Lusitano por tabela - Revista Equitação Online

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Lusitano por tabela - Revista Equitação Online
NOTAS IBÉRICAS
Neste segundo artigo vou mais uma vez tentar aprofundar um tema delicado, mas de vital
importância para o futuro do cavalo Lusitano – a tabela de avaliação de reprodutores Lusitanos.
Pretende-se a constituição de uma proposta de reflexão, onde procurarei fundamentar algumas
das perspectivas possíveis relativas à vigência e aplicação da tabela de atribuição de pontos.
Lusitano por tabela
Nada que não parta de um princípio firme pode ser estável
Cícero Tusculanae Disputationes 2.65 (45 a.C)
Eng.º Rodrigo Almeida
Diz-nos o artigo 17.º do Regulamento do Livro Genealógico do
Cavalo Lusitano (RLG): um- A inscrição no Livro de Reprodutores será
efectuada a pedido dos criadores ou
proprietários e desde que os animais
reúnam as seguintes condições: c) Tenham identidade com as características
expressas no padrão da raça (anexo
III); h) Tenham sido submetidos a provas morfofuncionais. i) A aprovação
de animais para o Livro de Reprodutores
terá duas fases:”
Atendendo ao âmbito da presente
explanação, apenas nos debruçaremos sobre a 1.ª fase (obrigatória),
onde para efeito de observância da
identidade com as características
expressas no padrão da raça, os
animais serão submetidos a provas
morfofuncionais, durante as quais,
serão examinados e pontuados em
conformidade com a tabela anexa
ao RLG (tabela abaixo), por uma
comissão de inscrição.
CARACTERES
Coeficientes
Cabeça e pescoço
Espádua e garrote
Peitoral e costado
Dorso e rim
Garupa
Membros
Conjunto de formas
Andamentos
TOTAL
1
1
1
1,5
1
1,5
1,5
1,5
10
Como o fundamento da avaliação
é o padrão da raça, é conveniente
marcar alguns pontos de vista relativamente ao mesmo.
Em primeiro lugar há que ter em
conta a linha de pensamento do Dr.
José Monteiro, que nos remete para
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a influência da variabilidade do ideal
de beleza, na espuma do tempo (in
O Cavalo Lusitano – Contributo
para o seu estudo- 1983): “Beleza
em hipologia, depende pois, da raça,
da função e até da moda, pois o homem, no tempo e no espaço, tem
apreciado o cavalo com concepções
de beleza diferentes. Assim, por exemplo, no século XVIII, em Portugal e
em Espanha, eram apreciados os cavalos bastos, de pescoço grosso e
muito rodado, de perfil pronunciadamente convexo e com andamentos
demasiadamente elevados que perdiam
em extensão e que desperdiçavam
em altura”.
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Em seguida referenciamos o Prof.
Dr. Francisco Peña Blanco (Departamento Producción Animal - Universidad de Córdoba – “Consideraciones acerca del protótipo racial
del P.R.E.” - II Jornadas Equestres Sevilha 2001), que nos transmite
que existem numerosas definições
de raça, atendendo à concepção
que ela representa para cada autor.
Segundo o Prof. Blanco, Lerner e
Donald entendem que um grupo
de animais constitui uma raça quando: a) têm características que a identificam, e consequentemente a diferenciam de outro grupo da mesma
espécie. ou b) quando o entendimento de uma Associação ou admi-
NOTAS IBÉRICAS
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nistração assim o determina. Prossegue o Prof. Blanco dizendo que
um padrão da raça deve servir a
raça e não interesses particulares,
acrescentando que a raça é uma
entidade viva, que deve estar em
evolução contínua, o que implica
que o padrão da raça não pode ser
estático, imóvel, mas ao contrário,
deverá ser ágil e modificar-se quando
a raça o entenda. Entende que os
termos que se empregam para a
descrição dos caracteres constantes
no padrão, têm de ser concretos,
precisos, claros, e que não provoquem confusão nem distintas interpretações. Refere ainda que não se
deve confundir um padrão racial
com um sistema de avaliação e programa de melhoramento.
