Civilização mundial passou do ponto, diz Papa no Rio
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Civilização mundial passou do ponto, diz Papa no Rio
“À guerra, cavaleiros esforçados! Pois os anjos sagrados em socorro estão em terra. À guerra!” (Gil Vicente) 1 a quinzena de agosto de 2013 Vol.XX, nº 5 Civilização mundial passou do ponto, diz Papa no Rio Com esta frase, tão coloquial como verdadeira, o Papa Francisco caracterizou o momento paradigmático pelo qual a humanidade atravessa, na primeira viagem internacional do seu pontificado, para participar da Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro. P. 4 EUA têm “governo sombra” A denúncia vem da exsubsecretária do Tesouro de George Bush pai, Catherine Austin-Fitts P. 8 Argentina e Brasil devem encerrar torneio de sucata militar Os dois países precisam fazer uma opção pelo estado da arte. P. 12 Capítulo indígena deveria ser retirado da Constituição Nos seis dias em que permaneceu na cidade, o Pontífice eletrizou milhões de pessoas, provenientes de 175 países (Ag Brasil) si_20_05.pmd 1 A proposta do jurista Clovis Ramalhete, feita há duas décadas, continua mais atual que nunca. P. 14 18/08/2013, 11:04 2 Solidariedade Ibero-americana EDITORIAL Investimentos em transportes podem deixar de ser “dívidas” Antes tarde do que nunca. Em iniciativa das mais oportunas, o governo federal pretende retirar os projetos em infraestrutura de transportes urbanos do cálculo de endividamento dos estados e municípios. A medida foi anunciada pela presidente Dilma Rousseff, durante a sua primeira visita a São Paulo (SP) desde as manifestações de junho, em 31 de julho, ocasião em que pôde constatar o que os brasileiros comuns conhecem sobejamente há décadas: a insuficiência das redes de transportes coletivos, em especial os metrôs. Caso o projeto já tivesse sido convertido em lei, os prefeitos e governadores teriam, hoje, uma capacidade de endividamento superior a R$ 35,3 bilhões, para investir em projetos de metrôs, corredores exclusivos de ônibus (BRTs), veículos leves sobre trilhos (VLTs), trens urbanos e ciclovias, sem que as contas referentes à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) fossem comprometidas. O advogado-geral da União, Luiz Inácio Adams, já está estudando os requisitos jurídicos para fazer o projeto sair do papel e avalia como aplicar as mudanças na LRF. O alívio fiscal para os estados e municípios também pode representar uma injeção monetária que ajude a reaquecer a economia brasileira, de modo a retomar a geração direta e indireta de empregos. Na visita à capital paulista, a presidente questionou o metrô local: “Como é possível uma cidade do tamanho de São Paulo sem transporte metroviário? Sem que o transporte possa ter uma velocidade que recorte a cidade em toda a sua expansão?”. A pergunta é das mais pertinentes, mas a responsabilidade pela resposta não cabe somente aos dirigentes estaduais, devendo ser compartilhada com a esfera federal, que não consegue sequer usar o montante de investimentos já empenhados no PAC-2 e outros programas governamentais. Sem falar na preservação inercial de princípios adotados pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, que seus sucessores petistas não se atreveram a tocar, como a absurda qualificação dos investimentos públicos em infraestrutura como endividamento, equiparando-os aos gastos de custeio, imposta pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Com isso, o Brasil perdeu quase duas décadas em investimentos não realizados em nome dos sacrossantos princípios do rentismo, que estabelece o serviço da dívida pública como meta suprema das políticas governamentais. A aberração chegou ao ponto de determinar que o custo global de um dado projeto de infraestrutura fosse debitado nas contas públicas de uma única vez, em lugar de distribuído ao longo de vários anos, como costumam ser feitos tais dispêndios. Agora, esperemos que o projeto de lei que liberta o setor de semelhante garrote vil receba a devida atenção, tanto no Congresso como, em particular, na mídia, geralmente comprometida com a orientação pró-rentista. Para tanto, será preciso acompanhar atentamente a sua tramitação, se preciso, pressionando o Congresso para acelerá-la. EDIÇÃO EM PORTUGUÊS Diretora: Silvia Palacios Publicado pelo MSIA – Movimento de Solidariedade Ibero-americana si_20_05.pmd Conselho editorial: Angel Palacios Zea, Geraldo Luís Lino, Lorenzo Carrasco e Marivilia Carrasco Projeto Gráfico: Maurício Santos 2 Rua México, 31 s.202 CEP 20.031-144 Rio de Janeiro-RJ Telefax: + (21) 2532-4086 E-mail: [email protected] Sítio: www.msia.org.br 18/08/2013, 11:04 1a quinzena de agosto de 2013 3 Rentistas voltam a pregar “autonomia” do BC Não satisfeitos com a retomada da alta dos juros básicos da economia pelo Banco Central (BC), os rentistas que operam no Brasil ensaiam uma nova investida para a promoção do seu sonho de consumo: a autonomia de direito do BC. A pauta foi colocada em uma reunião de um seleto grupo de economistas do mercado financeiro com o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, ocorrida no gabinete do ministério em São Paulo (SP), em 2 de agosto. Na oportunidade, o grupo sugeriu que o ministério se empenhe na aprovação do projeto de lei complementar que regulamenta o sistema financeiro nacional e propõe a independência do BC, que tramita há seis anos no Congresso e, em abril, recebeu parecer favorável para ser votado na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Segundo participantes do encontro, Holland não se comprometeu com a sugestão, mas também não a descartou, o que foi entendido como uma sinalização de que o governo poderia apoiar a mudança (O Globo, 6/08/2013). A motivação principal do evento foi a “perda de credibilidade fiscal” do governo, o mais recente bordão dos rentistas para justificar as pressões por um afrouxamento ainda maior das rédeas do governo federal sobre o BC de Alexandre Tombini, que, até há pouco, vinha atuando em estreita sintonia com o Palácio do Planalto e o Ministério da Fazenda. Nem mesmo as pressões inflacionárias ou a perspectiva de um baixo crescimento do PIB foram discutidos, em uma clara demonstração de desapreço quase absoluto pela economia real por parte dos representantes do “mercado”. Mesmo sem ser novidade, a própria