Obturação do Sistema de Canais Radiculares – Técnicas e

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Obturação do Sistema de Canais Radiculares – Técnicas e
Obturação do Sistema de Canais Radiculares –
Técnicas e Considerações
Grace Thaís Bastianelli, CD.
Ingle ( 1956), Barbakow ( 1980), Swartz (1986) e Nguyen (1994), atribuem a incompleta
ou inadequada obturação do sistema de canais radiculares a responsabilidade por um grande
número de insucessos na terapia endodôntica. Devemos considerar ainda que, na maioria
dos casos, falhas na fase de obturação se devem a dificuldades ou imprecisões ocorridas
durante a fase de preparo do canal.
Diversos estudos mostram a presença de inúmeras irregularidades no sistema de canal
radicular, sendo muitas dessas difíceis de obturar. O material obturador ideal deve ser
biocompatível, atóxico, radiopaco, fácil manipulação, insolúvel em fluídos teciduais e
capaz de se adaptar às paredes do canal radicular. Devido suas propriedades físicoquímicas, a guta percha com cimento é o material de eleição para diversas técnicas2.
Ao escolher a técnica de obturação do sistema de canais radiculares, devemos levar em
consideração a adaptação do material na parede dos canais, infiltração apical, sucesso
clínico, temperatura e facilidade em sua realização.
Muitas Técnicas de obturação foram desenvolvidas com o objetivo de promover um
selamento tridimensional do espaço do canal radicular tais como condensação lateral fria (
Grossman 1981), compactação termomecânica ( McSpadden1980), Thermafil ( Johnson
1978), guta percha termoplastificada ( Gutman& Rakusin 1987) e condensação vertical
aquecida ( Schilder 1967)7.
A fase inicial da condensação vertical é chamada “downpack” e tem por objetivo selar os
poucos milímetros apicais do sistema de canal radicular. O “downpack”, entretanto, deixa
espaços vazios no canal coronariamente, e a obturação desse espaço é chama “ backfillig”
ou preenchimento7.
A condensação lateral pode ser fria ( Grossman 1981), aquecida ( Martin & Fischer 1990)
ou em conjunto com termocompactador como uma técnica híbrida (Tagger 1984). Essa
versatilidade da técnica a tornou a mais utilizada 7.
O Compactador de McSpaden foi introduzido em 1978 ( McSpadden 1980) e utiliza a
energia friccional através de um compactador rotatório de aço inoxidável para derreter o
cone principal de guta percha e compactá-lo apicalmente. As desvantagens desta técnica é
que este compactador pode fraturar, além de dificuldade de controlar a extrusão apical do
material 1 .
A Técnica Híbrida ( McSpaden 1994) foi desenvolvia com o intuíto de controlar a extrusão
apical, através da condensação lateral do cone principal e colocação de guta percha fase
alfa para o preenchimento do canal. Gilhooly et al (2001) compararam esta técnica à
condensação lateral, e verificaram que esta técnica apresentou maior extrusão apical e pior
classificação de qualidade radiográfica em relação à condensação lateral, não apresentando
diferença estatística entre as técnicas quanto à infiltração coronária 1.
Técnica de condensação vertical aquecida ( Schilder 1967) é superior à condensação lateral
fria por preencher o canal radicular com uma mínima quantidade de cimento, porém requer
um maior número de passos, tempo, além de ser necessário um preparo de canal mais
amplo 1.
O sistema Thermafil ( Johnson 1987) consiste em um carreador de aço inoxidável ou níquel
titânio envolto por guta percha. Após selecionar o tamanho adequado, levar o cimento
endodôntico no canal, o carreador ao Therma Prep para ser aquecido, e posteriormente este
é levado ao canal radicular até o comprimento de trabalho. O remanescente do carreador
deve ser cortado com uma broca, e a guta percha deve ser compactada verticalmente com
um condensador 8.
O Alphaseal ( Multi-Phase I&II : NiTi Co., Chattanooga,TN,USA) consiste no Multi-Phase
I alta viscosidade e Multi-Phase II baixa viscosidade de guta percha, que são levados ao
canal radicular através de um condensador de niquel-titânio ou Pacmac 25.04 taper (NiTi
Co.), sendo este último, segundo McSpadden (1995) mais eficaz em introduzir a guta
percha no canal radicular. Como preenchimento, somente o Multi-Phase II é utilizado5. Ao
investigar esta técnica, Gilholly et al ( 2000) verificaram que a extrusão de cimento e guta
percha eram significantemente maior, apresentava menor infiltração apical e pior
classificação da qualidade radiográfica em relação á condensação lateral 1 .
