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CAPA
REVISTA CIENTIFICA – REDE UNIRB 2014
Editora-chefe
Prof.ª Adriana Assis Santos
Org. Prof.ª Maria Lúcia de Souza Carvalho Couto
Coordenadora do Curso
Revisão
Profª Itastimara Valverde Medeiros
Normas da ABNT
Prof. Carlos Alberto Bahia
Prof.ª Maria do Socorro Rocha
Marina Rodrigues (Bibliotecária)
Prof.ª Norma Sueli Mendes
Editoração
Marluce Souza Santos
Impressão
Gráfica – SENASP
Biblioteca da Faculdade Regional da Bahia – UNIRB
Revista Cientifica do Curso de Serviço Social/Faculdade Regional da Bahia
Vol. 05 – Salvador 2014
Interdisciplinar: Questão Social, Assistência Social, Proteção Social,
Seguridade Social, pessoa com deficiência.
FACULDADE REGIONAL DA BAHIA – UNIRB
EDITORIAL
A Revista Científica Rede UNIRB, em seu quinto volume, apresenta uma fundamental
contribuição para estudiosos, à comunidade interna e externa interessados na produção de
conteúdos acadêmicos acerca das abordagens propostas nos 10 artigos contidos neste
exemplar. O ineditismo dos estudos desta edição traz à tona a multidisciplinaridade e a
diversidade de enfoques produzidos pelos autores dos textos. De tal forma, é o que certamente
instiga o leitor em suas páginas.
Vale ressaltar que, mesmo tratando de temas diferenciados, cada artigo traz o compromisso e a
inquietação de seu articulista, no que tange ao aprofundamento, ampliação e questionamentos,
aflorados por estes do que se conhece das temáticas abordadas, a fim de contribuir para o
aumento de saberes e para a disseminação de novos estudos.
Presente nos estados da Bahia, Alagoas, Sergipe e Piauí, a Rede UNIRB reafirma que a
publicação desta Revista Científica é de extrema importância, não só pela forma como os
diferentes autores enfocam suas pesquisas, mas também pelo levantamento de questões e
conclusões, além do aporte intelectual e de conhecimentos concebidos a partir de sua leitura.
Por isso, temos a enorme satisfação de compartilhar com você mais esta edição.
Carlos Joel Pereira
Diretor-presidente da Rede UNIRB
SUMÁRIO
A dimensão técnico-operativa do Serviço Social na Saúde
Hospitalar...................................................................................................................
Adriana Assis Santos
Trabalho da(o) Assistente Social e os desafios teóricos, operativos e políticos
representados pelas atuais configurações da questão social e suas implicações
conservadoras no campo das políticas
sociais.......................................................................................................................
Ana Maria de Oliveira Silva
Por uma razão não instrumental: Reflexões propedêuticas acerca do pensamento de
JURGEN HABERMAS – Filosofo e Sociólogo
Contemporâneo..........................................................................................................
Norma Sueli Mendes
As condições de Trabalho do Assistente Social nos Centros de Referência da Assistência
Social em Salvador: Uma análise sobre a consolidação do sistema único da Assistência
Social........................................................................................
Neila Tiara Santos Soledade
Transfusão de Sangue: O dilema entre autonomia do paciente, violação de direitos e
Serviço Social...........................................................................................................
Rosemeire Moreira Pereira Bitencur e Ana Maria de Oliveira Silva
5
15
23
34
44
A importância do Fortalecimento das famílias no processo de Desenvolvimento da pessoa 56
com deficiência intelectual em Salvador – Bahia...........................................
Adriana Assis Santos, Sandra Moreira Costa de Carvalho e Tatiane Pereira dos Santos
A proposta do Estado frente a Centralidade das famílias na política Nacional de
Assistência Social – PNAS: Uma análise histórico-critíca..........................................
Grasiela Santana Santos e Jocelina Alves de Souza Coelho
A política previdenciária do auxilio-doença e as transformações societárias
contemporâneas do mundo do trabalho......................................................................
Jocelina Alves de Souza Coelho, Amanda Silva de Matos e Maria Lúcia de Souza
Carvalho Couto
Proteção social e população em situação de rua no Brasil:Uma trajetória de
invisibilidade...............................................................................................................
Camila Santana Oliveira, Sandra Moreira Costa de Carvalho
72
81
93
107
Trabalho e situação de Rua no Brasil: Mecanismos e formas de
precarização................................................................................................................
Sandra Moreira Costa de Carvalho
A DIMENSÃO TÉCNICOOPERATIVA DO SERVIÇO SOCIAL
NA SAÚDE HOSPITALAR
Adriana Assis Santos1
Resumo
O presente artigo visa apresentar o processo de
trabalho numa rede hospitalar da Capital baiana,
especificamente com base nas três dimensões da
profissão, ético-política, teórico-metodológica e
técnico-operativa da profissão. Buscou-se com esse
estudo obter uma aproximação acerca do
reconhecimento da realidade social pelas
profissionais atuantes nesse espaço socioocupacional
a partir da utilização dos instrumentais disponíveis na
categoria, armadilhas encontradas na práxis, bem
como a interface com a produção científica e
pesquisas em serviço social. A metodologia utilizada
nesse estudo foi qualitativa, numa perspectiva
dialética, primando pela compreensão dos
instrumentais utilizados pelas assistentes sociais
pesquisadas. O campo da pesquisa foi uma Rede de
Saúde Hospitalar do Estado da Bahia, Salvador – BA
(Unidade Sede), espaço socioocupacional composto
por 18 (dezoito) assistentes sociais, das quais apenas
oito desejaram participar do estudo de forma
voluntária, representando 03 (três) das 06 (seis)
Instituições desta Rede Hospitalar. A aplicação dos
questionários e assinatura do TCLE ocorreu via e-mail
personalizado e individualizado a cada convidada,
entre os dias 26 de junho a 30 de julho do ano em
vigor. Objetivando manter a identidade das
pesquisadas em sigilo, estas serão apresentadas
codificadas como AS1, AS2, AS3, AS4, AS5, AS6,
AS7 e AS8, sendo todas do sexo feminino. Como
resultados parciais, percebemos que a dimensão
técnico-operativa do serviço social na saúde
hospitalar reconhecem o acervo instrumental
disponível à execução da sua prática, conseguem
fazer a correlação teórica entre o uso dos
instrumentos e demandas apresentadas nesse campo
de atuação, utilizando-se da base teórica do serviço
social, contudo existem implicantes na sua condição
enquanto classe trabalhadora assalariada, se levado
em consideração a sua vinculação e demandas
impostas pela classe empregadora.
Palavras-chave: dimensão técnico-operativa. serviço
social. saúde hospitalar.
1
Introdução
O presente trabalho propõe tecer uma análise
acerca da
dimensão
técnico-operativa
do
serviço social na saúde hospitalar, através do
processo de trabalho numa rede de saúde na Bahia, a
partir da análise dos instrumentais disponíveis para a
categoria
no
seu
exercício
profissional,
reconhecimento da realidade social, percepção ou
não das armadilhas encontradas na práxis, e a
interface com as demais competências/dimensões
profissionais – ético-política, e teórico-metodológica.
Nesse estudo, apresentei como problema
central a necessidade de identificar se “as assistentes
sociais de uma Unidade hospitalar em Salvador
utilizam os instrumentais adequados com o seu fazer
profissional nesse espaço socioocupacional?”. Para
responder a esse questionamento, propus como
1
Assistente Social (Ucsal), Mestre em Políticas Sociais e Cidadania
(Ucsal) e Docente do Curso de Serviço Social da Unirb. E-mail:
[email protected]
objetivo geral de pesquisa “conhecer se os
assistentes sociais dessa unidade hospitalar utilizam
coerentemente os seus instrumentais (acervo
hábitos e cultura na profissão, emerge justamente no
documental), de forma a fortalecer a proposta do
momento em que os setores dominantes (capitalistas)
Projeto ético-político da profissão”.
da sociedade, buscavam meios de “apaziguar” as
O Estudo será apresentado em 04 tópicos, onde
mazelas da questão social (era industrial)2, a qual se
iniciarei com a discussão acerca da dimensão
mantém até os dias atuais, vistas através das suas
técnico-operativa no serviço social, perpassando a
múltiplas expressões. Essa afirmativa pode ser melhor
história e os avanços a partir da década de 1980. Em
compreendida quando Sousa (2008, p.120) explicita:
seguida falarei das competências profissionais,
O Movimento de Reconceituação do Serviço
Social, com toda a diversidade que lhe foi
próprio, criticou duramente essa divisão, e
proporcionou um aprofundamento teóricometodológico (principalmente a partir do
diálogo com a tradição marxista e, sobretudo,
com a obra marxiana) que possibilitou à
profissão romper com esse caráter
meramente executivo e conquistar novas
funções e atribuições no mercado de
trabalho, sobretudo do ponto de vista do
planejamento e administração das políticas
sociais.
compreendendo sua fundamentação para a prática
profissional do assistente social. Foi necessário
adentrar a discussão onde se evidencia a utilização
do acervo instrumental pelo serviço social na saúde.
Ao final farei uma analise acerca da demanda e
instrumentais utilizados pelo serviço social na saúde
na rede de saúde hospitalar estudada.
Na história da profissão, o assistente social
2 A dimensão técnico-operativa no Serviço
em sua atuação profissional, trabalhava sob uma ótica
Social: História e Avanços a Partir da
conservadora e ativista, como bem menciona Buriolla
Década de 80
(2006). A partir do movimento de reconceituação da
profissão, esta visão profissional passa a ser
Os avanços contidos na profissão do serviço
rediscutida nos movimentos de luta internos na
social, após o movimento de reconceituação da
categoria, buscando, conforme Sousa (2008, p.122)
profissão, mais precisamente a partir da década de
explicita acima, ser necessário buscar “superar essa
80, onde fora percebida a necessidade de ser
visão unilateral. No universo das diversas correntes
consolidado um novo conceito de profissão, momento
que atuaram nesse movimento, a principal motivação
em que, em meio à luta da própria categoria, negava-
era dar ao Serviço Social um estatuto científico”.
se o perfil de “mero executor de tarefas” imbuído no
2
exercício profissional de alguns assistentes sociais. É
válido ressaltar que esse processo de mudança de
Para melhor compreensão do tema, fez-se necessário
consultar autores que estudam e discutem a Questão Social
e o Serviço Social: Iamamoto, M. V. O Serviço Social na
Contemporaneidade. (2006); Castell R. A metamorfose da
Questão Social. (2008);
Ainda buscando corroborar com esta análise, Netto
competência ético-política, a competência teórico-
(2004 apud SOUSA, 2008, p.121), expõe os motivos
metodológica e a competência técnico-operativa.
que levaram a profissão a tecer uma repaginagem na
sua ação profissional, em especial que
Iamamoto (2005, p.19) ao tratar da
competência ético-política da profissão, sendo que
se debruçasse sobre a produção de um
conhecimento crítico da realidade social, para
que o próprio Serviço Social pudesse
construir os objetivos e (re)construir objetos
de sua intervenção, bem como responder às
demandas sociais colocadas pelo mercado
de trabalho e pela realidade. Assim, pôde o
Serviço Social aprofundar o diálogo crítico e
construtivo com diversos ramos das
chamadas Ciências Humanas e Sociais
(Economia, Sociologia, Ciência Política,
Antropologia, Psicologia).
esta competência além de envolver a não
neutralidade do profissional, aborda que
Sua prática se realiza no marco das relações
de poder e de forças sociais da sociedade
capitalista – relações essas que são
contraditórias. Assim, é fundamental que o
profissional tenha um posicionamento político
frente às questões que aparecem na
realidade social, para que possa ter clareza
de qual é a direção social da sua prática. Isso
implica em assumir valores ético-morais que
sustentam a sua prática – valores esses que
estão expressos no Código de Ética
Profissional dos Assistentes Sociais
(Resolução CFAS nº 273/93)5, e que
assumem claramente uma postura
profissional de articular sua intervenção aos
interesses dos setores majoritários da
sociedade;
No período da graduação profissional da
autora, em meio às teorias e ciências necessárias na
formação profissional, algumas das ciências
mencionadas por Netto (2004 apud SOUSA 2008),
questionava-me não entendendo ao certo os motivos
Do ponto de vista observado na citação acima,
e necessidades destas para a formação de um
cabe ressalvar que a postura profissional do
assistente social.
assistente social na contemporaneidade, vinculado a
um projeto ético-político societário deve quando nada
2.1 Competências profissionais:
compreendendo sua fundamentação para
tornar-se reflexivo3. Buscando compreender um pouco
a prática profissional do assistente social
mais sobre as outras competências profissionais,
conceituaremos agora a competência teórico-
Compreender a importância das competências
do assistente social no seu fazer profissional,
metodológica da profissão, também elucidada por
Sousa (2008, p.123), que esclarece:
Iamamoto (2005, p.27), nos traz a reflexão acerca das
competências profissionais na contemporaneidade,
mencionando as “3 dimensões que devem ser do
domínio do Assistente Social”, sendo elas:
a
3
Entendemos por prática reflexiva aquela desenvolvida por um
trabalhador social que, considerando a questão social – e sua vivencia
pelas classes populares – enraizada na dinâmica histórico-conjuntural das
relações entre as classes sociais e desta com o Estado, objetiva com sua
prática profissional, contribuir na construção de uma sociedade
democrática, tendo como base a luta pela igualdade econômico-política
que amplie e consolide a cidadania (VASCONCELOS, 1994).
o profissional deve ser qualificado para
conhecer a realidade social, política,
econômica e cultural com a qual trabalha.
Para isso, faz-se necessário um intenso rigor
teórico e metodológico, que lhe permita
enxergar a dinâmica da sociedade para além
dos fenômenos aparentes, buscando
apreender sua essência, seu movimento e as
possibilidades de construção de novas
possibilidades profissionais [...].
Muito embora possa ser banalizado por alguns
profissionais, a necessidade da manutenção dos
estudos teóricos e metodológicos da profissão tornase
imprescindível
ao
profissional
na
contemporaneidade, pois atuar frente às múltiplas
expressões da questão social4, embora pareça algo
“corriqueiro” não pode ser diminuído ou depreciado
pelo profissional do serviço social. Outro ponto,
considerado preponderante à essa “qualificação
permanente do profissional” volta-se à capacidade
que o profissional deverá ter para compreender as
mudanças societárias, lembrando inclusive da sua
especificidade em cada ação profissional, e isso só
ocorrerá
através da
busca
constante
por
conhecimento.
profissional no seu contexto de trabalho. Buscando
melhor
compreensão
acerca
desta
última
competência, Sousa (2008, p.122) nos afirma que
o profissional deve conhecer, se apropriar, e
sobretudo, criar um conjunto de habilidades
técnicas que permitam ao mesmo
desenvolver as ações profissionais junto à
população usuária e às instituições
contratantes
(Estado,
empresas,
Organizações
Não-governamentais,
fundações, autarquias etc.), garantindo assim
uma inserção qualificada no mercado de
trabalho, que responda às demandas
colocadas tanto pelos empregadores, quanto
pelos objetivos estabelecidos pelos
profissionais e pela dinâmica da realidade
social.
É válido ressaltar que, em matéria da
competência técnico-operativa, mesmo imbuída de
habilidades ou experiências profissionais para o
exercício da profissão, o assistente social no seu
fazer profissional deverá realizar uma análise crítica
contrapondo o campo de atuação, demandas dos
usuários, bem como aplicabilidade da competência
técnico-operativa, sempre vinculando-se aos objetivos
da categoria nesta instituição.
Sousa (2008, p.125) ressalta que
Como última competência profissional,
apresenta-se a técnico-operativa, a qual se volta ao
fazer
profissional,
à
assistência
prestada
cotidianamente, ao uso dos instrumentais cabíveis ao
“[...] o conjunto das expressões das desigualdades sociais como o
conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista
madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais
coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a
apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma
parte da sociedade” (IAMAMOTO, 2006, p.27).
4
essas três dimensões de competências
nunca
podem
ser
desenvolvidas
separadamente – caso contrário, cairemos
nas armadilhas da fragmentação e da
despolitização, tão presentes no passado
histórico do Serviço Social. Contudo, articular
essas três dimensões coloca um desafio
fundamental, e que vem sendo um tema de
grande debate entre profissionais e
estudantes de Serviço Social: a necessidade
da articulação entre teoria e prática.
Investigação e intervenção, pesquisa e ação,
ciência e técnica não devem ser encaradas
como dimensões separadas – pois isso pode
gerar uma inserção desqualificada do
Assistente Social no mercado de trabalho,
bem como ferir os princípios éticos
fundamentais que norteiam a ação
profissional.
2.2 Uso dos instrumentais do serviço social
na saúde: o olhar científico dessa prática
profissional
A prática profissional do assistente social em
O profissional deveria atuar no seu campo de
trabalho, somente se tivesse domínio pleno das três
competências profissionais, além de ter a clareza da
inseparabilidade entre elas, visto que a utilização
segregada destas três além de fragilizar a prática
profissional, consolida uma visão cultural da
sociedade para com a profissão, onde qualquer um
pode ser um assistente social, visto a atuação
vinculada ao senso comum conduzida por
profissionais da categoria.
A realidade social, autores como Baptista e
Batinni (2009), e o próprio Sousa (2008) consideram
que estudar a realidade social nunca foi tarefa fácil.
Dessa forma, o assistente social deverá estar
qualificado e habilitado para melhor desempenhar o
qualquer área de atuação profissional traz como
subsídios legais a Lei nº 8.662/935, o Código de ética
profissional de 1993, e, na saúde em especial, temos
a partir de 2009 “os parâmetros de atuação do
assistente social na saúde6”, documentos legais,
dentre outros, que contribuem para nortear a prática
profissional, primando pela consistência e vinculação
ao Projeto ético-político profissional, o qual é um
projeto societário.
A apresentação da base legal da profissão
fortalece o posicionamento ético-político que a
profissão do serviço social constituiu ao longo da sua
história na sociedade, bem como possibilita
compreender a importância da profissão e pensá-la a
partir do fato de
seu fazer profissional, pois “[...] o cotidiano cria armadilhas às quais o Assistente Social deve estar atento. [...].
Mas nem tudo que aparece é o que realmente é” (SOUSA, 2008, p.123).
Para tanto, os profissionais devem atentar-se à singularidade e particularidade em cada demanda trazida
pelos usuários do serviço social, levando-se em consideração que nem sempre a realidade é o que parece ser.
abordar o serviço social como uma profissão socialmente determinada na história da sociedade brasileira.
Em outros termos, analisar como o Serviço Social se formou e desenvolveu no marco das forças societárias,
como uma especialização do trabalho na sociedade. Mas pensar a profissão é também pensá-la como fruto
dos sujeitos que a constroem e a vivencia [...] (IAMAMOTO, 2006, p. 57-58).
O Serviço Social expressa na sociedade, a
5
Lei de Regulamentação da Profissão.
Documento construído com o objetivo de “fortalecer o trabalho dos assistentes sociais na saúde, na direção dos Projetos de Reforma Sanitária
e Ético-Político Profissional, imprimindo maior qualidade ao atendimento prestado à população usuária dos serviços de saúde em todo o Brasil”
(CFESS, 2009).
6
partir dos seus profissionais, a contínua construção de
social7, sobretudo pelas bases teóricas que alicerçam
ações eficazes, transformadoras e contribuintes, para
o fazer profissional, o qual deve estar distanciado do
uma sociedade que traz historicamente a negação
“fazer comum”, ou seja, do “senso comum”, do
dos seus direitos de cidadania. Contudo, a fragilidade
achismo, do achômetro, como já mencionava Buriolla
– vista muitas vezes no ativismo profissional - em
(2006, p.15).
exercer a profissão, não cabe mais ao profissional na
A prática profissional possibilita ao assistente
contemporaneidade, tendo em vista todo o processo
social, através dos dados obtidos no uso dos seus
de luta angariado pela categoria, reformulações
instrumentais8 diretos9 e indiretos10, a elaboração e
curriculares ao longo desses anos, implantação do
publicação de estudos dos perfis das populações
PEP, dentre outras atos significativos para o contexto
trabalhadas, estudos de casos sociais para
profissional.
discussões com as equipes multiprofissionais,
espaços
identificação dos indicadores sociais da área de
socioocupacionais em que atua, prima pela
atuação, comparativos das demandas ano a ano –
materialização dos direitos sociais dos seus usuários,
objetivando revisão dos projetos e/ou programas ora
cidadãos de direitos e deveres. A luta pelos direitos
desenvolvidos pelos profissionais da área, tendo em
dos cidadãos, dever de todos, é na profissão de
vista a certeza de que a realidade social é mutável e
serviço social uma das bandeiras de luta mais
não estática (BAPTISTA; BATTINI, 2009), dentre
acirradas
categoria,
outras possíveis pesquisas, estudos, levantamentos,
independentemente se este atue diretamente na área
propostas de intervenções, frutos da utilização dos
da saúde ou não, para tanto, faz-se necessário
seus instrumentais.
O
Assistente
pelos
Social
profissionais
nos
da
A necessidade de crescimento e estímulo
[...] analisar a profissão supõe abordar,
simultaneamente, os modos de atuar de
pensar que foram por seus agentes
incorporados, atribuindo visibilidade às bases
teóricas assumidas pelo Serviço Social na
leitura da sociedade e na construção de
acerca da produção científica em Serviço Social, em
respostas à questão social (IAMAMOTO, 2005,
p.58).
Corroborando com o dito por Iamamoto (2005),
ao contrário do que se pense na sociedade, nem
“todo mundo faz serviço social”, logo, ser assistente
7
O Serviço Social é uma profissão de nível superior e pode ser exercida
somente por profissionais diplomados em instituições de ensino
reconhecidas pelo Ministério da Educação (MEC) e devidamente
registrados no Conselho Regional de Serviço Social (CRESS). A pessoa
que se forma no curso de Serviço Social é denominada de assistente
social. (http://www.assistentesocial.com.br/perguntas.php ).
8
São entendidas como instrumentos ou meios dos quais o assistente social
se vale para atingir os fins pré-determinados. (www.ssrevista.uel.br/cv9n2_sandra.htm)
9
Ou instrumentos utilizados “face-a-face”, sendo eles: observação
participante, entrevista individual ou grupal, reunião, dinâmica de grupo,
mobilização de comunidade, visita institucional, visita domiciliar
(SOUSA, 20010 Ou instrumentos utilizados por escrito: atas de reuniões,
livros de registros, parecer social, relatório social, diário de campo
(SOUSA, 2008).
especial ao Estado da Bahia, sobretudo pela
social, muito provavelmente posteriormente utilizada.
importância e embasamento teórico-prático ofertado
Outro dado a ser levado em consideração
aos profissionais da categoria, fará parte de um
entre os achados no estudo é o fato de que 06 (seis)
contributo ainda mais para uma prática profissional
das pesquisadas mencionarem o uso constante do
crítica, propositiva, investigativa, contemporânea.
instrumental “parecer social” nas suas práticas
profissionais.
Esse
indicativo,
conduziu
a
pesquisadora à analisar a interface existente entre os
e
diversos instrumentais do Serviço Social, seja por sua
instrumentais utilizados pelo serviço
continuidade e sistemática necessária, seja pela
social na saúde na rede de saúde
importância do posicionamento profissional frente aos
hospitalar estudada
casos acompanhados pela categoria, ou seja, por
2.3 Analise
acerca
da
demanda
entender que cada instrumento utilizado pela
A título de esclarecimento, Sousa (2008)
esclarece que o serviço social possui seus
profissão, existe por detrás deste um objetivo e a
justificativa de sua aplicabilidade.
instrumentos diretos (ou face-a-face, que necessita
Uma entrevista social realizada pelo assistente
uma abordagem corpo-a-corpo com o usuário do
social junto ao seu usuário deve ser acompanhada e
serviço social) - entrevista individual e grupal,
precedida da observação participante – devido aos
observação participante, dinâmica de grupos,
dados
mobilização de comunidade, reunião, visita domiciliar,
Conseqüentemente, far-se-á após a aplicação dos
visita institucional -, e indiretos (por escrito,
dois instrumentos ora mencionados, através da
documentando as ações realizadas e dados obtidos
reflexão da prática profissional, os devidos
na aplicação de outros instrumentais) – atas de
encaminhamentos sociais, com a emissão do parecer
reuniões, parecer social, relatório social, livros de
social – entendido devido à possibilidade de
registros e diário de campo.
posicionamento do profissional frente à realidade
subjetivos
ofertados
por
esta.
A observação participante utilizada por cinco
social estudada, quer como norte e definição frente a
das oito participantes demonstra para a pesquisadora,
um caso assistido através da emissão de um parecer,
o equívoco da utilização desse instrumental na prática
quer para consubstanciar seus encaminhamentos a
profissional, pois, este corrobora de forma significativa
serem realizados a posteriori.
para angariar informações, impressões e detalhes
Quando questionadas sobre os motivos que as
subjetivos para consubstanciar a própria entrevista
levavam a utilizarem os instrumentais apontados no
estudo, daremos destaque a uma seguinte resposta
por uma das profissionais pesquisadas, sendo:
apresentadas no espaço profissional.
Outro ponto a ser considerado, analisando o
conjunto das respostas dadas pelas pesquisadas na
Procuro utilizar tais instrumentos em função
da necessidade de buscar, através do
conhecimento crítico da realidade social,
poder elaborar objetivos e (re)elaborar
objetos de intervenção, bem como responder
às demandas sociais apresentadas no
espaço profissional (AS1, 2010.).
última citação conjugado ao gráfico 01 é o fato de
transparecer nas entrelinhas o possível não
conhecimento de 100% das pesquisadas aos 100%
dos instrumentais mencionados (ofertados como
respostas), pelo fato de entender a sua inter-relação e
A partir dessa fala, observa-se uma
compreensão e entendimento justificáveis ao uso dos
instrumentais na prática profissional, ou seja, o
cuidado
desta
com
o
embasamento
e
completude entre muitos deles.
O profissional do serviço social, independente
de qual frente de trabalho atue, deve compreender
que no seu contexto de trabalho e
aprofundamento acerca da realidade social, meios de
melhor direcionamento aos casos ora acompanhados,
ponderações nos usos dos instrumentais disponíveis,
outros.
É notória a centralidade emitida no discurso de
AS1 (2010), onde esta procura os instrumentais, para
obtenção da visão crítica acerca da realidade social
trazida por seus usuários-clientes, sobretudo pela
possibilidade de reelaboração da sua proposta de
trabalho, a qual, mesmo já considerado-a
sistematizada, pode reajustá-la e readequá-la para
novos projetos e propostas de trabalho.
Essa necessidade de buscar, através do
conhecimento crítico da realidade social, novas
propostas de intervenções, seja através da
elaboração de objetivos e/ou da (re)elaboração do
objeto de intervenção profissional, o uso dos
instrumentais na visão de AS1 (2010) promove-a ao
encontro de respostas às demandas sociais
[...] na sua prática profissional se deparam
com uma população desinformada a respeito
dos seus direitos sociais, do conhecimento
que os técnicos têm acumulado sobre ela,
dos recursos que pode utilizar, do seu
movimento, das informações que os técnicos
produzem e detêm sobre o movimento das
instituições (rotinas, recursos, contradições,
correlação de forças). Essa desinformação
contribui para que os usuários sejam
utilizados pelas instituições e não as utilizem
enquanto um direito social, impedidos que
estão de ampliar, consolidar e exercitar sua
cidadania (VASCONCELOS, 1994, p.4).
A análise tecida por Vasconcelos, reforça a
certeza da importância de detalhes angariados
através da prática profissional, em especial na
instrumentalidade do serviço social, vista em seu
sentido macro-conceitual, sendo esta ação promotora
da acessibilidade dos usuários do serviço social, aos
bens e serviços os quais têm direito.
Diante desta perspectiva, a pesquisadora
ofertou às pesquisadas a possibilidade de refletir
sobre este momento de “reflexão da prática”, com o
competências profissionais (ético-política, teórico-
“este questionário
metodológico e técnico-operativo), possibilita um fazer
contribuiu com algum processo reflexivo acerca da
profissional politizador, ou seja, não alienador, sendo,
sua prática profissional neste momento. Se sim, pode
portanto promotor da emancipação do sujeito,
comentar?”, momento em que responderam:
conforme preconiza do Projeto Ético-político da
seguinte questionamento:
Sim. Todo trabalho cientifico relacionado a
nossa prática profissional é de grande valia
pois é necessário que os profissionais
produzam trabalhos nos quais sirvam de
base para que possamos aprimorar os
nossos conhecimentos a cada dia. O
profissional de Serviço Social deve estar
aberto a novas experiências e em
contrapartida saber de fato o que é a sua
atribuição sempre respaldado no projeto
ético-político da profissão. (AS2, 2010)
Sim. O questionário proporcionou uma
análise crítica acerca da atuação quanto
assistente social, bem como me fez refletir
sobre o atual campo de trabalho. Identifiquei
necessidades de atualização quanto a
utilização e objetivo dos instrumentos citados.
(AS3, 2010).
profissão.
A pesquisa in loco, felicitou a pesquisadora, no
sentido de confirmar a existência de uma prática nãoconservadora ou assistencialista, embora alguns
discursos tenham permanecido superficiais, se
comparados à teoria e ciência apreendida na
formação profissional, esta que deve ser mantida ao
longo do seu exercício, independente do espaço
sócio-ocupacional em que o assistente social esteja
inserido.
É válido ressaltar que, ao contrário do que se
pensa
quando
criticados
os
profissionais
Essas afirmativas demonstram através dos
conservadores da categoria de assistentes sociais,
discursos das pesquisadas, quão é válido refletir
considerando-os distantes da atualidade, o que difere
acerca da prática profissional, das ações realizadas
a categoria de conservador ou não, são as ações que
ou não realizadas, dos instrumentos utilizados ou não
estes desenvolvem ou não no seu exercício
realizados, do conhecimento realizado da realidade
profissional, ou seja, a lucidez ou não na qual conduz
social ou meramente deixado em segundo plano
a sua prática profissional, estando ou não vinculando
