da causa, na espécie ora em exame, para a Justiça Federal, cabendo a esta, e não ao Tribunal de Justiça local,
dizer da existência, ou não, do interesse jurídico da União Federal no processo, consoante orientação consagrada na jurisprudência
do Supremo Tribunal Federal (RTJ 164/359-361, Rel. Min. CELSO DE MELLO - RTJ 96/846, Rel. Min. MOREIRA ALVES RTJ 108/391, Rel. Min. FRANCISCO REZEK - RTJ 187/1080, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, v.g.).
Concluindo: revela-se incensurável o v. acórdão, que, emanado do E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro,
determinou, corretamente, o deslocamento da causa para a esfera de competência da Justiça Federal, considerado o ingresso
formal, no processo instaurado perante o Poder Judiciário local, da União Federal.
Sendo assim, e tendo em consideração as razões ora expostas, nego provimento ao presente agravo de instrumento, eis que
se revela inviável o recurso extraordinário a que ele se refere.
Publique-se.
Brasília, 08 de abril de 2005.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
* decisão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 383
Brasília, 11 a 15 de abril de 2005 Nº 383
Data (páginas internas): 20 de abril de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
EC 45/2004: Conselho Nacional de Justiça - 1 a 5
Reclamação: Demarcação de Terras Indígenas e Conflito Federativo
Contribuições Sindicais e Vício Formal
1ª Turma
Decisão Absolutória do Júri. Instauração de Nova Ação Penal. Coisa Julgada - 2
2ª Turma
Progressão de Regime e Crime Hediondo
Direito de Recorrer em Liberdade - 2
Interposição de Recurso e Falta de Assinatura de Advogado
Transcrições
Ação Popular: Hipótese Reservada à ADI por Omissão (Rcl 1017/SP)
PLENÁRIO
EC 45/2004: Conselho Nacional de Justiça - 1
O Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta de
inconstitucionalidade ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB contra os artigos 1º e
2º da EC 45/2004, que estabelecem normas relativas ao Conselho Nacional de Justiça - CNJ. A requerente
alegava que a instituição do CNJ, voltado ao controle da atuação administrativa e financeira do Judiciário
e do cumprimento dos deveres funcionais dos magistrados, composto por membros na origem alheios ao
mesmo Poder, ofenderia o princípio da separação e da independência dos poderes (CF, art. 2º) e também
o pacto federativo (CF, arts. 18, 25 e 125), na medida em que submeteu os órgãos do Poder Judiciário dos
Estados a uma supervisão administrativa, orçamentária, financeira e disciplinar por órgão da União.
Sustentava ainda, em relação ao art. 103-B, § 4º, III, introduzido pela mesma Emenda, que teria havido
afronta ao § 2º do art. 60 da CF, já que a expressão “perda do cargo”, contida no texto vindo da Câmara
dos Deputados, ao ser suprimida do texto aprovado no Senado Federal, deveria ser submetida à
reapreciação da primeira Casa legislativa. Preliminarmente, por unanimidade, afastou-se o vício formal de
inconstitucionalidade da norma em questão, suscitado pela Advocacia-Geral da União — consistente na
impossibilidade jurídica dos pedidos, porque deduzidos antes da publicação oficial da Emenda —, haja
vista que a publicação superveniente da mesma corrigiu a carência original da ação. Também por
unanimidade, não se conheceu do pedido declaratório de inconstitucionalidade do art. 125, § 8º, tendo em
conta a inexistência de tal dispositivo no texto da Emenda impugnada afinal promulgado.
ADI 3367/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 13.4.2005. (ADI-3367)
EC 45/2004: Conselho Nacional de Justiça - 2
No mérito, inicialmente, afastou-se a apontada violação ao art. 2º da CF. Remontando à matriz
histórica e à evolução da doutrina política que inspiraram nosso sistema constitucional da separação dos
Poderes, afirmou-se que o constituinte desenhou a estrutura institucional desses Poderes de forma a
garantir-lhes a independência no exercício das funções típicas, por meio da previsão de autonomia
orgânica, administrativa e financeira, temperando-a, no entanto, com a prescrição de outras atribuições,
muitas de controle recíproco, cujo conjunto forma um sistema de integração e cooperação preordenado a
assegurar equilíbrio dinâmico entre os órgãos, em benefício da garantia da liberdade, consistindo esse
quadro normativo em expressão natural do princípio na arquitetura política dos freios e contrapesos. Com
base nisso, esclareceu-se que o CNJ é órgão próprio do Poder Judiciário (CF, art. 92, I-A), composto, na
maioria, por membros desse mesmo Poder (CF, art. 103-B), nomeados sem interferência direta dos outros
Poderes, dos quais o Legislativo apenas indica, fora de seus quadros e, assim, sem vestígios de
representação orgânica, dois dos quinze membros, não podendo essa indicação se equiparar a nenhuma
forma de intromissão incompatível com a idéia política e o perfil constitucional da separação e
independência dos Poderes. Salientou-se, ademais, que a composição híbrida do CNJ não compromete a
independência interna e externa do Judiciário, porquanto não julga causa alguma, nem dispõe de
atribuição, de nenhuma competência, cujo exercício interfira no desempenho da função típica do
Judiciário, a jurisdicional. Levando em conta as atribuições conferidas ao Conselho — controle da
atividade administrativa e financeira do Judiciário e controle ético-disciplinar de seus membros —
assentou-se que a primeira não atinge o autogoverno do Judiciário, visto que, da totalidade das
competências privativas dos tribunais (CF, art. 96), nenhuma lhes foi usurpada, e que a segunda não
acarreta imparcialidade jurisdicional, eis que representa expressiva conquista do Estado democrático de
direito a consciência de que os mecanismos de responsabilização dos juízes, por inobservância das
obrigações funcionais, são imprescindíveis à boa prestação jurisdicional, sendo de reconhecer, como
imperativo do regime republicano e da inteireza e serventia da função, a necessidade de convívio
permanente entre a independência jurisdicional e instrumentos de responsabilização dos juízes que não
sejam apenas formais, mas que cumpram, com efetividade, o papel que se lhes predica. Acrescentou-se
que a existência, no Conselho, de membros alheios ao corpo da magistratura, além de viabilizar a
erradicação do corporativismo, estende uma ponte entre o Judiciário e a sociedade, permitindo a
oxigenação da estrutura burocrática do Poder e a resposta a críticas severas.
ADI 3367/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 13.4.2005. (ADI-3367)
EC 45/2004: Conselho Nacional de Justiça - 3
Da mesma forma, julgou-se improcedente a alegada violação ao pacto federativo. Ressaltou-se que
este, em relação ao Poder Judiciário, se expressa de forma normativa diversa da que atua sobre os demais
Poderes, pois a Jurisdição, enquanto manifestação da unidade do poder soberano do Estado, é una e
indivisível, sendo doutrina assente que o Poder Judiciário tem caráter nacional, consistindo a divisão da
estrutura judiciária brasileira, sob equívoca denominação, em “Justiças”, como resultado tão-só da
repartição racional do trabalho da mesma natureza entre distintos órgãos jurisdicionais. Considerou-se
que o CNJ reúne as características palpáveis de órgão federal, enquanto representativo do Estado unitário,
formado pela associação das unidades federadas. Não é órgão da União, mas sim do Poder Judiciário
nacional, não havendo que se falar, assim, em supervisão administrativa, orçamentária, financeira e
disciplinar dos órgãos judiciários estaduais por órgão da União. Assentou-se, ainda, que a composição do
Conselho reverencia e contempla as duas esferas federativas dotadas de “Justiças”, a União e os Estados-
membros, os quais contam com representantes das respectivas magistraturas (CF, art. 103-B, I a IX).
Concluiu-se que o Conselho não anula, mas reafirma o princípio federativo.
ADI 3367/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 13.4.2005. (ADI-3367)
EC 45/2004: Conselho Nacional de Justiça - 4
Rechaçou-se, também, a mencionada inconstitucionalidade formal do art. 103-B, § 4º, III,
porquanto, não obstante a retirada, no Senado, da expressão “perda do cargo”, o texto residual, aprovado
em ambas as Casas legislativas, teria mantido intacto o sentido nomológico, dada sua perceptível
autonomia semântica. Além disso, afirmou-se que a inclusão do poder de ordenar a perda do cargo de
magistrado vitalício, como atribuição do Conselho, é que poderia consubstanciar inconstitucionalidade,
ante a previsão do inciso I do art. 95 da CF, que restringe, de forma taxativa, as hipóteses em que é
possível a perda, nada valendo, por essa razão, a submissão da expressão suprimida ao escrutínio da
Câmara dos Deputados. Por fim, quanto ao aditamento à inicial, em que se impugnava a proposta de
acréscimo de mais um parágrafo ao art. 103-B da CF, pendente de apreciação na Câmara, dispondo sobre
vedações aos membros do Conselho, referidos nos incisos XII e XIII do mesmo artigo, de cumulação com
outras atividades durante o exercício do mandato, afastou-se a apontada violação ao princípio isonômico,
consistente na premissa de que a falta de norma semelhante no corpo da Emenda significaria que as
vedações propostas não se aplicariam aos advogados e cidadãos integrantes do Conselho, tendo em vista
que a pendência da proposta voltada a incorporar aqueles impedimentos à ordem constitucional não
implica que a eles não estejam sujeitos os referidos membros, bastando juízo analógico baseado nos
artigos 95, parágrafo único, e 127, § 5º, II, da CF, para concluir-se que ninguém pode desempenhar
atividades incompatíveis com a função de membro do Conselho.
ADI 3367/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 13.4.2005. (ADI-3367)
EC 45/2004: Conselho Nacional de Justiça - 5
Em suma, com esses fundamentos, o Tribunal julgou, por maioria, totalmente improcedente o
pedido. Vencidos o Min. Marco Aurélio, que o julgava integralmente procedente; os Ministros Ellen
Gracie e Carlos Velloso, que o julgavam parcialmente procedente, para declarar a inconstitucionalidade
dos incisos X, XI, XII e XIII do art. 103-B e o Min. Sepúlveda Pertence, que o julgava procedente, em
menor extensão, dando pela inconstitucionalidade somente do inciso XIII do caput do art. 103-B.
ADI 3367/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 13.4.2005. (ADI-3367)
Reclamação: Demarcação de Terras Indígenas e Conflito Federativo
O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em reclamação para o efeito de
reconhecer sua competência para o julgamento de diversos feitos, dentre os quais uma ação popular em
trâmite perante a 1ª Vara da Seção Judiciária de Roraima, na qual se discutia a validade jurídica da
Portaria 820/98, do Ministério da Justiça, que demarcou a área indígena “Raposa Serra do Sol”.
Entendeu-se caracterizada a hipótese de conflito federativo prevista no art. 102, I, f, da CF (“Art. 102.
Compete ao Supremo Tribunal Federal...: I - processar e julgar, originariamente:... f) as causas e os
conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as
respectivas entidades da administração indireta;”), já que o objeto da citada ação popular, assim como os
feitos processuais dela originados, estariam colocando pessoas de estatura federativa, quais sejam, a
União e o Estado de Roraima, em posições temerariamente antagônicas. Ressaltou-se que a impugnação
da validade jurídica da referida Portaria acarretaria uma situação de desconsideração da competência
constitucional da União para efetuar os procedimentos de demarcação de áreas indígenas (CF, art. 231),
bem como uma lesão ao princípio da homogeneidade federativa, este a significar a “costura” da
conciliação possível de interesses entre pessoas que se dotam de autonomia política. Por fim, em razão da
edição da Portaria 534/2005, também do Ministério da Justiça, por meio da qual a União alterou
substancialmente o disposto na Portaria 820/98, reconheceu-se a perda superveniente do objeto das ações
judiciais relacionadas pelo reclamante, tendo em conta que as mesmas impugnavam o ato normativo
modificado, e declarou-se a prejudicialidade dos agravos regimentais interpostos no bojo da reclamatória.
Vencidos os Ministros Marco Aurélio, Celso de Mello e Carlos Velloso que julgavam o pedido
improcedente, por considerar ser da competência do juízo da 1ª instância a ação popular, independente da
origem do ato impugnado. Precedente citado: Rcl 424/RJ (DJU de 6.9.96).
Rcl 2833/RR, rel. Min. Carlos Britto, 14.4.2005. (Rcl-2833)
Contribuições Sindicais e Vício Formal
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada por diversas confederações
de trabalhadores para declarar a inconstitucionalidade da Portaria 160/2004, do Ministro de Estado do
Trabalho e Emprego, que, disciplinando as contribuições instituídas pelos sindicatos em assembléia geral
da categoria, referindo-se à confederativa (CF, art. 8º, IV) e à assistencial (CLT, art. 513, e), dispõe, entre
outras coisas, a obrigatoriedade das contribuições em relação aos empregados sindicalizados,
determinando o desconto em folha de pagamento de salários quando fixadas as últimas em convenção ou
acordo coletivo e em sentença, exigindo a autorização do empregado não-associado, sob pena de sujeitarse o empregador à autuação administrativa, bem como impõe a cobrança de juros da mora e multa, caso
não recolhida a importância descontada no prazo nela estipulado. Entendeu-se que o ato normativo
questionado extrapola a competência conferida aos Ministros de Estado de expedir instruções para a
execução de leis, decretos e regulamentos (CF, art. 87, parágrafo único, II), a qual deve estar direcionada
ao funcionamento em si do Ministério, descabendo reconhecer ao Ministro de Estado alçada para definir a
espécie de instrumento própria à previsão de contribuição, bem como consignar a finalidade desta última.
Salientou-se, também, que referida portaria, ao dispor sobre a contribuição prevista na alínea e do art. 513
da Consolidação das Leis do Trabalho — estabelecendo a necessidade de previsão em convenção ou
acordo coletivo e destinação do que arrecadado ao custeio de atividades assistenciais, a melhoria e ao
crescimento sindical, além de viabilizar a participação nas negociações por melhores condições de
trabalho —, acabou por aditar a CLT, invadindo campo reservado ao legislador. No que se refere à
exigência de notificação do valor das contribuições e à necessidade da prévia e expressa autorização do
empregado não-associado para desconto em folha, considerou-se que se introduziu exigência estranha ao
art. 513, e, da CLT, salientando-se que o art. 545 desse diploma, ao estabelecer a necessidade de
autorização, refere-se a mensalidades devidas ao sindicato, e não à contribuição sindical de que cuida
aquele dispositivo.
ADI 3206/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 14.4.2005. (ADI-3206)
PRIMEIRA TURMA
Decisão Absolutória do Júri. Instauração de Nova Ação Penal. Coisa Julgada - 2
A Turma retomou julgamento de habeas corpus em que se pretende o trancamento de ação penal
instaurada contra dois pacientes, autor material e partícipe, denunciados pela prática de homicídio
qualificado, sob a alegação de ofensa à coisa julgada. Em decorrência de desmembramento do processo, o
denunciado por participação fora julgado antes do acusado como autor material do delito, tendo sido
absolvido pelo Conselho de Sentença, que acatara a tese de negativa de participação. O denunciado como
autor material, após o trânsito em julgado dessa decisão, retratara-se, no Júri, da versão até então
sustentada, passando a negar a autoria do crime, imputando esta ao outro co-réu, o que, reconhecido pelo
Conselho de Sentença, implicara sua absolvição, decisão também transitada em julgado. Posteriormente,
o Ministério Público, denunciando-os pelo mesmo fato, invertera as acusações de autoria e participação
— v. Informativo 369. O Min. Eros Grau proferiu voto-vista no sentido de deferir o writ, em parte, para
tornar nula a decisão que recebera a segunda denúncia contra o acusado, ao qual, anteriormente, fora
imputada a participação. Considerando que, quando do julgamento deste, o júri, ao responder dois
quesitos, afirmara por unanimidade que terceira pessoa que não o réu disparara contra a vítima e que este
não participara da conduta daquela, entendeu que, assim, o réu teria sido absolvido tanto da autoria
quanto da participação e que nova pretensão punitiva instaurada pelo Ministério Público, em relação ao
mesmo fato, violaria frontalmente a conclusão anterior do Júri. Após, pediu vista o Min. Cezar Peluso.
HC 82980/DF, rel. Min. Carlos Britto, 12.4.2005. (HC-82980)
SEGUNDA TURMA
Progressão de Regime e Crime Hediondo
A Turma indeferiu, por maioria, habeas corpus em que se pretendia a progressão de regime
aplicado a condenado pela prática de latrocínio, haja vista a omissão do advérbio “integralmente” na
sentença condenatória. Inicialmente, também por maioria, rejeitou-se a proposta formulada pelo Min.
Gilmar Mendes, acompanhada pelo Min. Joaquim Barbosa, no sentido de sobrestar o feito até o
julgamento, pelo Plenário, do HC 82959/SP — no qual se discute a constitucionalidade do § 1º do art. 2º
da Lei 8.072/90, que veda a possibilidade de progressão do regime de cumprimento da pena nos crimes
hediondos definidos no art. 1º da mesma Lei. Em seguida, considerou-se que o referido dispositivo ainda
é constitucional, tendo em conta que este Tribunal ainda não reviu o seu entendimento quanto à
hediondez. Assim, nos termos da jurisprudência do STF, a menção feita ao §1º do art. 2º da Lei 8.072/90
basta para legitimar o cumprimento da pena em regime integralmente fechado, desde que se trate de delito
hediondo ou a ele equiparado. Vencido o Min. Gilmar Mendes que deferia o writ.
HC 85692/RJ, rel. Min. Celso de Mello, 12.4.2005. (HC-85692)
Direito de Recorrer em Liberdade - 2
A Turma concluiu julgamento de habeas corpus em que se requeria a nulidade de despacho que, em
sede de apelação, determinara a expedição de mandado de prisão contra o paciente, sob alegação de que a
sentença condenatória de primeiro grau, da qual não recorrera a acusação, assegurara-lhe o direito de
recorrer em liberdade até o trânsito em julgado da condenação — v. Informativo 336. Por maioria,
indeferiu-se o writ ao fundamento de ser possível ao tribunal de justiça revisar o momento da expedição
do mandado de prisão, mesmo com sentença de primeiro grau estabelecendo segregação depois do
trânsito em julgado, ainda que o Ministério Público não tenha recorrido desse ponto. Vencidos, em parte,
os Ministros Carlos Velloso, relator, e Gilmar Mendes que o deferiam para assegurar ao paciente o direito
de aguardar em liberdade até o trânsito em julgado da sentença condenatória.
HC 83500/PB, rel. orig. Min. Carlos Velloso, rel. p/ acórdão, Min. Nelson Jobim, 12.4.2005. (HC83500)
Interposição de Recurso e Falta de Assinatura de Advogado
A Turma, por maioria, deu provimento a agravo regimental interposto contra decisão monocrática
do Min. Joaquim Barbosa, relator, que, em virtude da falta de assinatura do advogado na petição de
recurso extraordinário, negara seguimento a agravo de instrumento. Entendeu-se que a jurisprudência do
STF quanto ao tema, de modelo defensivo, deveria ser superada, haja vista se tratar de mero erro material.
Ademais, asseverou-se que o advogado interveio imediatamente para suprir essa falta, que não há dúvida
quanto à sua identificação e que ele possui procuração nos autos. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa
e Ellen Gracie que, mantendo a jurisprudência, negavam provimento ao regimental por considerar que a
mencionada ausência de assinatura na petição de recurso extraordinário e nas suas razões não configuraria
irregularidade sanável, mas defeito que acarreta a inexistência do próprio recurso.
AI 519125 AgR/SE, rel. Min. Joaquim Barbosa, 12.4.2005. (AI-519125)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
13.4.2005
12.4.2005
12.4.2005
Extraordinárias
14.4.2005
——
——
Julgamentos
8
159
104
CLIPPING
DO
DJ
15 de abril de 2005
ADI N. 1.967-DF
RELATOR P/ ACÓRDÃO: MIN. NELSON JOBIM
EMENTA: CONSTITUCIONAL. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 14/96 E LEI Nº 9.424/96. FUNDO DE MANUTENÇÃO E
DESENVOLVIMENTO DO ENSINO FUNDAMENTAL E DE VALORIZAÇÃO DO MAGISTÉRIO. ATRIBUIÇÃO DE NOVA
FUNÇÃO À UNIÃO - REDISTRIBUTIVA E SUPLETIVA DA GARANTIA DE EQUALIZAÇÃO DE OPORTUNIDADES
EDUCACIONAIS. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO FEDERATIVO. NÃO FERIMENTO À AUTONOMIA ESTADUAL.
‘CAUSA PETENDI’ ABERTA, QUE PERMITE EXAMINAR A QUESTÃO POR FUNDAMENTO DIVERSO DAQUELE
ALEGADO PELO REQUERENTE. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE QUE NÃO SE MOSTRA POSSÍVEL,
PORQUE SE ATACARIA O ACESSÓRIO E NÃO O PRINCIPAL.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE NÃO CONHECIDA.
* noticiado no Informativo 143
ADI N. 2.763-PE
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Processo de escolha de desembargadores para composição do Tribunal
Regional Eleitoral de Pernambuco. 3. Impugnação da expressão “para o Tribunal Regional Eleitoral” contida no art. 277, caput, do
Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, que disciplina o processo de escolha de desembargadores para
a Direção da Escola Superior da Magistratura, para o Tribunal Regional Eleitoral e para a Comissão de Concurso de Juiz Substituto,
adotando como critério de escolha, na medida do possível, a antigüidade. 4. O processo de escolha dos desembargadores, para o fim
de composição dos Tribunais Regionais Eleitorais encontra disciplina no art. 120, § 1o, I, da Constituição, que prevê a seleção
mediante votação secreta. 5. O art. 121 da Constituição prevê, ademais, que lei complementar disporá sobre a organização e
competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais. Inconstitucionalidade da norma. 6. Precedentes: ADI(MC)
2011, Rel. Ilmar Galvão; ADI(MC) 2012, Rel. Marco Aurélio e ADI 2700, Rel. Min. Sydney Sanches. 7. Ação julgada procedente.
* noticiado no Informativo 367
MED. CAUT. EM ADI N. 3.352-DF
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Ação direta de inconstitucionalidade: ato normativo (MPr 225/04) susceptível de controle abstrato de
constitucionalidade, não obstante a limitação numérica dos seus destinatários e a breve duração de sua vigência.
II. Mineração em terras indígenas: alegação de inconstitucionalidade da MPr 225/04, por alegada violação dos arts. 231, § 3º,
e 49, XVI, da Constituição: carência de plausibilidade da argüição: medida cautelar indeferida.
1. É do Congresso Nacional a competência exclusiva para autorizar a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas
(CF, art. 49, XVI, e 231, § 3º), mediante decreto-legislativo, que não é dado substituir por medida provisória.
2. Não a usurpa, contudo, a medida provisória que - visando resolver o problema criado com a existência, em poder de dada
comunidade indígena, do produto de lavra de diamantes já realizada, disciplina-lhe a arrecadação, a venda e a entrega aos indígenas
da renda líquida resultante de sua alienação.
* noticiado no Informativo 372
MS N. 24.925-DF
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. AGRÁRIO. REFORMA AGRÁRIA: DESAPROPRIAÇÃO. IMÓVEL INVADIDO: NÃOCOMPROVAÇÃO.
I. - Imóvel invadido: situação configuradora da justificativa do descumprimento do dever de tornar produtivo o imóvel,
caracterizando a invasão força maior prevista no § 7º do art. 6º da Lei 8.629/93. No caso, entretanto, são controvertidos os fatos: os
supostos invasores, ou parte deles, seriam arrendatários do imóvel.
II. - Mandado de Segurança indeferido.
HC N. 84.680-PA
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: HABEAS CORPUS. PACIENTE DENUNCIADO POR HOMICÍDIO QUALIFICADO. ALEGADA NULIDADE DA
PRISÃO PREVENTIVA QUE FAZ REFERÊNCIA À REPERCUSSÃO NACIONAL DO CRIME, A CLAMOR PÚBLICO E À
GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA NA LOCALIDADE EM QUE O CRIME FOI COMETIDO.
No julgamento do HC nº 80.717, o Plenário deste Supremo Tribunal Federal reafirmou a ilegalidade da segregação, quando
embasada unicamente na gravidade do fato, na hediondez do delito ou no clamor público. Nesse julgado, a corrente que prevaleceu
registrou que o modo e a execução do crime, bem como a conduta do acusado antes e depois do delito, poderiam servir de respaldo
para legitimar a prisão preventiva com base na ordem pública. Para tanto, é preciso que se evidencie a intranqüilidade no meio
social que o réu, em liberdade, poderia causar.
Ainda sobre “a garantia da ordem pública”, os precedentes de ambas as Turmas desta colenda Corte, e mais recentemente o
Plenário, consignam a possibilidade de enquadrar-se nesse fundamento a prisão preventiva decretada com vistas a evitar que o
acusado pratique novos delitos, incluindo, aí, a incolumidade física das pessoas, sobretudo daquelas que querem colaborar com a
Justiça.
Aplicando os precedentes jurisprudenciais a este caso, é de se afastar prontamente as referências à “repercussão de âmbito nacional”
e “ao clamor público” enquanto fundamentos válidos à decretação da custódia do paciente. Resta, porém, um motivo que, pela
excepcionalidade do caso, é suficiente para manter a custódia do paciente. É que o decreto prisional deixa claro o temor das
testemunhas e a insegurança na localidade em que o crime foi cometido. Na espécie, a necessidade da custódia fica ainda mais
evidente quando o referido decreto menciona outro elemento agravador da situação, consistente no isolamento da localidade em que
o delito foi cometido e a pequena presença do Estado na região, conhecida pelos violentos conflitos fundiários.
Habeas corpus indeferido.
* noticiado no Informativo 374
HC N. 85.543-DF
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. DEFENSOR DATIVO. INTIMAÇÃO PESSOAL.
1. A jurisprudência da Corte é firme no sentido de que a prerrogativa processual da intimação pessoal prevista no art. 5º, § 5º, da Lei
nº 1.060/50 não se aplica ao defensor dativo, mas, tão-somente aos defensores públicos. Precedentes.
2. Ordem indeferida.
ADI N. 2.928-SP
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 10.331/99 DO ESTADO DE SÃO PAULO.
POSSIBILIDADE DE ESTACIONAMENTO EM LOCAIS PROIBIDOS. COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DA UNIÃO PARA
LEGISLAR SOBRE TRÂNSITO. VÍCIO FORMAL.
1. Lei estadual que autoriza veículos particulares e de aluguel a estacionarem em locais indevidos para a aquisição urgente de
medicamentos ou atendimento grave não encontra respaldo no texto constitucional.
2. Esta Corte, em pronunciamentos reiterados, assentou que a Constituição de 1988 conferiu exclusivamente à União a competência
para legislar sobre trânsito.
3. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado procedente.
* noticiado no Informativo 379
Ext. N. 893-REPÚBLICA FEDERAL DA ALEMANHA
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Extradição. 2. Inexistência de tratado entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República
Federal da Alemanha. 3. Processamento do pedido de acordo com a Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980. Requisitos formais
atendidos. 4. Extradição fundada em ordem de prisão preventiva expedida pelo Tribunal de Primeira Instância de Stuttgart,
Alemanha, por fraude qualificada. 5. Dupla tipicidade: correspondência do ato delituoso nas leis brasileira e alemã. 6. Inocorrência
de prescrição. 7. Extraditando processado no Brasil, por motivo diverso do pleito extradicional, por infração penal punível com pena
privativa de liberdade. 8. Poderá o Presidente da República, atendendo a razões de conveniência ao interesse nacional, ordenar a
imediata efetivação da extradição, apesar do processo penal instaurado, ou, até mesmo, se tiver ocorrido condenação (art. 67 e art.
89, in fine, Lei nº 6.815/80). 9. Bens apreendidos pela Polícia Federal em poder do extraditando, quando de sua prisão preventiva,
deverão ser entregues ao Estado requerente. 10. Ressalvada, entretanto, a reserva de quantia suficiente para que se satisfaçam os
créditos pretendidos nos autos. Artigo 92 da Lei 6.815/80. 11. Delegação de competência ao Juízo da Seção Judiciária do Rio
Grande do Norte para decidir sobre os pedidos de pagamento das dívidas do extraditando no Brasil. 12.Extradição deferida. 13.
Decisão unânime.
Ext. N. 943-REPÚBLICA ITALIANA
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Extradição: condenação por formação de quadrilha destinada ao tráfico de entorpecentes: requisitos formais satisfeitos:
inexistência de óbice legal (Súmula 421): deferimento, condicionada a entrega do extraditando ao disposto no art. 89 c/c art. 67 da
Lei 6.815/80.
HC N. 85.457-SP
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Habeas corpus: cabimento: direito probatório.
Não cabe o habeas corpus para solver controvérsia de fato dependente da ponderação de provas desencontradas; cabe, entretanto,
para aferir a idoneidade jurídica ou não das provas onde se fundou a decisão condenatória.
II. Roubo: chamada de co-réus: inidoneidade para restabelecer validade de confissão extrajudicial retratada em Juízo:
precedente (v.g., HC 84.517, 1ª T., j. 19.10.04, Pertence, DJ 19.11.04).
Não se pode restabelecer a validade da confissão extrajudicial, negando-se valor à retratação, com fundamento na delação dos coréus e porque o paciente deixou de “dar versão hábil para o seu envolvimento nos fatos”.
Insuficiência dos elementos restantes para fundamentar a condenação.
III. Quadrilha (C. Penal, art. 288): ausência de dados de fato a comprovarem, no caso, a associação de “mais de três pessoas”,
exigida para a configuração do delito de quadrilha (v.g., HC 81.260, Pleno, j. 14.11.01, Pertence, DJ 19.4.02).
Acórdãos Publicados: 310
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Ação Popular: Hipótese Reservada à ADI por Omissão (Transcrições)
(v. Informativo 382)
Rcl 1017/SP*
RELATOR: MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE
RELATÓRIO: Reclamação proposta pelo Procurador-Geral da República contra o deferimento de tutela deferida nos autos
da Ação Popular 98.0043117-9, pela qual se determinou às autoridades nomeadas na inicial - Presidentes da República, do Senado,
da Câmara e do Supremo Tribunal Federal - a tomada de providências quanto à limitação dos vencimentos e proventos dos agentes
políticos de acordo com a EC 19/98.
Deferi a liminar (f. 50/56) para suspender o processo da ação popular e os efeitos da antecipação de tutela até o julgamento
final desta reclamação. Eis o resumo da decisão:
“Reclamação: ação popular que, pela causa de pedir e pelo pedido de provimento mandamental formulado, parece
configurar hipótese reservada à ação direta de inconstitucionalidade por omissão de medidas administrativas, de
privativa competência originária do Supremo Tribunal: liminar deferida”. As informações foram prestadas (f.
118/123).
Esta a ementa do parecer do em. Procurador-Geral da República Cláudio Fonteles:
“RECLAMAÇÃO. ART. 102, I, l, CF. USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO STF PARA PROCESSAR E JULGAR
AÇÃO POPULAR AJUIZADA NA JUSTIÇA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO,
QUE VISA A TORNAR EFETIVA A REGRA PREVISTA NO ART. 48, XV, CF, COM REDAÇÃO DADA PELA EC.
19/98. FIXAÇÃO DOS SUBSÍDIOS DOS MINISTROS DO STF.
Medida liminar deferida em 19.02.1999, para suspender o curso da Ação Popular 98.00.43117-9 até a decisão final
da presente reclamação
Utilização de ação popular com o objetivo de conseguir, por via oblíqua, provimento jurisdicional inerente à ação
direta de inconstitucionalidade por omissão.
Parecer pela procedência do pedido formulado na presente reclamação”
É o relatório.
VOTO: Ao deferir a liminar, ponderei os problemas da convivência entre os sistemas concentrado e difuso no complexo
modelo brasileiro de controle de constitucionalidade e, na ocasião, entendi que a ação popular reclamada identificava-se com ação
direta por omissão.
São estes, no que interessa, os fundamentos da decisão:
“Sabidamente compartilho, na questão de fundo, da afirmação, à vista do seu art. 29, da auto-aplicabilidade do art.
37, XI, da Constituição, na redação da EC 19/98: nesse sentido, o meu voto vencido na sessão administrativa de
24.6.98 do Supremo Tribunal.
Não é, porém, o que se acha em causa na presente reclamação; e sim, neste juízo liminar, a plausibilidade da
afirmativa de usurpação da competência do STF, especificamente, da sua competência originária para a ação direta
de inconstitucionalidade por omissão.
E aí é inegável a densidade do fundamento da reclamação.
Certo, em nosso complexo sistema de convivência do sistema concentrado e direto como o sistema difuso e incidente
de controle de normas, não se discute que, nesse último, a questão de inconstitucionalidade possa traduzir o
fundamento principal, quiçá o único, de uma demanda, sem que, no entanto, essa se confunda por isso com a ação
direta: basta que nela se veicule pretensão que, na via do controle abstrato, seria inadmissível.
É critério distintivo de fácil manejo, quando se cuida da inconstitucionalidade de normas.
Aí, a ação direta, de um lado, é o único instrumento idôneo a obter, em caráter principal e não incidente, a
declaração de inconstitucionalidade (ou, entre nós, também, a de constitucionalidade) da norma impugnada, mas, de
outro, a essa declaração se restringe a sua função.
Dessa limitação decorre ao contrário que, se a inconstitucionalidade é argüida como fundamento de outra pretensão
que não a mera declaração da invalidez da norma - por exemplo, de uma pretensão condenatória ou mandamental,
malgrado derivada da inconstitucionalidade de determinada regra jurídica - não será a da ação direta a via
processual adequada, mas sim a do controle incidente e difuso: nessa linha, com a ampla maioria do Plenário, o
raciocínio que desenvolvi, nas Reclamações 597, 600 e 602, de 3.9.97, para negar houvesse usurpação da
competência do Supremo Tribunal no conhecimento pela Justiça comum de ações civis públicas, nas quais a
inconstitucionalidade de lei federal era aventada como fundamento de pedido condenatório de pagamento de
correção monetária formulado em favor dos titulares de cadernetas de poupança contra numerosas instituições
financeiras.
O problema ganha conotações particulares, porém, quando se cuida, como é o caso, de inconstitucionalidade por
omissão, especialmente, da omissão administrativa.
Na inconstitucionalidade do ato normativo, a sentença declaratória de nulidade (conforme o sistema, a sentença
constitutiva de anulação) será bastante a expungir do ordenamento positivo a norma viciada; ao contrário, como
nota Jorge Miranda (Manual Dir. Constitucional, 1983, II/402), “a verificação da existência da inconstitucionalidade
por omissão não altera a ordem jurídica, circunscreve-se a factor - a juntar, provavelmente, a outros - susceptível de
levar os órgãos legislativos a transformar o seu comportamento de negativo em positivo”.
Dessa impossibilidade de reparar por simples decisão declaratória a inconstitucionalidade por omissão é que advém,
na hipótese mais dramática da omissão legislativa inconstitucional, a desanimadora verificação da ineficácia
jurídica virtualmente absoluta dos mecanismos tentados para o seu controle jurisdicional, tanto no direito português
- que primeiramente a instituiu - quanto no direito brasileiro.
Recusadas, lá como aqui, as propostas de suprimento pelo órgão de controle da omissão persistente do legislador, o
que restou foi muito pouco além da mera declaração: em Portugal, a simples comunicação dela ao órgão legislativo;
no Brasil, a mesma ciência da decisão ao Poder competente “para a adoção das providências necessárias” (CF, art.
103, § 2º).
A espécie não reclama tomada de posição sobre se essa menção explícita no texto constitucional brasileiro à
finalidade da ciência ao Poder remisso da declaração da inconstitucionalidade de sua omissão terá sido bastante a
emprestar à decisão do Tribunal o caráter de sentença mandamental: como visto no relatório, não pretende o autor
popular, dos quatro dignitários, o suprimento da omissão da iniciativa legislativa a eles reservada para a fixação por
lei dos subsídios dos Ministros do Supremo Tribunal, que servirão de teto geral das remunerações estatais.
A omissão imputada é outra, de caráter iniludivelmente administrativa: a das providências, que o autor entende
incumbir-lhes, para fazer observar, de logo, o teto constitucional que afirma já viger, até a sua fixação definitiva por
lei futura.
Para esse fim é que pediu - e a Juíza logo lhe deferiu, mediante antecipação de tutela - o provimento ordenatória da
purgação, em 15 dias, da mora administrativa atribuída aos réus.
Ora, à obtenção dessa sentença mandamental - cujo objeto seja a prática de medida administrativa necessária a
tornar efetiva uma norma constitucional - o instrumento adequado é a ação direta de inconstitucionalidade por
omissão, na modalidade prevista na parte final do art. 103, §, 2º, da Lei Fundamental:
“Art. 103 (...)
§ 2º Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será
dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão
administrativo, para fazê-lo em trinta dias”.
‘Note-se’ - acentua Luiz Roberto Barroso (O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas, Renovar, 1993,
p. 170 - “que a decisão proferida opera diferentemente, de acordo com o órgão responsável pela omissão. Se este for
administrativo, terá ele caráter mandamental e o agente público competente para sanar a omissão poderá ser
responsabilizado se permanecer inerte’.
O ponto parece consensual entre os doutos (v.g., Gilmar Mendes, Jurisdição Constitucional, Saraiva, 1996, p. 286;
Michel Temer, Elementos Dir. Constitucional, Malheiros, 1998, p. 52; Clèmerson Clève, A Fiscalização Abstrata de
Constitucionalidade, ed. RT, 1995, p. 236; Celso Bastos, Comentários à Constituição Brasileira, Saraiva, 1997,
4ª/268; Roque Carrazza, Ação direta de inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção em Cadernos Dir.
Constitucional...., RT, 1993, 1/120, 123; Celso A. Barbi, Supremo Tribunal Federal - funções na Constituição Federal
de 1988, na Rev. Fac. Direito UFMG, 1991, v. 33/107, 114; Alexandre de Moraes Direito Constitucional, Atlas, 1999,
p. 568).
Certo, a letra do dispositivo constitucional condiciona essa sentença de acentuada carga mandamental a que omissão
se atribuo a “órgão administrativo”: parece iniludível, porém, que, a esse fim, o predicado administrativo do órgão,
advirá da natureza administrativa da medida de efetivação constitucional omitida, nada importando o Poder que
integre ou a hierarquia que ostente a autoridade tachada de omissão.
Há decisão do Supremo Tribunal, logo ao início da vigência da Constituição - ADIn 19, 23.2.89, Passarinho, DJ
14.4.89, RT 645/184 -, cuja ementa restringe o cabimento da ação direta de inconstitucionalidade por omissão a que
o seu objeto seja a edição de ato normativo. E o caso guarda certa similitude com o presente.
Estou, porém, em que, nos termos em que deduzido, data venia, o precedente não é de seguir.
Claro, a hipótese mais freqüente de inconstitucionalidade por omissão é a da não edição de ato normativo, quase
sempre de hierarquia legal, necessário à eficácia plena de norma da Constituição.
Nada afasta, porém, a hipótese de a própria Constituição impor direta e imediatamente a tomada de medidas
administrativas concretas, necessárias à sua efetividade e exigíveis independentemente de intermediação legislativa
ordinária: e então nada parece impedir a autorização da ação direta de inconstitucionalidade por omissão.
De tudo, não posso, nesta delibação liminar, negar à reclamação a nítida aparência de bom direito”.
O caso é de usurpação de competência desta Corte (art. 102, I, l, CF), pois a pretensão deduzida na ação popular objeto da
reclamação se identifica como a própria de uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Acentuei no exame da cautelar:
“À primeira vista, a ação popular proposta alhures parece efetivamente configurar ação direta de
inconstitucionalidade por omissão de providências administrativas, da privativa competência originária do Supremo
Tribunal Federal: a essa identificação concorrem, na ação popular, tanto a causa petendi - omissão de providências
administrativas necessárias à efetividade do art. 29 da EC 20/98 - quanto o pedido - provimento mandamental que
ordene a purga da mora denunciada.
Não importa, para que daí se infira a usurpação da competência do Supremo, que, não sendo a ação direta uma ação
popular, não a pudesse propor o autor.
Se a Constituição previu uma única via processual apta a alcançar certo provimento jurisdicional - no caso, a ação
direta de inconstitucionalidade por omissão -, e enumerou taxativamente os legitimados para propô-la, é que a todos
os demais negou a iniciativa: dispensa demonstração que a parte ilegítima para propor, no juízo competente, a
única ação adequada, não se torna legítima com o propô-la sob rótulo dissimulado e em juízo incompetente.
Em conseqüência, com base no art. 14, II, L. 8.038/90, determino a suspensão do processo da ação popular e dos
efeitos da antecipação da tutela nela deferida até a decisão final desta reclamação”
A ação popular suspensa não visa ao julgamento de uma relação jurídica concreta: permanecem válidos os fundamentos da
concessão da cautelar, suficientes à procedência da reclamação.
A promulgação superveniente da EC 41/03 - que alterou de maneira significativa as regras da EC 19/98 - não é suficiente à
perda do objeto desta causa, pois a ação popular teve seu curso suspenso pela liminar deferida e, caso fosse julgada prejudicada a
reclamação, seguiria seu curso, incidindo na mesma usurpação de competência já examinada.
Também não é o caso de avocar o processo (art. 161, I, RISTF), pois ao autor da ação popular, falta legitimação para a ação
direta, de competência do Tribunal.
Ante o exposto, julgo procedente o pedido para cassar a tutela concedida e - como medida adequada à observância da
jurisdição desta Corte (art. 161, III, RISTF) - determinar a extinção da ação popular: é o meu voto.
* acórdão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 384
Brasília, 18 a 22 de abril de 2005 Nº 384
Data (páginas internas): 27 de abril de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Estado de Calamidade Pública e Sistema Único de Saúde - 1 a 3
1ª Turma
Prisão Preventiva e Excesso de Prazo
Ministério Público: Termo Inicial do Prazo Recursal
Defensoria Pública e Intimação Pessoal
2ª Turma
HC e Inabilitação para Cargo Público
Prerrogativa de Foro e Suspensão de HC
Concurso Público e Princípio da Isonomia
Clipping do DJ
Transcrições
Homicídio Culposo e Socorro à Vítima (HC 84380/MG)
ADI: Intervenção de Terceiros e Amicus Curiae (ADI 3311/DF)
Concurso Público: Princípio da Realidade e Exigência Temporal (MS 25326/DF)
PLENÁRIO
Estado de Calamidade Pública e Sistema Único de Saúde - 1
O Tribunal concedeu mandado de segurança impetrado contra o Decreto Presidencial 5.392/2005,
que declara estado de calamidade pública do setor hospitalar do Sistema Único de Saúde – SUS no
Município do Rio de Janeiro, e, dentre outras determinações, autoriza, nos termos do inciso XIII do art.
15 da Lei 8.080/90, a requisição, pelo Ministro da Saúde, dos bens, serviços e servidores afetos a
hospitais daquele Município ou sob sua gestão (Lei 8.080/90: “Art. 15. A União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios exercerão, em seu âmbito administrativo, as seguintes atribuições:... XIII - para
atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo
iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias, a autoridade competente da esfera
administrativa correspondente poderá requisitar bens e serviços, tanto de pessoas naturais como de
jurídicas, sendo-lhes assegurada justa indenização;”). O Min. Joaquim Barbosa, relator, entendeu ser
nulo o ato presidencial impugnado ante a insuficiência de motivação expressa, porquanto ausente
qualquer alusão aos motivos de fato ou de direito determinantes de sua prática. Ressaltou, ainda, a
possibilidade de a requisição incidir sobre bens públicos, sem a necessidade da decretação do estado de
defesa, por ser ela instituto que visa fornecer alternativas à administração para solução de problemas em
casos de eminente perigo público.
MS 25295/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 20.4.2005. (MS-25295)
Estado de Calamidade Pública e Sistema Único de Saúde - 2
O Min. Carlos Britto divergiu em parte do relator. Considerou tratar-se, na espécie, não de
requisição, mas de intervenção federal no município, não admitida pela Constituição Federal, com
apossamento de bens, serviços, servidores e recursos públicos municipais, pela União, fora dos
parâmetros do estado de defesa e do estado de sítio (CF, arts. 136 e 137 e ss., respectivamente). Concluiu,
dessa forma, ter sido o município em questão desafetado de serviço que lhe é próprio, por destinação
constitucional, já que a saúde pública é área de atuação de toda pessoa federada, correspondendo a um
condomínio funcional, nos termos do art. 196, da CF. Afastou, ainda, a viabilidade de requisição de bens
públicos na forma preconizada pelo inciso XIII do art. 15 da Lei 8.080/90, haja vista tal dispositivo estar
relacionado ao art. 5º, XXV, da CF, que prevê que a requisição de uso temporário apenas incide sobre
bens particulares. Reconhecendo a nulidade do ato por falta de motivação e o caráter interventivo do
mesmo, concedeu a ordem o Min. Cezar Peluso. Acrescentou que a requisição como tal pressupõe que o
bem requisitado tenha destinação natural diversa daquela prevista na Constituição, qual seja, atender a
iminente perigo público, o que não teria sido observado no caso, e, ainda, o fato de a própria lei invocada
como suporte da requisição impedir que se extravasasse o âmbito administrativo de cada unidade
federada.
MS 25295/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 20.4.2005. (MS-25295)
Estado de Calamidade Pública e Sistema Único de Saúde - 3
Na linha dos dois últimos votos, decidiram os Ministros Gilmar Mendes e Ellen Gracie.
Perfilharam, ainda, a conclusão quanto ao caráter interventivo do ato impugnado os Ministros Carlos
Velloso e Celso de Mello. O Min. Marco Aurélio adotou o entendimento da nulidade do decreto por
ausência de fundamentação. O Min. Sepúlveda Pertence acompanhou os votos dos Ministros Carlos
Britto e Cezar Peluso no que respeita à tese da intervenção, deixando, no entanto, de considerar o vício
apontado pelo relator quanto à falta de motivação do ato porque estranho à causa de pedir. O Min. Nelson
Jobim, Presidente, por fim, seguindo a maioria formada reconhecendo a nulidade do ato por falta de
fundamentação, apontou restrição quanto à amplitude do seu voto no sentido de — tendo em conta ser da
competência comum da União, Estados, DF e Municípios a função de cuidar da saúde e da assistência
pública (CF, art. 23, II), e diante de determinadas circunstâncias, como a da negativa absoluta da
prestação do serviço pela unidade federada — não se caminhar para a intervenção, mas para o
cumprimento daquela obrigação constitucional, a fim de se evitar que o conflito federativo implique
prejuízo aos cidadãos. Ordem deferida para restabelecer a administração e a gestão, por parte do
Município do Rio de Janeiro, dos hospitais municipais Souza Aguiar e Miguel Couto; a administração dos
servidores municipais lotados nestes dois hospitais municipais; a manutenção dos serviços públicos de
saúde nestes dois hospitais municipais; bem como vedar à União a pretensão de utilizar os servidores
municipais, os bens e serviços contratados pelo município impetrante nos outros quatro hospitais, nos
termos dos votos respectivos de cada um de seus ministros.
MS 25295/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 20.4.2005. (MS-25295)
PRIMEIRA TURMA
Prisão Preventiva e Excesso de Prazo
Por excesso de prazo, a Turma deferiu, de ofício, habeas corpus para conceder liberdade provisória
a um de dois pacientes, denunciados com terceiros — com base em investigações realizadas envolvendo
organização supostamente criminosa, denominada “Rede Chebabe” — pela prática dos crimes de
formação de quadrilha ou bando (CP, art. 288), falsidade ideológica (CP, art. 299) e corrupção ativa (CP,
art. 333, parágrafo único), cuja prisão preventiva, mantida pelo TRF da 2ª Região, fora decretada com
fundamento na garantia da ordem pública. Alegava-se, na espécie, ausência de motivação legal do decreto
de prisão cautelar e excesso de prazo. Inicialmente julgou-se prejudicado o pedido em relação a um dos
pacientes, já que a Turma estendera-lhe os efeitos da decisão proferida no HC 85020/RJ (DJU de
18.2.2005). No que toca ao outro paciente, indiciado como chefe do mencionado grupo, asseverou-se que
a questão relativa ao excesso de prazo da prisão poderia ser analisada de ofício, apesar de não ter sido
objeto da petição do writ perante o TRF da 2ª Região. Assim, entendeu-se que a superação do prazo, cujo
excesso prejudica o seu fundamento cautelar, ultrapassa os temperamentos admissíveis à luz do juízo de
razoabilidade, já que, passados mais de quatro meses desde o julgamento daquele HC nesta Corte, o feito
ainda se encontra na fase de diligências complementares, com a ressalva de que sem prazo certo de
término. Salientou-se que, embora tais diligências tenham sido solicitadas pela defesa, a esta não poderia
ser atribuída o atraso no encerramento da instrução.
HC 85068/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19.4.2005. (HC-85068)
Ministério Público: Termo Inicial do Prazo Recursal
A Turma, tendo em conta que a eficácia do lançamento do “ciente” pelo representante do parquet
como termo inicial do prazo recursal pressupõe a ausência de outra intimação pessoal, anterior, que, per
si, baste para consumar o ato, deferiu habeas corpus para, reconhecendo a intempestividade de embargos
de declaração opostos pelo Ministério Público Federal, anular o julgamento destes e, em conseqüência,
restabelecer o acórdão embargado, que não conhecera de recurso especial. Considerou-se que, na espécie,
deveria prevalecer, para efeito de contagem de início de prazo recursal, a data constante de certidão, não
contestada, e lavrada pela Coordenadoria da 6ª Turma do STJ, na qual certificado que o membro do MPF
fora devidamente intimado, na pessoa de seu representante legal. Ademais, afirmou-se que essa intimação
deveria preponderar, inclusive, em relação a que é realizada mediante entrega do processo em setor
administrativo do Ministério Público, formalizada a carga pelo servidor. Precedente citado: HC 83255/SP
(DJU de 12.3.2004).
HC 83915/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19.4.2005. (HC-83915)
Defensoria Pública e Intimação Pessoal
A ausência de intimação pessoal do defensor público da pauta de julgamento acarreta a nulidade
absoluta do julgado, não havendo que se falar em preclusão ou em necessidade de demonstração de
prejuízo. Com base nesse entendimento, a Turma, mantendo a prisão decretada na sentença de pronúncia,
deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo que negara provimento a recurso em sentido estrito do paciente, representado pela
Procuradoria de Assistência Judiciária daquele Estado, a qual não fora intimada para a sessão de
julgamento do referido recurso. Precedentes citados: RHC 83770/SP (DJU de 12.32004); HC 77359/DF
(DJU de 23.10.98); HC 70612/SP (DJU de 15.4.94); HC 75732/SP (DJU de 31.10.97); HC 77141/RS
(DJU de 21.8.98).
RHC 85443/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19.4.2005. (RHC-85443)
SEGUNDA TURMA
HC e Inabilitação para Cargo Público
Não é cabível habeas corpus para questionar a aplicação de penas acessórias que não afetam de
modo algum a liberdade de locomoção. Com base nesse entendimento, a Turma não conheceu de habeas
corpus impetrado contra acórdão do STJ em que se pretendia a desconstituição de acórdão do Tribunal de
Justiça do Estado do Piauí na parte em que determinara o afastamento do paciente do cargo de prefeito
municipal em decorrência de sua condenação, a dois anos e quatro meses de reclusão e inabilitação para o
exercício de cargo ou função pública, pela prática de crime tipificado no art. 1º, I, VI, VII e XI, do
Decreto-lei 201/67. Precedentes citados: HC 76605/SP (DJU de 18.9.98); HC 79791/GO (DJU de
4.8.2000); HC 84420/PI (DJU de 27.8.2004); HC 84326 AgR/PE (1º.10.2004).
HC 84816/PI, rel. Min. Carlos Velloso, 19.4.2005. (HC-84816)
Prerrogativa de Foro e Suspensão de HC
Após o voto da Min. Ellen Gracie, relatora, a Turma, acatando preliminar suscitada pelo Min.
Carlos Velloso, suspendeu, para aguardar o julgamento, pelo Pleno, das ADI 2797/DF e 2860/DF — nas
quais se discute a constitucionalidade dos §§ 1º e 2º do art. 84 do CPP, inseridos pelo art. 1º da Lei
10.628/2002 —, o andamento de habeas corpus. Pretende-se, no writ, o reconhecimento, ante a nova
redação do citado art. 84, da competência do STJ para julgar apelações — interpostas por magistrado
aposentado e pelo Ministério Público contra sentença que condenara o primeiro apelante e absolvera o
paciente, ex-senador — bem como a anulação do acórdão dessa Corte especial que determinara a remessa
dos autos do processo criminal ao TRF da 3ª Região (CPP: “Art. 84. A competência pela prerrogativa de
função é do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais
Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, relativamente às pessoas que devam
responder perante eles por crimes comuns e de responsabilidade. § 1o A competência especial por
prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente, prevalece ainda que o inquérito ou a
ação judicial sejam iniciados após a cessação do exercício da função pública. § 2o A ação de
improbidade, de que trata a Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992, será proposta perante o tribunal
competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de
prerrogativa de foro em razão do exercício de função pública, observado o disposto no § 1o.”). A Min.
Ellen Gracie, relatora, com base em precedentes do STF, deferiu a ordem. Salientando a validade da
sentença condenatória proferida antes da Lei 10.628/2002, à vista do princípio tempus regit actum,
entendeu que, em razão da superveniente alteração legislativa, conferindo ao STJ a competência
originária para julgar o primeiro apelante, seria desse órgão a atribuição para o julgamento dos referidos
recursos. Mantida a liminar deferida anteriormente pelo Min. Presidente, que suspendera os efeitos do
acórdão impugnado, até o julgamento definitivo do writ.
HC 85433/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 19.4.2005. (HC-85433)
Concurso Público e Princípio da Isonomia
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de
Justiça do Estado do Rio Grande do Norte que, com fundamento no princípio da isonomia, afastara norma
do edital de concurso público para provimento de cargo de escrivão da polícia civil e concedera mandado
de segurança, a fim de conferir à impetrante, ora recorrida, o direito de realizar nova prova física. A Min.
Ellen Gracie, relatora, deu provimento ao recurso. Entendeu que o tribunal de origem, ao acolher a
pretensão da impetrante, que falhara durante a realização da prova física em decorrência de uma distensão
muscular, longe de dar efetividade ao aludido princípio, acabou por ofender o da impessoalidade, uma
vez que criou benefício não estendido aos demais candidatos. Ressaltou que é certo que o princípio da
isonomia pressupõe a criação de distinções entre pessoas que estejam em situações diversas, contudo,
essa discriminação precisa basear-se em pressupostos genéricos e impessoais, o que não fora observado
na espécie, tendo o tribunal a quo, com o afastamento da disposição editalícia, premiado a impetrante em
detrimento dos candidatos que também não foram aprovados no referido exame. Após, pediu vista dos
autos o Min. Gilmar Mendes.
RE 351142/RN, rel. Min. Ellen Gracie, 19.4.2005. (RE-351142)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
13.4.2005
12.4.2005
12.4.2005
Extraordinárias
14.4.2005
——
——
Julgamentos
1
90
197
CLIPPING
DO
DJ
22 de abril de 2005
MED. CAUT. EM ADI N. 3.196-ES
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a Lei estadual n° 7.738, publicada no Diário Oficial do Estado do Espírito
Santo de 6 de abril de 2004. 2. Parcelamento de multas de trânsito. 3. Alegada ofensa à competência privativa da União para legislar
sobre trânsito e transporte (art. 22, XI, da Constituição). 4. Precedentes: ADI 2064 MC, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, DJ
5.11.1999; ADI 2432 MC, Rel. Min. NELSON JOBIM, DJ 21.9.2001; ADI 2101, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, DJ 05.10.2001;
ADI 2582, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ 06.06.2003; ADI 2644, Rel. Min. ELLEN GRACIE, DJ 17.09.2003; ADI
2814, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, DJ 05.02.2004. 5. Liminar deferida com eficácia ex nunc.
* noticiado no Informativo 365
MED. CAUT. EM ADI N. 3.361-MG
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIREITA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 1º, INCISOS I E II, E § 3º DO
ARTIGO 78 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE MINAS GERAIS. COMPOSIÇÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS.
ENUNCIADO N. 653 DA SÚMULA DESTA CORTE.
1. É firme o entendimento de que a estrutura dos Tribunais de Contas dos Estados-membros deve ser compatível com a Constituição
do Brasil, sendo necessário, para tanto, que, dos sete Conselheiros, quatro sétimos sejam indicados pela Assembléia Legislativa e
três sétimos pelo Chefe do Poder Executivo. Precedentes.
2. Há igualmente jurisprudência consolidada no que tange à clientela à qual estão vinculadas as nomeações do Governador. Apenas
um provimento será de livre escolha; as duas vagas restantes deverão ser preenchidas, necessariamente, uma por ocupante de cargo
de Auditor do Tribunal de Contas e a outra por membro do Ministério Público junto àquele órgão.
3. Medida cautelar deferida.
* noticiado no Informativo 379
AP N. 340-RS
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: AÇÃO PENAL. PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO. MANIFESTAÇÃO POLÍTICA. CRIME DE DANO.
PARTICIPAÇÃO NEGADA PELAS TESTEMUNHAS DE ACUSAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO PENAL.
CONTRAVENÇÃO PENAL. PRESCRIÇÃO.
Manifestação política contra o processo de privatização da Companhia Riograndense de Telecomunicações. Crime de dano
imputado à acusada, então vereadora. Depoimentos das testemunhas de acusação afastando o elemento subjetivo do tipo, ao
convergirem no sentido da ausência de participação direta ou indireta da deputada federal nos eventos que culminaram com a
destruição do patrimônio público. Absolvição, na forma do artigo 386, III, do Código de Processo Penal.
Contravenção penal cuja pena é cominada em 6 (seis) meses de prisão simples. Transcurso de prazo superior a 2 (dois) anos.
Prescrição da pretensão punitiva.
Ação Penal a que se julga improcedente.
Ext EM Ext N. 840-REPÚBLICA ARGENTINA
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
EXTRADIÇÃO - PEDIDO DE EXTENSÃO - MANIFESTAÇÃO DO EXTRADITANDO. O simples fato de o extraditando
manifestar-se favoravelmente à submissão plena à jurisdição do Governo requerente não é de molde a levar ao deferimento
automático do pedido, ou à perda do respectivo objeto.
EXTRADIÇÃO - EXTENSÃO. Satisfeita a dupla tipicidade, não concorrendo fenômeno capaz de revelar a extinção da
punibilidade, impõe-se o deferimento da extensão.
Ext N. 905-REINO DA BÉLGICA
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: PEDIDO DE EXTRADIÇÃO PARA EXECUÇÃO PENAL. GOVERNO DA BÉLGICA. NACIONAL BELGA.
TRÁFICO DE ENTORPECENTES.
Pedido de extradição de nacional belga condenado por crime de narcotráfico. Pedido fundado no tratado de extradição firmado entre
o Brasil e a Bélgica e em “convenção adicional” resultante da troca de notas entre o governo brasileiro e o belga para inclusão, no
tratado, dos crimes de “tráfico ilícito de drogas nocivas” (correspondências de 22.04.1958 e de 08.05.1958).
Inadmissibilidade, tanto sob a Constituição atual, quanto sob a de 1946, de ampliação de sentido de tratado de extradição por meio
de “convenção adicional” resultante de troca de notas entre governos. Ato inexistente no ordenamento jurídico nacional.
Pedido deferido, por aplicação de disposição expressa da Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias
Psicotrópicas, concluído em Viena, Áustria, em 20.12.1988 (art. 6, item 3), de que são signatários o Brasil e a Bélgica, cujo sentido
é reforçado pelas disposições da Convenção Única sobre Entorpecentes.
Ressalva para que o governo brasileiro decida acerca da efetivação da extradição, porquanto consta, contra o extraditando,
condenação no território nacional por crime diverso do que deu ensejo ao pedido.
Ext N. 909-ESTADO DE ISRAEL
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: EXTRADIÇÃO - CONCORDÂNCIA DO EXTRADITANDO - CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO DISPENSA O
CONTROLE DE LEGALIDADE DO PEDIDO EXTRADICIONAL, A SER EFETUADO PELO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL.
- O desejo de ser extraditado, ainda que manifestado, de modo inequívoco, pelo próprio súdito estrangeiro, não basta, só por si,
para dispensar as formalidades inerentes ao processo extradicional, posto que este representa garantia indisponível instituída em
favor do extraditando. Precedentes.
PEDIDO EXTRADICIONAL - CONCURSO DE INFRAÇÕES - MERA INDICAÇÃO DA PENA GLOBAL, SEM
REFERÊNCIA INDIVIDUALIZADORA DAS SANÇÕES PENAIS IMPOSTAS A CADA UM DOS DELITOS EM CONCURSO
- NECESSIDADE DE DISCRIMINAÇÃO DAS DIVERSAS PENAS APLICADAS AO EXTRADITANDO, PARA EFEITO DE
CÁLCULO DA PRESCRIÇÃO PENAL.
- Impõe-se, ao Estado estrangeiro, demonstrar, relativamente aos delitos em concurso, o “quantum” penal a eles abstratamente
cominado (extradição instrutória) ou efetivamente imposto (extradição executória), em ordem a permitir, na perspectiva da
legislação brasileira e/ou do ordenamento positivo do Estado requerente, o cálculo separado da prescrição penal concernente a
cada delito individualmente considerado. Precedentes.
- Exigência não atendida pelo Estado requerente, não obstante a reiteração, pelo Brasil, por via diplomática, de tal solicitação.
Conseqüente indeferimento parcial do pedido de extradição, acolhido, unicamente, quanto aos delitos de tráfico de entorpecentes
e de associação criminosa para a prática desse ilícito penal.
HC N. 84.643-RJ
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. INDEFERIMENTO.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
Proposta de suspensão condicional do processo apresentada pelo Ministério Público. Indeferimento, com base na singela afirmação
de falta de previsão legal. Constrangimento ilegal, por ausência de fundamentação. Ordem concedida.
RMS N. 23.462-DF
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Demarcação de terras indígenas: pretensão a que a demarcação da área deveria ser conforme a suposta vontade
da comunidade Krikati, com dimensão de 85.500 ha, enquanto a FUNAI sustenta devesse ser reservada à comunidade
indígena a área de 146.000 ha.
1. Pedido dos recorrentes que se assemelha a uma substituição processual da comunidade Krikati, não autorizada por lei:
conseqüente ilegitimidade ativa, suficiente ao não conhecimento do mandado de segurança.
2. Mandado de segurança, ademais, prejudicado por força da Portaria 820/MJ, de 11.12.98, que demarcou a terra indígena Raposa
Terra do Sol (cf. liminar concedida na Rcl 2833, Carlos Britto, DJ 7.10.2004).
RHC N. 81.740-RS
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Habeas corpus: cabimento: direito probatório.
Não cabe o habeas corpus para solver controvérsia de fato dependente da ponderação de provas desencontradas; cabe, entretanto,
para aferir a idoneidade jurídica ou não das provas nas quais se fundou a decisão condenatória.
II. Chamada de co-réu: inidoneidade para lastrear condenação.
A chamada de co-réu, ainda que formalizada em Juízo, é inadmissível para lastrear a condenação: precedentes (v.g., HHCC 74.368,
Pleno, j. 1.7.97, Pertence, DJ 28.11.97; 81.172, 1ª T., j. 11.6.02, Pertence, DJ 7.3.03).
Ausência de elementos de prova válidos para fundamentar a condenação.
HC N. 84.891-ES
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: - PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO EM FLAGRANTE, LIBERDADE PROVISÓRIA.
PRESSUPOSTOS DA PRISÃO PREVENTIVA. PERICULOSIDADE.
I. - A periculosidade do agente justifica a custódia preventiva como garantia da ordem pública. Mantém-se, então, a prisão
decorrente do flagrante.
II. - H.C. indeferido.
HC N. 84.949-RO
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL:
INEXISTÊNCIA.
I. - O decreto de prisão preventiva está fundamentado e atende ao contido no art. 312 do Código de Processo Penal.
II. - A circunstância de o réu ser primário e de bons antecedentes não afasta a possibilidade de decretação de sua prisão.
III. - H.C. indeferido.
HC N. 85.259-RJ
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: - PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. APELAÇÃO CRIMINAL. ACÓRDÃO. FUNDAMENTAÇÃO.
I. - Acórdão suficientemente fundamentado. Inocorrência de nulidade.
II. - H.C. indeferido.
HC N. 85.390-RS
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: - PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR.
EXAME DE PROVA.
I. - A pretensão do paciente de ver anulado o acórdão que julgou o seu pedido de revisão implicaria o exame das provas que
ensejaram a sua condenação, o que não é possível no processo do habeas corpus.
II. - H.C. indeferido.
RE N. 274.383-SP
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PROCESSO LEGISLATIVO. INICIATIVA PRIVATIVA DO PODER
EXECUTIVO. EMENDA PELO PODER LEGISLATIVO. AUMENTO DE DESPESA.
