primeiro trecho experimental urbano de sma com asfalto
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PRIMEIRO TRECHO EXPERIMENTAL URBANO DE SMA COM ASFALTO-BORRACHA... 203 PRIMEIRO TRECHO EXPERIMENTAL URBANO DE SMA COM ASFALTO-BORRACHA SEM FIBRAS: PROJETO, CONSTRUÇÃO E AVALIAÇÃO Sandra Oda Depto. de Eng. e Arquitetura, Universidade Salvador, Rua Agnelo Brito, 53, Federação, CEP 40210-245, Salvador, BA, e-mail: [email protected] Guilherme Edel Petrobras Distribuidora S.A. Gerência de Industrialização de Asfaltos, Rua General Canabarro, 500, sala 1403, Maracanã, CEP 20271-900, Rio de Janeiro, RJ, e-mail: [email protected] José Leomar Fernandes Júnior Depto. de Transportes, Escola de Engenharia de São Carlos, USP, Av. Trabalhador São-carlense, 400, STT-EESC-USP, CEP 13566-590, São Carlos, SP, e-mail: [email protected] Resumo Este trabalho apresenta os aspectos gerais de projeto, construção e avaliação do primeiro trecho experimental urbano com asfalto-borracha construído em dezembro de 2004 na cidade de Salvador, Bahia. A mistura asfáltica aplicada foi um SMA (Stone Matrix Asphalt) sem fibras. São duas pistas com duas faixas cada, sendo a espessura da camada acabada de 4,0 cm. São apresentados e discutidos os procedimentos tomados durante a execução para solucionar os problemas enfrentados, relacionados principalmente à falta de experiência dos técnicos em trabalhar com um material novo. Os resultados da primeira avaliação mostram que o revestimento com asfalto-borracha conferiu ganhos de atrito e drenabilidade superficial, garantindo, além disso, boa visibilidade e redução da aquaplanagem em dias de chuva, tornando o pavimento mais seguro e confortável. Os defeitos identificados até o momento são conseqüência de problemas preexistentes não sanados anteriormente à aplicação da camada de reforço de SMA (mediante fresagem, por exemplo). Foi constatado maior volume de vazios da mistura extraída da pista, quando comparada à mistura compactada em laboratório, além de resistência à tração muito diferente dos valores obtidos com as misturas de projeto, que evidenciam problemas construtivos relacionados à temperatura e à energia de compactação. Ainda assim, os resultados têm sido positivos, demonstrando a viabilidade técnica tanto do uso de borracha de pneus em pavimentação quanto da construção de revestimentos asfálticos com misturas SMA. Palavras-chave: asfalto-borracha, SMA, pavimentos urbanos, trecho experimental. Introdução Um revestimento asfáltico pode ter sua durabilidade incrementada com a utilização de ligantes asfálticos de melhor qualidade. Para melhorar as propriedades físicas, mecânicas e químicas dos cimentos asfálticos, podem ser adicionados produtos (aditivos e modificadores) como agentes rejuvenescedores, polímeros (SBR, SBS, EVA, etc.) e, particularmente, borracha de pneus moída. A borracha proporciona aumento da flexibilidade e da resistência aos raios ultravioletas, tornando a mistura asfáltica mais resistente ao envelhecimento, ao aparecimento e propagação de trincas e à deformação permanente. Além disso, quando utilizada uma curva granulométrica adequada, reduz o nível de ruído causado pelo fluxo de veículos e auxilia na drenagem em dias de chuva. Pode-se dizer que uma pista com asfalto-borracha proporciona maior conforto, Minerva, 2(2): 203-216 204 ODA, EDEL & FERNANDES JÚNIOR economia e segurança aos usuários, além do desempenho e da durabilidade serem superiores aos de uma pista construída com asfalto convencional (Edel, 2005). O desenvolvimento de novos produtos, como os asfaltos modificados, atende à necessidade de pavimento com melhor qualidade, principalmente considerando-se a forma inadequada ou inexistente de manutenção dos pavimentos por parte dos órgãos responsáveis pela infraestrutura viária. Porém, a falta de conhecimento técnico dificulta a utilização de novos produtos na construção de pavimentos, em função da desconfiança inerente. Por este motivo, um dos objetivos da construção de trechos experimentais é avaliar o desempenho de materiais e misturas produzidos em laboratório e, dessa forma, apresentar uma alternativa para melhorar a qualidade de pavimentos