reunião, “en petit comité”, sem a presença de qualquer representante dos setores si_20_05.pmd 3 produtivos da economia, é indicativa da crescente submissão do governo da presidente Dilma Rousseff aos rentistas. Segundo o jornal O Estado de Minas (3/08/2013), os porta-vozes da alta finança “aconselharam” o governo a emitir sinais de que pretende mudar a política atual (leia-se deixar que apenas os mercados influenciem as decisões do BC). Para tanto, recomendam a interrupção das manobras contábeis para a redução do déficit público – para não prejudicar o sacrossanto superávit primário –, além de dar maior liberdade à Petrobras, para que a empresa possa equiparar os preços internos dos combustíveis aos praticados no exterior, mesmo que os reajustes tenham impactos inflacionários. Em outra vertente, a investida rentista também colocou na alça de mira a intenção do governo de facilitar os investimentos em transportes urbanos pelos estados e municípios, retirando os investimentos neste setor do enquadramento como dívidas, de modo a permitir que possam ampliar a sua capacidade de investir em projetos mais que necessários. Um dos mais graduados arautos financeiros do País, o ex-presidente do BC Gustavo Loyola, transmitiu a “ameaça”, num artigo publicado no Valor Econômico de 5 de agosto, no qual considera a iniciativa “uma notícia negativa no campo fiscal” e uma ameaça à Lei de Responsabilidade Fiscal. Dadas a força do lobby pró-rentista e a fragilidade política do governo no momento, será preciso uma ativa e eficiente mobilização, tanto no âmbito do Congresso como na sociedade em geral, para aprovar tal iniciativa por meio de um projeto de lei, até agora, a única resposta do governo que demonstra alguma sintonia com as reivindicações das manifestações que sacudiram o País, em junho último. 18/08/2013, 11:04 4 Solidariedade Ibero-americana Civilização mundial passou do ponto, diz o Papa no Rio Silvia Palacios e Lorenzo Carrasco “A civilização mundial passou do ponto.” Com esta frase, tão coloquial como verdadeira, o Papa Francisco caracterizou o momento paradigmático pelo qual a humanidade atravessa, na primeira viagem internacional do seu pontificado, para participar da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), no Rio de Janeiro. Nos seis dias em que permaneceu na cidade, de 23 a 28 de julho, o Pontífice eletrizou as centenas de milhares de pessoas, provenientes de 175 países, que acompanharam os seus trajetos, entoando o coro, ”Esta es la juventud del Papa!” - quase sempre proferido em espanhol. A dimensão do entusiasmo espalhado pela sua presença pode ser aquilatada na missa final, realizada na praia de Copacabana, que reuniu mais de 3 milhões de pessoas, no maior evento já registrado na história da cidade. Em tal ambiente juvenil e festivo, Francisco não se dirigiu unicamente a esse numeroso contingente; em vez disto, as suas bem ponderadas mensagens foram endereçadas à própria Igreja e à sociedade em seu conjunto. Contra a desoladora imagem sagrada do ser humano característica da cultura prevalecente, com desdobramentos em um sistema econômico escravizante e um sistema político descompromissado com o bem comum, que não deixam de impactar a Igreja Católica, ele afirmou a necessidade de construção de uma “cultura do encontro e do diálogo”, com uma ordem de humildade social. O enorme interesse gerado pelas intervenções do Papa, a maioria delas transmitidas ao vivo pela televisão, demonstra que a sociedade está ávida de referências com credibilidade, que assinalem novos horizontes para a saída da crise de valores e si_20_05.pmd 4 socioeconômica que avassala o planeta. A ressonância da viagem se torna ainda maior pelo fato de ter-se realizado no “Continente da Esperança”, que reúne, desde as suas origens, uma vocação de integração que lhe confere o seu ethos, esta qualidade intrínseca, capaz de enfrentar grandes obstáculos para cristalizar a sua missão. As dificuldades para a consecução de tal projeto não residem apenas nas nações, mas também na própria Igreja. Por isso, foi bastante significativa a reunião com os representantes da Conferência Episcopal Latino-Americana (CELAM), no último dia da visita, cujos temas-chave foram o caminho para a integração do continente, uma radiografia clara dos problemas do mundo atual e a renovação do caminho missionário da Igreja, a “Missão Continental”, em sua forma transcendente. Na apresentação, Francisco enumerou algumas das “tentações” que têm acometido tanto a Igreja como a própria sociedade latino-americana: “Não se trata de sair à caça de demônios, mas simplesmente de lucidez e prudência evangélicas. Limito-me a mencionar algumas atitudes que configuram uma Igreja ‘tentada’. Trata-se de conhecer determinadas propostas atuais que podem mimetizar-se em a dinâmica do discipulado missionário e deter, até fazê-lo fracassar, o processo de conversão Pastoral.” Em seguida, atentou para os perigos da ideologização da mensagem evangélica, apontando algumas de suas modalidades: “a) O reducionismo socializante. É a ideologização mais fácil de descobrir. Em alguns momentos, foi muito forte. Tratase de uma pretensão interpretativa com base em uma hermenêutica de acordo com as ciências sociais. Engloba os campos 18/08/2013, 11:04 1a quinzena de agosto de 2013 mais variados, desde o liberalismo de mercado até à categorização marxista. “b) A ideologização psicológica. Trata-se de uma hermenêutica elitista que, em última análise, reduz o ‘encontro com Jesus Cristo’ e seu sucessivo desenvolvimento a uma dinâmica de autoconhecimento. Costuma verificar-se principalmente em cursos de espiritualidade, retiros espirituais, etc. Acaba por resultar numa posição imanente auto-referencial. Não tem sabor de transcendência, nem portanto de missionariedade. “c) A proposta gnóstica. Muito ligada à tentação anterior. Costuma ocorrer em grupos de elites com uma proposta de espiritualidade superior, bastante desencarnada, que acaba por desembocar em posições pastorais de ‘quaestiones disputatae’. Foi o primeiro desvio da comunidade primitiva e reaparece, ao longo da história da Igreja, em edições corrigidas e renovadas. Vulgarmente são denominados ‘católicos iluminados’ (por serem atualmente herdeiros do Iluminismo). “d) A proposta pelagiana. Aparece fundamentalmente sob a