favorável a outrem que não o usuário.
suas ações às bases legais da profissão e ao projeto
ético-político coletivamente instituído, além de
promover estudos e momentos de auto-reflexões
3 Considerações Finais
como ocorreu com este estudo.
Concomitante a isso, entende-se e reforça-se a
A prática profissional do assistente social,
embasada por suas bases legais já mencionadas
nesse estudo, bem como consubstanciada por suas
imprescindibilidade do profissional do serviço social
atentar-se diariamente à importância de exercer sua
prática profissional de forma auto-reflexiva,
reavaliando no cotidiano seus objetivos enquanto
BURIOLA, M. O estágio supervisionado. 3.ed. São
Paulo: Cortez, 2001.
profissional na sua área de atuação, questionando as
imposições
feitas
pelo
sistema
capitalista
GORZ, A. Misérias del presente, riqueza de lo
posible. Buenos Aires: Editorial Paidós, 1998.
(empregador), reafirmando as bases legais do nosso
código de ética profissional e Lei nº 8.662/93, esta
. O imaterial: conhecimento, valor e capital.
São Paulo: Annablume, 2005.
que regulamenta a profissão, tendo em mente e de
forma clara, que um dos objetivos centrais da
profissão é a intervenção e enfrentamento das
múltiplas expressões da questão social, na garantia e
efetivação de direitos das classes trabalhadoras, o
nosso usuário.
IAMAMOTO, M.V. O Serviço Social na
contemporaneidade: trabalho e formação
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políticas e sociais do país e podem ser vistas tanto
TRABALHO DA/O ASSISTENTE SOCIAL E OS
DESAFIOS TEÓRICOS, OPERATIVOS E POLÍTICOS
REPRESENTADOS PELAS ATUAIS
CONFIGURAÇÕES DA QUESTÃO SOCIAL E SUAS
IMPLICAÇÕES CONSERVADORAS NO CAMPO DAS
POLÍTICAS SOCIAIS.
Ana Maria de Oliveira Silva1
como mecanismos para manutenção da força de
trabalho, como conquistas da classe trabalhadora,
como benesse da burguesia, como também
instrumento para aumento da riqueza ou dos direitos
do cidadão a depender do momento histórico
analisado.
As mudanças que afetam o mundo do
Resumo
trabalho provocam a necessidade de alterações no
O presente texto tem como proposta apresentar
algumas reflexões sobre o Serviço Social brasileiro na
atualidade a partir da afirmativa: o trabalho da/o
Assistente Social, enquanto atividade que tem como
base de sua profissionalização a questão social e a
ação fundamentada na crítica marxista e defesa dos
interesses da classe trabalhadora têm desafios
teóricos, operativos e políticos representados pelas
atuais configurações da questão social e suas
implicações conservadoras no campo das políticas
sociais.
Palavras – chave: Serviço Social. Desafios. Questão
Social. Políticas Sociais
Estado e nas políticas sociais, e colocam diferentes
demandas e possibilidades ao trabalho do assistente
social no âmbito das políticas sociais.
Analisar os espaços sócio-ocupacionais nos
quais se insere o assistente social significa refletir
sobre o movimento histórico da sociedade e seus
processos sociopolíticos, que indicam o modo como a
profissão se inscreve na sociedade capitalista, como
uma especialização na divisão sociotécnica do
trabalho, articulado aos processos de produção e
reprodução das relações sociais. Da mesma forma,
1 Introdução
para além da instrumentalidade, é necessário verificar
também, como o profissional compreende o
Conforme Faleiros (1991 apud PIANA
2009), analisar políticas sociais significa percorrer
caminhos vinculados ao desenvolvimento do
capitalismo e as lutas profissionais e sociais, que no
Brasil, se relacionam às condições econômicas,
significado do seu trabalho, que olhar tem sobre a
profissão, o objetivo e a intencionalidade de sua ação
e de que forma a justifica, orientando a direção social
do seu exercício profissional.
Assim, é importante assinalar que refletir
sobre o trabalho profissional da/o Assistente Social,
1
Assistente Social, Mestranda em Políticas Sociais e Cidadania da
Universidade Católica do Salvador, Docente da Faculdade Regional da
Bahia.
baseado na questão social e a sua ação fundada na
crítica marxista e defesa dos interesses da classe
trabalhadora apresenta desafios teóricos, operativos e
formação profissional), que direcionam o projeto ético-
políticos postos pela questão social e suas
político profissional.
implicações conservadoras no campo das políticas
Esse projeto indica a necessidade de
sociais. Implica considerar que existem âmbitos
organização da categoria e é resultante da conjuntura
controversos do fazer profissional, nos quais se
sociopolíticas que define a vinculação entre os
confrontam diferentes concepções, valores e
espaços de trabalho e as manifestações da questão
propostas, articulados em torno de projetos que
social, considerada a expressão das desigualdades
disputam o espaço institucional onde se implementam
sociais produzidas e reproduzidas na dinâmica das
políticas públicas.
relações sociais, e, a partir das configurações
assumidas pelo trabalho e pelo Estado, no atual
2 O contexto de trabalho da profissão
Entendemos que apreender o modo como se
dá o exercício profissional significa perceber a lógica
estágio mundializado e financeirizado do capitalismo
contemporâneo, conforme Netto (1992) e Iamamoto
(2007).
de retração ou intensificação de demandas em
As políticas sociais representam a luta dos
determinadas áreas, bem como as respostas quer
movimentos sociais e expressam as conquistas das
sejam individuais ou coletivas dos assistentes sociais
classes trabalhadoras, enquanto respostas a suas
à essas exigências e compreender o caráter
necessidades mesmo que as vezes insuficientes.
contraditório do Serviço Social enquanto prática
O Estado responde a questão social através
polarizada pelos interesses das classes sociais, que
da fragmentação e setorização das necessidades
participa dos mecanismos de manutenção e de
sociais, recortando-as em problemas sociais
mudança, respondendo a interesses do capital e do
“particulares” como o desemprego, a falta de
trabalho, participando dos processos de dominação,
mobilidade urbana, a falta de moradia, a doença e
resistência e ruptura da ordem social, conforme
outras, inviabilizando a clareza quanto a raiz única. A
Iamamoto (2009).
implementação das políticas sociais, enquanto direitos
O trabalho da/o assistente social expressa a
sociais, torna-se um jogo complexo, que envolve
articulação de conhecimento e luta por espaço no
diferentes atores, interesses, projetos e estratégias,
mercado de trabalho associado às competências e
requisitando a presença e a intervenção de diversas
atribuições privativas legalmente reconhecidas nas
categorias profissionais que disputam espaços de
suas normativas (lei de regulamentação da profissão,
reconhecimento e poder.
código de ética profissional e diretrizes curriculares da
Rojas
(2006)
afirma
que
pode-se
compreender como os direitos sociais são tidos como
significa efetivação e a ruptura com a cultura da tutela
não ocorreu.
concessões da elite política e econômica à uma
Schons
(1999),
que
investigou
a
importante parcela marginalizada da população.
universalidade de acesso da Política de Assistência
Assim, o processo de construção do sistema de
Social, recuperou o histórico da assistência desde a
proteção social no Brasil entre os anos de 1985 a
Proclamação de República no final do século XIX até
1999, se estabelece num cenário político em que o
último quarto do século XX, quando a Assistência
contexto apresentava uma base sustentada na
Social alcançou status de política pública. Entretanto,
desigualdade social, elevação da concentração de
o alcance da condição de direito encontra limites que
renda, desemprego, perda dos direitos trabalhistas e
requerem superação.
privatizações.
Embora o discurso oficial apresentasse
O processo constituinte se fez marco no
propostas democráticas e rompimento com a cultura
campo da democracia, em que a classe trabalhadora,
da tutela e do favor, no entanto, a ótica liberal
através dos movimentos sociais organizados,
continuava prevalecendo os interesses privados sobre
consegue por em pauta suas reivindicações, abrindo
os públicos. Por isso o sistema de seguridade social
canal de participação. A chamada Constituição
sofre
Cidadã trazia em seu bojo a esperança de resolução
desenvolvimento neoliberal assumido neste período e
das desigualdades existentes através do Tripé da
o Estado assume a posição de estado mínimo
Seguridade Social: Saúde – universal não
transferindo a sua responsabilidade para a Sociedade
contributiva; Previdência Social – contributiva e
Civil, através do estímulo a filantropia.
desmonte
através
do
projeto
de
Assistência Social – a quem dela precisar – não
Nos anos 1990, houve um processo de
contributiva e foi elaborada em meio aos conflitos
regressão no âmbito do Estado e da universalização
entre o paradoxo econômico e social.
dos direitos, desencadeando elementos contrários ao
A Constituição de 1988, traz para a
processo de democratização política, econômica e
sociedade brasileira o direito a universalidade nos
social no país, no contexto de crise e reorganização
direitos
do capitalismo em escala internacional. Isto
trabalhistas;
de
controle
sobre
a
governabilidade e o direito ao voto para os
desencadeia
analfabetos e a flexibilidade da formação dos partidos
determinadas por alterações no âmbito do trabalho,
políticos. No entanto, assegurar no campo legal não
pela reforma do Estado ou contrarreforma conforme
transformações
societárias,
Behring (2003 apud RAICHELIS 2010), pela
redefinição dos sistemas de proteção social e da
para com a população brasileira, a partir da inclusão
política social e pelas novas formas de enfrentamento
do texto constitucional que derivou, anos depois a
da questão social, com mudanças e rebatimentos nas
efetivação do direito a saúde para todos os brasileiros
relações público-privado.
/as através da Lei 8080/90, que instituiu o Sistema
Observa-se o processo de perda de direitos
Único de saúde – SUS, mas os ataques à
desencadeada pela reforma do Estado e da
implementação do sistema continuam no contexto de
economia, provocando o sucateamento dos serviços
terceirizações, privatizações e precarização dos
públicos e de ataque aos direitos consagrados na
serviços que comprometem a efetivação dos
Constituição de 1988, gerados pela mobilização social
princípios doutrinários e organizativos do sistema,
em torno da pela democratização da sociedade e do
atingindo diretamente a população usuária e as/os
Estado no Brasil, como também, o esvaziamento da
trabalhadores.
noção de direitos vinculada a uma ideia de que tudo o
que é público e estatal é desnecessário. Encolhe-se a
O agravamento da questão social fruto do
legitimidade dos direitos, o que o transforma em
processo de reestruturação produtiva e da adoção do
privilégio em nome do avanço e da modernização da
programa neoliberal repercute na profissão, tanto nos
economia, referenciada pelo mercado e suas
sujeitos com os quais o assistente social trabalha
demandas.
quanto no mercado de trabalho que, como para os
As ações de assistência social incluíram a
demais trabalhadores, sofre o impacto das
população vulnerabilizada, mas não mudaram a sua
metamorfoses
do
trabalho
assalariado
na
condição de subalternizado, através da provisão dos
contemporaneidade, submetendo a atividade
mínimos sociais definidos pela Lei Orgânica da
profissional aos dilemas da alienação (IAMAMOTO,
Assistência Social /93. Rojas (2006) enfatiza o
2007 e 2009).
período de Governo de Fernando Henrique Cardoso
Esta dinâmica atinge diferentes profissões
que feriu o princípio da justiça social e gerou aumento
que tem as políticas sociais como campo de
da pobreza. Portanto, no campo legal a assistência
intervenção. Nota-se que, a reestruturação produtiva
social, enquanto integrante da seguridade social, é
atinge o trabalho do assistente social, diretamente na
direito do cidadão e dever do Estado, no campo da
mudança e/ou redefinição de postos de trabalho,
efetividade continua o conceito da tutela.
como também na ampliação e diversificação, como é
No que se refere a saúde, a Constituição
o caso das políticas de seguridade social,
significou o reconhecimento de dívidas do governo
principalmente nos municípios, considerando as
requisições decorrentes da descentralização e
direitos, ampliação do trabalho voluntário e diversas
municipalização e necessidade de profissionalização
novas formas de gestão do trabalho a exemplo do
da implementação das políticas, diante das pressões
cooperativismo e do empreendedorismo, que ocultam
diretas das populações atingidas pelo desemprego,
novos modos de gestão e (auto) exploração do
pobreza, violência, insegurança do trabalho e da
trabalho. Verifica-se também aumento do desemprego
moradia.
estrutural, que atinge os trabalhadores, sejam homens
Com justificativas sustentadas na insuficiência
e mulheres, estáveis ou precarizados, formais ou
de recursos financeiros, físicos, humanos e materiais
informais, e a queda da qualidade do trabalho, dos
cria-se um mito de que estes poderiam garantir a
salários e das condições em que ele é exercido.
universalidade. Assim são desconsiderados os limites
inerentes
à
própria
condição
do
As condições do capitalismo contemporâneo
tardio
com a globalização financeirizada dos capitais e
desenvolvimento econômico e social que caracteriza
sistemas de produção apoiados no desenvolvimento
a realidade brasileira e desvincula-se da visão de que
tecnológico promovem mudanças nos processos de
esta lógica é resultante da formação sócio-histórica do
organização, gestão e nas relações e vínculos
Brasil, onde esta a raiz da desigualdade.
laborais resultando em nova forma do trabalho, com
Tem-se claro que existe uma zona de
trabalhadores
flexibilizados,
informalizados,
desproteção social, formada por pessoas (os
precarizados, pauperizados, desprotegidos de direitos
“desassistidos”) que permanecem alijadas da
e desprovidos de organização coletiva. Isso atinge o
Previdência Social e, também, da Assistência Social.
trabalho assalariado, sua realização e materialidade,
A segurança de rendimentos não é alcançada por
levando a novas definições dos sistemas de proteção
alguns pela impossibilidade de contribuição com a
social e das formas de organização e gestão dos
Previdência
processos de trabalho.
Social
(desempregados
e
subempregados) e, para outros, por não fazerem
O tripé da seguridade social aponta o
parte de critérios de acesso aos benefícios não
caráter de política de proteção social articulada a
contributivos da Assistência Social.
outras políticas voltadas à garantia de direitos e de
Nesse contexto marcado pela retração do
condições dignas de vida, iniciando seu trânsito para
trabalho contratado e regulamentado, típico do
o campo dos direitos, da universalização dos acessos
período taylorista e fordista, aumenta o trabalho
e da responsabilidade estatal. Porém, não tem sido
precário, parcial, temporário, bem como as
fácil essa passagem, seja pela herança conservadora
modalidades de flexibilização de vínculos e de
que impregnou a explicitação de direitos no Brasil,
seja pela desestruturação determinada pelo projeto
ações públicas. A terceirização dos serviços sociais
neoliberal que construiu um perfil desarticulado
públicos faz a separação entre serviço e direito,
evidenciando um caráter seletivo e fragmentador para
retirando-se a responsabilidade do Estado,
as políticas e suas intervenções com medidas
comprimindo ainda mais as possibilidades das ações
assistenciais compensatórias, em face dos efeitos dos
públicas serem inseridas no campo do direito.
ajustes estruturais da economia.
A partir dos anos 1990, as políticas públicas
Essa dinâmica atinge o trabalho do
e a luta por direitos ficaram mais complexas,
assistente social, afetado pela insegurança do
especialmente diante do fato que apesar dos
emprego,
contratação,
desmontes que têm atingido a esfera estatal, o Estado
intensificação do trabalho, baixa remuneração,
continua sendo a forma mais efetiva de operar a
pressão pela produtividade e resultados a curto prazo,
universalização dos direitos, mesmo em sociedades
ausência de horizonte de progressão e ascensão
capitalistas periféricas e financeirizadas como a
profissional e de políticas de qualificação e
brasileira.
modo
precário
de
capacitação profissional..
A reforma neoliberal do Estado brasileiro
No âmbito do Serviço Social, aumenta a
iniciada no governo de Fernando Henrique Cardoso
subcontratação dos assistentes sociais para a
trouxe em paralelo uma campanha ideológica de
prestação de serviços a organizações governamentais
desconstrução do Estado e do que é estatal,
e não governamentais, acenando para o exercício
acompanhada da supervalorização do mercado e do
profissional temporário, por projeto, em função das
que é privado nos âmbitos federal, estadual e
novas formas de gestão das políticas sociais.
municipal, atingindo as condições e relações de
As consequências desse processo para o
trabalho nos espaços governamentais.
trabalho social nas políticas públicas são profundas,
Desse modo, a análise das condições de
pois a terceirização altera o significado e o alcance do
trabalho e suas possibilidades de ampliação e
trabalho realizado, altera as relações com a
qualificação no âmbito das políticas sociais não pode
população, suas representações e a gestão, pela
se afastar da dinâmica macrossocietária, nem ser
intermediação de empresas e organizações
tratada como algo específico do trabalhador.
contratadas. Também as ações passam a ter
É importante para o profissional exercitar a
subordinação a prazos e aos recursos financeiros
capacidade de leitura crítica da realidade, sem
podendo significar descontinuidade, rompimento de
naturalizações e criminalizações da pobreza, das
vínculos e descrédito da população para com as
formas de violência e de violação de direitos
de
adolescentes, mulheres, idosos, pessoas em situação
cotidianamente, um confronto com a hegemonia
de rua, por exemplo, mas procurando compreender
burguesa e construção de uma contra hegemonia.
criticamente os processos sociais de sua produção e
reprodução na sociedade brasileira.
As/Os assistentes sociais, tendo em vista
prerrogativas legais, éticas e técnicas, são
É preciso criticar e resistir ao produtivismo e
desafiadas/os a construir estratégias profissionais
ter claro o sentido e a direção social ético-política do
que, prioritariamente, atendam as abordagens
trabalho coletivo. A luta pela qualificação e
coletivas e a participação dos usuários, no sentido de
capacitação continuada, faz parte da luta pela
reverter relações que subalternizam a população.
melhoria das condições de trabalho e da qualidade
dos serviços prestados à população.
É relevante ressaltar que as políticas sociais
são mediações da profissionalização do Serviço
Também é importante discutir e estabelecer
Social, mas não se confundem com elas: serviço
estratégias de organização coletiva frente a
social é profissão e política pública é responsabilidade
precarização do trabalho, no contexto do conjunto dos
do Estado e dos governos.
trabalhadores das políticas sociais. Embora a
O direito social é resultante de processo
perspectiva neoliberal se utilize de instrumentos para
histórico de luta da classe trabalhadora e para que as
dividir os trabalhadores e suas entidades, é por meio
políticas se efetivem a sociedade civil deve se
da ação coletiva que se criam condições para a
apropriar dos canais de participação e controle social,
melhoria das condições de trabalho.
preconizados pela legislação, tornando evidente a
necessidade de trabalhar na lógica da promoção da
3 Considerações finais
participação da Sociedade Civil nos espaços públicos
de controle das ações do Estado para fazer valer seus
Os avanços do Serviço Social brasileiro e a
direitos.
direção ético-política da profissão repudiam
O diálogo com a história do Serviço Social
abordagens conservadoras e autoritárias, que
passa pela história da sociedade e do pensamento
individualizam a questão social, culpabilizando ou
social na modernidade. Exige um profissional
criminalizando as famílias e indivíduos pela sua
politicamente atento ao seu tempo; com competência
condição. Um desafio que se apresenta é pensar
técnico-política para apresentar os rumos e
como o projeto ético político profissional pode
estratégias de ação a partir analise da realidade,
valorizar o profissional diante do capital. Isto exige,
decifrando as manifestações sobre a ação
profissional. Essa perspectiva recusa o messianismo
utópico e a visão ingênua das possibilidades do
Referências
exercício profissional.
Temos que nos apropriar dos fundamentos
da profissão e dominar a teoria que esta na base do
projeto ético político da profissão expressa nas
produções e nas entidades. Esta é a forma de fazer a
leitura da realidade e identificar possibilidades do
cotidiano. O projeto ético político inscreve os valores
que a profissão abraça e reconhece, dá a direção
política à profissão e instiga a
reflexão. Exige
capacidade critica que permita compreender o
significado social do trabalho profissional.
Portanto, embora a Seguridade Social, no
seu aspecto legal, tenha alcançado o status de
Política ainda reside em algo a ser superado, para
BEHRING, Elaine R. Brasil em contra-reforma:
desestruturação do Estado e perda de direitos. 2. ed.
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profissional. São Paulo: Cortez, 2006.
que o status de público e universal seja uma realidade
e se vincule a consolidação da cidadania.
A transformação das políticas públicas em
atendimento fragmentado e seletivo a demandas que
não contribuem para a superação da pobreza nem
dignificam os homens e mulheres que dela fazem uso,
as transformas numa falsa política que contribui com
o estabelecimento e a manutenção de práticas
conservadoras, manipuladoras e de adequação ao
neoliberalismo.
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POR UMA RAZÃO NÃO
INSTRUMENTAL:
REFLEXÕES PROPEDÊUTICAS
ACERCA DO PENSAMENTO DE
JÜRGEN HABERMAS FILÓSOFO E SOCIÓLOGO ALEMÃO
CONTEMPORÂNEO
Norma Sueli Mendes da Silva1
Resumo
O presente trabalho tem como finalidade refletir acerca
de algumas das categorias teóricas do pensador
contemporâneo Jürgen Habermas, no que concerne à
sua teoria crítica e reflexiva da modernidade. Numa
leitura crítica do pensamento e construções teóricopráticas em Habermas (1993, 2002, 2003, 2004), vale
considerar também, a abertura crítico-reflexiva da sua
bibliografia. Nesse sentido pudemos evidenciar que a
análise de temas éticos e morais ocupam lugares
centrais no seu pensamento, que vem exercendo
expressiva influência entre teóricos e profissionais das
Ciências Humanas. Daí reside o nosso interesse por
essa temática estudando em caráter propedêutico
questões relacionadas ao estilo dialógico do
1
Educadora Pesquisadora do NIAC - Núcleo de Investigações Avançadas da
Consciência do CEPPEV/FVC junto às áreas de Filosofia. Ética. Desenvolvimento
Humano e Responsabilidade Social. Coordenadora do curso de especialização pós
flex em Metodologia do Ensino de filosofia e Sociologia. Vídeo-Conferencista na
modalidade EAD, bem como, atuando na modalidade presencial no ensino
superior em cursos de graduações, pós-graduações e educação profissional, bem
como formação continuada de educadores (as) e pessoas da Melhor
Idade..Especialista em Metodologia do Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação
pela UNEB. Especializanda em Filosofia Contemporânea pela Faculdade São
Bento. Mestre em Desenvolvimento Humano e Responsabilidade Social pelo
CEPPEV – FVC. E-mail para contato: [email protected]
.
pensamento desenvolvido por Habermas, sobretudo
aquele que denomina, em sua reflexão, sobre o
discurso de Ética do Discurso. Valendo considerar que
esta ética do discurso não dá nenhuma orientação
conteudística, mas sim, indicativos de um
procedimento rico de pressupostos, que deve garantir
a imparcialidade na formação do juízo moral
(HABERMAS, 2003). O caminho metodológico
percorrido partiu da observação da carência de paz
existente nas relações sociais, bem como a ênfase que
se tem dado na crença da razão meramente
instrumental, ou seja, na lógica da lucratividade
proporcionada pela demanda mercadológica,
racionalidade esta que se configura na ostentação do
ter em detrimento do ser. Para tanto, realizou-se uma
pesquisa bibliográfica, utilizando como aporte teórico
as obras de sua autoria, e, também, dos autores:
Aragão (2002), Habermas (1973, 1993, 2002, 2003,
2004, 2009, 2010,), Passos (2004), Silva (2010), numa
abordagem qualitativa, considerando tais fatores
pesquisados. Como resultados, vimos o quanto é
necessário um trabalho teórico que busque realizar
análises que possam auxiliar no desenvolvimento
humano diante de uma reflexão acerca da consciência
moral, teoria da ação comunicativa, teoria crítica,
dentre outras dimensões trabalhadas por Habermas.
Logo, compreender quão rica, bela e significativa
contribuição tem prestado para a sociedade
contemporânea, na medida em que os sujeitos sejam
capazes de atuar, quer seja no campo profissional ou
no campo social, em prol do desenvolvimento humano
e responsabilidade social considerando-se os desafios
presentes, dos atuais dirigentes e cidadãos da polis no
âmbito do século XXI.
Palavras-Chave: Teoria Crítica Social. Interesses:
Técnicos, Comunicativos e Emancipatórios. Ação
Comunicativa.
Abstract
The present article has as its purpose to reflect upon
some of the theoretical category of the contemporary
thinker Jürgen Habermas regarding his critical and
reflective modernity theory. From a critical point of view
of Habermas (1993, 2002, 2003, 2004) thought and
theoretical-practical construction, it is also worthwhile to
consider the critical-reflective opening of his
bibliography. In this regard, we could show that the
analysis of moral and ethic themes is in the center of
his thought, which has been exercising an expressive
influence amongst thinkers and professionals of Social
Sciences. There lies our interest for this theme studying
in a propaedeutic way questions related to the
dialogical thinking approach developed by Habermas,
specially the one he denominates, in his reflection,
about the discourse of Discourse Ethics. Considering
that this discourse ethics does not rely on the excess of
content, but an indicative of a procedure full of
assumptions that must ensure the impartiality in
shaping the moral judgment (HABERMAS, 2003). The
methodology approach came from observing the lack of
peace in social relationships, as well as the emphasis
that it has been given to the belief in merely
instrumental reason, that is to say, in profitability logic
provided by the market demand, in a rationality that is
distinguished by the ostentation of having instead of
being. For this purpose, a bibliographical research was
conducted using his body of work, as well as, the
following authors: Aragão (2002), Habermas (1973,
1993, 2002, 2003, 2004, 2009, 2010,), Passos (2004),
Silva (2010), based on a qualitative approach,
considering such researched factors. In the final
results, we observed how essential it is the theoretical
work that seeks to perform analysis that may assist in
the human development, against a reflection on moral
consciousness, critical theory, amongst others
dimensions studied by Hamermas. Thus,
understanding how valuable, graceful and significant
contribution has been provided to contemporary
society, in the way its individuals may act, whether at
professional field or social field, in favor of the human
development and social responsibility considering the
existing challenges of the current administration and
citizen of the polis in the scope of the 21th century.
Key-words: Critical Social Theory. Interests: Technical,
Communicative and Emancipatory. Communicative
Action.
1 Introdução
No âmbito da teoria crítica proposta por
Habermas, enquanto construto teórico acerca do
mundo da vida e do mundo do trabalho, bem como,
enquanto uma interação dialógica, comunicativa das
suas análises, vale considerar que a análise de temas
éticos e morais ocupam um lugar essencial no seu
pensamento, que vem exercendo significativo alcance
entre teóricos e profissionais das diversas áreas do
conhecimento, principalmente das ciências humanas.
Assim, nos sinaliza Habermas:
No processo histórico-universal do
conhecimento, a espécie humana distanciouse cada vez mais das origens e, no entanto,
não se livrou da compulsão mítica para a
repetição. O mundo moderno, o mundo
completamente racionalizado é desencantado
apenas na aparência; sobre ele paira a
coisificação demoníaca e do isolamento mortal
[...]. A pressão para dominar racionalmente as
forças naturais que ameaçam do exterior pôs
os sujeitos na via de um processo de formação
que intensifica até a desmesura as forças
produtivas por mor da pura autoconservação,
mas deixa definhar as forças da reconciliação
que transcendem a mera autoconservação. A
dominação sobre uma natureza exterior
objetivada e uma natureza interior reprimida é
o signo permanente do esclarecimento.
(HABERMAS, 2002, p.158)
1954 doutorou-se em filosofia na universidade de
Bona.
Ainda, de acordo com Aragão (2002),
Habermas estudou com o filósofo Adorno e foi
Daí residir o nosso interesse por esse teórico
pesquisando numa perspectiva propedêutica algumas
das questões fundamentais da sua concepção
filosófica as quais terminam se constituindo do seu
arcabouço teórico enquanto exercício éticoepistemológico face aos desafios presentes nas
sociedades de um modo geral.
No que diz respeito a algumas tessituras, como
já evidenciado de forma propedêutica da nossa
investigação, no que concernem as questões
habermasianas, podemos desde já evidenciar, através
levantamentos biográficos e bibliográficos que o
pensamento de Jürgen Habermas suplanta inúmeras
fronteiras, o que para esse trabalho se constitui em
vasto campo de reflexão de sentido de busca
interessada das suas teorizações.
Conforme Aragão (2002), Habermas foi
durante os anos 60 um dos principais teórico e depois
crítico do movimento estudantil. Considerado como um
dos últimos representantes da escola de Frankfurt.
Também, considerado, pela comunidade acadêmica e
por pesquisadores, como um dos mais importantes
pensadores alemães contemporâneos, nasceu em
Düsseldorf, em 18 de Junho de 1929. Estudou filosofia,
sociologia, história e literatura, interessou-se pela
psicologia e economia nas Universidades de Gotingen
- com Nicolai Harttman-, de Zurique e de Bona. Em
assistente no Instituto de Investigação Social de
Frankfurt de 1956 a 1959. Em 1961 obteve licença
para ensinar na Universidade de Marburg e, em
seguida, foi nomeado professor extraordinário de
filosofia da Universidade de Heidelberg de 1961 a
1964. Foi nomeado depois professor titular de filosofia
e sociologia da Universidade de Frankfurt de 1964 a
1971. Desde 1971 é co-diretor do Instituto Max Plank
para a Investigação das Condições de Vida do Mundo
Técnico-Científico, em Starnberg.
Diante da complexidade filosófica do
pensamento de Habermas, nos instiga averiguar
acerca das suas concepções teóricas, no que diz
respeito a sua crítica social, onde assume uma defesa
da modernidade procurando criar uma teoria da razão
cujas dimensões abranjam teoria e prática, justificativa
e explicativa e que deem suporte intersubjetivo as
questões que emergem da modernidade e terminam se
estabelecendo no âmbito da constituição do cenário
