Galgos e Lebres - IV HEREDITARIEDADE
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Galgos e Lebres - IV HEREDITARIEDADE
Efemérides Galgos e Lebres - IV HEREDITARIEDADE - II por: Sebastião Perestrello Prosseguindo agora com as considerações de Waddington, vê-se que a herança de genes pode ser estudada de duas maneiras diferentes. Podem-se criar animais de tipos diferentes e verificar como as suas potencialidades são transmitidas aos seus descendentes. Pode-se também, alternativamente, observar como os cromossonas se comportaram durante o processo de reprodução e destas observações deduzir-se o que deveria ter-se passado com os genes. Ambos os métodos chegam às mesmas conclusões. Vamos antes adoptar o sistema dos cromossomas. O primeiro aspecto a verificar é o de que na maioria dos animais, o núcleo de cada célula contém diversos tipos dife rentes de cromossomas, uns compridos, por exemplo, outros curtos, mas sempre dois de cada qualidade. Um par proveio do pai, outro da mãe, portanto cada célula, contém em si dois de cada qualidade de genes, mas que podem não ser idênticos exactamente, pois ainda que sendo da mesma famflia, podem provir, no entanto, de indivíduos diferentes dessa famflia. Os cientistas referem-se à família total dos genes que ocorrem em determinado local em determinado cromossoma como ocu pando um local - «locus». Aos diferentes indivíduos da famflia chamam-Ihes: «aleles». Em qualquer organismo individual, portanto os pares de cromossomas no seu núcleo podem conter «aleles» diferentes de certos «locais» no sentido dos seus comprimentos, enquanto que em outros «locais» ambos os cromossomas podem ter o mesmo «alele». Durante o crescimento do indivíduo, as células crescem e eventualmente dividem-se em duas partes, e assim sucessivamente. No entanto, cada célula filha, passa a conter em si exactamente o mesmo complemento de cromossomas. Antes desta divisão da célula, cada um dos cromossomas divide em dois no sentido longitudinal. Desta forma as cálulas novas vêm a ser dotadas exactamente com os seus respectivos cromossomas e genes como já se passava com a célula geradora. Quando o organismo atinge a maturidade e está apto a reproduzir-se, as coisas já não podem passar-se da mesma forma. Tem que se dar o fenómeno, ou um processo, de segmentação para metade do número dos cromossomas, afim de com pensar a duplicação que se dá quando o óvulo e o semen se fundem. Mas, voltando agora à divisão das céluIas; porque os cromossomas que se dividem, podem fazê-Io de diferentes maneiras; os cromossomas nas células filhas, podem ser diferentes dos das células mães, A este aspecto os cientistas referem-se, dando-Ihe o nome de «cruzamento». Este fenómeno dos «cruzamentos» tem grande importância na transmissão de traços hereditários. Na reprodução pode-se admitir e deve-se inferir no tempo, todos os tipos possíveis de óvulos se formam na fêmea. Vamos supôr que temos um animal, e que num dos seus pares de cromossomas, existem dois «aleles» diferentes: A1 A2 n um dos «locais». Quando as células germinais se estão para formar os dois cromossomas juntar-seão de maneira que o A1 se encontre junto ao A2. Depois cada cromossoma passará a dividir-se e teremos um grupo de quatro «aleles»: A1, A1, A2, A2. Levando esta divisão e reprodução mais de longe teremos fatalmente fenómenos de impossível predeterminação com cruzamentos: meios A1 e A2; todos A1 ou A2; etc... Trata-se das proporções de Mendel afinal; do homem que com as suas experiências com as ervilhas, abriu a porta para os subsequentes desenvolvimentos da genética. Foram estas linhas de investigação e dedução que Ievaram à conclusão de que os genes se localizam na extensão dos filamentos-cromossomas. Os cromossomas são corpos extremamente pequenos, só visíveis através de microscópios muito potentes. Cada cromossoma pode conter genes em número dumas centenas a duns milhares. Já se disse antes, que na maioria dos organismos, as células contêm dois de cada tipo