forma de restauracionismo. Perante os males da Igreja, busca-se uma solução apenas na disciplina, na restauração de condutas e formas superadas que, mesmo culturalmente, não possuem capacidade significativa. Na América Latina, costuma verificar-se em pequenos grupos, em algumas novas Congregações Religiosas, em tendências para a ‘segurança’ doutrinal ou disciplinar. Fundamentalmente é estática, embora possa prometer uma dinâmica para dentro: regride. Procura ‘recuperar’ o passado perdido. “2. O funcionalismo. A sua ação na Igreja é paralisante. Mais do que com a rota, se entusiasma com o ‘roteiro’. A concepção funcionalista não tolera o mistério, aposta na eficácia. Reduz a realidade da Igreja à estrutura de uma ONG. O que vale é o resultado palpável e as estatísticas. A partir disso, chega-se a todas as modalidades empresariais de Igreja. Constitui uma espécie de “teologia da prosperidade” no organograma da pastoral. “3. O clericalismo é também uma tentação muito atual na América Latina. Curiosamente, na maioria dos casos, trata-se de uma cumplicidade viciosa: o sacerdote clericaliza e o leigo lhe pede, por favor, que o clericalize, porque, no fundo, lhe resulta mais cômodo. O fenômeno do clericalismo explica, em grande parte, a falta de maturidade adulta e de liberdade cristã em boa parte do laicato da América Latina: ou não No Teatro Municipal, o Papa enfatizou a necessidade de recuperação da política como instrumento de caridade (foto O Globo) si_20_05.pmd 5 5 18/08/2013, 11:04 6 Solidariedade Ibero-americana cresce (a maioria), ou se abriga sob coberturas de ideologizações como as indicadas, ou ainda em pertenças parciais e limitadas. (...)” Reabilitar a política Em um encontro com lideranças da sociedade, no Teatro Municipal, ao qual estes autores tiveram o privilégio de comparecer, o Pontífice destacou qualidades específicas da cultura brasileira, que lhe conferem condições favoráveis para o cultivo de uma cultura de diálogo construtivo, tanto no âmbito da América Latina como no mundo em geral. Unidas às raízes cristãs, tais qualidades conferem à nação brasileira a capacidade e a responsabilidade para desempenhar um papel protagonista em um novo mundo em construção. Suas palavras: “Em primeiro lugar, é de justiça valorizar a originalidade dinâmica que caracteriza a cultura brasileira, com sua extraordinária capacidade para integrar elementos diversos. O sentir comum de um povo, as bases de seu pensamento e de sua criatividade, os princípios básicos de sua vida, os critérios de julgamento sobre as prioridades, as normas de atuação, se fundem e crescem em uma visão integral da pessoa humana. “Essa visão do homem e da vida característica do povo brasileiro recebeu, também, a seiva do Evangelho: a fé em Jesus Cristo, o amor de Deus e a fraternidade com o próximo. A riqueza desta seiva pode fecundar um processo cultural fiel à identidade brasileira e, por sua vez, um processo construtor de um futuro melhor para todos. Um processo de faz crescer a humanização integral e a cultura do encontro e da relação, esta é a maneira cristã de promover o bem comum, a alegria de viver. E aqui convergem a fé e a razão, a dimensão religiosa com os diferentes aspectos da cultura humana: a arte, a ciência, o trabalho, a literatura... O cristianismo combina transcendência e encarnação, pela capacidade de revitalizar sempre o pensamento e a vida, diante da ameaça de frustração e desencanto que podem invadir o coração e se propagar pelas ruas.” si_20_05.pmd 6 A mensagem foi clara e dura: os sistemas políticos do mundo se tornaram de tal forma desacreditados, que é crucial “reabilitar a política”, que, na tradição de Thomas More, apontou como sendo a forma mais alta de caridade. Prosseguindo, diante de uma platéia emocionada e eletrizada por suas palavras, enfatizou: “Um segundo ponto ao que gostaria de referir-me é a responsabilidade social. Ela requer um certo tipo de paradigma cultural e, em consequência, de política. Somos responsáveis pela formação de novas gerações, ajudá-las a serem capazes na economia e na política e firmes nos valores éticos. O futuro exige, hoje, a tarefa de reabilitar a política, que é uma das formas mais altas de caridade. O futuro nos exige, também, uma visão humanista da economia e uma política que logre uma participação cada vez maior e melhor das pessoas, evite o elitismo e erradique a pobreza. “Que não falte a ninguém o necessário e que se assegure a todos dignidade, fraternidade e solidariedade; este é o caminho proposto. Já na época do profeta Amós era muito frequente a admonição de Deus: ‘Vendem o justo por dinheiro, e o necessitado por um par de sapatos. Suspirando pelo pó da terra, sobre a cabeça dos pobres, pervertem o caminho dos mansos (Amós 2, 6-7).’ Os gritos que pedem justiça continuam, ainda hoje.” Aos jovens: atrevam-se a nadar contra a corrente Antes, no mesmo dia, em um encontro especial com mais de 30 mil peregrinos argentinos, Francisco lançou aos jovens o desafio de protagonizar mudanças efetivas. Na ocasião, afirmou: “Gostaria de dizer uma coisa. O que espero como consequência da Jornada da Juventude? Espero agitação! Que aqui dentro haverá agitação? Vai haver! Que aqui no Rio vai haver agitação? Vai haver! Mas quero agitação nas dioceses! Quero que saiam para fora! Quero que a Igreja saia às ruas! Quero que nos defendamos de tudo o que seja mundanidade, do que 18/08/2013, 11:04 1a quinzena de agosto de 2013 seja instalação, do que seja comodidade, do que seja clericalismo, do que seja estar encerrados em nós mesmos. As paróquias, os colégios, as instituições, são para sair! Se não saem, se convertem em uma ONG, e a Igreja não pode ser uma ONG. “Olhem, eu penso que, neste momento, esta civilização mundial passou do ponto, passou do ponto! Porque é tal o culto que tem sido feito ao deus dinheiro, que estamos presenciando uma filosofia e uma práxis de exclusão dos dois pólos da vida que são as promessas dos povos. E, evidentemente, se poderia pensar que poderia haver uma espécie de eutanásia escondida. Quer dizer, não se cuidam dos anciãos, mas também há esta eutanásia cultural: não se lhes deixam falar, não se lhes deixam atuar! E a exclusão dos jovens: o percentual de jovens sem trabalho, sem emprego, é muito alto! E é uma geração que não tem experiência da