contemporâneo, haja vista, o modo de ser, agir e
interagir da sociedade ante os pressupostos que a
fundamenta.
Assim, verifiquemos o que Habermas (1993, p.
105) nos faz refletir, quando entrevistado por Haller,
para responder a seguinte questão:
Haller – [...] Seria errado pensar que na
sociedade delineada conforme o seu modelo
os sujeitos não se comportariam mais como
pessoas, mas como máquinas de pensar
totalmente racionalizadas? Habermas
responde: - Em
primeiro lugar, eu não afirmo que as pessoas
gostariam de agir comunicativamente, mas
que elas são obrigadas a agir assim. Quando
os pais querem educar os seus filhos, quando
as gerações que vivem hoje querem se
apropriar do saber transmitido pelas gerações
passadas, quando os indivíduos e os grupos
querem cooperar entre si, isto é, viver
pacificamente com o mínimo de emprego de
força,
são
obrigados
a
agir
comunicativamente.
Evidencia-nos o pensador Habermas que a
dialogicidade intersubjetiva se encontra necessáriamente presente no âmbito das inter-relações sociais e
nas diversas dimensões e construções humanas,
enquanto agir comunicativamente, no que concerne ao
processo desse desenvolvimento humano.
2 Das Concepções de Valores Humanísticos
presentes no Pensamento de Habermas.
Um importante aspecto a ser observado na
concepção filosófica e social de Habermas é que a
noção de interesse é nuclear no seu pensamento. O
que equivale a dizer que todo conhecimento é dirigido
por interesses. Contudo contrariamente a Karl Marx
(1818-1883), Habermas não direciona o conhecimento
pondera que os interesses surgem de problemas que a
humanidade enfrenta e a que tem que dar resposta.
Desta forma, os interesses são estruturados
por processos de aprendizagem e compreensão
mútua. Nesse sentido, verificamos o sentido da
alteridade como, também, uma das preocupações
centrais do seu pensamento intersubjetivo. Habermas
afirma o princípio da racionalidade dos interesses,
distinguindo assim neste contexto três grandes tipos de
interesses, a saber:
Os interesses técnicos surgem do desejo de
domínio e controlo da natureza. Trata-se de
interesses técnicos na medida em que a
tecnologia se apoia ou está ligada à ciência.
Todo o conhecimento científico enquadra-se
nesta esfera de interesses.
Os interesses comunicativos levam os
membros duma sociedade a entenderem-se (e
às vezes a não entenderem-se) com outros
membros da mesma comunidade, o que
origina entendimentos e desentendimentos
entre as várias comunidades. Nesta esfera de
interesses estão as chamadas ciências do
espírito (ciências humanísticas, culturais, etc).
Os
interesses emancipatórios ou
libertadores estão ligados à auto-reflexão que
permite estabelecer modos de comunicação
entre os homens tornando razoáveis as suas
interpretações. Estes interesses estão ligados
à reflexão, às ciências críticas (teorias sociais),
e pelo menos em parte, ao pensamento
filosófico. Esta auto-reflexão pode converter-se
numa ciência, como ocorre com a psicanálise
e a crítica das ideologias, mas uma ciência
que é capaz transformar as outras ciências. O
interesse emancipatório resulta de ser um
interesse justificador, explicativo enquanto
justificador. (FONTES, 2011, p. 1)
propriamente na esfera da produção, numa dimensão
ideológica desse teor, nem tão pouco reduz os
interesses na esfera das lutas de classes. Trabalha a
categoria de interesses de maneira ampla, donde
Desta maneira, podemos articular que o
pensamento de Habermas aponta, assim, para uma
auto-reflexão da espécie humana, dos níveis de
racionalidade que a mesma atinge quer seja no âmbito
moral – interesses cuja esfera é as das ciências do
políticas ou econômicas”. Vale considerar, ainda, a
espírito, humanísticas. Vale mencionar que conforme
seguinte dimensão:
Habermas (2007, p. 135): "No plano filosófico, ao
contrário, a consciência secular, segundo a qual viveu
em uma sociedade pós-secular, sedimenta-se,
assumindo a forma de um pensamento metafísico." Ou
seja, continuamos a buscar apoio junto à tradição que
A partir da reflexão e da busca de
compreensão da teoria habermasiana, é
perceptível que ocorra grifos meus, uma maior
integração por parte dos sujeitos que se
encontram comprometidos com um processo
educativo democrático e cidadão, de fato, em
um sistema social, no qual cada uma das
ações repercute necessariamente sobre outros
indivíduos. (SILVA 2010, p. 80)
possa respaldar o nosso viver na sociedade
contemporânea.
Com relação ao aspecto de reflexões acerca
Igualmente, ainda com relação ao seu
da cidadania, Habermas (2004, p 35) acredita que: “a
pensamento no âmbito filosófico social, considera a
cidadania é uma posição definida pelos direitos civis.
auto-reflexão enquanto ciência capaz de transformar
Mas temos de considerar também que os cidadãos são
as outras ciências; e no âmbito dos interesses técnico-
pessoas que desenvolveram sua identidade pessoal no
científico na medida em que a comunidade científica
contexto de certas tradições”.
anseia pelo domínio e controle da natureza. Assim,
Considerando, ainda, a relevância do
indaga Habermas (2004, p. 33): - O que significa
pensamento de Habermas, donde vale salientar que a
moralização da natureza humana? Responde que:
sua teoria crítica da modernidade, trata-se de uma
Os avanços espetaculares da genética
molecular conduzem aquilo que somos “por
natureza” cada vez mais ao campo das
intervenções biotécnicas (...) sob a perspectiva
do mundo da vida, certamente nossa atitude
muda tão logo a tecnicização ultrapassa o
limite entre a natureza “externa” e a “interna”.
Na Alemanha, o legislador proibiu não apenas
o DGPI e o uso de embriões exclusivamente
para pesquisas, mas também as questões
relativas à clonagem terapêutica, à “barriga de
aluguel” e à “eutanásia”. (HABERMAS, 2004,
p. 33-34)
teoria crítica da sociedade que é proposta por ele de
modo que a ação comunicativa entre os interlocutores
sociais seja analisada segundo suas relações
intersubjetivas donde essa teoria funcionaria como um
balizamento às ações orientadas para um
entendimento mútuo – um conjunto de regras morais
para a vida, que afirmam a infraestrutura da linguagem
humana, do conhecer, do agir, da cultura e do ser.
Deste modo, significa apreender que a
emancipação humana se faz na totalidade das
3 Das Concepções Teóricas presentes na Filosofia
e Sociologia de Habermas
relações sociais onde a vida é produzida. Nesse
aspecto vale mencionar Passos (2004, p. 21) quando
Habermas tem como formação acadêmica a
exprime que: “Há exigência de valores morais em
filosofia e a sociologia. É considerado como o principal
todas as instâncias sociais, sejam elas científicas,
herdeiro da Escola de Frankfurt, a qual se constituiu
como uma das principais correntes do Marxismo
Cultural - vertente do marxismo que procura aplicar a
Teoria Crítica, desenvolvida por essa Escola, à análise
das sociedades. Procurou superar o pessimismo dos
fundadores dessa Escola, quanto às possibilidades de
homens são seres que se encontram e se
interagem em um mundo constituído tanto pela
ação quanto pela argumentação permeada de
racionalidade, que se atualiza historicamente
por meio de suas dimensões que se
reproduzem as formas de vida culturais e os
sistemas de saberes [...] A filosofia reflete
sobre esse mundo e sobre suas partes.
realização do projeto moderno, tal como formulado
Vale salientar que Habermas é um teórico
pelos iluministas.
Seus
estudos
direcionam-se
para
o
conhecimento e a ética. Sua tese para explicar a
produção de saber humano recorre ao evolucionismo,
pois a racionalidade comunicativa é considerada uma
racionalidade aprendiz.
Vale mencionar aqui que os pensadores
frankfurtianos, fortemente marcados pela calamidade
crítico do cientificismo positivista por considerá-lo
redutor da razão. Sendo assim é que concebe a razão
comunicativa e a ação comunicativa, ou seja, a
comunicação livre, racional e crítica - como alternativa
à razão instrumental e superação da razão iluminista –
concebida pela lógica ou razão instrumental, que
esconde a dominação, acreditando que:
que representou a Segunda Guerra Mundial - Adorno e
[...] somente ao agir comunicativo é aplicável
Horkheimer consideravam que houvesse um vínculo
o princípio segundo o qual as limitações
estruturais de uma linguagem compartilhada
intersubjetivamente levam os atores - no
sentido de uma necessidade transcendental
tênue – a abandonar o egocentrismo de uma
orientação pautada pelo fim racional de seu
próprio sucesso e a se submeter aos critérios
públicos da racionalidade do entendimento.
Podemos, pois, tomar as estruturas suprasubjetivas da linguagem na perspectiva da
teoria da ação e tentar encontrar a partir delas
uma resposta à questão clássica: como em
possível a ordem social? (HABERMAS, 2002,
p. 82-83)
primordial entre conhecimento racional e dominação, o
que teria determinado a falência dos ideais modernos
de emancipação social.
Contudo, Habermas se ocupa do ideal
emancipatório da razão, adotando o modelo
comunicacional como modelo paradigmático, tendo
como ponto de partida a ética comunicativa de Karl
Otto Apel (DUSSELDORF, 1922), filósofo alemão e
professor contemporâneo emérito da Johann Wolfgang
Ao pretender a recuperação do conteúdo
Goethe-Universität de Frankfurt em Main. Afirmando o
emancipatório do projeto moderno, no fundo,
pensamento de Habermas, Lourenço e Zancanaro (
Habermas está preocupado com o restabelecimento
2007, p.124) refletem que:
dos vínculos entre socialismo e democracia. Nessa
Desde os gregos a tarefa fundamental da
filosofia é refletir a condição humana e apontar
alternativas para a superação das crises que
marcam a existência dos seres humanos. Os
perspectiva, reflitamos sobre o que considera
Habermas (2010, p. 201), enquanto questões
de
caráter eminentemente ético-políticas: “a identidade de
Vale considerar, também, com relação à
um grupo refere-se às situações nas quais os membros
formação acadêmica de Habermas e do seu construto
podem dizer enfaticamente “nós”; ela não constitui uma
teórico que os mesmos se desenvolvem no âmbito das
identidade-eu em tamanho grande, e sim, o seu
suas experiências nas diversas áreas do conhecimento
complemento”.
filosófico, como por exemplo: a epistemologia, filosofia
Igualmente, enfatiza, também, com relação a
moral e política, teoria social, dentre outras. Como já
nossa racionalidade, saber, que: “[...] a posse reflexiva
foi dito anteriormente, Habermas, defende e propõe a
de juízos verdadeiros não seria possível se não
mudança de paradigma, já que para ele:
pudéssemos representar nosso saber em proposições,
Os projetos das ideias modernas não se
e se não pudéssemos corrigi-lo e ampliá-lo” Habermas
concretizaram ainda em face da necessidade em
(2004, p. 105).
desenvolvermos novos fundamentos acerca da nossa
Ainda de acordo com o seu pensamento, duas
compreensão de razão, ser humano e da sociedade.
esferas coexistem na sociedade: o sistema e o mundo
Propõe, também, que atrelemos [...] o pensamento a
da vida. Este último enquanto esfera de reprodução
uma lógica de descentralização em relação ao ego
simbólica, da linguagem, das redes de significados que
HABERMAS (2004, p. VIII).
compõem determinada visão de mundo, sejam eles
É bastante conhecida a análise habermasiana
referentes aos fatos objetivos, às normas sociais ou
da colonização do mundo da vida pelo sistema e a
aos conteúdos subjetivos. Assim, Habermas sinaliza
crescente instrumentalização desencadeada pela
acerca das suas reflexões nas dimensões da esfera
modernidade, sobretudo com o surgimento do direito
pública, que “O universal que o público se ocupava
positivo, que reserva o debate normativo aos técnicos
criticamente, continuou a ser monopólio de
e especialistas. Contudo, desde a década de
interpretação de autoridades eclesiásticas e
Os componentes de visões do mundo, que
governamentais” (2003, p. 52).
asseguram identidade e são eficazes para a
O sistema enquanto produção material, que é
integração social, isto é, sistemas de moral e
suas correlatas interpretações, seguem com
regido pela lucratividade, pela lógica mercadológica,
crescente complexidade um padrão que tem
denominada de lógica instrumental, donde ocorre a
um paralelo ao nível ortogenético na lógica do
adequação de meios a fins, incorporada nas relações
desenvolvimento da consciência moral.
hierárquicas (poder político) e de intercâmbio
(HABERMAS, 2002 p. 24)
(economia).
Sobre sua teoria discursiva, aplicada também à
filosofia jurídica, pode ser considerada em prol da
diversos campos de pesquisa. [Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Deutsche_Forschu
ngsgemeinschaft> Acesso em: 29 mar 2011].
integração social e, como consequência, da
democracia e da cidadania. Tal teoria coloca a
possibilidade de resolução dos conflitos vigentes na
sociedade não com uma simples solução, mas a
melhor solução - aquela que resulta do consenso de
todos os concernidos. Esclarece que:
O princípio da ética do Discurso refere-se a um
procedimento, a saber, o resgate discursivo de
pretensões de validez normativas; nessa
medida, a ética do Discurso pode ser corretamente caracterizada como formal. Ela não
indica orientações conteudísticas, mas um
processo: o Discurso prático. HABERMAS
(2003, p. 126)
Propondo uma participação mais ativa e
igualitária de todos os cidadãos nos litígios que os
envolvem e, concomitantemente, obter a tão almejada
justiça. Essa forma defendida por Habermas é o agir
comunicativo que se ramifica no discurso.
Quanto ao reconhecimento acerca da sua
trajetória profissional, Habermas foi laureado no ano de
1986, com a seguinte premiação:
Prêmio Gottfried Wilhelm Leibniz, em alemão:
Förderpreis für Deutsche Wissenschaftler im
Gottfried Wilhelm Leibniz-Programm der
Deutschen Forschun O Prêmio Gottfried
Wilhelm Leibniz, em alemão: Förderpreis für
Deutsche Wissenschaftler im Gottfried Wilhelm
Leibniz-Programm
der
Deutschen
Forschungsgemeinschaft, gsgemeinschaft,
abreviado como Prêmio Leibniz, é denominado
em memória de Gottfried Wilhelm Leibniz
(1646–1716). Desde 1986 é concedido
anualmente
pela
Deutsche
Forschungsgemeinschaft a pesquisa-dores
que trabalham na Alemanha, contemplando
O referido prêmio é dotado com 2,5 milhões de
Euros (até 1996 sua cifra monetária foi 1,55 milhões de
Euros). É a condecoração internacional dotada com o
maior valor financeiro. Seu valor monetário deve ser
integralmente aplicado em projetos de duração máxima
de sete anos (até 2006 o tempo era limitado a cinco
anos). Habermas também foi premiado em 2004 com o
Prêmio Kyoto:
Concedido anualmente pela Fundação
Inamori, desde 1984. O prêmio é o equivalente
japonês ao Prêmio Nobel, reconhecendo
trabalhos inovadores nos campos da filosofia,
arte, ciência e tecnologia. O prêmio é dado
não apenas àqueles que representam seu
próprio campo, mas também a quem contribui
para a humanidade com seu trabalho. Essa
premiação é distribuída em quatro áreas, a
saber: Tecnologia Avançada; Ciência Básica,
Arte e Filosofia. Em cada uma dessas
categorias existem subcategorias que são
variáveis. Por exemplo, o prêmio de tecnologia
abrange eletrônica, biotecnologia, ciência
material e engenharia, e ciência da
informação. O prêmio é dotado com 50
milhões de yens e por ações da Kyocera, está
sendo crescentemente prestigiado, enquanto
cobrindo
campos
geralmente
não
contemplados pelo Prêmio Nobel. [Disponível
em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Pr%C3%AAmio_Ky
oto> Acesso em 20 abr 2011].
Posteriormente, em 2009 ganha prêmio na
Alemanha:
O Prêmio da Paz do Comércio Livreiro,
Alemão, de 2009 foi concedido ao
filósofo e sociólogo Jürgen Habermas.
Ele é o 52º titular da mais importante
condecoração do setor cultural da
Alemanha. Os leitores em todo o
mundo o apreciam como "o filósofo
alemão mais significativo da época",
como afirma o júri literalmente em sua
justificativa. (SCHROFF, 2009, p. 1)
quer seja no campo pessoal, profissional ou no campo
societal, em prol do desenvolvimento humano e
responsabilidade social considerando-se os desafios
atuais os quais se inserem dirigentes governamentais,
não governamentais, os diversos seguimentos
No que diz respeito às questões da
intersubjetividade humana, bem como as dimensões
dos interesses, vale aqui enfatizar, que esse trabalho
nos proporcionou ampliar as nossas compreensões
quer sejam epistemológicas – construto teórico e/ou
axiológicas – teoria dos valores, no que tange algumas
das categorias do âmbito, político, social e moral
profissionais, institucionais, enfim todo e quaisquer
cidadãos que se encontram inseridos nas esferas
contemporâneas e que atuam nos âmbitos
econômicos, políticos, ideológicos, ambientais, sociais,
dentre outros conforme os desafios presentes, dos
atuais dirigentes e cidadãos da polis no âmbito do
século XXI.
contemporâneos face aos altos índices de caos sociais
presentes nas intersubjetividades dos sujeitos que
fazem parte dessas questões que se encontram
subjacentes ao pensamento de Habermas em prol de
uma razão Não-Instrumental, que possa realizar os
Referências
ARAGÃO, Lúcia. Habermas: filósofo e sociólogo do
nosso tempo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2002.
FONTES, Carlos. FREITAG. B. ROUANET. S.P. Habermas. Editora Ática: São Paulo, 1980.
anseios daqueles que primam pelo belo, rico e
significativo conviver social.
4 Considerações finais
Vimos o quanto é necessário realizar
pesquisas que possam auxiliar no desenvolvimento
humano diante de uma reflexão acerca da consciência
moral, teoria da ação comunicativa, teoria crítica,
dentre outras dimensões trabalhadas por Habermas.
Logo, compreender quão rica, bela e
significativa contribuição o pensador social Habermas
tem prestado para a sociedade contemporânea, na
medida em que os sujeitos sejam capazes de atuar,
HABERMAS. Jurgen. Prêmio Gottfried Wilhelm
Leibniz da Deutsche Forschungsgemeinschaft de
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entre facticidade e validade, Volume II. Tradução de
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo
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Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2004. – (Coleção
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Tradução de Karina Jannini. Revisão de tradução de
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MARQUES. Edi Carlos A. ZANCANARO. Lourenço. A
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SILVA. Norma Sueli Mendes da. Capítulo VII.
Consciência Moral Habermasiana: Contribuições Para
o Desenvolvimento Humano e a Responsabilidade
Social na Formação Profissional In.: ROCHA. Nívea
Maria Fraga e BARRETO. Maribel Oliveira
(Organizadoras). Desenvolvimento Humano e
Responsabilidade Social: fazendo recortes na
Multidisciplinaridade, volume 9. Salvador: Fast Design,
2010. p. 69-81.
AS CONDIÇÕES DE TRABALHO DO
ASSISTENTE SOCIAL NOS
CENTROS DE REFERÊNCIA DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL EM
SALVADOR:
UMA ANÁLISE SOBRE A
CONSOLIDAÇÃO DO SISTEMA
ÚNICO DA ASSISTÊNCIA SOCIAL
inseridos nos Centros de Referência da Assistência
Social de Salvador, evidenciando os principais
entraves para a consolidação do Sistema Único da
Assistência Social.
Palavras-chave: Estado. Neoliberalismo. Política
Nacional de Assistência Social. Precarização.
Trabalho. Serviço Social.
Abstract
Neila Tiara Santos Soledade1
Resumo
O presente estudo tem como objetivo abordar o tema:
“As condições de trabalho do Assistente Social nos
Centros de Referência da Assistência Social em
Salvador: Uma análise sobre a consolidação do
Sistema Único da Assistência Social”, na perspectiva
de discutir a possibilidade de consolidação do Sistema
Único da Assistência Social. No percorrer de um
caminho crítico foi trazido por meio dos teóricos o
debate sobre a reestruturação produtiva na elucidação
da ocorrência desse fenômeno com dimensões global
e inerente ao desenvolvimento do sistema capitalista,
bem como a posicionamento do Estado Neoliberal
nesse contexto. Discutiu-se ainda um breve histórico
da Política Pública de Assistência Social no Brasil.
Para tanto, foram analisados dados do Censo SUAS –
CRAS 2012 e os Relatórios de Monitoramento
Integrado da SEDES. Os resultados desse estudo
culminam com a construção de um panorama das
condições de trabalho dos Assistentes Sociais
Bacharel em Serviço Social pela Faculdade Regional da Bahia –
UNIRB. E-mail: [email protected]
The present study aims to address the theme: "The
working conditions of the social worker in the
Reference Centres for Social Assistance in Salvador:
An analysis of the consolidation of the Unified Social
Assistance", in view of discussing the possibility of
consolidation Unified Social Assistance. Go on a critical
path were brought through the theoretical debate about
the restructuring process in the elucidation of this
phenomenon with global dimensions, and inherent in
the development of the capitalist system, as well as the
positioning of the liberal State in this context. It also
discussed a brief history of the Public Policy Social
Welfare in Brazil. Therefore, we analyzed data from the
Census ITS - CRAS and 2012 Monitoring Reports
Integrated SEATS. The results of this study culminate
with the construction of an overview of the working
conditions of social workers entered the Centers for
Social Assistance Reference Salvador, highlighting the
main obstacles to the consolidation of the Unified
Social Assistance.
Keywords: State. Neoliberalism. National Policy for
Social Assistance. Precariousness. Work. Social
Service.
1
1 Introdução
Assistência Social no Brasil, a partir de 2004,
ampliou-se com a constituição do Sistema Único da
benefícios, programas e projetos da Proteção Social
Básica.
Assistência Social (SUAS). Diante da implantação
Sendo assim, este trabalho teve como objetivo
desse novo modelo de gestão, houve um aumento
geral analisar as condições de trabalho do Assistente
significativo na contratação de profissionais para
Social nos Centros de Referência da Assistência
desenvolvimento do trabalho social, sendo requerido
Social, buscando evidenciar possíveis limites para
entre esses os Assistentes Sociais.
consolidação do Sistema Único da Assistência Social.
O
presente
pela
Como objetivos específicos, buscou-se: relacionar os
necessidade de aprofundamento teórico e análise
fatores históricos, socioeconômicos que permearam a
crítica acerca das condições de trabalho precarizada
construção da Política Nacional de Assistência Social
dos
na
no Brasil; apresentar as condições de trabalho do
contemporaneidade, trazendo à reflexão os processos
Assistente Social no CRAS, assim como discutir como
históricos que contribuíram com as mudanças no
as implicações causadas pelo processo de
mundo do trabalho e como essas mudanças afetam os
precarização do trabalho do Assistente Social nos
profissionais do Serviço Social, enquanto trabalhadores
CRAS refletem na consolidação do Sistema Único da
assalariados.
Assistência Social.
Assistentes
estudo
Sociais
justifica-se
nos
CRAS
Neste estudo busca-se responder o seguinte
Para desenvolvimento do presente estudo,
problema de pesquisa: a precarização no processo de
utilizou-se, segundo a natureza dos dados, de
trabalho do Assistente Social nos CRAS em Salvador
pesquisa qualitativa. A pesquisa bibliográfica foi
pode ser considerada como um limite para a
desenvolvida a partir de material já elaborado,
consolidação do Sistema Único da Assistência Social?
constituído por meio de revisão de artigos científicos e
No desenvolvimento da pesquisa partiu–se da
livros, além da pesquisa documental que teve como
hipótese de que a precarização no processo de
fonte o Censo SUAS – CRAS/2012 do Ministério do
trabalho do profissional do Serviço Social nos CRAS de
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e
Salvador consiste em um limite para a consolidação do
os relatórios de Monitoramento Integrado da Secretaria
Sistema Único da Assistência Social, uma vez que a
de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza
falta de condições dignas de trabalho impossibilita a
(SEDES) de 2012. Quanto aos métodos de
efetivação da política pública de Assistência Social,
investigação mais gerais trata-se de uma pesquisa
comprometendo a operacionalização dos serviços,
exploratória e descritiva.
O artigo está estruturado em três sessões: Na
Essas determinações não contribuíram para a
primeira delineamos um breve histórico da política de
superação do paradigma da Assistência Social como
assistência social no Brasil; na segunda apresentamos
favor aos pobres e não direitos dos cidadãos
os impactos da reestruturação produtiva, abordando
brasileiros e de responsabilidade estatal, permitindo a
também o fenômeno no setor público; e na terceira
expansão da participação privada na execução dos
sessão abordamos a precarização do trabalho do
serviços socioassistenciais.
Assistente Social e a consolidação do Sistema Único
da Assistência Social.
Esta maneira de execução da Assistência
Social permanece inalterada até a década de 1980.
Analisando esse período, Raichelis (2000), destaca o
2 Política de Assistência Social no Brasil: o estado
e o neoliberalismo
A política social pública é um campo que se
modifica de acordo com os contextos históricos,
momento
histórico
de
aprofundamento
das
desigualdades sociais, acirramento da luta pela
democratização do país e de reivindicações de
políticas sociais efetivas.
sociais, políticos e econômicos de cada época, sendo
A ampliação das desigualdades sociais em
um campo de tensão entre os interesses e
conjunto com a luta para democratização do país foram
necessidades da classe trabalhadora e do capital.
fatores que contribuíram para a participação da
Tal constatação afirma-se quando em 1929 o
sociedade civil na construção de um texto
Estado enquanto instituição legalmente instituída para
constitucional que contemplasse os direitos dos
manter a sociedade de classe, segundo Marx, buscou
cidadãos brasileiros.
a superação da crise do sistema capitalista via
implantação do Estado de bem-estar social.
Em referência ao momento histórico da
elaboração da Constituição da República Federativa do
Portanto, pode-se afirmar que as políticas sociais
Brasil de 1988, Behring (2003) afirma que a
públicas nesse contexto não devem ser compreendidas
participação da sociedade civil sofreu a investida da
apenas como uma ação estatal frente às demandas
classe dominante, uma vez que essa participação não
sociais, podendo ser entendidas também como
se deu de forma ampla e irrestrita.
medidas de enfrentamento às crises do sistema
Mesmo diante da ofensiva da classe dominante
capitalista, gerando conflitos entre os interesses e
que barrou a participação popular de forma mais
necessidades da classe trabalhadora e do capital,
contundente a Constituição aprovada em 1988 pode
assim contribuindo para a reprodução do capitalismo.
ser considerada um avanço na história do país,
principalmente no que se refere à concepção
da
seguridade social que define a Saúde, Previdência e
Segundo Brasil (2005, p.15) o SUAS é um
Assistência Social como direito dos cidadãos
sistema público, que não requer de seus usuários
brasileiros, conforme designa o Artigo 194.
contribuição direta, sendo implantado de forma
Posteriormente foi aprovada a Lei nº
descentralizada agregando responsabilidades a todos
8.742/1993, a Lei Orgânica da Assistência Social
os entes federados e a participação popular em sua
(LOAS). Em estudos realizados por Yazbek (2008,
gestão.
p.99) pode-se destacar dois elementos no contexto da
Mesmo diante do avanço que esse sistema
formulação e aprovação da lei, o primeiro é o
traz para todos os cidadãos brasileiros, torna-se
entendimento que nesse momento histórico a LOAS
indispensável discutir as recentes mudanças no mundo
não previu a definição de um sistema organizado de
do trabalho, advindas do processo de reestruturação
gestão da Assistência Social e o segundo é que
produtiva, analisando os impactos para os
durante o processo de tramitação das legislações que
trabalhadores sociais, tendo destaque nessa discussão
regulamentavam as políticas de cunho social foi
o assistente social, sendo essa categoria profissional
instituído o ajuste neoliberal, resultando na supressão
historicamente ligada à Assistência Social.
dos direitos sociais.
A indefinição das ações de operacionalização
dos serviços socioassistenciais e a precarização
desses serviços foram fatores que contribuíram para
participação da sociedade civil nos debates e nas
conferências que etapas que antecederam a
implantação de uma nova forma de gestão da Política
de Assistência Social no Brasil.
Em 2004 ocorreu a aprovação da Política
Nacional de Assistência Social (PNAS), que
representou um avanço, pois instituiu a primazia do
Estado como responsável pela gestão da política de
Assistência Social, trazendo diretrizes para gestão e
operacionalização dos serviços socioassistenciais,
consolidando a afirmação da Assistência Social como
direito social.
3 Reestruturação Produtiva e as Mudanças no
Mundo do Trabalho: reflexos para o Serviço Social
Brasileiro
O sistema capitalista organiza-se na tendência
de atender as suas necessidades de reprodução,
visando a perpetuação da sua existência, tendo
historicamente o Estado como aliado nessa conjuntura.
Respaldando-se em estudos de Mota (2006)
evidencia-se que o processo de reestruturação
produtiva demandou do Estado direcionar-se em favor
do capital, principalmente nos países latinos
americanos que se apropriam dos ideais neoliberais.
Nessa perspectiva o Estado deixa de cumprir o seu
papel de defesa dos cidadãos tornando-se mínimo e
não interferindo na economia, e as relações
trabalhistas passam a não ter uma intervenção estatal
na sua regulação e a legislação flexibiliza-se em favor
neoliberalismo, tornando as condições de vida dos
do capital.
trabalhadores ainda mais perversa.
De acordo com Antunes (2011), nesse
A inserção de elementos constitutivos do
contexto inicia-se o desenvolvimento do modelo
processo de reestruturação produtiva no âmbito do
toyotista com a nova forma de produção: a
setor público iniciou-se a partir de uma reforma
terceirização das etapas de produção nas indústrias
administrativa instituída em moldes neoliberais.
como uma estratégia para enfrentamento a crise do
Segundo Alves (2009, p.190):
petróleo de 1970, com vistas à redução dos custos de
produção; redução dos níveis hierárquicos nas
indústrias, onde o modelo organizacional permitiu aos
trabalhadores avaliar o processo de trabalho de forma
Para o mundo do trabalho, tornou-se bastante
adverso o cenário social e político devido à
política autocrática do governo Collor visando
destruir o sindicalismo, principalmente de
categorias organizadas que resistiam a
qualidade dos produtos; a nova sociabilidade do capital
direitos do
trabalho (no caso de empresas
estatais e setor público).
que no ponto de vista subjetivo incutiu nos
Com a Emenda Constitucional no 19/1998 a
trabalhadores a suavização da forma de exploração
administração pública passa por uma intensa
mediante a criação de um ambiente de trabalho
metamorfose, essa reforma foi implementada a partir
favorável à ampliação da produtividade.
de uma orientação neoliberal, pautado em um discurso
a contribuir com o aumento da produção e da
Tais modificações contribuíram com o avanço
do desemprego estrutural, por conta da supressão dos
postos de trabalho advindo da reorganização das