existentes, principalmente em locais com elevado volume de tráfego. Este trabalho tem por objetivo apresentar os principais aspectos do projeto, execução e avaliação de trecho experimental construído na cidade de Salvador, Estado da Bahia. A mistura aplicada é um SMA (Stone Matrix Asphalt) composto por ligante asfalto-borracha e agregados minerais, sem fibras. Tecnologia Aplicada à Pavimentação Asfáltica A tecnologia do asfalto-borracha representa uma alternativa para melhoria da qualidade dos pavimentos adotada por vários Estados norte-americanos. O Departamento de Transportes do Estado da Flórida, por exemplo, após as primeiras conclusões de um extenso estudo de campo sobre o desempenho de misturas asfálticas modificadas com borracha, iniciou a implementação de especificações exigindo o uso de borracha de pneu em todas as misturas empregadas em revestimentos asfálticos. Desde a implantação dessas especificações, em 1994, até 1999, mais de 2,7 milhões de toneladas de misturas asfálticas modificadas com borracha foram empregadas na execução de pavimentos (Choubane et al., 1999). Na Flórida, o teor de borracha utilizado varia de 5% a 20% (Smith et al., 2000). No Estado do Arizona, a maioria (mais de 90%) dos serviços de pavimentação é feita com asfalto-borracha. Na Califórnia, o asfalto-borracha é aplicado em capas selantes, em membranas absorvedoras de tensão e como selante de trincas e juntas (Shatnawi & Long, 2000). Na Austrália, o asfalto-borracha é aplicado em capa selante (Oliver, 2000). No Brasil, o ligante asfalto-borracha já está sendo utilizado em alguns Estados das regiões Sul e Sudeste desde 2001 (principalmente São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul). A Petrobras Distribuidora S.A., uma das pioneiras na produção do ligante asfalto-borracha em Minerva, 2(2): 203-216 escala industrial no Brasil e, atualmente, o seu principal fornecedor, tem incentivado pesquisas e aplicações de asfalto-borracha em diferentes tipos de misturas asfálticas (Edel, 2005): l l l l l l SMA com asfalto-borracha: São Paulo e Bahia; CBUQ denso com asfalto-borracha (faixas B e C do DNIT): Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul; CBUQ gap-graded: São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará e Rio Grande do Sul; Camada Porosa de Atrito (CPA) com asfalto-borracha: São Paulo; Asfalto-borracha com granulometria híbrida (entre as faixas B e C): Minas Gerais; Tratamento superficial duplo (TSD) com asfalto-borracha: Brasília, DF. Na região Nordeste foram realizadas duas aplicações, uma no Ceará e outra na Bahia. A maior dificuldade de aplicar o produto nessa região é a falta de matéria-prima (borracha de pneus moída) para a produção do asfaltoborracha. Isso ocorre principalmente devido à pequena demanda pelo produto, uma vez que a maioria dos empreiteiros e técnicos atuantes na área de infra-estrutura é conservadora e tem medo de aplicar um produto novo. Infelizmente, os órgãos rodoviários também não incentivam o uso de novas tecnologias. Trecho Experimental Localização O trecho experimental com ligante asfalto-borracha está localizado na Avenida General Graça Lessa, no Vale do Ogunjá, em Salvador, Bahia. São duas pistas com duas faixas cada, uma de 320 m (sentido Bonocô–Vasco da Gama) e outra no sentido contrário, de 65 m (Figura 1). O trecho atravessa pontos de comércio de acessórios para veículos, oficinas mecânicas e uma comunidade, sendo que a faixa da direita (cerca de 150,0 m) é usada como acesso (entrada/saída) de veículos. Por esse motivo é uma zona de carregamento excessivo a baixa velocidade, além de ponto de frenagem de veículos devido à existência de uma curva e de um semáforo no fim do trecho. O trecho no sentido Vasco da Gama–Bonocô está localizado no fim de uma curva, também com entrada e saída de veículos devido à existência de concessionárias, o que implica um trecho de desaceleração e aceleração de veículos. Foi realizada uma avaliação superficial na qual se pode verificar a presença de alguns defeitos localizados, como remendos, trincas por fadiga, longitudinais e por reflexão, escorregamento de massa asfáltica e deformações acentuadas (Figura 