1. Norma municipal que confere aos servidores inativos o recebimento de proventos integrais correspondente ao vencimento de seu
cargo. Lei posterior que condiciona o recebimento deste benefício, pelos ocupantes de cargo em comissão, ao exercício do serviço
público por, no mínimo, 12 anos.
2. Norma que rege o regime jurídico de servidor público. Iniciativa privativa do Chefe do Executivo. Alegação de
inconstitucionalidade desta regra, ante a emenda da Câmara de Vereadores, que reduziu o tempo mínimo de exercício de 15 para 12
anos.
3. Entendimento consolidado desta Corte no sentido de ser permitido a Parlamentares apresentar emendas a projeto de iniciativa
privativa do Executivo, desde que não causem aumento de despesas (art. 61, § 1º, “a” e “c” combinado com o art. 63, I, todos da
CF/88). Inaplicabilidade ao caso concreto.
4. Se a norma impugnada for retirada do mundo jurídico, desaparecerá qualquer limite para a concessão da complementação de
aposentadoria, acarretando grande prejuízo às finanças do Município.
5. Inteligência do decidido pelo Plenário desta Corte, na ADI 1.926-MC, rel. Min. Sepúlveda Pertence.
6. Recurso extraordinário conhecido e improvido.
* noticiado no Informativo 381
RE N. 418.096-RS
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: - CONSTITUCIONAL. NACIONALIDADE: OPÇÃO. C.F., ART. 12, I, c, COM A EMENDA CONSTITUCIONAL
DE REVISÃO Nº 3, DE 1994.
I. - São brasileiros natos os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que venham a residir no Brasil e
optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira.
II. - A opção pode ser feita a qualquer tempo, desde que venha o filho de pai brasileiro ou de mãe brasileira, nascido no estrangeiro,
a residir no Brasil. Essa opção somente pode ser manifestada depois de alcançada a maioridade. É que a opção, por decorrer da
vontade, tem caráter personalíssimo. Exige-se, então, que o optante tenha capacidade plena para manifestar a sua vontade,
capacidade que se adquire com a maioridade.
III. - Vindo o nascido no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, a residir no Brasil, ainda menor, passa a ser considerado
brasileiro nato, sujeita essa nacionalidade a manifestação da vontade do interessado, mediante a opção, depois de atingida a
maioridade. Atingida a maioridade, enquanto não manifestada a opção, esta passa a constituir-se em condição suspensiva da
nacionalidade brasileira.
IV. - Precedente do STF: AC 70-QO/RS, Ministro Sepúlveda Pertence, Plenário, 25.9.03, “DJ” de 12.3.04.
V. - RE conhecido e não provido.
* noticiado no Informativo 381
RHC N. 85.220-SP
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. ARGUIÇÃO DE
ILEGITIMIDADE PASSIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
I. - Absolvido o paciente em razão da inexistência de prova de ter concorrido para a infração penal, não há falar em constrangimento
à liberdade de locomoção. Descabimento do habeas corpus, que tem como fim precípuo prevenir ou remediar o direito de ir, vir ou
permanecer.
II. - Recurso improvido.
Acórdãos Publicados: 313
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Homicído Culposo e Socorro à Vítima (Transcrições)
(v. Informativo 382)
HC 84380/MG*
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Relatório: O Parecer elaborado pela eminente Dra. Delza Curvello Rocha, Subprocuradora-Geral da República, assim relata o caso:
“Cuida-se de habeas corpus impetrado com pedido de concessão de liminar, ‘para o fim de obstar o início de
cumprimento da pena (...) determinando-se o recolhimento de mandado de prisão porventura expedido, ou que se pretenda
expedir...’ (fl. 16), em favor de MARCO AURÉLIO FERREIRA DOS ANJOS, condenado pelo juízo monocrático à pena de
03 (três) anos e 04 (quatro) meses de detenção, como incurso nas sanções do art. 121, § 3º e § 4º, do Código Penal, tendo em
grau de apelação sido promovida a diminuição da pena-base, restando caracterizada em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de
detenção, contra o v. acórdão da Quinta Turma do Colendo Superior Tribunal de Justiça que, por maioria, conheceu e negou
provimento ao recurso especial sob alegação de divergência jurisprudencial, no sentido de ser desconsiderada a causa de
aumento de pena, eis que entende, o ora impetrante, que a morte imediata da vítima descaracteriza a omissão de socorro,
conforme decisão abaixo ementada:
“CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO CULPOSO. AGRAVADO PELA OMISSÃO DE
SOCORRO. DESCONSIDERAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO. SUPOSIÇÕES ACERCA DAS CONDIÇÕES
FÍSICAS DA VÍTIMA. COMPETÊNCIA DO ESPECIALISTA LEGALMENTE HABILITADO E, NÃO, DO
AGRESSOR. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
I - É inviável a desconsideração do aumento de pena pela omissão de socorro, se verificado que o réu estava
apto a acudir a vítima, não existindo nenhuma ameaça a sua vida nem a sua integridade física.
II - A prestação de socorro é dever do agressor, não cabendo ao mesmo levantar suposições acerca das
condições físicas da vítima, medindo a gravidade das lesões que causou e as conseqüências de sua conduta, sendo
que a determinação do momento e causa da morte compete, em tais circunstâncias, ao especialista legalmente
habilitado.
III - Recurso desprovido”.
2. Colhe-se dos autos que dessa decisão foi interposto o AI 498.277-6, perante esse Colendo Supremo Tribunal
Federal, tendo sido negado seguimento, conforme o r. despacho de fls. 210.
3. Insiste, o impetrante, nos mesmos argumentos do recurso improvido, ou seja, que o paciente sofre constrangimento
ilegal decorrente da aplicação do aumento de pena pela omissão de socorro, previsto no § 4º do art. 121 do Código Penal,
alegando que ‘entendendo ser impossível a majoração da pena, tendo em vista a morte imediata da vítima’, e por isso, a
pena deva restar concretizada em 01 ano e 09 meses de detenção, o que impunha o reconhecimento da declaração da extinção
da punibilidade do paciente, em virtude da prescrição da pretensão punitiva contada pela pena concreta, nos termos do art.
107, inciso IV, c/c art. 110 e 109, V, todos do Código Penal.”
Indeferi a liminar (fl. 212).
O parecer do Ministério Público é no sentido do indeferimento da ordem de habeas corpus (fls. 215 a 218).
É o relatório.
Voto: Em seu parecer, a ilustre Subprocuradora-Geral da República, Dra. Delza Curvelo, anota:
“6. Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal ‘No homicídio culposo a ausência de imediato socorro a
vítima é causa de aumento de pena’ (HC 68894/RS, Rel. Min. Marco Aurélio).
7. E nesse sentido foi a fundamentação do aresto vergastado: ‘da decisão recorrida se constata que nenhuma
circunstância exculpante socorre o recorrente. A alegação de que as lesões causaram morte imediata também não se presta
à exclusão da circunstância especial do aumento de pena, pois, ao agressor, não cabe, no momento do fato, presumir as
condições físicas da vítima, mediando a gravidade das lesões que causou e as conseqüências de sua conduta. Tal
responsabilidade é do especialista médico, autoridade científica e legalmente habilitada para, em tais circunstâncias,
estabelecer o momento e a causa da morte’ (fls. 137).
8. Verifica-se, ainda, do acórdão proferido no recurso de apelação a seguinte fundamentação a respeito da exasperação
da reprimenda da omissão de socorro:
‘(...)
Colheu a vítima, sem tentar controlar o movimento do automóvel, não se detectando sinais de frenagem na
pista. Permaneceu indiferente à aglomeração normal de pessoas à frente da boate, sem se importar com a situação
de perigo que causava aos transeuntes, quando não cuidou de reduzir a marcha, conforme lhe ordenava o bom-senso.
Indisfarçável sua negligência e imprudência, dando causa ao acidente que vitimou a jovem Fernanda, não se
admitindo sequer cogitar-se de culpa da vítima, diante da inquestionável prevalência de culpa do réu.
Por outro lado, a exasperação da reprimenda, derivada da omissão de socorro deve ser mantida.
O agente tinha condições físicas de fazê-lo, tanto que, após o sinistro, ainda conversou com uma testemunha
(fls. 17 e fls. 86).
Nenhum indício de situações de risco à sua pessoa, desautorizando-o a clamar por temor de represália por
parte das pessoas que estavam no local.
A presença de terceiros no local e o estado da ofendida após o acidente, se ferida ou morta, não o eximem da
obrigação de diligenciar para prestar socorro. Não tinha ele condições de proceder a tal avaliação, não lhe
competindo, pois, detectar o real estado da vítima, para concluir se merecia ou não o socorro.
A condenação pelo homicídio culposo deve ser mantida, da mesma forma que se impõe a permanência da
qualificadora, traduzida na omissão de socorro.
(...)
O réu é primário, de bons antecedentes. Sua conduta e personalidade não se contaminaram de forma
irremediável pelo evento culposo. Sem dúvida, intensa a culpabilidade de suas condutas e graves as conseqüências,
com a morte de uma jovem.
Contudo, não são de todo desfavoráveis as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, em que pesem a dor e o
sentimento de revolta causado pelo evento funesto, razão pela qual não é de aplicar-se à hipótese a jurisprudência
citada.
Assim, a pena deve se ater às diretrizes legais, e - pelos motivos acima - não poderia mesmo aproximar-se do
limite máximo cominado.
Deste modo, fica alterada a pena-base para um ano e nove meses de detenção. Diante da qualificadora da
omissão de socorro, acrescento um terço, concretizando-a em dois anos e quatro meses de detenção.
De acordo com o disposto no art. 33, § 2º, alínea ‘c’, do CP - tendo em vista as circunstâncias judiciais,
conforme acentuei - será aberto o regime para o cumprimento da condenação...’ (fls. 88/89 - grifos do original).”
Não vislumbro razão para reforma das decisões atacadas. E não vejo, no caso, como acolher a alegação do réu, no sentido
de se excluir a aplicação do disposto no § 4º do art. 121 do Código Penal, tendo em vista a morte instantânea da vítima. O paciente
tinha condições de promover ou auxiliar no socorro de sua vítima, o que não fez. E não cabia ao paciente proceder à avaliação
quanto à eventual ausência de utilidade do socorro, tendo em vista a morte instantânea da vítima, conforme concluíram o Tribunal
de Justiça de Minas Gerais e o Superior Tribunal de Justiça. Tal interpretação acabaria por esvaziar o sentido da regra do § 4º do art.
121, no que toca à reprovação da omissão do agente.
Meu voto, portanto, é no sentido do indeferimento da ordem.
* acórdão pendente de publicação
ADI: Intervenção de Terceiros e Amicus Curiae (Transcrições)
ADI 3311/DF*
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
DESPACHO: O SINDICATO DOS MÉDICOS DO DISTRITO FEDERAL - SINDIMÉDICO requer sua admissão na presente
ação direta de inconstitucionalidade, na qualidade de amicus curiae.
A intervenção de terceiros no processo da ação direta de inconstitucionalidade é regra excepcional prevista no art. 7º, § 2º, da
Lei 9.868/1999, que visa a permitir “que terceiros - desde que investidos de representatividade adequada - possam ser admitidos na
relação processual, para efeito de manifestação sobre a questão de direito subjacente à própria controvérsia constitucional. - A
admissão de terceiro, na condição de amicus curiae, no processo objetivo de controle normativo abstrato, qualifica-se como fator
de legitimação social das decisões da Suprema Corte, enquanto Tribunal Constitucional, pois viabiliza, em obséquio ao postulado
democrático, a abertura do processo de fiscalização concentrada de constitucionalidade, em ordem a permitir que nele se realize,
sempre sob uma perspectiva eminentemente pluralística, a possibilidade de participação formal de entidades e de instituições que
efetivamente representem os interesses gerais da coletividade ou que expressem os valores essenciais e relevantes de grupos,
classes ou estratos sociais. Em suma: a regra inscrita no art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99 - que contém a base normativa
legitimadora da intervenção processual do amicus curiae - tem por precípua finalidade pluralizar o debate constitucional.” (ADI
2.130-MC, rel. min. Celso de Mello, DJ 02.02.2001).
Vê-se, portanto, que a admissão de terceiros na qualidade de amicus curiae traz ínsita a necessidade de que o interessado
pluralize o debate constitucional, apresentando informações, documentos ou quaisquer elementos importantes para o julgamento da
ação direta de inconstitucionalidade.
A mera manifestação de interesse em integrar o feito, sem o acréscimo de nenhum outro subsídio fático ou jurídico relevante
para o julgamento da causa, não justifica a admissão do postulante como amicus curiae.
Ademais, o SINDIMÉDICO não logrou demonstrar que detém experiência e autoridade em matéria de saúde social, uma vez
que dentre as suas “prerrogativas”, elencadas no art. 2º de seu Estatuto, figuram apenas disposições de caráter eminentemente
coorporativas e de interesse próprio da categoria, como por exemplo: “(a) representar, perante autoridade administrativas e
judiciárias os interesses gerais e individuais da categoria dos médicos, podendo promover ações de representação e substituição
processual de toda a categoria, médicos sócios e não sócios, inclusive da defesa dos direitos difusos e dos direitos do consumidor;
(b) celebrar convenções e acordos coletivos de trabalho e colaborar nas comissões de conciliação e tribunais de trabalho;
(c)adotar medidas de utilidade e beneficência para os seus associados de acordo com os regulamento que forem elaborados”, entre
outros.
Do exposto, indefiro o pedido.
Publique-se.
Brasília, 15 de abril de 2005.
Ministro JOAQUIM BARBOSA
Relator
*decisão publicada no DJU de 25.4.2005.
Concurso Público: Princípio da Realidade e Exigência Temporal (Transcrições)
MS 25326/DF*
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
DECISÃO
MANDADO DE SEGURANÇA - CONCURSO - REALIZAÇÃO DE PROVA ORAL - RELEVÂNCIA DO PEDIDO E
RISCO DE SE MANTER COM EFICÁCIA O QUADRO - LIMINAR DEFERIDA.
1. Discute-se o alcance do artigo 187 da Lei Complementar nº 75/93: “Poderão inscrever-se no concurso bacharéis em
Direito há pelo menos dois anos, de comprovada idoneidade moral”. Assevera o impetrante que, à época da inscrição definitiva,
contava com os citados dois anos, não cabendo, assim, obstaculizar-se a feitura da prova oral. Recurso administrativo teria sido
indeferido pelo Procurador-Geral. Alude à circunstância de o mencionado artigo 187, alvo de exame na Ação Direta de
Inconstitucionalidade nº 1.040-9/DF, não definir se a exigência diz respeito à inscrição provisória, preliminar ou definitiva. Discorre
o impetrante sobre o tema, requerendo a concessão de liminar que lhe viabilize o comparecimento às provas orais. Faz referência a
outras ações - civil pública e mandado de segurança -, salientando que, na primeira, houve sentença, afastando-se a exigência dos
dois anos para inscrição. Formula pedidos sucessivos quanto ao julgamento final, a saber:
a) que se conceda a ordem para concluir haver o impetrante atendido à exigência legal, sendo esta própria à inscrição
definitiva;
b) seja afastado o ato apontado como coator, ante equivocada interpretação do que decidido no Mandado de Segurança nº
24.985-4/DF;
c) defira-se a segurança, tendo em conta o princípio da isonomia, porquanto 24 outros candidatos, dos 79 convocados
para as provas orais, estão em situação semelhante à do impetrante e continuam no certame;
d) conceda-se a segurança, tendo em conta a decisão proferida na Ação Civil Pública nº 2004.83.00.012454-5.
2. O princípio da realidade, a sobrepor o conteúdo ao aspecto formal, sinaliza a relevância do que articulado na inicial.
Evidentemente, a exigência de dois anos de bacharelado possui móvel próprio, ou seja, buscar-se, tendo em conta a diplomação, e
não possível exigência de efetivo exercício, a experiência do candidato. A esta altura, o indeferimento da medida acauteladora
poderá implicar prejuízo irreversível, em face da dinâmica do concurso público, deixando o impetrante de comparecer às provas
orais.
3. Defiro a medida acauteladora para afastar o óbice até aqui existente - exigência de dois anos de bacharelado quando da
inscrição preliminar - à feitura da prova oral.
4. Publique-se, procedendo-se à comunicação do deferimento da liminar, via fac-símile, ao Procurador-Geral da República.
5. Solicitem-se informações.
6. Publique-se.
Brasília, 10 de abril de 2005.
Ministro MARCO AURÉLIO
Relator
*decisão publicada no DJU de 25.4.2005.
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 385
Brasília, 25 a 29 de abril de 2005 Nº 385
Data (páginas internas): 4 de maio de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
ADPF. Anencefalia. Aborto - 2 e 3
CNMP: EC 45/2004 e Vício Formal
Demarcação de Terras Indígenas e Devido Processo Legal
1ª Turma
Art. 113 do CP e Prisão Cautelar
Notícia-Crime e Delação Anônima - 2
2ª Turma
Sociedade Civil de Direito Privado e Ampla Defesa - 3
Empregada Gestante e Contrato por Prazo Determinado - 2
Clipping do DJ
Transcrições
Fiador. Contrato de Locação. Bem de Família. Impenhorabilidade (RE 352940/SP)
Porte Ilegal de Arma sem Munição (RHC 81057/SP)
PLENÁRIO
ADPF. Anencefalia. Aborto - 2
Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, por maioria, resolveu questão de ordem suscitada pelo
Procurador-Geral da República, no sentido de assentar a adequação da argüição de descumprimento de
preceito fundamental ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde - CNTS, na qual
se pretende obter posicionamento do STF sobre o aborto de feto anencéfalo — v. Informativos 354, 366 e
367. A argüente aponta como violados os preceitos dos artigos 1º, IV (dignidade da pessoa humana); 5º,
II (princípio da legalidade, liberdade e autonomia da vontade); 6º, caput, e 196 (direito à saúde), todos da
CF, e, como ato do Poder Público, causador da lesão, o conjunto normativo ensejado pelos artigos 124,
126, caput, e 128, I e II, do Código Penal, requerendo, em última análise, a interpretação conforme à
Constituição dos referidos dispositivos do CP, a fim de explicitar que os mesmos não se aplicam aos
casos de aborto de feto anencéfalo. Entendeu-se, nos termos do voto do relator, que os requisitos
concernentes à ação foram devidamente atendidos (Lei 9.882/99, arts. 1º, 3º e 4º, § 1º). Salientando de
um lado a presença de argumentos em torno de valores básicos inafastáveis no Estado Democrático de
Direito e, de outro, os enfoques do Judiciário com arrimo em conclusões sobre o alcance dos dispositivos
do Código Penal que dispõem sobre o crime de aborto, concluiu-se pela necessidade do pronunciamento
do Tribunal, a fim de se evitar a insegurança jurídica decorrente de decisões judiciais discrepantes acerca
da matéria. Assentou-se a inexistência de outro meio eficaz de sanar a lesividade alegada, apontando-se,
como fundamento, o que verificado relativamente ao habeas corpus 84025/RJ (DJU de 25.6.2004), da
relatoria do Min. Joaquim Barbosa, no qual a paciente, não obstante recorrer a essa via processual, antes
do pronunciamento definitivo pela Corte, dera à luz a feto que veio a óbito em minutos, ocasionando o
prejuízo da impetração. Ressaltou-se, também, o que consignado na ADPF 33 MC/PA (DJU de 6.8.2004),
por seu relator, Min. Gilmar Mendes, quanto ao caráter acentuadamente objetivo da ADPF e a
necessidade de o juízo da subsidiariedade ter em vista os demais processos objetivos já consolidados no
sistema constitucional — a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de
constitucionalidade. Assim, incabíveis estas, como no caso de controle de legitimidade do direito préconstitucional, possível a utilização daquela.
ADPF 54 QO/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 27.4.2005. (ADPF-54)
ADPF. Anencefalia. Aborto - 3
Em acréscimo aos fundamentos do relator, o Min. Carlos Britto asseverou a possibilidade do
emprego da interpretação conforme à Constituição, tendo em conta a pluralidade de entendimentos
quanto ao conteúdo e alcance dos citados artigos do CP, bem como a diversidade de decisões dela
resultantes. O Min. Gilmar Mendes retomou fundamentos por ele adotados na citada ADPF 33 MC/PA. O
Min. Sepúlveda Pertence, também acompanhando o voto do relator, mas, ressalvando a tese de que só o
cabimento de um processo objetivo outro obstaria a utilização da ADPF, entendeu ser patente a relevância
da controvérsia constitucional e que apenas uma medida extrema, como a utilizada, com efeitos erga
omnes e eficácia vinculante, seria capaz de reparar a lesão ocorrida ou obviar a ameaça identificada.
Refutou, ainda, o fundamento de que a ADPF se reduziria a requerer que fizesse incluir uma 3ª alínea no
art. 128 do CP, por considerar que a pretensão formulada é no sentido de se declarar, em homenagem aos
princípios constitucionais aventados, não a exclusão de punibilidade, mas a atipicidade do fato. Por sua
vez, o Min. Nelson Jobim, Presidente, ressaltou que o art. 128 e seus incisos pressupõem sempre que há
vida possível do feto, e que essa potencialidade de vida nos conduz a examinar o art. 124 para discutir se,
sob sua égide, se inclui um tipo de feto que não tenha essa possibilidade, a fim de verificar se essa
interpretação é ou não compatível com o caput do art. 5º da CF, que se refere à inviolabilidade do direito
à vida. Concluiu estar tanto aí quanto na insegurança jurídica das decisões contraditórias a controvérsia
constitucional posta. Vencidos os Ministros Eros Grau, Cezar Peluso e Ellen Gracie que não conheciam
da ação por considerar, em síntese, que o pedido de interpretação conforme dos artigos implicaria ofensa
ao princípio da reserva legal, criando mais uma hipótese de excludente de punibilidade. Vencido, da
mesma forma, o Min. Carlos Velloso que julgava incabível a argüição, em razão de a pretensão da
argüente equivaler, em última análise, a uma declaração de inconstitucionalidade parcial, sem redução de
texto, de disposições legais pré-constitucionais. Determinou-se, por fim, o retorno dos autos ao relator
para examinar se é caso ou não da aplicação do art. 6º, § 1º da Lei 9.882/99.
ADPF 54 QO/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 27.4.2005. (ADPF-54)
CNMP: EC 45/2004 e Vício Formal
Por considerar densa a plausibilidade da alegação de desrespeito ao § 2º do art. 60 da CF, que
dispõe sobre o processo legislativo referente à proposta de emenda constitucional, o Tribunal concedeu
liminar requerida em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Associação Nacional dos
Membros do Ministério Público – CONAMP para suspender a eficácia das expressões “e do Ministério
Público”, “respectivamente” e “e ao Ministério Público da União”, contidas no § 1º do art. 5º da Emenda
Constitucional 45/2004 (“Art. 5º O Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério
Público serão instalados no prazo de cento e oitenta dias a contar da promulgação desta Emenda,
devendo a indicação ou escolha de seus membros ser efetuada até trinta dias antes do termo final. § 1º
Não efetuadas as indicações e escolha dos nomes para os Conselhos Nacional de Justiça e do Ministério
Público dentro do prazo fixado no caput deste artigo, caberá, respectivamente, ao Supremo Tribunal
Federal e ao Ministério Público da União realizá-las.”). Entendeu-se que a inovação promovida pelo
Senado quanto à indicação e escolha supletiva de nomes para o Conselho Nacional do Ministério Público
teria implicado alteração substancial no texto aprovado, em dois turnos, pela Câmara dos Deputados,
segundo o qual caberia, também ao STF, o aludido mister.
ADI 3472 MC/DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 28.4.2005. (ADPF-54)
Demarcação de Terras Indígenas e Devido Processo Legal
O Tribunal, por maioria, denegou mandado de segurança impetrado por proprietários de glebas
rurais no Município de Pesqueira, no Estado de Pernambuco, contra o decreto presidencial de 30.4.2001,
publicado no Diário Oficial de 2.5.2001, que homologou a demarcação de terras indígenas da Tribo
Xucuru, na região onde localizadas as propriedades dos impetrantes. Insurgiam-se estes contra a distinção
feita pelo Decreto 1.775/96 relativa ao direito de defesa em processos demarcatórios iniciados antes e
depois de seu advento, pois, neste caso, haveria uma única oportunidade para defesa e, naquele, a defesa
alcançaria todas as fases do processo de demarcação. Inicialmente, por maioria, afastou-se a preliminar de
nulidade do processo por ausência de citação da FUNAI como litisconsorte passiva, bem como a de
ausência de direito líquido e certo dos impetrantes. No mérito, entendeu-se, com base no que decidido no
MS 21649/MS (DJU de 15.12.2000), que o Decreto 1.775/96, ao invés de violar o princípio da ampla
defesa, veio a corrigir erros que se encontravam no decreto anterior que disciplinava a matéria (Decreto
22/91). Ressaltou-se que, nos processos iniciados antes do advento do Decreto 1.775/96, o nível de
impugnação à demarcação das terras não poderia ser o mesmo que o outorgado aos processos surgidos
após o seu advento, uma vez que, na primeira hipótese, os trabalhos referentes à demarcação já teriam
tido início. Afirmou-se que o decreto poderia estabelecer tanto um procedimento diferenciado para os
processos iniciados antes de seu advento como anulá-los, e que, neste caso, haveria um ônus redobrado
tanto para os interessados quanto para a Administração. Concluiu-se que o direito à ampla defesa fora
observado, porquanto concedido a todos os interessados o direito de se manifestarem em prazos
razoáveis, salientando-se, por fim, o fato de o decreto homologatório impugnado ter sido precedido de
contestação dos impetrantes. Vencido o Min. Marco Aurélio que concedia a ordem por considerar que, a
despeito de o Decreto 1.775/96 prever a defesa quanto aos processos em curso, por não ter sido esta
viabilizada desde o início do processo administrativo, restaria violado o princípio do contraditório.
MS 24045/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 28.4.2005. (ADPF-54)
PRIMEIRA TURMA
Art. 113 do CP e Prisão Cautelar
O art. 113 do Código Penal tem aplicação vinculada às hipóteses de evasão do condenado ou de
revogação do livramento condicional, não se referindo ao tempo de prisão cautelar para efeito do cálculo
da prescrição (CP: “Art. 113 - No caso de evadir-se o condenado ou de revogar-se o livramento
condicional, a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena”). Com base nesse entendimento, a
Turma, por maioria, negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus no qual se pretendia que a
prescrição da pretensão executória fosse calculada com base no restante da pena a cumprir, descontados
os dias em que o réu estivera preso provisoriamente, como resultado da detração operada com base no art.
42 do CP. No caso, o recorrente fora preso em flagrante delito e condenado a um ano de reclusão e dez
dias-multa, pena substituída por restritiva de direitos e, posteriormente, convertida em privativa de
liberdade, em razão do descumprimento da pena alternativa. Considerou-se o princípio da legalidade
estrita, de observância cogente em matéria penal, que impede a interpretação extensiva ou analógica das
normas penais. Vencido o Min. Marco Aurélio, que dava provimento ao recurso. Precedentes citados: HC
69865/PR (DJU de 26.11.93); HC 74071/SP (DJU de 11.4.97).
RHC 85026/SP, rel. Min. Eros Grau, 26.4.2005. (RHC-85026)
Notícia-Crime e Delação Anônima - 2
A Turma retomou julgamento de habeas corpus em que se pretende o trancamento, por falta de
justa causa, de notícia-crime, instaurada no STJ, por requisição do Ministério Público Federal, contra juiz
estadual e dois desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado de Tocantins, pela suposta prática do
delito de tráfico de influência (CP, art. 332). Sustenta o impetrante que a atuação do parquet se fez com
base unicamente em denúncia anônima, o que violaria o inciso IV do art. 5º da CF (“IV - é livre a
manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;”) e o disposto nos artigos 144 da Lei 8.112/90
e 14, § 1º, da Lei 8.429/92, no que versam sobre a inidoneidade da denúncia anônima para os fins quer de
instauração de processo administrativo, quer de ação concernente à improbidade administrativa — v.
Informativo 376. O Min. Carlos Britto, em voto-vista, indeferiu o habeas corpus por entender que a
requisição assentara-se não apenas no documento apócrifo, mas, também, na análise de decisões
proferidas pela Justiça do Estado do Tocantins, valendo-se, portanto, de outros elementos para chegar à
conclusão no sentido da necessidade de melhor esclarecimento dos fatos. Considerou que os indícios de
irregularidades constatados nas referidas decisões judiciais, dado o caráter público destas, poderiam ter
chegado ao conhecimento do parquet independemente da existência da denúncia anônima, não havendo
se falar, por isso, em ofensa a direitos à honra, vida privada, imagem ou intimidade do paciente como
conseqüência da atuação da Procuradoria-Geral da República. Em seguida, os Ministros Eros Grau, que
ratificou seu voto anterior, e Cezar Peluso acompanharam o voto do Min. Marco Aurélio, relator,
deferindo o writ. O julgamento foi suspenso com o pedido de vista do Min. Sepúlveda Pertence.
HC 84827/TO, rel. Min. Marco Aurélio, 26.4.2005. (HC-84827)
SEGUNDA TURMA
Sociedade Civil de Direito Privado e Ampla Defesa - 3
A Turma retomou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro que mantivera decisão que reintegrara associado excluído do quadro
da sociedade civil União Brasileira de Compositores - UBC, sob o entendimento de que fora violado o
seu direito de defesa, em virtude de o mesmo não ter tido a oportunidade de refutar o ato que resultara na
sua punição — v. Informativos 351 e 370. O Min. Joaquim Barbosa, em voto-vista, acompanhando o
Min. Gilmar Mendes, negou provimento ao recurso. Entendeu que os princípios fundamentais têm
aplicação no âmbito das relações privadas e que, na espécie, os princípios constitucionais da ampla defesa
e do contraditório deveriam ter sido observados na exclusão de sócio, tendo em conta a natureza peculiar
da associação em causa, a qual possui caráter quase público. Por fim, asseverou que a incidência de
direitos fundamentais nas relações privadas há de ser aferida caso a caso, para não se suprimir a
autonomia privada. Por outro lado, o Min. Carlos Velloso dissentiu e, seguindo o voto da Min. Ellen
Gracie, relatora, deu provimento ao recurso. Considerou que a questão cinge-se ao âmbito
infraconstitucional, haja vista tratar-se de alegação de ofensa ao princípio do devido processo legal, cuja
lei, no caso, seria o estatuto da associação a qual o recorrido aderira. Ressaltou, ainda, que, aplicado o
Novo Código Civil, o tema seria de legalidade e que, incidente o antigo, de matéria regimental. Após,
pediu vista o Min. Celso de Mello.
RE 201819/RJ, rel. Min. Ellen Gracie, 26.4.2005. (RE-201819)
Empregada Gestante e Contrato por Prazo Determinado - 2
A Turma retomou julgamento de recurso extraordinário interposto pelo Estado de Santa Catarina
contra acórdão do Tribunal de Justiça desse Estado que concedera, em parte, mandado de segurança à
recorrida, contratada temporariamente como professora, sob o regime da Lei 8.391/91, para assegurar-lhe
o direito à licença-maternidade. Na espécie, o acórdão recorrido entendera que, em razão de a impetrante
estar a menos de dois meses do parto no momento em que encerrado o contrato de trabalho, o direito à
licença deveria ser ao mesmo integrado, haja vista ser uma proteção ao nascituro e ao infante e não uma
benesse ao trabalhador — v. Informativo 364. O Min. Joaquim Barbosa, em voto-vista, acompanhou a
Min. Ellen Gracie, relatora, e deu provimento ao recurso por considerar incompatíveis os institutos da
estabilidade provisória com o do contrato temporário. Afirmou que não estariam presentes os dois
requisitos objetivos condicionantes da estabilidade provisória, quais sejam, dispensa arbitrária e ausência
de justa causa, os quais, somados à gravidez, ensejariam o pedido, uma vez que, na espécie, a extinção do
contrato ocorrera em virtude de prazo prefixado. Asseverou, também, que o contrato temporário, exceção
ao contrato por prazo determinado vigorante no sistema da CLT, segue normas próprias e, deste modo,
admitir-se a estabilidade provisória no seu curso seria violar o princípio da autonomia da vontade. Após,
o julgamento foi suspenso em razão do pedido de vista do Min. Carlos Velloso.
RE 287905/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 26.4.2005. (RE-287905)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
27.4.2005
26.4.2005
26.4.2005
Extraordinárias
28.4.2005
——
——
Julgamentos
5
117
185
CLIPPING
DO
DJ
29 de abril de 2005
ADI N. 246-RJ
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 368 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO. RENUMERAÇÃO DO PRECEITO, MANTIDO O TEXTO ORIGINAL. ADITAMENTO PROMOVIDO PELO
AUTOR. PRELIMINAR DE PREJUDICIALIDADE REJEITADA. NORMA CONSTITUCIONAL ESTADUAL QUE DISPÕE
SOBRE APLICAÇÃO, INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DE TEXTOS NORMATIVOS ESTADUAIS.
CONSTITUCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL EXCLUSIVA DA UNIÃO. QUEBRA
DO PRINCÍPIO FEDERATIVO E DA INTERDEPENDÊNCIA E HARMONIA ENTRE OS PODERES. INOCORRÊNCIA. 1. A
renumeração do preceito constitucional estadual impugnado, mantido na íntegra o texto original, não implica a prejudicialidade da
ação direta, desde que promovido o aditamento à petição inicial. Precedente [ADI 1.874, Relator o Ministro MAURÍCIO CORREA,
DJ 07.02.2003]. 2. Inexistente atribuição de competência exclusiva à União, não ofende a Constituição do Brasil norma
constitucional estadual que dispõe sobre aplicação, interpretação e integração de textos normativos estaduais, em conformidade com
a Lei de Introdução ao Código Civil. 3. Não há falar-se em quebra do pacto federativo e do princípio da interdependência e
harmonia entre os poderes em razão da aplicação de princípios jurídicos ditos “federais” na interpretação de textos normativos
estaduais. Princípios são normas jurídicas de um determinado direito, no caso, do direito brasileiro. Não há princípios jurídicos
aplicáveis no território de um, mas não de outro ente federativo, sendo descabida a classificação dos princípios em “federais” e
“estaduais”. 4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada improcedente.
* noticiado no Informativo 374
ADI N. 951-SC
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DISPOSITIVOS DAS LEIS COMPLEMENTARES 78/1993 E
90/1993 DO ESTADO DE SANTA CATARINA E DA RESOLUÇÃO 40/1992 DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO
DE SANTA CATARINA. Inadmissibilidade, à luz da Constituição de 1988, de formas derivadas de investidura em cargos públicos.
Inconstitucionalidade de normas estaduais que prevêem hipóteses de progressão funcional por acesso, transposição (em modalidade
individual, diversa das exceções admitidas pela jurisprudência do STF), enquadramento a partir de estabilidade não decorrente de
investidura por concurso público, acesso por seleção interna, transferência entre quadros e enquadramento por correção de disfunção
relativamente ao nível de escolaridade do servidor.
Ação prejudicada em parte, em decorrência da revogação de dispositivos atacados. Ação procedente na parte restante, para se
declarar a inconstitucionalidade do art. 12, caput e § 1º, § 2º e § 3º, da Lei Complementar estadual 78/1993 e do inciso II, § 2º e § 3º
do art. 17 da Resolução 40/1992 da Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina.
* noticiado no Informativo 370
ADI N. 1.442-DF
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE ATIVA DE CENTRAL
SINDICAL (CUT) - IMPUGNAÇÃO A MEDIDA PROVISÓRIA QUE FIXA O NOVO VALOR DO SALÁRIO MÍNIMO ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE EM FACE DA INSUFICIÊNCIA DESSE VALOR SALARIAL REALIZAÇÃO INCOMPLETA DA DETERMINAÇÃO CONSTANTE DO ART. 7º, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA - HIPÓTESE DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO PARCIAL - IMPOSSIBILIDADE DE
CONVERSÃO DA ADIN EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO - AÇÃO DIRETA DE
QUE NÃO SE CONHECE, NO PONTO - MEDIDA PROVISÓRIA QUE SE CONVERTEU EM LEI - LEI DE CONVERSÃO
POSTERIORMENTE REVOGADA POR OUTRO DIPLOMA LEGISLATIVO - PREJUDICIALIDADE DA AÇÃO
DIRETA.
FALTA DE LEGITIMIDADE ATIVA DAS CENTRAIS SINDICAIS PARA O AJUIZAMENTO DE AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE.
- No plano da organização sindical brasileira, somente as confederações sindicais dispõem de legitimidade ativa “ad causam” para
o ajuizamento da ação direta de inconstitucionalidade (CF, art. 103, IX), falecendo às centrais sindicais, em conseqüência, o poder
para fazer instaurar, perante o Supremo Tribunal Federal, o concernente processo de fiscalização normativa abstrata. Precedentes.
SALÁRIO MÍNIMO - VALOR INSUFICIENTE - SITUAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO PARCIAL.
- A insuficiência do valor correspondente ao salário mínimo - definido em importância que se revele incapaz de atender as
necessidades vitais básicas do trabalhador e dos membros de sua família - configura um claro descumprimento, ainda que parcial,
da Constituição da República, pois o legislador, em tal hipótese, longe de atuar como sujeito concretizante do postulado
constitucional que garante à classe trabalhadora um piso geral de remuneração digna (CF, art. 7º, IV), estará realizando, de modo
imperfeito, porque incompleto, o programa social assumido pelo Estado na ordem jurídica.
- A omissão do Estado - que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional qualifica-se como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante inércia, o Poder Público
também desrespeita a Constituição, também compromete a eficácia da declaração constitucional de direitos e também impede,
por ausência de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental.
- As situações configuradoras de omissão inconstitucional, ainda que se cuide de omissão parcial, refletem comportamento estatal
que deve ser repelido, pois a inércia do Estado - além de gerar a erosão da própria consciência constitucional - qualifica-se,
perigosamente, como um dos processos informais de mudança ilegítima da Constituição, expondo-se, por isso mesmo, à censura
do Poder Judiciário. Precedentes: RTJ 162/877-879, Rel. Min. CELSO DE MELLO - RTJ 185/794-796, Rel. Min. CELSO DE
MELLO.
O DESPREZO ESTATAL POR UMA CONSTITUIÇÃO DEMOCRÁTICA REVELA-SE INCOMPATÍVEL COM O
SENTIMENTO CONSTITUCIONAL RESULTANTE DA VOLUNTÁRIA ADESÃO POPULAR À AUTORIDADE
NORMATIVA DA LEI FUNDAMENTAL.
- A violação negativa do texto constitucional, resultante da situação de inatividade do Poder Público - que deixa de cumprir ou se
abstém de prestar o que lhe ordena a Lei Fundamental - representa, notadamente em tema de direitos e liberdades de segunda
geração (direitos econômicos, sociais e culturais), um inaceitável processo de desrespeito à Constituição, o que deforma a vontade
soberana do poder constituinte e que traduz conduta estatal incompatível com o valor ético-jurídico do sentimento constitucional,
cuja prevalência, no âmbito da coletividade, revela-se fator capaz de atribuir, ao Estatuto Político, o necessário e indispensável
coeficiente de legitimidade social.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE E REVOGAÇÃO SUPERVENIENTE DO ATO ESTATAL IMPUGNADO.
- A revogação superveniente do ato estatal impugnado faz instaurar situação de prejudicialidade que provoca a extinção anômala
do processo de fiscalização abstrata de constitucionalidade, eis que a ab-rogação do diploma normativo questionado opera, quanto a
este, a sua exclusão do sistema de direito positivo, causando, desse modo, a perda ulterior de objeto da própria ação direta,
independentemente da ocorrência, ou não, de efeitos residuais concretos. Precedentes.
HC N. 85.059-MS
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Competência para o processo de crime de tráfico internacional de entorpecente apreendido no interior de
aeronave que pousou em Município que não é sede de Vara da Justiça Federal: Alegada competência da Justiça estadual
(art. 27 da L. 6.368/76): nulidade relativa: preclusão: Precedente. Conforme o decidido no HC 70.627, 1ª T., Sydney Sanches,
DJ 18.11.94, é federal a jurisdição exercida por Juiz estadual na hipótese do art. 27 da L. 6.368/76. Corrobora a tese o disposto no
art. 108, II, da Constituição, segundo o qual cabe aos Tribunais Regionais Federais “julgar, em grau de recurso, as causas decididas
pelos juízes federais e pelos juízes estaduais no exercício da competência federal da área de sua jurisdição”. É territorial, portanto,
o critério para saber se ao Juiz federal ou estadual, na hipótese do art. 27 da L. 6.368/76, cabe o “exercício de competência federal”;
e, por isso, se nulidade houvesse seria ela relativa, sanada à falta de argüição oportuna. II. Competência da Justiça Federal: crime
praticado a bordo de navios ou aeronaves (art. 109, IX, da Constituição): Precedente (HC 80.730, Jobim, DJ 22.3.02). É da
jurisprudência do STF que, para o fim de determinação de competência, a incidência do art. 109, IX, da Constituição, independe da
espécie do crime cometido “a bordo de navios ou aeronaves”, cuja persecução, só por isso, incumbe por força da norma
constitucional à Justiça Federal.
* noticiado no Informativo 377
Acórdãos Publicados: 389
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Fiador. Contrato de Locação. Bem de Família. Impenhorabilidade (Transcrições)
RE 352940/SP*
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. CIVIL. FIADOR: BEM DE FAMÍLIA: IMÓVEL RESIDENCIAL DO CASAL
OU DE ENTIDADE FAMILIAR: IMPENHORABILIDADE. Lei nº 8.009/90, arts. 1º e 3º. Lei 8.245, de 1991, que
acrescentou o inciso VII, ao art. 3º, ressalvando a penhora “por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de
locação”: sua não-recepção pelo art. 6º, C.F., com a redação da EC 26/2000. Aplicabilidade do princípio isonômico e do
princípio de hermenêutica: ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio: onde existe a mesma razão fundamental, prevalece a
mesma regra de Direito. Recurso extraordinário conhecido e provido.
DECISÃO: - Vistos. O acórdão recorrido, em embargos à execução, proferido pela Quarta Câmara do Eg. Segundo
Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, está assim ementado:
“A norma constitucional que inclui o direito à moradia entre os sociais (artigo 6º do Estatuto Político da República,
texto conforme a Emenda 26, de 14 de fevereiro de 2000) não é imediatamente aplicável, persistindo, portanto, a
penhorabilidade do bem de família de fiador de contrato de locação imobiliária urbana.
A imposição constitucional, sem distinção ou condicionamento, de obediência ao direito adquirido, ao ato jurídico
perfeito e à coisa julgada é inarredável, ainda que se cuide, a regra eventualmente transgressora, de norma de alcance
social e de ordem pública.” (Fl. 81)
Daí o RE, interposto por ERNESTO GRADELLA NETO e GISELDA DE FÁTIMA GALVES GRADELLA, fundado no
art. 102, III, a, da Constituição Federal, sustentando, em síntese, o seguinte:
a) impenhorabilidade do bem de família do fiador em contrato de locação, dado que o art. 6º da Constituição
Federal, que se configura como auto-aplicável, assegura o direito à moradia, o que elidiria a aplicação do disposto no
art. 3º, VII, da Lei 8.009/90, redação da Lei 8.245/91;
b) inexistência de direito adquirido contra a ordem pública, porquanto “(...) a norma constitucional apanha situações
existentes sob sua égide, ainda que iniciadas no regime antecedente” (fl. 88).
Admitido o recurso, subiram os autos.
A Procuradoria-Geral da República, em parecer lavrado pela ilustre Subprocuradora-Geral da República, Drª. Maria
Caetana Cintra Santos, opinou pelo não-conhecimento do recurso.
Autos conclusos em 15.10.2004.
Decido.
A Lei 8.009, de 1990, art. 1º, estabelece a impenhorabilidade do imóvel residencial do casal ou da entidade familiar e
determina que não responde o referido imóvel por qualquer tipo de dívida, salvo nas hipóteses previstas na mesma lei, art. 3º, inciso
I a VI.
Acontece que a Lei 8.245, de 18.10.91, acrescentou o inciso VII, a ressalvar a penhora “por obrigação decorrente de fiança
concedida em contrato de locação.”
É dizer, o bem de família de um fiador em contrato de locação teria sido excluído da impenhorabilidade.
Acontece que o art. 6º da C.F., com a redação da EC nº 26, de 2000, ficou assim redigido:
“Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, a segurança a previdência social, a
proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”
Em trabalho doutrinário que escrevi — “Dos Direitos Sociais na Constituição do Brasil”, texto básico de palestra que
proferi na Universidade de Carlos III, em Madri, Espanha, no Congresso Internacional de Direito do Trabalho, sob o patrocínio da
Universidade Carlos III e da ANAMATRA, em 10.3.2003 — registrei que o direito à moradia, estabelecido no art. 6º, C.F., é um
direito fundamental de 2ª geração — direito social — que veio a ser reconhecido pela EC 26, de 2000.
O bem de família — a moradia do homem e sua família — justifica a existência de sua impenhorabilidade: Lei 8.009/90, art.
1º. Essa impenhorabilidade decorre de constituir a moradia um direito fundamental.
Posto isso, veja-se a contradição: a Lei 8.245, de 1991, excepcionando o bem de família do fiador, sujeitou o seu imóvel
residencial, imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, à penhora. Não há dúvida que ressalva trazida pela Lei
8.245, de 1991, — inciso VII do art. 3º — feriu de morte o princípio isonômico, tratando desigualmente situações iguais,
esquecendo-se do velho brocardo latino: ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio, ou em vernáculo: onde existe a mesma razão
fundamental, prevalece a mesma regra de Direito.
Isto quer dizer que, tendo em vista o princípio isonômico, o citado dispositivo — inciso VII do art. 3º, acrescentado pela Lei
8.245/91, não foi recebido pela EC 26, de 2000.
Essa não recepção mais se acentua diante do fato de a EC 26, de 2000, ter estampado, expressamente, no art. 6º, C.F., o
direito à moradia como direito fundamental de 2ª geração, direito social. Ora, o bem de família — Lei 8.009/90, art. 1º — encontra
justificativa, foi dito linha atrás, no constituir o direito à moradia um direito fundamental que deve ser protegido e por isso mesmo
encontra garantia na Constituição.
Em síntese, o inciso VII do art. 3º da Lei 8.009, de 1990, introduzido pela Lei 8.245, de 1991, não foi recebido pela CF, art.
6º, redação da EC 26/2000.
Do exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento, invertidos os ônus da sucumbência.
Publique-se.
Brasília, 25 de abril de 2005.
Ministro CARLOS VELLOSO
- Relator * decisão pendente de publicação
Porte Ilegal de Arma sem Munição (Transcrições)
RHC 81057/SP*
(v. Informativo 349)
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
VOTO: Cuida-se de saber da incriminação, à luz do art. 10, caput, e § IV, da L. 9437/97, do fato de o agente - portador de
condenação anterior por crime contra o patrimônio - trazer consigo, à cintura, arma de fogo (denúncia, f. 6), no entanto,
desmuniciada (f. 11).
02.
Como a denúncia, ambas as decisões das instâncias de mérito julgaram irrelevante estar o revólver sem munição.
03.
Aduz a sentença - f. 109:
“... uma arma, ainda que não municiada, oferece potencial lesivo ao convívio social e é este convívio que o legislador
busca tutelar. Uma arma tem força intimidativa, pois a vítima, não sabe se em seu tambor há munição ou não.”
04.
Na mesma linha, o acórdão que confirmou a condenação e que se pretende baseado em Damásio de Jesus (f. 121, 123).
05.
Donde, o habeas corpus por falta de justa causa, que o STJ denegou.
06.
O julgado, da lavra do il. Ministro Gilson Dipp, assinala - f. 136:
“O art. 10 da Lei nº 9.437/97, assim dispõe:
“Possuir, deter, portar, fabricar, adquirir, vender, alugar, expor à venda ou fornecer, receber, ter em depósito,
transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda e ocultar arma de
fogo, de uso permitido, sem a autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Pena - detenção de um a dois anos e multa.”
Nos termos do r. art. de lei, no qual incurso o ora paciente, entende-se como suficiente para a configuração do delito, tãosomente o porte de arma de fogo sem autorização da autoridade competente.
Assim, a circunstância de a arma estar desmuniciada não pode excluir a tipicidade, sob o singelo argumento de que não
acarretaria lesão a qualquer bem jurídico, como sustentado pela impetração.
Como bem ressaltado em sede de parecer ministerial, o porte ilegal de arma de fogo coloca em risco toda a paz social, bem
jurídico a ser protegido pelo art. de lei ora em comento, não sendo escusável pelo fato de a arma estar desmuniciada,
porque, mesmo assim, ela oferece potencial poder de lesão (fl. 132).”
07.
Invoca-se precedente daquele Tribunal, a propósito da contravenção de porte de arma (REsp 43234, Cid Scartezzini, DJ
16.6.97).
08.
O recurso ordinário insiste na inexistência do crime, dado que o porte desmuniciado não lesa nem gera dano potencial ao
bem jurídico.
09.
Cita-se excerto do d. Ministro Cernicchiaro, em decisão do STJ - REsp 32322, DJ 2.8.93:
“A infração penal não é só conduta. Impõe-se, ainda, resultado no sentido normativo do termo, ou seja, dano ou perigo ao
bem juridicamente tutelado. A doutrina vem reiterada e insistentemente renegando os delitos de perigo abstrato. Com efeito,
não faz sentido, punir pela simples ação, se ela não trouxer, pelo menos, probabilidade (não possibilidade) de risco ao
objeto jurídico.”
10.
Referem-se decisões do TACRIM - ainda a respeito da contravenção - julgada inexistente quando a arma estava despida
de munição.
11.
Parecer do Ministério Público Federal pelo desprovimento do recurso, de autoria do il. Subprocurador-Geral Raimundo
de Bonis, que, além de endossar as razões dos julgados anteriores, entende de aplicação analógica ao caso o entendimento que dá
por qualificado o roubo com emprego de arma de brinquedo.
12.
Relatora, a em. Ministra Ellen Gracie nega provimento ao recurso e assinala:
“O crime é de mera conduta e, segundo dicção de Fernando Capez, de perigo abstrato, não tendo a lei exigido a efetiva
exposição de outrem a risco, sendo irrelevante a avaliação subsequente sobre a ocorrência de perigo à coletividade. Nos
crimes de perigo abstrato, segundo Capez, “a opção política do Poder Legislativo em considerar o fato, formal e
materialmente, típico independentemente de alguém, no caso concreto, vir a sofrer perigo real, não acoima a lei definidora de
atentatória à dignidade humana. Ao contrário. Revela, por parte do legislador, disposição ainda maior de tutelar o bem
jurídico, reprimindo a conduta violadora desde o seu nascedouro, procurando não lhe dar qualquer chance de desdobramento
progressivo capaz de convertê-la em posterior perigo concreto e, depois, em dano efetivo. Trata-se de legítima opção política
de resguardar, de modo mais abrangente e eficaz, a vida, a integridade corporal e a dignidade das pessoas, ameaçadas com a
mera conduta de sair de casa ilegalmente armado. Realizando a conduta descrita no tipo, o autor já estará colocando a
incolumidade pública em risco, pois protegê-la foi o desejo manifestado pela lei. Negar vigência ao dispositivo nos casos em
que não se demonstra perigo real, sob o argumento de que atentaria contra a dignidade da pessoa humana, implica reduzir o
âmbito protetor do dispositivo, com base em justificativas no mínimo discutíveis. Diminuindo a proteção às potenciais
vítimas de ofensas mais graves, produzidas mediante o emprego de armas de fogo, deixando-as a descoberto contra o dano
em seu nascedouro, o intérprete estará relegando o critério objetivo da lei ao seu, de cunho subjetivo e pessoal. Privilegia-se a
condição do infrator em detrimento do ofendido, contra a expressa letra da lei. A presunção da injuria, por essa razão,
caracteriza mero critério de política criminal, eleito pelo legislador com a finalidade de ofertar forma mais ampla e eficaz de
tutela do bem jurídico.” (“Arma de Fogo - Comentários à Lei nº 9.437, de 20.2.1997”, ed. Saraiva, 1997, págs. 25/26)”
13.
Pedi vista e passo a proferir meu voto.
14.
Assinalo, de logo, que a superveniência da L. 10826/2003 - o chamado “Estatuto do Desarmamento” - não afeta a
questão, pois se limitou, no que interessa, a aumentar as penas cominadas ao porte de arma de fogo, exacerbação inaplicável ao fato
anterior.
15.
O dissídio jurisprudencial a respeito é notório (cf. L.C. Betanho in Silva Franco e outros - Leis Penais Especiais e sua
Interpretação Jurisprudencial, RT, 7ª, 2/2113, 2118 ss.).
16.
Dentre os precedentes, alguns se alinham à postura de Fernando Capez, acolhida pela Relatora, mas, salvo engano,
solitária na doutrina.
17.
Para a teoria moderna - que dá realce primacial aos princípios da necessidade da incriminação e da lesividade do fato
criminoso (v.g., Luigi Ferrajoli, Derecho y Razon, trad., 5ª ed., Madri, 2001, p. 465; Nilo Batista, Introdução Crítica ao D. Penal,
Revan, 1990, p. 91; Maurício Ribeiro Lopes, Teoria Constitucional do Dir. Penal, ed. RT, 2000, p. 314) - o cuidar-se de crime de
mera conduta - no sentido de não se exigir à sua configuração um resultado material exterior à ação - não implica admitir sua
existência independentemente de lesão efetiva ou potencial ao bem jurídico tutelado pela incriminação da hipótese de fato.
18.
Donde a posição de Damásio de Jesus (Crimes de Porte de Arma de Fogo e Assemelhados, 2ª ed., Saraiva, 1999, p. 11 e
14) - por equívoco, referido pelo acórdão do Tribunal local -, quando assevera que “os delitos de porte de arma não são de perigo
nem abstrato: são crimes de lesão e de mera conduta (de simples atividade)”, para explicar, adiante, que “os delitos de porte de
arma e figuras correlatas são crimes de lesão porque o infrator, com sua conduta, reduz o nível de segurança coletiva exigido pelo
legislador, atingindo a objetividade jurídica concernente à incolumidade pública. E são crimes de mera conduta porque basta à sua
existência a demonstração da realização do comportamento típico, sem necessidade de prova de que o risco atingiu, de maneira
séria e efetiva, determinada pessoa”.
19.
A mesma questão é analisada, a partir dos princípios teóricos da lesividade e da ofensividade, em preciosa monografia
de Luiz Flávio Gomes e William Terra (Lei das Armas de Fogo, ed. RT, 2ª, 2002), para unificá-las - no que diz respeito aos
“delitos de posse” - na exigência da disponibilidade, que, acentuam (ob.cit., p. 93), “é o veículo que une duas outras categorias
(danosidade real do objeto + conduta criadora de risco proibido relevante) à ofensividade”.
20.
“Enquanto a danosidade real do objeto pode ser percebida concretamente (v.g., com a análise pericial de uma arma
carregada) a periculosidade da conduta é imaterial em sua essência (por se tratar da representação valorada de uma conduta
humana criadora de risco)”.
21.
“Somente quando as duas órbitas da disponibilidade (uma, material, a da arma carregada, e outra jurídica, a do
comportamento humano que rompe o princípio de confiança criando um risco proibido relevante) se encontram é que surge a
ofensividade típica (aquela não querida pela norma penal, reprovável, punível). Em outras palavras, o fato torna-se penalmente
relevante (exclusivamente) quando o bem jurídico coletivo (no caso) entra no raio de ação da conduta criadora do risco proibido e
relevante.”
22.
É raciocínio que se funda em axiomas da moderna teoria geral do Direito Penal; para o seu acolhimento, convém frisar,
não é necessário, de logo, acatar a tese mais radical que erige a exigência da ofensividade a limitação de raiz constitucional ao
legislador, de forma a proscrever a legitimidade da criação por lei de crimes de perigo abstrato ou presumido.
23.
Basta, por ora, aceitá-los como princípios gerais contemporâneo da interpretação da lei penal, que hão de prevalecer
sempre que a regra incriminadora os comporte.
24.
Na figura criminal cogitada, os princípios bastam, de logo, para elidir a incriminação do porte da arma de fogo inidônea
para a produção de disparos: aqui, falta à incriminação da conduta o objeto material do tipo.
25.
“A inaptidão da arma” - aduzem Gomes e Terra - com razão - (op.cit, p. 82) “gera a atipicidade da conduta, porque,
com sua impropriedade material, ela perderá a potencialidade lesiva que caracteriza o conteúdo do injusto. Isso decorre do fato de
que a finalidade do tipo é evitar o perigo emergente do relacionamento ilícito com armas de fogo, de maneira que, no exato
momento em que não existir mais este “perigo” (porque o objeto material é incapaz de produzir qualquer tipo de dano), deixará de
existir o delito”.
26.
A réplica sói fundar-se no poder de intimidação para a prática de outros crimes - particularmente, os comissíveis
mediante ameaça -, da arma de fogo, posto que ineficaz ou desmuniciada, ou até pelo artefato de brinquedo que a simule.
27.
Certo, a arma verdadeira, mas incapaz de disparar, ou a arma de brinquedo podem servir de instrumento de intimidação,
mas, como tal, também se podem utilizar inúmeros outros objetos - da faca à pedra e ao caco de vidro -, cujo porte não constitui
crime autônomo e cuja utilização não se erigiu em causa especial de aumento de pena: a falácia do argumento, por isso, ficou
evidenciada a meu ver, na discussão sobre o emprego de arma de brinquedo para a prática do roubo (v.g., HC 77872, RTJ 168/288) questão, no entanto, que ganhou novos contornos e não menos dificuldades - com o art. 10, § 1º, II, da L. 9347/97, que passou a
incriminar, com as penas do porte, o “utilizar arma de brinquedo, simulacro de arma capaz de atemorizar outrem, para o fim de
cometer crimes”.
28.
O caso vertente, porém, é de arma eficaz, mas desmuniciada.
29.
Estou - com os doutrinadores cujas premissas endossei - em que, nessa hipótese, é preciso distinguir duas situações, à luz
do princípio da disponibilidade.
30.
Se o agente traz consigo a arma desmuniciada, mas tem a munição adequada à mão, de modo a viabilizar sem demora
significativa o municiamento e, em conseqüência, o eventual disparo, tem-se arma disponível e o fato realiza o tipo.
31.
Ao contrário, se a munição não existe ou está em lugar inacessível de imediato, não há a imprescindível disponibilidade
da arma de fogo, como tal - isto é, como artefato idôneo a produzir disparo - e, por isso, não se realiza a figura típica.
32.
“Com certeza, a realidade irá proporcionar um grande número de situações em que a aferição da ofensividade não será
algo simples” - advertem Gomes e Terra (op. cit., pag. 85) - “revelando a complexidade do tema. Imagine-se, v.g., os casos em que
a arma esteja desmontada ou desmuniciada. Essas situações” - dilucidam com razão os autores -, “somente serão resolvidas pelos
princípios gerais da “disponibilidade” e da efetiva “ofensividade” do objeto: a) se, uma vez montada, a arma pode disparar e se
esta operação pode ser realizada com certa facilidade, estão cumpridos os dois requisitos mínimos - ofensividade e
disponibilidade; b) se a munição está ao alcance do agente, possibilitando a pronta utilização da arma, estará cumprido o requisito
da disponibilidade, mas ainda assim é necessária uma segunda aferição, que permitirá verificar se a arma, uma vez municiada,
poderia ferir ou matar (ofensividade)”.
33.
Essa me parece a solução mais razoável e adequada aos princípios e que tem ressonância jurisprudencial expressiva (cf.
Betanho, Leis Especiais, cit., 2/2119 ss).
34.
Na espécie, a denúncia não faz menção à disponibilidade de munições no contexto do fato - o que, à falta de aditamento já bastaria a impedir se considerasse a circunstância.
35.
De resto, nem as decisões de mérito, nem o acórdão recorrido, do STJ, aludem ao fato.
36.
Esse o quadro, com as vênias da em. Relatora, dou provimento ao recurso e defiro o habeas corpus: é o meu voto.
* acórdão publicado no DJU de 29.4.2005
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 386
Brasília, 2 a 6 de maio de 2005 Nº 386
Data (páginas internas): 11 de maio de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Instauração de CPI e Direito Público Subjetivo das Minorias - 1
Instauração de CPI e Direito Público Subjetivo das Minorias - 2
Medida Provisória. Presidente do BACEN. Transformação de Cargo. Ministro de Estado - 1
Medida Provisória. Presidente do BACEN. Transformação de Cargo. Ministro de Estado - 2
Medida Provisória. Presidente do BACEN. Transformação de Cargo. Ministro de Estado - 3
1ª Turma
Nulidade de Júri e Contradição de Quesitos
HC e Supressão de Instância
Revogação de Competência e Art. 25 do ADCT - 2
Aposentadoria por Invalidez Permanente e Proventos Proporcionais
2ª Turma
Prisão Cautelar e Carta Precatória
Decadência e Prestações de Trato Sucessivo
Clipping do DJ
Transcrições
Efeito Vinculante e Poder Legislativo (Rcl 2617 AgR/MG)
Produção Antecipada de Provas: Impossibilidade (RHC 85311/SP)
PLENÁRIO
Instauração de CPI e Direito Público Subjetivo das Minorias - 1
O Tribunal iniciou julgamento de mandados de segurança impetrados por senadores contra ato da
Mesa do Senado Federal, representada por seu Presidente, consubstanciado na validação da recusa deste
em proceder à indicação, ante a omissão por parte dos líderes partidários, de membros para instaurar a
denominada “CPI dos Bingos”, destinada a apurar a utilização das casas de bingos na prática do delito de
lavagem de dinheiro, bem como esclarecer eventual conexão dessas casas e das empresas concessionárias
de apostas com organizações criminosas. O Min. Celso de Mello, relator, concedeu a ordem, a fim de
determinar que o Presidente do Senado Federal, mediante aplicação analógica do art. 28, § 1º, do
regimento interno da Câmara dos Deputados, faça, ele próprio, a designação dos nomes faltantes dos
senadores a compor a CPI em questão. Inicialmente, o relator afastou as preliminares quanto à
incognoscibilidade da impetração e à ilegitimidade passiva da autoridade apontada como coatora,
suscitadas pelo Presidente do Senado Federal e pelo PGR, respectivamente. Em relação à primeira, em
razão de o fundamento da impetração concernir à alegação de ofensa a direito impregnado de estatura
constitucional — consistente no pretendido reconhecimento de que as minorias parlamentares possuem a
prerrogativa de fazer instaurar comissões parlamentares de inquérito, desde que atendidas as exigências
impostas pelo art. 58, § 3º, da CF —, o que legitimaria, por si só, afastado o caráter interna corporis do
comportamento impugnado, o exercício, pelo STF, da jurisdição que lhe é inerente. Quanto à segunda,
por competir, não aos líderes partidários, mas sim ao Presidente do Senado Federal, em sua condição de
órgão dirigente da Mesa dessa Casa legislativa, e até mesmo em função da própria estatalidade do ato de
constituição das CPI, o poder de viabilizar a organização e o efetivo funcionamento destas, adotando,
para isso, tanto no âmbito administrativo quanto no plano da gestão financeira de recursos públicos
destinados a custear as atividades de tais órgãos de investigação legislativa, as medidas necessárias à
efetiva instauração das referidas CPI.
MS 24831/DF; MS 24845/DF; MS 24846/DF; MS 24847/DF; MS 24848/DF; MS 24849/DF, rel.
Min. Celso de Mello, 4.5.2005. (MS-24831/DF) (MS-24845) (MS-24846) (MS-24847) (MS-24848) (MS24849)
Instauração de CPI e Direito Público Subjetivo das Minorias - 2
No mérito, salientando ter havido, na espécie, o preenchimento dos requisitos do § 3º do art. 58 da
CF, concluiu pela afronta ao direito público subjetivo, nesse dispositivo assegurado, às minorias
legislativas, de ver instaurado o inquérito parlamentar, com apoio no direito de oposição, legítimo
consectário do princípio democrático. Ressaltou, ademais, que a ocorrência da lacuna normativa no texto
do regimento interno do Senado Federal não seria óbice a que o Supremo, valendo-se dos meios de
integração, sobretudo por força do disposto no art. 412, VI e VII, daquele diploma legal — o qual
estabelece a competência da Mesa para decidir, nos casos omissos, de acordo com a analogia, bem como
preserva os direitos das minorias —, suprisse essa omissão por aplicação analógica de prescrições
existentes no âmbito do próprio legislativo da União, quais sejam, o art. 28, § 1º e art. 9º, § 1º, dos
regimentos internos da Câmara dos Deputados e do Congresso Nacional, respectivamente, que prevêem
solução normativa para situações em que os líderes partidários deixem de indicar representantes de suas
próprias agremiações para compor comissões. Acompanharam o voto do relator os Ministros Marco
Aurélio, Sepúlveda Pertence e Carlos Britto. O julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do
Min. Eros Grau.