dignidade ganha pelo trabalho. Ou seja, esta civilização está nos levando a excluir as duas pontas que são o nosso futuro! “Então, os jovens têm que sair, têm que se fazer valer. Os jovens têm que sair a lugar pelos valores – a lutar pelos valores! E os velhos, que abram a boca, os anciãos abram a boca e nos ensinem, transmitam-nos a sabedoria dos povos! Ao povo argentino, e lhes peço de coração aos anciãos, não claudiquem de ser a reserva cultural do nosso povo, que transmite a justiça, que transmite a história, que transmite os valores, que transmite a memória do povo. E vocês, por favor, não se metam contra os velhos! Deixem-nos falar, escutem-nos e levem adiante o que aprenderem! Mas saibam que, neste momento, vocês, os jovens e os anciãos, estão condenados ao mesmo destino: exclusão! Não se deixem excluir! Está claro? É por isso que creio que têm que trabalhar. “Por favor, não façam vitamina da fé em Jesus Cristo! Existe vitamina de laranja, de maçã, de banana, mas, por favor, não bebam vitamina de fé! É a fé em Jesus. É a fé no Filho de Deus feito homem, que me amou e morreu por mim. (...)” Em sua despedida dos jovens, ao encontrar-se com os voluntários da JMJ, si_20_05.pmd 7 7 Francisco sintetizou o seu apelo, dizendo: “Peço-lhes que sejam revolucionários, peçolhes que vão contra a corrente. Que se rebelem contra essa cultura do provisório, do relativo. Atrevam-se a ir contra a corrente.” A Jornada da Juventude da mídia Poucos dias após anunciar a sua renúncia, em uma reunião com o clero de Roma, em fevereiro último, o então Papa Bento XVI denunciou que os meios de comunicação mundiais haviam criado a sua própria versão do Concílio Vaticano II, desfigurando o seu conteúdo. Guardadas as proporções, uma tentativa semelhante se manifestou com a JMJ. No encontro no Teatro Municipal, os principais periódicos brasileiros deram grande destaque à presença de um grupo de índios, como se se tratasse de um grande acontecimento. O fato é que a sua presença tinha o mesmo valor que a dos demais segmentos da sociedade ali reunidos para um evento em que o destaque era o Papa,conclamando uma elite política e intelectual a assumir a responsabilidade pelo bem comum. Outro exemplo foi a entrevista concedida pelo Pontífice, no voo de volta a Roma, na qual grande parte das perguntas se centrou nos temas preferidos da mídia controlada pelos grandes poderes mundiais, que não constituíram temas nominais da Jornada, como o homossexualismo, o casamento homossexual e a ordenação de mulheres. Com tranquilidade, Francisco remeteu os jornalistas ao estabelecido pelo Catecismo da Igreja, fazendo uma ressalva sobre temas do sacramento do matrimônio, que estão sendo atualmente estudados. No dia seguinte, a imprensa mundial preferiu destacar, maciçamente, manchetes que asseguravam uma mudança nas posições da Igreja, em especial, quanto ao homossexualismo. A verdade é que os poderes globais pretendiam definir a importância do Papa nos temas que, precisamente, refletem o colapso cultural da sociedade. A isto se refere ele, quando diz que a civilização passou do ponto. 18/08/2013, 11:04 8 Solidariedade Ibero-americana EUA têm “governo sombra”, diz ex-subsecretária de Bush pai Catherine Austin-Fitts foi subsecretária de Habitação no início do governo de George Bush pai. Oriunda da diretoria do banco de investimentos Dillon, Read & Co. (posteriormente incorporado pelo suíço UBS), era responsável pela Administração Federal de Habitação (FHA), então o maior fundo de seguros hipotecários do mundo. Em 1990, foi demitida, depois de ter deparado com um vasto sistema de desvio de recursos para o chamado “orçamento negro” (black budget), destinado ao desenvolvimento de projetos de inteligência e tecnológicos sem supervisão do Congresso. Na iniciativa privada, foi uma das primeiras a advertir sobre a expansão da bolha hipotecária que deflagrou a crise de 2007-2008, e tem denunciado sistematicamente as fraudes que ocorrem rotineiramente no sistema financeiro encabeçado pelo Sistema da Reserva Federal, inclusive, a sua estreita vinculação com o tráfico internacional de drogas e outras atividades ilícitas. Em recente entrevista ao jornalista econômico alemão Lars Schall, postada no sítio larsschall.com, em 1º. de agosto, ela proporciona uma autêntica aula magna sobre a existência e o funcionamento de uma estrutura de governo mundial, que opera, principalmente, nos EUA e na Europa, à qual chama o “governo sombra” (shadow government). Provocada sobre o fato de que as suas denúncias lhe têm garantido numerosas acusações de ser uma “teórica da conspiração”, devolveu: “Bem, a coisa é que temos uma realidade oficial e a realidade, são duas coisas diferentes... O meu entendimento do mundo emergiu de trabalhar em Wall Street e para o governo. Eu passei vários anos em disputas judiciais com o governo federal e a minha experiência pessoal é a de que o mundo é movido por si_20_05.pmd 8 decisões quietas tomadas silenciosamente em vários grupos e, em seguida, implementadas dessas maneiras – é assim que o mundo funciona, este é o princípio organizacional básico... A linha divisória de classes, nos EUA de hoje, é entre as pessoas que criam, administram e se engajam no que alguns chamam conspirações, enquanto todo o restante é treinado para ser incapaz de fazer o mesmo, porque esta é a base do poder versus a impotência. Então, eu venho de um mundo onde ser capaz de se reunir com outras pessoas, organizar planos, implementar estes planos e fazer isto silenciosa e secretamente, é a base do exercício e do acúmulo de poder mundial. Por isso, quando eu ouço pessoas sendo depreciativas sobre as conspirações, no mundo em que me criei, isto representa, simplesmente, um sintoma de que elas concordaram em ser impotentes e fazer disto um distintivo de honra.” Segundo ela, tais grupos de poder configuram um “governo sombra”: “A coisa contra a qual estamos lutando é que não é realmente claro qual é o sistema de governança no planeta Terra e como ele funciona. O que sabemos é que as nações soberanas têm o poder de cobrar impostos e grandes orçamentos. A realidade é que essas nações soberanas não estão no controle e não estão dirigindo as coisas... Eu acho que o sistema de governo é, na melhor das hipóteses, obscuro e, na minha experiência de trabalho como funcionária governamental, as decisões são tomadas fora do governo e transmitidas ao governo. O governo trabalha para o ‘governo sombra’... O que estamos presenciando é uma grande centralização de controle político, e parte disto é que a tecnologia permite esse tipo de consolidação fantástica em lugares centralizados. (...)” 