1). PRIMEIRO TRECHO EXPERIMENTAL URBANO DE SMA COM ASFALTO-BORRACHA... PISTA 1 Av. General Graça Lessa Sentido: Bonocô–Vasco da Gama Área: 2.108,49 m² 16 205 Av. Bonocô 15 14 13 12 11 PISTA 2 Av. General Graça Lessa Sentido: Vasco da Gama–Bonocô Área: 519,54 m² 10 Vale do Ogunjá 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 Av. Vasco da Gama Figura 1 Identificação das duas pistas do trecho experimental. Materiais A seleção dos agregados foi realizada em função de suas propriedades, principalmente da resistência ao desgaste por Abrasão Los Angeles, uma vez que para misturas descontínuas a especificação DNIT ME 035/ 94 exige que seja inferior a 30%. O fíler (material de enchimento que passa na peneira #200) utilizado foi o pó calcário. A Tabela 1 apresenta os resultados da caracterização dos agregados. O material asfáltico utilizado foi o asfalto-borracha CAPFLEX B, fornecido pela Petrobras Distribuidora S.A. Tem como base o cimento asfáltico de petróleo (CAP) e borracha moída de pneus inservíveis. As propriedades do ligante encontram-se na Tabela 2. Deve-se destacar que os ligantes modificados com borracha de pneu têm viscosidade bem mais elevada que a de ligantes convencionais, que aliada à sua excelente coesão e flexibilidade permite a sua utilização em misturas asfálticas especiais, como CPA, SMA e gap-graded. Essas misturas proporcionam superfícies de pavimento com excelente macrotextura, o que se traduz em ganhos no atrito pneu-pavimento e na drenabilidade superficial, melhorando a visibilidade (anti-spray) e reduzindo os riscos de aquaplanagem. Um ganho que também tem sido bastante considerado é a redução do ruído gerado pelo tráfego de veículos quando são utilizadas essas misturas com asfaltoborracha. Mistura asfáltica Em função da granulometria dos agregados, as misturas asfálticas podem ser: descontínuas abertas (open-graded), descontínuas densas (gap-graded) ou contínuas densas. Seleção da mistura asfáltica – projeto de dosagem Para a escolha da mistura do trecho foram avaliadas três faixas granulométricas: faixa C do DNER (CBUQ densa), gap-graded da Califórnia (descontínua) e SMA da AASHTO MP8-01 (9,5 mm) (Tabela 3 e Figura 2). Minerva, 2(2): 203-216 206 ODA, EDEL & FERNANDES JÚNIOR Tabela 1 Caracterização dos agregados utilizados. Ensaios Resultados Especificação Método 20 máximo 30% DNIT ME 035/94 2,737 – DNIT ME 043/95 2,747 – ASTM D2041 Desgaste por Abrasão Los Angeles (%) 3 Densidade aparente dos grãos (g/cm ) 3 Densidade efetiva (g/cm ) Tabela 2 Propriedades do ligante asfalto-borracha utilizado. Ensaios Resultados Método Penetração (100 g, 25ºC, 5 seg.) (dmm) 55,0 ASTM D 5 Ponto de amolecimento (ºC) 62,0 ASTM D 36 Recuperação elástica (%) 62,5 ASTM D 6084 Viscosidade Brookfield (sp 31, 6 rpm) (cP) @ 175ºC 2.900 ASTM D 4402 Tabela 3 Granulometria das misturas asfálticas avaliadas. SMA AASHTO 9,5 mm Gap-graded Califórnia Peneira # Abertura (mm) CBUQ Faixa C-DNER 3/4" 19,1 100,0 100 100,0 100 100,0 100 1/2" 12,7 97,8 100 97,0 85-100 97,0 90-100 3/8" 9,52 93,6 70-95 91,0 75-100 89,2 78-92 #4 4,76 45,1 30-50 70,0 50-85 40,6 28-42 #8 2,38 24,0 20-30 40,6 18,8 15-25 # 16 1,19 19,0 21 25,8 13,6 # 30 0,60 15,9 18 18,5 11,1 10-20 # 50 0,297 14,1 15 14,8 13-35 8,3 7-15 # 200 0,075 9,2 8-12 7,8 5-10 5,3 2-7 100 % Passada 80 SMA CBUQ Gap-graded 60 40 20 0 0,01 0,1 1 10 Peneira (mm) Figura 2 Minerva, 2(2): 203-216 Granulometria das misturas asfálticas avaliadas. 100 PRIMEIRO TRECHO EXPERIMENTAL URBANO DE SMA COM ASFALTO-BORRACHA... Parâmetros da mistura selecionada A mistura asfáltica foi selecionada após a caracterização dos materiais (agregados e ligante asfaltoborracha) e avaliação das propriedades mecânicas das misturas, medidas através de ensaios de resistência à tração (RT) e do módulo de resiliência (MR). A Tabela 4 apresenta os parâmetros mecânicos das misturas avaliadas. O parâmetro MR avalia a rigidez da mistura, sendo que quanto menor o valor, menor a rigidez e maior a flexibilidade, resultando em menores tensões absorvidas pelo revestimento. Em relação à resistência à tração, quanto menor a RT, maior a perda da capacidade estrutural das misturas (Specht, 2004). Já