MS 24831/DF; MS 24845/DF; MS 24846/DF; MS 24847/DF; MS 24848/DF; MS 24849/DF, rel.
Min. Celso de Mello, 4.5.2005. (MS-24831/DF) (MS-24845) (MS-24846) (MS-24847) (MS-24848) (MS24849)
Medida Provisória. Presidente do BACEN. Transformação de Cargo. Ministro de Estado - 1
O Tribunal, por maioria, julgou improcedentes pedidos formulados em ações diretas
inconstitucionalidade propostas pelos Partidos da Frente Liberal - PFL e da Social Democracia Brasileira
- PSDB contra a Medida Provisória 207/2004, convertida na Lei 11.036/2004, que “Altera disposições
das Leis nº 10.683, de 28 de maio de 2003, e Lei nº 9.650, de 27 de maio de 1998”, transformando o
cargo de Presidente do Banco Central do Brasil – BACEN em cargo de Ministro de Estado. Os
requerentes apontavam ofensa aos seguintes dispositivos constitucionais: a) art. 62, por ausência dos
requisitos de relevância e urgência da MP; b) alínea b do inciso I do § 1º do art. 62, por tratar a MP de
direito processual, ante o claro objetivo de alterar o regime de competência para processar e julgar o
Presidente do BACEN; c) § 9º do art. 62, por ausência de discussão no âmbito da Comissão Mista; d) art.
52, III, d, e art. 84, I e XIV, uma vez que a MP viabilizaria a nomeação do Presidente do BACEN sem a
prévia aprovação do Senado, anulando, por conseguinte, a competência deste e, ainda, tendo em vista que
o Presidente do BACEN passaria a deter as prerrogativas constitucionais de seu superior hierárquico, o
Ministro de Estado da Fazenda; e) art. 192, em razão de a MP ter invadido campo reservado à lei
complementar.
ADI 3289/DF e ADI 3290/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 5.5.2005. (ADI-3289) (ADI-3290)
Medida Provisória. Presidente do BACEN. Transformação de Cargo. Ministro de Estado - 2
O Min. Gilmar Mendes, relator, inicialmente, afastou a preliminar de perda de objeto em face da
conversão da MP em lei, por não verificar alteração substancial entre as mesmas. Em seguida, rejeitou as
impugnações referentes aos requisitos específicos para a edição de medida provisória. Quanto à ausência
de relevância e urgência, ressaltando a necessidade de se considerar a dimensão política e histórica
condicionada da atuação do Poder Executivo, a qual poderia levar o Presidente da República a promover
ajustes no plano institucional — atendendo, especialmente, a critérios de índole política — que
demandariam, por vezes, a edição de medidas urgentes, entendeu que, no caso, seria legítima a razão
explicitada na Exposição de Motivos correspondente à MP impugnada, ante o papel absolutamente
diferenciado e relevante do Presidente do BACEN, a justificar a prerrogativa de foro a ele conferida. No
que se refere à apontada ofensa ao § 9º do art. 62 da CF, salientou o fato de ter sido, por duas vezes,
convocada a reunião para instalação da comissão, sem se chegar, no entanto, ao quorum necessário, razão
pela qual, e também em face do atual estágio de implementação da EC 32/2001, seria incabível a
formulação de um juízo de inconstitucionalidade por violação ao referido § 9º. No que tange à ofensa à
alínea b do inciso I do § 1º do art. 62 da CF, asseverou que a norma impugnada incide, de modo imediato
sobre a organização administrativa, sendo ancilar o reflexo no campo processual. Da mesma forma,
julgou inconsistente a alegação concernente ao afastamento da subordinação do Banco Central à
orientação, coordenação e supervisão do Ministério da Fazenda, porquanto a MP 207/2004 não elimina
ou altera a relação entre o BACEN e o Ministério da Fazenda, nem altera a competência desses órgãos,
eis que a autoridade conferida pelo nosso sistema jurídico tanto ao Presidente do BACEN quanto ao
Ministro da Fazenda corresponde a comandos constitucionais e legais que conformam a competência
desses órgãos. Em relação à aludida afronta ao disposto no art. 52, III, d, e no art. 84, I e XIV, da CF,
explicou que, quando a Constituição estabelece competir ao Presidente da República a nomeação e
exoneração de Ministros de Estado (art. 84, I), está implícito que essa nomeação se dará na forma da CF e
da lei, sendo certo que, no caso da nomeação do Presidente do BACEN, obedecer-se-á a um
procedimento constitucional específico, que terá como pressuposto a aprovação prévia pelo Senado (art.
52, III, d), requisito adicional que fortalece o sistema constitucional de distribuição de poderes e mantém
intacta a competência do Chefe do Executivo para a nomeação do Presidente do BACEN (art. 84, XIV).
Reputou inconsistente, ainda, a citada afronta ao art. 192 da CF, já que o tema tratado pela MP não está
por ele abrangido, haja vista dispor sobre matéria relativa à organização administrativa. Por fim,
analisando o parágrafo único do art. 2º da Lei 11.036/204, afirmou não vislumbrar qualquer norma
constitucional contrária à concessão de prerrogativa de foro a ex-dirigentes do BACEN, ressaltando que,
sendo um dos objetivos básicos da disciplina constitucional da prerrogativa de foro conferir a
tranqüilidade necessária ao exercício de certos cargos públicos, seria descabido permitir que as decisões
tomadas por um Ministro de Estado, em razão do exercício do cargo, pudessem ser posteriormente
contestadas em foro ordinário.
ADI 3289/DF e ADI 3290/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 5.5.2005. (ADI-3289) (ADI-3290)
Medida Provisória. Presidente do BACEN. Transformação de Cargo. Ministro de Estado - 3
Ficaram vencidos os Ministros Carlos Britto, Marco Aurélio, Carlos Velloso e Sepúlveda Pertence,
que julgavam integralmente procedentes os pedidos. Vencido, também, em parte, o Min. Celso de Mello,
que votou pela procedência do pleito somente em relação ao parágrafo único do art. 2º da Lei
11.036/2004, por considerar que a norma em questão transgride a ordem constitucional brasileira, eis que
o Congresso Nacional não poderia, por meio de legislação ordinária, alterar a competência originária do
STF. O Min. Carlos Britto divergiu do relator quanto ao mérito, por considerar que, em razão de a própria
CF estabelecer um vínculo funcional direto entre ministro e ministério, somente aquele que dirige um
ministério poderia atrair a competência penal do STF. O Min. Marco Aurélio acompanhou o relator
apenas em relação à perda de objeto do pedido. Entendeu haver contaminação da lei convertida em
função da ausência dos requisitos de relevância e urgência da MP impugnada. Asseverou que se acabou
por legislar em campo processual, salientando ser evidente o objetivo de se estabelecer a competência
originária do STF. No mais, seguiu o voto do Min. Carlos Britto. O Min. Carlos Velloso perfilhou o
entendimento dos Ministros Carlos Britto e Marco Aurélio. Por sua vez, o Min. Sepúlveda Pertence,
acompanhou a divergência iniciada pelo Min. Carlos Britto, realçando a inconstitucionalidade do
parágrafo único do art. 2º da Lei de conversão, tal como exposta pelo Min. Celso de Mello.
ADI 3289/DF e ADI 3290/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 5.5.2005. (ADI-3289) (ADI-3290)
PRIMEIRA TURMA
Nulidade de Júri e Contradição de Quesitos
Por contradição das respostas aos quesitos, a Turma, por maioria, deferiu habeas corpus impetrado
em favor de condenado pela prática do crime de homicídio qualificado, em cujo julgamento o Tribunal do
Júri reconhecera procedente, por um voto de diferença, a autoria imputada ao ora paciente e considerara
que a testemunha, que apresentara o álibi, não cometera o crime de falso testemunho. Asseverou-se não
haver como isolar os quesitos, haja vista tratar-se de julgamento único. Por conseguinte, caberia ao
magistrado obedecer ao disposto no art. 489 do CPP (“Se a resposta a qualquer dos quesitos estiver em
contradição com outra ou outras já proferidas, o juiz, explicando aos jurados em que consiste a
contradição, submeterá novamente à votação os quesitos a que se referirem tais respostas.”), tendo em
conta a presença de incongruência nas respostas apresentadas pelos jurados. Vencido o Min. Sepúlveda
Pertence que indeferia o writ por considerar que somente com o reexame de toda a prova seria possível
verificar a afirmação de autoria do homicídio e a existência do dito álibi. HC deferido para tornar
insubsistente o julgamento, a fim de que outro Júri venha a ser realizado.
HC 85150/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 3.5.2005. (HC-85150)
HC e Supressão de Instância
A Turma, considerando caracterizada a supressão de instância por parte do STJ, e tendo em conta o
preenchimento dos requisitos objetivo e subjetivo, julgou prejudicado o pedido, mas, deferiu, de ofício,
habeas corpus para conceder progressão de regime a condenado pela prática dos crimes de furto (CP, art.
155) e estelionato (CP, art. 171), cuja sentença impusera o cumprimento da pena em regime de reclusão.
No caso, o paciente ajuizara writ no Tribunal de Alçada Criminal do Paraná – TACrim/PA para impugnar
decisão que, por entender desfavorável o laudo de exame criminológico, indeferira seu requerimento de
progressão, não obstante ele haver cumprido 1/6 da pena exigida e possuir bom comportamento carcerário
atestado por diretor de estabelecimento prisional. Em virtude do não conhecimento do referido habeas
corpus, o paciente impetrara idêntica medida no STJ, que concluíra pela ausência de direito à progressão
pleiteada. Entendeu-se que o Tribunal a quo examinara matéria de mérito não apreciada na origem, uma
vez que o pedido formulado na impetração visava, tão-somente, compelir o TACrim/PA a analisar o
mérito do HC lá impetrado.
HC 85688/PR, rel. Min. Eros Grau, 3.5.2005. (HC-85688)
Revogação de Competência e Art. 25 do ADCT - 2
A Turma retomou julgamento de recurso extraordinário, interposto por instituição financeira, em
que se pretende a desconstituição de acórdão que, embora reconhecendo não ser auto-aplicável o §3º do
art. 192 da CF, determinara a redução de juros ao montante de 12% ao ano, consoante disposto no
Decreto 22.626/33, por entender revogada, pelo art. 25 do ADCT, a Lei 4.595/64, na parte em que
outorga poderes ao Conselho Monetário Nacional para dispor sobre as taxas de juros bancários, razão
pela qual o mencionado decreto teria voltado a viger em sua integralidade (ADCT, art. 25, caput: “Ficam
revogados, a partir de cento e oitenta dias da promulgação da Constituição, sujeito este prazo a
prorrogação por lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo
competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional...”) — v. Informativo 381.
Preliminarmente, a Turma rejeitou proposta de remeter os autos ao Plenário formulada pelo Min. Marco
Aurélio, o qual considerava indispensável o esclarecimento da constitucionalidade, ou não, da Lei
9.069/95, que dispõe sobre o Plano Real, o Sistema Monetário Nacional, estabelece as regras e condições
de emissão do Real e os critérios para conversão das obrigações para o Real, e dá outras providências. Em
seguida, o Min. Marco Aurélio, em voto-vista, negou provimento ao recurso, no que foi acompanhado
pelo Min. Carlos Britto, que retificou o voto. Asseverou que, na espécie, não se trata do exame da
incidência da Lei 4.595/64 e das demais normas que se seguiram, e sim da análise da constitucionalidade
da delegação prevista para que o Conselho Monetário Nacional fixe juros relativos ao sistema financeiro.
Destarte, após fazer histórico das leis que prorrogaram a citada delegação, culminando no advento da
referida Lei 9.069/95, entendeu que esta delegação conflita com o art. 25 do ADCT, porquanto ausente de
razoabilidade a prorrogação sucessiva de leis elastecendo um prazo de 180 dias de forma indeterminada.
Salientou, ainda, que, passados mais de 16 anos da vigência da CF/88, tem-se até o presente momento, a
competência do Conselho Monetário Nacional a partir de extravagante delegação. Por fim, declarou a
inconstitucionalidade da última lei, que implicou a prorrogação dos 180 dias previstos no art. 25 do
ADCT, ou seja, no particular, da Lei 9.069/95. Após a confirmação do voto do Min. Eros Grau, seguindo
o Min. Sepúlveda Pertence, relator, pediu vista o Min. Cezar Peluso.
RE 286963/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 3.5.2005. (RE-286963)
Aposentadoria por Invalidez Permanente e Proventos Proporcionais
A Turma deu provimento a recurso extraordinário interposto pelo Estado de Tocantins para
reformar acórdão do tribunal de justiça do mesmo Estado que, deferindo mandado de segurança
impetrado pela ora recorrida, concedera aposentadoria com proventos integrais à servidora pública
portadora de doença grave e incurável, cuja moléstia não se encontrava especificada na Lei 8.112/90 e
tampouco em legislação local. Aplicou-se entendimento firmado pela Corte no sentido de que o servidor
fará jus à aposentadoria com proventos integrais em caso de invalidez permanente derivada de acidente
em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, especificada em lei e, não
havendo essa discriminação, os proventos serão proporcionais ao tempo de contribuição (CF, art. 40, § 1º,
I, redação dada pela EC 20/98). Precedente citado: RE 175980/SP (DJU de 20.2.98).
RE 353595/TO, rel. Min. Marco Aurélio, 3.5.2005. (RE-353595)
SEGUNDA TURMA
Prisão Cautelar e Carta Precatória
A prisão preventiva efetivada sem envio de carta precatória, em comarca diversa do juízo
competente que expede a ordem devidamente fundamentada, configura mera irregularidade sanável. Com
base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia a revogação de prisão
preventiva do paciente, sob alegação de ilegalidade do decreto de prisão cumprido fora da comarca do
juízo da causa sem a expedição de carta precatória e sem a presença de autoridades locais, o que violaria
o art. 289 do CPP. A impetração sustentava, ainda, excesso de prazo para conclusão da instrução criminal.
Considerou-se, que, embora constatadas controvérsias acerca da presença ou não de autoridades locais no
momento da prisão do paciente, tal discussão não influenciaria a resolução da questão, visto que o art.
290 do CPP autoriza a prisão em comarca diversa daquela na qual fora expedido o mandado, em
determinadas situações de perseguição (alíneas a e b), além de constar do parágrafo único do art. 289 a
possibilidade de requisição de prisão, pelo juiz, por telegrama, em casos urgentes, desde que presentes os
requisitos do inciso LXI do art. 5º da CF. Ressaltou-se, ainda, que admitir-se o relaxamento da prisão
cautelar em face de mera irregularidade administrativa seria apegar-se a formalismos excessivos,
salientando-se, ademais, a necessidade de se assegurar a ordem pública, considerada a extrema gravidade
do crime praticado pelo paciente (homicídio duplo com esquartejamento). Asseverou-se, também, que a
discussão posta no writ perderia relevo, na medida em que, persistindo os pressupostos e fundamentos da
prisão preventiva, constantes dos artigos 311 e 312 do CPP, a eventual invalidação da prisão do paciente
não impediria a imediata expedição de novo decreto prisional, pelos mesmos fundamentos. Por fim,
afastou-se o alegado excesso de prazo, porquanto este se dera por culpa da defesa, notadamente em razão
do incidente de insanidade mental por ela instaurado.
HC 85712/GO, rel. Min. Joaquim Barbosa, 3.5.2005. (HC-85712)
Decadência e Prestações de Trato Sucessivo
O prazo para interpor mandado de segurança, em se tratando de cumprimento de prestações de trato
sucessivo, é contado a partir de cada novo ato, salvo se houver rejeição expressa da pretensão pela
autoridade. Com base nesse entendimento, a Turma, por maioria, deu provimento a recurso ordinário em
mandado de segurança para reformar acórdão do STJ que reconhecera a decadência do direito do
recorrente de pleitear o restabelecimento de vantagem prevista no art. 184, III, da Lei 1.711/52 —
revogada pela Lei 8.112/90 e que dispunha sobre o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União —,
suprimida dos seus proventos. Considerou-se que a ilegalidade atacada consiste na ausência de
pagamento de parcela remuneratória, que se renova mês a mês, não se podendo extinguir o processo com
fundamento no art. 18 da Lei 1.533/51 (“Art. 18 - O direito de requerer mandado de segurança extinguirse-á decorridos cento e vinte dias contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado.”). RMS
deferido para que o STJ examine o mérito do pedido. Precedentes citados: MS 21248/SP (DJU de
27.11.92); RMS 24534/DF (DJU de 28.5.2004).
RMS 24736/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 3.5.2005. (RMS-24736)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
4.5.2005
3.5.2005
3.5.2005
Extraordinárias
5.5.2005
——
——
Julgamentos
2
75
47
CLIPPING
DO
DJ
6 de maio de 2005
ADI N. 1.465-DF
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PARTIDOS POLÍTICOS. DUPLA FILIAÇÃO. REGULAÇÃO
LEGAL DA RELAÇÃO ENTRE DOIS OU MAIS PARTIDOS. PRINCÍPIO DA FIDELIDADE PARTIDÁRIA.
IMPROCEDÊNCIA.
Ação direta de inconstitucionalidade que impugna o texto “fica configurada dupla filiação, sendo ambas consideradas nulas para
todos os efeitos”, constante do art. 22 da Lei 9.096/1995.
A autonomia partidária não se estende a ponto de atingir a autonomia de outro partido, cabendo à lei regular as relações entre dois
ou mais deles.
A nulidade que impõe o art. 22 da Lei 9.096/1995 é conseqüência da vedação da dupla filiação e, por conseqüência, do princípio da
fidelidade partidária.
Filiação partidária é pressuposto de elegibilidade, não cabendo afirmar que a lei impugnada cria nova forma de inelegibilidade.
Ação direta julgada improcedente.
* noticiado no Informativo 377
MED. CAUT. EM ADI N. 2.333-AL
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. A liminar pressupõe a relevância da articulação e o risco de se manter com
plena eficácia o quadro normativo.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - RESOLUÇÃO - EFEITOS CONCRETOS. Apresentando a resolução efeitos
concretos, exauridos, descabe o controle concentrado de constitucionalidade.
ADI N. 2.966-RO
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MILITARES. REGIME JURÍDICO. INICIATIVA PRIVATIVA
DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
Emenda Constitucional 29/2002, do estado de Rondônia. Inconstitucionalidade.
À luz do princípio da simetria, é de iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo estadual as leis que disciplinem o regime
jurídico dos militares (art. 61, § 1º, II, f, da CF/1988).
Matéria restrita à iniciativa do Poder Executivo não pode ser regulada por emenda constitucional de origem parlamentar.
Precedentes.
Pedido julgado procedente.
* noticiado no Informativo 382
MED. CAUT. EM ADI N. 3.126-DF
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada contra a Resolução no 336, de 2.003, do Presidente do Conselho da
Justiça Federal, que dispõe sobre o acúmulo do exercício da magistratura com o exercício do magistério, no âmbito da Justiça
Federal de primeiro e segundo graus. 2. Alegação no sentido de que a matéria em análise já encontra tratamento na Constituição
Federal (art. 95, parágrafo único, I), e caso comportasse regulamentação, esta deveria vir sob a forma de lei complementar, no
próprio Estatuto da Magistratura. 3. Suposta incompetência do Conselho da Justiça Federal para editar o referido ato, porquanto fora
de suas atribuições definidas no art. 105, parágrafo único, da Carta Magna. 4. Considerou-se, no caso, que o objetivo da restrição
constitucional é o de impedir o exercício da atividade de magistério que se revele incompatível com os afazeres da magistratura.
Necessidade de se avaliar, no caso concreto, se a atividade de magistério inviabiliza o ofício judicante. 5. Referendada a liminar, nos
termos em que foi concedida pelo Ministro em exercício da presidência do Supremo Tribunal Federal, tão-somente para suspender a
vigência da expressão “único (a)”, constante da redação do art. 1o da Resolução no 336/2003, do Conselho de Justiça Federal.
* noticiado no Informativo 376
MED. CAUT. EM ADI N. 3.220-PR
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA CAUTELAR. IMPUGNAÇÃO DA LEI
COMPLEMENTAR Nº 102, DE 10 DE MARÇO DE 2004, DO ESTADO DO PARANÁ. INSTRUMENTO NORMATIVO QUE
SUPRIMIU A OBRIGATORIDADE DE OS PROCURADORES DE JUSTIÇA RESIDIREM NO LOCAL DA SEDE DA
PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA.
Conquanto a Lei Complementar nº 102/04, ao alterar a Lei Orgânica do Ministério Público do Estado do Paraná, tenha suprimido a
exigência de os Procuradores de Justiça residirem na sede da Procuradoria-Geral de Justiça, não se afigura que tal supressão possa
conduzir ao juízo de inconstitucionalidade do diploma legal sob censura, porquanto a referida exigência já se faz presente no âmago
da Constituição Federal de 1988.
Provimento acautelatório indeferido, à unanimidade.
MS N. 25.050-DF
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: APOSENTADORIA: ACUMULAÇÃO: PROVENTOS DA RESERVA MILITAR COM OS DE APOSENTADORIA EM CARGO CIVIL. EC 20/98, art. 11.
I. - Militar reformado que reingressa no serviço público, em cargo civil, e que vem a aposentar-se neste, antes da edição da EC
20/98. Acumulação permitida: EC 20/98, art. 11.
II. - Precedentes do Supremo Tribunal Federal.
III. - M.S. deferido.
MS N. 25.192-DF
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. COORDENADOR GERAL DE RECURSOS HUMANOS DA ABIN. EXECUTOR
DE ATO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. PROSSEGUIMENTO
DO FEITO QUANTO AO PRESIDENTE DA PRIMEIRA CÂMARA DO TCU. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA.
INOCORRÊNCIA. CUMULAÇÃO DE PROVENTOS DA RESERVA MILITAR COM OS DE APOSENTADORIA EM CARGO
CIVIL ANTES DA EC 20/98. POSSIBILIDADE. ART. 11 DA EC 20/98.
1. O Presidente da 1ª Câmara do Tribunal de Contas da União é parte legítima para figurar no pólo passivo de mandado de
segurança quando o ato impugnado reveste-se de caráter impositivo. Precedente [MS n. 24.001, Relator MAURÍCIO CORREA, DJ
20.05.2002].
2. Prejudicada a impetração quanto ao Coordenador Geral de Recursos Humanos da ABIN, mero executor do ato administrativo do
Tribunal de Contas da União.
3. O ato de aposentadoria configura ato administrativo complexo, aperfeiçoando-se somente com o registro perante o Tribunal de
Contas. Submetido a condição resolutiva, não se operam os efeitos da decadência antes da vontade final da Administração.
4. O art. 93, § 9º, da Constituição do Brasil de 1967, na redação da EC 1/69, bem como a Constituição de 1988, antes da EC 20/98,
não obstavam o retorno do militar reformado ao serviço público e a posterior aposentadoria no cargo civil, acumulando os
respectivos proventos. Precedentes [MS n. 24.997 e MS n. 25.015, Relator o Ministro EROS GRAU, DJ 01.04.05; e MS n. 24.958,
Relator o Ministro MARCO AURÉLIO, DJ 01.04.05].
5. Reformado o militar sob a Constituição de 1967 e aposentado como servidor civil na vigência da Constituição de 1988, antes da
edição da EC 20/98, não há falar-se em acumulação de proventos do art. 40 da CB/88, vedada pelo art. 11 da EC n. 20/98, mas a
percepção de provento civil [art. 40 CB/88] cumulado com provento militar [art. 42 CB/88], situação não abarcada pela proibição da
emenda.
6. Segurança concedida.
HC N. 84.975-SP
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
RECURSO - ROUBO À MÃO ARMADA - FIXAÇÃO DA PENA NO MÍNIMO PREVISTO PARA O TIPO RECOLHIMENTO. Descabe impor, para processamento do recurso, o recolhimento do condenado, tendo em conta a prática de
roubo à mão armada.
RHC N. 84.845-RJ
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: 1. Habeas corpus: descabimento para rever a questão relativa à identificação do paciente, dada a necessidade, no ponto,
de profundo reexame de provas.
2. Tráfico de entorpecentes: condenação fundada unicamente em chamada de co-réu, o que a jurisprudência do STF não admite:
precedentes.
Ademais, ao fato de o paciente ser a pessoa indicada pelos co-réus - conforme acertado nas instâncias de mérito -, per si, não
permite extrair tenha ele praticado conduta descrita na denúncia.
Manifesto constrangimento ilegal: concessão de habeas corpus de ofício.
RHC N. 84.944-RO
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: HABEAS CORPUS. LEI DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA. JUIZ DE DIREITO. INVESTIDURA EXCEPCIONAL
NA JURISDIÇÃO MILITAR. COMPETÊNCIA PARA JULGAR FEITOS CRIMINAIS GENÉRICOS.
A Lei de Organização Judiciária do Estado de Rondônia não afronta a Constituição do Brasil, ao atribuir a juiz de direito, investido
excepcionalmente no cargo de juiz auditor, competência para processar e julgar feitos criminais genéricos.
Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento.
HC N. 84.816-PI
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. PENAL. HABEAS CORPUS: AFASTAMENTO DO CARGO:
NÃO-CABIMENTO.
I. - O afastamento do paciente do cargo de Prefeito Municipal não autoriza a impetração de habeas corpus, porquanto não põe em
risco a sua liberdade de locomoção. É que o habeas corpus visa a proteger a liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de
poder, não podendo ser utilizado para proteção de direitos outros.
II. - H.C. não conhecido.
* noticiado no Informativo 384
RE N. 262.651-SP
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO:
RESPONSABILIDADE OBJETIVA. PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO PRESTADORAS DE SERVIÇO
PÚBLICO. CONCESSIONÁRIO OU PERMISSIONÁRIO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO. C.F., art. 37, § 6º.
I. - A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente aos
usuários do serviço, não se estendendo a pessoas outras que não ostentem a condição de usuário. Exegese do art. 37, § 6º, da C.F.
II. - R.E. conhecido e provido.
* noticiado no Informativo 358
Acórdãos Publicados: 302
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Efeito Vinculante e Poder Legislativo (Transcrições)
(v. Informativo 377)
Rcl 2617 Agr/MG*
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
Relatório: 1.
O ora agravante ajuizou reclamação contra a edição da Lei nº 14.938, de 2003, do Estado de Minas Gerais,
sob fundamento de que ofenderia a decisão proferida por esta Corte na ADI nº 2.424/CE-MC.
Alega que, ao instituir a “taxa de segurança pública (caput do art. 115) cujo fato gerador é a prestação potencial ou
efetiva, pelo Corpo de Bombeiros, do que chamou de serviço de extinção de incêndio” (fls. 06), o Governador do Estado teria
violado a decisão do Plenário da Corte, o qual suspendeu a “eficácia do art. 2º, I e II; arts. 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10, 11 e 12, e do
inciso I do art. 13, todos da Lei nº 13084, de 29 de dezembro de 2000, do Estado do Ceará.” (ementa da ADI nº 2.424/CE-MC).
Neguei seguimento ao pedido, nestes termos:
“2. De todo inviável o pedido.
É firme a jurisprudência desta Corte que não admite reclamação contra lei posterior à decisão cujo
desrespeito se alega (cf. Rcl nº 344-AgR, rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, DJ de 08/02/2002; Rcl nº 552, rel. Min.
VICTOR NUNES LEAL, DJ de 01/06/1966; Rcl nº 706, rel. Min. AMARAL SANTOS, DJ de 18/11/1968).
Se assim não fosse, interferir-se-ia de maneira desarmônica na esfera de atuação do Poder Legislativo do
Estado, impedindo-o de legislar novamente sobre a matéria, toda vez que esta Corte se manifeste pela inconstitucionalidade
de lei preexistente. Nesse sentido:
“A instauração do controle normativo abstrato perante o Supremo Tribunal Federal não impede que o
Estado venha a dispor, em novo ato legislativo, sobre a mesma matéria versada nos atos estatais impugnados,
especialmente quando o conteúdo material da nova lei implicar tratamento jurídico diverso daquele resultante das
normas questionadas na ação direta de inconstitucionalidade” (Rcl nº 467, rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ de
09/12/1994).
Insiste o agravante em que, “sendo o efeito vinculante decorrência da Constituição, sendo a decisão do Supremo
Tribunal a verdadeira e plena expressão das normas constitucionais, não viola o princípio da separação dos poderes a vinculação
do legislador ordinário as decisões decorrentes do controle abstrato de normas, uma vez que estas são decorrência da
concretização constitucional. Diante disso, não pode, simplesmente, o legislador infraconstitucional afrontar a constituição de
maneira intencional, porquanto já conhece o sentido da norma constitucional na dicção do órgão que tem, por determinação do
Texto Maior, a competência para a sua guarda” (fls. 104/105).
Voto: 1. É clara a Constituição da República no limitar a extensão dos efeitos vinculantes da decisão definitiva de mérito, proferida
pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações declaratórias de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, aos demais órgãos
do Poder Judiciário e ao Poder Executivo (art. 102, § 2º), enquanto eficácia que deve atribuída, por idênticas razões, à decisão
definitiva da ação direta de inconstitucionalidade, a qual tem igual caráter dúplice, posto que com sinal trocado.
É o que, aliás, confirma a Lei nº 9.868/99, no art. 28, § único:
“Art. 28. (...)
Parágrafo único. A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação
conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e
efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal.”
Está visto, pois, que nosso ordenamento não estendeu ao legislador os efeitos vinculantes da decisão de
inconstitucionalidade.
Nem se pode tirar coisa diversa à só previsão da eficácia erga omnes. Já se demonstrou alhures, com abundância de
argumentos, que, como fruto de exegese de textos similares ou análogos, a proibição de reprodução de norma idêntica à que foi
declarada inconstitucional não pode inspirar-se nalgum princípio processual geral que iniba renovação do comportamento
subjacente a ato concreto anulado ou tido por ilegal, o que, sob a autoridade da res iudicata, conviria apenas a processos de índole
subjetiva. Ademais, o postulado da segurança jurídica acabaria, contra uma correta interpretação constitucional sistemáticoteleológica, sacrificando, em relação às leis futuras, a própria justiça da decisão. Por outro lado, tal concepção comprometeria a
relação de equilíbrio entre o tribunal constitucional e o legislador, reduzindo este a papel subalterno perante o poder incontrolável
daquele, com evidente prejuízo do espaço democrático-representativo da legitimidade política do órgão legislativo. E, como razão
de não menor tomo, a proibição erigiria mais um fator de resistência conducente ao inconcebível fenômeno da fossilização da
Constituição:
“A conseqüência é particularmente grave: as constituições, enquanto planos normativos voltados para o
futuro, não podem de maneira nenhuma perder a sua flexibilidade e abertura. Naturalmente e na medida do possível,
convém salvaguardar a continuidade dos standards jurisprudenciais: alterações de rota, decisões overruling demasiado
repentinas e brutais contrastam com a própria noção de jurisdição. A percepção da continuidade como um valor não deve,
porém, significar uma visão petrificada da jurisprudência ou uma indisponibilidade dos tribunais para atender às
solicitações provenientes do ambiente”.
É o que se reconhece entre nós. Invocando a respeito a orientação da Corte (ADI nº 907, Rel. Min. ILMAR GALVÃO,
RTJ 150/726, e ADI nº 864, Rel. Min. MOREIRA ALVES, RTJ 151/416), adverte-se:
“Também o Supremo Tribunal Federal tem entendido que a declaração de inconstitucionalidade não impede
o legislador de promulgar lei de conteúdo idêntico ao texto anteriormente censurado...
Ao contrário do estabelecido na proposta original que se referia à vinculação dos órgãos e agentes públicos
o efeito vinculante consagrado na Emenda n. 3, de 1993, ficou reduzido, no plano subjetivo, aos órgãos do Poder Judiciário
e do Poder Executivo.
Proferida a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei objeto da ação declaratória,
ficam os Tribunais e órgãos do Poder Executivo obrigados a guardar-lhe plena obediência”.
2.
Do exposto, nego provimento ao agravo.
* acórdão pendente de publicação
Produção Antecipada de Provas: Impossibilidade (Transcrições)
(v. Informativo 378)
RHC 85311/SP*
RELATOR: MIN. EROS GRAU
RELATÓRIO: O paciente foi denunciado como incurso nas sanções do artigo 340 do CP. Como não foi encontrado para citação, o
juiz determinou a expedição de edital. Não atendida a convocação, foi declarada a revelia e decretada a suspensão do processo e do
curso prescricional, a teor do artigo 366 do CPP.
2.
O Ministério Público requereu a produção antecipada da prova testemunhal e, ante o indeferimento, interpôs recurso de
apelação, que — recebido como recurso em sentido estrito — foi provido pelo Tribunal de Alçada Criminal.
3.
A Procuradoria de Justiça estadual, atuando como defensoria pública, impetrou Habeas Corpus no Superior Tribunal de
Justiça, impugnando a produção antecipada de provas. A ordem foi denegada, ao fundamento de que “constatada a revelia do réu,
que se encontra em local incerto e não sabido, não ofende a garantia da ampla defesa, a produção antecipada de provas, consistente
na oitiva de testemunhas” (fls. 92).
4.
Daí este recurso ordinário, em que a defensoria alega ser a decisão impugnada contrária à jurisprudência do próprio
Superior Tribunal de Justiça, além de afrontar os princípios do contraditório e da ampla defesa.
5.
O Ministério Público Federal manifesta-se pelo provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO: O artigo 366, caput, do CPP, prevê — ante a frustração da citação por edital — a suspensão do processo e do curso
prescricional, além de facultar ao juiz a produção de provas consideradas urgentes.
2.
O Ministério Público de São Paulo requereu a produção de prova testemunhal, argumentando que “Tal medida é
necessária, ante a possibilidade da única testemunha esquecer de detalhes importantes dos fatos, em virtude do decurso de tempo, ou
deixar seu domicílio, não mais sendo localizada, de maneira que o acusado seria sempre beneficiado com a impunidade, o que não é,
à evidência, o espírito do legislador” (fls. 46).
3.
Ao indeferir o pedido, o juiz consignou que a antecipação probatória, por ser medida cautelar, sujeita-se à verificação do
periculum in mora e do fumus boni iuris, para concluir “... que o requerimento do Parquet não se fez acompanhar de motivos
concretos a autorizar a concessão da medida excepcional, referindo-se, apenas, à limitação da memória humana”. Consta da decisão
ressalva de exame de novo pedido, condicionado à demonstração da necessidade concreta da produção antecipada da prova.
4.
O citado artigo 366 do CPP prevê a possibilidade da produção antecipada de provas e o artigo 225, ao dispor
especificamente sobre a prova testemunhal, fornece os parâmetros que autorizam a antecipação da oitiva:
“Art. 225. Se qualquer testemunha houver de ausentar-se, ou, por enfermidade ou por velhice, inspirar receio de que
ao tempo da instrução criminal já não exista, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, tomar-lhe
antecipadamente o depoimento.”
5.
Depreende-se, da conjugação dos dois artigos, que o juiz não está vinculado a fórmulas genéricas, cabíveis a qualquer
caso. A não ser assim, jamais poderá exercer o juízo próprio ao exame das cautelares, tendo, em conseqüência, de deferir qualquer
espécie de pedido objetivando a produção antecipada de provas. Na espécie, o requerimento do Ministério Público funda-se tãosomente na possibilidade de a testemunha esquecer detalhes importantes dos fatos, em virtude do decurso de tempo, ou deixar seu
domicílio, não mais sendo localizada. Ora, o esquecimento pelo decurso do tempo ou a possibilidade de mudança de domicílio são
circunstâncias que respeitam a qualquer ser humano. No caso concreto, há meras conjecturas, desacompanhadas de quaisquer
elementos que revelem a real necessidade da medida.
6.
Observo que esta Primeira Turma examinou questão semelhante, por ocasião do julgamento do RHC n. 83.709 (acórdão
ainda não publicado), ocorrido na Sessão do dia 30.3.04, prevalecendo o substancioso voto-vista do Ministro Cezar Peluso, no
sentido de que o juiz não está obrigado a deferir todo e qualquer pedido de produção antecipada de provas.
Ante o exposto, na linha do parecer da PGR e do precedente citado, dou provimento ao recurso para restabelecer a
decisão de primeiro grau que indeferiu a antecipação probatória.
* acórdão publicado no DJU de 1º.4.2005
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 387
Brasília, 9 a 13 de maio de 2005 Nº 387
Data (páginas internas): 18 de maio de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Convênio e Dispensa de Licitação
Processo Fiscal: Utilização Simultânea das Vias Administrativa e Judicial - 2
Revisão Geral de Remunerações e Subsídios e Iniciativa
Perda de Mandato Parlamentar: Voto Aberto e Modelo Federal
1ª Turma
2ª Turma
Clipping do DJ
Transcrições
Perda de Mandato Parlamentar: Voto Aberto e Modelo Federal (ADI 2461/RJ)
Conflito Federativo: Oposição em Ação de Reintegração de Posse e Exceção de Domínio
(ACO 736/RR)
PLENÁRIO
Convênio e Dispensa de Licitação
O Tribunal absolveu deputado federal e outros denunciados pela suposta prática de crimes contra a
Administração Pública (art. 89 da Lei 8.666/93, art. 1º, II e XIII do DL 201/67 c/c arts. 29, 69 e 71 do
CP), consistentes na celebração de contratos — sob a denominação de convênios — entre a Companhia
de Desenvolvimento de Curitiba - CIC e a FUNDACEN - Fundação Instituto Tecnológico e Industrial do
Município de Araucária, sem o devido processo licitatório, e sem observar as formalidades pertinentes à
dispensa, e por meio dos quais teria havido contratação indevida de pessoas, em ofensa ao inciso II do art.
37 da CF. Inicialmente, rejeitou-se, por maioria, a questão de ordem suscitada pelo Min. Marco Aurélio
quanto à inviabilidade do inquérito, em razão de a apuração dos fatos se ter dado a partir de uma carta
anônima. Entendeu-se que, no caso, havia outros elementos concretos a dar suporte à investigação, os
quais prescindiriam da existência da carta apócrifa. Afastou-se, também, a alegação de que a denúncia
seria nula por se fundar em elementos ilegaLmente colhidos pelo Ministério Público. Considerou-se que o
parquet não realizara, diretamente, as investigações, eis que encaminhara à autoridade policial a denúncia
anônima recebida, requerendo, na oportunidade, a abertura do inquérito penal. Asseverou-se, também,
estar-se diante de inquérito civil, por se cuidar, na espécie, de dano ao erário. No mérito, concluiu-se pela
atipicidade da conduta, já que configurada hipótese de convênio, sendo dispensável a licitação, uma vez
que as contratantes possuem objetivos institucionais comuns, e o ajuste firmado, que trata de mútua
colaboração, está de acordo com as características das partes, com a finalidade de cunho social almejada,
não havendo contraposição de interesses, nem preço estipulado. Salientou-se, ainda, o fato de o ajuste ter
sido celebrado com instituição a que se refere o art. 24, XIII, da Lei 8.666/93, visto que a FUNDACEN é
brasileira, não tem fins lucrativos e se destina à pesquisa, ao ensino e ao desenvolvimento científico e
tecnológico (Lei 8.666/93, art. 24: “É dispensável a licitação:... XIII - na contratação de instituição
brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento
institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha
inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos;”). Ressaltou-se, por fim, ter sido
referida instituição declarada de utilidade pública federal pelo Ministério da Justiça.
Inq 1957/PR, rel. Min. Carlos Velloso, 11.5.2005. (Inq-1957)
Processo Fiscal: Utilização Simultânea das Vias Administrativa e Judicial - 2
O Tribunal retomou julgamento de uma série de recursos extraordinários interpostos contra acórdão
do TJ/RJ, que negara provimento à apelação das recorrentes e confirmara sentença, que indeferira
mandado de segurança preventivo por elas impetrado, sob o fundamento de impossibilidade da utilização
simultânea das vias administrativa e judicial para discussão da mesma matéria, com base no parágrafo
único do art. 38 da Lei 6.830/80 — v. Informativo 349. O Min. Gilmar Mendes, em voto-vista, negou
provimento aos recursos por considerar que a renúncia à faculdade de recorrer na esfera administrativa e a
automática desistência de eventual recurso interposto é decorrência lógica da própria opção do
contribuinte de exercitar a sua defesa em conformidade com os meios que considere mais favoráveis aos
próprios interesses. Asseverou, ainda, não vislumbrar desproporcionalidade na cláusula que declara a
prejudicialidade da tutela administrativa se o contribuinte optar por obter, desde logo, a proteção judicial
devida, uma vez que não reputa inadequada providência que vise conferir racionalidade a essa dúplice
proteção oferecida pelo sistema jurídico. Acompanhou, destarte, a divergência iniciada pelo Min. Cezar
Peluso e seguida pelos Ministros Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Carlos Velloso e Celso de Mello. Este
último, por sua vez, salientou que o parágrafo único do art. 38 da Lei de Execução Fiscal deve ser
interpretado de modo a não ser declarada a sua inconstitucionalidade. Em conseqüência, asseverou que tal
dispositivo deverá ter aplicação, tão-somente, se e quando o provimento denegatório do mandado de
segurança ou, eventualmente, a decisão proferida em sede de outra ação judicial não estiver revestida da
autoridade de coisa julgada, já que esta impede qualquer discussão judicial e, a fortiori, administrativa.
De outro lado, o Min. Marco Aurélio, relator, aditou o voto para incluir em sua fundamentação a ofensa
ao direito de petição (CF, art. 5º, XXXIV, a ). No mais, manteve a conclusão pelo provimento aos
recursos extraordinários para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 38 da Lei
6.830/80 e conceder a segurança, para ter seqüência o processo administrativo, no que foi acompanhado
pelo Min. Carlos Britto. Após, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Sepúlveda
Pertence.
RE 389893/RJ; RE 233582/RJ; RE 267140/RJ; RE 234798/RJ e RE 234277/RJ, rel. Min. Marco
Aurélio, 11.5.2005. (RE-389893) (RE-233582) (RE-267140) (RE-234798) (RE-234277)
Revisão Geral de Remunerações e Subsídios e Iniciativa
O Tribunal iniciou julgamento de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada
pelo Governador do Estado do Rio Grande do Sul contra a expressão “do Poder Executivo”, inserida, por
meio de emenda parlamentar, no art. 1º da Lei estadual 12.222/2004, que prevê revisão de remunerações e
subsídios de servidores e agentes públicos do referido Estado. O Min. Marco Aurélio, relator, após
salientar que a revisão geral prevista no inciso X do art. 37 da CF deve ser feita sempre na mesma data e
sem distinção de índices, independentemente de lei que a preveja, em razão de se tratar de mera
atualização monetária e não alteração de remuneração, concedeu a liminar, sob o fundamento de que o
indeferimento da mesma implicaria mal maior, qual seja, a ocorrência de revisão parcial, e a proclamação,
de certa forma, da necessidade de lei e da revisão setorizada. O Min. Eros Grau acompanhou apenas a
conclusão do voto do relator para conceder a liminar, por considerar que a emenda da Assembléia acabou
por transformar a revisão geral anual de que trata o inciso X do art. 37 em alteração da remuneração dos
servidores do Poder Executivo de que também trata o referido dispositivo. Por sua vez, o Min.Nelson
Jobim, Presidente, deferiu a medida por entender que as revisões gerais são de iniciativa privativa do
Poder Executivo. O julgamento foi suspenso com o pedido de vista do Min. Carlos Britto.
ADI 3459 MC/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 11.5.2005. (ADI-3459)
Perda de Mandato Parlamentar: Voto Aberto e Modelo Federal
O Tribunal, por maioria, julgou procedentes pedidos formulados em ações diretas ajuizadas pelos
Partidos da Social Liberal – PSL e Democrático Trabalhista – PDT para declarar a inconstitucionalidade
do § 2º do art. 104 da Constituição Estadual do Rio de Janeiro, alterado pela Emenda Constitucional
17/2001, que estabelece que a perda de mandato de deputado, em determinadas hipóteses, será decidida
pela Assembléia Legislativa, por voto aberto. Entendeu-se caracterizada a ofensa ao § 1º do art. 27 da CF,
que determina a aplicação, aos deputados estaduais, das regras da Constituição Federal sobre perda de
mandato, bem como ao § 2º do art. 55 da CF, que prescreve que a perda do mandato parlamentar será
decidida por voto secreto nos casos que enuncia. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Celso de Mello
que, salientando a prevalência da votação aberta na Constituição Federal, julgavam improcedentes os
pleitos, por considerar que, em respeito ao princípio da publicidade dos atos estatais (CF, art. 37, caput)
— a viabilizar o controle da legitimidade da conduta dos parlamentares —, bem como ao que dispõe o
art. 25, caput, da CF (“Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem,
observados os princípios desta Constituição”), haver-se-ia de conferir interpretação restrita ao § 1º do art.
27, no sentido de que a regra nele contida somente se aplica, no âmbito estadual, no que se refere à
definição material, e não meramente formal, das causas autorizadoras de perda do mandato dos deputados
estaduais, permitindo, dessa forma, ao Estado-membro, no exercício autônomo do seu poder de autogoverno e auto-organização, definir a modalidade de votação nos processos de destituição do parlamentar
do seu mandato legislativo. Leia o inteiro teor do voto do relator na seção Transcrições deste Informativo.
ADI 2461/RJ e ADI 3208/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 12.5.2005. (ADI-2461) (ADI3208)
PRIMEIRA TURMA
Não houve a sessão ordinária do dia 10.5.2005.
SEGUNDA TURMA
Não houve a sessão ordinária do dia 10.5.2005.
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
11.5.2005
——
——
Extraordinárias
11.5.2005
——
——
Julgamentos
9
——
——
CLIPPING
DO
DJ
13 de maio de 2005
ADI N. 1.985-PE
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REGIMENTO INTERNO DO TJ/PE. RECONDUÇÃO DE
MEMBROS DO CONSELHO DA MAGISTRATURA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Até o advento da lei complementar
prevista no artigo 93, caput, da Constituição de 1988, o Estatuto da Magistratura será disciplinado pelo texto da Lei Complementar
n. 35/79, que foi recebida pela Constituição. Precedentes. 2. A regra contemplada no artigo 102 da LOMAN, que cuida dos
mandatos dos membros dos órgãos colegiados de direção, proíbe a recondução. 3. Pedido de declaração de inconstitucionalidade
julgado procedente.
* noticiado no Informativo 378
ADI N. 2.948-MS
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: AÇÃO DIREITA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 2º DO ARTIGO 62 DA LEI N. 7.156/99 DO ESTADO DO
MATO GROSSO. INSTALAÇÃO E OPERAÇÃO DE MÁQUINAS ELETRÔNICAS DO JOGO DE BINGO NAQUELE
ESTADO-MEMBRO. MATÉRIA AFETA À COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. INCONSTITUCIONALIDADE
FORMAL. 1. A Constituição do Brasil determina expressamente que compete à União legislar sobre sistemas de consórcios e
sorteios (art. 22, inciso XX). 2. A exploração de loterias constitui ilícito penal. Nos termos do disposto no art. 22, inciso I, da
Constituição, lei que opera a migração dessa atividade do campo da ilicitude para o campo da licitude é de competência privativa da
União. 3. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado procedente.
* noticiado no Informativo 378
HC N. 81.611-DF
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Crime material contra a ordem tributária (L. 8137/90, art. 1º): lançamento do tributo pendente de decisão
definitiva do processo administrativo: falta de justa causa para a ação penal, suspenso, porém, o curso da prescrição
enquanto obstada a sua propositura pela falta do lançamento definitivo.
1. Embora não condicionada a denúncia à representação da autoridade fiscal (ADInMC 1571), falta justa causa para a ação penal
pela prática do crime tipificado no art. 1º da L. 8137/90 - que é material ou de resultado -, enquanto não haja decisão definitiva do
processo administrativo de lançamento, quer se considere o lançamento definitivo uma condição objetiva de punibilidade ou um
elemento normativo de tipo. 2. Por outro lado, admitida por lei a extinção da punibilidade do crime pela satisfação do tributo devido,
antes do recebimento da denúncia (L. 9249/95, art. 34), princípios e garantias constitucionais eminentes não permitem que, pela
antecipada propositura da ação penal, se subtraia do cidadão os meios que a lei mesma lhe propicia para questionar, perante o Fisco,
a exatidão do lançamento provisório, ao qual se devesse submeter para fugir ao estigma e às agruras de toda sorte do processo
criminal. 3. No entanto, enquanto dure, por iniciativa do contribuinte, o processo administrativo suspende o curso da prescrição da
ação penal por crime contra a ordem tributária que dependa do lançamento definitivo.
* noticiado no Informativo 333
Rcl N. 1.722-RJ
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: RECLAMAÇÃO - ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL EM FACE DO PODER
PÚBLICO (LEI Nº 9.494/97, ART. 1º) - OUTORGA DE MEDIDA CAUTELAR, EM SEDE DE AÇÃO DECLARATÓRIA DE
CONSTITUCIONALIDADE (ADC 4/DF) - DECISÃO PLENÁRIA REVESTIDA DE EFICÁCIA VINCULANTE INTERPRETAÇÃO DO ART. 102, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - INOBSERVÂNCIA, POR ÓRGÃO DE
JURISDIÇÃO INFERIOR, DO EFEITO VINCULANTE DERIVADO DESSE JULGAMENTO PLENÁRIO - HIPÓTESE
LEGITIMADORA DO USO DA RECLAMAÇÃO (CF, ART. 102, I, “L”) - RECLAMAÇÃO PROCEDENTE.
AS DECISÕES PLENÁRIAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - QUE DEFEREM MEDIDA CAUTELAR EM SEDE DE
AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE - REVESTEM-SE DE EFICÁCIA VINCULANTE.
- Os provimentos de natureza cautelar acham-se instrumentalmente destinados a conferir efetividade ao julgamento final
resultante do processo principal, assegurando, desse modo, “ex ante”, plena eficácia à tutela jurisdicional do Estado, inclusive no
que concerne às decisões, que, fundadas no poder cautelar geral - inerente a qualquer órgão do Poder Judiciário - emergem do
processo de controle normativo abstrato instaurado mediante ajuizamento da pertinente ação declaratória de constitucionalidade.
Doutrina. Precedentes.
O DESRESPEITO À EFICÁCIA VINCULANTE, DERIVADA DE DECISÃO EMANADA DO PLENÁRIO DA SUPREMA
CORTE, AUTORIZA O USO DA RECLAMAÇÃO.
- O descumprimento, por quaisquer juízes ou Tribunais, de decisões revestidas de efeito vinculante, proferidas pelo Supremo
Tribunal Federal em sede de controle normativo abstrato, ainda que veiculadoras de medidas cautelares, autoriza a utilização da via
reclamatória, também vocacionada, em sua específica função processual, a resguardar e a fazer prevalecer, no que concerne à
Suprema Corte, a integridade, a autoridade e a eficácia subordinante dos comandos que emergem de seus atos decisórios.
Doutrina. Precedentes.
A DESOBEDIÊNCIA À AUTORIDADE DECISÓRIA DOS JULGADOS PROFERIDOS PELO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL IMPORTA EM INVALIDAÇÃO DO ATO QUE A HOUVER PRATICADO.
- A procedência da reclamação, quando promovida com o objetivo de fazer prevalecer o “imperium” inerente aos julgados
proferidos pelo Supremo Tribunal Federal, importará em desconstituição do ato que houver desrespeitado a autoridade da
decisão emanada da Suprema Corte.
RE N. 407.190-RS
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
TRIBUTO - REGÊNCIA - ARTIGO 146, INCISO III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - NATUREZA. O princípio revelado no
inciso III do artigo 146 da Constituição Federal há de ser considerado em face da natureza exemplificativa do texto, na referência a
certas matérias.
MULTA - TRIBUTO - DISCIPLINA. Cumpre à legislação complementar dispor sobre os parâmetros da aplicação da multa, tal
como ocorre no artigo 106 do Código Tributário Nacional.
MULTA - CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - RESTRIÇÃO TEMPORAL - ARTIGO 35 DA LEI Nº 8.212/91. Conflita com a Carta da
República -artigo 146, inciso III - a expressão “para os fatos geradores ocorridos a partir de 1º de abril de 1977”, constante do artigo
35 da Lei nº 8.212/91, com a redação decorrente da Lei nº 9.528/97, ante o envolvimento de matéria cuja disciplina é reservada à lei
complementar.
* noticiado no Informativo 367
HC N. 83.915-SP
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: 1. Habeas corpus: recurso especial tempestivo, se considerada a data de lançamento do “ciente” pelo Ministério Público,
única comprovada nos autos: deficiência da instrução para se concluir pela existência de intimação pessoal anterior. 2. Embargos de
declaração: início do prazo a partir da primeira e inequívoca intimação pessoal: data a partir da qual, no caso, os embargos no STJ
seriam intempestivos. A aposição do “ciente” pelo Ministério Público, para efeitos de contagem do prazo dos recursos, pressupõe a
ausência de anterior intimação pessoal que, per si, baste para consumar o ato. É o caso “da entrega de processo em setor
administrativo do Ministério Público, formalizada a carga pelo servidor” (v.g., HC 83.255, Pleno, Marco Aurélio, DJ 12.3.04)
que, por sua vez, também cede à sua anterior e inequívoca intimação pessoal, tal como a certificada no processo principal e a partir
da qual os embargos no STJ seriam intempestivos. 3. Ordem deferida para cassar o julgamento dos embargos de declaração, de
modo a fazer subsistir a decisão embargada.
* noticiado no Informativo 384
RE N. 394.943-SP
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. EROS GRAU
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL. DANO MORAL E MATERIAL DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO. COMPETÊNCIA.
1. É competente a Justiça Comum estadual para o julgamento das causas relativas à indenização por acidente de trabalho, bem assim
para as hipóteses de dano material e moral que tenham como origem esse fato jurídico, tendo em vista o disposto no artigo 109, I, da
Constituição do Brasil. 2. A nova redação dada ao artigo 114 pela EC 45/2004 não teve a virtude de deslocar para a Justiça do
Trabalho a competência para o exame da matéria, pois expressamente refere-se o dispositivo constitucional a dano moral ou
patrimonial decorrentes de relação de trabalho. Recurso extraordinário conhecido, mas não provido, mantida a competência da
Justiça Comum para o exame da lide.
* noticiado no Informativo 375
RHC N. 85.443-SP
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: 1. Defesa: Defensoria Pública: ausência de intimação pessoal da pauta de julgamento do recurso em sentido estrito:
nulidade absoluta: precedentes. 2. Sustentação oral frustrada pela ausência de intimação da pauta de julgamento: demonstração de
prejuízo: prova impossível (v.g., HC 69.142, 1ª T., 11.2.92, Pertence, RTJ 140/926). Frustrado o direito da parte à sustentação oral,
nulo o julgamento, não cabendo reclamar, a título de demonstração de prejuízo, a prova impossível de que, se utilizada aquela
oportunidade legal de defesa, outra teria sido a decisão do recurso.
* noticiado no Informativo 384
HC N. 85.379-SP
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: - CONSTITUCIONAL. PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME HEDIONDO. REGIME
FECHADO. LEI 8.072/90, ART. 2º, § 1º. CONSTITUCIONALIDADE. I. - A pena por crime previsto no art. 2º, § 1º, da Lei nº
8.072/90 (crime hediondo) deverá ser cumprida em regime fechado. Inocorrência de inconstitucionalidade. C.F., art. 5º, XLIII.
Precedentes do STF: HC 69.657/SP, Rezek, RTJ 147/598; HC 69.603/SP, Brossard, RTJ 146/611; HC 69.377/MG, Velloso, “D.J.”
de 16.4.93; HC 76.991/MG, Velloso, “D.J.” de 14.8.98; HC 81.421/SP, Néri, “D.J.” de 15.3.02; HC 84.422/RS, Joaquim Barbosa,
Relator para acórdão, julgado em 14.12.2004. II. - HC indeferido.
RHC N. 84.571-RJ
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. DOSIMETRIA DA PENA.
CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. GRANDE QUANTIDADE DE DROGA. TRANSPORTE POR TRÊS ESTADOS DA
FEDERAÇÃO. AUMENTO NA PENA-BASE. POSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO. O juiz de primeira instância
fundamentadamente elevou a pena-base de três para seis anos, em função das circunstâncias do crime, responsáveis pelo aumento
significativo do potencial lesivo da conduta, a saber: grande quantidade de drogas apreendida e o fato de que a droga era
transportada por três estados da federação. A importância de se valorarem as circunstâncias do crime na dosimetria da pena decorre
justamente da necessidade de que as sanções sejam proporcionais à lesividade das condutas.
Acórdãos Publicados: 318
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Perda de Mandato Parlamentar: Voto Aberto e Modelo Federal (Transcrições)
ADI 2461/RJ*
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Relatório: Trata-se do julgamento de duas ações diretas de inconstitucionalidade, com objeto idêntico: a ADI no 2.461-RJ (ajuizada
pelo Partido Social Liberal - PSL); e a ADI no 3.208-RJ (ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT).
Na ADI no 2.461-RJ, o parecer da Procuradoria-Geral da República, de lavra então Procurador-Geral, Dr. Geraldo Brindeiro,
assim relata a controvérsia (fls. 76-80):
“1. O Partido Social Liberal ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de cautelar, com relação à redação
dada ao § 2º do art. 104 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, que tem o seguinte teor:
‘Emenda Constitucional nº 17, de 2001.
Altera o § 2º do art. 104, da Constituição, instituindo o voto aberto para a cassação de mandato de deputado.
A Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro resolve:
Art. 1º - O § 2º do art. 104 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, passa a ter a seguinte redação:
§ 2º - Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Assembléia Legislativa, por voto aberto
e maioria absoluta, mediante provocação da Mesa Diretora ou de partido político com representação na Casa,
assegurada a ampla defesa.
Art. 2º - Esta Emenda Constitucional entrará em vigor na data da sua publicação, revogadas as disposições em
contrário.
Rio de Janeiro, 17 de maio de 2001'.
2. Aduziu, em síntese, o Requerente, a afronta aos arts. 5º, LIV; 25 e 55, § 2º da Constituição Federal, pois o último
dispositivo estatui que a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto
secreto, enquanto o art. 25 dispõe que os Estados se organizam e se regem pelas Constituições e Leis que adotarem,
observados os princípios da Lei Maior. Sustentou ainda, à luz do art. 5º, LIV da Carta Magna, a afronta à garantia do devido
processo legal e recordou que a jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal ‘... tem confirmado o entendimento de que o
ato normativo não razoável viola o direito ao devido processo legal.’
3. Ao concluir, enfatizando a necessidade de cautelar, sustenta que deve ser garantida a imparcialidade dos Deputados
fluminenses, para que possam votar de acordo com suas consciências ‘... protegidas das pressões políticas e da própria
opinião pública’, o que só é possível mediante votação secreta.
4. A Assembléia Legislativa, em suas informações, ressaltou que ‘... os parâmetros a que estão subordinados os Estados,
quanto à capacidade de elaborarem sua própria normatização, dizem respeito tão somente aos princípios estabelecidos na
Constituição Federal e não a toda e qualquer norma lá prevista. Caso contrário, estar-se-ia impondo aos Estados limitações
excessivas, que não se coadunariam com o disposto no art. 1º da Constituição Federal, que consagra o princípio federativo’.
Aduziu ainda que a Carta Magna consagrou, no art. 37, o princípio da publicidade e que ‘... somente com observância a tal
princípio, consubstanciado na transparência da conduta, é que se daria aplicabilidade ao princípio constitucional da
soberania popular’.
5. A Advocacia-Geral da União, em sua manifestação, observou que a procuração, em momento algum, faz menção à
Emenda Constitucional nº 17, de 2001, que altera o § 2º do art. 104 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro,
contrariando, assim a jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal no sentido de que todas as procurações ou delegações
outorgadas pelos autores de ação direta a seus advogados e procuradores contenham poderes especiais para a instauração do
pertinente processo do controle normativo abstrato perante a Corte Suprema ‘... com a indicação objetiva dos diplomas
legislativos ou dos atos normativos, e respectivamente preceitos (quando for o caso), que devam expor-se, especificamente, à
impugnação em sede de ação direta de inconstitucionalidade’ e que, se o vício não for sanado, deve o feito ser extinto, sem
julgamento de mérito.
6. Citando jurisprudência do Excelso Pretório, salientou que o procedimento da cassação do parlamentar estadual é matéria
interna corporis e que, em momento nenhum, se verifica ofensa ao princípio do devido processo legal, pois ‘... apenas o ato
decisório de responsabilização política é que se dará mediante votação aberta, todos os atos antecedentes obviamente serão
precedidos do contraditório e da ampla defesa somados às discussões parlamentares’”.
Em despacho de 19.07.2002, determinei a observância do rito do art. 12 (fl. 48).
Na decisão de 14.03.2003 (fl. 106), em consonância com a jurisprudência da Corte à época, julguei prejudicada a presente
ADI, visto que o requerente, o Partido Social Liberal - PSL, perdera sua representação parlamentar no Congresso Nacional.
Em 30.08.2004, ao apreciar o agravo regimental interposto, reconsiderei minha decisão e determinei o prosseguimento do
feito (fl. 154), de acordo com a nova orientação do Tribunal, adotada no julgamento das ADI´s nos 2.159-DF e 2.618-PR, (DJ de
24.08.2004), em que se reconheceu que “a perda superveniente de representação parlamentar não desqualifica o partido político
como legitimado ativo para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade”.
Em 02 de março último, para fins de apreciação conjunta, determinei o apensamento dos autos da ADI no 3.208-RJ aos desta
(fl. 157), pois ambas possuem objeto totalmente idêntico.
Entretanto, apenas para efeito de registro, creio ser relevante destacar as seguintes vicissitudes apontadas pelo parecer da
Procuradoria-Geral da República na ADI no 3.208-RJ, de lavra do atual Procurador-Geral, o Dr.Cláudio Fonteles (fls. 261-266):
“Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida liminar, proposta pelo Partido Democrático
Trabalhista - PDT, em face do § 2o do art. 104 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro.
1. Eis o teor da norma estadual impugnada:
‘Art. 104. (...)
(...)
§ 2° - Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Assembléia Legislativa, por voto aberto
e maioria absoluta, mediante provocação da Mesa Diretora ou de partido político com representação na Casa,
assegurada a ampla defesa.’
2. Sustenta o requerente, em síntese, que a norma impugnada viola o art. 27, § 1o c/c o art. 55, § 2o, da Constituição da
República. Afirma que ‘se a norma constitucional Federal estabelece que quanto ao processo de cassação do mandato
outorgado aos Deputados Estaduais deverá ser observado em exatidão aquele definido para os Deputados Federais e
Senadores da República, restringindo a autonomia outorgada aos entes Estaduais, ao estabelecer a Constituição do Estado do
Rio de Janeiro o procedimento diverso, acabou tal dispositivo eivado de inconstitucionalidade’ (fls. 11-12).
3. A Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro prestou informações a fls. 215-223, sustentando preliminarmente o
não conhecimento da presente ação direta, tendo em vista que o requerente não impugnou o art. 96, caput e parágrafo único
da Constituição do Estado do Rio de Janeiro. Argumenta que ‘mesmo que se declare a inconstitucionalidade do preceito
inserto no art. 104, § 2o, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, restará, em pleno vigor, o comando do parágrafo único
do art. 96 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, o qual dispõe de maneira idêntica’ (fls. 218). Quanto ao mérito,
defende a constitucionalidade da norma, pois a Constituição Federal não impõe às Constituições Estaduais a observância do
voto secreto para a deliberação sobre a perda de mandato do deputado estadual.
4. O Advogado-Geral da União manifestou-se pela declaração de inconstitucionalidade do art. 104, § 2o, da Constituição do
Estado do Rio de Janeiro, tendo em vista a violação ao art. 27, § 1o c/c o art. 55, § 2o, ambos da Constituição Federal (fls.
244-256).” (fls. 261-262)
Em ambas as ações, o parecer da Procuradoria-Geral da República é pela procedência da ação direta de inconstitucionalidade
(fls. 76-80, na ADI no 2.461; e fls. 261-266, na ADI no 3.208).
É o relatório, do qual a Secretaria distribuirá cópia aos senhores Ministros desta Corte.
Voto: Relativamente à preliminar suscitada pela Advocacia-Geral da União (fls. 67-72) na ADI no 2.461-RJ acerca do caráter
genérico da procuração outorgada (fl. 14), observo que, a partir da orientação firmada por este Tribunal no julgamento da ADI no
2.187-BA, Rel. Min. Octávio Gallotti (DJ de 12.12.2003), determinou-se que “todas as procurações ou delegações outorgadas pelos
autores de ação direta (CF, art.103), a seus Advogados e Procuradores, contenham poderes especiais para a instauração do pertinente
processo de controle normativo abstrato perante esta Corte, com a indicação objetiva dos diplomas legislativos ou dos atos
normativos, e respectivos preceitos (quando for o caso), que devam expor-se especificamente, à impugnação em sede de ação direta
de inconstitucionalidade.” (ADI no 2.521-PE, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 30.04.2002).
