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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ PROGRAMA DE DOUTORADO INTEGRADO EM ZOOTECNIA PERFIL ADAPTATIVO DE CAPRINOS DA RAÇA ITALIANA GARFAGNINA E DO GRUPO GENÉTICO BRASILEIRO AZUL NEILA LIDIANY RIBEIRO AREIA – PB SETEMBRO - 2013 ii UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ PROGRAMA DE DOUTORADO INTEGRADO EM ZOOTECNIA PERFIL ADAPTATIVO DE CAPRINOS DA RAÇA ITALIANA GARFAGNINA E DO GRUPO GENÉTICO BRASILEIRO AZUL NEILA LIDIANY RIBEIRO -Zootecnista - AREIA – PB SETEMBRO - 2013 iii NEILA LIDIANY RIBEIRO PERFIL ADAPTATIVO DE CAPRINOS DA RAÇA ITALIANA GARFAGNINA E DO GRUPO GENÉTICO BRASILEIRO AZUL Tese apresentada ao Programa de Doutorado Integrado em Zootecnia da Universidade Federal da Paraíba, Universidade Federal Rural de Pernambuco e Universidade Federal do Ceará como requisito para obtenção do titulo de Doutor em Zootecnia. Comitê de Orientação: PROF. DR. ROBERTO GERMANO DA COSTA (ORIENTADOR) PROF. DR. EDILSON PAES SARAIVA (CO-ORIENTADOR) PROF. DR. EDGARD CAVALCANTI PIMENTA FILHO (CO-ORIENTADOR) PROF. DR. RICCARDO BOZZI (TUTOR UNIFI) AREIA – PB SETEMBRO - 2013 v DADOS CURRICULARES DO AUTOR NEILA LIDIANY RIBEIRO – Filha de Marialvo Benedito Ribeiro e Josefa Neide Ribeiro nasceu em 03 de outubro de 1978 na cidade de Areia, no Estado da Paraíba. Prestou vestibular para o Curso de Zootecnia na Universidade Federal da Paraíba em 1998, onde se formou em novembro de 2003. No mesmo ano ingressou no Curso de Mestrado em Engenharia Agrícola na Universidade Federal de Campina Grande na área de Construções Rurais e Ambiência, trabalhando com avaliação de conforto térmico para ovinos nativos em confinamento, recebendo o título em março de 2006. Em agosto de 2010 ingressou no Programa de Doutorado Integrado em Zootecnia desta universidade, em Areia, Paraíba, onde defendeu sua tese em setembro de 2013. vi Um trabalho que temos a graça e a oportunidade de fazer é nossa realização. Dedicar a alguém é demonstrar, reconhecer que também ajudou de algum modo. Ao meu filho Caio José que tanto amo e foi peça fundamental na realização deste trabalho. vii AGRADECIMENTOS Pelo processo de parto e nascimento deste trabalho, eu gostaria de agradecer às seguintes almas dedicadas. Obrigada, meu Deus! Eu lhe sou muito grata. Aos meus irmãos Neyton, Neyber, Saullo e Sarah por terem me dado carinho, amizade e confiança em todo este processo. À minha mãe por ter ficado do meu lado amiga e companheira. Ao meu pai por ter também rezado para que tudo desse certo, sempre confiante no meu sucesso. A minha avó Lúcia pelo incentivo e carinho. Aos meus tios (as) e primos (as) que tanto me incentivaram e me apoiaram durante a realização deste curso. A minha Tia Norma por ser minha tia, professora e nas horas vagas minha mãe, pela sua amizade, carinho, compreensão e incentivo a realização deste trabalho. Ao Tio Ângelo por ser tio, amigo, professor, pela sua amizade, carinho, compreensão e incentivo sempre. Ao meu querido amigo e companheiro Giovanni Sales, pelas noites em estudo. À Universidade Federal da Paraíba- Centro de Ciências Agrárias – CCA-UFPB, pela grande contribuição para minha vida profissional. À Universidade de Firenze pela acolhida, ensinamento e contribuição na minha vida profissional e pessoal. Ao professor Roberto Germano da Costa, pela orientação, amizade, confiança, incentivo e entusiasmo na execução deste trabalho, responsável pelo meu crescimento pessoal e científico. Ao professor Riccardo Bozzi, pelos ensinamentos, sugestões, amizade e incansável apoio à realização deste trabalho. Aos professores Edgard Pimenta e Edilson Paes Saraiva pela colaboração na realização deste trabalho. À professora Patrícia Emília pela grande contribuição na realização do trabalho. Aos proprietários das Fazendas unidades experimentais para o desenvolvimento deste trabalho. viii Aos professores do programa de Pós – graduação em Zootecnia, pelos ensinamentos e oportunidade de realização do curso. Aos professores e funcionários da Universidade de Firenze pelos ensinamentos e oportunidade de realização do doutorado sanduíche. A minha querida prima Jaciara Ribeiro e ao amigo Pablo Bertandes pela grande ajuda nas coletas realizadas no Brasil. A Carla Cristina pela amizade e ajuda na realização do trabalho. A Janaina Kelly pela amizade e ajuda na realização do trabalho. Aos colegas italianos Alessandro Crovetti, Silvia Ghezzi, Lapo e Francesco, pela contribuição na pesquisa. À amiga Suely pela ajuda direta e indireta na realização deste trabalho, pela amizade e apoio. Aos colegas de curso Tatiana Gouveia, Humberto, Lenice, Geovânia pela amizade e apoio direto e indireto na realização deste trabalho. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pela concessão da bolsa de estudos. MEUS SINCEROS AGRADECIMENTOS. ix SUMÁRIO Páginas LISTA DE TABELA................................................................................................ xii LISTA DE FIGURA................................................................................................ xv RESUMO GERAL................................................................................................... xvi GENERAL SUMARY............................................................................................. xviii CONSIDERAÇÕES INICIAIS................................................................................ 1 Capítulo I - Adaptação Fisiológica, Anatômica, Eritrocitária, Bioquímica Sanguínea e Hormonal dos Caprinos Submetidos ao Estresse Térmico .......... 4 Resumo.............................................................................................................. 5 Abstract............................................................................................................. 6 1. Introdução.................................................................................................... 7 2. Mecanismos de Adaptação.......................................................................... 8 2.1 Adaptação.................................................................................................... 8 2.2 Mecanismos Fisiológicos............................................................................ 11 2.3 Mecanismos Anatômicos............................................................................ 17 2.4 Mecanismos Eritrocitários........................................................................... 20 2.5 Mecanismos Bioquímicos Sanguíneos........................................................ 24 2.6 Mecanismos Hormonais.............................................................................. 28 3. Conclusões.................................................................................................. 33 4. Referências Bibliográficas.......................................................................... 34 Capítulo II - Perfil Anatomofisiológico e Endócrino da Adaptação de Caprinos Italianos da Raça Garfagnina ........................................................................... 45 Resumo.............................................................................................................. 46 Abstract............................................................................................................. 47 1. Introdução.................................................................................................... 48 2. Material e Métodos...................................................................................... 49 3. Resultados e Discussão............................................................................... 55 4. Conclusões.................................................................................................. 67 x 5. Referências Bibliográficas.......................................................................... 68 Capítulo III - Análise Multivariada para Avaliação do Perfil Adaptativo de Caprinos da Raça Garfagnina ........................................................................... 72 Resumo.............................................................................................................. 73 Abstract............................................................................................................. 74 1. Introdução.................................................................................................... 75 2. Material e Métodos...................................................................................... 77 3. Resultados e Discussão............................................................................... 80 4. Conclusões.................................................................................................. 85 5. Referências Bibliográficas.......................................................................... 86 Capítulo IV - Perfil Anatomofisiológico e Endócrino da Adaptação de Caprinos Brasileiros do Grupo Genético Azul ................................................................ 88 Resumo.............................................................................................................. 89 Abstract............................................................................................................. 90 1. Introdução.................................................................................................... 91 2. Material e Métodos...................................................................................... 93 3. Resultados e Discussão............................................................................... 99 4. Conclusões.................................................................................................. 111 5. Referências Bibliográficas.......................................................................... 112 Capítulo V - Análise Multivariada para Avaliação do Perfil Adaptativo de Caprinos do Grupo Genético Azul ................................................................... 116 Resumo.............................................................................................................. 117 Abstract............................................................................................................. 118 1. Introdução.................................................................................................... 119 2. Material e Métodos...................................................................................... 121 3. Resultados e Discussão............................................................................... 124 4. Conclusões.................................................................................................. 128 5. Referências Bibliográficas.......................................................................... 129 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 131 xi LISTA DE TABELAS Páginas Capítulo 1. Adaptação Fisiológica, Anatômica, Eritrocitária, Bioquímica Sanguínea e Hormonal dos Caprinos Submetidos ao Estresse Térmico 1. Temperatura retal (TR), frequência respiratória (TR), frequência cardíaca (FC) e temperatura superficial (TS) em diferentes condições ambientais de caprinos...... 16 2. Valores de eritrócitos (Er), hematócrito (Ht), hemoglobina (Hb), volume globular médio (VGM), hemoglobina globular média (HGM) e concentração de hemoglobina globular média (CHGM) de caprinos de diferentes raças.................... 23 3. Parâmetros bioquímicos sanguíneos de caprinos de diferentes raças no Brasil e outros países............................................................................................................... 27 Capítulo 2. Perfil Anatomofisiológico e Endócrino da Adaptação de Caprinos Italianos da Raça Garfagnina 1. Variáveis ambientais temperatura do ar (TA), umidade relativa (UR), índice de temperatura do globo negro e umidade (ITGU) e carga térmica radiante (CTR) em Bagni di Lucca, Itália................................................................................................. 55 2. Distribuição de frequência das características morfológicas em fêmeas caprinas da raça Garfagnina..................................................................................................... 57 3.Médias e desvio padrão (µ±dp) dos parâmetros anatômicos do pelo em fêmeas caprinas da raça Garfagnina....................................................................................... 58 4. Médias e desvio padrão (µ±dp) dos parâmetros anatomofisiológicos em fêmeas caprinas da raça Garfagnina, de acordo com a cor do pelo........................................ 59 5. Médias e desvio padrão (µ±dp) dos parâmetros fisiológicos em fêmeas caprinas da raça Garfagnina..................................................................................................... 60 6. Média e desvios padrão (µ±dp) dos parâmetros eritrocitários em fêmeas caprinas da raça Garfagnina....................................................................................... 62 7. Média e desvios padrão (µ±dp) dos parâmetros bioquímicos sanguíneos em fêmeas caprinas da raça Garfagnina........................................................................... 63 xii 8. Média e desvios padrão (µ±dp) dos parâmetros hormonais em fêmeas caprinas da raça Garfagnina..................................................................................................... 65 9. Correlações de Pearson entre os hormônios triiodotironina (T3), tiroxina (T4) e cortisol (COR) em função da temperatura do ar (TA)............................................... 65 Capítulo 3. Análise Multivariada para Avaliação do Perfil Adaptativo de Caprinos da Raça Garfagnina 1. Componente principal (CP), autovalores, porcentagem da variância por componente e variância total de fêmeas caprinas da raça Garfagnina....................... 80 2. Correlações entre as variáveis e respectivos componentes em fêmeas caprinas da raça Garfagnina..................................................................................................... 81 Capítulo 4. Perfil Anatomofisiológico e Endócrino da Adaptação de Caprinos Brasileiros do Grupo Genético Azul 1.Variáveis ambientais: temperatura do ar (TA), umidade relativa (UR) Índice de temperatura do globo negro e umidade (ITGU) e carga térmica radiante (CTR) no Rio Grande do Norte, Brasil.................................................................... 99 2. Distribuição de frequência das características morfológicas em fêmeas caprinas do grupo genético Azul............................................................................. 101 3. Médias e desvio padrão (µ±dp) dos parâmetros anatômicos do pelo em fêmeas caprinas do grupo genético Azul............................................................................. 102 4. Médias e desvio padrão (µ±dp) dos parâmetros fisiológicos em fêmeas caprinas do grupo genético Azul............................................................................. 103 5. Média e desvios padrão (µ±dp) dos parâmetros eritrocitários em fêmeas caprinas do grupo genético Azul............................................................................. 106 6. Média e desvios padrão (µ±dp) dos parâmetros bioquímicos sanguíneos em fêmeas caprinas do grupo genético Azul................................................................. 107 7. Correlações de Pearson entre os hormônios triiodotironina (T3), tiroxina (T4) e cortisol (COR) em função da temperatura do ar (TA).......................................... 109 xiii Capítulo 5. Análise Multivariada para Avaliação do Perfil Adaptativo de Caprinos do Grupo Genético Azul 1. Componentes principais, autovalores, e porcentagem da variância por componentes e variância total de fêmeas caprinas do grupo genético Azul.............. 124 2.Correlações entre as variáveis e respectivos componentes em fêmeas caprinas do grupo genético Azul.............................................................................................. 125 xiv LISTA DE FIGURAS Páginas Capítulo 2. Perfil Anatomofisiológico e Endócrino da Adaptação de Caprinos Italianos da Raça Garfagnina 1. Localização de Orrido di Botri, Itália..................................................................... 49 2. Gradiente térmico TR-TS em função da temperatura ambiente em fêmeas caprinas da raça Garfagnina........................................................................................ 61 3. Concentração dos hormônios tireoidianos e cortisol de cabras da raça Garfagnina em função da temperatura do ar............................................................... 66 Capítulo 3. Análise Multivariada para Avaliação do Perfil Adaptativo de Caprinos da Raça Garfagnina 1 Componente Principal para parâmetros fisiológicos, eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais em fêmeas caprinas da raça Garfagnina.............................. 84 Capítulo 4. Perfil Anatomofisiológico e Endócrino da Adaptação de Caprinos Brasileiros do Grupo Genético Azul 1. Localização de Caiçara do Rio do Vento, região Nordeste do Brasil..................... 93 2. Concentração dos hormônios tireoidianos e cortisol nos períodos chuvoso e seco.............................................................................................................................. 109 Capítulo 5. Análise Multivariada para Avaliação do Perfil Adaptativo de Caprinos do Grupo Genético Azul 1. Distribuição das características estudadas nos dois planos (CP 1 e CP2) de caprinos do grupo Azul, do Brasil.............................................................................. 127 xv PERFIL ADAPTATIVO DE CAPRINOS DA RAÇA ITALIANA GARFAGNINA E DO GRUPO GENÉTICO BRASILEIRO AZUL RESUMO GERAL A exposição de caprinos a temperaturas elevadas induz a aumento na dissipação do excesso de calor do corpo. A dissipação é feita por evaporação da água a partir do trato respiratório e da superfície da pele via ofegação e suor, respectivamente. Quando os mecanismos fisiológicos do animal não são eficientes na eliminação do excesso de carga térmica, a temperatura retal aumenta. Ao mesmo tempo, a exposição dos animais ao estresse térmico, promove mudanças drásticas nas funções biológicas. Independente da raça, o ambiente e suas variáveis, a estação e o período do dia, alteram os parâmetros anatomofisiológicos, hematológicos, bioquímicos e hormonais dos animais, com efeitos diretos sobre as respostas termorregulatórias dos animais. O objetivo desta pesquisa foi caracterizar o perfil adaptativo de fêmeas caprinas da raça italiana Garfagnina e do grupo genético Azul do Brasil. Os grupos foram avaliados em dois turnos do dia (manhã e tarde) em duas estações (manhã e tarde), quanto aos aspectos fisiológico, morfológico, bioquímico, hematológico, hormonal e anatômico. Foram utilizados dados de temperatura do ar, temperatura do globo negro e umidade relativa do ar. Utilizaram-se também os parâmetros fisiológicos (temperatura retal, frequência respiratória, frequência cardíaca, temperatura superficial bem como o gradiente térmico TR-TS), parâmetros anatômicos (diâmetro e o comprimento do pelo e a espessura do pelame), parâmetros hematológicos (eritrócitos, hematócrito, hemoglobina, volume globular médio, concentração de hemoglobina globular média), parâmetros bioquímicos sanguíneos (glicose, colesterol, triglicérides, creatinina, uréia, proteína total, albumina, globulina, relação albumina e globulina, magnésio, gama glutamiltransferase, aspartato aminotransferase e alanina aminotransferase) e parâmetros hormonais (tiroxina, triidotironina e cortisol). O perfil adaptativo das duas raças também foi caracterizado através de análise de componentes principais. Para a raça italiana, observou-se efeito significativo de período e estação sobre todas as variáveis ambientais. As variáveis fisiológicas, temperatura retal, frequência respiratória, frequência cardíaca e temperatura superficial apresentaram valor mais elevado no período da tarde em ambas as estações. Para os parâmetros anatômicos observou-se efeito significativo de estação e xvi de cor do pelo. Já os parâmetros bioquímicos e hormonais foram afetados significativamente pela estação, ao contrário dos parâmetros hematológicos que não foram afetados significativamente por esse efeito. Para o grupo genético Azul do Brasil, observou-se efeito significativo de período e estação sobre todas as variáveis ambientais. As variáveis fisiológicas, temperatura retal, frequência respiratória, frequência cardíaca e temperatura superficial apresentaram valor mais elevado no período da tarde em ambas as estações. Para os parâmetros anatômicos observou-se efeito significativo de estação. Para a raça italiana foram necessários 4 componentes para explicar cerca de 67% da variação total conforme o critério estabelecido, com 46,79% concentrada nos componentes 1 e 2. Para o grupo genético Azul do Brasil foram necessários cinco componentes para explicar 67% da variação total, sendo que 45% da variação concentrou-se nos dois primeiros componentes. Os perfis bioquímico, eritrocitário, hormonal e a temperatura superficial foram os que mais contribuíram na determinação do perfil adaptativo dos animais. Observou-se que os animais nos dois países mantiveram sua temperatura retal dentro do limite recomendado para a espécie, mantendo a homeotermia, o que é indicativo de que utilizaram outros mecanismos adaptativos para se ajustarem as modificações climáticas nas diferentes estações do ano. As ferramentas multivariadas foram eficientes na definição do perfil adaptativo dos animais e permitiu visualização adequada no espaço bidimensional, sem grande perda de informações. Palavras-chave: eritrócitos, homeotermia, hormônios, multivariada, parâmetros fisiológicos xvii ADAPTIVE PROFILE OF BREED GOATS AND ITALIAN GARFAGNINA BRAZILIAN GROUP GENETIC AZUL GENERAL SUMARY Goats exposure to elevated temperatures induces an increase in the dissipation of excessive heat from the body. The dissipation is done by evaporation of water from the respiratory tract and the skin surface via sweat and panting, respectively. When the physiological mechanisms are not effective in removing excess thermal load, rectal temperature increases. At the same time, exposure of animals to heat stress, drastic changes occurs in the biological functions. Regardless of the breed, the environment and its variables, the season and time of day, change the anatomophisiological parameters as well as the hematological, biochemical and hormonal with direct effects on the thermoregulatory responses of animals. The objective of this research was to characterize the profile of adaptive female of the Italian Garfagnina goats breed and Azul genetic group from Brazil. The groups were evaluated in two rounds of the day (morning and afternoon) in two seasons (morning and afternoon) and physiological, morphological, biochemical, hematological, hormonal and anatomical aspects were studied. Data of air temperature, black globe temperature and relative humidity were collected. Were also used physiological parameters (rectal temperature, respiratory rate, heart rate, skin temperature and the thermal gradient TR - TS), anatomical parameters (diameter and length and thickness of the hair coat), hematological parameters (erythrocyte, hematocrit, hemoglobin, mean corpuscular volume, mean corpuscular hemoglobin concentration), blood biochemical parameters (glucose, cholesterol, triglycerides, creatinine, urea, total protein, albumin, globulin, albumin and globulin, magnesium, gamma glutamyl transferase, aspartate aminotransferase and alanine aminotransferase) and hormonal parameters ( thyroxine, Triiodothyronine and cortisol). The adaptive profile of the two breeds was also characterized by principal component analysis. For the Italian breed , there was a significant effect of period and season on all environmental variables. Physiological variables as rectal temperature, respiratory rate, heart rate and skin temperature showed higher value in the afternoon in both seasons. For anatomical parameters it was observed significant effect of season and the coat color. The biochemical and hormonal parameters were significantly affected by the season and hematological parameters were not significantly affected by this effect. For xviii the Azul genetic group from Brazil, there was a significant effect of period and season on all environmental variables. Physiological variables, rectal temperature, respiratory rate, heart rate and skin temperature showed higher value in the afternoon in both seasons. For anatomical parameters it was observed significant effect of season. For the Italian breed four principal components explained about 67% of the total variation according to the criteria established, with 46.79 % concentrated in components one and two. For the Azul genetic group from Brazil, five components were necessary to explain 67% of the total variation, with 45% of the variation concentrated in the first two components. The biochemical profiles, erythrocyte, hormonal and surface temperature were the main contributors in determining the adaptive profile of animals. It was observed that the animals in the two countries maintained their rectal temperature within the recommended range for the goat specie, keeping the homeothermy which is indicative that other suitable mechanisms were used to adjust the climate changes in different seasons of the year. Multivariate tools were effective in defining the adaptive profile of animals and allowed adequate visualization in two-dimensional space, without much loss of information. Keywords: erytrocyte, heat tolerance, hormones, multivariate physiological parameters 1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS 2 CONSIDERAÇÕES INICIAIS A espécie caprina (Capra hircus) é a mais vastamente distribuída no mundo, sendo a segunda a ser domesticada e primeira das espécies leiteiras. Esta é o resultado tanto da domesticação quanto da seleção natural, durante a qual apenas aquelas espécies que podiam resistir em determinada região sobreviviam. Isto fez com que adquirissem características de adaptação particulares para os locais onde se estabeleceram. As raças de animais domésticas estão intimamente relacionadas à região de origem e sua conservação sustentável e representa uma das possibilidades de desenvolvimento para região. Um dos grandes obstáculos para conservação de uma raça é a falta de informações técnicas sobre ela. Os conhecimentos da identidade genética de cada grupo, de seu potencial produtivo e reprodutivo e de seus mecanismos adaptativos são importante na sua valorização, conservação e uso adequado. Estudos devem ser conduzidos de modo a precisar o real potencial de cada grupo ou raça local, principalmente devido à reconhecida capacidade adaptativa e importância socioeconômica destas raças locais no seu país de origem, a exemplo do grupo genético Azul no Brasil e da raça Garfagnina na Itália. O grupo genético Azul existente na região Nordeste do Brasil, ainda não é reconhecida oficialmente como raça, pois este grupo racial está em perigo de extinção. Porém, é um animal bastante rústico e adaptado as adversidades climáticas. Na Itália a raça Garfagnina, tem grande importância em sistemas familiares de criação. Atualmente a população está em processo de extinção, porém são animais rústicos adaptados ao inverno rigoroso do clima temperado. Uma demanda de importância indiscutível é o estudo dos mecanismos que possibilitaram a esses animais alto grau de adaptabilidade às adversidades ambientais, bem como das características físicas que auxiliam na manutenção da homeotermia em regiões de clima quente e frio. Assim, estruturas da epiderme e do pelame, mecanismos que envolvem síntese e secreção de hormônios e valores de referência de temperatura corporal, ritmo respiratório e evaporação cutânea são importantes ferramentas para a compreensão dos mecanismos adaptativos, ao mesmo tempo em que estão relacionadas às funções produtivas dos animais. 