medidas drásticas que atingiam
que ressalta a necessidade de “enxugamento” da
máquina pública.
Assim, a redução nos postos de trabalho no
setor público pautado na justificativa da necessidade
equipes de trabalho.
Como consequência da flexibilização das
de redução dos gastos traz intrinsecamente o
relações de trabalho deste novo modelo de produção,
posicionamento neoliberal de minimização da
ocorreu a desregulamentação dos direitos trabalhistas,
intervenção estatal também no que tange a prestação
inerente às novas formas de contratação no contexto
de serviços públicos aos cidadãos.
da reestruturação produtiva, sendo a acumulação de
desqualificam o setor público abrindo espaço para
lucros a principal meta do sistema capitalista.
Na realidade brasileira a reestruturação
produtiva
alastrou-se
em
conjunto
Um ponto relevante é a difusão de ideais que
com
o
terceirização de serviços e a privatização de empresas
em benefício de grupos internacionais, ocasionando a
degradação do patrimônio estatal brasileiro. Segundo
trabalho que consiste no atendimento das demandas
Mota e Amaral (1998, p.13):
sociais com subsídios das políticas sociais.
Nessa conjuntura, as mudanças nas relações
entre Estado, sociedade e mercado
materializam-se num conjunto de medidas de
ajuste econômico e de reformas institucionais,
cujos destaques são: os mecanismos de
privatização, as pressões do empresariado e
da burocracia estatal para suprimir direitos
sociais e trabalhistas e a “naturalização” da
superexploração do trabalho.
A
reestruturação
produtiva
Com a precarização do trabalho no serviço
público os Assistentes Sociais inseridos nas
instituições estatais passam a vivenciar os reflexos das
mudanças do trabalho não só nas relações com os
usuários dos serviços socioassistenciais, como
também na sua própria relação de trabalho. Para
Raicheles (2011, p. 422):
ocasionou
Essa dinâmica de flexibilização/precarização
atinge também o trabalho do assistente social,
nos diferentes espaços institucionais em que
se realiza, pela insegurança do emprego,
precárias formas de contratação, intensificação
do trabalho, aviltamento dos salários, pressão
pelo aumento da produtividade e de resultados
imediatos, ausência de horizontes profissionais
de mais longo prazo, falta de perspectivas de
progressão e ascensão na carreira, ausência
de políticas de capacitação profissional, entre
modificações no mundo do trabalho que afetam as
condições de trabalho de todos os trabalhadores,
inclusive dos Assistentes Sociais. Em suma, o
profissional do Serviço Social está submetido às
consequências de todas as metamorfoses ocorridas no
mercado de trabalho e esse fenômeno pode ser
observado na atualidade a partir de uma leitura critica
outros.
da realidade social.
Respaldando-se em Montaño (1997) o
Cabe salientar que a ampliação do
desenvolvimento do capitalismo e a consequente
desemprego, a instabilidade, a flexibilização dos
ampliação das expressões da questão social
direitos trabalhistas, subsidiados pelas diversas formas
demandaram ao Estado respostas, na medida em que
de contratação são incidências reais para os
esse contexto desenha a eminência de um conflito
Assistentes Sociais, mesmo para os inseridos na
social e deslegitima o mesmo perante a sociedade,
esfera estatal.
atendendo também as necessidades de reprodução da
força de trabalho.
Esse processo acompanha o movimento de
redução da ação do Estado e a ampliação da ação do
Nessa conjuntura, o Assistente Social inseriu-
setor privado no campo das políticas sociais, sendo a
se no âmbito estatal, na função inicial de executor
terceirização uma modalidade cada vez mais utilizada.
dessas políticas sociais, contribuindo para legitimação
Dentre a terceirização que envolve as políticas públicas
do Estado através da operacionalização do seu
podemos apontar as contratações de recursos
Social, sendo recomendado pelo MDS a ampliação
humanos para prestar serviços em unidades públicas.
para 62 unidades, de acordo com dados da SEDES.
Ao passo que a descentralização político
A principal unidade de execução das ações da
administrativa contribuiu para a expansão da oferta de
Proteção Social Básica é o Centro de Referência de
serviços em nível municipal, ocasionou também a
Assistência Social, que, segundo Brasil (2005, p. 95-
ampliação da precarização do trabalho.
96) é uma unidade pública estatal localizada em áreas
de vulnerabilidade social com base na territorialidade.
4 Precarização do Trabalho do Assistente Social
frente a Consolidação do Sistema Único da
Assistência Social: a realidade em Salvador
Diante das considerações apresentadas, partese para a realidade mais específica do município de
Salvador, onde pontua-se a ausência de investimentos
significativos por parte da gestão municipal, que, de
De acordo com a classificação estabelecida pelo
MDS, o município de Salvador constitui-se como
metrópole devido o percentual de habitantes e,
segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), em 2010, a população de Salvador estava
constituída por 2.675.656 habitantes, e em 2013, de
acordo com dados do IBGE são 3.884.435 habitantes.
Outra realidade no município refere-se aos níveis
de extrema pobreza, que segundo o Censo
Demográfico de 2010 indicava o quantitativo de
147.864 pessoas na extrema pobreza.
Diante dessa realidade o contingente
populacional que necessita acessar os serviços,
benefícios, programas e projetos do Sistema Único da
Assistência Social é crescente, sendo essencial que as
ações tenham qualidade para efetivação dos direitos
desses cidadãos.
A metrópole dispõe apenas com uma rede
composta por 21 Centros de Referência da Assistência
acordo com dados do MDS investe apenas 1,14% do
orçamento total na execução da Política Social de
Assistência Social, sendo esse percentual um valor
inferior à média de todos os municípios do estado que
é de 2,94%.
Respaldando – se em dados do Censo SUAS
– CRAS preenchido em agosto de 2012, dos 23
profissionais de Serviço Social inseridos nos CRAS, 22
eram terceirizados e 100% cumpriam carga horária de
40 horas semanais.
Analisando
os
dados
percebe-se
o
descumprimento da Norma Operacional Básica de
Recursos Humanos do Sistema Único da Assistência
Social (NOB-RH/SUAS), uma vez que essa legislação
preconiza que o ingresso desses profissionais deve ser
efetivado via concurso público.
Sobre
os
equipamentos
e
materiais
disponíveis, em perfeito funcionamento, para o
desenvolvimento dos serviços constatou-se que 11
possuem telefone e 10 não possuíam, apenas 12
idosos, apenas 05 CRAS tem desenvolvido e as outras
CRAS estão com acesso à internet, outros 04 unidades
16 unidades não realizaram, ficando evidente a
não possuem acesso à internet e 05 informaram não
ausência de mobilização em algumas localidades.
ter computador. A ausência de computadores com
Referente ao público das atividades de PAIF
acesso à internet impossibilita a produção de dados e
ou SCFV, apenas 4 CRAS informaram ter pessoas com
troca de informações sobre o território.
deficiência participando das atividades, e os outros 17
No
que
se
referem
ao
diagnóstico
não contam com a participação desse público.
socioterritorial os dados apontaram que apenas 01
Portanto, considera-se que a gestão do
CRAS não possuía esse documento. Entretanto, cabe
território, a frequência na oferta dos serviços,
evidenciar que dos 20 que construíram esse
benefícios, programas e projetos, e a qualidade
documento apenas 06 unidades têm dados completos
desses, e a gestão do trabalho são fatores que
que evidenciam as vulnerabilidades do território de
contribuem para consolidação da Política Social
abrangência.
Pública de Assistência Social e como consequência
De acordo com esses dados evidencia-se que
os CRAS do município não dispõem de uma vigilância
efetivam os direitos sociais dos cidadãos a proteção
social.
socioassistencial efetiva, o que implica na fragilização
da gestão territorial e consequentemente do
desenvolvimento das atividades.
5 Considerações Finais
A compreensão do estágio atual da política
Quanto questionados sobre as ações CRAS no
social pública de Assistência Social no Brasil requer
Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família
uma análise histórica e a reflexão crítica, considerando
(PAIF) tendo como mês de referência agosto de 2012,
atrelamento desta aos interesses da classe dominante
evidenciou-se os dados abaixo:
na tentativa de minimizar os conflitos provenientes das
Considerando esse mesmo período, apenas 3
desigualdades sociais.
CRAS acompanharam as famílias com crianças e
Outra tendência revelada é o provimento dos
adolescentes inseridos no Programa de Erradicação do
mínimos sociais, por meio da transferência de renda
Trabalho Infantil (PETI), e as outras 18 unidades
que atende parte significativa da população nas suas
afirmaram não ter realizado o acompanhamento nesse
necessidades mais emergenciais e ao mesmo tempo
período.
nota-se o enfraquecimento do trabalho social, por
No que se refere às atividades do Serviço de
Convivência e Fortalecimento de Vínculo (SCFV) com
conta da não promoção de recursos para sua
efetivação ou da disponibilização de estrutura precária
momento a mobilização da categoria frente às
para sua execução.
condições vivenciadas. Tal enfrentamento configura-se
A fragilização da consolidação do Sistema
não apenas como defesa dos direitos dos
Único de Assistência Social com a precarização das
trabalhadores da própria categoria, como também
condições de trabalho do Assistente Social e dos
defesa dos usuários do Serviço Social que necessitam
outros trabalhadores do SUAS inseridos nos Centros
da Política Pública da Assistência Social por questão
de Referência da Assistência Social, retratam a
de manutenção da sobrevivência.
precarização das políticas sociais públicas.
Assim, cabe aos profissionais do Serviço
No decorrer do processo de construção desse
Social fomentarem uma articulação juntos às
estudo confirmou-se a hipótese de que a precarização
representações dos demais trabalhadores do SUAS,
no processo de trabalho do profissional do Serviço
com a sociedade civil, conselhos municipais de
Social nos CRAS de Salvador consiste em um limite
Assistência Social, na perspectiva de lutar pela
para a consolidação do Sistema Único da Assistência
desprecarização dos vínculos empregatícios e por
Social, uma vez que a falta de condições dignas de
condições dignas de trabalho que possibilitem
trabalho impossibilita a efetivação da política pública de
intervenções profissionais que efetivem os direitos dos
Assistência Social, comprometendo a operacionali-
usuários e contribuam para sua emancipação enquanto
zação dos serviços, benefícios, programas e projetos
sujeito de direitos.
da proteção social básica.
Verificou-se, ainda, que os profissionais do
Serviço Social dos CRAS de Salvador têm realizado
suas intervenções de forma improvisada, por conta da
ausência de meios para efetivação das atividades, o
que vem se refletindo na pouca adesão dos usuários
aos serviços e programas ofertados pelas unidades de
Proteção Social Básica. Sendo assim, a precarização
na gestão e execução de políticas sociais anuncia o
retrocesso dos direitos sociais, exigindo, portanto,
outras competências do Serviço Social.
Diante do exposto, o processo de precarização
do trabalho dos Assistentes Sociais requer nesse
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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – 1.ed. –
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MDS,
2008.
TRANSFUSÃO DE SANGUE: O
DILEMA ENTRE AUTONOMIA DO
PACIENTE, VIOLAÇÃO DE
DIREITOS E SERVIÇO SOCIAL
A vida em um Estado Democrático de Direitos
implica a coexistência de interesses, significa direitos
iguais para diferenças peculiares: etnia, cor da pele,
opiniões, religiões, costumes e outras particularidades.
A Constituição do Estado é a norma jurídica que regula
o uso do direito pelos indivíduos e entidades, inclusive
Rosimeire Moreira Pereira Bitencur*1
Ana Maria de Oliveira Silva**2
pelo próprio estado a fim de que, nem mesmo este, se
sobreponha em direitos em detrimento dos cidadãos.
Assim, a liberdade de cada indivíduo é limitada em prol
Resumo
da liberdade de todos.
A recusa a tratamento de doenças com o uso
Este artigo propõe contribuir com a discussão acerca
do direito do paciente recusar transfusão sanguínea.
Apresenta princípios amparados pelo Texto
Constitucional, aponta para o direito de escolha do
paciente a partir dos instrumentos jurídicos, garantidos
pela Constituição Federal, que conferem autonomia de
escolha, como também discute a atuação do Serviço
Social na área da saúde, na relação com os direitos
sociais do paciente, a orientação e o incentivo ao
respeito a diversidade.
Palavras-chave: Autonomia. Dignidade da pessoa
humana. Direitos. Serviço Social. Transfusão de
sangue.
de sangue remete aos direitos fundamentais
assegurados em documentos internacionais tais como:
o Código de Ética da Sociedade Internacional de
Transfusão de Sangue, adotado em 2000, pela OMS
(Organização Mundial de Saúde); a Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789 e na
Constituição Federal Brasileira de 1988, a qual possui
como um de seus fundamentos o princípio da
Dignidade da Pessoa Humana no art.1º, inciso III.
Sendo o Serviço Social uma profissão
interventiva na qual o profissional goza de relativa
autonomia para, inclusive, atuar na mediação de
1 Introdução
conflitos e orientar a busca de mecanismos e recursos
que contribuam para a prevalência de direitos, como
deverá atuar de modo favorável à autonomia e à
*Bacharel em Serviço Social da Faculdade Regional da Bahia – UNIRB
**Assistente Social, Mestranda em Políticas Sociais e Cidadania da Universidade
Católica do Salvador, Docente no Curso de Bacharelado em Serviço Social da
Faculdade Regional da Bahia – UNIRB.
liberdade do indivíduo enquanto membro de uma
equipe multiprofissional, na qual a autonomia de
profissionais pode se sobrepor a do indivíduo?
Pelos meandros do direito legal, com o
administrar o uso do sangue poder ser tomada
respaldo da Carta Magna que se construiu este estudo
independente da sua vontade, quando há convicção
diante da necessidade de afirmar o indivíduo como ser
que os benefícios são maiores que os riscos e também
de direitos cuja dignidade deve ser considerada, visto
em situação de perigo de morte. (Resolução CFM n°
que ela não existe quando seu direito é violado faz se o
1931/2009).
questionamento: transfusão de sangue sem
Segundo Nunes (2010, p.22), “a Organização
autorização do paciente se constitui violação ao
Mundial de Saúde, o Ministério da Saúde e a literatura
princípio da dignidade da pessoa humana?
médica reconhecem os riscos inerentes ao
A Constituição Federal de 1988, nos seus
procedimento”. Por isso, a decisão do profissional
fundamentos, tem a dignidade da pessoa humana e
constitui um momento crítico, pois, mesmo com
assegura como direitos invioláveis a liberdade de
critérios e técnicas adequadas e condições clinicas
consciência e de crença. Mas, ao mesmo passo em
favoráveis outros aspectos devem ser considerados,
que se reconhece o direito do paciente decidir de forma
incluindo-se aí questões sociais e psicológicas, sob
livre sobre si e sobre sua qualidade de vida, o
pena de o profissional responder em juízo.
profissional de saúde pode restringir esse direito,
decidindo, sobre o tratamento a ser instituído.
2 Transfusão de Sangue e Direito do Paciente
A transfusão de sangue é uma ferramenta
utilizada em situações de perda sanguínea e de
algumas patologias hematológicas. É um procedimento
terapêutico no qual o sangue é retirado do corpo de um
indivíduo e infundido após analises, em outro. É
O Código Civil Brasileiro prevê que os danos
decorrentes de atividades de riscos sejam
reparados por meio da responsabilidade
objetiva, entretanto, também dispõe que os
profissionais liberais que causem prejuízos a
terceiros respondam subjetivamente pelo ato
danoso. Esse mesmo entendimento está
disposto no Código de Defesa do Consumidor,
que também se enquadra em algumas
situações ligadas à transfusão de sangue. O
conhecimento do procedi-mento transfusional
e dos regula-mentos pertinentes à atividade
permite o adequado enquadramento do fato à
norma, bem como, a consequente justa
individualização de responsabilidades do
processo. (NUNES, 2010 p.22).
utilizado mediante moderna tecnologia com a finalidade
de melhorar a saúde do paciente.
É preciso reconhecer o direito a recusa de
Porém, as transfusões de sangue não são uma
tratamentos de saúde considerando-se que, em face
prática livre de danos. Há polêmica concernente ao seu
às normas constitucionais que tutelam a liberdade de
uso, já que um grupo específico de pessoas recusa
crença e de consciência, o direito à intimidade e à
esta forma de tratamento, não obstante, a decisão em
privacidade, os princípios da legalidade e da dignidade
da pessoa humana, é autêntica a negativa que envolva
a violação da sua autonomia.
Na contemporaneidade, a tecnologia das
transfusões avançou e é utilizada como um tratamento
2.1 Surgimento e evolução histórica.
Segundo Garrafa (2004, p.72), o uso do
sangue até meados do século XVI não correspondia a
opcional.
2.2 Direitos da Pessoa Humana que Recusa
Transfusão Sanguínea
verdadeiras transfusões – mas sim a ingestões e
aplicações externas, já que os processos relacionados
à circulação corpórea eram desconhecidos.
A primeira transfusão com sangue humano é
atribuída ao obstetra inglês James Blundell, em 1818.
Até os meados de 1900, a hemotransfusão era um
exercício empírico. Logo depois, os procedimentos
envolvendo diagnóstico e tratamentos hemoterápicos
conquistaram espaço como uma prática cientifica.
No
século
XIX
desenvolveram-se
Segundo o Código de Ética Médica revisado,
no seu Capítulo I - Dos Princípios Fundamentais, a
autonomia do paciente é objeto de evidência. O inciso
XXI, a esse respeito, alude da seguinte maneira:
XXI - No processo de tomada de decisões
profissionais, de acordo com seus ditames de
consciência e as previsões legais, o médico
aceitará as escolhas de seus pacientes,
relativas aos procedimentos diagnósticos e
terapêuticos por eles expressos, desde que
adequadas ao caso e cientificamente
reconhecidas. (CFM, Resolução n°
1931/2009).
equipamentos destinados a realizações de transfusões,
bem como técnicas cirúrgicas e foi possível usá-las
durante a primeira e Segunda Guerra Mundial.
França, Baptista e Brito afirmam sobre o
histórico dos serviços de hemotransfusão no Brasil:
Porém ainda prevalece à
consciência
profissional, visto que, se a decisão do mesmo não for
atestada como legítima, é a do profissional que terá
validade. Trata-se, portanto, de uma autonomia
relativa, não garantindo o respeito ao direito de recusa.
No Brasil, os primeiros serviços organizados
de hemotransfusão surgiram em 1920, sendo
a prática transfusional de cunho científico
iniciada por cirurgiões no Rio de Janeiro. Em
1950, o I Congresso Paulista de Hemoterapia
instituiu as bases para a Fundação da
Sociedade Brasileira de Hematologia e
Hemoterapia (SBHH). Em 1965, o Ministério
da Saúde (MS) criou a Comissão Nacional de
Hemoterapia que se encarregou de criar os
hemocentros. Na década 80 do século
passado, o MS instituiu a Política Nacional do
Sangue. (FRANÇA, BAPTISTA e BRITO,
2008, p.500).
O direito de escolha do tratamento se baseia
em duas diretrizes: uma pautada no direito a receber
informações para tomada de decisão consciente sobre
o tratamento recomendado. A esse respeito dizem os
artigos 22 e 24 do Código de Ética Médica, em seu
capítulo IV. É vedado ao médico:
Art. 22. Deixar de obter consentimento do
paciente ou de seu representante legal após
esclarecê-lo sobre o procedimento a ser
realizado, salvo em caso de risco iminente de
morte.
Art. 24. Deixar de garantir ao paciente o
exercício do direito de decidir livremente sobre
sua pessoa ou seu bem estar, bem como
exercer sua autoridade para limitá-lo. (CFM,
Resolução 1931/2009).
degradante” e o art. 57 e 59 do Código de Ética Médica
que veda ao médico:
Art. 57 - Deixar de utilizar todos os meios
disponíveis de diagnóstico e tratamento a seu
alcance em favor do paciente
Art. 59 - Deixar de informar ao paciente o
diagnóstico, o prognóstico, os riscos e
objetivos do tratamento, salvo quando a
comunicação direta ao mesmo possa
provocar-lhe dano, devendo, nesse caso, a
comunicação ser feita ao seu responsável
legal.
Outra diretriz indica que a/o paciente pode
decidir aprovar ou renunciar a orientação médica pelo
conceito ético da autonomia do indivíduo, a partir do
qual, as decisões sobre o destino da pessoa devem ser
tomadas pela própria pessoa envolvida.
Deste modo, entende-se que ninguém tem o
O minidicionário da Língua Portuguesa define
direito de ignorar os direitos fundamentais do indivíduo
o termo como: “Independência, governo de si próprio;
e é indispensável uma reflexão sobre o comportamento
faculdade de se governar por si mesmo”.
ético em atividades de saúde sob a perspectiva da
(TERSARIOL, p 58). Como proposto por Beauchamp &
responsabilidade social e da ampliação dos direitos da
Childress (1985 apud FORTES 1994, p.1): "A pessoa
cidadania. Isto implica considerar a autonomia e a
autônoma é aquela que não somente delibera e
dignidade como características intrínsecas ao ser
escolhe seus planos, mas que é capaz de agir com
humano que nos produz a responsabilidade de
base nessas deliberações”.
respeitá-lo.
A partir dessas definições, ao se analisar o
O Código Civil, estabelece no Art. 15° que
Código de Ética Médica se percebe contradição entre o
ninguém pode ser constrangido ou submetido sob
inciso VII do capitulo I e o artigo 24 do capitulo IV,
pressão a tratamentos médicos ou cirúrgicos, ninguém
entre a autonomia do médico e do paciente, visto que
deve ser coagido a aceitar algo que não tem desejo,
esta só prevalece se não for contrária “aos ditames da
tendo em análise os riscos envolvidos. Esta é uma
consciência do profissional”.
decisão inteiramente pessoal.
Na equipe de saúde, cada profissional tem
O Código de Defesa do Consumidor, o Art. 6°,
responsabilidades específicas e cabe a todos
inciso III, garante ao consumidor ou paciente que está
assegurar informação sobre possíveis terapias
em serviço médico “ter toda informação de forma clara
alternativas, garantindo a observância do art.5°, inciso
e adequada”, Fioravante (2010, p.31). Vale ressaltar os
III, da Constituição Federal que reza: “ninguém será
incisos VI e VII, que falam sobre a reparação daqueles
submetido à tortura nem a tratamento desumano ou
que tiveram seus direitos recusados e o Art. 9° que
reza:
O fornecedor de produtos e serviços
potencialmente nocivos ou perigosos à saúde
ou segurança deverá informar, de maneira
ostensiva e adequada, a respeito da sua
nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da
adoção de outras medidas cabíveis em cada
caso concreto. (CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR, 2009).
Outra lei que reafirma a autonomia dos
pacientes é a 10.741/2003, o Estatuto do Idoso que em
seu Artigo 17 exprime: "Ao idoso que esteja no domínio
de suas faculdades mentais é assegurado o direito de
optar pelo tratamento de saúde que lhe for reputado
mais favorável”.
Assim, a práxis dos profissionais de saúde
deve estar infundida da noção do respeito ao princípio
da autonomia individual, pois em razão do
conhecimento especializado e habilidades técnicas que
possuem, podem inviabilizar a expressão do desejo da
pessoa atendida. Julga-se essencial que as políticas
de saúde e educacionais guiadas à formação dos
profissionais de saúde estejam direcionadas à redução
das violações contra os princípios éticos e ao
comprometimento de uma prática mais humanista.
3 Transfusão Sanguínea sem Autorização: Violação
ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana?
Na Constituição Federal Brasileira de 1988, em
seu primeiro artigo, inciso III, encontra-se um dos
fundamentais e importantes princípios: a dignidade da
pessoa humana, que deve ser balizadora da liberdade
de escolha a tratamento médico sem sangue.
Sustentando que toda pessoa tem direitos,
nasceram declarações sobre direitos humanos. Os
direitos civis, sociais, econômicos, políticos e culturais
estão correlacionados e uma geração de direitos não
substitui a outra, mas com ela interage. Apenas com o
desempenho de todos eles existe a pessoa humana, o
ideal de autonomia.
Considerando a Lei nº 8.080/90, que dispõe
sobre as condições para garantir o acesso universal e
igualitário às ações e serviços para promoção,
proteção e recuperação da saúde, o Ministro de Estado
da Saúde assinou a Portaria n° 1.820/2009, que
apresenta a Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde
- que tem como base princípios básicos de cidadania e
se tornou um instrumento para o cidadão conhecer
seus direitos. (BRASIL, 2011).
Sobre os direitos do paciente, no âmbito do
serviço público e privado, o Art. 4° refere:
Toda pessoa tem direito ao atendimento
humanizado e acolhedor, realizado por
profissionais qualificados, em ambiente limpo,
confortável e acessível a todos.
Parágrafo único. É direito da pessoa, na rede
de serviços de saúde, ter atendimento
humanizado, acolhedor, livre de qualquer
discriminação, restrição ou negação em
virtude de idade, raça, cor, etnia, religião,
orientação sexual, identidade de gênero,
condições econômicas ou sociais, estado de
saúde, de anomalia, patologia ou deficiência,
garantindo-lhe:
[...]
III – nas consultas, nos procedimentos
diagnósticos,
preventivos,
cirúrgicos,
terapêuticos e internações, o seguinte:
a) à integridade física;
b) à privacidade e ao conforto;
c) à individualidade;
d) aos seus valores éticos, culturais e
religiosos;
e) à confidencialidade de toda e qualquer
informação pessoal;
f ) à segurança do procedimento;
g) ao bem-estar psíquico e emocional.
[...]
IX – a informação a respeito de diferentes
possibilidades terapêuti-cas, de acordo com
sua condição clínica, baseado nas evidências
científicas, e a relação custo-benefício das
alternativas de tratamento, com direito à
recusa, atestado na presença de testemunha;
[...]
XI – o direito à escolha de alternativa de
tratamento, quando houver, e à consideração
da recusa de tratamento proposto; (BRASIL,
2011, p.11-12. Grifo nosso).
O minidicionário de Língua Portuguesa faz a
seguinte referência ao termo dignidade: “consciência
do próprio valor; honra; modo de proceder que inspira
respeito; distinção; amor próprio.” (HOUAISS; VILLAR,
2004, p. 248). Em palavras simples, a dignidade é um
atributo ético que inspira respeito.
A Constituição e as leis em geral são pródigas
em demonstrações deste fundamento, como por
exemplo, os direitos dos deficientes e dos idosos. Os
direitos e garantias fundamentais, dentre eles os
Fica claro, portanto, que para um direito ser
positivados como Direitos Sociais decorrem da
identificado, precisa ser assegurado. Essas garantias
dignidade humana. Ora, os direitos à educação, à
fundamentais acham-se definidas por meio de
saúde, ao trabalho, à moradia, à previdência, à
princípios, entre eles, os princípios da legalidade, da
assistência social, dentre outros, são essenciais para
liberdade, da privacidade, da liberdade de crença e de
se ter uma vida digna.
consciência e o da dignidade da pessoa humana.
A pessoa é, portanto, o valor máximo da
democracia, sendo tal princípio uma decorrência do
4 Dignidade da Pessoa Humana
Estado Democrático. Não sem razão, doutrinadores o
consideram como um super princípio. Para Silva (1995,
p. 106), "a dignidade da pessoa humana é um valor
Entende-se dignidade como uma peculiaridade
humana que está subordinada ao senso ou
racionalidade. Somente as pessoas têm a
competência, a partir do exercício da liberdade
individual de aperfeiçoar a sua vida, incorporando a
dignidade com autonomia em conduzir a si mesmo.
Esta afirmação é reforçada por Sarlet (2011, p. 35) ao
dizer que o conceito de dignidade está “intimamente
ligada à noção da liberdade pessoal de cada indivíduo
- o Homem como ser livre e responsável por seus atos
e seu destino”.
supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos
fundamentais do homem, desde o direito à vida”.
O respeito à autonomia envolve não apenas a
ausência de sua violação, por meio de uma
atitude respeitosa – como reconhecer o direito
da pessoa de ter suas opiniões, escolhas e
agir com base em valores e crenças pessoais.
Envolve também uma ação respeitosa, que
compreende cuidar dos pacientes de forma a
diminuir seus temores frente ao tratamento por
passar as informações necessárias,
proporcionando segurança, capacitando o
paciente atuar e decidir de forma autônoma.
(BEAUCHAMP e CHILDRESS, apud
SOARES, 2009, p. 33-34).
Os cidadãos que recusam transfusão de
sangue, querem exercitar o direito de escolha,
preservando sua dignidade. Sob essa perspectiva, é
importante lembrar que a Constituição Federal em seu
art° 1, inciso II, garante proteção à vida e esta abrange
aspectos
espirituais
e
materiais,
Bioética é de forma literal a ética da vida.
Envolve tudo o que ocorre no “princípio,
preservação e fim da vida humana”. Ela é
interdisciplinar, ou seja, estabelece uma
interlocução com várias categorias
profissionais, a fim de alcançar um consenso a
respeito do que é viável quanto à conduta do
ser humano. (LIGIERA, apud FIORAVANTE,
2010, p. 37).
subsídios
imprescindíveis para uma vida com dignidade.
Ademais, sobre o tema, expõe Sarlet (2006,
A bioética pondera o individuo como um todo,
levando em conta suas especificidades e todas as
áreas da sua vida. Segundo Soares (2010, p.35), a
p.122):
Onde não houver respeito pela vida e pela
integridade física do ser humano, onde as
condições mínimas para uma existência digna
não forem asseguradas, onde a intimidade e a
identidade do individuo forem objeto de
ingerências indevidas, onde sua igualdade
relativamente aos demais não for garantidas,
bem como onde não houver limitação do
poder, não haverá espaço para a dignidade da
pessoa humana, e esta não passará de mero
objeto de arbítrio e injustiças.
Assim, qualquer intervenção para transfundir
sangue, sem consentimento, deverá ser analisado com
cautela, sob pena de violação a dignidade da pessoa
humana.
4.1 Princípio da Beneficência
Durante a graduação acadêmica debate-se
sobre a ética profissional e isso perdura durante a
atuação profissional. A compreensão do significado da
bioética, seus princípios e características, a ética é
basilar a bioética. Abaixo, o que trazem os autores
Ligiera (2009, apud FIORAVANTE, 2010, p.37) sobre o
que representa a bioética:
beneficência de uma forma ampliada, instaura a ideia
de fazer o bem. É este princípio que conduz o
profissional de saúde a intervir de maneira benéfica
com o paciente em harmonia com a autonomia.
O novo Código de Ética Médica brasileiro
revisado, traz itens de relevância que garantem a
efetivação do bem e o direito de escolha do paciente.
Na sua introdução afirma:
A partir de 13 de abril de 2010, entra em vigor
o sexto Código de Ética Médica reconhecido
no Brasil. Revisado após mais 20 anos de
vigência do Código anterior, ele traz novidades
como a previsão de cuidados paliativos, o
reforço à autonomia do paciente [...]
Também prevê a extensão de seu alcance aos
médicos em cargos de gestão, pesquisa e
ensino. [...] O objetivo comum foi construir um
atento aos avanços tecnológicos e
científicos, à autonomia e ao
esclarecimento do paciente, além de