18/08/2013, 11:04 1a quinzena de agosto de 2013 Não obstante, para Austin-Fitts, a crise global representa uma oportunidade: “Estamos atravessando um extraordinário período de mudanças... Estamos deixando de ser divididos entre desenvolvidos e nãodesenvolvidos e entrando numa economia mais mundial. Este reequilíbrio é uma mudança bastante significativa... Estamos mudando o nosso modelo. No mundo desenvolvido, nós dizíamos, basicamente, vamos ser democracias, mas vamos financiar as nossas democracias percorrendo o planeta, matando todo o resto e pegando baratos os seus recursos naturais. Agora, temos que converter-nos num modelo em que o que for feito a um será feito a todos, e isto é parte desse reequilíbrio, acho que é uma grande mudança.” Embora sem proporcionar detalhes, ela comenta ter deparado, em suas investigações, com o desenvolvimento encoberto de tecnologias de propulsão espacial muito mais avançadas do que as oficialmente reconhecidas como sendo o estado da arte dos EUA: “A maneira em como me interessei no programa espacial foi que eu estava seguindo as pistas de fraudes e extraordinárias quantidades de dinheiro que desapareciam dos programas de hipotecas do governo federal e desaparecendo do [Departamento do] Tesouro. Isto me levou a investigar o orçamento negro. Mas quando você começa a investigar o orçamento negro, o que você começa a compreender é que a primeira história de cobertura para ele é a incompetência e a segunda, a corrupção. Porque, de fato, estamos falando de um processo institucionalizado de desviar dinheiro da economia aberta, seja no nível governamental ou nas comunidades, por meio do crime organizado e coisas como as fraudes com hipotecas – e estamos falando de dinheiro numa escala enorme. Não estamos falando de Ferraris e contas em paraísos fiscais para parceiros de Wall Street, estamos falando de trilhões e trilhões de dólares que estão indo para algum lugar. Na medida em que comecei a estudar o orçamento negro e para si_20_05.pmd 9 9 onde o dinheiro estava indo, numa escala extraordinária, comecei a investigar os diferentes relatos sobre a construção de instalações subterrâneas e a construção de naves espaciais que funcionam como dizem que os funcionam os OVNIs [objetos voadores não-identificados]. (...) “(...) Então, essas tecnologias estão sendo desenvolvidas há algum tempo e um dos nossos desafios, como planeta, é que existe uma enorme divisão na população, entre pessoas que estão avançando rapidamente, fazendo coisas de tecnologia muito avançada, inclusive, por meio do orçamento negro, e uma população muito maior que, se está fazendo algo, está reduzindo as suas habilidades, inteligência e capacidade de lidar com tecnologias avançadas.” Ao final, Schall pediu à ex-subsecretária para apontar os desafios mais importantes para a humanidade, dos quais a grande maioria das pessoas não estaria ciente: “Eu diria que os nossos dois desafios mais importantes estão na ascensão espiritual e cultural, para estar à altura da tecnologia, inclusive, praticando globalmente a não-violação, na medida em que chegamos a uma cultura e uma economia muito mais integradas e, assim, atuar como uma sociedade é assumir as responsabilidades para interagir no espaço e entender e gerenciar os nossos riscos geofísicos, no contexto de toda a galáxia. “A solução é que cada um de nós faça o que chamo ‘tomar posição’ [“come clean”, no original]. Cada um de nós tem que mudar; em outras palavras, não precisamos esperar que as lideranças façam alguma coisa. Nós podemos, simplesmente, começar a mudar nós mesmos... A maneira como vamos construir o futuro é atraindo o que queremos. Vamos passar por uma enorme mudança e não há jeito de que possamos nos esconder num bunker, com nossa comida desidratada e moedas de ouro, e pensar que vai dar tudo certo. Temos que sair para fora, de um jeito ou de outro, e criar soluções.” 18/08/2013, 11:04 10 Solidariedade Ibero-americana México ameaçado pelo caos, diz general Dauahare Marivilia Carrasco No último dia 12 de julho, o general Tomás Ángeles Dauahare, ex-subsecretário de Defesa Nacional do México, recebeu a medalha Honoris Causa da Instituição Nacional para a Celebração do Dia do Advogado. A homenagem foi um reconhecimento pelos importantes serviços prestados por ele ao país, além de um desagravo pelas “violações às garantias individuais dos mexicanos”, cometidas contra ele, que foi arbitrariamente acusado e detido durante 11 meses, por acusações infundadas de ter vínculos com o cartel de drogas dos irmãos Beltrán Leyva. Em 17 de abril, um juiz federal ordenou a libertação de Dauahare, depois que a Promotoria retirou as acusações e arquivou o processo, deixando claro que se tratou de um procedimento fraudulento, iniciado pelo governo do então presidente Felipe Calderón. Dauahare é o militar mexicano de patente mais alta entre os que foram acusados de laços com o narcotráfico e presos, em 2012, por acusações de duas testemunhas protegidas que estavam sob custódia de autoridades dos EUA (Resenha Estratégica, 23/05/2012). Atualmente, todos encontram-se em liberdade. Este é o preço pago pelo país, pela subordinação dos seus últimos governos aos acordos do NAFTA (Tratado de Livre Comércio da América do Norte), que incluem cláusulas de segurança implementadas pelo Comando Norte das Forças Armadas estadunidenses. Se algo se pode extrair desses processos, eles puseram em evidência o fiasco si_20_05.pmd 10 do bizarro programa de “testemunhas protegidas”, implementado no México sob os auspícios do Departamento de Justiça e da Agência Antidrogas (DEA) dos EUA, que passa por cima das leis mexicanas e do consagrado princípio jurídico do devido processo legal. Desta forma, o programa permite acusações “à la carte” e abre caminho para vinganças políticas como as que vitimaram Dauahare e seus colegas militares, com grande impacto para a imagem das Forças Armadas, anteriormente, a mais respeitada e admirada instituição do país. A fracassada política do governo