3 Também é importante conhecer os mecanismos adaptativos que cada raça utiliza para fazer frente às adversidades climáticas que enfrentam. Uma das possibilidades é o estudo do perfil bioquímico, hematológico, hormonal e anatômico destes grupos. Para conhecer o perfil adaptativo das raças Azul do Brasil e Garfagnina da Itália foi desenvolvida esta tese, a qual está estruturada em cinco capítulos: No Capítulo 1 tem-se a revisão sobre a adaptação dos caprinos ao estresse térmico por calor e frio, ressaltando parâmetros fisiológicos (temperatura retal, temperatura superficial, frequência cardíaca e respiratória), anatômicos (comprimento, diâmetro do pelo e espessura do pelame), eritrocitários (eritrócitos, hematócrito, hemoglobina, volume globular médio, concentração de hemoglobina globular média), bioquímicos sanguíneos (glicose, colesterol, triglicéride, ureia, proteína, globulina, albumina, creatinina, alanina aminotransferase, aspartato aminotransferase, gama glutamiltransferase (enzimas)) e os hormônios (tireoidiano e cortisol) na adaptação de caprinos submetidos ao estresse térmico. No Capítulo 2 é abordada a influência do clima temperado nos marcadores fenotípicos, mecanismos anatomofisiológicos, mecanismos eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais e como esses afetam a adaptação dos caprinos da raça italiana Garfagnina. No Capítulo 3 foi feito o estudo do perfil adaptativo de fêmeas caprinas da raça Garfagnina, com uma abordagem estatística multivariada, com base em todas as características utilizadas no capítulo 2, de modo a entender o fenômeno da adaptação a partir de uma perspectiva global. No Capítulo 4 observa-se neste capítulo, a influência do clima tropical, nos marcadores fenotípicos, mecanismos anatomofisiológicos, mecanismos eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais e como esses afetam a adaptação dos caprinos do grupo genético brasileiro Azul. No Capítulo 5 tem-se o estudo do perfil adaptativo de fêmeas caprinas do grupo genético brasileiro Azul, com uma abordagem estatística multivariada, com base em todas as características utilizadas no capítulo 4, de modo a entender o fenômeno da adaptação a partir de uma perspectiva global. 4 CAPÍTULO 1 Referencial teórico 5 ADAPTAÇÃO FISIOLÓGICA, ANATÔMICA, ERITROCITÁRIA, BIOQUÍMICA SANGUÍNEA E HORMONAL DOS CAPRINOS SUBMETIDOS AO ESTRESSE TÉRMICO Adaptação fisiológica, anatômica, eritrocitária, bioquímica sanguínea e hormonal dos caprinos submetidos ao estresse térmico RESUMO O objetivo com esta revisão foi entender o papel dos pmecanismos anatômicos, fisiológicos, eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais de caprinos nativos criados em ambientes adversos. Trabalhos científicos realizados nos últimos anos permitiram avaliar como os caprinos de várias raças respondem aos efeitos edafoclimáticos para manter a homeotermia em função da adaptabilidade ao ambiente. Os dados destes estudos permitiram concluir que, independente da raça, o ambiente e suas variáveis, assim como o período e o turno do dia alteram os mecanismos adaptativos. A exposição de caprinos a temperaturas elevadas induz a um aumento na dissipação do excesso de calor do corpo. Quando os mecanismos fisiológicos do animal não são suficientes na eliminação do excesso de carga térmica, ocorrem aumentos na temperatura retal. Ao mesmo tempo, tal exposição das cabras ao estresse térmico provoca uma série de mudanças drásticas nas funções biológicas dos animais. Estudos recentes indicam que o sistema nervoso central regula os ritmos circadianos e sazonais da maioria das funções biológicas, particularmente as funções reprodutivas e de comportamento, em mamíferos. Há evidências sugerindo que o sisma nervoso central é sensível às mudanças de temperatura e algumas células são mais ágeis no frio e outras no calor. Em conclusão, pode-se dizer que a exposição das cabras a alta temperatura do ambiente afeta negativamente as funções biológicas que são refletidas na diminuição da sua produção e características de reprodução. Palavras-chave: adaptabilidade, cortisol, homeotermia, respostas termorreguladoras, tolerância ao calor 6 Physiological, anatomical, erythrocyte, biochemical sanguine and hormonal adaptations on goats subjected to heat stress ABSTRACT The aim of this review was to understand the role of the anatomic, physiologic, erythrocyte, biochemical sanguine and hormonal traits in local goats raised in adverse environments. Scientific work in recent years led to understand how the goats of several breeds respond to the edaphoclimatic effects to maintain homeothermy due to environmental adaptation. Data from these studies showed that regardless of the breed, the environment and its variables as well as the season and day time changes the adaptive mechanisms. Goats exposured to high temperatures increase the dissipation of excess heat from the body. When the physiological mechanisms are not sufficient in eliminate excessive thermal load the rectal temperature increasement. At the same time, goats exposure to thermal stress many drastic changes occurs in biological functions of animals. Recent studies indicate that the central nervous system regulates the circadian and seasonal of most biological functions, particularly reproductive function and behavior. There is evidence suggesting that the central nervous system is sensitive to temperature changes and some cells are more nimble in other cold and the heat. In conclusion, it can be said that goats exposure to high temperature environment negatively affects the biological functions that are reflected in decrease production and reproduction traits. Keywords: adaptability, cortisol, homeothermy, heat stress, thermal answers 7 1. INTRODUÇÃO O impacto das mudanças climáticas tem promovido muitos prejuízos à produção animal, o que gera a necessidade de estudos aprofundados sobre os processos adaptativos das raças, para melhor compreensão dos mecanismos e processos de adaptação dos animais a mudanças bruscas de temperatura. As variações climáticas afetam os animais diretamente através do estresse fisiológico gerado pela necessidade de controle da termorregulação, nutrição e doenças. Portanto, a descrição do ambiente de produção é importante, visto que cada raça apresenta características adaptativas distintas. As raças locais em geral foram submetidas a séculos de seleção natural, o que resultou em indivíduo com elevado valor adaptativo para adversidade ambiental, com expectativa de maior eficiência produtiva. Recentemente, alguns trabalhos têm demonstrado maior preocupação com o bem-estar animal, pois há aparentemente, existência de correlação inversa entre adaptabilidade e produtividade (Silanikove, 2000a). As espécies de mamíferos apresentam formas diferentes de lidar com o estresse e percebe-se interesse generalizado sobre os mecanismos utilizados pelos organismos para manter a homeostase. Fisiologicamente, os animais reagem diferentemente às mudanças drásticas de temperatura, alterando o comportamento e a produção e, como consequência, sofrem alterações genéticas e fisiológicas (Silva et al., 2010). A criação de caprinos é bastante difundida no mundo, sendo criados nas mais diversas regiões, muitas vezes em situações inóspitas tanto nutricionais como ambiental. O clima é um dos componentes ambientais que exerce efeito mais pronunciado sobre o bem-estar animal e, por consequência, sobre a produção e produtividade. É considerado, portanto, fator regulador ou mesmo limitador da exploração animal para fins econômicos. A produção animal, seja em clima tropical ou temperado, independente da espécie, é limitada principalmente pelo estresse por calor ou por frio. Com o advento do aquecimento global, observam-se mudanças climáticas drásticas nas diferentes regiões do mundo, expondo cada vez mais as diferentes espécies animais a condições estressantes. As mudanças nas funções biológicas dos animais devido à exposição ao estresse térmico incluem alteração no consumo, utilização e metabolismo de água, energia, 8 proteína e minerais, mudanças nas reações enzimáticas, nas secreções hormonais e nos metabólitos do sangue, além de acarretar mudanças nas reações fisiológicas e comportamentais dos animais (Marai et al., 2006). Um ambiente estressante provoca várias respostas, dependendo da capacidade do animal para adaptação. Em determinadas condições ambientais, o animal pode manter todas as suas funções vitais e, em outras, estabelece prioridades. Dados detalhados referentes à adaptação das raças locais, incluindo as suas zonas termoneutras e distribuição é escasso, o que dificulta o desenvolvimento de estratégias de criação com vistas ao aumento da produção. O objetivo desta revisão foi compilar informações sobre os mecanismos fisiológicos, anatômicos, genéticos, eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais usados pelas raças caprinas locais para adaptar-se a ambientes adversos. 2. MECANISMOS DE ADAPTAÇÃO 2.1 Adaptação A adaptabilidade pode ser definida como a capacidade de sobreviver e reproduzir em determinado ambiente ou a capacidade das espécies em se ajustar a ambientes adversos por meio de alterações fisiológicas ou genéticas (Prayaga e Henshall, 2005). Acredita-se que a adaptação tenha sido a característica considerada mais importante na seleção de animais no início da domesticação. A adaptação fisiológica ocorre por alterações nas características anatômicas, morfológicas, fisiológicas, bioquímicas e de conduta do animal, que proporcionam bemestar e favorecem a sobrevivência do animal a um meio específico (Hafez, 1973). Do ponto de vista genético, a adaptação consiste em alterações herdáveis nas características que favorecem a sobrevivência de uma população de indivíduos em determinado ambiente, podendo envolver modificações evolutivas durante muitas gerações (seleção natural) ou a aquisição de propriedades genéticas específicas (seleção artificial). Por outro lado, a adaptação fenotípica consiste em alterações que reduzem a condição fisiológica e/ou emocional produzida por componentes estressantes do ambiente e ocorrem dentro do tempo de vida do animal (Bernabucci et al., 2010). Os fatores a serem considerados na determinação do conforto térmico e nas condições de adaptação dos animais a ambientes específicos são: o ambiente, a capa externa, as características corporais, bioquímicas, hematológicas, hormonais, genéticas e fisiológicas. Desde que foram reconhecidas as diferenças dos animais quanto à sua 9 capacidade de enfrentar as variações climáticas, têm sido feito tentativas de estabelecer critérios de seleção para os mais aptos a ambientes específicos, além de se classificar os diversos tipos de ambientes sob o ponto de visto do conforto desses animais (Silva, 2000). Pesquisas sobre vários aspectos da adaptação (fisiológica, fenotípica e genética) têm sido realizadas com poucas espécies e raças, na maioria exótica e em sistemas de produção controlado. Para obter o genótipo ideal a um determinado ambiente, duas estratégias são adotadas: modificação do ambiente para atender as necessidades dos animais e manutenção dos animais adaptados em seus respectivos ambientes, como fazem os pequenos produtores em sistemas extensivos. A interação entre os animais e o ambiente, a capacidade de adaptação das espécies e raças são características importantes, pois é com base nelas que se tomam decisões sobre o melhor sistema de criação e estratégias de manejo a serem adotados no intuito de aumentar a produção dos animais (Mirkena et al., 2010). As raças locais em geral são comumente criadas em pastagens nativas, sendo também seus subprodutos e serviços usados pelas comunidades com baixos insumos externos. O melhoramento dessas raças tem sido limitado e os ganhos são aqueles conseguidos por seleção natural e artificial, baseado na morfologia. Nesse processo, adquiriram características adaptativas únicas como resistência a doenças, tolerância ao calor e ao frio, dentre outras, o que permite que estes animais sejam produtivos nesses ambientes (Devendra, 1990). A crescente preocupação com o conforto térmico dos animais é justificável não só em países que ocupam as zonas tropicais onde altas temperaturas ambientais estão se tornando um problema, como também nas zonas temperadas em que a avaliação dos efeitos do estresse térmico e outros fatores de estresse são complexos e difíceis. As raças de alto rendimento provenientes de regiões temperadas não são adaptadas ao estresse por calor devido, em parte, à alta produção de calor metabólico (Nardone et al., 2010). Em determinada faixa de temperatura efetiva ambiental, o animal mantém praticamente constante a temperatura corporal com mínimo dos mecanismos termorregulatórios, faixa conhecida como zona de conforto térmico (ZCT). Nesta zona não há sensação de frio ou calor e o desempenho do animal em qualquer atividade é otimizado. Esta zona em caprinos está entre 20 e 30°C (Baêta e Souza, 2010). 10 A temperatura ambiente representa o principal elemento climático que afeta as variáveis fisiológicas, seguida da radiação solar, umidade relativa do ar e movimento do ar. A raça do animal, idade, sexo, atividade física, condições nutricionais e ambientais, regime de manejo, estágio reprodutivo e de lactação, podem também afetar as variáveis fisiológicas. Nos ruminantes domésticos existem diferenças entre espécies, raças, nível de produção e susceptibilidade ao estresse calórico, isto ocorre devido às diferenças entre espécies na capacidade de reduzir a produção de calor endógeno e aumentar a dissipação de calor. Assim, animais adaptados a ambientes quentes apresentam geralmente menor taxa e maior capacidade de dissipar calor através do ofego e da sudorese (Gaughan et al., 2009). Entre os ruminantes, as espécies ovina e caprina são consideradas menos sensíveis ao estresse térmico que a espécie bovina. Porém, a espécie caprina é mais bem adaptada a ambientes adversos e destacam-se as raças locais com melhor desempenho nestes ambientes do que outros ruminantes domésticos (Silanikove, 2000b). O efeito combinado do tamanho do corpo e do comportamento alimentar permite que os caprinos suportem melhor o estresse ambiental. Os animais que habitam ambientes quentes e/ou úmidos apresentam corpo pequeno, enquanto os que habitam ambientes secos ou áreas com ampla faixa de temperatura diurna geralmente possuem corpos maiores (Daramola e Adeloye, 2009). A melhor adaptação das raças locais é fruto de um processo que ocorreu ao longo do tempo através da seleção natural devido ao ambiente imposto a esses animais, de forma que sobreviveram aqueles com maior capacidade adaptativa. Alterações quantitativas dos componentes teciduais e celulares frequentemente surgem em processos de adaptação, evolução ou patologias em um determinado organismo, o que torna necessário uma avaliação quantitativa destes componentes para que estes processos sejam bem entendidos (Roberts et al., 2000). As características morfofisiológicas mais importantes para a adaptação dos animais são: menor produção de calor basal, maiores glândulas salivares, tamanho do corpo, estrutura do pelo e aumento da eficiência de utilização de ureia e a capacidade de aumentar substancialmente o volume do intestino anterior quando alimentados com alimentos fibrosos (Daramola e Adeloye, 2009). O principal efeito das respostas adaptativas é coordenar o metabolismo de forma a atingir novo equilíbrio que pode ser considerado como um novo estado fisiológico 11 (alostase). Conhecer melhor os mecanismos fisiológicos da adaptação pode contribuir para o desenvolvimento e adoção de procedimentos que ajudam a manter a eficiência, saúde, reprodução e produção de ruminantes em ambientes adversos. Vários parâmetros fisiológicos são utilizados para avaliar a capacidade adaptativa sendo os mais utilizados: frequência respiratória, temperatura retal, temperatura superficial e frequência cardíaca e taxa de sudorese. Outros parâmetros podem contribuir com informações importantes para se conhecer o perfil adaptativo de raças locais, tais como parâmetros bioquímicos, hematológicos, morfológicos, hormonais e genéticos, evidenciando assim a necessidade de definir esses parâmetros para as raças locais de caprinos (Bernabucci et al., 2010). 2.2 Mecanismos Fisiológicos 2.2.1 Temperatura Retal A temperatura retal é frequentemente utilizada como um indicador da temperatura corporal dos animais. Por isso, o equilíbrio entre o ganho e a perda de calor do corpo pode ser inferido pela temperatura retal. Esta medida é usada frequentemente como índice de adaptabilidade fisiológica ao ambiente quente ou frio, pois, se esta aumenta ou diminui demasiadamente, indica que os mecanismos de dissipação ou de produção de calor são ineficientes. À medida que a temperatura do ar aumenta, a eficiência das perdas de calor sensível diminui devido ao menor gradiente de temperatura entre a pele do animal e a do ambiente. Assim, o animal pode até certo ponto manter a temperatura retal por meio de vasodilatação, pois aumenta o fluxo sanguíneo periférico e consequentemente aumenta a temperatura da pele. No entanto, se a temperatura do ar continuar a aumentar, o animal passa a depender da perda de calor por evaporação através da respiração e/ou sudorese. Em caprinos a temperatura retal varia de 38,3ºC a 40,0ºC (Anderson, 1996). Vários fatores são capazes de causar variações na temperatura corporal, dentre eles a estação do ano, idade, sexo, turno do dia, exercício, ingestão e digestão de alimentos e consumo de água. Em animais domésticos, a temperatura retal aumenta significativamente em resposta a temperaturas ambientais a partir dos 28°C. A hipertermia ocorre em temperaturas ambientais na faixa de 30 a 50°C ou quando a temperatura corporal aumenta cerca de 3 a 6°C acima do nível normal, dependendo do tempo de exposição, 12 da adaptação ao calor e do nível de produção do animal (Muller, 1989) de modo que, em caprinos, a temperatura corporal pode sofrer variações diárias de 0,3 a 1,9°C (Piccione e Refinetti, 2003). Avaliando a adaptabilidade de caprinos exóticos e de raças locais no semiárido Silva et al. (2006), Medeiros et al. (2007) e Souza et al. (2008) verificaram que, independente da raça, o efeito de turno influenciou a temperatura retal, mostrando-se mais altas no turno da tarde. Nas diferentes raças em condições ambientais diferentes como mostrado na Tabela 1 à temperatura retal esteve dentro da faixa adequada para a espécie caprina. 2.2.2 Frequência Respiratória A frequência respiratória é o volume de ar movido por unidade de tempo sobre as superfícies úmidas das vias respiratórias e o aumento da frequência respiratória é o indicativo de perda de calor por evaporação. O mecanismo respiratório é muito importante para a termólise e manutenção da homeotermia nos animais a fim de evitar aumento na temperatura do corpo durante a exposição térmica (McMannus et al., 2009). No mecanismo de defesa contra o calor pelo ofego, ocorre um aumento da ventilação efetuada pelo aumento da frequência respiratória e consequentemente diminuição do volume corrente (Perissinoto, 2006). O aumento da frequência respiratória pode ser uma maneira eficiente de perder calor por curtos períodos, mas se esse aumento se mantém por várias horas poderá resultar em sérios problemas para o animal. Os caprinos apresentam frequência respiratória média de 25 mov./min. (Dukes e Swenson, 1996) e são classificados sob quatro níveis de estresse. Se a frequência respiratória esta entre 40 a 60 mov./min diz-se que o animal encontra-se em baixo nível de estresse; em estresse médio a alto, de 60 a 80 mov./min; em estresse alto de 80 a 120 mov./min. e acima de 200 mov./min. em estresse severo (Silanikove, 2000a). A frequência respiratória é um excelente indicador do estado de saúde do animal, mas deve ser adequadamente interpretada, pois pode variar conforme a espécie, tamanho corporal, raça, idade, estágio fisiológico, ingestão de alimentos, exercícios, excitação e fatores ambientais (Reece, 2006). Altos valores de frequência respiratória não indicam que o animal esteja sob estresse térmico, pois a frequência respiratória é mais um parâmetro de termorregulação do que um indício de estresse térmico. Ou seja, se a frequência respiratória estiver alta, mas o animal foi eficiente em eliminar calor mantendo a homeotermia, pode não ocorrer estresse calórico (Berbigier, 1988). 13 Segundo Renaudeau et al. (2012), a resposta inicial de um animal sob estresse consiste em aumentar a sua frequência respiratória e, assim há perda de calor pela evaporação respiratória. A frequência respiratória sofre influência do turno do dia, uma vez que a tarde, a temperatura do ar é geralmente bem mais elevada que pela a manhã, promovendo elevação na frequência respiratória (Silva et al., 2006, Medeiros et al., 2007 e Souza et al., 2008). Na Tabela 1, observa-se que os animais nativos foram mais eficientes na manutenção da temperatura retal, pois a frequência respiratória não sofreu grandes alterações ao contrário do que ocorreu com animais exóticos criados no Brasil como é o caso das raças Savana e Saanen (Silva et al., 2010 e Souza et al., 2011) e dos cruzamentos (Silva et al., 2005; Souza et al., 2005; Silva et al., 2011) que aumentaram a frequência respiratória para manter a temperatura retal dentro da faixa considerada normal para a espécie caprina. 2.2.3 Frequência Cardíaca Os animais domésticos apresentam grande variação na frequência cardíaca sob diferentes testes de tolerância térmica e entre diferentes grupos genéticos, provavelmente devido à diluição ou concentração do volume do plasma sanguíneo, provocado por estresse térmico (Elvinger et al., 1992). Aumento da atividade muscular para controlar o aumento simultâneo da frequência respiratória e redução na resistência vascular periférica promove maior circulação sanguínea para dissipação de calor através da pele, o que são atributos que fazem que a frequência cardíaca aumente (Al-Tamimi, 2007). A frequência cardíaca considerada normal para espécie caprina é de 70 a 80 bat./min. (Dukes e Swenson, 1996), porém os valores variam em função da raça, idade, trabalho muscular e temperatura do ar. Vários estudos têm mostrado grande variação da frequência cardíaca de animais nas diferentes temperaturas e raças (Tabela 1). Os estudos indicam que, à medida que a temperatura do ar aumenta, a FC também aumenta, sendo sempre superior no turno da tarde. Porém, quando o estresse térmico persiste, a frequência cardíaca diminui como resposta do animal na busca por diminuir a produção de calor (Medeiros et al., 2007; Souza et al., 2008). Rocha et al. (2006) estudaram caprinos do grupo genético brasileiro Azul nas épocas seca e chuvosa do ano e observaram que a frequência cardíaca no período chuvoso foi maior (79,4 bat/min) que no período seco (69,5 bat/min), esses valores são 14 fortemente relacionados com a frequência cardíaca, como relatado por Souza et al. (2005), os quais observaram frequência cardíaca de 121,4 bat/min. em animais do grupo genético ½ Moxotó ½ SRD. 2.2.4 Temperatura Superficial A pele é formada por duas camadas distintas: a epiderme (mais externa) e a derme, que nos herbívoros abrange os folículos pilosos, glândulas sudoríparas, glândulas sebáceas e o músculo eretor do pelo (Dellman e Brown, 1982). A pele protege o organismo do calor e do frio e a temperatura superficial depende das variáveis climáticas e das condições fisiológicas (vascularização e sudorese), contribuindo para a manutenção da temperatura retal. Nos mamíferos, a pele representa uma via importante para a troca de calor entre a superfície do corpo e o ambiente. O fluxo sanguíneo para a pele é também bastante variável, modificando-se conforme a necessidade de regulação da temperatura. Assim, a temperatura superficial resulta do ajuste do fluxo sanguíneo da pele, que termina com a regulação do calor entre o núcleo da pele e do corpo (Habeeb et al., 1992). Alterações quantitativas dos componentes teciduais, celulares ou de organelas celulares frequentemente surgem em processos de adaptação, evolução ou patologias em um determinado organismo, o que torna necessário uma avaliação quantitativa destes componentes para que estes processos sejam bem entendidos (Roberts et al. 2000). Segundo Habeeb et al. (1992), o redirecionamento do fluxo sanguíneo e a vasodilatação facilitam a dissipação de calor por mecanismos não evaporativos (condução, convecção e radiação), reduzindo a temperatura superficial. Entretanto, a eficácia desses mecanismos depende do gradiente de temperatura entre o corpo do animal e o ambiente. O redirecionamento do fluxo sanguíneo para a superfície corporal, a vasodilatação e o aumento da temperatura da pele, facilitam a dissipação de calor por mecanismos não evaporativos. As diferenças de temperatura no centro do corpo do animal podem atingir até 0,5°C de um local para outro (Souza et al., 2005). No frio, ocorre vasoconstrição na pele e o fluxo sanguíneo para essa região é mínimo. Quando o animal tem necessidade de dissipar calor, como consequência de temperaturas ambientais altas ou aumento da produção de calor, o fluxo sanguíneo para a pele é enormemente aumentado e o gradiente térmico entre a superfície do corpo e o meio decresce, dificultando a dissipação de calor, isto faz com que o animal lance mão de mecanismos evaporativos predominantes como a sudorese e a respiração, 15 intensificando assim a frequência respiratória e, fazendo com que o animal dissipe calor (Cunningham, 2008). Nos ruminantes criados em regiões tropicais, o mecanismo de termólise considerado mais eficaz é o evaporativo, uma vez que nesses ambientes a temperatura do ar tende a ser próxima à da superfície cutânea, neutralizando as trocas térmicas por condução e convecção. Cerca de 1/3 da termólise evaporativa ocorre pelas vias respiratórias e 2/3 pela cutânea, portanto, a ocorrência de estresse térmico em caprinos, ovinos e bovinos pode ser diagnosticada com base no aumento da temperatura retal, frequência respiratória e taxa de sudação. Porém, é importante ressaltar que a termólise evaporativa em regiões de clima quente, como nas regiões semiáridas, poderá ser prejudicada tanto pelo excesso quanto pela falta de umidade (Silva, 2000). A temperatura superficial de um indivíduo em equilíbrio térmico é sempre mais baixa do que a temperatura do centro do corpo. À medida que a temperatura do ar se eleva, a sudorese se intensifica evitando, dessa forma, o acúmulo de calor no organismo, o que pode resultar em redução no desempenho animal (Ferreira et al., 2009). Em geral a temperatura da pele de caprinos varia conforme a estação do ano e hora do dia e, torna-se mais elevada com a elevação da temperatura ambiente. Portanto, a exposição de caprinos a temperaturas elevadas provoca aumento da dissipação de excesso de calor do corpo, a fim de equilibrar a excessiva carga de calor. A dissipação do excesso de calor do corpo ocorre por evaporação de água a partir do trato respiratório e da superfície da pele através do ofego e do suor. O estudo do comportamento adaptativo baseado em parâmetros fisiológicos indica que as raças locais possuem comportamento adaptativo diferente das raças exóticas, pois a faixa de tolerância da temperatura retal é alta e a modificação que ocorre na frequência respiratória e na frequência cardíaca é bem pequena comparativamente às exóticas. 