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Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Ada Maria Veras da Veiga – [email protected] Perícias Médicas Instituto de Pós-Graduação e Graduação – IPOG Resumo A avaliação do cérebro através da Tomografia Computadorizada (TC) e da Ressonância Magnética (RM), em especial, do lobo pré-frontal, responsável pelo comportamento, surgem como possibilidade de mais um critério na avaliação da periculosidade. A reincidência do criminoso mesmo tendo sido submetido a exame comportamental pelo perito da área tem se mostrado frágil exigindo outros métodos de avaliação. Apresentariam os estudos publicados nos últimos 10 anos resultados concludentes? Seriam os métodos por imagem do cérebro úteis ao perito judicial em sua avaliação da periculosidade na liberdade condicional ou definitiva do criminoso? Este artigo faz um levantamento de estudos publicados entre 2000 a 2012 nos quais criminosos reincidentes foram submetidos a avaliação por imagem cerebral. O objetivo deste levantamento é comparar o percentual de coincidência entre os achados das imagens cerebrais e o comportamento violento reincidente propondo sua utilização como subsídio à perícia forense. O método adotado foi o descritivo explicativo em revisão de literatura. Os estudos de imagem cerebral corroboram esta premissa, desde que utlizada de forma restrita no individuo já condenado e reincidente cuja a liberação dependa de avaliação neuropsicológica. Palavras-chave: perícia forense. psiquiatria forense. neuroimagem. lobo pré-frontal. reincidência. 1. Introdução Inertes, observamos as cifras da criminalidade crescente e reincidente com o pensamento de que, alguém tem que fazer alguma coisa. Os custos emocionais suportados pelas vítimas e os financeiros absorvidos por toda a sociedade em decorrência do comportamento violento recidivante, por si só justificam uma análise mais detida daquilo que os estudos no campo da neurobiologia cerebral têm trazido nos últimos 10 anos, quem sabe, melhorando a capacidade de avaliar periculosidade e risco da reincidência. Embora estime-se que a taxa de reincidência criminal no Brasil seja alta, em torno de 80% (AMBIEL, 2006, p.265-266) ainda não existem dados confiáveis o suficiente e por esta razão, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) encomendou ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) um estudo sobre o tema. Apesar de a violência ter sempre estado presente desde os tempos mais remotos, quando gratuita e reiterada não deve ser aceita como aspecto inevitável da condição humana. Se o indivíduo encontra-se na condição de reincidente é porque já passou pelo sistema judiciário penal e, ou fugiu, ou cumpriu sua parte da pena voltando a delinquir. O art. 63 do Código Penal Brasileiro define: “Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior”. A reincidência do criminoso violento após a liberdade condicional ou definitiva, especialmente a liberdade daquele já submetido a ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 exame pericial que avalia risco/periculosidade, faz pensar que métodos mais objetivos de análise comportamental deveriam ser utilizados na avaliação deste risco. As novas descobertas no campo da neurociência, como os exames de neuroimagem, obtidas de criminosos violentos e reincidentes, talvez possam apresentar-se como ferramenta subsidiária na perícia forense. A neurociência é a parte da ciência que se ocupa com as áreas da biologia que estudam o sistema nervoso normal ou alterado relacionando esses achados, com outras áreas do conhecimento em especial aquelas que envolvem o comportamento. A atividade cerebral é seu foco principal. (GUERRA, 2011). No campo da cognição, ela vem desenvolvendo métodos que aumentam nossa compreensão a respeito da base biológica (neurobiologia) do comportamento violento além dos fatores ambientais e socioeconômicos já conhecidos. O presente artigo destaca a evolução das pesquisas relacionadas à neurobiologia do comportamento agressivo, violento e criminoso bem como seus possíveis reflexos sobre a perícia forense e as implicações éticas que estas descobertas podem significar. Desde Franz Gall, anatomista austríaco do século XVIII e sua frenologia segundo a qual regiões específicas do cérebro regulariam o comportamento antissocial, passando por Cesare Lombroso e sua “stigmata” (características físicas da suposta índole criminosa) até o século XX com a leucotomia (retirada de parte do cérebro de indivíduos com graves distúrbios do comportamento) de Egas Moniz, Nobel de Medicina de 1941, busca-se uma razão biológica, para explicar o comportamento criminoso e uma alternativa para lidar com ele. Identificar o indivíduo violento e sua potencial capacidade de repetir o ato criminoso pode parecer utópico e para alguns, despertar oposição por receio de que se reeditem mecanismos de segregação que marcaram tempos sombrios de nossa muito recente história. Importante é que não se confunda a identificação de um padrão comportamental violento, tendente ao delito com o do indivíduo simplesmente diferente do coletivo. Este enfoque poderá trazer à discussão temas como eugenia, darwinismo social, e até o holocausto. Entretanto é preciso que se ressalte: não é o indivíduo que precisa ser monitorado e sim seu comportamento violento é que precisa ser identificado, controlado e se possível tratado. Progrediu-se no controle de doenças, até então letais, através do combate em sua origem, estabelecendo-se medidas de prevenção, diagnóstico precoce e tratamento adequado. De forma serena e natural admite-se o isolamento de contaminados por doenças infecto contagiosas até que deixem de ser contaminantes. Entretanto, no que diz respeito à violência, parece que pouco se evoluiu no estabelecimento de sua possível base neurobiológica, bem como na tomada de decisões difíceis, mas necessárias no controle da criminalidade. Talvez em virtude de ainda ressoar à memória as atrocidades de regimes totalitários cometidas em abuso de poder, embriagou-se a sociedade de um socialismo irrefletido relutando-se a tirar ou restringir a liberdade de alguém. Assim, vai se repetindo um mantra que atribui a violência a tudo o que está fora do violento, como se as causas socioeconômicas e as ambientais, que indiscutivelmente fazem parte do processo, fossem sua principal e às vezes única origem. O objetivo maior deste artigo é o de apresentar a potencial relação entre o comportamento violento reiterado e a presença de alteração anatômica e/ou funcional cerebral utilizando imagens cerebrais obtidas pelas técnicas de neuro-imagem, bem como a possibilidade do uso destes achados na perícia forense, acrescida da discussão sobre as implicações éticas que lhes são inerentes. Deseja-se inferir se existe relação entre o comportamento violento e alterações ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 anatômicas ou funcionais cerebrais no cometimento da infração penal que envolva violência e reincidência. Avalia-se aqui se os novos conhecimentos trazidos pela neurociência, em estudos publicados através dos meios de divulgação científica entre 2000 e 2012 são consistentes e se estes podem servir para avaliar risco de violência/reincidência em portadores de comportamento criminoso repetitivo, bem como discutir a validade do uso destes na perícia forense estabelecendo um modelo de potencial preditivo e seu limite ético. Foi utilizado o método descritivo em pesquisa bibliográfica através do levantamento de estudos publicados entre 2000 e 2012 numa revisão qualitativa de literatura. Acredita-se que a compreensão dessas bases neurobiológicas da moralidade e do comportamento violento possa ajudar no desenvolvimento de novas estratégias relacionadas à acurácia da pericia forense, ao manejo eficiente do potencial risco da reincidência e ao tratamento adequado dos portadores de comportamentos violentos reiterados. Esta possibilidade não só favorece a sociedade nas alternativas de prevenção do crime como igualmente, oferece ao agressor, a possibilidade precoce de tratamento neurológico adequado sempre que houver, além de permitir arguir importantes questões morais para o sistema legal e para neuroética. 