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www.industriaeambiente.pt
ENTREVISTA Afonso Lobato de Faria
REFLEXÃO Resíduos Urbanos: um novo paradigma entre o Setor Público e o Privado
OPINIÃO por João Bau
Água e Resíduos
desafios comuns
número 84
janeiro/fevereiro 2014
publicação bimestral
6.50 €
ISSN 1645-1783
9
771645
178003
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Um objectivo
FICHA TÉCNICA
NÚMERO 84 | JANEIRO/FEVEREIRO 2014
Diretor
António Guerreiro de Brito
[email protected]
Diretora Executiva
Carla Santos Silva
[email protected]
Conselho Editorial
Alexandre Cancela d’Abreu, Ana Malheiro,
António Gonçalves Henriques, António Joyce,
Carlos Alberto Alves, Carlos Pedro Ferreira,
Isabel Rosmaninho, Luís Fonseca, Luís Rochartre,
Pedro Santos e Rui Rodrigues
Redação
Cátia Vilaça
[email protected]
Tiragem 3000 exemplares
Os artigos assinados são da exclusiva
responsabilidade dos seus autores.
A Indústria e Ambiente adotou na sua redação
o novo acordo ortográfico.
A Indústria e Ambiente é impressa em papel
proveniente de florestas com Certificação da
Gestão Florestal Responsável.
Capa © D.R. / Remondis
A Indústria e Ambiente
é o membro português da
European Environmental Press
Revista Oficial
Entrevista | Afonso Lobato de Faria
22
26
SUMÁRIO
Depósito Legal 165 277/01
6
20
Assinaturas
Tel. 225 899 625 | Fax 225 899 629
[email protected]
ISSN 1645-1783
12º Congresso da Água, 16º ENASB e XVI Silubesa – Que futuro queremos?
16
Design
avawise
Publicação Periódica
Registo no ICS n.o 117 075
4
12
Editor
António Malheiro
Propriedade e Administração
PUBLINDÚSTRIA, Produção de Comunicação, Lda.
Praça da Corujeira, 38 – Apartado 3825
4300-144 PORTO – PORTUGAL
www.publindustria.pt | [email protected]
Editorial, por António Guerreiro de Brito
Sem tempo para esperar pelo futuro.
10
Marketing e Publicidade
Vera Oliveira
Tel. 225 899 625
[email protected]
Redação e Edição
Engenho e Média, Lda.
Grupo Publindústria
Tel. 225 899 625 | Fax 225 899 629
www.engenhoemedia.pt
2
Dossier “Água e Resíduos”
Novos desafios para as instalações prediais: a recuperação e reutilização
de recursos – armando silva afonso
Qualidade e tratamento de água e águas residuais. Desafios e
oportunidades – maria joão rosa, elsa mesquita, catarina silva
Processos e tecnologias de tratamento de resíduos sólidos: o papel dos
TMB no desafio português de desvio dos RUB dos aterros – mário russo
Políticas públicas da água em Portugal. passado, presente e futuro
– joão howell pato
Gestão patrimonial de infraestruturas, economia e regulação
– maria adriana cardoso
Sobre a articulação entre os sistemas de planeamento territorial e dos
recursos hídricos em Portugal – criar sinergias para reduzir pressões e
potenciar benefícios – teresa fidélis
29
Reflexão
Resíduos Urbanos: um novo paradigma entre o Setor Público e o Privado
– paulo praça
32
Tecnologia
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Produtos e Tecnologias
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Notícias
Efeitos do Relatório Climático do IPCC: preocupação ou caminhos de saída?
– joão quintela cavaleiro
Novo quadro da União Europeia em matéria de energia e clima 2030
– Comissão Europeia recomenda princípios mínimos para a exploração de
gás de xisto – manuel gouveia pereira
Água
Resíduos
Ecodeal aposta na valorização de resíduos perigosos para serem utilizados
energeticamente pelas cimenteiras – elsa leite
Telemetria no estudo de Rotas Migratórias – pedro martins e diogo sayanda
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Crimes e Contraordenações Ambientais
Produção de ruído por linhas elétricas de alta tensão – isabel rocha
48
Pessoas e Empresas
48
Eventos
51
Vozes Ativas
Qual o aspeto prioritário a alterar na revisão da Lei dos Solos, prevista para
o 1º semestre de 2014? – antónio fiúza e hélder careto
37
38
40
43
44
Nortada
Brasil – carlos pedro ferreira
52
Opinião, por João Bau
ERRATA Na edição 83 (pp. 16-21), o autor do artigo ”Optimização das tarifas de
electricidade em Portugal”, Henrique Gomes, antigo Secretário de Estado da
Energia, foi erradamente identificado como Diretor-Geral da REN, cargo que
já não exerce. Houve também uma incorreção na identificação das figuras.
O artigo retificado pode ser consultado na íntegra no site da Indústria e
Ambiente. Pedimos desculpa pelo lapso ao visado e aos leitores.
PRÓXIMA EDIÇÃO
DOSSIER ›
Internacionalização
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
1
EDITORIAL
Sem tempo
para esperar pelo futuro.
António Guerreiro de Brito, Diretor
[email protected]
Quando conversamos sobre assuntos triviais, ou quase, parece-nos óbvio que
todos entendemos bem sobre o que estamos a falar. Dizemos “um cinto” e
pensamos em algo que deve ser colocado entre presilhas e que segurará uma
peça de vestuário. Pode haver variações na forma, mas a função será só uma.
Dizemos “um peixe” e parece-nos que o nosso colega percebe bem que devemos
estar a falar do que poderá ser o potencial almoço (se não tiver lido Eugénio de
Andrade). Muitas palavras são claras, com funções explícitas e sem problemas.
Outras vezes, as palavras parecem mais livres, esguias ou complexas...Mas, a
água? À primeira vista, a água parece pertencer ao primeiro grupo, o dos assuntos
óbvios, entre os cintos e os peixes...mas será? Não. A água é extraordinariamente
diferente, não porque o seu estado físico possa ser múltiplo, como consta em
qualquer enciclopédia, mas porque é percecionado como um bem completamente
diferente em função do uso que lhe é atribuído. Para uns, trivial não será mesmo o
termo, pois é um direito humano. Para outros, é alimento ou, simplesmente, vida.
Portanto, se há palavra crucial e que não pode ser definida fora de um contexto,
essa palavra é ÁGUA.
Uma palavra deste calibre deve-se às suas funções e usos, que são muitos
e de valor significativo. A lista de usos é enorme, desde ser o fator essencial
para a produção agrícola ou um elemento essencial da oferta energética, mas
também a biodiversidade, a navegação, a paisagem e recreio, entre outros. A
água é uma palavra especialmente importante onde é um bem escasso, como é
em Portugal, onde representa um fator de produção e de qualidade ambiental,
ambas com valor para a economia. É uma matéria-prima e um elemento tão
importante que, sem dúvida, merece o melhor do entusiasmo, da competência
e do profissionalismo da comunidade da água. Uma comunidade que considera
que se pode e deve discutir o que queremos para o futuro. Como o futuro é quase
hoje, a Associação Portuguesa de Recursos Hídricos e a Associação Portuguesa
de Engenharia Sanitária e Ambiental uniram os seus esforços para realizar, em
colaboração com a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental,
uma verdadeira Convenção da Água e dos Resíduos, agregando o 12.º Congresso
da Água, o 16.º Encontro de Engenharia Sanitária e Ambiental e o XVI Simpósio
Luso-Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. Nessa convenção, cerca de
300 participantes debaterão o que queremos para o futuro, desde a gestão da
recursos hídricos e os serviços de águas até à gestão de resíduos, entre o litoral
e as questões transfronteiriças, o planeamento e a gestão, ou a regulação e o
mercado. Por outro lado, mas não menos importante, analisarão a estratégia
das políticas públicas, seja no domínio da gestão de recursos hídricos, após a
profunda mudança nas Administrações de Região Hidrográfica em 2011, seja pelas
novas possibilidades levantadas pela concessão privada dos serviços de resíduos.
Contudo, o que verdadeiramente os preocupa é que o modelo de governação seja
eficiente, mobilizador e participativo, o que tem levantado dúvidas mas, também,
expectativas.
2
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
“
O QUE
VERDADEIRAMENTE
OS PREOCUPA É
QUE O MODELO
DE GOVERNAÇÃO
SEJA EFICIENTE,
MOBILIZADOR E
PARTICIPATIVO,
O QUE TEM
LEVANTADO DÚVIDAS
MAS, TAMBÉM,
EXPECTATIVAS.
Dados recentemente publicados por
uma empresa especializada indicam que,
em 2012, o valor do mercado mundial
de consultadoria em ambiente atingiu
cerca de 20 mil milhões de euros, com um
aumento previsto, até 2017, de 3% por ano.
Estes dados podem simbolizar que um
processo de desenvolvimento assente na
sustentabilidade é o caminho certo, pelo
que uma Coligação de Vontades nesse
sentido é sempre uma iniciativa virtuosa.
Contudo, mais do que encontrar adjetivos,
deve resultar nas decisões certas e na
respetiva implementação. Estamos sem
tempo para esperar pelo futuro.
12º CONGRESSO DA ÁGUA, 16º ENASB E XVI SILUBESA
Que futuro queremos no domínio dos recursos
hídricos, dos serviços de água e do planeamento
e gestão de zonas costeiras?
Água e Resíduos.
Que futuro?
Rodrigo Proença de Oliveira
António Jorge Monteiro
Presidente da Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos
Professor do Instituto Superior Técnico – Universidade de Lisboa
Portugal pode orgulhar-se de um conjunto de resultados
alcançados nas últimas décadas no domínio dos recursos
hídricos, dos serviços
de água e do planeamento e gestão de
zonas costeiras. O recurso água tem sido um
fator de desenvolvimento da economia, o estado das massas de água tem vindo a melhorar, as necessidades de água têm sido asseguradas, mesmo durante períodos de escassez
como foi o caso da seca de 2005, os danos
de cheia têm sido controlados e o começam
a existir bons exemplos de ordenamento do
território, em particular das zonas costeiras.
Estes resultados são fruto do trabalho de uma
comunidade técnico-científica competente, de
um quadro legal genericamente adequado e
de uma estrutura institucional com capacidade para assegurar a definição de objetivos claros, regular a atividwade económica, promover
o desenvolvimento de soluções adequadas e
monitorizar os resultados.
É evidente que neste período houve áreas e
casos concretos em que não fomos bem-sucedidos ou em que os resultados alcançados
foram insuficientes. Permanecem também
muitos desafios que suscitam preocupação,
como é o caso da sustentabilidade económica de algumas das soluções implementadas
e dos impactos das alterações climáticas. A
crise económica que envolveu a Europa e o
Portugal e as soluções preconizadas para a
sua resolução agravaram estes desafios, e
nalguns casos assistiu-se a um retrocesso
na nossa capacidade de os enfrentar. A integração do Instituto da Água e das Administrações de Região Hidrográfica na Agência
Portuguesa do Ambiente, a desativação dos
Conselhos de Região Hidrográfica e os cortes
orçamentais diminuíram significativamente
a capacidade de intervenção da Administração Pública. A redução da atividade económica que levou ao encerramento de muitas
empresas do setor e à emigração de técnicos qualificados reduziu a capacidade téc-
4
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
nica instalada do setor privado. O estado de
inoperação das redes de monitorização que
tarda a ser ultrapassado e a incerteza em
torno do arranque, conclusão ou execução
de alguns instrumentos de planeamento são
também fontes de preocupação.
É neste quadro que reúne o Congresso da
Água, este ano em conjunto com o Encontro
de Engenharia Sanitária e Ambiental e com o
Simpósio Luso-Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. O lema do evento procura
suscitar a discussão sobre os desafios que
enfrentamos e sobre as melhores soluções
para os ultrapassar. Precisamos de redefinir
o futuro que queremos com a ambição própria de um País que procura deixar um legado
profícuo às próximas gerações mas com adequada ponderação para os constrangimentos
socioeconómicos que nos condicionam.
Os modelos e os instrumentos que utilizámos
para alcançar o estado atual podem, ou não,
continuar a ser os mais adequados.
É, no entanto, consensual que a gestão
adequada dos recursos hídricos exige uma
sociedade conhecedora e participativa,
uma administração pública especializada
e com capacidade de assumir as suas
responsabilidades que não podem ser
delegadas e uma comunidade técnico-científica
competente, inovadora e com capacidade de
resposta. É nossa responsabilidade assegurar
a vitalidade destes três pilares e a existência de
um ambiente adequado para a articulação da
atividade de cada um na promoção conjunta do
desenvolvimento económico e da proteção e
valorização dos recursos hídricos.
Uma visão clara e um consenso alargado sobre o futuro que queremos e sobre as medidas necessárias para o alcançar é a base para
qualquer futuro de sucesso.
Os desafios que enfrentamos não são exclusivos de Portugal, surgindo com diferentes
matizes e intensidades em várias regiões do
mundo. É, por isso, com muito interesse e satisfação que recebemos neste debate muitos
especialistas da comunidade técnico-científica de expressão portuguesa.
Presidente do Conselho Diretivo da APESB – Associação
Portuguesa de Engenharia Sanitária e Ambiental
O crescimento dos periurbanos nas grandes
cidades dos países
em vias de desenvolvimento vai continuar
e trazer enormes desafios no domínio da
água e dos resíduos.
Os desenvolvimentos
da última década no abastecimento de água
foram significativos mas estima-se haver mais
de 2,5 mil milhões de pessoas com água fornecida sem acesso a um adequado saneamento
das águas residuais. Apesar de ser compreensível a estratégia de concentrar todos os recursos no abastecimento de água é discutível
que esta seja uma estratégia sustentável, em
termos de saúde pública e de proteção ambiental. De facto, em vastas áreas periurbanas do
globo, o aumento significativo das águas residuais produzidas sem saneamento adequado
e a falta de gestão das águas pluviais tornam
insalubres estes bairros em períodos de maior
precipitação. Por outro lado, com a falta de remoção de resíduos sólidos urbanos, estes acumulam-se nas linhas de drenagem provocando
obstruções e vastas áreas de águas residuais
estagnadas que constituem focos de vetores
da malária, principal causa de mortalidade em
todo o mundo.
Não basta fornecer água. É necessário
planear intervenções concertadas que
envolvam também o saneamento das águas
residuais e dos resíduos sólidos para se
conseguir, em termos de saúde pública e de
proteção do meio ambiente, os benefícios
desejados. Mas o grande desafio é: como
fazer as intervenções simultâneas nestas
quatro frentes (água, águas residuais, pluviais
e resíduos sólidos) com os escassos recursos
que esses países têm disponíveis?
A experiência de Portugal, neste domínio é relevante. O desenvolvimento do setor da água e
dos resíduos nas últimas décadas foi notável.
Fez de Portugal um caso de sucesso reconhecido internacionalmente cujo saber deve ser
partilhado. Os modelos e as soluções centra-
QUE FUTURO QUEREMOS?
“
O GRANDE DESAFIO,
COMUM PARA A
ÁGUA E RESÍDUOS,
É A ESCOLHA DOS
CAMINHOS A TRILHAR.
PODEM SER VÁRIOS
MAS TÊM QUE SER
SUSTENTÁVEIS.
lizadas de água, saneamento e resíduos, que
implementámos com sucesso, podem ser uma
referência para países onde é expectável um
grande crescimento das áreas urbanas. Mas
também há que reconhecer que em muitos locais as soluções centralizadas chegaram tarde
demais tendo as populações adotado soluções
individuais que se têm revelam adequadas. Há
que assumir e integrar estas múltiplas vias de
desenvolvimento do setor das águas e resíduos, incluindo as soluções individuais na estratégia do setor. Em Portugal, é com agrado que
se constata que o plano PENSAAR 2020 procura dar o enfoque no melhor aproveitamento
das infraestruturas existentes em detrimento
da expansão em novos sistemas. Incentivar
os levantamentos do estado das fossas individuais existentes para avaliar da adequabilidade das mesmas na cobertura do serviço de
saneamento é uma solução sensata, face às
fracas taxas de adesão que se têm verificado
em alguns dos investimentos efetuados nos
últimos anos em redes de saneamento. Mas
é também importante que, em Portugal, não
fique mais uma vez por enquadrar a questão
dos pluviais. Os pluviais nas zonas urbanas
não são só um problema de inundações. São
também um problema de qualidade da água
que necessita de intervenções adequadas para
garantir a boa qualidade das massas de água
a jusante. Por outro lado, são também um
enorme desafio e uma oportunidade de voltar
a colocar a água no centro do desenvolvimento urbano. Devolver à cidade as suas linhas de
água, anteriormente canalizadas por questões
de saúde pública, e criar dessa forma novos espaços de lazer e um novo patamar de relação
da cidade com a água.
O grande desafio, comum para a água e resíduos, é a escolha dos caminhos a trilhar. Podem
ser vários mas têm que ser Sustentáveis.
Água e Resíduos:
desafios comuns
Dante Ragazzi Pauli
Presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária - ABES
O Brasil teve crescimento econômico
nas últimas décadas
que coloca o país
como uma das economias mais fortes
do mundo, tomandose por base o Produto Interno Bruto.
Ao mesmo tempo, quando olhamos nosso
Índice de Desenvolvimento Humano, o IDH,
percebemos que muito há que se fazer. Ocupamos o 85º lugar, posição nada agradável.
Temos cerca de 80% de nossa população total
atendida com água de boa qualidade. Porém,
apenas 50% dos brasileiros têm acesso à rede
coletora de esgotos e somente 37% dos resíduos domésticos gerados vão para o devido
tratamento.
Outro gigantesco desafio é a adequada destinação dos resíduos sólidos gerados nas áreas urbana e rural. Pouco mais da metade do
volume doméstico gerado é disposto de forma tecnicamente recomendada. E do ponto de vista operacional, é necessário baixar
nosso índice de perdas de água, hoje perto
de 39%.
O Brasil conta hoje com legislação que ordena
o setor, trazendo mais segurança para operadores e investidores. Recentemente aprovado, o Plano Nacional de Saneamento apresenta metas para os próximos 20 anos, o que
ajuda a direcionar ações do setor para que a
universalização dos serviços seja alcançada.
Nosso grande desafio agora é a gestão deste
plano. A quantia estimada dos recursos a serem aplicados é de R$ 508 bilhões (cerca de
€ 160 bilhões), mas a falta de clareza sobre
a origem dos mesmos é uma questão a ser
resolvida.
Outro aspecto preocupante e desafiador é a
fragilidade técnica e econômica de boa parte
de nossos quase 5600 municípios, ainda mais
quando aliados à nossa extensão territorial e
à falta de equilíbrio na distribuição de renda.
Juntamente com os itens acima elencados,
questões como regulação e participação são
apenas alguns exemplos dos problemas que
temos de enfrentar nos próximos anos.
A ABES tem promovido e participado de forma
intensa destas discussões. Temos procurado
apresentar propostas a nossos governantes
e à cadeia produtiva do setor como um todo.
A troca de experiências com nossos amigos
portugueses tem sido de grande valia, e muito do que temos aprendido tem tido aplicação
prática no Brasil.
Assim, entendemos que o fortalecimento
de nosso relacionamento com as
instituições de água e saneamento de
Portugal é de fundamental importância,
pois tem nos ajudado a encontrar
caminhos para a melhoria do saneamento
e da qualidade de vida dos brasileiros.
É com esse espírito de parceria que a
ABES participará de mais um SILUBESA:
apresentando o panorama do saneamento
no Brasil e trocando experiências com os
especialistas portugueses.
Temos certeza de que, novamente, será um
grande sucesso.
“
A TROCA DE
EXPERIÊNCIAS COM
NOSSOS AMIGOS
PORTUGUESES TEM
SIDO DE GRANDE
VALIA, E MUITO
DO QUE TEMOS
APRENDIDO TEM TIDO
APLICAÇÃO PRÁTICA
NO BRASIL.
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
5
ENTREVISTA
AFONSO LOBATO DE FARIA
O presidente do grupo Águas de Portugal aborda,
nesta entrevista, a reestruturação do setor da água e o
objetivo dessa reforma, ou seja, a sustentabilidade do
setor, para a qual deverão contribuir as agregações em
alta. Afonso Lobato de Faria explica também como a
harmonização tarifária pode trazer justiça social e por
que razão a lógica de privatização aplicada aos resíduos
não se coloca na água e saneamento.
Coordenação técnica por ANTÓNIO GUERREIRO DE BRITO | Entrevista por CÁTIA VILAÇA e CARLA SANTOS SILVA
6
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
ENTREVISTA
Indústria e Ambiente (IA) – Como enquadra a
posição do grupo Águas de Portugal na política do Governo, ou seja, o que pretende o Estado do grupo Águas de Portugal?
Afonso Lobato de Faria (ALF) – O grupo Águas
de Portugal tem uma dupla tutela - Ambiente
e Finanças-, sendo detido maioritariamente
pela Parpública. A nossa missão, que é dada
pelas tutelas, vai no sentido de prosseguir
uma reestruturação do grupo que, por inerência, é uma reestruturação do setor da água,
saneamento e resíduos. O grupo tem uma
presença muito forte nesses três setores, que
são muito heterogénos, sendo o braço do Estado para os organizar.
A reestruturação em curso tem por objetivo
trazer sustentabilidade económico-financeira
a estes setores, essencialmente o da água e
saneamento. Essa sustentabilidade passa,
em primeiro lugar, pela agregação de sistemas
com o objetivo de aumentar a escala e gerar
sinergias diversas.
As primeiras empresas do grupo a ser criadas
foram as do litoral, numa lógica de autossuficiência financeira. Depois, as empresas do
interior, a que nós chamamos sistemas multimunicipais de segunda geração, seguiram a
mesma lógica dos de primeira geração. Ora,
isso criou um desequilíbrio muito grande
porque o país não é igual. Enquanto no litoral existe uma grande concentração urbana, o
que faz com que o custo per capita para poder fornecer água ou para recolher e tratar as
águas residuais seja perfeitamente aceitável,
no interior há uma grande dispersão populacional, o que faz com que o custo per capita
seja muito mais elevado. Neste momento, se
nada fosse feito, um português do interior teria de pagar valores muito superiores àqueles
que são pagos pelos portugueses do litoral.
No âmbito destas agregações vão ser criadas
a Águas do Norte, Águas do Centro-Litoral,
Águas de Lisboa e Vale do Tejo e, se os municípios do Alentejo assim o permitirem, a Águas
do Sul. A criação destas quatro empresas vai
permitir ter tarifas (água + saneamento) numa
banda de 15 por cento. Um português do interior passa gradualmente a pagar na alta (cerca
de metade do valor da tarifa que chega à casa
das pessoas),a mesma tarifa que é paga no
litoral. Acreditamos que esta harmonização
tarifária traz mais justiça.
IA – Qual o espaço temporal dessa reforma?
ALF – O Decreto-lei enquadrador dessas agregações foi publicado em 2013. Depois foi pedido ao regulador um parecer sobre os Decretoslei de criação de cada um destes sistemas. O
regulador já deu o seu parecer, portanto o pas-
so seguinte será dado pelo Governo português,
com o envio desses decretos aos municípios
acionistas das empresas, para que eles se possam pronunciar sobre algumas alterações que
queiram realizar. O objetivo é termos estas
empresas criadas no final do primeiro semestre deste ano.
As agregações permitem resolver outro aspeto importante, que tem a ver com o défice
tarifário, que não é exclusivo do setor elétrico. O défice tarifário é gerado essencialmente
nos sistemas do interior (Águas de Trás-osMontes e Alto Douro, Águas do Zêzere e Côa,
Águas do Centro e Águas do Norte Alentejo)
onde a tarifa em alta que é aplicada fica abaixo da que seria necessária para recuperar os
custos, embora, ainda assim, seja superior à
cobrada no litoral.
Estas agregações permitem, em 25 anos, resolver todo um passivo tarifário, que neste
momento se situa em valores acima de 500
milhões de euros. Não se faz em menos tempo porque cada tarifa que será agora aplicada
vai não só recuperar os custos do ano, como
também pagar parte do passivo tarifário que
foi acumulado ao longo dos anos.
IA – Essa situação de harmonização não poderá levar a que as populações que pagavam
menos sofram um aumento?
ALF – Não necessariamente. Este movimento
faz com que tarifas do interior, que eram altas, baixem. As do litoral, que tem uma concentração populacional muito maior, sobem
ligeiramente na alta, o que não significa que
na casa das pessoas esse aumento se verifique. Se as tarifas tivessem de subir no interior, claramente as Entidades Gestoras em
baixa não tinham qualquer possibilidade de
acomodar esses aumentos, mas as Entidades
Gestoras em baixa do litoral estão com uma
melhor saúde financeira do que as do interior.
Há ainda outro aspeto a resolver com a reestruturação, que é o das ineficiências. É na baixa que estão as maiores ineficiências porque,
infelizmente, temos muitas Entidades Gestoras de dimensão muito reduzida.
IA – Há, portanto, operadores a mais...
ALF – Há operadores a mais, claramente. Tem
de haver um esforço de consolidação e as
Águas da Região de Aveiro são um exemplo
disso. Havia 10 Entidades Gestoras em baixa
e agora há uma. Passou-se de uma escala de
cerca de 30 mil habitantes, em média, para
300 mil, e esse aumento de escala é essencial.
Há excelentes profissionais enquadrados em
Entidades Gestoras microscópicas, que não
têm escala para lidar com a panóplia de exigências que uma Entidade Gestora em baixa
está obrigada a cumprir, com certificações de
qualidade, ambientais ou de redução do consumo de energia.
As Entidades Gestoras na alta, mesmo antes
das agregações, já têm uma dimensão média
muito superior à das Entidades Gestoras em
baixa mas mesmo assim achamos que têm
uma dimensão pequena. As agregações na
alta vão permitir reduzir custos, segundo as
nossas estimativas, de 25 milhões de euros
por ano.
Na baixa o caminho vai ser mais longo, até
porque a propriedade dessas Entidades Gestoras está dispersa por centenas de entidades. No entanto, fizemos um desafio para
haver uma integração entre a alta e a baixa.
Obtivemos uma resposta favorável por parte
de mais de 100 municípios, pelo que estamos
a estudar, em parceria com os municípios,
uma forma de integrar as altas e as baixas.
Se o país tivesse a alta e a baixa integradas
pouparia 150 milhões de euros por ano. A isto
chama-se ineficiência.
IA – Uma das ineficiências tem a ver com as
perdas de água...
ALF – A ERSAR avançou recentemente com
um valor interessante, segundo o qual o país
perde 163 milhões de euros por ano por causa
das perdas de água. As perdas de água estão
principalmente nas Entidades Gestoras em
baixa. As duas únicas Entidades Gestoras em
baixa controladas pelo grupo Águas de Portugal são a EPAL e as Águas da Região de Aveiro.
No caso da EPAL, essas perdas estão a níveis
historicamente baixos: no ano 2013 deverão
registar valores de perdas inferiores a 8 por
cento, quando a média do país rondará os 40
por cento.
IA – Há, inclusive, casos onde o valor chega a
80 por cento...
ALF – É um caso ou outro, mas acontece.
Lisboa, no que toca às perdas de água, está
neste momento ao nível da Holanda, do Japão e de Singapura, que são os países mais
eficientes. Mesmo assim, as pessoas podem
questionar-se se esses 8 por cento não po-
“
A REESTRUTURAÇÃO
EM CURSO TEM POR
OBJETIVO TRAZER
SUSTENTABILIDADE
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
7
ENTREVISTA
deriam ser evitados. Eu diria que abaixo dos 5
por cento não é realista.
IA – Essa discrepância nas perdas de água
deve-se a quê?
ALF – Deve-se, sobretudo, à carência de duas
vertentes: capacidade de investimento e capacidade técnica. A EPAL investiu numa equipa profissionalizada e na implementação de
zonas de medição e controlo precisamente
para perceber onde se encontram as perdas.
Para isso é necessário um investimento mínimo. Infelizmente, muitas Entidades Gestoras em Portugal não têm essa capacidade. É
preciso ter medidores de caudal para se saber
exatamente o que se fatura. Quando isso não
está devidamente contabilizado, é evidente
que a eficiência não se verifica.