de Calderón colocou o Exército à frente de uma guerra antidrogas carente de inteligência e de uma estratégia eficaz, permitindo a ingerência da DEA e da CIA (Agência Central de Inteligência) no país. Este fato foi, precisamente, apontado por Dauahare, quando a Fundação Colosio do Partido Revolucionário Institucional (PRI) o convidou, em meio à campanha eleitoral de 2012, a apresentar a sua avaliação sobre a situação de segurança do país. Seis dias depois de ter externado a posição de que a guerra contra o crime organizado não tinha objetivos claros e que não existia uma estratégia real, ocorreu a sua detenção, juntamente com a de outros dois generais, em meio a severas anomalias e irregularidades, um fato inédito na história mexicana. Por ocasião da recente homenagem recebida, Dauahare voltou a alertar o novo governo sobre os riscos de se minimizar a crescente instabilidade social 18/08/2013, 11:04 1a quinzena de agosto de 2013 no país. Na oportunidade, ele afirmou: “À margem do pacto social estabelecido pela Constituinte de 1917, hoje, são moedas correntes as sedições, a simulação, a calúnia, as diatribes, os enganos e a mentira, que semeiam desunião e ruptura.” Assinalando o risco de que a situação desemboque em uma guerra civil, o oficial citou um trecho do livro sobre a Guerra Civil Espanhola, Todos fuimos culpables (Todos fomos culpados), do historiador espanhol Juan Simeón Vidarte, no qual este adverte: “Erros gigantescos deram lugar à formação de um clima de guerra civil, que imprevisões, imperícias e paixões descontroladas em campos rivais impediram que se evitasse.” Nas palavras de Dauahare, “é um fato que o México vive sob a ameaça do caos, momentos de incertezas e turbulências negativas para a sociedade e as instituições da nossa Pátria”. No mesmo evento, ele enfatizou que, “onde há injustiça, senhores advogados, invariavelmente, há violência”. E, ao mesmo tempo, sugeriu que os aspectos econômicos estão na origem do descontentamento: “A informalidade, um lastro conhecido da economia nacional durante décadas, está generalizada e é percebida no descrédito da atividade si_20_05.pmd 11 11 O general Tomás Ángeles Dauahare, ao deixar a prisão, em abril (El Universal) política e na suplantação de atribuições exclusivas dos organismos de governo, de segurança e de justiça.” “O México mudará, se lograrmos que, em todo o território do país, cada um faça a parte que lhe corresponde, para reduzir as desigualdades e multiplicar as oportunidades”, concluiu. Em tempo: Dauahare, que estava na reserva, foi reincorporado ao Exército, como assessor do secretário de Defesa Nacional, general Salvador Cienfuegos. 18/08/2013, 11:04 12 Solidariedade Ibero-americana Argentina e Brasil, hora de encerrar torneio de sucata militar Geraldo Luís Lino O governo argentino está negociando a compra de caças Mirage F1M, recentemente desativados pela Força Aérea espanhola. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo (7/ 08/2013), a transação envolveria 20 aviões, peças e o treinamento de pilotos argentinos pelos espanhóis, a um custo de 220 milhões de dólares. As aeronaves, com 38 anos de uso, se destinariam a substituir os poucos aviões de combate restantes na Força Aérea Argentina (FAA), um punhado de caças Dassault Mirage IIIEA e Douglas A-4AR Fightinghawk (este último uma versão ligeiramente melhorada dos A-4KU Skyhawk II da Marinha do Brasil), adquiridos na década de 1970. Apesar de justificada pelo comando da FAA, para permitir a manutenção de um mínimo de capacitação operacional dos seus pilotos, a operação tem sido criticada por políticos argentinos. Em sua página no Facebook, o ex-ministro da Economia Roberto Lavagna condenou o gasto de 220 milhões de dólares em aviões tão usados, advertindo para o risco de repetição de uma anterior compra de vagões ferroviários portugueses para a estatal Ferrocarriles Argentinos, que se revelaram imprestáveis. As chamadas “compras de oportunidade” de equipamentos militares desativados pelos países mais avançados constituem uma prática corrente das Forças Armadas sul-americanas, sempre às voltas com orçamentos limitados. E as F.As. argentinas, em particular, têm sofrido com um descaso deliberado por parte de sucessivos governos, a partir do alinhamento “carnal” de Carlos Menem (1989-1999) com potências extrahemisféricas com uma agenda de debilitação das instituições militares da região, e as perseguições de cunho ideológico que têm sido uma marca registrada do casal Néstor e Cristina Kirchner, nos últimos dez anos. No Brasil, a despeito do desenvolvimento de alguns projetos de tecnologia de ponta, si_20_05.pmd 12 como a construção de submarinos de última geração e o avião de transporte KC390, as restrições orçamentárias têm levado os militares a recorrer rotineiramente a tais aquisições. Um exemplo recente foi a compra pelo Exército de 34 blindados antiaéreos alemães Gepard 1A2, adquiridos a pretexto da segurança das competições esportivas que o País sediará até 2016, bem como da visita do papa Francisco durante a Jornada Mundial da Juventude. Anteriormente, o Exército havia adquirido 220 tanques Leopard 1A5, também alemães. Ambos os modelos já foram desativados pelos exércitos europeus nos quais operavam. No início do ano, foi anunciado o interesse na compra de sistemas antiaéreos russos de última geração, mas até agora não houve uma decisão formal a respeito. Por sua vez, a MB também contribui para essa competição de sucata, ao manter o mais que obsoleto navio aeródromo São Paulo (o antigo Foch francês, lançado ao mar em 1960 e desativado pela Marinha francesa em 2000) e os igualmente vetustos caças Skyhawk comprados para operar nele, dos quais 12 (dos 23 comprados no Kuwait) estão sendo modernizados pela Embraer, ao custo de R$ 106 milhões. Igualmente, a força está gastando R$ 122 milhões para comprar e modernizar quatro aviões Grumman C-1A Trader (retirados de serviço em 1988 pela Marinha dos EUA), para realizar tarefas de transporte e reabastecimento no São Paulo. Uma utilização bem melhor para esses recursos seria a construção de uma há muito necessária segunda base para a MB no Nordeste ou Norte do País, contemplada na Estratégia Nacional de Defesa de 2008, mas ainda sem previsão para concretização. Percebe-se, assim, que os problemas da defesa nacional