A verdade sobre o caso Ford

Transcrição

A verdade sobre o caso Ford
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APRESENTAÇÃO
Em sentença de 1º grau, a 5ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, em
dezembro de 2009, acolheu ação ajuizada pela Procuradoria-Geral do Estado, em 2000,
contra a FORD. A decisão reconhece o não cumprimento contratual por parte da FORD e
condena a empresa a ressarcir o Estado dos valores recebidos para sua instalação no
RS.
A não instalação da montadora em Guaíba foi objeto de inúmeros debates na
Assembléia Legislativa, onde uma oposição feroz assumiu o papel de advogado de
defesa da Ford, jogando toda a responsabilidade pela desistência do empreendimento
sobre o governo Olívio Dutra. Os discursos inflamados ganharam eco na grande mídia,
que fez coro à tese da oposição, de que o Rio Grande teria que indenizar a FORD por
quebra de contato. Os grandes meios de comunicação do Rio Grande do Sul
encarregaram-se de manter e difundir a tese de que “Olívio e o PT expulsaram a FORD”.
Sabiam do processo, sabiam da MP 1740 do governo FHC, mas de forma tendenciosa e
eivada de preconceito mentiram aos gaúchos.
Foram anos de uma mesma ladainha, repetida a cada eleição estadual ou
municipal. Valeu-se a oposição da tese de Joseph Paul Goebbels , ministro do Povo e da
Propaganda de Adolf Hitler conhecido pela frase: "uma mentira cem vezes dita, tornase verdade". Agora, a decisão da Justiça comprova tudo o que afirmávamos esses anos
todos: a decisão de não se instalar no RS foi única e exclusivamente da FORD, movida
pelos favores fiscais recebidos por alteração de última hora na Medida Provisória
1.740/99.
A lei vigente, 9440/97, em seu artigo 12,
dizia: Farão jus empreendimentos
habilitados pelo Poder Executivo até 31/05/1997. A alteração feita pela base de
sustentação de FHC no Congresso Nacional estabeleceu que “ o prazo mencionado na lei
9440/97, no artigo 12 terá vigência até 31/12/99.”
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A seguir, reproduzimos um pequeno histórico dos caminhos trilhados desde 1999
e que culminaram na condenação da FORD. Dedicamos esse caderno a todos os
companheiros de governo que foram injustiçados pela oposição e pela mídia, na figura do
inesquecível companheiro, Secretário de Desenvolvimento e Assuntos Internacionais no
Governo Olívio, Zeca Moraes. Este, nem no dia de sua morte foi respeitado. Um jornal de
Porto Alegre, ao falar de seu falecimento, o apresentava como o responsável pela “saída
da montadora”.
Reproduzir os fatos apresentados neste caderno é uma questão de Justiça!
Raul Pont
Deputado Estadual PT/RS
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Breve histórico do caso FORD
1999
A Ford comunica ao Estado do RS a sua decisão de não mais instalar uma
fábrica no RS e anuncia que o empreendimento será construído na Bahia. O
rompimento unilateral por parte da FORD ocorreu num cenário onde montadoras
renegociaram seus contratos com o Poder Público, como é o caso da Renault no
Paraná, da Fiat em Minas Gerais e da própria GM aqui no RS.
A Procuradoria-Geral do Estado encaminha notificação judicial à FORD,
onde denuncia a quebra de contrato por parte da direção da montadora. A PGE
relata à Justiça todas as tentativas e esforços empenhados pelo Governo do
Estado buscando manter o Projeto Amazon no RS. A notificação alertava que,
independentemente da prestação de contas dos recursos financiados, a
desistência do empreendimento por parte da FORD a obriga a devolver os
valores, sob pena de locupletamento ilícito.
2000
Quando a Ford oficializou ao Estado do Rio Grande do Sul sua decisão de não
mais instalar uma unidade em Guaíba, o Governo Gaúcho buscou acertar extrajudicialmente com a empresa o ressarcimento dos R$ 42 milhões liberados como
financiamento, além da parcela concedida em incentivos fiscais gerados a partir da
importação de carros pelo Porto de Rio Grande. “Consideramos que o mais adequado
para ambas as partes era obtermos o distrato de forma negociada, uma vez que isso
evitaria uma longa ação judicial, o que inviabilizaria um ressarcimento imediato ao cofres
públicos” destacou, à época, o secretário do Desenvolvimento e Assuntos Internacionais,
Zeca Moraes.
Após as várias tratativas com o presidente da Ford do Brasil, Antonio Maciel Filho,
foram consideradas esgotadas
as possibilidades de chegar a bom termo nas
negociações. Isto levou o Estado a buscar pela via judicial o ressarcimento dos valores.