IA – A par da água, também o setor dos resíduos foi alvo de uma reestruturação. Como a
caracteriza?
ALF – Nos resíduos, a lógica é diferente. A alta
dos resíduos, como é chamada, é mais jovem
do que a alta da água e saneamento mas mais
madura. Por ser um setor mais maduro, não
tem défice tarifário – até tem superavit – portanto a eficiência que as empresas estão a
obter faz com que os custos sejam inferiores
àqueles que foram estimados, o que é um sinal de eficiência. No entanto, uma boa parte
dos proveitos da EGF não vem da tarifa. Portugal, na área específica do tratamento de
resíduos sólidos urbanos, tem das melhores
práticas internacionais, o que faz com que
mais de metade dos proveitos das empresas
da EGF venha da tarifa da venda de recicláveis
e da venda de energia.. A decisão tomada pelo
governo português foi a de abrir o capital da
EGF a privados.
IA – Essa decisão de abrir o capital da EGF a
privados comporta algum risco?
ALF – Eu diria que o risco está controlado. Isto
é a prática habitual dos outros países europeus, enquanto em Portugal 97 por cento dos
resíduos sólidos urbanos são tratados por
empresas da esfera pública. Portugal está,
neste momento, numa fase bastante evoluída no setor dado ter um regulador para os
resíduos sólidos urbanos, o que não é habitual
do ponto de vista económico (noutros países é
essencialmente um mercado aberto). Em Portugal este setor é regulado, o que significa que
há uma rede de proteção relativamente aos
operadores, sejam eles públicos ou privados.
O regulamento tarifário dos resíduos está
neste momento a ser alterado, precisamente para tornar as empresas mais eficientes.
O setor da água e saneamento e o dos resíduos regem-se por uma regulação económi-
8
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
ca numa lógica de cost-plus, que na área dos
resíduos vai passar para uma lógica de revenue cap, passando a ter um teto de proveitos
permitidos, que é o número de toneladas de
resíduos vezes uma tarifa. Ou seja, o operador não vai receber mais do que aquele valor,
e tem de acomodar os custos àquele teto definido pelo regulador. É uma regulação muito
exigente do ponto de vista económico que
vai obrigar o futuro operador do tratamento
de resíduos sólidos urbanos a reduzir os seus
custos, precisamente para que o consumidor
final seja beneficiado.
Há também metas ambientais muito importantes na área dos resíduos sólidos urbanos
inseridas no PERSU 2020, em que cada sistema tem as suas metas de reciclagem bem
definidas e bastante ambiciosas, portanto vai
ter de haver novos investimentos.
Importa salientar que a EGF é uma entidade
que agrega concessionárias de sistemas em
que o Estado é o concedente. Com a privatização da EGF, o Estado continua a ser o proprietário das infraestruturas, e passará a ter um
contrato de concessão com um privado que
tem de cumprir as obrigações determinadas
sob pena de o Estado resgatar essa concessão
ou tomar medidas no sentido de corrigir o que
o operador não estiver a cumprir. Acredito que
tudo está a ser feito para que esta transição
de um operador público para um privado seja
feita com todas as cautelas, e portanto o risco,
neste momento, está claramente controlado.
IA – Se há um superavit nos resíduos, será que
em parte não poderia compensar o défice tarifário da água no valor global da fatura?
ALF – Não. A tarifa que chega à casa das pessoas é a soma da alta e da baixa, e infelizmente temos défices tarifários na água e também
na baixa dos resíduos. Neste momento, o que
as pessoas estão a pagar, em média, pelos resíduos sólidos urbanos, não está a recuperar
os custos. Os resíduos, tal como a água e o
saneamento, é um setor cujos proveitos, somados, não compensam os custos que têm, e
cada um destes setores é deficitário. O grupo
Águas de Portugal investiu, nos últimos 20
anos, 7,5 mil milhões de euros. Isto é um setor
de capital intensivo! Ainda assim, o facto de
haver superavit tarifário na alta dos resíduos
faz com que as tarifas que a alta cobra à baixa
sejam um pouco inferiores, o que causa menos pressão tarifária nas pessoas.
IA – O ministro Jorge Moreira da Silva quis acabar com alguma especulação em torno da possível privatização do setor da água. A que se
deve esta diferença de tratamento entre o setor dos resíduos e da água, ambos essenciais?
“
IMPORTA SALIENTAR
QUE A EGF É UMA
ENTIDADE QUE AGREGA
CONCESSIONÁRIAS
DE SISTEMAS EM
QUE O ESTADO É O
CONCEDENTE.
ALF – As orientações que o grupo Águas de
Portugal tem vão no sentido dessa diferenciação. No setor dos resíduos, como disse, a
decisão foi de privatização da EGF, que não é
a privatização do setor. Os sistemas multimunicipaistêm um concedente, que continua
a ser o Estado, e um regulador, que vai passar
a ser independente do Estado (já foi aprovada
a lei orgânica da ERSAR, conjuntamente com o
projeto de lei da fatura detalhada). No caso da
água e saneamento, a lógica foi outra. O objetivo prioritário é reestruturar o setor, incluindo
a agregação de empresas e a integração altabaixa, o que é um processo compreensivelmente demorado. A questão da privatização
é, portanto, algo que não se vai colocar nos
próximos tempos.
IA – Há projetos de inovação em curso no grupo Águas de Portugal, nomeadamente no âmbito do Horizonte 2020?
ALF – O grupo Águas de Portugal tem uma
grande responsabilidade no setor do Ambiente. Temos um volume de negócios acima dos
800 milhões de euros e mais de 5 mil colaboradores, dos quais 1400 licenciados, sendo
que cerca de 1000 são engenheiros. Isto para
referir o potencial da empresa. Somos uma
utility, ou seja, um grupo que detém infraestruturas e que tem como objetivo geri-las da
melhor forma possível. O grupo Águas de Portugal tem empresas que estão obviamente
em fases diferentes de vida – o caso da EPAL
é típico, é uma empresa com mais de 145 anos,
muito madura e já com boa parte dos seus investimentos feitos.
Houve uma fase intensa de infraestruturação,
com a qual o grupo ganhou muita capacidade numa lógica de gerir projetos de uma forma muito eficaz e da qual resultou que o país
tem hoje uma qualidade de água reconhecida
e o tratamento adequado dos resíduos sóli-
ENTREVISTA
PERFIL
Afonso Lobato de Faria
assumiu, em fevereiro
de 2012, a presidência
do Conselho de
Administração do grupo
Águas de Portugal, cargo
que acumula com o de
presidente do Conselho de
Administração da Águas
de Portugal Internacional,
Serviços Ambientais, SA.
Passou também pela
Direção da Efacec Ambiente
e foi Administrador da
Parceria Portuguesa para
a Água (PPA).
dos urbanos. Tudo isso deu ao grupo Águas de
Portugal muito know-how e neste momento
o grupo está a chegar a uma fase diferente.
Está numa lógica de gestão de ativos, e portanto a inovação interessa por via da vontade
de gerir, com as melhores práticas internacionais, todos estes ativos.
Uma das empresas do Grupo, a Aquasis, dedica-se só a sistemas de informação com produtos específicos que utilizamos não só no nosso
grupo como também exportamos para outras
entidades dentro e fora de Portugal. Isto funciona na alta mas também na baixa. Na baixa, através da EPAL e das Águas da Região de
Aveiro, estamos também a desenvolver produtos, como o Wone, que já referi atrás, que está
a funcionar na EPAL mas também noutras
entidades. Temos também uma grande preocupação com o contacto próximo com o cliente,
no caso da baixa da água e saneamento. Com
estes sistemas de informação, pretendemos
entrar nas SmartGrids, ou seja, nas redes inteligentes. As SmartGrids, nas quais o setor
elétrico está mais avançado, são baseadas
em sistemas de informação, que vão permitir
que os clientes possam perceber, por exemplo,
onde estão a gastar mais água.
Do ponto de vista da gestão de ativos, no caso
do saneamento, gerimos cerca de 1000 ETAR
em Portugal, e um dos principais custos das
ETAR é a energia. Participamos em projetos
europeus de investigação precisamente para
reduzir o consumo de energia que as nossas
instalações têm, e estamos a conseguir resultados extremamente interessantes. Eu diria
que o grupo Águas de Portugal tem um grupo de inovação que está totalmente aberto a
ideias fora do grupo. Faço, portanto, um de-
safio às universidades e centros tecnológicos
com ideias interessantes nestes setores.
Há duas formas de dar um salto do ponto de
vista da eficiência: uma é melhorando os processos de forma rigorosa e controlada, outra é
através de saltos inovadores, e é evidente que
temos de trabalhar nestas duas vertentes. A
primeira vertente é óbvia e tem de partir de
uma gestão apertada. Por outro lado, pretendemos apostar em saltos qualitativos com
ideias inovadoras. Por vezes essas ideias até
vêm de fora, pelo que estamos abertos ao exterior.
Na área dos resíduos sólidos urbanos, a EGF
é extremamente inovadora. Temos vários
tratamentos mecânicos e biológicos não habituais em outros países. Temos também, do
ponto de vista da triagem, sistemas inovadores de separação ótica de materiais. Temos
várias unidades pioneiras, como uma unidade
de lavagem de plásticos na Valnor, numa lógica de uma busca incessante para recuperar
materiais. Neste tipo de métodos inovadores,
consegue perceber-se se determinado material pode ser recuperado e se o investimento
tem retorno. Tendo, deve ser exportado para
os outros sistemas.
IA – Há alguma perspetiva de reabilitação de
ETAR mais antigas?
ALF – Tipicamente, o grupo Águas de Portugal,
na área do saneamento, herdou muitas ETAR,
muitas delas que não estavam a funcionar
corretamente, pelo que reabilitámos algumas
e outras, construímos novas, desativando as
obsoletas. Mas do ponto de vista global, temos ETAR muito recentes.
Portugal está numa fase em que ainda é mais
importante o novo investimento em ETAR do
que a renovação das ETAR existentes.
IA – Por onde passa o futuro do grupo Águas
de Portugal? Pela internacionalização?
ALF – A área internacional é uma área que já
existe, portanto é futuro mas também é presente. O grupo Águas de Portugal pode ser
considerado uma história de sucesso. É um
grupo saudável, com uma situação económico-financeira positiva. Apesar de existirem
problemas, como as dívidas dos nossos clientes, o grupo tem solidez financeira, e isso é o
mais importante, porque o objetivo número
1 do grupo é ter entidades em Portugal bem
geridas e com o ciclo da infraestruturação,
renovação e reabilitação garantido. Pretendemos ter uma qualidade excelente do serviço
em Portugal ao mais baixo preço possível. O
futuro passa por continuarmos a gerir bem e
também a apoiar a reestruturação do setor
em Portugal.
Um grupo com esta história de sucesso em
Portugal tem, naturalmente, competências
que podem ser úteis no mercado internacional. Neste momento, o grupo está presente
em vários países: Angola, Moçambique, Brasil, Timor, Cabo Verde, entre outros. O nosso
objetivo principal é replicar o negócio base,
que é conceber, construir e gerir infraestruturas. Com as oportunidades certas, se formos
bem-vindos nesses países, julgo que o grupo
Águas de Portugal tem as competências necessárias para ir, paulatinamente, expandindo
a sua atividade para outros países, e partilhando o know-how que tem ganho ao longo
destes anos.
NOTA O processo de privatização da EGF foi aprovado em
Conselho de Ministros à data da entrevista (30 de janeiro).
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
9
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
© T.BRAUCHLE/DR
Armando Silva Afonso
Professor da Universidade de Aveiro
Presidente da Direção da ANQIP
NOVOS DESAFIOS
PARA AS INSTALAÇÕES
PREDIAIS: A
RECUPERAÇÃO E
REUTILIZAÇÃO DE
RECURSOS
As instalações prediais de águas e esgotos
viveram em Portugal, entre a década de 90 e
meados da última década, um período de clara
estagnação técnica e científica. De facto, após
a promoção pelo LNEC, em finais dos anos 70,
do Curso CPP 508 e a publicação tardia (1995)
do novo Regulamento Geral (que resultou, em
grande parte, da necessidade de trazer para o
nosso país conceitos e técnicas construtivas
que surgiram nas décadas de 60 e 70 no setor
e que o CPP já introduzira, tornando necessária a “legalização” de algumas práticas), seguiu-se um período de duas décadas em que,
praticamente, não se desenvolveu em Portugal qualquer linha consistente de investigação
científica ou de atualização tecnológica neste
domínio.
Em 2005, com a construção de uma torre hidráulica experimental no novo Departamento
de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro, simulando as redes de um edifício de três
pisos, os temas relacionados com as instalações hidráulicas prediais começaram, novamente, a ser objeto de interesse e investigação, levando à criação, naquela Universidade,
de diversas disciplinas de opção no mestrado
10
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
e ao aparecimento de várias teses sobre a
temática. Este acontecimento, associado ao
facto de a maioria das empresas nacionais do
setor sanitário se situarem na região de Aveiro, acabou por fazer surgir aí um polo de desenvolvimento deste domínio, confirmado em
2007 com a criação da ANQIP (Associação Nacional para a Qualidade nas Instalações Prediais), uma associação sem fins lucrativos que
congregou, à volta das questões de qualidade
e eficiência nas instalações prediais, diversas
universidades, empresas, entidades gestoras
e técnicos individuais.
A ANQIP conta hoje com perto de 200 associados, mantém a sua sede nacional em Aveiro
e tem sido a responsável pela recente evolução e atualização do domínio, com práticas
de informação, formação, qualidade, certificação e, até, de investigação (apoiando teses
de doutoramento e de mestrado), procurando
recuperar o manifesto atraso que o nosso
país apresentava neste setor. Conseguiu até
uma inversão da situação nacional em alguns
domínios, como o da eficiência hídrica, onde é
atualmente uma referência internacional, com
um sistema de rotulagem pioneiro e em vias
de ser adotado por outros países europeus. A
ANQIP, ao reunir representantes de toda a fileira das instalações prediais, torna a Associação um modelo único em Portugal e potencia a
sua capacidade de intervenção a todos os níveis e de integração em redes internacionais.
A recuperação de energia e recursos na drenagem predial foi uma das áreas que suscitaram recentemente a atenção da ANQIP, correspondendo aos alertas que têm vindo a ser
dados a nível internacional em relação a esta
problemática, em particular no que se refere
à necessidade de recuperar nutrientes como
o fósforo. Este elemento químico, único e não
renovável, é fundamental para garantir a segurança alimentar, mas as principais reservas
mundiais encontram-se fora da Europa e revelam uma rápida diminuição de stocks, motivada pelo aumento exponencial da população
mundial e pela intensificação da agricultura.
A recuperação do fósforo está, por isso, no
topo das políticas mundiais e o Parlamento
Europeu já se pronunciou no sentido de “…
draw up appropriated criteria and start pilot
projects for several resources, for example P,
with a view of archiving virtually 100% reuse by
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
fábrica de processamento da urina arrancou
recentemente, devendo estar concluída em
2014. Com um milhão de pessoas, Amesterdão poderá produzir mil toneladas de fertilizante por ano.
Estas experiências existentes baseiam-se
essencialmente na recuperação e posterior
utilização direta da urina. Mas a recuperação
do fósforo nos edifícios a partir da urina pode
ser viabilizada com uma tecnologia desenvolvida em Portugal por uma empresa parceira
da Universidade do Minho (ION Environment
& Business Consulting), baseada em membranas de alumínio nanoporoso, a qual já recebeu
diversos prémios de inovação.
A separação da urina em edifícios, com ou sem
a recuperação do fósforo, exige uma revolução nas nossas instalações sanitárias: sanitas separadoras, mictórios nas habitações
(masculinos e femininos), novo desenho para
as instalações, novas regras de dimensionamento, etc. Por outro lado, existe também um
potencial para a aplicação da urina ou dos nutrientes nos próprios edifícios, em coberturas
verdes ou em agricultura urbana, potenciando
assim estas duas tendências, que hoje são
reconhecidas como da maior importância em
termos de políticas de sustentabilidade.
Ciente da necessidade desta evolução, a ANQIP está a liderar a constituição de um “Action
Group” neste domínio, enquadrado na “European Innovation Partnership on Water”, envolvendo atualmente 11 parceiros (empresas,
universidades e associações) de quatro países (Portugal, Espanha, Eslováquia e Turquia).
Este “Action Group”, designado por INTHERN
(Integrated Approach on Hydric Efficiency and
Recovery of Nutrient in Buildings with Green
Roofs), foi já reconhecido pela Comissão Europeia como de elevada importância e potencial
e permitirá a Portugal manter-se na vanguarda das conceções sanitárias para os edifícios
do futuro.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
• KVARNSTRÖM, E. [et al.] – “Urine diversion: One step towards sustainable sanitation”, EcoSanRes Sanitation Series
– Report 2006-1, Sweden, Stockholm Environmental Institute, 2006. ISBN 91 975238 9 5.
• LOURO, C., VOLSCHAN, I., ÁVILA, G. – “Sustentabilidade
ambiental: Estudo sobre o aproveitamento de nutrientes
da urina humana para fins agrícolas”, Revista Sistemas
& Gestão, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil,
2012, pp. 440-447.
• CORDELL, D., NESET, T., PRIOR, T. - “The phosphorus
mass balance: identifying ‘hotspots’ in the food system
as a roadmap to phosphorus security”, Current Opinion
in Biotechnology, Elsiever, Volume 23 (Issue 6), 2012, pp.
839-845.
• OLIVEIRA, M., MACHADO, A., NOGUEIRA, R. – “Phosphorus Removal from Eutrophic Waters with an Aluminium
Hybrid Nanocomposite”, Water, Air, Soil Pollution, Springer, Volume 223, 2012, pp.4831-4840.
REFERÊNCIAS WEB
• http://www.gppq.fct.pt/h2020/_docs/brochuras/env/
EIO_Thematic_Report_Water_May_2011.pdf
• http://ec.europa.eu/environment/life/project/Projects/index.cfm? fuseaction=home.createPage&s_
ref=LIFE07%20ENV/UK/000936
• http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=
OJ:C:2013:264E:FULL:EN:PDF
• http://www.anqip.pt/
PUB.
2020 and optimizing their use and recycling...”
Um adulto médio elimina, através da urina,
cerca de 1 g de fósforo por dia. A recuperação
de fósforo nas estações de tratamento de
águas residuais (ETAR) é teoricamente possível, mas a recuperação na origem, ou seja,
nos edifícios, aparenta inúmeras vantagens,
reduzindo a carga nas ETAR, evitando a diluição e minorando, assim, os custos e consumos
energéticos no processo.
Na verdade, a maior parte dos nutrientes evacuados pelo homem encontra-se na urina.
Por isso, a utilização direta da urina para fins
agrícolas foi já objeto de experiências piloto
na África do Sul, China, Alemanha e Suécia. Na
China já foram instalados, a partir de 1998,
mais de
700 000 sanitários separadores de urina e, na
Alemanha, já existem diversos edifícios com
essa tecnologia, como os escritórios da Cooperação Técnica Alemã. Na Suécia, a separação de
urina é, cada vez mais, uma solução considerada para pequenos aglomerados rurais, a fim de
minorar o enriquecimento com nutrientes das
linhas de água naturais, e já existem mais de
135 000 sanitários separadores de urina, bem
como recomendações específicas para a utilização da urina recolhida em edifícios habitacionais.
Na Holanda, a Waternet, a entidade gestora
de águas de Amesterdão, desenvolveu um
programa piloto de armazenamento de urina
de casas de banho públicas, tendo em vista a
sua utilização na fertilização de jardins públicos e coberturas verdes. A construção de uma
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
11
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
© D.R.
Maria João Rosa, Elsa Mesquita, Catarina Silva
UQTA – Unidade de Qualidade e Tratamento de Água
Núcleo de Engenharia Sanitária,
Departamento de Hidráulica e Ambiente
LNEC – Laboratório Nacional de Engenharia Civil, I.P.
QUALIDADE E
TRATAMENTO DE ÁGUA E
ÁGUAS RESIDUAIS.
DESAFIOS E
OPORTUNIDADES
As estações de tratamento de água (ETA) e
as estações de tratamento de águas residuais (ETAR) são peças-chave na proteção da
saúde pública e dos ecossistemas. Nos últimos anos concretizaram-se, em Portugal,
avultados investimentos na construção destas infraestruturas, que permitiram superar
a meta estabelecida no PEAASAR (Plano estratégico de abastecimento e água e saneamento de águas residuais) para o abastecimento de água em 2013 (97% vs. 90% (meta)
de cobertura da população nacional em 2009
[1]) e melhorar substancialmente a percentagem de população servida com tratamento
de águas residuais – valor estimado em 71%,
em 2009 [1]. Além de ser necessário aumentar este último valor para as metas nacionais
(90% a nível nacional e > 70% em cada sistema
integrado), os atuais desafios das entidades
gestoras colocam-se essencialmente na melhoria do desempenho das infraestruturas
existentes, e na produção de informação de
apoio à decisão a médio-longo prazo, necessária, designadamente, aos sistemas de gestão patrimonial de infraestruturas [2].
O aumento da resiliência das ETA e ETAR às
12
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
variações bruscas de quantidade e qualidade
da água a tratar, agravadas pelas alterações
climáticas, a proteção da saúde e o controlo de microcontaminantes resistentes aos
tratamentos convencionais, e.g. substâncias
prioritárias, cianotoxinas, vírus e protozoários, a minimização de gastos e da pegada de
carbono, constituem drivers de uma gestão
orientada pela procura contínua da melhoria
de desempenho dos sistemas de tratamento.
DESAFIOS
A escassez e a qualidade da água
A escassez e a qualidade da água estão na
agenda da União Europeia. Assiste-se, atualmente, a um desequilíbrio crescente entre
a quantidade/qualidade de água disponível e
necessária, e a uma intensa competição entre os diferentes usos deste recurso limitado
– agricultura, produção de energia, abastecimento público e ecossistemas – situação que,
segundo a Agência Europeia do Ambiente, tem
vindo a agravar-se em muitas zonas da Europa
e, em particular, em Portugal, como se sentiu
fortemente no ano hidrológico de 2004/2005.
As alterações climáticas amplificam a pressão
sobre este recurso e tornam o fornecimento de
água menos previsível, sendo expectável que o
aumento da intensidade e frequência das secas resulte numa variação acentuada da disponibilidade e qualidade de água, sobretudo no
Sul da Europa. A adoção de medidas eficientes
de gestão de água é premente, e as águas residuais tratadas surgem como recurso hídrico
alternativo, viável e relevante [3], mas que, em
função do(s) uso(s), pode exigir um aumento
do nível de tratamento da água. Deste cenário,
que pode envolver a descarga de águas residuais mais carregadas e a menor capacidade
de diluição dos meios recetores, decorre um
elevado potencial de deterioração da qualidade
dos recursos hídricos, incluindo as origens de
água para abastecimento público.
Os fenómenos de precipitação intensa
e a qualidade da água
Em acréscimo aos períodos de seca intensa
ou extrema, é expectável que aumente a frequência do fenómeno extremo climático inverso, ou seja, das precipitações intensas. Es-
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
tes fenómenos são também responsáveis por
alterações bruscas e severas da quantidade e
qualidade da água a tratar, quer nas ETAR [4]
quer nas ETA [5]. A gestão adequada dos sistemas de drenagem e das afluências pluviais
nas ETAR urbanas é, portanto, prioritária [6].
A maioria dos sistemas de drenagem urbanos
transporta, conjuntamente, águas residuais
domésticas e pluviais em sistemas de funcionamento unitário, misto ou pseudo-separativo [7]. Em tempo chuvoso é comum a ocorrência de descargas nas ETAR, com cargas
poluentes significativas que têm um impacto
negativo nos meios hídricos recetores [4].
Tipicamente, as ETAR estão dimensionadas
para capacidades de tratamento da ordem de
3 a 6 vezes o caudal médio diário em tempo
seco, consoante estejam ligadas a sistemas
de funcionamento, respetivamente, separativo ou pseudo-separativo/unitário [8]. Além
disso, as ETAR são frequentemente projetadas para elevados horizontes de projeto
baseados em cenários de expansão demográfica, que nem sempre se verificam. Estas
situações refletem-se na existência de ETAR
urbanas em subutilização, em termos volúmicos e/ou mássicos [9, 10]. Ou seja, pode existir
alguma capacidade de encaixe de águas pluviais nas ETAR, mas não existem ferramentas
de apoio à gestão sustentada dessas afluências que permitam minimizar os caudais descarregados sem comprometer o tratamento
eficaz e fiável da água residual com o menor
consumo possível de energia, reagentes e
produção de lamas.
Os contaminantes emergentes
A par dos fenómenos quantitativos acima
referidos (períodos de seca e de precipitação
intensa), que têm reflexos diretos na qualidade da água, cresce a pressão antropogénica
sobre a capacidade natural de depuração dos
ecossistemas. Por um lado, descargas com
maiores teores em matéria orgânica exercem
maior carência de oxigénio nos meios hídricos
e, por outro lado, assiste-se a uma descarga
crescente de xenobióticos. Anualmente, são
criados ca. 120 novos químicos, com potencial
de contaminação dos recursos hídricos durante a sua produção, utilização ou descarga. Em
consequência, a lista de contaminantes emergentes de grande relevância para o ambiente
e para a saúde pública não para de crescer.
Esta evolução tem sido acompanhada pela legislação, mas há ainda muitos contaminantes
emergentes que não estão (ainda) regulados
por limitações analíticas ou por falta de estudos que comprovem inequivocamente a rela-
ção causa-efeito sobre a saúde pública.
A Diretiva 2013/39/EU (que altera as Diretivas
2000/60/CE e 2008/105/CE no que respeita
às substâncias prioritárias no domínio da política da água) veio acrescentar recentemente
quinze novas substâncias à lista dos 33 poluentes cuja presença nas águas de superfície
da EU é monitorizada e controlada. As novas
substâncias prioritárias são componentes de
produtos fitofarmacêuticos e biocidas (aclonifena, bifenox, cibutrina, cipermetrina, diclorvos, dicofol, heptacloro e epóxido de heptacloro, quinoxifena, terbutrina), produtos químicos
industriais (ácido perfluorooctanossulfónico e
seus derivados (PFOS), hexabromociclododecanos) e subprodutos da combustão (dioxinas
e PCB com propriedades toxicológicas semelhantes às das dioxinas). A Diretiva 2013/39/EU
incluiu ainda três fármacos (diclofenac,
17-β-estradiol e 17-alfa-etinilestradiol) na
primeira lista de vigilância a fim de recolher
dados que facilitarão o estabelecimento de
medidas adequadas de gestão do risco.
De entre ou além das substâncias prioritárias,
existe um conjunto muito alargado de contaminantes que se destacam pela sua potencial
ocorrência e perigosidade, e pela sua produção
durante o tratamento ou resistência aos tratamentos convencionais em ETA e ETAR [11,
12]. São exemplos os subprodutos potencialmente carcinogénicos da oxidação química
(e.g., trihalometanos de bromo e cloro, ácidos
haloacéticos, nitrosodimetilamina, bromato),
pesticidas, fármacos e outros desreguladores
endócrinos, arsénio, cianotoxinas (microcistina-LR entre outras hepatotoxinas; neurotoxinas, cito- e genotoxinas; dermatotoxinas)
cianobactérias e outros agentes biológicos,
em particular vírus e formas resistentes à oxidação química, como os oocistos de Cryptosporidium parvum, os cistos de Giardia lamblia
e a Legionella pneumophila.
Ainda em relação aos fármacos, esta classe engloba uma extraordinária variedade de
compostos químicos com ações muito diferentes (antibióticos, analgésicos, anti-inflamatórios, contracetivos orais e esteroides,
etc.) e risco(s) associado(s) igualmente diversos. Assim, a Global Water Research Coalition
(GWRC) consolidou recentemente sete critérios para priorização destes contaminantes e
estabelecimento de medidas de vigilância e de
gestão do risco no ciclo urbano da água. São
eles: 1) existência de regulamentação, 2) consumo e vendas, 3) propriedades físico-químicas, 4) toxicidade e ecotoxicidade, 5) ocorrência
em águas superficiais, subterrâneas e de consumo e em águas residuais, 6) concentração
ambiente analisada/prevista, 6) degradabilidade/persistência durante o tratamento em
ETAR ou no ambiente e 7) resistência ao tratamento em ETAR e em ETA [13]. Com estes
critérios, a GWRC propôs o estabelecimento
de três classes: I. Fármacos de elevada prioridade, II. Fármacos prioritários e III. Fármacos
de prioridade mais baixa. Na classe I foram
identificados os 10 compostos listados no
Quadro 1.