Algumas considerações subjectivas,
como largo, estreito, grande, pequeno ou bem proporcionado, constantes no padrão de algumas raças,
devem ser progressivamente substituídas por valores numéricos que
possam confirmar ou rectificar a
subjectividade das avaliações visuais
(Oom, 1987). Estas requerem uma
enorme experiência e são falíveis
(o estado físico do animal ou a arte
do apresentador são alguns dos factores que as podem influenciar).
Lembramos no entanto, que não é
possível reduzir a números toda a
anatomia do animal, pois existem
determinadas características, não
mensuráveis, como o perfil da cabeça, a harmonia da ligação
cabeça/pescoço, entre outras, onde
as formas de avaliação serão sempre
subjectivas (Back, 2001).
Dentro do que for mensurável
devem ser estabelecidos limites de
referência para balizar essa apreciação e orientar todos os criadores
e interessados. Neste contexto é a
morfometria que reduz a números
a informação obtida através do fenótipo, assumindo esta forma um
papel de relevo na definição de critérios objectivos (Oom, 1987).
A beleza estética deverá constituir
um contributo e não uma finalidade.
Dada a subjectividade que lhe é inerente, há que procurar minimizar
os riscos de relativismos decorrentes
da sensibilidade de quem a julga
(por factores culturais, profissionais
ou meramente estéticos).
O cerne do problema das avaliações de reprodutores constitui-se
na forma subjectiva como uma tabela
de avaliação pouco objectiva e didáctica, é aplicada por juízes que na
sua maioria são igualmente criadores
e intervenientes activos na comercialização de cavalos. A este propósito, e numa entrevista conferida
em http://www.carregdressage.co.uk/interviewapsl.htm, em 10 de Novembro
de 2008, foi levantada uma questão
de grande pertinência, e que demonstra que também lá fora existem
sérias preocupações com a vertente
ética associada à avaliação de animais.
Eis um relevante extracto dessa entrevista:
Dr. Mathias Weis, Médico Veterinário, Presidente do Cavalo Lusitano na Suíça CLS (MW): “Os
juízes da APSL possuem um conhecimento profundo sobre o PSL, a maioria
deles são criadores do PSL e/ou estão
envolvidos com o Lusitano e quase
todos conhecem os criadores e respectivos cavalos. Deste modo, parece
ser bastante difícil para um juiz, formular um julgamento objectivo. Como
é que se pode gerir este problema?”
Dr. Emídio Pinto: “Em primeiro
lugar tentamos escolher pessoas com
integridade e independência comprovadas. Além disso, todos os anos organizamos seminários com o objectivo
de melhorar os critérios de julgamento.
E, mesmo não existindo regras definidas
sobre este assunto, temos o cuidado
de encontrar juízes que não possuam
ligações muito próximas com os criadores e proprietários participantes
num determinado festival. Seria, certamente, muito mais fácil se houvesse
pessoas completamente independentes
do meio equestre, mas depois, qual
seria o seu conhecimento sobre a criação do Lusitano?”
No que respeita à questão didáctica que deve estar na base da existência de uma tabela de avaliação,
pergunta-se: Como é que alguém
com base numa nota generalista relativa aos membros, consegue perceber a valorização ou significância
que os juízes atribuem às diferentes
partes que compõe os membros
(tipos de taras – com ou sem determinismo genético comprovado;
aprumos; comprimento e perímetro
ideal da canela; curvilhões - impor-
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tância do seu ângulo, largura, e espessura; desenvolvimento pretendido
das superfícies articulares; diferenças
de importância entre membros anteriores e posteriores, etc.)? Nestes
moldes, esta pergunta é extensível
a outras regiões! Importa igualmente
esclarecer porque motivo machos
e fêmeas são avaliados com base
num padrão que não prevê a existência de dimorfismo sexual? Será
este o motivo pelo qual as éguas,
nos dias que correm (a partir de
1998/99 – conforme ilustra o Gráfico
1), possuem uma pontuação média
francamente acima da dos machos?