reconhecer claramente o processo de
terminalidade da vida humana.[...] Ao final,
produziu-se um documento amplo e atento ao
exercício da Medicina brasileira no século 21.
[...]. A autonomia tem sido um dos itens de
maior destaque. Já no preâmbulo o documento
diz que o médico deverá aceitar as escolhas
de seus pacientes, desde que adequadas ao
caso e cientificamente reconhecidas. O inciso
XXI determina que, no processo de tomada de
decisões profissionais, “o médico aceitará as
escolhas de seus pacientes relativas aos
procedimentos
diagnósticos
e
terapêuticos”. (Resolução CFM nº 1931/2009.
Grifo nosso).
promoção á saúde e redução dos riscos de violação
Sobre o princípio da beneficência, é de bom
Assim, considerando-se o processo histórico
alvitre salientar que residi-se em um contexto histórico
do surgimento do Serviço Social, cujas raízes
no qual, cada vez mais, os direitos do paciente,
remontam à luta de classes, pelo reconhecimento e
ganham consideração. Conforme Marine (2005 apud
manutenção por parte do Estado, dos seus direitos, e
LEIRIA, 2009, p.11), “o médico não é mais encarado
observando ainda a legislação que rege o Serviço
como uma autoridade (de caráter quase que mítica)
Social, bem como o seu Projeto Ético-Político, “que
inquestionável e autoritária”, antes, arroga-se que ele
está vinculado a um projeto de transformação da
perpetre o que favoreça ao paciente, de acordo com a
sociedade” (CRESS, 2005, p.394) é seguro afirmar
visão do mesmo.
que, para além da defesa dos direitos dos indivíduos,
dos direitos sociais. (CFESS, 2010, p.33-38).
Do ponto de vista da bioética o maior valor que
as ações do cotidiano profissional dos assistentes
deveria prevalecer e ser respeitado é justamente o que
sociais devem ter como fim o desenvolvimento humano
não viola o corpo, as crenças e a consciência do
nos vários aspectos da vida. Para corroborar com o
individuo, mas estabelece sua autonomia.
que até aqui se tem dito leia-se:
5 Serviço Social na Defesa da Cidadania
A promulgação da Constituição Federal de
O Assistente Social deve efetivar os interesses
dos usuários nos serviços prestados por ele,
fazendo valer a justiça social. Esse profissional
se diferencia dos outros, principalmente pela
defesa dos Direitos Humanos, enquanto
médicos cuidam da saúde e advogados da lei.
(FIORAVANTE, 2010, p.48).
1988, traz consigo uma nova perspectiva de garantia
de direitos sociais, antes negada pela sociedade. O art.
1º afirma que a saúde é dever do Estado e direito de
todo cidadão, compondo o tripé da seguridade social,
junto com a assistência social e a previdência social.
A proteção social de que trata a seguridade
social é produto da luta histórica dos cidadãos,
mediante movimentos sociais que, exercendo pressão
sobre as autoridades públicas, culminaram na criação
de políticas cujo escopo é a garantia do
desenvolvimento humano mediante ações de
A atuação do Assistente Social pauta-se na
compreensão dos aspectos sociais, econômicos,
políticos e culturais que interferem no processo saúdedoença, contribuindo para garantir um processo de
intervenção social capaz de assegurar os direitos dos
usuários dos seus serviços. (CFESS, 2010, p.30).
Coloca-se a intervenção do Serviço Social na
perspectiva da singularidade e valores da pessoa,
desenvolvendo potencialidades e contribuindo para a
sua transformação em cidadãos ativos e agentes de
mudança da sua qualidade de vida. A esse respeito
Profissional do Assistente Social traz em seus
Vasconcelos traz a seguinte afirmação:
princípios fundamentais:
I- Reconhecimento da liberdade como valor
ético central e das demandas políticas a ela
inerentes – autonomia, emancipação e plena
expansão dos indivíduos sociais;
II- Defesa intransigente dos direitos humanos e
recusa do arbítrio e do autoritarismo;
III- Ampliação e consolidação da cidadania,
considerada tarefa primordial de toda
sociedade, com vistas à garantia dos direitos
civis sociais e políticos das classes
trabalhadoras;
[...]
VI- Empenho na eliminação de todas as
formas de preconceitos, incentivando o
respeito à diversidade, à participação de
grupos socialmente discriminados e à
discussão das diferenças;
[...]
X- Compromisso com a qualidade dos serviços
prestados à população e com o aprimoramento
intelectual, na perspectiva da competência
profissional; [...]. (CEFESS, 2012, p. 23-24).
Na saúde, se cabe ao médico, ao enfermeiro,
primordialmente, a manutenção, recuperação
e promoção da saúde, aos assistentes sociais
– que tem como objeto a “questão social” –
cabem principalmente, organizar, aprofundar,
ampliar,
desenvolver,
facilitar
os
conhecimentos e informações necessários
sobre todos os aspectos [...] relativos à saúde
e seus determinantes. (VASCONCELOS,
2011 p.435)
O profissional de Serviço Social atua no
enfrentamento das expressões da questão social,
resultantes das desigualdades proporcionadas pelo
sistema capitalista neoliberal. Assim, é desafiado na
sua prática cotidiana a responder as demandas postas,
através do embasamento das três competências
profissionais (teórico-metodológica, ético-político e
técnico-operativo) que permeiam o fazer profissional
além de estar regulamentado pela Lei 8.662/1993, que
dispõe em seu Art. 4° o que compete ao Assistente
Social:
Depreende-se que a intervenção profissional
do Assistente Social deve possibilitar a compreensão
dos fatos como parte de “um complexo social que sofre
influências sociais, econômicas, políticas, ideológicas,
culturais, dentre outras”. A mediação feita é analisada
[...] III – Encaminhar providências, e prestar
orientação social a indivíduos, grupos e a
população; [...] V – Orientar indivíduos e
grupos de diferentes segmentos sociais no
sentido de identificar recursos e de fazer uso
dos mesmos no atendimento e na
defesa de seus direitos.
através da tríade: “singularidade, universalidade e
particularidade”, como aponta Cavalli (2012, p.7).
O profissional de Serviço Social por atuar com
e nas mediações, é um articulador e potencializador,
atrelado às refrações da questão social constitutivas
Considerando a necessidade de criação de
das demandas postas á profissão. Deve olhar para
novos valores éticos, fundamentados no compromisso
além da questão sobre transfusão sanguínea e atuar
com os usuários, com base na liberdade, democracia,
como instrumento de informação, promovendo e
cidadania, justiça e igualdade social, o Código de Ética
apoiando
a
articulação
junto
às
multidisciplinares e outros recursos sociais.
equipes
É sob a perspectiva da “emancipação e plena
expansão dos indivíduos sociais” (NETTO, 2011, p.15)
profissão. Ao que se alude, registra Barroco (2010, p.
55):
A reflexão ética supõe a suspensão da
cotidianidade; não tem por objetivo responder
ás suas necessidades imediatas, mas
sistematizar a critica da vida cotidiana [...],
ampliando as possibilidades de os indivíduos
se realizarem como individualidades livres e
conscientes.
que o Assistente Social deve pensar seu plano de ação
nas instituições de saúde, com vistas à contribuir com
a qualidade de vida das/os pacientes que recusam
transfusão de sangue, de forma a desmistificar visão
preconceituosa, pautada nos princípios éticos
norteadores da profissão, entre eles, os constantes no
projeto Ético-Político da categoria.
Na atualidade, as situações apresentadas
pelos diversos setores societários tem sido um desafio
para o profissional intervir nas particularidades das
[...] Tem em seu núcleo o reconhecimento da
liberdade como valor central – a liberdade
concebida historicamente, como possibilidade
de escolha entre alternativas concretas; daí
um compromisso com a autonomia, a
emancipação e a plena expansão dos
indivíduos sociais [...] (NETTO, 2011, p.15).
demandas postas. Para Iamamoto (2009, p.19-20):
sua formação é regada a reflexão ético-filosófica e que
Pensar
o
Serviço
Social
na
contemporaneidade requer os olhos abertos
para o mundo contemporâneo para decifrá-lo e
participar da sua recreação. [...] É nessa
perspectiva que se inquire a realidade
buscando, pelo seu deciframento, o
desenvolvimento de um trabalho pautado no
zelo pela qualidade dos serviços prestados, na
defesa da universalidade dos serviços
públicos, na atualização dos compromissos
ético-políticos com o interesse coletivo da
população usuária.
“valores e princípios pessoais devem ser mantidos em
A ação do profissional de Serviço Social tem
patamares distintos”, Melo (2009 apud FIORAVANTE,
uma relação histórica com as mudanças no contexto
2010, p. 48).
social, político, econômico, culturais e ambientais das
Quando confrontado com pacientes que
recusam transfusão de sangue, é pertinente refletir que
A atividade em rede e multidisciplinar é
classes sociais envolvidas, cabendo deter-se sobre a
estratégia de organização do trabalho e de intervenção
singularidade do sujeito em seus aspectos de valores,
do Serviço Social, que atua numa realidade complexa
costumes,
e se articula com outras categorias profissionais para
contribuições éticas e morais.
crenças,
religiosidade,
além
das
alcançar uma visão mais integral das questões. Vale
A união dos aparatos, técnicas, métodos
ressaltar, que as intervenções podem afetar de modo
compõem o referencial para atuar junto aos pacientes,
significativo à vida dos indivíduos, por isso é importante
inclusive, os que recusam a transfusão sanguínea. O
a reflexão quanto aos interesses individuais e/ou
trabalho realizado deve buscar a garantia de sua e a
coletivos, demonstrando comprometimento com a
busca de meios que favoreçam o acesso aos seus
Referências:
direitos sociais.
6 Considerações Finais
Fica evidente que os direitos dos pacientes
BARROCO, Maria Lucia Silva. Ética e Serviço Social:
fundamentos ontológicos. 8. ed. São Paulo: Cortez,
2010.
BRASIL. Código civil brasileiro. 61. ed. São Paulo:
Saraiva, 2010.
estão presentes nas leis e códigos do País, em se
tratando daqueles capazes de decidir sobre seu corpo,
BRASIL. Código de defesa do consumidor.
Presidência da Republica. [S.l.]: Casa Civil, 1990.
decidir sobre si. A estas o texto constitucional
brasileiro, confere o direito de tomar decisões.
O paciente tem autonomia e direito legal de
recusar tratamento médico com sangue, devido aos
seus valores pessoais e convicções, baseado nos
princípios da autonomia, beneficência e a própria
BRASIL. Código de ética do/a assistente social. Lei
8.862/93 de regulamentação da profissão. 10. ed. rev.
atual. Brasília: Conselho Federal de Serviço Social,
2012.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da
Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF: Casa
Civil, 1988; Ministério da Saúde, 2011.
dignidade da pessoa humana.
Além da Constituição Federal, o Código Civil, o
Código de Ética Médica, o Código de Defesa do
Consumidor, a Carta dos Direitos dos Usuários da
Saúde e o Código de Ética Profissional dos assistentes
sociais contemplam aspectos referentes ao direito dos
pacientes.
O Serviço Social surge com a intenção de
produzir mudanças e contribuir com a melhoria da
sociedade. O Assistente Social enquanto mediador,
trabalha pelo acesso igualitário aos direitos sociais,
cabendo, portanto, atuação na eliminação das formas
de preconceito, defendendo os interesses de seus
usuários, incentivando o respeito pela diversidade
pautada na ética.
BRASIL. Ministério da Saúde. Carta dos Direitos dos
Usuários da Saúde/Ministério da Saúde. 3. ed.
Brasília: Ministério da Saúde, 2011.
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A IMPORTÂNCIA DO
FORTALECIMENTO DAS
FAMÍLIAS NO PROCESSO DE
DESENVOLVIMENTO DA PESSOA
COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
EM SALVADOR - BAHIA
1 Introdução
A discussão quanto ao papel da família vem
tendo repercussões em todo espaço social, por
considerá-la
a
primeira
instituição
com
responsabilidade em proporcionar um crescimento
Adriana Assis Santos1
Sandra Moreira Costa de Carvalho2
Tatiane Pereira dos Santos3
saudável e harmonioso ao indivíduo. A escolha
deste tema é de grande relevância para estudo por
se tratar de um grupo social que tem um papel
fundamental no desenvolvimento intelectual e social
Resumo
da pessoa com deficiência, favorecendo a inclusão
nos demais grupos sociais.
Esta pesquisa, fruto do trabalho de conclusão de
curso em serviço social de uma das autoras, trata
da importância da família no processo de
desenvolvimento da pessoa com deficiência
intelectual. A presente pesquisa objetivou conhecer
as manifestações da questão social que permeiam
o ambiente familiar com a presença da pessoa com
deficiência intelectual. Trata-se de uma pesquisa de
abordagem qualitativa, com pesquisa de campo in
lócus em instituição que realiza atendimento a
pessoa com deficiência intelectual, a Associação de
Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) Salvador,
sendo realizado entrevista semi estruturada junto
aos responsáveis que acompanham os educandos
da referida instituição, buscando atingir o objetivo
proposto no estudo.
Palavras chave: Família. Pessoas com deficiência.
Serviço social. Interdisciplinaridade.
1
Assistente Social (Ucsal), Mestre em Políticas Sociais e Cidadania (Ucsal) e
Docente em Serviço Social da Unirb;
2
Assistente Social (Ucsal), Mestranda em Políticas Sociais e Cidadania
(Ucsal) e Docente em Serviço Social da Unirb;
3
Assistente Social e Egressa da Unirb.
O assistente social é um dos profissionais
que pode contribuir no fortalecimento das famílias
para que alcancem maior autonomia frente à
superação das manifestações da questão social que
interferem no desenvolvimento da pessoa com
deficiência intelectual. Sendo assim, o assistente
social tem como possibilidade de atuação junto aos
usuários a ação interdisciplinar, pois o diálogo entre
diferentes saberes contribui para um olhar amplo da
realidade social.
A motivação pessoal para escolha do tema
foi pelo fato da aproximação da pesquisadora
enquanto funcionária do campo empírico da
pesquisa Associação de Pais e Amigos dos
Excepcionais de Salvador (APAE) teve a
oportunidade de observar a relação entre as
famílias e o filho com deficiência intelectual e a
inquietação de como os seus conflitos poderiam
interferir no desenvolvimento do mesmo. Sendo as
desenvolvimento intelectual e social da pessoa com
impressões fortalecidas no período do estágio
deficiência, dando ênfase às manifestações da
extracurricular que foi realizado na mesma
questão social que interferem na família da pessoa
instituição, porém considerando que neste momento
com
a vivência já tinha um olhar acadêmico, pois a
desenvolvimento intelectual e social, bem como, no
pesquisadora estava em formação profissional.
3º tópico, destaca-se a importância do trabalho
deficiência
intelectual
e
no
seu
A pesquisa tem como o motivo pelo qual as
interdisciplinar, por conseguinte, a contribuição do
famílias da pessoa com deficiência intelectual
serviço social no atendimento a família. No quarto
devem ser alvo de intervenção do serviço social.
tópico apresentaremos os resultados e análise dos
Para esse estudo, apresentamos como objetivo
dados com um recorte sobre a atuação do
geral analisar a importância da atuação do Serviço
assistente social em uma instituição de atenção a
Social no fortalecimento das famílias e nos fatores
pessoa com deficiência intelectual;
que interferem o desenvolvimento intelectual e
Cabe ainda destacar que, a metodologia
social da pessoa com deficiência e como objetivos
utilizada nesse estudo foi qualitativa, sendo utilizado
específicos a necessidade de conhecer quais
a pesquisa de campo realizada in lócus, com
manifestações da questão social interferem na
aplicação do roteiro de entrevista junto às famílias
família da pessoa com deficiência e no seu
que são acompanhadas pela APAE – Salvador, no
desenvolvimento intelectual e social, bem como
ano de 2013. Para nortear o estudo, foi realizado a
discutir a atuação do serviço social junto às famílias
pesquisa bibliográfica, desenvolvendo a técnica de
da pessoa com deficiência intelectual e refletir sobre
revisão literária a partir da busca de artigos, teses,
a importância da interdisciplinaridade na abordagem
internet, monografias e livros, sites, dentre outros.
junto às famílias da pessoa com deficiência
intelectual.
Utilizaremos a apresentação do aporte
teórico desse estudo 04 tópicos, sendo que o 1º
2 Desenvolvimento
2.1. Contextualizando a deficiência intelectual:
aspectos históricos e teóricos
tópico realizaremos a contextualização da
deficiência intelectual, por seus aspectos sócio
histórico dando ênfase às políticas voltadas para
Analisar a respeito do processo de
esse público a partir de 1980. No 2º tópico
desenvolvimento da pessoa com deficiência
percorreremos a importância da família no
intelectual requer primeiro o estudo da deficiência
no contexto sócio histórico brasileiro e os caminhos
percorridos a partir da década de 1980.
leva a compreender que a deficiência deixa de ser o
A partir da década de 1980 foi necessário
utilizar
a
Classificação
Internacional
das
Deficiências, Incapacidades e Desvantagens (CIDD)
que afirma a deficiência como sendo qualquer perda
ou anomalia (temporária ou permanente) das
estruturas e funções psicológica, fisiológica ou
anatômica e se constitui como desvio da norma
biomédica, fundada em base estatística, possível de
ser observada e mensurada. (OMS, 1989 apud
MÂNGIA; MURAMOTO; LANCMAN, 2008, p. 6).
Diante do exposto, verifica-se que esse
modelo de classificação não era satisfatório, nesse
sentido foi elaborado e implantado outra
classificação que melhor refletia a deficiência e suas
características,
trata-se
da
Classificação
Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e
Saúde (CIF), como descrevem: é a funcionalidade,
que cobre os componentes de funções e estruturas
do corpo, atividade e participação social. Segundo a
CIF a incapacidade é resultante da interação entre a
disfunção apresentada pelo indivíduo (seja orgânica
e/ou da estrutura do corpo), a limitação de suas
atividades e a restrição na participação social, e dos
fatores ambientais que podem atuar como
facilitadores ou barreiras para o desempenho
dessas atividades e da participação. (FARIAS e
BUCHALLA, 2005, p.3).
Mensurar a incapacidade a partir da CIF
foco e fator determinante para a limitação da
pessoa, mas engloba o contexto ambiental e social
que podem interferir no desempenho das atividades
e na participação social.
Compreender a deficiência requer a
utilização desses instrumentos, a CIF e a CID-10,
que a descreve como resultado da interação entre
as limitações das atividades e os obstáculos
impostos pelo ambiente social e físico restringindo a
participação social. Destaca-se ainda que, nas
mudanças políticas que contemplam a pessoa com
deficiência identifica-se a utilização da CIF no
momento da avaliação do Benefício de Prestação
Continuada. Assim, o avanço no que tange os
direitos da pessoa com deficiência a participação
plena na sociedade foi constituído historicamente a
partir de mudanças políticas.
A partir da década de 1980 surgiram leis,
pesquisas, debates que permitiram a sociedade ter
outra visão sobre a temática, principalmente quanto
ao seu papel em relação à construção de uma
sociedade inclusiva a diversidade humana. Neste
ano, como Ano Internacional da Pessoa Deficiente,
trata de um movimento voltado à desconstrução de
uma imagem preconceituosa e excludente sobre a
pessoa com deficiência.
Nesse aspecto, a “sociedade inclusiva” tem
como característica se preparar para dar condições
aos seres humanos, inclusive às pessoas com
deficiência, a ter acesso a todos os espaços sociais,
que no ponto de vista de Sassaki (1997, p. 41),
afirma que
a inclusão social como o processo pelo
qual a sociedade se adapta para poder
incluir, em seus sistemas sociais gerais,
pessoas com necessidades especiais e,
simultaneamente, estas se preparam para
assumir seus papéis na sociedade.
e ao idoso que comprovem não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei. (BRASIL, 2010,
p.22). Por este Artigo da CF de 1988, emerge a Lei
nº 8.742/1993, Lei Orgânica da Assistência Social
(LOAS), trata do Benefício de Prestação Continuada
(BPC), a qual estabelece alguns critérios de
É necessário que o Estado garanta
efetivamente os direitos das pessoas com
deficiência, e a sociedade assuma o seu papel
como instituição que tem responsabilidade no que
concessão aos seus beneficiários, como por
exemplo ter renda per capita inferior ¼ de salário
mínimo e atestar limitação para realização dos atos
da vida diária.
tange a inclusão, para que todos tenham condições
de exercer sua cidadania com oportunidade de
2.2.
igualdade, como deve ocorrer no campo
desenvolvimento intelectual e social da pessoa
educacional, local em que já se observa alguns
com deficiência
A
importância
da
família
no
avanços confirmados na Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva, a qual tem como objetivo o acesso, a
participação e a aprendizagem dos alunos com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento
e altas habilidades/superdotação nas escolas
regulares, orientando os sistemas de ensino para
promover respostas às necessidades educacionais
especiais. (BRASIL, 2007, p.8).
Um outro avanço no que tange a dignidade
e igualdade de oportunidade para as pessoas com
deficiência pobres, que são as que vivem em maior
situação de vulnerabilidade social, consta no art.
203, V, da Constituição Federal de 1988, onde
estabelece a garantia de um salário mínimo de
benefício mensal à pessoa portadora de deficiência
Historicamente, a deficiência era um tema
discutido apenas no ambiente familiar, no entanto,
na contemporaneidade, ocorreu à entrada da
sociedade e do poder público sobre a complexa
temática.
Impossível tratar do tema deficiência sem
contextualizar com o universo familiar e as
manifestações da questão social presente neste
cenário, assim, destaca-se a contribuição do
profissional do serviço social nesse contexto,
ressaltando
a
importância
do
trabalho
interdisciplinar diante da complexidade das
demandas. Reconhecendo que a família tem uma
importância no desenvolvimento intelectual e social
da pessoa com deficiência, cabe refletir sobre o seu
significado que na concepção de Nogueira (2007,
forma que a notícia for abordada poderá trazer
p.1), onde a família é uma sociedade natural
dificuldades no relacionamento da mãe com seu
formada por indivíduos, unidos por laço de sangue
bebê. (FALKENBACH, DREXSLER e WERLER,
ou de afinidade.
2007, p. 07).
Embora autores tragam a compreensão da
No que tange ao tratamento, a família que
família nuclear, esta, na contemporaneidade vem
tem o direito e o dever de solicitar orientações
sofrendo modificações na sua base estrutural, não
referentes ao diagnóstico, ao tratamento, aos
sendo possível identificá-la com um padrão único,
benefícios sociais, enfim, tudo que envolve o
mas sim com diversos arranjos, assim, pode-se
desenvolvimento intelectual e social da criança, e
caracterizá-la como família extensa com a presença
quando os pais encontram profissionais que
dos avôs, tios e outros parentes ou ainda pode ser
realizam um atendimento humanizado transmitindo
com estrutura monoparental formada por um dos
confiança, conforto e promove um diálogo com
genitores e seus descendentes.
escuta de questionamentos, compartilhamento de
A família é o primeiro elo da criança
dúvidas e informações pertinentes acerca da
(independente se com ou sem deficiência) e tem
deficiência, tudo isso irá gerar subsídios para a
responsabilidade direta no crescimento e no seu
família melhor exercer o seu papel no que tange o
processo de evolução proporcionando o encontro
desenvolvimento do membro com deficiência.
com os demais ambientes sociais o que favorecerá
A falta de operacionalização das políticas
a autonomia para ser um sujeito atuante na
públicas agrava o contexto sociofamiliar quando
sociedade. Nesse contexto, torna-se de suma
vinculada a outros determinantes sociais, a saber: o
importância o momento do diagnóstico para a
desemprego, a pobreza, a baixa renda, a estrutura
família e para o filho com deficiência, pois é a partir
monoparental, a discriminação, o acesso a serviços
dali que iniciará a construção dos vínculos afetivos,
de apoio assistencial.
e quando as informações são dadas com relatos
carregados de preconceitos, falta de sensibilidade e
desconhecimentos da deficiência podem gerar na
família fragilidades emocionais que poderão
2.3. A contribuição do Serviço Social no
atendimento a Família e a Importância do
Trabalho Interdisciplinar.
interferir no desenvolvimento intelectual e social da
O Serviço Social passou após seu
criança. O momento da notícia pode ser crucial na
movimento de reconceituação, por processos de
vida do bebê e de sua mãe, pois dependendo da
mudanças na sua identidade
profissional,
configurada pela renovação do serviço social, a
político, a Lei que Regulamenta a Profissão e o
teoria marxista e a construção do projeto ético
Código de Ética do Serviço Social.
político, possibilitando a intervenção do profissional
Como
alternativa
técnico-operativa,
diante das demandas dos usuários a partir de uma
salienta-se as possibilidades de intervenção do
consciência crítica.
assistente social por suas ações socioeducativas
Embasado no novo projeto, o assistente
que são desenvolvidas a partir de três eixos: do
social deve realizar atuação junto à pessoa com
trabalho em torno da orientação e informação sobre
deficiência na viabilização da garantia dos direitos
as questões que envolvem o reconhecimento e a
humanos, no fortalecimento da cidadania e da
viabilização de direitos sociais; do trabalho em torno
autonomia, que possibilite uma participação ativa na
de aspectos da organização e dinâmica familiar o
sociedade de forma igualitária.
que envolve as questões familiares e de “suporte
Para o assistente social desenvolver a sua
emocional”; e do trabalho em torno da organização
prática profissional pautada no projeto ético político
social e participação política cuja preocupação é de
requer do profissional conhecer as demandas com
fortalecer o usuário e a família para uma ação mais
uma consciência crítica da realidade social,
coletiva e voltada à mobilização social. (JESUS,
articulando com as competências profissionais.
2005, p. 144).
Nesse contexto, Iamamoto (2011, p. 62) nos
Nesse sentido, compreende-se que o
apresenta as competências que fundamentam os
trabalho socioeducativo tem como perspectiva o
meios de trabalho, tais como: as competências
indivíduo e o coletivo tendo como características, as
técnico-operativo,
teórico-
informações e orientações que possibilitem o
metodológica, esta última, permite ao profissional
acesso aos direitos sociais, vale ressaltar a
conhecer a dinâmica da realidade além da
importância do trabalho socioeducativo, na dinâmica
aparência, a partir de uma reflexão crítica,
familiar, com os conflitos que as permeiam e o
buscando estratégias de intervenções favoráveis.
fortalecimento dos usuários pensando no coletivo e
ético-político
e
Assim, na prática profissional do assistente
na organização social.
social junto às famílias e pessoa com deficiência é
Diante das manifestações da questão social
relevante a articulação das dimensões, teórico-
vivenciadas pelas famílias da pessoa com
metodológica, técnico-operativa e ético-política, o
deficiência,
embasamento legal tais como: o projeto ético
socioeducativo de maneira contínua e permanente,
cabe
desenvolver
o
trabalho
no qual os usuários dos serviços constroem uma
consciência crítica sobre si mesmo e sobre a
necessitam desses serviços em sua grande maioria
realidade para nela atuar de forma transformadora.
vêm com uma ansiedade em ver seus filhos andar e
E ainda, um espaço onde ocorra a troca, a
falar, daí a necessidade da equipe interdisciplinar
socialização e a democratização das informações,
trabalhar com a criança e seus familiares”. São
baseado, não num mero repasse, mas num
diversas as dificuldades das famílias ao lidar com a
processo reflexivo. (JESUS, 2005, p. 146). Assim,
pessoa com deficiência, nesse sentido, ao
realizar uma intervenção emergencial junto às
contemplar o trabalho com famílias a partir da
demandas das famílias da pessoa com deficiência,
proposta de ação interdisciplinar, na qual os
visando um atendimento com resultado imediato,
profissionais dialogam os saberes específicos,
torna-se inviável, pois cabe um acompanhamento
buscam encontrar a melhor forma de intervenção.
constante com perspectiva do trabalho centrado na
família e no alcance do seu fortalecimento e
empoderamento.
Atuar nesse espaço sócio-ocupacional,
requer do assistente social habilidades na
2.4. Um recorte sobre a atuação do Assistente
Social em uma Instituição de atenção a pessoa
com deficiência intelectual
perspectiva interdisciplinar. Demo (1997, p. 88 apud
2.4.1 O percurso metodológico e os resultados da
CARRIJO, PORTO e BERTANI, 2003, p. 10), define
pesquisa
a
interdisciplinaridade
como
“a
arte
do
aprofundamento com sentido de abrangência, para
dar conta, ao mesmo tempo, da particularidade e da
complexidade do real [...]”. Sendo assim, a
interdisciplinaridade é uma iniciativa de trabalho que
envolve uma ação voltada para o diálogo de
saberes nos quais, profissionais de áreas diferentes
atuam contribuindo com o seu conhecimento,
considerando a totalidade e a particularidade do
sujeito.
O campo empírico desse estudo foi a
Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
(APAE) em Salvador. Essa instituição oferta suporte
técnico e interdisciplinar aos seus usuários nas
áreas de: professores, auxiliares de classe, dentista,
assistentes sociais, fonoaudiólogo, neurologista,
terapeutas ocupacionais, psicólogo, psicomotricista,
psicopedagogos e coordenadores pedagógicos e
gerente técnica.
A metodologia utilizada foi a abordagem
Nesse contexto familiar, reflete-se à
contribuição da equipe interdisciplinar a as autoras
Rocha e Gimenez (2010, p. 2), “as famílias que
qualitativa, com pesquisa in lócus realizada no mês
de maio de 2013, com base na Resolução MG
196/96 e determinações institucionais. Com a
assinatura do Termo de Consentimento Livre e
membro trabalha e ajuda com as despesas da
Esclarecido (TCLE), todos os sujeitos foram
família. Salienta-se o pai de um usuário-educando,
esclarecidos sobre os objetivos acadêmicos do
o qual fora o único responsável do sexo masculino a
trabalho, bem como sobre seus direitos e deveres
frequentar o Espaço de Convivência das Famílias
como participante do estudo. Embora a Instituição
da Instituição no turno vespertino. No universo das
assista atualmente cerca de 231 (duzentos e trinta e
08 (oito) mulheres entrevistadas todas são chefes
um) usuários/educandos, o quantitativo de sujeitos
de família, ou seja, com estrutura monoparental;
das pesquisas foram 09 (nove) responsáveis
todas desempregadas, tendo como sustento familiar
desses educandos que participavam do Projeto
o Benefício de Prestação Continuada (BPC) como
Fazer e Acontecer desenvolvido pelo Serviço Social
única fonte de renda.
do núcleo do CEDUC- Centro de Atendimento
Educacional Especializado.
Nessa pesquisa pensando no sigilo, os
entrevistados serão representados por nomes de
Após alguns critérios de elegibilidade para
participarem da pesquisa, dentre eles, abdicarem
cores tais como: Amarela, Verde, Azul, Rosa, Lilás,
Laranja, Vermelha, Branca, e Marrom.
das atividades laborais em detrimento da
A partir de agora, apresentaremos alguns
assistência ao usuário-educando, recorrendo ao