O teor (natureza e concentração) em matéria
orgânica (natural e antropogénica) da água
é outro parâmetro crítico e, neste contexto, pode portanto ser também considerado
emergente. A matéria orgânica pode variar
(e varia frequentemente) de forma brusca e
severa com a estação do ano e os fenómenos
climáticos (em particular, com os extremos de
seca ou precipitação) e pode afetar drasticamente a eficácia e a eficiência do tratamento
em ETA e em ETAR. A matéria orgânica ocorre
na gama mg/L e é, por isso, considerada um
macrocontaminante e i) é precursora de subprodutos da oxidação, incluindo matéria orgânica biodegradável (AOC) que pode promover
o crescimento de biofilme nas redes de distri-
QUADRO 1 Fármacos de alta prioridade [13].
Número
Nome
Classificação
1
Carbamazepina
Antiepilético
2
Sulfametoxazol
Antibiótico
3
Diclofenac
Anti-inflamatório
4
Ibuprofeno
Anti-inflamatório
5
Naproxeno
Anti-inflamatório
6
Bezafibrato
Fibrato
7
Atenolol
Beta-bloqueador
8
Ciprofloxacina
Antibiótico
9
Erythromycina
Antibiótico
10
Gemfibrozil
Fibrato
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
13
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
buição e comprometer a estabilidade biológica
da água, ii) aumenta a carência de oxidante(s)/
desinfetante(s), coagulante(s)/floculante(s) e
adsorvente(s) e a produção de lamas e iii) em
regra, diminui a eficácia do tratamento para
os microcontaminantes (presentes na gama
µg/L ou ng/L) [11, 14].
O controlo dos contaminantes emergentes
em ETA e ETAR é, portanto, um objetivo prioritário, que requer a avaliação do(s) risco(s)
associado(s), a melhoria do desempenho dos
sistemas existentes e, se necessário, a sua
reabilitação com tecnologias de tratamento
avançado [11, 12].
OPORTUNIDADES DE MELHORIA E
INVESTIGAÇÃO EM CURSO NO LNEC
Decorre do acima exposto que a resposta aos
desafios que se colocam exige uma abordagem integrada para proteção dos ecossistemas e da saúde pública: por um lado, é necessário reduzir a pressão sobre os ecossistemas,
melhorando o controlo de contaminantes na
fonte e a eficácia e a resiliência das ETAR e, por
outro, há que garantir a eficácia e a resiliência
das ETA (Figura 1).
À semelhança do investimento em desenvolvimento e inovação que se observa internacionalmente, também a UQTA/LNEC tem procurado dar o seu contributo, desenvolvendo
e promovendo, através de projetos colaborativos de IDT (investigação e desenvolvimento
tecnológico), a utilização em Portugal e na Europa de (Figura 1):
• ferramentas de avaliação e melhoria (benchmarking) do desempenho de ETA e ETAR;
estas ferramentas são particularmente
inovadoras ao nível das métricas utilizadas
(indicadores e índices de desempenho) e
da eficiência energética, fiabilidade do tratamento e eficiências de remoção de cada
etapa de tratamento num conjunto de barreiras múltiplas [6] – e.g., iniciativa PASt21
(past21.lnec.pt) e curso PAS (www-ext.
lnec.pt/projects2011/PAS), projeto TRUST
(www.trust-i.net) ação 43.3 “Curative actions in wastewater treatment”;
• ferramenta de apoio à gestão de afluências
pluviais em ETAR urbanas; esta ferramenta
assenta em dois pilares, simulação dinâmica e avaliação de desempenho, e, no essencial, permitirá avaliar, prever e melhorar o
desempenho operacional das ETAR (cumprimento dos valores para descarga, eficiência energética, …) em resposta às variações de caudal e concentração provocadas
pelas afluências pluviais – tese de doutoramento em curso [6];
• soluções “à medida” de tecnologias de tratamento avançado para controlo de contaminantes emergentes e produção segura
de água para consumo humano, tratamento de águas residuais e reutilização de água;
privilegiam-se as soluções baseadas em
separações físicas e/ou biodegradação,
com menores consumos de reagentes e
formação de subprodutos, nomeadamente
as opções tecnológicas que integram adsorção a carvão ativado em pó (PAC) [14,15]
FIGURA 1 Ciclo urbano da água – desafios de qualidade e tratamento de água e exemplos de projetos de IDT no LNEC.
14
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
ou biofiltros de carvão ativado (BAC) [16,17],
flutuação por ar dissolvido [18], membranas
de baixa pressão (micro- e ultrafiltração; MF
e UF [19]), média pressão (nanofiltração; NF
[20]) e processos híbridos (PAC/MF ou PAC/
UF) [21-23] – projetos LIFE HyMemb “Tailoring hybrid membrane processes for sustainable drinking water production”, LIFE
aWARE “Innovative hybrid MBR-(PAC-NF)
systems to promote water reuse” (www.
life-aware.eu), TRUST, ação 44.2.1 “Testing
of a new ceramic membrane for tertiary
treatment of effluent designated for reuse
in Portugal”;
• recomendações para adaptação das ETA
e dos sistemas de abastecimento em resposta aos desafios colocados pelas alterações climáticas – projeto PREPARED “Enabling change” (www.prepared-fp7.eu), ações
5.2.4 e 5.5.5;
• estratégias de controlo integrado de formas
biológicas resistentes e de subprodutos da
oxidação química no tratamento de águas
(www-ext.lnec.pt/projects2013/fr-obp) e
controlo de cianobactérias e cianotoxinas
em água para consumo humano (www-ext.
lnec.pt/projects2012/CYANO);
• conhecimento sobre qualidade e segurança
da água em sistemas de adução e distribuição (www-ext.lnec.pt/projects2013/saa) e
modelos mecanísticos e preditivos das taxas de decaimento do cloro – tese de doutoramento em curso [24] e projeto ChloriDec
(PTDC/ECM/116747/2010).
NOTAS FINAIS
Vivem-se hoje grandes e rápidas mudanças
catalisadas por fortes pressões físicas e económicas. As alterações climáticas agravam
os cenários e a incerteza a eles associada.
São múltiplos e complexos os desafios que
se colocam aos sistemas urbanos de água
na proteção da saúde e do ambiente. Os
contaminantes emergentes, as afluências
pluviais, a reutilização de água, a capacidade
de adaptação rápida a variações severas da
água a tratar e a melhoria da eficiência energética são exemplos de desafios que exigem
frequentemente soluções de compromisso e
para os quais as ETA e as ETAR podem não
estar preparadas, em Portugal e pelo mundo
fora, uma vez que não foram considerados no
seu projeto. As entidades gestoras têm agora
de dar respostas e a inovação na exploração
dos sistemas pode ser a chave para o sucesso.
Inovação ao nível da abordagem, necessariamente integradora, de controlo na fonte e de
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
remediação, e do benchmarking dos sistemas
de tratamento, convencional e avançado, em
cenários de seca e de precipitação, que permitam identificar onde, quando e como melhorar
e intervir nos sistemas de tratamento e nas
redes associadas (sistemas de abastecimento
de água e de drenagem de residuais pluviais
e residuais) são temas para os quais o LNEC
tem vindo a procurar respostas, como aqui se
pretendeu ilustrar.
AGRADECIMENTOS
Um agradecimento especial é devido aos restantes elementos da atual equipa de investigação em Qualidade e Tratamento de Água:
José Menaia, Laura Monteiro, Margarida Campinas, Rui Viegas e Vítor Napier.
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INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
15
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
© DAVID RITTER / D.R.
PROCESSOS E
TECNOLOGIAS DE
TRATAMENTO DE
RESÍDUOS SÓLIDOS:
O PAPEL DOS TMB
NO DESAFIO PORTUGUÊS
DE DESVIO DOS RUB
DOS ATERROS
PANORAMA DA GESTÃO DOS RESÍDUOS
A produção de resíduos devido à atividade humana é um dos grandes desafios colocados à
sociedade nos nossos dias pelas quantidades
descartadas anualmente no ambiente, perdendo-se recursos finitos e muitos com um
fim à vista na nossa geração, se nada for feito
em contrário.
De facto, geram-se anualmente no mundo
mais de 4 biliões de toneladas de resíduos
de origem municipal, industrial e perigosos
(http://www.unece.org) que contribuem para
5% dos gases de efeito de estufa (GEE). Os
resíduos municipais gerados são entre 1,6 e
2 biliões de toneladas, sendo a maior parte
resíduos orgânicos putrescíveis, alimentos e
restos de alimentos e resíduos verdes, cujo
crescimento é estimado em 44% até 2025 devido ao crescimento da população e do consumo. Esta situação provocará um acréscimo
da emissão de GEE de 8 a 10% relativamente
à atualidade.
A reciclagem em todas as suas formas emprega 12 milhões de pessoas apenas em três
países - Brasil, China e Estados Unidos. A triagem e o processamento de materiais reciclá-
16
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
veis sustentam dez vezes mais empregos do
que operações em aterros ou em incineração,
numa base por Mg (megagrama) (Towards a
green economy – UNEP). Por outro lado, deve
referir-se que a reciclagem conduz à economia
de recursos substanciais. Por exemplo, para
cada tonelada de papel reciclado, 17 árvores e
50 por cento da água podem ser evitadas. A
reciclagem de cada tonelada de alumínio conduz à economia de recursos, evitando 1,3 toneladas de resíduos de bauxita, o consumo de
15 m3 de água de refrigeração, 0.86 m3 de água
de processo e 37 barris de petróleo. Para além
de evitar 2 toneladas de CO2 e 11 kg de SO2.
O panorama a nível mundial não é nada confortável sob o ponto de vista ambiental. Com
efeito, cerca de 70% dos resíduos municipais
são depositados em lixeiras ou em aterros sanitários, 11% são tratados por métodos térmicos em incinerações com produção de energia
elétrica e apenas os restantes 19% são reciclados ou tratados por tratamentos mecânicobiológico (TMB), que inclui a compostagem. O
desperdício de recursos, como se pode deduzir, é imenso.
Sob o ponto de vista da saúde pública, o espe-
Mário Russo
Prof. Coordenador
Instituto Politécnico de Viana do Castelo
lho mostra-nos uma imagem distorcida, dado
que se estima que cerca de 3,5 biliões de pessoas no mundo não têm acesso a sistemas
de gestão de resíduos, que representa cerca
de 52% da população da Terra (dados de 2008),
que inclui população sem a recolha para fora
das suas áreas de residência e menos ainda
qualquer tipo de tratamento.
O crescimento rápido da população sugere
que o problema se agravará com a rápida urbanização das populações, sobretudo no hemisfério sul, para onde se dirige o crescimento
económico mundial e o da população.
Esta situação, entre outras, acarreta a deposição de plásticos no oceano à volta de 7
milhões de toneladas por ano, formando verdadeiras ilhas nas calotes polares, santuários
ambientais por definição e localização: Estima-se que cerca de 80 milhões de toneladas
de plásticos estejam a flutuar no Atlântico e
no Pacífico, causando reações tóxicas e libertando, nos ecossistemas e na cadeia alimentar, desreguladores endócrinos, substâncias
cancerígenas, mutagénicas ou tóxicas para a
reprodução, partículas de dimensões nanométricas e poluentes orgânicos persistentes
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
que perduram dezenas de anos no ambiente (Relatório sobre uma estratégia europeia
para os resíduos de plástico no ambiente
(2013/2113(INI)).
É uma realidade factual que todos os recursos
disponíveis no mercado estão condenados a
serem transformados em resíduos a qualquer
momento e toda a atividade produtiva gera
uma forma de resíduo. Estes factos sugerem
claramente o agravamento dos problemas de
saúde pública e riscos ambientais, bem como
a perda de importantes recursos minerais
por aterramento, que exigem uma tomada de
posição de todos os governos por soluções
compatíveis com os princípios de preservação
ambiental e social.
Com efeito, apesar das preocupações pelo fim
do petróleo, manifestadas frequentemente,
poderá ser o fim das reservas conhecidas de
dezenas de elementos metálicos e metaloides, designadamente terras raras, lantanídeos, gálio, germanium, entre outros, que poderá
pôr em causa o desenvolvimento da sociedade
que conhecemos. Estes recursos estão a ser
desperdiçados por má gestão dos resíduos
com o seu aterramento em aterros, mas sobretudo em lixeiras em quase todo o mundo.
Sob o ponto de vista económico, este setor
é uma indústria que movimenta, anualmente, cerca de 433 biliões de USD$ e tem forte
tendência de crescimento face à necessidade de implementação de soluções capazes
de responder aos desafios de legislações já
aprovadas e cada vez mais precisas quanto
a metas a atingir, seja na Europa (legislação
sobre resíduos aprovada em 1975 e atualizada em 2012), seja em muitos outros países,
designadamente no Brasil (marco regulatório
aprovado em 2010) e em Angola, com a aprovação do PESGRU, o marco regulatório do país,
aprovado em 2012.
No entanto, não se pode falar de uma solução
para tratamento dos resíduos, devido às especificidades de: legislação nacional e regional
a cumprir; tipos de resíduos; contexto ambiental, económico, social e cultural dos países;
quantidades a manejar; tecnologias disponíveis e fiáveis nos diversos contextos; entre
outros requisitos, como:
• Preservação de condições ambientais e sociais (desenvolvimento sustentável);
• Implementação de práticas de custo efetivo
(princípio poluidor-pagador ou utilizadorpagador);
• Preservação e minimização da depleção dos
recursos naturais;
• Redução das emissões gasosas decorrentes de práticas de gestão dos resíduos.
A União Europeia aprovou recentemente a estratégia para os resíduos que muda de paradigma, passando da gestão dos resíduos para
a gestão de recursos por forma a inverter a
atual situação em que ainda prevalece o aterro como solução e se privilegie a valorização
dos recursos. Com efeito, na UE, cerca de 39%
dos resíduos produzidos são depositados em
aterro, 20% são incinerados e 23% são reciclados e 18% são compostados (dados disponíveis de 2009 pelo Eurostat).
Esta mudança de foco fortalece a necessidade de se desenhar e implementar uma gestão
integrada de resíduos que combina diversas
tecnologias para atingir os objetivos estabelecidos, designadamente:
• Minimização da produção de resíduos e o
fim gradual da sua deposição em aterro;
• Preservação de recursos naturais através
do incremento da reciclagem de produtos
secundários;
• Redução do uso de combustíveis fósseis
através do aproveitamento da energia contida nos resíduos;
A escolha ou seleção do método apropriado
de tratamento de resíduos depende de vários
critérios, que incluem:
• Custos de investimento e de operação;
• Simplicidade da tecnologia:
• Referências de cada tecnologia
• Requisitos de licenciamento;
• Dados quantitativos e qualitativos sobre
resíduos produzidos;
• Tratamento de subprodutos de resíduos e a
maturidade do Mercado para os absorver;
• Requisitos impostos pela legislação nacional ou regional;
• Potencial capacidade de expansão da tecnologia – incremento do input/output
• Requisitos de segurança e saúde do pessoal;
• Avaliação do impacto ambiental.
O DESAFIO DE PORTUGAL NO OBJETIVO DE
DESVIO DE RUB DOS ATERROS
Para atingir os objetivos plasmados na estratégia europeia de gestão de resíduos, os diversos Estados Membros terão de adequar os
seus planos, dando ênfase à recuperação dos
materiais através da reciclagem e reduzindo
drasticamente a deposição em aterro, sobretudo ao cumprir as metas de deposição da
fração urbana biodegradável (definida como
os resíduos orgânicos fermentáveis mais o
papel e cartão). Portugal também se encontra
nesta situação desafiante, estando em discussão a revisão do PERSU II, através de um
documento PERSU 2020, que traça o caminho,
impondo metas diferenciadas aos diversos
sistemas de gestão existentes no país.
Numa análise do comportamento passado
nos vários sistemas e das metas que lhes são
agora impostos na revisão do PERSU II, não é
difícil vaticinar as dificuldades do cumprimento
de tais objetivos assentes em desejos dos autores e não na realidade do país e das regiões.
Sendo o maior desafio a redução da deposição
em aterro fração biodegradável, cujas metas
são a autorização da deposição de apenas 35%
do RUB produzido em 1995 a partir de 2020.
Com efeito, segundo a APA, em 2010 o quantitativo de RUB encaminhado a aterros foi de
1.866.605 t contra uma meta de 937.000 t.
Em 2011 foram encaminhados 1.700.000 t
contra uma meta de 566.000 t, ou seja, em
2010 o défice foi de 939.605t e em 2011 foi de
1.134.000 t.
Em 2010 havia 9 unidades de valorização orgânica (VO) e 10 em construção. Em 2011 havia
13 unidades de VO e 6 permaneciam em construção. Como se pode constatar o desafio é
grande e exigirá a construção de soluções para
valorizar os RUB não admitidos em aterro.
Abordarei, por isso, soluções de valorização
desta fração, seja por via aeróbia, seja anaeróbia. Para tanto abordarei as tecnologias de
tratamento TMB (tratamento mecânico biológico).
TRATAMENTO MECÂNICO BIOLÓGICO
O TMB envolve operações de separação mecânica e processos de tratamento biológico,
aeróbio ou anaeróbio. Com efeito, a componente de separação mecânica é similar ao
que se processa em unidades de triagem para
reciclagem multimaterial. Há variações deste
processo em que após a trituração dos RSU,
com prévia separação dos componentes de
maiores dimensões, todo o material é sujeito
a um processo de degradação biológico, aeróbio ou anaeróbio, que é designado de TMB ou
algumas vezes de Tratamento Biológico Mecânico (TBM), porque é de facto diferente.
No TMB os resíduos são separados mecanicamente através de tromels rotativos em duas
ou mais frações. A fração < 90 mm é biologicamente tratada por compostagem ou digestão anaeróbia, enquanto a fração > 90 mm é
submetida a um tratamento mecânico de separação para recuperar materiais recicláveis e
produzir um combustível de alto poder calorífico (combustível derivado de resíduos, CDR).
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
17
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
A pequena fração de refugo obtida a seguir ao
tratamento biológico pode ser submetida a
um outro tratamento mecânico para produzir
um CDR.
No TBM a degradação da fração biodegradável
é realizada conjuntamente com os não degradáveis e só depois é que entra a componente
de separação mecânica. No entanto, as designações tem sido usadas indistintamente de
forma errada (Figura 1).
O TMB é classificado como um pré-tratamento, convertendo resíduos em produtos
que requerem um tratamento posterior. Em
alguns casos resíduos orgânicos e plásticos
mistos são convertidos em CDR, um combustível utilizado em fornos de cimenteiras, por
exemplo.
Podemos descrever três variantes do TMB:
• Pré-tratamento mecânico seguido de compostagem;
• Pré-tratamento mecânico e digestão anaeróbia, com aproveitamento do biogás para
produção de energia. O digerido é compostado tendo em conta o seu aproveitamento
como condicionador de solos degradados;
• Pré-tratamento mecânico e bio-desidratação.
Pré-tratamento mecânico e compostagem
A compostagem é um processo de conversão
da fração biodegradável dos resíduos em duas
fases, uma degradação ativa e uma de maturação, na presença de oxigénio fornecido por
meios mecânicos de revolvimento ou injeção
de ar nas pilhas: estas podem ser em sistemas abertos ou fechados (túneis e reatores
verticais ou horizontais (tipo Dano).
O controlo é feito por parâmetros operacionais: temperatura (deve ser inferior a 55ºC),
teor de humidade (entre 40 e 60%), teor de
oxigénio, porosidade (aumenta a superfície
específica) e o rácio C/N (deve ser superior a
30:1).
O tempo de degradação total ronda de 50 a 60
dias, repartidos entre a degradação ativa que necessita de oxigenação e a maturação (Figura 2).
Um balanço de massas típico mostra 10% de
recicláveis, 23% de CDR, 14% de composto, refugos de 20% para aterro e perdas de 33% na
compostagem.
Pré-tratamento mecânico com digestão
anaeróbia
A digestão anaeróbia consiste na conversão
da matéria orgânica num digerido e biogás,
através da fermentação microbiana na ausência de oxigénio nas seguintes fases: hidrólise dos compostos orgânicos em açúcares,
18
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
FIGURA 1 Fluxograma de um TBM (Mavropoulos, 2012).
Materiais
Recicláveis
Receção
RSU
Compostagem
Separação
Mecânica
Fração orgânica
(Composto)
Uso no solo
ou depósito
em Aterro
Refugos
para Aterro
FIGURA 2 Fluxograma de uma instalação TMB compostagem (Mavropoulos, 2012).
Materiais para
a Reciclagem
Receção
RSU
Separação
Mecânica
Separação
Mecânica
Compostagem
CDR
Composto
Refugos
para Aterro
FIGURA 3 Fluxograma do TMB com digestão anaeróbia e compostagem (Mavropoulos, 2012).
Materiais para
a Reciclagem
Receção
RSU
Separação
Mecânica
Digestão
Anaeróbia
Refugos
para Aterro
Compostagem
(digerido)
acidogénese, acetogénese e metanogénese. As condições ótimas são a manutenção
de temperaturas mesofílicas entre 30-40ºC
e termofílicas entre 50-65ºC; o tamanho das
partículas inferior a 2 cm e humidade entre 80 para alta concentração de sólidos e
95%, restantes tradicionais casos. O C/N
para componentes rapidamente biodegra-
Biogás para
produção de
eletricidade
Composto para
uso no solo ou
depositar em
aterro
dáveis deve ser superior a 25:1 ou superior a
40:1 para os lentamente biodegradáveis (Figura 3).
Os sistemas de DA podem ser classificados
de acordo com 4 critérios que definem as respetivas tecnologias: (i) concentração de sólidos; (ii) temperatura; (iii) sistema de mistura
(Figura 4) e (iv) número de reatores/estágios
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
FIGURA 4 Esquemas dos processos tecnológicos das 3 empresas identificadas
A
B
FIGURA 5 Fluxograma do processo de bio desidratação num TMB.
C
Recirculação
do inóculo
Materiais
Recicláveis
Receção
RSU
Bio
desidratação
Separação
Mecânica
CDR
Recirculação Biogás
Alimentação
Digerido
Alimentação
Refugos
para Aterro
Digerido
Alimentação
Digerido
DRANCO
KOMPOGAS
VALORGA
(1 estágio ou em 2 estágios). Os reatores, quanto à mistura, podem
ser de eixo vertical ou horizontal.
Num balanço de massas deste sistema obtém-se aproximadamente 10% de recicláveis, 27% de CDR, 6% de biogás, 31% de composto e
perdas e refugos da ordem dos 25%.
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• EU, 2008 – Diretiva n.º2008/98/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19
Pré-tratamento mecânico e bio-desidratação
Trata-se de uma alternativa de tratamento de resíduos em TMB em
que a componente de separação mecânica é precedida de uma desidratação biológica aeróbia, produzindo um CDR de elevada qualidade, uma vez que, no processo, que é diferente da compostagem, é
preservada a biomassa da matriz, acrescentando carbono biogénico
preservado no CDR. O calor necessário para a desidratação é devido
ao efeito de convecção do ar aquecido pelas reações exotérmicas da
decomposição microbiana dos componentes rapidamente biodegradáveis (Figura 5).
Um balanço de massas típico mostra 10% de recicláveis, 50% de CDR
e 40% de perdas no processo e refugos a encaminhar ao aterro (13%).
PUB.
de novembro, relativa aos resíduos.
Solução Integrada
de Gestão de Resíduos
CONCLUSÕES – O DESAFIO DO CUMPRIMENTO DAS METAS
Portugal tem um desafio muito grande para cumprir a meta de desvio de RUB de aterro devido à falta de unidades de valorização orgânica. Estas deverão ser maioritariamente TMB com variantes de
DA com aproveitamento do biogás e compostagem ou apenas com
compostagem.
As tecnologias disponíveis sugerem um cuidado especial na sua seleção devido à dificuldade de estabilização dos processos, já com
evidências nos exemplos instalados em Portugal.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
Receção de:
RCD’s
Metais
Madeiras
Solos e Rochas
Resíduos Verdes
Veículos para Abate
www.multitriagem.com
• C.A. Velis, P.J. Longhurst, G.H. Drew and R. Smith, S.J.T. Pollard (2009) - Biodrying for mechanical-biological treatment of wastes: a review of process
science and engineering. Bioresource Technology, Volume 100, Issue 11, June
2009, Pages 2747-2761.
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INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
19
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
© D.R.
João Howell Pato
Consultor
[email protected]
POLÍTICAS PÚBLICAS
DA ÁGUA EM PORTUGAL.
PASSADO, PRESENTE
E FUTURO
POLÍTICAS PÚBLICAS DA ÁGUA – QUATRO
TENDÊNCIAS
A história recente das políticas públicas da água
em Portugal, pelo menos desde 1974, pode ser
lida à luz de quatro tendências distintas. Observar essas tendências é um exercício essencial
para compreender o seu momento presente e
para pensar um futuro sustentável.
A primeira diz respeito aos pressupostos institucionais que a comunidade técnico-científica
tem vindo a defender, e que ganham forma no
modelo de planeamento e gestão integrada das
águas por bacia ou região hidrográfica. É difícil
encontrar, no âmbito das associações técnicas,
científicas ou profissionais existentes (Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos, Associação Portuguesa dos Distribuidores de Água, Associação Portuguesa de Engenharia Ambiental,
entre outras), bem como no seio da Academia,
alguém que não defenda este modelo e que
não o tenha feito de forma persistente e consistente ao longo das últimas décadas. Relembre-se, ainda, que este ideário começou a ser
defendido em Portugal logo na década de 1970,
antecipando os pressupostos essenciais da Diretiva Quadro da Água (2000) em três décadas.
20
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
A segunda está relacionada com a integração europeia das políticas hídricas nacionais,
manifestando-se na elevação dos padrões
de exigência (qualitativos e quantitativos)
inerentes a este domínio de governação, e na
disponibilidade de recursos financeiros (volume muito significativo e sem precedentes)
para garantir a concretização desses mesmos
padrões de exigência. Se a Diretiva-Quadro
da Água, publicada em 2000, procurou definir
os princípios essenciais que devem orientar a
implementação de um modelo integrado de
políticas públicas da água à escala da União
Europeia, não nos podemos esquecer que
Portugal já vinha adotando pressupostos
fundamentais das políticas hídricas comunitárias, pelo menos desde a década de 1980, e
que, da mesma forma, já vinha sendo beneficiário (em grande medida a custo perdido)
de financiamentos muito significativos para
distintas componentes do setor. Portugal tem
sido essencialmente e amplamente beneficiado por esta integração.
A terceira decorre da observação de que, ao
longo destes últimos quarenta anos, cresceu
de forma muito significativa a competência
científica, técnica, administrativa e de gestão
associada a distintas vertentes deste domínio de governação nacional. O investimento
conjunto de universidades, laboratórios, empresas de consultoria, empresas de construção civil, serviços ou empresas de gestão de
distintas componentes de serviços de águas
e saneamento (de escala nacional, regional ou
municipal) e da administração pública em geral
veio criar uma rede de excelência que permitiu
ao país desenvolver-se sem precedentes em
distintos subdomínios de governação que podemos associar à ‘governação da água’, rede
essa que é hoje, inclusivamente, reconhecida à
escala internacional.