2. O cérebro e o comportamento violento O cérebro é uma das estruturas que compõe o sistema nervoso central (SNC). Sua camada mais externa é formada por células especiais, os neurônios cuja função é a de processar informações. O lobo frontal é a região mais anterior do cérebro. Seu córtex é subdividido em: córtex motor, responsável pelo movimento; o córtex pré-motor, envolvido na sequencia de integração dos atos do movimento e o córtex pré-frontal responsável pelo pensamento abstrato, raciocínio e emoções. (SALLES, 2011). No córtex pré-frontal concentra-se a capacidade cognitiva e é esta região o objeto desta análise em relação ao comportamento violento, criminoso e reiterado. Estudos funcionais do cérebro através de imagem demonstram que o córtex pré-frontal é a região de maior importância para o comportamento humano. 2.1 Quando a agressividade passa a ser violência Agressividade e violência não são sinônimos. A agressividade nasce com o indivíduo e faz parte de impulsos básicos e primitivos de sobrevivência na mesma medida da capacidade de ser solidário ou amar o outro. (VILHENA, 2002, p. 35). O indivíduo nasce com a potencial capacidade de defender-se mediante a agressão, inclusive do ponto de vista econômico e social. Entretanto, somente tais razões não respondem a questão da violência. A pobreza, a despeito de ser importante estressor para o desenvolvimento do indivíduo de forma isolada não determina comportamento infrator. A violência, por sua vez, não tem como seu objetivo maior apenas uma marcação de território ou uma mera afirmação do poder: eu mando você obedece porque eu quero que seja assim. Ela é muito mais do que isto. Reflete outra dimensão da agressividade. Implica num desejo de destruição, do desaparecimento do outro, da anulação de sua existência ainda que este não seja sempre o resultado final. “Enquanto a agressividade institui o outro em um lugar de menor autoridade e investido de certo valor, a violência promove a desqualificação deste valor, anulando este outro.” (VILHENA, 2002, p. 35). Observa-se até aqui que, a agressividade, embora característica primitiva de defesa animal não é sinônimo de violência. ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 Em todas as espécies a sobrevivência encontra-se na capacidade de se reproduzir e de se defender. (CORDEIRO 2003 p. 47). A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a violência como “o uso de força física ou poder, em ameaça ou na prática, contra si próprio, outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade que resulte ou possa resultar em sofrimento, morte, dano psicológico, desenvolvimento prejudicado ou privação”. (DAHLBERG; KRUG, 2007, p.1165). É importante que se esclareça que um indivíduo dito agressivo não é necessariamente violento ou está em débito com a lei. . “A agressão torna-se violência quando ela é exagerada e injustificável, levando a violação de normas sociais e à destruição” (VICTOROFF, 2009 apud FUMAGALLI, 2012). A violência sempre existiu e sempre houve a preocupação com seu controle. Platão, no livro IX da República,faz um retrato do homem tirânico, “o mais violento dos homens” (FERRARI, 2006, p.50). A natureza violenta envolve padrões persistentes de comportamento hostil, hiperatividade, abandono escolar, dificuldade em manter vínculo empregatício, inquietude permanente, envolvimento precoce com drogas, impulsividade, frieza emocional, agressividade familiar e comunitária nos quais, os direitos básicos do outro ou as normas sociais são violadas repetidamente. Crimes como homicídio, desordem, agressão, estupro, roubo, incêndio, extorsão, frequentemente estão relacionados a este padrão de comportamento prévio. (GALLO, 2005, p.83. ABDALLA-FILHO, 2004, p. 281). Torna-se necessário diferenciar com algum critério o indivíduo simplesmente diferente, com escolhas personalíssimas, daquele cuja diferença surge de um distúrbio do comportamento (psicopatia) o qual infringe sofrimento e sentimentos de estranheza à coletividade (TABORDA, 2004, p. 26). A agressividade pode ser contida, atenuada ou potencializada dentro de um contexto social influenciado pelo ambiente familiar, por vivências da educação comunitária e também por razões econômicas. Entretanto, ainda assim, tais razões são insuficientes para explicar a transposição da fronteira do convívio social dentro da lei para o outro lado, disfuncional e patológico. Chamaremos de disfuncional o indivíduo que apresenta comportamentos destruidores mediante atitudes violentas e reiteradas. Sua representação máxima pode ser definida pela chamada personalidade dissocial, antissocial ou sociopata (anteriormente chamada de personalidade psicopata). 2.2 Quando a violência passa a ser uma psicopatia A personalidade e o comportamento do sociopata são diferentes daquelas dos demais criminosos. Seu comportamento obedece a alguns padrões persistentes como a indisciplina e o baixo limiar de tolerância à frustração. Mesmo quando não matam, possuem características que sempre os colocarão afastados da lei. (BORGES, 2016). Psicopatas não criminosos podem apresentar uma forma de violência tácita, intimidação, autopromoção, mentira e manipulação, através da qual eles podem tirar vantagem sem que seja necessário o confronto direto com a polícia ou com a justiça, tornando-se extremamente violentos somente quando seus planos e desejos são obstaculizados e quando vem à tona sua baixa tolerância à frustração. (TINDADE E BEHEREGARAY apud BORGES, 2016). Os distúrbios da personalidade são classificados pelo Manual de Diagnóstico e Estatística das Doenças Mentais da Associação Norte Americana de Psiquiatria, que está em sua quarta revisão, denominado DSM IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorder) e também pela ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) através do Código Internacional de Doenças – CID. Tabelas 1 e 2 Por ter maior uso em território brasileiro, optamos por definir os transtornos de personalidade pelos critérios da OMS, sendo que entre os nove transtornos, é o dissocial (sociopata) o que mais se relaciona com o crime violento e a com a reincidência. F60 Transtornos específicos da personalidade F60.0 Personalidade paranóica F60.1 Personalidade esquizóide F60.2 Personalidade dissocial F60.3 Transtorno de personalidade com instabilidade emocional F60.4 Personalidade histriônica F60.5 Personalidade anancástica F60.6 Personalidade ansiosa (esquiva) F60.7 Personalidade dependente F60.8 Outros transtornos específicos da personalidade F60.9 Transtorno não especificado da personalidade Tabela 1 – Transtornos de Personalidade – CID 10 Fonte: Organização Mundial de Saúde - OMS A classificação de transtornos mentais e de comportamento está em sua décima revisão (CID10). Ali estão descritos os transtornos específicos da personalidade e, entre eles, o transtorno de personalidade dissocial, que se manifesta como uma grave perturbação comportamental não decorrente de doença específica. Portanto, o transtorno de personalidade não é doença, mas uma anomalia considerada pela perícia forense como uma perturbação mental. F60. 