Afora as restrições que, de minha parte, poderiam ser feitas com relação à extensão do rigor processual assumido pelo
Tribunal, entendo que, para efeito da presente apreciação conjunta, a solução ortodoxa da extinção da ADI no 2.461-RJ sem
julgamento de mérito não afeta, sob hipótese alguma, a análise da questão constitucional aqui colocada.
Já com pertinência à preliminar suscitada pela Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (fls. 215-223) na ADI no
3.208-RJ, a qual propugna pelo não conhecimento da ação por suposta ausência de impugnação total dos dispositivos eivados de
inconstitucionalidade, creio que tal alegação não procede. A propósito, anotou o parecer da Procuradoria-Geral da República:
“6. Em primeira linha, deve ser ressaltado que, ao contrário do proposto pela Assembléia Legislativa do Estado do Rio de
Janeiro, a presente ação direta de inconstitucionalidade merece ser conhecida. A eventual declaração de inconstitucionalidade
do § 2o do art. 104 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, não fará com que a matéria atinente ao método de decisão da
perda do mandato parlamentar seja regida pelo art. 96, da mesma Carta Constitucional. Declarada a nulidade ex tunc, voltará
a viger a norma revogada, ou seja, a redação originária do § 2o do art. 104, o qual prescrevia, em consonância com a
Constituição Federal, o voto secreto como meio de deliberação da Casa Legislativa sobre a perda do mandato parlamentar.”
(fls. 262-263)
Quanto ao mérito o tema encontra adequada equação no texto constitucional.
O § 1o do art. 27 da Constituição estabelece a seguinte regra:
“Art. 27 - (...)
§ 1o - Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando-se-lhes as regras desta Constituição sobre
sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às
Forças Armadas. (ênfases acrescidas)”
O art. 55, § 2º fixa por sentença, a seguinte norma:
“Art. 55 - Perderá o mandato o Deputado ou Senador:
(...)
§ 2o - Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado
Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado
no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.”
Ademais a doutrina é pacífica no sentido da aplicação das regras vigentes na Constituição aos deputados estaduais no que
concerne à inviolabilidade, imunidades, subsídios, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas. A
esse respeito, destaco o seguinte excerto do Parecer da lavra do Professor Cláudio Fontelles (fls. 261-266):
“7. Quanto ao mérito, a inconstitucionalidade da norma impugnada resta evidente pela simples leitura do enunciado
normativo. Com efeito, a Constituição da República deixa claro que as regras por ela fixadas quanto à perda de mandato
parlamentar devem ser obrigatoriamente observadas pelas Constituições Estaduais.
8. A Constituição de 1988, ao mesmo tempo que atribui aos Estados poderes de auto-organização, auto-governo, autolegislação e auto-administração (art. 18, 25 a 28), impõe limitações a esses poderes e determina que sejam respeitados os
princípios nela estabelecidos. Assim, no caput do art. 25, está consignado que ‘os Estados organizam-se e regem-se pelas
Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.’
9. Não indica a Constituição quais seriam esses princípios. Alguns podem ser descobertos com facilidade, como os chamados
princípios sensíveis, enumerados no art. 34, inciso VII, quais sejam: a) a forma republicana, sistema representativo e regime
democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da administração pública; e)
aplicação do mínimo exigido da receita de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção
e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.
10. JOSÉ AFONSO DA SILVA fala ainda em princípios constitucionais estabelecidos, que são os que limitam a autonomia
organizatória dos Estados. São regras que revelam previamente a matéria de sua organização e as normas constitucionais de
caráter vedatório, bem como os princípios de organização política, social e econômica, que determinam o retraimento da
autonomia estadual, e cuja identificação reclama pesquisa no texto da Constituição (SILVA, José Afonso da. Curso de
Direito Constitucional Positivo. 19a Ed. São Paulo: Ed. Malheiros; 2001, p. 597).
11. Dessa forma, JOSÉ AFONSO DA SILVA, em análise do texto constitucional, nota que alguns princípios geram
limitações expressas, outros limitações implícitas e outros limitações decorrentes do sistema constitucional adotado. Dentre
as limitações expressas, encontram-se as de natureza vedatória e as de caráter mandatório. As mandatórias ‘consistem em
disposições que, de maneira explícita e direta, determinam aos Estados a observância de princípios, de sorte que, na sua
organização constitucional e normativa, hão que adotá-los, o que importa confranger sua liberdade organizatória aos limites
positivamente determinados.’ (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19a Ed. São Paulo: Ed.
Malheiros; 2001, p. 597)
(...)
14. Dessa forma, o mandamento constitucional é de que o Poder Constituinte Decorrente do Estados-membros, ao tratar a
respeito de perda de mandato parlamentar, deve, obrigatoriamente, observar as regras estabelecidas pela Constituição
Federal.
15. Outro não é o entendimento de JOSÉ AFONSO DA SILVA (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional
Positivo. 19a Ed. São Paulo: Malheiros; 2001, p. 610), quando afirma:
‘O Estatuto dos Deputados Estaduais é matéria que compete ao constituinte de cada Estado definir na
respectiva Constituição, mas a Constituição Federal já determina que lhes sejam aplicadas as regras sobre sistema
eleitoral (sistema proporcional), inviolabilidade, imunidades, subsídio, perda de mandato, licença, impedimentos e
incorporação às Forças Armadas, o que invoca o conteúdo do modelo federal constante dos arts. 53 a 56, cumprindo
apenas acrescentar aí o privilégio de foro a ser previsto na Constituição estadual, para declarar que serão julgados
pelo Tribunal de Justiça’. (ênfases acrescidas)” (fls. 263-265)
Diante do exposto, ao prescrever que a perda do mandato de deputado estadual seria decidida por “voto aberto”, o
Constituinte Estadual promulgou emenda constitucional em sentido diametralmente oposto às disposições fixadas pela Constituição
Federal.
Destarte, é forçoso concluir que o § 2o do art. 104 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro viola o art. 27, § 1o e o art. 55,
§ 2o, da Constituição da República.
Nestes termos, na linha do parecer da Procuradoria-Geral da República na ADI no 3.208-RJ, o meu voto é pela procedência
da ação, para declarar a inconstitucionalidade do § 2º, do art. 104 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro.
* acórdão pendente de publicação
Conflito Federativo: Oposição em Ação de Reintegração de Posse e Exceção de Domínio (Transcrições)
ACO 736/RR*
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
1. Trata-se de oposição oferecida pelo Estado de Roraima em face de Nilton José Bispo Aciole, Cecília Maria Gomes e
outros, respectivamente autor e réus em ação de reintegração de posse (ação principal autuada como ACO 735).
Nilton José Bispo Aciole propôs ação de reintegração de posse com pedido de liminar em face de Cecília Maria Ferreira
Gomes e Outros.
Alegou ser “legítimo possuidor do lote de terras na Ilha São Bento (Daiany), localizada a 03 (três) quilômetros LESTE de
Boa Vista (RR), cercada pelos rios Branco e Surrão, em frente ao Iate Club, com uma área de 134,75 ha, medindo 1820 metros de
FRENTE para o Rio Branco, 550 metros do lado DIREITO, 550 metros do lado ESQUERDO e 1820 metros de FUNDO com o Rio
Surrão, tendo os referidos rios como única via de acesso” (autos da ACO 735, fls. 4-5). Sustenta a ocorrência do esbulho
possessório pelos requeridos em junho de 1999.
Em aditamento à inicial, informou o autor que a área litigiosa seria de propriedade do Estado de Roraima (autos da ACO 735,
fl. 47).
O Estado de Roraima, alegando o domínio sobre as terras objeto de litígio, sustentou preliminar de ilegitimidade ativa ad
causam do autor (autos da ACO 735, fl. 67).
O Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista/RR indeferiu a liminar possessória (autos da ACO 735, fl. 70).
O Estado de Roraima ofereceu, então, oposição contra os litigantes na ação de reintegração de posse (fl. 3).
Argumenta, em síntese, que o autor, tendo protocolado pedido de permissão de uso do bem sob litígio, sem que a autorização
para o ingresso no bem fosse concedida, o vem ocupando, em razão da mera tolerância do Poder Público Estadual, com o propósito
de converter-se em possuidor das aludidas terras. Sustenta que “o domínio sobre as ilhas fluviais existentes no território estadual é
do Estado Federado, à luz do disposto no Art. 26, inc. II, da Constituição da República” (fl. 7).
Nilton José Bispo Aciole contestou a oposição alegando a ilegitimidade ativa do Estado de Roraima, vez que a verdadeira
proprietária das terras seria a União (fl. 18).
Tendo a União argüido a incompetência da Justiça Estadual (fl. 90), foram os autos encaminhados à Justiça Federal (fl. 99).
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), juntando certidão, esclareceu que “o imóvel objeto da
disputa é parte integrante da GLEBA TACUTU, matriculada em nome da União Federal, às fls. 097 do Livro 2-D de Registro
Geral, sob o nº 997, desde 4 de julho de 1977, no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Boa Vista - RR” (fl. 282).
Afirmou que, não possuindo o imóvel características para reforma agrária, não interessava à autarquia ingressar no feito.
O Instituto Brasileiro do Meio ambiente (IBAMA) afirmou que “a referida gleba é considerada de Proteção Ambiental
amparada pela Legislação Ambiental”, e que os “ocupantes da Ilha do Surrão já foram notificados, autuados e embargadas as suas
ocupações em decorrência dos crimes constantes dos arts. 38 e 39 da lei nº 9.605/98” (fl. 286).
Ao especificar provas, o Estado de Roraima juntou “cópia da lei nº 10.304, de 05 de novembro de 2001, onde houve a
transferência ao domínio do Estado de Roraima das terras até então pertencentes à União, compreendidas dentro dos limites e
confrontações do Estado” (fl. 310).
A União, sustentando ser a proprietária das terras, alega a carência de ação em razão da ilegitimidade ativa do oponente (fl.
326).
Admitindo a intervenção da União na qualidade de assistente litisconsorcial passiva, determinou o Juízo da 1ª Vara Federal
da Seção Judiciária de Roraima a remessa dos autos ao STF, com base no art. 102, I, “f” da CF (fl. 357).
O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do Vice Procurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e
Silva de Souza, manifesta-se pelo não conhecimento da ação cível originária, ou, ultrapassada a preliminar de não conhecimento,
pela improcedência do pedido formulado na oposição (fls. 372-379).
2. Tendo o Estado de Roraima ajuizado a presente oposição em face de litigantes em ação de reintegração de posse,
configurou-se o conflito federativo com a superveniente intervenção da União no feito, na condição de assistente litisconsorcial
passiva.
Dessa forma, por força do art. 102, I, “f”, da CF, compete ao Supremo Tribunal Federal o exame da presente oposição.
Observo, no entanto, que o conflito de interesses entre o Estado de Roraima e a União funda-se na propriedade das terras objeto de
ação de reintegração de posse.
Com a edição da Lei nº 6.820/80, que alterou a redação do art. 923 do CPC, prevalece o entendimento doutrinário de que a
exceção de domínio em ação possessória desapareceu de nosso ordenamento jurídico.
A esse respeito, colho trecho da obra de Alexandre Freitas Câmara:
“(...) em 1980, a Lei nº 6.820/80 alterou a redação do art. 923 do CPC, expurgando sua parte final, que se referia à
exceção de domínio. Manteve-se em vigor, tão-somente, a primeira parte do dispositivo, segundo a qual ‘na pendência do
processo possessório, é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar a ação de reconhecimento do domínio’. Desapareceu,
então, qualquer referência, no direito positivo brasileiro, à exceção de domínio. É de se recordar, aliás, que a revogação da
segunda parte do art. 923 do CPC não teve o condão de fazer novamente vigente o art. 505 do Código Civil de 1916, já que
não se admite, entre nós, a repristinação tácita (art. 2º, §3º, da Lei de Introdução do Código Civil). Com a entrada em vigor
do Código Civil de 2002, que não prevê a exceção de domínio, o instituto fica definitivamente sepultado.
Assim sendo, não há mais que se falar, no Direito Brasileiro, em exceção de domínio. No juízo possessório, portanto,
não poderá o juiz conhecer da alegação, em defesa, do ius possidendis. Opera-se, assim, uma total separação, no direito
vigente, do juízo possessório (aquele que versa sobre o ius possessionis) e do petitório (aquele que versa sobre o ius
possidendis).
Não infirma essa tese o conteúdo do Enunciado 487 da Súmula da Jurisprudência Dominante do Supremo Tribunal
Federal, segundo o qual ‘será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for ela disputada’.
A proibição de discussão a respeito do ius possidendis dá-se, apenas, nas ‘ações possessórias’, e nos casos em que se
disputa a posse com base no domínio não se está diante de uma ‘ação possessória’, mas sim de ‘ação petitória’.
Não se admite, pois, no direito vigente, qualquer interferência, no juízo possessório, de discussões de natureza
petitória. Em outras palavras, não se pode discutir o ius possidendis no curso de um processo possessório”
No mesmo sentido a manifestação do parecer do Ministério Público Federal:
“28. A ação principal é de reintegração de posse. O Estado de Roraima foi chamado a se manifestar por terem
informado as partes então litigantes que a área fazia parte do patrimônio estadual. Veio atuar como mero informante,
contatado com acerto pelo magistrado de 1ª instância, com o objetivo único de esclarecer sobre eventual posse exercida por
autor e réus . Como por ele próprio (Estado) aduzido nos autos da ação principal, em não tendo nenhuma das partes
qualificação de possuidor de terras, ‘as providências cabíveis para solucionar o fato’ seriam tomadas de imediato.
29. O meio de que se deveria valer o Estado - que se considera proprietário da área e nega a existência de
documentação que legitime a ocupação dos particulares - para reaver a terra em litígio não era o ajuizamento de oposição
nos autos em que se discute a posse, mas sim o uso dos mecanismos administrativos pertinentes de que dispõe, ou, caso
infrutíferos, o ajuizamento de ação própria, reivindicatória, que tutela especificamente o domínio.
30. A oposição em ação de integração de posse não é cabível, pois o que busca o opoente, nesse caso e em verdade, é
o reconhecimento da propriedade sobre a terra litigiosa. As causas, ligadas por natureza, passariam - e passaram - a ter
objetos diferentes: a primeira (principal) com base na posse, e a segunda (intervenção), com base no domínio, institutos
bastante distintos um do outro” (fl. 376).
Dessa forma, dada a autonomia entre posse e propriedade, tem-se por manifestamente incabível o ajuizamento de oposição
em que se alega o domínio das terras objeto de lide de índole possessória. A pretensão deduzida pelo Estado de Roraima, refutada
pela União, por ser de natureza reivindicatória, não se confunde com o objeto da ação principal, de natureza possessória. Assim,
verifica-se a ausência do interesse processual do opoente, hipótese de carência de ação.
3. Ante o exposto, julgo extinta a presente oposição, sem julgamento do mérito (art. 267, VI do CPC).
Publique-se.
Brasília, 28 de abril de 2005.
Ministra Ellen Gracie
Relatora
* decisão publicada no DJU de 16.5.2005
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 375
INFORMATIVO Nº 388
Brasília, 16 a 20 de maio de 2005 Nº 388
Data (páginas internas): 25 de maio de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
PIS e COFINS: Conceito de Faturamento - 4
PIS e COFINS: Conceito de Faturamento - 5
Extradição. Direito Intertemporal. Dupla Tipicidade. “Abolitio Criminis”. Prescrição - 3
Médico Servidor Público Federal: Jornada de Trabalho e Lei Especial
Conflito Federativo e Competência para Exploração de Serviço Público
1ª Turma
Trancamento de Inquérito por Atipicidade e Coisa Julgada
Ex-Governador e Prerrogativa de Foro
Apropriação de Coisa Havida por Erro e Competência
Proposta de Suspensão Condicional do Processo e Competência
Estelionato e Competência da Justiça Militar
Crime Ambiental: Falta de Documento Fiscal e Atipicidade
Lei 10.684/2003: Extinção da Punibilidade e Aplicação da Lei Penal mais Benéfica
2ª Turma
Rejeição de Denúncia e Exame de Mérito - 1
Rejeição de Denúncia e Exame de Mérito - 2
Perturbação do Sossego Alheio e Tutela da Paz Pública
Juiz Federal e Prisão Especial
Cabimento de MS e Autoria Sigilosa em Denúncia
IPI e Bem Importado por Pessoa Física
Clipping do DJ
PLENÁRIO
PIS e COFINS: Conceito de Faturamento - 4
O Plenário retomou julgamento de recurso extraordinário em que se questiona a constitucionalidade
das alterações promovidas pela Lei 9.718/98, que ampliou a base de cálculo da COFINS e do PIS, cujo
art. 3º, § 1º, define o conceito de faturamento (“Art. 3º: O faturamento a que se refere o artigo anterior
corresponde à receita bruta da pessoa jurídica. § 1º. Entende-se por receita bruta a totalidade das
receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a
classificação contábil adotada para as receitas.”). Trata-se, na espécie, de recurso extraordinário
interposto por contribuinte — contra acórdão do TRF da 4ª Região que dera pela constitucionalidade da
Lei 9.718/98, determinando a observância do prazo nonagesimal a partir da edição da Medida Provisória
1.724/98 —, em que se alega a inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º da Lei 9.718/98, em face da
redação original do art. 195, I, da CF, sustentando-se, ademais, que, até a data da promulgação da EC
20/98, que deu nova redação ao referido dispositivo constitucional, o PIS e a COFINS somente poderiam
ser cobrados sobre o “faturamento” assim entendido como a renda obtida das vendas de mercadorias e
serviços. Em síntese, alega-se a impossibilidade de uma lei, inconstitucional na origem, receber, durante a
vacatio legis, o embasamento constitucional que lhe faltava antes de sua entrada em vigor, infirmando,
portanto, a convalidação do art. 3º da Lei 9.718/98 pela EC 20/98 — v. Informativos 294 e 342.
Inicialmente, resolveu-se proceder ao julgamento conjunto de outros recursos extraordinários (RE
390840/MG; RE 357950/RS; RE 358273/RS), de relatoria do Min. Marco Aurélio, em que versada, da
mesma forma, a constitucionalidade da norma ora em questão.
RE 346084/PR, rel. Min. Ilmar Galvão, 18.5.2005. (RE-346084)
PIS e COFINS: Conceito de Faturamento - 5
Em seguida, relativamente ao RE 346084/PR, o Min. Cezar Peluso, proferindo voto-vista, conheceu
do recurso e lhe deu provimento para declarar a inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º da Lei 9.718/98.
Julgou, ainda, constitucional o caput do art. 3º da referida lei para dar-lhe interpretação conforme à
Constituição, nos termos do julgamento proferido no RE 150755/PE (DJU de 20.8.93), que tomou a
locução “receita bruta” no significado de faturamento. Afirmando ter havido uma acomodação prática do
conceito legal do termo faturamento estampado na Constituição às exigências históricas da atividade
empresarial, entendeu que o § 1º do art. 3º da Lei 9.718/97, ao ampliar o conceito de receita bruta para
toda e qualquer receita, violou a noção de faturamento pressuposta no art. 195, I, b, da CF, na sua redação
original, que equivaleria ao de receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de
serviços de qualquer natureza, conforme reiterada jurisprudência do STF. Reputou, ademais, afrontado o
§ 4º do art. 195 da CF, se considerado para efeito de instituição de nova fonte de custeio de seguridade,
eis que não obedecida, para tanto, a forma prescrita no art. 154, I, da CF (“Art. 154. A União poderá
instituir: I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam nãocumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta
Constituição;”). Salientou, ainda, que, a despeito de a norma constante do texto atual do art. 195, I, b, da
CF, na redação dada pela EC 20/98, ser conciliável com o disposto no art. 3º, do § 1º da Lei 9.718/97, não
haveria se falar em convalidação nem recepção deste, já que eivado de nulidade original insanável,
decorrente de sua frontal incompatibilidade com o texto constitucional vigente no momento de sua
edição. Por fim, afastou o argumento de que a publicação da EC 20/98, em data anterior ao início de
produção dos efeitos da Lei 9.718/97 — o qual se deu em 1º.2.99 em atendimento à anterioridade
nonagesimal (CF, art. 195, § 6º) —, poderia conferir-lhe fundamento de validade, haja vista que a lei
entrou em vigor na data de sua publicação (28.11.98), portanto, 20 dias antes da EC 20/98. Adiantando
seus votos, os Ministros Marco Aurélio, Carlos Velloso, Celso de Mello e Sepúlveda Pertence
acompanharam os fundamentos expostos no voto do Min. Cezar Peluso, divergindo apenas quanto à parte
dispositiva, para declarar, também, a inconstitucionalidade do caput do art. 3º da Lei 9.718/97. Em
relação aos demais recursos extraordinários, o Min. Marco Aurélio, relator, deles conheceu, dando-lhes
parcial provimento, na linha do voto proferido pelo Min. Cezar Peluso, sendo seguido pelos Ministros
Carlos Velloso, Celso de Mello e Sepúlveda Pertence. Após, o Min. Eros Grau pediu vista dos autosdos
últimos recursos.
RE 346084/PR, rel. Min. Ilmar Galvão, 18.5.2005. (RE-346084)
Extradição. Direito Intertemporal. Dupla Tipicidade. “Abolitio Criminis”. Prescrição - 3
O Tribunal retomou julgamento de pedido de extradição formulado pelo Governo do Paraguai para
entrega de nacional paraguaio processado, nesse país, pela prática dos crimes de estafa e estafa al estado,
previstos, respectivamente, nos artigos 396 e 397, do Código Penal Paraguaio de 1914 - v. Informativos
366 e 374. O Min. Carlos Britto, relator, que, na última assentada pedira vista dos autos para melhor
exame dos fundamentos apresentados pelo Min. Cezar Peluso, que indeferira o pedido, reiterou o seu voto
no sentido de conceder a extradição. Em seguida, pediu vista dos autos o Min. Eros Grau.
Ext 925/República do Paraguai, rel. Min. Carlos Britto, 19.5.2005. (Ext-925)
Médico Servidor Público Federal: Jornada de Trabalho e Lei Especial
Adotando o critério da especialidade (“lex specialis derogat generali”), o Tribunal concedeu
mandado de segurança impetrado contra ato do TCU, consubstanciado em acórdão que determinara ao
TRT da 16ª Região a adequação do pagamento das remunerações dos impetrantes, ocupantes dos cargos
de médico daquele TRT, à jornada de trabalho efetivamente trabalhada. Considerou-se o disposto na Lei
9.436/97, que estabelece a jornada de trabalho do médico servidor público em 4 horas, e prevê, nos §§ 1º
e 2º do seu art. 1º, a possibilidade de o médico optar por trabalhar 8 horas diárias para o mesmo órgão,
configurando-se tal fato como duas jornadas de trabalho, bem como no Decreto-lei 1.445/76, que regula a
jornada de trabalho dos médicos servidores públicos federais, naquilo que não contrarie a Lei 9.436/97, e
que também estabelece a jornada de 4 horas diárias. Entendeu-se que haveria de prevalecer o que fixado
em lei especial, afastando-se, dessa forma, o caput do art. 19 da Lei 8.112/90 que, de acordo com sua
publicação consolidada, determinada pela Lei 9.527/97, prevê jornada de trabalho com duração máxima
semanal de 40 horas, observados os limites mínimo e máximo de 6 e 8 horas, respectivamente.
MS 25027/DF, rel. Min. Carlos Velloso, 19.5.2005. (MS-25027)
Conflito Federativo e Competência para Exploração de Serviço Público
O Tribunal iniciou julgamento de reclamação proposta pela Agência Nacional de Transportes
Aquaviários - ANTAQ em face de decisão proferida por desembargador do TRF da 5ª Região, que fixara
a competência do juízo federal de 1ª instância para processar e julgar ação proposta pela SUAPE Complexo Industrial Portuário Governador Eraldo Gueiros e o Estado de Pernambuco contra a União e a
reclamante, na qual se pretende “obter o enquadramento das instalações portuárias de SUAPE como
Terminal Privativo de Uso Misto, afastando, assim, a incidência de todo o normativo pertinente à
estrutura de Porto Organizado”. Alega-se, na espécie, usurpação da competência do STF para julgar
causa que apresente potencial ofensivo ao pacto federativo (CF, art. 102, I, f), uma vez que a lide em
questão trata sobre a titularidade da prestação de serviços públicos de competência privativa da União e
sobre a destinação de bens e recursos federais aplicados na estruturação do referido Porto. O Min.
Joaquim Barbosa, relator, julgou procedente o pedido formulado para, tornando sem efeito os atos
decisórios proferidos no juízo federal de 1º grau, determinar a remessa dos autos a esta Corte. Entendeu
que, na causa sob exame, há potencial conflito federativo, porquanto evidente a divergência entre as
partes sobre a noção, de substrato constitucional, de competência material para exploração de importante
serviço público, qual seja, a atividade de serviços portuários. O Min. Eros Grau acompanhou o voto do
relator. Em seguida, pediu vista dos autos o Min. Carlos Britto.
Rcl 2549/PE, rel. Min. Joaquim Barbosa, 19.5.2005. (Rcl-2549)
PRIMEIRA TURMA
Trancamento de Inquérito por Atipicidade e Coisa Julgada
A decisão que determina o arquivamento do inquérito policial, a pedido do Ministério Público,
quando o fato nele apurado não constituir crime, produz, mais que preclusão, coisa julgada material,
impedindo ulterior instauração de processo que tenha por objeto o mesmo episódio, ainda que a denúncia
se baseie em novos elementos de prova. Nesses termos, a Turma deferiu habeas corpus impetrado em
favor de ex-prefeito condenado pela prática do crime previsto no art. 1º, II, do Decreto-lei 201/67 (“Art.
1º -... II – utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços
públicos.”), consistente no desvio de finalidade de recursos, advindos de convênio entre Município e o
Ministério do Bem Estar Social, para o pagamento de obra diversa da pactuada, com o fim de ensejar
benefício à empreiteira. Considerando a identidade dos fatos pelos quais o paciente fora processado e
julgado com aqueles que já teriam sido objeto de anterior inquérito policial, arquivado por determinação
do Tribunal de Justiça estadual — em decisão, não recorrida, que analisara o mérito e concluíra pela
atipicidade do fato —, a Turma entendeu que a instauração de ação penal pelo Ministério Público Federal,
sob o fundamento de que teriam surgido novas provas a justificar o recebimento da denúncia na Justiça
Federal, violara a coisa julgada. Salientou que, não obstante a decisão de arquivamento tivesse sido
prolatada pela justiça comum, absolutamente incompetente para o caso, já que o delito imputado é
ofensivo a interesse da União, os seus efeitos não poderiam ser afastados, sob pena de reformatio in pejus
indireta. Habeas corpus deferido para trancar o processo condenatório. Precedentes citados: HC
80560/GO (DJU de 30.3.2001 e RTJ 179/755); Inq 1538/PR (DJU de 14.9.2001 e RTJ 178/1090); Inq
2044 QO/SC (DJU de 8.4.2005) e HC 80263/SP (DJU de 27.6.2003 e RTJ 186/1040).
HC 83346/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 17.5.2005. (HC-83346)
Ex-Governador e Prerrogativa de Foro
A Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia a aplicação do art. 84 do Código de Processo
Penal, com o reconhecimento da competência do STJ para julgar queixa-crime proposta contra o exGovernador do Estado do Rio de Janeiro. Esta havia sido formalizada perante o STJ, em razão da
qualificação do paciente à época do suposto delito, sob acusação de ofensa à honra, consistente na
afirmação feita pelo querelado de que houvera uma doação de verba, repassada pela então Vicegovernadora à determinada pessoa, para construção de restaurante popular, não concretizada. O STJ
concluíra pela competência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, após a renúncia pelo
paciente do mandato de governador. Rejeitou-se a questão de ordem suscitada pelo Min. Marco Aurélio,
relator, quanto à incidência do § 1º do art. 84 do CPP, com redação dada pela Lei 10.628/2002 (“Art.
84.... § 1o A competência especial por prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente,
prevalece ainda que o inquérito ou a ação judicial sejam iniciados após a cessação do exercício da
função pública.”), por se considerar que, no caso, o ato praticado não se relacionava com o exercício do
cargo de governador, não havendo de se aplicar o foro especial previsto na referida norma,
independentemente do reconhecimento ou não da sua constitucionalidade pendente de apreciação no
Plenário. Com base nisso, indeferiu-se a ordem. Vencido, na questão de ordem, o Min. Marco Aurélio,
relator. Habeas Corpus indeferido para manter a decisão do STJ.
HC 85675 QO/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 17.5.2005. (HC-85675)
Apropriação de Coisa Havida por Erro e Competência
A Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de pacientes que estão sendo processados em
Vara Criminal do Rio de Janeiro/RJ, para assentar, como juízo natural da ação penal, o Juizado Especial
Criminal. No caso concreto, a suposta vítima formalizara representação contra os pacientes alegando que
contratara serviços, por um certo valor, com a empresa da qual estes são sócios. Ocorre, no entanto, que
remeteram, equivocadamente, via depósito em conta, montante aproximadamente 100 vezes o preço
combinado, não tendo logrado êxito nas tentativas de receber a devolução da diferença. A denúncia
oferecida pelo Ministério Público enquadrara os fatos no art. 171 do CP (estelionato). Entendeu-se tratarse, na espécie, do delito previsto no art. 169 do CP (“Art. 169 - Apropriar-se alguém de coisa alheia
vinda ao seu poder por erro, caso fortuito ou força da natureza”), a alterar a competência para o
processamento da ação penal, porquanto a denúncia fora explícita sobre o fato de que o depósito se dera
não por meio de induzimento ou manutenção de alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer
outro meio fraudulento, mas por equívoco da própria empresa que apresentara notícia do crime.
HC 84610/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 17.5.2005. (HC-84610)
Proposta de Suspensão Condicional do Processo e Competência
Não encerra verdadeira transação entre o titular da ação penal e o acusado o que previsto no art. 89
da Lei 9.099/95 [“Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano,
abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a
suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não
tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão
condicional da pena (art. 77 do Código Penal)”]. Trata-se de instituto submetido a condições legais, cuja
formalização passa pelo crivo do juiz. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus
impetrado em favor de denunciado pela suposta prática do crime de desacato (CP, art. 331). Pretendia-se
a concessão da ordem para que fosse designada nova audiência visando à concordância, ou não, com a
proposta do representante do Ministério Público de suspensão condicional do processo, a qual fora
indeferida pelo juízo, que concluíra por sua impropriedade, em razão de o denunciado encontrar-se
respondendo a outro processo. Salientou-se, ainda, não haver presunção de culpa do acusado, mas de
requisito que, considerada a política criminal, está previsto no referido artigo.
HC 85751/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 17.5.2005. (HC-85751)
Estelionato e Competência da Justiça Militar
Com base no art. 9º, III, a, do Código Penal Militar (“Art. 9º. Consideram-se crimes militares, em
tempo de paz: ... III – os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as
instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do inciso
II, nos seguintes casos: a) contra o patrimônio sob a administração militar, ou contra a ordem
administrativa militar”), a Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de denunciada pela
suposta prática de estelionato (CPM, art. 215), consistente no recebimento de proventos de pensão militar
especial de pensionista falecida, por meio da falsificação da assinatura desta. Pretendia-se, na espécie, a
decretação da competência da Justiça Federal para o julgamento da paciente, sob o argumento de que os
valores pertenciam à União e que o lesado fora o Banco do Brasil. Considerou-se que os recursos
repassados pela União para o pagamento da pensionista estavam sob a administração militar, sendo,
portanto, da competência da Justiça Militar o julgamento do crime, haja vista que o citado dispositivo
alude a “patrimônio sob a administração militar” e não a patrimônio de que as entidades militares sejam
titulares da propriedade, pela simples razão de que elas não têm patrimônio próprio, que é do Estado, que
o coloca sob a administração das entidades militares para que estas possam exercer as suas atribuições.
HC 84735/PR, rel. Min. Eros Grau, 17.5.2005. (HC-84735)
Crime Ambiental: Falta de Documento Fiscal e Atipicidade
O parágrafo único do art. 46 da Lei 9.605/98 (“Art. 46.... Parágrafo único. Incorre nas mesmas
penas quem vende, expõe à venda, tem em depósito, transporta ou guarda madeira, lenha, carvão e
outros produtos de origem vegetal, sem licença válida para todo o tempo da viagem ou do
armazenamento, outorgada pela autoridade competente.”) se refere à autorização ambiental expedida
pelo IBAMA, e não à regularidade de documentação fiscal. Com base nesse entendimento, a Turma, por
falta de justa causa, deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus para trancar a ação penal na
qual o recorrente estava sendo acusado por crime ambiental, por transportar produto de origem vegetal,
sem que constasse da nota fiscal da mercadoria carimbo da Secretaria de Estado da Fazenda de Minas
Gerais - SEF, embora houvesse autorização ambiental dentro do prazo de validade. Considerou-se que
eventual irregularidade fiscal do transporte não afeta o bem jurídico protegido pela incriminação, qual
seja, o meio-ambiente, o que leva à atipicidade do fato, posto que se trate, como na hipótese, de um crime
de mera conduta.
RHC 85214/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 17.5.2005. (RHC-85214)
Lei 10.684/2003: Extinção da Punibilidade e Aplicação da Lei Penal Mais Benéfica
A Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de denunciado pela suposta prática de
apropriação indébita de contribuições previdenciárias descontadas de segurados. Na espécie, o paciente e
mais dois co-réus, após o recebimento da denúncia, haviam parcelado e pago, espontaneamente, todos os
débitos. A mesma medida fora indeferida no STJ, que entendera não existir previsão legal para o
parcelamento de contribuições previdenciárias descontadas de empregados, havendo, ao contrário,
expressa vedação (Lei 10.666/2003, art. 7º), o que teria sido ratificado pelo veto do § 2º do art. 5º da Lei
10.684/2003, que previa esse benefício. Aplicou-se, ao caso, o disposto no § 2º do art. 9º da Lei
10.684/2003, extinguindo-se a punibilidade do paciente, considerado o princípio da retroatividade da lei
penal mais benéfica (CF, art. 5º, XL). Salientou-se que, ainda que o parcelamento e a quitação do débito
com a Previdência tivessem ocorrido após a vigência dessa lei, ela deveria incidir, haja vista que as regras
referentes ao parcelamento são dirigidas à autoridade tributária, de modo que, se esta defere a faculdade
de parcelar e quitar o débito e o paciente cumpre a respectiva obrigação, deve ser beneficiado. Com base
no art. 580 do CPP, estendeu-se a decisão a um dos co-réus, dada a identidade de situações, esclarecendo
que o terceiro acusado já fora absolvido. (“Lei 10.684/2003: Art. 9o É suspensa a pretensão punitiva do
Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos
arts. 168A e 337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período
em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de
parcelamento. ... § 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa
jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e
contribuições sociais, inclusive acessórios.”).
HC 85452/SP, rel. Min. Eros Grau, 17.5.2005. (HC-85452)
SEGUNDA TURMA
Rejeição de Denúncia e Exame do Mérito - 1
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus impetrado em favor de juíza de direito contra
acórdão do STJ que, dando provimento a recurso especial interposto pelo Ministério Público estadual,
recebera denúncia contra ela apresentada pela suposta prática dos crimes de peculato (CP, art. 312);
redução à condição análoga a de escravo (CP, art. 149, por três vezes); fuga de pessoa presa ou submetida
a medida de segurança (CP, art. 351, § 3º); extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento
(CP, art 314); tráfico de influência (CP, art 332, por oito vezes); exploração de prestígio (CP, art. 357),
prevaricação (CP, art. 319, por dezesseis vezes) e abuso de autoridade (Lei 4.898/65, arts. 3º, j e 4º, a),
todos em concurso material. No caso, o Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul rejeitara a
denúncia por atipicidade das condutas imputadas à paciente e por ausência de condição de
procedibilidade da ação penal, sendo tal decisão modificada pelo STJ, ao fundamento de que aquele
tribunal adentrara o mérito da acusação, mediante análise de fatos e de provas, sem se restringir ao exame
dos requisitos formais estabelecidos pelos artigos 41 e 43 do CPP. No tocante à falta de representação do
ofendido, o STJ concluíra, ainda, que a ausência desta não obstaria a instauração de ação penal pública,
em se tratando de crime de abuso de autoridade, haja vista que esse requisito fora abolido, a teor do que
dispõe a Lei 5.249/67. Pretende-se, na espécie, a declaração de nulidade do acórdão prolatado pelo
tribunal a quo, sob a alegação de falta de fundamentação e ofensa à coisa julgada. Sustenta-se que o STJ,
ao concluir que a denúncia não era inepta, apreciara questão diversa daquela decidida pelo Tribunal de
Justiça local, sem reexaminar os motivos e argumentos que a embasaram, uma vez que a alegação
principal do parquet seria o fato de a denúncia não ser inepta, tendo sido esta, por sua vez, considerada
improcedente em face da atipicidade da conduta.
HC 84860/MS, rel. Min. Joaquim Barbosa, 17.5.2005. (HC-84860)
Rejeição de Denúncia e Exame do Mérito - 2
O Min. Joaquim Barbosa, relator, indeferiu o writ, por não vislumbrar mácula capaz de invalidar a
decisão do STJ. Afastou, inicialmente, a alegação de ausência de fundamentação, porquanto, embora
sucinto o acórdão impugnado, considerou-o suficientemente motivado, com o exame e a rejeição das
razões do acórdão prolatado pelo tribunal de justiça. Com relação à segunda causa de pedir, qual seja, a
ofensa à coisa julgada, consistente no fato de que os fundamentos da decisão do tribunal estadual estariam
acobertados por essa qualidade, em razão de somente haver sido argüida a inépcia da denúncia, o Min.
Joaquim Barbosa entendeu que tanto o recurso especial quanto o acórdão ora recorrido versaram sobre a
questão da atipicidade das condutas, não se limitando aos aspectos meramente formais da inépcia da
inicial. No ponto, salientou que o STJ reconhecera a existência, ao menos, de crime em tese, fazendo
juízo diverso do firmado pelo tribunal de justiça estadual, o qual declarara de plano a atipicidade. Por seu
turno, considerou não existir motivo para a rejeição liminar da peça acusatória, tendo em conta a
gravidade das imputações. De outro lado, o relator refutou a manifestação proferida pela ProcuradoriaGeral da República, no sentido da aplicação do art. 6º da Lei 8.038/90, quanto à possibilidade de o
tribunal deliberar sobre a improcedência da acusação, já que, na hipótese, restaria caracterizada a
necessidade de produção de outras provas, no âmbito da ação penal. Asseverou, ainda, que o tribunal de
justiça rejeitara a denúncia e não a julgara improcedente. Por fim, afirmou que tanto o juízo de
atipicidade, constante do inciso I do art. 43 do CPP, como a rejeição por improcedência, prevista na parte
final do art. 6º da Lei 8.038/90, devem ser entendidos sempre com a observância ao princípio in dubio pro
societatis, que incide na fase de recebimento da denúncia. Após, o julgamento foi suspenso em virtude do
pedido de vista do Min. Gilmar Mendes.
HC 84860/MS, rel. Min. Joaquim Barbosa, 17.5.2005. (HC-84860)
Perturbação do Sossego Alheio e Tutela da Paz Pública
Por ausência de justa causa, a Turma concedeu habeas corpus para trancar ação penal proposta
contra acusado pela suposta prática da contravenção de perturbação do sossego alheio (Lei das
Contravenções Penais, art. 42), cujo tumulto decorreria de barulho provocado pelos cinco filhos do
paciente, menores de dez anos, consistente na correria e no arremesso de objetos ao chão no apartamento
onde residem. Entendeu-se que os ruídos tidos por praticados na residência do paciente não teriam o
condão de macular a paz social, bem jurídico tutelado pelo Direito Penal, uma vez que, conforme relatado
na denúncia, os fatos descritos atingiriam apenas o morador do apartamento do andar inferior. O Min.
Gilmar Mendes, relator, ressaltou em seu voto que, na espécie, restaria evidente certa sobrecarga ao
processo penal e certa incapacidade da sociedade de solver esses tipos de conflito em outras esferas, que
não a exclusivamente penal.
HC 85032/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.5.2005. (HC-85032)
Juiz Federal e Prisão Especial
A Turma concedeu medida cautelar em favor de juiz federal condenado, com base em investigações
procedidas na denominada “Operação Anaconda”, pela prática do crime de formação de quadrilha (CP,
art. 288), para determinar a sua imediata transferência para o Quartel do Regimento de Cavalaria Montada
“Nove de Julho” da Polícia Militar do Estado de São Paulo, até final julgamento do habeas corpus. Alega
a impetração constrangimento ilegal consistente na vedação de tratamento de saúde e realização de
exames médicos fora do estabelecimento prisional, bem como requer, ainda, a remoção do paciente para
cela especial. Entendeu-se que, em razão de o paciente ser magistrado, deveria ser recolhido em prisão
especial ou em sala especial de Estado-Maior, nos termos e para os fins previstos no art. 33, III, da
LOMAN (“Art. 33 - São prerrogativas do magistrado: ... III - ser recolhido a prisão especial, ou a sala
especial de Estado-Maior, por ordem e à disposição do Tribunal ou do órgão especial competente,
quando sujeito a prisão antes do julgamento final;”). Precedente citado: HC 81632/SP (DJU de
20.8.2002).
HC 85431/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 17.5.2005. (HC-85431)
Cabimento de MS e Autoria Sigilosa em Denúncia
A Turma deu provimento a recurso ordinário em mandado de segurança interposto contra acórdão
do STJ que julgara extinto, sem julgamento do mérito, o writ impetrado pelo ora recorrente contra ato de
Ministra de Estado Corregedora-Geral da União ao fundamento de que o instrumento processual
adequado para a busca de informações relativas à pessoa do impetrante seria o habeas data. No caso, o
recorrente visa ao fornecimento, por certidão, da identidade dos autores de denúncias contra ele
formuladas perante a Corregedoria-Geral da União, para que tal documento possa ser usado na defesa de
direitos, como prova em processo judicial. Aplicou-se precedente firmado pelo STF no sentido da
adequação do mandado de segurança como remédio constitucional hábil para a obtenção de informações
sobre os nomes dos denunciantes. No ponto, entendeu-se que não se poderia concluir de modo diverso,
haja vista que deve ser atribuída a máxima eficácia às garantias constitucionais. Asseverou-se, ainda, que
o habeas data possui finalidades específicas, quais sejam, assegurar o conhecimento de informações
relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais
ou de caráter público, assim como para a retificação de dados quando não se prefira fazê-lo por processo
sigiloso, judicial ou administrativo (CF, art. 5º, LXXII, a e b). RMS provido para determinar que o STJ
proceda ao julgamento do mérito do mandado de segurança como entender de direito. Precedente citado:
MS 24405/DF (DJU de 23.4.2004).
RMS 24617/DF, rel. Min. Carlos Velloso, 17.5.2005. (RMS-24617)
IPI e Bem Importado por Pessoa Física
A Turma iniciou julgamento de dois agravos regimentais em recursos extraordinários interpostos
pela União contra decisão monocrática do Min. Carlos Velloso, relator, que, tendo em conta o princípio
da não-cumulatividade (CF, art. 153, § 3º, II), concluíra pela não incidência do IPI na aquisição de
veículo importado, destinado a uso próprio, por pessoa física não comerciante ou empresária. O Min.
Carlos Velloso votou pela manutenção da decisão impugnada. Enumerou vários precedentes firmados
pelo STF no sentido da inexigibilidade de ICMS quando se tratar de bem importado por pessoa física,
antes do advento da EC 33/2001 — que viabilizara tal cobrança —, ressaltando, por outro lado, não
existir disposição igual no tocante ao IPI. Diante disso, asseverou que o princípio da não-cumulatividade
deve ser observado. Após, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Joaquim
Barbosa.
RE 272230 AgR/SP e RE 255682AgR/RS, rel. Min. Carlos Velloso, 17.5 2005. (RE-272230) (RE255682)
Sessões
Ordinárias
Extraordinárias
Julgamentos
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
18.5.2005
17.5.2005
17.52005
19.5.2005
——
——
13
26
400
CLIPPING
DO
DJ
20 de maio de 2005
QO EM AC N. 244-DF
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
ARRESTO - EXTENSÃO - PENDÊNCIA DO PROCESSO PRINCIPAL - PROJEÇÃO NO TEMPO. A natureza acauteladora do
arresto sinaliza a existência de ato precário e balizado no tempo, mormente quando alcançado o universo dos bens do destinatário do
ato de constrição. A regra do artigo 807 do Código de Processo Civil há de ser tomada sob o ângulo da razoabilidade, longe ficando
de implicar a indeterminação do prazo de eficácia das medidas cautelares.
* noticiado no Informativo 366
ACO N. 640-RO
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
BENS DA UNIÃO - TERRITÓRIO DE RORAIMA - UTILIZAÇÃO. Ante o teor do § 2º do artigo 14 do Ato das Disposições
Transitórias da Carta de 1988, aplicáveis são as normas norteadoras da criação do Estado de Rondônia e, portanto, quanto aos bens
da União e à transferência destes para o novo Estado de Roraima, o preceito do artigo 15 da Lei Complementar nº 41/81. Os bens
efetivamente utilizados pela Administração do Território Federal de Roraima passaram ao domínio do novo Estado.
ADI N. 2.884-RJ
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - A QUESTÃO PERTINENTE AO MINISTÉRIO
PÚBLICO ESPECIAL JUNTO AO TRIBUNAL DE CONTAS ESTADUAL: UMA REALIDADE INSTITUCIONAL QUE NÃO
PODE SER DESCONHECIDA - CONSEQÜENTE IMPOSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL DE O MINISTÉRIO PÚBLICO
ESPECIAL SER SUBSTITUÍDO, NESSA CONDIÇÃO, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO COMUM DO ESTADO-MEMBRO AÇÃO DIRETA JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE.
OS ESTADOS-MEMBROS, NA ORGANIZAÇÃO E COMPOSIÇÃO DOS RESPECTIVOS TRIBUNAIS DE CONTAS,
DEVEM OBSERVAR O MODELO NORMATIVO INSCRITO NO ART. 75 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.
- Os Tribunais de Contas estaduais deverão ter quatro Conselheiros eleitos pela Assembléia Legislativa e três outros nomeados
pelo Chefe do Poder Executivo do Estado-membro. Dentre os três Conselheiros nomeados pelo Chefe do Poder Executivo
estadual, apenas um será de livre nomeação do Governador do Estado. Os outros dois deverão ser nomeados pelo Chefe do
Poder Executivo local, necessariamente, dentre ocupantes de cargos de Auditor do Tribunal de Contas (um) e de membro do
Ministério Público junto à Corte de Contas local (um). Súmula 653/STF.
- Uma das nomeações para os Tribunais de Contas estaduais, de competência privativa do Governador do Estado, acha-se
constitucionalmente vinculada a membro do Ministério Público especial, com atuação perante as próprias Cortes de Contas.
O MINISTÉRIO PÚBLICO ESPECIAL JUNTO AOS TRIBUNAIS DE CONTAS NÃO SE CONFUNDE COM OS
DEMAIS RAMOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO COMUM DA UNIÃO E DOS ESTADOS-MEMBROS.
- O Ministério Público especial junto aos Tribunais de Contas - que configura uma indiscutível realidade constitucional - qualificase como órgão estatal dotado de identidade e de fisionomia próprias que o tornam inconfundível e inassimilável à instituição do
Ministério Público comum da União e dos Estados-membros.
- Não se reveste de legitimidade constitucional a participação do Ministério Público comum perante os Tribunais de Contas dos
Estados, pois essa participação e atuação acham-se constitucionalmente reservadas aos membros integrantes do Ministério
Público especial, a que se refere a própria Lei Fundamental da República (art. 130).
- O preceito consubstanciado no art. 130 da Constituição reflete uma solução de compromisso adotada pelo legislador
constituinte brasileiro, que preferiu não outorgar, ao Ministério Público comum, as funções de atuação perante os Tribunais de
Contas, optando, ao contrário, por atribuir esse relevante encargo a agentes estatais qualificados, deferindo-lhes um “status”
jurídico especial e ensejando-lhes, com o reconhecimento das já mencionadas garantias de ordem subjetiva, a possibilidade de
atuação funcional exclusiva e independente perante as Cortes de Contas.
A QUESTÃO DA EFICÁCIA REPRISTINATÓRIA DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE “IN ABSTRACTO”.
- A declaração final de inconstitucionalidade, quando proferida em sede de fiscalização normativa abstrata, importa - considerado
o efeito repristinatório que lhe é inerente - em restauração das normas estatais anteriormente revogadas pelo diploma normativo
objeto do juízo de inconstitucionalidade, eis que o ato inconstitucional, por juridicamente inválido (RTJ 146/461-462), não se
reveste de qualquer carga de eficácia derrogatória. Doutrina. Precedentes (STF).
* noticiado no Informativo 372
ADI N. 2.895-AL
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: REMUNERAÇÃO: VINCULAÇÃO OU EQUIPARAÇÃO. C.F., art. 37, XIII. Lei Complementar nº 7, de 1991, com a redação da Lei Complementar nº 23, de 2002, do Estado de
Alagoas.
I. - Objetivando impedir majorações de vencimentos em cadeia, a Constituição Federal, art. 37, XIII, veda a vinculação ou
equiparação de vencimentos para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público.
II. - Inconstitucionalidade de parte da segunda parte do art. 74 da Lei Complementar nº 7, de 1991, com a redação da Lei
Complementar nº 23, de 2002, ambas do Estado de Alagoas.
III. - Não obstante de constitucionalidade duvidosa a primeira parte do mencionado artigo 74, ocorre, no caso, a impossibilidade de
sua apreciação, em obséquio ao “princípio do pedido” e por não ocorrer, na hipótese, o fenômeno da inconstitucionalidade por
“arrastamento” ou “atração”, já que o citado dispositivo legal não é dependente da norma declarada inconstitucional. ADI
2.653/MT, Ministro Carlos Velloso, “DJ” de 31.10.2003.
IV. - ADI julgada procedente, em parte.
* noticiado no Informativo 375
AG.REG. NA Rcl N. 872-SP
RELATOR P/ ACÓRDÃO: MIN. NELSON JOBIM
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO. POSSIBILIDADE DE INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO. CABIMENTO DA RECLAMAÇÃO. EFICÁCIA DA DECISÃO CONCESSIVA DE LIMINAR NA ADC 4.
No julgamento da ADC 4 restou assentada que a decisão que concede medida cautelar em sede de ação declaratória de
constitucionalidade é investida da mesma eficácia contra todos e efeito vinculante, características da decisão de mérito.
A reclamação e o agravo do art. 522 do CPC não são procedimentos idênticos, mas recursos ou remédios com diferentes efeitos e
diversas razões.
A reclamação visa preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões, motivo pelo qual a decisão proferida
em reclamação não substitui a decisão recorrida como nos recursos, mas apenas cassa o ato atacado.
A reclamação tem natureza de remédio processual correcional, de função corregedora.
Ademais, o STF somente admite a reclamação nos casos de processos sem trânsito em julgado, ou seja, com recurso ainda pendente.
Agravo provido com a concessão de liminar.
HC N. 84.639-BA
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: HABEAS CORPUS. CRIME HEDIONDO. RECOLHIMENTO À PRISÃO PARA APELAR. AUSÊNCIA DE
CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PRESENTES OS FUNDAMENTOS DA PRISÃO PREVENTIVA. ORDEM DENEGADA.
Não viola o princípio da inocência nem constitui constrangimento ilegal a prisão de réu condenado por sentença recorrível, quando
presentes os fundamentos da segregação cautelar.
O decreto de prisão do paciente, devidamente fundamentado, lastreou-se no resguardo da ordem pública e na alta periculosidade do
agente, que está envolvido em diversos processos relacionados com o tráfico de entorpecentes.
Ordem denegada.
HC N. 84.935-GO
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: HABEAS CORPUS. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. ABORTO. EXTENSÃO A CODENUNCIADO. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DO CONTRADITÓRIO.
INOCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA.
A suspensão condicional do processo não é direito subjetivo do acusado; sua concessão é de competência exclusiva do Ministério
Público, sempre de maneira fundamentada (Súmula 696).
A inextensão do benefício ao co-denunciado pelo crime de aborto não viola os princípios do devido processo legal e do
contraditório, visto que se encontra devidamente motivada.
Ordem denegada.
QO EM Pet N. 2.705-SP
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: MEDIDA CAUTELAR INOMINADA - PRETENDIDA OUTORGA DE EFICÁCIA SUSPENSIVA A
RECURSO EXTRAORDINÁRIO JÁ ADMITIDO PELA PRESIDÊNCIA DO TRIBUNAL INFERIOR - PRESSUPOSTOS
NECESSÁRIOS AO ACOLHIMENTO DESSA POSTULAÇÃO CAUTELAR - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA DESNECESSIDADE DA CITAÇÃO DA PARTE REQUERIDA - INAPLICABILIDADE DO ART. 802 DO CPC - DECISÃO
REFERENDADA.
PRESSUPOSTOS ESSENCIAIS À OUTORGA DE EFICÁCIA SUSPENSIVA A RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
- A concessão de medida cautelar, pelo Supremo Tribunal Federal, quando requerida com o objetivo de atribuir eficácia
suspensiva a recurso extraordinário, exige, para viabilizar-se, a cumulativa observância dos seguintes pressupostos: (1)
instauração da jurisdição cautelar do Supremo Tribunal Federal, motivada pela existência de juízo positivo de admissibilidade
do recurso extraordinário, (2) viabilidade processual do recurso extraordinário, caracterizada, dentre outros requisitos, pelas
notas da tempestividade, do prequestionamento explícito da matéria constitucional e da ocorrência de ofensa direta e imediata ao
texto da Constituição, (3) plausibilidade jurídica da pretensão de direito material deduzida pela parte interessada e (4) ocorrência
de situação configuradora de “periculum in mora”. Precedentes (RTJ 174/437-438, v.g.). Hipótese em que foram satisfeitos, pela
parte requerente, todos os pressupostos necessários ao deferimento da medida cautelar.
MEDIDA CAUTELAR INOMINADA E DESCABIMENTO DA CITAÇÃO.
- A outorga de eficácia suspensiva a recurso extraordinário, em sede de procedimento cautelar, constitui provimento jurisdicional
que se exaure em si mesmo, não dependendo, por tal motivo, da ulterior efetivação do ato citatório, posto que incabível, em tal
hipótese, o oferecimento de contestação, eis que a providência cautelar em referência não guarda - enquanto mero incidente
peculiar ao julgamento do apelo extremo - qualquer vinculação com o litígio subjacente à causa.
- O procedimento cautelar, instaurado com o objetivo de conferir efeito suspensivo ao apelo extremo, rege-se, no Supremo
Tribunal Federal, por norma especial, de índole processual (RISTF, art. 21, V), que, por haver sido recebida, pela nova
Constituição da República, com força e eficácia de lei (RTJ 167/51), afasta a incidência - considerado o princípio da especialidade
- das regras gerais constantes do Código de Processo Civil (art. 796 e seguintes). Precedentes.
* noticiado no Informativo 279
Acórdãos Publicados: 241
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 389
Brasília, 23 a 27 de maio de 2005 Nº 389
Data (páginas internas): 1º de junho de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Decreto Expropriatório: Transmissão “Mortis Causa” e Partes Ideais
Decreto Expropriatório: Promitente Comprador e Legitimidade
Decreto Expropriatório: Morte de Cônjuge e Produtividade do Imóvel
Execução Provisória de Pena e Princípio da Presunção da Não-Culpabilidade
Remuneração dos Membros do Congresso Nacional e Teto
Reprovação no Estágio Probatório e Vitaliciedade - 3
1ª Turma
Prescrição e HC de Ofício
Revogação de Competência e Art. 25 do ADCT - 3
ICMS. Importação. Sujeito Ativo - 3
Adicional por Tempo de Serviço e Cartórios
2ª Turma
Crime Societário e Dispensa de Individualização da Conduta
Clipping do DJ
Transcrições
Ministério Público. Legitimidade. Ação Civil Pública. Mensalidades Escolares (RE
332545/SP)
ICMS. Importação. Sujeito Ativo (RE 268586/SP)
PLENÁRIO
Decreto Expropriatório: Transmissão Mortis Causa e Partes Ideais
O Tribunal retomou julgamento de mandado de segurança em que se pretende anular decreto
expropriatório de imóvel rural, sob a alegação de que este é explorado em condomínio, proveniente de
sucessão mortis causa, constituído por diversas partes ideais, cujas áreas não se qualificam,
individualmente, como grandes propriedades improdutivas passíveis de desapropriação. Na sessão de
10.3.2005, o Min. Gilmar Mendes, relator, concedeu o writ. Tendo em conta precedentes da Corte no
sentido de que, com o falecimento do proprietário, posto que já iniciado o processo administrativo de
desapropriação, há divisão tácita da propriedade entre os herdeiros, nos termos do § 6º do art. 46 da Lei
4.504/64 (Estatuto da Terra), entendeu que, na espécie, as frações ideais atribuíveis a cada condômino são
unidades autônomas, que se caracterizam como médias propriedades rurais, sendo, portanto, insuscetíveis
de desapropriação, para fins de reforma agrária, de acordo com o inciso I do art. 185 da CF, a despeito de
não terem sido individualizadas no Sistema de Cadastro Nacional nem no respectivo Cartório de Registro
de Imóveis. Nesta assentada, o Min. Eros Grau, em voto-vista, divergiu, para denegar a ordem, no que foi
acompanhado pelos Ministros Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Cezar Peluso. Reiterando os fundamentos
que expôs em seu voto no julgamento do MS 24924/DF (v. Informativos 367 e 379), considerou
inaplicável o § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra, haja vista que a finalidade desse preceito, quanto à
expressão “para os fins desta Lei”, é a de instrumentar o cálculo do coeficiente de progressividade do
Imposto Territorial Rural - ITR, a fim de evitar a solidariedade passiva dos condôminos no pagamento do
tributo, não servindo, dessa forma, de parâmetro para dimensionamento de imóveis rurais destinados à
reforma agrária, matéria afeta à Lei 8.629/93. Ressaltou, ainda, a necessidade de se interpretar o art. 1.784
em conjunto com o disposto no art. 1.791 e seu parágrafo único, ambos do CC, concluindo que a saisine
somente torna múltipla a titularidade do imóvel, o qual permanece, do ponto objetivo, uma única
propriedade até a partilha, unidade que não pode ser afastada quando da apuração da área do imóvel para
fins de reforma agrária, razão por que não se pode tomar cada parte ideal como propriedade distinta.
Salientou, por fim, que somente o registro do imóvel no cartório competente prova a titularidade do
domínio (art. 252 da Lei 6.015/73, na redação conferida pela Lei 6.216/75), o que não efetuado no caso,
inexistindo qualquer elemento capaz de assegurar que o imóvel em questão seja um conjunto de médias
propriedades rurais. Após, pediu vista dos autos o Min. Marco Aurélio.
MS 24573/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 25.5.2005. (MS-24573)
Decreto Expropriatório: Promitente Comprador e Legitimidade
O Tribunal iniciou julgamento de agravo regimental em mandado de segurança impetrado contra ato
do Presidente da República, que, por meio de decreto, declarara de interesse social, para fins de reforma
agrária, imóvel rural. O Min. Joaquim Barbosa, relator, preliminarmente, manteve a decisão agravada no
sentido de não conhecer do mandamus, por entender que o impetrante, promitente comprador do imóvel
em questão, não é parte legítima para defender, em juízo, em nome próprio, propriedade que ainda não
lhe pertence. Asseverou que, por parte do promitente comprador, poderá haver, se for o caso, o direito de
sub-rogação no preço apurado com a desapropriação, mas não o direito de obstar diretamente o
procedimento expropriatório. Acrescentou que a alteração promovida no novo Código Civil (art. 1.417)
confere ao promitente comprador apenas o direito real à aquisição do imóvel, e não sua propriedade. No
mérito, negou provimento ao recurso, por não vislumbrar, na espécie, direito líquido e certo do
impetrante, porquanto as apontadas irregularidades, consistentes na falta de notificação do impetrante e da
proprietária do imóvel, são afastadas pelas provas constantes dos autos, segundo as quais ambos foram
notificados em tempo hábil a exercerem devidamente sua defesa e acompanhar os trabalhos da vistoria
realizada. O julgamento foi suspenso com o pedido de vista do Min. Carlos Britto.
MS 24908 AgR/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 25.5.2005. (MS-24908)
Decreto Expropriatório: Morte de Cônjuge e Produtividade do Imóvel
A morte de cônjuge ou de parentes é evento natural que não configura caso fortuito ou de força
maior, e não justifica o baixo nível de produtividade do imóvel, nos termos do disposto no § 7º do art. 6º
da Lei 8.629/93. Com base nesse entendimento, o Plenário indeferiu mandado de segurança em que se
pretendia a anulação de decreto expropriatório de imóvel rural do impetrante, sob a alegação de
ocorrência de motivo fortuito ou de força maior, em razão do falecimento de sua mulher, o que o teria
impedido, devido à instabilidade emocional e financeira, de manter o índice do grau de eficiência e
produtividade do imóvel. Asseverou, ademais, que a questão referente à produtividade de imóvel rural
seria controvertida, a demandar dilação probatória, o que é defeso na via eleita. Precedentes citados: MS
24441/DF (DJU de 6.8.2004) e MS 24518/DF (DJU de 30.4.2004).
MS 24442/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 25.5.2005. (MS-24442)
Execução Provisória de Pena e Princípio da Presunção da Não-Culpabilidade
O Tribunal iniciou julgamento de habeas corpus, afetado ao Pleno pela 1ª Turma, impetrado contra
decisão do STJ, que denegara igual medida, em que se pretendia a suspensão do recolhimento imediato
do paciente à prisão e o reconhecimento do seu direito de aguardar o julgamento de recursos futuros em
liberdade. Na espécie, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por maioria, negara provimento à
apelação do paciente, mantendo a sentença, com expedição de mandado de prisão, que o condenara, pela
prática de uma série de crimes, às penas de reclusão, em regime fechado, e de detenção, em regime semiaberto, tendo a divergência de votos se restringido à quantificação da pena imposta a um dos crimes e ao
regime de cumprimento de outro. O Min. Sepúlveda Pertence, relator, concedeu a ordem, por entender
que a prisão fundada em decisão condenatória recorrível, quando não motivada em razões de ordem
cautelar, substantiva execução provisória de pena não definitivamente aplicada, em ofensa ao princípio da
presunção de não-culpabilidade (CF, art. 5º, LVII). Após, pediu vista dos autos a Min. Ellen Gracie. O
Tribunal, por unanimidade, deliberou conceder a liberdade provisória ao paciente até a decisão final do
writ.
HC 85591/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 25.5.2005. (HC-85591)
Remuneração dos Membros do Congresso Nacional e Teto
Denegado, por maioria, mandado de segurança impetrado por ex-deputado contra ato conjunto das
Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, que fixou subsídios dos membros do Congresso
Nacional, tendo em conta o disposto no § 2º do art. 1º do Decreto Legislativo 444/2002 (“Art. 1° Até que
seja aprovada a lei de iniciativa conjunta de que trata o art. 48, XV, da Constituição Federal, a
remuneração dos Membros do Congresso Nacional corresponderá à maior remuneração percebida, a
qualquer título, por Ministro do Supremo Tribunal Federal, incluídas as relativas ao exercício de outras
atribuições constitucionais, e se constituirá de subsídio fixo, variável e adicional. ... § 2° As Mesas do
Senado Federal e da Câmara dos Deputados regularão, em ato conjunto, a aplicação deste Decreto
Legislativo.”). Sustentava o impetrante ofensa ao caput do art. 1º do referido decreto, por não terem sido
incluídas, no cálculo de sua pensão, as parcelas relativas ao exercício de outras atribuições
constitucionais, em especial o “jeton”, pago aos Ministros do STF que atuam perante o TSE. Considerouse o que previsto no § 1º do art. 1º da Lei 10.474/2002 que, dispondo sobre a remuneração da
magistratura da União, ressalva — assim como o faz a Resolução 236/STF — que “para os fins de
quaisquer limites remuneratórios, não se incluem no cômputo da remuneração as parcelas percebidas...
por Ministro do Supremo Tribunal Federal em razão de tempo de serviço ou de exercício temporário de
cargo no Tribunal Superior Eleitoral.”. Vencido integralmente o Min. Marco Aurélio, relator, que
concedia a ordem e, em parte, o Min. Sepúlveda Pertence, que a deferia apenas para incluir os valores
referentes ao pagamento da gratificação eleitoral, excluído do cálculo o adicional de tempo de serviço.