Técnica Microseal (Analytic, Glenora,CA,USA) é o resultado da combinação e
modificação das técnicas Alphaseal e Híbrida. A técnica consiste no travamento do cone
principal no comprimento de trabalho, e depois o mesmo é levado ao interior do canal
envolto por cimento endodôntico. O cartucho de MicroFlow ( Analytic), contendo guta
percha de baixa fusão, é colocado no aquecedor Microseal por 15 segundos. O cartucho de
MicroFlow é removido do aquecedor e um condensador Microseal .04 é inserido no
cartucho de modo a ficar envolto por guta percha. Um espaçador é colocado lateralmente
ao longo do cone principal e removido, criando espaço para a inserção do do condensador
.04 envolto por guta percha, o qual é inserido e acionado a uma rotação de 5.000 rpm. O
condensador deverá permanenecer por 2 segundos na posição apical, antes de ser
suavemente removido com uma pressão contra as paredes laterais do canal. Com um
instrumento manual (condensador) deve ser feita a condensação vertical. Se necessário, o
procedimento pode ser repetido 1.
A Técnica original de condensação vertical aquecida leva tempo, sendo facilitada com a
introdução do “ Touch and Heat” ( Analytic Tecnology, Redmont,WA,USA). Este
instrumento consiste em um calcador, aquecido eletricamente, sendo sua ativação através
de um toque digital. Este dispositivo tornou a condensação vertical mais fácil, promovendo
um melhor controle da extensão que o calor é aplicado7.
Com o objetivo de simplificar a técnica de condensação vertical aquecida, Buchanan (1996)
desenvolveu esta técnica utilizando o princípio de aquecimento do equipamento System B (
Analytic Sybron Dental Specialties, Orange, CA, USA), produzindo um preenchimento do
canal com alto percentual de guta percha ( Silver et al 1999) e selamento apical similar (
Pommel & Camps 2001). Combinado com o sistema de injeção de guta percha Obtura II (
Obtura Corporation, Fenton, MO, USA), pode ser atingido um efetivo preenchimeto do
canal radicular ( Mc Robert & Lumley 1997). O condensador do System B a ser
selecionado é aquele que penetre pelo menos até 5 mm do comprimento de trabalho. Um
stop de silicone deve ser colocado á 3 mm do ponto que este condensador prenda nas
paredes do canal. Verifica-se o travamento do cone principal no comprimento de trabalho e
o mesmo é levado envolto por cimento. O System B deve estar ajustado em sua potência
máxima ( 200°C). O equipamento é acionado com um toque e levado ao canal radicular até
a altura do cursor de silicone. O aquecimento é desativado e o condensador é empurrado
até o ponto que o mesmo se prenda às paredes do canal e mantido por 10 segundos. Com
um toque, o calor é novamente ativado, aguarda-se 1 segundo e o condensador é
removido.O preenchimento do canal é realizado através da injeção de guta percha aquecida.
O Obtura II é ajustado para 200°C, e a agulha inserida no canal radicular de modo a tocar a
guta percha apical. Aguardar 5 segundos, dispensar a guta percha e condensar apicalmente
com o auxílio de um condensador manual 1.
Mc Robert e Lumley (1997) realizaram uma pesquisa in vitro com o objetivo de comparar
a capacidade de preenchimento do System B, Obtura II e Alphaseal, e verificaram que,
radiograficamente, não houve diferença em relação à presença de bolhas entre as técnicas
de preenchimento com System B, Obtura II e Alphaseal, sendo que o Alphaseal foi o que
apresentou o maior número de bolhas. .Em relação à infiltração coronária, não houve
diferença significativa entre o preenchimento com System B e Obtura II, sendo que estes
apresentam uma infiltração sinificativamente menor em relação ao preenchimento com
Alphaseal e condensação lateral. O System B parece ser mais difícil de usar em relação ao
Obtura II, mas não há diferença em relação a bolhas e infiltração 7.
Weller et al (1997) compararam 4 técnicas de obturação do sistema de canais radiculares,
sendo que a Técnica com o Obtura II foi a única que obturou o canal radicular em toda a
sua extensão. Pouquíssimas bolhas foram encontradas e uma excelente adaptação à
superfície radicular foi encontrada nesse grupo 11.