não se limitam à miopia estratégica da classe política em relação às 18/08/2013, 11:04 1a quinzena de agosto de 2013 necessidades do setor, sempre um dos favoritos para os cortes orçamentários efetuados de forma recorrente pelo governo federal, para cumprir os compromissos com o sempre prioritário serviço da dívida pública. Em vários casos, ao se aferrar a concepções sobre o emprego da força militar e de equipamentos que as rápidas mudanças políticas e tecnológicas do cenário global têm colocado em questão, os planejadores militares brasileiros também têm dado a sua contribuição para um uso menos adequado dos recursos disponíveis. Em lugar de investir em equipamentos obsoletos e de utilidade questionável, as F.As., tanto brasileiras como argentinas, deveriam fazer uma opção preferencial pelo estado da arte, ainda que os equipamentos sejam adquridos em menor quantidade, à espera de dias melhores, favorecidos por um amadurecimento das respectivas sociedades civis quanto às necessidades mínimas da defesa nacional. Igualmente, devem ser aproveitadas todas as oportunidades para o engajamento das indústrias nacionais e para projetos de cooperação bi ou multinacionais, a exemplo do avião de treinamento básico Unasur-I, iniciativa da própria Argentina, cujo desenvolvimento foi aprovado, em maio, pelo Conselho de Defesa da União de Nações SulAmericanas (Unasul). Embora aparentemente modesto, trata-se de um projeto com potencial para viabilizar iniciativas mais ambiciosas, de maior conteúdo tecnológico, além de representar um importante fator de construção de confiança regional. Outro interessante campo de cooperação é oferecido pelos VANTs (Veículos Aéreos Não Tripulados), cuja importância tende a crescer na substituição de aviões convencionais em certas missões, principalmente, de reconhecimento e ataque leve. Vários países da região têm projetos próprios de tais aeronaves e o Brasil já projeta motores para elas. Nesse contexto, o Brasil e a Argentina, que já têm projetos conjuntos, como o jipe militar Gaúcho e a participação da Fábrica Argentina de Aviones (FAdA) no projeto KC-390, podem pensar em voos mais altos, em termos de capacitação tecnológica e si_20_05.pmd 13 13 estratégica. Um projeto de enorme alcance seria o desenvolvimento de um satélite de reconhecimento, que poderia ter múltiplas funções militares e civis, como a vigilância das zonas de exploração econômica exclusiva de ambos os países, no Atlântico Sul. O projeto poderia, eventualmente, ser estendido a outros países da região e até mesmo fora dela, como a África do Sul, parceira do Brasil no grupo BRICS. Da mesma forma, seria relevante dar atenção à pesquisa e aplicação de novos princípios físicos nos equipamentos militares, em um processo de interação entre centros de pesquisa militares e civis, como ocorre em países mais avançados. Em março de 2012, o então ministro da Defesa da Federação Russa, Anatoly Serdyukov, anunciou que o planejamento estratégico do país inclui “o desenvolvimento de armamentos baseados em novos princípios físicos: armas de energia direta, armas geofísicas, armas de energia de ondas, armas genéticas, armas psicotrônicas etc”. O desenvolvimento de tais projetos deverá ficar a cargo de uma agência especial, como a Agência de Projetos de Pesquisa Avançada de Defesa (DARPA, na sigla em inglês) estadunidense (RIA Novosti, 22/03/2012). Em uma escala mais modesta, o Brasil e a Argentina, em particular, dispõem de capacidades científico-tecnológicas para uma iniciativa similar, que poderia, por exemplo, dar a partida em um projeto de pesquisas baseado na chamada “energia do ponto-zero” (zero-point energy, em inglês) ou do vácuo quântico, que tem sido objeto de numerosos estudos em vários países industrializados, em iniciativas de pesquisadores isolados e, provavelmente, nos laboratórios de pesquisas sigilosas (black projects) de potências como os EUA. Para os adeptos dos “negócios como sempre”, algumas dessas propostas podem parecer delirantes, mas nenhuma está fora do alcance das capacidades argentinas e brasileiras. No entanto, para concretizá-las, será preciso um grande esforço de arejamento de concepções e de superação de velhas inércias institucionais, para que se possa, de uma vez por todas, deixar para trás esse incômodo torneio de sucatas militares. 18/08/2013, 11:04 14 Solidariedade Ibero-americana Uma denúncia Clovis Ramalhete N. dos E. – A seguir, por sua grande atualidade, reproduzimos um artigo do falecido jurista Clovis Ramalhete (1912-1995) sobre a política indigenista introduzida pela Constituição de 1988, publicado no Jornal do Brasil de 30 de outubro de 1993. Um dos grandes juristas da sua geração, Ramalhete foi, entre outros cargos, juiz da Corte Permanente de Arbitragem de Haia, consultor-geral da República e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). O texto a seguir merece a atenção dos leitores, em especial, daqueles envolvidos nos aspectos legislativos da política indigenista. Esta denúncia, com vistas à revisão constitucional, aponta aos congressistas o exagero do constituinte de 88 ao tratar de índios. Ele o fez com radicalismo. Este capítulo da Constituição de 88 contém – vejam só – ameaça à organização nacional, à sua integridade e ao desenvolvimento. Melhor será revogá-lo da Constituição. É o que tentarei demonstrar, tão errada e sectária revela-se a política ali adotada. É voz geral que ninguém leu toda a Constituição de 88. Cada segmento da sociedade leu o que lhe interessava. Mas o capítulo sobre o índio, no final da Constituição, este ninguém o leu, claro. Por isso não se levantou a merecida opinião crítica ao texto. Ele é sectário, radical e antinacional. Ninguém, político ou jurista, por ter lido sobre os índios na Constituição de 88, já pasmou ao ver que eles agora se tornaram irremovíveis. E o são até mesmo no caso de “interesse da soberania nacional” (só lendo para acreditar!). Enquanto com índio agora é assim, irremovível, o restante da população brasileira é deslocado por ordem judicial, no caso de desapropriação. Arredam-se famílias para abrir nova si_20_05.pmd 14 rua. Até populações compactas são removidas, como no caso de hidrelétricas, necessárias, a serviço de áreas industriais e de desenvolvimento. Mas índio, não; índio está fincado ao solo pelo constituinte de 