Perto Longe - Zipper Galeria
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Perto Longe - Zipper Galeria
Perto Longe Prospecções movediças As propostas poéticas de Aline van Langendonck lidam de forma hábil com a construção e o apagamento. Muitos dos estratos que fundamentam a pesquisa do desenho, em especial, da artista tem a ver com essa complicada urbe na qual nasceu e vive, São Paulo, cidade que parece viver um cíclico jogo de potencialidades e decepções. Van Langendonck lida bem com essa visualidade de limites algo estrangulados da cidade e cria uma obra que se beneficia do residual, das lateralidades e do sorrateiro. Foi assim desde cedo em sua trajetória. Em 2001, em parceria com Laerte Ramos, extraiu a fuligem do túnel Noite Ilustrada, numa área limítrofe do verde bairro do Pacaembu, e criou desenhos que devem ter desestabilizado, ao menos por segundos, motoristas encerrados na pressa diária. No mesmo ano, as séries de gravuras Esquinas e Ensaios captavam uma luz fugidia e, numa dupla característica, tanto fortaleciam os traços do desenho em alguns dos trabalhos como preenchiam a superfície com um negro quase total em outros. Já com dez anos de trajetória, Van Langendonck vem avançando discretamente na criação de trabalhos que se alimentam desses fluxos maximizados de circulação da metrópole. Para Perto Longe, individual que apresenta no projeto Zip’Up, assina a primeira intervenção na fachada principal da Zipper Galeria, criando outra peça da série Paisagem Milimetrada. Ela instala quadrantes de tom azulado que revelam grides superpostos, serigrafias sobre vinil adesivo a exibir um desenho vivo, com uma movimentação virtual pelo espaço. A rigidez do padrão, assim, contém uma flexibilidade que, com ritmo, tenta capturar a atenção do olhar do passante. Disposição já concretamente percebida em Condensações, intervenção com acrílica e spray nas grandes paredes de entrada do Sesc Pinheiros, produzida neste ano. No trabalho, a representação variada de nuvens e das palavras que nomeiam muitos desses corpos de água e gelo que passeiam pelos céus fixavam, novamente em tom azulado, esse balé atmosférico tão imaterial, mas, ao mesmo tempo, tão presente nas memórias afetivas. “Porque, é verdade que aquilo a que chamamos paisagem se desenrola em volta de um ponto, em ondas ou em vagas sucessivas para se concentrar de novo nesse único objecto, reflexo em que vem fixar-se tudo ao mesmo tempo, a luz, o odor ou a melancolia. E eu sei bem que houve outras. [...] Muitas outras, incluindo as cidades. Os edifícios formam parelhas na luz eléctrica azul. Os portos. As portas batem, um murmúrio. Cidades de jade e de lápis-lazúli, construídas ao longo de um lago invisível, vejo belos cemitérios, e ao mesmo tempo que me apercebo de que existem apenas marinheiros, caio da plataforma rochosa onde se encontrava a porta. Caio eternamente na direcção do oceano soberbo, mas não chego a tocar-lhe. E, de repente, a paisagem está ali. Apareceria ela sem esta abertura, quando o sonho desliza da noite para a claridade ínfima do dia?”1, destaca, numa das passagens mais bonitas de A Invenção da Paisagem, a francesa Anne Cauquelin. As topografias plásticas criadas por Van Langendonck podem ser vistas também em peças de menor dimensão. Em 180° (2011), por exemplo, flipbook que pede a participação do público para acontecer o desenho por meio do movimento veloz das páginas se sucedendo. E se apresentam na forma de um “desenho sonoro”, Na Linha A Linha Azul (2010), no qual a narração de estilo radiofônico de Juca Kfouri e Marcelo Gomes faz com que o ouvinte crie um registro mental do que a artista sugere, traços que, reunidos, equivalem aos desenhos feitos a lápis e papel, de materialidade chamativa. A condução entusiasmada, a variedade de bordões e a referência imediata aos campos do futebol, verdes palcos de um entretenimento massivo, geram fricções interessantes no conjunto dos trabalhos da artista na mostra Perto Longe, tão marcado por retículas, linhas, ângulos, raios e diâmetros. No entanto, tal rigidez é constantemente subvertida por Van Langendonck, na irregularidade dos intervalos que surgem nas superfícies da série Massas: Deslocamentos (2011), com sua fugaz presença de luz que fundamenta os desenhos encerrados em backlights. A série de relevos secos sem título também