crítica semanal da economia

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crítica semanal da economia
Núcleo de Educação Popular 13 de Maio - São Paulo, SP
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CRÍTICA SEMANAL DA ECONOMIA
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EDIÇÃO Nº 1170/1171 – Ano 28; 1ª e 2ª Semanas Novembro 2013.
Cavalheiros de Nobre Consciência
. JOSÉ MARTINS.
O que pensa o “rei dos mercados” – como é apresentado Alan Greenspan, o mais
famoso economista norte-americano, presidente do Federal Reserve por mais de 20
anos, em entrevista à Revista Veja, ativa porta-voz do imperialismo na grande mídia
brasileira, edição 30/10/2013 – dos programas sociais do governo dos EUA e da crise
do déficit público, pontos centrais da armadilha de enfraquecimento geopolítico, no
exterior, e de tensões sociais crescentes, no interior, que falamos no último boletim?
Do alto dos seus 87 anos, ele declara: “Há limites para o Estado do bem-estar
social. O crescimento anual dos gastos com benefícios tem sido de quase 10% ao ano,
um número impressionante. Desde 1965, a participação dos benefícios subiu de 5% para
15 % do PIB. O avanço ocorreu tanto em governos democratas quanto em republicanos.
Estamos sentindo hoje os sintomas dessa política. É o caso da grande batalha em torno
do Orçamento no Congresso. Chegamos ao limite. Na minha avaliação e na de qualquer
pessoa bem informada, inclusive o presidente dos Estados Unidos, o volume de
benefícios tem que ser reduzido. Mas isso é politicamente muito difícil. Existem forças
politicas poderosas em jogo. Não sei como isso vai acabar. Gostaria de saber.”
Ele mente deslavadamente sobre os números dos gastos com os benefícios
sociais no orçamento. Não temos tempo nem espaço aqui para apresentar e contrapor os
números oficiais apresentados no documento do Congressional Budget Office –
“Historical Budget Data—August 2013” http://www.cbo.gov/publication/44507, que já
utilizamos em nosso boletim “Imperialismo em Moratória”, 4ª Sem. Outubro 2013.
Basta dizer que as despesas globais denominadas Mandatory Outlays, tabela 5 do
relatório, que se refere ao total dos benefícios sociais, estão incrivelmente congeladas
(em torno de 2 trilhões de dólares) desde 2009. Está de acordo com o desejo do velhaco.
Mas isso não é o mais importante. O que se deve destacar da declaração de
Greenspan é que ela é corretíssima quanto às necessidades atuais do capital e dos
capitalistas norte-americanos: destruam os últimos sinais de Estado do bem-estar social!
Ponto. Em segundo lugar, ela reflete o fato de que os capitalistas sabem o tamanho da
trolha que vem pela frente, mas não arredarão um milímetro do seu renovado modus
operandi de atacar de frente a classe operária e a maioria da população para garantir a
continuidade da acumulação e, principalmente, dos seus oceanos de lucros atuais.
– Enquanto isso aumenta o número de grandes empresas norteamericanas pagando salário de fome no seu próprio país. Fazem agora em Chicago, Los
Angeles, New York, etc., a mesma coisa que sempre fizeram nas suas filiais instaladas
OS IRMÃOS WALTON
1
nas infectas periferias do mundo – Filipinas, China, Brasil, Africa do Sul, etc. É o caso
da Wall Mart, a maior cadeia varejista mundial. Emprega mais de 2 milhões de
trabalhadores em todo o mundo. É a empresa que mais emprega força de trabalho nos
EUA. Mais de 1,4 milhões de norte-americanos trabalham na Wall Mart. Sua força de
trabalho é o dobro dos Correios dos EUA e superior à população de 96 países. Esses
dados estão em extensa pesquisa realizada por um grupo de trabalho do Congresso dos
EUA.1 Outros dados: em 2012, o faturamento da Wall Mart passou de US$ 469 bilhões,
mais que o PIB da rica Noruega. No quarto trimestre de 2012, registrou aumento de
8.6% nos lucros. Nos doze meses de 2012 acumulou massa de lucro de US$ 17 bilhões.
Entre 2007 e 2010, enquanto o valor das propriedades das famílias do país caia
38.8%, o valor das propriedades de seis membros da família Walton – herdeiros do
fundador da cadeia Wall Mart – subiu de US$ 73.3 bilhões para US$ 89.5 bilhões. Essa
família burguesa acumula sozinha riqueza com valor equivalente à soma das riquezas de
48 milhões de famílias norte-americanas (ou 41.5 % do total das famílias do país)
localizadas na parte de baixo da pirâmide de distribuição do produto do país.