Finalmente, a quarta surge associada à dificuldade recorrente em definir um modelo de
governação integrado e estável - quadro jurídico, modelo institucional, seu desdobramento setorial-funcional-territorial e respetivas
formas de gestão pública e/ou privada -, desejavelmente capaz de, não só garantir a concretização dos seus valores e objetivos primários, mas também de consolidar um modelo
estável e sustentável para o futuro. De facto,
as reformas e contrarreformas políticas e de
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
políticas públicas inerentes a este domínio de
governação têm-se sucedido a ritmo considerável, e esta variabilidade não será alheia ao
ritmo com que se vão sucedendo ministros e
secretários de Estado com responsabilidade
direta neste domínio de governação - a título
de exemplo refira-se que Portugal conheceu,
entre 1976 e 2014, 34 ministros com tutela
na área ambiental -, bem como ao facilitismo
com que se vão alterando as respetivas orientações políticas.
DELIMITAÇÃO E FUNCIONALIDADE DAS
POLÍTICAS DA ÁGUA
De facto, tanto a delimitação das políticas
públicas da água como a sua estruturação
num modelo funcional têm sido problemáticas ao longo deste período. As distintas áreas
de intervenção que lhe são tradicionalmente
associadas – abastecimento e saneamento
de água, energia, agricultura, domínio público
hídrico, zonas costeiras, relações luso-espanholas, entre outras - distribuem-se por uma
quantidade expressiva de instituições que demonstram dificuldades de diálogo e integração numa linha de atuação que se desejaria
fosse, no mínimo, funcional. Em simultâneo,
há áreas de intervenção cuja natureza poderia ser considerada essencialmente hídrica
- aquacultura, oceanos, etc. - mas que persistem associadas a domínios de governação
com vocação muito distinta. E se é verdade
que a criação das Administrações de Região
Hidrográfica, em finais da década de 2000,
poderia ter contribuído para a resolução de alguns dos problemas de integração institucional e funcional, a sua desestruturação recente
veio demonstrar que este domínio de governação continua sujeito a uma variabilidade
política que vem geralmente a par com uma
significativa falta de conhecimento, comunicação ou visão.
Ao longo deste período de quatro décadas observaram-se avanços muito expressivos em
áreas distintas. O ‘milagre português’ ganhou
forma precisamente porque a falta de um
projeto político consistente e durável nunca
foi suficiente para travar a emergência dessa
rede de excelência. E também, naturalmente,
porque desde a integração plena na União Europeia nunca houve efetivamente preocupações financeiras.
O ‘MILAGRE PORTUGUÊS’
O desenvolvimento do setor de abastecimento e saneamento de águas tem sido descrito
por instâncias internacionais como ‘o milagre
português’: se em 1976 os sistemas de abastecimento e saneamento de águas abrangiam 40% e 17% da população, hoje estes valores serão, respetivamente, de 95% e 81%, e
vêm a par com um salto qualitativo muito expressivo do ponto de vista da gestão, do cumprimento de normas de qualidade da água ou
da qualidade do serviço prestado. Persistem,
contudo, problemáticas associadas à tensão
entre Estado e autarquias, à escala territorial
dos sistemas, às políticas tarifárias, à sustentabilidade financeira dos serviços ou à relação público / privado.
A primeira geração de leis, regulamentos e
normas técnicas associados a questões como
o planeamento da água, o regime económico
e financeiro, o regime jurídico do domínio público hídrico, as normas de qualidade da água
(consumo humano e qualidade ambiental),
entre outras, começou a ser publicada de forma sistemática durante a primeira metade da
década de 1990, tendo sido sujeita a revisão
como consequência da publicação da Lei da
Água em 2005, repercutindo-se na atuação
das entidades públicas responsáveis e no âmbito dos distintos planos que entretanto têm
sido publicados (Plano Nacional da Água, Planos de Gestão de Região Hidrográfica, Planos
de Ordenamento da Orla Costeira, etc.). No
entanto, o ‘planeamento das águas’ continua
a ser visto essencialmente como um exercício
de diagnóstico, e não como projeto de reflexão
estratégica que deveria conduzir à definição
de uma visão para o futuro e à identificação
dos recursos e instrumentos necessários à
sua concretização.
A expansão (qualitativa e quantitativa) das redes de monitorização hidrográfica, bem como
a criação e implementação de uma série de
indicadores associados ao desempenho técnico e de gestão das instituições envolvidas
(sobretudo na componente do abastecimento
e saneamento de águas), representou igualmente um esforço notório de criação de sistemas de informação essenciais às funções de
planeamento e gestão dos recursos hídricos
nas suas distintas vertentes, que se vem desenvolvendo de forma significativa, sobretudo
desde a década de 1990. No entanto, esta informação raramente é transformada em formas de conhecimento passíveis de contribuir
para uma reflexão estratégica regular e de colocar em prática os seus resultados.
UM NOVO ‘CONTRATO DA ÁGUA’
No momento presente estamos a assistir à
desestruturação conjugada de grande parte
desta cadeia de valor, suas virtudes e defeitos.
Começando pela ‘extinção’ das Administrações de Região Hidrográfica e, com ela, do
ideário do planeamento e gestão integrada
das águas, passando pela falta de verbas que
permitam garantir a continuidade - para não
falar no reforço - das redes de monitorização
hidrográfica (Qual o destino atual da Taxa de
Recursos Hídricos? Como estão a ser geridas
as questões do licenciamento e da fiscalização? Quais os instrumentos financeiros disponíveis?), ou mesmo pelo desinvestimento
no sistema educativo superior, as notícias
que vão sendo avançadas dão conta de uma
incapacidade significativa de comunicação
entre quem ‘orienta e dirige’ o atual projeto
político deste domínio de governação, por um
lado, e todas as instituições (públicas ou privadas) intervenientes ou ainda todos aqueles
que apostaram projetos de formação, profissionais, empresariais ou de investimento financeiro ao longo das últimas décadas neste
sector, por outro. A falência de empresas ou o
êxodo significativo de grande parte dos mais
jovens académicos, investigadores, consultores e gestores - para o estrangeiro, para
o desemprego ou para funções profissionais
cuja exigência de qualificações é muito mais
baixa -, torna este problema ainda mais preocupante e vem acrescentar à desorientação
e à desmotivarão latentes em tantas instituições um problema acrescido de recursos e
competências.
A realidade de um programa de assistência
financeira como aquele a que está sujeito o
país não serve para justificar a inexistência
de um projeto político. Antes pelo contrário, exige e torna evidente a necessidade de
um projeto político de qualidade que consiga
transformar as dificuldades atuais em novas alternativas de futuro. Nunca o país teve
tantas condições – para além das financeiras
– para o fazer.
Importa, assim, que esta rede de excelência
se consiga mobilizar, agregar e motivar, nomeadamente através da sua ancoragem na
sociedade civil, tendo em vista a definição de
um novo ‘contrato da água’ que se apresente
como definição dos valores, propósitos e modelos de organização para um futuro sustentável. Este poderia ser o mote de um verdadeiro ‘Congresso da Água’. E poderia ser uma
forma de exercer, efetivamente, um magistério de influência sobre a comunidade política,
orientando-a relativamente a decisões estruturantes para o futuro do país.
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
21
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
© AFONSO LIMA / D.R.
Maria Adriana Cardoso
Engenheira Civil, Doutora em Engenharia Civil
Investigadora Auxiliar
no Núcleo de Engenharia Sanitária, LNEC
[email protected]
GESTÃO PATRIMONIAL
DE INFRAESTRUTURAS,
ECONOMIA E REGULAÇÃO
INFRAESTRUTURAS URBANAS DE ÁGUA
Nas últimas décadas foram construídas, em
todo o mundo, infraestruturas rodoviárias
e ferroviárias, energia elétrica, telecomunicações e água que, conjuntamente, têm um
avultado valor económico. As infraestruturas
constituem um meio para garantir o fornecimento de bens e a prestação de serviços que
promovem o desenvolvimento e o crescimento das populações. No longo prazo, o desempenho futuro das economias da Organização
para a Cooperação Económica e Desenvolvimento (OCDE), e de facto da economia global,
dependerá em grande medida da disponibilidade de infraestruturas adequadas para sustentar o crescimento e desenvolvimento social. Prevê-se que, até 2030, as necessidades
anuais de investimento nas referidas infraestruturas sejam, em média, de cerca de 3,5% do
produto interno bruto mundial (OECD, 2007).
As infraestruturas urbanas de água, para
além de prestarem um serviço fundamental
para a saúde e o bem-estar das populações
e para a preservação do ambiente, com todos
os benefícios económicos e sociais daí decorrentes, constituem uma parcela do patrimó-
22
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
nio construído de grande valor, a proteger e a
manter, correspondente a vultuosos investimentos realizados no passado e a realizar no
futuro.
Portugal beneficiou de três décadas de investimento de capital, mais de oito mil milhões de
euros de investimentos, com foco em novas
infraestruturas de abastecimento de água,
águas residuais e gestão de resíduos urbanos. Em resultado dos fortes investimentos
realizados, a situação evoluiu de forma significativa no sentido de uma adequada prestação destes serviços e dando cumprimento aos
exigentes normativos comunitários e nacionais em matéria ambiental e de saúde pública
com grande impacto na melhoria da cobertura
e qualidade do serviço. Contudo, após este ciclo de infraestruturação, é necessário redirecionar esforços para uma adequada gestão
das infraestruturas existentes, desde a sua
manutenção preventiva às atividades de reparação e reabilitação, como forma de garantir
elevados níveis de serviço ao longo de toda a
sua vida útil. Num contexto, presente e futuro,
em que os recursos financeiros tendem a ser
cada vez mais escassos, é indispensável ren-
tabilizar e maximizar a utilização das infraestruturas existentes como forma de assegurar
a sustentabilidade económica e financeira dos
serviços no médio e no longo prazo (Almeida e
Cardoso, 2010; Alegre e Covas, 2010).
A gestão patrimonial de infraestruturas urbanas de água é cada vez mais reconhecida
como essencial para atingir e garantir essa
sustentabilidade nos serviços urbanos de
água, sendo urgente e necessária, tendo em
conta o contexto restritivo de disponibilização
de capital e as motivações, cada vez mais exigentes, decorrentes das alterações climáticas
e proteção do ambiente, expectativas sociais
crescentes, desenvolvimentos tecnológicos,
entre outros.
GESTÃO PATRIMONIAL DE
INFRAESTRUTURAS
Importância de uma abordagem integrada
de planeamento
As infraestruturas urbanas de água devem assegurar continuamente a sua função enquanto
se justificar o serviço a que se destinam, man-
PUB.
tendo permanentemente as condições
de operacionalidade adequadas à satisfação dos níveis de serviço pretendidos.
A infraestrutura não pode ser substituída
na globalidade, de uma só vez, mas deve
ser reabilitada progressivamente ao longo do tempo, com intervenções nos seus
componentes, que não ponham em causa a continuidade de prestação do serviço e que garantam uma vida ilimitada à
infraestrutura. Pode atribuir‑se uma vida
útil limitada a um componente individual mas não à infraestrutura no seu todo
(Burns et al., 1999). Acresce que estas
infraestruturas são enterradas, o que
aumenta a dificuldade da sua gestão e
reduz a sua visibilidade social.
A gestão patrimonial de infraestruturas
(GPI) é frequentemente abordada com
base em pontos de vista parciais. Por
exemplo, para os gestores de negócios
e contabilistas, GPI significa planeamento financeiro e controlo da exposição ao
risco do negócio (Harlow e Young, 2001),
para os engenheiros, GPI é focada na
análise e projeto da rede, planeamento,
construção, operação otimizada e fiabilidade hidráulica (Alegre e Almeida, 2009),
para os gestores da manutenção de ativos, a infraestrutura é principalmente
um inventário de ativos individuais. No
entanto, a abordagem de GPI deve ser
feita de forma integrada e proativa, envolvendo os diferentes níveis de decisão
das entidades gestoras, sendo recomendada a consideração de três níveis
de planeamento, estratégico, tático e
operacional (Gordon e Shore, 1998; INGENIUM e NAMS, 2006).
Uma abordagem integrada de GPI constitui um processo sistemático e contínuo
de proporcionar a melhor forma de manter, operar e renovar as infraestruturas,
garantindo a prestação do serviço, com
níveis de qualidade adequados e um risco aceitável, assim como assegurar a sua
sustentabilidade, procurando a melhor
utilização dos recursos disponíveis. A
GPI combina as competências da engenharia, gestão e informação, fornecendo
a base e as ferramentas para facilitar e
apoiar uma tomada de decisão eficaz e
a comunicação entre as diversas partes
interessadas.
A GPI no setor da água pode ser descrita
como a gestão do capital em património de infraestruturas que fornecem o
serviço aos utilizadores, cumprindo os
níveis de serviço exigidos, enquanto se
minimiza o custo total de possuir, operar e manter o património, protegendo o
meio ambiente e garantindo a segurança. Consequentemente, em cada um dos
três níveis de planeamento requeridos
para GPI, as três dimensões do desempenho, risco e custo devem ser equilibradas (Alegre e Covas, 2010; Almeida e
Cardoso, 2010).
Esta metodologia aborda a GPI como
um processo de gestão, com base em
princípios de melhoria contínua (Alegre
e Coelho, 2012), exigindo o pleno alinhamento entre os objetivos e metas estratégicos e as prioridades e ações reais
implementadas, incorporando, assim,
os requisitos das normas ISO 55000,
ISO 55001 e ISO 55002 sobre gestão de
ativos (ISO, 2012a, b, c).
Relevância no contexto económico
Nos países da OCDE, as fontes tradicionais de financiamento público por si só
não serão suficientes para atender às
necessidades futuras das infraestruturas, que são avultadas e crescentes. Colocam-se questões fundamentais como
quais serão as novas fontes de financiamento, que papel terá o setor privado
neste domínio, que modelos financeiros,
organizacionais, institucionais e regulamentares atualmente em vigor serão
capazes de responder adequadamente
aos complexos desafios que se colocam
e se serão sustentáveis a longo prazo
(OECD, 2007).
Presentemente, dado o contexto económico desfavorável e as dificuldades
para ultrapassar os desafios cada vez
mais complexos, as fontes tradicionais
de financiamento público, como sejam
os orçamentos governamentais, estarão sob uma pressão significativa nas
próximas décadas, na maioria dos países da OCDE devido ao envelhecimento
da população, necessidades crescentes
de gastos sociais, de segurança, entre
outros. Consequentemente, prevê-se
que os investimentos públicos de capital
mantenham a sua tendência decrescente (OECD, 2007).
Ultrapassar o défice de investimento
nas infraestruturas é essencial para
evitar atingir custos ainda mais elevados resultantes da perda dos serviços
prestados com graves consequências na
competitividade, crescentes problemas
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
FIGURA 1 Metodologia AWARE-P.
Planeamento Estratégico
Missão e visão
da organização
Objetivos › critéiros de avaliação
› métricas › metas
Revisão
Diagnóstico
Planeamento Tático
Produção do plano
Implementação do plano
Para o
Tático
Do Estratégico
Objetivos › critéiros de avaliação
› métricas › metas
Monitorização do plano
Revisão
Diagnóstico
Planeamento Operacional
Produção do plano
Implementação do plano
Para o
Operacional
Monitorização do plano
Do Tático
Objetivos › critéiros de avaliação
› métricas › metas
Revisão
Diagnóstico
Produção do plano
Implementação do plano
Ação
Monitorização do plano
ambientais, com todas as implicações para a
qualidade de vida e crescimento económico.
Enfrentar este desafio exigirá abordagens
inovadoras, tanto no que diz respeito à obtenção de financiamento adicional, como à gestão
das infraestruturas de forma mais eficiente,
com recurso a novas tecnologias, estratégias
de gestão da procura, alterações regulatórias
e melhor planeamento.
Como um setor estratégico de grande relevância social e económica, é vital que os serviços
urbanos de água sejam geridos de uma forma
cada vez mais racional e eficiente, criando o
máximo valor das suas infraestruturas. Sem
FIGURA 2 Planos de GPI (Cardoso et al., 2014).
24
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
uma GPI avançada, não será viável garantir
níveis adequados de serviço no futuro, essenciais para garantir o desenvolvimento das sociedades e, consequentemente, o crescimento
da economia.
Regulação como oportunidade
A atividade regulatória dos serviços urbanos de água constitui uma oportunidade de
melhoria da capacidade dos serviços para
ultrapassarem o défice de investimento nas
infraestruturas. Em Portugal, nos últimos
anos foram tomadas várias medidas importantes visando inverter a tendência verifica-
da e fornecer às entidades gestoras do país
meios para promover a sustentabilidade a
longo prazo das infraestruturas existentes.
A importância da gestão patrimonial de infraestruturas foi reconhecida em legislação
do setor, nomeadamente no Decreto-Lei n.º
194/2009, de 20 de agosto, que determina
que as entidades gestoras dos serviços devem dispor de informação sobre a situação
atual e projetada das infraestruturas, a sua
caracterização e a avaliação do seu estado
funcional e de conservação, sendo que as entidades gestoras que sirvam mais de 30 mil
habitantes devem ainda promover e manter
um sistema de gestão patrimonial de infraestruturas (Almeida e Cardoso, 2010; Alegre e
Covas, 2010).
A informação reportada à ERSAR pelas entidades gestoras, relativa ao ano de 2012, identificou a existência de um nível claramente
insuficiente de conhecimento infraestrutural
nos serviços urbanos de água. A GPI não pode
ser efetiva sem um aumento considerável do
conhecimento das infraestruturas, base fundamental para que possam ser geridas (ERSAR, 2013).
A Entidade Reguladora dos Serviços de Águas
e Resíduos (ERSAR) considera que a GPI, entendida como a gestão estratégica e sustentável das infraestruturas existentes, deve ser
desenvolvida de forma integrada, incluindo as
diferentes atividades de exploração dos sistemas urbanos de águas, bem como as de reabilitação e de expansão. Considera, ainda, que
esta abordagem é indispensável para assegurar o cumprimento dos níveis de serviço, através da adoção de uma estratégia de investimentos e de custos operacionais adequados,
face aos objetivos estabelecidos.
PUB.
IMPLEMENTAÇÃO DA GPI EM
PORTUGAL
De 2009 a 2012, decorreu em Portugal
o projeto AWARE-P, cofinanciado pelo
Mecanismo Financeiro Europeu - EEA
Grants e pelas entidades gestoras
participantes, que teve como objetivos
desenvolver e implementar o conhecimento e as ferramentas necessárias à
tomada eficiente de decisões por parte das entidades gestoras, no âmbito
da GPI em sistemas urbanos de água
(Cardoso et al., 2012; www.aware-p.
org). Este projeto foi liderado pelo LNEC,
em parceria com o IST, Sintef (Noruega),
Addition, YDreams, ERSAR, AGS, AdP
Serviços, Veolia Águas de Mafra e SMAS
de Oeiras-Amadora. O projeto promoveu
o desenvolvimento e disseminação de
abordagens estruturadas e tecnicamente bem fundamentadas (Figura 1), tendo
a sua implementação e capacitação sido
realizadas através de duas iniciativas
colaborativas “gémeas” a nível nacional,
os programas iGPI e PGPI, lideradas respetivamente pelo LNEC e pela AGS. Esta
fase (2012-2013) permitiu a validação e
refinamento dos métodos e do software, apoiando o desenvolvimento efetivo
em campo e a implementação de planos
de GPI em mais de 30 entidades gestoras (Leitão et al., 2013; Feliciano et al.,
2013a, b).
É de realçar o esforço que conduziu a que,
presentemente, mais de 25% da população portuguesa seja servida pelas 30
entidades gestoras que proativamente
produziram os seus planos estratégicos
e táticos de GPI no âmbito dos programas iGPI e PGPI (Figura 2). Aplicaram a
metodologia e orientações do projeto
AWARE-P – reconhecido pela ERSAR –
com a utilização generalizada do software de código aberto, criando efetivamente o alinhamento e a massa crítica para a
tão necessária mudança.
Gestão Integrada de Resíduos
A Renascimento é uma empresa
direcionada para a gestão integrada de
resíduos. A atividade da empresa é
desenvolvida tendo por base a gestão,
recuperação, valorização reciclagem e
tratamento adequeados de um leque
diversificado de resíduos, disponibilizando um serviço completo de logística
e fornecimento de contentores e outros
dispositivos de gestão, nas instalações
dos seus parceiros.
Soluções de Gestão
de Resíduos
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System Analysis. Ed. Avi Ostfeld (ISBN 978-953-51-0889-4). Open access at: www.intechopen.com/books/
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Gestão Global de Resíduos
Unidade de Abate VFV
Unidades de Reciclagen REEE
Unidades de Reciclagem RCD
Reciclagem Resíduos de Madeira
Produção de CDR
Serviços de Logística
Limpezas industriais
Descontaminação de Solos
St.ª Mª da Feira
Loures
Silves
Excelência´12
Unidades da Renascimento Gestão de Resíduos
Unidade de Loures- Tel: 219 738 211 | Fax: 219 738 212
Unidade de Sanguedo- Tel: 227 474 110 | Fax: 227 474 111
Unidade de Algoz- Tel: 282 570 030 | Fax: 282 570 031
Email: [email protected]
www.renascimento.pt
-
-RenascimentoReciclagem
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
© 2014 TERRAMETRISCS / D.R.
SOBRE A ARTICULAÇÃO
ENTRE OS SISTEMAS
DE PLANEAMENTO
TERRITORIAL E DOS
RECURSOS HÍDRICOS
EM PORTUGAL
– CRIAR SINERGIAS PARA
REDUZIR PRESSÕES E
POTENCIAR BENEFÍCIOS
O planeamento territorial é essencial para a
proteção dos recursos hídricos, dos estuários
e dos serviços dos ecossistemas associados,
bem como para prevenir riscos. Uma articulação robusta entre o planeamento territorial
e o planeamento dos recursos hídricos pode
dar um importante contributo para a implementação de diversas medidas previstas
na Diretiva Quadro da Água (DQA) (Diretiva
2000/60/CE de 23.10). Entre outros aspetos,
pode ser usado para minimizar os impactos
resultantes das pressões humanas sobre o
ciclo da água e os ecossistemas de uma determinada área geográfica. Os sistemas de
planeamento territorial e de planeamento de
recursos hídricos têm sido concebidos a partir
de diferentes contextos técnico-científicos,
de diferentes quadros institucionais e com
diferentes limites territoriais, dificultando
assim o estabelecimento de pontes entre estes dois sistemas. Apresenta-se uma muito
breve reflexão sobre o modo como as atuais
versões da Lei de Bases do Ordenamento
do Território e Urbanismo e da Lei da Água
preveem a articulação dos dois sistemas de
planeamento referidos. Conclui-se com uma
26
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
perspetiva crítica sobre a sua articulação e
recomenda-se a criação de sinergias mais
produtivas entre eles.
CONTRIBUTOS DA ARTICULAÇÃO ENTRE
OS SISTEMAS DE PLANEAMENTO DOS
RECURSOS HÍDRICOS E DO TERRITÓRIO
O conceito de gestão integrada dos recursos
hídricos tem sido usado como um paradigma para as boas práticas no setor da água.
É entendido como um processo que promove
a utilização e proteção da água, do solo e dos
recursos associados de forma a maximizar
o bem-estar económico e social resultante
de forma equitativa e sem comprometer a
sustentabilidade dos ecossistemas (Biswas,
2008). O conceito inclui um aspeto crítico ainda pouco apreendido pelas políticas públicas,
nomeadamente a necessidade de se ter em
conta que a própria utilização do território
pelas mais diversas atividades humanas tem
implicações sobre o equilíbrio hidrológico do
solo, e sobre os recursos hídricos em geral,
por exemplo através da poluição difusa, das
alterações morfológicas ou da excessiva
Teresa Fidélis
Professora Auxiliar
Departamento de Ambiente e Ordenamento
Universidade de Aveiro
[email protected]
captação, resultantes, por exemplo, dos impactes da transformação do solo pela agricultura, urbanização, transportes, etc. (EEA,
2012). No contexto europeu, esta preocupação tem sido cada vez mais evidenciada e a
DQA deixou já claro que a gestão da água é
muito mais do que apenas a distribuição e
tratamento da água. Envolve também a gestão do território das atividades que nele se
instalam, requerendo por isso uma forte coordenação com o ordenamento do território
(EU, 2012).
As vantagens de melhorar as sinergias entre
os sistemas de planeamento territorial e dos
recursos são múltiplas (EEA, 2012). Permite
i) contribuir para construir uma visão estratégica de longo prazo e facilitar a integração
de várias áreas relevantes como a da DQA ou
da Rede Natura 2000; ii) influenciar a localização e intensidade das atividades económicas
que afetam as bacias hidrográficas; iii) facilitar a incorporação de objetivos dos recursos
hídricos nos sistemas de governação e planeamento locais verificando se propostas de desenvolvimento salvaguardam as massas de
água e contribuem para o seu bom estado; iv)
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
partilhar ferramentas chave como a Avaliação
Ambiental Estratégica (AAE) e a participação
pública, criando sinergias entre estas e os utilizadores envolvidos e v) constituir uma abordagem fundamental para enfrentar os riscos
de inundação, na lógica da Diretiva Inundações
(2007/60/CE de 23.10).
Mas são ainda várias as razões que sustentam as dificuldades em promover a articulação entre os sistemas (EEA, 2013): i) a experiência dos países europeus está ainda a evoluir;
ii) tradicionalmente os planos de recursos hídricos e os planos de ordenamento são elaborados por diferentes setores de governação;
iii) decorrem de áreas técnico-científicas e
tradições diferentes; iv) os limites territoriais
raramente coincidem; v) em geral têm escalas
temporais e territoriais diferentes; vi) raramente compartilham conhecimentos, métodos e dados; vii) os processos de participação
pública envolvem atores diferentes; e viii) dificilmente conseguem assumir uma visão integrada de sustentabilidade.
ARTICULAÇÃO ENTRE OS SISTEMAS DE
PLANEAMENTO TERRITORIAL E DOS
RECURSOS HÍDRICOS EM PORTUGAL
O sistema de planeamento territorial português está estabelecido na Lei de Bases da
Política de Ordenamento do Território e Urbanismo (Lei n. 48/98 de 11.08, alterada pela
Lei n. 54/2007 de 31.08). No documento são
definidos os três níveis de planeamento, nacional, regional e local, os requisitos de articulação entre eles, os vários tipos de planos,
bem como os principais objetivos, responsabilidades do estado e regras de elaboração e implementação dos planos. A regulamentação
adicional veio clarificar e consolidar diversas
regras sobre a elaboração dos planos e respetivo conteúdo, bem como sobre a implementação do sistema (Decreto-Lei n. 380/99 de
22.09, alterado pelo Decreto-Lei n. 316/2007
de 19.09 e pelo Decreto -Lei n. 46/2009 de
20.02).
O sistema de planeamento de recursos hídricos está estabelecido no capítulo III da Lei da
Água (Lei n. 58/2005 de 29.12, alterada pelo
Decreto-Lei n. 245/2009 de 22.9 e pelo Decreto-Lei n. 130/2012 de 22.6), que transpõe
a DQA para a ordem jurídica interna. É constituído por três tipos de instrumentos, os planos de gestão de recursos hídricos, os planos
especiais de ordenamento do território e as
medidas de proteção e melhoria dos recursos
hídricos. Na figura 1 podem observar-se os
tipos de planos previstos em ambos os sis-
FIGURA 1 Os sistemas de planeamento territorial e dos recursos hídricos.
temas bem como a sua natureza estratégica,
obrigando apenas as entidades públicas, ou
de natureza regulamentar, obrigando quer as
entidades públicas quer os privados.
A articulação entre os instrumentos de planeamento territorial e os de planeamento de
recursos hídricos está prevista na lei e tem
merecido alguma atenção (ver Saraiva et al,
2008, Fidélis e Roebeling, 2013). Para além dos
conteúdos previstos para os planos, o atual
quadro legislativo estabelece que durante a
preparação, revisão e avaliação dos instrumentos de planeamento, deve ser assegurada a intervenção de vários departamentos
ministeriais que supervisionam as atividades
envolvidas no uso dos recursos hídricos. Determina que o PNPOT e o PNA se devem articular entre si, garantindo um compromisso
recíproco de harmonização das respetivas
opções, e que os planos regionais resultantes
devem ser consistentes com este objetivo.