2 Transtorno de Personalidade Dissocial Transtorno de personalidade caracterizado por um desprezo das obrigações sociais, falta de empatia para com os outros. Há um desvio considerável entre o comportamento e as normas sociais estabelecidas. O comportamento não é facilmente modificado pelas experiências adversas, inclusive pelas punições. Existe uma baixa tolerância à frustração e um baixo limiar de descarga da agressividade, inclusive da violência. Existe uma tendência a culpar os outros ou a fornecer racionalizações plausíveis para explicar um comportamento que leva o sujeito a entrar em conflito com a sociedade. Personalidade: amoral, antissocial, associal, psicopática, sociopática Tabela 2 – Transtorno de personalidade dissocial – CID10 Fonte: Organização Mundial de Saúde - OMS O objetivo deste artigo não é o de estudar o aspecto psiquiátrico do transtorno, mas sim o de traçar a relação anatômica e funcional cerebral obtidas pela técnica de neuro-imagem e o comportamento delitivo e sua utilidade na perícia psiquiátrica forense bem como suas implicações éticas. O que se deseja saber é se existe relação entre o comportamento violento e alterações estruturais e/ou funcionais no cometimento reiterado da infração penal. É crescente número de evidencias que demonstram alterações cerebrais na região frontal de indivíduos com comportamento reiteradamente violento. Em um estudo retrospectivo visando determinar a prevalência de determinadas condutas ilícitas e o perfil diagnóstico dos acusados realizado no Hospital Nina Rodrigues em São Luis no Maranhão, Miranda Filho encontrou ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 uma alta prevalência do transtorno de personalidade dissocial (sociopatia) conforme mostra a tabela abaixo. Tabela 3. Diagnóstico Homicídio % Agressão % Furto % Roubo % Estupro % Total 8 Sem diagnóstico Uso de drogas 21,4 35,2 Esquizofrenia 14,2 23,5 Sociopatas 14,2 11 Limítrofes 14,2 5,8 Outros distúrbios psiquiátricos 21,4 17,6 30,7 37,5 14,2 7,6 12,5 28,5 38,4 25 42 14 17 7 13 Total de Indivíduos Tabela 3 – Relação do crime com o diagnóstico psiquiátrico da perícia Fonte: elaboração da autora a partir de dados extraídos de Miranda Filho, 2009. 12,5 8 67 Observe-se que a sociopatia está presente de forma mais expressiva nos crimes de maior violência, homicídio, roubo e estupro só perdendo para o consumo de drogas grupo no qual as características da sociopatia podem ser inadvertidamente interpretadas como efeito da substância psicoativa. Ressalte-se também que os indivíduos diagnosticados como limítrofes foram aqueles que não preenchiam todos os requisitos para a sociopatia, mas se aproximavam dela. Num outro estudo verificando a ocorrência de comportamento criminal recidivo realizado no Manicômio Judiciário de Franco da Rocha em São Paulo Moscatello encontrou, entre 100 internos cumprindo medida de segurança, uma prevalência de 41% que praticaram somente um crime e 59% que cometeram mais de um crime. Daqueles que reincidiram, 59% eram esquizofrênicos e 38% portadores de transtorno da personalidade. (MOSCATELLO, 2001). Na Inglaterra foram estudadas populações de 3 unidades psiquiátricas de alta segurança, analisando-se os registros de1.740 indivíduos. A população era predominantemente do sexo masculino com média de idade 39,4 anos. O transtorno de personalidade foi encontrado em 41% dos casos. (TEIXEIRA e DALGALARRONDO, 2006) Existe um aumento de evidencias de prejuízos cerebrais em indivíduos antissociais. Pacientes com transtornos neurológicos com danos no córtex pré-frontal basal mostram comportamento desinibido, do tipo psicopático, embotamento emocional e autonômico e tomada de decisão inadequada. Pesquisas com ressonância magnética (RM) têm evidenciado que indivíduos com transtornos de personalidade apresentam redução de 11% da substância cinzenta pré-frontal, associada a uma reduzida atividade autonômica durante um estressor social impedindo emoções secundárias de vergonha, constrangimento e culpa. “[...] há uma significativa base cerebral no ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 comportamento antissocial, e que estes processos neurocomportamentais são importantes para entender a violência na sociedade cotidiana” (RAINE, 2008). Já não se pode mais atribuir a gênese do comportamento violento exclusivamente à pobreza e à desigualdade social. Pesquisas realizadas na última década demonstram resultados cada vez mais estruturados a respeito da razão biológica para o comportamento agressivo, violento e predisposto ao crime. “As lesões neurológicas (vasculares, tumorais, degenerativas ou traumáticas) do lobo frontal determinam um transtorno mais ou menos evidente da conduta social” (BUTMAN et al 2001, p. 277). É a chamada sociopatia adquirida. Reiteramos que, a despeito das razões neurobiológicas para o comportamento violento a serem apresentadas nesta revisão bibliográfica não negamos a influência do ambiente. Ao contrário: o próprio ambiente hostil, também ele pode produzir alterações na codificação genética, os chamados “erros epigenéticos”. O termo epigenética origina-se do prefixo grego epi, que significa “acima ou sobre algo” e estuda as mudanças herdadas nas funções dos genes. Os padrões epigenéticos são sensíveis a modificações ambientais que podem causar mudanças fenotípicas que serão transmitidas aos descendentes (PRAY apud MULLER;PRADO, 2008, p. 61). As consequências da violência além de afetarem a vítima diretamente, apresentam repercussões clínicas, sociais, econômicas, políticas aumentando a responsabilidade da perícia forense em seu papel de decidir se e quando este indivíduo poderá obter a liberdade. Os sociopatas não aprendem com a punição. São insensíveis perante o sentimento alheio. Sua indiferença e desprezo pelas normas os torna irresponsável, e impulsivos. “Se existe uma ‘personalidade criminosa’ esta se realiza por completo no psicopata. Ninguém está tão habilitado a desobedecer às leis enganar ou ser violento como ele (SILVA, 2008 p. 129). Avaliar corretamente comportamentos atípicos é atividade complexa que demanda cuidados, isto porque boa parte dessas situações comportamentais acontece em populações que não se distinguem da população geral. Somente em algumas pessoas, a fronteira entre o que se deve e o que não se deve fazer, entre a boa ou má conduta, se rompe. Ao confundir-se um indivíduo que tenha apenas um comportamento peculiar com um verdadeiro portador de transtorno da personalidade, ou seja, considerar atitudes incomuns como sendo psicopatológicas corre-se o risco de considerar justificada eventual segregação, o que acarretaria abuso de direitos e cerceamento da livre expressão (CORDEIRO, 2003 p. 3). Porém, o oposto também é verdadeiro: ao não se reconhecer o transtorno da personalidade dissocial, violenta e reiterada naquele que a possua se justificaria a segregação cada vez maior dos pacíficos atrás das grades de suas próprias casas. 