Ativação e ressignificação da classe trabalhadora em Venezuela e

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Ativação e ressignificação da classe trabalhadora em Venezuela e
Ativação e ressignificação da classe trabalhadora em Venezuela e Bolívia: a
conjuntura constituinte.
Mayra Goulart 1
Introdução.
O paper aqui apresentado faz parte de uma pesquisa em andamento. Esta por sua
vez espera concluir-se sob a forma de uma contribuição à teoria democrática
contemporânea, uma vez que seu objeto diz respeito a diferentes formas de interpretar
este ideal. Nesse sentido, buscar-se-á observar como diferentes conceitos de democracia
são mobilizados por atores sociais determinados, atentando para as consequências de tal
mobilização. Em particular, serão analisadas as conceitualizações substancialistas
procedimentalistas e "agonísticas" acerca da noção de soberania popular.
Não obstante, a escolha destas formas de ressignificar o ideal democrático
obedece um critério puramente instrumental e didático tendo em vista o objetivo do
trabalho, que é analisar os recentes processos de ativação do poder constituinte
sucedidos em Venezuela e Bolívia – nos quais o conceito de democracia teria exercido o
papel de catalizador – observando as formas pelas quais os principais atores envolvidos
se apropriaram de tal conceito. Em seguida, se investigará como essas diferentes formas
de interpretar o ideal democrático influenciam a práxis dos atores e, por conseguinte, as
instituições por eles modeladas.
Partir-se-á, então, da hipótese de que distintas formas de entender a democracia
ensejam diferentes formas de agir, na medida em que "decantam" sobre a forma de
distintas práticas e demandas políticas, que, por sua vez, dão origem a desenhos
institucionais diferenciados. Sendo assim, por meio da análise de documentos e ensaios
sobre o período constituinte, mas, também, sobre seus antecedentes e desdobramentos,
buscar-se-á elementos que permitam um maior conhecimento sobre a formação e
atuação dos principais atores coletivos envolvidos nos procesos de cambio 2 estudados.
1
Doutoranda em Ciência Po lít ica do Instituto de Estudos Polít icos e Sociais da Un iversidade Estadual do
Rio de Janeiro (IESP/UERJ), mestre em Ciência Po lít ica pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio
de Janeiro (IUPERJ), professora do Instituto de Humanidades e da Faculdade de Direito da Universidade
Cândido Mendes (UCAM) e coordenadora do Observatório de Países de Língua Portuguesa (OPLOP).
2
Forma pela qual grande parte da população de Venezuela e Bolívia se refere ao processo que levou a
uma transformação política, por meio de u ma ruptura co m as lid eranças pretéritas e instauração de um
1
Do mesmo modo, serão analisados documentos e ensaios sobre o período que sucede
tais processos em busca de elementos que indiquem suas principais consequências.
Portanto, identificando a democracia como um ideal normativo que desempenha
um papel determinante na definição da conduta dos principais atores envolvidos nos
processos constituintes estudados e, por conseguinte, no desenho institucio nal por eles
configurados, espera-se estabelecer: (i) quem eram e qual a origem dos principais
atores envolvidos nesses processos; (ii) qual eram os conceitos de democracia por eles
mobilizados, ou seja, o que eles entendiam por democracia quando a demandavam; (iii)
qual o impacto dessas diferentes formas de entendimento na praxis desses atores durante
o momento constituinte; (iv) qual o seu impacto para a configuração institucional
constituída.
Primeira parte
Apresentação da polêmica: debate teórico acerca do conceito de democracia.
1.1.
A democracia inachevée, sua origem e o controverso conceito de
participação.
Esta investigação tem como ponto de partida o diagnóstico de Pierre
Rosanvallon de que o ideal democrático teria um caráter inachevé, ou seja, se
constituiria como um horizonte necessáriamente inalcançável 3 e, portanto, incapaz de
cristalizar-se em um sistema institucional ou conceito determinado. Tal pressuposto, por
sua vez, se desdobra em uma perspectiva epistemológica segundo a qual o conceito de
democracia só se mostraria sob a forma de movimento e, por isso, só poderia ser
estudado através da análise de suas sucessivas ressignificações e polêmicas entre as
diferentes formas de interpretá-lo. Esta é, então, a perspectiva que orienta a proposta
novo marco institucional. Sob uma perspectiva quantitativa e generalista é seguro afirmar que tal p rocesso
conta com o apoio da maio ria dos cidadãos de ambos os países, embora, co mo será desenvolvido ao longo
do trabalho, os níveis de aprovação e crítica variem significativamente entre os dois casos estudados.
3
» il est tout de suite nécessaire de préciser qu’il ne s’agit pas seulement de dire que la démocratie a une
histoire. Il faut considérer plus radicalement que la démocratie est une histoire. Elle est indissociable
d’un travail d’exploration et d’experimentation, de compréhension et d’élaboration d’elle -même » (3
ROSANVA LLON ; 2000 : 32-33.)
2
desta primeira parte, na qual será promovido um contraste entre duas possíveis
interpretações para a noção de soberania popular: uma, schmittiana, de caráter
substancialista com desdobramentos cesaristas e outra, habermasiana, de caráter
procedimental e deliberativo. Tal contraste, todavia, será realizado com a intenção de
orientar uma reflexão crítica a respeito das novas Constituições de Venezuela (1999) e
Bolívia (2009), assim como dos processos políticos que as engendraram e sucederam.
Esta intenção alicerça-se na percepção de que ambas dinâmicas de ativação do
poder constituinte respondem a um projeto de refundação democrática do Estado,
através da construção de um modelo participativo de democracia. Entretanto, haja vista
sua vagueza e indefinição conceitual, a noção de participação é compatível com
concepções substancialistas e procedimentais de democracia.
Deste modo, objetivo da pesquisa é aclarar quais teriam sido as interpretações
acerca da ideia de soberania popular mobilizadas nesta conjuntura, na tentativa de
esclarecer qual teria sido a fundamentação do modelo demandado. Nesta medida, a
análise se volta para a busca de indícios que evidenciem, nas dinâmicas políticoinstitucionais configuradas pelas novas Cartas, vestígios que remetam aos difere ntes – e,
em certa medida, antagônicos – conceitos de democracia que as inspiraram.
Esta seção cumpre, então, a função de introduzir didática e preliminarmente
alguns destes conceitos. Para isso, ela incluirá um quadro comparativo no qual serão
sintetizadas as cinco formas de ressignificar o ideal democrático que serão mobilizadas
ao longo do estudo de casos. Estas são: (a) da origem: o modelo grego; (b) da
ressignificação republicana: o modelo substancialista de Rousseau; (c) da radicalização
schmittiana: o modelo cesarista/plebiscitário; (d) da crítica habermasiana: democracia
enquanto modelo de procedimento deliberativo e, por fim, (e) uma síntese possível: o
modelo agonístico de Chantall Mouffe e Ernesto Laclau.