MS 24527/SP, rel. Min. Marco Aurélio, rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, 25.5.2005. (MS24527)
Reprovação no Estágio Probatório e Vitaliciedade - 3
O Tribunal retomou julgamento de mandado de segurança no qual se pretende anular ato do
Procurador-Geral da República que determinara a exoneração de Procuradora do Ministério Público do
Trabalho, em razão de sua reprovação no estágio probatório, sob a alegação de a impetrante já ter
adquirido vitaliciedade no cargo à época da exoneração, bem como pela existência de irregularidades na
conversão do inquérito administrativo instaurado para a apuração de infração disciplinar em avaliação de
estágio probatório — v. Informativos 326 e 337. A Min. Ellen Gracie, relatora, aditou seu voto e manteve
o indeferimento do writ, rebatendo os fundamentos pelos quais o Min. Joaquim Barbosa, em voto-vista,
deferira a segurança. Salientando a previsão do inquérito administrativo para apuração de falta funcional
tanto no art. 247 da LC 75/93, quanto no art. 11, da Resolução 006/94 (que estabelece procedimento para
avaliar o cumprimento de estágio probatório dos membros do Ministério Público do Trabalho), entendeu
não configurar ofensa ao princípio da ampla defesa o seu aproveitamento no procedimento de avaliação
do estágio probatório, afirmando que, na espécie, o inquérito continha elementos justificadores da
proposta do Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho pela exoneração da impetrante por não
ter cumprido as condições exigidas para aprovação em estágio probatório, sendo, dessa forma,
desnecessária e inútil a abertura do novo processo administrativo para colher os mesmos dados que
levariam à conclusão de que a conduta pessoal e pública da impetrante em estágio probatório não a
recomendava para integrar a carreira. Asseverou, também, que a impetrante exerceu devidamente seu
direito de defesa, conforme razões apresentadas tanto por ela como por seus advogados, e que a decisão
de exoneração foi colegiada, não do chefe imediato da estagiária. Ressaltou, ainda, que não há norma que
determine que a sessão administrativa para avaliação de estágio probatório seja aberta, nem que haja
sustentação oral. Por fim, afastou o argumento de que houvera conspiração contra a impetrante por parte
de toda alta cúpula da instituição, já que ele, além de ser contrário ao que se depreende da leitura do
procedimento administrativo em questão, demandaria inviável revolvimento de fatos e provas. Após,
pediu vista dos autos o Min. Gilmar Mendes. (Resolução 006/94, Art. 11: “A qualquer tempo, durante o
estágio probatório, o Corregedor-Geral poderá instaurar inquérito administrativo, visando apuração de
falta disciplinar, bem como, propor ao Conselho Superior a exoneração de membro do Ministério
Público do Trabalho que não cumprir as condições do estágio probatório.”).
MS 23441/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 25.5.2005. (MS-23441)
PRIMEIRA TURMA
Prescrição e HC de Ofício
Verificada a prescrição, ainda que o recurso seja intempestivo, cabe deferimento de habeas corpus
de ofício. Com base nesse entendimento, a Turma, resolvendo questão de ordem, não conheceu do agravo
de instrumento interposto por condenado pela prática dos crimes previstos nos arts. 129, caput, e 147,
ambos do CP e no art. 311 do Código de Trânsito Brasileiro - CTB, mas, de ofício, concedeu habeas
corpus para declarar a prescrição, nos termos dos arts. 110, §§ 1ºe 2º; e 109, VI, ambos do CP, com
relação apenas ao delito do art. 311 do CTB. No caso, o ora agravante objetivava, em recurso
extraordinário inadmitido, o reconhecimento da absorção do crime tipificado no art. 311 do CTB pelo de
lesão corporal ao argumento de contrariedade ao art. 5º, LIV e LV, da CF, bem como alegava violação ao
art. 93, IX, da CF, por ausência de fundamentação do acórdão recorrido quanto a suposta majoração das
penas aplicadas.
AI 544607 QO/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 24.5.2005. (AI-544607)
Revogação de Competência e Art. 25 do ADCT - 3
A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário, interposto por instituição financeira, em
que se pretendia a desconstituição de acórdão que, embora reconhecendo não ser auto-aplicável o § 3º do
art. 192 da CF, determinara a redução de juros ao montante de 12% ao ano, consoante disposto no
Decreto 22.626/33, por entender revogada, pelo art. 25 do ADCT, a Lei 4.595/64, na parte em que
outorga poderes ao Conselho Monetário Nacional para dispor sobre as taxas de juros bancários, razão
pela qual o mencionado decreto teria voltado a viger em sua integralidade — v. Informativos 381 e 386.
Por maioria, deu-se provimento ao recurso para determinar que o Tribunal a quo reaprecie a questão dos
juros com base nas normas aplicáveis nas resoluções e circulares baixadas pelo Banco Central e vigentes
na data da celebração do negócio jurídico. Entendeu-se não haver que se falar em revogação dessa lei,
haja vista que, conforme se depreende da redação do art. 25 do ADCT, o objeto da revogação, quando
ultrapassado o prazo de 180 dias da promulgação da CF, é a competência atribuída ou delegada a órgão
do Poder Executivo pela legislação pré-constitucional e não as normas editadas quando vigente a
delegação. Concluiu-se que as normas objeto dessa ação são válidas, já que editadas dentro do prazo
previsto na norma transitória, quando o Poder Executivo possuía competência para dispor sobre
instituições financeiras e suas operações, sendo indiferente, para sua observância, ter ou não havido a
prorrogação prevista no art. 25 do ADCT. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto que
negavam provimento ao recurso, por considerar que esta delegação conflita com o art. 25 do ADCT,
porquanto ausente de razoabilidade a prorrogação sucessiva de leis elastecendo um prazo de 180 dias de
forma indeterminada.
RE 286963/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 24.5.2005. (RE-286963)
ICMS. Importação. Sujeito Ativo - 3
A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário no qual se discutia a competência tributária
quanto ao sujeito ativo do ICMS na hipótese de importação. Tratava-se, na espécie, de recurso interposto
contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo que entendera ser este Estado o beneficiário do ICMS,
haja vista ter sido nele processado o desembaraço da mercadoria — v. Informativos 366 e 375. Por
maioria, negou-se provimento ao recurso por se entender que o sujeito ativo da relação tributária é o
Estado de São Paulo, uma vez que, em se tratando de operação iniciada no exterior, o credor do tributo é
aquele no qual situado o porto em que recebidas as mercadorias, ficando mitigada a referência a
estabelecimento destinatário. Asseverou-se, ainda, que, na espécie, a mercadoria apenas circulara no
Estado de São Paulo, nunca tendo ingressado no Estado do Espírito Santo. Ressaltou-se, também, o
caráter fraudulento, com fins de burlar o Fisco, do acordo entabulado entre a recorrente e a importadora,
beneficiária de vantagens fiscais (Sistema FUNDAP), segundo o qual esta “figuraria nas operações de
importação como consignatária,... vindo a ser reembolsada em tudo..., inclusive tributos,... ficando a
cargo da ora recorrente a definição das mercadorias”. Vencido o Min. Carlos Britto, que dava
provimento ao recurso por considerar que o sujeito ativo da relação tributária seria o Estado do Espírito
Santo, Estado em que estaria localizado o sujeito passivo do tributo, qual seja, aquele que promovera
juridicamente o ingresso do produto (importador). Leia o inteiro teor do voto do relator na seção
Transcrições deste Informativo.
RE 268586/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 24.5.2005. (RE-268586)
Adicional por Tempo de Serviço e Cartórios
A Turma manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo que, com base em lei
estadual, reconhecera o direito à contagem do tempo de serviço em que o recorrido, serventuário de
justiça, trabalhara em cartório não-oficializado, para efeito de gratificação de adicional de tempo de
serviço. Entendeu-se que o art. 236 da CF, que prevê o caráter privado dos serviços notariais e de registro,
não impede que a lei local estabeleça, para efeito de adicional por tempo de serviço, o cômputo do tempo
de serviço prestado em cartório não-oficializado. Precedente citado: RE 245171/ES (DJU de 20.10.2000).
RE 235623/ES, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 24.5.2005. (RE-235623)
SEGUNDA TURMA
Crime Societário e Dispensa de Individualização da Conduta
A Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia a declaração de nulidade de processo
criminal, desde o início, pelo qual o paciente fora condenado pela prática de crime contra a ordem
econômica, previsto no art. 1º, I, II e IV da Lei 8.137/90, c/c os arts. 29 e 71 do CP, consubstanciado na
utilização, como sócio-administrador de empresa, de artifícios fraudulentos, para o fim de eximir-se ou
reduzir pagamento de tributos e contribuições federais. A impetração alegava inépcia da denúncia, sob o
argumento de que a conduta do paciente não fora nela descrita pormenorizadamente, o que ofenderia o
princípio do devido processo legal e, por conseguinte, caracterizaria constrangimento ilegal. Por entender
que a necessidade do estabelecimento do vínculo de cada sócio ou gerente ao ato ilícito que lhe é
imputado somente se faz obrigatória nas circunstâncias em que, de plano, as responsabilidades de cada
um dos sócios ou gerentes são diferenciadas em razão do próprio contrato social relativo ao registro da
pessoa jurídica envolvida, e considerando que, na época dos fatos, a empresa era administrada em iguais
condições pelos denunciados, concluiu-se não haver razão jurídica para o detalhamento pela denúncia da
conduta atribuível a cada um dos sócios, diante do que preconiza o art. 41 do CP (“A denúncia ou queixa
conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou
esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol
das testemunhas.”).
HC 85579/MA, rel. Min. Gilmar Mendes, 24.5.2005. (HC-85579)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
25.5.2005
24.5.2005
24.5.2005
Extraordinárias
——
——
——
Julgamentos
9
678
151
CLIPPING
DO
DJ
27 de maio de 2005
AG. REG. NA Rcl N. 909-DF
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. NELSON JOBIM
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO. POSSIBILIDADE DE INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO.
CABIMENTO DA RECLAMAÇÃO. EFICÁCIA DA DECISÃO CONCESSIVA DE LIMINAR NA ADC 4.
No julgamento da ADC 4 restou assentada que a decisão que concede medida cautelar em sede de ação declaratória de
constitucionalidade é investida da mesma eficácia contra todos e efeito vinculante, características da decisão de mérito.
A reclamação e o agravo do art. 522 do CPC não são procedimentos idênticos, mas recursos ou remédios com diferentes efeitos e
diversas razões.
A reclamação visa preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões, motivo pelo qual a decisão proferida
em reclamação não substitui a decisão recorrida como nos recursos, mas apenas cassa o ato atacado.
A reclamação tem natureza de remédio processual correcional, de função corregedora.
Ademais, o STF somente admite a reclamação nos casos de processos sem trânsito em julgado, ou seja, com recurso ainda pendente.
Agravo provido com a concessão de liminar.
RE N. 353.595-TO
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
APOSENTADORIA - INVALIDEZ - PROVENTOS - MOLÉSTIA GRAVE. O direito aos proventos integrais pressupõe lei em que
especificada a doença. Precedente: Recurso Extraordinário nº 175.980-1/SP, Segunda Turma, relator ministro Carlos Velloso, Diário
da Justiça de 20 de fevereiro de 1998, Ementário nº 1.899-3.
* noticiado no Informativo 368
RE N. 427.339-GO
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Contraditório e ampla defesa: art. 5º, LV, da Constituição: conteúdo mínimo.
A garantia constitucional da ampla defesa (CF, art. 5º, LV) tem, por força direta da Constituição, um conteúdo mínimo essencial,
que independe da interpretação da lei ordinária que a discipline (RE 255.397, 1ª T., Pertence, DJ 07.05.2004).
II. Recurso extraordinário: improcedência das alegações de violação à garantia da ampla defesa: desprovimento.
1. Alegação de que a defesa não teve tempo hábil para estudar os autos corretamente afastada pelo acórdão, em face das
peculiaridades do caso.
2. Substituição de testemunhas da acusação: pedido justificado: decisão recorrida suficientemente motivada: ausência de violação do
art. 93, IX, da Constituição.
3. Júri: inquirição de testemunhas: não se computa como testemunha a ser inquirida no plenário, a leitura de depoimento prestado
anteriormente.
4. Júri: falta de intimação de uma das testemunhas arroladas pela defesa, residente fora da Comarca, para depor em Plenário:
nulidade que, acaso existente, para ela concorreu a defesa.
III. Individualização da pena: constrangimento ilegal: habeas corpus de ofício.
1. Ausência de constrangimento ilegal na consideração do fato de o recorrente estar respondendo a outros processos, o que, segundo
a jurisprudência da Corte, configura maus antecedentes, circunstância não considerada em nenhum outro momento da fixação da
pena.
2. Manifesto constrangimento, contudo, decorrente da ilegalidade da majoração da pena-base pela culpabilidade considerada
“incisiva”, sob o fundamento de que o recorrente era “plenamente imputável, cônscio da reprovabilidade de sua conduta, sendo que
outra lhe era exigida”, pressupostos do elemento subjetivo do crime.
3.Concessão de habeas corpus de ofício, para que o Tribunal a quo proceda a nova fixação da pena, reduzindo-a, como entender de
direito.
RE N. 451.409-MA
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Recurso extraordinário: descabimento: falta de prequestionamento da matéria constitucional suscitada no RE,
exigível, segundo o entendimento do STF, também nas hipóteses em que a pretendida contrariedade ao texto constitucional tenha
surgido na própria decisão recorrida: incidência das Súmulas 282 e 356.
II. Recurso extraordinário, requisitos específicos e habeas corpus de ofício.
Em recurso extraordinário criminal, perde relevo a inadmissibilidade do RE da defesa, por falta de prequestionamento e outros
vícios formais, se, não obstante - evidenciando-se a lesão ou a ameaça à liberdade de locomoção - seja possível a concessão de
habeas-corpus de ofício (v.g. RE 273.363, 1ª T., Sepúlveda Pertence, DJ 20.10.2000).
III. Contraditório e ampla defesa (CF, art. 5º, LV).
Inequívoco cerceamento do direito de defesa pela falta de intimação da Defesa para apresentar contra-razões à apelação do
Ministério Público, que foi provido para agravar a situação do réu.
RHC N. 85.026-SP
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: HABEAS CORPUS. PRISÃO PROVISÓRIA. CONTAGEM PARA EFEITO DA PRESCRIÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE.
O tempo de prisão provisória não pode ser computado para efeito da prescrição, mas tão-somente para o cálculo de liquidação da
Pena. O artigo 113 do Código Penal, por não comportar interpretação extensiva nem analógica, restringe-se aos casos de evasão e de
revogação do livramento condicional.
Ordem denegada.
* noticiado no Informativo 385
HC N. 84.768-PE
RELATOR P/ ACÓRDÃO: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: HABEAS CORPUS. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECEBIMENTO DE DENÚNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA QUANTO AO CRIME DE ROUBO.
1 - A técnica da denúncia (art. 41 do Código de Processo Penal) tem merecido reflexão no plano da dogmática constitucional,
associada especialmente ao direito de defesa. Precedentes.
2 - Denúncias genéricas, que não descrevem os fatos na sua devida conformação, não se coadunam com os postulados básicos do
Estado de Direito. Violação também do princípio da dignidade da pessoa humana.
3 - A denúncia sob exame utiliza-se de um silogismo de feição fortemente artificial para indicar o paciente como autor intelectual do
roubo. A decisão Superior Tribunal de Justiça pelo recebimento da denúncia nada acrescentou em relação ao crime de roubo.
4 - Deferimento da ordem para anular a denúncia quanto à atribuição ao paciente da conduta prevista no art. 157 do Código Penal,
ressalvados os votos vencidos da Min. Ellen Gracie e do Min. Joaquim Barbosa.
HC N. 84.974-SP
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: 1. Habeas Corpus. 2. Condenação pela prática de crime de roubo tipificado no art. 157, § 2º, I e II do Código Penal 3.
Regime inicial fechado. 4. Alegação de incompatibilidade entre o regime fixado e a pena imposta. 5. A periculosidade do agente, a
gravidade do delito e as circunstâncias de sua prática justificam a reprimenda mais severa. 6. Inaplicabilidade das Súmulas nos 718 e
719 do STF. 7. Ordem denegada.
* noticiado no Informativo 374
RE N. 212.285-PR
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Juros moratórios entre a data da expedição e a do efetivo pagamento do precatório judicial.
Não-incidência. Precedentes. 3. Recurso extraordinário a que se dá provimento.
Acórdãos Publicados: 229
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Ministério Público. Legitimidade. Ação Civil Pública. Mensalidades Escolares (Transcrições)
RE 332545/SP*
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário fundado no art. 102, III, “a”, da Constituição Federal, contra acórdão que entendeu
que o Ministério Público não tem legitimidade para propor ação civil pública sobre mensalidades escolares.
O acórdão ficou assim ementado:
“Ilegitimidade ‘ad causam’ - Ação civil pública - Ministério Público - Mensalidades escolares - Impossibilidade do
uso da ação civil pública, em juízo, para a defesa de interesses de pequenos grupos determinados, em razão de danos
variáveis e divisíveis - Hipótese de prestação de serviços, de caráter patrimonial e privado, disciplinados por uma relação
exclusivamente contratual - Ausência de conversão da escola particular em ente público pelo fato de desempenhar relevante
missão social - Incompetência do Ministério Público na substituição dos indivíduos na esfera de seus direitos - Ilegitimidade
caracterizada - Recurso improvido.” (fls. 373)
Alega-se violação aos arts. 127, caput, 129, III e IX, 205 e 209, da Carta Magna.
O acórdão recorrido extraordinariamente não está em consonância com a jurisprudência desta Corte, conforme se depreende
do julgamento do RE 163.231, Plenário, Rel. Maurício Corrêa, DJ 29.06.01:
“EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E HOMOGÊNEOS.
MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO.
1. A Constituição Federal confere relevo ao Ministério Público como instituição permanente, essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis (CF, art. 127).
2. Por isso mesmo detém o Ministério Público capacidade postulatória, não só para a abertura do inquérito civil, da
ação penal pública e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, mas também
de outros interesses difusos e coletivos (CF, art. 129, I e III).
3. Interesses difusos são aqueles que abrangem número indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas
circunstâncias de fato e coletivos aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis, ligadas
entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.
3.1. A indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos e a determinidade a daqueles interesses
que envolvem os coletivos.
4.
Direitos ou interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei n° 8.078, de 11
de setembro de 1990), constituindo-se em subespécie de direitos coletivos.
4.1.Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão
cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou
classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais
para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses
grupos, categorias ou classe de pessoas.
5. As chamadas mensalidades escolares, quando abusivas ou ilegais, podem ser impugnadas por via de ação civil
pública, a requerimento do Órgão do Ministério Público, pois ainda que sejam interesses homogêneos de origem comum,
são subespécies de interesses coletivos, tutelados pelo Estado por esse meio processual como dispõe o artigo 129, inciso III,
da Constituição Federal.
5.1.Cuidando-se de tema ligado à educação, amparada constitucionalmente como dever do Estado e obrigação de
todos (CF, art. 205), está o Ministério Público investido da capacidade postulatória, patente a legitimidade ad causam,
quando o bem que se busca resguardar se insere na órbita dos interesses coletivos, em segmento de extrema delicadeza e de
conteúdo social tal que, acima de tudo, recomenda-se o abrigo estatal.
Recurso extraordinário conhecido e provido para, afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas
à defesa dos interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no
julgamento da ação.”
Assim, conheço e dou provimento ao recurso (art. 557, § 1o-A, do CPC), para afastar a alegada ilegitimidade do Ministério
Público Estadual.
Publique-se.
Brasília, 06 de maio de 2005.
Ministro GILMAR MENDES
Relator
* decisão pendente de publicação
ICMS. Importação. Sujeito Ativo (Transcrições)
(v. Informativo 375)
RE 268.586/SP*
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
RELATÓRIO: O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou acolhida a pedido formulado em apelação, ante fundamentos
assim sintetizados (folha 381):
Ação anulatória – Débito tributário – Auto de infração – Falta de recolhimento do ICMS – Recebimento de
mercadorias importadas por empresa sediada em outro Estado – Decreto de improcedência confirmado – Recurso não
provido.
Os embargos de declaração que se seguiram foram desprovidos pelo Colegiado (folha 403 à 405).
No extraordinário de folha 408 a 427, interposto com alegada base na alínea “a” do permissivo constitucional, a contribuinte
articula com a transgressão do artigo 155, § 2º, inciso IX, alínea “a”, da Carta Política da República. Ressalta já haver esta Corte
decidido que o fato gerador do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços na importação de mercadorias dá-se na ocasião
do desembaraço aduaneiro, a ser recolhido pelo importador. Dessa forma, procura demonstrar não ser responsável pelo recolhimento
do imposto, que já teria sido pago pela empresa Oceania, importadora dos produtos, sediada no Estado do Espírito Santo. Assegura
que, na espécie, ocorreram duas operações: a de importação dos bens pela Oceania e, posteriormente, a de transferência destes bens
ao estabelecimento da recorrente. Aduz que o fato gerador da exação deu-se no desembaraço aduaneiro e, “na condição de sujeito
passivo e destinatário das mercadorias, de acordo com o preceito da Carta Magna, a empresa Oceania recolheu o ICMS para o
Estado em que se localiza seu estabelecimento, qual seja, o Estado do Espírito Santo. Assim, não há que se falar em exigência de
imposto pela Fazenda Pública do Estado de São Paulo” (folha 414). Registra que a importadora é beneficiária do sistema FUNDAP,
usufruindo de benefícios fiscais previstos em lei e que “embora as mercadorias tenham sido desembaraçadas no Porto de Santos e
seguido diretamente para o estabelecimento da recorrente, sem haver transitado pelo estabelecimento da importadora, a importação
foi realizada pela empresa Oceania que adquiriu a disponibilidade das mercadorias quando do seu desembaraço aduaneiro e em
seguida as remeteu ao estabelecimento da recorrente” (folha 416). Discorre, longamente, sobre a controvérsia, referindo-se a
precedentes jurisprudenciais e a ensinamentos doutrinários.
O Estado de São Paulo apresentou as contra-razões de folha 564 a 573, nas quais evoca o Verbete nº 279 da Súmula desta
Corte e defende o acerto da conclusão adotada pelo Tribunal de origem.
O procedimento atinente ao juízo primeiro de admissibilidade encontra-se à folha 586 à 589.
Registro que o especial simultaneamente interposto teve o trânsito obstado na origem, seguindo-se a protocolação de agravo,
desprovido no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (folha 588 a 601).
A Procuradoria Geral da República, no parecer de folha 607 a 609, preconiza o não-conhecimento do recurso. Eis o resumo
da peça:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO – TRIBUTÁRIO – ICMS – Mercadoria importada do exterior – Fato gerador –
Alegação de contrariedade ao art. 155, § 2º, inciso IX, alínea “a”, da CF/88 – Matéria de prova – Aplicação (sic) do
Enunciado da Súmula 279/STF – Ofensa reflexa – Parecer pelo não-conhecimento do recurso.
É o relatório.
VOTO: Na interposição deste recurso, foram observados os pressupostos gerais de recorribilidade. Os documentos de folhas 10 e
488 evidenciam a regularidade da representação processual e do preparo. Quanto à oportunidade, a decisão impugnada teve notícia
veiculada no Diário de 8 de setembro de 1998, terça-feira (folha 406), ocorrendo a manifestação do inconformismo em 23 imediato,
quarta-feira (folha 408), no prazo assinado em lei.
Examino, então, o tema de fundo, a implicar o conhecimento, em si, do recurso e o posterior provimento ou desprovimento.
Eis a verdade formal, incontroversa a esta altura, segundo os parâmetros objetivos do acórdão prolatado pela Corte de origem, da
lavra proficiente do desembargador Márcio Bonilha:
a) nas guias de importação, consta como importadora a Sociedade Comercial Oceania;
b) a empresa importadora mantinha, com a ora recorrente, “acordo comercial FUNDAP”, figurando como consignatária;
c) a importadora promoveu o desembaraço das mercadorias, recolhendo os tributos devidos;
d) o ICMS foi pago ao Estado do Espírito Santo;
e) o desembaraço aduaneiro realizou-se no Porto de Santos;
f) na nota fiscal, a importadora debitou o ICMS;
g) a recorrente promoveu o crédito, visando a compensar o imposto devido no Estado de São Paulo na posterior venda dos
produtos;
h) as mercadorias importadas não entraram fisicamente no estabelecimento importador;
i)
as mercadorias importadas não transitaram no Estado do Espírito Santo;
j)
ao desembaraço alfandegário, no Porto de Santos, seguiu-se a entrada das mercadorias diretamente no
estabelecimento da recorrente, situado no Estado de São Paulo.
Então, concluiu o Tribunal de origem que o tributo deveria ter sido recolhido aos cofres do Estado de São Paulo, pouco
significando a circunstância de a sociedade importadora contar com estabelecimento no Estado do Espírito Santo, onde desfruta
vantagens fiscais e financeiras, considerado o sistema FUNDAP. Proclamou a Corte competir à unidade da Federação em que
processado o desembaraço da mercadoria cobrar o tributo, aludindo à circulação com aquisição e entrada no estabelecimento situado
no próprio território da Unidade.
Poucas vezes defrontei-me com processo a revelar drible maior ao Fisco. O acordo comercial FUNDAP, formalizado entre a
importadora e a ora recorrente, é pródigo na construção de ficções jurídicas para chegar-se à mitigação do ônus tributário, isso em
vista do fato de a importadora encontrar-se cadastrada no sistema FUNDAP, tendo jus, por isso, a vantagens fiscais. No acordo,
previu-se que a importadora figuraria nas operações de importação dele objeto como consignatária, o que implica dizer que não
atuaria como senhora, em si, de importação de mercadorias para posterior venda, mas como simples intermediária, vindo a ser
reembolsada em tudo o que despendesse, inclusive tributos, frete, armazenagem, desembaraço aduaneiro e demais despesas
pertinentes à operação, ficando a cargo da ora recorrente a definição das mercadorias, alfim, entabular o negócio jurídico no
exterior, com fixação de preço. Onde a lealdade aos princípios básicos à vida democrática, aos princípios assentados na Lei Maior?
A toda evidência, tem-se quadro escancarado de simulação.
Nada obstante, examinemos também o caso à luz do que se contém na própria Carta da República, deixando
momentaneamente em segundo plano os vícios de vontade estampados no acordo firmado, a manobra em que potencializado o
desejo de lograr vantagens fiscais, em detrimento do interesse geral. O alcance do artigo 155, § 2º, inciso IX, alínea “a”, da
Constituição Federal foi elucidado pelo Plenário em julgamentos ocorridos em 23 de outubro de 1996: Recurso Extraordinário nº
144.660-9/RJ, do qual fui relator, havendo sido designado para redigir o acórdão o ministro Ilmar Galvão – Diário da Justiça de 21
de novembro de 1997; Recurso Extraordinário nº 192.711-9/SP, tendo como relator o ministro Ilmar Galvão – Diário da Justiça de
18 de abril de 1997 - e Recurso Extraordinário nº 193.817-0/RJ, também relatado pelo ministro Ilmar Galvão – Diário da Justiça de
10 de agosto de 2001. Então, a Corte apontou como fato gerador do tributo, revelando-o devido nesse momento, o despacho
aduaneiro e, em interpretação sistemática do regime da Carta anterior e do regime da atual, entendeu como sujeito ativo do tributo
aquele no qual situado o porto em que recebidas as mercadorias, em que realizado o despacho aduaneiro. Procedeu-se à análise da
Emenda Constitucional nº 23/83, que acrescentou o § 11 ao artigo 23 da Carta anterior:
“§ 11. O imposto a que se refere o item II” - ICM – “incidirá, também, sobre a entrada em estabelecimento
comercial, industrial ou produtor, de mercadoria importada do exterior por seu titular, inclusive quando se tratar de bens
destinados a consumo ou ativo fixo do estabelecimento.”
Sob a égide desse texto, a Corte veio a editar o Verbete nº 577 da Súmula:
Na importação de mercadorias do exterior, o fato gerador do imposto de circulação de mercadorias ocorre no
momento de sua entrada no estabelecimento do importador.
Então, examinando a nova normatividade constitucional, o Plenário, na verve do relator, deixou assentado:
Desnecessário muito esforço interpretativo para concluir-se que a necessidade de definição do Estado competente
para a exigência do ICMS decorreu da alteração introduzida quanto ao elemento temporal referido ao fato gerador do
tributo, na hipótese em tela, que deixou de ser o momento da entrada da mercadoria no estabelecimento do importador para
ser o do recebimento da mercadoria importada.
Explicitou mais:
Com efeito, no sistema anterior, em que se tinha a obrigação tributária como surgida no momento da entrada no
estabelecimento do importador, não se fazia mister a alusão ao Estado credor, que não poderia ser outro senão o da
situação do estabelecimento. Antecipado o elemento temporal para o momento do recebimento da mercadoria, vale dizer, do
desembaraço, fez-se ela necessária, tendo em vista que a entrada da mercadoria, não raro, se dá em terminal portuário ou
aéreo situado fora dos limites do Estado de destino da mercadoria.
Consagrou a nova Carta, portanto, finalmente, a pretensão, de há muito perseguida pelos Estados, de verem
condicionado o desembaraço da mercadoria ou do bem importado ao recolhimento, não apenas dos tributos federais, mas
também do ICMS incidente sobre a operação.
É extremo de dúvida que, ante os precedentes mencionados, o Colegiado Maior decidiu ser credor do tributo o Estado onde
aportada a mercadoria, ficando mitigada a referência a estabelecimento destinatário. De qualquer forma, como já salientado, nota-se
quadro a estampar, a mais não poder, procedimento conflitante com o apego às balizas normativas regedoras da espécie, porque a
mercadoria apenas circulou no Estado de São Paulo, jamais havendo ingressado no Estado outorgante dos benefícios fiscais
percebidos pelo ajuste entre a ora recorrente e a importadora, alfim, em estabelecimento desta situado no Estado do Espírito Santo.
Cumpre, então, subscrever o que decidido pela Corte de origem, concluindo-se, assim, pelo desprovimento do recurso.
É como voto.
* acórdão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 390
Brasília, 30 de maio a 3 de junho de 2005 Nº 390
Data (páginas internas): 8 de junho de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Suspensão de Tutela Antecipada e Transferência de Serviços Públicos
ADPF e Conhecimento como ADI
Reclamação: Pena-Base e Dupla Valoração
Competência Originária do STF: Empresa Pública e Conflito Federativo - 2
Competência Originária do STF: Ato de Turma Recursal e § 2º do Art. 113 do CPC
Tribunal de Contas: Omissão na Criação de Cargos e Modelo Federal
Art. 118 da Lei 8.213/91 e Constitucionalidade
1ª Turma
Crime de Menor Potencial Ofensivo e Competência da Justiça Comum
Desclassificação de Infração para a Modalidade Culposa e Emendatio Libelli
2ª Turma
Princípio da Não-Culpabilidade e Maus Antecedentes
Convenção Coletiva e Política Salarial - 3
Convenção Coletiva e Política Salarial - 4
Intervenção do Estado no Domínio Econômico e Responsabilidade Civil
Concurso Público e Princípio da Isonomia - 2
Clipping do DJ
Transcrições
Competência Originária do STF: Empresa Pública e Conflito Federativo (ACO 765 QO/RJ)
PLENÁRIO
Suspensão de Tutela Antecipada e Transferência de Serviços Públicos
O Tribunal iniciou julgamento de agravo regimental interposto pelo Município de Petrolina - PE
contra decisão do Min. Nelson Jobim, Presidente, que suspendera a tutela antecipada deferida pelo
Tribunal de Justiça de Pernambuco, o qual determinara a imediata transferência dos serviços públicos de
água e esgoto ao Município, em razão do descumprimento do “Termo de Rescisão Amigável do Contrato
de Concessão” formalizado entre este, o Estado de Pernambuco e a COMPESA - Companhia
Pernambucana de Saneamento. O Min. Nelson Jobim, relator, negou provimento ao recurso. Salientando
o fundamento constitucional da causa, em razão de estar em debate a competência constitucional para
prestação de serviços de abastecimento de água e saneamento urbano (CF, art. 30, V), reiterou os
fundamentos da decisão agravada por entender que a tutela antecipatória deferida ocasiona grave lesão à
ordem e à saúde públicas, já que comprovado que o Município não possui infra-estrutura nem pessoal
qualificado para fornecimento dos referidos serviços. Ressaltou, ademais, que a suspensão da tutela não
traz prejuízos ao Município, pois a COMPESA, assim como presta os serviços, há cerca de 30 anos,
continuará atendendo à população até a solução da lide. O julgamento foi suspenso em virtude do pedido
de vista do Min. Eros Grau.
STA 26 AgR/PE, rel. Min. Nelson Jobim, 1º.6.2005. (STA-26)
ADPF e Conhecimento como ADI
Tendo em conta o caráter subsidiário da argüição de descumprimento de preceito fundamental ADPF, consubstanciado no § 1º do art. 4º da Lei 9.882/99, o Tribunal resolveu questão de ordem no
sentido de conhecer, como ação direta de inconstitucionalidade - ADI, a ADPF ajuizada pelo Governador
do Estado do Maranhão, em que se impugna a Portaria 156/2005, editada pela Secretária Executiva de
Estado da Fazenda do Pará, que estabeleceu, para fins de arrecadação do ICMS, novo boletim de preços
mínimos de mercado para os produtos que elenca em seu anexo único. Entendeu-se demonstrada a
impossibilidade de se conhecer da ação como ADPF, em razão da existência de outro meio eficaz para
impugnação da norma, qual seja, a ADI, porquanto o objeto do pedido principal é a declaração de
inconstitucionalidade de preceito autônomo por ofensa a dispositivos constitucionais, restando observados
os demais requisitos necessários à propositura da ação direta. Precedente citado: ADI 349 MC/DF (DJU
de 24.9.90).
ADPF 72 QO/PA, rel. Min. Ellen Gracie, 1º.6.2005. (ADPF-72)
Reclamação: Pena-Base e Dupla Valoração
O Plenário iniciou julgamento de reclamação, ajuizada contra sentença do Juízo da 3ª Vara Criminal
do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em que se alega ofensa à autoridade da decisão
proferida pelo STF no HC 81769/RJ (DJU de 13.9.2002), na qual se determinara que o juízo reclamado
proferisse nova sentença, desconsiderando, na fixação da pena-base, em face da dupla valoração da
mesma circunstância e da ofensa ao método trifásico, a causa especial de aumento da internacionalidade
do delito prevista no art. 18, I, da Lei 6.368/76 (“Art. 18. As penas dos crimes definidos nesta Lei serão
aumentadas de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços): I - no caso de tráfico com o exterior ou de extraterritorialidade da lei penal;”). Na espécie, o juízo a quo, ao fixar a pena-base em 6 anos na sentença
anulada, considerara que “as conseqüências do delito foram as piores possíveis, com repercussões, de
monta, em vários países estrangeiros”, e, em seguida, elevara a pena em 2/3, em razão da
internacionalidade do delito. Na nova sentença, apontando outras circunstâncias judiciais, mantivera a
pena-base anteriormente fixada, aumentando-a, novamente, em 2/3, com base no art. 18, I, da Lei
6.368/76. O Min. Gilmar Mendes, relator, julgou improcedente o pedido por entender que o juízo
reclamado adequou-se ao que decidido no HC 81769/RJ, haja vista que afastara o defeito da dupla
valoração ao excluir a internacionalidade do delito como circunstância judicial na fixação da pena-base,
mantendo, de forma devidamente fundamentada, o percentual de aumento de pena. Em divergência, o
Min. Sepúlveda Pertence votou pela procedência do pedido, por considerar que, eliminada uma
circunstância, a pena-base não poderia ser mantida, no que foi acompanhado pelos Ministros Eros Grau,
Joaquim Barbosa, Carlos Britto, Ellen Gracie e Celso de Mello. Após, pediu vista dos autos o Min. Marco
Aurélio.
Rcl 2636/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 1º.6.2005. (Rcl-2636)
Competência Originária do STF: Empresa Pública e Conflito Federativo - 2
O Tribunal, por maioria, resolveu questão de ordem, no sentido de reconhecer, com base na alínea f
do inciso I do art. 102 da CF, a competência do STF para o julgamento de ação cível originária proposta
pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT contra o Estado do Rio de Janeiro, em que se
pretende afastar a cobrança do IPVA, bem como as sanções decorrentes da inadimplência do tributo – v.
Informativo 382. Tendo em conta que, à vista do disposto no art. 6º do Decreto-lei 509/69, a ECT é
pessoa jurídica equiparada à Fazenda Pública, que explora serviço de competência da União (CF, art. 21,
X), devendo, por isso, ser a ela estendidos os mesmos privilégios concedidos aos entes estatais, e, ainda,
que seus bens pertencem à entidade mantenedora, entendeu-se, com base no voto do Min. Eros Grau, que
abriu divergência, que a discussão acerca da garantia constitucional da imunidade recíproca (CF, art. 150,
VI, a), a qual se assenta no princípio da federação, atrairia a competência originária do STF para julgar o
feito (CF: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição,
cabendo-lhe:... I - processar e julgar, originariamente:... f) as causas e os conflitos entre a União e os
Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da
administração indireta;”). Vencidos os Ministros Marco Aurélio, relator, e Carlos Velloso, que afastavam
essa competência. Leia o inteiro teor do voto vencedor na seção Transcrições deste Informativo.
ACO 765 QO/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 1º.6.2005. (ACO-765)
Competência Originária do STF: Ato de Turma Recursal e § 2º do Art. 113 do CPC
Com base na orientação fixada no MS 24691 QO/MG (j. em 4.12.2003, acórdão pendente de
publicação), no sentido de competir à turma recursal de juizado especial o julgamento de mandado de
segurança impetrado contra seus atos ou de seus integrantes, o Tribunal, por maioria, negou provimento a
agravo regimental interposto contra decisão que negara seguimento a mandado de segurança impetrado
contra ato da Turma Recursal do Juizado Especial Cível e Criminal de Sete Lagoas – MG. Salientou-se,
ademais, que, por força do disposto no § 1º do art. 21 do RISTF - Regimento Interno do STF, que atribui
ao relator a possibilidade de “arquivar” ou “negar seguimento” a pedido, na hipótese em que “for
evidente a sua incompetência”, não se aplicaria, ante a especialidade desta norma, o previsto na parte
final do § 2º do art. 113 do CPC (“§ 2º Declarada a incompetência absoluta, somente os atos decisórios
serão nulos, remetendo-se os autos ao juiz competente”), sob pena de a Corte deliberar, de modo
definitivo, sobre a competência de outros Tribunais, antes que estes pudessem se manifestar a respeito.
Ressaltou-se, por fim, que outra seria a solução da causa se, ao invés de o mandado de segurança ter sido
impetrado diretamente neste Tribunal, nos tivesse sido remetido por outro, hipótese esta que imporia a
devolução dos autos ao órgão de origem, conforme orientação já fixada pelo STF, eis que, neste caso, não
haveria equívoco da parte, que não poderia ser prejudicada por ato a que não deu causa. Vencidos,
parcialmente, os Ministros Marco Aurélio, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso e Sepúlveda Pertence, que
negavam provimento ao regimental, em face da incompetência do Tribunal, e determinavam o envio dos
autos à Turma Recursal responsável pelo ato atacado.
MS 25258/MG, rel. Min. Carlos Britto, 1º.6.2005. (MS-25258)
Tribunal de Contas: Omissão na Criação de Cargos e Modelo Federal
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Partido Democrático
Trabalhista - PDT contra o art. 2º da EC 54/2003, do Estado do Ceará e contra a alínea c do inciso II do §
2º do art. 79 da Constituição estadual que estabeleceram ser de livre escolha do governador o provimento
de vaga, respectivamente, de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado e do Tribunal de Contas dos
Municípios, na hipótese de falta de auditor ou de membro do Ministério Público especial junto aos
referidos tribunais de contas. Declarou-se a inconstitucionalidade por omissão em relação à criação das
carreiras de auditores e de membros do Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas do
Estado do Ceará, a impedir o atendimento do modelo federal (CF, art. 73, § 2º e art. 75 - verbete 653 da
Súmula do STF), bem como a inconstitucionalidade da alínea c do inciso II do § 2º do art. 79 da
Constituição estadual, já que, não obstante a comprovada existência dos cargos no Tribunal de Contas dos
Municípios, a possibilidade de livre escolha do governador para o provimento dos mesmos estaria em
desconformidade com o citado modelo.
ADI 3276/CE, rel. Min. Eros Grau, 2.6.2005. (ADI-3276)
Art. 118 da Lei 8.213/91 e Constitucionalidade
O Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta ajuizada pela
Confederação Nacional da Indústria - CNI contra o caput do art. 118 da Lei 8.213/91, que garante a
manutenção do contrato de trabalho, em caso de acidente de trabalho, pelo prazo mínimo de doze meses,
após a cessação do auxílio-doença, independentemente de percepção de auxílio-acidente. Entendeu-se que
o dispositivo impugnado fixa os limites de uma garantia trabalhista vinculada à ocorrência de acidente de
trabalho, e não versa sobre o regime de estabilidade, razão pela qual não afronta o inciso I do art. 7º da
CF, que exige lei complementar para disciplinar a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa
causa. Ressaltou-se, também, que o acidente de trabalho é regulado, em última análise, para assegurar a
dignidade do trabalhador no momento em que não possui capacidade efetiva de trabalho. Concluiu-se que
o rol de garantias do art. 7º da CF não esgota a proteção aos direitos sociais, e que o art. 188 não cria novo
direito, mas apenas especifica o que a Constituição já prevê ao tratar das garantias referentes ao acidente
de trabalho. Vencido o Min. Marco Aurélio, que julgava o pedido procedente, por considerar que a norma
em questão dispôs sobre proteção de emprego, aditando o art. 10 do ADCT, sem observar a necessidade
de lei complementar para tratar da matéria (ADCT: “Art. 10. Até que seja promulgada a lei complementar
a que se refere o art. 7º, I, da Constituição:... II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:..
a) do empregado eleito para cargo de direção de comissões internas de prevenção de acidentes, desde o
registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandato; b) da empregada gestante, desde a
confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.”).
ADI 639/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 2.6.2005. (ADI-639)
PRIMEIRA TURMA
Crime de Menor Potencial Ofensivo Julgado e Competência da Justiça Comum
A Turma deferiu, em parte, habeas corpus impetrado contra acórdão de Turma Recursal de Juizado
Especial Criminal que, reformando sentença absolutória proferida pela Justiça Comum de 1º grau,
condenara o paciente pela prática do delito de desacato (CP, art. 221). No caso concreto, o Tribunal de
Alçada, em apelação interposta pelo Ministério Público, havia declinado a competência para a Turma
Recursal do Juizado Especial. Entendeu-se que, a despeito de se tratar de crime de menor potencial
ofensivo, o recurso contra a sentença de mérito deveria ter sido julgado na mesma jurisdição em que esta
fora prolatada, na espécie, pelo Tribunal de Alçada, considerado o disposto no art. 25 da Lei 10.259/2001
(“não serão remetidas aos Juizados Especiais as demandas ajuizadas até a data de sua instalação”).
Concluiu-se, ademais, que o argumento sustentado na impetração quanto à ausência de justa causa para a
ação penal deverá ser analisado pelo tribunal competente por ocasião do julgamento da apelação. HC
deferido, em parte, para anular o acórdão da Turma Recursal, por incompetência desta, e determinar, em
face da EC 45/2005, a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná para que seja julgada
a apelação. Precedentes citados: HC 83855/MG (DJU de 28.5.2004); HC 84566/MG (DJU de
12.11.2004).
HC 85652/MG, rel. Min. Eros Grau, 31.5.2005. (HC-85652)
Desclassificação de Infração para a Modalidade Culposa e Emendatio Libelli
A Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus em que se pretendia ver
declarada nula decisão de primeira instância que condenara a recorrente por crime de peculato culposo.
Alegava-se ofensa às garantias da ampla defesa e do contraditório, eis que, por ter sido a recorrente
denunciada pela prática de peculato doloso (CP, art. 312, caput), a sentença teria incorrido em mutatio
libelli, impondo, por isso, a prévia abertura de prazo à defesa, nos termos do art 384 do CPP. Entendeu-se
não estar configurada a hipótese de mutatio libelli e sim a emendatio libelli, uma vez que os fatos
narrados na denúncia seriam iguais aos considerados na sentença atacada, tendo esta divergido apenas
quanto ao elemento subjetivo do tipo, ao considerar ser o caso de culpa e não de dolo. Salientou-se que
caberia à ré se defender dos fatos que lhe são imputados, e não das respectivas definições jurídicas que a
eles são atribuídas.Asseverou-se, ainda, que a alteração contestada fora benéfica à recorrente, incidindo,
no caso, o disposto no art. 563 do CPP (“nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar
prejuízo para a acusação ou para a defesa”). Concluiu-se que, de qualquer modo, não haveria de se
prover o recurso, visto que houvera reforma da sentença pelo Tribunal de Justiça local que, acolhendo
recurso de apelação do Ministério Público, condenara a recorrente na mesma capitulação contida na
denúncia. Precedentes citados: HC 67997/DF (DJU de 21.9.90) e RHC 82589/BA (DJU de 20.2.2004).
RHC 85657/SP, rel. Min. Carlos Britto, 31.5.2005. (RHC-85657)
SEGUNDA TURMA
Princípio da Não-Culpabilidade e Maus Antecedentes
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que indeferira
igual medida ao fundamento de que o paciente, condenado por porte ilegal de arma (Lei 9.437/97, art. 10,
§§ 2º e 4º) à pena de 3 anos de reclusão e 15 dias-multa, em regime semi-aberto, não preenche os
requisitos subjetivos exigidos pelo art. 44, III, do CP, na redação dada pela Lei 9.714/98, para a
substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, haja vista a sua folha de antecedentes
penais. Alega-se, na espécie, constrangimento ilegal consistente na fixação de regime inicial mais
gravoso, bem como na negativa de substituição da pena aplicada. O Min. Gilmar Mendes, relator, tendo
em conta que a fixação da pena e do regime do ora paciente se lastreara única e exclusivamente na
existência de dois inquéritos policiais e uma ação penal, concedeu o writ para modificar o regime inicial
de cumprimento da pena para o aberto e, também, determinar ao juiz da causa que proceda à substituição
da pena reclusiva pela restritiva de direitos. Considerou, na linha do que proferido em seu voto na Rcl
2391 MC/PR — em que se discute, no Plenário, a possibilidade de o réu recorrer em liberdade —, que a
mera existência de inquéritos ou ações penais em andamento não pode caracterizar maus antecedentes,
sob pena de violar o princípio constitucional da não-culpabilidade (CF, art. 5º, LVII). Ressaltou, ainda, o
aparente conflito entre as orientações das Turmas do STF no tocante à consideração ou não, como maus
antecedentes, dos aludidos procedimentos. Após, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista
do Min. Joaquim Barbosa.
HC 84088/MS, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.5.2005. (HC-84088)
Convenção Coletiva e Política Salarial - 3
Concluído julgamento de novos embargos de declaração opostos contra acórdão que, entendendo incorreta a premissa que integrou a ratio decidendi do julgamento do recurso extraordinário, concedera
efeitos modificativos a embargos declaratórios para assentar que prevalece a lei federal que instituiu nova
sistemática de reajuste de salário em face de cláusula de acordo coletivo no sentido de que o regime de
reajuste de salários ali convencionado seria mantido, ainda que sobreviesse nova lei introduzindo política
salarial menos favorável — v. Informativos 227, 294 e 311. Inicialmente, a Turma indeferiu questão de
ordem em que se pretendia a suspensão do julgamento da ação, antes de ser proferido o voto-vista do
Min. Nelson Jobim, para que fosse analisada a possibilidade de extensão, às outras empresas, do acordo
coletivo de trabalho celebrado entre empresa integrante do sindicato patronal embargado e trabalhadores,
com o fim de solucionar a pendência judicial existente, já que o aludido acordo teria tratado também dos
efeitos perante a presente ação. Considerou-se que o prosseguimento do feito não prejudica a conciliação
pretendida, a qual poderá ser concluída a qualquer tempo. Ademais, asseverou-se que a solicitação objeto
da questão de ordem refere-se apenas a uma das empresas sindicalizadas e que a negociação dependeria,
ainda, de exame de conveniência e oportunidade por parte das demais.
RE 194662 ED-ED-QO/BA, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.5.2005. (RE-194662)
Convenção Coletiva e Política Salarial - 4
Em seguida, no mérito, a Turma rejeitou os mencionados embargos de declaração em que se
sustentava a existência, no acórdão embargado, de: a) omissão e obscuridade, dado que, ao acolher os
primeiros embargos em face de “premissa incorreta”, criara-se nova possibilidade de cabimento de
embargos de declaração, sem que existisse previsão legal a respeito e b) contradição, tendo em conta que
a matéria já havia sido apreciada pelos Ministros Nelson Jobim e Maurício Corrêa, quando do julgamento
do recurso extraordinário, o que os impediria de reconsiderarem suas decisões em sede de embargos
declaratórios. Entendeu-se que a excepcionalidade de se conferir efeito modificativo ou infringente do
julgado a embargos declaratórios ocorreu por não haver, no sistema legal, previsão de outro recurso para
a correção de eventual erro cometido. No ponto, o Min. Nelson Jobim concluiu que a indicação de efeitos
modificativos aos embargos de declaração não se configura, na espécie, como hipótese nova de
cabimento de embargos, mas simplesmente como correção de omissão apontada por meio da “premissa
incorreta”. Por outro lado, quanto aos votos dos Ministros Maurício Corrêa e Nelson Jobim, afirmou-se
não existir qualquer contradição, tendo em conta a impossibilidade de se manter premissa incorreta que
distinguira o caso dos autos em relação aos precedentes da Corte.
RE 194662 ED-ED/BA, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.5.2005. (RE-194662)
Intervenção do Estado no Domínio Econômico e Responsabilidade Civil
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto por destilaria contra acórdão do
STJ que, em recurso especial, reformara decisão que condenara a União a indenizar os prejuízos advindos
da intervenção do Poder Público no domínio econômico, a qual resultara na fixação de preços, no setor
sucro-alcooleiro, abaixo dos valores apurados e propostos pelo Instituto Nacional do Açúcar e do Álcool.
A recorrente alega ofensa ao art. 37, § 6º, da CF, sustentando que, não obstante o referido ato tenha
decorrido de legítima atividade estatal, deve ser indenizada pelo dano patrimonial por ela sofrido. O Min.
Carlos Velloso, relator, deu provimento ao recurso. Entendeu que a intervenção estatal na economia
possui limites no princípio constitucional da liberdade de iniciativa e a responsabilidade objetiva do
Estado é decorrente da existência de dano atribuível à atuação deste. Nesse sentido, afirmou que a
fixação, por parte do Estado, de preços a serem praticados pela recorrente em valores abaixo da realidade
e em desconformidade com a legislação aplicável ao setor constitui-se em óbice ao livre exercício da
atividade econômica, em desconsideração ao princípio da liberdade de iniciativa. Assim, não é possível
ao Estado intervir no domínio econômico, com base na discricionariedade quanto à adequação das
necessidades públicas ao seu contexto econômico, de modo a desrespeitar liberdades públicas e causar
prejuízos aos particulares. Após, pediu vista o Min. Joaquim Barbosa.
RE 422941/DF, rel. Min. Carlos Velloso, 31.5.2005. (RE-422941)
Concurso Público e Princípio da Isonomia - 2
A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de
Justiça do Estado do Rio Grande do Norte que, com fundamento no princípio da isonomia, afastara norma
do edital de concurso público para provimento de cargo de escrivão da polícia civil e concedera mandado
de segurança, a fim de conferir à impetrante, ora recorrida, o direito de realizar nova prova física — v.
Informativo 384. Deu-se provimento ao recurso por se entender que o tribunal de origem, ao acolher a
pretensão da impetrante, que falhara durante a realização da prova física em decorrência de uma distensão
muscular, ofendera os princípios da impessoalidade e da isonomia. Ressaltou-se que o tribunal a quo,
com o afastamento da disposição editalícia, premiara a impetrante em detrimento dos candidatos que
também não foram aprovados no referido exame.
RE 351142/RN, rel. Min. Ellen Gracie, 31.5.2005. (RE-351142)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
1º.6.2005
31.5.2005
31.5.2005
Extraordinárias
2.6.2005
——
——
Julgamentos
9
544
293
CLIPPING
DO
DJ
3 de junho de 2005
ADI N. 3.177-AP
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PROCESSO LEGISLATIVO. LEI 645/2002 DO ESTADO DO
AMAPÁ. EMENDA PARLAMENTAR. HIPÓTESE VEDADA PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 63, I.
OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA PELOS ESTADOS-MEMBROS.
É inconstitucional norma que seja resultante de emenda parlamentar a projeto de lei iniciado pelo Poder Executivo e que amplie
hipóteses de recebimento de gratificação por servidores públicos estaduais. Precedentes.
Ação julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 2º e 5º da Lei 645/2002 do Amapá, decorrentes da rejeição
de veto do governador do estado.
* noticiado no Informativo 378
MED. CAUT. EM ADI N. 3.401-SP
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a Resolução no 196, de 19.1.2005, editada pelo órgão Especial do Tribunal
de Justiça do Estado de São Paulo, que alterou a destinação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e
de registros. 2. Redução de parcela destinada ao Poder Executivo. 3. Violação aos arts. 98, § 2o (com a redação da Emenda no 45, de
2004), 167, VI e IX, todos da Constitução Federal. 4. Dispensa da oitiva do órgão responsável pela edição do ato, tendo em vista a
urgência da matéria. 5. Plausibilidade jurídica do pedido. 6. Alegação de equívoco na interpretação que possibilita que o § 2o do art.
98 alcance os emolumentos extrajudiciais. 7. Matéria orçamentária e reserva legal: ofensa ao art. 167, VI e IX, tendo em vista a
potencial invasão, pelo ato impugnado, de matéria reservada à lei. 8. Presença de sinal de bom direito e de periculum in mora. 9.
Conveniência política na suspensão do ato. 10. Liminar deferida para o fim de suspender a vigência do ato.
* noticiado no Informativo 375
Inq N. 1.769-DF
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. PECULATO. Código Penal, art. 312. PRESCRIÇÃO: NÃO-OCORRÊNCIA.
DENÚNCIA: CPP, art. 41. GOVERNADOR DE ESTADO: Código Penal, art. 327. COISA JULGADA: NÃO-OCORRÊNCIA.
I. - A denúncia descreve crime em tese, crime de peculato - Código Penal, art. 312 - e contém os requisitos inscritos no art. 41, CPP.
Deve ser recebida, portanto.
II. - Prescrição: não-ocorrência, presente a causa de aumento de pena inscrita no art. 327, § 2º, do Código Penal.
III. - Coisa julgada: não-ocorrência, por isso que a decisão que manda arquivar inquérito ou peças de informação não causa
preclusão. Súmula 524-STF.
IV. - Denúncia recebida.
* noticiado no Informativo 372
Rcl N. 1.017-SP
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Reclamação: usurpação da competência do STF (CF, art. 102, I, l): ação popular que, pela causa de pedir e pelo pedido
de provimento mandamental formulado, configura hipótese reservada à ação direta de inconstitucionalidade por omissão de medidas
administrativas, de privativa competência originária do Supremo Tribunal: procedência.
* noticiado no Informativo 382
RE N. 413.782-SC
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
DÉBITO FISCAL - IMPRESSÃO DE NOTAS FISCAIS - PROIBIÇÃO - INSUBSISTÊNCIA. Surge conflitante com a Carta da
República legislação estadual que proíbe a impressão de notas fiscais em bloco, subordinando o contribuinte, quando este se
encontra em débito para com o fisco, ao requerimento de expedição, negócio a negócio, de nota fiscal avulsa.
* noticiado no Informativo 380
HC N. 84.735-PR
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: PENSÃO RECEBIDA APÓS O FALECIMENTO DA PENSIONISTA. RECURSOS SOB A ADMINISTRAÇÃO
MILITAR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR. ESTELIONATO. SUJEITO PASSIVO.
Estelionato praticado por pessoa que, mediante assinatura falsa, se fez passar por pensionista falecida para continuar recebendo os
proventos de pensão militar depositados no Banco do Brasil. Recursos sob a administração militar. Competência da Justiça Militar
para processar e julgar a respectiva ação penal (artigo 9º, III, “a” do Código Penal Militar).
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido de que o sujeito passivo, no crime de estelionato, tanto pode ser
a pessoa enganada quanto a prejudicada, ainda que uma seja ente público. Ordem denegada.
* noticiado no Informativo 388
HC N. 85.068-RJ
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: 1. Habeas corpus: prejudicialidade parcial, dada a extensão dos efeitos do HC 85.020 (1ª T., Pertence, DJ 18.2.05) a um
dos pacientes.
2. Prisão preventiva: excesso de prazo: diligências requeridas pela Defesa: ausência de prazo certo para a sua realização: tempo
gasto que não cabe seja debitado ao paciente: inequívoco excesso de prazo não atribuível à Defesa, que prejudica eventual
fundamento cautelar da prisão: liberdade provisória concedida de ofício.
Diligências posteriores à inquirição das testemunhas, requeridas ou não pelas partes, fazem-se, a critério do juiz, quando necessárias
à complementação de prova de fatos relevantes para o julgamento. Por isso, para a sua realização, a lei não fixa prazo certo. E não
cabe debitar o tempo gasto ao co-réu que as tenha requerido (v.g., voto do Relator no HC 71.610, 30.6.94, Pleno, DJ 30.3.01).
Prazo da prisão que, no caso, sobrepuja os temperamentos admissíveis à luz do juízo de razoabilidade, ao qual a Turma tende a
submeter a legitimidade da extensão temporal da prisão preventiva, após a instrução ordinária, malgrado a lei não lhe predetermine
limites rígidos de duração.
* noticiado no Informativo 384
HC N. 85.452-SP
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS DESCONTADAS DOS EMPREGADOS. PARCELAMENTO E QUITAÇÃO APÓS O
RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, POR FORÇA DA RETROAÇÃO DE LEI BENÉFICA.
As regras referentes ao parcelamento são dirigidas à autoridade tributária. Se esta defere a faculdade de parcelar e quitar as
contribuições descontadas dos empregados, e não repassadas ao INSS, e o paciente cumpre a respectiva obrigação, deve ser
beneficiado pelo que dispõe o artigo 9º, § 2º, da citada Lei n. 10.684/03. Este preceito, que não faz distinção entre as contribuições
previdenciárias descontadas dos empregados e as patronais, limita-se a autorizar a extinção da punibilidade referente aos crimes ali
relacionados. Nada importa se o parcelamento foi deferido antes ou depois da vigência das leis que o proíbe: se de qualquer forma
ocorreu, deve incidir o mencionado artigo 9º.
O paciente obteve o parcelamento e cumpriu a obrigação. Podia fazê-lo, à época, antes do recebimento da denúncia, mas assim não
procedeu. A lei nova permite que o faça depois, sendo portanto, lex mitior, cuja retroação deve operar-se por força do artigo 5º, XL
da Constituição do Brasil.
Ordem deferida. Extensão a paciente que se encontra em situação idêntica.
* noticiado no Informativo 388
RMS N. 24.249-DF
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SOCIEDADE DE
ECONOMIA MISTA. CONCEITO. CONCEITOS JURÍDICOS. SERVIDOR PÚBLICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. NÃOEXERCÍCIO DO DIREITO DE OPÇÃO NO PRAZO LEGAL. MÁ-FÉ CONFIGURADA.
1. Para efeitos do disposto no art. 37, XVII, da Constituição são sociedades de economia mista aquelas — anônimas ou não — sob o
controle da União, dos Estados-membros, do Distrito Federal ou dos Municípios, independentemente da circunstância de terem sido
“criadas por lei”.
2. Configura-se a má-fé do servidor que acumula cargos públicos de forma ilegal quando, embora devidamente notificado para optar
por um dos cargos, não o faz, consubstanciando, sua omissão, disposição de persistir na prática do ilícito.
3. Recurso a que se nega provimento.
* noticiado no Informativo 361
RHC N. 85.214-MG
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Habeas corpus: descabimento.
1. Alegação de nulidade de decisão que decretou a perda da carga e o descarregamento em empresa diversa da destinatária :
ausência, no ponto, de ameaça ou constrangimento à liberdade de locomoção.
2. Questões relacionadas à inexigibilidade de conduta diversa, que demandam o revolvimento de fatos e provas, ao que não se presta
o procedimento sumário e documental do habeas corpus.
II. Crime ambiental: transporte de carvão vegetal sem licença válida para todo o tempo da viagem outorgada pela autoridade
competente (L. 9.605/98, art. 46, parágrafo único): exigência de autorização ambiental expedida pelo IBAMA - existente e no prazo
de validade - e não de regularidade da documentação fiscal, cuja ausência não afeta o bem jurídico protegido pela incriminação, qual
seja o meio-ambiente, o que induz à atipicidade do fato, ainda quando se trate, como no caso, de um crime de mera conduta (v.g.,
HC 81.057, 1ª T., 25.4.04, Pertence, Infs. STF 349 e 385).
* noticiado no Informativo 388
RE N. 413.327-BA
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. VEREADOR. CASSAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. VIOLAÇÃO FLAGRANTE E INEQUÍVOCA DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. RECURSO PROVIDO.
Sistema de votação que previa a distribuição de duas cédulas a cada vereador, uma contendo a palavra “SIM” e outra a palavra
“NÃO”. Ausência, nos autos, de controvérsia acerca da inexistência de recipiente para recolhimento dos votos remanescentes.
Adotado formalmente pela Câmara de Vereadores o sigilo como regra do processo de cassação do mandato de vereador, é
indispensável a previsão de mecanismo apto a assegurar, com plena eficácia, que os votos sejam proferidos de forma sigilosa, sob
pena de violação do princípio do devido processo legal.
Recurso provido.
* noticiado no Informativo 370
Acórdãos Publicados: 97
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Competência Originária do STF: Empresa Pública e Conflito Federativo (Transcrições)
ACO 765 QO/RJ*
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
Voto-vista (Min. Eros Grau): Na sessão do dia 07 de abril de 2005, o Ministro Marco Aurélio trouxe ao exame da Corte
“Questão de Ordem” pertinente à competência do Supremo Tribunal Federal para conhecer e julgar, originariamente, lide instaurada
entre o Estado do Rio de Janeiro e a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT.
2.
Sua Excelência esclareceu que o tema controvertido estava circunscrito à cobrança do IPVA - Imposto sobre a
Propriedade de Veículos Automotores, bem como às sanções decorrentes do não-pagamento do tributo.
3.
A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos ajuizou ação declaratória visando o afastamento da cobrança, pelo Estado
do Rio de Janeiro, do tributo incidente sobre os veículos de sua propriedade. Evocou, como fundamento da sua pretensão, o decretolei 509/69, que a criou com o objetivo de prestar os serviços postais a que alude o artigo 21, X, da Constituição. Sustentou ser em
razão disso beneficiária da imunidade tributária prevista no artigo 150, VI, “a”, da Constituição do Brasil (imunidade recíproca),
razão pela qual o juízo federal determinou a remessa dos autos a este Tribunal, tendo em consideração o disposto no artigo 102,
inciso I, alínea “f”, da Constituição.
4.
O Ministro Marco Aurélio ressalta em seu voto que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT integra
“administração indireta, mas o faz como empresa pública e, portanto, pessoa jurídica de direito privado”. Acentuou mais:
“(...) Ainda que se pudesse vislumbrar repercussão maior no objeto estatutário da Empresa, na delegação de serviços
postais, ter-se-ia a circunstância de não se configurar, na espécie, conflito a colocar em risco o sistema federativo, deixando
de incidir, por essa razão, a norma da alínea “f” do inciso I do artigo 102 do Diploma Maior. Então, consigno que, ante o
alcance do preceito constitucional, a referência a entidades da administração indireta está ligada ao envolvimento de pessoas
jurídicas de direito público e mesmo assim em hipóteses de conflito de repercussão maior, o que não é o caso, em se tratando
de cobrança de tributo - IPVA - relativamente a veículos de propriedade de empresa pública, repita-se, pessoa jurídica de
direito privado”.
5.
Resolvendo a “Questão de Ordem”, Sua Excelência afastou a competência do Supremo Tribunal Federal, determinando
o retorno do processo ao Juízo Federal, que declinou da competência.
6.
Pedi vista dos autos e, nessa oportunidade, trago o processo para prosseguir o julgamento.
7.
Embora resulte sempre dificultosa a identificação desta ou daquela parcela de atividade econômica em sentido amplo
como serviço público ou como atividade econômica em sentido estrito, há casos nos quais essa identificação pode ser operada com
facilidade. Faço alusão, aqui, a hipóteses nas quais o próprio texto constitucional eleva algumas delas à primeira categoria; temos aí
os serviços públicos por definição constitucional. Isso é precisamente o que se dá em relação às atividades de correio: o artigo 21, X
da Constituição de 1.988 define competir à União “manter o serviço postal e o correio aéreo nacional”.
Note-se bem que, apesar da doutrina em regra não se ter dado conta disso, aí estão referidas duas atividades inteiramente
distintas, o serviço postal e o correio aéreo nacional. O primeiro pode ser descrito como o conjunto de atividades que torna possível
o envio de correspondência ou objeto postal de um remetente para um endereço final certo e determinado. Já o segundo, o correio
aéreo nacional, é atividade instrumental dos correios [= serviço postal], mantida inclusive por outro departamento da
Administração, o Ministério da Aeronáutica, que não o incumbido de manter o serviço postal, o Ministério das Comunicações.