O que terá acontecido no ano
1998/99 para as fêmeas passarem a
ter pontuações médias acima das
dos machos? Se não existem limites
de referência objectivos, dentro das
características morfológicas passíveis
de medição, como é possível contestar com fiabilidade uma avaliação
totalmente subjectiva, com uma reapreciação igualmente subjectiva? Seguramente que se fosse solicitado a
cada um dos juízes que dessem indicações para um retrato robot do
Lusitano ideal, o resultado do comparativo dos diferentes desenhos,
seria ilustrativo quanto à materialização das sensibilidades implicadas.
Temos de recuar a 1967, e perceber o motivo pelo qual se adoptou
esta e não outra tabela. De acordo
com Luís Fabre (In Cheval Lusitanien,
Maio de 2011) o Eng.º Fernando
Sommer D’Andrade viu-se obrigado
a utilizar em 1967, ano da constituição do stud book do cavalo Lusitano,
a tabela de pontuação espanhola.
Acrescenta que o Eng.º Fernando
D’Andrade lhe terá confessado no
decurso dos anos 70, que não apreciava verdadeiramente esta tabela
de pontuação.
Ao lado apresento a tabela utilizada
pelo Dr. José Monteiro na Estação
Zootécnica Nacional (EZN).
Como se pode constatar esta tabela é francamente mais detalhada
que a actualmente utilizada na avaliação de reprodutores PSL. O único
detalhe que lhe escapa são os andamentos, pois os mesmos eram analisados através da utilização de outra
tabela. É curioso que o facto de se
referenciar o trabalho de selecção
levado a cabo na EZN de 1934 a
1973, leva a maioria das pessoas a
relacioná-lo com a produção de cavalos bastos, pesados e pouco finos,
da Coudelaria Nacional, esquecen-
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do-se estas pessoas, que provas
idênticas, mas mais exigentes, aplicadas ao efectivo puro-sangue árabe,
constituiu um factor de propulsão
de uma das populações árabes mais
funcionais no mundo do cavalo árabe.
Apesar disto, ainda hoje se houve
referenciar a égua Ujica CN (Juapo
CN x Nadadora CN por Danúbio
II), nascida em 1978, como um dos
factores de relevo na mecânica do
cavalo Spartacus da coudelaria de
Santa Margarida.
Pergunta-se se existirá desvalorização ou valorização económica
com a atribuição das pontuações
afectas aos reprodutores? Respondo
a esta pergunta, com outra pergunta
de resposta óbvia: Será que no mercado de trabalho, afecto a alunos
formados na mesma universidade,
será dada a mesma valorização da
oportunidade de emprego a um aluno que termina o curso com média
de 19, comparativamente com outro
que termina com média de 10?
Por terras de França André Rosentiehl, juiz da raça Lusitana, numa
publicação na revista Cheval Lusitanien
de Maio de 2011, expõe pontos de
vista de grande pertinência e positivismo crítico. É dito nesse artigo:
Um cavalo pode ter uma morfologia
ideal e andamentos inexistentes ou o
inverso, o que torna o exame difícil e
sobretudo a decisão dos juízes, se esse
cavalo deve ser sancionado ou não…
Neste caso, deverá meter-se a morfologia em primeiro ou os andamentos
e inversamente.
Pontuação
máxima
atribuível
Cabeça
4
Pescoço
6
Garrote
5
Espádua
5
Dorso
6
Costado
4
Peitoral
4
Rim
7
Garupa
7
Membro anterior
Braço, ante-braço e joelho
6
Canela, boleto e quartela
7
Cascos
6
Membro posterior
Coxa e perna
6
Curvilhão
7
Canela, boleto e quartela
7
Cascos
6
Conjunto de forma
Total
7
100
Sal montado por Nuno Palma e Santos
Por outro lado, os andamentos
não determinam a funcionalidade de
uma raça.
A minha experiência de criador e
de juiz da raça fez-me ver algumas
anomalias em alguns julgamentos,
praticados há alguns anos atrás.
Logo, aquando da criação do stud
book em 1967, torna-se visível a sua
influência dentro de algumas coudelarias. Manuel Veiga opôs-se à vontade
dos juízes dessa época, por escolher
cavalos reprovados para constituir as
suas linhas principais. O livro estava
aberto e era assim possível solicitar a
admissão de produtos de éguas reprovadas.