Antes desta sucinta exposição cabe um, também sucinto, comentário acerca do
caráter demasiadamente vago das interpretações “participativas” do ideal democrático 4 .
Para isso, voltar-se-á ao modelo grego (ateniense), enquanto arquétipo deste ideal, com
o propósito de desqualificar sua caracterização como “democracia direta” – apontando
4
Levando em consideração que mesmo o modelo plebiscitário e cesarista se estrutura em função de
algum grau de participação, no caso à consulta às massas e, subsequente, aclamação ou desaprovação
ao líder, é possível conjecturar que tal conceito é demasiadamente vago e, portanto, incapaz de servir
de parâmetro para a análise normativa dos experimentos democráticos.
3
os limites de tal conceito e sua proximidade com as formulações substancialistas. Sendo
assim, o sistema político ateniense será reafirmado em seus componentes deliberativos.
Com base nas leituras de M. I. Finley, Chantal Mouffe e Ellen Wood, entre
outros, o sistema político-social estabelecido em Atenas no século IV AC. – delineado
através de resgates históricos, subjetivamente orientados, como todos os outros –, é
possível situá-lo no patamar de modelo de democracia, a servir de inspiração para as
experiências subsequentes. Nestas narrativas ele sobressai, então, como procedimento
deliberativo e includente, no que diz respeito à efetiva participação dos diferentes
estratos econômicos que compunham a cidadania ateniense. Não obstante o
reconhecimento da incompatibilidade do tipo de mecanismo político criado na Atenas
do século IV A.C, com relação às sociedades complexas do século XXI.
Todavia, de acordo com o ponto de vista assumido ao longo desta análise,
nenhum anseio de mudança, sobretudo quando baseado no ideal democrático, pode
ultrapassar a vulgaridade sem impor limites ao ceticismo. Dessa forma, como veremos
no estudo de casos, é esta a disposição de grande parte dos atores políticos
comprometidos com a instauração de um proceso de cambio em Venezuela e Bolívia,
capaz de instaurar um modelo de democracia radicalmente participativo, cuja inspiração
subjaz ao arquétipo ateniense, embora combinada com inúmeras outras influências e
ressignificações.
Uma disposição análoga, porém orientada teoricamente, pode ser encontrada na
argumentação desenvolvida por M. I. Finley, em Democracia Antiga e Democracia
Moderna. Isto porque o propósito do texto – que é repensar a democracia moderna a
partir de uma análise aprofundada do modelo ateniense – é conciliado a um justificável
ceticismo, a respeito da plausibilidade de admitir o sistema político de Atenas como um
desenho institucional passível de transplante trans- histórico. Afinal, mesmo nos tempos
áureos de Péricles, a totalidade dos cidadãos atenienses jamais passara de 40 mil
homens, organizados de modo rudimentar em uma comunidade essencialmente agrícola.
Este trabalho, então, em muito deve ao esforço de recuperação histórica realizado
por Finley, Chantall e Wood acerca do modelo legado pelos gregos. Porém, é
particularmente devedor do ponto de vista crítico que estrutura a argumentação destes
autores. Como pode ser ilustrado no fragmento abaixo, retirado do livro de Finley.
4
“(...) seria absurdo fazer qualquer co mparação direta com u ma
sociedade pequena, homogênea, onde todos se conheciam, co mo a antiga
Atenas, sugerir ou até mesmo sonhar que pudéssemos reinstalar uma
Assembleia de cidadãos como órgão supremo, co m poder decisório de uma
cidade ou não moderna. Não era essa a opção que eu examinava, e sim u ma
totalmente distinta, proveniente da apatia política e de sua avaliação. Não
há como contestar que a apatia pública e a ignorância polít ica são hoje fatos
fundamentais. As decisões são tomadas pelos líderes polít icos em apelo ao
voto popular, o qual, no máximo , tem apenas um eventual poder de veto
depois da concretização do fato. A questão é se esse estado de coisas, nas
condições atuais, é algo necessário e desejável, ou se novas de
participação popular, com o mesmo espírito das atenienses, embora sem
sua essência, precisam ser inventadas” (FINLEY, 1988: 48 – grifo meu)
Este argumento é fundamental para a pesquisa aqui apresentada, pois, além de
assumido sob o ponto de vista teórico, ele é também compatível com uma apreciação
empírica, formada a partir da análise dos atores coletivos que compõem o estudo de
casos. Esta compatibilidade resulta do fato de que muito daqueles que vislumbravam a
instauração de um proceso de cambio, deixaram de lado o excesso de ceticismo para
abraçar um ponto de vista efetivamente normativo, haja vista a intenção de construir
algo novo.
Grande parte das abordagens comprometidas uma radicalização da democracia,
empreendidas pelas sociedades venezuelana e boliviana; a despeito de suas diferenças,
possuem uma estrutura comum na qual aparece a referência a experimentos
participativos análogos ao ateniense 5 . Tal estrutura tem alguns atributos essenciais: a
percepção de que o modelo representativo sofre de uma crise de legitimidade – tendo se
mostrado insuficiente para atender às crescentes demandas e expectativas associadas ao
ideal democrático –e; em segundo lugar, elas compartilham o entendimento de que o
incremento da participação é a alternativa mais adequada para lidar com tal crise.
Não obstante, a hipótese desenvolvida nesta seção busca atentar para a
inadequação do conceito de "democracia direta", tendo em vista possíveis
desdobramentos plebiscitários, e, até mesmo cesaristas, que subestimam o componente
5
Estes, por sua vez, são associados à ideia de democracia d ireta, que, co mo veremos, abre margem para
imprecisões conceituais com consequências políticas desagradáveis.
5
deliberativo e o envolvimento dos cidadãos na formulação das propostas posteriormente
sufragadas. Sob esta perspectiva, a participação se reduziria uma função meramente
consultiva, perante propostas apresentadas por elites políticas (no caso dos
experimentos plebiscitários), ou por um líder a ser aclamado ou rechaçado (no caso dos
experimentos cesaristas).
O conceito de "democracia participativa", por sua vez, padece do mesmo
problema, e, também, será descartado em virtude de sua excessiva imprecisão. Pois,
como asseverado acima, a ideia de participação pode compreender desde de uma
aceitação tácita e complacente quanto às autoridades políticas, até a capacidade dos
cidadãos de se envolverem ativamente nos processos de formação e decisão das
políticas públicas.