2.3. A relação entre alterações cerebrais e comportamento violento nos estudos de neuroimagem Os primeiros sinais de que havia uma relação entre o lobo frontal e comportamento vieram de estudos realizados em amostras de pacientes com lesões cerebrais e não em amostras de criminosos como ocorreu no passado com Lombroso, e sua “stigmata” Um caso emblemático é o do trabalhador de linha férrea Phineas Gage que em 1848 foi atingido acidentalmente por uma barra de ferro de quase 1 metro por 2,5 cm que arremessada de baixo para cima transpassou-lhe a área frontal do cérebro, entrando pelo lado esquerdo da ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 face, abaixo do olho e saindo pelo alto da cabeça, durante uma explosão para abertura de túnel nas rochas da região. Tendo sobrevivido a tão grave acidente, recuperou-se sem prejuízo da linguagem, memória ou movimentos desenvolvendo, entretanto, uma modificação dramática em seu comportamento. Ele que era considerado um trabalhador responsável, habilidoso, equilibrado e cortês passou a ser rude, instável, impaciente, indisciplinado e agressivo. Sua baixa tolerância ás frustrações tornou-o desrespeitoso incapaz de adequar-se às normas sociais ou a estabelecer vínculos afetivos durante os 13 anos seguintes antes de sua morte (FUMAGALLI, 2011). A partir da descrição deste caso uma atenção maior voltou-se para os traumatismos cranianos acidentais ou como ferimentos de guerra e suas posteriores consequências. Figura 1 Em 1888 Leonor Welt publica em uma tese de doutorado seus achados sobre a mudança de comportamento em 12 pacientes com lesão pré-frontal, entre eles, Phineas Gage, traduzida por euforia, hiperatividade, deterioração de padrões morais. No mesmo ano, Jastrowitz estudando pacientes com tumores do lobo frontal descreveu-os como muito falantes, exaltados e com linguagem obscena. Em 1931, Kleist observou que pacientes com lesão cerebral da área fronto-orbital apresentavam dificuldade em reprimir seus impulsos (BUTMAN e al, 2001, p. 276-277). Figura 1 Phineas Gage e o modelo de seu crânio perfurado pela barra de ferro Fonte: Daguerreotype Wilgus Photo pt.wikipedia.org Phineas Gage GageMillerPhoto2010-02-17 Cropped.jpg brainandspine.titololawoffice.com “Sociopatia adquirida” é o termo que tem sido frequentemente utilizado para descrever a mudança de personalidade observada em decorrência de danos cerebrais em regiões préISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 frontais”. Uma das características do portador de personalidade antissocial, indivíiduo agressivo, violento, infrator reiterado é a quebra de regras e o destemor para com as consequências. São incapazes de seguir normas morais. Os resultados destas observações levaram a crer que o comprometimento da região frontal do cérebro levaria a uma dificuldade em controlar impulsos e à personalidade antissocial (DEL-BEM 2005, p. 29). O impacto dos traumatismos cranianos em criminosos ainda não conta com muitos estudos, entretanto alguns deles demonstraram forte relação com comportamento criminoso, especialmente para crimes violentos. Entre agressores masculinos, a presença de trauma craniano estava associada com violência doméstica (FERGUSON, 2012). A introdução dos métodos por imagem, Tomografia Computadorizada Ressonância Magnética e seus correlatos nas décadas de 70 e 80 fizeram o conhecimento científico das regiões do corpo avançar em velocidade até então inimaginável e, nesta esteira, seguiu-se também o melhor conhecimento do funcionamento do cérebro e suas sub-regiões. A neuroimagem estrutural (ressonância magnética e tomografia computadorizada) é capaz de detectar lesões morfológicas no cérebro que podem ser correlacionadas com determinados comportamentos e com a cognição. Lesões em regiões estratégicas do cérebro tem relação direta e causal com as disfunções observadas. (TABORDA, 2004, p. 70). A partir do caso Phineas Gage estudos e relatos de casos em veteranos de guerra mostraram relação entre lesão da região pré-frontal e a observação clínica de comportamentos agressivos e de inadequação social após trauma cerebral (BROWER apud DEL BEM, 2005). Uma comparação de entre 20 estudos epidemiológicos conduzidos para calcular a prevalência do traumatismo de crânio e sua relação com posterior comportamento violento encontrou uma positividade de 60,3%. Estas alterações na área pré-frontal se traduziram em funcionamento alterado para um grande número de indivíduos antissociais (SHIROMA et al, 2010). O desenvolvimento de novas técnicas de imagem cerebral abre nova perspectiva de que a neuroimagem possa ser útil na prática clínica tanto do doente psiquiátrico como na perícia forense para auxiliar o diagnóstico e a escolha da melhor conduta na avaliação de risco/periculosidade no seguimento de um infrator violento reincidente. (ROCHA et al, 2001) 2.4 A Técnica e os achados da neuroimagem O estudo por imagem – neuroimagem - é composto por um conjunto de técnicas que permitem visualizar diretamente a anatomia (estrutura) e a função (atividade) do cérebro. As duas principais representantes destas técnicas são a Tomografia Cerebral Computadorizada (TC), e a Ressonância Magnética (RM). Ambas fazem observações estáticas da estrutura cerebral Do princípio já conhecido do Raio X, derivam-se três técnicas: a) Tomografia Computadorizada (TC); b) Tomografia por Emissão do Pósitron - PET (Positon Emission Tomography); c) Tomografia Computadorizada por Emissão de Fóton Único - SPECT (Single Photon Emission Computed Tomography); Do princípio da radiofrequência surge a Ressonância Magnética da qual se deriva a Ressonância Magnética Funcional (MRf). As três técnicas podem estudar o cérebro tanto do ponto de vista estrutural (arquitetura anatômica) como também funcional e bioquímico, medindo a atividade neural da área que estiver ativa naquele momento. Tabela 4 ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Métodos Estruturais (estáticos) Métodos Funcionais (dinâmicos) Tomografia Computadorizada PET SPECT Dezembro/2013 Ressonância Magnética RMf Tabela 4 - Métodos estruturais e funcionais de avaliação por imagem Fonte: elaborado pela autora Tanto nos estudos com o PET como com o SPECT utiliza-se endovenosamente a associação de um traçador (elemento radiativo) com a glicose que tem a capacidade de ser absorvida pelo cérebro. Em sequência o paciente passará através de uma câmara que tem capacidade para detectar o material radioativo do traçador acumulado na área em atividade (maior consumo da glicose), registrando num papel uma imagem colorida correspondente à região estudada. Um programa de computador fará a interpretação desta atividade através de cores. Quanto mais ativa estiver aquela região do cérebro, maior será seu metabolismo, mais energia gastará e mais glicose marcada absorverá. Traça-se dessa forma um mapa funcional do cérebro que pode inclusive ter aparência tridimensional (ROCHA, 2001), (LAMPARELLO, 2011, p. 504). Como a imagem primária é obtida em preto e branco, sendo a cor preta correspondente à atividade igual a zero e a branca a região de maior atividade, um programa de computador converterá a cor branca em um espectro de cores que significam níveis intermediários de atividade. Assim é que o vermelho será o maior nível e o preto o menor nível passando pelo amarelo o verde o azul e o violeta, progressivamente menores antes do preto que é o nível zero. Dessa forma os mapas cerebrais obtidos pelo PET ou pelo SPECT correspondem com fidelidade à função que está sendo pesquisada em tempo real. São ferramentas utilizadas no estudo das funções cognitivas e suas diversas formas de expressão do pensamento abstrato. Trata-se de método para estudos cerebrais funcionais. A Ressonância Magnética (RM), por se tratar de um método estático, faz observações estruturais de anatomia cerebral (integridade local) e quando acrescentado