em relação à fadiga, alguns autores apontam a relação MR/RT como um bom indicador para o comportamento de misturas asfálticas, já que esta relaciona a flexibilidade com a capacidade de suporte da mistura. Por esse motivo foi dada preferência ao SMA, por apresentar melhor desempenho mecânico quando comparado ao CBUQ e ao gap-graded (Tabela 4). A Tabela 5 apresenta os parâmetros volumétricos da mistura SMA. Após a seleção da mistura SMA, foram moldadas duas placas para determinação da deformação permanente em simulador de tráfego LCPC (Laboratorie Central de Ponts e Chaussées), do Laboratório de Tecnologia de Pavimentação da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (LTPEPUSP). Os resultados dos ensaios após 30.000 ciclos mostram Tabela 4 que a deformação permanente variou de 3,85% a 4,15%, ficando abaixo do limite estabelecido pela norma francesa NF P 98-253-1, de 5% para tráfego pesado. Conforme recomendações da especificação americana (AASHTO MP8-01 – 9,5 mm), a dosagem do SMA foi realizada empregando-se fibra. Neste projeto, foi utilizada uma fibra de poliéster proveniente de pneus de automóveis e caminhões de uma empresa localizada no Rio Grande do Sul (distante 3.200 km de Salvador, BA), o que tornou inviável o uso da fibra, pois o custo de transporte iria ficar cerca de 20 vezes o valor do produto. Por esse motivo, e considerando-se, também, que o asfalto-borracha é mais viscoso que o CAP sem borracha, optou-se por reduzir o teor de asfalto (de 6,8% para 6,4%) e aplicar o SMA sem fibra. Usinagem A mistura SMA foi produzida em uma usina gravimétrica distante 40 km do local de aplicação. Quando foi realizada a calibração da usina pôde-se verificar a diferença de granulometrias das misturas resultantes, pois os agregados coletados nos silos quentes estavam diferentes daqueles fornecidos para a dosagem em laboratório, tendo sido necessária a troca de materiais. Para a produção da mistura em usina foram definidas as temperaturas adequadas dos agregados, do ligante e de mistura (Tabela 6). Parâmetros mecânicos das misturas avaliadas. Misturas MR (MPa) RT (MPa) MR/RT CBUQ (Faixa C) 2.616 0,77 3.397 Gap-graded (Califórnia) 2.829 1,00 2.829 SMA (AASHTO) 3.077 1,10 2.797 Tabela 5 207 Parâmetros volumétricos das misturas asfálticas ensaiadas. Parâmetros Valores Teor de asfalto-borracha (%) 3 6,8 Densidade aparente (g/cm ) 2,367 3 2,468 D.M.T (g/cm ) Vv (%) 4,1 V.A.M. (%) 19,7 V.C.B. (%) 15,7 Estabilidade (kgf) 765 Fluência (pol) 16,2 R.B.V. (%) 78,9 Minerva, 2(2): 203-216 208 ODA, EDEL & FERNANDES JÚNIOR Tabela 6 Temperaturas do ligante, dos agregados e de compactação. Material Temperatura (oC) Ligante 165-175 Agregados 175-185 Compactação 164-168 O asfalto-borracha, já na temperatura de usinagem, foi bombeado diretamente do caminhão para o tambor de mistura da usina. Durante a usinagem foi realizado um controle de todo o material produzido pela usina, no qual foram determinados, além da temperatura, os teores de asfalto e a granulometria da massa asfáltica. Foram confeccionados corpos-de-prova (CPs) no laboratório da usina, onde, após a determinação da densidade, os CPs foram submetidos à extração de ligante pelo rotarex. Após a remoção do ligante de cada CP foi realizado o peneiramento do material resultante e determinada a granulometria. As granulometrias encontradas são parecidas com a curva de projeto, apresentando pequena variação. Como a massa asfáltica analisada é proveniente dos CPs moldados in loco, tal variação da faixa granulométrica pode ser proveniente de segregação. O transporte foi realizado em caminhões basculantes com o recobrimento por lona e não foi observada perda significativa de temperatura da massa asfáltica, que ao chegar ao trecho estava entre 160 e 180°C. Aplicação da mistura asfáltica SMA nas pistas A aplicação na pista 1 (sentido Bonocô–Vasco da Gama) aconteceu nos dias 4 e 5 de dezembro de 2004, enquanto a pista 2 (Vasco da Gama–Bonocô) foi feita no dia 5 de dezembro, ambos em condições climáticas favoráveis e sem chuva. A espessura da camada acabada nas duas pistas foi de 4,0 cm, sendo aplicado 5,0 cm de material solto. No entanto, em alguns pontos da