Deste modo, é necessário demarcar as diferenças entre as formas de entender a
participação e a democracia, haja vista suas consequências radicalmente distintas em
termos de práticas políticas e desenho institucional (o que será feito no próximo
subitem). Para, em seguida, buscar um enquadramento normativo que defenda as
abordagens que privilegiam o momento da deliberação, ressaltando a importância de
processos de formação de interesses comuns, em detrimento da mera consulta e
agregação de preferências aprioristicamente consideradas.
A hipótese que normativamente será sustentada ao longo do trabalho, se
configura em defesa do modelo apresentado por Chantal Mouffe e Ernesto Laclau, não
apenas em virtude de suas qualidades intrínsecas, mas, também, por sua adequação a
contextos sócio-políticos marcados por uma forte polarização e antagonismo entre
parcelas da população. Como se espera demonstrar ser o caso das conjunturas
venezuelana e boliviana, analisadas ao longo da segunda parte da investigação.
1.2.
O ideal de mocrático e suas ressignificações: cinco formas
de interpretar a soberania popular
a. Origem: o modelo ateniense
a.1. Forma de interpretar a ideia de soberania popular:
Procedimental.
6
O povo não apenas era consultado e votava propostas apresentadas
por líderes – a partir de preferências pré- formadas –, uma vez que
qualquer cidadão podia formular medidas e sugestões. A soberania
entendia-se, portanto, enquanto procedimento de produção de
consenso, no qual diferentes proposições eram apresentadas e
debatidas.
a.2. Procedimento decisório:
Não representativo.
O povo exercia sua soberania de modo direto, deliberativo e
includente.
a.3. Enquadramento normativo:
Conforme ressaltado por inúmeros historiadores, o pertencimento ao
conjunto de cidadãos atenienses, condição para a participação no
processo decisório, tinha como contrapartida uma diferenciação em
relação àqueles que não faziam parte deste grupo (estrangeiros, mulheres
e escravos).
b. O modelo republicano de Rousseau
b.1. Forma de interpretar a ideia de soberania popular:
Substancialista.
Embora seja difícil resumir a complexidade do pensamento de J.J.
Rousseau – que concilia elementos republicanos e liberais – é possível
observar que, em sua descrição de uma comunidade política virtuosa,
subjaz uma concepção substancialista acerca da ideia de soberania
popular. Isto por que as condições de exercício de tal soberania implicam
na configuração de uma comunidade homogeneamente virtuosa.
b.2. Procedimento decisório:
Não representativo.
7
O povo exerceria sua soberania de modo direto. Tal procedimento,
entretanto, não se estabelece de modo propriamente deliberativo.
Pois, ao reunirem- se em assembleias periódicas, os cidadãos apenas
reafirmam sua identidade e concordância em relação aos termos da
vontade geral, uma vez que já se encontram em consenso, no tocante
aos valores éticos. Tal consenso, entendido como identidade dada a
priori e não como resultado de um procedimento deliberativo, é a
condição de possibilidade de qualquer noção substancialista de
soberania popular.
b.3. Enquadramento normativo:
A vontade geral está enraizada em uma identidade compartilhada
pelos cidadãos, que se encontram em uma situação de igualdade
econômica e cultural, propiciando um alto grau de homogeneidade
ético-valorativa, a qual, por sua vez, é apresentada po r Rousseau
como condição de possibilidade para o sistema por ele proposto.
Deste modo, a ideia se soberania popular é concebida como
expressão do "povo" enquanto sujeito de uma identidade eticamente
determinada.
c) A radicalização schmittiana.
c.1) Forma de interpretar a ideia de soberania popular:
Substancialista, plebiscitária, cesarista e antagônica.
Para Carl Schmitt o processo de formação de identidades
ético/políticas
procederia a partir da “exclusão do outro”. Sendo assim, seria
através da percepção da alteridade, isto é, de um conjunto de
elementos que definiriam a heterogeneidade (o ‘outro’), que se
revelariam os elementos que configuram a homogeneidade (o ‘nós’).
c.2. Procedimento decisório:
Representativo com consultas diretas à população (cesarista).
8
Os cidadãos são chamados a aclamar ou rechaçar as decisões do líder
(soberano),
cuja força simbólica advém do seu papel de
representante da identidade do grupo enquanto sujeito político.
c.3. Enquadramento normativo:
O povo soberano é sujeito de uma identidade ética, determinada a partir
da decisão do soberano de excluir os elementos heterogêneos. No caso,
aqueles que são considerados como uma ameaça ao modo de vida do
grupo em questão.
Não há afinidade necessária entre democracia e direitos huma nos, os
quais são descartados enquanto mera abstração da ideia de igualdade. A
democracia, contudo, implica em uma relação de homogeneidade e
identidade concreta entre os cidadãos e seus governantes.
d. O modelo deliberativo de Jürgen Habermas.
d.1. Forma de interpretar a ideia de soberania popular.
Soberania popular enquanto procedimento.
Na reflexão pós- metafísica de Jürgen Habermas a soberania é
entendida como expressão de um povo dessubjetivado, cuja identidade
política deveria se limitar ao compromisso a constituição (patriotismo
constitucional) e, sobretudo, ao apego às regras do procedimento
democrático. A dimensão ético-valorativa é situada em um plano
distinto, ou seja, fora da esfera pública. Por este motivo, as
deliberações e decisões políticas sempre podem resultar em consenso
ou acordo, não havendo espaço para conflito entre valores não
conciliáveis, uma vez que estes devem se restringir ao universo
privado. Todos podem ser igualmente soberanos. As decisões podem
ser tomadas sem que ninguém seja excluído ou derrotados.
d.2. Procedimento decisório:
Representativo com ênfase na participação.
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O procedimento democrático deliberativo deve garantir a autonomia
dos envolvidos. E, por isso, deve ter como essência a troca ideias por
parte da população em esferas públicas e privadas de formação da
vontade geral, que não deve estar radicada em nenhum tipo de
homogeneidade, identidade ou consenso dado a priori.
d.3) Enquadramento normativo:
A vontade geral assume a forma de um consenso precário e
provisório, porém sempre possível, mesmo entre grupos com
identidades ético- valorativas distintas, visto que estas devem se
restringir à esfera privada, não interferindo nas decisões políticas.
Tal consenso, por conseguinte, é sempre aquiescente aos parâmetros
das liberdades subjetivas (direitos humanos), já que estas são cooriginais à própria expressão da soberania popular. O consenso
produzido deliberativamente aparece, então, como o único modo
racional de produção de decisões legítimas 6 .
e. Uma síntese 7 possível: o modelo agonístico de Chantall Mouffe e Ernesto Laclau.
e.1. Forma de entender a soberania popular:
Substancialista e procedimental.