16 Tabela 1. Temperatura retal (TR), frequência respiratória (TR), frequência cardíaca (FC) e temperatura superficial (TS) de caprinos em diferentes condições ambientais. Raça Temperatura do TR FR FC TS Referência ambiente (ºC) (mov./min.) (bat./min.) (ºC) Raças Nativas Parda Sertaneja 28,0ºC – 33,7ºC 39,3 33,9 74,4 31,4 Santos et al (2005) Azul 26,0ºC - 36,5ºC 38,9 31,7 69,4 - Rocha et al. (2006) SPRD 27,3ºC – 33,5ºC 39,0 22,3 98,6 34,4 Medeiros et al. (2007) Marota 27,0ºC – 34,8ºC 39,0 32,5 70,8 - Santos (2008) Canindé 25,3ºC – 28,4ºC 38,8 24,0 74,0 - Eloy et al. (2008) Graúna 19,9ºC – 33,1ºC 38,8 39,2 - 33,1 Leite et al. (2012) Moxotó 25,3ºC – 28,4ºC 38,7 20,0 75,7 - Lucena et al. (2013) Boer 28,0ºC – 31,8ºC 39,2 27,7 75,1 - Martins Junior et al. (2007) Anglo Nubiana 28,7ºC – 36,0ºC 39,4 34,4 89,2 - Martins Junior et al. (2007) Savana 21,5ºC – 29,5ºC 39,4 42,8 - 29,2 Silva et al. (2010) Saanen 20,8ºC – 32,9ºC 38,9 61,0 - 31,8 Souza et al. (2011) Anglo Nubiano x SPRD 32,8ºC – 35,7ºC 39,1 42,1 - 31,8 Silva et al. (2005) ½ Moxotó ½ SRD 22,0ºC – 35,0ºC 39,6 46,0 121,4 - Souza et al. (2005) Saanen x Boer 30,5ºC – 32,6ºC 38,5 47,3 77,5 32,0 Silva et al. (2011) Raças Exóticas Cruzamentos 17 2.3 Mecanismos Anatômicos A quantidade de radiação solar absorvida pela pelagem do animal é parcialmente determinada por tamanho, cor e condição do pelo. A parte invisível dos raios infravermelhos é completamente absorvida pelos animais independente da cor da pelagem, porém, a parte visível é absorvida pelos animais e é dependente da cor da pelagem. A propriedade de proteção do animal depende da morfologia, características da pele (cor, espessura, etc.) e do pelo (espessura do pelame, comprimento do pelo, diâmetro do pelo, ângulo de inclinação do pelo, entre outros), o que permite que o animal troque calor com o meio ambiente (Silva, 2000). Segundo Bernabucci et al. (2010), a densidade de glândulas sudoríparas e sua função, a densidade de pelos e espessura de comprimento do pelo, cor da pele, são fatores que afetam a eficácia da perda de calor por evaporação nos animais. Diferenças nas características anatômicas e morfológicas podem explicar parcialmente as diferenças de tolerância ao calor entre espécies e raças (Gaughan et al., 2009). Um aspecto importante da evolução da cor da capa dos animais é que as diferentes partes do corpo estão sujeitas à pressões seletivas diferentes. A hipótese principal para a cor da capa em mamíferos é explicada pela física e fisiologia, funções que estão envolvidas na regulação da temperatura do corpo, levando em conta também a cor do pelo ou da pele do animal (Walsberg, 1983). Animais de pelame escuro apresentam maior absorção e menor reflexão da radiação térmica, resultando em maior estresse de calor. Arruda e Pant (1984) estudaram caprinos de diferentes idades no Nordeste brasileiro e observaram que a cor da pelagem influenciou o processo de adaptação, pois os animais brancos apresentaram frequência respiratória significativamente inferior a de animais pretos. Utilizando modelos de Cena e Monteith (1975a), Maia et al. (2003) confirmaram que a quantidade de radiação transmitida através da capa de pelame depende não somente da cor mas, também em alto grau da sua estrutura física, principalmente do número de pelos por unidade de área. O diâmetro do pelo é outra característica muito importante, o qual permite compreender o comportamento dos animais submetidos a variações climáticas. Para que essa medida seja acurada, se faz necessário que a aferição ocorra ao longo de todo o eixo do pelo, pois o diâmetro do pelo tende a ser maior no centro e nas extremidades (Davis, 2010). 18 Muitas espécies de mamíferos apresentam mudanças sazonais na pelagem e, tendo como padrão a pelagem densa e fina que retém o ar quente para aquecer no inverno e pelagem menos densa na primavera e no verão que permita a circulação de ar e resfriamento evaporativo. As propriedades da pele e pelagem afetam a troca de calor, incluindo a cor, densidade, diâmetro, profundidade, transmissividade e absorção de calor também afetam a tolerância ao calor pelos animais (Bianchini et al., 2006). As características morfológicas do pelame também são importantes na regulação do calor corporal, influenciando diretamente as trocas de calor entre os animais e o ambiente sendo bons indicadores da adaptação dos animais ao seu habitat (Cena e Monteith, 1975b). Nos animais em geral, assim como nos caprinos, a estrutura do pelame é altamente dependente das condições ambientais. No semiárido, o pelo dos animais apresenta-se geralmente curto e grosso, permitindo que os animais suportem altas taxas de radiação ou umidade, em regiões áridas em geral, os caprinos possuem pelo comprido, fibra grossa e um sub-pelo sazonal de fibra curta e fina para proteger contra o frio extremo, o pelo liso, provavelmente, facilita a regulação da temperatura corporal em condições quente e úmida (Daramola e Adeloye, 2009). Em ambiente tropical, os animais possuem pelame de cor clara e pelos curtos, grossos e bem assentados, sob uma epiderme altamente pigmentada e suportam melhor as condições desse ambiente (Maia et al., 2005). Embora a reflexão seja maior em uma capa de coloração clara, para que essa vantagem seja efetiva, a epiderme deve ser pigmentada e os pelos, densamente distribuídos sobre ela, além disso, a penetração da luz na pele depende não só da cor, mas também da estrutura do pelame. Em animais de clima frio, as características morfológicas do pelame também são indicativas da condição de adaptação dos animais ao meio em que vivem. Uma maior espessura e comprimento do pelo dificultam a perda térmica do animal para o ambiente e isto faz com que os animais apresentem menor densidade de pelos. Essas características podem facilitar a movimentação do ar entre os pelos, promovendo maiores trocas conectivas e evaporativas. Quanto maior o número de fibras por unidade de área e, quanto mais grossas forem as fibras, maior será a quantidade de energia térmica conduzida através da capa. Ainda, quanto maior o diâmetro do pelo, maior será a condução molecular através dos pelos e, portanto, maior a capacidade térmica. Assim, pelames constituídos por pelos grossos devem ser mais vantajosos em ambientes quentes que aqueles formados por 19 pelos finos. No entanto, o acréscimo na transmissão térmica pelo pelame que pode ser atribuída à condução ao longo do pelo não é tão significativo, de modo que a convecção livre e a troca radiativa entre os pelos são os maiores responsáveis pela transferência de calor através do pelame na ausência de movimentação de ar. Quando a densidade de fios é baixa (poucos fios por área de superfície), o vento pode penetrar causando remoção do ar preso sobre a área e favorecendo a transferência térmica (Gebremedhin et al., 1997). Acharya et al. (1995) estudaram cabras adultas nativas na Índia com pelo curto e longo e verificaram que animais de pelo curto apresentaram maiores valores de temperatura retal, frequência respiratória, frequência cardíaca e temperatura superficial. Aiura et al. (2010) estudaram características do pelame de cabras Parda alpina e Saanen em ambiente tropical e observaram a presença de animais com pelame espesso, comprido, pouco denso, finos e bem assentados, características que podem ser indicativas de maior adaptação ao ambiente. A adversidade genética nas espécies de animais de produção é um elemento importante para realizar mudanças nas características fenotípicas de uma população. Essas características podem ser divididas em características de produção (quantidade e qualidade) e de fitness (adaptação, conformação, fertilidade e resistência a doenças). Isto porque a variação genética é a base para a seleção natural que facilita a adaptação da população ao ambiente com suas possíveis mudanças, bem como a base para a seleção artificial nas populações comerciais (Oldenbroek, 2007). A caracterização fenotípica das diferentes raças de animais domésticos baseia-se em geral em características morfológicas e produtivas, resultantes da interação genótipo x ambiente, de tal forma que as raças submetidas a condições ambientais específicas podem mudar seu genótipo (Mariante e Cavalcante, 2000). Do ponto de vista morfológico, as raças têm sido caracterizadas com base em caracteres etnológicos de origem qualitativa, como o tamanho de orelha, pelo longo, ausência ou presença de chifres, barba, brincos e cor de pelagem (Zepeda, 2000). A presença ou ausência de orelhas pequenas é determinada pelo gene ―EL‖ – Earlength ou orelhas pequenas, sendo o tamanho da orelha um caráter adaptativo, com função termorreguladora, devido ao elevado nível de vascularização, que favorece troca de calor por convecção (Zepeda, 2000). Nos caprinos de raças nativas, as orelhas são pequenas, refletindo a adaptação desses animais, pois tem facilidade de movimentação na caatinga, bem como maior sensibilidade auditiva para escapar dos predadores. 20 Machado et al. (2000) e Oliveira et al. (2004), em estudo comparativo de caprinos SPRD do Ceará com caprinos mediterrâneos europeus observaram que as orelhas dos animais brasileiros são maiores que dos animais europeus. A presença ou ausência de chifres é determinada por um gene, cujo alelo Ho +, em condições de homozigose recessiva, da origem ao aparecimento de chifres, enquanto que o Hop, que é dominante sobre o alelo Ho+, produz a ausência de chifres (Lauvergne, 1987). Esta é uma característica importante porque os caprinos das regiões semiáridas, na época de escassez de alimento, utilizam os chifres para retirar espinhos dos cactos para se alimentarem sendo uma característica adaptativa adquirida ao longo dos anos. O comprimento do pelo, por outro lado, é determinado pelo lócus HL com dois alelos (HLL determina pelo longo e HL+ determina o tipo curto). O pelo curto é dominante sobre o pelo longo, mas apresenta penetrância e expressividade incompletas (Rodero et al., 1996). Apesar dos diferentes níveis de penetrância e expressividade desse gene, tem sido encontrado predominância de pelos curtos nos caprinos de diferentes estados da região Nordeste do Brasil (Machado et al., 2000 e Oliveira et al., 2004). A presença ou ausência de brincos é determinada por um gene autossômico dominante (Wa), que possui dois Alelos Waw, que induz a presença de brincos e que é dominante sobre o recessivo Wa+ (Lauvergne, 1987). E a presença ou ausência de barba é determinada pelo locus Br, com os alelos Br b (barbado) e Br+(selvagem), que é um gene autossômico ligado ao sexo, dominante nos machos e recessivos nas fêmeas. O alelo Brb determina a presença de barba e o alelo Br + determina a sua ausência. O alelo Brb é dominante, nos machos e, nas fêmeas, o alelo dominante é o Br + (Rodero et al., 1996). Não se conhece função adaptativa dos brincos e da barba. 2.4 Mecanismos Eritrocitários Como é sensível às mudanças de temperatura, o sangue representa um indicador importante das respostas fisiológicas, de modo que as alterações quantitativas e morfológicas nas células sanguíneas são associadas ao estresse calórico, traduzidas por variações nos valores dos constituintes do eritrograma (eritrócitos, hematócrito e teor de hemoglobina no eritrócito). O eritrograma, parte do hemograma que avalia a série vermelha do sangue, é importante na detecção de alterações quantitativas e qualitativas das hemácias, além de ser bastante útil na determinação de diagnósticos, avaliação de prognósticos e da 21 eficiência terapêutica de diversas enfermidades que alteram o quadro eritrocitário (Delfino et al., 2012). Várias pesquisas têm sido realizadas para avaliar a influência dos fatores ambientais sobre o eritrograma dos animais. Estes trabalhos têm demonstrado que animais criados sob diferentes condições ambientais e de manejo podem apresentar evidentes variações nos constituintes do eritrograma, o que gera a necessidade de determiná-lo para cada raça (Burgel Junior et al., 2001). Os eritrócitos variam, em diâmetro e espessura, de acordo com a espécie e estado nutricional do animal, porém são capazes de sofrer modificações na forma, enquanto passam pelos leitos capilares. O pequeno eritrócito do caprino apresenta pouca biconcavicidade. Os caprinos possuem o menor número de hemácias por unidade de volume bem como as menores células em diâmetro e volume (Reece, 2006). Os eritrócitos são responsáveis por transportar o oxigênio por todo o organismo e, quanto maior o número de eritrócitos, maior será a capacidade de oxigenação dos tecidos (Swenson e Reece, 1996). No eritrócito, os gases se ligam à hemoglobina formando a oxiemoglobina (hemoglobina com oxigênio, encontrada no sangue arterial) e carboxiemoglobina (hemoglobina com gás carbônico, encontrada no sangue venoso). A capacidade de transporte de oxigênio é dada pela quantidade de hemoglobina, cuja concentração na célula é de, aproximadamente 33%, índice dado pela concentração de hemoglobina globular média (CHGM) (Garcia-Navarro, 2005). Durante o esforço físico, a liberação do oxigênio se processa de forma mais rápida, contribuindo para a elevação na taxa de consumo de oxigênio e, consequentemente, ocorre aumento do valor da hemoglobina. Além disso, a alimentação deficiente, que é observada em animais sob estresse térmico de longa duração, reduz o número de eritrócitos e teor de hemoglobina, resultando em diminuição dos glóbulos vermelhos na corrente sanguínea (Nunes et al., 2002). Os índices eritrocitários são determinados a partir dos eritrócitos e do volume de glóbulos aglomerados (VGA) bem como as concentrações de hemoglobina (Hb). Com essas informações também se obtêm os índices de volume globular médio (VGM), hemoglobina globular média (HGM) e a concentração de hemoglobina globular média (CHGM), os quais auxiliam no diagnóstico de várias anemias. O VGM fornece o tamanho médio da célula em micrômetros cúbicos. O HGM expressa o peso médio da hemoglobina presente nos eritrócitos e CHGM fornece a porcentagem média do VGM que a hemoglobina ocupa (Reece, 2006). 22 O hematócrito é o método pelo qual os componentes do sangue (células e plasma) são separados de acordo com a densidade ou gravidade específica por centrifugação (Swenson e Reece, 1996). Os componentes do hematócrito em ordem de maior densidade são a massa eritrocitária, os leucócitos e o plasma. Ao mesmo número de hemácias podem corresponder valores de hematócrito diferentes, conforme o estado de hidratação do animal. Desidratação e redução no volume plasmático geram valores mais elevados; hipervolemia e aumento no volume plasmático resultam em valores menores (Thrall, 2007). Alguns autores relatam que com o aumento da temperatura do ambiente o animal perde líquido através do aparelho respiratório o que contribui para redução do volume plasmático sanguíneo, levando a aumento na concentração do hematócrito (Souza et al., 2011). De acordo com Silva e Costa (1982), se o esforço físico for prolongado, ocorre uma desidratação; e com isto, perda de líquidos por processo evaporativo, resultando em aumento no hematócrito. O hematócrito pode diminuir pela ocorrência de anemias, hemólise, prenhez avançada e estresse térmico prolongado (Swenson e Reece, 1996). Na ausência de anemia, o hematócrito apresenta-se correlacionado com a quantidade de hemoglobina existente no sangue. O valor de 15% de hemoglobina no sangue corresponde a aproximadamente ao hematócrito de 45%. A razão aproximada é de 1:3 em relação ao hematócrito. Em função de mecanismos fisiológicos de adaptação, ocorrem alterações na quantidade de hemácias no sangue circulante bem como alterações na estrutura e função da hemoglobina (Reece, 2006). Vários fatores alteram o eritrograma: raça (Bezerra et al., 2008; Eloy et al., 2008; Aguiar, 2009; Abdelatif et al., 2009; Piccione et al., 2010; Bhat et al., 2011), estado fisiológico (Iriandam, 2007), estação do ano (Al-Elissa et al., 2012), temperatura (Souza et al., 2008; Souza et al., 2011; Aguiar, 2009;). Além destes, o sistema sanguíneo é sensível às mudanças de temperatura e se constitui em um importante indicador das respostas fisiológicas a agentes estressores. Alterações quantitativas e morfológicas nas células sanguíneas são associadas ao estresse calórico, traduzidas por variações nos valores do hematócrito, conteúdo de eritrócitos e teor de hemoglobina no eritrócito e isto pode ser verificado nos resultados de pesquisas listados na Tabela 2. 23 Tabela 2. Valores de eritrócitos (Er), hematócrito (Ht), hemoglobina (Hb), volume globular médio (VGM), hemoglobina globular média (HGM) e concentração de hemoglobina globular média (CHGM) de caprinos de diferentes raças Espécie Ambiente /Raça Caprina Er Ht Hb VGM HGM CHGM Referência (106/ml) (%) (g/dl) (f/l) (p/g) (%) 8,0 -18,0 19,0-38,0 8,0-14,0 15,0-30,0 5,0-7,4 35,0-42,0 Jain (1996) 8,6-20,0 18,0-38,0 6,0-13,0 10,0-28,0 - 25,0-47,0 Kaneko et al. (2008) Canindé 28ºC 11,5 25,5 8,35 21,5 7,3 32,4 Eloy et al. (2008) Moxotó 25,3ºC-28,1ºC 11,4 28,2 9,1 25,5 8,1 32,2 Aguiar (2009) Moxotó 25,6ºC-28,4ºC 10,4 26,7 9,2 25,9 8,9 34,4 Aguiar (2009) Canindé - 15,3 34,6 10,1 24,0 7,0 29,3 Luz et al. (2010) Canindé - 14,6 33,9 10,9 26,9 - 32,2 Oliveira et al. (2011) Saanen 20,8ºC-32,9ºC 11,9 10,3 29,5 24,7 8,7 35,0 Souza et al. (2011) 25,1ºC - 28,1 9,8 21,9 7,7 35,1 Souza et al. (2008) Nubian 8,2ºC-22,5ºC 11,3 27,8 8,9 24,4 7,8 32,1 Abdelatif et al. (2009) Girgentana 8,1ºC-30,9ºC 15,3 23,9 9,9 15,7 6,5 42,8 Piccione et al. (2010) - 11,4 28,0 11,0 - - 33,3 Bhat et al. (2011) ½ Moxotó ½ SRD Kashimir 24 2.5 Mecanismos Bioquímicos Sanguíneos Dentre os mecanismos sanguíneos mais comumente avaliados no perfil bioquímico de um animal, a glicose e o colesterol representam o metabolismo energético; a uréia, a hemoglobina, a albumina, a globulina e a proteínas total estão relacionadas ao metabolismo protéico; o magnésio determina o metabolismo mineral. A atividade das enzimas aspartato aminotransferase (AST), gama glutamiltransferse (GGT) e alanina aminotransferase (ALT) é importante na avaliação de distúrbios metabólitos, funcionamento hepático, alterações ósseas e na adaptação dos animais às adversidades climáticas (Gonzalez e Silva, 2006). O carboidrato característico do sangue é a glicose, a qual é considerada o mais importante metabólito usado como combustível para a oxidação respiratória, porém a dependência dos diferentes tecidos em relação à glicose sanguínea circulante varia muito, sendo os eritrócitos e o cérebro adulto criticamente dependente. A manutenção das concentrações estáveis de glicose no sangue envolve mecanismo finamente regulado, no qual o fígado, tecidos extra-hepáticos e vários hormônios, como a insulina, glucagon, adrenalina, glicocorticóides e os hormônios da tireóide desempenham papel regulador fundamental (Reece, 2006). Durante o estresse térmico, uma das principais funções dos glicocorticóides é favorecer o catabolismo protéico, convertendo a proteína em aminoácidos para apoiar a gliconeogênese. O nível de glicose indica também falhas na homeostase (Sejian et al., 2010a). A diminuição da glicose plasmática pode também ocorrer devido à diluição do sangue ou devido ao aumento da utilização de glicose plasmática para produzir mais energia para uma maior despesa necessária na alta atividade muscular (Rasooli et al., 2004). Os lipídios encontrados no plasma sanguíneo são divididos em três grandes grupos: colesterol, fosfolipídios e triglicerídeos. Quando ocorrem falhas nos requerimentos energéticos da glicose, os triglicerídeos são mobilizados para servir como fonte de energia (Payne e Payne, 1987). O colesterol constitui o lipídio encontrado em maior quantidade nas membranas celulares e é produzido em quase todas as células do corpo, principalmente no córtex da adrenal, ovários e epitélio intestinal. É precursor de hormônios esteróides (como estrogênio) e dos ácidos biliares. O colesterol é eliminado na forma de ácidos biliares e o aumento da sua concentração no plasma pode estar associado com obstrução biliar extra-hepática, fibrose hepática e hiperplasia de ductos 25 biliares. Além de ser excretado na bile, o colesterol pode ser eliminado na urina na forma de hormônios esteróides (Ribeiro, 2001). O estresse térmico tem maior efeito sobre a concentração de colesterol total do que o estresse nutricional, o que pode ser devido ao aumento da utilização de ácidos graxos para a produção de energia, como uma consequência da diminuição de concentração de glicose em animais estressados termicamente. Entretanto, pouca atenção tem sido dada ao estudo dos possíveis efeitos da temperatura ambiente efetiva elevada, nos climas tropicais e subtropicais, sobre as concentrações séricas de colesterol. Além do estresse térmico, fatores como número de dias após o parto, número de lactações, idade, nível de produção leiteira e estação do ano podem acarretar alterações nas concentrações plasmáticas de colesterol (Rasooli et al., 2004). As proteínas plasmáticas são compostas pela albumina e globulina e a proporção normal entre albumina e globulina em todas as espécies deve ser de 1:1 (Duncan e Prasse, 2003). Existe correlação negativa entre a proteína do plasma e aumento da temperatura ambiental. O significado biológico da redução da proteína com o estresse térmico deve-se ao fato de que ela apóia a neoglicogênese hepática através da ação dos glicocorticóides, aumentando os níveis de glicose para que o animal possa lidar com o estresse térmico (Sejian et al., 2008). A albumina funciona regulando e mantendo a pressão coloidal osmótica do sangue e como importante transportador de muitas substâncias, incluindo ácidos graxos livres, ácidos biliares, bilirrubina, cátions, microelementos e muitos fármacos. A albumina plasmática, juntamente com o bicarbonato e fosfato, são os principais tampões do fluido extracelular (Reece, 2006). A albumina é sintetizada nas células hepáticas e suas principais funções relacionam-se ao transporte de bilirrubina, magnésio e cálcio. Para detectar mudanças significativas na concentração da albumina em ruminantes, fazse necessário período mínimo de um mês, devido à baixa velocidade de síntese e degradação desta proteína (Gonzalez e Scheffer, 2002). Al-Elissa et al. (2012) trabalharam com caprinos machos da raça Nubian Ibex (Capra Nubiana) na Arábia Saudita e observaram maior concentração de glicose e proteína total no verão, o que pode ser associado à alteração na concentração plasmática do sangue. A concentração de albumina foi maior no período chuvoso em comparação com o inverno e verão que apresentaram valores estatisticamente semelhantes. Este achado é compatível com o papel da albumina na manutenção da pressão osmótica do plasma e o transporte de proteínas no sangue. Suntorn et al. (2009) também relataram 26 em seus estudos redução na albumina em cabras durante o verão. A diferença na albumina pode ser devido a vários fatores como adaptação fisiológica e genética. Abdelatif et al. (2009) relataram maior nível de globulina no plasma durante o periodo chuvoso, com diferenças significativas para o inverno e o verão. Isto pode sugerir que os caprinos são mais adaptados ao ambiente árido de modo que a imunidade é potencializada. A creatinina é uma substância presente no músculo que está envolvida no metabolismo energético. O catabolismo da creatinina é lento e constante e, essa taxa é diretamente proporcional à massa muscular do animal. De fato, há influxo constante de creatinina para o plasma que não é afetado por qualquer mudança na atividade muscular ou lesão muscular (Kerr, 2003). O magnésio é um importante mineral antienvelhecimento e é essencial para a absorção de cálcio e vitamina C e ajuda no metabolismo do fósforo, sódio e potássio. Em geral, o magnésio ajuda a converter o açúcar do sangue em energia e é necessário para um sistema nervoso eficaz e para o bom funcionamento dos músculos. Referido também como o mineral anti-estresse, o magnésio regula os batimentos cardíacos e os coágulos sanguíneos e, auxilia o organismo na produção e uso da insulina (Amorim e Tirapegui, 2008). Al-Elissa et al. (2012) trabalharam com caprinos machos da raça Nubian Ibex (Capra nubiana) na Arábia Saudita e observaram que o magnésio não apresentou diferença significativa nas estações estudadas, corroborando Sandabe e Chaudhary (2000). O estudo do comportamento adaptativo baseado em parâmetros bioquímicos sanguíneos exige a correta interpretação dos perfis metabólitos. A interpretação do perfil bioquímico é complexa, devido tanto a mecanismos que controlam o nível sanguíneo de vários metabólitos como devido a grande variação desses níveis em função de fatores como raça, idade, estado fisiológico, estresse, dieta, nível de produção leiteira, manejo, clima e estado fisiológico (Gomide et al., 2004). Apesar dos muitos trabalhos já realizados sobre o assunto (Tabela 3), para a correta interpretação dos perfis metabólitos há necessidade de valores de referência apropriados para cada população particular e região (Wittwer, 2000). 