“Infelizmente, a proposta de ressarcimento apresentada pela empresa não era suficiente
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para recuperar os dispêndios do Estado”, afirmou o secretário. Então, a Sedai enviou
ofício à Procuradoria-Geral do Estado solicitando “providências para reaver o integral
ressarcimento”.
A Ação Judicial
No dia 3 de fevereiro de 2000, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE)
ingressou, na 5ª Vara da Fazenda Pública, com uma Ação Cível pelo rito ordinário
de Nulidade de Cláusulas Contratuais e de Rescisão por Inadiplemento
Contratual, cumulada com perdas e danos, contra a FORD. A ação se baseou na
posição da Procuradoria-Geral do Estado, que orientou todo o processo de
negociação, que foi consolidada na Informação 27/99, do procurador Ricardo
Lucas Camargo, de 16/11/99.
Na ação, a PGE requereu a devolução dos R$ 42 milhões liberados à
montadora a título de financiamento para implantação do complexo industrial.
Também são cobrados os R$ 92 milhões relativos ao creditamento presumido de
ICMS pela Ford, sem prejuízo do ressarcimento das demais perdas e danos
apurados neste processo.
Prestação de Contas
A PGE chamava a atenção para a prestação de contas apresentada pela
empresa, referentes à parcela de R$ 42 milhões liberada pelo Estado. Segundo
relatório da Contadoria e Auditoria Geral do Estado (CAGE), não houve
comprovação de aplicação no projeto Amazon da maioria das despesas
apresentadas.
Destes valores, R$ 19 milhões foram usados para compra de uma máquina que,
segundo depoimento de Ivan Fonseca e Silva à CPI, “seria o coração da fábrica”.
Curiosamente, o contrato de compra apontava a entrega desta máquina para 2002, um
ano depois da previsão de início das operações em Guaíba. Essa compra foi realizada às
vésperas de vencer a segunda parcela do financiamento.
2009
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A condenação da Ford
Pela sentença da 5ª Vara da Fazenda Pública, a FORD deverá restituir ao Estado do
Rio Grande do Sul os seguintes valores:
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R$ 42.000.000,00 ( quarenta e dois milhões de reais), que devem ser corrigidos
pelo IGPM a contar de 23/03/1998 e acrescidos de juros legais de 6% ao ano a contar da
citação até a entrada em vigor do novo Código Civil, em 10/01/2003, e de 12% ao ano a
contar de tal data, do qual deve ser abatido o valor de R$ 6.349.768,96 ( seis milhões,
trezentos e quarenta e nove mil, setecentos e sessenta e oito reais e noventa e seis
centavos), atualizado pelo IGPM a contar de 1º/11/2001;
-
R$ 92.100.949,58 ( noventa e dois milhões, cem mil, novecentos e quarenta e
nove reais e cinquenta e oito centavos), a serem corrigidos pelo IGPM a contar da data de
cada apropriação conforme planilha apresentada pelo perito contábil na fl. 2089, e
acrescidos de juros legais de 6% ao ano a contar da citação até a entrada em vigor do
novo Código Civil, em 10/01/2003, e de 12% ao ano a contar de tal data;
-
e R$ 32.989,60 ( trinta e dois mil, novecentos e oitenta e nove reais e sessenta
centavos), atualizados pelo IPGM a contar da data do ajuizamento do pedido e acrescido
de juros legais de de 6% ao ano a contar da citação até a entrada em vigor do novo
Código Civil, em 10/01/2003, e de 12% ao ano a contar de tal data.“
A sentença, por ser parcialmente procedente condena ambas as partes em
pagamento de honorários advocatícios e custas processuais, sendo que o Estado
pagará 10% destas e R$ 5.000,00 (cinco mil reais) aos procuradores da ré,
enquanto esta pagará R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais) aos advogados do
Estado.
Alguns trechos da Sentença:
“A questão de fundo e prioritária à solução do litígio está na rescisão unilateral do
contrato pela FORD. Ainda que esta sustente toda sua argumentação em suposto
inadimplemento contratual do Estado, de fato o que se vislumbra é uma clarividente
rescisão unilateral patrocinada pela própria FORD, consubstanciada, mormente, no
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documento nas fls. 374/376, quando expressamente notificou o Estado da desocupação
da área que vinha possuindo para implantação da indústria, alegando o descumprimento
do contrato em face, fundamentalmente, da não liberação da segunda parcela do
financiamento para execução do projeto.”