A ideia de soberania popular é desenvolvida, por Chantall Mouffe e
Ernesto Laclau, com base em um resgate do pensamento de Antonio
Gramsci, sob a forma de um procedimento por meio do qual um
conjunto de cidadãos reafirma uma identidade comum, precária,
6
“Todos aqueles que são afetados por decisões legais deveriam ser ouvidos e envolvidos em discursos
jurídicos até que concordassem co m u m consenso razoável, ou, caso eles não concordem, eles deveriam
ser avaliados como não-razoáveis” (LUHMANN; 1998: 890; tradução minha 6 ).
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A exp ressão aqui utilizada remete ao termo Au fhebung, utilizado por Hegel para referir-se à superação
de um antagonismo entre tese e antítese. Nesse sentido, a síntese apareceria co mo u ma negação da
negação, que, por sua vez, pro move a suprassunção do conflito, elevando-o a um patamar superior. O
modelo agonístico, aqui exposto, ao apresentar uma crítica ao modelo deliberativo de Jürgen Habermas –
que se define pela negação das teses substancialistas schmittianas – pode ser visto como negação da
negação e, portanto, como síntese que suprassume o conflito entre os conceitos substancialista e
procedimentalista de democracia.
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provisória e mutável, que demanda constante atualização diante de
novas circunstâncias.
Essa identidade, entretanto, pressupõe uma fronteira entre aqueles que fazem
parte do conjunto de cidadãos e aqueles que dele estão excluídos. Tal fronteira,
por sua vez, aparece como o resultado de um arranjo político-social (formação
hegemônica). Este arranjo, contudo, pode ser alvo de contestação e disputa,
conforme seus alicerces venham a se fragilizar, o que acontece em momentos de
luta hegemônica.
e.2. Procedimento decisório:
Procedimento decisório: deliberativo, includente e participativo,
embora incapaz de subsumir os conflitos.
As decisões políticas não podem favorecer igualmente a todos os
cidadãos, elas sempre resultam em vencedores e perdedores, uma
vez que as diferenças e as identidades ético-valorativas não são
excluídas da esfera pública. Ao contrário, o modelo visa ampliar os
canais institucionais de contestação e discussão, permitindo que as
fronteiras de antagonismo se mantenham abertas ao debate e à
modificação. Com isso, criam-se mecanismos pelos quais as
diferenças e o antagonismo entre grupos possam ser amainados,
reduzindo a beligerância e mantendo a possibilidade de que
vencedores e perdedores possam trocar de posição.
e.3. Enquadramento normativo:
No modelo desenvolvido por Chantal Mouffe e Ernesto Laclau o
povo soberano é entendido enquanto sujeito ético, formado a partir
de uma fronteira de antagonismo entre aqueles que dele fazem parte
e os que dele estão excluídos. Todavia, a identidade entre ambos os
grupos é dialeticamente determinada, correspondendo a uma
formação hegemônica provisória, visto que sujeita a contestação por
parte daqueles que dela são excluídos, ou nela ocupam uma posição
subalterna.
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Não há afinidade necessária entre democracia e direitos humanos.
Esta correlação foi historicamente construída no campo teórico e
político. Não obstante, uma vez que nas sociedades contemporâneas
a ideia de soberania popular se encontra intrinsecamente associada à
defesa das liberdades individuais, devem existir garantias de que tais
direitos sejam resguardados.
Segunda parte
Estudo de casos.
2.1 Ativação do poder constituinte: democracia e inclusão.
Nesta seção, buscar-se-á compreender os conceitos de democracia mobilizado pelos
principais atores coletivos envolvidos nos processos constituintes de Venezuela e
Bolívia. Para isso, será analisado o contexto que propiciou o movimento de ativação do
poder constituinte, na tentativa de investigar quem eram esses atores, sua origem, e,
sobretudo, quais eram suas motivações e demandas. Em particular, a hipótese que
orienta a presente análise indica que, em ambos os casos, tanto o movimento em favor
da mudança, como seus protagonistas surgiram de uma crise hegemônica no sistema
político-social anterior.
Estas formações hegemônicas que vigoravam até então, em Venezuela e Bolívia,
foram construídas por meio de pactos entre os principais partidos no poder, o
empresariado e as principais organizações trabalhistas. Estes pactos, embora em um
primeiro momento tenham sido revestidos de algum grau de legitimidade normativa –
propiciada, sobretudo, pelo apoio ao compromisso de respeito às instituições
democráticas –; foram mantidos, em particular no tocante às suas bases sociais, por
meio de recursos de cooptação e repressão.
Nesse sentido, conforme se enfraqueciam os alicerces normativos do sistema – que
se demonstrava incapaz de atender as demandas por parte da sociedade civil, crescentes
em termos de quantidade e complexidade – reduziam-se os recursos disponíveis para
sustentar os incentivos utilizados para cooptar as bases sociais. Tais incentivos, por sua
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vez, em parte respondiam a uma dinâmica (restrita) de inclusão social propiciada
durante seus momentos áureos. Porém, conforme progredia o desgaste de ambos blocos
históricos, tornam-se ainda mais importantes as prebendas e favores, distribuídos
diretamente àqueles que participavam das organizações político-partidárias e
trabalhistas, desejosas por manter sua hegemonia.
Nos anos noventa, contudo, esta crise se acentua, tendo em vista um cenário de
baixa nos preços das commoditties e dos produtos primários exportados pelos países da
região, cujos recursos eram indispensáveis para a manutenção da estrutura corporativa.
Ao lidarem com este dilema, parte dos países latinoamericanos se tornaram- receptivos
a discursos liberalizantes, empenhando-se na redução da máquina estatal. O Estado,
antes visto como o artífice do moderno, agora, nas derradeiras décadas do século
passado, tornar-se- ia um obstáculo ao progresso, na concepção de grande parte das
elites econômicas e sociais dos países da região.
No plano conceitual, este contexto ganha contornos pós- modernos. A liberdade
individual é hipostasiada em detrimento das instâncias associativas: classes, sindicatos e
o próprio Estado transformam-se em símbolos de um mundo antigo. A salvação passa,
então, a ser buscada pelo expurgo da herança maldita dos governos nacional-populares.
Ela, contudo, não veio. Ao contrário, os países sul-americanos experimentaram no
período uma grave recessão econômica, conjugada a uma profunda crise social. Com
isso, uma parte dos indivíduos que antes se reconheciam como profissionais,
trabalhadores ou camponeses se viram dispensados enquanto força produtiva, passando
a ser identificados negativamente como desempregados, sem teto, sem terra e excluídos
de modo geral.