27 Tabela 3 Parâmetros bioquímicos sanguíneos para caprinos de diferentes raças no Brasil e outros países. Espécie/ Raça Ambiente GLI COL TRI CRE PROT ALB GLB (mg/dl) (mg/dl) (mg/dl) (mg/dl) (g/dl) (g/dl) (g/dl) Caprina 50-75 80-130 - 1,0-1,8 6,0-7,5 2,7-3,9 2,7-4,1 SRD 48,3 91,7 28,3 - - - - AST ALT Mg+2 (U/L) (U/L) (mg/dl) - 20-56 24-83 2,8-3,6 Kaneko et al. (2008) - - - - Araujo e Silva et al. A/G Referências (2008) Canindé 25,3ºC-28,4ºC - - - - 7,2 3,8 3,4 - - - - Aguiar (2009) Moxotó 25,3ºC-28,4ºC - - - - 6,8 3,7 3,0 - - - - Aguiar (2009) 54,3 110,7 16,8 - 6,9 2,9 3,9 0,78 37,4 92,8 1,8 Mundim et al. (2007) - - - 0,72 7,2 3,2 - 0,8 40,6 78,2 1,7 Piccione et al. (2010) Saanen Girgentana 8,1ºC-30,9ºC Sahel - 45,7 82,0 - 0,9 6,4 - - - 53,3 28,7 - Waziri et al (2010) Nubian ibex - 125,2 - - - 10,4 4,8 3,6 - - - 3,0 Al-Elisa et al. (2012) Glicose (GLI), colestero (COL), triglicérides (TRI), proteína total (PROT), albumina (ALB), globulina (GLB), relação A/G, aspartato aminotransferase (AST), alanina aminotransferase (AST), +2 magnésio (Mg ) 28 2.6 Mecanismos Hormonais 2.6.1 Hormônios da Tireóide A glândula tireóide é um dos órgãos mais sensíveis à variação do calor e seus hormônios (triiodotironina (T4) e tiroxina (T3)) são importantes moduladores de processos metabólicos (Todini et al., 2007). A adequada função da tireóide e a atividade dos hormônios desta glândula é crucial para a manutenção do desempenho produtivo nos animais domésticos. O nível dos hormônios tireoidianos no sangue pode ser considerado indicador do estado metabólico, nutricional e adaptativo dos animais. O aporte de iodo na dieta é fundamental para o normal funcionamento da glândula tireóide e formação de T4 e T3 (Helal et al., 2010). Os hormônios da tireóide agem em todos os tecidos do corpo e, seu principal efeito é aumentar a atividade metabólica da maioria dos tecidos, aumentando a taxa de processos vitais, tais como o consumo de O2 e a produção de calor nas células do corpo. Os efeitos globais são o aumento da taxa de metabolismo basal, disponibilizando mais glicose para as células, estimulando a síntese de proteínas, aumentando o metabolismo lipídico e estimulando as funções cardíacas e neurais (Todini, 2007). Os hormônios da tireóide também agem sobre as glândulas endócrinas, aumentando a secreção da maioria delas e das necessidades de hormônios pelos tecidos. Estes hormônios parecem atuar indiretamente pelo incremento geral na taxa metabólica através do aumento dos efeitos provocados por outros hormônios. Sobre o sistema cardiovascular, há o aumento do fluxo sanguíneo e da frequência cardíaca. No aparelho respiratório, induzem o aumento da frequência respiratória (Greco e Stabenfeld, 1999). Para compreender a relação entre estresse térmico e metabolismo é extremamente importante estudar as variações nas concentrações dos hormônios tireoidianos. O mecanismo hipotalâmico atua na regulação secretora da tireóide quando as condições do ambiente se modificam. Assim, o calor deprime e o frio estimula a atividade da glândula (Mies Filho, 1987). A intensidade dos efeitos negativos das altas temperaturas ambientais depende da eficiência dos mecanismos termorreguladores dos animais. As glândulas adrenais e a tireóide desempenham importantes funções nesse mecanismo de adaptação. Animais bem adaptados respondem rapidamente a mudanças ambientais proporcionando os ajustes fisiológicos necessários (Uribe-Velasquez et al., 1998). Os hormônios da tireóide são importantes no controle da produção de calor em animais homeotérmicos e, o estresse causado pelo calor faz com que o organismo animal reduza a concentração 29 dos hormônios tireoidianos para diminuir a taxa de calor metabólico. A queda na secreção de tiroxina, sob exposição às altas temperaturas, relaciona-se com a necessidade de diminuição da termogênese, como passo importante para a redução do estresse térmico (Coelho et al., 2008). A tireóide produz T4 (com meia-vida longa e menos ativa) em maior quantidade e, T3 (com meia-vida curta e mais ativa) que são reguladoras do metabolismo intermediário. O T4 assegura cerca de 2/3 da ação metabólica, por enquanto o restante 1/3 é exercido pelo T3. O ritmo da secreção tireoidiana é controlado por um mecanismo específico de feedback, que envolve o hipotálamo e a hipófise. Assim, a secreção e liberação de T4 pela tireóide é regulada pela hipófise através do TSH (Barra et al., 2004). Estes hormônios são diferentes dos produzidos pela maioria das glândulas endócrinas, pois não possuem função altamente localizada, sendo que a maior parte dos tecidos possuem receptores para os hormônios tireoidianos (Guyton e Hall, 2011). Pesquisas realizadas com caprinos tem indicado relação inversa entre as concentrações de hormônios tireoidianos e a temperatura do ar. O estresse calórico provoca algumas alterações nas concentrações plasmáticas dos hormônios tireoidianos em mamíferos (Starling et al., 2005). Por outro lado, Uribe-Velasquez et al. (1998), em estudo com cabras alpinas adultas, não observaram qualquer alteração dos perfis plasmáticos desses hormônios decorrente do estresse calórico. Bhattacharyya (1980) e Baccari et al. (1996) não encontraram diferenças entre as concentrações plasmáticas de tiroxina em cabras leiteiras, quando submetidas a estresse de 38,4°C em câmara bioclimática. A variação dos valores observados na literatura deve-se principalmente às diferenças dos procedimentos adotados para provocar estresse calórico e a frequência de coleta de amostras de sangue para dosagens hormonais. Estudos com caprinos da raça Saanen indicaram que o estresse térmico foi suficiente para provocar alterações nas concentrações plasmáticas de T3 nos machos, mas não na raça Alpina, demonstrando que os machos da Saanen são menos tolerantes à elevação da temperatura ambiente que os da raça Alpina (Coelho et al., 2008). Helal et al. (2010) observaram hipotiroidismo em cabras Balady e Damascus criadas no nordeste do Egito, decorrente da redução na concentração de T3 e T4 induzida por estresse térmico. Salles (2010) trabalhou com reprodutores Saanen criados intensivamente em clima tropical e também não verificaram variações nas concentrações de T4 em diferentes épocas do ano. No entanto, observou-se diminuição do T3 no período do ano de maior desconforto térmico, quando o índice de temperatura e umidade foi igual a 86. 30 Coelho et al. (2008) observaram caprinos sob estresse térmico em câmaras bioclimáticas no início do tratamento e perceberam que estes reduziram as concentrações médias dos hormônios tireoidianos. Do terceiro ao quinto dia de tratamento os níveis hormonais foram semelhantes aqueles de animais termoneutros, sugerindo uma adaptação dos animais às condições ambientais. Segundo esse autor, as concentrações séricas de T3 geralmente diminuem com o estresse térmico, afetadas pela elevada temperatura ambiente, o que justifica a correlação negativa entre os hormônios da tireóide e temperatura ambiente (Starling et al., 2005). O tipo de resposta de cada indivíduo frente ao estresse depende não somente da magnitude e frequência do evento estressor, mas também da união de fatores ambientais e genéticos (Teixeira et al., 2008). Em fêmeas caprinas, foram obtidos resultados inversos para as concentrações de hormônios da tireóide e temperatura ambiente. Cabras prenhes da raça Dwarf e da raça Parda Alpina foram submetidas ao estresse térmico e não foi observado alterações nos perfis plasmáticos do T4 decorrentes do estresse térmico (Berbegier e Cabello, 1990). 2.6.2 Hormônio Cortisol Os primeiros hormônios usados para avaliar situações estressantes são os glicocorticóides (cortisol e corticosterona) e as catecolaminas (adrenalina e noradrenalina). A secreção de glicocorticóides ocorre em resposta endócrina clássica ao estresse (Kannan et al. 2000). Selye (1936) descreveu a síndrome adaptativa geral, definindo estresse como resposta à exposição a agentes nocivos não específicos (estressores). Essa síndrome compreende uma fase de alerta (reação de luta e fuga, com ativação das glândulas adrenais); um estágio adaptativo de resistência, com aumento da secreção de glicocorticóides (alterações morfológica e plasticidade) e a fase de exaustão. Dos glicocorticóides de natural ocorrência no organismo, o cortisol é o mais potente. É um esteróide sintetizado pelas glândulas suprarrenais sob influência do hormônio adrenocorticotrófico liberado na corrente sanguínea pela adenohipófise, sendo o produto final da ativação do eixo hipotalâmico-hipofisário-adrenal. O hormônio liberador de corticotropina é liberado do hipotálamo e vai até a hipófise anterior, onde provoca a liberação do hormônio adrenocorticotrófico, que atua no córtex adrenal para produzir o cortisol (Dwyer e Lawrence, 2008). Os níveis de cortisol aumentam durante a fase inicial do ciclo ativo dos animais, obedecendo ao ritmo circadiano e também durante o estresse. É considerado um dos principais hormônios envolvidos na resposta 31 ao estresse, o qual tem como principal função favorecer o metabolismo protéico para converter a proteína em aminoácidos, apoiando a neoglicogênese (Sejian et al., 2010b). Os hormônios secretados a partir do eixo hipotalâmico-hipofisário-adrenal têm efeito amplo e duradouro sobre o corpo. Praticamente todas as funções biológicas que são afetadas pelo estresse, incluindo a capacidade imunológica, reprodução, metabolismo e o comportamento, são reguladas por esses hormônios. Essas respostas endócrinas objetivam melhorar a aptidão do indivíduo frente ao estresse (Meij e Mol, 2008). O aumento do cortisol não pode ser visto apenas como uma resposta negativa ao organismo, pois este é essencial à vida e é responsável por vários processos. Também atua amplificando o efeito de outros hormônios no organismo. A liberação mínima de cortisol tem como objetivo manter a homeostase, conservando o equilíbrio interno do organismo, o que varia de indivíduo para indivíduo (Sejian et al., 2008). A liberação do cortisol, como resposta ao estresse, tem ações bem conhecidas sobre o metabolismo de carboidratos. O efeito do cortisol é oposto ao da insulina, produzindo o que é conhecido como resistência à insulina. Esta resistência se dá através da diminuição do efeito supressor que a insulina provoca na produção hepática de glicose (favorecendo a gliconeogênese) e prejudica a entrada de glicose para o interior das células, que é mediada pela insulina. O efeito do estresse sobre o metabolismo de lipídios é bem mais complexo. O estímulo do sistema nervoso autônomo durante o estresse agudo provoca transformação dos triglicerídeos em ácidos graxos livres e glicerol. Os glicocorticóides interferem no balanço entre ácidos graxos e triglicerídeos, tanto no sentido da lipólise quanto na reesterificação (formação de triglicérides a partir de ácidos graxos). Na recuperação da resposta aguda ao estresse, os níveis elevados de glicocorticóides mantêm-se por mais tempo que os de catecolaminas. Dessa forma, acabam favorecendo a reesterificação com o armazenamento de triglicérides, mecanismos estes que representam uma forma do organismo recompor suas reservas de energia, indicando seu papel adaptativo (Zuardi, 2013). A secreção de cortisol é útil apesar da sua variabilidade e vida curta. O cortisol estimula ajustes fisiológicos que permitem ao animal tolerar o estresse causado por ambientes quentes. Como as situações ameaçadoras requerem uma ação vigorosa, as respostas anatômicas e endócrinas ao estresse são catabólicas, isto é, elas ajudam a 32 mobilizar reservas energéticas do organismo, influenciam no metabolismo de carboidratos, lipídios, eletrólitos e água (Silanikove, 2000b). Em todos os sistemas fisiológicos constata-se ritmicidade, principalmente circadiana. Nenhuma variável fisiológica se mantém estável e constante ao longo das 24 horas. Elas apresentam flutuação diária regular, filogeneticamente determinada, cuja finalidade é preparar o organismo antecipadamente para as alterações previsíveis da alternância do dia e da noite. A regulação da secreção de cortisol é de natureza pulsátil com ritmo circadiano de liberação. Menor secreção ocorre durante a noite, em torno da meia–noite e maiores secreções ocorrem pouco antes das 8h da manhã (que representa metade da secreção diária total do hormônio) (Melado e Meza-Herrera, 2002). A associação entre o estresse térmico e aumento na secreção do cortisol é pouco documentada em ruminantes. Altas temperaturas (fase aguda do estresse térmico) acarretam elevação da concentração sanguínea de cortisol, diminuindo a taxa de produção de calor metabólico (Sejian e Srivastava, 2010b). Kaushish et al. (1987) relataram aumento no nível de cortisol durante o estresse térmico significativo em caprinos, com níveis sanguíneos elevados após estresse térmico agudo, em comparação a animais que vivem em situação de estresse térmico crônico. Em contrapartida, estresse crônico severo pode resultar em períodos de altas concentrações de cortisol, diminuindo a aptidão individual por causar imunossupressão e atrofia dos tecidos de defesa do organismo. Além disso, reduz a energia disponível para o sistema imune, aumentando a suscetibilidade dos animais às doenças infecciosas (Al-Busaidi et al., 2008). Devido ao interesse nas consequências do estresse nos organismos e buscando compreender melhor as fases dessa resposta, surge o conceito de alostasia, que é um processo adaptativo que ativamente mantém a homeostasia do indivíduo através das mudanças, também consideradas mecanismos homeostáticos. Neste caso, o cérebro orquestra diferentes mecanismos, podendo ou não incorporar experiências prévias memoriais, antecipação e a reavaliação das necessidades fisiológicas, envolvendo em um primeiro momento os glicocorticóides, catecolaminas e citocinas (McEwen e Wingfield, 2003). Por ser um processo ativo, há gasto energético e esse custo foi denominado carga alostática, que se refere ao desgaste fisiológico gerado no organismo em resposta a estímulos estressores (McEwen, 1998). 33 3. CONCLUSÕES O estudo permitiu verificar que, independente da raça, o ambiente de criação e suas variáveis climáticas podem desencadear alterações fisiológicas, anatômicas, bioquímicas, hematológicas e hormonais que resultam em redução na produção para manutenção da homeotermia. Apesar dos caprinos serem considerados animais de rusticidade maior que outros ruminantes, pouco se conhece sobre os aspectos adaptativos destes animais. Percebe-se que as raças caprinas nativas possuem maior capacidade de manter a temperatura retal dentro do limite ideal com pequena variação da frequência respiratória e frequência cardíaca ao contrário do que ocorre com raças exóticas. O conhecimento dos mecanismos adaptativos usados pelas raças locais em ambientes com frio ou calor intenso é importante, pois permite minimizar as perdas que podem ocorrer com o impacto das mudanças climáticas, além de nortear futuros programas de conservação e melhoramento genético para essas raças. 34 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABDELATIF, M. A.; IBRAHIM, Y. M. and HASSAN, Y.Y. Seasonal variation in erythrocytic and leukocytic indices and serum proteins of female nubian goats. Shambat Sudan. Journal of Scientific Research, v. 4, n. 3, p.168 -174, 2009. ACHARYA, R. M.; GUPTA, U. D.; SEHGAL, J. P. et al. Coat characteristics of goats in relation to heat tolerance in the hot tropics. Small Ruminant Research, v. 18, p. 245-248. 1995. ANDERSON, B. E. 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Foram utilizados dados de temperatura do ar, temperatura do globo negro e umidade relativa do ar com o auxílio de uma estação meteorológica automática. Os parâmetros fisiológicos utilizados foram temperatura retal, frequência respiratória, frequência cardíaca, temperatura superficial e gradiente térmico TR-TS. Os parâmetros anatômicos utilizados foram o diâmetro e o comprimento do pelo. Utilizaram-se também parâmetros hematológicos (eritrócitos, hematócrito e volume globular médio), parâmetros bioquímicos sanguíneos (glicose, colesterol, triglicérides, creatinina, uréia, proteína total, albumina, globulina, relação albumina e globulina, gama glutamiltransferase e aspartato aminotransferase) e parâmetros hormonais (tiroxina, triidotironina e cortisol). Houve efeito significativo de período e turno sobre todas as variáveis ambientais. As variáveis fisiológicas, temperatura retal, frequência respiratória, frequência cardíaca e temperatura superficial apresentaram valor mais elevado no turno da tarde em ambas as estações. Para os parâmetros anatômicos observou-se efeito significativo de estação e de cor do pelo. Já os parâmetros bioquímicos e hormonais foram afetados significativamente pelo período, ao contrário dos parâmetros hematológicos que não foram afetados significativamente por esse efeito. Observou-se que os animais mantiveram sua temperatura retal dentro do limite recomendado para a espécie, mantendo a homeotermia, o que é indicativo de que utilizaram outros mecanismos adaptativos para se ajustarem as modificações climáticas nos diferentes períodos do ano. Palavras-chave: estresse, homeotermia, hormônios, tolerância ao calor 47 Anatomophisiological and endocrine profile of the Garfagnina Italian breed goat ABSTRACT The aim of this research was to characterize the adaptive profile of Garfagnina, a Italian breed goat, raised on its center of origin (Bagni di Lucca, Tuscany, Italy) based on physiological, morphological, biochemical, hematological, hormonal and anatomical traits during winter and summer seasons. Sixty females were used in the winter and fifty in the summer season, all adult and lactating. Data of air temperature, black globe temperature and relative humidity with the aid of an automatic weather station were collected. Physiological parameters used were rectal temperature, respiratory rate, heart rate, surface temperature and thermal gradient RT-ST. The anatomical parameters used were the hair diameter and hair length. It was also used hematological parameters (erythrocyte, hematocrit and mean corpuscular volume), blood biochemical parameters (glucose, cholesterol, triglycerides, creatinine, urease, total protein, albumin, globulin, gamma glutamyl transferase and aspartate aminotransferase) and hormonal parameters (thyroxine, Triiodothyronine and cortisol). There was no significant effect of period and season on all environmental studied variables. Physiological variables, rectal temperature, respiratory rate, heart rate and skin temperature showed higher value in the afternoon in both seasons. And these physiological variables showed higher mean value in summer. For anatomical parameters it was observed significant effect of season and coat color. Already the biochemical and hormonal parameters was no significant effect of season. Hematological parameters were not significantly affected by day time and season. It was observed that the animals maintained their TR within the limit for the species, keeping the homeothermy, which is indicative that other suitable mechanisms used to adjust the climate changes in different seasons of the year. Keywords: stress, homeothermy, hormones, heat tolerance 48 1. INTRODUÇÃO As alterações climáticas afetam os animais diretamente devido ao estresse fisiológico sofrido na tentativa de controle da termorregulação. Portanto, a descrição do ambiente de produção é importante para a compreensão dos processos adaptativos das raças em situações diversas de ambiente, visto que cada raça apresenta características adaptativas próprias. As raças locais foram submetidas a séculos de seleção natural, o que resultou em animais com elevado valor adaptativo as diferentes condições de ambiente. Nesse processo, adquiriram características adaptativas únicas como resistência a doenças, tolerância ao calor e ao frio, o que permite que esses animais apresentem alta eficiência produtiva nesses ambientes (Devendra, 1990). O interesse em quantificar o estresse calórico bem como a forma apropriada para mensurar os limites fisiológicos da exposição dos animais ao estresse tem sido motivo de vários estudos ao longo do tempo, visando contribuir para otimizar a resposta do animal (Ferreira et al., 2009). A interação entre o animal e o ambiente deve ser levada em consideração quando se busca maior eficiência na exploração pecuária, pois o conhecimento das variáveis climáticas, sua ação sobre as respostas fisiológicas, hematológicas, bioquímicas sanguíneas, hormonais e genéticas são preponderantes para adequação do sistema de produção aos objetivos da atividade pecuária (Neiva et al., 2004). Assim, temperaturas elevadas associadas a altas umidades do ar e radiação solar, são os principais elementos climáticos estressantes que causam diminuição na taxa de crescimento, na produção e falhas na reprodução. Fisiologicamente, os animais reagem diferentemente às mudanças drásticas de temperatura, alterando a sua fisiologia e comportamento. Estas alterações envolvem os parâmetros fisiológicos (temperatura retal, frequência cardíaca, frequência respiratória e temperatura superficial), o eritrograma, parâmetros bioquímicos do sangue, nível de cortisol e dos hormônios da tireóide e parâmetros anatômicos. Estes parâmetros podem sofrer variações importantes dentro da mesma espécie devido a fatores como regime alimentar, idade, estado fisiológico, raça, estresse, nível de produção, manejo e clima. O objetivo desta pesquisa foi identificar os mecanismos adaptativos, quanto aos aspectos fisiológicos, morfológicos, anatômicos, hematológicos, bioquímicos e hormonais que as cabras da raça Garfagnina utilizam. 49 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1 Local do experimento O estudo foi conduzido no período de inverno e verão em dois turnos do dia (manhã e tarde) em uma propriedade da localidade de Lucca (Figura 1) (Bagni di Lucca) localizada na Reserva Florestal Orrido di Botri, na Itália, a 44’01° de latitude e 10’58° de longitude, e a uma altitude de 634m. O clima da região segundo a classificação de Thornthwaite é do tipo clima A com temperatura média anual variando de 2 °C a 29,0 ºC, umidade relativa média de 68% e precipitação variando de 1851 a 2050 mm anuais. Figura 1. Localização de Orrido di Botri, Itália. 2.2 Animais experimentais Foram selecionadas aleatoriamente fêmeas em lactação da raça Garfagnina. Os dados de 50 animais foram coletados em dois dias no inverno, sendo um dia no mês de março e outro dia no mês de maio. No verão foram coletados os dados dos mesmo 50 animais em dois dias alternados no mês de julho. Nos turnos manhã com início às 9:00 horas e tarde às 14:00 horas. A idade dos animais foi obtida indiretamente pela análise da cronometria dentária devido à ausência de escrituração zootécnica na propriedade, sendo todas classificadas como adultas (2 a 5 anos de idade). 50 Todos os animais foram avaliados através do FAMACHA (coloração da conjuntiva), presença de ectoparasitas, linfadenites ou algum outro tipo de problema na pele. Antes dos animais irem a campo faziam-se estas observações e coletavam-se as medidas fisiológicas e o pelo. No turno da tarde, estes animais eram novamente contidos no mesmo ambiente e coletavam-se novamente as medidas fisiológicas e o sangue. No período do inverno, ao retornar às instalações no final do dia, os animais recebiam suplemento a base de feno ou grão, dependendo da disponibilidade, além do uso da flora local, que os animais tinham acesso dentro da propriedade, a qual está localizada numa reserva de rica flora. 2.3 Dados climatológicos e Índices de Conforto Térmico Nos dias de coleta dos dados fisiológicos, utilizou-se estação meteorológica automatizada, instalada no ambiente onde os animais passavam o dia e, neste mesmo ambiente eram realizadas as medidas fisiológicas. De 15 em 15 segundos eram coletados os dados temperatura do bulbo seco (Tbs), temperatura de bulbo úmido (Tbu), temperatura do globo negro (Tgn) e umidade relativa do ar (UR) com o auxílio de uma estação meteorológica automática. Ao final do experimento os dados eram processados e armazenados numa planilha adequada para esse fim. A velocidade do vento (Vv) foi mensurada com o auxílio de um anemômetro digital, sendo os dados tomados a cada 2 horas. 2.3.1 Índice de temperatura de globo negro e umidade (ITGU) O valor do ITGU foi determinado através dos dados climatológicos temperatura de globo negro (Tgn) e temperatura do ponto de orvalho (Tpo), de acordo com a equação sugerida por Buffington et al. (1981) expressa da seguinte maneira: Onde: ITGU = Índice de temperatura globo negro e umidade, Tgn = temperatura do globo negro, °C. Tpo = Temperatura do ponto de orvalho, °C. 2.3.2 Carga térmica radiante (CTR) A CTR foi calculada dentro dos apriscos pela equação descrita por Esmay (1969). 51 Onde: CTR = Carga térmica radiante, W.m-2 σ = Constante de Stefan-Boltzman, 5,67.10-8 Wm-2 .K-1; TRM = Temperatura radiante média, K. A temperatura radiante média (TRM) é a temperatura de uma circunvizinhança, considerada uniformemente negra capaz de eliminar o efeito da reflexão, com a qual o corpo (globo negro) troca tanta quantidade de energia quanto à do ambiente considerado (Bond e Kelly, 1954). A TRM pode ser obtida pela equação: Onde: TRM = temperatura radiante, em K; V = Velocidade do vento, em m/s-1; Tbs = Temperatura do bulbo seco, em K; Tgn = Temperatura do globo negro, em K. 2.4 Mecanismos Anatômicos 2.4.1 Caracteres morfológicos Na primeira coleta foi feita a caracterização fenotípica de todos os animais cujas informações foram compiladas em planilhas adequadas. Cada animal foi avaliado quanto à presença ou ausência de orelhas reduzidas, chifres, brincos, pelo longo, barba, cor ruão (presença das cores branco, preto e vermelho na mesma pelagem), eumelanina marrom e padrão de pigmentação eumelânica. 2.4.2 Amostragem do pelo dos animais Foi coletada uma amostra de pelo de cada animal nos dois períodos, sendo esta coleta feita manualmente na região do costado, um pouco abaixo da coluna vertebral, mesma região onde foi realizada a temperatura superficial. Os pelos foram identificados e acondicionados em envelopes de papel para a determinação das características 52 morfológicas do pelame como o diâmetro dos pelos (DP), tomado com o auxílio de um micrômetro digital acoplado a um microscópio e comprimento do pelo (CP), para as quais foram usados os pelos mais longos de cada amostra, segundo metodologia descrita por Kassab (1964). 2.5 Mecanismos Fisiológicos 2.5.1 Temperatura retal (TR) A temperatura retal (TR) dos animais foi aferida no inverno e no verão, nos turnos manhã e tarde. Utilizou-se um termômetro clínico digital com escala de 32 a 43,9°C, o qual era introduzido no reto de cada animal, com o bulbo em contato com a mucosa, permanecendo no reto até que o termômetro emitisse um sinal sonoro, que era indicativo da estabilização da temperatura. 2.5.2 Frequência respiratória (FR) e Frequência Cardíaca (FC) A frequência respiratória (FR) e cardíaca (FC) foram mensuradas no inverno e no verão, nos dois turnos do dia (manhã e tarde) através da auscultação indireta das bulhas, com o auxílio de um estetoscópio flexível, ao nível da região laringo-traqueal, contando-se o número de movimentos e batimentos durante 20 segundos e, o resultado multiplicado por 3 para obtenção da frequência por minuto. 2.5.3 Temperatura superficial (TS) Utilizou-se um termômetro infravermelho digital para obtenção da temperatura superficial dos animais (TS), sendo as leituras realizadas nas duas estações (inverno e verão) e em dois turnos (manhã e tarde). Essa leitura foi realizada no costado dos animais, mesmo local de coleta dos pelos. Calculado o gradiente térmico: TR – TS. 2.6 Mecanismos eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais As amostras de sangue de cada animal foram coletadas no turno da tarde em ambos os períodos (inverno e verão), através de punção na veia jugular, após assepsia com álcool iodado, com mínimo de traumatismo. Nas coletas foram usadas agulhas de calibre 0,8x25mm e tubos à vácuo de 5ml contendo anticoagulante etileno diaminotetracetato de sódio (EDTA) a 10%. A contagem de eritrócitos (Er) foi realizada em câmara do tipo Neubauer modificada, através da diluição das células, utilizando-se uma pipeta semi-automática de 20 microlitros conforme preconizado por Vallada (1999). Para determinação do hematócrito (Ht) foi usada a técnica do microhematócrito por 15 minutos, conforme 53 descrito por Ayres et al. (2001), na qual se utilizaram tubos capilares homogêneos de 75 milímetros de comprimento por um milímetro de diâmetro. O índice hematimétrico absoluto: volume globular médio (VGM) foi obtido através da contagem do número de Er, Ht, segundo Ferreira Neto e Viana (1977). Para análise dos parâmetros bioquímicos sanguíneos e hormonais foi coletado 7 ml de sangue com agulhas de calibre 0,8x25mm, em tubos à vácuo com gel separador e com fluoreto de sódio, este sendo utilizado para análise de glicose. As amostras de sangue foram transportadas imediatamente em caixas isotérmicas ao laboratório da UNIFI, centrifugadas em uma centrífuga digital a 4°C, a 3000 rotações durante quinze minutos. O sobrenadante resultante da centrifugação foi separado em alíquotas de 1,5mL para dosagens bioquímicas, realizadas logo no dia seguinte após a coleta. Foram mensuradas as concentrações séricas de proteína total (PRT), pelo método colorimétrico biureto; albumina (ALB), pelo método colorimétrico bromocresol; glicose (GLI) e triglicérides (TRI), pelo método enzimático colorimétrico; colesterol (COL), pelo método enzimático CHOD-POD; ureia (URE), pelo método cinético enzimático; e creatinina (CRE), pelo método cinético Jaffe; Gamma Glutamil Transferase SL (GGT), pelo método cinético Szasz–Tris e aspartato aminotransferase (AST), pelo método cinético UV. Todos os procedimentos foram realizados utilizando kits laboratoriais de uso comercial (ASSEL S.r.l.) e as leituras foram feitas com aparelho para análises bioquímicas (VegaSys) com fotômetro de comprimento de onda múltiplo. As concentrações plasmáticas de cortisol, trioxina (T4) e triiodotironina (T3) foram analisadas em duplicatas mediante técnica ELISA, utilizando kits laboratoriais de uso comercial (INVITRO), desenvolvidos para avaliação quantitativa dos hormônios. Como estes hormônios têm padrão de secreção circadiano com pico alto no início da manhã, coletou-se o sangue no turno da tarde para entender como a raça Garfagnina utiliza os mecanismos adaptativos em altas temperaturas. 