um contraste endovenoso, aqui não mais um contraste radioativo, mas de comportamento magnético passa a dar também uma interpretação funcional recebendo o nome de Ressonância Magnética Funcional (RMf). Reflete a atividade funcional pelo maior fluxo sanguíneo (maior consumo de oxigênio) do local responsável pelo ato desempenhado naquele momento. Quando a atividade cerebral é desencadeada em uma região específica, verifica-se a coerência do achado com a atividade realizada, por exemplo, observar uma cena repulsiva e depois uma cena neutra (estado de repouso X estado de não repouso). Neste caso, a imagem da região do cérebro que está ativada é formada pelo aumento do fluxo sanguíneo local decorrente da ativação neural daquela região. O sangue, particularmente a hemoglobina carregando a partícula de oxigênio (oxihemoglobina) tem propriedades paramagnéticas que são reconhecidas pelo aparelho (efeito BOLD) (LAMPARELLO, 2011 p. 504) Quanto maior a atividade sináptica, [troca de informações entre neurônios] maior a demanda por oxigênio; Quanto maior a demanda por oxigênio, maior a perfusão tecidual; Quanto maior a perfusão, menor a quantidade de desoxihemoglobina no tecido; ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 O aumento da perfusão ocorre onde há maior concentração de sinapses, ou seja, na substância cinzenta. O contraste gerado é denominado BOLD – blood oxigenation level dependent contrast e seu uso para a construção de imagens funcionais chama-se BOLD fMRI. As imagens são construídas a partir das diferenças de sinal entre as aquisições em repouso e em atividade. (Alencar, 2010). A técnica, por ressonância magnética funcional é a base da maioria das investigações em neurociências e a evolução da técnica permitiu uma melhor exploração das relações entre região cerebral processos mentais específicos. (DEL-BEM, 2005, p.31) Para calibrar padrões de comparação volumétrica as técnicas de neuroimagem baseiam-se no princípio do voxel, unidade tridimensional básica de imagens cerebrais, de volumes na ordem de poucos milímetros cúbicos. O método de análise voxel-a-voxel mais conhecido é o Statistical Parametric Mapping (SPM), é utilizado por pesquisadores na realização de comparações estatísticas da média da intensidade de sinal em cada voxel do volume cerebral, entre grupos de pacientes psiquiátricos e controles normais, ou ainda comparar imagens de um mesmo grupo em duas condições diferentes (ROCHA, 2001). Os voxels são então transformados em pixels na imagem que será impressa para posterior visualização. Figura 2 Figura 2 – Representação da unidade volumétrica da imagem - VOXEL Fonte: PEÇANHA http://sobreafisicamedica.blogspot.com.br/2012/02/irm-historia-e-principios-basicos.html Dados morfométricos tem uma reprodução mais estável permitindo a comparação de estudos realizados com amostras entre indivíduos diferentes. Alterações na estrutura cerebral da região pré-frontal corresponderão a prejuízos no seu desempenho (função) em muitos indivíduos antissociais. As pesquisas utilizando como método a neuroimagem têm seus resultados corroborados quando do cruzamento com dados obtidos de estudos neurológicos, e psicofisiológicos na mesma amostra. (RAINE, 2008). Além da região cerebral pré-frontal cujo prejuízo anatômico ou funcional está relacionado ao comportamento antissocial violador de regras morais, também participam desta modulação outras regiões cerebrais como o hipocampo, o giro angular a amígdala cerebral e o córtex temporal. Entretanto, como o maior número de evidências publicadas até aqui refere-se à relação entre comportamento violento e delitivo (antissocial) e alterações da região do córtex cerebral pré-frontal nosso foco será ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 exclusivamente voltado para esta região, não nos detendo na distinção anatômica e funcional de suas três subdivisões (córtex ventromedial , fronto-orbital e dorsolateral). Um estudo americano relacionando a prevalência de traumatismo craniano com vários tipos de criminosos encontrou evidências de lesão em: 61% dos habitualmente violentos; 58% dos criminosos juvenis; 40% dos criminosos com severo prejuízo do comportamento (sociopatas); 36% dos criminosos sexuais (FABIAN apud LAMPARELLO, 2011, p.506). Abaixo, são apresentados alguns estudos demonstrando a relação entre o comportamento violento e achados de neuroimagem. Tabelas 5 e 6. Estudo/Autor Metabolismo reduzido da glucose avaliado pela PET Pietrini et al 2000 (agressivos) X Hirono et aL 2000 (agressivos) X Juhasz et aL 2001 (agressivos) X Redução da ativação do freio inibitório cerebral RMf Horn et al 2003 (impulsivos) X Vollm et al 2004 (sociopatas) X Birbaumer et al 2005 (sociopatas) X Tabela 5 - Anormalidades pré-frontais funcionais Fonte: elaboração da autora a partir de dados extraídos de RAINE, 2006 Estudo/Autor Brower e Price 2001 Redução estrutural da região frontal na RM X ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 (desinibidos e impulsivos) Laakso et al 2002 (sociopatas) X Raine et al 2002 (sociopatas) X Kruesi et al 2004 (crianças c/ alt. de conduta) X Yang et al 2005 (sociopatas) X Yang et al 2006 (sociopatas) X Tabela 6 - Anormalidades pré-frontais estruturais Fonte: elaboração da autora a partir de dados extraídos de RAINE, 2006. Sabe-se que existem mais fatores de influência do que alterações nas redes neurais modificando sentimentos e interpretações de regras morais, entretanto, sobrepõe-se a estes fatores uma substancial evidência de que as alterações nos sistemas neurais são comuns neste grupo. (RAINE, 2006). 2.5 A avaliação de periculosidade e a imagem cerebral na perícia forense Uma das primeiras publicações brasileiras dedicadas à perícia forense foi o livro de Francisco Franco da Rocha Esboço de Psiquiatria Forense (1904) que defendia a necessidade de uma avaliação pericial na determinação daqueles potencialmente perigosos para o convívio social. (ALMEIDA, 2008). O exame pericial é uma avaliação psiquiátrica com o objetivo de esclarecer “fatos do interesse de autoridade judiciária, policial, administrativa, de particular, constituindo-se meio de prova”. (TABORDA, 2006, p. 58) Estabelece se o estado mental particular de um indivíduo exige consideração diferenciada da lei e verifica se há condições de imputação da culpa e sob qual enquadramento jurídico: doença mental, desenvolvimento mental incompleto, retardado ou perturbação da saúde mental. No que se refere às alterações do comportamento, a perícia forense deverá delimitar em qual extensão os transtornos psiquiátricos aumentam o risco de comportamento violento. A saúde pública caracteriza-se, sobretudo, por sua ênfase em prevenção. Mais do que simplesmente aceitar ou reagir à violência, seu ponto de partida reside na forte convicção de que o comportamento violento e suas consequências podem ser prevenidos e evitados. (DAHLBERG;KRUG, 2002). O exame criminológico (EC) pericial é um exame multidisciplinar (médico, psicológico, jurídico e social), aplicado ao indivíduo condenado com o objetivo de auxiliar a sua ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 classificação em termos de antecedentes e personalidade, bem como a individualização da execução de sua pena [art. 5° da Lei de Execuções Penais], (TABORDA 2004, p. 167), entretanto, nem toda perturbação mental constitui doença mental. É o caso dos sociopatas nos quais o transtorno de personalidade não se constitui doença mental. O exame de verificação de cessação de periculosidade (EVCP) é um exame forense