Há situações clínicas em que o sistema e injeção de guta percha plastifica é imprescindível,
como nos casos e reabsorção interna. Goldberg et al (2000) avaliaram in vitro a qualidade
de obturação e o tipo de material que preencheu a reabsorção interna simulada entre quatro
técnicas de obturação: compactação lateral, técnica híbrida, Obtura II e Thermafil. O
Obura II apresentou significativamente um melhor resultado, sendo a cavidade interna de
reabsorção preenchida principalmente com guta percha. Dos dez dentes obturados com esta
técnica, nove apresentaram obturação completa da reabsorção interna simulada e em oito o
principal material de preenchimento foi a guta percha 3.
Marlin (1986), avaliou in vivo de uma caso obturado através da técnica de injeção de guta
percha realizada com o Obtura. Verificou que esta técnica requer menor força de
condensação em relação a outras técnicas, um fator importante quando considerado o alto
índice de falhas por fratura. Radiograficamente, a obturação mostrou-se densa, com canais
bem preenchidos, ligeiramente aquém do ápice radiográfico e preenchimento de alguns
canais acessórios e ramificações 6.
Tani-Ishi e Teranaka ( 2003) avaliaram clínica e radiograficamente a reparação de 236
tratamentos de canal em 131 casos obturados com Obtura II, sendo que as radiografias
foram analisadas por 2 endodontistas experientes. Neste estudo, mais de 96 % dos casos
obtiveram sucesso e o extravasamento não interferiu no processo de reparação, sendo o
índice de sucesso de 97 % para o preenchimento no comprimento ideal e 93 % tanto para os
casos de sub quanto sobreobturação 10.
Torabinejad et al 1990 & khayat et al 1993 demonstraram que dentes tratados
endodonticamente expostos coronariamente a bactérias apresentaram contaminação apical.
Jacobson et al ( 2002) avaliaram infiltração coronária bacteriana em dentes obturados com
a técnica de ondas contínuas de condensação com o SystemB, seguida pelo preenchimento
com o Obtura II, e em dentes obturados com a técnica de condensação lateral. Foi
constatado que a infiltração bacteriana coronária ocorre mais rápida usando a técnica de
condensação lateral (2 dias) em relação a técnica de ondas contínuas de condensação
utilizando o System B e o Obtura II ( 7 dias) 4.
A técnica de backfill com o Obtura foi avaliada por Johnson e Bond (1999). Neste trabalho
compararam a infiltração em canais onde o preenchimento (backfill) foi feito em um ou
múltiplos incrementos, utilizando dois tipos de cimento. Constataram que não houve
diferença significativa entre o backfill em 1 incremento ou em múltiplos incrementos,
sendo clinicamente aceitável o backfill em incremento de até 10 mm 5.
A qualidade da obturação do sistema e canais radiculares é extremamente importante para o
sucesso do tratamento endodôntico. Cathro et al (2003) compararam a proporção de guta
percha, cimento e bolhas através do preenchimento de canais simulados em blocos
plásticos, utilizando duas técnicas de obturação termoplastificada , Microseal e System B/
Obtura II, e concluíram que a técnica do Microseal produz um preenchimento heterogêneo
composto do cone principal MicroFlow e a guta percha do cartucho, misturadas com o
cimento, enquanto que a técnica com o System B/ Obtura II produz um preenchimento
homogêneo em todos os níveis 1.
Um questionamento freqüente em relação às técnicas de obturação termoplastificada, é o
aquecimento que essas podem gerar, ocasionando danos ao ligamento periodontal. É aceito
que o aumento da temperatura da superfície externa acima de 10° C da temperatura
corporal pode causar danos às estruturas ao redor do dente. Um fator que pode alterar a
temperatura da superfície externa radicular é a espessura da dentina, uma vez que esta é
considerada um bom isolante. Este fato pode explicar a variação da temperatura na
superfície radicular em sua extensão. O cimento também pode ser considerado como
isolante, podendo reduzir a temperatura externa radicular de 1°C a 2°C. No trabalho
realizado por Sweatman et al ( 2001) mensuraram a temperatura do canal radicular e da
superfície radicular em diferentes níveis, usando System B com os condensadores Fine,
Fine –Medium e Medium a 200°C, 250°C e 300°C, além dos sistemas Obtura II e
Ultrassom. Em momento algum, nenhum os 3 sistemas causou um aumento de temperatura
da superfície externa superior à 10 ° C 9, o que significa que o uso dessas técnicas não gera
nenhum dano ao ligamento periodontal.
Essa é apenas uma breve revisão das técnicas de obturação que podem ser utilizadas, sendo
necessária a avaliação do caso clínico e habilidade do profissional para a escolha da técnica
a ser utilizada.
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