2.7 Análises estatísticas Os dados coletados foram analisados por meio do Statistical Analysis System pela aplicação dos procedimentos GLM (Análise de Variância), e teste de médias (T 5%) para as variáveis significativas. Foram utilizados os seguintes modelos matemáticos: 54 yijk = µ + Ei + Pj + eijk em que: yijk é a variável dependente; µ é a média geral; E i é o efeito fixo de período (i=verão, i=inverno), Pj é o efeito fixo de turno (j=manhã, j=tarde) e eijk é o erro aleatório, considerando média 0 e variância ơ 2. Entretanto, os parâmetros anatômicos do pelo e os parâmetros hematológicos, bioquímicos sanguíneos e hormonais foram analisados por um modelo semelhante ao anterior, mas que incluiu apenas o efeito fixo de período. Os parâmetros anatomofisiológicos do pelo foram analisados por um modelo tendo como variável independente a cor do pelame, cujo modelo é descrito a seguir: yij = µ + Ci + eij em que: yij é a variável dependente; µ é a média geral; C i é o efeito fixo da cor do pelo (i=marron, cinza e preto) e e ij é o erro. Foram estimadas as correlações de Pearson entre todas as variáveis, utilizandose o PROC CORR. As frequências das variáveis morfológicas de natureza qualitativa avaliada foram feitas pelo procedimento PROC FREQ do Statistical Analysis System (Versão 9.1). 55 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 Dados climatológicos e índices de conforto térmico Consta na tabela 1 as médias, valores máximo e mínimo por período e a média geral (µ) das variáveis: temperatura do ar (TA), umidade relativa (UR), Índice de temperatura do globo negro e umidade (ITGU) e carga térmica radiante (CTR) nas distintas estações. Maiores valores foram observados no verão, com exceção da UR, que é inversamente proporcional a TA. A temperatura média do ar (TA) foi maior no turno da tarde (p<0,01). A média da TA no verão foi de 29,5°C, com valor máximo de 38,0°C e mínimo de 21,0 °C, já no inverno a média da temperatura do ar foi 20,1°C com valor máximo de 28,9°C e mínimo de 9,4°C. Observou-se maiores amplitudes de temperatura entre os turnos do que entre as estações, a amplitude térmica no inverno foi de 10,6°C e no verão de 14,1°C, com a amplitude entre as estações de 9,4°C. Tabela 1. Variáveis ambientais temperatura do ar (TA), umidade relativa (UR), Índice de temperatura do globo negro e umidade (ITGU) e carga térmica radiante (CTR), em Bagni di Lucca, Itália. Período Inverno Verão Turno Manhã Máximo Mínimo Tarde Máximo Mínimo Média Manhã Máximo Mínimo Tarde Máximo Mínimo Média TA (°C) 14,8 21,0 9,4 25,4 28,9 17,7 20,1 22,4 24,8 21,1 36,5 38,0 34,1 29,5 UR (%) 50,1 83,0 19,0 23,0 50,5 13,7 36,5 50,3 61,5 43,0 16,9 21,6 13,4 33,6 Letras iguais na coluna não diferem entre si pelo teste t (p<0,01). Tgn (°C) 18,0 33,1 10,1 35,4 39,6 25,1 26,7 22,9 25,5 20,2 51,6 54,0 47,0 37,3 ITGU 60,5 74,8 53,0 77,1 81,2 68,8 68,8 68,0 70,8 65,5 95,5 97,4 90,5 81,8 CTR (w/m²) 447,6 646,6 345,0 682,8 728,8 589,2 565,2 456,9 494,0 432,8 902,0 938,6 801,7 679,5 56 Os valores de TA observados nas duas estações foram valores considerados entre a zona de conforto térmico, determinado para a espécie caprina que, de acordo com a classificação de Baêta e Souza (2010) estes valores estão entre 20 e 30°C, limitada pela temperatura critica inferior (TCI) de 16ºC e pela temperatura crítica superior (TCS) de 35ºC. A TA observada no turno da tarde do verão esteve fora da ZCT para a espécie, ou seja, acima da TCS estando sob estresse de calor e tendo que aumentar dissipação e reduzir a produção de calor para manter a homeotermia. Já no turno da manhã do inverno a TA esteve abaixo da TCI, estando o animal submetido a estresse por frio, assim ocorre aumento na produção e conservação do calor e diminuição da dissipação. Com relação à UR observou-se diferença significativa (p<0,01) entre os turnos do dia e os períodos do ano. Os valores médios foram maiores no turno da manhã devido aos altos valores de TA observados neste turno, os quais foram inversamente proporcionais a UR. De acordo com Baêta e Souza (2010) a UR exerce grande influência no bem-estar e na produtividade animal, principalmente quando os valores são elevados e associados a altas temperaturas. O valor de ITGU diferiu estatisticamente entre os períodos com maior valor sendo observado no verão. Estes valores não podem ser considerados perigosos para caprinos locais, uma vez que a TR se encontra dentro da normalidade, demonstrando não estar havendo estocagem de calor. Além disso, não se dispõe de valores referência de ITGU para caprinos. A CTR apresentou-se maior (p<0,01) no turno da tarde com valores de 683,0 Wm -2 e 902,0 Wm-2 para o inverno e verão, respectivamente. Houve diferença significativa entre os períodos com maior valor no verão. Este aumento no verão se deve ao fato de que, neste período, as temperaturas do ar e do globo negro são mais altas. Já a UR é mais baixa. O valor da CTR é mais alto no verão e, a quantidade de radiação solar absorvida pela pelagem do animal é parcialmente determinada pelo tamanho, diâmetro e cor do pelo. 3.2 Mecanismos anatomofisiológicos Na tabela 2, encontram-se as frequências das características fenotípicas morfológicas para cabras da raça Garfagnina. Observa-se homogeneidade quanto ao padrão morfológico dos animais, com maior predominância de animais de pelo longo (HLL), chifres (Ho+), barba (Brb), orelhas longas (EL+), pelagem preta (a) e marrom (b). 57 A característica brinco observou-se em 61% da população, não possui ligação com a adaptação dos animais. A presença de chifre é uma característica marcante na raça, como verificado neste trabalho e por Martini et al. (2010), é uma característica adaptativa importante, pois os animais nativos criados em sistema extensivo utilizam os chifres para facilitar a locomoção entre as plantas e também auxiliando para alimentarse de troncos e frutos espinhosos. As populações europeias de caprinos possuem o alelo EL+ que define presença de orelha longa, ou seja, não rudimentar. Sendo este um importante mecanismo de dissipação de calor por ser uma região muito vascularizada. Observou-se que todos os animais apresentaram barba, esta característica esta relacionada com o tamanho do pelo, sendo mais observado em animais de pelo longo, (Zepeda, 2000). Os animais de clima temperado possuem pelo longo comparado aos animais de clima tropical. O pelo longo (HL+) é uma característica comum nos caprinos locais da Itália e estão relacionadas a questões de adaptação às baixas temperaturas que ocorrem em algumas regiões. Acharya et al. (1995) estudaram cabras adultas nativas na Índia e observaram dois tipos de pelo, um curto onde os animais com este tipo apresentaram maiores valores para os parâmetros fisiológicos do que os animais de pelo longo. Tabela 2. Distribuição de frequência das características morfológicas em fêmeas caprinas da raça Garfagnina Fenótipos Presença de brinco Presença de chifre Presença de orelhas longas Presença de barba Presença de pelo longo Presença de pelagem preta Presença de pelagem marron Alelos Waw Ho+ EL+ Br HLL a b Número 57 93 93 93 93 93 93 Frequência 0,61 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 Os animais apresentam pelo preto e marrom fato também verificado por Martini et al. (2010) nesta mesma raça. No entanto, percebeu-se que a coloração do pelo dos animais tornam-se mais claras no verão e, de acordo com Walsberg (1983), a coloração do pelo está envolvida na regulação da temperatura do corpo. 58 Além do comprimento, a análise do diâmetro auxilia na definição do perfil adaptativo dos animais, pois estes podem variar ao longo do ano. Na Tabela 3, encontram-se os valores médios, máximo e mínimo para comprimento e diâmetro do pelo em fêmeas caprinas da raça Garfagnina. As variáveis de pelo auxiliam na homeostase dos animais. Com a mudança sazonal do pelo, os animais conseguem manter a TR dentro do limite para a espécie. Observa-se que houve diferença significativa (p<0,01) dos parâmetros anatômicos do pelo entre as estações. No inverno o pelo apresenta-se maior e com diâmetro menor, com a finalidade de reter o ar quente para aquecer, no verão o pelo apresenta-se menor e com diâmetro maior, permitindo assim a circulação de ar para o resfriamento da pele. Tabela 3. Médias e desvio padrão (µ±dp) dos parâmetros anatômicos do pelo em fêmeas caprinas da raça Garfagnina. Inverno Variável DP (mm) CP (cm) Verão µ±dp Mínimo – Máximo µ±dp Mínimo - Máximo 0,074±0,010b 12,20±3,30a 0,048 - 0,098 14,53 - 19,44 0,088±0,010a 10,64±3,48b 0,049 - 0,116 13,10 – 17,89 Médias nas linhas seguidas de letras diferentes diferem entre si pelo teste t (p<0,01) Diâmetro do pelo (DP); Comprimento do pelo (CP). Na Tabela 4, observa-se que a cor do pelo para estes animais não foi importante fonte de variação dos parâmetros fisiológicos, indicando que são animais adaptados às condições ambientais onde são criados, corroborando Balieiro et al. (2003). Estes autores concluíram que a coloração do pelo não alterou a TR e a FR em ovelhas da raça Santa Inês de diferentes cores de pelame. Houve diferença significativa (p<0,01) no tamanho e diâmetro do pelo de diferentes cores. O diâmetro e comprimento do pelo nos animais de coloração preta apresentaram-se mais longos, sendo estas duas características moderadamente correlacionadas (0,46). Isto auxilia na dissipação de calor sem interferência da cor do pelo nos parâmetros fisiológicos. Os animais cinza possuem diâmetro de pelo maior que os animais marrom, pois a coloração cinza é uma união de pelos preto e branco e, no grupo marrom o pelo é marrom claro. A estrutura de pelame é fortemente influenciada pelas condições ambientais o que interfere diretamente na capacidade adaptativa. 59 Tabela 4. Médias e desvio padrão (µ±dp) dos parâmetros anatomofisiológicos em fêmeas caprinas da raça Garfagnina, de acordo com a cor do pelo. Marrom (28) Variável TR (°C) TS (°C) FR (mov./min.) FC (bat./min.) DP (mm) CP (cm) Cinza (28) Preto (44) µ±dp µ±dp µ±dp 38,80±0,60 27,80±3,90 33,90±11,10 89,90±15,20 0,076c±0,01 10,29b±3,74 39,10±0,80 28,20±3,70 36,50±15,60 90,80±20,20 0,081b±0,01 9,98c±2,70 38,91±0,77 27,99±3,98 34,31±10,70 92,09±20,48 0,084a±0,01 12,61a±3,27 Médias nas linhas seguidas de letras diferentes diferem entre si pelo teste t (p<0,01) Temperatura retal (TR); Temperatura superficial (TS); Frequência respiratória (FR); Frequência cardíaca (FC); Diâmetro do pelo (DP); Comprimento do pelo (CP) Na Tabela 5, observa-se diferença significativa (p<0,01) de turno do dia e período do ano sobre a temperatura retal (TR), frequência respiratória (FR), temperatura superficial (TS), frequência cardíaca (FC) e gradiente térmico (TR-TS). A TR apresentou-se maior (p<0,01) no turno da tarde em ambas as estações, corroborando Medeiros et al. (2007) e Souza et al. (2008), os quais observaram TR superior no período da tarde. Os caprinos são animais ativos durante o dia e por isso sofrem alterações nos parâmetros fisiológicos. Esta variação é mínima pela manhã e máxima no turno da tarde, devido a grande amplitude térmica que ocorre durante o dia, superior a amplitude entre os períodos, onde não houve diferença significativa na TR. A TR manteve-se dentro do limite, de 38,3ºC a 40ºC (Anderson, 1996), para a espécie caprina, indicando que os animais lançaram mão de mecanismos de dissipação de calor com eficácia. A variação diária na TR foi de 1,2°C e 1,1°C, no inverno e verão, respectivamente. De acordo com Piccione e Refinetti (2003), a variação na TR de caprinos geralmente está em torno de 3% devido ao impacto do calor (Martello, 2002). No presente trabalho a FR foi maior (p<0,01) no turno da tarde em ambas as estações. No entanto, no verão a média da FR apresentou-se maior que no inverno. Resposta semelhante foi encontrada por Medeiros et al. (2007), Souza et al. (2008), Silva et al. (2010) e Sejian et al. (2010). Estes autores concluíram que a FR sofre 60 influência do turno do dia, uma vez que à tarde, a TA é mais elevada que durante a manhã, promovendo elevação na FR. Tabela 5. Médias e desvio padrão (µ±dp) dos parâmetros fisiológicos em fêmeas caprinas da raça Garfagnina. Período Inverno Verão Turno Manhã Tarde Média Manhã Tarde Média TR (°C) µ±dp 38,3±0,4d 39,5±0,4b 38,9±0,7A 38,4±0,5c 39,5±0,5a 38,9±0,7A FR (mov./min.) µ±dp 26,7±6,1d 34,0±7,9b 30,4±7,9B 32,6±5,5c 44,3±17,0a 38,4±13,9A FC (bat./min.) µ±dp 89,3±12,7b 103,5±15,0a 96,4±15,6A 72,7±14,0c 101,0±16,3a 86,9±20,8B TS (°C) µ±dp 24,0±1,2c 25,3±1,1b 24,7±1,3B 28,5±1,9b 33,0±2,1a 30,8±3,0A TR-TS (°C) µ±dp 14,3±1,2a 14,2±1,0a 14,2±1,1A 9,8±1,9b 6,5±2,1c 8,1±2,6B Letras iguais na coluna não diferem entre si pelo teste t (p<0,01). Temperatura Retal (TR); Temperatura Superficial (TS); Frequência Respiratória (FR); Frequência Cardíaca (FC); gradiente térmico temperatura retal-temperatura superficial (TR-TS). De acordo com a classificação de Silanikove (2000), a FR no turno da tarde do verão apresentou valor de 44,3 mov./min., indicativo de o animal neste período apresenta-se em baixo estresse. Nos demais períodos os valores para FR estiveram dentro do limite para a espécie caprina. Porém esta alta FR não necessariamente indica que o animal está em estresse térmico, pois os animais mantiveram a TR em nível adequado mostrando-se eficiente na eliminação de calor. A FC apresentou valor maior (p<0,01) no turno da tarde nos dois períodos, com 103,5 e 101,0 bats⁄min no inverno e verão, respectivamente, tendo apresentado valores mais elevados nas tardes de inverno. Em temperaturas baixas ocorre vasoconstricção periférica provocando aumento da pressão sanguínea. Quando a TA aumenta, ocorre vasodilatação periférica e consequentemente diminuição da pressão sanguínea como meio para diminuir a produção de calor. Porém, se os animais permanecem sob estresse térmico por frio, suas FC aumentam. A média da FC observada no presente trabalho foi maior no inverno (Tabela 5). Resposta semelhante foi observada por Rocha (2006) estudando caprinos brasileiros do grupo Azul durante o período de seca e chuva, com altos valores de FC no período chuvoso. Estudos realizados por Medeiros et al. (2007), Souza et al. (2008) e Silva et al. (2010) indicaram que a medida que a temperatura do ar aumenta a FC também aumenta, mostrando-se sempre superior no turno da tarde. 61 A TS média apresentou-se maior (p<0,01) no verão (Tabela 5), indicativo de que os animais acessaram os mecanismos de dissipação de calor com o aumento da FR. Quando a UR é baixa e a temperatura do ar é superior a TS do animal, a dissipação de calor por trocas sensíveis não é eficiente. Em ambiente com alta UR a dissipação de calor por FR é comprometida, pois o ar estará carregado de água em suspensão e terá menor capacidade de reter novas quantidades. No presente trabalho, o gradiente térmico (TR-TS) foi maior no inverno (p<0,01). À medida que a TA aumenta, o gradiente diminui devido ao comportamento inverso entre temperatura do ar e gradiente térmico (TR-TS) (Figura 2). 18 Y= 18,292 – 0,2909x R² = 0,46 16 Gradiente TR - TS (ºC) 14 12 TS = 24,6°C 10 TR = 38,9°C 8 TS = 37,5°C TR-TS =14,3°C 6 TR = 38,9°C 4 TR-TS = 8,2°C 2 5 10 15 20 25 30 35 40 Temperatura ambiente (ºC) Figura 2. Gradiente térmico TR-TS em função da temperatura ambiente em fêmeas caprinas da raça Garfagnina. O gradiente térmico TR-TS (Figura 2) apresentou-se maior no inverno, pois os valores de temperatura superficial foram inferiores aos da temperatura do ar. Isto diminui a eficiência da perda de calor pela superfície da pele e aumenta a perda de calor pela respiração. A maior parte da dissipação de calor corpóreo ocorre de forma sensível, devido ao gradiente de temperatura. Houve correlação alta entre TA e TS (87%) e baixa 62 entre TA e TR (3%), indicando independência entre essas variáveis e que estes animais são bem adaptados às intempéries climáticas da região onde vivem. 3.3 Mecanismos eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais. Os valores médios dos parâmetros eritrocitários, bioquímicos e hormonais de fêmeas caprinas da raça Garfagnina nas duas estações em estudo são apresentados nas Tabelas 6, 7 e 8. Não houve efeito de periodo sobre eritrócitos (Er), hemácias (He) e volume globular médio (VGM). Isto certamente deve-se ao fato de que a média geral da TA encontra-se na zona de conforto térmico, conforme Baêta e Souza (2010). Os animais não foram submetidos por tempo excessivo ao estresse térmico, sendo a região de criação destes animais com altitude de 643m e localizada em um vale, cercado por montanhas. Os valores obtidos no presente estudo estão de acordo com os valores citados por Kaneko et al. (2008), Feldman et al. (2000) e Piccione et al. (2010). Os valores obtidos para os parâmetros eritrocitários certamente estão relacionados a capacidade adaptativa dos animais, característica adquirida ao longo dos anos através da adaptação às condições climáticas locais, uma vez que esta raça está presente na região há muitos anos. Tabela 6. Média e desvios padrão (µ±dp) dos parâmetros eritrocitários em fêmeas caprinas da raça Garfagnina. Inverno (25,4ºC) Variável Verão (36,5ºC) µ±dp Mínimo–Máximo µ±dp Mínimo–Máximo Er (x106/ml) 16,1±4,0 10,0 – 26,8 15,3±3,4 10,1 – 24,5 He (%) 29,8±5,1 16,0 - 40,0 29,2±4,9 20,0 – 42,0 VGM (f/l) 20,2±5,9 7,1 -35,4 19,8±5,0 10,9 – 32,5 Eritrócitos (Er), Hematócrito (He), Volume globular médio (VGM) Na Tabela 7, observa-se variação nos parâmetros bioquímicos sanguíneos entre os períodos do ano (p<0,01). A glicose apresentou maior valor no inverno (p<0,01). No verão com as temperaturas altas, o requerimento de glicose pelo animal aumenta, 63 gerando mobilização de triglicérideos, os quais apresentam valores elevados e são usados como fonte de energia. Os valores de glicose e triglicérides estão de acordo com os observados por Carlson (1994); Kaneno et al. (2008) e Mundim et al. (2007), em diferentes locais. Tabela 7. Média e desvios padrão (µ±dp) dos parâmetros bioquímicos sanguíneos em fêmeas caprinas da raça Garfagnina Inverno (25,4ºC) µ±dp Mínimo–Máximo Variável Verão (36,5ºC) µ±dp Mínimo–Máximo Glicose (mg/dl) 57,1±7,5a 40,0-85,0 50,7±5,8b 38,0-62,0 Ureia (mg/dl) 46,4±8,1a 27,0-66,0 42,8±5,6b 31,0-56,0 a b Colesterol (mg/dl) 73,0±12,4 33,0-98,0 68,4±14,4 41,0-99,0 Triglicérides (mg/dl) Creatinina (mg/dl) 14,2±5,6b 0,87±0,1a 6,0-30,0 0,7-1,2 25,2±8,9a 0,78±0,1b 13,0-66,0 0,6-1,0 Proteína Total (g/dl) 7,5±1,1b 3,2-10,2 8,3±0,8a 5,8-9,7 Albumina (g/dl) 3,4±0,4 2,0-4,4 3,5±0,3 3,0-4,4 Globulina (g/dl) b 1,2-6,8 a 2,3-6,7 b 0,5-1,6 4,0±1,0 a A/G 0,9±0,3 GGT (U/l) AST (U/l) 40,2±8,2 0,5-1,7 a 111,1±23,0 27,0-70,0 b 42,0-178,0 4,8±0,8 0,8±0,2 49,7±9.6 b 133,5±18,5 35,0-74,0 a 92,0-185,0 Médias nas linhas seguidas de letras diferentes diferem entre si pelo teste t (p<0,01). relação albumina e globulina (A/G), gama glutamiltransferase (GGT) e aspartato aminotransferase (AST). Os valores de colesterol diferiram significativamente (p<0,01) entre os periodos, indicando que estresse térmico tem maior efeito na concentração do colesterol do que o estresse nutricional. Isto certamente se deve ao aumento da utilização de ácidos graxos para a produção de energia, como consequência da diminuição de concentração de glicose em animais estressados termicamente, corroborando com Rasooli et al. (2004). Os valores de colesterol encontrados neste trabalho estão abaixo dos descritos por Kaneko et al. (2008). Sob estresse os valores de colesterol diminuem como resposta a demanda pela síntese de cortisol, principal indicador de estresse térmico por calor. O cortisol limita a utilização da glicose, mobilizando outras reservas de energia como triglicerídeos e proteínas. A creatinina apresentou valores menores no verão (p<0,01), isto porque com aumento da temperatura ambiente ocorre aumento na frequência respiratória e diminuição no valor da creatinina presente no músculo, cujos valores diminuem à medida que a frequência respiratória aumenta o resultado do catabolismo lento. A 64 correlação existente entre a creatinina e frequência respiratória foi de 33% e a correlação da creatinina com temperatura ambiente foi inversa (-0,46), os quais corroboram com os encontrados por Piccione et al. (2010) trabalharam com caprinos nativos da raça Girgentana, na Itália. A proteína total apresentou diferença significativa (p<0,01) entre os períodos do ano, sendo mais alta no verão. Os valores da proteína são relacionados com a temperatura ambiente (0,43). Os níveis de globulinas apresentaram-se mais altos no verão o que favorece a adaptação ao estresse e, diferenças no valor da globulina estão ligadas aos fatores fisiológicos e genéticos para adaptação do animal. Abdalla et al. (2009) e Al-Eissa et al. (2012) também relataram nível de globulina maior no verão, resultando em concentrações baixas na relação albumina/globulina no período de inverno. O valor de GGT nas duas estações permaneceu dentro do limite estabelecido para a espécie caprina, porém apresentou valor mais elevado no verão e correlação positiva com a temperatura ambiente (0,40). A AST também apresentou valor mais elevado no verão e correlação moderada e positiva com a temperatura do ar (0,47). Os níveis hormonais variaram entre as estações (p<0,01), evidenciando a influência da ação conjunta das variáveis meteorológicas estudadas sobre a fisiologia endócrina e termorreguladora dos animais (Tabela 8). Observou-se declínio dos níveis plasmáticos de T3 e T4 nas fêmeas no verão. Estes resultados assemelham-se aos de outras pesquisas que têm demonstrado existência de correlação alta e inversamente proporcional entre as concentrações de hormônios tireoidianos e a temperatura ambiente (-0,93) em caprinos, sendo um mecanismo adaptativo para reduzir a produção de calor. Com isto, os animais estudados mantiveram a TR dentro do limite para a espécie caprina. No inverno, com as baixas temperaturas e umidade relativa do ar (Tabela 1), ocorreram maiores concentrações de T3 e T4. A maior média de cortisol foi registrada no verão (p<0,01). Durante esse períodos também se registrou a maior média de temperatura do ar (Tabela 1), o que influenciou a concentração sanguínea de cortisol, pois a alta temperatura dificulta o processo de termólise nos animais. Essa argumentação é fortalecida quando se verifica que, durante o período de temperatura e umidade do ar amena foi registrado menor nível médio de cortisol. As concentrações de cortisol obtidas neste estudo (Tabela 8) foram próximas aos valores médios descritos por Encarnação (1989), porém, inferiores ao valor médio relatado por Minton et al. (1995). 65 Tabela 8. Média e desvios padrão (µ±dp) dos parâmetros hormonais em fêmeas caprinas da raça Garfagnina Variável T3 (ng/mL) T4 (µg/dL) Cortisol (ng/mL) Inverno (25,4ºC) (µ±dp) Mínimo–Máximo a 1,2±0,2 1,0–1,6 a 1,3±0,3 0,8-1,9 b 7,2±1,4 5,5-9,0 Verão (36,5ºC) (µ±dp) Mínimo–Máximo b 0,7±0,2 0,6 – 1,0 b 0,8±0,02 0,8 – 0,8 a 10,1±0,9 9,0 – 12,4 Médias nas linhas seguidas de letras diferentes diferem entre si pelo teste t (p<0,01). Os valores mais baixos encontrados nesse estudo podem ter sido ocasionados pela coleta que foi realizada no turno da tarde, com maiores temperaturas do ar e baixo pico hormonal. De modo geral a temperatura ambiente apresentou correlação inversa com os hormônios tireoidianos, observando-se que, quanto maior a temperatura ambiente, menor o nível de T3 e T4 e maior o nível de cortisol. Esse estudo confirma as suposições de Yousef et al. (1967), McFarlane et al. (1995) e Dickson (1996) de que ocorre redução na atividade tireoidiana em resposta ao incremento da carga térmica sobre os animais, ao mesmo tempo em que se elevam os níveis de cortisol. Em razão desses fatos, as concentrações de cortisol (Tabela 9) mostraram-se positivamente correlacionadas com a temperatura ambiente e os hormônios tireoidianos possuem correlação inversa com a temperatura ambiente (Figura 3). Tabela 9. Correlações de Pearson entre os hormônios triiodotironina (T3), tiroxina (T4) e cortisol (COR) em função da temperatura do ar (TA). TA T4 T3 T4 -0,93** T3 -0,93** 0,91** COR 0,91** -0,93** -0,96** **P<0,01 A concentração de cortisol correlacionou-se negativamente com concentração de T3 e de T4. Como a secreção do cortisol representa uma resposta ao estresse, a maior produção foi no verão (Tabela 8), apresentando alta correlação com a temperatura 66 ambiente (Tabela 9). O cortisol tem como função manter a homeostase do animal, com 2,0 13 1,8 12 1,6 11 1,4 10 1,2 9 1,0 8 0,8 7 0,6 6 0,4 5 16 18 20 22 24 26 28 30 32 34 36 38 40 Cortisol (ng/mL) T4 (µg/dL) and T3 (ng/mL) isso conseguem manter a temperatura retal dentro do limite para a espécie caprina. T4: y = 2,6679 - 0,0525*x (r2 = 0,86) T3: y = 2,2943 - 0,0439*x (r2 = 0,87) Cortisol: y = 0,0026 + 0,2784*x (r2 = 0,83) Temperatura do ar (ºC) Figura 3. Concentração dos hormônios tireoidianos e cortisol de cabras da raça Garfagnina em função da temperatura do ar. Após as primeiras modificações adaptativas que ocorrem no animal como resposta ao aumento nas frequências respiratória e cardíaca, na temperatura superficial e modificações no pelo do animal, o sistema HHA é ativado, aumentando assim o nível de cortisol e diminuindo o nível de colesterol. Esta mudança contribui com maior disponibilidade de substrato energético para as células, reduzindo o consumo de glicose das células com menor importância no estresse. Isto explica a correlação inversa (-0,30) observada entre o cortisol e glicose. No animal em jejum ou sob estresse térmico, o cortisol faz as células utilizarem os triglicerídeos e proteínas como fonte de energia para economizar glicose, o que justifica a moderada correlação entre cortisol e triglicérides (0,57), cortisol e proteína total (0,40) e correlação negativa do cortisol com o colesterol (-0,39). 67 4. CONCLUSÕES No ambiente estudado, os caprinos da raça Garfagnina são adaptados ao estresse por frio e por calor. No verão possuem maior capacidade de manter a temperatura retal com menor frequência respiratória e maior capacidade de dissipação de calor, já no frio eles possuem maior capacidade de produção de calor. Apenas a temperatura retal e a frequência respiratória não são suficientes para expressar a adaptação da raça. Sendo necessário considerar respostas fisiológicas e comportamentais dos animais às condições ambientais para adequada avaliação da adaptação. As características anatômicas, bioquímicas e hormonais são afetadas pelas estações, de modo que, durante o estresse térmico por calor há uma diminuição no metabolismo e no estresse térmico por frio ocorre um aumento no metabolismo, controlados pelos hormônios tireoidianos e o cortisol. A utilização desses hormônios facilita a compreensão dos mecanismos fisiológicos envolvidos no processo de adaptação. 68 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDERSON, B. E. Regulação da temperatura e fisiologia ambiental. In: SWENSON, M. J. DUKES. 