aplicado naqueles em regime de medida de segurança e tem por objetivo estabelecer se foi controlada ou não a potencial condição perigosa (periculosidade) do indivíduo. Atualmente o conceito de risco superou o de periculosidade A avaliação criminológica da perícia forense enfrenta divergências com relação aos instrumentos que devam ser utilizados. A maioria opta pelo uso da entrevista clínica como elemento de avaliação de periculosidade. A utilização de escalas padronizadas de avaliação de periculosidade, das quais as duas mais importantes são o Teste de Rorschach que se baseia em pranchas coloridas e a Escala de Hare (PCL-R) são muito pouco utilizadas por peritos brasileiros. Os elementos pesquisados durante a avaliação clínica baseada apenas em entrevista e na impressão pessoal do perito pode se aproximar dos instrumentos padronizados, (escalas) entretanto, os primeiros dependerão da valorização do perito de determinado item, ou seja, o desajuste social, por exemplo, poderá ser interpretado por um como indicativo de risco para violência e subvalorizado por outro. Dessa forma, há necessidade de que se dê uma uniformização ao ato de avaliar os quesitos relacionados ao risco de violência, principalmente no que se refere à reincidência sendo de vital importância rever conceitos e introduzir novos métodos como rotina na perícia forense do Brasil. [...] é de todo aconselhável que o examinador valha-se de elementos objetivos que confortem sua avaliação subjetiva. [...] Cresce a importância, pois, do uso de entrevistas estruturadas, de instrumentos objetivos para medir funções psíquicas, inclusive risco de violência, de exames funcionais e de imagem, bem como de testes neuropsicológicos. Além desses, quaisquer,exames complementares que possam alicerçar afirmativas do perito serão, em princípio, bem vindos. (TABORDA, 2004, p. 59) As alterações do córtex pré-frontal prejudicam exatamente as funções que influenciam diretamente o comportamento criminal e sua respectiva responsabilidade: controle dos impulsos, freio comportamental (veto), regulação emocional. (LAMPARELLO, 2011, p. 507). Se considerarmos algumas estatísticas que encontraram na população geral 1 a 3% de indivíduos violentos (sociopatas) e nas prisões de 20 a 25% podemos concluir que é de especial valor o desenvolvimento de técnicas que possam estabelecer relação de causa e efeito, além de propiciar medidas de conduta preventiva que identifiquem o criminoso violento antes do delito ou pelo menos antes da reincidência. (GAZZANIGA, 2011). Ainda que não se tenha uma estatística definitiva, estima-se que no Brasil a reincidência criminal esteja em torno de 80%. Aquele que sai do sistema carcerário retorna e será somado àqueles que estão entrando pela primeira vez. Embora os exames do cérebro por imagem sejam atualmente os mais utilizados nas pesquisas que relacionam comportamento violento com sua alteração funcional ou anatômica, ainda não é possível estabelecer qual é o padrão de referência para o cérebro não violento. A ciência ainda não teve tempo suficiente para demonstrar através de técnicas de imagem mais ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 sensíveis, existentes a menos de duas décadas todas as nuances mais sutis de uma alteração neurológica Será preciso que se responda: a) A técnica é confiável ? b) Qual o percentual de erro? Deve-se lembrar que, muitas vezes, um instrumento de imagem poderá ser o único elemento a auxiliar uma perícia. Quem deveria ser submetido a exames de imagem cerebral? Aqueles que tivessem cometido: a) crimes violentos associados a comportamento prévio de desajuste familiar e comunitário reiterado; b) todo o crime praticado com características de crueldade; c) comportamento violento durante a aplicação da pena ou medida de segurança d) reincidência Em síntese, a pergunta que a perícia deveria responder de forma fundamentada e mesmo antes do quesito que determina a imputabilidade, é se ele é ou não perigoso para si ou para outrem, independente do transtorno de personalidade e do comportamento (desde que violento) do qual seja acometido. 2.6 As implicações éticas Pode-se definir o homem “normal” como aquele que apresenta características de personalidade e valores preconizados como ideais pela sociedade em que vive (conceito psicológico), que não apresenta sintomas das doenças mentais conhecidas (conceito biológico ou psicopatológico) e que possui, em grau maior ou menor capacidade de se beneficiar e de se submeter ao universo de direitos e deveres que regem as relações com os outros e com a sociedade (conceito fundamentado na responsabilidade social). (TABORDA, 2006, p.26). “A responsabilidade pessoal é um conceito social (ou público) que só pode existir em grupo social e não apenas em um indivíduo. Se alguém fosse a única pessoa do planeta, não existiria qualquer conceito de responsabilidade pessoal.” (MARINO JR . 2010 p. 111). Os portadores de distúrbio do comportamento do tipo antissocial não tem responsabilidade moral, mas são passíveis de punição em virtude da responsabilidade social. “[...] a sociedade reluta em usar medicação para tratar o comportamento agressivo e antissocial ao mesmo tempo que se sente confortável para medicar outras condições comportamentais como por exemplo a esquizofrenia ou a psicose maníaco depressiva.” (RAINE A. 2008). Alguém com importante dificuldade no controle de suas ações não significa que seja incapaz de agir com conhecimento daquilo que está fazendo e saber de suas consequências. Esta, aliás, é a diferença entre ter ou não prejuízo cognitivo. Indivíduos com prejuízo do lobo frontal ainda agem com intencionalidade e conhecimento, porém dentro de um contexto de maior dificuldade no controle de seus impulsos. Isto não os torna insanos (LAMPARELLO, 2005). São duas as preocupações desta abordagem: - em relação ao portador - em relação à sociedade em geral Estas duas motivações deveriam por si só justificar a adoção de medidas mais específicas para portadores de comportamento antissocial, limitando sua autonomia resguardando tanto a sua segurança como a de seu meio social (ABDALLA FILHO e BERTOLOTE, p. 557, 2006). ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 A pergunta correta talvez não seja se ele é imputável ou não e sim se ele tem condições de retornar ao convívio social. Se ele é perigoso ou não. Sendo perigoso, quais são seus direitos de manter-se livre para ameaçar a integridade dos que estão a sua volta? O que seria justo? Estas questões precisam ser abordadas urgentemente de forma isenta de pré-julgamentos ponderando tanto os efeitos do meio ambiente sobre o indivíduo quanto as alterações orgânicas incidentes sobre o comportamento violento. [...] a neuroética é o estudo das questões éticas, legais, e sociais que surgem quando os achados científicos são levados à prática médica, interpretações legais, saúde, normas sociais que englobam achados no campo da genética, neuroimagens, diagnóstico e previsão de doenças que sejam examinadas por médicos, advogados, juízes, seguradoras ou legisladores e o público em geral ao lidar com estes fatos”. (SAFIRE 2002 apud MARINO JR, 2010, p.110). O cérebro é órgão máximo da evolução humana, sendo ele o mais desenvolvido entre todos os animais. Como sede da ética, da moral e do reconhecimento cognitivo das leis precisa ser reconhecido como imperativo na determinação de comportamentos nos quais o ambiente e outras condições não orgânica são apenas agravantes. [...] a neurobiologia do comportamento moral tem