dados obtidos com o estudo. Em se tratando da
BPC, foi aplicado entrevista semi estruturada aos 09
notícia sobre o diagnóstico da deficiência, momento
(nove) participantes, com o objetivo de identificar as
que marca profundamente a família, pois
manifestações da questão social que interferem nas
experimentam sentimentos contraditórios, o familiar
famílias que possuem pessoa com deficiência
Verde, afirmou que ao saber do diagnóstico “Fiquei
intelectual.
decepcionada no início, chorei, mas depois me
Como forma de tecer essa análise a partir
acostumei”. Nesse contexto, os sentimentos que
dos dados obtidos, tornou-se necessário construir
são mais comuns no momento do diagnóstico da
um perfil mínimo dos sujeitos da pesquisa. Dessa
deficiência, oscilam entre polaridades muitos fortes:
forma, o estudo foi composto por oito mulheres e
amor e ódio, alegria e sofrimento; uma vez que as
um homem, com idade variando entre 28 a 54 anos,
reações concomitantes oscilam entre aceitação e
membros de famílias compostas pelo educando, a
rejeição, euforia e depressão – para citar o que
mãe e em alguns casos outros filhos tendo a
ocorre com frequência. (AMARAL, 1995 apud GLAT
presença de filhos menores e adultos em sua
1996, p. 4).
maioria; com núcleo familiar onde apenas
um
Um outro elemento apresentado na fala do
necessário buscar atendimentos na capital para
familiar Rosa, afirma que “Me senti triste, fiquei com
entender sobre a deficiência, o que revela o
medo dele ficar cego.”, expressando portanto o
desconhecimento de alguns profissionais sobre a
desconhecimento da deficiência e seus efeitos no
deficiência, limitando as orientações aos familiares.
sujeito, a falta de informação gera angústia e medo
Em se tratando do cotidiano das famílias
do futuro. Sobre as possíveis orientações recebidas
com o filho com deficiência, são diversas as
não emergiram do momento do diagnóstico, mas
limitações e dificuldades, a saber:
sim, do seu primeiro contato com a Instituição
especializada, vejam: “Não recebi nenhuma
orientação, só deu apenas o diagnóstico, a
orientação recebi da APAE aos 3 a 4 meses”.
(Amarela)
Percebe-se que, as orientações e apoio
necessários aos pais quando recebe a notícia que
seu filho tem deficiência podem influenciar
positivamente na autoconfiança do filho para o
desenvolvimento de suas capacidades. Assim
sendo, o apoio dado à família minimiza as
ansiedades frente ao filho portador de necessidades
especiais, e promove a busca de novas alternativas
para a organização da vida dessa criança,
possibilitando um enfrentamento dos problemas
com
Dificuldades em brincar com meu filho, no
início, em alimentar, dificuldade no falar.
(Rosa)
Dificuldade
no
acesso
ao
acompanhamento, no interior não tinha
geneticista, tinha que ir para outra cidade.
A minha dificuldade é fazer que ela preste
atenção no que eu estou falando é ter
pulso firme com ela. Às vezes eu coloco
ela de castigo quando volto ela não esta
mais, resistente demais. (Branca)
Dialogando sobre as dificuldades em lidar
com a deficiência, Buscaglia (1993, p.26) aponta
que “os pais de crianças deficientes necessitam de
orientação em relação à disciplina dessas crianças.
Freqüentemente relutam em repreendê-las, treiná-
cotidianos. (GLAT, 2004, p. 4).
Esclarecimentos
Ele é desobediente, às vezes perco a
paciência, dificuldade em fazer com que
ele aceite as coisas da maneira
certa..(Amarela)
informações
pertinentes a respeito da deficiência são
las, ensinar-lhes limites reais, assim como fazem
com os outros filhos. [...]”
indispensáveis, porém ainda se encontra famílias
A partir dos relatos observa-se que as
que não recebem as orientações essenciais para
famílias têm dificuldades em impor limites às
compreender a deficiência e saber como lidar com a
crianças com deficiência, assim a busca por
nova situação. E quando a família é oriunda do
caminhos para entender como lidar com a pessoa
interior são escassas as informações sendo
com deficiência é manifestada nos relatos, e como
as orientações para superação das dificuldades e o
economicamente ativa e laboral para cuidar
fortalecimento das famílias são indispensáveis para
exclusivamente do seu ente com deficiência.
Parei de trabalhar, depois que ele nasceu
abandonei o trabalho, porque tinha que
cuidar dele e não tinha quem cuidasse.
(Amarela).
conviver com as questões internas e externas que
experimentam.
Quando questionadas se eles preparam a
Pessoa com deficiência para algumas situações
Eu trabalhava, tinha minha vida
estabilizada, quando minha filha nasceu,
me vi sozinha, meu outro filho também
dependia de mim. (Azul).
cotidianas, algumas famílias afirmam que:
Preparo, recebe orientação para estimular
a minha filha a ser uma pessoa
independente para não estar fazendo as
coisas para ela.( Lilás)
Preparo, mostro tudo a eles. Recebe
orientação da professora de AVAS da
APAE, da psicóloga na reunião
psicossocial que fazia a gente entender as
necessidades dos nossos filhos. Recebe
muito apoio quando cheguei na APAE.(
Laranja)
Sobre o papel dos pais no desenvolvimento
Nesse cenário de mudanças na dinâmica
familiar, especialmente no aspecto financeiro,
Almeida, (2011, p. 21) afirma que mediante
necessidades de deslocamento e acompanhamento
preciso dos seus filhos, alguns muitos pais precisam
optar ou pelo trabalho ou pelo tratamento deste,
optando
geralmente
pelo
último,
muito
intelectual e social do filho com deficiência, uma boa
provavelmente por acreditarem que apenas eles
relação entre pais e filhos que desenvolva vínculos
podem e devem cuidar dos seus filhos com
afetivos pode propiciar comportamentos mais
deficiência. Esse cenário é expresso por Sposati
competentes, gerando mais autonomia e
(2004, p.172), a qual apresenta-nos que para quase
possibilidades de inclusão social. (CARDOZO e
“[...] 50% das famílias a única renda regular que
SOARES, 2011, p.5).
possuem, formando-se, com isto, fundamental para
As famílias informam as possíveis
o sustento delas.[...]”
mudanças ocorridas nos aspectos relacionados ao
Nesse contexto socioeconômico e familiar,
trabalho, lazer, relação conjugal e demais filhos com
o lazer torna um momento raro na vida familiar, ou
a presença da pessoa com deficiência no ambiente
quando acontece tem a presença da pessoa com
familiar.
deficiência, afirmado nas falas de alguns familiares:
No âmbito do trabalho, as respostas
frequentes afirmaram um dado já apresentado no
perfil dos pesquisados, os quais pararam suas vidas
Eu saía para passear passava os dias fora
em outra cidade, agora não saiu mais
quando eu saiu, eu tenho que levar ela.
(Branca).
Saiu com eles para os lugares. (Verde)
Outro ponto a ser considerado além da
ausência do lazer nessas famílias, é apresentado
nas falas abaixo, as quais expressam outra
problemática envolvida, a relação conjugal.
Alguns anos me separei do pai dele,
porque ele não se esforçava para me
acompanhar para sair com ele no médico,
na escola, não me ajudava. (Amarela).
O pai discriminava o filho e ele bebia
muito, brigávamos muito por causa da
bebida e do filho. (Rosa).
O pai se neutralizou, vive muito bem, acha
que os filhos não tem nada, acho que é
uma defesa dele. (Laranja).
indispensável o acesso a orientações e apoio para
compreender a deficiência.
Nesse contexto, Famílias com estrutura
monoparental, geralmente com chefia feminina,
devem buscar a solidariedade de parentes e
vizinhos para cumprir as diversas atividades na
rotina diária. Entretanto, quando os parentes não
moram próximos ou vivem em outra cidade como é
o caso da Família Branca, se vêm sozinhas para
resolver tudo que se aplica ao ambiente doméstico.
As famílias relatam as outras atividades que
passaram a ter com a presença da pessoa com
A importância de uma rede de apoio junto
deficiência favorecendo a sobrecarga tais como: a
às famílias é essencial para o enfretamento das
atenção maior nos cuidados, o atendimento
manifestações da questão social presente na
educacional especializado, a escola regular, o
dinâmica familiar com a presença da pessoa com
acompanhamento médico, a dificuldade em lidar
deficiência. Considerando a divisão de papéis na
com o filho(a) com deficiência e a administração dos
relação conjugal, Souza e Boemer (2003, p. 16)
conflitos familiares.
afirmam:
O acumulo de tarefas sendo dispensado
O papel do pai nessa relação pode ser
entendido como relevante, com aspectos
significativos para ele, a mãe e o filho,
sinalizando para o cuidado não mais
exclusivo da mulher, mas trazendo uma
participação cada vez maior e reflexão a
respeito das necessidades de todos os
envolvidos.
exclusivamente a um membro, gera a sobrecarga,
estresse físico e emocional, comprometendo a
saúde do responsável pelo cumprimento das
atividades da rotina diária. Orientações e
informações que contribuam para a superação das
Nos relatos, as famílias, maioria das
dificuldades presentes no ambiente familiar são
entrevistadas mulheres, revela a ausência do pai na
essenciais para a busca de mudanças desta
divisão de papéis, no apoio, na ida aos
realidade.
atendimentos médicos, lidam com a deficiência de
A
discriminação
e
estigma
social
maneira diferenciada da mãe, necessitando de um
enfrentados pela família e pessoa com deficiência
tempo
em diversas circunstâncias ainda se faz presente
maior
para
aceitação,
portanto é
em locais como: ônibus, família, comunidade e
vivenciada no cotidiano, como através de denúncias
escola, conforme marca a fala de Verde:
das Escolas que não aceitam a pessoa com
Já briguei no ônibus com o motorista e o
passageiro. Tem motorista que não parava
no ponto quando solicitado, quando via
que era deficiente, já denunciei a
discriminação. (Verde)
deficiência. O Estado deve assumir a sua
responsabilidade em garantir o acesso à educação
para todos de forma igualitária.
De acordo com Furlan, Araújo e Peralta
O Assistente Social atua numa equipe
(2010, p. 1) “o preconceito social é o que mais
interdisciplinar, no projeto Portas Aberta, onde
amedronta a mãe, pois sabe que as pessoas farão
pessoas que tentam ingressar na Instituição
comentários e olharão de forma diferente para seu
passam pela equipe interdisciplinar formada por
filho”. Observa-se que ainda a sociedade
assistente
desconhece sobre a deficiência, e a sua
fonoaudióloga, e psicopedagogo, na qual juntos irão
responsabilidade no contexto da inclusão social.
apontar quais os serviços demandados pela criança
Outro ponto que não pode deixar de ser
mencionado nesse estudo são as dificuldades com
a inclusão escolar da pessoa com deficiência
intelectual, conforme expressa Laranja:
Na reunião de pais teve a entrega das
provas dos filhos e não entregaram as
minhas, fui me informar, elas disseram que
segunda – feira, me entregaram as tarefas
muito bem executadas [...] (Laranja)
social,
neurologista,
psicólogo,
e pela família e a partir daí quais poderão ser
ofertados pela instituição.
A partir da relação da equipe interdisciplinar
e a família da pessoa com deficiência, Cortez e
Regen (1996, p.07) afirmam:
É importante que se estabeleça uma
relação de confiança mútua e de parceria
entre pais e profissionais, pois aqueles,
embora leigos, convivem por muito mais
tempo com a criança e podem trazer dados
importantes para o bom desenvolvimento
do trabalho técnico.
Muitas famílias ainda não aceitam a
inclusão escolar, tem medo do preconceito social
manifestado pelos profissionais da área da
educação, dos alunos e das famílias dos mesmos.
Quando a família se sente valorizada,
Sensibilizar a sociedade quanto ao direito da
participante do processo de aprendizado do filho
pessoa com deficiência no acesso a todos os
com deficiência, favorece a relação entre os
espaços sociais de maneira igualitária, é
profissionais e família. Contar com a equipe
fundamental para romper com a discriminação, e as
profissional,
famílias ter uma consciência crítica quanto ao seu
compartilhamento de dúvidas é indispensável para
direito para realizar mudanças dessa realidade
o desenvolvimento intelectual e social da pessoa
com deficiência.
para
orientações,
para
A equipe interdisciplinar é fundamental
Social na efetivação do trabalho são: observação
diante das manifestações da questão social
participante, acolhimento, acompanhamento,
experimentadas junto as famílias e a pessoa com
orientação, atendimento individual e grupal, visitas
deficiência, pois promove o fortalecimento, o acesso
domiciliares e institucionais, entrevistas individuais,
as informações para lidar com a deficiência, enfim,
dinâmica de grupo, reunião técnica, palestras,
um atendimento visando mudanças da realidade
anamneses, avaliações sociais e socioeconômico,
social enfrentadas no cotidiano.
diário de campo, prontuários, formulários para
Nessa Instituição, o serviço social tem como
monitorar e organizar o trabalho, planejamento para
finalidade facilitar a relação interpessoal de seus
exercício dos projetos, relatório social e
membros, sua integração na comunidade e
encaminhamentos.
consequentemente a inclusão social. Oportunizar à
No
que
diz
respeito
às
ações
sua clientela o acesso aos serviços oferecidos pela
socioeducativas realizadas pelos assistentes sociais
instituição, bem como o conhecimento de outros
Mioto (2010, p. 2) diz, “postula-se a orientação e o
serviços que possam facilitar à aquisição e
acompanhamento como ações de natureza
ampliação de direitos. O público alvo do serviço
socioeducativa que, como os próprios nomes
Social são as famílias e os responsáveis dos
indicam, interferem diretamente na vida dos
educandos que são atendidos, além do atendimento
indivíduos, dos grupos e das famílias”.
a comunidade acolhendo a demanda espontânea
As famílias relatam sobre as orientações
que busca os serviços da instituição realizando uma
dadas pelo profissional do Serviço Social,
triagem e orientando as famílias. As principais
considerando importantes diante das dificuldades
demandas
em lidar com a deficiência e as situações presentes
dos
usuários
são:
acesso
a
escolarização, a profissionais da área de saúde
especializada
(neurologista,
psicólogo,
no cotidiano da dinâmica familiar.
As
técnicas
utilizadas
para
o
psicopedagogo, dentista, etc.), informações sobre
desenvolvimento do trabalho socioeducativo é
garantias dos benefícios como BPC (Beneficio de
explanada por Mioto (2010, p.12), “esses
Prestação Continuada) e Passe Livre.
incorporam técnicas de dinâmica de grupo, recursos
Nesse espaço sócio ocupacional, os projetos
desenvolvidos pelo Serviço Social são de
audiovisuais, técnicas de reconhecimento do
território, entre muitas outras”.
acompanhamento e assistência às famílias. Os
As respostas manifestam que a oferta de
Instrumentos técnicos utilizados pela Assistente
atividades voltadas para a geração de renda é
importante para as famílias, na medida em que
decisivamente na família da pessoa com deficiência
contribui para aumentar a renda, já que os sujeitos
e assim no seu desenvolvimento intelectual e social.
entrevistados, na sua maioria, tem o BPC como
Certificou-se a fragilidade de políticas
única fonte de renda. Também são ressaltadas as
públicas em prol das famílias de pessoas com
atividades
deficiência, atuando diante das manifestações da
artesanais
e
culinárias
com
demonstração de prazer e relaxamento, já que
devido à sobrecarga da rotina diária, muitas não
têm tempo para momentos de distração.
Dentre os temas discutidos nas dinâmicas,
questão social, assim, a
mobilização das
organizações sociais, da própria pessoa com
deficiência e da família são fundamentais na luta
pela garantia dos seus direitos.
palestras e oficinas os mais citados são os que
Para tratar da família e a sua importância
abordam a direitos, a saúde e a questões referentes
no desenvolvimento intelectual e social da pessoa
à deficiência, ao cotidiano das famílias e da
com
sociedade. Assim, as ações socioeducativas tem o
manifestações da questão social que interferem na
objetivo de viabilizar o empoderamento das famílias
dinâmica familiar, o que revelou que começa no
através da orientação, da socialização de
momento do diagnóstico da deficiência e que a falta
informações e do processo reflexivo, promovendo
de orientação e apoio de profissionais junto às
mudanças na sua realidade social com consciência
famílias compromete a relação entre os pais e a
crítica para participar ativamente da transformação
criança com deficiência.
social.
deficiência
buscou-se
conhecer
as
A pesquisa revelou a contribuição do
serviço social centrada no trabalho com as famílias
3 Considerações Finais
desses sujeitos através do desenvolvimento da sua
competência nas ações de orientações e apoio
junto às famílias tendo a articulação com a equipe
Este trabalho analisou a importância da
interdisciplinar, a partir da complexidade das
atuação do Serviço Social no fortalecimento das
demandas experimentadas pelas mesmas, pois
famílias e nos fatores que interferem para o
percebe-se que o diálogo entre diferentes saberes
desenvolvimento intelectual e social da pessoa com
favorece a intervenção profissional.
deficiência. Percebe-se que as famílias devem ser
A pesquisa empírica permitiu conhecer que
alvo de intervenção do serviço social, pois as
neste universo, as manifestações da questão social
manifestações da questão social interferem
experimentadas pela família, tais como: a falta de
orientação no momento do diagnóstico, e para
saber lidar com a deficiência; a pobreza em virtude
da necessidade de abandonar o emprego para
cuidar do(a) filho(a) com deficiência tendo como
principal fonte de renda o Benefício de Prestação
Continuada (BPC); a discriminação; a sobrecarga
pelo ato de cuidar; o fato da família em geral ser
ALMEIDA, Washington L. Sieleman. A
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em: http://www.apaesalvador.org.br/. Acesso em: 15
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monoparental.
Portanto pode-se afirmar que o problema
que norteou este trabalho, a saber, o por que as
famílias da pessoa com deficiência intelectual
devem ser alvo de intervenção do serviço social?
BRASIL, República Federativa do. Ministério do
Desenvolvimento e Combate à Fome. LOAS - Lei
Orgânica da Assistência Social.Brasília,
Reimpressão 2010.
Foi respondido, sendo confirmada a hipótese: a
intervenção do serviço social proporciona o
fortalecimento das famílias frente às manifestações
da
questão
social
que
interferem
no
desenvolvimento intelectual e social da pessoa com
deficiência, considerando a importante contribuição
da equipe interdisciplinar nesse processo.
Afirma-se que o Serviço Social, neste
contexto,
realiza
ações
socioeducativas,
possibilitando o fortalecimento e empoderamento
das famílias na busca por mudanças da sua
realidade social, na medida em que viabiliza o
acesso às informações com reflexão, gerando uma
BRASIL, República Federativa do.Política Nacional
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A PROPOSTA DO ESTADO FRENTE À
CENTRALIDADE DAS FAMÍLIAS NA
POLÍTICA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA
SOCIAL - PNAS: UMA ANÁLISE HISTÓRICOCRÍTICA
Palavras-chave: Centralidade. Família. Estado.
Política Nacional de Assistência Social – PNAS.
Neoliberalismo.
1 Introdução
Grasiela Santana Santos1
Objetiva-se com o texto trazer reflexões
Jocelina Alves de Souza Coelho2
históricas da inoperância das políticas sociais no Brasil,
frente à lógica excludente da sociedade capitalista e da
Resumo
cooptação da ideologia neoliberal, somado a idéia de
O presente artigo tem por finalidade abordar o tema: “A
proposta do Estado frente à centralidade das famílias
na Política Nacional de Assistência Social - PNAS: uma
análise histórico-crítica”, com o objetivo de refletir
sobre a implantação e a implementação do Sistema
Único de Assistência Social - SUAS como política
pública universal garantidora de direitos. Além de
trazer sérias discussões a respeito de: como a família
passou a ser merecedora de atenção e vista como alvo
central das políticas sociais, nomeada pelo Estado
como responsabilizável pela proteção, recuperação e
sustentação dos seus membros. Bem como, na
exigência de que a mesma deva ser solidária as
demais instâncias sociais caso seja necessário. Isto se
traduz numa sobrecarga que a família pode não
conseguir suportar, tendo em vista a sua condição de
vulnerabilidade socioeconômica, política e cultura.
Logo, percebe-se que o Estado com tal “privilégio”
passa a culpabilizar e/ou psicologizar as famílias por
seu sucesso ou insucesso.
reduzir o tamanho do Estado, que resulta no aumento
das altas taxas de extrema pobreza no país e
sobretudo no agravamento da crise social. Assim, o
Estado na tentativa de amortizar os problemas utilizase de políticas focalizadas, e fragmentadas dando a
entender que os impactos sociais estão sendo
reduzidos.
Baseando-se nesse contexto a família
ressurge na década de 1970 com nova significância,
diante do declínio da sociedade salarial e da crise do
welfare state, ou seja, o Estado busca responsabilizá-la
pela proteção, recuperação e sustentação dos seus
membros, bem como, passa a exigi-lhe postura de
solidariedade às demais instâncias sociais caso fosse
necessário.
1
Assistente Social do CRAS Água Fria e do Núcleo de Apoio à
Saúde da Família do mesmo município, desde julho de 2013,
graduada pela UNIRB, turma – 2013.1. E-mail:
[email protected]
2
Assistente Social do INSS e Professora Orientadora da Disciplina
de TCC I e II da Faculdade UNIRB, Mestre em Serviço Social e
Política Social. E-mail: [email protected].
Diante do exposto, o artigo ora em abordagem
tem por finalidade responder ao seguinte problema:
qual a intencionalidade da política de Estado em
promover a família na perspectiva neoliberal como alvo
central da Política Nacional de Assistência Social?
Para disseminação do estudo, utilizaram-se
como pontos chaves as categorias: Estado,
desenvolvidos da Europa e o porquê dele nunca ter se
efetivado no Brasil.
Neoliberalismo, Política Social Pública de Assistência
Social, Famílias e Serviço Social.
O plano beveridgiano inglês de proteção
social, instituído em 1942, durante a Segunda Guerra
2 Os fatores Históricos e Socioeconômicos que
Contribuíram para a Construção do Modelo de
Proteção Social Atual
Mundial, serviu como condicionante determinador para
regulamentar os padrões nas relações sociais e
materiais entre a classe capitalista e o proletariado,
submersos ao padrão keynesiano-fordista3. A proposta
A presente seção visa refletir como se deu a
intervenção do Estado na proteção social das famílias
beveridgiana objetivava a luta pela redução da
pobreza, e das multifacetadas expressões da questão
social.
brasileiras, e quais fatores evidenciaram a alocação
desse público como alvo central da Política Nacional
de Assistência Social – PNAS, frente à perspectiva
neoliberal de atuação do Estado. Assim, para
descrever a organização do Estado lançou-se a
abordagem inicial, através de uma breve análise
teórica sobre sua categoria.
Assim, as políticas da Assistência Social e da
Saúde no Brasil foram orientadas através desse
princípio, enquanto que na Previdência Social há
predominância
do
modelo
compõe a Seguridade Social Brasileira, desde a
implantação da Constituição Federal de 1988.
proposta elucidar o que Marx define como Estado, visto
como uma instituição legalmente instituída por manter
a sociedade de classes. Marx traduz o que na
atualidade seria a instituição social provedora e/ou
interventora das relações sociais e materiais que
permeiam a vida da classe trabalhadora do Brasil.
Refletir sobre o funcionamento da dimensão
intervencionista do Estado, atuando na perspectiva de
conter as crises instaladas pela produção e reprodução
É preciso também frisar o contexto histórico
excludente vivenciado pela população que saiu do
modelo escravista, sem que lhes fossem dados
condições mínimas de absolvição no mercado de
trabalho e na sociedade, por meios de garantias de
subsistência.
Historicamente vê-se que as políticas públicas
foram criadas ao longo dos tempos na tentativa de
conter os conflitos entre a classe trabalhadora e a
das relações sociais, requer a compreensão inicial do
modelo de proteção do Estado de bem estar social
que
de
contribuição, formando assim os três pilares que
A linha de pesquisa escolhida tem como
(Welfare State)
bismarquiano
funcionou nos
países
3
- Ler Antunes (1999) e Havey (1992).
dominante, com intenção de regulação permeando-se
desenvolvimento é consequente das desigualdades
entre os espaços contraditórios da sociedade.
sociais. É histórica a realidade desigual que marca o
Estas têm suas origens na perspectiva de
Brasil, por não deter de recursos financeiros suficientes
suprir as necessidades mínimas daqueles que já não
para cobrir tais necessidades, como ainda hoje, sofre-
têm condições de prover o próprio sustento, ou ser
se com a estimativa de não dispor de um fundo próprio,
provido pela família. Dando garantias de segurança
que assegure aos mais vulneráveis a proteção social
afiançada aos cidadãos que dela necessitarem. Diante
do Estado.
disso, houve intensas discussões na perspectiva de
Para tanto, perceber que capitalismo e Estado
propor e formular uma nova política pública de
de bem-social são vistos com uma via de mão dupla,
Assistência Social, através da inclusão de direitos
conforme sinaliza Demo (2002, p.07) “igualar
sociais e, mais especificamente, do direito à
capitalismo e Estado de Bem-Estar só pode ser feito
seguridade social.
por um centro alienado”, ou seja, ambos têm ideários
contraditórios, o primeiro visa à acumulação de
3 O Estado enquanto Agente de Proteção Social
atendendo a Proposta Neoliberal
riquezas através da exploração do homem pelo
homem, baseando-se na negação de diretos sociais, já
o segundo, busca garantir os direitos sociais básicos
aos que não o detém, seja ele trabalhador ativo ou
Esta seção objetiva discutir o papel do Estado
como agente da proteção social frente às garantias dos
mínimos sociais, atendendo a proposta ideopolítica
neoliberal, na perspectiva de apontar os limites do
esgarçamento da política de seguridade social, o que
de certa forma não foi consolidada, conforme preceitua
a Carta Magna de 1988. Considera-se de fato que a
lógica capitalista sobrepõe a pobreza, a exploração da
mais-valia, enfim, estratifica a produção e reprodução
das relações sociais e materiais.
Adotar um modelo de proteção social vindo de
países europeus desenvolvidos só tende a fadar no
fracasso, inclusive por razões óbvias de que o aumento
crescente da população pobre nos países em
inativo.
Diante desse contexto, reafirma-se o sair da
rota do direito, com ações de enfrentamento da
questão social de cunho paliativo, impopular,
focalizado e impreciso, ainda adotando uma visão
funcionalista, perpassando pela corrente positivista que
visualiza o sujeito como culpado pela sua situação de
vulnerável.
No entanto, vale destacar a importância de
desmistificar a Assistência Social como fetiche na
solução das mazelas sociais. Conforme frisa Demo
(2002, p.15) não é acaso que se vê no Brasil “leis que
não funcionam, mercado sequer condiz com o
capitalismo competitivo, a elite espolia tudo e a
histórica do Estado por não ser uma política de cunho
concentração de renda, terra e poder é um horror”.
universal e transformadora das reais necessidades
Assim, com o Estado de Bem-Estar Social a
básicas, principalmente educação. Com o SUAS
família se torna alvo de atuação no conjunto das ações
priorizando a família como alvo central de suas ações,
do Estado. Este identifica a importância da família no
o BPC segundo Marques e Mendes (2005, apud
processo de reprodução social, no qual se caracteriza
TRISTÃO, 2011, p.122) “foi responsável por 67% da
como unidade econômica, compartilhadora de
redução da população situada abaixo da linha de
responsabilidades sociais.
pobreza, entre o período de 1988 a 1999”.
Na contemporaneidade nota-se com isso, que
De acordo com dados publicados por Santos
a sociedade contemporânea revela que os Benefícios,
(2011, p.01) da mais recente Pesquisa de Amostra
Serviços e Programas de Transferência de Renda da
Domiciliar (PNAD), a nova classe C é “majoritariamente
Política de Assistência Social - PAS gerou poder de
urbana (89%) e, em sua maioria, está em três regiões
consumo a uma nova classe social, denominada de
brasileiras: Sul (61%), Sudeste (59%) e Centro-Oeste
classe C, também conhecida como a classe do
(56%)”.
consumo.
Frente a todos esses fatos, faz-se necessário
A nova classe C procede de um momento
compreender de que forma a PNAS tem contribuído
oportuno na economia, advinda da enorme oferta de
para melhoria da qualidade de vida da população
crédito facilitado com baixos juros no mercado,
usuária, num contexto em que há 09 (nove) anos
serviços e benefícios, a exemplo do Benefício de
reafirma-se a política neoliberal.
Prestação Continuada – BPC (concessão de um
salário mínimo para pessoas com deficiência de
qualquer idade e idosos a partir de 65 anos, cuja renda
4 Os Impactos produzidos através do
Trabalho com Famílias na PNAS
familiar per capta seja inferior a ¼ do salário mínimo) e
a expansão dos Programas de Transferência de Renda
Para sistematizar os impactos produzidos na
da PNAS, condição traçada pelo governo como forma
vida das famílias cadastradas nos Centros de
de reduzir a crise em 2009, ampliando o acesso ao
Referência da Assistência Social - CRAS utilizou como
consumo, com juros baixos.
pressuposto uma pesquisa realizada com famílias e
Com fácil acesso aos programas de governo,
indivíduos
beneficiários
dos
programas
de
esse público vem ganhando poder de consumo, no
transferências de renda, serviços ou benefícios da
entanto, tal perspectiva confessa a inoperância
PNAS, através de visita domiciliar realizada entre
março a maio de 2013, no município de Água Fria,
onde foram entrevistadas 10 famílias, utilizando-se de
Assistência Social tem contribuído para melhorar a
questionário semi-estruturado para coleta e compilação
qualidade de vida da população usuária, ou seja,
dos dados.
pouco se tem investido na implementação de políticas
O município de Água Fria – BA tem área
sociais que visem à superação das desigualdades
territorial correspondente a 643 km², estando numa
sociais. Isso só reafirma do cenário da política
distância de 148 km da capital baiana. Sendo definido
neoliberal.
como território de identidade: Portal do Sertão.
Com a compilação dos dados da pesquisa
Encontra-se em nível de habilitação do SUAS como
realizada, ficaram comprovados os entraves da Política
Gestão Básica, classificado como Pequeno Porte - PP
de Assistência Social, frente à municipalização,
I. Tendo uma população corresponde a 15.726
delegando ao município a prestar a oferta de serviços,
habitantes, sendo que desse total, 7.903 são homens e
benefícios, programas e projetos. A análise da
7.823 mulheres, 5.777 residem na zona urbana,
amostragem confirmou que na ponta da Política de
enquanto que 9.949 vivem na rural.
Assistência Social, exercida no município, ainda, se
Foram cadastrados no CadÚnico até janeiro de
tem muitos caminhos a trilhar, mesmo diante das
2013, um total de 3.507 famílias, o Programa Bolsa
especificidades do caso em estudo, imprimiu-se que
Família (PBF) beneficiou em abril de 2013, 2.610
falta muito para que haja consolidação do papel da
famílias, representando uma cobertura estimada em
PNAS, cabendo ressaltar que é preciso:
98,9% das famílias pobres do município, contabilizando