assume essa fragilidade de existência, característica tão forte na obra específica feita pela artista no Paço das Artes, em 2003. Nela, a figura humana impressa a guache na claraboia do espaço expositivo surgia em projeções enigmáticas, de acordo com a luminosidade do dia, no interior do centro de artes. “Permanece o fato de que a mente e as coisas de certos artistas não são ‘unidades’, mas coisas num estado de disrupção suspensa. Alguém pode se opor a volumes ‘ocos’ em favor de ‘materiais sólidos’, mas nenhum material é sólido, todos eles contêm cavernas e fissuras”2, ressalta Robert Smithson em seu fulcral texto Uma Sedimentação da Mente: Projetos de Terra. Série [series] Massas: Deslocamentos, 2011 ALINE VAN LANGENDONCK Mario Gioia Graduado pela ECA-USP (Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo), foi o curador, em 2011, de Presenças (Zipper Galeria), inaugurando o projeto Zip’Up, destinado a novos artistas (que teve como outras mostras Já Vou, de Alessandra Duarte, e Aéreos, de Fabio Flaks, com a mesma curadoria). Em 2010, fez Incompletudes (Galeria Virgilio), Mediações (Galeria Motor) e Espacialidades (Galeria Central), além de ter realizado acompanhamento crítico de Ateliê Fidalga no Paço das Artes. Em 2009, fez as curadorias de Obra Menor (Ateliê 397) e Lugar Sim e Não (Galeria Eduardo Fernandes). Foi repórter e redator de artes e arquitetura no caderno Ilustrada, no jornal Folha de S.Paulo, de 2005 a 2009, e atualmente colabora para diversos veículos, como as revistas Bravo e Trópico e o portal UOL, além da revista espanhola Dardo. É coautor de Roberto Mícoli (Bei Editora) e faz parte do grupo de críticos do Paço das Artes. 1. CAUQUELIN, Anne. A Invenção da Paisagem. Edições 70, Lisboa, 2008, p. 17 2. FERREIRA, Glória e COTRIM, Cecilia (org.). Escritos de Artistas – Anos 60/70. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2006, p. 190 Rua Estados Unidos, 1494 CEP 01427 001 São Paulo – SP – Brasil +55 [11] 4306 4306 www.zippergaleria.com.br ALINE VAN LANGENDONCK Perto Longe Shifting prospects Aline van Langendonck’s artistic proposals skilfully address the notions of construction and erasure. Many of the underlying strata of the studies for the artist’s drawings, in particular, are related to São Paulo, the complicated city where the artist was born and lives, and which seems to live a cyclic game of capabilities and disillusions. Far), her solo exhibition presented for the Zip’Up project, she brings an intervention on the main façade of the Zipper Galeria, creating another piece from the Paisagem Milimetrada (Landscape in Millimetres) series. She installs blue-toned quadrants that reveal overlapping grids, screen prints on adhesive vinyl to display a living drawing, with a virtual motion through space. The rigidity of the pattern, therefore, contains a flexibility that rhythmically attempts to catch the eye of the passer-by. Such a configuration could already be perceived in Condensações (Condensations), an intervention with acrylic and spray paint on the large entrance walls of the SESC Pinheiros, produced this year. In this work, the varied representation of clouds and words that designate several of these bodies of water and ice that cross the skies, again in a blue tone, established this aerial ballet, so immaterial, yet at the same time so present in our minds. “Because it’s true that that which we call landscape unfolds around a point, in waves or in successive spaces to be condensed again in this single object, a reflection in which everything comes together at the same time; light, scent or melancholy. And I know that there have been others. [...] Many others, including cities. The buildings form pairs in the electric blue sky. The ports. The doors slam, a murmur. Cities of jade and lapis lazuli, built alongside an invisible lake, I see beautiful cemeteries, and just as it dawns on me that there are only sailors, I fall from the rocky platform where the door was. I fall eternally towards the magnificent ocean, but never reach it. And, all of a sudden, the landscape is there. Would it appear without this opening, when the dream slides from the night to the never-ending light of day?”1, as French thinker Anne Cauquelin writes in one of the most beautiful parts of L’invention du paysage. Van Langendonck works well with