Esta dinâmica de esgotamento do antigo sistema abre espaço para um processo de
reconfiguração identitária por parte dos grupos sociais nele envolvidos, determinado
pelo surgimento de novas demandas, que aparecem e se consolidam em função de uma
alteração nas formas pelas quais estes grupos – que se percebiam de algum modo
excluídos do antigo sistema – observavam a si mesmos e eram observados pelos
demais. Em especial, este processo foi catalizado pelo incremento nas demandas por
inclusão, participação e reconhecimento por parte das camadas populares, mantidas
subalternas no plano político, econômico e social. É ao longo de tal reconfiguração que
se originam os atores coletivos que protagonizam a dinâmica de ativação do poder
constituinte.
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Esta reconfiguração, contudo, uma vez que motivada por uma perspectiva de
exclusão que associa os planos político, econômico e simbólico-cultural, é determinada
por uma acentuação na dimensão antagônica. Esta segundo a argumentação de Laclau e
Chantall Mouffe, seguida ao longo do trabalho, é constitutiva de toda formação política
identitária. Assim sendo, deflagra-se uma conjuntura de acirrada polarização social, que
divide a sociedade em dois grupos: aqueles que demandam sua inclusão e
reconhecimento por meio de um processo mudança e ruptura com o sistema anterior,
seguida pela configuração de um novo modelo político-econômico, e aqueles que se
opõem ao novo modelo.
Seria através da percepção da alteridade, isto é, de um conjunto de elementos que
definiriam a heterogeneidade (o ‘outro’), que se revelariam os elementos que
configuram a homogeneidade (o ‘nós’). Deste modo, a opção por tal perspectiva,
decorre da hipótese de que os casos estudados compartilhariam uma conjuntura de
radicalidade, responsável pela ativação do poder constituinte. Mas, sobretudo, por que
se caracterizam por possuir uma dinâmica social determinada pela polarização e pela
divisão da sociedade em dois grupos antagônicos.
2.2 Comparação dos casos de Venezuela e Bolívia: esgotamento das formações
hegemônicas e ativação do poder constituinte 8 .
a. Caso venezuelano
a.1. Sistema de partidos.
Ano 1999.
Colapso do bipartidarismo.
a.2. Resultados eleitorais (eleições presidenciais simultâneas ou próximas no tempo e
porcentagem).
Eleições 1998:
8
Parte dos dados aqui apresentados foram extraídos do livro “Democracia Directa en Latinoamérica”
(LISSIDINI, W ELP, ZOVATT O eds., 2008).
14
Pólo patriótico [Movimento Quinta República (MVR), Movimento al Socialismo
(MAS), Partido Pátria para Todos (PPT), Partido Comunista Venezuelano (PCV)
e outros]: 48.11%
Pólo democrático [Ação Democrática (AD), Partido Social Cristiano de
Venezuela (COPEI), Proyecto Venezuela (PRVZ) e outros]: 39.97%.
a.3. Alternância ou não alternância do partido no governo.
Alternância.
Presidente Hugo Chávez Frias (MVR, MAS, PPT, PCV e outros).
a.4. Nível de protesto social antigovernamental (níveis: alto, médio ou baixo).
Médio.
Se registra um aumento nas greves, paralizações e, principalmente, no
fechamento de vias (cortes de rutas o carreteras).
a.5. Nível de estabilidade política.
Baixo.
Foram registradas duas tentativas de golpe de Estado. Em 1992, Chávez lidera
segmentos do Exército venezuelano em um intento fracassado de tomar o poder.
Em 1993, o presidente Carlos Andrés Pérez, é afastado por meio de um
impeachment. Em 2002, a oposição protagoniza um golpe de Estado contra
Hugo Chávez que, em seguida, é restituído ao cargo.
a.6. Atores que protagonizam as manifestações de descontentamento.
Poucos atores coletivos, haja vista o baixo grau de organização da sociedade
civil. Em particular, observam-se protestos de estudantes universitários, vecinos
(associações de moradores), buhoneros (camelôs e trabalhadores informais),
pensionistas e aposentados, embora, na maioria dos casos, não organizados em
movimentos sociais com coesão e capacidade de mobilização.
a.7. Atores que protagonizam o proceso de cambio.
Crescente protagonismo do MVR e de outros grupos políticos partidários
aglutinados em torno da figura de Hugo Chávez. Aumento da presença política
15
de algumas organizações sociais como o Comité de Familiares de las Víctimas
de los sucesos ocurridos entre el 27 de febrero y los primeros días de marzo de
19899 (COFAVIC) , Queremos eleger, entre outros).
a.8. Variáveis econômicas.
 Grau de reforma do Estado:
Alto (principal conjunto de reformas ocorrido em 1995).
 Porcentagem da população abaixo da linha de pobreza:
49.4 (em 1999)
 Distribuição de renda:
0,498 (índice GINI de 1999)
 Taxa de desemprego:
14.9% (em 1999)
 Crescimento do PIB por habitante:
-7.7% (índice Cepal de 1999).
b. Caso boliviano
b.1. Sistema de partidos.
Ano 2004.
Multipartidarismo moderado, surgimento de novos grupos políticos.
b.2. Resultados eleitorais (eleições presidenciais simultâneas ou próximas no tempo e
porcentagem).
Eleições 2002:
MNR: 22.46 % (primeiro turno)
MAS: 20.94% (primeiro turno 10 ).
9
Em 1989, após o governo ter anunciado um conjunto de medidas econômicas, grupos de pessoas em
Caracas e nas cidades satélites saíram às ruas para protestar. O evento, conhecido como Caracazo, se
desenvolveu sob a forma de saques e enfrentamentos que duraram alguns dias e re sultaram na mo rte de
cerca de 600 pessoas.
10
Segundo as regras eleitorais então vigentes, quando nenhum candidato obtinha a maioria absoluta dos
votos nas eleições, cabia ao Congresso escolher quem seria o presidente da República. Uma vez que o sua
coligação era majoritária no legislativo, Gonzalo Sánchez de Lozada foi escolhido para o cargo,
derrotando Evo Morales.
16
NFR: 20 % (primeiro turno).
b.3. Alternância ou não alternância do partido no governo.
Alternância 11 .
Presidente Gonzalo Sánchez de Lozada (MNR).
b.4. Nível de protesto social antigovernamental.
Alto.