pista 1 foi aplicado cerca de 15,0 cm de espessura de massa devido à existência de deformações acentuadas. Esse fato ocorreu porque, apesar de altamente recomendável, não foi realizada a fresagem de material subjacente antes da aplicação do novo revestimento, conforme previsto inicialmente. Antes do espalhamento da massa asfáltica (SMA) foi realizada uma pintura de ligação com emulsão asfáltica (RR-1C). O espalhamento da massa asfáltica na pista foi realizado com o auxílio de uma vibro-acabadora. A compactação foi realizada com um rolo de chapa vibratório e um rolo de pneus, sendo ambos borrifados com óleo vegetal para evitar que ocorresse a aderência da massa asfáltica nas rodas. A Figura 3 mostra as fotos do trecho Minerva, 2(2): 203-216 após a aplicação da mistura asfáltica SMA com asfaltoborracha. Problemas e Dificuldades durante a Execução Durante as etapas de projeto e aplicação surgiram alguns problemas e dificuldades, que são relatados e discutidos a seguir: l l l l l Seleção da mistura asfáltica: resistência dos técnicos e engenheiros da prefeitura de Salvador (PMS) em aplicar um SMA (mistura descontínua), devido à falta de experiência em trabalhar com esse tipo de mistura, pois a PMS só utiliza CBUQ (densa). Fresagem: a pista 1 apresentava deformações acentuadas (~14 cm) entre as estacas 12 e 14. Por esse motivo, durante a etapa de projeto foi determinado que seria necessário realizar a fresagem do revestimento existente no dia 3/12 (sexta-feira), antes da aplicação da pintura de ligação. No entanto, a PMS só conseguiu uma fresadora no sábado (4/12) à tarde, o que impossibilitou a execução do serviço de fresagem. Usina de asfalto: o diâmetro da tubulação de entrada do material asfáltico era de 2”, o que dificultou o seu bombeamento, exigindo a redução da produção de 1.200 kg/batelada para 1.000 kg/batelada. Vibro-acabadora: um problema no equipamento provocou a distribuição irregular de massa (faixas de espessuras diferentes); além disso, as limitações do equipamento (largura da mesa da vibro-acabadora) e a inexperiência da equipe em trabalhar com o SMA dificultaram a execução das juntas, sendo a massa aplicada de forma inadequada (uma faixa de 4,0 m de largura e outra de 2,0 m), ocasionando demora no início da compactação e, conseqüentemente, perda de temperatura da massa. Derramamento de óleo diesel: a realização de uma “seresta” provocou aumento do número de pessoas e veículos circulando no local da aplicação, causando um pequeno acidente, no qual foi derramado cerca de 20 litros de óleo diesel sobre a massa asfáltica aplicada. Apesar de ter sido retirada grande quantidade de massa encharcada, pode-se verificar (depois) que certa quantidade de óleo não foi removida. PRIMEIRO TRECHO EXPERIMENTAL URBANO DE SMA COM ASFALTO-BORRACHA... 209 Av. Bonocô PISTA 1 16 15 14 PISTA 2 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 Av. Vasco da Gama Figura 3 Fotos do trecho após a aplicação da mistura asfáltica SMA com asfalto-borracha. Levantamento das Condições da Superfície Nos dias 6 e 7 de abril de 2005 foi realizado o primeiro levantamento das condições do trecho experimental com asfalto-borracha. O escopo desta avaliação foi determinar as propriedades superficiais do revestimento (avaliação de macro e microtextura e permeabilidade) e fazer um levantamento de defeitos. A determinação da macrotextura, teste que mede a rugosidade da superfície, foi feita através do ensaio de mancha de areia (ASTM E-965-96, Figura 4). A microtextura, por sua vez, foi determinada utilizandose o Pêndulo Britânico (ASTM E-303-93, Figura 5), enquanto a permeabilidade foi determinada segundo a metodologia do National Center for Asphalt Technology (NCAT), modificada pelo Centro de Pesquisas da Petrobras (CENPES, Figura 6). O levantamento de defeitos foi realizado segundo a metodologia DNER-PRO 08/94 (Avaliação objetiva de pavimentos flexíveis e semi-rígidos), que estabelece um índice numérico dos defeitos chamado Índice de Gravidade Global (IGG). Apresentação de resultados Os resultados obtidos nos ensaios são apresentados nas Tabelas 7, 8 e 9. Análise dos resultados Pode-se observar, na Tabela 7, que o