Determina também que as medidas preconizadas nos instrumentos de gestão territorial, incluindo os planos especiais, os planos
regionais e os planos diretores municipais,
se devem articular com os instrumentos de
planeamento dos recursos hídricos e com as
medidas para a sua proteção. Adicionalmente, os sistemas assumem uma evidente complementaridade através dos planos especiais,
os Planos de Ordenamento de Orla Costeira
(POOC), os Planos de Ordenamento de Estuário (POE) e os Planos de Ordenamento de
Albufeiras de Águas Públicas (POAAP), dedicados a áreas específicas onde a articulação
entre ordenamento do território e dos recursos hídricos é mais premente. Estes planos
são, simultaneamente, parte integrante dos
dois sistemas e assumem uma dupla missão
onde os objetivos e medidas de uso do solo
e dos recursos hídricos têm que ser integrados. Para além destas situações específicas,
e apesar de a articulação estar prevista em
termos gerais, não têm sido evidentes as metodologias ou procedimentos seguidos nem
as perspetivas e oportunidades para a sua
plena efetivação.
Considerando os mais recentes ciclos de planeamento ao nível regional, nomeadamente a
elaboração dos PROT e dos PGBH, vale a pena
centrar a atenção, por exemplo, ao Plano Regional de Ordenamento do Território do Centro
(PROTC), concluído em 2009, e no PGBH dos
Rios Vouga, Mondego e Lis, concluído em 2011.
Uma breve análise ao modelo de desenvolvimento territorial previsto pelo primeiro e ao
programa de medidas previsto pelo segundo
permite antever potenciais conflitos de planeamento associados à sensibilidade ambiental
e aos recursos hídricos. A figura 2 i mostra
esquematicamente o modelo de desenvolvimento territorial proposto pelo PROTC (mapa
A), a programação de implementação das medidas no PGBH-Vouga, Mondego e Lis (mapa
B) e a análise integrada de potenciais conflitos
entre ambos (mapa C). Na figura é possível
ver zonas onde se propõe o reforço do desenvolvimento estrutural urbano, que poderá acarretar agravamento de pressões sobre
i
Elaborada no âmbito de um projeto de investigação em curso,
em colaboração com Peter Roebeling do CESAM, Universidade
de Aveiro.
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
27
DOSSIER ÁGUA E RESÍDUOS
os recursos hídricos, nomeadamente através
do aumento das águas pluviais, da poluição
da água ou impermeabilização do solo, onde
as pressões sobre os recursos hídricos são
já consideradas impeditivas para se atingir o
bom estado das águas.
A gestão integrada dos recursos hídricos e do
território podem beneficiar com a aplicação
de análises territoriais como esta, de modo
a identificar áreas de potenciais conflitos e
equacionar estratégias que facilitem a articulação entre decisões sobre desenvolvimento
territorial e sobre proteção e requalificação
dos recursos hídricos. Esta articulação pode
também potenciar a criação de sinergias que
incentivem a adoção de medidas específicas
destinadas a minimizar os impactos acrescidos sobre os recursos hídricos e reduzam a
necessidade de investimentos acrescidos em
infraestruturação ou recuperação de passivos
ambientais.
ARTICULAÇÃO ENTRE OS SISTEMAS DE
PLANEAMENTO TERRITORIAL E DOS
RECURSOS HÍDRICOS EM PORTUGAL
Nos últimos anos, Portugal assistiu a significativas reformas do quadro institucional e de
governação dos recursos hídricos. A análise
da legislação que determina os sistemas de
planeamento territorial e dos recursos hídricos reflete o reconhecimento institucional
da importância da articulação entre aqueles
sistemas. Na prática, contudo, e apesar dos
progressos alcançados, devem ainda ser explorados esforços para melhor aproveitar os
benefícios que uma articulação mais robusta
entre o planeamento territorial e o planeamento dos recursos hídricos pode oferecer.
Algumas soluções passam por i) criar orientações ao nível governamental sobre melhores
formas de articulação; ii) melhorar as análises
territoriais água-território, nomeadamente
através da melhor representação de vulnerabilidades e de conflitos; iii) incentivar o envolvimento dos stakeholders em ambos os
sistemas; iv) incentivar estratégias de comunicação entre entidades e equipas que elaboram os planos; v) melhorar a partilha de metodologias, dados e indicadores.
A breve análise territorial dos dois planos regionais apresentada permitiu identificar zonas onde a complementaridade pode ser mais
bem equacionada de modo a minimizar pressões e criar sinergias que garantam a proteção dos recursos hídricos. Apesar do detalhe
dos programas de medidas, os planos de recursos hídricos podem ainda evoluir no senti-
28
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
FIGURA 2 Análise territorial do PROTC e do PGBH Vouga, Mondego e Lis.
do de oferecer melhor orientação sobre como
condicionar ou orientar o uso do solo de modo
a minimizar as pressões sobre os recursos
hídricos e que devam ser objeto de especial
atenção em planos a escalas inferiores como,
por exemplo, na área do caso de estudo, os
POE e, sobretudo, os PDM.
Numa altura em que se equaciona a revisão
da Lei de Bases de Ordenamento do Território, valeria a pena desenvolver uma reflexão
atenta sobre a articulação entre estes dois
sistemas e a eventual adoção de metodologias que facilitem a tradução dos desafios
dos programas de medidas dos PGBH sobre
as estratégias e indicadores a adotar pelos
planos de ordenamento do território. Uma
discussão mais aprofundada a nível local, designadamente sobre o papel dos PDM na implementação da DQA, pode também desafiar
as atuais práticas e exigir novas abordagens
metodológicas de planeamento territorial
e dos recursos hídricos. A aproximação da
participação pública e institucional entre os
dois sistemas de planeamento, a atenção
acrescida do contributo da AAE e o inevitável processo de implementação da Diretiva
Inundações, poderão, também, constituir
oportunidades para melhor explorar a criação de sinergias mais fortes entre estes dois
sistemas de planeamento.
REFERÊNCIAS
• Biswas, A.K., 2008. Integrated Water Resources Management: Is it working?, International Journal of Water
Resources Development, 24(1), 5-22.
• EEA 2012. Territorial cohesion and water management
in Europe: the spatial perspective. EEA Technical report
Nº 4/2012, Copenhagen
• EU 2012. A Blueprint to Safeguard Europe’s Water Resources COM (2012) 673 final, Brussels.
• Fidélis T., Roebeling P. 2013. Water Resources and Spatial Planning Systems in Portugal – Using Ria de Aveiro
as a Model to Explore Better Synergies, 8th Conference
of the European Water Resources Association, 26-29
April, Porto, Portugal, p.39.
• Saraiva et al, 2008. Articulação entre a Gestão da Água
e o Ordenamento do Território, Ministério do Ambiente e
do Ordenamento do Território, Lisboa.
REFLEXÃO
© SANJA GJENERO / D.R.
Paulo Praça
Diretor-Geral da Resíduos do Nordeste
RESÍDUOS URBANOS:
UM NOVO PARADIGMA
ENTRE O SETOR PÚBLICO
E O PRIVADO
O setor dos resíduos urbanos (RU) encontrase em profunda mudança, tendo o XIX Governo Constitucional encetado uma vasta reforma legislativa para a definição de um novo
modelo de gestão.
Partindo dessa realidade e quando equacionávamos o tema desta publicação, eis que é
aprovado, em Conselho de Ministros de 30 de
janeiro 2014, o ”…processo de privatização da
Empresa Geral do Fomento, S.A. (EGF, S.A.)”.
É, pois, este o ponto de partida para a nossa
reflexão, conscientes da sofisticação que o
tema encerra.
AS PRIVATIZAÇÕES EM PORTUGAL
Em Portugal, a privatização total das empresas públicas só foi permitida a partir da Revisão Constitucional de 1989 e, concretamente,
através da Lei nº 11/90, de 5 de abril.
Como se conhece, um dos princípios fundamentais da nossa Constituição Económica é o
da coexistência dos setores público, privado e
cooperativo (cf. art.º 80º, al. b), da CRP).
Por outro lado, o debate sobre as privatizações, além das questões técnicas, económicas
e jurídicas, centra-se muitas vezes também
em questões ideológicas.
Importa, pois, estabilizar o que significa privatização. Globalmente, a privatização designa
uma técnica pela qual o Estado reduz ou modifica a sua intervenção na economia em favor
do setor privado 1.
As formas de alcançar o objetivo de “privatização” variam em função das políticas públicas
económicas, sendo conveniente esclarecer,
desde logo, que “juridicamente não existe …
um único sentido do termo privatizar”2 .
Em sentido restrito, entende-se por privatização a transmissão da titularidade de um bem/
empresa pública para o setor privado dos
meios de produção. A natureza pública desse bem ou empresa tanto pode ser originária
como resultar de nacionalizações anteriores.
Fala-se, neste caso, de reprivatização (situação da EGF).
Assim, em termos microeconómicos, a política de privatizações visa melhorar o funcionamento das empresas e, numa perspetiva
macroeconómica, restaurar os mecanismos
de mercado em determinados setores e reduzir o peso do Estado na economia. Em síntese,
razões de índole diversa justificam as privatizações.
Atrevemo-nos a avançar que, no caso da reprivatização da EGF, não serão questões microeconómicas, pois, como é do conhecimento
geral, a empresa evidenciou importantes capacidades de organização, execução e gestão,
bem como adequados meios técnicos e recursos humanos de excelência. Não se ignora que
além do encaixe financeiro que a privatização
pode aportar, também se mitiga a responsabilidade do Estado para fazer face a investimentos públicos que, necessariamente, os
sistemas estão obrigados a implementar no
âmbito do PERSU 2020.
1
MARQUES, Maria Manuela Leitão / SANTOS, António Carlos
dos / GONÇALVES, Maria Eduarda - Direito Económico, Almedina, Coimbra, 1991, pág. 166ss.
2
Paulo Otero, “Coordenadas Jurídicas da Privatização da Admi-
nistração Pública, in Os Caminhos da Privatização da Administração Pública, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade
de Coimbra, Coimbra editora, 2001, pág.36.
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
29
REFLEXÃO
Com o PERSU 2020 pretende-se garantir
a necessária compatibilização das ações a
preconizar com o próximo período de financiamento comunitário 2014-2020, bem como
garantir a sustentabilidade dos sistemas de
gestão de RU, maximizando a sua eficiência.
O ACESSO DA INICIATIVA ECONÓMICA
PRIVADA AO SETOR DOS RESÍDUOS URBANOS
A Lei n.º 88-A/97, de 25 de julho, vedava a empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza, salvo quando concessionadas, a
atividade de gestão da água e dos RU.
Esse regime jurídico era limitativo no acesso da iniciativa privada à gestão de sistemas
multimunicipais de águas e de RU, uma vez
que apenas admitia a participação de privados em posição obrigatoriamente minoritária
no capital das entidades gestoras concessionárias, limitação igualmente aplicável à subconcessão dos referidos sistemas.
Face a essa restrição, o Governo encarou
como prioritária a definição e a implementação da estratégia de reorganização do setor
das águas e RU.
Assim, o Programa do Governo estabeleceu
diversos objetivos na área do ambiente, cuja
consecução exige uma reestruturação do setor dos RU. Inclui, ainda, como uma das medidas para a área do ambiente: «autonomizar o
subsetor dos resíduos no seio do Grupo Águas
de Portugal e implementar as medidas necessárias à sua abertura ao setor privado».
O próprio PERSU II já previa «a abertura ao
mercado da gestão de infraestruturas de tratamento de resíduos».
Embora o setor das águas e dos RU se debata
globalmente com a necessidade de realização
de investimentos significativos para cumprimento das metas nacionais, a natureza distinta quanto ao valor social, económico e jurídico dos bens em presença, por um lado, e a
necessidade de reestruturar o setor das águas
e saneamento de águas residuais por outro
lado, justificam a diferenciação de estratégias
consagradas no Programa do Governo, tendo
sido delineadas soluções distintas para cada
um dos subsetores das águas e dos resíduos.
No que respeita às atividades de captação,
tratamento, distribuição e abastecimento
de águas e saneamento de águas residuais,
prevê-se a reorganização, sem alteração da
natureza das entidades gestoras, que permanece maioritariamente pública.
Relativamente aos RU, é criada a oportunidade de privatização, abrindo-se a possibilidade
de as concessões virem a ser geridas por en-
30
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
“
É necessário uma
estratégia nacional para
o setor, inserida numa
estratégia mais geral
para o Ambiente que
tenha naturalmente em
conta o atual contexto
europeu e os princípios
constitucionais.
tidades privadas. Tal estratégia implica a entrada maioritária de entidades privadas nas
atividades de gestão de resíduos, através da
alienação das participações sociais do Estado
nas concessionárias dos sistemas multimunicipais.
Em suma, a Lei n.º 35/2013, de 11 de junho,
veio viabilizar a concessão de sistemas multimunicipais3 de RU a entidades de capitais
maioritária ou totalmente privados, e a subconcessão de sistemas multimunicipais de
águas e de saneamento de águas residuais
a entidades de natureza também privada, de
forma a permitir a implementação da estratégia definida pelo Governo.
A PRIVATIZAÇÃO DA EMPRESA GERAL
DO FOMENTO
O Governo tem vindo a implementar as medidas necessárias à abertura ao setor privado, sendo a iniciativa legislativa aprovada em
Conselho de Ministros um momento eloquente do processo. Aliás, na Lei n.º 83-B/2013, de
31 de dezembro (GOP 2014) o Governo já havia
reafirmado que pretende “Promover a alienação da totalidade do capital social da EGF”.
Também a Lei nº 35/2013, veio regular o acesso da iniciativa económica privada a determinadas atividades económicas, passando a
prever que, no caso de sistemas multimunicipais , a gestão de RU possa ser atribuída a
empresas cujo capital social seja maioritária
ou integralmente subscrito por empresas do
setor privado.
Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 92/2013, de
11 de julho, introduziu as modificações necessárias para a viabilização da operação de alienação de participações sociais a privados no
setor dos resíduos, desaparecendo a regra da
maioria pública nas entidades gestoras.
Este compromisso do Governo de privatizar
a EGF, não pode ser dissociado do Programa de Assistência Económica e Financeira,
no quadro das medidas a adotar com vista à
promoção do ajustamento macroeconómico
nacional.
Afigura-se-nos, também, pertinente, recordar
que a EGF foi objeto de nacionalização no passado, pelo que o processo de reprivatização
se rege pela Lei nº 11/90, de 5 de abril, sendo
concretizado através de “um concurso público,
transparente, competitivo e previamente publicitado, em linha com as exigências do direito
nacional e da União Europeia”4 .
A EGF é atualmente uma sociedade de “capitais exclusivamente públicos”, que desenvolve
a sua atividade através de “11 empresas concessionárias onde detém a maioria do capital
social, as quais, em 2012, geriram e processaram 3.2 milhões de toneladas de resíduos (65%
da produção nacional) e serviram 6,4 milhões
de habitantes (60% da população), numa área
correspondente a 174 dos 278 municípios de
Portugal continental. Em 2012, a EGF registou
um volume de negócios aproximado de 150
milhões de euros”5.
Face ao exposto, o processo de privatização da
EGF vai, de futuro, indubitavelmente, alterar
as condições de funcionamento do mercado
de RU em Portugal.
A DELIMITAÇÃO DE COMPETÊNCIAS ENTRE O
ESTADO E AS AUTARQUIAS LOCAIS
Como se sabe, nem sempre é muito clara a delimitação de competências entre o Estado e as
Autarquias Locais.
Contudo, para a temática em apreço, a Lei n.º
75/2013, de 12 de setembro, preceitua no artigo 23º nº 2 al. k.) que os municípios dispõem
de atribuições no domínio do «ambiente e saneamento básico»6.
É, pois, claro que o setor dos RU é tradicionalmente da competência dos municípios. Aliás,
3
«São sistemas multimunicipais os que sirvam pelo menos dois
municípios e exijam a intervenção do Estado em função de razões de interesse nacional,…» cf. artigo 1º nº 2 do Decreto-Lei
n.º 92/2013, de 11 de julho.
4
Anúncio informal e preliminar de privatização publicado pela
Parpública, SGPS, S.A. sociedade gestora de participações sociais detida integralmente pelo Estado Português.
5
Idem.
6
Idêntica disposição estava consagrada na alínea l) do artigo 13º
Lei nº 159/99, de 14 de setembro.
PUB.
o abastecimento público e a salubridade
pública são, desde o primeiro quartel do
século XX, atribuições autárquicas.
Até ao Decreto-Lei nº 379/93, de 5 de
novembro, apenas existiam serviços de
águas (abastecimento e saneamento)
e resíduos de titularidade municipal7,
tendo este diploma vindo a estabelecer
a distinção entre sistemas multimunicipais (titularidade estatal) e sistemas
municipais (titularidade municipal).
Este modelo tinha como objetivo primordial alcançar economias de escala, tanto
dos investimentos como da sua exploração, garantindo, assim, sustentabilidade
económico-financeira.
Pela sua parte, os sistemas municipais
têm vocação natural e histórica para se
concentrarem sobre o serviço direto aos
munícipes, isto porque, essencialmente
por falta de meios, os municípios não
têm capacidade para assumir avultados
investimentos, em particular nas regiões
de baixa densidade económica, dada a
complexidade técnica das soluções ambientais a implementar.
Do ponto de vista constitucional, questionou-se se caberia nas atribuições do
Estado a criação de sistemas multimunicipais, em face dos princípios da autonomia das autarquias locais (artigo 235º, nº
2, da CRP) 8 , da descentralização (artigo
237º da CRP) e da subsidiariedade (artigo
2º, nº 6, da CRP) e tendo em consideração
as atribuições típicas dos municípios.
Hodiernamente, os serviços de gestão de resíduos são prestados por um
vasto universo de entidades gestoras,
podendo ser de titularidade estatal ou
municipal.
Nos casos de titularidade estatal, os modelos de gestão legalmente admissíveis
são: gestão direta pelo Estado; delegação pelo Estado em terceira entidade; e
concessão pelo Estado em terceira entidade, como sucede com os sistemas
multimunicipais concessionados. E, nos
casos de titularidade municipal: gestão
direta do serviço pelo município, como é
o caso dos serviços municipais e dos serviços municipalizados; delegação do serviço em empresa constituída em parceria
com o Estado; delegação do serviço pelo
município em entidade integrada no respetivo setor empresarial local ou em freguesias ou associações de utilizadores; e
concessão do serviço pelo município em
empresa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entendemos, pois, que é necessário uma
estratégia nacional para o setor, inserida
numa estratégia mais geral para o Ambiente que tenha naturalmente em conta
o atual contexto europeu e os princípios
constitucionais.
Aliás, como refere Jaime Melo Baptista,
este setor tem “condições para, a par
da resolução dos problemas básicos da
população, ser uma das apostas estratégicas a adotar em Portugal, constituindo
uma área de desenvolvimento do saber
nacional e, consequentemente, do desenvolvimento da consolidação e mesmo
da internacionalização das empresas
portuguesas”9.
Face aos modelos explanados, entendemos essencial para essa estratégia,
entre outras matérias, a estabilidade
dos modelos técnicos e financeiros dos
sistemas; a reorganização espacial dos
sistemas; a “harmonização” tarifária e
regras claras de cobrança.
Por outro lado, em tese, todos os modelos de gestão legalmente admissíveis
são adequados para os serviços de gestão dos RU, dependendo a sua escolha do
caso concreto.
Fazendo nossas as palavras do Conselho Diretivo da ERSAR, diríamos: “É do
interesse nacional que o País continue
a fazer uma clara aposta estratégica no
setor,…” pois apesar de um balanço globalmente positivo “…subsistem alguns
problemas, nomeadamente a nível da
sustentabilidade económica e financeira
nas entidades gestoras estatais e municipais”10.
Esperamos, pois, que em Portugal os
responsáveis políticos sejam sensíveis
a este desígnio, quer a opção reverta a
favor da gestão privada ou da gestão pública.
7
No Município de Lisboa a EPAL constituí uma exceção
ao regime de titularidade municipal do serviço de distribuição domiciliária de água.
8
Também consagrado na Carta Europeia de Autonomia
Local.
9
Cfr. Reformar Portugal – 17 Estratégias de Mudança,
5ª edição, 2003.
10
ERSAR: “Contribuições para a Reorganização dos
Serviços de Abastecimento Público de Água, de Saneamento e de Gestão de Resíduos Urbanos em Portugal”,
Lisboa., outubro de 2011.
TECNOLOGIA
InfraSIG 360º – Otimiza a eficiência
das infraestruturas de água e saneamento
O InfraSIG 360º é uma solução Esri Portugal, direcionada
ao setor das infraestruturas de água e saneamento, que
responde a um conjunto de funções inerentes às áreas do
planeamento, projeto e construção das infraestruturas, bem
como de operação e manutenção dos sistemas.
O InfraSIG assenta sobre um modelo de dados completo e
abrangente, de acordo com a Esri, e consolidado ao longo de
vários anos de acompanhamento permanente da realidade
quotidiana dos clientes do setor, que inclui temas como
Distribuição de Águas, Drenagem de Águas Residuais
Domésticas e Pluviais, Ordenamento do Território e Gestão
Operacional.
SISTEMA ABERTO E INTEROPERÁVEL
A aplicação InfraSIG 360º permite um sistema aberto e interoperável
que estende uma aplicação de cadastro de ativos de infraestruturas
para uma solução que permite responder à regulação, gerir equipas, suportar indicadores comerciais e operacionais, definir circuitos de leituras, entre outras componentes que utilizam todas as potencialidades
de um sistema de informação geográfica (SIG). Os componentes da solução abrangem áreas como a exploração e monitorização de estados
dinâmicos de operação da infraestrutura (SCADA/Telemetria) e estão
direcionados a diferentes perfis de utilização, desde o técnico de cadastro às equipas móveis operacionais, responsáveis de planeamento,
decisores técnicos e alta-gestão.
Com o InfraSIG 360º, todos os processos de negócio da entidade suportados sobre os SIG podem ser colmatados com base nas diferentes
realidades de um departamento: o projeto e investimentos de capital, a
gestão patrimonial dos ativos, a análise comercial, a exploração, os planos estratégicos, produção de indicadores internos e para o regulador,
equipas de despacho e manutenção, entre outros processos/departamentos suportados pela solução.
PLANEAR INVESTIMENTOS
A abertura da plataforma ArcGIS permite também a fácil integração da
solução InfraSIG com outros sistemas, nomeadamente de telegestão,
gestão e faturação de clientes e manutenção. Assim, a construção do
APLICAÇÃO INFRASIG 360º.
32
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
cadastro com o InfraSIG permite a produção de indicadores ERSAR baseados no cadastro, tendo em atenção o cálculo e apresentação desses indicadores, de acordo com o regulador. A informação obtida poderá ainda ser utilizada para efetuar um planeamento de investimentos
mais rentável e eficaz, pois permite fazer o planeamento operacional
dos projetos de reabilitação e expansão das infraestruturas através de
ferramentas de estimativa de custos dos investimentos baseadas em
catálogos de materiais associados à infraestrutura.
CENTRO DE OPERAÇÕES
Essa mesma informação, associada à tecnologia Geo Event Processor e
InfraSIG Dashboard, disponibiliza aos departamentos de exploração um
autêntico centro de operações com recolha de informação contínua e
em tempo real sobre a infraestrutura e a atualização de indicadores de
operação com alertas, alimentado por informação fornecida em tempo
real pelas equipas no terreno através de dispositivos móveis. Ambas as
tecnologias possuem interfaces gráficos que permitem ser configurados
pelos utilizadores, seja na conectividade aos sistemas de supervisão (o
Geo Event Processor permite desenhar os procedimentos de análise e
algoritmos), seja no centro de operações (o InfraSIG Dashboard possui
widgets gráficos que apresentam a informação de uma forma visual e
intuitiva, suportando multi-monitores). Os operadores podem conjugar
ambas as tecnologias para identificar áreas de operação, monitorizar o
cumprimento dos circuitos definidos, obtendo alertas sobre desvios no
circuito ou saídas da área de operação definida. Este conceito é replicado
para todas as aplicações e componentes da solução InfraSIG.
EVOLUÇÃO FUNCIONAL
Por fim, a autonomia da solução InfraSIG permite às entidades fazer
evoluir funcionalmente a solução, acrescentar novos componentes de
informação, modelos de análise, suportar departamentos com necessidades distintas, sem necessitarem de intervenção técnica da Esri.
Assim, o investimento poderá ser recuperado de forma mais rápida e
eficiente, assegura a Esri.
PRODUTOS E TECNOLOGIAS
Arrancador suave de média tensão MVX
da Aucom
Motores SuPremE da KSB
– maior eficiência a preço standard
O MVX é um arrancador suave de média tensão
da Aucom, marca representada pela Zeben. O
produto apresenta, de acordo com a Zeben, um
painel mais pequeno do que qualquer outro arrancador suave de média tensão do mercado.
As reduzidas dimensões contemplam vantagens no que toca à redução de custos, oferecendo mais flexibilidade em aplicações onde o
espaço seja essencial, como por exemplo a indústria marítima.
Ainda de acordo com a Zeben, o MVX garante a
segurança do pessoal e das instalações relativamente à falha de arco e cumpre e excede todas as normas IEC relevantes para a resistência de falha de arco interno.
O arrancador suave MVX com painéis da série L pode, garante a Zeben,
resistir a um evento de arco num compartimento sem que haja qualquer
dano nos outros compartimentos. Para a otimização de todos os processos e serviços, os arrancadores suaves Aucom são extremamente fáceis
de montar, substituir ou reparar todos os seus constituintes. O arrancador
suave MVX foi especialmente projetado para uma facilidade nas operações de retirar e voltar a colocar os racks. Todos os componentes podem
ser inspecionados ou controlados através de janelas de visualização e estão acessíveis através de portas giratórias ou painéis removíveis, mantendo ao mesmo tempo afastado pessoal não autorizado.
O arrancador suave de média tensão MVX está disponível para tensões
até 15kVA em qualquer potencia até 800A, com revestimento isolante
(standard), conexão do motor em linha, eletrónica envernizada, entre outras características.
Desde outubro de 2013 que o Grupo KSB
está a fazer uma promoção que se traduz na venda dos seus motores de alta
eficiência (IE4) ao preço dos motores de
eficiência standard (IE2), para as suas
bombas inline (modelo Etaline), com potências de 0,55 kW até 18,5 kW, e com
variação de velocidade.
Os motores de elevada eficiência, modelo SuPremE, são fabricados pela KSB
com recurso a uma tecnologia chamada
de “síncronos de relutância livre de ímanes permanentes”, que permite
ganhos de energia de até 50%, quando comparada com a habitual tecnologia dos motores assíncronos com ímanes permanentes.
De acordo com a KSB, os motores SuPremE ultrapassam já hoje a classe
de eficiência legalmente exigida para 2017 (IE3), são especialmente eficientes no funcionamento a carga parcial (que está provado ser em média a maior parte do tempo de funcionamento), e não exigem a utilização
dos metais raros necessários aos motores standard, os quais provocam
graves danos no planeta, através das minas a céu aberto, da elevada poluição do processo de purificação e da inexistência de canais de recolha
para reciclagem. Por estas razões, os motores SuPremE são, segundo a
empresa, considerados os mais eficientes e ecológicos do mundo.
As principais razões desta promoção – temporária – são a vontade da
KSB em ajudar a melhorar o Ambiente do planeta e o desejo de permitir
aos seus clientes melhorar a eficiência e custos energéticos das suas
instalações.
www.zeben.pt
www.ksb.pt
Formação certificada SEW-EURODRIVE Portugal
A SEW-EURODRIVE PORTUGAL, empresa formadora certificada pela
DGERT (Direção-Geral de Empresas e das Relações de Trabalho) disponibiliza uma gama de formação técnica certificada. As sessões compreendem formação em:
– MOVITRAC® 07B (Refª MC_B)
– MOVITRAC® LT (Refª MC_LT)
– SISTEMAS DESCENTRALIZADOS®
(Ref.ª SD)
– Controladores vetoriais MOVIDRIVE®B
(Refª MDX_B)
– Motion Controller MOVI-PLC
(Ref.ª MOVI_PLC);
– Programação em IPOS (IPOS Assembler:
Refª IPOSPlus / C-Compiler: Refª IPOSPlus C)
– Acionamentos Eletro-Mecânicos
(Ref.ª EME)
A pré-inscrição de participantes deverá ser enviada até 10 dias antes
da data da formação, carecendo a mesma de aprovação, a qual ocorrerá
no limite até 5 dias antes da data da sessão. O número de participantes por sessão está limitado a 12 (exceto MOVI-PLC, com máximo de 8
participantes).