É certo, portanto, no quanto ora importa considerar, não existir, em face do texto da Constituição do Brasil, a menor
dúvida no que tange ao fato de a prestação do serviço postal consubstanciar serviço público. Tamanha essa evidência que dispensa
quaisquer outras considerações: entre nós, tais atividades consubstanciam serviço público por definição constitucional.
8.
É certo, por outro lado, que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos é uma empresa pública, entidade da
Administração Indireta da União, como tal tendo sido criada pelo decreto-lei nº 509, de 10 de março de 1969. Seu capital é detido
integralmente pela União Federal (artigo 6º) e ela goza dos mesmos privilégios concedidos à Fazenda Pública, “quer em relação a
imunidade tributária, direta ou indireta, impenhorabilidade de seus bens, rendas e serviços, quer no concerne a foro, prazos e
custas processuais”. Leia-se o texto do artigo 12 do decreto-lei.
9.
No que concerne às obrigações tributárias, a ela não se aplica o § 2º do art. 173 da Constituição do Brasil, na afirmação
de que as empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor
privado. O que resta definidamente evidente, neste passo, como anotei em outra ocasião, é que tanto o preceito inscrito no § 1º
quanto o veiculado pelo § 2º do art. 173 da Constituição de 1988 apenas alcançam empresas públicas e sociedades de economia
mista que explorem atividade econômica em sentido estrito. Não se aplicam àquelas que prestam serviço público, não assujeitadas
às obrigações tributárias às quais se sujeitam as empresas privadas. As empresas públicas, sociedades de economia mista e outras
entidades estatais que prestem serviço público podem gozar de privilégios fiscais, ainda que não extensivos a empresas privadas
prestadoras de serviço público em regime de concessão ou permissão (art. 175 da CF 88). Isso me parece inquestionável.
10.
O Pleno do Supremo Tribunal Federal declarou, quando do julgamento do RE 220.906, relator o Ministro Maurício
Corrêa, DJ 14.11.2002, à vista do disposto no artigo 6º do decreto-lei nº 509/69, que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos é
“pessoa jurídica equiparada à Fazenda Pública, que explora serviço de competência da União (CF, artigo 21, X)”.
11.
E, mais, declarou ainda ter sido o decreto-lei recebido pela Constituição de 1988 e — repito — que a Empresa Brasileira
de Correios e Telégrafos - ECT é “pessoa jurídica equiparada à Fazenda Pública, que explora serviço de competência da União
(CB, artigo 21, X)”; que lhe são deferidos os mesmo privilégios concedidos aos entes estatais, “quer em relação a imunidade
tributária, direta ou indireta”; e que, como empresa pública mantida pela União Federal, seus “bens pertencem à entidade
mantenedora”.
12.
Assentadas essas premissas, observo que a Constituição do Brasil, em seu artigo 150, VI, “a”, veda a instituição de
impostos sobre o patrimônio, renda e serviços da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, garantia extensiva às
autarquias e às fundações instituídas e mantidas pelo poder público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços
vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes (CB, artigo 150, VI, § 2º).
13.
A imunidade recíproca tende a evitar que as unidades da federação sejam compelidas a pagar impostos umas às outras,
com o que resultam afastadas eventuais pressões que umas e outras poderiam exercer entre si de forma recíproca, comprometendo a
unidade política essencial ao perfeito funcionamento do regime federativo. A imunidade recíproca, na lição de Aliomar Baleeiro, é
uma forma de expressão do princípio federativo; não se pode conceber a federação sem a imunidade tributária recíproca.
14.
Retorno ao texto do artigo 12 do decreto-lei 509/69 para lembrar que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos goza
dos mesmos privilégios concedidos à Fazenda Pública, explora serviço de competência da União — serviço público federal — e,
sendo mantida pela União Federal (CB, artigo 21, X), seus bens pertencem à entidade mantenedora. Esses bens consubstanciam
propriedade pública, estando integrados à prestação de serviço público. Esse patrimônio identifica-se com aquele que a
Constituição define como imune aos impostos da titularidade de qualquer pessoa de direito público.
15.
Ainda que no caso se cuide de empresa pública integrante da Administração Indireta, pessoa jurídica de direito privado, a
EBCT é delegada da prestação de serviço público federal, a ela amoldando-se qual u’a luva ainda outra lição de Aliomar Baleeiro:
constituem serviço público “quaisquer organizações de pessoal, material, sob a responsabilidade dos poderes de Pessoa de Direito
Público Interno, para desempenho de funções e atribuições de sua competência, enfim, todos os meios de operação dessas Pessoas
de Direito Público, sob várias modalidades, para realização dos fins que a Constituição, expressa ou implicitamente lhes comete.
16.
Sendo assim, dada a impossibilidade de tributação de bens públicos federais pelo Estado do Rio de Janeiro em razão da
garantia constitucional de imunidade recíproca e convencido de que ela, a imunidade recíproca, assenta-se basicamente no princípio
da federação, entendo verificar-se a competência originária desta Corte para conhecer e julgar a lide, nos termos do disposto no
artigo 102, I, f, da Constituição. O fato jurídico que deu ensejo à causa é a tributação de bem público federal.
Ante o exposto, peço vênia ao eminente Ministro Marco Aurélio para afirmar a competência desta Corte para o exame da
matéria.
* acórdão pendente de públicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 391
Brasília, 6 a 10 de junho de 2005 Nº 391
Data (páginas internas): 15 de junho de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Serviços Notariais e de Registro: Selo de Controle dos Atos e Vício Material
ADI: Recebimento Direto de Inquérito Policial e Requisição de Informações pelo MP
ADI: Juiz de Paz, Processo Eleitoral e Atribuições – 1
ADI: Juiz de Paz, Processo Eleitoral e Atribuições – 2
ADI: Juiz de Paz, Processo Eleitoral e Atribuições – 3
Extradição: Trânsito em Julgado e Erro Material
Decreto Expropriatório: Transmissão “Mortis Causa” e Partes Ideais - 2
1ª Turma
Prisão Preventiva e HC de Ofício - 1
Prisão Preventiva e HC de Ofício - 2
RE Criminal: Descaminho e Princípio da Insignificância
Protocolo Integrado e Instância Extraordinária
2ª Turma
Crime de Imprensa e Competência do Juizado Especial
“Bis In Idem” e Sentença Definitiva
Responsabilidade Civil do Estado e Ato Omissivo
Transcrições
Responsabilidade Civil do Estado e Ato Omissivo (RE 409203/RS)
PLENÁRIO
Serviços Notariais e de Registro: Selo de Controle dos Atos e Vício Material
O Tribunal, por maioria, julgou procedente, em parte, pedido formulado em ação direta ajuizada
pela Associação dos Notários e Registradores do Brasil - ANOREG/BR e declarou a
inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.033/2003, do Estado do Mato Grosso, que institui selo de
controle dos atos dos Serviços Notariais e de Registro, adiciona receita ao Fundo de Apoio ao Judiciário e
dá outras providências (Lei 8.033/2003, art. 2º: “§ 1º. A não-utilização do selo de controle de acordo com
as regras fixadas nesta lei, acarretará a invalidade do ato.”). Entendeu-se constitucional a iniciativa do
Tribunal de Justiça na propositura da lei, uma vez que, na competência de iniciar o processo legislativo de
organização de seus serviços, estaria implícito a de propor a fonte de custeio dos mesmos. Salientou-se
que o selo instituído possui natureza jurídica de taxa, em razão do exercício do poder de polícia, sendo
possível a destinação do produto de sua arrecadação a órgão público, inclusive ao próprio Judiciário,
conforme orientação já fixada pelo Supremo e, ainda, que a lei impugnada atentou para a exata proporção
da capacidade contributiva das respectivas serventias, conforme estabelece seu art. 8º, inexistindo,
destarte, a alegada ofensa ao inciso IV do art. 150 da CF. Não obstante, considerou-se caracterizada a
usurpação da competência privativa da União para dispor sobre registros públicos (CF, art. 22, XXV),
haja vista que a instituição do selo de controle dos serviços notariais não poderia consistir em requisito de
validade dos atos de criação, preservação, modificação e extinção de direitos e obrigações. Vencidos o
Min. Eros Grau, que julgava procedente o pedido apenas no aspecto material, e o Min. Marco Aurélio,
que o julgava procedente em toda sua extensão, tanto no aspecto formal como no material.
ADI 3151/MT, rel. Min. Carlos Britto, 8.6.2005. (ADI-3151)
ADI: Recebimento Direto de Inquérito Policial e Requisição de Informações pelo MP
O Plenário iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Governadora do
Estado do Rio de Janeiro contra os incisos IV e V do art. 35 da Lei Complementar 103/2003 (Lei
Orgânica do Ministério Público do referido Estado), que dispõem, respectivamente, caber ao Ministério
Público o recebimento, direto da polícia judiciária, do inquérito policial que versar sobre infração de ação
penal pública, e a requisição de informações quando o inquérito não for encerrado em 30 dias, tratando-se
de indiciado solto por meio de fiança ou sem ela. O Min. Eros Grau, relator, julgou o pedido parcialmente
procedente para declarar a inconstitucionalidade do inciso IV do art. 35 da Lei Complementar 103/2003.
Reconhecendo o caráter procedimental do inquérito, afastou a apontada ofensa à competência privativa da
União para legislar sobre direito processual (CF, art. 22, I), e, ressaltando ser a causa de pedir aberta,
entendeu ter ocorrido violação ao § 1º do art. 24 da CF, porquanto o ato atacado dispõe de forma diversa
do que estabelecido pela norma geral editada pela União sobre a matéria, qual seja, o § 1º do art. 10 do
CPP (“Art. 10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 (dez) dias, se o indiciado tiver sido preso em
flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se
executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trina) dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem
ela. § 1o A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará autos ao juiz
competente.”). No que se refere ao inciso V do art. 35 da lei em questão, não vislumbrou
inconstitucionalidade, já que compete ao Ministério Público o controle externo da atividade policial, a
teor do disposto no art. 129, VII, da CF (“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:...
VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no
artigo anterior;”). Acompanhou o voto do relator o Min. Carlos Velloso. Em divergência, o Min. Marco
Aurélio proferiu voto no sentido de julgar o pedido improcedente e declarar a constitucionalidade também
do inciso IV do art. 35 da lei, ao fundamento de que, por ser o inquérito procedimento, a competência
legislativa seria concorrente (CF: “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:... XI - procedimentos em matéria processual;... § 1º - No âmbito da legislação
concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.”). O julgamento foi
suspenso como pedido de vista do Min. Joaquim Barbosa.
ADI 2886/RJ, rel. Min. Eros Grau, 8.6.2005. (ADI-2886)
ADI: Juiz de Paz, Processo Eleitoral e Atribuições - 1
Julgada pelo Plenário a ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral da
República contra diversos dispositivos da Lei 13.454/2000, do Estado de Minas Gerais, que dispõe sobre
o processo eleitoral, atribuições e competência de juiz de paz. Preliminarmente, o Tribunal, por
unanimidade, não conheceu do pedido formulado quanto às expressões “simultaneamente com as eleições
municipais” e “segundo o princípio majoritário”, constantes, respectivamente, do caput dos artigos 2º e
3º da lei mineira, por consistirem em reproduções de normas contidas na constituição estadual que não
foram impugnadas na ação (“Art. 2º As eleições para Juiz de Paz serão realizadas simultaneamente com
as eleições municipais, na forma estabelecida por esta lei e mediante a aplicação subsidiária do Código
Eleitoral e da Legislação federal específica. Parágrafo único – O processo eleitoral de que trata este
artigo será presidido pelo Juiz Eleitoral competente. Art. 3º O Juiz de Paz é eleito segundo o princípio
majoritário, para mandato de quatro anos, pelo voto direto, universal e secreto do eleitorado do distrito
ou do subdistrito judiciário respectivo, permitida a reeleição.”). No mérito, em relação ao restante desses
artigos, exceto quanto ao vocábulo “subsidiária”, também do caput do art. 2º, julgou-se, por maioria,
improcedente o pedido, em razão de a Constituição Federal ter incluído a eleição de juiz de paz no
sistema eleitoral global (CF: “Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo
voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:... § 3º - São condições
de elegibilidade, na forma da lei:... V - a filiação partidária;... VI - a idade mínima de:.. c) vinte e um
anos para... juiz de paz;”). Vencidos os Ministros Eros Grau, relator, e Marco Aurélio, que julgavam o
pedido procedente, por vislumbrar ofensa à competência privativa da União para legislar sobre direito
eleitoral (“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:.. I – direito... processual, eleitoral...e
do trabalho;”).
ADI 2938/MG, rel. Min. Eros Grau, 8 e 9.6.2005. (ADI-2938)
ADI: Juiz de Paz, Processo Eleitoral e Atribuições - 2
Prosseguindo no julgamento, o Pleno, por maioria, declarou a constitucionalidade do art. 4º da lei
em questão (“Art. 4º Os candidatos a Juiz de Paz e seus suplentes serão escolhidos nas mesmas
convenções partidárias que deliberarão sobre as candidaturas às eleições municipais, observadas as
normas estabelecidas na legislação eleitoral e no estatuto dos respectivos partidos políticos.”).
Considerando o sistema do art. 14, entendeu-se ser a filiação partidária condição compatível com o
exercício da justiça de paz. Salientou-se, ademais, o caráter não jurisdicional das atividades exercidas
pelos seus juízes (CF, art. 98, II). Vencidos, no ponto, os Ministros Carlos Britto, Marco Aurélio e Celso
de Mello que julgavam incompatível a filiação e declaravam a inconstitucionalidade do referido
dispositivo. Por unanimidade, declarou-se a inconstitucionalidade do art. 6º da lei, que estabelece
condições de elegibilidade, haja vista tratar-se de matéria eleitoral. O pedido foi julgado improcedente
pela maioria quanto aos artigos 5º, 7º, 8º, 9º e 10. Vencidos, no ponto, os Ministros Eros Grau, relator,
Marco Aurélio e Celso de Mello que, entendendo caracterizada a afronta ao art. 22, I, da CF, julgavam os
artigos inconstitucionais.
ADI 2938/MG, rel. Min. Eros Grau, 8 e 9.6.2005. (ADI-2938)
ADI: Juiz de Paz, Processo Eleitoral e Atribuições - 3
Em relação ao art. 15 da lei mineira, que dispõe sobre as competências do juiz de paz, o Tribunal,
por maioria, julgou improcedente o pedido formulado quanto ao inciso VII (“arrecadar bens de ausentes
ou vagos, até que intervenha a autoridade competente”), levando em conta o disposto no inciso II do art.
98, que outorga ao juiz de paz outras atribuições de caráter não jurisdicional previstos em legislação
estadual. Vencidos, nessa parte, os Ministros Eros Grau, relator, e Marco Aurélio que davam pela
procedência do pedido por entender se ter versado matéria processual. Por unanimidade, julgou-se
inconstitucional a expressão “e lavrar auto de prisão”, contida no inciso VIII do art. 15, por se tratar de
matéria processual penal. Pela mesma razão, por maioria, declarou-se a inconstitucionalidade do
remanescente desse último inciso, relativo à outorga ao juiz de paz de competência para processar auto de
corpo de delito, ficando vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Carlos Velloso, Sepúlveda Pertence e
Nelson Jobim. O inciso IX do art. 15 (“prestar assistência ao empregado nas rescisões de contrato de
trabalho...”) foi declarado inconstitucional, à unanimidade, por tratar de matéria trabalhista. Por maioria,
entendendo não haver incompatibilidade com o texto constitucional, considerando o disposto no inciso VI
dos seus artigos 23 e 24, declarou-se a constitucionalidade do inciso X do art. 15, que permite aos juízes
de paz zelar pela observância das normas concernentes à defesa do meio ambiente, tomando as
providências necessárias ao seu cumprimento. Vencidos os Ministros Eros Grau, relator, e Marco Aurélio,
que davam interpretação conforme o art. 225 da CF, de modo que as atividades dos juízes de paz se
restringissem à comunicação da violação da lei às autoridades ambientais competentes. O inciso XII do
art. 15 (“funcionar como perito em processos...”) foi declarado constitucional, por maioria, diante da
referida previsão do art. 98, II, da CF quanto à possibilidade de outorga de outras atribuições. Nesse
ponto, restaram vencidos os Ministros Eros Grau, relator, e Marco Aurélio que consideravam ter havido
invasão à competência da União para legislar sobre matéria processual civil. Pelos mesmos fundamentos
expostos em relação ao inciso VII do art. 15, o Tribunal, por maioria, vencidos os Ministros relator e
Marco Aurélio, julgou improcedente o pedido quanto ao § 2º do art. 15 (“A nomeação de escrivão ‘ad
hoc’ é obrigatória em caso de arrecadação provisória de bens de ausentes ou vagos.”). Declarou-se,
ainda, por maioria, a inconstitucionalidade da expressão “e garante direito a prisão especial, em caso de
crime comum, até definitivo julgamento”, contida no art. 22 da lei mineira, por cuidar de matéria de
processo penal. Vencidos, nesse ponto, os Ministros Joaquim Barbosa e Carlos Velloso, que julgavam o
dispositivo constitucional por já constar da LOMAN.
ADI 2938/MG, rel. Min. Eros Grau, 8 e 9.6.2005. (ADI-2938)
Extradição: Trânsito em Julgado e Erro Material
Erro material é o resultante de enganos da escrita, de datilografia ou de cálculo e ainda os
atribuíveis a flagrante equívoco ou inadvertência do juiz, uma vez que haja nos autos elementos que
tornem evidente o engano, quando relativo a matéria do processo. Com base nesse entendimento, o
Tribunal, por maioria, vencido o Min. Marco Aurélio, resolveu questão de ordem no sentido de
reconhecer erro material na decisão que julgara prejudicado pedido extradicional e negar provimento a
agravo regimental interposto contra decisão que determinara a distribuição dos autos da extradição. No
caso concreto, o governo requerente, encaminhando nota verbal ao Ministro da Justiça, desistira da
extradição somente em relação a um dos três crimes imputados ao extraditando, em face da prescrição
punitiva. Por sua vez, o Ministro da Justiça enviara ofício ao Min. Sydney Sanches, então relator do
processo, informando, com base na citada nota verbal, cuja cópia anexara, “...não ter mais o Governo
daquele país interesse na extradição..., em virtude da prescrição punitiva”, sem precisar o delito, diante
do que o então relator concluíra pelo prejuízo de todo o pedido e determinara a expedição do alvará de
soltura. Após o trânsito em julgado dessa decisão, o governo requerente manifestara seu interesse no
prosseguimento do feito em relação aos demais crimes, tendo o Min. Marco Aurélio, no exercício da
Presidência, decidido, ante o trânsito em julgado, que nada havia a providenciar. Em razão de novo
pedido formulado no mesmo sentido, o Min. Maurício Corrêa, também no exercício da Presidência,
determinara a distribuição do feito, decisão esta agravada.
Ext 775 Petição Avulsa-QO-AgR/República Argentina, rel. Min. Nelson Jobim, 9.6.2005. (Ext-775)
Decreto Expropriatório: Transmissão “Mortis Causa” e Partes Ideais - 2
O Tribunal retomou julgamento de mandado de segurança em que se pretende anular decreto
expropriatório de imóvel rural, sob a alegação de que este é explorado em condomínio, proveniente de
sucessão mortis causa, constituído por diversas partes ideais, cujas áreas não se qualificam,
individualmente, como grandes propriedades improdutivas passíveis de desapropriação – v. Informativo
389. O Min. Marco Aurélio, em voto-vista, acompanhou o voto do Min. Gilmar Mendes, relator, no
sentido de conceder a ordem, reiterando os fundamentos que expôs por ocasião do julgamento do MS
22045/ES (DJU de 30.6.95). Após, pediu vista dos autos a Min. Ellen Gracie.
MS 24573/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 9.6.2005. (MS-24573)
PRIMEIRA TURMA
Prisão Preventiva e HC de Ofício - 1
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus impetrado em favor de acusado pela suposta autoria
intectual do homicídio contra sua esposa em que se pretende a declaração de nulidade do processo, a
partir da denúncia, com o conseqüente relaxamento da prisão preventiva contra ele decretada. Alega-se,
na espécie: a) impossibilidade de investigação direta realizada pelo Ministério Público; b) impedimento
do promotor de justiça, por aplicação analógica do art. 252, II, combinado com o art. 258, ambos do CPP,
no caso de se admitir a referida investigação; c) se o membro do parquet não estiver impedido, a sua
suspeição para atuar na causa, em razão de incidente ocorrido, em audiência judicial, entre ele e a
principal testemunha; d) usurpação de competência do tribunal de justiça por juiz de primeiro grau para
julgar a exceção de impedimento ou de suspeição oposta ao promotor de justiça; e) complexidade do caso
a impedir que o julgamento da exceção acontecesse de plano; e) não cabimento da prisão cautelar, haja
vista que decretada com base apenas na situação econômica do paciente e que, em razão disso, poderia
evadir-se ou procrastinar o andamento do processo.
HC 85011/RS, rel. Min. Eros Grau, 7.6.2005. (HC-85011)
Prisão Preventiva e HC de Ofício - 2
O Min. Eros Grau, relator, indeferiu o writ conforme requerido, mas, de ofício, deferiu habeas
corpus para conceder liberdade provisória ao paciente, acompanhado pelo Min. Carlos Britto, na
integralidade, e pelos demais Ministros somente quanto à concessão de ofício. De início, salientou que a
questão relativa à legitimidade da investigação procedida pelo Ministério Público está sendo examinada
pelo Plenário do STF (Inq 1968/DF) e que, no caso concreto, as investigações não foram realizadas
exclusivamente pelo parquet. No ponto, informou que houvera instauração regular de inquérito policial,
com o posterior requerimento de peças pelo promotor, a teor do disposto no art. 47 do CPP, em virtude do
fato de a autoridade policial não conseguir reunir elementos sobre a autoria do fato criminoso. No tocante
à alegação de impedimento, aplicou a jurisprudência da Corte no sentido de que a participação de
membro do Ministério Público na fase investigativa não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o
oferecimento da denúncia. Entendeu, também, que a competência para julgar exceção de impedimento ou
de suspeição de promotor de justiça, conforme previsto no art. 104 do CPP, é da justiça de 1º grau,
facultado ao juiz deferir ou indeferir diligências probatórias. Em conseqüência, considerou prejudicado o
terceiro fundamento da impetração e ressaltou que há nos autos outros elementos de convicção além do
depoimento da aludida testemunha. Rejeitou, ainda, o argumento de que a exceção, por sua
complexidade, impediria o seu julgamento de plano, dado que esta fundara-se em incidente entre o
promotor e a testemunha, o que seria suficiente para afastar a suposta complexidade. Quanto à prisão
preventiva, asseverou que, apesar de não ter sido objeto de recurso ordinário no STJ, ela não está
amparada em fundamentos idôneos e em elementos concretos que certifiquem a necessidade de sua
manutenção. Por fim, após noticiar que a prisão cautelar fora confirmada na sentença de pronúncia,
aduziu que a convolação de título judicial não se traduz em prejudicialidade se os fundamentos tidos por
inidôneos são reproduzidos na sentença subseqüente. Concluiu, ademais, que a liberdade provisória
encontraria respaldo no excesso de prazo. Após, pediu vista o Min. Cezar Peluso.
HC 85011/RS, rel. Min. Eros Grau, 7.6.2005. (HC-85011)
RE Criminal: Descaminho e Princípio da Insignificância
Em recurso extraordinário criminal, a ausência de prequestionamento não impede a concessão de
habeas corpus de oficio quando a ilegalidade é flagrante e implica constrangimento à liberdade de
locomoção. Com base nesse entendimento, a Turma, resolvendo questão de ordem, negou provimento a
agravo de instrumento por ausência de prequestionamento, mas, concedeu habeas corpus, de ofício, para
restabelecer sentença que, aplicando o princípio da insignificância, rejeitara denúncia apresentada contra
o ora agravante pela suposta prática do crime de descaminho (CP, art. 334). No caso concreto, o TRF da
4ª Região, embora tenha considerado de pequena monta os impostos devidos, assim como irrelevante o
prejuízo causado, negara aplicação do aludido princípio ao fundamento de restar caracterizada a
habitualidade criminosa do agente. Asseverou-se que para a incidência do princípio da insignificância
somente devem ser considerados aspectos objetivos, referentes à infração praticada, tais como: mínima
ofensividade da conduta do agente; ausência de periculosidade social da ação; reduzido grau de
reprovabilidade do comportamento; inexpressividade da lesão jurídica causada. Destarte, concluiu-se que
para a caracterização de ato jurídico como insignificante são incabíveis considerações de ordem subjetiva,
consoante reputado pelo acórdão recorrido, que afastara a incidência do princípio da bagatela com base na
existência de vários registros contra o agravante pelo mesmo delito, ainda que não houvesse notícia de
condenação transitada em julgado. Por fim, afirmou-se que, em se tratando de ato insignificante, este
torna-se atípico, a impor o trancamento da ação penal por falta de justa causa. Precedentes citados: HC
84412/SP (DJU de 19.11.2004); HC 77003/PE (RTJ 178/310).
AI 559904 QO/RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 7.6.2005. (AI-559904)
Protocolo Integrado e Instância Extraordinária
A Turma remeteu ao Plenário julgamento de dois agravos regimentais em agravos de instrumento
em que se discute a aplicabilidade ou não do sistema de protocolo integrado na instância extraordinária.
Trata-se, na espécie, de decisão monocrática do Min. Carlos Britto, relator, que, ao fundamento de que o
sistema do protocolo integrado não se estende à instância extraordinária, negara provimento a agravo de
instrumento por considerar intempestivo recurso extraordinário, porquanto este deveria ter sido
protocolizado perante a secretaria do tribunal a quo.
AI 476260/SP e AI 507874/SP, rel. Min. Carlos Britto, 7.6.2005. (AI-476260)(AI-507874)
SEGUNDA TURMA
Crime de Imprensa e Competência do Juizado Especial
É da competência dos Juizados Especiais Criminais o julgamento de crime de imprensa, de menor
potencial ofensivo (Lei 10.529/2001, art. 2º: “Parágrafo único. Consideram-se infrações de menor
potencial ofensivo, para efeitos desta Lei, os crimes que a lei comine pena máxima não superior a dois
anos, ou multa.”). Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia a
declaração de incompetência do Juizado Especial Criminal e da ocorrência da prescrição da pretensão
punitiva em relação aos delitos imputados ao paciente, previstos nos artigos 21 e 22 da Lei 5.250/67
(difamação e injúria, respectivamente). Afastou-se a alegação de existência de procedimento especial para
os delitos mencionados, haja vista que, na espécie, a pena cominada, em ambos os crimes, não é superior
a dois anos. Ressaltou-se que o parágrafo único do art. 2º da Lei 10.529/2001, revogando o art. 61 da Lei
9.099/95, conferiu novo conceito a crime de menor potencial ofensivo, não excepcionando, tal como fazia
o dispositivo revogado, os crimes para os quais a lei preveja procedimento especial. Refutou-se, ademais,
a apontada prescrição, tendo em conta o atendimento dos prazos previstos no art. 41 da Lei 5.250/67, e
por se aplicarem, no caso, as causas interruptivas do art. 117, I e IV do CP.
HC 85694/MG, rel. Min. Ellen Gracie, 7.6.2005. (HC-85694)
“Bis In Idem” e Sentença Definitiva
Com base no disposto no art. 82 do CPP (“Se, não obstante a conexão ou continência, forem
instaurados processos diferentes, a autoridade de jurisdição prevalente deverá avocar os processos que
corram perante os outros juízes, salvo se já estiverem com sentença definitiva. Nesse caso, a unidade dos
processos se dará, ulteriormente, para efeito de soma ou de unificação das penas.”), a Turma deu
provimento parcial a recurso ordinário em habeas corpus, para anular sentença da Justiça Federal, que
condenara o ora recorrente pelos crimes previstos nos artigos 14 da Lei 6.368/76 e 180 do CP, na parte
relativa ao primeiro delito, com vistas a evitar dupla condenação pelo mesmo fato. Na espécie, o STJ
mantivera acórdão do TRF que indeferira habeas corpus, sob o entendimento de que a sentença da Justiça
Estadual é que deveria ser anulada, em face da absoluta incompetência para o julgamento. Considerou-se
a existência de sentença condenatória definitiva, referente ao crime do art. 14 da Lei 6.368/76, proferida
por Vara Criminal da Comarca do Rio de Janeiro, anterior à condenação no âmbito federal. Precedente
citado: HC 81617/MT (DJU de 28.6.2002).
RHC 84904/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 7.6.2005. (RHC-84904)
Responsabilidade Civil do Estado e Ato Omissivo
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de
Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que, aplicando o princípio da responsabilidade objetiva do
Estado, julgara procedente pedido formulado em ação indenizatória movida por vítimas de ameaça e de
estupro praticados por foragido do sistema penitenciário estadual, sob o fundamento de falha do Estado
na fiscalização do cumprimento da pena pelo autor do fato, que, apesar de ter fugido sete vezes, não fora
sujeito à regressão de regime. O Min. Carlos Velloso, relator, conheceu e deu provimento ao recurso para
afastar a condenação por danos morais imposta ao Estado, com base no entendimento firmado no RE
369820/RS (DJU de 27.2.2004), no sentido de que, em se tratando de ato omissivo do poder público, a
responsabilidade civil é subjetiva, a exigir demonstração de dolo ou culpa, não sendo, entretanto,
necessário individualizar esta última, uma vez que pode ser atribuída ao serviço público, de forma
genérica, a falta de serviço, a qual não dispensa o requisito da causalidade. Entendeu ausente, na espécie,
a demonstração da existência de nexo causal entre a fuga do apenado e o dano causado às recorridas.
Após, pediu vista o Min. Joaquim Barbosa. Leia o inteiro teor do voto do relator na seção Transcrições
deste Informativo.
RE 409203/RS, rel. Min. Carlos Velloso, 7.6.2005. (RE-409203)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
8.6.2005
7.6.2005
7.6.2005
Extraordinárias
9.6.2005
——
——
Julgamentos
23
407
95
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Responsabilidade Civil do Estado e Ato Omissivo (Transcrições)
RE 409203/RS*
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS
PÚBLICAS. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: ESTUPRO PRATICADO POR APENADO FUGITIVO.
RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALHA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º.
I. – Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo
ou culpa, esta numa de suas três vertentes, a negligência, a imperícia ou a imprudência, não sendo, entretanto, necessário
individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço.
II. – A falha do serviço — faute du service dos franceses — não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do
nexo de causalidade entre a ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro.
III. - Crime de estupro praticado por apenado fugitivo do sistema penitenciário do Estado: nesse caso, não há falar em
nexo de causalidade entre a fuga do apenado e o crime de estupro, observada a teoria, quanto ao nexo de causalidade, do
dano direto e imediato. Precedentes do STF: RE 369.820/RS, Ministro Carlos Velloso, “DJ” de 27.02.2004; RE 172.025/RJ,
Ministro Ilmar Galvão, “DJ” de 19.12.1996; RE 130.764/PR, Ministro Moreira Alves, RTJ 143/270.
IV. – RE conhecido e provido.
Relatório: O acórdão recorrido, em ação sob o rito ordinário, proferido pela Décima Câmara Cível do Eg. Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Sul, está assim ementado:
“RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. 1. Apenado em regime aberto que, durante fuga, invade residência e
pratica violência contra as moradoras, uma delas sendo vítima de estupro. Falha evidente do Estado na fiscalização do
cumprimento da pena pelo autor do fato, que, apesar de ter fugido em sete oportunidades, não foi sujeito à regressão de
regime. Confirmação da sentença de procedência, por seus próprios fundamentos, inclusive quanto ao valor arbitrado como
reparação dos danos morais. Homologação da desistência do apelo das autoras, restando prejudicado o recurso adesivo.
Sentença confirmada em reexame necessário.” (Fl. 260)
Daí o RE, interposto pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, fundado no art. 102, III, a, da Constituição Federal, com
alegação de ofensa ao art. 37, § 6º, da mesma Carta, sustentando, em síntese que o dano suportado pela recorrida decorreu
exclusivamente de ato de terceiro, não havendo falar em responsabilidade civil do Estado do Rio Grande do Sul. Ademais, inexiste
nexo causal entre a suposta falha do serviço estatal e o dano sofrido pela recorrida.
Admitido o recurso, subiram os autos.
A Procuradoria Geral da República, em parecer lavrado pelo ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner de
Castro Mathias Netto, opinou pelo não-conhecimento do recurso e, se conhecido, pelo não-provimento.
Autos conclusos em 10.3.2005.
É o relatório.
Voto: Trata-se de ação de indenização por danos morais contra o Estado do Rio Grande do Sul. Um apenado, fugitivo da prisão,
invadiu a casa das autoras e, portando arma, exigiu-lhes dinheiro. Não atendida a exigência do meliante, as autoras foram
submetidas a ameaças, sendo que uma delas, de 12 anos de idade, foi estuprada.
Pediram, então, indenização por danos morais ao Estado, por isso que “o indivíduo era foragido do sistema penitenciário estadual”
(fl. 261).
A ação foi julgada procedente em 1ª instância, confirmada a sentença pelo Tribunal de Justiça, mediante a aplicação do
princípio da responsabilidade objetiva do Estado. O acórdão admitiu ter havido “falha evidente do Estado na fiscalização do
cumprimento da pena pelo autor do fato, que, apesar de ter fugido em sete oportunidades, não foi sujeito à regressão de regime”
(fl. 260, ementa do acórdão).
Preliminarmente, o recurso é de ser conhecido, por isso que não se torna necessário, no caso, o exame da prova. O acórdão
esclarece os fatos e realiza a sua tipificação legal. O que nos cabe, agora, é verificar se essa tipificação está correta.
Passo ao exame do mérito.
Em caso semelhante, oriundo, aliás, do Rio Grande do Sul, RE 369.820/RS, por mim relatado, decidiu o Supremo Tribunal
Federal:
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS PÚBLICAS.
ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: LATROCÍNIO PRATICADO POR APENADO FUGITIVO. RESPONSABILIDADE
SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º.
I. – Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou
culpa, esta numa de suas três vertentes, a negligência, a imperícia ou a imprudência, não sendo, entretanto, necessário
individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço.
II. – A falta do serviço — faute du service dos franceses — não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de
causalidade entre a ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro.
III. – Latrocínio praticado por quadrilha da qual participava um apenado que fugira da prisão tempos antes: neste caso,
não há falar em nexo de causalidade entre a fuga do apenado e o latrocínio. Precedentes do STF: RE 172.025/RJ, Ministro
Ilmar Galvão, “D.J.” de 19.12.96; RE 130.764/PR, Relator Ministro Moreira Alves, RTJ 143/270.
IV. – RE conhecido e provido.” (“DJ” de 27.02.2004)
Assim o voto que proferi por ocasião do citado julgamento:
“(...)
A autora-recorrida e seu marido estavam num veículo estacionado às margens da BR 386, no Km 328, quando foram
assaltados por ‘um apenado fugitivo, em co-autoria com outros delinqüentes’, culminando o fato com a morte do marido da
autora. (fls. 310/313).
Anote-se, por primeiro, portanto: o marido da autora foi morto por ‘um apenado fugitivo, em co-autoria com outros
delinqüentes’, em número de quatro.
O Estado do Rio Grande do Sul, em razão disso, foi condenado, já que o homicídio fora praticado por um apenado foragido,
a indenizar a autora-recorrida por danos materiais e dano moral.
Está no voto em que se embasa o acórdão:
‘(...) O autor do dano tinha movimentadíssima folha de antecedentes, com prévias condenações. E o documento de fl.
249 faz certo que havia fugido em 20 de fevereiro de 1992, sendo recapturado em 27 de junho do mesmo ano. Ora, o
lastimável evento se deu em 22 de junho. Portanto, durante lapso temporal em que o assassino esteve foragido. E a
fuga de presídio, lançando-se à rua perigoso delinqüente corresponde à inequívoca falta do serviço.
O acórdão recorrido concluiu, assim, estar evidenciada a responsabilidade do Poder Público, em face da existência
de nexo causal entre o evento lesivo e o desempenho das tarefas estatais, considerada, especialmente, a circunstância
de o mesmo haver sido praticado por criminoso de alta periculosidade, em co-autoria com outros delinqüentes, ainda
que foragido há quatro meses e que a sua pena, à época, somasse quatro anos e três meses de reclusão, e não
cinqüenta e quatro anos, como depois fixada pelo Tribunal.
Ainda, os fatos evitam o argumento genérico de um mero dever de dar segurança, como se o Estado fosse responsável
por algum tipo de seguro de vida ou de patrimônio. Não é o caso. Na hipótese, é evidente a falta de serviço, em que
perigosíssimo delinqüente conseguiu fugir.
Fica claro, portanto, que o Estado deve responder pelo mal funcionamento de seus serviços, sempre que seu
funcionário for demorado, lento e vagaroso no desempenho dos mesmos e desse estado de letargia surgir o dano,
como referiu Ulderico Pires dos Santos, na obra A responsabilidade civil na doutrina e jurisprudência, Forense,
1984, p. 597. (...)’ (fl. 399).
II
No caso, o dano não resultou de ato praticado por agente público, mas foi causado mediante ato comissivo de terceiro. Terse-ia, portanto, ato omissivo do poder público.
No voto que proferi no RE 204.037/RJ, cuidei do tema: a responsabilidade do poder público por ato omissivo.
Destaco do voto que proferi:
‘(...)
O § 6º do art. 37 da CF dispõe:
‘Art.37. (...)
(...)
§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão
pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa.’
Em princípio, pois, a responsabilidade objetiva do poder público, assentada na teoria do risco administrativo, ocorre
por ato de seus agentes. Dir-se-á que o ato doagente público poderá ser omissivo. Neste caso, entretanto, exige-se a
prova da culpa. É que a omissão é, em essência, culpa, numa de suas três vertentes: negligência, que, de regra,
traduz desídia, imprudência, que é temeridade, e imperícia, que resulta de falta de habilidade (Álvaro Lazarini,
‘Responsabilidade Civil do Estado por Atos Omissivos dos seus Agentes’, em ‘Rev. Jurídica’, 162/125).
Celso Antônio Bandeira de Mello, dissertando a respeito do tema, deixa expresso que ‘o Estado só responde por
omissões quando deveria atuar e não atuou — vale dizer: quando descumpre o dever legal de agir. Em uma palavra:
quando se comporta ilicitamente ao abster-se.’ E continua: ‘A responsabilidade por omissão é responsabilidade por
comportamento ilícito. E é responsabilidade subjetiva, porquanto supõe dolo ou culpa em suas modalidades de
negligência, imperícia ou imprudência, embora possa tratar-se de uma culpa não individualizável na pessoa de tal
ou qual funcionário, mas atribuída ao serviço estatal genericamente. É a culpa anônima ou faute de service dos
franceses, entre nós traduzida por ‘falta de serviço’.
É que, em caso de ato omissivo do poder público, o dano não foi causado pelo agente público. E o dispositivo
constitucional instituidor da responsabilidade objetiva do poder público, art. 107 da CF anterior, art. 37, § 6º, da CF
vigente, refere-se aos danos causados pelos agentes públicos, e não aos danos não causados por estes, ‘como os
provenientes de incêndio, de enchentes, de danos multitudinários, de assaltos ou agressões que alguém sofra em vias
e logradouros públicos, etc.’ Nesses casos, certo é que o poder público, se tivesse agido, poderia ter evitado a ação
causadora do dano. A sua não ação, vale dizer, a omissão estatal, todavia, se pode ser considerada condição da
ocorrência do dano, causa, entretanto, não foi. A responsabilidade em tal caso, portanto, do Estado, será subjetiva.
(Celso Antônio Bandeira de Mello, ‘Responsabilidade Extracontratual do Estado por Comportamentos
Administrativos’, em ‘Rev. dos Tribs.’, 552/11, 13 e 14; ‘Curso de Direito Administrativo’, em ‘Rev. dos Tribs.’,
552/11, 13 e 14; ‘Curso de Direito Administrativo’, Malheiros Ed. 5º ed., pp. 489 e segs.).
Não é outro o magistério de Hely Lopes Meirelles: ‘o que a Constituição distingue é o dano causado pelos agentes da
Administração (servidores) dos danos ocasionados por atos de terceiros ou por fenômenos da natureza. Observe-se
que o art. 37, § 6º, só atribui responsabilidade objetiva à Administração pelos danos que seus agentes, nessa
qualidade, causem a terceiros. Portanto o legislador constituinte só cobriu o risco administrativo da atuação ou
inação dos servidores públicos; não responsabilizou objetivamente a Administração por atos predatórios de
terceiros, nem por fenômenos naturais que causem danos aos particulares’. A responsabilidade civil por tais atos e
fatos é subjetiva. (Hely Lopes Meirelles, ‘Direito Administrativo Brasileiro’, Malheiros Ed., 21ª ed., 1996, p. 566).
Esta é, também, a posição de Lúcia Valle Figueiredo, que, apoiando-se nas lições de Oswaldo Aranha Bandeira de
Mello e Celso Antônio Bandeira de Mello, leciona que ‘ainda que consagre o texto constitucional a responsabilidade
objetiva, não há como se verificar a adequabilidade da imputação ao Estado na hipótese de omissão, a não ser pela
teoria subjetiva’. E justifica: é que, ‘se o Estado omitiu-se, há de se perquirir se havia o dever de agir. Ou, então, se a
ação estatal teria sido defeituosa a ponto de se caracterizar insuficiência da prestação de serviço.’(Lúcia Valle
Figueiredo, ‘Curso de Direito Administrativo’, Malheiros Ed., 1994, p. 172).
Desse entendimento não destoa a professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro (‘Direito Administrativo’, Ed. Atlas, 5ª
ed., 1995, p.415).
Posta a questão em tais termos, força é concluir, no caso, pelo não-conhecimento do recurso, dado que, conforme
vimos, a versão fática do acórdão é que não houve culpa do servidor da empresa ao não impedir a ocorrência do
fato, nem é possível presumir, no caso, a faute de service, ou a culpa anônima, vale dizer, a culpa que poderia ser
atribuída ao serviço estatal de forma genérica.
(...)’ (RTJ 179/797-798).
Maria Helena Diniz também sustenta que a responsabilidade do Estado por ato omissivo é subjetiva (‘Cód. Civil Anotado’,
Saraiva, 4ª ed., pág. 31).
De outro lado, há juristas que entendem que a responsabilidade estatal por ato omissivo é objetiva. Assim, por exemplo,
Yussef Said Cahali (‘Responsabilidade Civil do Estado’, Malheiros Ed., 2ª ed., 1995, pág. 40), Odete Medauar (‘Direito
Administrativo Moderno’, Ed. R.T., 4ª ed., 2000, pág. 430) e Celso Ribeiro Bastos (‘Curso de Direito Administrativo’,
Saraiva, 3ª ed., 1999, p. 190), dentre outros.
No voto que proferi no RE 204.037/RJ, retrotranscrito, mencionei que Hely Lopes Meirelles adotara a responsabilidade
subjetiva na hipótese de ações omissivas do poder público. Agora, melhor examinando a obra do saudoso e notável mestre,
reconheço o meu engano. Hely Lopes Meirelles, na verdade, sustentava a teoria da responsabilidade objetiva do Estado
pelos atos comissivos e omissivos dos seus agentes. ‘O essencial é que o agente da Administração haja praticado o ato ou a
omissão administrativa no exercício de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las.’ (‘Direito Administrativo Brasileiro’,
Malheiros Ed., 24ª ed., 1999, pág. 589). Continua: ‘O que a Constituição distingue é o dano causado pelos agentes da
Administração (servidores) dos danos ocasionados por atos de terceiros ou por fenômenos da natureza. Observe-se que o
art. 37, § 6º, só atribui responsabilidade objetiva à Administração pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causem a
terceiros.’ (grifei). E acrescenta, esclarecendo: ‘Portanto, o legislador constituinte só cobriu o risco administrativo da
atuação ou inação dos servidores públicos; não responsabilizou objetivamente a Administração por atos predatórios de
terceiros, (...)’ (‘Direito Administrativo Brasileiro’, Malheiros Ed., 24ª ed., 1999, págs. 589/590). Ora, no citado RE
204.037/RJ, cuidávamos de ato praticado por terceiro, no interior de veículo de transporte coletivo, assim de concessionária
do serviço público.
O Supremo Tribunal Federal, pela sua 1ª Turma, no RE 109.615/RJ, Relator o Ministro Celso de Mello, decidiu no sentido
de que é objetiva a responsabilidade do Estado ‘pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou
por omissão.’ (RTJ 163/1.107).
III
No caso, o acórdão decidiu pela ocorrência da falta do serviço.
A falta do serviço decorre do não-funcionamento ou do funcionamento insuficiente, inadequado, tardio ou lento do serviço
que o poder público deve prestar.
No RE 179.147/ SP, por mim relatado, decidiu esta 2ª Turma que ‘tratando-se de ato omissivo do poder público, a
responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, numa de suas três vertentes, negligência,
imperícia ou imprudência, não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço
público, de forma genérica, a faute du service dos franceses.’ (RTJ 179/791).
IV
Todavia, a faute du service não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre a ação
omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro. O Ministro Moreira Alves, no voto que proferiu no RE
130.764/PR, lecionou que ‘a teoria adotada quanto ao nexo de causalidade é a teoria do dano direto e imediato, também
denominada teoria da interrupção do nexo causal’, que ‘sem quaisquer considerações de ordem subjetiva, afasta os
inconvenientes das outras duas teorias existentes: a da equivalência das condições e a da causalidade adequada’ (cf. Wilson
Mello da Silva, ‘Responsabilidade sem culpa’, nºs. 78 e 79, págs. 128 e seguintes, Ed. Saraiva, São Paulo, 1974). Essa
teoria, como bem demonstra Agostinho Alvim (‘Da Inexecução das Obrigações’, 5ª ed., nº 226, pág. 370, Ed. Saraiva, São
Paulo, 1980), só admite o nexo de causalidade quando o dano é efeito necessário de uma causa, o que abarca o dano direto
e imediato sempre, e, por vezes, o dano indireto e remoto, quando, para a produção deste, não haja concausa sucessiva.
Daí, dizer Agostinho Alvim (1. c): ‘os danos indiretos ou remotos não se excluem, só por isso; em regra, não são
indenizáveis, porque deixam de ser efeito necessário, pelo aparecimento de concausas. Suposto não existam estas, aqueles
danos são indenizáveis.’ (RE 130.764/PR, RTJ 143/270, 283).
V
A questão a ser posta, agora, é esta: a fuga de um apenado da prisão, vindo este, tempos depois, integrando quadrilha de
malfeitores, assassinar alguém, implica obrigação de indenizar por parte do poder público, sob color de falta do serviço?
No citado RE 130.764/PR, da relatoria do Ministro Moreira Alves, cuidou-se de tema semelhante ao aqui tratado. Ali, a
espécie versada foi a seguinte: bando de marginais, integrado por dois evadidos de prisões estaduais, invadiu residência e,
dominando a família, apossou-se de bens desta, levando o terror às pessoas, agredindo o dono da casa e causando elevado
prejuízo à família. Proposta a ação de indenização, reconheceram as instâncias ordinárias a responsabilidade civil do
Estado, condenando-o a compor os danos materiais, mediante a aplicação da responsabilidade objetiva e invocando a falta
do serviço. Decidiu, então, o Supremo Tribunal Federal, no mencionado RE 130.764/PR:
‘EMENTA: Responsabilidade Civil do Estado. Dano decorrente de assalto por quadrilha de que fazia parte preso
foragido vários meses antes.
- A responsabilidade do Estado, embora objetiva por força do disposto no artigo 107 da Emenda Constitucional nº
1/69 (e, atualmente, no § 6º do artigo 37 da Carta Magna), não dispensa, obviamente, o requisito, também objetivo,
do nexo de causalidade entre a ação ou a omissão atribuída a seus agentes e o dano causado a terceiros.
- Em nosso sistema jurídico, como resulta do dispositivo no artigo 1.060 do Código Civil, a teoria adotada quanto ao
nexo de causalidade é a teoria do dano direto e imediato, também denominada teoria da interrupção do nexo causal.
Não obstante aquele dispositivo da codificação civil diga respeito à impropriamente denominada responsabilidade
contratual, aplica-se ele também à responsabilidade extracontratual, inclusive a objetiva, até por ser aquela que, sem
quaisquer considerações de ordem subjetiva, afasta os inconvenientes das outras duas teorias existentes: a da
equivalência das condições e a da causalidade adequada.
- No caso, em face dos fatos tidos como certos pelo acórdão recorrido, e com base nos quais reconheceu ele o nexo
de causalidade indispensável para o reconhecimento da responsabilidade objetiva constitucional, é inequívoco que o
nexo de causalidade inexiste, e, portanto, não pode haver a incidência da responsabilidade prevista no artigo 107 da
Emenda Constitucional nº 1/69, a que corresponde o § 6º do artigo 37 da atual Constituição. Com efeito, o dano
decorrente do assalto por uma quadrilha de que participava um dos evadidos da prisão não foi o efeito necessário da
omissão da autoridade pública que o acórdão recorrido teve como causa da fuga dele, mas resultou de concausas,
como a formação da quadrilha, e o assalto ocorrido cerca de vinte e um meses após a evasão.
- Recurso extraordinário conhecido e provido.’ (‘D.J.’ de 07.8.92).
No RE 172.025/RJ, Relator o Ministro Ilmar Galvão, decidiu o Supremo Tribunal Federal:
‘EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
LATROCÍNIO PRATICADO POR PRESO FORAGIDO, MESES DEPOIS DA FUGA.
Fora dos parâmetros da causalidade não é possível impor ao Poder Público uma responsabilidade ressarcitória sob
o argumento de falha no sistema de segurança dos presos.
Precedente da Primeira turma: RE 130.764, Relator Ministro Moreira Alves.
Recurso extraordinário não conhecido.’ (‘D.J.’ de 19.12.96).
Nesse RE 172.025/RJ, cuidou-se de ação de reparação de dano proposta contra o Estado do Rio de Janeiro, com base no
art. 107 da CF/67, por ter sido o marido da autora vítima de latrocínio praticado por presidiário foragido.
Caso igual, portanto, ao que examinamos aqui.
(...).”
O caso aqui tratado é igual ao que foi examinado e decidido no RE 369.820/RS, acima transcrito.
Não há dúvida que, no caso, houve falha do serviço, a faute du service dos franceses. Esta, todavia, não prescinde da
demonstração do nexo de causalidade. É dizer, no caso, deveria estar demonstrado o nexo de causalidade entre a fuga do apenado e
o lamentável fato ocorrido, certo que há de ser observada a teoria, quanto ao nexo de causalidade, do dano direto e imediato.
Não há possibilidade, portanto, da adoção, no caso sob julgamento, da falha do serviço.
Do exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento.
* julgamento pendente de conclusão em virtude do pedido de vista do Min. Joaquim Barbosa
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 392
Brasília, 13 a 17 de junho de 2005 Nº 392
Data (páginas internas): 22 de junho de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
ADPF e Monopólio das Atividades Postais – 1
ADPF e Monopólio das Atividades Postais – 2
Serventias: Substituto e Titularidade sem Concurso Público
Recurso Precoce e Tempestividade
Precatório: Erro de Valor e Ordem Cronológica
1ª Turma
Competência Municipal e Tempo em Fila de Banco
2ª Turma
Inelegibilidade de Parentes Afins e Separação de Fato
Clipping do DJ
Transcrições
CNMP: EC 45/2004 e Vício Formal (ADI 3472 MC/DF)
PLENÁRIO
ADPF e Monopólio das Atividades Postais - 1
O Tribunal iniciou julgamento de argüição de descumprimento de preceito fundamental proposta
pela Associação Brasileira das Empresas de Distribuição – ABRAED, em que se pretende a declaração da
não-recepção, pela CF/88, da Lei 6.538/78, que instituiu monopólio das atividades postais pela Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT. O Min. Marco Aurélio, relator, após afastar a preliminar de
ilegitimidade ativa e reputar atendidos os pressupostos de que trata o art. 3º da Lei 9.882/99, acolheu o
pedido formulado para declarar a não-recepção pela CF/88 dos artigos da Lei 6.538/78 que disciplinaram
o regime da prestação de serviço postal como monopólio exclusivo da União, ao fundamento de que eles
violam os princípios da livre iniciativa, da liberdade no exercício de qualquer trabalho, da livre
concorrência e do livre exercício de qualquer atividade econômica (CF, arts. 1º, IV; 5º, XIII; 170, caput,
IV e parágrafo único, respectivamente). Ressaltando, inicialmente, a necessidade de se interpretar a
Constituição de modo a lhe dar a maior eficácia possível, diante da realidade vigente, considerou que a
expressão “manter o serviço postal”, contida no inciso X do art. 21 da CF, inserida na primeira
Constituição e repetida nas seguintes, teria adquirido alcance diverso com o passar do tempo, evoluindo
no sentido de significar, no contexto social presente, não mais monopólio, mas um conjunto de serviços
que a União deve garantir e, eventualmente, prestar de forma direta, se inexistente interesse econômico
para o desenvolvimento da atividade em certos locais do território brasileiro. Considerou, para tanto, as
mutações ocorridas no Direito Administrativo brasileiro, decorrentes da gradativa redução da participação
direta do Estado na atividade econômica, em razão do reconhecimento da sua ineficiência na prestação de
serviços públicos e na realização dos investimentos tecnológicos necessários à melhoria dos mesmos,
salientando, no ponto, em relação à ECT, as diversas falhas observadas em sua administração, o atraso
tecnológico, e os elevados custos e preços dos serviços prestados. Diante disso, concluiu não ter sido
recepcionado, pela CF/88, o monopólio do serviço postal, inclusive, por inexistir previsão a ele relativa
no texto constitucional, o qual seria exaustivo quanto à instituição do monopólio na atividade econômica
(CF, arts. 21, XXIII, e 177). Asseverou que, em prol da preservação do interesse público, a atuação do
Estado deveria ser subsidiária, afastando-se sua intervenção desnecessária em área sustentada, de forma
satisfatória, pelo setor privado – titular da atividade econômica, permitindo, dessa forma, a liberdade de
iniciativa e de concorrência, passando o Estado a posicionar-se como agente normativo e regulador das
atividades econômicas, nos termos do disposto no art. 174 da CF. Isso por melhor atender ao interesse da
coletividade a garantia de que o serviço postal seja prestado em regime de concorrência entre as várias
empresas do mercado consumidor, eis que esse modelo promove o aperfeiçoamento tecnológico, a
redução dos custos operacionais e dos preços dos serviços. Entendeu ainda que, ao se reconhecer que a
atividade econômica não é própria do Estado, seria dispensável definir-se serviço postal ou como serviço
público ou como atividade econômica em sentido estrito, sendo, ademais, possível a existência de duplo
regime (público e privado) na realização da referida atividade.
ADPF 46/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 15.6.2005. (ADPF-46)
ADPF e Monopólio das Atividades Postais - 2
Prosseguindo no julgamento, o Min. Eros Grau divergiu e julgou improcedente o pedido. Tendo em
conta a orientação fixada pelo Supremo na ACO 765 QO/RJ (pendente de publicação), no sentido de que
o serviço postal constitui serviço público, portanto, não atividade econômica em sentido estrito,
considerou inócua a argumentação em torno da ofensa aos princípios da livre iniciativa e da livre
concorrência. Distinguindo o regime de privilégio de que se reveste a prestação dos serviços públicos do
regime de monopólio, afirmou que os regimes jurídicos sob os quais são prestados os serviços públicos
implicam que sua prestação seja desenvolvida sob privilégios, inclusive, em regra, o da exclusividade na
exploração da atividade econômica em sentido amplo a que corresponde essa prestação, haja vista que
exatamente a potencialidade desse privilégio incentiva a prestação do serviço público pelo setor privado
quando este atua na condição de concessionário ou permissionário. Asseverou, que a prestação do serviço
postal por empresa privada só seria possível se a CF afirmasse que o serviço postal é livre à iniciativa
privada, tal como o fez em relação à saúde e à educação, que são serviços públicos, os quais podem ser
prestados independentemente de concessão ou permissão por estarem excluídos da regra do art. 175, em
razão do disposto nos artigos 199 e 209 (CF: “Art. 175. Incumbe ao poder público, na forma da lei,
diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de
serviços públicos. ... Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada. ... Art. 209. O ensino é
livre à iniciativa privada.”). Ressaltou que o serviço postal é prestado pela ECT, empresa pública criada
pelo Decreto-Lei 509/69, que foi recebido pela CF/88, a qual deve atuar em regime de exclusividade (em
linguagem técnica, em situação de privilégio, e, em linguagem corrente, em regime de monopólio),
estando o âmbito do serviço postal bem delineado nos artigos 70 e seguintes da Lei 6.538/78, também
recebida pela CF/88. Por fim, julgando insuficiente a atuação subsidiária do Estado para solução dos
conflitos da realidade nacional, considerou que, vigentes os artigos 1º e 3º da CF, haver-se-ia de exigir um
Estado forte e apto a garantir a todos uma existência digna, sendo incompatível com a Constituição a
proposta de substituição do Estado pela sociedade civil. O julgamento foi suspenso com o pedido de vista
do Min. Joaquim Barbosa.
ADPF 46/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 15.6.2005. (ADPF-46)
Serventias: Substituto e Titularidade sem Concurso Público
Por vislumbrar aparente ofensa ao § 3º do art. 236 da CF (“Art. 236. ... § 3º - O ingresso na
atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que
qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis
meses.”), o Tribunal concedeu medida liminar em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela
Associação dos Notários e Registradores do Brasil - ANOREG/BR, para suspender, com efeitos ex tunc, a
eficácia o § 7º do art. 231 da Lei Complementar 165/99, alterado pela Lei Complementar 294/2005,
ambas do Estado do Rio Grande do Norte, que determina que o substituto de serventia será enquadrado,
na vacância, como titular do respectivo serviço, desde que seja bacharel em direito e conte com mais de 3
anos de efetivo exercício na substituição da serventia vaga.
ADI 3519 MC/RN, rel. Min. Joaquim Barbosa, 16.6.2005. (ADI-3519)
Recurso Precoce e Tempestividade
É tempestivo, por possuir objeto próprio, o recurso interposto contra decisão já juntada aos autos,
ainda que não publicada no Diário de Justiça. Tendo em conta esse entendimento, fixado pela 1ª Turma
no AI 497477 AgR/ PR (DJU de 8.10.2004), o Tribunal deu provimento a agravo regimental interposto
contra decisão que negara seguimento a outro agravo regimental em ação originária, por considerá-lo
intempestivo.
AO 1133 AgR-AgR/DF, rel. Min. Carlos Britto, 16.6.2005. (AO-1133)
Precatório: Erro de Valor e Ordem Cronológica
Constado erro de valor de precatório, há de se considerar, para efeito de ordem cronológica de
pagamento, a data da requisição do montante efetivamente devido. Com esse entendimento, o Tribunal
julgou procedente pedido formulado em reclamação ajuizada pelo Estado da Paraíba contra o Tribunal de
Justiça do mesmo Estado, para, reconhecendo descumprido o acórdão proferido na ADI 1662/SP (DJU de
19.9.2003), afastar ordem de seqüestro. Na espécie, em 1999, fora expedido precatório, cujo valor,
incluído no orçamento de 2000, fora impugnado, tendo sido apurada, em 2003, quantia significativamente
menor, com a qual concordaram os credores. Diante disso, o Presidente do TJ-PB, considerando a data do
precatório anterior (2000), requisitara o pagamento imediato do novo montante. Ressaltou-se que, ante a
erronia do valor do precatório inicial, não obstante sua inclusão no orçamento de 2000, não poderia
subsistir a ordem de seqüestro, eis que apenas em 2003 surgira o valor realmente devido, conferindo
liquidez ao título.
Rcl 2768/PB, rel. Min. Marco Aurélio, 16.6.2005. (RCL-2768)
PRIMEIRA TURMA
Competência Municipal e Tempo em Fila de Banco
O município é competente para dispor sobre o tempo de atendimento ao público nas agências
bancárias localizadas no seu respectivo território. Com base nesse entendimento, a Turma deu provimento
a recurso extraordinário interposto pelo Coordenador do Procon do Município de Criciúma - SC para
manter a vigência da Lei Municipal 4.188/2001, que dispõe sobre o tempo que os usuários passam na fila,
à espera de atendimento. Considerou-se que o tema diz respeito a interesse local e não às atividades-fim
das instituições financeiras. Entendeu-se que a referida norma não dispõe sobre política de crédito,
câmbio, seguros e transferência de valores (CF, art. 22, VII), não regula organização, funcionamento e
atribuições de instituições financeiras, bem como não envolve transgressão da competência reservada ao
Congresso Nacional para tratar sobre matéria financeira e funcionamento das instituições financeiras (CF,
art. 48, XIII) e, tampouco refere-se à estruturação do sistema financeiro nacional, matéria que, nos termos
do art. 192 da CF, será regulada por lei complementar. Asseverou-se que essa lei limita-se a impor regras
tendentes a assegurar adequadas condições de atendimento ao público na prestação de serviços ao
consumidor-cliente. Ademais, ressaltou-se que a proteção aos direitos do consumidor inclui-se no âmbito
dos assuntos de interesse local. Precedentes citados: RE 312050/MS (DJU de 6.5.2005) e RE 208383/SP
(DJU de 7.6.99).
RE 432789/SC, rel. Min. Eros Grau, 14.6.2005. (RE-432789)
SEGUNDA TURMA
Inelegibilidade de Parentes Afins e Separação de Fato
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do TSE que
mantivera decisão que declarara a inelegibilidade do recorrente, em virtude do seu grau de parentesco por
afinidade com o então prefeito, seu sogro, cassando, em conseqüência, o registro de sua candidatura ao
cargo de prefeito nas eleições de outubro de 2004. Alega o recorrente que a sua situação não se
enquadraria na hipótese de inelegibilidade prevista no art. 14, §7º da CF (“São inelegíveis, no território
de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por
adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de
Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de
mandato eletivo e candidato à reeleição.”), uma vez que seu divórcio transitara em julgado no curso do
mandato de seu sogro, candidato à reeleição. A Min. Ellen Gracie, relatora, deu provimento ao recurso
para restabelecer o registro de candidatura do ora recorrente, no que foi acompanhada pelo Min. Joaquim
Barbosa. Inicialmente a relatora registrou que o recorrente fora eleito para o cargo. Em seguida,
ressaltando a peculiaridade de que restara comprovada, na sentença que decretara o divórcio, a separação
de fato do casal antes do início do mandato do sogro do recorrente, afastou a cláusula de inelegibilidade.
Afirmou que a regra estabelecida no art. 14, §7º da CF, visa impedir o monopólio do poder político por
grupos hegemônicos ligados por laços familiares. Nesse ponto, rejeitou suposta argumentação no sentido
de desfazimento fraudulento do vínculo conjugal com o objetivo de manter a família no poder, já que,
concorrendo somente o recorrente e o seu sogro, a vitória daquele não ensejaria a impugnação da
candidatura por parte da coligação pela qual disputara o sogro. Por fim, adotando interpretação
teleológica do referido dispositivo constitucional, entendeu que o acórdão recorrido merece reforma,
repelida a possibilidade de perpetuação de grupo oligárquico no poder local, quer pela extinção dos laços
de parentesco antes do período vedado, quer pela ilogicidade de hipotética fraude. Após, pediu vista o
Min. Carlos Velloso.
RE 446999/PE, rel. Min. Ellen Gracie, 14.6.2005. (RE-446999)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
15.6.2005
14.6.2005
14.6.2005
Extraordinárias
16.6.2005
——
——
Julgamentos
20
570
483
CLIPPING
DO
DJ
17 de junho de 2005
QO EM AG. REG. NA Pet N. 1.318-DF
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
EMENTA: MEDIDA LIMINAR CONCEDIDA, EM SEDE DE PROCEDIMENTO CAUTELAR, PELO PRESIDENTE DO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - SUSPENSÃO DA EFICÁCIA EXECUTIVA DESSE PROVIMENTO LIMINAR, POR
DETERMINAÇÃO DO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (LEI Nº 8.437/92, ART. 4º) - POSTERIOR
CASSAÇÃO, PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, DA MEDIDA LIMINAR QUE HAVIA SIDO DEFERIDA POR
SEU PRESIDENTE - DESISTÊNCIA, PELA EMPRESA AGRAVANTE, DO RECURSO ESPECIAL POR ELA INTERPOSTO
PERANTE O TRIBUNAL “A QUO” - INSUBSISTÊNCIA DO PROCESSO PRINCIPAL - CONSEQÜENTE EXTINÇÃO DO
PROCEDIMENTO CAUTELAR E DA MEDIDA DE CONTRACAUTELA - RELAÇÃO DE ACESSORIEDADE ENTRE A
CAUSA PRINCIPAL E A MEDIDA CAUTELAR - RECURSO DE AGRAVO PREJUDICADO.