de cromossomas, e portanto também contêm dois «aleles» diferentes em cada «local». Temos que supor que a presença de um gene dominante produzirá efeito em desenvolvimento, suficientemente forte para a transmissão do carácter que lhe é próprio. Portanto, mesmo que estejam presentes dois genes dominantes, não haverá mais qualquer outro efeito. Isto significa que alguns dos factores genéticos podem ficar ocultos; é impossivel determinar-se pela vista do animal em observação se ele contém dois genes dominantes, ou um gene dominante e o correspondente gene regressivo. Da copulação de dois animais pode portanto resultar na produção dum tipo novo. Disto segue-se que nunca á possível predeterminar como um animal se irá reproduzir, ou que traços transmitirá aos seus descendentes. As consequências desta conclusão são inúmeras. Por exemplo, não se pode determinar se um galgo e uma galga, contêm factores regressivos que poderiam vir a prejudicar muito uma reprodução dum indivíduo, que não contivesse em si a correspondente dominante. Se dois animais possuidores do mesmo gene regressivo se reproduzirem, é de esperar que uma quarta parte dos filhos demonstrarão o caráter regressivo. Este é o perigo de consaguinidade, e explica os insucessos nos galgos, onde a consaguinidade é muito marcada, principalmente nos galgos ingleses, visto que a probabilidade da presença de actores regressivos é muito mais acentuada e frequente por consequência exactamente da consaguinidade. Por outro lado, também, o facto da consaguinidade pode ser favorável à transmissão de qualidades, pois que devido ao próximo parentesco, também é mais provável terem ambos os progenitores um tipo de factor regressivo valioso, o que tornará a sua descendência geneticamente superior do que o normal. Mas, regressivos favoráveis são provàvelmente mais raros do que os nocivos. Assim, o sistema de «in breeding» (cobrir cadelas com cães seus muito próximos parentes, e até irmãos) é um ligeiro risco, mas não um risco demasiadamente, digamos, arriscado. Ao contrário de que Darwin pensava, ainda que ele próprio considerasse a sua hipótese como fraca, era que os reprodutores transmitiam aos seus descendentes qualquer coisa como que um fluido de cada parte, que misturando-se davam ao novo individuo, passando de geração em geração como valiosas características hereditárias em proporções sempre crescentes. Afinal o que Darwin classificou como selecção natural. Mas, se a hereditariedade significa a lotagem de características dos pais, então e fatalmente as qualidades boas hereditárias, acabariam por ser neutralizadas pela mistura com qualidades menos boas, ou até más. Bateson, diz que as qualidades hereditárias não se misturam na descendência, mesmo que pareçam ter desaparecido e não mostrem estar presentes. O gene regressivo, por exemplo, pressistirá, será transmitido a gerações futuras, e tornará a aparecer quando dois genes regressivos eventualmente se juntarem. Não há perigo de que o mero processo de reprodução venha a alterar a variação hereditária que existe para permitir o funcionamento da selecção natural, e reduzir todos os indivíduos a uma uniformidade insípida. A presença de genes regressivos inoperantes, afinal constitui, como que, uma reserva de variações hereditárias muito maior do que se possa supor; e esta reserva pode vir a ser de importância capital para o ajustamento de espécies em ambientes diferentes dos de agora. Na reprodução de galgos, o criador tem que considerar diversos aspectos dos resultados que espera obter: tamanho, velocidade, dureza, moral, força fisica, formas convenientes, etc. Os reprodutores, portanto, deverão ser tão perfeitos quanto possível no que diz respeito a estas qualidades. Cheguei finalmente ao termo deste sumário, muitíssimo reduzido insisto, sobre genética, citologia, hereditariedade, atavismo e reprodução, considerações que eram necessárias para o prosseguimento deste estudo muito elementar. As conclusões a que necessàriamente