SEW-EURODRIVE: UMA DAS MELHORES EMPRESAS PARA TRABALHAR
A SEW-EURODRIVE foi eleita uma das 100 melhores empresas para
trabalhar, no âmbito de uma iniciativa anual da revista Exame desenvolvida em parceria com a consultora Accenture, para todas as empresas com 10 ou mais colaboradores a operarem território nacional,
públicas ou privadas. Este estudo está dirigido para as empresas que
queiram fazer uma avaliação do contexto em que os seus colaboradores trabalham, assente nas Práticas de Gestão de Capital Humano vigentes na empresa e no respetivo impacto que estas têm na satisfação
dos seus colaboradores.
www.sew-eurodrive.pt
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
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PRODUTOS E TECNOLOGIAS
Processo eletroquímico de oxidação avançada
da Luságua
Medidor da Hanna Instruments
O PEOA é uma tecnologia para aplicar
a efluentes carregados com matérias
orgânicas de difícil biodegradação,
como os provenientes de destilarias
e óleos, da produção de azeite e vinho,
pasta e papel, cortiça e têxteis, pesticidas e hisdrocarbonetos aromáticos
policíclicos, compostos farmacêuticos,
drogas, hormonas e agentes patogénicos e aterros sanitários.
Trata-se de uma tecnologia capaz de gerar um oxidante forte através
da eletrólise de uma solução com cloreto de sódio, utilizando, de acordo
com a empresa, um elétrodo de construção inovadora, mais resistente
à incrustação e à corrosão.
Como resultado, obtém-se uma solução oxidante forte, incluindo cloro,
dióxido de cloro, ozono, oxigénio atómico, peróxido de oxigénio, radical
hidroxilo, hidrogénio atómico e radical cloro.
O PEOA pode ser usado como pré-tratamento para aumentar o rácio
CBO/CQO, para o tratamento de afinação (remoção de micro poluentes
remanescentes), para o tratamento de desinfeção, descontaminação
de solos e tratamento integral de efluentes industriais, entre outras
aplicações.
A Hanna Instruments lançou, no final
de 2013, um medidor de pH, Condutividade e Oxigénio Dissolvido – o edge®.
Trata-se de um medidor multi-parâmetros com um desenho compacto,
com uma espessura de 1,27 cm e um
peso inferior a 260 gramas, que conjuga elementos de medidores portáteis e de bancada. O desenho versátil
permite, de acordo com a Hanna Instruments, a sua utilização como um
medidor de bancada, como um medidor portátil e até mesmo instalado
numa parede, libertando o espaço de bancada num laboratório.
O edge® possui um mostrador LCD de 5.5”, com um amplo ângulo de visão, um teclado de toque capacitivo e duas portas USB. É fornecido com
suporte para bancada, que integra um suporte de elétrodo giratório, e
suporte para montagem em parede.
O edge® mede pH, Condutividade e Oxigénio Dissolvido através dos seus
elétrodos digitais, que armazenam internamente informação sobre o
tipo de sensor, calibração e número de série. Estes elétrodos digitais
possuem um conector de 3.5 mm e são automaticamente reconhecidos
pelo edge®, libertando o utilizador da preocupação com o alinhamento e
quebra de pinos dos conectores tradicionais.
www.aquaporservicos.pt
www.hannacom.pt
Plataforma para gestão de resíduos da Sinfic
A Solução DECISOR é uma plataforma integrada de diversos módulos que permite uma Gestão 360º das organizações. A
plataforma permite controlar cada uma
das atividades de uma empresa, geri-la
individualmente, medi-la individualmente
e planeá-la individualmente de acordo com a Estratégia Corporate.
Como aplicação modular integrada, nas suas várias vertentes, o ERP
(Enterprise Resource Planning) DECISOR possui um vertical de Gestão
de Resíduos que responde às necessidades do setor dos Resíduos. Isto
deriva, de acordo com a Sinfic, da necessidade de evolução contínua originada pelo crescimento qualitativo das necessidades dos Operadores
de Resíduos, a atenção especial às constantes alterações legislativas
do setor e a vontade de satisfazer as necessidades prementes de aliviar
os utilizadores de processos burocráticos e manuais.
Na construção da solução DECISOR houve, e continua a existir, segundo
a empresa, uma preocupação em refletir o Modelo de Negócio dos Operadores de Resíduos na arquitetura da solução. Deste modo, o ciclo de
vida do resíduo é perfeitamente identificável e gerido através de três
processos que operam na solução, nomeadamente o processo de aceitação/receção do resíduo, o processo de transformação/separação/
valorização do resíduo e o processo de encaminhamento/eliminação do
resíduo ou da matéria-prima.
O processo de aceitação/receção do resíduo é iniciado aquando da en-
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INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
trada do resíduo nas instalações do Operador de Gestão de Resíduos.
A solução permite que o processo de receção dos resíduos seja alimentado pelo CRM DECISOR com os dados relativos ao Cliente, Produtor,
LER, entre outros, facilitando e agilizando todo o processo de receção e
validação de entradas de resíduos. Numa primeira fase, o resíduo será
armazenado e custeado ao preço de compra ou de valorização, e será
acondicionado por diferentes armazéns e secções, parametrizados
conforme as necessidades do utilizador.
O processo de transformação/separação/valorização dos resíduos
relaciona-se com as operações internas a efetuar com o resíduo, com
a devida imputação de custos de separação, trituração, moagem, mãode-obra, entre outros. A valorização dos resíduos em parque poderá,
caso se deseje, ser separada dos resíduos que se encontram a aguardar processamento em parque. Por último, o processo de encaminhamento/eliminação dos resíduos permite gerir o encaminhamento para
destino final (nacional ou transfronteiriços) ou a eliminação do resíduo.
Em todos os processos referidos, a Solução DECISOR proporciona ferramentas de reporte e informação estatística de suporte à gestão, eliminando, de acordo com a Sinfic, as principais lacunas dos Sistemas de
Informação na Gestão de Resíduos, nomeadamente incoerência e perda
de informação, dificuldade em consolidar dados para reporte legal e elevado peso dos processos burocráticos e manuais.
www.sinfic.pt
PRODUTOS E TECNOLOGIAS
Nova gama de bombas normalizadas da Efaflu
Série Q da HUBER SE
A EFAFLU desenvolveu uma nova
gama de bombas normalizadas
para responder à solicitação do
mercado de equipamentos de
bombagem de óleo térmico (termofluído) e água quente. Estas
bombas são aplicadas em sistemas de aquecimento urbano e industrial
e na circulação forçada de caldeiras, bem como em outros processos
industriais.
As temperaturas máximas de operação destas bombas são de 400°C
para óleo térmico e 250°C para água quente. As gamas CJG-HT e NNJHT variam apenas na norma de construção, as CJG-HT são normalizadas
segundo a ISO 2858 e ISO 5199 e as NNJ-HT segundo a norma EN 733.
A EFAFLU desenvolveu para esta gama uma só peça para o conjunto
chumaceira/adaptador). Com esta execução foi projetado um rolamento especial em material duro do lado da ponta de veio da bomba, tendo,
desta forma, aumentado significativamente a sua fiabilidade/durabilidade, assegura a Efaflu.
Do lado do motor e beneficiando do tubo da chumaceira, tanto o empanque mecânico como o rolamento de esferas de contacto angular são
normalizados, não necessitando de ser dimensionados para temperaturas elevadas, considerando o gradiente de temperatura do projeto.
Os empanques mecânicos são normalizados segundo a DIN EN 12756,
sendo que as faces de vedação são em Carboneto de Silício/Carboneto
de Silício e os elastómeros em Viton.
A chumaceira-adaptador na zona da câmara de empanque é constituída em termos de construção de alhetas para dissipação do calor. No
lado do motor, pode ser também aplicado um ventilador de impulso, independente do motor, para assegurar o fluxo contínuo de ar de forma a
dissipar o calor com maior eficiência.
As lamas, quando bem desidratadas, têm menos volume, o que reduz
os custos de transporte e deposição. Os tratamentos posteriores, como
por exemplo a secagem ou a incineração, exigem uma desidratação prévia de boa qualidade, para que a evaporação de água se processe a custos energéticos reduzidos.
De acordo com a Amprotec, distribuidora da marca, uma desidratação
de lamas de última tecnologia deve preencher os seguintes requisitos:
– Ser eficaz para minimizar o volume de lamas e o seu teor de humidade
– Ser fiável e automatizada, para minimizar os tempos de paragem e
maximizar os tempos de função
– Adaptar-se a lamas com as mais diferentes composições
– Ser económica no que respeita aos custos de investimento e operação
www.efaflu.pt
www.huber.de
Com a série Q, as lamas floculadas são bombeadas diretamente para
um tambor filtrante diagonal e cilíndrico, no qual se encontra um
sem-fim de baixa rotação. O paço sem-fim reduz em direção à zona
de descarga. Desta forma, o volume entre o tambor filtrante, o veio, e
as hélices, reduz continuamente, de modo que a pressão sobre a lama
aumente, pressão esta que retira a humidade do interior da câmara de
prensagem através do crivo.
Na descarga, o sem-fim pressiona as lamas desidratadas contra um
cone de controlo pneumático, cuja pressão é controlada manual ou
automaticamente. A pressão gerada pelo cone pneumático fornece
um poder de desidratação acrescentado a este sistema de baixa rotação.
Elementos de limpeza colocados sobre a hélice do sem-fim limpam o interior do tambor filtrante. O exterior do tambor é limpo periodicamente
através de uma barra aspersora fixa sobre o tambor rotativo.
Renascimento com Novas Soluções de Gestão Integrada de Resíduos
A Renascimento efetuou, em
2012 e 2013, investimentos no
melhoramento
tecnológico das
suas unidades
de tratamento e reciclagem de resíduos elétricos e eletrónicos e da sua
linha de produção de combustível derivado de resíduo (CDR).
De acordo com a Renascimento, trata-se de uma tecnologia pioneira
na Europa — combi¬nando procedimentos automáticos e manuais no
tratamento e reciclagem dos REEE e na produção de combustível derivado de resíduos. Isto permite, segundo a empresa, obter metas de
reciclagem globais acima da média quando comparadas com as metas
definidas pela comunidade europeia.
Todo o serviço é suportado por três unidades, distribuídas a sul, no cen-
tro e a norte de Portugal, que permitem a gestão integrada e operação
de todos os fluxos de resíduos a nível nacional.
Garantindo de forma eficiente o correto processamento de todos os fluxos de resíduos, as unidades de receção e operação de resíduos encontram-se munidas de tecnologia semiautomática, que possibilita uma
triagem e processamento eficaz dos resíduos, obtendo elevadas taxas
de reciclagem e valorização de resíduos em termos globais.
Os resíduos não passíveis de reciclagem, sobretudo provenientes de
materiais de natureza orgânica (têxteis, papel, cartão, plásticos, madeira, borracha), representam um precioso recurso dada a sua natureza
combustível e, regra geral, apresentam um elevado poder calorífico. Por
este motivo serão processados na nossa unidade de produção de combustível derivado de resíduos (CDR) e, posteriormente enviados para
valorização energética.
www.renascimento.pt
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
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PRODUTOS E TECNOLOGIAS
Unidade de Tratamento EVAPOTECNIC® da Carmona
A Unidade de Tratamento
EVAPOTECNIC®, desenvolvida
pela Carmona SLTC, para o tratamento de lixiviados, baseiase numa simbiose entre os
processos de evaporação por
vácuo e de evaporação forçada. Apesar de existirem no
mercado diversas tecnologias
destinadas ao tratamento de
águas lixiviantes, na maior parte dos casos, os custos do tratamento, associados aos custos das instalações e à qualidade do tratamento,
deixam lacunas difíceis de ultrapassar, de acordo com a Carmona. Os
tratamentos biológicos, habitualmente, não funcionam, uma vez que os
lixiviados contêm contaminantes recalcitrantes relativamente à ação
das bactérias.
É neste contexto que a Carmona SLTC desenvolve a tecnologia EVAPOTECNIC®. Esta aceita efluentes de naturezas e composições muito
variadas, adequando, caso a caso, a arquitetura funcional da instalação, obtendo-se assim uma eficiência energética que, de acordo com
a Carmona, não é habitual em processos industriais dependentes de
ciclos térmicos. O Processo EVAPOTECNIC® ocupa-se das três frações
(gasosa, líquida e sólida) presentes ao longo do processo de tratamento
do lixiviado e assenta em 3 eixos funcionais:
1) O sistema de condensação prévia de voláteis por crionização permite a associação à evaporação forçada e por vácuo, sem o prejuízo
da libertação de voláteis para a atmosfera, rentabilizando estes dois
processos na obtenção de um efluente condensado liberto de contaminantes;
2) O sistema combinado de evaporação - forçada + vácuo - para o qual
contribui a torre de evaporação forçada, cuja performance depende
do estado de saturação do ar ambiente e pode ser determinante para
a economia do processo, evitando o consumo de energia térmica aplicada ao processo de evaporação nos evaporadores de vácuo. Este
último garante que o ciclo de tratamento se completa do ponto de
vista energético, independentemente das condições atmosféricas;
3) O sistema de separação sólido-líquido, cujo contributo é dado por
uma centrifugadora, resume-se à capacidade de retirar sólidos em
suspensão no efluente em regime contínuo e no momento mais
adequado, do ponto de vista da sua concentração, evitando ou minorando fenómenos de incrustação.
A tecnologia EVAPOTECNIC® surge como uma solução para o tratamento dos lixiviados, sendo a conjugação dos processos de evaporação por
vácuo e evaporação forçada uma clara mais-valia do ponto de vista de
custos de processos, de acordo com a Carmona.
www.carmona.pt
ETAR da BLUEMATER
A BLUEMATER desenvolveu
uma nova Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) para tratamento
de águas residuais de todos
os tipos, desde lixiviados de
aterros sanitários e efluentes
industriais a águas residuais
urbanas, de hospitais e de laboratórios farmacêuticos.
Esta solução foi desenvolvida
em colaboração com a LIPOR,
PARESIDEL e VALORMED e tem como base o tratamento biológico patenteado Natantia®, podendo ser complementado por um tratamento
terciário à base de microalgas, que está a ser submetido a patenteação.
O sistema apresenta, de acordo com a empresa, baixos custos de operação, baseando-se em métodos de tratamento sustentáveis e permitindo obter um efluente com qualidade de descarga em meio hídrico,
cumprindo os Valores Limite de Emissão (VLE).
A nova ETAR é constituída por vários órgãos, sendo totalmente automática. O coração do sistema é o leito percolador patenteado Natantia®, que enche a torre biológica Sycon, exclusiva da BLUEMATER.
Este filtro biológico permite efetuar de forma eficaz a nitrificação da
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INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
amónia, com baixo esforço energético e sem a adição de químicos.
Pode ser escalada para qualquer dimensão, afirma a empresa, e para
todo o tipo de lixiviados. Permite também fazer o upgrade de ETAR
existentes, de modo a atingir os VLE, aproveitando, sempre que possível, os equipamentos existentes, de modo a baixar os custos de instalação.
Os objetivos de tratamento a atingir dependem do local de descarga
e das normas locais. No caso de massas de água recetoras genéricas,
os VLE mais importantes referem-se aos parâmetros principais CBO5,
CQO e SST, Azoto Total e Amoniacal, e fósforo, que devem estar de acordo com os valores do Anexo XVIII do Decreto-Lei n.º 236/98, de 1 de
agosto. Quando a descarga é efetuada em zonas sensíveis, poderão ser
restringidos os VLE para alguns deles, como a amónia ou o fósforo total. A ETAR BLUEMATER está preparada para todas essas situações,
podendo ser dimensionada e configurada para os objetivos a atingir,
incorporando sistemas como os MBR, osmose inversa ou um tratamento terciário à base de microalgas desenvolvido exclusivamente pela
BLUEMATER, caso as normas de descarga do local assim o exijam ou
se queira reaproveitar o efluente tratado para usos gerais, lavagens ou
rega. Com o tratamento adequado, a água poderá ainda ser usada para
consumo humano.
www.bluemater.com
ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS E CONSERVAÇÃO DA NATUREZA
Efeitos do Relatório Climático do IPCC:
preocupação ou caminhos de saída?
João Quintela Cavaleiro
Advogado da LEGAL LINK | CAVALEIRO & ASSOCIADOS
[email protected]
Em setembro passado, o Painel
Intergovernamental para as
Alterações Climáticas (IPCC)
publicou o seu 5.º Relatório,
que acabará por ser lançado
em quatro partes. O 1.º Grupo
de Trabalho versou sobre
os aspetos científicos das
mudanças climáticas. Em
março de 2014, será a vez do 2.º
Grupo de Trabalho publicar em
Yokohama sobre os impactos,
adaptação e vulnerabilidade. O
3.º Grupo de Trabalho versará
sobre a mitigação dos impactos
das mudanças climáticas, em
abril, e, por fim, um relatório
síntese, em outubro de 2014,
em Copenhaga.
Os Relatórios têm sido motivo de críticas por
parte dos céticos, com acusações de alegadas
manipulações de dados e de previsões erradas de degelo dos glaciares. Em resposta, o
IPCC publicou o mais completo documento
de sempre. Cada afirmação tem de corresponder a uma fonte científica credível e só
foram levados em conta modelos baseados
em leis físicas, em detrimento de outros semi-empíricos. Contou com o trabalho de 259
cientistas e representantes dos governos de
195 países. O papel do IPCC não está só no
campo científico, mas estende-se ao político.
Os 4 relatórios anteriores (91, 95, 2001 e 2007)
serviram de base à diplomacia ambiental em
momentos-chave: elaboração da Convenção
Quadro da ONU para as Alterações Climáticas
(92), Protocolo de Quioto (97) Conferências de
Bali (2007) e Copenhaga (2009). Criado em
1988, atingiu o auge em 2007, com atribuição
do Nobel da Paz.
Deste último Relatório resultou que o aquecimento global é maioritariamente causado
pela atividade humana. Utiliza mais de 30
modelos diferentes de simulação do clima em
cada cenário. Traça diferentes cenários, baseados em possíveis medidas para conter as
emissões de GEE que aquecem a atmosfera.
No mais favorável – que implica reduções extremamente ambiciosas de emissões de GEE
– o termómetro pode subir entre 0,3 e 1,7 °C.
No pior caso, o aumento está entre 2,6 e 4,8
°C. A subida média do nível do mar está estimada entre 26 e 81 cm. O dado preocupante é
que todos os valores são médias, o que significa que poderão existir zonas com aumentos
de temperatura de 6 e 8 graus e subidas do
nível do mar mais preocupantes em determinadas zonas do globo.
Portugal enfrentará alterações mais intensas
no clima do que a média mundial. Para o mesmo cenário, e considerando os resultados centrais de uma série de modelos de simulação do
clima, os termómetros poderão subir entre 3 e
7 ºC. Nos meses de verão, a Península Ibérica
pode chegar a aquecer 9 ºC. Portugal deverá
testemunhar uma redução da precipitação
que, também no pior cenário, pode chegar a
valores entre 10% no norte do país e 40% no
sul. Os números mais dramáticos emergem
do pior cenário para o futuro, em que pouco
ou nada é feito para controlar as emissões de
dióxido de carbono. A sua concentração na atmosfera atinge mais de 900 partes por milhão
em 2100, mais de duas vezes a atual.
O relatório do IPCC chama a atenção para o
facto de a Europa já estar a aquecer mais do
que a média global. A temperatura média entre 1979 e 2010 aumentou 0,48 ºC por década no norte europeu. Há evidências de maior
secura dos solos e de frequência de eventos
extremos no sul. O clima europeu é, em grande parte, influenciado por um fenómeno atmosférico, a Oscilação do Atlântico Norte, que
tem a tendência de vir a deslocar-se para cima
em latitude. O sul da Europa enfrentará outros
impactos, como tempestades mais intensas,
embora menos frequentes, temperaturas extremas no verão e menos humidade superficial, aumentando o risco de secas. Haverá menos chuva, embora haja muito mais incerteza
nas projeções futuras da precipitação do que
da temperatura.
Posto isto, e mesmo levando em consideração
as críticas que lhe são dirigidas, o Relatório
serve, pelo menos, de barómetro para a atividade negocial, por duas razões. Informa dos
possíveis constrangimentos que existirão no
futuro em termos de posicionamento económico de alguns setores – ex. recursos naturais
– e serve de base aos governos para a construção de decisões políticas com impactos
nos negócios.
É neste contexto, aparentemente tempestuoso, que Portugal poderá ter uma palavra a
dizer, porque a resposta estará no talento, na
capacidade de encontrar soluções para mitigar estes efeitos climáticos. Temos recursos
naturais, estruturas, engenharia, recursos
científicos e a capacidade de resposta à necessidade de reestruturação energética na
Europa. A Europa continuará a procura de
energia com investimento associado, carecendo de competências e conhecimento para
descarbonização. Num cenário nada agradável em projeções climáticas, Portugal poderá
dar como resposta o conhecimento dos seus
quadros. A evolução futura do problema dependerá em muito da resposta da sociedade
nos próximos anos.
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
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ENERGIA
Novo quadro da União Europeia
em matéria de energia e clima 2030
– Comissão Europeia recomenda princípios
mínimos para a exploração de gás de xisto
Manuel Gouveia Pereira
Associado Coordenador da Área de Imobiliário & Ambiente
da VIEIRA DE ALMEIDA & ASSOCIADOS
[email protected]
No passado dia 22 de janeiro,
a Comissão Europeia adotou
uma recomendação relativa
a princípios mínimos para
a exploração e a produção
de hidrocarbonetos
(designadamente de gás de
xisto) mediante fraturação
hidráulica maciça.
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INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
De acordo com o comunicado de imprensa da
Comissão, a recomendação deverá ajudar os
Estados-Membros que pretendam recorrer à
prática de fraturação hidráulica maciça a fazerem face aos riscos para a saúde e o ambiente
e a aumentarem a transparência para os cidadãos, para além de criar condições de concorrência equitativas para as empresas do setor,
estabelecendo um quadro mais claro para os
investidores.
Juntamente com a recomendação, foi emitida
uma Comunicação da Comissão ao Conselho e
ao Parlamento Europeu – Communication on
the exploration and prodution of hydrocarbons (such as shale gas) using high volume
hydraulic fracturing in the EU – que apresenta
e realça as potenciais novas oportunidades,
bem como os desafios, que resultam da extração de gás de xisto na Europa, e aborda os
problemas e receios da utilização da fraturação hidráulica maciça para a extração de hidrocarbonetos.
Ambos os documentos estão integrados no
novo quadro da União Europeia em matéria de
clima e energia para 2030, igualmente apresentado a 22 de janeiro, que define os objetivos em matéria de energia e clima para uma
economia competitiva, segura e hipocarbónica
na UE em 2030, donde se destacam (i) uma redução das emissões de gases com efeito de
estufa de 40% em relação ao nível de 1990,
(ii) um objetivo, vinculativo à escala da UE, de
pelo menos 27% para as energias renováveis,
(iii) ambições renovadas para as políticas de
eficiência energética, (iv) um novo sistema de
governação, e (v) uma série de novos indicadores destinados a garantir a competitividade e
a segurança do sistema energético.
No que respeita à recomendação, embora se
reconheça, por um lado, que tanto a legislação geral como a ambiental da União Europeia (onde se incluem, nomeadamente, as
Diretivas relativas às condições de acesso
e utilização das autorizações de prospeção,
pesquisa e produção de hidrocarbonetos, à
política da água, à avaliação ambiental estratégica, à responsabilidade ambiental, à
avaliação de impacte ambiental, aos resíduos e às emissões industriais) são aplicáveis
às operações de exploração e produção de
hidrocarbonetos que envolvem fraturação
hidráulica maciça, salienta-se, por outro lado,
que a referida legislação ambiental foi elaborada numa altura em que não se praticava a
fraturação hidráulica maciça na Europa, concluindo, por conseguinte, pela necessidade
de estabelecer princípios mínimos que os
Estados-Membros devem considerar sempre que aplicarem ou adaptarem a sua regulamentação relacionada com atividades que
envolvam esta prática.
A recomendação adota as definições de «fraturação hidráulica maciça» – a injeção de
uma quantidade de água igual ou superior a
1000 m3 por fase de fratuação ou igual ou superior a 10 000 m3 durante todo o processo
de fraturação num poço – e de «instalação» –
uma estrutura, inclusive subterrânea, conexa
designada para a exploração ou produção de
hidrocarbonetos mediante fraturação hidráulica maciça.
Em matéria de princípios mínimos, cumpre
destacar:
– Planeamento estratégico e avaliação de
impacte ambiental: antes da concessão de
licenças, realizar uma avaliação ambiental
estratégica, bem como uma avaliação de
impacto ambiental, garantindo a participação do público;
– Licenças de exploração e produção: garantir
que os procedimentos de obtenção de licenças cumprem a legislação da União sempre
que existam, nomeadamente, duas ou mais
autoridades competentes ou dois ou mais
operadores;
– Seleção do local de exploração e produção:
efetuar uma caracterização e uma avaliação dos riscos do potencial local e da zona
circundante, à superfície e no subsolo;
– Estudo da situação inicial: efetuar um levantamento ambiental (situação inicial) do
local da instalação e zona circundante, à superfície e no subsolo, suscetível de ser afetada;
“
A Comissão irá
monitorizar a aplicação
da recomendação,
divulgando ao público
um quadro comparativo
da situação nos diversos
Estados-Membros
produção, bem como após a fraturação hidráulica maciça;
– Responsabilidade ambiental e garantia financeira: os operadores devem apresentar
uma garantia financeira ou equivalente que
abranja o disposto na licença e eventual
responsabilidade ambiental;
– Capacidade administrativa: as autoridades
devem dispor de recursos adequados;
– Obrigação de encerramento: após o encerramento, deve ser realizado um estudo a
fim de comparar a situação ambiental da
instalação e zona circundante, à superfície
e no subsolo, com a situação anterior, apurada aquando da determinação da situação
inicial;
– Difusão de informações: o operador deve
disponibilizar informação acerca das substâncias químicas e dos volumes de água a
utilizar, devendo as autoridades publicitar
informação relativa (i) ao número de projetos e de licenças, (ii) a estudo da situação
inicial e monitorização, e (iii) aos incidentes,
acidentes e resultados das inspeções.
Por último, os Estados-Membros são convidados a aplicar os princípios acima referidos no
prazo de seis meses e, a partir de dezembro de
2014, a informar anualmente a Comissão das
medidas que tenham adotado. A Comissão irá
monitorizar a aplicação da recomendação, divulgando ao público um quadro comparativo
da situação nos diversos Estados-Membros,
e procederá a uma avaliação da eficácia desta
estratégia no prazo de 18 meses.
PUB.
– Projeto e construção da instalação: assegurar que a instalação é construída de modo a
evitar fugas e derrames à superfície para o
solo, a água ou a atmosfera;
– Infraestruturas de uma zona de produção:
os operadores adotam uma estratégia integrada para o desenvolvimento de uma zona
de produção, prevenindo e reduzindo o impacto e os riscos em termos de ambiente e
de saúde, e cumprem os requisitos adequados estabelecidos, em termos de infraestruturas, para a manutenção da instalação;
– Requisitos operacionais: assegurar que os
operadores aplicam as melhores técnicas
disponíveis, assim como as boas práticas
do setor para prevenir, gerir e reduzir os impactos e riscos associados à atividade;
– Utilização de substâncias químicas e água:
recurso a técnicas de fraturação que minimizem o consumo de água e os fluxos de
resíduos e que não utilizem substâncias
químicas perigosas;
– Requisitos de monitorização: o operador
deve monitorizar periodicamente a instalação e a zona circundante, à superfície e no
subsolo, durante as fases de exploração e
ENERGIA
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
39
ÁGUA
Conclusões do VIII Congresso Ibérico
de Gestão e Planeamento da Água
CONSTRUIR UMA NOVA CULTURA DA ÁGUA
Desde 1998, a Fundação Nova Cultura da Água
organizou oito Congressos Ibéricos sobre
Gestão e Planeamento da Água, sempre com
o objetivo de levar cabo uma reflexão transdisciplinar, crítica e construtiva da política da
água em Portugal e Espanha. A finalidade foi
sempre a mesma: construir uma nova cultura
da água para melhorar a nossa relação com os
ecossistemas e conseguir que a gestão seja
mais democrática e o seu uso mais equitativo.