- A medida de contracautela, deferida com fundamento no art. 4º da Lei nº 8.437/92, não pode subsistir autonomamente, se o ato
sobre o qual ela incide - e cuja eficácia buscava neutralizar - já não mais existe, em virtude da circunstância de o próprio Superior
Tribunal de Justiça, em julgamento colegiado e em sede recursal, haver reformado a decisão emanada do Presidente daquela E.
Corte judiciária.
A medida de contracautela autorizada pelo art. 4º da Lei nº 8.437/92 não existe nem subsiste em função de si própria. Supõe, para
efeito de sua concessão, a efetiva existência de um provimento judicial, ainda eficaz, reputado lesivo ao interesse público e sobre o
qual a medida de contracautela deve incidir com eficácia neutralizadora de suas conseqüências jurídicas.
- Entre o processo cautelar e as demais categorias procedimentais, há inequívoca relação de acessoriedade. A tutela cautelar
não existe em função de si própria. Supõe, por isso mesmo, para efeito de sua concessão, a perspectiva de um processo principal.
- Uma vez extinta a causa principal, cessa, de pleno direito, a eficácia do provimento cautelar a ela referente (CPC, art. 808, III).
Com o advento desse fato, torna-se ineficaz, em virtude da perda superveniente de seu objeto, a medida de contracautela que
havia sido concedida para inibir os efeitos do provimento cautelar anteriormente deferido.
HC N. 69.179-RJ
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
EMENTA: “HABEAS CORPUS” - JÚRI - ALEGADA NULIDADE DO PROCEDIMENTO PENAL POR AUSÊNCIA DO
EXAME DE CORPO DE DELITO - INOCORRÊNCIA - EFETIVA APRESENTAÇÃO DE LAUDO PERICIAL INCONSISTÊNCIA DA ALEGAÇÃO DE SUPOSTA QUEBRA DE INCOMUNICABILIDADE DOS JURADOS PRESUNÇÃO “JURIS TANTUM” DE VERACIDADE DOS ATOS DOS SERVENTUÁRIOS E DOS OFICIAIS DE JUSTIÇA REITERAÇÃO DOS DEMAIS FUNDAMENTOS DA IMPETRAÇÃO - PEDIDO INDEFERIDO.
- A efetiva realização do exame de corpo de delito direto - consubstanciado, formalmente, em laudo pericial - descaracteriza a
mera alegação de sua ausência.
- As declarações emanadas dos Serventuários e dos Oficiais de Justiça, consubstanciadas nas certidões e termos que exaram no
regular exercício de suas atribuições funcionais, revestem-se de presunção “juris tantum” de veracidade. Essa presunção legal,
ainda que relativa e infirmável por prova em contrário, milita em favor dos atos praticados pelos Escrivães do Juízo e pelos
Oficiais de Justiça, seja porque gozam de fé pública, inerente ao relevante ofício que desempenham, seja porque tais atos
traduzem formal manifestação do próprio Estado.
As certidões emanadas desses agentes auxiliares do Juízo têm fé pública e prevalecem até que se produza prova idônea e
inequívoca em sentido contrário. Meras alegações não descaracterizam o conteúdo de veracidade que se presume existente nesses
atos processuais.
- Inocorre transgressão à norma inscrita no art. 458, § 1º, do CPP, não se viabilizando, em conseqüência, a declaração de nulidade
processual (CPP, art. 564, III, “j”), se - consoante resulta do termo assinado pelo magistrado e pelo escrivão - os jurados, após
sorteados, não se comunicaram entre si, ou com terceiros, nem manifestaram sua opinião sobre o processo, sendo incontroverso,
ainda, que, findos os debates, recolheram-se à sala secreta, sob a presidência do juiz e fiscalização das partes, para a votação dos
quesitos. Plena observância, no caso, da exigência legal da incomunicabilidade dos membros do Conselho de Sentença.
HC N. 70.175-RS
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
EMENTA: “HABEAS CORPUS” - DESENTRANHAMENTO DA DEFESA PRÉVIA DEDUZIDA EXTEMPORANEAMENTE
- POSSIBILIDADE - ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA POR FALTA DESSA PEÇA PROCESSUAL INOCORRÊNCIA - NÃO-CARACTERIZAÇÃO DE PREJUÍZO PARA O RÉU - ALEGADA FALTA DE INTIMAÇÃO DO
RÉU QUANTO À SENTENÇA DE PRONÚNCIA - EXISTÊNCIA DE CERTIDÃO QUE COMPROVA A OCORRÊNCIA DE
DUPLA INTIMAÇÃO (DEFENSOR E RÉU) - PRESUNÇÃO “JURIS TANTUM” DE VERACIDADE - CONTRARIEDADE
AO LIBELO APRESENTADA POR DEFENSOR DATIVO DIVERSO DAQUELE NOMEADO E COMPROMISSADO INCONSISTÊNCIA DESSA ALEGAÇÃO - INDICAÇÃO, EM PLENÁRIO, FEITA PELO RÉU, DE SEU NOVO DEFENSOR
- NÃO-CONFIGURAÇÃO DE NULIDADE PROCESSUAL - PRETENDIDA OCORRÊNCIA DE CONFLITO ENTRE AS
DEFESAS DO PACIENTE E DO CO-RÉU, FEITAS PELO MESMO ADVOGADO - SITUAÇÃO NÃO CARACTERIZADA COMPATIBILIDADE DAS TESES SUSTENTADAS - PEDIDO INDEFERIDO.
- Se o réu, por seu defensor, ainda que dativo, deixa de oferecer, no prazo legal, a defesa prévia, vindo a produzi-la,
extemporaneamente, torna-se lícito ao magistrado ordenar o desentranhamento dessa peça processual, sem que tal determinação
configure ofensa a garantia constitucional do contraditório e da plenitude de defesa. Precedentes.
- As declarações dos Serventuários e dos Oficiais de Justiça, consubstanciadas nas certidões que exaram no regular exercício de
suas atribuições funcionais, revestem-se de presunção “juris tantum” de veracidade.
Essa presunção legal, ainda que relativa e infirmável por prova em contrário, milita em favor dos atos praticados pelos Escrivães
do Juízo e pelos Oficiais de Justiça, seja porque gozam de fé pública, inerente ao ofício que desempenham, seja porque traduzem
formal manifestação do próprio Estado.
- A falta de assinatura, pelo defensor dativo, do termo de compromisso não constitui, só por si, causa de nulidade do processo,
ainda mais quando o réu, ele próprio, indicou, em plenário, esse mesmo Advogado para exercer a defesa técnica.
- Para que se configure a hipótese de defesas conflitantes, que constitui situação apta a infirmar a própria validade do processo
penal de conhecimento, torna-se imperioso constatar, de modo inequívoco, que há, entre as defesas apresentadas pelo mesmo
Advogado, uma irredutível e substancial posição de contraste capaz de tornar absolutamente ineficaz, em relação a um dos coréus, a própria intervenção defensiva do seu patrono. Hipótese inocorrente na espécie em exame.
RE N. 135.243-DF
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO - MATÉRIA PENAL - FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS PÚBLICOS
MEDIANTE INSERÇÃO DE DADOS FICTÍCIOS EM REGISTROS MANTIDOS POR ÓRGÃOS DA UNIÃO FEDERAL
(COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL) - POSTERIOR INCLUSÃO, EM CARTEIRA DE TRABALHO E PREVIDÊNCIA
SOCIAL, DE FALSA ANOTAÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO, FEITA COM O INTUITO DE OBTER CRÉDITO EM
ESTABELECIMENTO COMERCIAL (COMPETÊNCIA PENAL DA JUSTIÇA ESTADUAL) - CONEXÃO DE CAUSAS UNIDADE DE PROCESSO E JULGAMENTO (“SIMULTANEUS PROCESSUS”) - PREVALÊNCIA DA COMPETÊNCIA
PENAL DA JUSTIÇA FEDERAL, POR TRATAR-SE DE ATRIBUIÇÃO DE ÍNDOLE EMINENTEMENTE
CONSTITUCIONAL - PRECEDENTES - RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO-CONHECIDO.
RHC N. 80.967-GO
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Recurso ordinário ou habeas corpus substitutivo: inexigibilidade de prequestionamento explícito do fundamento
de incompetência do órgão prolator da decisão questionada.
1. O órgão jurisdicional que decide sobre o mérito de uma impetração de habeas corpus afirma, ainda que implicitamente, a sua
competência para conhecer do pedido: por isso, a alegação de sua incompetência pode ser suscitada em recurso ordinário ou
impetração dele substitutiva, porquanto independem de prequestionamento.
2. RHC provido para que o STJ - malgrado não haja o acórdão da Câmara do Tribunal local afirmado explicitamente a sua
competência - decida do pedido fundado na incompetência o órgão a quo.
* noticiado no Informativo 232
AG. REG. NA MC NO HC N. 84.523-PE
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
SURSIS PROCESSUAL. LEI 9099/95. CONCURSO MATERIAL.
Inadmissível, na hipótese de concurso material, a consideração da pena mínima de cada um dos delitos, isoladamente. Se a soma das
penas mínimas ultrapassar o limite de um ano, não há cogitar do sursis processual (Súmula STJ nº 243). A Lei 10.259/0l alterou a
concepção de infração de menor potencial ofensivo, mas não afetou o patamar para o sursis processual. Habeas corpus indeferido.
Agravo regimental prejudicado.
HC N. 84.669-SP
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: ROUBO QUALIFICADO POR CONCURSO DE PESSOAS E USO DE ARMA E FORMAÇÃO DE QUADRILHA
ARMADA. INOCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM. FIXAÇÃO DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS PESSOAIS DE CO-RÉUS NÃO
APROVEITAM AOS DEMAIS. EXCESSO NA DOSIMETRIA DA PENA. PROGRESSÃO DE REGIME. QUESTÃO NÃO
SUBMETIDA ÀS INSTÂNCIAS INFERIORES. PEDIDO DE HABEAS CORPUS CONHECIDO EM PARTE E DEFERIDO
QUANTO À DOSIMETRIA DA PENA.
Entende o Supremo Tribunal Federal que é válida a cumulação dos crimes dos arts. 288, parágrafo único, e 157, § 2º e incisos, do
Código Penal (cf. HC 76.213, rel. min. Sepúlveda Pertence, DJ 14.04.1998).
Não há aproveitamento de circunstâncias pessoais de co-réus para dosimetria da pena dos demais acusados. A fixação da pena é
individualizada, de acordo com as circunstâncias pessoais de cada acusado. Entretanto, constata-se excesso na estipulação da pena,
que foi elevada além dos limites legais.
O pedido de progressão de regime não pode ser conhecido, sob pena de supressão de instâncias, já que não fora apreciado pelas
instâncias anteriores. Pedido de habeas corpus conhecido em parte e deferido quanto à fixação da pena, a fim de que se proceda a
nova estipulação, dentro dos limites legais.
* noticiado no Informativo 377
Acórdãos Publicados: 547
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
CNMP: EC 45/2004 e Vício Formal (Transcrições)
(v. Informativo 385)
ADI 3472 MC/DF*
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. ADIn: legitimidade ativa: “entidade de classe de âmbito nacional” (art. 103, IX, CF): Confederação
Nacional dos Membros do Ministério Público.
1. É certo que, na ADInMC 1.402, de 29.2.96, red. p/acórdão Maurício Corrêa, o Tribunal, na linha da jurisprudência então
dominante na Casa, que desqualifica para a iniciativa da ADIn as chamadas “associações de associações”, negou à
CONAMP a qualificação de “entidade de classe de âmbito nacional”; no caso, a discussão seria ociosa, dado que, ao julgar,
a ADIn-AgR 3153, 12.08.04, Pertence, o plenário da Corte abandonou o entendimento que exclui as entidades de classe de
segundo grau do rol dos legitimados à ação direta.
2. Ademais, segundo o estatuto da CONAMP - agora Associação Nacional dos Membros do Ministério Público - a
qualidade de “associados efetivos” ficou adstrita às pessoas físicas integrantes da categoria, - o que basta a satisfazer a
jurisprudência restritiva-, ainda que o estatuto reserve às associações afiliadas papel relevante na gestão da entidade nacional.
II. ADIn: pertinência temática.
Cuidando-se do processo de integração de membros do MP dos Estados na composição do Conselho Nacional do Ministério
Público, é manifesta a interseção do tema da norma impugnada com os fins institucionais da representação da categoria
profissional que a entidade requerente congrega.
III. Conselho Nacional do Ministério Público: composição inicial (EC 45/2004, art. 5º, § 1º): densa plausibilidade da
argüição de inconstitucionalidade de norma atributiva de competência transitória para a hipótese de não se efetivarem a
tempo, na forma do texto permanente, as indicações ou escolhas dos membros do Conselho Nacional do Ministério Público,
por inobservância do processo legislativo previsto no § 2º do art. 60 da Constituição da República, dada a patente subversão
do conteúdo da proposição aprovada pela Câmara dos Deputados, por força de emenda que lhe impôs o Senado, e afinal se
enxertou no texto promulgado.
RELATÓRIO - Acolhendo representação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (DOC 5, f. 36/42), a Associação
Nacional dos Membros do Ministério Público - CONAMP - propõe ação direta de inconstitucionalidade - com pedido de suspensão
liminar da eficácia das expressões “e do Ministério Público”, “respectivamente” e da expressão “e ao Ministério Público da
União”, contidas no § 1o, do art. 5o, da Emenda Constitucional 45 de 8 de dezembro de 2004, que tem este teor:
“Art. 5º O Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público serão instalados no prazo de
cento e oitenta dias a contar da promulgação desta Emenda, devendo a indicação ou escolha dos seus membros ser
efetuada até trinta dias antes do termo final.
§ 1º Não efetuadas as indicações e escolha dos nomes para os Conselhos Nacional de Justiça e do Ministério Público
dentro do prazo fixado no caput deste artigo, caberá, respectivamente, ao Supremo Tribunal Federal e ao Ministério
Público da União realizá-las.”
Quanto a legitimidade ativa da associação proponente, alega-se que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADIn
2874 (Marco Aurélio, j. 28.08.2003), reconheceu, por unanimidade, à CONAMP para a propositura de ação a qualificação de
“entidade de classe de âmbito nacional” (art. 103, IX, CF).
Quanto a pertinência temática, aduz-se que dentre as finalidades da requerente estão as de “defender o fortalecimento do
Ministério Público, instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbida da defesa da ordem jurídica, do
regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (art. 2º, II) e de “promover a unidade institucional do
Ministério Público Brasileiro” (art. 2º, IV)”.
A impugnação tem como núcleo a inconstitucionalidade formal das expressões “e do Ministério Público”, “e ao Ministério
Público da União” e do advérbio “respectivamente”.
Colhe-se da inicial (f. 5):
“O pressuposto de validade de uma Emenda Constitucional, quanto à sua gênese, é a observância estrita do processo
legislativo previsto no § 2º do art. 60 do texto original da Constituição da República.
Ora, não se pode ter como “emenda de redação”, elaborada pelo Senado Federal, aquela que modifica,
substancialmente, o texto aprovado, em dois turnos, pela Câmara dos Deputados, consoante provam os documentos
anexos (docs. 06 e 07).
Não obstante se trate de disposição transitória, destinada a regulamentar a primeira composição do Conselho
Nacional do Ministério Público, o certo é que ela é fruto de transgressão do mandamento estampado no art. 60, § 2º,
da Constituição da República.
Com efeito, a Emenda aprovada na Câmara dos Deputados atribuía, exclusivamente, ao Supremo Tribunal Federal a
escolha dos membros de ambos os Conselhos Nacionais: o da Justiça e o do Ministério Público. Já, no Senado, o
texto aprovado e, posteriormente promulgado, sofreu modificação substancial, pois retirou do Supremo Tribunal
Federal a escolha dos membros do Conselho Nacional do Ministério Público para atribuí-la ao Ministério Público
da União.
Reconhecida a inconstitucionalidade formal aqui apontada, a primeira composição do Conselho Nacional do
Ministério Público estará condicionada ao advento de lei específica prevista no artigo 7º da Emenda Constitucional
nº 45.”
Os autos da ação direta vieram-me conclusos em 19.04.2005 e, no dia seguinte, ante o pedido de suspensão liminar,
impusera-lhe o rito abreviado do art. 12, da L. 9868/99.
Em 25.04.05, requereu a CONAMP a reconsideração do despacho e a concessão imediata da cautelar pleiteada, ante o prazo
previsto no final do art. 5o da chamada “reforma do judiciário”, membros dos referidos Conselhos, que vence em 6 de maio deste
ano.
No mesmo dia, despachei:
“DESPACHO: Junte-se oportunamente.
Reconsidero o despacho que aplicou o art. 12, da L. 9868/99 e aplico o art. 10, § 3o, da L. 9868/95.
Em mesa para julgamento liminar.”
É o relatório.
VOTO:
I
Como acentuei no voto proferido no julgamento da ADIn 2797 (j. 22.09.2004, vista ao em Min. Eros Grau), é certo que, na
ADInMC 1.402, de 29.2.96, o Tribunal - vencido o Relator, Ministro Carlos Velloso - negou à CONAMP a qualificação de
“entidade de classe de âmbito nacional”, para, nos termos do art. 103, IX, CF, propor ação direta de inconstitucionalidade.
O voto condutor do acórdão, do Ministro Maurício Corrêa, alinhou-se à jurisprudência então dominante na Casa, que
desqualificava para a iniciativa da ADIn as ditas “associações de associações” (v.g., ADIn 1.580, de 2.6.97 (QO), Corrêa; ADIn
1.159, 29.4.98, Galvão) -, ao que acrescentou o Ministro Ilmar Galvão a circunstância de a CONAMP admitir também a filiação
direta de pessoas físicas, membros do Ministério Público.
Ausente daquele julgamento, minha tendência seria a de acompanhar o voto vencido do Ministro Velloso.
Jamais me alinhei no ponto à orientação do Tribunal, como repetidamente declarei (v.g, ADIn 1.580, Corrêa, 5.6.97, DJ
25.5.01).
E não daria relevo decisivo a que, então, a CONAMP admitisse, além das associações regionais, a filiação direta de
integrantes individuais da categoria.
Na espécie, contudo, a reabertura da discussão é ociosa.
De logo, porque a exclusão das entidades de classe de segundo grau - as chamadas “associações de associações” - do rol dos
legitimados à ação direta, vem de ser abandonada pelo Tribunal (ADIn 3153-AgRg, 12.08.04, Pertence, Inf STF 356).
De qualquer sorte, instrui a petição o novo estatuto da CONAMP - agora Associação Nacional dos Membros do Ministério
Público - a preceituar que a qualidade de “associados efetivos” ficou adstrita às pessoas físicas integrantes da categoria, - o que
basta a satisfazer a antiga jurisprudência restritiva -, ainda que o estatuto reserve às associações afiliadas papel relevante na gestão
da entidade nacional.
De tudo, reconheço a qualificação da requerente para propositura da ação direta.
II
A pertinência temática, no caso, dispensa maior consideração: cuidando-se, como se trata, do processo de integração de
membros do MP dos Estados na composição do Conselho Nacional do Ministério Público, é manifesta a interseção do tema da
norma impugnada com os fins institucionais de representação da categoria profissional que a entidade congrega.
III
É pelo menos densa, por derradeiro, a plausibilidade da argüição de inconstitucionalidade da regra transitória questionada
para não adiantar, de logo, a sua procedência patente.
A proposta de emenda constitucional aprovada em dois turnos na Câmara dos Deputados versou a questão, para dispor - f.
56:
“Art. 42. O Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público serão instalados no prazo de
cento e oitenta dias a contar da promulgação desta Emenda, devendo a indicação e escolha de seus membros ser
efetuada até trinta dias antes do termo final.
§ 1º Não efetuadas as indicações e escolha dos nomes para os Conselhos Nacional de Justiça e do Ministério Público
dentro do prazo fixado no caput deste artigo, caberá ao Supremo Tribunal Federal realizá-las.”
Nesses termos, encaminhada ao Senado Federal, na tramitação da matéria na sua Comissão de Constituição, Justiça e
Cidadania é que se alterou substancialmente esse § 1º da proposta aprovada pela Câmara dos Deputados.
Explica-o a representação do MP do Estado do Rio de Janeiro, endossada pela requerente - f. 36, 38:
“6. Note-se que as inovações tiveram lugar na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal,
por ocasião da apreciação do relatório do Exmo. Sr. Senador José Jorge. Apesar de Sua Excelência ter inicialmente
prestigiado o texto oriundo da Câmara dos Deputados, o então art. 4º da Proposta de Emenda à Constituição nº
29/2000 sofreu a seguinte “emenda de redação”:
‘Art. 4º (...)
§ 1º - Não efetuadas as indicações e escolha dos nomes para os Conselhos Nacional de Justiça e do Ministério
Público dentro do prazo fixado no caput deste artigo, caberá ao Supremo Tribunal Federal e ao Promotor-Geral
da República realizá-las”.
7. As razões que justificaram fosse a inovação intitulada de “emenda de redação” foram assim expostas pelo Exmo.
Sr. Senador José Jorge, por ocasião da votação do Destaque nº 42 na Comissão de Constituição e Justiça: “Sr.
Presidente, na realidade, nas atribuições do Conselho Nacional do Ministério Público, na parte que antecede a sua
instalação, há um item que preconiza que os membros serão indicados pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal,
quando o correto seria que os procuradores fossem indicados pelo Procurador-Geral da República. Inicialmente
avaliamos que a mudança desse item por destaque levaria o texto novamente à Câmara dos Deputados. Combinamos
com o Senador Demóstenes Torres a retirada do destaque e faremos uma emenda de redação, evidentemente se
possível, para corrigir a mudança” (Ata da 6ª Reunião Ordinária da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania,
da 2ª Sessão Legislativa Ordinária, da 52ª Legislatura, realizada em 24 de março de 2004, Quarta-feira, às 10 horas,
em 31 de março de 2004, Quarta-feira, às 10 horas e em 6 de abril de 2004, Terça-feira, às 11 horas).
8. Avançando nos trabalhos a expressão “Promotor-Geral da República” foi substituída por “Ministério Público da
União”, inovação já encampada pelo Parecer nº 147, por meio do qual a Comissão de Constituição, Justiça e
Cidadania do Senado Federal apresentou , em 17 de novembro de 2004, a “redação, para o segundo turno, da
Proposta de Emenda à Constituição nº 29, de 2000 (nº 96, de 1999, na Câmara dos Deputados), constante da
Emenda nº 240, da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania - texto que vai à promulgação.”
E, assim aprovada - e, ao que parece, só no segundo turno de votação - pelo Plenário do Senado, o tópico alterado se inseriu
no § 1º do art. 5º da EC 45/04, que se veio a promulgar.
IV
Dispõe o art. 130-A, da Constituição - introduzido pela EC 45/04 - que - além do Procurador-Geral da República, que o
preside (inc I) e de conselheiros estranhos à instituição (incs IV - VI) - integrarão o Conselho Nacional do Ministério Público
“quatro membros do Ministério Público da União, assegurada a representação de cada uma de suas carreiras” (inc. II) e “três
membros do Ministério Público dos Estados” (inc. III).
Prescreve, de sua vez, o § 1º do mesmo art. 130-A, que
“Os membros do Conselho oriundos do Ministério Público serão indicados pelos respectivos Ministérios Públicos, na
forma da lei.”
A questão está na disposição transitória do art. 5º da mesma EC 45/04, o qual - depois de fixar, no caput, em 180 dias
contados de sua promulgação, o prazo para a instalação do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério
Público, “devendo a indicação ou escolha dos seus membros ser efetuada até trinta dias antes do termo final” -, preceituou,
conforme o texto promulgado:
“§ 1º. Não efetuadas as indicações dos nomes para os Conselhos Nacional da Justiça e do Ministério Público dentro
do prazo fixado no caput deste artigo, caberá, respectivamente, ao Supremo Tribunal Federal e ao Ministério
Público da União realizá-las.”
Impugnam-se as expressões grifadas (“e do Ministério Público”, “respectivamente” e “ao Ministério Público da União”),
cuja inserção na emenda promulgada teria ofendido o art. 60, § 2º, da Constituição, que, ao disciplinar o processo legislativo das
emendas constitucionais estatui:
“§ 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se
aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros”
No processo legislativo das emendas à Constituição, rege, assim, o sistema bicameral puro.
Daí que, se iniciada na Câmara dos Deputados a apreciação da proposta, nos termos em que ali aprovada em dois turnos,
subirá ela à revisão do Senado, que, ou a aprova, também em dois turnos, tal como a recebeu da Casa de origem, ou a rejeita, total
ou parcialmente.
Se a rejeição é total, finda, no Senado, o processo.
Se a rejeição é parcial, só os tópicos aprovados pela Câmara e também pelo Senado integrarão o texto da emenda a ser
promulgado pelas Mesas de ambas as casas do Congresso Nacional.
Certo, a prática parlamentar tem flexibilizado a rigidez bicameral do processo.
Quando o Senado não se limita a suprimir proposições aprovadas pela Câmara, mas, a propósito da mesma matéria, aprova
proposição diversa, tem-se devolvido a questão à Casa de origem: o retorno, porém, vale pela submissão a ela, da proposta alterada,
como se fora iniciativa original do Senado, a fim de ser, então, aprovada, também em dois turnos, pela Câmara e levada à
promulgação; ou por ela rejeitada, pondo fim, no tópico, ao processo frustrado de emenda constitucional.
Certo, tem-se admitido à câmara revisora a imposição de emendas de mera redação ao teor da proposta da Câmara de
origem, caso em que a promulgação contemplará a alteração de forma, sem necessidade de retorno à origem.
Dilucida o acórdão da ADC 3, 2.12.99, lavrado por V. Exa., Sr. Presidente:
“(...) O retorno do projeto emendado à Casa iniciadora não decorre do fato de ter sido simplesmente emendado.
Só retornará se, e somente se, a emenda tenha produzido modificação de sentido na proposição jurídica.
Ou seja, se a emenda produzir proposição jurídica diversa da proposição emendada.
Tal ocorrerá quando a modificação produzir alterações em qualquer um dos âmbitos de aplicação do texto
emendado: material, pessoal, temporal ou espacial.”
O aresto - malgrado exarado a propósito de processo legislativo ordinário - tem aplicação plena ao de emenda constitucional,
como o Tribunal igualmente já assentou - ADIn 2666, 3.10.02, Ellen Gracie, DJ 6.12.02:
“Proposta de emenda que, votada e aprovada na Câmara dos Deputados, sofreu alteração no Senado Federal, tendo
sido promulgada sem que tivesse retornado à Casa iniciadora para nova votação quanto à parte objeto de
modificação. Inexistência de ofensa ao art. 60, § 2º da Constituição Federal no tocante à supressão, no Senado
Federal, da expressão “observado o disposto no § 6º do art. 195 da Constituição Federal”, que constava do texto
aprovado pela Câmara dos Deputados em 2 (dois) turnos de votação, tendo em vista que essa alteração não importou
em mudança substancial do sentido do texto (Precedente: ADC nº 3, rel. Min. Nelson Jobim).”
Diversamente, porém, se a inovação aprovada pela Casa revisora altera, não apenas a forma da elocução, mas o conteúdo
significativo da proposta da Câmara de origem, é inválida a promulgação do texto modificado, antes que o aceite, em dois turnos, o
Plenário de origem: é o que se dá, seja que se transforme em outra, em qualquer dos seus elementos de identificação, a hipótese
normativa ou a sanção, seja, quando se lhe suprima proposição acessória, que implique modificar a significação normativa do texto
remanescente.
Essa última, a hipótese resolvida na ADIn 2031-MC, 29.09.99, Gallotti, RTJ 182/3, solução tornada definitiva na ADIn
2031, 3.10.02, Ellen, RTJ 188/1, esta, assim formulada, no que interessa, no voto da em. Relatora:
“No que toca à alteração ocorrida no § 3º do novo art. 75 do ADCT, filio-me ao entendimento esposado pela maioria
dos Ministros da Casa no julgamento cautelar, de que a expressão suprimida “hipótese em que o resultado da
arrecadação verificado no exercício financeiro de 2002 será integralmente destinado ao resgate da dívida pública
federal”, não tinha autonomia em relação à primeira parte do dispositivo, assim redigida: “É a União autorizada a
emitir títulos da dívida pública interna, cujos recursos serão destinados ao custeio da saúde e da previdência social,
em montante equivalente ao produto da arrecadação da contribuição, prevista e não realizada em 1999”. Entendeu o
Plenário que o Senado havia autorizado a emissão de títulos da dívida pública para compensar a ausência de
arrecadação no período de janeiro a junho de 1999, em face da não votação da proposta de emenda em tempo hábil.
No entanto, essa autorização foi condicionada à destinação da arrecadação da contribuição, verificada no exercício
financeiro de 2002, ao resgate desses mesmos títulos. A vontade do Senado, assim, autorizando tal emissão, foi no
sentido de condicioná-la à aplicação do produto da arrecadação ocorrido no ano de 2002 no resgate desses títulos.
Entendeu a maioria dos Ministros, ao meu ver corretamente, que não se estava diante de duas normas autônomas,
mas interdependentes, tendo em vista que a expressão suprimida indicava justamente a fonte prevista pelo Senado
para a cobertura dos títulos emitidos. Diante dessa vinculação, a supressão da mencionada expressão, pela Câmara
dos Deputados, deveria ter dado azo ao retorno da proposta ao Senado Federal, para nova apreciação, visando ao
cumprimento do disposto no § 2º do art. 60 da Carta Política.”
Na espécie, mais que mera alteração, é patente a subversão do conteúdo da proposição aprovada pela Câmara dos Deputados,
por força da emenda que lhe impôs o Senado e afinal se enxertou no texto promulgado, como se a houvesse ditado o voto
coincidente das duas Casas do Congresso Nacional.
Cuida-se, como visto, de uma norma atributiva de competência transitória para a hipótese de não se efetivarem a tempo, na
forma do texto permanente, as indicações ou escolhas de membros do Conselho Nacional de Justiça ou do Conselho Nacional do
Ministério Público.
A norma de competência assim concebida desdobra-se em três elementos de identificação: (1) a hipótese normativa de sua
incidência: omissão de indicações ou escolhas no prazo assinado; (2) o objeto da competência atribuída: suprir a omissão verificada;
e (3) o sujeito a quem atribuída essa competência supletiva.
Os dois primeiros elementos mantiveram-se incólumes à revisão do Senado.
No terceiro, porém, relativamente ao Conselho Nacional do Ministério Público, a mesma competência que a Câmara
aprovara outorgar ao Supremo Tribunal Federal é transferida, pela emenda votada solitariamente pelo Senado, ao Ministério Público
da União.
Evidente, de seu turno, é o risco de manter-se vigente e operante a norma questionada, a reger a composição inicial do
Conselho Nacional do Ministério Público, de modo a tisná-la de probabilíssima e radical nulidade: “pau que nasce torto...”.
Esse o quadro, defiro a medida cautelar: é o meu voto.
* acórdão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 393
Brasília, 20 a 24 de junho de 2005 Nº 393
Data (páginas internas): 29 de junho de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Instauração de CPI e Direito Público Subjetivo das Minorias - 3
Estatuto da Advocacia - 5
Estatuto da Advocacia – 6
Estatuto da Advocacia - 7
1ª Turma
Sursis Processual e Cabimento de HC
Flagrante Ilegalidade e Enunciado 691 da Súmula
Concurso Público: Adequação dos Quesitos ao Edital e Legalidade
Contribuição Previdenciária e Aposentado pelo RGPS
Processos de Origens Diversas e Não Incidência da Prevenção
2ª Turma
Medida Sócio-Educativa e Substituição por Internação
Clipping do DJ
Transcrições
Persecução Penal e Delação Anônima (Inq 1957/PR)
PLENÁRIO
Instauração de CPI e Direito Público Subjetivo das Minorias - 3
Concluído o julgamento de mandados de segurança impetrados por senadores contra ato da Mesa do
Senado Federal, representada por seu Presidente, consubstanciado na validação da recusa deste em
proceder à indicação de membros para instaurar a denominada “CPI dos Bingos” — v. Informativo 386.
O Tribunal, por maioria, concedeu a ordem, a fim de assegurar, à parte impetrante, o direito à efetiva
composição da CPI, de que trata o Requerimento 245/2004, devendo, o Presidente do Senado, mediante
aplicação analógica do art. 28, § 1º c/c o art. 85, caput, respectivamente, do Regimento Interno da Câmara
dos Deputados e o do Senado Federal, proceder, ele próprio, à designação dos nomes faltantes dos
senadores que irão compor esse órgão de investigação legislativa, observado, ainda, o disposto no § 1º do
art. 58 da CF. Inicialmente, afastou-se a questão de ordem suscitada pelo Min. Eros Grau que, partindo da
premissa de que a criação da CPI se dá com o requerimento de 1/3 dos membros da referida Casa
legislativa e se extingue ao término do respectivo prazo de duração, a teor do disposto nos artigos 76, II, e
§ 3º; 145, caput e §§ 1º e 2º, do Regimento Interno do Senado Federal, dava pela prejudicialidade da
impetração, tendo em vista que, no caso, o prazo de duração previsto no Requerimento 245/2004 se
encerrara em 2.7.2004. Entendeu-se que o prazo fixado sequer iniciara, eis que sua fluência estaria
condicionada a situação de absoluta normalidade, não observada no caso, já que, constituída a CPI, sua
instalação sequer ocorrera em razão do indevido obstáculo criado pelo Presidente do Senado. No mérito,
salientando ter havido, na espécie, o preenchimento dos requisitos do § 3º do art. 58 da CF, concluiu-se
pela afronta ao direito público subjetivo, nesse dispositivo assegurado, às minorias legislativas, de ver
instaurado o inquérito parlamentar, com apoio no direito de oposição, legítimo consectário do princípio
democrático. Ressaltou-se, ademais, que a ocorrência da lacuna normativa no texto do regimento interno
do Senado Federal não seria óbice a que o Supremo, valendo-se dos meios de integração, sobretudo por
força do disposto no art. 412, VI e VII, daquele diploma legal — o qual estabelece a competência da
Mesa para decidir, nos casos omissos, de acordo com a analogia, bem como preserva os direitos das
minorias —, suprisse essa omissão por aplicação analógica de prescrições existentes no âmbito do próprio
legislativo da União, que prevêem solução normativa para situações em que os líderes partidários deixem
de indicar representantes de suas próprias agremiações para compor comissões. Vencido o Min. Eros
Grau que indeferia o writ por considerar que o § 3º do art. 58 da CF teria assegurado a 1/3 dos membros
da Câmara ou do Senado, e não às minorias, apenas o direito de criação da CPI, o que suporia a sua
instalação, “sendo o seu funcionamento afetado unicamente pelos efeitos do debate parlamentar, no
embate entre as forças políticas que atuam nos parlamentos”, consistindo, portanto, em questão interna
corporis.
MS 24831/DF; MS 24845/DF; MS 24846/DF; MS 24847/DF; MS 24848/DF; MS 24849/DF, rel.
Min. Celso de Mello, 22.6.2005. (MS-24831)(MS-24845)(MS-24846)(MS-24847)(MS-2848)(MS-24849)
Estatuto da Advocacia - 5
O Tribunal retomou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Confederação
Nacional da Indústria - CNI contra dispositivos, a seguir transcritos, da Lei 8.906/94 - Estatuto da
Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil: art. 1º, § 2º: “Os atos e contratos constitutivos de
pessoas jurídicas, sob pena de nulidade, só podem ser admitidos a registro, nos órgãos competentes,
quando visados por advogados.”; art. 21: “Nas causas em que for parte o empregador, ou pessoa por este
representada, os honorários de sucumbência são devidos aos advogados dos empregados. Parágrafo
único. Os honorários de sucumbência, percebidos por advogado empregado de sociedade de advogados
são partilhados entre ele e a empregadora, na forma estabelecida em acordo.”; art. 22: “A prestação de
serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados
por arbitramento judicial e aos de sucumbência.”; art. 23: “Os honorários incluídos na condenação, por
arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este o direito autônomo para executar a
sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu
favor.”; art. 24, § 3º: “É nula qualquer disposição, cláusula, regulamento ou convenção individual ou
coletiva que retire do advogado o direito ao recebimento dos honorários de sucumbência.”; art. 78:
“Cabe ao Conselho Federal da OAB, por deliberação de dois terços, pelo menos, das delegações, editar
o Regulamento Geral deste Estatuto, no prazo de seis meses, contados da publicação desta Lei.” – v.
Informativo 338.
ADI 1194/DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 22.6.2005. (ADI-1194)
Estatuto da Advocacia - 6
Em relação ao § 2º do art. 1º da lei em questão, o Min. Gilmar Mendes, em voto-vista,
acompanhando a divergência, no ponto, iniciada pelo Min. Marco Aurélio, julgou procedente o pedido.
Entendeu que o dispositivo impugnado tem caráter eminentemente corporativista e viola o princípio da
proporcionalidade, porquanto a medida interventiva nele prevista mostra-se inadequada, haja vista a
ausência de qualquer relação plausível entre o meio utilizado e objetivos pretendidos pelo legislador, bem
como desnecessária, em razão da existência de inúmeras outras alternativas menos gravosas para os
interessados, no que diz respeito à boa elaboração dos atos constitutivos das pessoas jurídicas. Em
seguida, após os votos dos Ministros Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Cezar Peluso, que acompanhavam
a dissidência, e os votos dos Ministros Carlos Velloso, Celso de Mello e Nelson Jobim, que
acompanhavam o relator, o julgamento foi suspenso, quanto ao § 2º do art. 1º, para aguardar o voto da
Min. Ellen Gracie.
ADI 1194/DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 22.6.2005. (ADI-1194)
Estatuto da Advocacia - 7
Prosseguindo no julgamento, o Min. Gilmar Mendes, no tocante ao art. 21, caput, e seu parágrafo
único, julgou procedente o pedido, declarando a inconstitucionalidade do dispositivo com eficácia ex
nunc, adotando os fundamentos expostos nos votos dos Ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso, no
sentido de que os honorários de sucumbência, a teor do disposto no art. 20 do CPC, são devidos à parte
vencedora, e de que o direcionamento, ao advogado, da verba honorária destinada, por natureza, a
compensar o dano causado àquele que teve o ônus próprio de ir ao Judiciário para ter sua razão
reconhecida, implica indevido desfalque do patrimônio deste, violando o art. 5º, XXXV, da CF. Quanto
ao art. 24, o Min. Gilmar Mendes acompanhou o voto do relator, dando pela procedência do pedido, para
declarar a inconstitucionalidade do artigo, propondo, no entanto, efeitos ex nunc. Após, pediu vista dos
autos o Min. Joaquim Barbosa.
ADI 1194/DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 22.6.2005. (ADI-1194)
PRIMEIRA TURMA
Sursis Processual e Cabimento de HC
É cabível pedido de habeas corpus em favor de beneficiado com a suspensão condicional do
processo (Lei 9.099/95, art. 89), porquanto tal medida pode ameaçar a liberdade de locomoção do
paciente. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ
que denegara igual medida por entender que o paciente, ao aceitar proposta de sursis formulada pelo
Ministério Público, renunciara ao interesse de agir, na aludida via mandamental, para requerer, por
ausência de justa causa, o trancamento de ação penal contra ele instaurada pela suposta prática de crime
ambiental (Lei 9.605/98, art. 40, §1º). HC deferido para, mantida a liminar, determinar que o STJ proceda
ao exame da impetração como entender de direito.
HC 85747/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 21.6.2005. (HC-85747)
Flagrante Ilegalidade e Enunciado 691 da Súmula
A Turma, acolhendo proposta do Min. Sepúlveda Pertence, decidiu remeter ao Plenário o
julgamento de habeas corpus no qual se discute, em razão de flagrante ilegalidade, o cabimento de
habeas corpus impetrado contra decisão do STJ que indeferira liminar em outro writ, tendo em conta o
Enunciado 691 da Súmula do STF (“Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas
corpus impetrado contra decisão de relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior,
indefere a liminar.”). No caso concreto, o writ fora impetrado em favor de acusado pela suposta prática
de crimes contra a ordem tributária (Lei 8.137/90, art. 1º, I e IV), cuja denúncia fora recebida antes de
emitida a decisão final quanto ao crédito tributário em sede administrativa. Alega-se, na espécie,
constrangimento ilegal, haja vista a orientação adotada pelo STF no julgamento do HC 81611/DF (DJU
de 13.5.2005), no sentido de que, nos crimes do art. 1º da Lei 8.137/90, a decisão definitiva do processo
administrativo consubstancia uma condição objetiva de punibilidade, não se podendo afirmar o montante
da obrigação tributária até que haja o efeito preclusivo da decisão final em sede administrativa.
HC 85185/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 21.6.2005. (HC-85185)
Concurso Público: Adequação dos Quesitos ao Edital e Legalidade
A adequação das questões da prova ao programa do edital de concurso público constitui tema de
legalidade suscetível de exame pelo Poder Judiciário. Com base nesse entendimento, a Turma negou
provimento a recurso extraordinário interposto pelo Estado do Rio Grande do Sul contra acórdão do
Tribunal de Justiça deste Estado que, ao conceder parcialmente mandado de segurança, anulara questões
relativas a concurso público para o cargo de juiz de direito substituto. No caso concreto, o tribunal a quo,
aplicando a jurisprudência do STF — no sentido da inviabilidade da revisão de provas de concursos
públicos pelo Poder Judiciário ou para a correção de eventuais falhas na elaboração das suas questões,
recusara-se a rever a correção técnica da formulação de alguns quesitos da prova, mas, de outro lado,
entendera que duas questões diziam respeito a assunto não incluído no edital, referindo-se, portanto, à
matéria de legalidade consistente na pertinência das questões ao programa do edital. Asseverou-se que o
edital, nele incluído o programa, é a lei do concurso e, por isso, suas cláusulas obrigam os candidatos e a
Administração Pública. Por conseguinte, havendo controvérsia acerca da legalidade do ato e pretensão de
direito subjetivo lesado a apurar, é cabível o acesso à jurisdição (CF, art 5º, XXXV). Precedentes citados:
RE 192568/PI (DJU de 7.2.97) e RE 268244/CE (DJU de 30.6.2000).
RE 434708/RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 21.6.2005. (RE-434708)
Contribuição Previdenciária e Aposentado pelo RGPS
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se sustenta que a exigência de
contribuição previdenciária de aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social que retorna à
atividade, prevista no art. 12, § 4º da Lei 8.212/91 e no art. 18, § 2º da Lei 8.213/91, viola o art. 201, § 4º
da CF (“A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de
filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá,
nos termos da lei, a: ...§4º É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter
permanente, o valor real, conforme critérios definidos em lei”). O Min. Sepúlveda Pertence, relator,
acompanhado pelo Min. Eros Grau, negou provimento ao recurso por considerar que a aludida
contribuição está amparada no princípio da universalidade do custeio da Previdência Social (CF, art. 195),
corolário do princípio da solidariedade; bem como no art. 201, § 11, da CF, que remete, à lei, os casos em
que a contribuição repercute nos benefícios. Asseverou, ainda, tratar-se de teses cuja pertinência ao caso
resulta, com as devidas modificações, da decisão declaratória da constitucionalidade da contribuição
previdenciária dos inativos do serviço público (ADI 3105/DF e ADI 3128/DF, DJU 18.2.2005). Após, o
julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Carlos Britto.
RE 437640/RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 22.6.2005. (RE-437640)
Processos de Origens Diversas e Não Incidência da Prevenção
Com base no entendimento de que a regra do art. 71 do Regimento Interno do STJ é semelhante à
do art. 69 do Regimento Interno do STF — da qual se extrai que há prevenção desde que se trate de
desdobramentos de processo único, recursos e também habeas originários do mesmo processo —, a
Turma afastou a redistribuição de habeas corpus impetrado no STJ e deferiu a mesma medida para tornar
insubsistente o acórdão, denegatório do writ, proferido por aquela Corte. No caso, o STJ distribuíra,
inicialmente, o processo a ministro integrante da Sexta Turma. No entanto, indeferida a medida
acauteladora e apresentado parecer da Procuradoria Geral da República, procedera à redistribuição do
feito a ministro integrante da Quinta Turma, sob o fundamento de que haveria outro processo anterior, o
qual, relatado por este, seria originário da mesma causa que motivara a impetração. Entendeu-se não
configurada a prevenção, tendo em conta a diversidade de origem dos referidos processos, que teriam
resultado de ações penais ou imputações próprias. HC deferido para determinar a redistribuição do
processo a integrante da Sexta Turma do STJ, haja vista a aposentadoria do ministro que inicialmente o
recebera.
HC 84635/SP, rel. Min.Marco Aurélio, 22.6.2005. (HC-84635)
SEGUNDA TURMA
Medida Sócio-Educativa e Substituição por Internação
A Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de adolescente, para restabelecer medida sócioeducativa de semiliberdade, anteriormente aplicada e convertida em medida de internação sem prazo
determinado. Na espécie, em razão de o ato infracional praticado ser equiparado ao delito do art. 157, §
2º, I e II, do CP, fora imposta ao paciente a medida sócio-educativa de liberdade assistida. No curso do
cumprimento dessa medida, o paciente fora apreendido pela prática de novo ato infracional (furto) que,
apurado em outro processo, resultara em medida de internação-sanção, por prazo determinado, com
fundamento no art. 122, III, do ECA. Ao tomar conhecimento do incidente, o juiz do Departamento de
Execuções Penais determinara a substituição da internação-sanção por internação por prazo
indeterminado. Tendo em vista que compete ao juízo de mérito da ação sócio-educativa a aplicação das
medidas de internação previstas nos incisos I e II do art. 122 do ECA, após o procedimento de apuração
do ato infracional no qual sejam asseguradas as garantias do contraditório e da ampla defesa, entendeu-se
que a substituição realizada no processo de execução extrapolara os limites do título executivo,
afrontando o princípio do devido processo legal, certo que a internação objeto da impetração decorrera da
consideração da prática do segundo ato infracional, não sujeito à medida de internação, como
descumprimento da medida de semiliberdade. Ressaltou-se, ainda, não ser possível a substituição de uma
medida sócio-educativa ou de proteção por uma de internação fundada no art. 113 do ECA, tendo em
vista que a substituição — na linha da tese adotada pelo STF no HC 74715/SP (DJU de 16.5.97) —
somente é aplicável em relação às medidas específicas de proteção (ECA, arts. 101 e 112, VII).
HC 85503/SP, rel. Min. Carlos Velloso, 21.6.2005. (HC-85503-SP)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias
22.6.2005
21.6.2005
21.6.2005
Extraordinárias
23.6.2005
22.6.2005
——
Julgamentos
18
298
419
CLIPPING
DO
DJ
247 de junho de 2005
ADI N. 2.718-RS
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. BARREIRAS ELETRÔNICAS. TRÂNSITO. COMPETÊNCIA
DA UNIÃO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
Lei 11.824, de 14.08.2002, do estado do Rio Grande do Sul. Inconstitucionalidade.
O disciplinamento da colocação de barreiras eletrônicas para aferir a velocidade de veículos, por inserir-se na matéria trânsito, é de
competência exclusiva da União (art. 22, XI, da CF/1988).
Precedentes.
Pedido julgado procedente.
* noticiado no Informativo 382
RMS N. 24.069-DF
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
UNICIDADE SINDICAL MITIGADA - CATEGORIA - SEGMENTOS AGRUPADOS - DESMEMBRAMENTO VIABILIDADE - ARTIGOS 5º, INCISO XVII, 8º, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 570, PARÁGRAFO ÚNICO, E
571 DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO - RECEPÇÃO. A liberdade de associação, observada, relativamente às
entidades sindicais, a base territorial mínima - a área de um município -, é predicado do Estado Democrático de Direito. Recepção
da Consolidação das Leis do Trabalho pela Carta da República de 1988, no que viabilizados o agrupamento de atividades
profissionais e a dissociação, visando a formar sindicato específico.
* noticiado no Informativo 381
Acórdãos Publicados: 838
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Persecução Penal e Delação Anônima (Transcrições)
(v. Informativo 387)
Inq 1957/PR*
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
VOTO DO MIN. CELSO DE MELLO: Sabemos, Senhor Presidente, que o veto constitucional ao anonimato, nos termos em
que enunciado (CF, art. 5º, IV, “in fine”), busca impedir a consumação de abusos no exercício da liberdade de manifestação do
pensamento e na formulação de denúncias apócrifas, pois, ao exigir-se a identificação de seu autor, visa-se, em última análise, com
tal medida, a possibilitar que eventuais excessos derivados de tal prática sejam tornados passíveis de responsabilização, “a
posteriori”, tanto na esfera civil quanto no âmbito penal, em ordem a submeter aquele que os cometeu às conseqüências jurídicas
de seu comportamento.
Essa cláusula de vedação - que jamais deverá ser interpretada como forma de nulificação das liberdades do pensamento surgiu, no sistema de direito constitucional positivo brasileiro, com a primeira Constituição republicana, promulgada em 1891
(art. 72, § 12). Com tal proibição, o legislador constituinte, ao não permitir o anonimato, objetivava inibir os abusos cometidos
no exercício concreto da liberdade de manifestação do pensamento, para, desse modo, viabilizar a adoção de medidas de
responsabilização daqueles que, no contexto da publicação de livros, jornais, panfletos ou denúncias apócrifas, viessem a ofender o
patrimônio moral das pessoas agravadas pelos excessos praticados, consoante assinalado por eminentes intérpretes daquele
Estatuto Fundamental (JOÃO BARBALHO, “Constituição Federal Brasileira - Comentários”, p. 423, 2ª ed., 1924, F. Briguiet;
CARLOS MAXIMILIANO, “Comentários à Constituição Brasileira”, p. 713, item n. 440, 1918, Jacinto Ribeiro dos Santos
Editor, “inter alia”).
Vê-se, portanto, tal como observa DARCY ARRUDA MIRANDA (“Comentários à Lei de Imprensa”, p. 128, item n. 79,
3ª ed., 1995, RT), que a proibição do anonimato tem um só propósito, qual seja, o de permitir que o autor do escrito ou da
publicação possa expor-se às conseqüências jurídicas derivadas de seu comportamento abusivo.
Nisso consiste, portanto, a “ratio” subjacente à norma, que, inscrita no inciso IV do art. 5º, da Constituição da República,
proclama ser “livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (grifei).
Torna-se evidente, pois, Senhor Presidente, que a cláusula que proíbe o anonimato - ao viabilizar, “a posteriori”, a
responsabilização penal e/ou civil do ofensor - traduz medida constitucional destinada a desestimular manifestações abusivas
do pensamento, de que possa decorrer gravame ao patrimônio moral das pessoas injustamente desrespeitadas em sua esfera de
dignidade, qualquer que seja o meio utilizado na veiculação das imputações contumeliosas.
Esse entendimento é perfilhado por ALEXANDRE DE MORAES (“Constituição do Brasil Interpretada”, p. 207, item n.
5.17, 2002, Atlas), UADI LAMMÊGO BULOS (“Constituição Federal Anotada”, p. 91, 4ª ed., 2002, Saraiva) e CELSO
RIBEIRO BASTOS/IVES GANDRA MARTINS (“Comentários à Constituição do Brasil”, vol. 2/43-44, 1989, Saraiva), dentre
outros eminentes autores, cujas lições enfatizam, a propósito do tema, que a proibição do anonimato - por tornar necessário o
conhecimento da autoria da comunicação feita - visa a fazer efetiva, “a posteriori”, a responsabilidade penal e/ou civil daquele que
abusivamente exerceu a liberdade de expressão.
Lapidar, sob tal perspectiva, o magistério de JOSÉ AFONSO DA SILVA (“Curso de Direito Constitucional Positivo”, p.
244, item n. 15.2, 20ª ed., 2002, Malheiros), que, ao interpretar a razão de ser da cláusula constitucional consubstanciada no art.
5º, IV, “in fine”, da Lei Fundamental, assim se manifesta:
“A liberdade de manifestação do pensamento tem seu ônus, tal como o de o manifestante identificar-se, assumir
claramente a autoria do produto do pensamento manifestado, para, em sendo o caso, responder por eventuais danos a
terceiros. Daí porque a Constituição veda o anonimato. A manifestação do pensamento não raro atinge situações jurídicas
de outras pessoas a que corre o direito, também fundamental individual, de resposta. (...).” (grifei)
É inquestionável, Senhor Presidente, que a delação anônima, notadamente quando veicular a imputação de supostas
práticas delituosas, pode fazer instaurar situações de tensão dialética entre valores essenciais - igualmente protegidos pelo
ordenamento constitucional -, dando causa ao surgimento de verdadeiro estado de colisão de direitos, caracterizado pelo
confronto de liberdades revestidas de idêntica estatura jurídica, a reclamar solução que, tal seja o contexto em que se delineie,
torne possível conferir primazia a uma das prerrogativas básicas em relação de antagonismo com determinado interesse fundado
em cláusula inscrita na própria Constituição.
O caso veiculado na presente questão de ordem suscitada pelo eminente Ministro MARCO AURÉLIO pode traduzir,
eventualmente, a ocorrência, na espécie, de situação de conflituosidade entre direitos básicos titularizados por sujeitos diversos.
Com efeito, há, de um lado, a norma constitucional, que, ao vedar o anonimato (CF, art. 5º, IV), objetiva fazer preservar,
no processo de livre expressão do pensamento, a incolumidade dos direitos da personalidade (como a honra, a vida privada, a
imagem e a intimidade), buscando inibir, desse modo, delações de origem anônima e de conteúdo abusivo. E existem, de outro,
certos postulados básicos, igualmente consagrados pelo texto da Constituição, vocacionados a conferir real efetividade à exigência
de que os comportamentos individuais, registrados no âmbito da coletividade, ajustem-se à lei e mostrem-se compatíveis com
padrões ético-jurídicos decorrentes do próprio sistema de valores que a nossa Lei Fundamental consagra.
Assentadas tais premissas, Senhor Presidente, entendo que a superação dos antagonismos existentes entre princípios
constitucionais há de resultar da utilização, pelo Supremo Tribunal Federal, de critérios que lhe permitam ponderar e avaliar,
“hic et nunc”, em função de determinado contexto e sob uma perspectiva axiológica concreta, qual deva ser o direito a
preponderar no caso, considerada a situação de conflito ocorrente, desde que, no entanto, a utilização do método da ponderação de
bens e interesses não importe em esvaziamento do conteúdo essencial dos direitos fundamentais, tal como adverte o magistério da
doutrina (DANIEL SARMENTO, “A Ponderação de Interesses na Constituição Federal” p. 193/203, “Conclusão”, itens ns. 1 e
2, 2000, Lumen Juris; LUÍS ROBERTO BARROSO, “Temas de Direito Constitucional”, p. 363/366, 2001, Renovar; JOSÉ
CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, “Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976”, p. 220/224, item n. 2,
1987, Almedina; FÁBIO HENRIQUE PODESTÁ, “Direito à Intimidade. Liberdade de Imprensa. Danos por Publicação de
Notícias”, in “Constituição Federal de 1988 - Dez Anos (1988-1998)”, p. 230/231, item n. 5, 1999, Editora Juarez de Oliveira; J.
J. GOMES CANOTILHO, “Direito Constitucional”, p. 661, item n. 3, 5ª ed., 1991, Almedina; EDILSOM PEREIRA DE FARIAS,
“Colisão de Direitos”, p. 94/101, item n. 8.3, 1996, Fabris Editor; WILSON ANTÔNIO STEINMETZ, “Colisão de Direitos
Fundamentais e Princípio da Proporcionalidade”, p. 139/172, 2001, Livraria do Advogado Editora; SUZANA DE TOLEDO
BARROS, “O Princípio da Proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidade das Leis Restritivas de Direitos
Fundamentais”, p. 216, “Conclusão”, 2ª ed., 2000, Brasília Jurídica).
Tenho para mim, portanto, Senhor Presidente, em face do contexto referido nesta questão de ordem, que nada impedia, na
espécie em exame, que o Poder Público, provocado por denúncia anônima, adotasse medidas informais destinadas a apurar,
previamente, em averiguação sumária, “com prudência e discrição” (JOSÉ FREDERICO MARQUES, “Elementos de Direito
Processual Penal”, vol. I/147, item n. 71, 2ª ed., atualizada por Eduardo Reale Ferrari, 2000, Millennium), a possível ocorrência
de eventual situação de ilicitude penal, com o objetivo de viabilizar a ulterior instauração de procedimento penal em torno da
autoria e da materialidade dos fatos reputados criminosos, desvinculando-se a investigação estatal (“informatio delicti”), desse
modo, da delação formulada por autor desconhecido, considerada a relevante circunstância de que os escritos anônimos – aos
quais não se pode atribuir caráter oficial - não se qualificam, por isso mesmo, como atos de natureza processual.
Disso resulta, pois, a impossibilidade de o Estado, tendo por único fundamento causal a existência de tais peças apócrifas,
dar início, somente com apoio nelas, à “persecutio criminis”.
Daí a advertência consubstanciada em julgamento emanado da E. Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em que
esse Alto Tribunal, ao pronunciar-se sobre o tema em exame, deixou consignado, com absoluta correção, que o procedimento
investigatório não pode ser instaurado com base, unicamente, em escrito anônimo, que venha a constituir, ele próprio, a peça
inaugural da investigação promovida pela Polícia Judiciária ou pelo Ministério Público:
“INQUÉRITO POLICIAL. CARTA ANÔNIMA. O Superior Tribunal de Justiça não pode ordenar a instauração de
inquérito policial, a respeito de autoridades sujeitas à sua jurisdição penal, com base em carta anônima. Agravo regimental
não provido.”
(Inq 355-AgR/RJ, Rel. Min. ARI PARGENDLER - grifei)
Vale referir, no ponto, o douto voto que o eminente Ministro ARI PARGENDLER, Relator, proferiu no mencionado
julgamento:
“O artigo 5º, item IV, da Constituição Federal garante a livre manifestação do pensamento, mas veda o anonimato.
A carta anônima de fls. 3 e verso não pode, portanto, movimentar polícia e justiça sem afrontar a aludida norma
constitucional.” (grifei)
É interessante observar que, na Itália, quer sob a égide do antigo Código de Processo Penal de 1930, editado em pleno
regime fascista (art. 141), quer sob o novo estatuto processual penal promulgado em 1988 (arts. 240 e 333, nº 3), a legislação
processual peninsular contém disposições restritivas no que concerne aos “documenti anonimi”, às “denunce anonime” ou aos
“scritti anonime”, estabelecendo que os documentos e escritos anônimos não podem ser formalmente incorporados ao processo,
não se qualificam como atos processuais e deles não se pode fazer qualquer uso processual, salvo quando constituírem o próprio
corpo de delito ou quando provierem do acusado.
Revela-se expressivo, sob tal aspecto, o que hoje dispõe o vigente Código de Processo Penal italiano (1988), em seu art.
240, que tem o seguinte teor:
“240. Documenti anonimi. – 1. I documenti che contengono dichiarazioni anonime non possono essere acquisiti né in
alcun modo utilizzati salvo che costituiscano corpo del reato o provengano comunque dall’imputato.”
Como já assinalado, o velho Código de Processo Penal fascista (1930) continha dispositivo que também vedava a formal
recepção, em sede de “persecutio criminis”, de escritos anônimos, determinando, quando se tratasse “di delazioni anonime” (art.
8º), a aplicação da cláusula limitativa inscrita no art. 141 daquele antigo estatuto processual penal:
“141. Eliminazione degli scritti anonimi – Gli scritti anonimi non possono essere uniti agli atti del procedimento, né
può farsene alcun uso processuale, salvo che costituiscano corpo del reato, ovvero provengano comunque dall’imputato.”
Cumpre referir, neste ponto, o valioso magistério expendido por GIOVANNI LEONE (“Il Codice di Procedura Penale
Illustrato Articolo per Articolo”, sob a coordenação de UGO CONTI, vol. I/562-564, itens ns. 154-155, 1937, Società Editrice
Libraria, Milano), cujo entendimento, no tema, após reconhecer o desvalor e a ineficácia probante dos escritos anônimos, desde
que isoladamente considerados, admite, no entanto, quanto a eles, a possibilidade de a autoridade pública, a partir de tais
documentos e mediante atos investigatórios destinados a conferir a verossimilhança de seu conteúdo, promover, então, em caso
positivo, a formal instauração da pertinente “persecutio criminis”, mantendo-se, desse modo, completa desvinculação desse
procedimento estatal em relação às peças apócrifas que forem encaminhadas aos agentes do Estado, salvo – como anteriormente
enfatizado – se os escritos anônimos constituírem o próprio corpo de delito ou provierem do acusado.
Impende rememorar, bem por isso, na linha do que vem de ser exposto, a precisa lição de JOSÉ FREDERICO
MARQUES (“Elementos de Direito Processual Penal”, vol. I/147, item n. 71, 2ª ed., atualizada por Eduardo Reale Ferrari, 2000,
Millennium):
“No direito pátrio, a lei penal considera crime a denunciação caluniosa ou a comunicação falsa de crime (Código
Penal, arts. 339 e 340), o que implica a exclusão do anonimato na notitia criminis, uma vez que é corolário dos preceitos
legais citados a perfeita individualização de quem faz a comunicação de crime, a fim de que possa ser punido, no caso de
atuar abusiva e ilicitamente.
Parece-nos, porém, que nada impede a prática de atos iniciais de investigação da autoridade policial, quando
delação anônima lhe chega às mãos, uma vez que a comunicação apresente informes de certa gravidade e contenha dados
capazes de possibilitar diligências específicas para a descoberta de alguma infração ou seu autor. Se, no dizer de G. Leone,
não se deve incluir o escrito anônimo entre os atos processuais, não servindo ele de base à ação penal, e tampouco como
fonte de conhecimento do juiz, nada impede que, em determinadas hipóteses, a autoridade policial, com prudência e
discrição, dele se sirva para pesquisas prévias. Cumpre-lhe, porém, assumir a responsabilidade da abertura das
investigações, como se o escrito anônimo não existisse, tudo se passando como se tivesse havido notitia criminis
inqualificada.” (grifei)
Essa orientação – perfilhada por JORGE ULISSES JACOBY FERNANDES (“Tomada de Contas Especial”, p. 51, item n.
4.1.1.1.2, 2ª ed., 1998, Brasília Jurídica) - é também admitida, em sede de persecução penal, por FERNANDO CAPEZ (“Curso de
Processo Penal”, p. 77, item n. 10.13, 7ª ed., 2001, Saraiva):
“A delação anônima (notitia criminis inqualificada) não deve ser repelida de plano, sendo incorreto considerá-la
sempre inválida; contudo, requer cautela redobrada, por parte da autoridade policial, a qual deverá, antes de tudo,
investigar a verossimilhança das informações.” (grifei)
Com idêntica percepção da matéria em exame, orienta-se o magistério de JULIO FABBRINI MIRABETE (“Código de Processo Penal Interpretado”, p. 95, item n. 5.4, 7ª ed., 2000, Atlas):
“(...) Não obstante o art. 5º, IV, da CF, que proíbe o anonimato na manifestação do pensamento, e de opiniões
diversas, nada impede a notícia anônima do crime (notitia criminis inqualificada), mas, nessa hipótese, constitui dever
funcional da autoridade pública destinatária, preliminarmente, proceder com a máxima cautela e discrição a investigações
preliminares no sentido de apurar a verossimilhança das informações recebidas. Somente com a certeza da existência de
indícios da ocorrência do ilícito é que deve instaurar o procedimento regular.” (grifei)
Esse entendimento é também acolhido por NELSON HUNGRIA (“Comentários ao Código Penal”, vol. IX/466, item n.
178, 1958, Forense), cuja análise do tema - realizada sob a égide da Constituição republicana de 1946, que expressamente não
permitia o anonimato (art. 141, § 5º), à semelhança do que se registra, presentemente, com a vigente Lei Fundamental (art. 5º,
IV, “in fine”) - enfatiza a imprescindibilidade da investigação, ainda que motivada por delação anônima, desde que fundada em
fatos verossímeis:
“Segundo o § 1.º do art. 339, ‘A pena é aumentada de sexta parte, se o agente se serve de anonimato ou de nome
suposto’. Explica-se: o indivíduo que se resguarda sob o anonimato ou nome suposto é mais perverso do que aquêle que
age sem dissimulação. Êle sabe que a autoridade pública não pode deixar de investigar qualquer possível pista (salvo
quando evidentemente inverossímil), ainda quando indicada por uma carta anônima ou assinada com pseudônimo; e, por
isso mesmo, trata de esconder-se na sombra para dar o bote viperino. Assim, quando descoberto, deve estar sujeito a um
plus de pena.” (grifei)
Essa mesma posição, Senhor Presidente, é igualmente perfilhada, dentre outros, por GUILHERME DE SOUZA NUCCI
(“Código de Processo Penal Comentado”, p. 68, item n. 29, 2002, RT), DAMÁSIO E. DE JESUS (“Código de Processo Penal
Anotado”, p. 9, 18ª ed., 2002, Saraiva), GIOVANNI LEONE, (“Trattato di Diritto Processuale Penale”, vol. II/12-13, item n. 1,
1961, Casa Editrice Dott. Eugenio Jovene, Napoli), FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO (“Código de Processo Penal
Comentado”, vol. 1/34-35, 4ª ed., 1999, Saraiva) e ROMEU DE ALMEIDA SALLES JUNIOR (“Inquérito Policial e Ação
Penal”, item n. 17, p. 19-20, 7ª ed., 1998, Saraiva), cumprindo rememorar, ainda, por valiosa, a lição de ROGÉRIO LAURIA
TUCCI (“Persecução Penal, Prisão e Liberdade”, p. 34/35, item n. 6, 1980, Saraiva):
“Não deve haver qualquer dúvida, de resto, sobre que a notícia do crime possa ser transmitida anonimamente à
autoridade pública (...).
