9º Concurso Literário
Transcrição
9º Concurso Literário
9º Concurso Literário Educação para o Desenvolvimento Sustentável Érica Franco de Souza Fini 1º Escola Monteiro Lobato – Mogi Guaçu O ipê amarelo Amanhece. Pela fresta da janela entra a pri- teava como uma grande cobra virara apenas meira luz do dia que incomoda porque falta um filete de água suja e mal cheirosa. A mata uma lâmina da veneziana e o feixe bate bem ciliar se restringira a apenas alguns galhos no olho esquerdo. Mas não faz muita dife- secos e retorcidos, em nada parecido com rença, já que passou a noite praticamente a exuberância que protegia o leito. Fica tris- às claras. Algo o incomoda, mas não con- te. Lembra-se de quando a mãe pedia para segue precisar o quê. Insônia e suores ocu- ir até o mercado comprar pão, vê se não pam o travesseiro vazio ao lado. Pesadelos demora, moleque, senão fica murcho!, e ao seriam melhores, pois significariam alguns passar pela ponte, ficava admirando a força momentos de sono. daquele rio caudaloso de águas barrentas. Melhor a mãe não estar aqui para ver isso. Melhor levantar. Abre a janela e o que seus olhos veem fazem-no lembrar de Fabiano, Abaixa a cabeça em sinal de desapontamen- que ficara contente ao ver a enchente sumir to. Afinal, o que deu errado? Tantos projetos, com o perigo da seca imediata que aterrori- palestras, simpósios, congressos, campa- zava a família durante meses. Vidas secas: a nhas de conscientização. Conscientização. dele e a minha. Não precisava ser enchente; Repete pausadamente digerindo cada sílaba uma boa chuva já ajudava. pronunciada. Não faltou conscientização, já que o povo sempre teve ciência dos proble- Talvez seja essa paisagem que anda afu- mas. Não há como conviver com uma difi- gentando o sono. Tenta fazer uma ligação culdade e não ter consciência dela. Então o entre o cenário e a insônia. Será? Há algum que faltou? tempo tudo aquilo o incomodava demais, azucrinava demais, inquietava demais. Acha A tristeza dá lugar à indignação. Ele tentou, melhor sair do quarto para não ficar ainda ajudou, fez a sua parte. Não foi o único a se mais amuado. mobilizar. Toda uma comunidade se sentiu responsável, mas também não foi suficiente. Caminha até a porta, mas um barulho chama a sua atenção para a janela novamente. Sente um grande aperto no peito, mas não Quem dera fosse trovão! Mas só vê o céu consegue chorar. Melhor não desperdiçar azul alaranjado com cheiro de poeira de ce- mais água ainda. Volta-se novamente para mitério que custa a sair do nariz. Olha para o horizonte empoeirado. Estica a cabe- baixo e vê um caminhão velho descendo a ça para fora dos limites da janela e uma rua e soltando uma fumaça preta. explosão amarela arrebata seus olhos. A poucos metros há um ipê repleto de flo- – Chegou a chuva enlatada... res vivas contrastando com o marrom da paisagem. Já não consegue segurar as Já estava há três semanas sem água na tor- lágrimas. Sensibiliza-se. neira. Banho, só de canequinha. Valha-me, Deus! Mas hoje não era dia de receber a De repente, uma ideia passa pela sua ca- água. Teria que esperar. Pensou na cister- beça e, antes que ela vá embora, corre até na vazia há meses no corredor da casa. Se o criado-mudo, pega um lápis com marcas ainda chovesse só um pouco... de mordida na ponta e escreve em letras maiúsculas: sensibilização. Era o que fal- Desiste de sair do quarto. Com os cotovelos tava. Sente-se fortalecido para mais uma secos apoiados no batente da janela, fica a tentativa de reverter a situação. Corre em vislumbrar a secura. Não consegue acreditar direção à escada e desce pulando os de- no que vê. E pensar que há alguns anos isto graus de dois em dois. aqui era de um verde só. O rio que serpen- 2014 9º Concurso Literário Educação para o Desenvolvimento Sustentável 2º Jair Francisco Dias EMEB Francisco Piccolomini – Mogi Mirim Lar Ao homem cabe, e isso é sabido, ser o próprio rei de seu lar... assim dizia meu avô, principalmente quando nos levava para chupar laranjas em um banquinho colocado bem embaixo de uma enorme mangueira. E ria alto... contava sempre a mesma história, a da galinha e a raposa... enfim, as galinhas tinham medo de que o céu caísse e se refugiaram na toca da raposa que as enganou... resultado: o céu caiu para as galinhas. me preparando para mostrar o projeto que teria o título: como ter uma produção maior sem agredir a natureza, ou a melhor maneira de crescer conscientemente, ou recursos naturais e a importância de saber usá-los... sou péssimo em títulos... para falar e desenvolver sou bom... pode pedir que eu logo vou falando... que nem meu avô, minha avó era mais caladona, acho que ela gostava de ouvi-lo. A frase de meu avô ficava, insistentemente, “batendo” em minha cabeça, o ônibus não chegava... e de novo a frase ... pessoas começavam a se juntar... ia ter uma lotação no ônibus... e a frase voltava assim como a imagem dele, que eu achava que já havia esquecido.... ria alto... e pegava os restos de comida, as cascas e jogava em um buraco que havia feito perto do galinheiro pequeno com cerca de bambu... saía um cheiro ruim... e ele dizia a horta não tá bonita... não faz cara de nojo. Isso vira adubo e vocês são piores que as aves para devorar tudo... na hora de comer gostam, né! E dava uma enxada para cada um que estivesse perto para cuidar da horta, replantar e tirar capins. Um supetão. Uma buzinada. Um palavrão. Um sinal