the visuality of the somewhat strangulated limits of the city, creating an art that benefits from the residual, the fringes and the surreptitious. She has worked in such a way since her early days. In 2001, in partnership with Laerte Ramos, she extracted the soot from the Noite Ilustrada tunnel, located on the edges of the leafy neighbourhood of Pacaembu, and created drawings that must have destabilized, at least for a few seconds, the drivers emerged in the daily rush. In the same year, her series of engravings Esquinas e Ensaios (Corners and Essays) captured a fleeting light and, in a dual characteristic, both strengthened the drawing lines in some of the works and almost completely blacked out the surface in others. The plastic topographies created by van Langendonck can also be seen in smaller scale pieces. In 180° (2011), for example, a flipbook that requires spectator interaction to trigger the drawing into life by quickly flicking through the pages. And they are presented in the form of an “acoustic drawing” in Na Linha A Linha Azul (In Line the Blue Line) (2010), in which the radio presentation style of Juca Kfouri and Marcelo Gomes lead the listener to create a mental record of what the artist suggests, lines that, when put together, correspond to the pencil drawings, of eye-catching materiality. The excited broadcasting style, the variety of catchphrases and immediate reference to football pitches, green stages for mass entertainment, generate interesting points of friction in the artist’s set of works in the Perto Longe show, typified by grids, lines, angles, radii and diameters. With ten years of work behind her, van Langendonck has been quietly getting on with creating works that feed on these maximized flows of circulation in the metropolis. For Perto Longe (Near However, such rigidity is constantly subverted by van Langendonck in the irregularity of the intervals that arise in the surfaces of the series Massas: Desclocamentos (Masses: Displacements) (2011), with the fleeting presence of light grounding the backlit drawings. The untitled series of paper embossings also assumes this existential fragility, such a strong characteristic in the work produced specifically by the artist at the Paço das Artes, in 2003. There, the gouache printed human figure in the skylight of the exhibition room emerged in enigmatic projections, according to the daylight that entered the art centre. “The fact remains that the mind and things of certain artists are not ‘unities’, but things in a state of arrested disruption. One might object to ‘hollow’ volumes in favor of ‘solid materials’, but no materials are solid, they all contain caverns and fissures”2, underlines Robert Smithson in his central text A Sedimentation of the Mind: Earth Projects. Série [series] Massas: Deslocamentos, 2011 (detalhe/detail) Mario Gioia A graduate from the ECA-USP (São Paulo University School of Arts and Communication), in 2011 he curated the exhibition Presenças (Zipper Galeria), inaugurating the Zip’Up project, aimed at new artists (which has also included the exhibitions Já Vou, by Alessandra Duarte, and Aéreos, by Fabio Flaks, with the same curatorship). In 2010, he presented Incompletudes (Galeria Virgilio), Mediações (Galeria Motor) and Espacialidades (Galeria Central), as well as providing critical reviews of Ateliê Fidalga no Paço das Artes. In 2009, he curated Obra Menor (Ateliê 397) and Lugar Sim e Não (Galeria Eduardo Fernandes). He also worked as a reporter and editor of arts and architecture in the Ilustrada supplement of the Folha de S. Paulo newspaper from 2005 to 2009, and is currently writing for several publications, including the magazines Bravo and Trópico and the UOL online portal, as well as the Spanish magazine Dardo. He is the co-author of Roberto Mícoli (Bei Editora) and belongs to the Paço das Artes team of critics. 1. CAUQUELIN, Anne. A Invenção da Paisagem. Edições 70, Lisboa, 2008, p. 17 2. FERREIRA, Glória e COTRIM, Cecilia (org.). Escritos de Artistas – Anos 60/70. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2006, p. 190 Série [series] Massas: Deslocamentos, 2011 (detalhe/detail) Rua Estados Unidos, 1494 CEP 01427 001 São Paulo – SP – Brasil +55 [11] 4306 4306 www.zippergaleria.com.br
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