(...) constitui dever funcional da autoridade pública destinatária da notícia do crime, especialmente a policial,
proceder, com máxima cautela e discrição, a uma investigação preambular no sentido de apurar a verossimilhança da
informação, instaurando o inquérito somente em caso de verificação positiva. E isto, como se a sua cognição fosse
espontânea, ou seja, como quando se trate de notitia criminis direta ou inqualificada (...).” (grifei)
Esse entendimento também fundamentou julgamento que proferi, em sede monocrática, a propósito da questão pertinente
aos escritos anônimos. Ao assim julgar, proferi decisão que restou consubstanciada na seguinte ementa:
“DELAÇÃO ANÔNIMA. COMUNICAÇÃO DE FATOS GRAVES QUE TERIAM SIDO PRATICADOS NO
ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SITUAÇÕES QUE SE REVESTEM, EM TESE, DE ILICITUDE
(PROCEDIMENTOS LICITATÓRIOS SUPOSTAMENTE DIRECIONADOS E ALEGADO PAGAMENTO DE DIÁRIAS
EXORBITANTES). A QUESTÃO DA VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL DO ANONIMATO (CF, ART. 5º, IV, ‘IN FINE’),
EM FACE DA NECESSIDADE ÉTICO-JURÍDICA DE INVESTIGAÇÃO DE CONDUTAS FUNCIONAIS DESVIANTES.
OBRIGAÇÃO ESTATAL, QUE, IMPOSTA PELO DEVER DE OBSERVÂNCIA DOS POSTULADOS DA LEGALIDADE,
DA IMPESSOALIDADE E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA (CF, ART. 37, ‘CAPUT’), TORNA INDERROGÁVEL
O ENCARGO DE APURAR COMPORTAMENTOS EVENTUALMENTE LESIVOS AO INTERESSE PÚBLICO. RAZÕES DE
INTERESSE SOCIAL EM POSSÍVEL CONFLITO COM A EXIGÊNCIA DE PROTEÇÃO À INCOLUMIDADE MORAL
DAS PESSOAS (CF, ART. 5º, X). O DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO DO CIDADÃO AO FIEL DESEMPENHO, PELOS
AGENTES ESTATAIS, DO DEVER DE PROBIDADE CONSTITUIRIA UMA LIMITAÇÃO EXTERNA AOS DIREITOS
DA PERSONALIDADE? LIBERDADES EM ANTAGONISMO. SITUAÇÃO DE TENSÃO DIALÉTICA ENTRE
PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES DA ORDEM CONSTITUCIONAL. COLISÃO DE DIREITOS QUE SE RESOLVE, EM
CADA CASO OCORRENTE, MEDIANTE PONDERAÇÃO DOS VALORES E INTERESSES EM CONFLITO.
CONSIDERAÇÕES DOUTRINÁRIAS. LIMINAR INDEFERIDA.”
(MS 24.369-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, “in” Informativo/STF nº 286/2002)
Cabe referir, ainda, que o E. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a questão da delação anônima, analisada em face
do art. 5º, IV, “in fine”, da Constituição da República, já se pronunciou no sentido de considerá-la juridicamente possível, desde
que o Estado, ao agir em função de comunicações revestidas de caráter apócrifo, atue com cautela, em ordem a evitar a
consumação de situações que possam ferir, injustamente, direitos de terceiros:
“CRIMINAL. RHC. NOTITIA CRIMINIS ANÔNIMA. INQUÉRITO POLICIAL. VALIDADE.
1. A delatio criminis anônima não constitui causa da ação penal que surgirá, em sendo o caso, da investigação
policial decorrente. Se colhidos elementos suficientes, haverá, então, ensejo para a denúncia. É bem verdade que a
Constituição Federal (art. 5º, IV) veda o anonimato na manifestação do pensamento, nada impedindo, entretanto, mas, pelo
contrário, sendo dever da autoridade policial proceder à investigação, cercando-se, naturalmente, de cautela.
2. Recurso ordinário improvido.”
(RHC 7.329/GO, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES - grifei)
“CONSTITUCIONAL, PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. (...).
PROCESSO ADMINISTRATIVO DESENCADEADO ATRAVÉS DE ‘DENÚNCIA ANÔNIMA’. VALIDADE.
INTELIGÊNCIA DA CLÁUSULA FINAL DO INCISO IV DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL (VEDAÇÃO DO
ANONIMATO). (...). RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.”
(RMS 4.435/MT, Rel. Min. ADHEMAR MACIEL - grifei)
“(...) Carta anônima, sequer referida na denúncia e que, quando muito, propiciou investigações por parte do
organismo policial, não se pode reputar de ilícita. E certo que, isoladamente, não terá qualquer valor, mas também não se
pode tê-la como prejudicial a todas as outras validamente obtidas.”
(RHC 7.363/RJ, Rel. Min. ANSELMO SANTIAGO - grifei)
Vê-se, portanto, não obstante o caráter apócrifo da delação ora questionada, que, tratando-se de revelação de fatos
revestidos de aparente ilicitude penal, existia, efetivamente, a possibilidade de o Estado adotar medidas destinadas a esclarecer,
em sumária e prévia apuração, a idoneidade das alegações que lhe foram transmitidas, desde que verossímeis, em atendimento ao
dever estatal de fazer prevalecer - consideradas razões de interesse público - a observância do postulado jurídico da legalidade,
que impõe, à autoridade pública, a obrigação de apurar a verdade real em torno da materialidade e autoria de eventos
supostamente delituosos.
Tal como asseverado pelo eminente Relator, o Ministério Público adotou, na espécie em análise, e no que concerne à carta
anônima em questão, todas as cautelas ora mencionadas neste voto, procedendo, em conseqüência, de acordo com a orientação
doutrinária e jurisprudencial que venho de expor.
Demais disso, cumpre acentuar que o Ministério Público, para formar a sua “opinio delicti”, valeu-se, como referido pelo
eminente Relator, de outros meios de informação, de origem conhecida, que viabilizaram o ajuizamento, na espécie, da ação
penal pública.
Não constitui demasia assinalar que o Ministério Público não depende, para deduzir a pretensão punitiva do Estado, da
prévia instauração de inquérito policial, eis que o representante do “Parquet” pode formar a sua convicção com fundamento em
elementos obtidos “aliunde”.
Como se sabe, o magistério jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, confirmando esse entendimento, tem acentuado
ser dispensável, ao oferecimento da denúncia, a prévia instauração de inquérito policial, desde que seja evidente a materialidade
do fato alegadamente delituoso e estejam presentes indícios de sua autoria (AI 266.214-AgR/SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA
PERTENCE - HC 63.213/SP, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA - HC 77.770/SC, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA RHC 62.300/RJ, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO, v.g.):
“O oferecimento da denúncia não depende, necessariamente, de prévio inquérito policial. A defesa do acusado se faz
em juízo, e não no inquérito policial, que é meramente informativo (...).”
(RTJ 101/571, Rel. Min. MOREIRA ALVES - grifei)
“Denúncia – Oferecimento sem a instauração de inquérito policial – Admissibilidade, se a Promotoria dispõe de
elementos suficientes para a formalização de ação penal (...).”
(RT 756/481, Rel. Min. MOREIRA ALVES - grifei)
“‘HABEAS CORPUS’ – MINISTÉRIO PÚBLICO – OFERECIMENTO DE DENÚNCIA – DESNECESSIDADE DE
PRÉVIA INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL – EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS DE INFORMAÇÃO
QUE POSSIBILITAM O IMEDIATO AJUIZAMENTO DA AÇÃO PENAL – INOCORRÊNCIA DE SITUAÇÃO DE
INJUSTO CONSTRANGIMENTO – PEDIDO INDEFERIDO.
- O inquérito policial não constitui pressuposto legitimador da válida instauração, pelo Ministério Público, da
‘persecutio criminis in judicio’. Precedentes.
O Ministério Público, por isso mesmo, para oferecer denúncia, não depende de prévias investigações penais
promovidas pela Polícia Judiciária, desde que disponha, para tanto, de elementos mínimos de informação, fundados em
base empírica idônea, sob pena de o desempenho da gravíssima prerrogativa de acusar transformar-se em exercício
irresponsável de poder, convertendo, o processo penal, em inaceitável instrumento de arbítrio estatal. Precedentes.”
(HC 80.405/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
A “ratio” subjacente a essa orientação – que também traduz a posição dominante na jurisprudência dos Tribunais em geral
(RT 664/336 – RT 716/502 – RT 738/557 – RSTJ 65/157 - RSTJ 106/426, v.g.) – encontra apoio no próprio magistério da
doutrina (DAMÁSIO E. DE JESUS, “Código de Processo Penal Anotado”, p. 07, 17ª ed., 2000, Saraiva; FERNANDO DA
COSTA TOURINHO FILHO, “Código de Processo Penal Comentado”, vol. I, p. 111, 4ª ed., 1999, Saraiva; JULIO FABBRINI
MIRABETE, “Código de Processo Penal Interpretado”, p. 111, item n. 12.1, 7ª ed., 2000, Atlas), cuja percepção do tema põe
em destaque que, “se está a parte privada ou o Ministério Público na posse de todos os elementos, pode, sem necessidade de
requerer a abertura do inquérito, oferecer, desde logo, a sua queixa ou denúncia” (EDUARDO ESPÍNOLA FILHO, “Código de
Processo Penal Brasileiro Anotado”, vol. I, p. 288, 2000, Bookseller - grifei).
É por essa razão que o Supremo Tribunal Federal, por mais de uma vez (RTJ 64/342), já decidiu que “Não é essencial ao
oferecimento da denúncia a instauração de inquérito policial, desde que a peça acusatória esteja sustentada por documentos
suficientes à caracterização da materialidade do crime e de indícios suficientes da autoria” (RTJ 76/741, Rel. Min. CUNHA
PEIXOTO).
Encerro o meu voto, Senhor Presidente. E, ao fazê-lo, deixo assentadas as seguintes conclusões:
(a) os escritos anônimos não podem justificar, só por si, desde que isoladamente considerados, a imediata
instauração da “persecutio criminis”, eis que peças apócrifas não podem ser incorporadas, formalmente, ao processo, salvo
quando tais documentos forem produzidos pelo acusado, ou, ainda, quando constituírem, eles próprios, o corpo de delito
(como sucede com bilhetes de resgate no delito de extorsão mediante seqüestro, ou como ocorre com cartas que evidenciem
a prática de crimes contra a honra, ou que corporifiquem o delito de ameaça ou que materializem o “crimen falsi”, p. ex.);
(b) nada impede, contudo, que o Poder Público, provocado por delação anônima (“disque-denúncia”, p. ex.), adote
medidas informais destinadas a apurar, previamente, em averiguação sumária, “com prudência e discrição”, a possível
ocorrência de eventual situação de ilicitude penal, desde que o faça com o objetivo de conferir a verossimilhança dos fatos
nela denunciados, em ordem a promover, então, em caso positivo, a formal instauração da “persecutio criminis”, mantendose, assim, completa desvinculação desse procedimento estatal em relação às peças apócrifas; e
(c) o Ministério Público, de outro lado, independentemente da prévia instauração de inquérito policial, também
pode formar a sua “opinio delicti” com apoio em outros elementos de convicção que evidenciem a materialidade do fato
delituoso e a existência de indícios suficientes de sua autoria, desde que os dados informativos que dão suporte à acusação
penal não tenham, como único fundamento causal, documentos ou escritos anônimos.
Sendo assim, e consideradas as razões expostas, peço vênia, Senhor Presidente, para acompanhar o douto voto proferido
pelo eminente Relator, rejeitando, em conseqüência, a questão de ordem ora sob exame desta Suprema Corte.
É o meu voto.
* acórdão pendente de publicação
Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
[email protected]
INFORMATIVO Nº 394
Brasília, 27 de junho a 1º de julho de 2005 Nº 394
Data (páginas internas): 3 de agosto de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento
das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja
uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua
publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Indenização por Danos Decorrentes de Acidente do Trabalho: Competência
ADI e Brigas de Galo
Vinculação de Gratificação ao Salário Mínimo
ADI e Investidura em Cargo Público - 1 a 3
Competência Originária do Supremo e Suspeição Deliberadamente Provocada
Promoção de Defensor Público e Critérios de Desempate
Vagas de Juiz e Lista Quádrupla
Crime Contra a Honra e Atipicidade
1ª Turma
Habeas Corpus e Justiça Trabalhista
Delitos de Trânsito e Competência
Falta Grave e Perda dos Dias Remidos
Requerimento de Naturalização e Efeito Declaratório
2ª Turma
Concurso Público: Adequação dos Quesitos ao Edital e Legalidade
Inelegibilidade de Parentes Afins e Separação de Fato - 2
Empregada Gestante e Contrato por Prazo Determinado - 3
Responsabilidade Objetiva do Estado e Danos Morais
Clipping do DJ
Transcrições
Empregada Gestante e Contrato por Prazo Determinado (RE 287905/SC)
Controle normativo abstrato - Tribunal de Justiça - Constituição estadual/Lei Orgânica do DF como
único parâmetro de confronto (Rcl 3436 MC/DF)
Busca e apreensão em repartição pública estadual - Ordem emanada de TRF - Conflito federativo Inexistência (AC 403 MC/AM)
Bancos. Lei Municipal que determina medidas de conforto aos usuários. Validade. (RE 215542/SP)
PLENÁRIO
Indenização por Danos Decorrentes de Acidente do Trabalho: Competência
As ações de indenização propostas por empregado contra empregador, fundadas em acidente do
trabalho, são da competência da justiça do trabalho. Com base nesse entendimento, que altera a
jurisprudência consolidada pelo Supremo no sentido de que a competência para julgamento dessa matéria
seria da justiça comum estadual, por força do disposto no art. 109, I, da CF, o Plenário, em Conflito de
Competência suscitado pelo TST - Tribunal Superior do Trabalho em face do extinto Tribunal de Alçada
do Estado de Minas Gerais, conheceu da ação e determinou a remessa do feito à Corte suscitante.
Entendeu-se que não se pode extrair do referido dispositivo a norma de competência relativa às ações
propostas por empregado contra empregador em que se pretenda o ressarcimento por danos decorrentes
de acidente de trabalho. Esclareceu-se que, nos termos da segunda parte do inciso I do art. 109 da CF,
excluem-se, da regra geral contida na primeira parte — que define a competência dos juízes federais em
razão da pessoa que integra a lide — as causas de acidente do trabalho em que a União, entidade
autárquica ou empresa pública federal forem interessadas, na condição de autora, ré, assistente ou
oponente (CF: “Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União,
entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés,
assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça
Eleitoral e à Justiça do Trabalho;”). Afirmou-se que referidas causas consistem nas ações acidentárias
propostas pelo segurado contra o INSS, nas quais se discute controvérsia acerca de benefício
previdenciário, e que passaram a ser da competência da justiça comum pelo critério residual de
distribuição de competência (Enunciado da Súmula 501 do STF). Não se encaixariam, portanto, em
nenhuma das partes do mencionado dispositivo as ações reparadoras de danos oriundos de acidente do
trabalho, quando ajuizadas pelo empregado contra o seu empregador, e não contra o INSS, em razão de
não existir, nesse caso, interesse da União, de entidade autárquica ou de empresa pública federal, exceto
na hipótese de uma delas ser empregadora. Concluiu-se, destarte, ressaltando ser o acidente de trabalho
fato inerente à relação empregatícia, que a competência para julgamento dessas ações há de ser da justiça
do trabalho, a qual cabe conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e
empregadores, e outras controvérsias decorrentes daquela relação. Asseverou-se que tal entendimento
veio a ser aclarado com a nova redação dada ao art. 114 da CF, pela EC 45/2004, especialmente com a
inclusão do inciso VI (“Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:... VI - as ações de
indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;”). Acrescentou-se,
ainda, que o direito à indenização em caso de acidente de trabalho, quando o empregador incorrer em
dolo ou culpa, está enumerado no art. 7º da CF como autêntico direito trabalhista, cuja tutela, deve ser,
por isso, da justiça especial. Fixou-se, como marco temporal da competência da justiça laboral, a edição
da EC 45/2004, por razões de política judiciária. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, que
estabelecia o termo inicial dessa competência a partir da redação original do art. 114 da CF.
CC 7204/MG, rel. Min. Carlos Britto, 29.6.2005. (CC-7204)
ADI e Brigas de Galo
Por ofensa ao art. 225, VII, § 1º, da CF, que veda práticas que submetam os animais a crueldade, o
Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da
República para declarar a inconstitucionalidade da Lei 11.366/2000, do Estado de Santa Catarina, que
autoriza e regulamenta a criação, a exposição e a realização de “brigas de galo”. Precedentes citados: RE
153531/SC (DJU de 13.3.98) e ADI 1856 MC/RJ (DJU de 22.9.2000).
ADI 2514/SC, rel. Min. Eros Grau, 29.6.2005. (ADI-2514)
Vinculação de Gratificação ao Salário Mínimo
Em face da violação ao art. 7º, IV, da CF, que proíbe a vinculação do salário mínimo para qualquer
fim, o Tribunal deu provimento a recurso extraordinário, para indeferir mandado de segurança, e declarar
a inconstitucionalidade do § 6º do art. 1º da Lei 9.503/94, do Estado de Santa Catarina, que estabelece que
a base de cálculo de gratificação complementar de vencimento não pode ser inferior ao salário mínimo.
Ressaltou-se, ainda, a orientação fixada pelo Supremo no sentido de que o inciso I do art. 27 da
Constituição catarinense, que assegura ao servidor público piso de vencimento não inferior ao salário
mínimo nacionalmente unificado, estaria a se referir, para se compatibilizar com a Constituição Federal, à
remuneração total (vencimentos e vantagens) e não ao vencimento-base. Precedentes citados: RE
247208/SC (DJU de 1º.6.2001); RE 197072/SC (DJU de 8.6.2001); RE 199098/SC (DJU de 18.5.2001);
RE 426063/SC (DJU de 6.8.2004); RE 433248/SC (DJU de 9.3.2005).
RE 426059/SC, rel. Min. Gilmar Mendes, 30.6.2005. (RE-426059)
ADI e Investidura em Cargo Público - 1
Por ofensa ao art. 37, II, da CF, que exige, para investidura em cargo público, ressalvadas as
nomeações para cargos em comissão, a prévia aprovação em concurso público de provas, ou de provas e
títulos, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador do
Estado do Mato Grosso para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 9º da Lei
Complementar estadual 66/99, que confere a possibilidade de ex-dirigentes da Agência Estadual de
Regulação dos Serviços Públicos Delegados daquele Estado - AGER/MT permanecerem vinculados à
autarquia estadual, após extinto o respectivo mandato, prestando serviços em outro cargo ou função da
administração pública estadual.
ADI 3244/MT, rel. Min. Joaquim Barbosa, 30.6.2005. (ADI-3244)
ADI e Investidura em Cargo Público - 2
Também pela afronta ao art. 37, II, da CF, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação
direta proposta pelo Procurador-Geral da República para declarar a inconstitucionalidade do art. 13 da Lei
8.032/2003, do Estado do Maranhão, que determina que servidores do Poder Judiciário, efetivos e
estáveis, nomeados antes de 5.10.98, serão enquadrados em determinados cargos, por transposição, por
ato do Presidente do Tribunal de Justiça. Entendeu-se, ademais, que o preceito atacado amplia a exceção à
regra da exigência de concurso para o ingresso no serviço público estabelecida no art. 19 do ADCT.
ADI 3332/MA, rel. Min. Eros Grau, 30.6.2005. (ADI-3332)
ADI e Investidura em Cargo Público - 3
Em face da lesão à reserva de iniciativa do Chefe do Poder Executivo para leis que disponham sobre
criação de cargos, funções ou empregos públicos na Administração Direta e autárquica, ou aumento de
sua remuneração, bem como servidores públicos da União e dos Territórios, seu regime jurídico,
provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria (CF, art. 61, II, a e c), o Tribunal julgou procedente
pedido formulado em ação direta proposta pelo Procurador-Geral da República para declarar
inconstitucional a Emenda Constitucional 52/2001, do Estado de Minas Gerais, que, acrescentando o art.
110 ao ADCT da Constituição estadual, dispõe sobre a extinção de cargos de carcereiros da Polícia Civil
e determina o ingresso de seus ocupantes nos cargos de detetive. Salientou-se, também, que a norma em
questão padece do vício de inconstitucionalidade material, porquanto a transferência de servidores
autorizada constitui provimento derivado de cargo efetivo que ofende a regra do concurso público (CF,
art. 37, II). Por fim, reputou-se inaplicável, ao caso, a orientação fixada pelo Supremo no sentido de
admitir o aproveitamento de ocupantes de cargos extintos em recém-criados quando houver plena
identidade substancial entre os cargos, compatibilidade funcional e remuneratória e equivalência dos
requisitos exigidos em concurso, eis que, na espécie, o cargo de carcereiro em nada se assemelha com o
de detetive, o que reconhecido, inclusive, no próprio texto impugnado.
ADI 3051/MG, rel. Min. Carlos Britto, 30.6.2005. (ADI-3051)
Competência Originária do Supremo e Suspeição Deliberadamente Provocada
Aplicando, por analogia, a norma prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 134 do CPC
(“Art. 134. É defeso ao juiz exercer as suas funções no processo contencioso ou voluntário:... IV - quando
nele estiver postulando, como advogado da parte, o seu cônjuge ou qualquer parente seu, consangüíneo
ou afim, em linha reta; ou na linha colateral até o segundo grau;... Parágrafo único. No caso do no IV, o
impedimento só se verifica quando o advogado já estava exercendo o patrocínio da causa; é, porém,
vedado ao advogado pleitear no processo, a fim de criar o impedimento do juiz.”), o Pleno resolveu
questão ordem suscitada em ação originária, para declarar o impedimento de procurador substabelecido,
e, reconhecendo a incompetência do Supremo para julgamento do feito, determinar a remessa dos autos
ao Tribunal de origem - TJ/AM. Na espécie, após uma série de recursos interpostos perante aquela Corte,
a parte sucumbente constituíra, por meio de substabelecimento, novo advogado, que subscrevera e
protocolizara embargos de declaração, requerendo, em seguida — e no que veio a ser atendido — a
remessa dos autos ao Supremo, com base na segunda parte do art. 102, I, n, da CF, que estabelece ser da
competência originária do STF o julgamento da ação “em que mais da metade dos membros do tribunal
de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente interessados;”. Relatara, para tanto, a
existência de representações do causídico contra desembargadores do TJ/AM e, por parte desses
magistrados contra ele, de representação, na OAB, de declarações de inimizade capital e de ação penal
por calúnia. Entendeu-se que a proteção ao princípio constitucional do juízo natural, que serviu de base à
criação da ressalva contida na segunda parte do parágrafo único do art. 134 do CPC, deveria prevalecer
no caso, uma vez que a atuação do advogado substabelecido se dera com o evidente propósito de criar a
situação de suspeição e retirar da Corte amazonense a competência para o julgamento dos embargos
declaratórios. Assim, considerando caracterizada a ofensa ao aludido princípio, afastou-se a incidência da
regra do art. 102, I, n, da CF. Determinou-se, ainda, o envio de cópia dos votos ao Conselho Federal da
OAB para ciência das específicas circunstâncias verificadas nos autos.
AO 1120 QO/AM, rel. Min. Ellen Gracie, 30.6.2005. (AO-1120)
Promoção de Defensor Público e Critérios de Desempate
O Plenário concedeu, parcialmente, mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente da
República, consubstanciado em decreto que implicara a promoção de defensores da segunda para
primeira categoria. Na espécie, o Conselho Superior da Defensoria Pública da União, com base no
disposto no inciso I do art. 10 da Lei Complementar 80/94 (“Art. 10. Ao Conselho Superior da Defensoria
Pública da União compete: I - exercer o poder normativo no âmbito da Defensoria Pública da União;”),
definira, ante a lacuna da lei relativa à promoção, o critério de desempate utilizado para remoção de
defensores públicos, previsto no § 1º do art. 37 da LC 80/94 (“Art. 37... § 1º Findo o prazo fixado no
caput deste artigo e, havendo mais de um candidato à remoção, será removido o mais antigo na
categoria e, ocorrendo empate, sucessivamente, o mais antigo na carreira, no serviço público da União,
no serviço público em geral, o mais idoso e o mais bem classificado no concurso para ingresso na
Defensoria Pública.”). Após a aprovação e publicação dessa lista de antigüidade, na qual figurara a
impetrante, o Conselho refizera a lista, colocando em primeiro lugar, para fins do desempate, a
classificação, o que ocasionara a promoção de outros defensores menos antigos que a autora do writ. O
Tribunal entendeu que, apesar de detentor do poder normativo para definir o critério de desempate, ao
Conselho não caberia, depois de eleito um critério — aplicável, por analogia, e consagrado pela própria
lei de regência — adotar outro, não previsto na lei e após a publicação da primeira lista, ofendendo os
princípios conducentes à segurança jurídica, quais sejam, da legalidade, da impessoalidade, da
moralidade, da publicidade e da eficiência.
MS 24872/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 30.6.2005. (MS-24872)
Vagas de Juiz e Lista Quádrupla
Havendo mais de uma vaga de juiz a ser preenchida por merecimento, nas promoções ou acessos, o
Tribunal poderá optar pela confecção de uma única lista quádrupla. Assim decidiu o Plenário, por
maioria, ao indeferir mandado de segurança impetrado por juiz federal contra ato do Presidente da
República, consubstanciado em decretos de nomeação, por critério de merecimento, de juízes federais, e
contra ato do Presidente do TRF da 5ª Região, em razão da elaboração de lista quádrupla para o
preenchimento de duas vagas existentes naquele tribunal. Inicialmente, rejeitou-se a preliminar de
ilegitimidade ativa do impetrante, eis que, no procedimento de promoção por merecimento, todos os
concorrentes à lista, e que dela não constem, são partes legítimas para questionar sua validade
judicialmente, se, do reconhecimento da nulidade argüida, possa decorrer a renovação do ato de escolha,
que estariam qualificados para disputar. Da mesma forma, afastou-se a alegação de preclusão decorrente
do fato de o impetrante não ter se utilizado, previamente, da via administrativa para impugnar a ausência
de requisito para preenchimento de vaga, já que esse procedimento não é pressuposto essencial ao
exercício do direito de impetração do mandado de segurança, sob pena de ofensa ao postulado da
inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV). No mérito, entendeu-se que a confecção da lista
quádrupla é prática legítima que encontra respaldo legal na conjugação dos arts. 93, II, b e III, 107, II, da
CF com os arts. 80, 82, 84 e 88, da LC 35/79. Considerou-se que, na existência de duas vagas, o critério
da lista quádrupla corresponde ao de duas listas tríplices, pois, escolhido um entre quatro nomes, três
restam para a segunda escolha. Além disso, o art. 88 da LOMAN permite expressamente o critério da lista
quádrupla, bem como o Regimento Interno do TRF da 5ª Região determina a aplicação, nesse caso, do §
4º do art. 27 do Regimento Interno do STJ (“Se existirem duas ou mais vagas a serem providas dentre
Juízes ou Desembargadores, o Tribunal deliberará, preliminarmente, se as listas se constituirão, cada
uma, com três nomes distintos, ou se, composta a primeira com três nomes, a segunda e subseqüentes
deverão ser integradas pelos dois nomes remanescentes da lista anterior, acrescidas de mais um nome”).
Ainda repeliu-se, com base na jurisprudência da Corte (MS 21631/RJ, DJU de 4.8.2000 e MS 23337/SP,
DJU de 19.12.2001), o argumento do impetrante de que um dos juízes incluídos na lista não teria
preenchido o requisito do interstício de vitaliciedade de mais de cinco anos de exercício para investidura
no cargo de segunda instância, haja vista não se aplicar a norma do art. 93, II, b, da CF à promoção dos
juízes federais, sujeita apenas ao requisito do implemento de cinco anos de exercício (CF, art. 107, II), no
qual se inclui o tempo de exercício no cargo de juiz federal substituto. Vencidos os Ministros Marco
Aurélio e Joaquim Barbosa que concediam o writ, ao fundamento de que, diante do que preceitua o art. 88
da LOMAN, a lista deveria ser única e constituída por seis magistrados, já que, além dos magistrados
correspondentes ao número das vagas existentes — no caso, duas — para cada uma destas, mais dois
magistrados deveriam ser indicados (LC 35/79: “Art. 88 - Nas promoções ou acessos, havendo mais de
uma vaga a ser preenchida por merecimento, a lista conterá, se possível, número de magistrados igual ao
das vagas mais dois para cada uma delas.”).
MS 23789/PE, rel. Min. Ellen Gracie, 30.6.2005. (MS-23789)
Crime Contra a Honra e Atipicidade
O Tribunal rejeitou queixa-crime proposta contra Ministro de Estado, na qual lhe fora imputada a
prática dos crimes de calúnia, difamação e injúria (Lei 5.250/67, arts. 20, 21 e 22, respectivamente), que
seriam decorrentes da veiculação do artigo “A Reforma Previdenciária não tem face oculta”, por ele
escrito e publicado no Jornal Planalto Central do DF em resposta às matérias “As faces ocultas da
reforma” e “A irmandade dos fundos de pensão”, publicadas anteriormente naquele jornal. Sustentava o
querelante, autor de obra doutrinária que servira de base às duas últimas matérias jornalísticas, que sua
honra teria sido atingida por extensão. Considerou-se atípica a conduta, eis que inexistente, em relação à
calúnia e à difamação, qualquer imputação por parte do querelado de fato descrito como crime ou
ofensivo à reputação do querelante. Ademais, não obstante verificar a adequação objetiva do tipo descrito
no art. 22 da Lei de Imprensa, entendeu-se ausente o elemento de índole subjetiva necessário à
caracterização dos delitos — dolo geral e animus injuriandi, restando configurado, entretanto, o animus
defendendi, haja vista que o querelado escrevera o artigo com o intuito de defender a reforma
previdenciária planejada pelo atual governo, e afastar os argumentos antes expendidos pelo jornal a ela
contrários. Vencidos, apenas na preliminar de conhecimento, os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto
que declinavam da competência para o juízo de primeira instância.
Inq 2081/DF, rel. Min. Carlos Velloso, 1º.7.2005. (Inq-2081)
PRIMEIRA TURMA
Habeas Corpus e Justiça Trabalhista
A Turma deferiu habeas corpus em favor de paciente que, nos autos de reclamação trabalhista,
tivera contra ele determinada, por Juízo de Vara do Trabalho de comarca do Estado de Minas Gerais, a
prisão civil, sob a acusação de infidelidade como depositário judicial. Na espécie, denegado habeas
corpus impetrado ao TRT/MG, o paciente interpusera recurso ordinário ao TST, que o desprovera, e
impetrara, também, novo habeas corpus ao STJ, que concedera a ordem por não ter havido aceitação
expressa do encargo de depositário judicial, sem a qual o decreto de prisão é ilegítimo. Considerando que
os habeas corpus foram julgados antes da edição da EC 45/2004, entendeu-se aplicável, ao caso, a
jurisprudência até então firmada pelo Supremo, no sentido de competir ao juízo criminal o julgamento de
habeas corpus, em razão de sua natureza penal, ainda que a questão material subjacente seja de natureza
civil, cabendo o julgamento ao Tribunal Regional Federal, quando a coação for imputada a Juiz do
Trabalho de 1º Grau (EC 45/2004: “Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:... IV - os
mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria
sujeita a sua jurisdição.”). HC deferido para cassar o acórdão do TST, único impugnado, e declarar
válido o acórdão do STJ. Precedente citado: HC 68687/PR (DJU de 4.10.91).
HC 85096/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 28.6.2005. (HC-85096)
Delitos de Trânsito e Competência
Compete à Justiça Comum Estadual o julgamento dos crimes descritos nos arts. 303 (lesão corporal
no trânsito), 306 (embriaguez ao volante) e 309 (participação em competição não autorizada) da Lei
9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro), a teor do que dispõe o art. 291 e parágrafo único da mesma
norma c/c o art. 61 da Lei 9.099/95 (“Art. 291: Aos crimes cometidos na direção de veículos automotores
previstos neste código, aplicam-se as normas gerais do Código Penal e do Código de Processo Penal, se
este capítulo não dispuser de modo diverso, bem como a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, no que
couber. Parágrafo único. Aplica-se aos crimes de trânsito de lesão corporal culposa, de embriaguez ao
volante, e de participação em competição não autorizada o disposto nos arts. 74, 76 e 88 da Lei nº 9.099,
de 26 de setembro de 1995.”). Com esse entendimento, a Turma, por maioria, deferiu, parcialmente,
habeas corpus para anular acórdão de Turma Recursal, que condenara o paciente pelo delito de
embriaguez ao volante, e determinar a remessa dos autos ao TJ/MG. Mantida a decisão condenatória, haja
vista não ter sido demonstrado prejuízo ao paciente decorrente do procedimento dos juizados especiais.
Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia a ordem integralmente. Precedentes citados: HC 85019/MG
(DJU de 4.3.2005) e HC 81510/PR (DJU de 12.4.2002).
HC 85350/MG, rel. Min. Eros Grau, 28.6.2005. (HC-85350)
Falta Grave e Perda dos Dias Remidos
Nos termos do art. 127 da Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal), o condenado que comete falta
grave durante o cumprimento da pena perde os dias remidos, iniciando novo período a partir da infração
disciplinar, não havendo se falar em ofensa ao direito adquirido ou à coisa julgada. Perfilhando esse
entendimento, a Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia, sob a alegação de
ofensa ao princípio da proporcionalidade, o restabelecimento de acórdão do Tribunal de Alçada Criminal
do Estado de São Paulo que, ao prover recurso de agravo interposto pelo paciente, restaurara-lhe o direito
à remição. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia parcialmente o writ apenas em relação ao período
em que o paciente esteve preso na penitenciária onde a falta grave fora cometida. Precedente citado: HC
77592/SP (DJU de 12.3.99).
HC 85552/SP, rel. Min. Carlos Britto, 28.6.2005. (HC-85552)
Requerimento de Naturalização e Efeito Declaratório
O requerimento de aquisição da nacionalidade brasileira, fundado no art. 12, II, b, da CF (“Art. 12.
São brasileiros:... II – naturalizados:... b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade residentes na
República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que
requeiram a nacionalidade brasileira.”), possui caráter meramente declaratório, cujos efeitos retroagem à
data da solicitação. Dessa forma concluiu a Turma para negar provimento a recurso extraordinário e
manter acórdão do Tribunal de Justiça de Tocantins que, em mandado de segurança, anulara ato que
invalidara a posse de chilena no cargo público de enfermeira. Considerou-se que, a despeito de a portaria
de formal reconhecimento da naturalização ter sido publicada em data posterior à investidura da recorrida
no aludido cargo, o requerimento da interessada antecedera à posse, restando atendidos todos os
requisitos necessários à naturalização.
RE 264848/TO, rel. Min. Carlos Britto, 29.6.2005. (RE-264848)
SEGUNDA TURMA
Concurso Público: Adequação dos Quesitos ao Edital e Legalidade
Tendo em conta a existência de recurso idêntico decidido pela Primeira Turma favoravelmente a
candidato (RE 434708/RS, j. em 21.6.2005, v. Informativo 393), a Turma deu provimento a agravo
regimental para remeter ao Plenário o julgamento de recurso extraordinário em que se discute se a
adequação das questões da prova ao programa do edital de concurso público constitui tema de legalidade
suscetível de exame pelo Poder Judiciário.
RE 442411 AgR/RS, rel. Min. Carlos Velloso, 28.6.2005. (RE-442411)
Inelegibilidade de Parentes Afins e Separação de Fato - 2
A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do TSE que
mantivera decisão que declarara a inelegibilidade do recorrente, em virtude do seu grau de parentesco por
afinidade com o então prefeito, seu sogro, cassando, em conseqüência, o registro de sua candidatura ao
cargo de prefeito — v. Informativo 392. Em votação majoritária, deu-se provimento ao recurso para se
afastar a cláusula de inelegibilidade. Adotou-se interpretação teleológica do art. 14, § 7º da CF (“São
inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o
segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do
Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito,
salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.”), tendo em conta a peculiaridade de que
restara comprovada, na sentença que decretara o divórcio, a separação de fato do casal antes do início do
mandato do sogro do recorrente. Afirmou-se, ainda, que a regra estabelecida no aludido dispositivo
constitucional visa impedir o monopólio do poder político por grupos hegemônicos ligados por laços
familiares. Neste ponto, rejeitou-se suposta argumentação no sentido de desfazimento fraudulento do
vínculo conjugal com o objetivo de manter a família no poder, já que, no caso, concorreram somente o
recorrente e o seu sogro e a vitória daquele não ensejaria a impugnação da candidatura por parte da
coligação pela qual disputara o sogro. Vencido o Min. Carlos Velloso que negava provimento ao recurso,
por entender que a separação de fato não afasta a inelegibilidade e, na espécie, em algum momento do
mandato do sogro existira a sociedade conjugal.
RE 446999/PE, rel. Ellen Gracie, 28.6.2005. (RE-446999)
Empregada Gestante e Contrato por Prazo Determinado - 3
A Turma conclui julgamento de recurso extraordinário interposto pelo Estado de Santa Catarina
contra acórdão do Tribunal de Justiça do mesmo Estado que concedera, em parte, mandado de segurança
à recorrida, contratada temporariamente como professora, sob o regime da Lei 8.391/91, para lhe
assegurar o direito à licença-maternidade. Na espécie, o acórdão recorrido entendera que, em razão de a
impetrante estar a menos de dois meses do parto no momento em que encerrado o contrato de trabalho, o
direito à licença deveria ser ao mesmo integrado, haja vista ser uma proteção ao nascituro e ao infante e
não uma benesse ao trabalhador — v. Informativos 364 e 385. Por maioria, negou-se provimento ao
recurso por se entender, na linha dos precedentes do STF, que a temporariedade do contrato não prejudica
a percepção da licença à gestante (ADCT, art. 10, II, b), se os últimos 120 dias da gestação têm início
ainda na vigência do contrato. Vencida a Min. Ellen Gracie, relatora, que dava provimento ao recurso por
considerar que o Tribunal estadual conferira caráter absoluto à estabilidade provisória. O Min. Joaquim
Barbosa retificou o seu voto. Precedentes citados: RMS 24263/DF (DJU de 9.5.2003); RMS 21238/DF
(DJU de 3.5.2002); RE 273801/DF (DJU de 21.9.2004); AI 448572/SP (DJU de 22.4.2004); AI
395255/SP (DJU de 2.12.2003). Leia o inteiro teor do voto-vencedor na seção Transcrições deste
Informativo.
RE 287905/SC, rel. orig. Min. Ellen Gracie, rel. p/ acórdão Min. Carlos Velloso, 28.6.2005. (RE287905)
Responsabilidade Objetiva do Estado e Danos Morais
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do TRF da 4ª
Região que, afastando a responsabilidade objetiva do Estado, negara provimento a pedido de indenização
por danos morais e materiais. Alega-se, na espécie, ofensa ao art. 37, § 6º, da CF, porquanto a recorrente
teria sofrido abalo psicológico, assim como realizado gastos com sua inscrição em estabelecimento
particular de ensino superior, sendo ambos os danos ocasionados pela negativa da Universidade Federal
de Santa Maria - UFSM em efetuar a matrícula da recorrente, com base em exigência posteriormente
declarada descabida pelo tribunal a quo: conclusão de estágio profissionalizante. O Min. Carlos Velloso,
relator, conheceu em parte do recurso e, nessa parte, deu-lhe provimento para deferir a indenização por
danos morais, a ser apurada em liquidação de sentença, no que foi acompanhado pelo Min. Joaquim
Barbosa. Não conheceu do recurso quanto à argüição de dano material, uma vez que, na espécie, a
ocorrência do nexo de causalidade entre as despesas realizadas pela recorrente e a negativa da recorrida
em efetuar a matrícula somente poderia ser afirmada com o exame de provas. No tocante ao dano moral,
após ressaltar seu status constitucional (CF, art. 5º, X), afirmou que a sua concretização se dá quando
alguém tem ofendido, por ato de terceiro, o seu decoro ou a sua auto-estima, a causar desconforto,
aborrecimento ou constrangimento, não importando, em princípio, a envergadura desses dissabores.
Considerou que, no caso, a negativa de matrícula causara dor íntima, abalo psíquico e trauma à recorrente
que, após ser aprovada em vestibular para ingresso em universidade pública federal, vira seu anseio
postergado por exigência considerada, ulteriormente, dispensável pelo próprio Poder Judiciário. Após, o
julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Gilmar Mendes.
RE 364631/RS, rel. Min. Carlos Velloso, 28.6.2005. (RE-364631)
Sessões
Pleno
1ª Turma
2ª Turma
Ordinárias Extraordinárias Julgamentos
29.6.2005 30.6.2005 e 1º.7.2005
28
28.6.2005
29.6.2005
525
28.6.2005
——
593
CLIPPING
DO
DJ
1º de julho de 2005
Ext. N. 855-2
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
EMENTA: EXTRADIÇÃO - ATOS DELITUOSOS DE NATUREZA TERRORISTA - DESCARACTERIZAÇÃO DO
TERRORISMO COMO PRÁTICA DE CRIMINALIDADE POLÍTICA - CONDENAÇÃO DO EXTRADITANDO A DUAS (2)
PENAS DE PRISÃO PERPÉTUA - INADMISSIBILIDADE DESSA PUNIÇÃO NO SISTEMA CONSTITUCIONAL
BRASILEIRO (CF, ART. 5º, XLVII, “B”) - EFETIVAÇÃO EXTRADICIONAL DEPENDENTE DE PRÉVIO COMPROMISSO
DIPLOMÁTICO CONSISTENTE NA COMUTAÇÃO, EM PENAS TEMPORÁRIAS NÃO SUPERIORES A 30 ANOS, DA
PENA DE PRISÃO PERPÉTUA - PRETENDIDA EXECUÇÃO IMEDIATA DA ORDEM EXTRADICIONAL, POR
DETERMINAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - IMPOSSIBILIDADE - PRERROGATIVA QUE ASSISTE,
UNICAMENTE, AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA, ENQUANTO CHEFE DE ESTADO - PEDIDO DEFERIDO, COM
RESTRIÇÃO.
O REPÚDIO AO TERRORISMO: UM COMPROMISSO ÉTICO-JURÍDICO ASSUMIDO PELO BRASIL, QUER EM FACE DE
SUA PRÓPRIA CONSTITUIÇÃO, QUER PERANTE A COMUNIDADE INTERNACIONAL.
- Os atos delituosos de natureza terrorista, considerados os parâmetros consagrados pela vigente Constituição da República, não
se subsumem à noção de criminalidade política, pois a Lei Fundamental proclamou o repúdio ao terrorismo como um dos
princípios essenciais que devem reger o Estado brasileiro em suas relações internacionais (CF, art. 4º, VIII), além de haver
qualificado o terrorismo, para efeito de repressão interna, como crime equiparável aos delitos hediondos, o que o expõe, sob tal
perspectiva, a tratamento jurídico impregnado de máximo rigor, tornando-o inafiançável e insuscetível da clemência soberana do
Estado e reduzindo-o, ainda, à dimensão ordinária dos crimes meramente comuns (CF, art. 5º, XLIII).
- A Constituição da República, presentes tais vetores interpretativos (CF, art. 4º, VIII, e art. 5º, XLIII), não autoriza que se
outorgue, às práticas delituosas de caráter terrorista, o mesmo tratamento benigno dispensado ao autor de crimes políticos ou de
opinião, impedindo, desse modo, que se venha a estabelecer, em torno do terrorista, um inadmissível círculo de proteção que o
faça imune ao poder extradicional do Estado brasileiro, notadamente se se tiver em consideração a relevantíssima circunstância de
que a Assembléia Nacional Constituinte formulou um claro e inequívoco juízo de desvalor em relação a quaisquer atos delituosos
revestidos de índole terrorista, a estes não reconhecendo a dignidade de que muitas vezes se acha impregnada a prática da
criminalidade política.
EXTRADITABILIDADE DO TERRORISTA: NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DO PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO E
ESSENCIALIDADE DA COOPERAÇÃO INTERNACIONAL NA REPRESSÃO AO TERRORISMO.
- O estatuto da criminalidade política não se revela aplicável nem se mostra extensível, em sua projeção jurídico-constitucional, aos
atos delituosos que traduzam práticas terroristas, sejam aquelas cometidas por particulares, sejam aquelas perpetradas com o apoio
oficial do próprio aparato governamental, à semelhança do que se registrou, no Cone Sul, com a adoção, pelos regimes militares
sul-americanos, do modelo desprezível do terrorismo de Estado.
- O terrorismo - que traduz expressão de uma macrodelinqüência capaz de afetar a segurança, a integridade e a paz dos cidadãos e
das sociedades organizadas - constitui fenômeno criminoso da mais alta gravidade, a que a comunidade internacional não pode
permanecer indiferente, eis que o ato terrorista atenta contra as próprias bases em que se apóia o Estado democrático de direito,
além de representar ameaça inaceitável às instituições políticas e às liberdades públicas, o que autoriza excluí-lo da benignidade de
tratamento que a Constituição do Brasil (art. 5º, LII) reservou aos atos configuradores de criminalidade política.
- A cláusula de proteção constante do art. 5º, LII da Constituição da República - que veda a extradição de estrangeiros por crime
político ou de opinião - não se estende, por tal razão, ao autor de atos delituosos de natureza terrorista, considerado o frontal
repúdio que a ordem constitucional brasileira dispensa ao terrorismo e ao terrorista.
- A extradição - enquanto meio legítimo de cooperação internacional na repressão às práticas de criminalidade comum representa instrumento de significativa importância no combate eficaz ao terrorismo, que constitui “uma grave ameaça para os
valores democráticos e para a paz e a segurança internacionais (...)” (Convenção Interamericana Contra o Terrorismo, Art. 11),
justificando-se, por isso mesmo, para efeitos extradicionais, a sua descaracterização como delito de natureza política. Doutrina.
EXTRADIÇÃO E PRISÃO PERPÉTUA: NECESSIDADE DE PRÉVIA COMUTAÇÃO, EM PENA TEMPORÁRIA
(MÁXIMO DE 30 ANOS), DA PENA DE PRISÃO PERPÉTUA - REVISÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL, EM OBEDIÊNCIA À DECLARAÇÃO CONSTITUCIONAL DE DIREITOS (CF, ART. 5º,
XLVII, “b”).
- A extradição somente será deferida pelo Supremo Tribunal Federal, tratando-se de fatos delituosos puníveis com prisão perpétua,
se o Estado requerente assumir, formalmente, quanto a ela, perante o Governo brasileiro, o compromisso de comutá-la em pena
não superior à duração máxima admitida na lei penal do Brasil (CP, art. 75), eis que os pedidos extradicionais - considerado o
que dispõe o art. 5º, XLVII, “b” da Constituição da República, que veda as sanções penais de caráter perpétuo - estão
necessariamente sujeitos à autoridade hierárquico-normativa da Lei Fundamental brasileira. Doutrina. Novo entendimento
derivado da revisão, pelo Supremo Tribunal Federal, de sua jurisprudência em tema de extradição passiva.
A QUESTÃO DA IMEDIATA EFETIVAÇÃO DA ENTREGA EXTRADICIONAL - INTELIGÊNCIA DO ART. 89 DO
ESTATUTO DO ESTRANGEIRO - PRERROGATIVA EXCLUSIVA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA, ENQUANTO
CHEFE DE ESTADO.
- A entrega do extraditando - que esteja sendo processado criminalmente no Brasil, ou que haja sofrido condenação penal
imposta pela Justiça brasileira - depende, em princípio, da conclusão do processo penal brasileiro ou do cumprimento da pena
privativa de liberdade decretada pelo Poder Judiciário do Brasil, exceto se o Presidente da República, com apoio em juízo
discricionário, de caráter eminentemente político, fundado em razões de oportunidade, de conveniência e/ou de utilidade, exercer,
na condição de Chefe de Estado, a prerrogativa excepcional que lhe permite determinar a imediata efetivação da ordem
extradicional (Estatuto do Estrangeiro, art. 89, “caput”, “in fine”). Doutrina. Precedentes.
* noticiado no Informativo 358
MS N. 25.027-DF
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MÉDICOS: JORNADA DIÁRIA DE TRABALHO. D.L. 1.445/76, art.
14. Lei 9.436, de 05.02.97, art. 1º. Lei 8.112, de 11.12.90, art. 19, § 2º.
I. - A jornada diária de trabalho do médico servidor público é de 4 (quatro) horas. Decreto Lei 1.445/76, art. 14. Lei 9.436/97, art.
1º. II. - Normas gerais que hajam disposto a respeito da remuneração dos servidores públicos, sem especificar a respeito da jornada
de trabalho dos médicos, não revogam a norma especial, por isso que a norma especial afasta a norma geral, ou a norma geral não
revoga nem modifica a norma especial. III. - Mandado de segurança deferido.
* noticiado no Informativo 388
RE N. 418.918-RJ
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. CORREÇÃO DAS CONTAS VINCULADAS DO FGTS.
DESCONSIDERAÇÃO DO ACORDO FIRMADO PELO TRABALHADOR. VÍCIO DE PROCEDIMENTO. ACESSO AO
COLEGIADO.
1. Superação da preliminar de vício procedimental ante a peculiaridade do caso: matéria de fundo que se reproduz em incontáveis
feitos idênticos e que na origem (Turmas Recursais dos Juizados Especiais da Seção Judiciária do Rio de Janeiro) já se encontra
sumulada. 2. Inconstitucionalidade do Enunciado nº 21 das Turmas Recursais da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, que preconiza a
desconsideração de acordo firmado pelo trabalhador e previsto na Lei Complementar nº 110/2001. Caracterização de afastamento,
de ofício, de ato jurídico perfeito e acabado. Ofensa ao princípio inscrito no art. 5º, XXXVI, do Texto Constitucional. 3. Recurso
extraordinário conhecido e provido.
* noticiado no Informativo 381
Inq N. 1.070-TO
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Denúncia: cabimento, com base em elementos de informação colhidos em auditoria do Tribunal de Contas, sem que a
estes - como também sucede com os colhidos em inquérito policial - caiba opor, para esse fim, a inobservância da garantia ao
contraditório. II. Aprovação de contas e responsabilidade penal: a aprovação pela Câmara Municipal de contas de Prefeito não elide
a responsabilidade deste por atos de gestão. III. Recurso especial: art. 105, III, c: a ementa do acórdão paradigma pode servir de
demonstração da divergência, quando nela se expresse inequivocamente a dissonância acerca da questão federal objeto do recurso.
* noticiado no Informativo 371
HC N. 85.652-PR
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: HABEAS CORPUS. DESACATO. CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. SENTENÇA PROFERIDA POR
JUIZ DE DIREITO DA JUSTIÇA COMUM. RECURSO PARA O TRIBUNAL DE JUSTIÇA. A competência para julgar recurso
de apelação interposto contra sentença proferida por Juiz de Direito da Justiça Comum é do Tribunal de Justiça, não da Turma
Recursal. “As disposições concernentes a jurisdição e competência se aplicam de imediato, mas, se já houver sentença relativa ao
mérito, a causa prossegue na jurisdição em que ela foi prolatada, salvo se suprimido o Tribunal que deverá julgar o recurso” (Carlos
Maximiliano). Ordem parcialmente deferida.
* noticiado no Informativo 390
RMS N. 24.699-DF
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO.
DEMISSÃO. PODER DISCIPLINAR. LIMITES DE ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA.
ATO DE IMPROBIDADE. 1. Servidor do DNER demitido por ato de improbidade administrativa e por se valer do cargo para obter
proveito pessoal de outrem, em detrimento da dignidade da função pública, com base no art. 11, caput, e inciso I, da Lei n. 8.429/92
e art. 117, IX, da Lei n. 8.112/90. 2. A autoridade administrativa está autorizada a praticar atos discricionários apenas quando norma
jurídica válida expressamente a ela atribuir essa livre atuação. Os atos administrativos que envolvem a aplicação de “conceitos
indeterminados” estão sujeitos ao exame e controle do Poder Judiciário. O controle jurisdicional pode e deve incidir sobre os
elementos do ato, à luz dos princípios que regem a atuação da Administração. 3. Processo disciplinar, no qual se discutiu a
ocorrência de desídia — art. 117, inciso XV da Lei n. 8.112/90. Aplicação da penalidade, com fundamento em preceito diverso do
indicado pela comissão de inquérito. A capitulação do ilícito administrativo não pode ser aberta a ponto de impossibilitar o direito
de defesa. De outra parte, o motivo apresentado afigurou-se inválido em face das provas coligidas aos autos. 4. Ato de improbidade:
a aplicação das penalidades previstas na Lei n. 8.429/92 não incumbe à Administração, eis que privativa do Poder Judiciário.
Verificada a prática de atos de improbidade no âmbito administrativo, caberia representação ao Ministério Público para ajuizamento
da competente ação, não a aplicação da pena de demissão. Recurso ordinário provido.
* noticiado no Informativo 372
RHC N. 83.709-SP
RELATOR P/ ACÓRDÃO: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTA: AÇÃO PENAL. Processo suspenso. Prova. Produção antecipada. Inquirição de testemunhas. Inadmissibilidade.
Revelia. Réu revel citado por edital. Não comparecimento por si nem por advogado constituído. Prova não urgente por
natureza. Deferimento em grau de recurso. Ofensa ao princípio do contraditório (art. 5º, LV, da CF). Recurso provido.
Inteligência dos arts. 92, 93 e 366 cc. 225, todos do CPP. Se o acusado, citado por edital, não comparece nem constitui advogado,
pode o juiz, suspenso o processo, determinar produção antecipada de prova testemunhal, apenas quando esta seja urgente nos termos
do art. 225 do Código de Processo Penal.
HC N. 85.271-MS
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. JUIZADO ESPECIAL. CRIME DE AMEAÇA. AUSÊNCIA
DE REPRESENTAÇÃO DA VÍTIMA. RITO PROCESSUAL: INVERSÃO. PREJUÍZO. AUSÊNCIA DE DOLO.
I. - Representação da vítima ratificada pelo comparecimento à audiência de instrução e pelo teor da sua manifestação.
II. - Não alegada a tempo e modo a inobservância do disposto no art. 81 da Lei 9.099/95, que é uma nulidade relativa, ocorre a
preclusão.
III. - Somente com o exame aprofundado da prova será possível opor-se ao acórdão, para o fim de verificar se o paciente agiu, ou
não, com dolo. O processo do habeas corpus, entretanto, não comporta esse exame.
IV. - H.C. indeferido.
HC N. 85.585-RJ
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: - CONSTITUCIONAL. PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME HEDIONDO. REGIME
FECHADO. OMISSÃO DO ADVÉRBIO “INTEGRALMENTE”. LEI 8.072/90, ART. 2º, § 1º. CONSTITUCIONALIDADE.
I. - A omissão do advérbio “integralmente” na sentença condenatória não significa que se tenha assegurado ao condenado o direito à
progressão do regime prisional. No caso, o d. magistrado fez expressa menção à Lei 8.072/90.
II. - A pena por crime previsto no art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90 (crime hediondo) deverá ser cumprida em regime fechado.
Inocorrência de inconstitucionalidade. C.F., art. 5º, XLIII. Precedentes do STF: HC 69.657/SP, Rezek, RTJ 147/598; HC 69.603/SP,
Brossard, RTJ 146/611; HC 69.377/MG, Velloso, “DJ” de 16.4.93; HC 76.991/MG, Velloso, “DJ” de 14.8.98; HC 81.421/SP, Néri,
“DJ” de 15.3.02; HC 84.422/RS, julgado em 14.12.2004.
III. - HC indeferido.
HC N. 85.694-MG
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. CRIME DE IMPRENSA. LEI 10.259/2001. PENA MÁXIMA COMINADA NÃO
SUPERIOR A DOIS ANOS. CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. COMPETÊNCIA. JUIZADO ESPECIAL
CRIMINAL. 1. Com o advento da Lei nº 10.259/01, não cabe mais perquirir se há previsão de procedimento especial para
determinado crime, com o objetivo de enquadrá-lo, ou não, no conceito de crime de menor potencial ofensivo. Basta o exame da
pena cominada, a qual não poderá ser superior a dois anos. 2. Não ocorrência da prescrição da pretensão punitiva. 3. Ordem
indeferida.
* noticiado no Informativo 391
RE N. 351.142-RN
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ISONOMIA. CONCURSO PÚBLICO. PROVA DE APTIDÃO FÍSICA. LESÃO
TEMPORÁRIA. NOVA DATA PARA O TESTE. INADMISSIBILIDADE. 1. Mandado de segurança impetrado para que
candidata acometida de lesão muscular durante o teste de corrida pudesse realizar as demais provas físicas em outra data. Pretensão
deferida com fundamento no princípio da isonomia. 2. Decisão que, na prática, conferiu a uma candidata que falhou durante a
realização de sua prova física uma segunda oportunidade para cumpri-la. Benefício não estendido aos demais candidatos. Criação de
situação anti-isonômica. 3. Recurso extraordinário conhecido e provido.
* noticiado no Informativo 390
RE N. 351.905-RJ
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS. PROFISSIONAL DA SAÚDE. ART.
17 DO ADCT. 1. Desde 1º.11.1980, a recorrida ocupou, cumulativamente, os cargos de auxiliar de enfermagem no Instituto
Nacional do Câncer e no Instituto de Assistência dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro - IASERJ. A administração municipal
exigiu que ela optasse por apenas um dos cargos. 2. A recorrida encontra-se amparada pela norma do art. 17, § 2º, do ADCT da
CF/88. Na época da promulgação da Carta Magna, acumulava dois cargos de auxiliar de enfermagem. 3. O art. 17, § 2º, do ADCT
deve ser interpretado em conjunto com o inciso XVI do art. 37 da Constituição Federal, estando a cumulação de cargos
condicionada à compatibilidade de horários. Conforme assentado nas instâncias ordinárias, não havia choque de horário nos dois
hospitais em que a recorrida trabalhava. 4. Recurso extraordinário conhecido e improvido.
Acórdãos Publicados: 888
TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão
mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Empregada Gestante e Contrato por Prazo Determinado (Transcrições)
RE 287905/SC*
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. GESTANTE: LICENÇA. C.F., art. 7º, XVIII; ADCT, art. 10, II, b. CONTRATO
TEMPORÁRIO.
I. – À duração por prazo certo do contrato sobrevém gravidez que a Constituição protege com licença por 120 dias –
C.F., art. 7º, VIII – que não protege a mulher-trabalhadora, mas ao nascituro e ao infante. Por isso, a temporariedade do
contrato não prejudica a percepção da licença à gestante, se os últimos 120 dias da gestação têm início ainda na vigência do
contrato.
II. – RE conhecido e não provido.
Voto-vista: - O Segundo Grupo de Câmaras do Eg. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, às fls. 62-66, em mandado de
segurança, decidiu pelo direito da professora admitida em caráter temporário na rede oficial de ensino catarinense à
percepção da licença-gestante, desde que os últimos cento e vinte dias da gestação se iniciem na vigência do contrato de
trabalho, por se tratar de proteção conferida pela Lei Maior ao nascituro.
Daí o recurso extraordinário interposto pelo ESTADO DE SANTA CATARINA, às fls. 71-79, fundado no art. 102, III, a,
da Constituição Federal, com alegação de ofensa aos arts. 2º; 7º, XVIII; 37, caput, II e IX; e 39, § 2º, da mesma Carta.
Inadmitido o recurso (fl. 87), subiram os autos em virtude do provimento do agravo de instrumento em apenso.
A Procuradoria Geral da República, em parecer lavrado pela ilustre Subprocuradora-Geral da República Maria Caetana
Cintra Santos, opinou pelo parcial conhecimento do recurso e, nessa parte, pelo seu desprovimento (fls. 98-102).
Na Sessão de 05.10.2004, a eminente Relatora, Ministra Ellen Gracie, conheceu do recurso e deu-lhe provimento, no que
foi acompanhada, posteriormente, pelo eminente Ministro Joaquim Barbosa, em voto-vista proferido em 26.4.2005 (certidões de
fls. 104 e 107).
Pedi vista dos autos, que me foram encaminhados em 20.6.2005. Em 27.6.05, mandei os autos à Mesa, a fim de retomarmos
o julgamento do recurso.
Passo a votar.
O Tribunal a quo decidiu:
“– Administrativo. Professora temporária.
- A temporariedade do contrato das professoras admitidas no regime da Lei nº 8.391/91 não prejudica a percepção
da licença à gestante, se os últimos 120 dias da gestação têm início ainda na vigência do contrato.
- É que, à duração por prazo certo do contrato, sobrevém acontecimento natural que a Constituição Federal protege
com licença por 120 dias, que não é uma benesse ao trabalhador, mas uma proteção ao nascituro e ao infante.
- Quanto à admissão da impetrante como professora temporária em 1998, não há prova de que ela tivesse se
submetido a processo seletivo ou comparecido perante a Junta Médica, como alega.
- Segurança parcialmente deferida.” (Fl. 62)
Com a vênia da eminente Ministra Ellen Gracie e do não menos eminente Ministro Joaquim Barbosa, penso que o acórdão
recorrido decidiu com acerto.
No julgamento do RMS 24.263/DF, por mim relatado, decidiu esta 2ª Turma:
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO.
EXONERAÇÃO. C.F., art. 7º, XVIII; ADCT, art. 10, II, b.
SERVIDOR
PÚBLICO.
LICENÇA-GESTANTE.
I. - Servidora pública exonerada quando no gozo de licença-gestante: a exoneração constitui ato arbitrário, porque
contrário à norma constitucional: C.F., art. 7º, XVIII; ADCT, art. 10, II, b.
II. - Remuneração devida no prazo da licença-gestante, vale dizer, até cinco meses após o parto. Inaplicabilidade, no
caso, das Súmulas 269 e 271-STF.
III. - Recurso provido.” (“DJ” de 09.5.2003)
No RMS 21.328/DF, também de minha relatoria, decidiu esta 2ª Turma:
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO. FUNGIBILIDADE. C.F., art. 102, II, a.
CONSTITUCIONAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. GRAVIDEZ. C.F., art. 7º, I; ADCT, art. 10, II, b.
I. - Conversão do recurso extraordinário em ordinário, tendo em vista a ocorrência da hipótese inscrita no art. 102,
II, a, da Constituição.
II. - Estabilidade provisória decorrente da gravidez (C.F., art. 7º, I; ADCT, art. 10, II, b). Extinção do cargo,
assegurando-se à ocupante, que detinha estabilidade provisória decorrente da gravidez, as vantagens financeiras pelo
período constitucional da estabilidade.
III. - Recurso improvido.” (“DJ” de 03.5.2002)
No RE 273.801/DF, acentuei que a responsabilidade do empregador, no caso da estabilidade provisória da gestante é objetiva
(ADCT, art. 10, II, b). Confirmada a gravidez, adquire a empregada estabilidade provisória até cinco meses após o parto. Ora, se a
dispensa, com o término do prazo contratual, ocorreu quando a gravidez já existia, ofendeu ela o dispositivo constitucional.
No caso, o acórdão concedeu apenas a licença-gestante (C.F., art. 7º, XVIII), benefício estendido aos servidores públicos
pelo art. 39, § 3º, da mesma Carta.
Com acerto, decidiu o acórdão, conforme voto do eminente Desembargador João José Schaefer:
“(...)
Estando a menos de dois meses do parto ao encerrar-se o contrato de trabalho, neste há de integrar-se, sem dúvida, a
licença a gestante que a Constituição garante por 120 dias, sem prejuízo do salário, pois à duração por prazo certo do
contrato, sobreveio acontecimento natural que a Constituição protege com licença por 120 dias, o que não é uma benesse ao
trabalhador, mas uma proteção ao nascituro e ao infante.
(...).” (Fl. 65)
Nos AI 448.572/SP e 395.255/SP, o eminente Ministro Celso de Mello, examinando questões semelhantes, anotou que “a
empregada gestante tem direito subjetivo à estabilidade provisória prevista no art. 10, II, b, do ADCT/88, bastando

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