“A FORD, quando notificou o Estado de que estava desocupando a área onde seria
implantada a indústria e sustentou, equivocadamente, o descumprimento do contrato pelo
Estado que negava-se a repassar a segunda parcela do financiamento, indiscutivelmente
tornou-se a responsável pela rescisão contratual. Diz-se equivocadamente, porque estava
o Estado amparado nas disposições contratuais quando negou o repasse das segunda
parcela do financiamento, em face da já mencionada pendência da prestação de contas
pela FORD, daqueles valores repassados, concernente à primeira parcela do
financiamento.”
“Sob essa perspectiva, é forçoso concluir que a conduta do Estado esteve sempre
amparada nos estritos termos legais e contratuais.” (…) “De se ressaltar, a reforçar a
correção do procedimento do Estado ao exigir a complementação da prestação de contas
pela ré, fatos noticiados nas perícias contábil e de engenharia mecânica.” (grifamos)
“Disso, indaga-se: se a FORD houvesse prestado contas satisfatoriamente,
teria o Estado repassado os valores da segunda parcela? Pergunta sem resposta,
restrita a meras especulações. A FORD, por sua vez, não esperou para saber a
resposta. Retirou-se e desistiu do negócio, rescindindo unilateralmente o contrato.”
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Verdades e Mentiras sobre o Caso Ford
MENTIRA
O Rio Grande do Sul tinha dinheiro para cumprir o contrato original fechado com a
Ford pelo então governador Antonio Britto. O contrato previa o repasse de R$ 419 milhões
(R$ 234 milhões em obras de infra-estrutura, mais R$ 185 milhões em financiamento de
capital de giro e concessão de créditos de ICMS).
VERDADE
O governo Britto já havia colocado no Orçamento de 1999 uma previsão de receita
de R$ 850 milhões, provenientes da alienação de participações societárias. Esta
informação consta na página 35, do Anexo I, sob o código 2211.00.002, do Projeto de Lei
de Orçamento Geral do Estado.O dinheiro para pagar a FORD viria da venda do restante
das ações da CEEE e da venda das ações da CORSAN. O governo Olívio, por
compromisso programático e eleitoral, não venderia as empresas estatais.
MENTIRA
O governo Olívio só buscou o ressarcimento do dinheiro recebido pela FORD
devido à determinação do relatório da CPI da FORD, concluído em dezembro de 1999.
VERDADE
No dia 30/03/1999 – nove meses antes da votação do relatório da CPI – o
Governo do Estado já fazia a primeira notificação extrajudicial à FORD, na qual destacava
que apenas quatro dias antes a FORD havia entregue a prestação de contas relativa à
primeira parcela dos valores recebidos. A notificação esclarecia que a liberação da
segunda parcela estava condicionada ao exame e aprovação da prestação de contas.
No dia 14/05/1999, a Procuradoria-Geral do Estado encaminhou notificação
judicial à FORD, onde requeria a devolução dos recursos recebidos pela FORD
para instalação da fábrica no RS. A FORD respondeu com notificação judicial
recusando-se a devolver os valores.
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No dia 03/02/2000, esgotadas todas as etapas preliminares para obtenção de
acordo na esfera judicial, o Estado do Rio Grande do Sul ajuizou a Ação contra FORD,
cuja sentença saiu em dezembro de 2009.
MENTIRA
O Governo Olívio expulsou a FORD do Rio Grande do Sul.
VERDADE
1) “Vislumbra-se de forma objetiva, que quem deu causa à rescisão foi a FORD, e
não o Estado. Por isso, secundária qualquer discussão quanto à validade das cláusulas
contratuais, pois rescindido o contrato unilateralmente pela FORD, resta, tão-somente, a
verificação dos efeitos da rescisão e não a análise acadêmica do conteúdo do contrato.”
(Trecho da Sentença da Juíza Lílian Cristiane Siman)
2) O prazo do Regime Automotivo Especial para serem concedidos novos
incentivos fiscais às montadoras no Nordeste havia terminado em maio de 1997. O Jornal
Gazeta Mercantil, de 21 de outubro de 2001, afirmou: "O fato porém, é que a Bahia não
mais contava, naquele momento, com condições de atrair uma montadora de
automóveis"; e: "para viabilizar a instalação da Ford na Bahia, o deputado federal Jose
Carlos Aleluia (PFL-BA), relator da MP 1740, que tratava de ajustes no sistema
automotivo brasileiro, incluiu no documento a prorrogação da vigência do Regime
Especial do Nordeste". Foi aprovado o projeto por voto simbólico das bancadas,
transformando-se em lei, no dia 29 de junho de 1999.