Diversas mobilizações a partir de 2000: a ‘Guerra da água’ 12 ; os bloqueios
camponeses em Chapare, Cochabamba e La Paz 13 ; o ‘Fevereiro negro 14 ’ (ocorrido
em La Paz e El Alto em 2003) e o ‘Outubro negro’ 15 (ocorrido em La Paz e El Alto
em 2003).
b.5. Nível de estabilidade política.
Médio.
Renúncia do presidente Gonzalo Sánchez de Lozada, em outubro 2003, e de
Carlos Mesa, em 2005.
11
Em 2001, após a renúncia de Hugo Banzer, do partido Acción Democrática, assume o vice-presidente
Jorge Quiroga, membro da mesma agremiação.
12
Nome dado a uma série de protestos sucedidos em 2000, co mo conseqüência de do intento do
presidente boliviano Hugo Ban zer, co m o apoio do Banco Mundial, de privatizar o serviço de d istribuição
e abastecimento de água em Cochabamba. A forte repressão às manifestações resultou em u ma morte e
mais de 170 feridos. Após os eventos, todavia, a privatização foi interropida.
13
Em setembro de 2000 os cocaleiros da região de Yunga e Chapare iniciam b loqueios em 17 pontos da
rodovia Santa Cruz- Cochabamba em protesto contra a instalação de quartéis militares na região, e,
sobretudo, contra a política de erradicação da coca levada a cabo pelo governo boliviano com o apoio de
instituições estrangeiras (em particu lar, norte-americanas). Os manifestantes demandavam, também, a
criação de uma universidade agrônoma e u m parque industrial. Os bloqueios, que contaram co m o apoio
da CSUTCB, tiveram co mo resultado o isolamento das cidades de La Paz, Oru ro, Cochabamba e Santa
Cru z, levando a uma forte repressão por parte do Estado, que declara a participação nos bloqueios um
delito passível de detenção. Uma pessoa morreu e do ze ficaram feridas durante os protestos.
14
Em fevereiro de 2003, após a aprovação de uma drástica elevação nos impostos (o chamado
impuestazo), setores polícia e da sociedade civil se engajaram em u ma série de protestos, que tiveram
como consequência em 33 mortos, em parte, resultantes do confronto entre policiais e militares.
15
Os acontecimentos que ficaram conhecidos como ‘outubro negro’, tiveram sua origem em 2002,
quando o governo de Jorge Quiroga decide pela construção de um gasoduto através do território chileno,
não obstante as críticas de diversos setores da população, em favor de uma rota que passasse pelo Peru. O
descontentamento, porém, acirrou-se ao longo do ano, abarcando inúmeras organizações sociais
(sindicatos, camponeses, indígenas entre outros), transformando -se em u ma mu lt itudinária reiv indicação
pela nacionalização dos hidrocarbonetos, liderada por Evo Morales (dirigente sindical cocaleiro) e Felipe
Quispe (dirigente campesino). Em meados de outubro de 2003, durante manifestações ocorridas na cidade
de El Alto, mo rreram 67 pessoas e mais de 400 foram feridas em confrontos com os militares. Eclodiram,
então, inúmeras man ifestações pelo país que culminaram co m a renúncia do presidente Sánchez de
Lo zada, que foge em 17 de outubro rumo aos Estados Unidos.
17
b.6. Atores que protagonizam as manifestações de descontentamento.
Camponeses, indígenas e sindicatos. Sociedade civil fortemente organizada com
a presença de inúmeros atores coletivos com coesão e capacidade de
mobilização. Em especial: La
Central
Indígena del
Oriente Boliviano
(CIDOB), La Confederación Sindical Única de Trabajadores Campesinos de
Bolivia (CSUTCB), La Confederación Sindical de Colonizadores de Bolivia
(CSCB), La
Federación
Nacional de
Mujeres Campesinas
de
Bolivia
Bartolina Sisa (FMCBBS), La Confederación Nacionalde Markas y Ayllus
del Qollasuyo (CONAMAQ).
b.7. Atores que protagonizam o proceso de cambio.
Adquirem protagonismo os líderes indígenas e campesinos, em particular Evo
Morales (MAS), Felipe Quispe (MIP). Surgem os partidos Consciência de Pátria
(CONDEPA), fundado em 1988 e extinto em 2002, Unidad Cívica Solidaridad
(UCS), fundado em 1989, e Nova Força Republicana (NFR), fundado em 1996.
b.8. Variáveis econômicas.
 Grau de reforma do Estado:
Alto (principal conjunto de reformas ocorrido em 1995).
 Porcentagem da população abaixo da linha de pobreza:
60,6 (em 1999)
 Distribuição de renda:
0,586 (índice GINI de 1999)
 Taxa de desemprego:
7.6% (em 2000)
 Crescimento do PIB por habitante:
-0.9% (índice Cepal de 2001).
2.3 As novas Constituições de Venezuela e Bolívia.
Após a observação dos quadros expostos na seção 2.2 e da discussão empreendida
no item 2.1, fica claro o panorama de radicalização e antagonismo que marca os
18
procesos de cambio, deflagrados em Venezuela e Bolívia, ao final do século XX. Esta
radicalização – catalizada pela crise econômico-social e pela subseqüente demanda por
uma transformação político-econômica – foi potencializada por meio de elementos
simbólico- identitários, galvanizados pelas lideranças que conduziram o processo de
ruptura constituinte. Tal panorama instaura, principalmente nas classes populares, um
processo de ressignificação identitária, a partir do qual emergem uma multiplicidade de
sujeitos coletivos.
Sendo assim, ao longo da década de 90, estes novos atores, reunidos em função de
ideais nacionalistas, étnicos e sócio-econômicos, foram se aglutinando em torno de
projeto de mudança e inclusão. Tal projeto chega, então, ao poder pela via eleitoral,
capitaneado pelas lideranças de Hugo Chávez e Evo Morales, que passam a ser, em
maior ou menor escala, os porta- vozes e representantes dos anseios dessas parcelas da
população.
Esta dinâmica corresponde, portanto, a uma configuração identitária de tipo
substancialista, que, por sua vez, modelará o ideal de soberania popular presente nos
anseios de refundação democrática do Estado e de ativação do poder constituinte, os
quais se consubstanciam na promulgação das novas Constituições de Venezuela (1999)
e Bolívia (2009).