se chegam é que é impossivel predeterminar o resultado de cruzas; que se devem escolher os mais perfeitos exemplares dos dois sexos dos quais se esperam bons resultados; que devido aos factores regressivos intangíveis não é de admirar que certas cruzas não dêem bons resultados, principalmente nos galgos ingleses tão próximos parentes uns dos outros; que uma vez encontrada por tentativas uma boa cruza se deve repetir o cruzamento para se tirarem o maior número de filhos. O sexo não pode ser predeterminado ou previsto. O sexo é outro dos mistérios do Universo. Não vou sequer tentar dissertar sobre o assunto. Até que os cientistas possam determinar qualquer coisa a este respeito, contentemonos com a explicação simplista e poética de Platão, que não sendo exacta, nem possível, nem provável, nem aceitável, sem o mérito de ser além de extravagante, o de ser homérica por assim dizer. Diz Platão que no princípio o homem e a mulher eram um indivíduo apenas. A certa altura a fúria dos deuses dividiu-os em dois: homem e mulher. Desde então os dois sexos têm tido uma única ideia: a de se juntarem de novo para tornarem ao estado primitivo. Platão expressa assim o carácter fundamental da sexualidade: a atracção recíproca do homem pela mulher; do macho pela fêmea e vice-versa. Para terminar este artigo vou dar umas opiniões sobre hereditariedade da autoria de J. Arthur Thomson professor de História Natural da Universidade de Aberdeen. «A hereditariedade não é uma força, ou uma entidade mas, é uma relação de carne e sangue entre gerações sucessivas, pela qual o semelhante tende necessàriamente a reproduzir semelhante... Assim há uma continuidade duma organização específica dos pais para os filhos e por aí fora; e esta continuidade, mal classificada como transmissão, é o facto central em hereditariedade... Oualquer novidade vivente de origem germinal é «ipso facto» transmissível ou "continuável: e nenhuma alteração orgânica que prove não ser transmissível pode fazer parte do processo evolutivo. Assim a hereditariedade é uma condição de evolução. «...ninguém até hoje conseguiu compreender porque é que uma de duas características em contraste deva ser dominante e a outra regressiva. As expressões Iimitam-se a afirmar o facto genético de que uma das características em contraste se expressa no desenvolvimento da prole e a outra não...» O Professor Thomson sobre consaguinidade diz: «...É agora sabido que o refresco de sangue, que significa a cruza de dois tipos desemelhantes, não resulta invariàvelmente em vigor híbrido, e também que a cruza consanguínea não é sempre nociva, mas pode de facto ser definitivamente vantajosa, levando ao estabelecimento de produtos uniformes e bons reprodutores». Um aspecto que o nosso professor se refere é à possibilidade de predeterminação dos sexos que virão a nascer. Houve quem afirmasse que nos animais é a fêmea e não o macho que é o factor dominante. Esta teoria afirma que os dois ovários diferem um do outro, no aspecto de que um produz óvulos predestinados a serem machos e o outro predestinados a serem fêmeas. Acrescentam que os ovários funcionam à vez alternadamente em cada menstruação. Pretendem portanto que se se observar o sexo dum nascimento, e se se tomar nota dos períodos seguintes, é possível predizer o sexo de subsequente prole. Outros curiosos pensam que um ovário é de machos e que o outro é de fêmeas, e que se se puder dirigir o semen masculino num sentido ou no outro obtém-se o sexo desejado. Chegam a cobrir vacas na encosta dum monte, com um plano mais baixo de que o outro. O semen correrá para o plano mais abaixo, assegurando assim a fertilização do óvulo desse lado. De ideias ocas e de palavras vãs está o Mundo cheio. Em 1923, R. Goldschmidt publicou um livro sobre este assunto em Londres: «The Mechanism and Physiology y sex Determination». Se alguém se interessar pela predeterminação do sexo, ser-Ihe-á possível consultar este livro. In Jornal “O Mundo Canino” – Junho de 1972