valor médio da macrotextura obtida foi de 0,60 mm, sendo que este valor para revestimentos convencionais geralmente é inferior a 0,30 mm. Já a microtextura oscilou na faixa de 45-55 BPN (Tabela 8). Com os resultados de macro e microtexturas pôdese calcular o International Friction Index (IFI, Método ASTM E-1960-98), que é uma estimativa do atrito pneu-pavimento de um veículo trafegando a 60 km/h em pista molhada. Os valores calculados variaram de 0,18 a 0,22 na trilha de roda e de 0,22 a 0,28 no centro da pista, mostrando que o efeito do tráfego causou leve perda de atrito. Geralmente, este valor é da ordem de 0,10 para revestimento convencional, o que mostra que ocorreu um ganho de 2 a 3 vezes no índice de atrito. Com relação à permeabilidade, verificou-se que, em alguns pontos, o revestimento é impermeável, enquanto em outros a permeabilidade variou de 550 × 10–5 a 7800 × 10–5 cm/s, que são valores compatíveis aos de revestimentos deste tipo (Tabela 9). Quanto ao levantamento de defeitos, verificou-se que havia três trechos, com aproximadamente 10,0 m de extensão, que estavam com problemas: os dois primeiros apresentavam um pequeno deslocamento de massa (Figura 7) e o terceiro, onde ocorreu um derramamento de óleo diesel durante a construção da pista, causou uma panela de aproximadamente 1,0 por 1,5 m (Figura 8). Minerva, 2(2): 203-216 210 ODA, EDEL & FERNANDES JÚNIOR Figura 4 Figura 5 Ensaio de macrotextura – mancha de areia. Ensaio de microtextura com Pêndulo Britânico. Figura 6 Minerva, 2(2): 203-216 Determinação da permeabilidade. PRIMEIRO TRECHO EXPERIMENTAL URBANO DE SMA COM ASFALTO-BORRACHA... Tabela 7 Macrotextura superficial de pavimentos (mancha de areia). Ponto da pista Profundidade da textura (mm) P01 0,53 P02 0,65 P03 (E12 – TR) 0,48 P04 (E11 + 5,0 m – TR) 0,47 P04 (E11 + 5,0 m – centro) 0,85 P05 (E10 + 5,0 m – TR) 0,59 P05 (E10 + 5,0 m – centro) 0,60 Tabela 8 Tabela 9 211 Microtextura superficial de pavimentos (Pêndulo Britânico). Ponto da pista Cálculo do atrito (BPN) P01 45 P02 51 P03 (E12 – TR) 55 Permeabilidade superficial de pavimentos – método CENPES. Ponto da pista Permeabilidade (10–5 cm/s) P02 0 P03 (E12 – TR) 9.090 (2.272) P03 (E12 – centro) 31.164 (7.791) P04 (E11 + 5,0 m – TR) 2.197 (550) P05 (E10 + 5,0 m – TR) 6.128 (1.532) Figura 7 Deslocamento de massa. Minerva, 2(2): 203-216 212 ODA, EDEL & FERNANDES JÚNIOR Figura 8 Panela causada por derramamento de óleo. Extração de Corpos-de-Prova e Ensaios de Laboratório Foi escolhido um pré-misturado a frio (PMF), Faixa A do DNER, por apresentar característica granulométrica semelhante à da mistura (SMA) que foi aplicada na pista (Figura 10). O PMF, composto de agregados (os mesmos usados na construção da pista) e emulsão asfáltica de ruptura média (RM-1C), foi produzido no local. O teor de emulsão asfáltica utilizado foi de 8%, uma vez que o teor do resíduo era de 62%. No dia 20 de abril foi feita a extração de corposde-prova (CPs) da pista experimental. A Figura 9 mostra os locais de onde foram extraídos os CPs. Os furos foram fechados com uma mistura a frio, pois não era viável produzir mistura a quente em usina, devido à pequena quantidade necessária (2,4 kg) e da localização da mesma. 16 15 14 5 6 2 1 13 4 3 12 7 8 11 10 9 9 10 8 7 6 Vale do Ogunjá 1112 5 4 3 1314 2 1 0 Figura 9 Minerva, 2(2): 203-216 1516 Localização dos corpos-de-prova extraídos do trecho experimental. PRIMEIRO TRECHO EXPERIMENTAL URBANO DE SMA COM ASFALTO-BORRACHA... 213 100 SMA PMF % Passando 80 60 40 20 0 0,01 0,1 1 10 100 Peneira Figura 10 Curva granulométrica do PMF utilizado para fechar os furos. 