Para chegar a esse fabuloso desempenho da sua poderosa empresa global, os
proprietários da Wall Mart têm aquela estranha mania de pagar salários de miséria aos
seus trabalhadores, abusar das jornadas de tempo parcial, etc. A mesma marca
registrada dos seus colegas do MacDonalds e da franco-maçonaria capitalista em geral.
A média salarial horária na Wall Mart é de US 8.81, pouco acima do salário mínimo
obrigatório por lei. A Wall Mart é a primeira colocada de uma pesquisa que faz o
“ranking das doze empresas que pagam menos nos EUA”. A maioria dos seus
empregados, off course, vive pendurada nas esmolas do governo, naquelas mais
desgastadas do que nunca estruturas do “estado do bem estar social” da segunda metade
do século passado, que agora eles precisam e vão destruir.
– Essa realidade de explosão da miséria capitalista na economia de
ponta do sistema torna-se então uma hiper-realidade de desigualdade de rendimentos, de
injustiça social, “perdas de conquistas” e outras lamúrias da benemerência social. É
claro que se as dificuldades da vida fossem só essas simulações moralizadoras de um
perverso descontrole do Estado social, de uma súbita má consciência dos nobres
capitalistas, etc., então os trabalhadores poderiam acreditar nas fantasiosas ideias de
reforma política ou de revisão ética do injusto modus operandi dos capitalistas.
Acontece que, longe dessas simulações enganosas, o que se verifica é um
processo de valorização do capital determinado por irreversíveis necessidades
materiais, quer dizer, econômicas. A atual queda progressiva do salário real nas
economias dominantes é guiada por claras situações globais da acumulação de capital.
Aprofundando um pouco mais a observação deste processo, encontra-se a necessidade
HIPER-REALIDADE
1
Democratic staff of the U.S. House Committee on Education and the Workforce – “The Low‐Wage Drag
on Our Economy: Wal‐Mart’s low wages and their effect on taxpayers and economic growth” [“O Peso
do Baixo Salário em Nossa Economia: os baixos salários da Wall Mart e seu efeito sobre os contribuintes
e no cresimento economico] Maio/2013
http://democrats.edworkforce.house.gov/sites/democrats.edworkforce.house.gov/files/documents/Wa
lMartReport-May2013.pdf
2
absoluta dos capitalistas extorquirem uma taxa de mais-valia relativa ou de exploração
muito superior, agora, do que nos ciclos econômicos anteriores. Trata-se, portanto, da
necessidade de se recuperar e estabilizar a taxa geral de lucro do último ciclo. Afinal, o
aumento da miséria dos operários (mais-valia absoluta) não foi sempre um poderoso
antidoto para a tendência à queda da taxa de lucro provocada pelo aumento da
produtividade (mais-valia relativa)?
As mutantes necessidades da reprodução ampliada do capital estabelecem os
níveis dos salários reais e a massa de pobres de um país. Principalmente quando a
extração da mais-valia relativa é combinada internamente com espaços mais amplos de
extração de mais-valia absoluta, como ocorre com maior visibilidade, agora, no Japão,
Eurozona e Estados Unidos. O espaço econômico interno das maiores potências
econômicas e imperialistas é invadido pela valorização do capital baseada na forma de
extração da mais-valia absoluta. O desenvolvimento desigual e combinado do mercado
mundial entre economias dominantes (mais-valia relativa) e dominadas (mais-valia
absoluta) agora se desdobra também no interior das economias dominantes. Isso
decorre de intensa globalização e crescente homogeneização das diferentes condições
nacionais de funcionamento do exército industrial de reserva mundial.
– Ao contrário da afirmação dos economistas da economia
vulgar de que o bem-estar da classe capitalista se espalharia para a classe trabalhadora
e que o bem estar das economias dominantes seria espalhado pelo resto do mundo, a
globalização da indústria e da acumulação capitalista se realiza agora espalhando a
característica miséria das economias dominadas no interior das economias dominantes.
Isso é importante não por ser injusto, imoral, mas porque doravante será uma prática
rotineira à produção de lucro e à permanência do regime capitalista. E isso balança
revolucionariamente as estioladas condições de governabilidade burguesa no centro do
sistema e com a luta de classes em todo o mundo.