Bailador (origens reprovadas)
Lidador II (uma linha reprovada)
Universo (filho de uma linha reprovada)
Bailador II (a partir de duas linhas
reprovadas)
A égua “Toleirona”, igualmente reprovada, avó materna do Novilheiro e
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A égua Beleza também ela reprovada,
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Foto: Aurélio Grilo
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in Coudelaria Ervideira 120 Anos
de História – Edições Inapa). Ainda
com base neste Gráfico, é possível
afirmar que apesar da consideração
unânime quanto à melhoria qualitativa
dos animais actualmente produzidos,
a média das pontuações está em
contraciclo com esse considerando.
Apesar de não haver evidência documental que o corrobore (pois não
houve alteração do padrão, ou mesmo da tabela de avaliação - coeficientes), há quem explique a descida
das pontuações com o argumento
de que o nível de exigência aumentou. As rectas descendentes constantes no gráfico abaixo, demonstram
que a raça se encontra cada vez
mais impotente para contrariar este
nível de “exigência”.
Guapo e sobretudo o Neptuno, cavalo
de toureio sob a sela de Manuel Vidrié
e depois reprodutor em Portugal.
A lista é muito longa para enumerar
todas as linhas reprovadas…
Hoje em dia, essa coudelaria em
puro ou cruzada com outras linhas
tem um impacto muito forte na raça.
Como definir um julgamento entre
um futuro cavalo de dressage e um
futuro cavalo de toureio, que não têm
a mesma funcionalidade.
Obviamente que a informação
contida no histórico das pontuações
Na prática esta situação de impotência, está longe de ser pacífica,
pois para alguns, sugere um enorme
conflito entre morfologia/padrão e
funcionalidade. Por exemplo, uma
espádua ou um dorso geometricamente conformes com o padrão,
não implica(m) necessariamente uma
boa mecânica de andamentos, ou
em última instância, uma “funcionalidade” oscilante. Mas o rótulo
dos pontos… esse é uma constante
que ultrapassa o período de vida do
animal avaliado!
O que se tem verificado actualmente, é que os juízes têm avaliado
a morfologia em função da mecânica
de andamentos, o que não está consignado em regulamento algum! Esta
é uma das explicações para o avas-
resultantes da aplicação da tabela
de avaliação não contem objectividade que permita um comparativo
fiável, pois as pontuações variam de
acordo com os gostos e sensibilidade
de quem está a pontuar, muitas das
vezes, segundo critérios definidos
com base na sensibilidade dos próprios juízes, conforme justificam as
dúvidas do juiz francês. Será que
deve prevalecer o modelo ou os
andamentos? A variação atrás referida, é muito bem ilustrada no gráfico
abaixo (fonte: Dr. Costa Ferreira –
Gráfico 1
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salador nível de “chumbos” e baixas
pontuações a que temos assistido.
É perverso, mas o que acontece
com frequência, é por exemplo,
uma espádua estar perfeitamente
de acordo com o padrão, mas é-lhe
atribuída uma nota baixa, porque
no conjunto, a locomoção/amplitude
do cavalo não corresponde à perfeição da espádua!
Será justo que a aplicação desta
grelha reprove animais como a Toleirona MV, que produziu descendência de referência para a raça,
suficiente para coudelarias como a
do Arq. Arsénio Cordeiro a referenciarem como de fulcral importância para a sua base genética? Será
justo que se desvalorizem ou valorizem cavalos baseados numa grelha
totalmente desvinculada da funcionalidade?
Recentemente houve um amigo
que resolveu encaminhar à concentração de garanhões um cavalo velho,
no qual acreditava como melhorador
da sua coudelaria, pois montou-o e
ficou encantado com as características do cavalo, sobretudo o galope.