10) ficou próximo dos valores determinados em laboratório (6,8%) e na usinagem da massa asfáltica (6,4%). Pode-se verificar, a partir dos resultados obtidos na Tabela 10, que o volume médio de vazios da mistura extraída no campo ficou muito acima (11%) dos limites estabelecidos para uma mistura do tipo SMA (entre 3% e 5%), assim como dos valores obtidos em laboratório durante a dosagem (4,1%) e após a usinagem da massa asfáltica que foi aplicada na pista (3,9%). Para a determinação do teor de ligante, foi realizada extração através da perda por ignição utilizandose o Carbolite Binder Analyzer (ASTM D 6307, AASHTO T308). Inicialmente, os CPs foram aquecidos em estufa para facilitar a desagregação e, posteriormente, foram colocados em uma cesta metálica para serem ensaiados. Os CPs 7 e 8 foram descartados porque apresentaram grande quantidade de areia na mistura. Provavelmente, a areia “infiltrou” com a água da chuva, uma vez que o volume de vazios apresentado por esses CPs foi o mais elevado (13,3%), o que também pode ser comprovado pelo alto valor da permeabilidade (7.791 × 10–5 cm/s). Após a extração, os CPs numerados foram transportados para o CENPES (Rio de Janeiro, RJ) para que a composição da mistura aplicada na pista fosse analisada e submetida a ensaios mecânicos (módulo de resiliência, MR, e resistência à tração, RT) e volumétricos. Avaliação da mistura aplicada no trecho experimental Inicialmente, os CPs foram serrados e foram determinadas as espessuras e diâmetros. Os CPs extraídos da pista apresentaram espessura média de 4,13 cm e diâmetro médio de 10,17 cm, o que atende às especificações do DNER, que recomenda espessura de 3,50 a 6,50 cm e diâmetro de 10,00 ± 0,20 cm. Apenas um CP apresentou espessura de 3,14 cm (abaixo do mínimo) e diâmetro de 10,23 cm, um pouco acima da norma. Parâmetros volumétricos Antes de ensaiados, os CPs tiveram as densidades aparentes medidas para o cálculo do volume de vazios. O teor de ligante dos CPs extraídos da pista (6,47%, Tabela Tabela 10 Parâmetros volumétricos dos CPs extraídos da pista experimental. Parâmetros Valores médios Teor de asfalto-borracha (%) 6,47 3 Densidade aparente (g/cm ) 2,247 Volume de vazios (%) 11,0 VCB (%) 13,9 VAM (%) 24,9 RBV (%) 55,9 3 Massa efetiva dos agregados (g/cm ) 2,809 Minerva, 2(2): 203-216 214 ODA, EDEL & FERNANDES JÚNIOR Após a extração do ligante, os agregados foram lavados e deixados em estufa por aproximadamente 2 horas para que ocorresse a secagem. Em seguida, foi realizado o peneiramento dos agregados para que fosse determinada a composição granulométrica de cada CP (Tabela 11 e Figura 11). Os CPs 1, 2, 3 e 4 correspondem, respectivamente, aos CPs 1 e 2; CPs 5 e 6; CPs 9 e 10; e CPs 13 e 14 extraídos da pista. Parâmetros mecânicos A determinação dos parâmetros mecânicos (MR e RT) foi realizada no Laboratório de Pavimentos e Misturas Betuminosas da COPPE/UFRJ, no dia 28 de abril de 2005. Os resultados são apresentados na Tabela 12. Tabela 11 A Tabela 12 mostra que os parâmetros mecânicos dos CPs extraídos da pista (revestimento asfalto-borracha) estão bem diferentes dos resultados da mistura produzida em laboratório, principalmente a RT, cujo valor obtido na dosagem foi de 1,10 MPa e o valor médio dos CPs foi de 0,51 MPa. Em função dos resultados dos parâmetros mecânicos e volumétricos, foram moldados novos CPs com os agregados obtidos da extração de ligante e CAPFLEX B coletado do caminhão. Foram moldados dois CPs empregando-se a granulometria de projeto e dois com a granulometria obtida na usina. Os CPs foram moldados empregando-se as mesmas características de temperatura e número de golpes das misturas produzidas em laboratório e na usina. Após a moldagem, os CPs foram submetidos aos ensaios mecânicos e volumétricos (Tabela 13). Granulometria dos CPs extraídos do trecho experimental. % Passante Peneira (mm) SMA 9,5 Projeto CP1 CP2 CP3 CP4 Mínimo Máximo 19,1 100,0 100,0 100,0 100,0 100 100 100 12,5 97,4 98,9 96,8 95,1 100 100 97,8 9,5 89,9 95,7 89,6 89,4 70 95 93,6 4,75 48,5 53,8 51,9 48,7 30 50 45,1 2,36 23,0 24,5 22,2 21,6 20 30 24,0 1,18 17,0 17,8 15,5 15,2 21 19,0 0,6 13,9 14,6 12,5 12,5 18 15,9 0,3 11,9 12,2 10,7 11,0 15 14,1 0,075 8,0 8,0 7,6 7,9 12 9,2 8 100 90 80 % Passante 70 60 50 40 30 20 10 0 0,01 CP1 Figura 11 Minerva, 2(2): 203-216 0,1 CP2 1 Log peneira (mm) CP3 CP4 10 Mín 100 Máx Proj Granulometria dos CPs extraídos da pista experimental. PRIMEIRO TRECHO EXPERIMENTAL URBANO DE SMA COM ASFALTO-BORRACHA... Tabela 12 215 Valores de MR e RT de CPs extraídos da pista. No do CP Altura (cm) Diâmetro (cm) RTmáxima (MPa) 03 4,64 10,16 0,56 2.269 05 3,67 10,14 0,51 2.575 07 4,21 10,16 0,49 2.281 08 4,53 10,14 0,52 1.879 09 4,45 10,17 0,57 