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Foram necessários 4 componentes para explicar 67% da variação total conforme o critério estabelecido. Desta variação, 46,79% esteve concentrada nos componentes 1 e 2. O primeiro componente esteve fortemente associado às variáveis hormonais, temperatura superficial, triglicérides e proteínas. As ferramentas multivariadas foram eficientes na definição do perfil adaptativo dos animais, pois permitiram redução do espaço amostral, sem grande perda de informações. Palavras-chave: adaptação, clima temperado, componentes principais, homeotermia 74 Multivariate analysis for evaluation of adaptive profile of garfagnina goat breed ABSTRACT The aim of this research was to characterize the adaptive profile of the Italian Garfagnina breed through the use of principal component analysis and discriminant analysis. Fifty females were analysed in the winter and sixty in summer seasons, all adult and lactating. Physiological parameters used were rectal temperature, respiratory rate, heart rate and skin temperature. The anatomical parameters used were the diameter and length of the hair. It has been used hematological parameters (erythrocyte, hematocrit and mean corpuscular volume), blood biochemical parameters (glucose, cholesterol, triglycerides, creatinine, urea, total protein, albumin, globulin, albumin and globulin, gamma glutamyl transferase and aspartate aminotransferase) and hormonal parameters (thyroxine, Triiodothyronine and cortisol). Four components were needed to explain about 67% of the total variation according to the criteria established. Part of that variation (46.79%) was concentrated in components 1 and 2. The first component was strongly associated with hormonal variables, surface temperature, triglycerides and protein content. Multivariate tools were effective in defining the adaptive profile of animals as allowed reduction of the sample space without much loss of information. Keywords: adaptation, homeothermy, main components, temperate 75 1. INTRODUÇÃO Os mamíferos apresentam formas diferentes de lidar com as mudanças climáticas e vários são os mecanismos biológicos que utilizam para lidar com o estresse provocado pelo clima. Por isso percebe-se interesse generalizado em avaliar os mecanismos utilizados pelos organismos para lidar com a homeostase. Fisiologicamente, os animais reagem diferentemente as mudanças drásticas de temperatura, alterando o comportamento e a produção e, como consequência, sofrem alterações nos parâmetros fisiológicos como o eritrograma, alguns parâmetros bioquímicos do sangue, nível de cortisol e dos hormônios da tireóide bem como da sua genética. Os animais endotérmicos tentam manter sua temperatura corporal, dentro de uma determinada faixa de temperatura ambiente, denominada zona de conforto térmico ou de termoneutralidade onde, a manutenção da temperatura corporal ocorre com a mínima mobilização dos mecanismos termorreguladores. Várias características fisiológicas são utilizadas para avaliar a adaptação do animal em climas adversos. Portanto, é necessário selecionar animais capazes de produzir satisfatoriamente em ambientes adversos e fora da zona de conforto térmico (Starling et al., 2002). Várias são as ferramentas estatísticas utilizadas para auxiliar na determinação do perfil adaptativo dos animais. A análise individual das características é importante para descrever comportamento de variáveis e sua variação individual, o que possibilita a definição de padrões máximos e mínimos. No entanto, a análise individual dificulta a compreensão do fenômeno de forma global. Nessa perspectiva, a análise multivariada representa uma técnica estatística de extrema importância, pois permite análise do perfil adaptativo individual e de um grupo de animais através da aplicação de diferentes métodos (Zepeda et al., 2002). A análise multivariada pode ser definida por um conjunto de métodos e técnicas que permitem a análise simultânea de medidas múltiplas para cada indivíduo, levando em consideração as correlações existentes entre elas, ou seja, esses métodos e técnicas contemplam todas essas medidas de uma forma integrada, onde as inter-relações são exploradas e as soluções para os problemas são mais consistentes e úteis (Ferreira, 2003). Uma vantagem desse método é que pode ser aplicado a dados qualitativos e quantitativos. 76 Estabelecer relações, encontrar ou propor leis explicativas é papel próprio da ciência. Para isso, é necessário controlar, manipular e medir as variáveis que são consideradas relevantes ao entendimento do fenômeno analisado. Muitas são as dificuldades em traduzir as informações obtidas em conhecimento principalmente quando se trata da avaliação estatística da informação (Vicini, 2005). Dentre essas técnicas, a análise de componentes principais tem sido utilizada para descrever perfis e classificar elementos de uma população. Como as demais, estas são técnicas que permitem avaliar as inter-relações entre as variáveis em estudo e sumarização dos dados (Rosa, 1999), ou seja, buscar reduzir um conjunto original de variáveis a um número menor de ―fatores‖ independentes, facilitando a sua interpretação. A necessidade da utilização da análise multivariada de caracteres no estudo de variação de organismo foi reconhecida há muito tempo por sistematas e evolucionistas. Torna-se importante em estudos de populações com base no fenótipo e pode verificar as diferenças existentes quando todas as variáveis são analisadas conjuntamente (Gould e Johnston, 1972; Dossa et at., 2007). Portanto, o objetivo com esta pesquisa foi de identificar parâmetros mais relevantes na adaptação dos caprinos da raça italiana Garfagnina através do uso de análise de componentes principais. 77 2. MATERIAL E MÉTODOS O estudo foi conduzido no período de inverno e verão em dois turnos do dia (manhã e tarde) em uma propriedade da localidade de Lucca (Figura 1) (Bagni di Lucca) localizada na Reserva Florestal Orrido di Botri, a 44’01° de latitude e 10’58° de longitude, a 634m de altitude, na Itália. O clima da região segundo a classificação de Thornthwaite é do tipo clima A e temperatura média anual variando de 2 °C a 29,0 ºC, umidade relativa média de 68% e precipitação variando de 1851 a 2050 mm anuais. Foram avaliadas 50 fêmeas em lactação da raça Garfagnina no inverno e 50 no verão. Os dados foram coletados em dois dias no inverno, sendo um dia no mês de março e outro dia no mês de maio. No verão também foram coletados em dois dias alternados no mês de julho. Nos turnos manhã com início às 9:00 horas e tarde às 14:00 horas. A idade dos animais foi obtida indiretamente pela análise da cronometria dentária devido à ausência de escrituração zootécnica na propriedade, sendo todas classificadas como adultas (acima de 2 anos de idade). As variáveis fisiológicas: temperatura retal (TR), frequência respiratória (FR) e frequência cardíaca (FC) bem como a temperatura superficial (TS) foram verificadas em cada animal nos turnos da manhã e tarde em duas estações (inverno e verão). Temperatura retal (TR) A temperatura retal (TR) dos animais foi aferida no inverno e no verão, nos turnos manhã e tarde. Utilizou-se um termômetro clínico digital com escala de 32 a 43,9°C, o qual era introduzido no reto de cada animal, com o bulbo em contato com a mucosa, permanecendo no reto até que o termômetro emitisse um sinal sonoro, que era indicativo da estabilização da temperatura. Frequência respiratória (FR) e Frequência Cardíaca (FC) As frequências respiratória (FR) e cardíaca (FC) foram mensuradas no inverno e no verão, nos dois turnos do dia (manhã e tarde) através da auscultação indireta das bulhas, com o auxílio de um estetoscópio flexível, ao nível da região laringo-traqueal, contando-se o número de movimentos e batimentos durante 20 segundos e, o resultado multiplicado por 3 para obtenção da frequência por minuto. Temperatura superficial (TS) Utilizou-se um termômetro infravermelho digital para obtenção da temperatura superficial dos animais (TS), sendo as leituras realizadas nos dois períodos (inverno e 78 verão) e em dois turnos (manhã e tarde). Essa leitura foi realizada no costado dos animais, mesmo local de coleta dos pelos. As amostras de sangue de cada animal foram coletadas no turno da tarde em ambas as estações (inverno e verão), através de punção na veia jugular, após assepsia com álcool iodado, com mínimo de traumatismo. Para análise eritrocitária foram usados tubos à vácuo de 5ml contendo anticoagulante etileno diaminotetracetato de sódio (EDTA) a 10%. A contagem de eritrócitos (Er) foi realizada em câmara do tipo Neubauer modificada, através da diluição das células, utilizando-se uma pipeta semi-automática de 20 microlitros conforme preconizado por Vallada (1999). Para determinação do hematócrito (Ht) foi usada a técnica do microhematócrito por 15 minutos, conforme descrito por Ayres et al. (2001), na qual se utilizaram tubos capilares homogêneos de 75 milímetros de comprimento por um milímetro de diâmetro. O índice hematimétrico absoluto: volume globular médio (VGM) foi obtido através da contagem do número de Er, Ht, segundo Ferreira Neto e Viana (1977). Para análise dos parâmetros bioquímicos sanguíneos e hormonais foram usados tubos à vácuo de 7 ml com gel separador e com fluoreto de sódio, este sendo utilizado para análise de glicose. As amostras de sangue foram transportadas imediatamente em caixas isotérmicas ao laboratório da UNIFI, centrifugadas em uma centrífuga digital a 4°C, a 3000 rotações durante quinze minutos. O sobrenadante resultante da centrifugação foi separado em alíquotas de 1,5mL para dosagens bioquímicas, realizadas logo no dia seguinte após a coleta. Foram mensuradas as concentrações séricas de proteína total (PRT), pelo método colorimétrico biureto; albumina (ALB), pelo método colorimétrico bromocresol; glicose (GLI) e triglicérides (TRI), pelo método enzimático colorimétrico; colesterol (COL), pelo método enzimático CHOD-POD; ureia (URE), pelo método cinético enzimático; e creatinina (CRE), pelo método cinético Jaffe; Gamma Glutamil Transferase SL (GGT), pelo método cinético Szasz–Tris e aspartato aminotransferase (AST), pelo método cinético UV. Todos os procedimentos foram realizados utilizando kits laboratoriais de uso comercial (ASSEL S.r.l.) e as leituras foram feitas com aparelho para análises bioquímicas (VegaSys) com fotômetro de comprimento de onda múltiplo. 79 As concentrações plasmáticas de cortisol, trioxina (T4) e triiodotironina (T3) foram analisadas em duplicatas mediante técnica ELISA, utilizando kits laboratoriais de uso comercial (INVITRO), desenvolvidos para avaliação quantitativa dos hormônios. Como estes hormônios têm padrão de secreção circadiano com pico alto no início da manhã, coletou-se o sangue no turno da tarde para entender como a raça Garfagnina utiliza os mecanismos adaptativos em um período de alta temperatura. O número de componentes foi escolhido mediante os autovalores, pelo critério sugerido por Kaiser (1960) apud Mardia (1979), que consistiu em incluir somente aqueles componentes cujos autovalores foram superiores a 1. As análises foram realizadas com auxílio do software Statistica (versão 8.0). 80 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Na Tabela 1, apresenta-se o resultado dos autovalores, bem como a porcentagem de variância explicada por cada componente, e também a variância acumulada pelas mesmas. Observa-se que foram necessários 4 componentes para explicar um percentual mínimo de 66,56% da variação total das características adaptativas. A percentagem de variância acumulada no primeiro fator é baixa, pela natureza das variáveis que são expressas em diferentes unidades de medidas. Por isso, mesmo com a padronização dos dados, foram necessários quatro fatores para atender o critério de seleção adotado (>=1,0), com quase 67% de variância acumulada. Assim a natureza e grau de relacionamento das variáveis são determinantes na definição da quantidade de fatores. Tabela 1. Componente principal (CP), autovalores, porcentagem da variância por componente e variância total de fêmeas caprinas da raça Garfagnina. CP Autovalores Variação Simples (%) Variação acumulada (%) 1 4, 900094 32,66729 32,6673 2 2,119375 14,12916 46,7965 3 1,596694 10,64463 57,4411 4 1,369066 9,12711 66,5682 Há muitas características adaptativas que podem ser medidas, mas há necessidade de determinar e compreender o papel destas no processo adaptativo dos animais. Na Tabela 2, encontram-se os pesos das variáveis para cada componente para as 15 variáveis estudadas em fêmeas caprinas da raça italiana Garfagnina, considerando a correlação nos componentes acima de 0,65. No primeiro componente, as variáveis que mais contribuíram para a variação total foram: temperatura superficial, os hormônios e o triglicerídeo, sendo estas as variáveis que sofrem maior variação. A temperatura superficial é uma medida importante no perfil adaptativo de animais, pois esta diretamente relacionada a temperatura do ar. À medida que aumenta a temperatura do ar, a temperatura superficial também cresce. Quando a temperatura superficial iguala a temperatura do ar, o animal deixa de ser eficiente na dissipação de calor pela via sensível, necessitando lançar mão de outros mecanismos e assim, contribuindo para a manutenção da temperatura retal. 81 Os hormônios tireoidianos e o cortisol também apresentam alta correlação com algumas variáveis bioquímicas, e são de relevância no primeiro componente. Quando a dissipação de calor pela pele torna-se ineficiente, o animal é submetido a um estresse e desencadeia a produção dos hormônios, na tentativa de equilibrar novamente a temperatura corporal. Tabela 2. Correlações entre as variáveis e respectivos componentes em fêmeas caprinas da raça Garfagnina Variável Frequência respiratória CP 1 0,242171 CP 2 -0,697733 CP 3 0,066654 CP 4 0,127265 Temperatura retal -0,109728 -0,670011 0,026868 0,306986 Frequência cardíaca -0,022221 -0,706369 -0,215612 -0,269214 Temperatura superficial 0,837741 -0,163791 0,307088 0,018876 Eritrócitos -0,134754 0,184874 0,206098 0,655244 Hematócrito -0,072633 0,458548 0,099799 -0,050965 Glicose -0,391794 -0,469834 -0,382410 -0,098838 Colesterol -0,022822 0,108135 -0,684425 -0,353029 Triglicérides 0,702973 0,028781 -0,107512 -0,233729 Ureia -0,367035 -0,266814 -0,014424 0,468499 Proteína total 0,634358 0,229615 -0,581663 0,397335 Globulina 0,609705 0,109868 -0,604437 0,407979 T4 -0,920474 0,201888 -0,089453 -0,038495 T3 -0,930337 -0,001897 -0,173876 0,109869 Cortisol 0,913132 -0,058218 0,173057 -0,086377 No estresse térmico por calor o primeiro hormônio usado para avaliar as situações de estresse é o cortisol. O aumento na concentração deste hormônio é observado em períodos de altas temperaturas, diminuindo assim o calor metabólico. O 82 cortisol limita a utilização da glicose e altera a função dos carboidratos, triglicerídeos e proteínas. Mobiliza as reservas de triglicerídeos para serem utilizados como fonte de energia, por serem hidrofóbicos. Pode ser armazenada em grades quantidades, e contêm, por unidade de massa, mais do que o dobro de energia armazenada que as proteínas e os carboidratos, fornecendo mais energia metabólica quando oxidados (Reece, 2006). A alta concentração dos hormônios tireoidianos acarreta aumento na atividade metabólico e como consequência ocorre aumento do consumo de oxigênio, aumento da frequência cardíaca e frequência respiratória, reduzindo o estresse térmico e mantendo a temperatura corporal. O segundo componente tem maior associação com frequência cardíaca, frequência respiratória e temperatura retal, variáveis também com variação considerável. A liberação dos hormônios devido ao estresse térmico por calor ou por frio acarreta em aumento da frequência cardíaca, está não é controlada por receptores de temperatura e sim por quimiorreceptores e mecanorreceptores. O aumento da frequência cardíaca aumenta o fluxo sanguíneo para as extremidades auxiliando na dissipação de calor por forma sensível ou insensível (Reece, 2006). A temperatura retal e a frequência respiratória são indicadores da temperatura corporal do animal. Parâmetros utilizados para determinar o grau de adaptabilidade dos animais, uma vez que a elevação dessas variáveis indica que o animal esta estocando calor e dissipando pela forma evaporativa. O terceiro componente é fortemente associado ao colesterol, é a variável de maior relevância, porém com baixa variação. Não apresenta alta correlação com as variáveis, apenas com o cortisol uma correlação considerável e inversa (-0,39). O colesterol é precursor do cortisol, o qual limita a utilização da glicose com maior relevância. No quarto componente apresenta-se o eritrócito com maior relevância, os eritrócitos são responsáveis pelo transporte de oxigênio por todo o organismo. A produção de eritrócitos é intensificada pelo aumento na frequência respiratória. O eritrócito também é utilizado para avaliar a capacidade adaptativa de raças, pois o sangue esta envolvido nos mecanismo de perda de calor. Alterações nos parâmetros fisiológicos são evidências de tentativas orgânicas a que os animais recorrem para sair da condição de estresse. Os caprinos, mais precisamente os nativos, são adaptados às condições diversas de clima e seus mecanismos adaptativos se ajustam para que o animal sobreviva a estas condições. Trabalho semelhante foi realizado por Carneiro et al (2010) em ovinos de 83 raças naturalizadas e raças comerciais, utilizando análise de componentes principais e discriminante. Verificaram que as técnicas permitiram verificar a existência de grupos diferenciados e identificaram o grupo de variáveis que melhor discriminaram os grupos. Assim, em situações semelhantes às da presente pesquisa e que não seja possível a coleta de todas as variáveis utilizadas no presente estudo, deve-se dar prioridade àquelas destacadas nos dois primeiros componentes. Isto porque o primeiro componente retém a maior porção da variação total dos dados, o segundo retém a segunda maior porção e, assim sucessivamente para os demais componentes (Cruz e Regazzi, 2003). Para definir o perfil adaptativo da raça Garfagnina foram necessários 4 componentes. As 10 medidas morfológicas utilizadas na pesquisa não foram importantes na definição do perfil, podem ser destacadas em um sucessivo trabalho com esta raça no mesmo ambiente, assim reduzindo mão-de-obra e gastos excessivos. Considerando os dois primeiros componentes, que apresentam as maiores variações são necessárias apenas 7 variáveis, temperatura superficial, hormônios tireoidianos, cortisol, frequência cardíaca, frequência respiratória e temperatura retal. Os dois primeiros fatores explicam 46,79% do total da variação entre as características (Figura 1). As variáveis localizadas mais distantes do ponto zero do eixo X e Y aquelas destacadas no primeiro componente, e acumulam a maior parte da variação total dos dados. A frequência cardíaca tem comportamento oposto ao hematócrito, sendo assim as variáveis que se encontram mais distantes do centro são as que melhor representam o perfil são: hormônios tireoidianos, cortisol, temperatura superficial, frequência cardíaca, frequência respiratória e temperatura retal. Animais em condições de alta temperatura do ar utilizam mecanismos fisiológicos para entrar em homeotermia, quando não conseguem ajustar a temperatura corporal lançam mão de outros mecanismos, como os hormônios. 84 1,0 He CP 2 : 14,13% 0,5 T4 PRT Er GLO TRI COL 0,0 T3 COR TS URE GLI -0,5 TR FC FR -1,0 -1,0 -0,5 0,0 0,5 1,0 CP : 32,67% Figura 1 Componente Principal para parâmetros fisiológicos, eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais em fêmeas caprinas da raça Garfagnina. 85 4. CONCLUSÕES A análise fatorial foi capaz de identificar quais as variáveis fisiológicas, bioquímicas e hormonais irão influenciar no perfil adaptativo dos animais, nas condições em que esta pesquisa foi realizada. Desta forma permitindo redução do espaço amostral, sem grande perda de informações, a temperatura superficial, diâmetro do pelo, hormônios, frequência cardíaca e hematócrito foram as variáveis mais relevantes nos animais da raça Garfagnina de clima temperado. 86 5. 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Archivos de Zootecnia, v.51, p.53-64, 2002. 88 CAPÍTULO 4 89 PERFIL ANATOMOFISIOLÓGICO E ENDÓCRINO DA ADAPTAÇÃO DE CAPRINOS DO GRUPO GENÉTICO BRASILEIRO AZUL Perfil anatomofisiológico e endócrino da adaptação de caprinos do Grupo Genético Brasileiro Azul RESUMO O objetivo desta pesquisa foi caracterizar o perfil adaptativo de cabras do grupo genético brasileiro Azul, quanto aos aspectos fisiológico, morfológico, bioquímico, hematológico, hormonal e anatômico nas estações seca e chuvosa. Foram utilizadas 40 fêmeas no período chuvoso e 40 fêmeas no período seco, todas adultas e em lactação. Foram utilizados dados de temperatura do ar, temperatura do globo negro e umidade relativa do ar com o auxílio de uma estação meteorológica automática. Os parâmetros fisiológicos utilizados foram à temperatura retal, frequência respiratória, frequência cardíaca e temperatura superficial. Os parâmetros anatômicos utilizados foram o diâmetro e comprimento do pelo e a espessura do pelame. Utilizaram-se também parâmetros hematológicos (eritrócitos, hematócrito, hemoglobina, volume globular médio e concentração de hemoglobina globular média), parâmetros bioquímicos sanguíneos (glicose, colesterol, triglicérides, creatinina, uréia, proteína total, albumina, globulina, relação albumina e globulina, magnésio, gama glutamiltransferase, aspartato aminotransferase e alanina aminotransferase) e parâmetros hormonais (tiroxina, triidotironina e cortisol). Houve efeito significativo de turno e período sobre todas as variáveis ambientais. As variáveis fisiológicas, temperatura retal, frequência respiratória, frequência cardíaca e temperatura superficial apresentaram valor mais elevado no turno da tarde em ambos os períodos. Para os parâmetros anatômicos observou-se efeito significativo de período. Já os parâmetros eritrocitários, bioquímicos e hormonais foram afetados significativamente pelo período do ano. Observou-se que os animais mantiveram sua TR dentro do limite recomendado para a espécie, mantendo a homeotermia, o que é indicativo de que utilizaram outros mecanismos adaptativos para se ajustarem as modificações climáticas nos diferentes períodos do ano. Palavras-chave: cortisol, estresse térmico, homeotermia, nativos 90 Anatomophisiological and endocrine profile of the Azul breed Brazilian goat ABSTRACT The aim of this research was to characterize the adaptive profile of Brazilian goats of Azul breed based on physiological, morphological, biochemical, hematological, hormonal and anatomical traits in dry and rainy seasons. Forty females were used in each season, all adult and in lactation phase. Data of air temperature, black globe temperature and relative humidity with the aid of an automatic weather station were collected. Physiological parameters used were rectal temperature, respiratory rate, heart rate, skin temperature, as well as the thermal gradient RT-ST. The anatomical parameters used were the diameter and hair length and thick hair coat. Were also used hematological parameters (erythrocyte, hematocrit, hemoglobin, mean corpuscular volume and mean corpuscular hemoglobin concentration), blood biochemical parameters (glucose, cholesterol, triglycerides, creatinine, urea, total protein, albumin, globulin, albumin and globulin, magnesium, gamma glutamyl transferase, aspartate aminotransferase and alanine aminotransferase) and hormonal parameters (thyroxine, triiodothyronine and cortisol).There was no significant effect of period and season on all environmental variables. Physiological variables as rectal temperature, respiratory rate, heart rate and skin temperature showed higher value in the afternoon in both seasons. For anatomical parameters it has been observed significant effect of season. Already erythrocytic parameters, biochemical and hormonal were significantly affected by season. It was observed that the animals maintained their air temperature within the recommended range for the goat specie, keeping the homeothermy which is indicative that other suitable mechanisms were used to adjust the climate changes in different seasons of the year. Keywords: cortisol, heat stress, homeothermy, native 91 1. INTRODUÇÃO A rusticidade das raças de caprinos nativos da região Nordeste do Brasil é um fator importante para a sustentabilidade da caprinocultura da Região. Isto ocorre devido principalmente à sua adaptabilidade. Entretanto, os elementos ambientais e o sistema extensivo de criação representam fatores limitantes ao desenvolvimento da caprinocultura regional. As raças nativas de caprinos possuem interessante material genético para condições do semiárido, se destacando entre elas o grupo genético Azul ou Azulanha, de pelagem cinza azulada e pele escura, ainda não reconhecida oficialmente como raça. Este grupo racial encontra-se em perigo de extinção, havendo, no entanto, possibilidade de recuperação desse importante material genético que, ao longo do processo de aclimatização degenerativa, ainda mantém material genético rico, porém desconhecido, principalmente no tocante à capacidade de resistência à seca e às doenças. Exemplares isolados de caprino Azul são encontrados em rebanhos de várias partes do Nordeste (ASCCOPER, 2005). Os caprinos são animais homeotérmicos e como tais se caracterizam pela capacidade de manter a temperatura corporal dentro de limites estreitos, utilizando para esse fim, além das trocas com o ambiente, à produção interna de calor (Randal et al., 2000). O impacto das mudanças climáticas tem promovido muitos prejuízos na produção animal, o que gera a necessidade de estudos aprofundados sobre os processos adaptativos das raças, notadamente as raças locais, para melhor compreensão dos mecanismos e processos de adaptação destes animais a mudanças bruscas de temperatura. As alterações climáticas afetam os animais diretamente através do estresse fisiológico no controle da termorregulação, nutrição e aparecimento de doenças. Portanto, a descrição do ambiente de produção é importante para a compreensão da adaptação das raças locais a situações diversas de ambiente, pois cada raça apresenta características adaptativas próprias. As raças locais em geral foram submetidas a séculos de seleção natural o que resultou em animais com elevado valor adaptativos a ambientes estressantes. Recentemente, alguns trabalhos têm demonstrado maior preocupação com o bem-estar animal, já que estudos têm apontado para a existência de correlação inversa entre estresse calórico e produtividade (Silanikove, 2000). Mudanças nas funções biológicas 92 dos animais devido à exposição ao estresse térmico incluem alteração no consumo e utilização da alimentação, perturbações no metabolismo da água, energia, proteína e minerais, mudanças nas reações enzimáticas, nas secreções hormonais e nos metabólitos do sangue (Marai et al., 2007). O objetivo com esta pesquisa foi caracterizar o perfil genético e adaptativo da cabra do grupo genético Azul, quanto aos aspectos fisiológicos, morfológicos, bioquímico, hematológicos, hormonais e anatômicos. 93 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1 Local do Experimento O estudo foi conduzido no período chuvoso e seco, em uma propriedade do município de Caiçara do Rio do Vento, no Rio Grande do Norte, a latitude 5º45’36‖ sul e longitude 35º59’52‖ oeste, a 175m de altitude, no Brasil. O clima da região é tropical com estação seca, segundo a classificação climática de Koppen é do tipo As. Com temperatura média anual de 27,2°C, temperatura máxima de 33,0ºC e temperatura mínima de 21,0ºC. Figura 1 Localização de Caiçara do Rio do Vento, região Nordeste do Brasil 2.2 Animais experimentais Foram avaliadas 80 fêmeas do grupo genético Azul, sendo 40 no período chuvoso (julho) e 40 no período seco (dezembro), todas em lactação, criadas extensivamente. As coletas foram realizadas em 2 dias seguidos em cada período do ano, as condições climáticas eram semelhantes àquelas esperadas para a região em ambas as estações. A idade dos animais foi obtida indiretamente pela análise da cronometria dentária devido à ausência de escrituração zootécnica na propriedade, sendo todas 94 classificadas como adultas (de 2 a 5 anos de idade). Observa-se as medidas fisiológicas duas vezes ao dia às 8:00 horas e as 14:00 horas nas duas estações. Todos os animais eram sadios e esse padrão foi definido em função do estado sanitário dos animais avaliado através do FAMACHA (coloração da conjuntiva), presença de ectoparasitas, linfadenites ou algum outro tipo de problema na pele. 2.3 Dados climatológicos e Índices de Conforto Térmico Durante o período experimental foram coletados dados climatológicos com o auxilio de uma estação meteorológica, que era localizada no ambiente onde os animais passavam o dia e neste mesmo ambiente eram realizadas as medidas fisiológicas. Iniciando às 8:00 horas da manha e finalizando as 18:00 horas. A cada hora eram coletados os seguintes dados: temperatura do bulbo seco (Tbs), temperatura de bulbo úmido (Tbu), temperatura do globo negro (Tgn) e umidade relativa do ar (UR). Ao final do experimento os dados eram processados e armazenados numa planilha adequada para esse fim. A velocidade do vento foi realizada com o auxilio de um anemômetro digital, era realizado de 2 em 2 horas. 