Implantar o Programa de Erradicação do
um total de recursos financeiros pagos em benefício as
Trabalho Infantil (PETI) no município,
famílias do município, no valor de R$ 413.348,00. No
necessitando de uma equipe mínima da
que tange o quantitativo de idosos beneficiários do
proteção especial, entre eles: assistentes
BPC são num total de 104, contabilizando o repasse no
sociais e psicólogos, para prestar atendimento
valor de R$ 277.302,00 (idosos), e pessoa com
as crianças e adolescentes retiradas da
deficiência - PcD’s representa um quantitativo de 108
situação de Trabalho Infantil - TI;
beneficiários, com repasse anual de R$ 314.592,00.

Incluir
no
Serviço
Convivência
e
O município tem um único CRAS, conforme
Fortalecimento dos Vínculos (SCFV) as
porte e quantitativo de famílias referenciadas (2.500), o
crianças e adolescentes retiradas da situação
qual tem a responsabilidade de ofertar proteção social
de TI;
a todo o território municipal. Frente a todos esses fatos,
foi possível compreender de que forma a Política de

Promover a acessibilidade no equipamento do
CRAS, com rampas e barras de acesso de

acordo com as normas da ABNT NBR
atribuições do CRAS na vida das famílias
9050:2004, para inserção de idosos e Pessoas
referenciadas;
com Deficiência no espaço de convivência;