É para amortecer as consequências sociais dessas irreversíveis determinações
materiais que os reformadores da ordem precisam inventar acrobacias mentais como a
de que a redução do salário real (e a consequente pauperização social) não é uma
necessidade para os capitalistas – e, para completar, que a elevação do salário dos
trabalhadores seria do interesse dos próprios capitalistas. Então, os irmãos Walton
poderiam ganhar ainda mais do que já ganham com uma alta de 100% do salário
mínimo de uma só tacada? Os autores do trabalho acima citado estão convencidos que
sim: “O modelo de baixos salários da Wall Mart não é função de necessidade. O
aumento dos salários na Wall Mart e na totalidade do setor varejista do país teria um
significativo impacto em dois fronts inter-relacionados: crescimento econômico e
redução do déficit... Quando as pessoas tem mais dinheiro no bolso, especialmente as
mais pobres, elas gastam mais.” 2
Estão dizendo que a produção de mercadorias e dos lucros dos capitalistas pode
coincidir com a melhoria das condições econômicas dos trabalhadores, quer dizer, que
os interesses da classe operária poderiam perfeitamente coincidir com os interesses da
PASTORAL CAPITALISTA
2
Democratic staff of the U.S. House Committee on Education and the Workforce, idem.
3
classe capitalista e seus agregados. O didatismo dessas afirmações é avassalador: o
aumento do consumo dos trabalhadores é determinante para o aumento da produção e
dos lucros. Esse é o mantra. Basta afirmar e pronto, está demonstrado. Não estão
preocupados se a sua afirmação é uma ingênua confusão da demanda pelo produto com
a demanda pela produção, quer dizer, confundindo a demanda por mercadorias em
geral (circulação simples) com demanda por mercadorias-capital (circulação
desenvolvida). Não se preocupam também com o fato de que a demanda
especificamente capitalista consiste da realização da massa de lucro e da
correspondente taxa média de lucro embutida nos preços de produção das mercadorias,
e não pela realização de uma utilidade qualquer. Para essa pastoral capitalista, é como
se fosse possível realizar a esdrúxula hipótese de os produtores da mais-valia e do
capital consumirem uma boa parte dessa produção. Aliás, não existe nas negociações
salariais dos sindicatos de todo o mundo a figura da “participação dos trabalhadores
nos lucros da empresa”? Só assim os controladores da ordem social podem confirmar
suas fantasiosas teorias das harmonias econômicas. Já tratamos exaustivamente desse
assunto da demanda e da acumulação em diversos boletins anteriores nos últimos 25
anos, pelo menos. Não vale a pena repetir mais uma vez aqueles boletins.
– Mas será que os simpáticos irmãos Walton, deuses da modernidade
capitalista, sentados no alto da montanha olímpica de 90 bilhões de dólares, acreditam
que um aumento substancial dos salários dos trabalhadores das 48 milhões de famílias
apertadas na parte de baixo do purgatório do seu reino de fantasias aumentaria ainda
mais o lucro da sua empresa e, claro, a sua própria riqueza? Eles preferem deixar essas
bobagens acadêmicas para as aulas de seus fieis professores de “ciência econômica” e
outros ideólogos do sistema espalhados pelos quatro cantos do mundo.
O mais provável é que eles responderiam que já pagam até demais para os
trabalhadores do seu país. Afinal, eles não pagam o equivalente a menos de $1 dólar por
hora (cerca de $ 300 dólares mensais para trabalhadores de jornada completa) aos
funcionários de suas lojas espalhadas pelas infectas periferias da Ásia, África e América
Latina? Os capitalistas sabem, por dever de oficio, porque senão não seriam capitalistas,
que as orientações do mercado para se determinar o quanto vale uma mercadoria (como
o valor da força de trabalho, por exemplo) são muito mais preciosas do que as
demagógicas receitas de dos seus confusos pastores da harmonia social.
Quanto ao problema da miséria da população e do déficit público do país, os
irmãos Walton têm a mesma receita prática dos seus economistas mais preparados para
dar a resposta do conjunto da sua classe. Mas, agora, sem aquelas ilusões moralizantes
de uma nobre consciência burguesa e outras babaquices. A receita para esses
desagradáveis problemas é dada com a mesma firmeza e cinismo do velhaco Alan
Greenspan, ex-presidente do Federal Reserve, com quem abrimos este boletim.
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