Os temas abordados em cada Congresso variam de acordo com o contexto dos problemas
de cada momento, mas invariavelmente somos confrontados com o resultado das práticas que resultam de uma antiga cumplicidade
entre determinadas relações de poder e uma
conceção obsoleta das políticas da água. O
conteúdo da VIII edição do Congresso Ibérico,
que decorreu na sede da Fundação Calouste
Gulbenkian em Lisboa, em dezembro de 2013,
articulou-se num cenário institucional muito
particular que renova o interesse pela deliberação coletiva. Na União Europeia avaliou-se o
primeiro ciclo de planeamento hidrológico da
Diretiva-Quadro da Água em finais de 2012, e
isto exige-nos contribuir para esse processo
comum de avaliação, que requer a participação ativa da sociedade civil.
O Congresso foi organizado em torno de quatro áreas temáticas que articulam as conclusões que se apresentam a seguir. Por um
lado, e como já se tinha feito em congressos anteriores, insistiu-se na necessidade
de que os governos de Portugal e Espanha
adotem medidas efetivas para coordenar as
suas políticas de águas nas bacias partilhadas, tendo presente que agora há que contar
com práticas e experiências europeias muito
mais avançadas nesse terreno, que permitem
uma análise mais profunda nessa matéria.
Ao mesmo tempo, esta revisão enquadrouse no debate internacional sobre as relações
entre bacias hidrográficas e o governo do
território. Insistiu-se, igualmente, na dimensão ecossistémica da política de águas, que
exige cada vez mais a inclusão das águas
marinhas com a mesma importância que as
águas continentais, de transição e costeiras.
Os conferencistas do Congresso destacaram,
particularmente, a necessidade de garantir
uma adequada articulação com os objetivos
40
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
da Diretiva-Quadro de Estratégia Marinha e
de calibrar adequadamente a eficácia dos indicadores ambientais para identificar os efeitos
das pressões humanas.
Finalmente, os aspetos económicos marcaram também presença no Congresso, incluindo temas novos como os efeitos da atual crise,
ou os progressos registados no debate internacional sobre a aproximação económica aos
serviços ecossistémicos.
A POLÍTICA COMUNITÁRIA DA ÁGUA EM
REVISTA
– Ao longo dos 10 aos de aplicação da Diretiva-Quadro da Água (2003-2013), a política
comunitária da água conseguiu melhorias
na qualidade das águas superficiais, na informação sobre a água e os seus ecossistemas, na incorporação de novos atores no
processo de decisão e na coordenação entre
os Estados.
– Na União Europeia é, no entanto, necessário intensificar os esforços para deter de
maneira efetiva a degradação dos ecossistemas aquáticos, em especial a produzida pelas alterações hidromorfológicas e
a poluição difusa originada pela agricultura
convencional baseada no alto consumo de
inputs externos (energia fóssil, agroquímicos, etc.).
– É necessário afirmar a água como uma
questão social e não meramente técnica e
é preciso que o direito humano à água e ao
saneamento se integrem na ação interior
e exterior da União Europeia, pela mão de
uma Comissão mais decidida.
– A política da água deve priorizar a gestão pública, impedir a mercantilização das
águas e seus ecossistemas, e aspirar a alcançar o acesso universal aos serviços básicos da água com garantias jurídicas eficazes.
– A governança da água precisa de credibilidade. Há práticas internacionais como
as que tiveram lugar na Austrália ou Nova
Zelândia que podem ajudar-nos a conseguir uma cooperação mais intensa entre os
atores sociais e o Estado. É necessário um
acompanhamento dos grupos de interesse
que permita identificar e avaliar a sua intervenção nas decisões finais e os benefícios
privados que obtêm como consequência
dessa mesmas decisões.
GOVERNO DO TERRITÓRIO E REGIÕES
HIDROGRÁFICAS
– Constatámos importantes dificuldades na
concertação entre Portugal e Espanha para
planear e gerir de forma comum os seus rios
transfronteiriços.
– Existe uma clara dificuldade para aplicar os
acordos alcançados entre ambos os países,
órfãos de medidas práticas de participação
pública recíproca e de mecanismos eficazes
que permitam identificar e gerir problemas
partilhados.
– A cooperação transfronteiriça em matéria
de águas permanece cativa de um modelo
excessivamente protocolado, enquanto os
problemas persistem. As autoridades portuguesas mostram-se passivas e com escassa sensibilidade face aos desafios partilhados, em especial os relativos à qualidade
ecológica das águas, ao aceitar uma partilha
quantitativa de caudais dos rios comuns.
As autoridades espanholas aumentam a
intensidade dos seus aproveitamentos e
conexões entre bacias, apesar dos conflitos
que gerados.
– O planeamento conjunto das regiões hidrográficas partilhadas deve centrar-se na
recuperação do bom estado ecológico dos
rios, que continuará a constituir o principal
desafio no próximo ciclo de planeamento,
como pedra de toque para a revisão da Convenção de Albufeira.
– Os problemas transfronteiriços têm como
pano de fundo uma grave e continuada carência de integração dos objetivos ambientais da água nas políticas setoriais de incidência territorial (agricultura, urbanismo,
turismo, industria, etc.).
– A inacabada definição das competências
das diferentes autoridades territoriais e os
seus desencontros continua a ser um fator
chave na insuficiente aplicação da DiretivaQuadro da Água. Este problema, que desde logo transcende o campo da gestão da
água, tem expressão no protocolo e insuficiente desenvolvimento que teve em ambos
os países a figura da comissão de autoridades competentes.
ÁGUA
– Em relação com o ponto anterior, partindo
de uma perspetiva de gestão ecossistémica da água, que tem na bacia hidrográfica
a sua expressão física natural, haverá que
aprofundar as implicações que apresentam
as mudanças de escala (nacional, regional,
bacia…) na distribuição do poder de decisão,
o que ajudará a compreender os conflitos
relativos à implantação de diferentes âmbitos hidrográficos de gestão.
ECONOMIA E ECOSSISTEMAS
– Para garantir o uso sustentável da água é
necessária a transição do modelo de gestão de recursos para o modelo de gestão de
ecossistemas.
– Na ausência de garantias do direito humano
ao acesso à água potável e ao saneamento
confluem a falta de equidade (crise social)
e a degradação dos recursos hídricos (crise
ecológica). A privatização dos serviços de
abastecimento e saneamento nas suas diferentes modalidades converte os cidadãos
sem recursos económicos em clientes pobres.
– A entrada do setor privado no monopólio
dos sistemas de abastecimento e saneamento requer a existência de uma entidade
reguladora, que estabeleça as condições de
prestação dos serviços, audite as entidades
que os prestam e sirva de guia para o setor
em aspetos como qualidade, preço e garantia. Para que a função do regulador seja
credível e eficaz, é imprescindível que exista
um controlo social, mediante a participação
dos cidadãos, e o controlo político através
do parlamento.
– Sendo certo que os problemas da água não
se esgotam no setor da água, antes devendo ser abordados de maneira integrada com
outras políticas de caráter setorial e territorial, existe margem para a melhoria dos
serviços de abastecimento e saneamento
urbanos. Além do incremento da eficiência
técnica através da redução de perdas nas
redes e outros melhoramentos nas infraestruturas, é necessário conceber tarifas que
satisfaçam um conjunto de critérios relati-
Insistiu-se na necessidade de
que os governos de Portugal
e Espanha adotem medidas
efetivas para coordenar as
suas políticas de águas nas
bacias partilhadas
vos, entre outros aspetos, à garantia solidária do acesso aos serviços e à sustentabilidade económica e financeira a longo prazo
do prestador de um serviço de qualidade. A
incorporação dos custos ambientais do uso
da água nas tarifas continua a ser uma tarefa pendente.
– O conceito de serviços ecossistémicos – a
contribuição dos ecossistemas para o bem
estar humano - pode ser incorporado na
gestão da água com potenciais resultados
positivos. Esta abordagem permite uma
melhor compreensão da complexidade que
caracteriza a gestão da água, aportando
elementos para melhorar o diagnóstico,
ampliar o catálogo de medidas e facilitar
a integração com outras políticas (biodiversidade, clima, etc.). Existe, no entanto, o
risco de que tal abordagem derive para o
caminho da privatização e mercantilização
dos ecossistemas. A participação cidadã e a
manutenção da visão holística face a perspetivas reducionistas (monetização universal) pode limitar esse risco.
ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS: ONDE COMEÇA
O MAR?
– Persiste uma menor atenção e desenvolvimento do conhecimento científico das
águas costeiras, em comparação com as
águas interiores.
– Esta assimetria no conhecimento levou a
que houvesse mais progressos na gestão
do estado ecológico dos rios que no das
águas de transição e costeiras. Em muitos
casos as incertezas sobre os efeitos afetam
a proteção destas águas menos estudadas,
o que acaba também por ter consequências
negativas na homogeneidade dos indicadores e dos trabalhos de intercalibração.
– Permanecem em uso expressões como «a
água dos rios perde-se no mar», que ignoram de maneira flagrante os importantes
serviços que estes caudais, e os sedimentos e nutrientes que eles transportam, desempenham nos ecossistemas aquáticos
litorais. É imprescindível garantir regimes
ecológicos de caudais que mantenham as
funções destes ecossistemas.
– Quanto às águas subterrâneas, a sua gestão requer a ação coordenada das Autoridades envolvidas e a sua efetiva integração
em cada um dos sistemas de exploração
para que a gestão seja realmente articulada
em conjunto com as águas superficiais.
– As reduções orçamentais estão a afetar a
necessária melhoria do conhecimento das
águas subterrâneas e a sua relação com
os ecossistemas que delas dependem, as
redes de monitorização do seu estado e a
harmonização dos métodos para a sua gestão.
A GESTÃO DO CICLO URBANO DA ÁGUA EM
TEMPOS DE CRISE
– É o momento de afrontar com empenho o
princípio da recuperação de custos da Diretiva-Quadro da Água, contextualizando-o
nos novos debates e realidades socioeconómicas, e abordar, mais para além dos
custos, o lucro dos beneficiários da privatização dos serviços.
– A recuperação de custos limitada aos gerados pela gestão já tocou no fundo, as restrições orçamentais, de crédito e de fundos
estruturais, desembocam num aumento
das tarifas para os serviços relacionados
com a água.
– O aumento improvisado das tarifas está já
a produzir graves problemas sociais nos setores mais próximos da pobreza ou em risco
de exclusão.
– É inadiável estabelecer critérios de recuperação de custos e aumento de tarifas que
contribuam de forma eficaz para atingir os
objetivos ambientais e não comprometer
o acesso universal efetivo aos serviços de
abastecimento e saneamento.
– O facto de a responsabilidade dos serviços
de água e saneamento ser de caráter local
(municipal), requer funções de regulação
por parte de uma instituição superior que
assegure a garantia dos direitos humanos
e de cidadania em jogo, e ao mesmo tempo
garanta que se estabelecem critérios e indicadores para contrastar a qualidade dos
serviços com transparência e participação
dos cidadãos. Neste capítulo, a procura do
setor privado de uma regulação com regras
claras que tornem compatível o interesse
geral com o benefício empresarial foi muito
contestada pela visão que defende a necessidade de retirar do espaço de mercado este
tipo de serviços vinculados a direitos humanos e de cidadania, que devem ser de acesso
universal pela sua própria natureza.
– A defesa do interesse geral implica a adoção
de novos modelos de gestão transparentes
e participativos, em que a cidadania conheça e possa participar na tomada das decisões importantes. Isto não é passível de ser
garantido através dos modelos tradicionais
de gestão pública e menos ainda com as
concessões a empresas privadas.
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
41
ÁGUA
Projeto do LNEC apoia Entidades Gestoras
na redução de perdas de água
A Iniciativa Nacional para o Controlo Eficiente
de Perdas – iPerdas - consiste num projeto
colaborativo que tem como objetivo capacitar
e apoiar as entidades gestoras de sistemas
de abastecimento de água na implementação de um programa de redução de perdas
de água e aumento da eficiência energética.
A iPerdas teve início em janeiro de 2014 e tem
a duração de um ano.
Este projeto, promovido pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), conta com
a participação de 22 entidades gestoras de
todo o país e outras sete empresas e tem
como parceiros o Instituto Superior Técnico
da Universidade de Lisboa, a empresa de software Addition, Lda. e a Universidade Politécnica de Valencia, Espanha.
No âmbito da iPerdas irão decorrer três sessões comerciais com o objetivo de divulgar e
demonstrar aos participantes no projeto soluções tecnológicas disponíveis no mercado
para apoio a processos de controlo de perdas
de água e melhoria da eficiência energética.
Os temas e datas previstos para cada sessão
são:
– Tema 1: Sistemas de informação para suporte à operação (ex: ferramentas SIG, sistemas de telegestão operacional/SCADA)
– 13 de março 2014
– Tema 2: Equipamentos de medição e aquisição de dados e deteção de fugas (ex: soluções para monitorização e aquisição de
dados de caudal, soluções para monitorização e aquisição de dados de pressão,
soluções para deteção de fugas, soluções
para gestão de pressões) – 9 de julho 2014
– Tema 3: Ferramentas de análise de dados
(ex: software para modelação de sistemas
de abastecimento, software para processamento e análise de dados de caudal) – 12
de novembro 2014.
As empresas comerciais fornecedoras deste
tipo de soluções interessadas em fazer uma
apresentação nestas sessões poderão consultar informação adicional no site da iPerdas.
www.iperdas.org
Tratamento de Água para Consumo Humano e Uso Industrial
– edição revista e atualizada
A formação em engenharia exige um
conjunto de elementos instrumentais
de suporte para assegurar a respetiva
lecionação. Entre eles, para que se possam conferir com êxito os conhecimentos
necessários, é determinante a existência
de conteúdos de índole teórico-prática,
problemas ou exercícios. A sua resolução, acompanhada ou não, é fundamental
para a eficácia da docência ao nível universitário e, também, para a formação
em contínuo no domínio do exercício da
engenharia.
No domínio dos sistemas de tratamento
de água para consumo humano e uso industrial verifica-se, pelo menos nos países de expressão portuguesa, uma clara
insuficiência de material de apoio a esta
componente de ensino teórico-prática. Os
exercícios disponíveis para consulta estão
dispersos por diversos livros em língua
não portuguesa e não cobrem todos os
42
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
aspetos que se pretendem consolidar. Esta
limitação tem constituído um motivo de insatisfação entre os professores e alunos perante a importância desta temática.
Os autores entenderam, por isso, que seria
de todo o interesse uma sistematização de
conhecimentos que contribuísse, com uma
linguagem simples e prática, para uma melhor aprendizagem no domínio do projeto e
da exploração dos sistemas de tratamento de
água. Em complemento, julgaram útil incluir
uma componente formativa sobre a aplicação
do Sistema
Internacional de Unidades, conhecidas que são
algumas insuficiências na sua cabal aplicação.
Note-se, ainda, que esta publicação integra
diversas contribuições de colegas e alunos
recebidas após a primeira edição e, por isso,
os autores agradecem a todos o interesse e
a disponibilidade manifestada. O resultado final é esta segunda edição, revista, atualizada
e ampliada.
À venda em www.engebook.com
RESÍDUOS
Projeto MULTI VALOR RCD – Objetivos e metodologia
Com este projeto, pretende fazer-se uma caracterização mecânica,
física, química e ambiental, bem como estudar as suas aplicações em
pavimentos rodoviários e em betões. O conhecimento científico produzido permitirá definir um modelo de otimização do processo produtivo e avaliar as possíveis aplicações, já sugeridas pelo LNEC ou novas,
para as diferentes frações produzidas.
Em termos de objetivos gerais do projeto, pretende-se alargar a
gama de produtos reciclados aos clientes e melhorar a sua qualidade; flexibilizar a produção e aumentar o volume de negócios; reduzir o
impacte ambiental da atividade, quantificar e caracterizar os RCD em
termos de origens e tipologias; produzir Know-how científico; definir
um modelo de otimização do processo produtivo; demonstrar às empresas alvo, empresas difusoras e potenciais clientes que a aplicação
de RCD para a execução de pavimentos é uma solução tecnicamente
viável, ambientalmente segura e economicamente vantajosa.
O MULTI VALOR RCD será desenvolvido na empresa e na Universidade
do Algarve por investigadores do Centro de Investigação em Química
do Algarve (CIQA) pertencentes à Faculdade de Ciências e Tecnologia
(FCT) – Laboratórios de Absorção Atómica e de Cromatografia, e por
investigadores do Laboratório Avançado de Engenharia Mecânica e
dos Laboratórios de Estruturas e Construção (LEC), de Materiais de
Construção (LMC) e de Geotecnia (LG), pertencentes ao Instituto Superior de Engenharia (ISE).
O projeto decorrerá em quatro fases. A primeira fase será desenvolvida na empresa e envolve a caracterização quantitativa e qualitativa
dos resíduos e também a sua triagem e processamento. Nesta fase
serão selecionados os resíduos a submeter às fases seguintes. A segunda fase decorrerá na Universidade do Algarve e envolverá todos
os seus laboratórios. Os resíduos selecionados serão submetidos, em
primeiro lugar, a uma caracterização mecânica e física nos laboratórios do Instituto Superior de Engenharia (ISE), de acordo com as especificações do LNEC. Será feita também nestes laboratórios a caracterização das propriedades térmicas dos resíduos. De seguida será
feita uma caracterização química bastante detalhada nos laboratórios da FCT, com particular incidência na deteção de poluentes, sejam
eles metais pesados, orgânicos (utilizando uma tecnologia inovadora
a nível internacional – a Fonte DESI) ou outros. Na terceira fase, os
agregados que passarem nos testes efetuados na fase anterior serão escolhidos para preparar betões e para utilizar em pavimentos
rodoviários à escala real. Os betões preparados serão caracterizados
no que respeita às suas propriedades mecânicas, físicas, térmicas e
químicas. Na última fase, os RCD selecionados para pavimentos rodoviários serão testados à escala real em obra de pavimentação dentro da empresa. Os betões preparados serão também testados no
que se refere à avaliação da fissuração.
PUB.
O MULTI VALOR RCD surgiu para solucionar
uma dificuldade da empresa que consiste
na comercialização dos agregados
reciclados resultantes da trituração dos
Resíduos de Construção e Demolição
(RCD). É um problema transversal a todas
as empresas do setor e que subsiste
primariamente na heterogeneidade dos
resíduos que chegam às unidades de
reciclagem. A sua composição variável
e potencialmente perigosa condiciona
a obtenção de produtos reciclados com
qualidade suficiente para serem aplicados.
© RECYCLINGWORKS MA.
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
43
RESÍDUOS
Ecodeal aposta na valorização de
resíduos perigosos para serem utilizados
energeticamente pelas cimenteiras
Elsa Rola
Eng.ª Química – responsável industrial
O coprocessamento é uma das áreas em que
a Ecodeal está a apostar para crescer e ganhar quota de mercado na área da valorização
ambiental dos resíduos industriais perigosos.
Esta atividade consiste no aproveitamento de
resíduos com destinos menos nobres, adequando-os de modo a serem utilizados de forma energética e material mais correta. O seu
destino são as duas cimenteiras nacionais – a
Secil e a Cimpor – com quem a empresa tem
vindo a firmar uma parceria privilegiada com o
objetivo de contribuir para a substituição dos
combustíveis fósseis utilizados nos fornos de
produção de clínquer por combustíveis mais
verdes.
A empresa espera que haja um alargamento
do leque de resíduos coprocessáveis através
do balanço de consumo de recursos para tratamento e tem como estratégia para o próximo
ano avaliar novos tratamentos ou modificação
de existentes para converter mais resíduos em
coprocessáveis. Apesar disso, ainda subsistem
dificuldades relevantes neste método de tratamento: é a própria Ecodeal quem paga o coprocessamento às cimenteiras, apesar de ser
um fornecimento de energia. Para além disto
o processo de identificação, teste e liberação
preparação/adequação de resíduos para coprocessamento reveste-se de alguma complexidade, e é demorado e oneroso;
O trabalho da Ecodeal baseia-se na procura de
processos que valorizem os resíduos industriais perigosos que a empresa recebe de todo
o país, obrigando a uma intensa investigação. A
cada entrada de novos resíduos, estes são avaliados quanto ao seu potencial para coprocessamento. Uma das propriedades relevantes é
o poder calorífico mas existem outras propriedades ligadas à estabilização, homogeneização
e bombeabilidade das misturas. O ponto fundamental é conseguir compatibilizar os vários
resíduos com potencial para coprocessamento.
Isto obriga a um estudo com o objetivo de se
conseguir a anulação das reatividades e interações para que o poder calorífico da mistura
possa vir a ser utilizado. Existem resíduos de
produção contínua, que são mais constantes,
44
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
mas cada um deles é único, pelo que, para ser
ambientalmente valorizado, tem de ser tratado
de uma forma particular. Esta variabilidade exige uma monitorização constante do processo
de tratamento de forma a adequar as quantidades de reagentes utilizadas no coprocessamento. Cada resíduo tem uma solução à sua
medida. São também fatores importantes os
baixos teores de água e a reduzida presença
de metais pesados. Em todo este processo de
preparação há que ter em conta que apenas
são admissíveis para coprocessamento os resíduos industriais perigosos que cumpram os
requisitos das licenças ambientais das instalações de destino (cimenteiras).
HIERARQUIZAR O TRATAMENTO
A hierarquia de tratamento dos resíduos começa na prevenção, seguida da reutilização
e reciclagem. Hoje em dia promove-se otimização desta cadeia de gestão, colocando
o coprocessamento no topo da valorização
energética. Isto permite às cimenteiras aproveitarem esta fonte de energia de uma forma
mais eficiente, com um aproveitamento próximo dos 90%, possibilitando ainda incorporação
das cinzas no cimento e evitando a queima de
combustíveis mais poluentes em termos de
libertação de carbono.
As misturas de resíduos coprocessáveis devem cumprir vários requisitos, como serem
bombeáveis, não inflamáveis (flash point inferior a 55ºC), terem poder calorífico relevante,
terem uma compatibilidade alargada, terem
estabilidade físico-química e serem homogéneas. No final a mistura de resíduos possui
características bem definidas e o facto de ser
estável permite controlar o fluxo da energia
fornecida ao forno.
A tipologia de proveniência dos resíduos industriais perigosos que constituem estas
misturas é muito alargada. Podem ser resíduos oleosos e de combustíveis, resíduos de
tintas e suas formulações, resíduos de colas e
suas formulações, resíduos solventes, resinas
e suas formulações, resíduos de detergentes e
suas formulações, algumas águas residuais e
outros resíduos orgânicos.
PORQUÊ COPROCESSAR?
O coprocessamento é um dos processos mais
importantes na valorização ambiental dos
resíduos industriais perigosos, uma vez que
permite menor utilização de combustíveis ricos em libertação de dióxido de carbono. O
coprocessamento pode ser uma alternativa
de tratamento bastante vantajosa também a
nível de processo de tratamento. Pode evitar
o recurso a tratamentos físico-químicos complexos, demorados e onerosos, diminui deposição em aterro, reduz também o consumo de
reagentes e outras matérias-primas com consequente redução de utilização de combustíveis fósseis.
As características do procedimento de coprocessamento envolvem a combustão dos resíduos, através da combinação entre dois processos químicos, a pirólise e a oxidação. Esta
última é a principal reação de um composto
orgânico com oxigénio e requer relativamente
baixa energia de ativação. Já a pirólise é uma
modificação química resultante apenas do calor e envolve a rotura de ligações estáveis resultando num rearranjo molecular. Para uma
combustão eficiente, o principal processo utilizado deve ser a oxidação, sendo que a pirólise
ocorre sobretudo para que a forma resultante
do material seja depois mais eficientemente
oxidado. No forno de cozedura temos temperaturas muito elevadas, chama a 2000ºC e os
materiais podem atingir os 1450ºC, em conjunto com um longo tempo de residência cerca
de 10 segundos. Estas condições asseguram
a destruição das moléculas orgânicas, aliada à
retenção de metais pesados na malha cristalina do produto clínquer, e têm uma altíssima
capacidade de destruição das dioxinas e furanos, 99,99%. Aliado a estes fatores há a salientar o forte controlo ambiental a que é sujeito
o processo de coprocessamento enquadrado
pelo Decreto-Lei nº 85, de 2005.
Os resíduos preparados pela Ecodeal são en-
RESÍDUOS
FIGURA 1 Processo de fabrico clínquer/cimento.
FIGURA 2 Evolução da quantidade de resíduos
enviados para coprocessamento.
6.
Expedição
5.
Moagem
de cimento
4.
Cozedura
3.
Moagem de cru
Utilização dos resíduos na
fase de cozedura como
combustível alternativo
2.
Britagem
1.
Extração
dade de avaliação e identificação dos resíduos
com este potencial. São também efetuados no
Laboratório da Ecodeal os testes aos resíduos,
com vista à formulação do lote para coprocessamento e respetivo ensaio piloto. Os testes a
efetuar pretendem aferir características como
a compatibilidade entre resíduos, a estabilidade, a homogeneidade e, por fim, o cumprimento de requisitos do lote face às especificações
das licenças ambientais das instalações de
coprocessamento (cimenteiras). Para isto, é
constituído lote à escala piloto e nele são avaliados os requisitos. Caso este tenha resultado
positivo é então constituído um lote à escala
industrial. De novo as suas características são
aferidas e, se obtivermos resultados conformes, estes são remetidos os resultados à instalação de coprocessamento para obtenção da
aprovação do lote. Daqui se compreende que
o trabalho laboratorial é um ponto-chave para
obtenção de um lote de resíduos coprocessáveis adequado aos requisitos das instalações
de coprocessamento.
Depois da obtenção da autorização do lote, a
cada expedição as características dos resíduos expedidos são aferidas pela Ecodeal e pelo
destino final, havendo assim o acompanhamento constante destas cargas.
Desde 2009 que a Ecodeal tem vindo a preparar resíduos para coprocessamento, com o
objetivo de procurar a solução ambientalmente mais correta para os resíduos. Têm vindo a
aumentar de modo relevante as quantidades
enviadas para esta solução. Este é o resultado do forte trabalho ao nível interno quanto à
preparação e soluções de tratamento e também na crescente sinergia com os destinos
finais procurados (Figura 2).
O futuro, neste âmbito, balança entre duas
vertentes principais: a da avaliação de novos
tratamentos ou modificação de existentes
para converter mais resíduos em coprocessáveis e o alargamento do leque de resíduos coprocessáveis através do balanço de consumo
de recursos para tratamento.
PUB.
caminhados para as cimenteiras, onde são
utilizados na cadeia de produção do cimento
na fase da cozedura. Como o processo de cozedura do clínquer é energeticamente exigente (800 Kcal/tonelada clínquer), o coprocessamento contribui de modo relevante para este
processo (Figura 1).
Na Ecodeal são várias as unidades de tratamento que participam na preparação dos resíduos, a saber: Unidade de Tratamento FísicoQuímico, Unidade De Classificação, Triagem e
Transferência, Unidade de Tratamento de Resíduos Orgânicos e Unidade de Estabilização.
Na criação de um lote de resíduos para coprocessamento podem participar todas unidades
ou apenas algumas de acordo com as características dos resíduos admitidos em cada
uma, e as respetivas soluções de tratamento
encontradas. O procedimento inicia-se com a
entrada dos resíduos no CIRVER e a avaliação
do seu potencial para coprocessamento em
qualquer das fases de tratamento no CIRVER.