2.3.1 Índice de temperatura de globo negro e umidade (ITGU) O valor do ITGU foi determinado através dos dados climatológicos temperatura de globo negro (Tgn) e temperatura do ponto de orvalho (Tpo), de acordo com a equação sugerida por Buffington et al. (1981) expressa da seguinte maneira: Onde: ITGU = Índice de temperatura globo negro e umidade, Tgn = temperatura do globo negro, °C. Tpo = Temperatura do ponto de orvalho, °C. 2.3.2 Carga térmica radiante (CTR) A CTR foi calculada dentro dos apriscos pela equação descrita por Esmay (1969). 95 Onde: CTR = Carga térmica radiante, W.m-2 σ = Constante de Stefan-Boltzman, 5,67.10-8 Wm-2 .K-1; TRM = Temperatura radiante média, K. A temperatura radiante média (TRM) é a temperatura de uma circunvizinhança, considerada uniformemente negra capaz de eliminar o efeito da reflexão, com a qual o corpo (globo negro) troca tanta quantidade de energia quanto à do ambiente considerado (Bond e Kelly, 1954). A TRM pode ser obtida pela equação: Onde: TRM = temperatura radiante, em K; V = Velocidade do vento, em m/s-1; Tbs = Temperatura do bulbo seco, em K; Tgn = Temperatura do globo negro, em K. 2.4 Mecanismos Anatômicos 2.4.1 Caracteres morfológicos Na coleta realizada no período chuvoso foi feita a caracterização fenotípica de todos os animais cujas informações foram compiladas em planilhas adequadas. Cada animal foi avaliado quanto à presença ou ausência de orelhas reduzidas, chifres, brincos, pelo longo, barba e cor ruão (presença das cores branca e preta na mesma pelagem). 2.4.2 Amostragem do pelo dos animais Foi coletada uma amostra de pelo de cada animal nas duas estações, sendo esta coleta feita manualmente na região do costado, um pouco abaixo da coluna vertebral, mesma região onde foi realizada a temperatura superficial. Os pelos foram identificados e acondicionados em envelopes de papel para a determinação das características morfológicas do pelame como o diâmetro dos pelos (DP), feito com o auxílio de um 96 micrômetro digital acoplado a um microscópio, onde eram feitas 5 medições ao longo do pelo e por fim feita a média. O comprimento do pelo (CP), para as quais foram usados os pelos mais longos de cada amostra, segundo metodologia descrita por Kassab (1964) a espessura do pelame (EP) foi medida in situ, 18 cm abaixo da coluna vertical, utilizando-se uma régua metálica graduada em milímetros provida de um cursor, conforme Silva (2000). A régua era introduzida perpendicularmente na superfície do pelame até tocar suavemente a pele e o cursor era movido até tocar a superfície externa do pelame. 2.5 Mecanismos Fisiológicos 2.5.1 Temperatura retal (TR) A temperatura retal (TR) dos animais foi aferida no período chuvoso e seco, nos turnos manhã e tarde. Utilizou-se um termômetro clínico digital com escala de 32 a 43,9°C, o qual era introduzido no reto de cada animal, com o bulbo em contato com a mucosa, permanecendo no reto até que o termômetro emitisse um sinal sonoro, que era indicativo da estabilização da temperatura. 2.5.2 Frequência respiratória (FR) e Frequência Cardíaca (FC) As frequências respiratória (FR) e cardíaca (FC) foram realizadas no período chuvoso e seco, nos dois turnos manhã e tarde através da auscultação indireta das bulhas, com o auxílio de um estetoscópio flexível, ao nível da região laringo-traqueal, contando-se o número de movimentos e batimentos durante 20 segundos e, o resultado multiplicado por 3 para obtenção da frequência por minuto. 2.5.3 Temperatura superficial (TS) Utilizou-se um termômetro infravermelho digital para obtenção da temperatura superficial dos animais (TS), sendo as leituras realizadas nos dois períodos (chuvoso e seco) e em dois turnos (manhã e tarde). Essa leitura foi realizada no costado dos animais, mesmo local de coleta dos pelos. Calculado o gradiente térmico: TR – TS. 2.6 Mecanismos eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais As amostras de sangue de cada animal foram coletadas no turno da tarde em ambos os períodos (chuvosa e seca), através de punção na veia jugular, após assepsia com álcool iodado, com mínimo de traumatismo. Nas coletas foram usadas agulhas de calibre 0,8x25mm e tubos à vácuo de 5ml contendo anticoagulante etileno diaminotetracetato de sódio (EDTA) a 10%. As amostras de sangue foram mantidas em 97 caixas isotérmicas com gelo até chegada ao laboratório de Fisiologia Animal e Biologia Molecular (UFPB-CCA). A contagem de eritrócitos (Er) foi realizada em câmara do tipo Neubauer modificada, através da diluição das células, utilizando-se uma pipeta semi-automática de 20 microlitros conforme preconizado por Vallada (1999). Para determinação do hematócrito (Ht) foi usada à técnica do microhematócrito por 15 minutos, conforme descrito por Ayres et al. (2001), na qual se utilizaram tubos capilares homogêneos de 75 milímetros de comprimento por um milímetro de diâmetro. A determinação do teor de hemoglobina (Hb) no sangue foi realizada pelo método da cianometahemoglobina, conforme técnica descrita por Mello (2001), utilizando o analisador bioquímico automático, BIOPLUS 2000, com auxílio de kit comercial próprio para dosagem de hemoglobina, LABTEST DIAGNOSTIC. Os índices hematimétricos absolutos: volume globular médio (VGM) e concentração de hemoglobina globular média (CHGM) foram obtidos através da contagem do número de Er, Ht e do teor de hemoglobina (Hb), segundo Ferreira Neto e Viana (1977). Para análise dos parâmetros bioquímicos sanguíneos e hormonais foi coletado 7 ml de sangue com agulhas de calibre 0,8x25mm, em tubos à vácuo com gel separador e com fluoreto de sódio, este sendo utilizado para análise de glicose. As amostras de sangue foram transportadas imediatamente em caixas isotérmicas ao laboratório da UFPB-CCA, centrifugadas em uma centrifuga digital a 4°C, a 3000 rotações durante quinze minutos. O sobrenadante resultante da centrifugação foi separado em alíquotas de 1,5mL para dosagens bioquímicas, realizadas logo no dia seguinte após a coleta. Foram mensuradas as concentrações séricas de proteína total (PRT) – pelo método colorimétrico biureto; albumina (ALB) – pelo método colorimétrico bromocresol; glicose (GLI) – pelo método GOD-Trinder; triglicérides (TRI) – pelo método enzimático Trinder; colesterol (COL) – pelo enzimático Trinder; uréia (URE) pelo método uréase Labtest; magnésio (Mg) – pelo método Labtest; creatinina (CRE) – pelo método Labtest; Gamma GT SL (GGT) – pelo método cinético Szasz modificado; aspartato aminotransferase (AST) – pelo método cinético UV-IFCC; alanina amino transferase (ALT) – pelo método cinético UV-IFCC. Todos os procedimentos foram realizados utilizando kits laboratoriais de uso comercial (Labtest) e as leituras foram feitas com auxílio do espectrofotômetro com comprimento de onda múltiplo. 98 As concentrações plasmáticas de cortisol, trioxina (T4) e triiodotironina (T3) foram analisadas em duplicatas mediante técnica ELISA, utilizando kits laboratoriais de uso comercial (INVITRO), desenvolvidos para avaliação quantitativa dos hormônios. Como estes hormônios são circadianos, com pico alto no início da manhã, coletou-se o sangue no turno da tarde para entender como o grupo genético Azul utiliza os mecanismos adaptativos em um período de alta temperatura. 2.7 Análises estatísticas Os dados coletados foram analisados por meio do Statistical Analysis System pela aplicação dos procedimentos GLM (Análise de Variância), e teste de médias (T 5%) para as variáveis significativas. Foram utilizados os seguintes modelos matemáticos: yijk = µ + Ei + Pj + eijk em que: yijk é a variável dependente; µ é a média geral; E i é o efeito fixo de período (i=chuvoso, i=seco), Pj é o efeito fixo de turno (j=manhã, j=tarde) e eijk é o erro aleatório, considerando média 0 e variância ơ 2. Entretanto, os parâmetros anatômicos do pelo e os parâmetros hematológicos, bioquímicos sanguíneos e hormonais foram analisados por um modelo semelhante ao anterior, mas que incluiu apenas o efeito fixo de período. Foram estimadas as correlações de Pearson entre todas as variáveis, utilizandose o PROC CORR. As frequências das variáveis morfológicas de natureza qualitativa avaliada foram feitas pelo procedimento PROC FREQ do Statistical Analysis System (Versão 9.1) 99 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 Parâmetros climatológicos e índices de conforto térmico Consta na tabela 1 as médias por período e a média geral (µ) das variáveis temperatura do ar (TA), umidade relativa (UR), Índice de temperatura e umidade e globo negro (ITGU) e carga térmica radiante (CTR). Maiores valores foram observados no período seco, com exceção da UR, que é inversamente proporcional a TA. Houve diferença significativa (p<0,01) entre os períodos, sendo os valores de TA mais elevados no turno da tarde (Tabela 1). No período chuvoso as temperaturas são baixas com aumento de TA à medida que ocorre mudança de período, com mudanças mais acentuadas ao longo do dia. Observam-se maiores amplitudes de temperatura entre os turnos do que entre os períodos. Tabela 1. Variáveis ambientais: temperatura do ar (TA), umidade relativa (UR), Índice de temperatura do globo negro e umidade (ITGU) e carga térmica radiante (CTR), no Rio Grande do Norte, Brasil. Período Chuvoso Seco Turno TA (°C) UR (%) Tgn (°C) ITGU CTR (W/m²) Manhã 34,8 36,0 34,5 91,5 678,9 Máximo 38,0 76,7 36,0 88,2 734,8 Mínimo 29,8 39,6 32,0 75,6 476,6 Tarde 38,7 33,2 47,4 95,5 738,9 Máximo 39,8 38,4 41,3 93,2 844,5 Mínimo 35,4 29,8 38,9 83,2 528,4 Média 36,8 34,6 40,8 93,5 708,9 Manhã 39,6 34,5 43,9 98,9 813,5 Máximo 40,5 51,2 40,7 100,2 885,4 Mínimo 35,9 36,7 38,5 95,2 582,4 Tarde 43,5 32,0 49,6 101,3 868,5 Máximo 44,5 39,6 52,6 105,8 925,4 Mínimo 39,8 29,8 47,2 98,9 678,9 Média 41,6 33,3 46,8 100,1 841,0 Letras iguais na linha não diferem entre si pelo teste t (p<0,01). 100 Os valores de TA observados nas duas estações (Tabela 1) indicam que os animais estavam fora da zona de conforto térmico, determinado para a espécie caprina, que de acordo com a classificação de Baêta e Souza (2010), o que acarretou mudanças nos parâmetros fisiológicos dos animais. No entanto, a TR e a FR apresentaram valores dentro da normalidade para a espécie caprina. Com relação à UR observou-se diferença significativa (p<0,01) entre os turnos e os períodos. A UR apresenta-se com valores maiores no turno da manhã, pois a TA neste período é alta, sendo inversamente proporcional a UR. De acordo com Baêta e Souza (2010) a UR exerce grande influência no bemestar e na produtividade do animal, principalmente quando os valores são elevados e associados a altas temperaturas. O valor de ITGU no turno da tarde foi superior ao da manhã (p<0,01), em ambas as estações. O valor de ITGU diferiu estatisticamente entre as estações, com maior valor tendo sido observado no verão. Apesar de não se ter valores referência para caprinos locais, estes valores não podem ser considerados perigosos, uma vez que a TR se encontra dentro da normalidade, demonstrando não estar havendo estocagem de calor. A CTR apresentou-se maior (p<0,01) no turno da tarde com valores de 738,9 Wm -2 e 777,6 Wm-2 para o período chuvoso e seco, respectivamente. Houve diferença significativa entre as estações e o valor de CTR foi mais alto no verão, devido a alto valor de temperatura do ar e a temperatura de globo negro e baixa UR. 3.2 Mecanismos Anatomofisiológicos Na tabela 2 encontra-se a distribuição de frequência das características fenotípicas. Observa-se homogeneidade do padrão morfológico dos animais, com maior predominância de animais com brincos (Wa w), pelo curto (HL+), chifres (Ho+), barba (Brb), orelhas longas (EL+) e pelagem cinza. Os brincos e a barba são características que não possuem função adaptativa em caprinos, podendo ser considerada características neutras na seleção. O tamanho da orelha é definido por um par de alelos autossômicos de dominância incompleta EL+ e ELr. A condição homozigota para o alelo ELr gera encurtamento que quase anula a orelha (Lauvergne et al., 1987). Machado et al. (2000) observaram predominância total de orelhas longas em estudo comparativo de caprinos SPRD do Ceará com caprinos mediterrâneos europeus. O tamanho da orelha é um caráter adaptativo, tendo função termorreguladora devido ao elevado nível de 101 vascularização, que favorece troca de calor por convecção. No caso dos caprinos nativos as orelhas são de tamanho menor, refletindo a adaptação desses animais, facilita a movimentação dos animais na caatinga, bem como maior sensibilidade auditiva para escapar dos predadores. O caractere presença de chifre deve-se a expressão de um locus (locus hornless – Ho) autossômico de dominância completa em que o alelo Ho +, em homozigose recessiva da origem ao aparecimento de chifres, e o alelo Hop, que é dominante, produz a sua ausência (Lauvergne et al.,1987). Machado et al. (2000) observaram frequências para Ho+ que variaram de 0,89 a 0,94 para os caprinos SRD em várias regiões do Ceará. Oliveira et al (2006) pesquisaram caprinos nativos em dois municípios no Estado de Pernambuco e observaram presença de chifres em 93% dos animais do município de Ibimirim e em 79% dos animais do Município de Serra Talhada. Outro aspecto importante é que os caprinos das regiões semiáridas, na época de escassez de alimento, utilizam os chifres para retirar espinhos dos cactos para se alimentarem, sendo esta uma característica adaptativa adquirida ao longo dos anos. Tabela 2. Distribuição de frequência das características morfológicas em fêmeas caprinas do grupo genético Azul. Fenótipos Presença de brinco Presença de chifre Presença de barba Pelo curto Pele preta Orelha longa Alelos Waw Ho+ Br HL+ A EL+ Número 80 80 80 80 80 80 Frequência 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 Todos os animais apresentam do grupo genético Azul observados nesta pesquisa apresentaram barba, que é determinada pelo locus beard (Br), que contém os alelos Br b (barbado) e Br+ (selvagem), que é um gene autossômico ligado ao sexo, dominante nos machos e recessivo nas fêmeas. Machado et al. (2000) verificaram variabilidade neste locus para fêmeas caprinas SPRD no Estado do Ceará, tendo observado frequências que variaram de 0,37 a 0,56. O comprimento do pelo está determinado pelo locus hair (HL) com dois alelos. O HLL determina pelo longo e HL+ determina o pelo curto, sendo este dominante sobre o pelo longo, mas apresenta penetrância e expressividade incompleta (Rodero et al., 102 1996). Todas as cabras desta pesquisa apresentaram o pelo curto HL+, característica comum dos caprinos locais no Brasil e estão relacionadas a questões de adaptação a temperaturas altas. As características morfológicas do pelame são importantes na regulação do calor corporal, influenciando diretamente as trocas de calor entre o animal e o ambiente, sendo indicadores do grau de adaptação dos animais. Silva et al. (2001) e Maia et al. (2005) observaram que animais com pelo curto, grosso e bem assentado sob uma epiderme pigmentada, suportam melhor as condições do ambiente tropical. Podem-se observar na Tabela 3 os valores médios, máximo e mínimo para comprimento e diâmetro do pelo e espessura de pelame em cabras do grupo genético Azul. Estas variáveis auxiliam na definição do perfil adaptativo dos animais, pois possuem variação sazonal. Houve efeito de período (p<0,01) para as características anatômicas dos animais devido às condições edafoclimáticas de cada período do ano em estudo. Tabela 3. Médias e desvio padrão (µ±dp) dos parâmetros anatômicos do pelo em fêmeas caprinas do grupo genético Azul. Chuvoso Variável Seco µ±dp Mínimo – Máximo µ±dp Mínimo - Máximo DP (mm) 0,077b±0,010 0,061–0,092 0,080a±0,008 0,061–0,103 CP (cm) 4,010a±1,110 2,980–7,040 3,037b±0,470 2,460–4,440 EP (mm) 1,540a±0,350 1,000–2,000 1,204b±0,247 0,950–1,500 Médias nas linhas seguidas de letras diferentes diferem entre si pelo teste t (p<0,01) Diâmetro do Pelo (DP); Comprimento do Pelo (CP), Espessura do Pelame (EP). No período chuvoso o pelo apresenta-se mais longo e com menor diâmetro com a finalidade de reter o ar quente para aquecer. No período seco o pelo é menor e com diâmetro maior, permitindo assim a circulação de ar, resfriando a pele. Os animais no período chuvoso apresentam espessura de pelame maior (p<0,01), o que é interessante para proteger os animais do excesso de vento. No período seco a espessura de pelame foi menor para facilitar a dissipação de calor. 103 Na Tabela 4, observa-se diferença significativa (p<0,01) de turno do dia e período do ano sobre a temperatura retal (TR), temperatura superficial (TS), frequência respiratória (FR), frequência cardíaca (FC) e gradiente térmico (TR-TS). A TR apresentou-se maior (p<0,01) no turno da tarde em ambos os períodos com valores de 39,7ºC no período chuvoso e 39,5°C no período seco, devido a grande amplitude térmica que ocorre durante o dia, superior a amplitude entre as estações. Estes achados estão de acordo com os de Medeiros et al. (2007) e Souza et al. (2008). Entre as estações a TR não apresentou diferença significativa, mantendo-se dentro do limite de tolerância para a espécie. A TR manteve-se dentro do limite para a espécie caprina, indicando que os animais lançaram mão de mecanismos de dissipação de calor com eficácia, com o aumento da FR e TS. Tabela 4. Médias e desvio padrão (µ±dp) dos parâmetros fisiológicos em fêmeas caprinas do grupo genético Azul. Período Turno TR FR FC TS TR-TS (°C) (mov./min.) (bat./min.) (°C) (°C) µ±dp µ±dp µ±dp µ±dp Chuvoso Seco d 27,5±6,4 d d µ±dp 78,5±11,3 35,5±0,3 d 4,0±0,5a Manhã 39,5±0,4 Tarde 39,7±0,4a 34,2±6,7c 85,5±16,3c 37,8±1,4c 1,9±1,2b Média 39,6±0,4A 30,8±7,3B 82,0±14,3B 36,7±1,5B 3,0±1,4A Manhã 39,2±0,6d 38,0±8,6a 92,6±20,6a 39,9±2,1b -0,7±2,0c Tarde 39,5±0,6c 36,3±12,5b 88,5±22,5b 41,1±2,7a -1,6±2,5d Média 39,4±0,6A 37,1±10,7A 90,5±21,5A 40,5±2,5A -1,2±2,3B Letras iguais na coluna não diferem entre si pelo teste t (p<0,01). Temperatura Retal (TR); Temperatura Superficial (TS); Frequência Respiratória (FR); Frequência Cardíaca (FC); gradiente térmico temperatura retal-temperatura superficial (TR-TS). Observou-se variação diária TR de 0,3°C e 0,2°C, no período chuvoso e seco seca, respectivamente. Segundo Martello (2002) e Piccione e Refinetti (2003), esta variação pode ser de 0,3 a 1,9⁰ C. Os animais lançaram mão de vários mecanismos de dissipação de calor com eficácia, pois mesmo em altas temperaturas, como é o caso do período seco, os animais mantiveram a TR dentro do limite indicados para espécie. Isto é indicativo de boa capacidade adaptativa dos animais a condições estressantes. Rocha (2006) estudou caprinos da raça Saanen e do grupo genético azul e concluíram que o grupo Azul 104 apresentou TR superior aos Saanen, indicando menor capacidade de manutenção da TR. No entanto, este valor não acarretou aumento de estresse visto não ter ocorrido elevação da FR. Este resultado pode ser indicativo da adaptação às altas temperaturas e seleção natural desses animais, causada por alteração do ponto termorregulador a nível central ou da sensibilidade dos receptores de temperatura para um limiar mais alto. A FR é um bom indicador de estresse térmico e é muito usado para enfrentar as adversidades climáticas. No presente trabalho a FR (p<0,01) no turno da manhã do período seco apresentou-se mais elevada que durante a tarde. A FR alta não significa que o animal está em estresse térmico, pois ela é mais um parâmetro de termorregulação. Neste trabalho para manter a TR dentro do limite fisiológico, os animais aumentaram a FR, mas mantiveram dentro do limite indicado como normal para a espécie, sendo eficientes em eliminar calor. A FC apresentou valor médio maior (p<0,01) no período seco devido ao fato de que em temperaturas altas ocorre vasodilatação periférica e diminuição da pressão sanguínea, para diminuir a produção de calor. Porém, se os animais permanecem sob estresse térmico por calor ocorre aumento na FC. Estudos realizados por Medeiros et al. (2007), Souza et al. (2008) e Silva et al. (2010) indicaram que, à medida que a TA aumenta, a FC também aumenta, mostrando-se superior no turno da tarde. A TS apresentou-se superior (p<0,01) no turno da tarde, indicando que acessou os mecanismos de dissipação de calor como aumento na FR, com o intuito de perder calor para o meio. Quando a UR é baixa e a temperatura do ar é superior a TS do animal, a dissipação de calor por trocas sensíveis não é eficiente. Em ambiente com altas UR a dissipação de calor por FR é comprometida, pois o ar estará carregado de água em suspensão e a capacidade de reter novas quantidades de água é menor. No presente trabalho, o gradiente térmico (TR-TS) foi maior no período chuvoso (p<0,01). À medida que a TA aumenta, o gradiente diminui devido ao comportamento inverso entre temperatura do ar e gradiente térmico TR-TS. O gradiente térmico TR-TS apresentou-se maior no período chuvoso, pois a temperatura da pele apresentou valores bem inferiores aos da temperatura do ar. Na seca, o gradiente foi menor, diminuindo a eficiência da perda de calor pela superfície da pele e aumentando a perda de calor pela respiração. O aumento da TA é seguido de aumento na TR do animal e diminui a eficiência das perdas de calor sensível devido ao menor gradiente existente entre TR e TS. Se a TA continua aumentando, o animal começa a perder calor pela respiração (insensível), 105 diminuindo ainda mais o gradiente existente. Nestes casos, as perdas pelas vias sensíveis tornam-se ineficazes. Observou-se correlação moderada entre TA e TS (0,41) e baixa entre TA e TR (0,15), indicando independência entre essas variáveis e que e que estes animais são bem adaptados às intempéries climáticas da região em estudo. Os redirecionamentos do fluxo sanguíneo para a superfície corporal e a vasodilatação contribuem para incremento da temperatura da pele e facilitam a dissipação de calor por mecanismos não evaporativos. Quando a temperatura do ar se eleva, o gradiente térmico entre a superfície do corpo e o meio diminui, dificultando a dissipação de calor e fazendo com que o animal acesse os mecanismos evaporativos, como a frequência respiratória. 3.3 Mecanismos eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais Os valores médios dos parâmetros eritrocitários e bioquímicos de fêmeas caprinas do grupo genético Azul nas duas estações em estudo são apresentados nas Tabelas 5 e 6. Houve efeito de período do ano (p<0,01) sobre os eritrócitos, hematócrito, hemoglobina, volume globular médio e concentração de hemoglobina globular média. Para manter a homeotermia, ou seja, para manter a temperatura retal e a frequência respiratória dentro do limite recomendado para a espécie, os animais usaram mecanismos adaptativos como modificações nos parâmetros eritrocitários. Ajustaram os eritrócitos para sobreviverem a escassez de alimento e água como também as altas temperaturas. Observa-se que no período seco houve uma baixa produção dos eritrócitos ou hemácias com a alta temperatura as células são produzidas em pequena quantidade, e como neste esta a hemoglobina consequentemente a produção da hemoglobina também é baixa. Ocorrendo o inverso com o hematócrito, o valor deve apresentar-se mais alto no período seco, pois ocorre uma hemoconcentração devido à desidratação. Nesta pesquisa observa-se que o valor do hematócrito foi mais baixo no período seco do que no inverno, pois os animais foram submetidos a estresse prolongado. Houve efeito significativo (p<0,01) de período sobre a hemoglobina, com valor mais alto no período seco. Ocorre liberação de oxigênio de forma mais rápida no estresse térmico acarretando aumento da hemoglobina. Os demais parâmetros apresentaram valores de acordo com os citados por Kaneko et al. (2008). 106 Tabela 5. Média e desvios padrão (µ±dp) dos parâmetros eritrocitários em fêmeas caprinas do grupo genético Azul. Variável Chuvoso (38,7ºC) Seco (43,5ºC) µ±dp Mínimo–Máximo µ±dp Mínimo–Máximo Er (x106/ml) 17,8±2,1a 14,5–23,4 14,6±4,1b 9,4 – 22,1 He (%) 38,2±3,6a 34,0-49,0 23,0±6,4b 12,0-34,0 Hb (g/dl) 12,7±1,2a 11,3-16,3 10,4±3,5b 7,2-21,1 VGM (f/l) 21,8±2,7a 17,0-27,5 7,7±2,1b 4,0-11,3 CHGM (g/dl) 33,3±0,1 33,2-33,4 33,3±0,1 33,1-33,5 Médias nas linhas seguidas de letras diferentes diferem entre si pelo teste t (p<0,01). Eritrócitos (Er), Hematócrito (He), Hemoglobina (Hg); Volume globular médio (VGM); Concentração de hemoglobina globular média (CHGM). Na Tabela 6, observa-se efeito de período sobre os parâmetros bioquímicos sanguíneos (p<0,01). No verão, período em que as temperaturas são altas, ocorre aumento do requerimento de glicose pelo animal, com mobilização de triglicérides, com valores mais altos no verão (p<0,01), para ser usado como fonte de energia. Os valores encontrados neste trabalho estão de acordo com os observados por Carlson (1994); Kaneko et al. (2008) e Mundim et al. (2007). Os valores de colesterol diferiram significativamente (p<0,01) entre as estações, o que justifica o efeito do estresse térmico sob os níveis de colesterol do que o estresse nutricional. Isto ocorre devido ao aumento da utilização de ácidos graxos para a produção de energia, como uma consequência da diminuição na concentração de glicose em animais estressados termicamente, o que corrobora com Rasooli et al. (2004). O valor do colesterol diminuiu no período seco, pois este é o precursor do hormônio cortisol, sendo a produção de cortisol aumentada na seca (Tabela 7). A creatinina apresentou valores menores no período seco (p<0,01), isto porque com aumento da temperatura ambiente ocorre aumento na frequência respiratória e diminuição no valor da creatinina presente no músculo. Estes valores diminuem à medida que a frequência respiratória aumenta, devido ao catabolismo lento. A correlação existente entre a creatinina e frequência respiratória foi de 0,38 e a correlação da creatinina e temperatura ambiente foi de -0,36. 