Ao recolher informação relativa aos
seus ascendentes apercebeu-se que
o mesmo era filho de uma égua de
referência funcional na coudelaria
Andrade, a Corveta SA. Escusado
será dizer que o cavalo chegou à
pontuação paternalista e foi literalmente reprovado e crucificado pela
sua morfologia e andamentos. Pergunta-se: a quem caberia a responsabilidade de vender a qualidade
dos filhos deste cavalo? Que certeza
existirá na mente de quem exclui,
para assertivamente garantir com
fiabilidade o (des)propósito funcional
dessas exclusões ou rebaixamentos
valorativos, quando a realidade performante dita situações em que o
nível das pontuações se encontram
inversamente relacionadas com a
funcionalidade? Quando um criador
como o Sr. Manuel Braga refere que
prefere para reprodutor um animal
de boas famílias mas de pior morfologia e andamentos, comparativamente a outro de boa morfologia e
andamentos, mas de piores famílias,
seguramente que isto nos deixa a
pensar!
Apresento-vos o Negador e o
seu proprietário (o cavaleiro José
Ezequiel de Carvalho - foto acima).
Este cavalo é um Peninsular da afamada coudelaria espanhola Guerrero
(coudelaria que também está na
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Negador
base de algumas aquisições praticadas
pelo Dr. Ruy D’Andrade quando iniciou a sua coudelaria), que venceu
um raid em Portugal de 1300 Km,
em 1907, onde perdeu com o esforço 76,5 Kg (à partida pesava 455
e à chegada pesava 378). Reportando
este cavalo para os dias de hoje, o
mesmo não entrava no Livro do
Cavalo Lusitano, pois a suspensão
do artigo 18.º não o permite, e se
por uma eventualidade do destino
fosse classificado de acordo com a
grelha, apesar de ser um animal ultra-funcional, poderia chumbar.
Há que assumir que a avaliação
do modelo e dos andamentos aplicada
à avaliação dos reprodutores, nos
termos da aplicação da actual tabela,
não possui correspondência directa
com a funcionalidade. Dentro deste
âmbito, a expressão provas morfofuncionais aplicada às vigentes concentrações de garanhões ou atribuição
de pontos às fêmeas em casa dos
criadores, conforme descrito na alínea
h), número um, artigo 17.º do RLG,
está totalmente destituída de sentido
funcional. Porque motivo se chama
a esta avaliação de 5 ou 10 minutos
uma prova morfofuncional?
Proponho um comparativo entre
a tabela abaixo (fonte: APCRS), e a
tabela actualmente aplicada na avaliação de reprodutores da raça Lusitana. De qual delas se conseguirá
retirar mais informação????
Para terminar, penso que de futuro:
1.º Os objectivos para a raça deveriam ser claros e precisos;
2.º Seja privilegiada a funcionalidade associada à performance em
prova nas diferentes disciplinas;
3.º A par do currículo desportivo,
a criação de provas de esforço deveriam passar a constituir outra opção de selecção dos criadores;
4.º Deveriam passar a existir bases
de dados relativas à funcionalidade
dos exemplares da raça, para estabelecer correlações genéticas asso-
ciadas à aplicação do BLUP (best linear unbiased prediction).
Por isso, qualquer animal filho de
progenitores Lusitanos, desde que
não possua taras com determinismo
genético comprovado, poderia ser
reprodutor! Não nos podemos dar
ao luxo de eliminar reprodutores
que poderão ser uma mais-valia para
a raça, baseados numa grelha disfuncional que privilegia o cavalo da
“Vista Alegre”, e que a título de
exemplo, ignora e muitas vezes penaliza o sentido funcional e mais
elementar que fez a raça – o toureio!
A ideia para além de simples era de
fácil execução, bastaria por exemplo,
fazer uma inspecção veterinária relativa às taras anteriormente descritas
(constituiria o único motivo de exclusão) e pagar-se uma taxa anual à
APSL para poder beneficiar 10 éguas
(o montante da taxa deverá ser pensado de forma a que o estatuto de
reprodutor não seja banalizado).
Para além disso, a progressão do
número de éguas a beneficiar, estaria
dependente dos resultados funcionais
obtidos por esses animais, (dressage;
toureio; atrelagem; equitação de
trabalho; obstáculos).
Será que o simples, afinal é assim
tão complicado? n

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