Neste subítem, por conseguinte, o objetivo é investigar qual teria sido o modelo de
democracia plasmado nestas novas Cartas. Para isso, buscar-se-á compreendê- las
enquanto resultantes do embate entre as diferentes forças envolvidas nos processos
constituintes. Partir-se-á, então, da perspectiva de que a dinâmica de reconfiguração
identitária (analisada nas seções 2.1 e 2.2), situa-se na dimensão do político, que se
caracteriza por processos de representação e auto-entendimento, nos quais são forjadas
as identidades políticas dos grupos sociais. Nesta seção (2.3), todavia, serão observados
os rebatimentos desses processos processo no plano da política, que se caracteriza pelo
embate fático, transcorrido nos canais institucionais e extra institucionais, entre os
diferentes grupos e forças políticas que disputam os recursos de poder disponíveis na
sociedade.
Esta análise, conforme argumentado anteriormente, obedece à hipótese de que tais
transformações teriam sido inspiradas em uma interpretação substancialista do ideal
democrático, posto que estruturado em função de uma concepção apriorística da
vontade geral, entendida como resultado de uma homogeneidade prévia. Isto porque, o
19
projeto de refundação democrática do Estado que as orienta teria sido delineado
enquanto modo de reafirmação de uma identidade naciona l, forjada a partir de setores
que se percebiam como historicamente excluídos econômica, política e culturalmente
(um “nós” que teria surgido pela percepção de alteridade em relação a um “outro”).
Constata-se, primeiramente, que as duas Cartas analisadas assumem um modelo
inspirado na acepção “participativa” do ideal democrático, conforme consta no próprio
texto constitucional 16 , como podemos observar no quadro ilustrativo abaixo.
Constitución de la República Bolivariana de
Venezuela
Preámbulo
El pueblo de Venezuela, en ejercicio de sus
poderes creadores e invocando la
protección de Dios, el ejemp lo histórico de nuestro
Libertador Simón Bolívar y
el heroís mo y sacrificio de nuestros antepasados
aborígenes y de los
precursores y forjadores de una patria libre y
soberana; con el fin supremo de
refundar la República para establecer una sociedad
democrática, participativa y
protagónica, mult iétnica y pluricultural…
Artículo 6. °
El gobierno de la República Bo livariana de
Venezuela y de las entidades
políticas que la co mponen es y será siempre
democrático, participativo,
electivo, descentralizado, alternativo, responsable,
pluralista y de mandatos
revocables.
Constitución Política del Estado Plurinacional de
Bolivia
Artículo 11º
I. La República de Bolivia adopta para su
gobierno la forma democrática part icipativa,
representativa y comunitaria, con equivalencia
de condiciones entre hombres y mujeres.
II. La democracia se ejerce de las siguientes
formas, que serán desarrolladas por la ley :
1. Directa y participativa, por medio del
referendo, la in iciat iva leg islativa ciudadana, la
revocatoria de mandato, la asamb lea, el cabildo y
la consulta previa.. Las asambleas y cabildos
tendrán carácter deliberativo conforme a Ley.
2. Representativa, por medio de la elección de
representantes por voto universal, directo y
secreto, conforme a Ley.
3. Co munitaria, por medio de la elección,
designación o nominación de autoridades y
representantes por normas y procedimientos
propios de las naciones y pueblos indígena
originario campesinos, entre otros, conforme a
Ley.
Esta nova adjetivação do conceito de democracia, caracterizada por sua vagueza
e imprecisão, remete, contudo, a uma proposta de ampliação dos canais de
envolvimento direto e indireto da população na política. Não obstante, sobre tal
proposta incide, também, uma “deriva plebiscitária” (maior ou menor conforme as
diferenças entre os casos), haja vista as possibilidades de contornar entraves nos
16
O termo participativo é usado 8 vezes na Constituição venezuelana de 1999 (no preâmbulo, e nos
artigos: 6º, 18º, 84º, 86º, 118º, 171º e 299º) e na Constituição boliviana de 2009 (art igos: 11º, 18º, 78º,
275 º, 282 º, 317 º, 345 º, 391 º).
20
processos de formação de consenso parlamentar, pela via dos “mecanismos de
democracia direta”.
Entretanto, uma vez que o objetivo do artigo é analisar os casos de Venezuela e
Bolívia não apenas sob o prisma da semelhança, é preciso estabeler movimentos de
aproximação (i) e distanciamento (ii) entre ambos.
No tocante às aproximações (i), sobressai a compreensão de que as duas
Constituições são o produto de uma conjuntura política e social marcada (a) pela
radicalidade das demandas por transformação política e econômica, e (b) pela
polarização da sociedade, isto é sua divisão em grupos antagônicos em função de
elementos simbólicos, identitários e materiais. Quanto ao primeiro elemento (a), ao
longo do estudo dos casos analisados, sobressaem elementos indicativos de que os
anseios por uma alteração no regime de acumulação não teriam resultado em
disposições constitucionais propriamente revolucionárias, passíveis de determinar
mudanças econômicas drásticas e automáticas. Embora seja possível apontar alguns
artigos que delineiam um perfil nacionalista e desenvolvimentista, enumerados nas duas
tabelas abaixo.
Tabela 1
Tabela 2
21
Quanto ao segundo elemento (b), observou-se que a criação de dois polos de
atração reduziu o espaço para a formação de consensos políticos no país, dificultando o
andamento institucional, administrativo e a relação entre os partidos, permitindo a
ascendência do Poder Executivo sobre o Legislativo 17 . Sendo assim, os mecanismos de
“democracia direta”, apresentados na tabela 2, teriam surgido como uma alternativa
para dirimir tais entraves institucionais, buscando, por meio da consulta direta à
população, conferir legitimidade a decisões que não advêm das instâncias de
representação e deliberação parlamentar.
No que tange às diferenciações (ii), cujas raízes serão buscadas nos contextos
que antecedem e determinam a ativação do poder constituinte, a comparação dos casos
venezuelano e boliviano indica que quanto mais polarizada é a conjuntura, mais difícil
se torna a emergência de posições intermediárias e atores dissonantes. Nesta medida,
conforme ilustrado nas tabelas 3, 4 e 5, a partir de uma comparação entre os dois
processos constituintes, evidenciam-se indícios de maior ou menor pluralidade que, por
sua vez, servem para diferenciá- los no tocante aos seus graus de polarização. Dessa
17
Tal ascendência não se desenvolve em conflito entre Poderes, uma vez que o Executivo em Venezuela
e Bolívia, conta, até o mo mento, co m amp la maioria no Leg islativo, dada a predominância de
congressistas do Partido Socialista Unido de Venezuela (PSUV) e do Movimento al Socialismo (MAS),
liderados, respectivamente, por Hugo Chávez e Evo Morales.
22
forma, quanto menos plural e amplo for o espectro de sujeitos coletivos organizados
(partidos, sindicatos, organizações profissionais, movimentos sociais) capazes de
participar na esfera pública, maior o grau de polarização.