3) Hoje está claro que o verdadeiro responsável pela ida da Ford para a
Bahia foi o governo Fernando Henrique Cardoso e seus aliados, que prorrogaram
o prazo de vigência do Regime Automotivo Especial do Nordeste com o único
objetivo de possibilitar a instalação da montadora em Camaçari.
Quando da morte de ACM, no discurso de homenagem ao avô, o deputado
federal ACM Neto, lembrou mais uma vez, entre as “benesses” conseguidas por
ACM para a Bahia, a instalação da FORD. ACM teria inclusive ameaçado de
romper com o governo FHC se o Executivo não reeditasse os benefícios e
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privilégios federais do Regime Automotivo Especial para favorecer a FORD,
afirmou o deputado federal ACM Neto. A medida legal durou por poucos meses e
a FORD foi a única a se instalar no Nordeste.
O que disse a Oposição durante o Governo Olívio Dutra
“Srs. Deputados, não podemos calcular a quantia que deverá ser paga à Ford e que
certamente não será paga pelo Governador Olívio Dutra e sua equipe, porque eles jamais
colocarão os pés no Palácio Piratini depois deste desastre que ocasionaram no nosso
Estado. Quem pagará essa conta, certamente, será o contribuinte, sob a administração de
um outro governante. Por esse motivo, Deputado José Farret, é que não há pruridos em
quebrar o contrato, descumprir o Código Civil e ter que estar sob as sanções da lei, afinal,
quem pagará essa conta será o contribuinte e o próximo governante.” Deputado Luis
Augusto Lara (PTB), na Sessão do dia 4/5/1999.
“Pois, em 120 dias, os Senhores nada mais fizeram do que desmentir o que haviam
dito. A palavra não foi respeitada, o compromisso não foi cumprido. É por isso que, hoje,
algumas pessoas identificam o governo como aquele que não tem palavra, que não
cumpre com o prometido. A falta de credibilidade, de confiabilidade nos custa muito e vai
nos custar muito mais. Pagaremos mais caro pelo descumprimento do que pelo
cumprimento do contrato firmado em lei pela Assembléia Legislativa.” Deputado
Francisco Appio (PPB), na Sessão do dia 4/5/1999.
“Hoje, ao final da manhã, Deputado Ronaldo Zülke, solicitei uma audiência com o
governador do Estado, no intuito de entregar-lhe uma carta pessoal, na qual apelo a S.
Exa. para que assuma pessoalmente as negociações com a Ford...”. Deputado Mario
Bernd (PMDB), na Sessão do dia 4/5/1999.
A carta foi transcrita nos anais da Assembléia. Um dos itens da carta: “Previne
juridicamente os cofres públicos de possível custosa ação indenizatória por parte da Ford,
que tem reafirmado o rompimento unilateral de contrato por parte do Governo Gaúcho.”
“Agora, Srs. Líderes, quanto irá custar para o Rio Grande não cumprir o contrato
assinado com a Ford, oriundo de uma lei assinada pelo Parlamento? Além de arcar com a
falta de oportunidade de empregos, que foram corridos do nosso Estado, quanto ainda o
povo gaúcho irá pagar por isso? Irá pagar muito caro por essa ditadura estabelecida pelo
Governador Olívio Dutra e pelo seu partido.” Deputado Wilson Covatti (PPB), na
Sessão do dia 5/5/1999.
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Conclusão
Esta síntese dos acontecimentos busca repor a verdade e a justiça após anos e
anos de versão predominante baseada no preconceito e na tendenciosidade. A partir da
notícia veiculada no novo jornal eletrônico www.sul21.com.br, os meios de comunicação
foram obrigados a dar a matéria, sem nenhuma auto-crítica, nenhum reconhecimento da
parcialidade de anos na cobertura do fato.
Na Assembléia Legislativa, o deputado estadual Berfran Rosado (PPS) foi para a
Tribuna para, sem nenhuma auto-crítica da tese desqualificada pela Justiça, afirmar que o
governo Olívio só ingressou com a ação reparatória depois de forçado pela CPI da FORD
organizada pela oposição na ALRS, apesar de toda a evidência dos fatos e datas provar
ao contrário. A postura do deputado e o fugaz registro de um dia na mídia, demonstram o
espírito e a prática da informação predominantes no Estado.
É mais uma razão para justificar
restabelecimento da verdade e da Justiça.
a
publicação
deste
Argumento,
PARA SABER MAIS
www.sul21.com.br
www.ptsul.com.br
www.pge.rs.gov.br/publicações (Revista Caso Ford – Em Defesa do Interesse Público)
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