vermelho. trancos e barrancos, mas estava chegando ao local onde falaria dos projetos da nova plantação de cenouras... alfaces... não... quem plantava isso era meu avô. Quase quinze minutos de atraso e eu nem me lembrava mais do que iria falar. Desci do ônibus. Vi a “cara braba” do meu patrão. Nem olhei de lado. Entrei quase que correndo no edifício. “Titubeei”. Olhei impaciente para todos que me olhavam com uma certa... “ impacientes”. Comecei: Empurrões e a busca por um banco vazio... várias pessoas passaram a minha frente... Lar... a palavra que insistia...o riso de meu avô e a voz dele me dizendo lar... e pelo vidro da janela do ônibus vi a gente: eu e meus três irmãos correndo em volta da horta... e meu irmão levando bronca por subir na jabuticabeira que estava cheia de flor... e meu avô e minha avó mexendo na terra fazendo outra horta e colocando aquilo que ele chamava de adubo... logo nasceriam cenouras ali... um pedido de desculpa de alguém que pisou no pé do outro me trouxe de volta as preocupações daquele dia... a reunião, se o carro não houvesse quebrado já estaria, lá, Preparar para falar é preparar para plantar, nenhuma semente deve ser jogada fora, assim como nenhuma palavra. Não adianta mostrar fórmulas mágicas, é preciso crescer, é preciso produzir, mas também é preciso poder continuar a crescer e produzir, e hoje veio a mim a imagem de meu avô, que sabia respeitar o terreno onde plantava, onde tirava seu sustento, onde criou os filhos, ele sabia qual, isso na sua ignorância de estudos, era a época certa de cada planta, e qual devia ser o próximo cultivo para recuperar a terra, usava adubo que ele mesmo fazia com restos de comida e plantas. Ele tinha sua terra como seu lar... então, antes de falar sobre o projeto eu pergunto onde é seu lar?... Ri alto... vi nos olhos de muitos os olhos das galinhas com medo de que o céu caísse... muitos encontrariam raposas. Elaine Cristina Seco 3º EMEF Antônio Giovani Lanzi – Mogi Guaçu A/C - Aos cuidados de todos nós Estimado e inevitável Sr. Futuro, Pensei muito antes de escrever-lhe esta carta, pois não encontrava palavras para assumir a total vergonha por tudo de errado que ocorreu, e tampouco saberia como pedir-lhe perdão pelos exageros cometidos. Talvez o senhor considere muita ingenuidade todos os caminhos equivocados que contarei. Mas, por favor, tente compreender. O cenário era cheio de expectativas e vigorava a sensação do poder pleno, capaz de qualquer conquista. Qualquer uma que se quisesse. As intenções que prevaleciam eram focadas sempre no imediatismo e acreditava-se piamente que a “sabedoria” dos atos tornava perfeita a busca pelo sucesso. Foi uma fase em que não havia limites. Muitos foram os descuidos: exploração, devastação e pouco questionamento. Tinha-se o avanço da tecnologia a favor. O dinheiro era um notável aliado. Havia uma riqueza imensurável à disposição e inúmeras eram as possibilidades de ganhos abundantes. Mas, eis que um dia, sentiu-se na pele a sensação dos carentes. Ah, como lamentou-se o desperdício fútil... O excesso predominava nos feitos e nas ações. Por diversas vezes, e de maneira consecutiva, o abuso era cometido e sequelas negativas começaram a ser deixadas. Ora, Sr. Futuro, coloque-se nesse contexto. Todos os dias convivendo com a imensidão deste planeta; com o sonho humano de apossar o Universo; desfrutando do enriquecimento almejado pelas metas da evolução e ostentando um luxo extraordinariamente invejável e sedutor. O que poderia dar errado naquele momento? Esta resposta se fez tão evidente quanto a situação insustentável. Um dia faltou o ar (foi difícil respirar); houve sede (a água era escassa); desordenadamente fez frio e calor; tormento e tremor (o clima definitivamente não era dos melhores). O abatimento gene- 2014 ralizado se agravou. Antes, tudo era resolvido graças à abundância de recursos naturais disponíveis e, de repente, não se conseguiu mais realizar o dom da renovação. Iniciava-se um processo de autodestruição. Foi horrível! Foi desesperador! Em meio a esse conflito, razão e sensibilidade defendiam soluções contraditórias e de uma forma completamente agressiva e incoerente declarouse que a culpa era minha! Fui acusado de ser egoísta e arrogante por todo consumo praticado sem ponderação. Consideraram-me um vilão ganancioso e sem piedade, pois tal conduta causava consequências ameaçadoras a todos, inclusive a mim. A ocasião exigia mudança de atitude. Dali em diante uma nova postura se fez. Confiante. Corajosa. Solidária e principalmente generosa. Não foi um processo fácil, mas a cada dia muitos se comoviam com minha condição nessa história e voluntariamente passaram a colaborar. Com toda essa experiência, aprendeu-se enfim que o certo é agir a favor de uma consciência coletiva e que cada um deve repensar seus atos individuais. Sr. Futuro, dizem que os fins justificam os meios e posso lhe afirmar que foi pela vontade de encontrá-lo e recebê-lo com serenidade, que tantas providências foram tomadas para reparar tantos desatinos. Desejo muito que o senhor venha e que as coisas ainda lhe sejam tão boas quanto foram para mim um dia. Que todos o acolham com muita cautela e respeito, para que a sensatez em saber viver a vida se torne um compromisso, cultivado para sempre. Assinado: o Presente. P.S.: quando ler esta carta, eu já serei o Passado. Mas, um passado feliz e vitorioso, assim espero.