Tabela 3
Tabela 4
23
Tabela 5
2.4 Avanços e retrocessos dos procesos de cambio.
Por meio de um acompanhamento da dinâmica político-social dos países
estudados, foi possível observar que, em maior ou menor medida, esta polarização
ultrapassou o momento constituinte, levando a um 'achatamento' da vida pública do
país, isto é, ao seu confinamento às disputas entre governo e oposição. Nesta medida, o
processo constituinte na Venezuela teria ocorrido sob um panorama comparativamente
mais polarizado, haja vista a participação de um menor número de atores e, por
conseguinte, a maior centralização na figura do presidente. O que está relacionado à
menor eficiência dos partidos e organizações corporativas tradicionais venezuelanas no
que tange a sua capacidade de formar vínculos de pertencimento e mobilização socia l
com a população, deixando-os mais suscetíveis à débâcle que os atinge nas últimas
décadas do século.
Quando comparada à conjuntura boliviana, a crise dos partidos e sindicatos
tradicionais venezuelanos parece mais cáustica e tem como consequência uma ma ior
“atomização” da sociedade civil. O que dificulta a organização das demandas e
insatisfações sociais por meio de outros meios, favorecendo a centralização por parte do
presidente, que sobressai como canal de representação possível. Conforme apresentado
na tabela 5 que, quando contrastada com a tabela 3, ressalta a maior pluralidade do
24
processo constituinte boliviano, na medida em que este inclui um espectro mais amplo
de atores.
Na conjuntura boliviana, por sua vez, a crise nos partidos tradicionais, embora
acentuada, teria sido em parte compensada pela atuação dos sindicatos e, em especial,
pela emergência de novos movimentos sociais. Desta maneira, a figura do líder e de seu
partido não teria alcançado um mesmo grau de centralidade, considerando a presença de
outros atores externos e internos à coalizão com capacidade de influência e mobilização
das bases.
Esta maior capacidade de mobilização evita a concentração de poderes na figura
do líder e seus correligionários, haja vista a presença de um número maior de atores
políticos organizados e concorrentes na disputa por alguma parcela de poder, porém,
muitas vezes, consoantes em termos de apoio ao proceso de câmbio instaurado. Na
Venezuela, todavia, observou-se que esta disputa limita-se à relação entre governo e
oposição, em função da escassez de organizações sociais capazes de exercer este tipo de
pressão. Em especial, sobressai a ausência de atores coletivos que, embora apoiem o
proceso de cambio, sejam capazes de manter uma postura crítica e combativa em
relação a eventuais tendências centralizadoras.
Por isso, é possível sugerir que o caso venezuelano ganha matizes cesaristas
mais fortes do que o boliviano, não obstante, a constatação de que, em ambos, o modelo
de democracia implementado é de tipo substancialista, com desdobramentos
plebiscitários.
Deste modo, as implicações dos distintos graus de polarização, e a subsequente
relação inversamente proporcional entre pluralidade e centralização, servem de base
para a comparação entre os dois casos analisados. O contraste, por sua vez, pode ser
estabelecido, também, no tocante às relações Executivo e Legislativo (constituinte e
ordinário), considerando-se que, quanto menor a capacidade do parlamento de servir de
espaço para a representação de interesses e grupos plurais, menor a sua legitimidade
enquanto lócus de formação de consensos. Sob esta perspectiva é possível sugerir uma
correlação entre esta fragilização do Legislativo – em termos de capacidade representar
a sociedade e produzir consensos – e o uso dos mecanismos de “democracia direta”,
enquanto instrumento (plebiscitário) de legitimação de decisões. O que indicaria uma
“conexão lógica” (para além das evidentes conexões empíricas) entre a inclinação
plebiscitário-cesarista, observada nestes experimentos, e a conotação substancialista,
25
que subjaz à interpretação outorgada ao ideal democrático nos processos constituintes
que os configuraram.
Considerações finais:
À guisa de conclusão, contudo, cabe uma ressalva quanto aos riscos de que esta
deriva plebiscitária possa minar o conteúdo efetivamente deliberativo e procedimental
desses novos experimentos democráticos, abrindo espaço para a configuração de uma
dinâmica consultiva, incapaz de estimular a produção de consensos, cujo resultado seria
o incremento da polarização por meio da reificação identitária do antagonismo entre
oposição e governo.
Para isso, é fundamental resgatar as considerações de Chantal Mouffe e Ernesto
Laclau. Isto porque o aqui chamado “modelo agonístico” de democracia se confor ma
por meio de uma crítica sintética às formas substancialistas e procedimentalistas de
entender a soberania popular. Sendo assim, no tocante às conceitualizações
substancialistas, é denunciada uma compreensão estática acerca dos antagonismos e das
relações identitárias, que, entretanto, são reconhecidos como inerentes a quaisquer
coletividades políticas, ou, na terminologia gramsciana, formações hegemônicas. Tal
reconhecimento, por conseguinte, é a base da crítica direcionada ao modelo deliberativo
procedimental. Mas, também, o fundamento de sua adequação aos casos estudados, uma
vez que estes se caracterizam por um alto grau de polarização, nos quais sobressai uma
compreensão identitária do antagonismo entre grupos. Daí o descompasso entre o modelo
deliberativo e estas conjunturas, deflagradas por processos de luta hegemônica, nos qua is a
dimensão ético-valorativa é palco de antagonismos que dificilmente podem ser subsumidos
através de procedimentos deliberativos.
Sem embargo, a adequação do modelo de democracia encontrado na formulação
agonística, reside exatamente em sua ênfase ao caráter dialético, provisório e precário
das identidades assumidas pelos sujeitos políticos em uma relação de antagonismo. E,
sobretudo, na importância concedida aos processos de deliberação e contestação dos
termos que configuram as fronteiras de diferenciação e exclusão que os formam. Pois,
se a política é uma prática que inevitavelmente resulta em vencedores e perdedores, a
diferença entre ambos não pode ser vista em termos de essência, mas enquanto parte de
uma formação hegemônica provisória, precária e contestável.
26
Uma segunda vantagem do modelo proposto por Chantall Mouffe e Ernesto
Laclau diz respeito aos desdobramentos econômicos do conceito de soberania popular,
que passa a estar associada à equalização das condições materiais dos diferentes grupos
sociais (socialismo), enquanto condição de possibilidade para uma efetiva capacidade
de participar dos processos decisórios. Todavia, tal equalização não mitiga o espaço de
contestação de outras formas de subalternidade, ao contrário, reforça a possibilidade de
lutas por reconhecimento estabelecidas no plano simbólico-cultural.
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29

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