107 Tabela 6. Média e desvios padrão (µ±dp) dos parâmetros bioquímicos sanguíneos em fêmeas caprinas do grupo genético Azul Chuvoso (38,7ºC) Seco (43,5ºC) Variável µ±dp Mínimo–Máximo µ±dp Mínimo–Máximo Glicose (mg/dl) 100,8±6,2 78,1–112,2 99,7±4,6 88,0–106,3 Ureia (mg/dl) 75,6±12,5 41,9–98,3 76,1±14,1 58,0–94,0 Colesterol (mg/dl) 204,4±14,3a 180,0–234,7 164,6±36,2b 55,0–199,2 Triglicérides (mg/dl) 13,7±20,5b 11,3–20,5 16,9±39,3a 10,9–24,0 Creatinina (mg/dl) 1,3±0,4a 0,6 – 1,9 1,1±0,4b 0,7–1,8 Proteína Total (g/dl) 3,8±0,4 3,0-4,3 7,2±0,7a 6,3–9,7 Albumina (g/dl) 1,7±0,5b 0,9–3,0 2,8±0,4 2,0–3,8 Globulina (g/dl) 2,1±0,6b 0,7–3,4 4,4±0,8a 2,9–7,0 A/G 0,8±0,8a 0,4–1,5 0,6±0,2b 0,3–1,2 GGT (U/l) 40,9±8,5a 27, – 70,0 38,7±8,8a 27,0–70,0 AST (U/l) 81,2±15,0a 34,6–99,9 72,6±13,3b 38,0-95,0 ALT (U/l) 68,6±17,4b 50,2-118,8 96,8±11,0a 73,5-119,9 2,3±0,3b 1,7-3,3 2,7±0,5a 1,6-3,9 Magnésio (mg/dl) Médias nas linhas seguidas de letras diferentes diferem entre si pelo teste t (p<0,01). relação albumina e globulina (A/G), gama glutamiltransferase (GGT), aspartato aminotransferase (AST) e alanina amino transferase (ALT). A proteína total apresentou diferença significativa (p<0,01) entre as estações do ano, sendo mais alta no período seco. Os valores da proteína total são medianamente relacionados de forma positiva com a temperatura ambiente (0,50). Os níveis de globulinas foram mais altos na seca, favorecendo a adaptação ao estresse. Diferenças no valor da globulina estão ligadas aos fatores fisiológicos e genéticos da adaptação do animal. Abdalla et al., (2009) e Al-Elissa et al. (2012) relataram nível de globulina maior no período chuvoso, resultando em concentrações baixas na relação albumina/globulina no período seco. Houve efeito significativo de periodo para as enzimas GGT, AST e ALT, sendo diferentes dos estabelecidos por Kaneko et al. (2008) e Mundim et al. (2007). Os valores de GGT e AST apresentaram-se mais altos no período chuvoso, já ALT 108 apresentou valor mais alto no período seco e alta correlação com a TA (0,38). Estas enzimas são importantes na avaliação de distúrbios metabólicos, funcionamento hepático, alterações ósseas e na adaptação dos animais as adversidades climáticas (Gonzalez e Silva, 2006). Os valores para magnésio entre os períodos foram diferentes significativamente (p<0,01) apresentando valor mais alto no período seco, corroborando com o valor citado por Kaneko et al. (2008). O magnésio ajuda a converter o açúcar do sangue em energia. Definido também como o mineral anti-estresse, o magnésio regula os batimentos cardíacos e os coágulos sanguíneos (Amorim e Tirapegui, 2008). Houve efeito significativo de período (p<0,01) sobre os níveis hormonais (Figura 2), evidenciando a influência da ação conjunta das variáveis meteorológicas estudadas sobre a fisiologia endócrina e termorreguladora dos animais. Observou-se declínio dos níveis plasmáticos de T3 e T4 nas fêmeas, no período seco. Estes resultados assemelham-se aos de outras pesquisas que tem demonstrado a existência de relação inversa entre as concentrações de hormônios tireoidianos e TA em caprinos, sendo um mecanismo adaptativo para reduzir a produção de calor. Com isto, estes animais mantiveram a TR dentro do limite para a espécie caprina. Já no período chuvoso, houve redução na temperatura, assim os hormônios tireoidianos apresentaram valores mais altos. A média de cortisol maior foi registrada no verão (p<0,01). Durante esse periodo observou-se maior média de temperatura do ar (Tabela 1), o que influenciou a concentração sanguínea de cortisol, pois a alta temperatura dificulta o processo de termólise nos animais. As concentrações de cortisol obtidas neste estudo (Figura 2) foram próximas aos valores médios descritos por Encarnação (1989), porém inferiores ao valor médio relatado por Minton et al. (1995). Esse estudo confirma as suposições de Yousef et al. (1967), McFarlane et al. (1995) e Dickson (1996) de que ocorre redução na atividade tireoidiana em resposta ao incremento da carga térmica sobre os animais, ao mesmo tempo em que se elevam os níveis de cortisol. 109 Figura 2 Concentração dos hormônios tireoidianos e cortisol nos períodos chuvoso e seco. A concentração de cortisol mostra-se positivamente correlacionada com a temperatura ambiente, já os hormônios tireoidianos possuem correlação inversa com a temperatura do ar, Tabela 7. Tabela 7. Correlações de Pearson entre os hormônios triiodotironina (T3), tiroxina (T4) e cortisol (COR) em função da temperatura do ar (TA). TA T4 T3 T4 -0,55** T3 -0,57** 0,67** COR 0,92** -0,87** -0,89** **P<0,01 A concentração de cortisol correlacionou-se negativamente com concentração de T3 e de T4 (p<0,01). Aparentemente, o cortisol responde mais rapidamente ao estresse térmico, ao passo que o período de latência é maior nas respostas do T4 e T3. A secreção do cortisol ocorre como resposta ao estresse e pode-se observar na Tabela 8 que sua maior produção ocorreu no verão. Na Tabela 7, verifica-se alta correlação do cortisol com a temperatura do ar. Com o aumento da TA no verão (Tabela 1), ocorre aumento da concentração de cortisol, que tem como função manter a homeostase do animal. Após as primeiras modificações adaptativas que ocorrem no 110 animal, com o aumento nas FR e FC, TS e modificações no pelo do animal, o sistema HHA é ativado, promovendo aumento do nível de cortisol. A produção de colesterol diminui no período de estresse, pois este é precursor do cortisol. Já o cortisol apresenta alta concentração no verão, o qual tem a função de alterar o metabolismo de carboidratos, gordura e proteína. Esta mudança disponibiliza maior quantidade de substrato energético para as células, reduzindo o consumo de glicose por algumas células, com menor importância no estresse (Guyton e Hall, 2011). Isto explica a correlação inversa observada existente entre o cortisol e glicose (-0,45). Em momentos de jejum ou estresse o cortisol faz com que célula utilize triglicérides e proteína total como forma de energia, fato que também explica a correlação positiva de cortisol com triglicérides (0,46), com proteína total (54%) e negativa com colesterol (0,39). Os primeiros hormônios usados para avaliar situações estressantes são os glicocorticóides e as catecolaminas e, a secreção de glicocorticóides representa uma resposta endócrina clássica ao estresse (Kannan et al., 2000). 111 4. CONCLUSÕES Os animais do grupo genético Azul são animais adaptados às severas condições climáticas da sua região, pois mantiveram a temperatura retal dentro do limite para a espécie caprina sem grandes alterações na frequência respiratória. Os dados sanguíneos obtidos são os primeiros valores de referência a serem publicados para cabras do grupo genético Azul, aumentando a compreensão dos mecanismos utilizados por estes animais para adequar-se as variações bruscas de temperatura. Os parâmetros estudados apresentaram diferença de acordo com a temperatura do ar e umidade relativa, os hormônios tireoidianos e o cortisol, utilizados como indicadores de estresse térmico facilitaram o entendimento do processo adaptativo destes animais. 112 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABDALLA, M.; ABDELATIF, M.; IBRAHIM, Y. et al. Seasonal Variation in Erythrocytic and Leukocytic Indices and Serum Proteins of Female Nubian Goats. Middle-East Journal of Scientific Research, v. 4, n. 3, pág.168 -174, 2009. AL-ELISSA, M.S.; SAAD, A.; AL-FARRAJ, S.A. et al. Seasonal variation effects on the composition of blood in Nubian ibex (Capra nubiana) in Saudi Arabia. African Journal of Biotechnology. v. 11, n.5, pág.1283-1286, 2012. AMORIM, A.G. 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Os parâmetros bioquímicos sanguíneos (glicose, colesterol, triglicérides, creatinina, uréia, proteína total, albumina, globulina, relação albumina e globulina, gama glutamiltransferase e aspartato aminotransferase) e parâmetros hormonais (tiroxina, triidotironina e cortisol). Foram necessários quatro fatores para explicar a variação total. No primeiro componente as variáveis mais influentes pertencem ao metabolismo protéico. Os dois primeiros fatores juntos explicam 45% da variação total, sendo o perfil bioquímico, hormonal e a temperatura superficial os mais importantes na determinação do perfil adaptativo dos animais. Assim as ferramentas multivariadas foram eficientes na definição do perfil adaptativo dos animais e permitiu visualização adequada no espaço bidimensional, sem grande perda de informações. Palavras-chave: adaptação, componentes principal, hoemotermia, multivariada 118 Multivariate analysis for the adaptive profile of Azul breed Brazilian goat ABSTRACT The aim of this research was to characterize the adaptive profile of the Azul brazilian genetic group by principal component and discriminant analysis. Forty females were used in the rainy and forty in the dry season, all adult and lactating. Physiological parameters used were rectal temperature, respiratory rate, heart rate and skin temperature. The anatomical parameters used were the diameter and length of the hair. It had been used hematological parameters (erythrocyte, hematocrit and mean corpuscular volume), blood biochemical parameters (glucose, cholesterol, triglycerides, creatinine, urea, total protein, albumin, globulin, albumin and globulin, gamma glutamyl transferase and aspartate aminotransferase) and hormonal parameters (thyroxine, Triiodothyronine and cortisol). Five components were needed to explain the total variation. In the first part the most influential variables belong to protein metabolism. The first two factors together explain 45% of the total variation and the biochemical profile, erythrocyte, hormonal and surface temperature were the most important in determining the adaptive profile of the animals. Thus the multivariate tools were effective in defining the adaptive profile of animals and allowed adequate visualization in two-dimensional space, without much lack of information. Keywords: adaptation, hoemotermia, main components, multivariate 119 1. INTRODUÇÃO O estresse por calor é considerado um fator limitante para a produção de caprinos na região Nordeste. Animais bem adaptados são caracterizados para manter a sua produtividade e alta resistência a ecto e endoparasitas. Várias características fisiológicas são utilizadas para avaliar a adaptação animal em climas adversos (McManus et al., 2010). Para ruminantes em geral, criados em regiões tropicais, o mecanismo de termólise considerado mais eficaz é o evaporativo, uma vez que nesses ambientes a temperatura do ar tende a ser próxima à da superfície cutânea, neutralizando as trocas térmicas por condução e convecção (Souza Junior et al., 2008). Estabelecer relações encontrar ou propor, leis explicativas, é papel próprio da ciência. Para isso, é necessário controlar, manipular e medir as variáveis que são consideradas relevantes ao entendimento do fenômeno analisado. Muitas são as dificuldades em traduzir as informações obtidas em conhecimento principalmente quando se trata da avaliação estatística das informações (Vicini, 2005). A análise individual das características é importante para descrever o comportamento das variáveis e sua variação individual, o que possibilita a definição de padrões máximos e mínimos. No entanto, a análise individual dificulta a compreensão do fenômeno de forma global. Nessa perspectiva, a análise multivariada representa uma técnica estatística de extrema importância, pois permite análise do perfil adaptativo individual de um grupo de animais através da aplicação de diferentes métodos (Zepeda et al., 2002). Várias são as ferramentas estatísticas utilizadas para auxiliar na determinação do perfil adaptativo dos animais. Uma vantagem desse método é que pode ser aplicado a dados qualitativos e quantitativos. A análise multivariada é um vasto campo, no qual até os estatísticos experientes movem-se cuidadosamente, devido esta ser uma área recente da ciência, pois já se descobriu muito sobre esta técnica estatística, mas muito ainda esta para se descobrir (Magnusson, 2003). Dentre essas técnicas, a análise de componentes principais e discriminante têm sido utilizadas para descrever perfis e classificar elementos de uma população. Como as demais, estas são técnicas que permitem avaliar as inter-relações entre as variáveis em estudo e sumarização dos dados (Rosa, 1999). Ou seja, busca reduzir um conjunto 120 original de variáveis a um número menor de ―fatores‖ independentes, facilitando a interpretação. A necessidade da utilização da análise multivariada de caracteres no estudo de variação de organismo foi reconhecida há muito tempo por sistematas e evolucionistas. É importante em estudos de populações com base no fenótipo, podendo verificar as diferenças existentes quando todas as variáveis são analisadas conjuntamente (Gould e Johnston, 1972; Dossa et at., 2007). O objetivo desta pesquisa foi caracterizar o perfil adaptativo de caprinos do grupo genético brasileiro Azul através de análise de componentes principais e discriminante. 121 2. MATERIAL E MÉTODOS O estudo foi conduzido nos períodos seco (verão) e chuvoso (inverno), em uma propriedade do município de Caiçara do Rio do Vento, no Rio Grande do Norte, a latitude 5º45’36‖ sul e longitude 35º59’52‖ oeste, a 175m de altitude, no Brasil. O clima da região é tropical com estação seca, segundo a classificação climática de Koppen é do tipo As. Com temperatura média anual de 27,2°C, temperatura máxima de 33,0ºC e temperatura mínima de 21,0ºC. Foram avaliadas 80 fêmeas do grupo genético Azul, sendo 40 no período chuvoso (julho) e 40 no seco (dezembro), todas em lactação, criadas extensivamente. As coletas foram realizadas em 2 dias seguidos em cada período, as condições climáticas eram semelhantes àquelas esperadas para a região em ambos os períodos. A idade dos animais foi obtida indiretamente pela análise da cronometria dentária devido à ausência de escrituração zootécnica na propriedade, sendo todas classificadas como adultas (acima de 2 anos de idade). Observa-se as medidas fisiológicas duas vezes ao dia às 8:00 horas e as 14:00 horas nos dois períodos em estudo. Todos os animais eram sadios e esse padrão foi definido em função do estado sanitário dos animais avaliados através do FAMACHA (coloração da conjuntiva), presença de ectoparasitas, linfadenites ou algum outro tipo de problema na pele. As variáveis fisiológicas: temperatura retal (TR), frequência respiratória (FR) e frequência cardíaca (FC) bem como a temperatura superficial (TS) foram verificadas em cada animal nos turnos da manhã e tarde nos dois períodos (chuvoso e seco). Temperatura retal (TR) A temperatura retal (TR) dos animais foi aferida no inverno e no verão, nos turnos manhã e tarde. Utilizou-se um termômetro clínico digital com escala de 32 a 43,9°C, o qual era introduzido no reto de cada animal, com o bulbo em contato com a mucosa, permanecendo no reto até que o termômetro emitisse um sinal sonoro, que era indicativo da estabilização da temperatura. Frequência respiratória (FR) e Frequência Cardíaca (FC) As frequências respiratória (FR) e cardíaca (FC) foram mensuradas no inverno e no verão, nos dois turnos do dia (manhã e tarde) através da auscultação indireta das bulhas, com o auxílio de um estetoscópio flexível, ao nível da região laringo-traqueal, 122 contando-se o número de movimentos e batimentos durante 20 segundos e, o resultado multiplicado por 3 para obtenção da frequência por minuto. Temperatura superficial (TS) Utilizou-se um termômetro infravermelho digital para obtenção da temperatura superficial dos animais (TS), sendo as leituras realizadas nos dois períodos (inverno e verão) e em dois turnos (manhã e tarde). Essa leitura foi realizada no costado dos animais, mesmo local de coleta dos pelos. As amostras de sangue de cada animal foram coletadas no turno da tarde em ambas os períodos (seco e chuvoso), através de punção na veia jugular, após assepsia com álcool iodado, com mínimo de traumatismo. Foram usadas agulhas de calibre 0,8x25mm. Para análise eritrocitária foram usados tubos à vácuo de 5ml contendo anticoagulante etileno diaminotetracetato de sódio (EDTA) a 10%. As amostras de sangue foram mantidas em caixas isotérmicas com gelo até chegada ao laboratório de Fisiologia Animal e Biologia Molecular (UFPB-CCA). A contagem de eritrócitos (Er) foi realizada em câmara do tipo Neubauer modificada, através da diluição das células, utilizando-se uma pipeta semi-automática de 20 microlitros conforme preconizado por Vallada (1999). Para determinação do hematócrito (Ht) foi usada à técnica do microhematócrito por 15 minutos, conforme descrito por Ayres et al. (2001), na qual se utilizaram tubos capilares homogêneos de 75 milímetros de comprimento por um milímetro de diâmetro. A determinação do teor de hemoglobina (Hb) no sangue foi realizada pelo método da cianometahemoglobina, conforme técnica descrita por Mello (2001), utilizando o analisador bioquímico automático, BIOPLUS 2000, com auxílio de kit comercial próprio para dosagem de hemoglobina, LABTEST DIAGNOSTIC. Os índices hematimétricos absolutos: volume globular médio (VGM) e concentração de hemoglobina globular média (CHGM) foram obtidos através da contagem do número de Er, Ht e do teor de hemoglobina (Hb), segundo Ferreira Neto e Viana (1977). Para análise da glicose foi coletado 7 ml de sangue, em tubo Vacutainer com gel separador e tubo Vacutainer com fluoreto de sódio. As amostras de sangue foram transportadas imediatamente em caixas isotérmicas ao laboratório da UFPB-CCA, centrifugadas em centrífuga digital a 4°C, a 3000 rotações por minuto durante quinze minutos. O sobrenadante resultante da centrifugação foi separado em alíquotas de 123 1,5mL para dosagens bioquímicas e hormonais, no dia seguinte a coleta realizada no laboratório na UFPB-CCA. Foram mensuradas as concentrações séricas de proteína total (PRT) – pelo método colorimétrico biureto; albumina (ALB) – pelo método colorimétrico bromocresol; glicose (GLI) – pelo método GOD-Trinder; triglicérides (TRI) – pelo método enzimático Trinder; colesterol (COL) – pelo enzimático Trinder; uréia (URE) pelo método uréase Labtest; magnésio (Mg) – pelo método Labtest; creatinina (CRE) – pelo método Labtest; Gamma GT SL (GGT) – pelo método cinético Szasz modificado; aspartato aminotransferase (AST) – pelo método cinético UV-IFCC; alanina amino transferase (ALT) – pelo método cinético UV-IFCC. Todos os procedimentos foram realizados utilizando kits laboratoriais de uso comercial (Labtest) e as leituras foram feitas com auxílio do espectrofotômetro com comprimento de onda múltiplo. As concentrações plasmáticas de cortisol, trioxina (T4) e triiodotironina (T3) foram analisadas em duplicatas mediante técnica ELISA, utilizando kits laboratoriais de uso comercial (INVITRO), desenvolvidos para avaliação quantitativa dos hormônios. Como estes hormônios são circadianos com pico alto no início da manhã, coletou-se o sangue no turno da tarde para entender como o grupo genético Azul utiliza os mecanismos adaptativos em um período de alta temperatura. A análise de componentes principais (ACP) consiste em definir o número de componentes que irão compor as combinações lineares para formar as novas variáveis. O número de componentes foi escolhido mediante os autovalores, pelo critério sugerido por Kaiser (1960) apud Mardia (1979), que consistiu em incluir somente aqueles componentes cujos autovalores superiores a 1 e, as análises foram realizadas com auxílio do software Statistica (versão 8.0). 124 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Na Tabela 1, apresenta-se o resultado dos autovalores, bem como a porcentagem de variância explicada por cada componente, e também a variância acumulada pelas mesmas. Observa-se que foram necessários 5 componentes para explicar as características adaptativas, explicando 67,65% de variação total. O fato de que nenhuma variável consegue individualmente caracterizar de maneira adequada a unidade experimental, ou consegue discriminar indivíduos com relação a qualquer critério que seja empregado, é a principal justificativa do experimentador para medir diversas variáveis em cada unidade. No primeiro componente a variação acumulada não é alta, isto ocorre devido a diferença na natureza das variáveis estudadas. Para compreender como os animais usam os mecanismos adaptativos observamse na Tabela 3 os pesos das variáveis para cada componente para as 17 variáveis estudadas em fêmeas caprinas do grupo genético Azul. No primeiro componente as variáveis: proteína, hematócrito, cortisol e T4 são as mais relevantes e melhor explicadas por este componente. Tabela 1. Componentes principais, autovalores, e porcentagem da variância por componentes, e variância total de fêmeas caprinas do grupo genético Azul CP Autovalores Variação Simples (%) Variação acumulada (%) 1 5,580410 32,82594 32,8259 2 2,091322 12,30189 45,1278 3 1,433009 8,42947 53,5573 4 1,236530 7,27370 60,8310 5 1,160273 6,82513 67,6561 No segundo componente destacam-se as frequências respiratória e cardíaca e a temperatura retal, sendo a FC a mais pesada neste componente. Isto indica o grau de importância dessas variáveis na definição do perfil adaptativo dos animais do grupo genético Azul. Sendo a proteína total, globulina, hematócrito, T4 e cortisol são os mais relevantes no primeiro componente. A tiroxina (T4) e o cortisol são de relevância no primeiro componente, pois quando a temperatura retal aumenta o animal usa 125 mecanismos para dissipar calor, um exemplo é o aumento na produção de cortisol e diminuição do hormônio tireoidiano, para tentar equilibrar novamente a temperatura retal. Tabela 2. Correlações entre as variáveis e respectivos componentes em fêmeas caprinas do grupo genético Azul Variável CP 1 CP 2 CP 3 CP 4 CP 5 Glicose 0,071751 -0,144503 -0,353628 0,508447 -0,554754 Colesterol 0,646910 0,033581 -0,118341 -0,128778 -0,127302 Triglicérides -0,556694 -0,027078 -0,014531 0,406377 0,377935 Ureia 0,015355 -0,320801 0,517215 0,480433 -0,016997 Proteína total -0,906558 0,032142 0,018122 -0,269025 0,020614 Globulina -0,821408 -0,011914 0,062117 -0,380128 -0,024880 Magnésio -0,443633 -0,063661 -0,408160 0,270487 -0,081521 Eritrócitos 0,564032 -0,187735 0,436560 -0,177665 -0,295185 Hematócrito 0,808974 -0,315644 0,158293 0,183698 0,075324 Hemoglobina -0,631251 -0,296350 0,013411 0,236484 0,264377 T4 0,796983 0,204730 -0,257007 0,084683 0,290100 T3 0,493597 0,136520 -0,336223 -0,060274 0,551270 Cortisol -0,658674 -0,083519 0,094555 0,206477 0,146425 Temperatura retal 0,237496 0,674660 -0,247433 0,205469 -0,124816 Frequência respiratória -0,069504 0,659490 0,483486 0,218763 0,067942 Frequência cardíaca -0,022979 0,800914 0,329998 0,103308 0,000063 Temperatura superficial -0,638569 0,372366 0,329998 0,003959 -0,305132 126 No estresse térmico por calor o primeiro hormônio usado para avaliar as situações de estresse é o cortisol. O aumento na concentração deste hormônio é observado em períodos de altas temperaturas, diminuindo assim o calor metabólico. O cortisol limita a utilização da glicose e mobiliza as reservas de triglicerídeos, as proteínas e os carboidratos, para serem utilizados como fonte de energia. (Alaniz et al.,2006). A globulina caracteriza se o animal é adaptado ou não, de acordo com seu valor. O cortisol apresenta função inversa ao primeiro componente, porém com relevância. A alta concentração destes hormônios acarreta em aumento na atividade metabólico, como consequência aumenta o consumo de oxigênio, aumento da frequência cardíaca e frequência respiratória, reduzindo o estresse térmico e mantendo a temperatura retal. O hematócrito é usado para determinar se o animal está em estresse agudo ou crônico. O alto grau de estresse crônico ao qual estes animais foram submetidos, a desidratação afeta o nível de hematócrito. O segundo componente é o fisiológico, formado pela frequência cardíaca, frequência respiratória e temperatura retal, variáveis também com variação considerável. O primeiro contato com o estresse acarreta aumento na frequência cardíaca, esta não é controlada por receptores de temperatura e sim por quimiorreceptores e mecanorreceptores. O aumento da frequência cardíaca aumenta o fluxo sanguíneo distribuindo as substâncias, como por exemplo, os hormônios (Reece, 2006). A temperatura retal e a frequência respiratória são indicadores da temperatura corporal do animal. Parâmetros utilizados para determinar o grau de adaptabilidade dos animais, uma vez que a elevação dessas variáveis indica que o animal está estocando calor e dissipando pela forma evaporativa. De acordo com Cunnigham (2004) alterações nos parâmetros fisiológicos são evidencias de tentativas orgânicas a que os animais recorrem para sair da condição de estresse. Em pesquisa semelhante a esta, pode-se priorizar àquelas que se destacaram nos dois primeiros componentes. Isto porque o primeiro componente retém a maior porção da variação total dos dados, o segundo componente retém a segunda maior porção e, assim sucessivamente para os demais componentes (Cruz e Regazzi, 2003). Para definir o perfil adaptativo do grupo genético Azul os dois componentes respondem bem. As 5 variáveis destacadas nesta pesquisa e que foram importantes na definição do perfil, podem ser destacadas em um sucessivo trabalho com esta raça no mesmo ambiente, 127 assim reduzindo mão de obra e gastos excessivos. Considerando os dois primeiros componentes, que apresentam as maiores variações são necessárias apenas 5 variáveis, proteína, globulina, hematócrito, cortisol e T4. Figura 1 mostra a representação do componente principal para as variáveis fisiológicas, bioquímicas, hematológicas e hormonais de fêmeas do grupo genético Azul. Os dois primeiros fatores explicam 45,129% do total da variação entre as características (Fgiura 1). As variáveis localizadas mais distantes do ponto zero do eixo X e Y são representantes do primeiro e do segundo componente, e possuem maior variação. Observa-se que proteína e a globulina apresentam-se opostas ao hormônio tireoidiano. 1,0 FC TR FR 0,5 CP 2 : 12,30% TS T4 T3 0,0 PROT GLO COL TRI COR Mg GLI Hg Er He URE -0,5 -1,0 -1,0 -0,5 0,0 0,5 1,0 CP 1 : 32,83% Figura 1. Distribuição das características estudadas nos dois planos (CP 1 e CP2) de caprinos do grupo Azul, do Brasil 128 4. CONCLUSÕES Os animais do grupo genético Azul utilizaram o metabolismo proteico com grande relevância para determinação do perfil genético adaptativo do grupo, seguido pelos hormônios T4, cortisol, proteína, globulina, hematócrito, temperatura retal, frequência cardíaca e respiratória. 129 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AYRES, M. C. C. et al. 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As populações de caprinos nativos guardam uma diversidade genética única e que diferi das raças melhoradas, devendo ser conservada, uma vez que seus agrupamentos genéticos ou raças desempenham um papel importante na economia, na formação histórica e cultural de vários povos. O estudo da diversidade genética dos recursos genéticos animais tem sido alvo de interesse de pesquisadores, e, aqueles conscientes dos efeitos negativos produzidos pela perda da variabilidade genética desses recursos naturais. Esses animais que atualmente são importantes para agricultura e para produção de alimentos são o resultado de um processo de domesticação, de seleção natural, onde apenas aquelas espécies que podiam resistir a determinada região sobreviviam, levando esses animais a adquirem características de adaptação particulares onde se estabeleceram e de seleção artificial, motivada para atender as necessidades humanas. A conservação das populações ou raças refere-se a medidas que são tomadas com vista a garantir a sobrevivência de uma população de animais. Um dos grandes obstáculos para conservação de qualquer recurso genético é a falta de caracterização do mesmo. A escassez de informações sobre o recurso, sua identidade como grupo genético, suas potencialidades produtiva, reprodutiva e de adaptação, dificultam seu processo de conservação, além da descoberta de um nicho mercado que possa inserir o recurso de forma efetiva no sistema produtivo, valorizando assim os produtos oriundos dele. Com as mudanças bruscas no clima estes são os animais que irão realmente resistir, animais estes que passaram por evolução, seleção natural para ajustar as características ao ambiente no qual são criados. Foi possível verificar que a raça italiana nariva Garfagnina e o nativo grupo genético brasileiro Azul, apresentam mecanismos adaptativos diferenciados. Estas raças, em sua região de origem apresentam maior capacidade de manter a temperatura retal dentro do limite ideal com pequena variação da frequência respiratória e frequência cardíaca. 133 Para manter a temperatura retal sem grandes variações na frequência respiratória os animais utilizam mecanismos adaptativos como o perfil metabólico, anatômicos, parâmetros eritrocitários, bioquímicos sanguíneos e hormonais. Os hormônios tireoidianos e o cortisol mostraram-se como fortes indicadores do nível de estresse dos animais das duas raças em clima tropical e temperado, sendo necessário mais estudo sobre este hormônio em caprinos nativos. Apesar dos caprinos serem considerados animais de rusticidade maior que outros ruminantes, ainda são poucos os estudos sobre seus mecanismos adaptativos. O conhecimento dos mecanismos adaptativos usados pelas raças locais em ambientes com frio ou calor intenso é importante, pois, permite minimizar as perdas que podem ocorrer com o impacto das mudanças climáticas.