Ao Laboratório da Ecodeal cabe a responsabili-
CLIMATE CHANCE!
Uma reflexão jurídico-económica
do mercado de carbono
no combate às alterações climáticas
de Ivone Rocha, João Quintela Cavaleiro e Paulo Caetano
Numa livraria perto de si.
www.engebook.com/climate_chance
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
45
BIODIVERSIDADE
Telemetria no estudo de Rotas Migratórias
Pedro Martins e Diogo Sayanda
Ecovisão
A Barragem de Pedrógão,
construída no rio Guadiana,
a jusante da barragem de
Alqueva, pela EDIA – Empresa
de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva, foi
equipada com um dispositivo de
passagem para peixes, com o
objetivo de minimizar a redução
da conectividade longitudinal do
rio Guadiana, resultante desta
infraestrutura.
46
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
Entre os principais impactes sobre a ictiofauna de um determinado rio, associados à existência de uma barragem, podem destacar-se
a alteração ao regime de escoamento, com
consequente alteração de características
como temperatura ou oxigenação da água e,
naturalmente, o efeito de barreira que a própria barragem representa para a circulação de
peixes ao longo dos rios.
O dispositivo de passagem para peixes tem
como objetivo principal permitir que as espécies autóctones efetuem as migrações relacionadas com o seu ciclo de vida que ocorrem
nas zonas de cabeceira de rios.
No entanto, para que este tipo de medidas
seja eficaz é importante acompanhar o seu
funcionamento e proceder à monitorização
dos movimentos migratórios dos peixes ao
longo do rio. No presente projeto, com duração
de 14 meses, aplicou-se a técnica da telemetria acústica, complementada com uma outra
série de dados relativos ao habitat e a condições hídricas, para se obter uma amostra
robusta que permita uma análise estatística
multivariável. Neste contexto, a EDIA está a
desenvolver a avaliação da eficácia do dispositivo de passagem para peixes da barragem
de Pedrógão, estando a componente de seguimento de peixes por telemetria acústica a
cargo da Ecovisão.
O seguimento de peixes por telemetria é uma
metodologia que consiste na captura para
marcação de indivíduos com emissores de sinal acústico (ou de rádio), e no seu seguimento
posterior de forma passiva e ativa.
Assim, os indivíduos alvo são capturados
através de um sistema convencional de pesca
elétrica, em que é gerado um campo elétrico
que atordoa os peixes, permitindo a sua cap-
tura de uma forma inócua. Posteriormente
são anestesiados e através de uma pequena
incisão é introduzido o emissor, que possui
uma assinatura individual, permitindo identificar especificamente cada um dos indivíduos
marcados, após o que são libertados.
O seguimento passivo dos peixes é efetuado
de forma contínua através da montagem de
um sistema de boias com estações submersas
de receção de sinal acústico (assim como sensores com data-logger de Temperatura e Oxigénio Dissolvido), colocados em várias linhas
perpendiculares ao rio, de forma a cobrirem
toda a secção transversal, registando todas as
passagens de indivíduos. As estações permanecem submersas durante o tempo de monitorização (que se pode estender por mais de
6 meses), sendo posteriormente recuperadas.
O seguimento ativo dos indivíduos, complementar ao anterior, envolve a realização
periódica de percursos de kayak ao longo do
rio em monitorização, utilizando para o efeito uma estação de deteção e registo de sinal
acústico móvel. Esta abordagem tem por objetivo determinar periodicamente a posição de
indivíduos marcados quando estes se encontram fora dos troços cobertos pelo sistema de
monitorização passivo, permitindo aumentar
consideravelmente a
cobertura da monitorização, identificar rotas
alternativas de migração ou áreas de habitats
preferenciais e, assim, otimizar o desenho de
amostragem.
Para uma albufeira, o seguimento de peixes
por telemetria acústica poderá ser uma ferramenta bastante eficiente no estudo ecológico
da ictiofauna, na definição de medidas com
vista ao sucesso da sua reprodução e, em última análise, para a sua conservação.
CRIMES E CONTRAORDENAÇÕES AMBIENTAIS
Produção de ruído
por linhas elétricas de alta tensão
– Obrigação de remoção ou alteração do seu trajeto
independentemente da aferição do nível de ruído
Isabel Rocha
é Mestre em Direito e Advogada.
Exerce a advocacia desde 1991, sendo
Senior Partner na RMV & Associados
– Sociedade de Advogados, RI.
Supremo Tribunal de Justiça
decidiu, por Acórdão de 2
dezembro de 2013, que a
violação dos direitos ao
repouso, ao sono e à tranquilidade,
decorrente da colocação de linhas
elétricas de alta tensão que produzem
ruído, dispensa a aferição do nível de
ruído pelos padrões legais
estabelecidos, ordenando a remoção
ou alteração das mesmas.
“
(...) cumpre-nos
chamar a atenção
das entidades
que exploram
atividades com
impacte ambiental
para a necessidade
de velar pelo
cumprimento da
legislação ambiental
aplicável.
Uma empresa a quem está acometido o serviço público de concessão, produção,
aquisição, transporte, distribuição e venda de energia elétrica, detentora de linhas elétricas de alta tensão, intentou uma ação judicial contra os proprietários de um imóvel
onde tinha duas linhas instaladas, pedindo que lhe fosse reconhecido o direito de entrar
no seu prédio para a realização da manutenção e beneficiação das mesmas, necessárias
ao cumprimento do serviço público que prossegue.
Os donos do imóvel contestaram invocando a inexistência do direito de passagem
das linhas elétricas sobre o seu terreno e, além disso, invocaram que viviam na incerteza
dos efeitos nefastos decorrentes das linhas de alta tensão, suportando, entre outros,
ruído audível no interior da habitação semelhante a curto-circuito quando chove e ocorrem ventos fortes, tendo pedido, entre outras coisas, que a empresa em questão fosse
condenada a remover as linhas em causa, alterando o seu trajeto ou fazendo-as passar
subterraneamente.
Para defesa da sua tese, alegou a empresa que no caso das redes elétricas, como no
dos edifícios, o que importa é apurar se foram ou não cumpridas as regras de segurança
no estabelecimento e construção das linhas em concreto, tendo afirmado, e provado,
dispor de licenças de estabelecimento e exploração das mesmas. Além disso, invocou
ainda o interesse público prosseguido e que não foi provado que os campos elétricos e
eletromagnéticos excedessem quaisquer parâmetros legalmente estabelecidos.
Realizado o julgamento no Tribunal de 1.ª instância e depois do recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, o processo foi alvo de recurso para o Supremo Tribunal de
Justiça, tendo este decidido, por Acórdão de 02-12-2013, que “Os direitos ao repouso, ao
sono e à tranquilidade constituem uma emanação dos direitos fundamentais de personalidade, nomeadamente à integridade física e moral da pessoa e a um ambiente de vida
sadio, pelo que a sua violação é ilícita”, afirmando que “Tal ilicitude, decorrente da colocação de linhas elétricas de alta tensão (...) que produzem ruído (...) dispensa a aferição do
nível de ruído pelos padrões legais estabelecidos.” (ver em www.dgsi.pt)
Com efeito, afirma o mencionado Acórdão, que a ofensa dos direitos ao repouso e à
tranquilidade “são aspetos do direito à integridade pessoal, que faz parte do elenco dos
direitos fundamentais, do acervo de direitos, liberdades e garantias pessoais” e, como
tal, ”a sua ofensa é ilícita independentemente de respeitar imposições regulamentares
(como o sejam os níveis permitidos pelo Regulamento sobre Ruído), ou do cumprimento
de condições administrativas de licenciamento.”
E, nesse quadro, fundamenta a decisão de ordenar a remoção ou alteração do trajeto
das linhas de alta tensão em questão.
Em face do exposto, cumpre-nos chamar a atenção das entidades que exploram
atividades com impacte ambiental para a necessidade de velar pelo cumprimento da
legislação ambiental aplicável, embora isso só não baste... Na verdade, deverão ter a
preocupação de eliminar todas as situações que possam, eventualmente, provocar danos aos direitos fundamentais inerentes à personalidade, como é o caso do direito ao
repouso.
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
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PESSOAS E EMPRESAS
PRÉMIO CARREIRA
Fernando Castro
Diretor do Laboratório de Análises Químicas da TecMinho
“O facto de, para se tratar resíduos,
serem precisas licenças especiais, é
algo que não se compreende”
Percurso de vida
Licenciado em Engenharia Metalúrgica
pela FEUP em 1982, é docente
universitário na FEUP e na Universidade
do Minho, sendo atualmente professor
catedrático no Departamento de
Engenharia Mecânica desta Universidade.
Fundou e presidiu ao Conselho de
Administração do CVR – Centro para a
Valorização de Resíduos, entre 2002 e
2012. É diretor do Laboratório de Análises
Químicas da TecMinho desde 1994 e autor
de mais de uma centena de publicações
científicas na área do tratamento de
resíduos.
Persistência de resíduos não valorizados
A valorização de resíduos em Portugal nem
sempre tem sido feita tendo em conta critérios de sustentabilidade e interesse económico. Há melhorias a conseguir, em particular
no caso dos resíduos de origem municipal e
urbana, onde a maior parte dos resíduos continua a não ser valorizada. A sustentabilidade
económica do sistema está, de certa forma,
garantida, através das taxas que os cidadãos
pagam, não podendo a elas fugir ou optar, por
a gestão ser feita em situação de monopólio
natural. A existência de fileiras de gestão de
resíduos é um ponto forte em Portugal, mas
a dimensão das soluções técnicas a jusante é
uma limitação relevante. Problema que muitas das vezes é difícil de contornar, dada a dimensão do nosso País.
Ausência de mercado livre nos
(bio)combustíveis
Para haver um mercado de facto, a característica principal é de que ele funcione livremente
e de acordo com as leis normais em mercados
abertos e onde haja concorrência. Para que
isso aconteça, há que terminar com as barreiras administrativas e protecionismos, nomeadamente no que ao uso dos combustíveis
diz respeito. Se continuar a nada ser feito, julgo que não haverá condições para existir um
mercado, no sentido normal do termo. Haverá,
contudo, “mercados” criados artificialmente, e
que acabam por prejudicar o aparecimento de
verdadeiros mercados livres.
Reciclagem/valorização de resíduos
– o que falta fazer
Essencialmente falta deixar que a atividade
económica funcione. As barreiras legais e ad-
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INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
ministrativas limitam imenso as atividades de
valorização de resíduos. O simples facto de,
para se tratar resíduos, serem precisas licenças especiais, é algo que não se compreende
num País carente de matérias-primas e deficitário em termos energéticos. Se “resíduo”
for definitivamente entendido como “recurso” e não lhe for adicionado qualquer epíteto
ou marca distintiva face a outros recursos e
substâncias, a valorização ocorrerá natural e
livremente, de acordo com as necessidades e
oportunidades do mercado. A iniciativa privada surgirá, criar-se-á riqueza e empregos. A
intervenção do Estado e da própria UE tem ido,
nesta matéria, na direção de criar uma hiperregulamentação, de que só têm beneficiado
alguns, poucos, agentes, e criado ineficiências
económicas e ambientais que são tecnicamente injustificáveis e retiram competitividade global à economia.
Distanciamento entre política e
necessidades da economia
O distanciamento crescente entre as decisões
político/administrativas e as reais necessidades da economia tem dificultado, em muito,
as atividades de valorização de resíduos. Por
um lado, há princípios gerais que estão consignados nas leis, que estão corretos e vão no
bom sentido. Por outro lado, há um conjunto
de barreiras que muito dificultam a atividade
económica da gestão sustentável de resíduos,
protegendo quem já está no “mercado” e levando a práticas que nem sempre são as mais
racionais.
PESSOAS E EMPRESAS
A2O
B.I. A2O – Água, Ambiente e Organização, Lda.
Nascimento 1993
Localização Porto
Foco Indústria do Ambiente em geral e entidades públicas e privadas que operam
sistemas e infraestruturas de água, águas residuais e águas pluviais
Proximidade e inovação
A A2O é uma empresa de engenharia que desenvolve soluções de suporte à gestão operacional de entidades baseadas em aplicações
informáticas de terreno. A empresa baseia a
sua atividade em dois pilares fundamentais:
uma grande proximidade com os utilizadores
das suas soluções, tornando-as “soluções
simples para problemas complexos”, e uma
profunda aposta na inovação e na investigação, inclusivamente em projetos internacionais. A A2O detém certificação na norma de
gestão da I&D, NP 4457. Conta com 10 colaboradores, todos com formação superior e uma
grande experiência de terreno.
Obsessão com a simplicidade
A A2O afirma distinguir-se pela cumplicidade
estabelecida com os clientes e permanente
atenção às suas necessidades, bem por um
conhecimento profundo do seu setor de atuação, baseado numa grande experiência no terreno. A “obsessão com a simplicidade” é outra
das características destacadas, a par da “paixão” da equipa pelo setor do ambiente e pela
sustentabilidade.
O NAVIA
O NAVIA é o principal produto da A2O. Trata-se
de uma solução informática de gestão operacional global que abrange a totalidade do ciclo
humano de utilização da água. É uma ferra-
menta simples e amigável que permite total
flexibilidade de utilização e de configuração e
dá aos utilizadores liberdade para evoluir autonomamente com os seus modelos de gestão operacional. O sistema é fácil e rápido de
implementar, com tempos de “set-up” de poucas semanas.
A conjugação da simplicidade da utilização
com a flexibilidade de parametrização permite ao NAVIA ser adotado com muita facilidade
pelas pequenas empresas, da mesma forma
que dá uma resposta global às empresas
de maior porte, suportando todos os seus
processos operacionais. A isto acresce uma
escalabilidade comercial que posiciona esta
ferramenta como uma solução low-cost, cujo
retorno do investimento é, segundo a A2O,
inferior a dois anos. A ferramenta possibilita também o suporte integrado na atividade
diária da equipa operacional dos sistemas de
gestão pela qualidade e ambiental (ISO9001
+ ISSO14000), bem como dos reportes que as
entidades gestoras estão obrigadas a prestar
ao regulador, tais como o PCQA e os indicadores de gestão. A integração de dados pode ser
feita com qualquer outra ferramenta informática, nomeadamente SIG, ERP, CRM, LIMS
ou SCADA.
Consolidar a internacionalização
A A2O faz um balanço positivo da sua atividade, e sente que tem estado a acrescentar
A conjugação da
simplicidade da utilização
com a flexibilidade de
parametrização permite
ao NAVIA ser adotado com
muita facilidade pelas
pequenas empresas, da
mesma forma que dá
uma resposta global às
empresas de maior porte,
suportando todos os seus
processos operacionais.
valor e a melhorar a sustentabilidade da sua
atividade.
Para o futuro, a A2O pretende apostar na melhoria permanente das suas soluções, prosseguir a aposta na inovação e na investigação e
continuar a estabelecer relações fortes e sinceras com os seus clientes. A consolidação do
processo de internacionalização é outro dos
objetivos da empresa.
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
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EVENTOS
IFAT 2014 terá cerca de 3 mil expositores
A IFAT 2014 – feira mundial para os setores da água,
águas residuais, resíduos e matérias-primas – decorre de 5 a 9 de maio em Munique, na Alemanha.
O espaço da feira ocupará 230 mil metros quadrados,
o que representa um aumento de 15 mil metros quadrados em relação a 2012. São esperados cerca de 3
mil expositores de 50 países. São também esperados 56 stands conjuntos de 13 países.
Em 2014, pela primeira vez os participantes vão poder testemunhar uma demonstração
dos processos envolvidos na reciclagem de um veículo.
De Portugal, estão registados cinco expositores: AIP Feiras, Congressos e Eventos, Dosag, Grove Advanced Chemicals, Marcovil e Ventilaqua.
URBANIZAÇÃO INTELIGENTE
Um dos temas fortes da feira será a urbanização inteligente. Este tópico surge num contexto em que, de acordo com dados do Banco Mundial, em 2025 2,2 biliões de toneladas
de resíduos serão produzidos anualmente nas áreas urbanas. O tema será abordado
numa lógica de oferta de soluções integradas para expandir áreas metropolitanas e regiões cujas populações estão em declínio. Para que o tema seja apresentado de forma
abrangente e aprofundada, será apresentado não apenas na IFAT mas também na Bauma, BAU, C ommunication World, Expo Real e Transport Logistic.
2º Congresso Internacional
de Gestão Sustentável
de Resíduos
A 2ª edição do Congresso Internacional de Gestão Sustentável de Resíduos (II Africa Sustainable Waste Management) tem lugar de 22 a
24 de abril em Luanda. Depois de uma primeira
edição no Lobito, este 2º Congresso acontece
pouco depois da aprovação, por Angola, do seu
PESGRU e do Regulamento de Gestão de Resíduos. Se o 1º Congresso serviu para apresentar o problema, esta segunda edição fará um
pequeno balanço e permitirá, de acordo com a
organização, apresentar soluções para a gestão adequada dos resíduos, das mais simples
e robustas às mais complexas e sofisticadas.
www.africawastecongress2014.org
IFAT MEDIA DIALOG – A ANTEVISÃO
Pela primeira vez este ano, a IFAT foi precedida por uma apresentação à imprensa durante a qual as empresas expositoras tiveram oportunidade de antecipar a uma comitiva
internacional de jornalistas as novidades para maio. O IFAT Media Dialog decorreu a 7
e 8 de janeiro no recinto da Messe München e proporcionou aos jornalistas a oportunidade de conhecer, em detalhe, os produtos e tecnologias “na calha” de cada uma das
empresas.
NOTA O contacto para os expositores portugueses na IFAT 2014 é a MundiFeiras.
Tel: 22 616 49 59 | [email protected]
CALENDÁRIO DE EVENTOS
Evento
Temática
Local
Data
Informações
ACQUALIVEEXPO / ENERGYLIVEEXPO
Água e Energia
Lisboa
Portugal 5a7
www.acqualiveexpo.fil.pt
março
2014
12º CONGRESSO DA ÁGUA / 16º ENASB / Água e Resíduos
Lisboa
XVI SILUBESA
Portugal 5a8
www.aprh.pt/aguaeresiduos2014/
março
2014
RENEXPO 2014 Energia
Budapeste
Hungria 12 e 13 www.renexpo-budapest.com
março
2014
14º CONGRESSO NACIONAL DE GEOTECNIA Geotecnia portuguesa Covilhã
Portugal
6a9 www.ubi.pt
abril
2014
3RD IAHR EUROPE CONGRESS
Engenharia costeira, hidráulica, Porto
alterações climáticas
Portugal
14 a 16
www.fe.up.pt/iahr2014/
abril
2014
2ª EDIÇÃO DO CONGRESSO DE
Gestão de resíduos
Luanda
GESTÃO SUSTENTÁVEL
Angola
22 a 24 www.africawastecongress2014.org
abril
2014
IFAT 2014 Água, águas residuais, resíduos e
Munique
gestão de matérias-primas
Alemanha
5 a 9
www.ifat.de
maio
2014
As informações constantes deste calendário poderão sofrer alterações. Para confirmação oficial, contactar a Organização.
50
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
VOZES ATIVAS
QUAL O ASPETO PRIORITÁRIO A ALTERAR NA REVISÃO DA LEI DOS SOLOS,
PREVISTA PARA O 1º SEMESTRE DE 2014?
NORTADA
PARTICIPE
seja uma voz ativa e
envie-nos questões que
queira ver respondidas nas
próximas edições!
[email protected]
ANTÓNIO FIÚZA
HÉLDER CARETO
Professor Catedrático do Departamento
de Engenharia de Minas da FEUP
Eng.º do Ambiente
e Secretário Executivo do GEOTA
A lei de solos deverá proteger este recurso nãorenovável à escala de milhares de anos, formado por
produtos da decomposição física, química e biológica
da crusta, distinto dos sedimentos, e contendo uma
componente biológica que pode servir de suporte da
vida vegetal, considerando esta complexidade: a de
interface entre a litosfera, a atmosfera e a biosfera.
Atendendo à realidade geológica nacional deverse-á basear numa perspetiva de especificidade de
utilização do solo, com critérios de qualidade relativos
à sua utilização potencial, e não numa perspetiva de
multifuncionalidade da sua utilização.
A proposta legislativa em apreço necessita de
maior capacidade de integração e coordenação
dos programas e instrumentos de política,
legislativos e fiscais com incidência no território,
para cumprir os fins a que se propõe. É, por isso,
fundamental que traga consequências normativas
para os RJIGT e RJUE, a legislação fiscal, a afetação
de mais-valias, os processos de revisão dos PDM,
as finanças locais, o código de expropriações, a
regeneração urbana, o código de arrendamento
urbano e outros.
Brasil
por Carlos Pedro Ferreira, Diretor Geral - Grupo Sondar
Não há duas sem
três, o que para mim
significa que não há
nove sem dez.
Fiz, dia 11 de
fevereiro, a minha
10ª viagem ao Brasil
no prazo de um ano,
o que não demostra
nenhum distúrbio
de personalidade, ou
obsessão pelo lugar
em si, mas adequação
à forma e formato de
atuação do local onde
decidimos atuar.
O Brasil foi e é um desafio, muito mais que uma teimosia, muito menos que uma necessidade, mas felizmente a única coisa que me move são os desafios,
e por felicidade, para já, ainda não tive de me mover
por necessidade.
Mas antecipar as necessidades por desafios, antecipando uma hipotética crise, pode ser uma grande
ajuda para sair de forma airosa, calma, sem ser, por-
que não temos outra escolha.
Não ter outra escolha é a pior coisa do mundo, muito embora alguns psicanalistas defendam que grande parte das angústias modernas advêm do facto de, ao termos de escolher
entre 10 coisas, a única coisa certa é podermos estar a deixar de fora 9 coisas boas…
Parece que é mesmo assim, mas continuo na mesma, prefiro a angústia de ter de decidir e ter por onde
escolher, do que não ter de escolher porque não há
escolha, com a exceção de quando estou com pressa e com fome. Nessas ocasiões, a frase “Amigo, a
sair, já só temos bacalhau” deixa-me completamente satisfeito e feliz, mesmo não sabendo qual a forma em que me será apresentado. Cumpre a função,
alimentar-me e rapidamente.
Neste momento da nossa história recente, a capacidade de nos adaptarmos rapidamente a alterações
súbitas e repentinas nos negócios e mercados, bem
como conseguirmos, nós próprios, adequar a nossa
vida à situação atual é o que fará de nós vencedores
ou perdedores.
Eu que detesto andar à boleia, não gosto de hotéis
em geral, gosto de cozinhar, gosto de carros e de
andar de carro, não tenho grande apreço por aviões
nem por alfândegas e detesto estar sentado e cala-
do, e adoro a minha familia, consegui num ano reunir
tudo aquilo de que não gosto, no Brasil, onde tenho
quase tudo o que não aprecio, não posso fazer aquilo que aparentemente gosto, e não tenho aquilo que
consideraria a minha “cesta básica”. No entanto,
tudo o que não gosto, ou gosto menos, se esvai no
prazer do desafio, da viagem e das coisas de que
gosto e não sabia gostar. A vida é uma aprendizagem contínua onde a viagem, o desafio, a superação
e o desconhecido farão de nós melhores pessoas.
Como não gostar de criar um projeto de raiz de sucesso? Como ficar indiferente ao “afinal não preciso
de carro, e aguento-me dez horas num avião sem
que seja um calvário, ou estar sozinho num hotel
afinal não é assim tão mau…” é assim. Há quem
esteja sozinho na rua, sem desafios, sem projetos,
sem ambições que não sejam ter algo para comer
ou não ter frio ou calor.
Esta crónica vem no seguimento da última, é sempre uma questão de perspetiva e a maioria de nós
consegue sempre ver os lados maus da vida.
Estou num hotel, sem carro, mas levantei-me às
6:00 da manhã e fui correr, tomei um banho e vim de
boleia para o escritório com o Gonçalo. Estão 30 ºC.
Haverá algo melhor? Talvez, mas isto chega-me.
Para a semana estou em casa, e continuo feliz.
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
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OPINIÃO
Assegurar água para todos
João Bau
Investigador-Coordenador do LNEC (aposentado). Presidente da EPAL nos períodos 1975-1980 e 1996-2000.
Administrador da AdP-Águas de Portugal no período 1996-2002. Presidente da APRH no período 1990-1992.
Presidente da APDA no período 2000-2003. Membro do “Board” da IWRA no período 1986-1988.
Membro do “Board” da EUREAU no período 2000-2003
temática do
“direito à água”
tem estado nos
últimos anos em debate
na cena internacional,
nomeadamente no
âmbito das Nações
Unidas.
A temática do “direito à água” tem estado nos últimos anos em debate na cena internacional,
nomeadamente no âmbito das Nações Unidas. Os sucessivos governos portugueses assumiram
sempre uma posição favorável ao reconhecimento internacional de tal direito e, inclusivamente,
Portugal votou favoravelmente a Resolução aprovada pela Assembleia-Geral das Nações
Unidas em 26/07/2010, a qual “declara o direito à água potável e ao saneamento como um
direito fundamental para o pleno disfrute da vida e de todos os direitos humanos”. A posterior
aprovação por consenso em Genebra, em 30/09/2010, pelos 47 membros do Conselho dos
Direitos do Homem, da sua própria Resolução relativa à mesma temática significou, nas palavras
da perita independente do Conselho dr.ª Catarina Albuquerque, que “para a ONU o direito à água
e ao saneamento está contido nos tratados relativos aos direitos do homem e por consequência
é legalmente obrigatório”.
Ora este debate internacional sobre o “direito à água” tem lugar num momento de
reconhecida gravidade da actual crise financeira, económica, social e ambiental que enfrentamos
à escala planetária, à escala europeia e à escala nacional. A existência em Portugal de problemas
crescentes de desemprego, de pobreza e de exclusão social levou a que um número crescente
de famílias não tenha possibilidade de assegurar o pagamento das facturas de água, o que põe
em risco a continuidade do abastecimento público a suas casas. A dimensão deste fenómeno
no nosso país não pode ser escamoteada e tais situações têm que ser encaradas como uma
violação dos direitos do homem e exigem uma responsabilização e uma acção colectivas. O
recurso à água não é uma questão de escolha. Todos temos necessidade de água. A água de
facto desempenha funções sociais que são garantia de direitos do homem.
A ultrapassagem da situação actual exige o primado da política, reclama que os direitos
económicos, sociais e culturais não sejam considerados como direitos de segunda relativamente
aos direitos civis e políticos, impõe que seja dado conteúdo efectivo a direitos como o “direito à
água”. Mas para isso é necessário garantir a existência de meios para financiar no nosso país
a garantia desse “direito à água”. Não é este o espaço indicado para debater em pormenor
tal questão, procuro aqui apenas defender a urgência do lançamento de tal debate. Mas
referirei ainda que foram construídos na Europa mecanismos diversos para apoiar os cidadãos
impossibilitados de fazer face ao pagamento das facturas de serviços básicos por razões
económicas e que visam, por conseguinte, evitar a interrupção da prestação de tais serviços.
Uns, como em França, funcionaram a nível departamental e com base em transferências do
orçamento social, ou seja, são financiados pelos contribuintes. Outros, como na Valónia ou em
Bruxelas, são baseados na introdução, no sistema tarifário dos serviços de água, de uma parcela
destinada a um Fundo de Solidariedade, e são portanto suportados pelos consumidores. Outros
mecanismos poderiam ser ainda criados, tais como, por exemplo, o estabelecimento de um
imposto sobre a água mineral engarrafada.
Estamos num momento de escolhas e do necessário empenhamento na construção do
futuro com base nessas escolhas e nos princípios e valores que as enformam. É nos momentos
de crise que é imperioso que os valores sejam reafirmados, defendidos e levados à prática. E
por isso defendo a oportunidade e a urgência do lançamento de um debate sobre a necessidade
de garantir aqui e agora o “direito à água” e sobre a forma como se podem assegurar os
indispensáveis recursos financeiros para que tal seja possível.
João Bau escreve de acordo com a antiga ortografia.
52
INDÚSTRIA E AMBIENTE 84 JANEIRO/FEVEREIRO 2014
PUB.

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