10 4,59 10,23 0,57 11 3,51 10,17 0,61 1.879 12 3,14 10,17 0,52 1.502 14 4,98 10,18 0,26 843 15 3,57 10,16 0,45 1.326 A Tabela 14 apresenta os parâmetros mecânicos das misturas de projeto, da mistura aplicada na pista e da Tabela 13 RTmédio (MPa) MR (MPa) 2.131 0,51 1.709 mistura confeccionada com os agregados dos CPs extraídos da pista experimental. Resultados de ensaios dos CPs moldados no CENPES. CPs Teor de ligante (%) Densidade aparente (g/cm3) Densidade máxima calculada (g/cm3) Volume de vazios (%) RT (MPa) 1 6,4 2,386 2,526 5,54 – 2 6,4 2,383 2,526 5,66 1,22 3 6,4 2,441 2,526 3,37 1,14 4 6,4 2,447 2,526 3,13 1,29 Tabela 14 Mistura Mistura de projeto Mistura de campo (extração) 2 Mistura de laboratório 1 Comparação entre as misturas do trecho experimental. MR (MPa) Rtmédio (MPa) D (g/cm3) Vv (%) 2.701 1,10 2,367 4,1 1.839 0,51 2,247 11,0 1,22 3 – 2,414 4,4 1 Corpos-de-prova extraídos da pista. 2 Corpos-de-prova confeccionados com agregados dos CPs extraídos da pista. 3 Determinada pelo Rice Test. Minerva, 2(2): 203-216 216 ODA, EDEL & FERNANDES JÚNIOR Conclusões Espera-se que a construção do primeiro trecho experimental com asfalto-borracha na cidade de Salvador, Bahia, sirva de incentivo para futuros projetos de pavimentos com asfaltos modificados, criando, dessa forma, uma demanda pelo produto que pode ter como conseqüência a melhoria de qualidade dos pavimentos existentes. Além disso, espera-se que ocorra a implantação de empresas produtoras de borracha de pneu em pó, o que irá contribuir para que seja possível ter produção de asfaltoborracha no Estado da Bahia. A disponibilidade de borracha moída por fabricantes locais trará condições de adotar o uso de asfalto modificado por borracha em serviços de pavimentação nas rodovias da região. Os problemas e dificuldades encontrados durante a elaboração do projeto e, principalmente, no decorrer da aplicação devem ser analisados com cuidado para evitar que ocorram novamente. Ficou evidente que o desconhecimento técnico e a falta de experiência dos órgãos responsáveis pela infra-estrutura viária (nesse caso, PMS e empresas contratadas) é um dos principais obstáculos à aplicação de novas tecnologias. Por esse motivo, algumas observações importantes e essenciais para um bom resultado devem ser enfatizadas, como a necessidade de um planejamento rigoroso e eficaz de todas as etapas da obra, desde a produção do ligante até a compactação da mistura, com o comprometimento de todos os envolvidos (contratantes, engenheiros, técnicos e encarregados): l l l l l l agregados: a granulometria e as características devem atender as exigências das especificações; usina de asfalto: devem ser realizadas calibração e adaptações necessárias previamente; produção da mistura: deve ser tomado muito cuidado com as temperaturas dos materiais e da mistura; transporte: a mistura deve ser transportada coberta por lona; serviços preliminares: devem ser realizadas avaliações funcional e estrutural para verificar a necessidade de serviços preliminares, como, por exemplo, a fresagem do pavimento existente; execução: devem ser tomados cuidados especiais com temperaturas de espalhamento e compactação. As informações apresentadas neste trabalho quanto à experiência realizada do uso de borracha moída de pneus inservíveis em pavimentação demonstram a atratividade desta técnica para fins rodoviários e ambientais. Em termos Minerva, 2(2): 203-216 de trabalhos futuros, além de avaliações semestrais ao longo dos anos, num futuro próximo serão feitos levantamentos de deflexões no pavimento com o uso da viga Benkelman, visando a avaliar os aspectos estruturais. Agradecimentos O desenvolvimento deste trabalho só foi possível porque contou com o apoio da Petrobras Distribuidora, da prefeitura de Salvador, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), da Universidade de São Paulo e do Centro de Excelência em Asfalto (CEASF). Referências Bibliográficas AASHTO. MP8. Specification for designing SMA. American Association of State Highways Transportation Officials, 2000. CHOUBANE, B.; SHOLAR, G. A.; MUSSELMAN, J. A.; PAGE, G. C. 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