implicações potencias para a prática clínica e levanta preocupações éticas [...] Do ponto de vista clínico indivíduos que manifestem anormalidades de comportamento moral deveriam ser rastreados para anormalidades neurológicas no sentido de estabelecer-se diagnóstico precoce. O grande avanço da neurociências tem demonstrado ao longo das últimas décadas que deveria ajudar na atualização nos critérios e protocolos para decidir se o cérebro do criminoso é normal” (FUMAGALLI 2012). Importante considerar a responsabilidade moral e o suficiente conhecimento do perito na realização de sua avaliação, uma vez que cabe a ele, em cada laudo, dar sentido à norma legal, apresentando à sociedade a defesa de seus valores, tanto na proteção do indivíduo diferente como também na proteção da sociedade contra aqueles que representam perigo para ela. Embora a neuropredição da violência ainda esteja na fase de avaliação e discussão, ela não conflita com os instrumentos já existentes. Predições decorrentes de avaliações clínicas (entrevistas) são menos objetivas do que seriam se associadas a avaliações biológicas objetivas e é esta uma das razões para que os novos achados da neurociência possam subsidiar e aumentar a acurácia da avaliação do risco/periculosidade e reincidência na perícia forense (NADELHOFFER, 2010). A possibilidade do mau uso destes recursos pode ser controlada pelo estabelecimento objetivo de rígidos critérios de sua adoção, ou seja, a presença de crime violento associado a antecedentes infracionais recorrentes. 3. Conclusão Há um interesse crescente na busca das possíveis razões biológicas relacionadas à criminalidade e ao comportamento violento. Explicar os distúrbios do comportamento humano, em especial do comportamento violento é tarefa multidisciplinar que implica na absorção de fatos novos trazidos principalmente pelo avanço dos métodos de neuroimagem desenvolvidos nas últimas duas décadas. O maior entendimento dos mecanismos neurobiológicos relacionados ao comportamento impulsivo e beligerante tem se apoiado na observação de alterações cerebrais de indivíduos recidivantes em crimes violentos como também naqueles que se tornaram violentos após trauma cerebral em região pré-frontal. ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 A violência gratuita e reiterada, o comportamento transgressor repetitivo encontrado em portadores de transtorno da personalidade é um grande desafio não só para a perícia forense pela dificuldade em sua adequada identificação, mas principalmente pela destinação que a ele deverá ser reservada, seja na forma de tratamento seja na forma de reclusão por tempo indeterminado. A Organização Mundial da Saúde em seu relatório de 2002 ressalta que uma das formas de abordagem sistemática da violência é inicialmente reconhecer seu tamanho e seu impacto, compreender os fatores que aumentam número de agressores violentos, a dimensão do prejuízo social consequente e estabelecer mecanismos eficazes e programas de abordagem e prevenção. (Relatório Mundial sobre Violência e Saúde - OMS 2002). Se no Brasil, estimativas indicam que mais da metade dos que cometem um crime retornarão ao presídio não seria este o momento de rever conceitos no que concerne ao juízo de risco/periculosidade/reincidência? Esta questão não se resume somente na defesa da sociedade que precisa e deve ser protegida, mas também da defesa daquele que será submetido ao sistema penal. As decisões sobre a soltura de presos após o cumprimento da pena ou em razão de benefícios concedidos enquanto reclusos, precisam ser baseadas em dados objetivos, juízos de valor comportamental acurados, extraídos de instrumentos confiáveis e reprodutíveis mesmo quando examinados por peritos diferentes. Magistrados e jurados, não afeitos à prática de juízos clínicos precisam do suporte de dados concretos para fundamentar sua decisão. A neurociência da cognição ao apresentar um número cada vez maior de estudos na área do comportamento, auxilia a compreensão das escolhas delitivas daqueles que transgridem normas sociais e legais de forma recorrente. É importante definir até que ponto uma alteração cerebral contribuiu para aquela escolha e se é possível reverte-la ou conte-la. Atrocidades cometidas no passado, na busca por um mundo de perfeição física e social espalharam indiscriminadamente uma névoa cinzenta sobre qualquer ciência que identifique “os diferentes”. Esquecidos, entretanto, que o tempo todo separamos o que julgamos pior daquilo que achamos melhor. Queremos o melhor parceiro para nossos filhos, que seja bom e honrado, que trabalhe ou estude... e isto não parece mal. Evitamos a turma com o pior professor, o que finge dar aula mas não o faz...e evitá-lo, também não parece mal. Identificar uma criança com problemas de aprendizagem para lhe dar um tratamento diferenciado, também não parece ser errado. Quando preenchemos um cadastro de seguro ou convênio médico nos perguntam se temos alguma doença pré-existente. Somos classificados quanto ao risco de virmos a utilizar o plano de saúde. E se fizermos um financiamento também nos perguntarão de quanto é nossa renda para em seguida nos classificarem quanto ao risco potencial que seremos para o sistema financeiro. Características físicas e materiais nos separam e nos agrupam o tempo todo. O limite entre o que é ético precisa ter a mesma fronteira daquilo que é justo. Mas o que é justo? Talvez a melhor pergunta fosse: o que é injusto? Será injusto tentar melhorar nossa capacidade de prever o potencial agressivo de um indivíduo já preso por crime violento? Será errado avaliar o risco deste comportamento violento voltar a ocorrer? Esta revisão bibliográfica pretendeu responder a 3 perguntas iniciais: a) Os estudos de imagem cerebral publicados nos últimos 10 anos apresentam resultados concludentes demonstrando a relação entre alteração biológica e comportamento violento? ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 b) Seriam os métodos por imagem úteis para o laudo do perito judicial? c) O uso dos métodos por imagem como ferramenta auxiliar do perito forense é ético? Para a primeira questão deve-se substituir a expressão “resultados concludentes” por “resultados promissores”. Em virtude dos estudos por imagem serem muito recentes, constituírem métodos caros, ainda não há um número suficiente de trabalhos padronizados para que sejam comparados entre si. Além disso, quando se trata de alteração puramente funcional (não anatômica), a ferramenta por imagem ainda não tem acurácia suficiente para afirmar sua existência. Entretanto deve-se lembrar que, ausência de evidência não é evidência de ausência. A neuroimagem acena como uma nova perspectiva na compreensão da neurobiologia da violência. Mesmo com os avanços no campo das neurociências trazendo maior segurança para interpretação de comportamentos patológicos no campo da Justiça Penal, em especial da perícia forense, a influencia dos fatores psicossociais não deve ser negligenciada. Ocorrências negativas marcantes nos primeiros anos de vida, abusos físicos ou mentais, ambientes violentos, desigualdade social, desempenho escolar insatisfatório, exposição ao álcool e a substâncias psicoativas (drogas) isoladamente ou somados, por si só já são geradores de violência. Associados a alterações da estrutura ou da função cerebral responsável pelo comportamento e juízo moral, funcionarão como gatilho agravando as condições pré existentes. Importante é ressaltar que nada deve eximir do Estado sua obrigação, de tolerância zero para com