88. Ninguém já ficou surpreso, só porque não leu a Constituição, por ali saber esse fato espantoso: no Brasil, para apenas 240 mil índios existentes, estão destinados 793 mil quilômetros quadrados, isto é, 26 vezes mais que o território da Bélgica ou que a soma da França com a Inglaterra. Pergunto: e o lavrador sem terra? É por efeito desta Constituição de 88 que nossa Federação está esquartejada. Por mera portaria do ministro da Justiça vão sendo retalhados territórios dos estados para índios. E tudo sem a audiência dos estados e sem a intervenção do Congresso Nacional. Agora, na Federação, estados são mutilados por portaria! Pergunto, eu, e com indignação: que federação é esta, a nossa? Nela, portarias despedaçam estados! Ninguém protesta. Governadores dos estados mutilados, senadores, deputados, onde estão? Reúnamse, reajam; a revisão da Constituição pode curar esse aleijão. Também ninguém ficou perplexo ao saber que o subsolo pertence agora ao índio, onde habite; enquanto que, no território restante, ao fazendeiro só pertence a superfície da terra, com pastos e matas; e o subsolo é da União. Por que a diferença? Talvez seja o cacique quem deva assinar a concessão da exploração, mas com reserva do lucro, pois já lhe está assegurado pela Constituição. Ninguém já leu, para saber, que as tribos agora estão dotadas de capacidade para ingressar em juízo. Assim poderão, de dentro do estado, atacar a unidade do território do Brasil. 18/08/2013, 11:04 1a quinzena de agosto de 2013 Ninguém se advertiu ainda que ali na Amazônia, onde há tanto índio, pululam Organizações Não-Governamentais, as polêmicas ONGs, mais de trinta, financiadas por capital estrangeiro, agora tomado de suspeito idealismo quanto à ecologia da cobiçada Amazônia. Mas ninguém se deu conta de que foi agora tornado possível pelo constituinte de 88, e de modo expresso, que aventureiros, ONGs, missionários, algum patife e até idealistas fundem para índios sociedade que seja representativa da tribo. Tal entidade, então, iniciará na Justiça combate de toda ordem; ou irá levar denúncias contra o Brasil, sem base, difamatórias, apresentadas a órgãos da OEA ou da ONU, talvez sobre suposto genocídio, como se falou há pouco. E tudo movido por pessoa jurídica fundada por um qualquer, para índios. E terá base no “direito originário” do índio à terra que ocupa, movido por “pessoas jurídicas” fantasmas: uma farsa perigosa. Leiam a Constituição e confiram tudo isso no capítulo sobre índios, que entendo deva ser revogado, agora, na revisão constitucional. De fato, diz a Constituição de 88, no capítulo sobre o índio (capítulo que ninguém leu): “São reconhecidos aos índios os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam!” Vê-se logo que o constituinte errou. Ele admitiu aos índios, agora, a atualidade de “direitos originários” às terras que ocupam. Opôs tais “direitos” a tudo quanto a história já construiu politicamente em terra brasileira, desde a chegada de Cabral. Nesta verba constitucional, o constituinte de 88 declarou reconhecer “direitos originários” às terras. Contrariou então manifesto interesse brasileiro de que a soberania do Brasil seja íntegra; e recobriu os índios também, sujeitos à ordem jurídica nacional. Que é isso, agora, de “direitos originários”? Aos índios, é certo que devem ser assegurados seus costumes, e receberem eles a proteção do Estado, permissiva da sua aculturação. Entretanto, o tal “direito si_20_05.pmd 15 15 originário” às terras, este não existe mais. Sua garantia atual opõe-se ao regime jurídico nacional vigente. Ele é produto dos quatro séculos de processo formativo do Brasil, nas sucessivas etapas da colônia, da monarquia e da república. O constituinte de 88, ao garantir aos índios “direitos originários” às terras, faz tardia objeção ao Direito Internacional do século XVI, que, no tempo das navegações e “descobertas”, em definitivo concedeu a posse dos territórios achados à soberania da coroa a que se sujeitasse o navegador, ainda que no território encontrado se deparasse com civilizações como a dos incas e dos maias. A história já recobriu tudo. Nas Américas, por efeito dessa ordem jurídica seiscentista, aqui se instalaram colônias. O processo de séculos, que se seguiu, culminou constituindo Estados soberanos, reconhecidos mundialmente. Mas veio agora o constituinte de 88 e tentou ressuscitar suposto “direito originário” deles à terra que ocupam. Reconheceu-o e quis pô-lo em vigência. E, assim, desintegrou a organização nacional brasileira, cirando perigos potenciais, para o pior. A presente denúncia dirige-se ao Congresso Nacional ocupado em rever a Constituição de 88. Que alguém leia (até que enfim!) esse danado capítulo dos índios. E, então, que o congressista ponha na Constituição a garantia dos costumes ao silvícola; a proteção dele pelo Estado, sem interferência na sua cultura; e a possibilidade de ampara o natural processo de sua aculturação. Mas quanto aos supostos “direitos originários” às terras, e quanto a serem eles irremovíveis, que seja apagado na Constituição esse erro, esse radicalismo de perigos potenciais. Há mais e mais demasias do constituinte de 88 nesse fantástico capítulo sobre índios. Ele figura bem ao final da Constituição. Por isso, ninguém o leu. O melhor mesmo seria revogá-lo. A matéria é para lei ordinária, como já figura no Estatuto do Índio. 18/08/2013, 11:04 16 Solidariedade Ibero-americana CONHEÇA O NOVO LANÇAMENTO DA CAPAX DEI EDITORA Loja virtual: www.capaxdei.com.br | [email protected] F A Ç A O S E U P E D I D O (acrescentar R$ 6,00 para remessa postal) Nome End. Cidade UF Tel.: CEP E-mail exemplar(es) do livro Quem manipula os povos indígenas contra o desenvolvimento do Brasil: um olhar nos porões do Conselho Mundial de Igrejas – R$ 35,00 assinatura anual do jornal Solidariedade Ibero-americana – R$ 135,00 Opção de pagamento: [ ] Cheque nominal à Capax Dei Editora Ltda. no valor de R$ [ ] Depósito bancário no Banco do Brasil, ag. 0392-1, c.c. 20.735-7 em nome da Capax Dei Editora Ltda. no valor de R$ Envie seu pedido e cheque ou comprovante de pagamento à Capax Dei Editora Ltda. R E M E T E N T E | R. México, 31 s. 202 si_20_05.pmd 16 CEP 20031-144 – Rio de Janeiro – RJ telefax +(21) 2510.3656 18/08/2013, 11:04
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