a violência e da incansável determinação em empenhar-se no emprego de medidas eficientes para a paz social em sua dualidade: a segurança coletiva e a liberdade individual. Com o objetivo de encontrar alternativas mais eficazes para o controle da violência devem debruçar-se Ética, o Direito e a Medicina, no sentido de estabelecer protocolos de avaliação, de conduta e de prevenção no manejo do comportamento violento, em especial do reincidente. Com relação à segunda pergunta, a despeito das limitações dos estudos publicados até aqui, o potencial uso da neuroimagem na perícia forense deve ser considerado sim. A Medicina e o Direito, áreas que lidam com a dor física e a dor moral, precisam cada vez mais ser permeáveis ao conhecimento do novo e refletir sobre o que as chamadas neurociências têm produzido no campo da neuroimagem com o objetivo de tentar relacionar achados biológicos e padrões comportamentais, entre eles o violento reiterado. De acordo com esses novos conhecimentos, o indivíduo violento, criminoso e reincidente, no estrito contexto da perícia forense, deveria ser submetido, a exames de neuroimagem que serviriam de informação adicional ao laudo pericial e a um banco de dados nacional, como já é feito, por exemplo, com a tomada de impressões digitais. Como medida de segurança, este conjunto de informações apoiaria decisões de restrição, tratamento se houver, ou liberação. É bom lembrar que já se faz isto há mais de 30 anos com doenças de notificação compulsória, como por exemplo, hepatite, dengue, febre amarela, Aids, entre outras (Lei no 6.259, de 30 de outubro de 1975), o que facilita as estratégias de rastreamento e tratamento do Ministério da Saúde. Não se pode, confundir medidas que defendem a segurança da sociedade com mecanismos de eugenia ou ressuscitação da “stigmata” de Lombroso, sob pena de, por interpretação tortuosa e irrefletida, estar-se retirando direitos de ambos os lados: do agressor e do agredido. Finalmente, para responder à terceira pergunta, algumas reflexões precisam ser feitas antes de respondê-la. ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 Não se trata aqui, de prever especificamente um comportamento inadequado mas de prever o risco potencial de um comportamento disfuncional (violento) ocorrer ou vir a se repetir. Os estudos tem mostrado que indivíduos com alteração do lobo frontal sabem o que é certo ou errado. Mesmo assim persistem na conduta violenta e/ou criminosa sem mencionar os inúmeros delitos cometidos no recesso do lar, que não chegam à justiça penal, e que tanto desgaste social representam como estressores do núcleo familiar e comunitário. Esta inabilidade em controlar sua impulsividade infracional deveria merecer por parte da justiça um tratamento diferenciado criando uma alternativa além da determinação da imputabilidade. Não há prisão perpétua no Brasil e, se tiver bom comportamento, poderá sair e voltar a delinquir novamente. Se for considerado que, mesmo sabendo da ilegalidade da conduta, não pôde refrear seu ímpeto, ou seja, sabia que o ato era errado, mas ainda assim, persistiu por falta de juízo de valor moral sobre sua conduta poderá ser considerado semi-imputável e submetido à medida de segurança em regime de internação hospitalar de custódia ou em regime ambulatorial. Em regime ambulatorial, sabe-se que é próprio de seu perfil a negação e a insubordinação ao tratamento permanecendo perigosos até a idade avançada, quando parece haver um arrefecimento da violência. Não há adesão a nenhum tratamento. Em caso de custódia, ele será periodicamente submetido à avaliação da perícia quanto ao risco/periculosidade e aí reside a questão discutida até aqui: a instrumentalidade da perícia forense. O uso do resultado alterado de um exame de neuroimagem cerebral associado a comprovado comportamento violento reiterado, poderia autorizar o Estado a modificar seus critérios de vigilância e de confinamento, mantendo o objetivo inicial de reabilitar o indivíduo (se tratamento houver), diminuindo o risco da reincidência. A identificação de outros fatores de risco para o comportamento violento, além daqueles de fácil observação como os socioeconômicos e os ambientais, não somente acrescenta subsídios para a fundamentação de laudos periciais como também contribui para abordagens mais eficientes de prevenção e tratamento. Certamente não se deve tomar como conclusiva esta ou aquela evidência isoladamente e a cautela na interpretação dos resultados aqui se impõe. A utilização de métodos que aumentem a acurácia desta avaliação facilita o embasamento e a segurança jurídica na tomada de decisão pela justiça criminal. Este é um aspecto difícil para o mundo jurídico aceitar sem associar a lembranças de um passado recente no qual o uso da força foi utilizado para segregar com fins políticos cometendo-se atrocidades que todos conhecemos. É verdade que os achados de uma neuroimagem não significam necessariamente que aquele indivíduo cometeu o delito em virtude da referida alteração. Entretanto, o achado de um exame de neuroimagem pode somar-se a outras evidencias obtidas como, por exemplo, um rol de antecedentes violentos, um comportamento beligerante de longa data. Alguns aspectos ainda precisam ser abordadas demonstrando que também se refletiu sobre o que lhe era desfavorável. A literatura ainda não fornece dados suficientes para uma neuropredição. Na maioria dos estudos os dados foram obtidos num único momento, o que exigiria uma coleta de dados efetuada ao longo do tempo. Resultados com este perfil estão sendo aguardados neste momento. ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 6ª Edição nº 006 Vol.01/2013 –dezembro/2013 Métodos de imagem cerebral como critério de avaliação de periculosidade Dezembro/2013 Naturalmente não se pode defender um método potencialmente útil numa avaliação pericial de comportamento sem considerar seus custos. Entretanto, duas são as condições que ainda tornam a utilização dos métodos por imagem defensáveis: a) seu uso estrito em casos de dúvida quanto a periculosidade. b) o custo deste método tende a reduzir-se na medida de sua utilização, compensando o investimento maior na fase de implantação inicial. Identificar fatores de risco, sendo eles, de natureza ambiental ou biológica, não só é útil na intervenção antecipada da ocorrência da violência através de mecanismos preventivos, como também é importante no desenvolvimento de alternativas de controle e tratamento evitando reincidência. A elaboração de critérios rígidos e objetivos para a utilização dos referidos métodos, bem como a cautela nas interpretações de seus os resultados devem ser recomendados, restringindo-se seu uso à avaliação de risco/periculosidade no estrito âmbito da perícia forense, direcionados à avaliação do criminoso violento e reincidente. Para finalizar, ressalte-se que a natureza sistematicamente cruel não é própria do ser humano, melhor dizendo, o cérebro humano, em ato reiterado de violência e crueldade não pode nem deve ser considerado como normal. REFERÊNCIAS ABDALLA FILHO, Elias; BERTOLOTE, José Manoel. Sistemas de psiquiatria forense no mundo. Revista Brasileira de Psiquiatria, Brasília, 28 (supl II) p. 556-61, 2006. ______ Avaliação de risco de violência em Psiquiatria Forense. Revista de Psiquiatria Clínica, Brasília, v.31, n.6, p.279-284, 2004. ALENCAR, Edinaldo Barbosa de. Distribuições de Probabilidades Multiescala em fMRI. 2010.58f. Dissertação (Mestrado em Matemática Aplicada). 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