Realizar busca ativa;
Contração de equipe técnica mínima,

Convidar as famílias a participarem da
construção do plano de ação do município;
consistente e nutrida com conhecimento da
realidade do município, principalmente para


embasar e fortalecer a dinâmica do trabalho na
equipe técnica do CRAS e a equipe técnica da
prestação dos serviços, benefícios, programas
Secretaria Municipal Assistência Social -
e projetos no município;
SMAS (PBF);
Contratação de equipe técnica adicional para

benefícios, programas e projetos no município,

e BPC, prioritariamente as que estão em
abrangência do CRAS;
descumprimento das condicionalidades;
Construir mapa de atendimento do território de

Construir Diagnóstico Socioterritorial na
que se encontram
em
situação de

questão social municipal;

Combater todas as formas de TI, propondo
parceria com a rede de proteção, defesa e
prioritário;
responsabilização dos direitos de crianças e
Promover ações de cunho sócio educativo,
adolescentes;

E, sobretudo, construir um plano com
autonomia das famílias;
indicadores de avaliação dos impactos da
Acompanhar as famílias beneficiárias do
Política de Assistência Social na vida das
Programa Bolsa Família - PBF e BPC, visando
famílias.
promover proteção e vigilância social;

Propor novas estratégias de enfrentamento a
vulnerabilidade e risco social e seu público
propondo desenvolver o protagonismo e

Promover projetos sociais voltados à realidade
municipal, por meio de parcerias;
perspectiva de prever as famílias e indivíduos

Acompanhar as famílias beneficiárias do PBF
como base na dinâmica e território de
abrangência do CRAS;

Mapear e fortalecer as parcerias com a rede
socioassistencial do município;
melhor oferta a prestação dos serviços,

Desenvolver articulação/parcerias entre a
Considera-se, contudo que as ações ora
Divulgar os serviços, benefícios, programas e
apresentadas são uma constante frente à realidade
projetos ofertados no CRAS do município,
municipal, cabendo ao gestor viabilizar condições
imprimindo a importância das competências e
favoráveis de trabalho aos profissionais do SUAS,
imprimindo assim qualidade no acesso aos serviços
implicam no dispêndio de energia seja física e
ofertados à população.
psíquica, inclusive quando se é exercida em condições
impróprias. Esse processo de reestruturação produtiva
vem trazendo impactos no mundo do trabalho do
5 A consolidação do Papel do Serviço Social
na implantação e implementação da PNAS
no Brasil
Assistente Social, no âmbito estatal, conforme sinaliza
A proposta dessa seção situa-se no contexto
Os processos de re-estruturação
produtiva atingem também o
mercado de trabalho do assistente
social, com a redução de postos
governamentais, principalmente
nos níveis federal e estadual, e a
sua transferência para os
municípios em virtude dos
processos de descentralização e
municipalização dos serviços
públicos.
Raichelis (2010, p.07):
de origem e evolução da profissão de Serviço Social
configurada ao longo dos anos, diante das
perspectivas, tendências e limites que permeiam as
lutas incessantes do Assistente Social por uma
sociedade mais justa e igualitária, bem como, os
contrastes evidenciados pela sociedade capitalista,
além de trazer as interfaces do objeto de estudo da
profissão e sua nuances ao longo do tempo histórico
no contexto da política da assistência social.
Diante disso, é preciso compreender a
dinâmica do capital, suas relações e nuances, diante
do Estado neoliberal, que prioriza a acumulação,
exploração, e os desmontes da fragmentação social.
Para tanto, se faz necessário compreender as
Debruçando-se nos estudos da autora citada
acima, pode-se constatar que diante desse processo,
as mudanças têm transformado o mundo do trabalho
do
Assistente
Social,
imprimindo
profundas
reconfigurações na conquista do profissional de
Serviço Social, frente à consolidação na esfera da
divisão social e técnica do trabalho, como trabalhador
liberal.
possibilidades, tendência e limites da nova
configuração do processo de trabalho do Assistente
Social.
6 Considerações Finais
Apesar do trabalho exercido pelo Assistente
Social ser um “trabalho morto”, nos termos de Netto e
Braz (2009), corporificado pelos insumos, gerando a
mercadoria (abstração), é um trabalho não visto. Vale
aqui ressaltar que todas as formas de trabalho
A partir dos fatos apresentados ao longo do
estudo foi possível perceber que diante de uma
sociedade capitalista neoliberal que prega a
acumulação do capital, globalização de mercado,
na perspectiva de planejar e construir juntos um plano
flexibilização e reestruturação no processo de trabalho,
de ação para o enfrentamento das problemáticas
o ser social passa a ser coisificado e o capital
citadas.
personificado. A de se concordar que nada na
Portanto, os limites e as possibilidades são
sociedade capitalista neoliberal, extremamente
muitos na contemporaneidade e é preciso estar atenta
exacerbada, pode ser concebida sem que haja
às condições que perpassam a PNAS e o SUAS no
intencionalidade de acumulação de lucros, sendo
Brasil desafiando-nos a ultrapassar condicionantes
comprovado ao longo dessa pesquisa.
históricos para sua consolidação, a exemplo de:
A lógica capitalista estratifica o sujeito social,
relações patrimoniais e clientelistas; ausência de
por meio da divisão da sociedade em classes sociais,
distinção entre o público x privado x estatal; a ponta
da exploração, da alienação, do fetichismo da
(execução) da pública ocupada por oligarquias; bem
mercadoria, frutos de uma sociedade primada na
como o sistema de proteção marcado pela meritocracia
acumulação do capital, do lucro e da mais-valia.
e pelo desconhecimento do direito; subordinação do
A Política de Assistência Social, primada na
social ou econômico.
lógica da não contribuição, para aqueles que estão em
situação de vulnerabilidade e risco social ou
comunitário, tem como saída recorrer a Política
Nacional da Assistência Social para prover proteção
social às famílias brasileiras. Essa tem atendido a
lógica dos Programas de Transferências de Renda,
através dos Benefícios socioassistenciais, encabeçando influências para o consumo de bens e serviços,
produzindo forte influência para girar a economia do
país.
Contudo, é preciso ir mais além do que
transcende as aparências, para tanto, é preciso ter
uma equipe forte, consistente e
articuladora,
conhecedora da realidade social em que atua, para
melhor administrar a mazelas provenientes da questão
social. Bem como, propor parcerias com a comunidade
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POLÍTICA PREVIDENCIÁRIA DO
AUXÍLIO-DOENÇA E AS
TRANSFORMAÇÕES
do mundo do trabalho, pois além do desemprego
estrutural, do aumento do mercado informal e da
precarização do trabalho refletiram, também, de forma
negativa na saúde do trabalhador, trazendo-lhe
SOCIETÁRIAS
doenças vinculadas ao ambiente de trabalho e ao
CONTEMPORÂNEAS DO MUNDO
desenvolvimento das atividades profissionais. Contudo,
DO TRABALHO
apesar de alguns avanços legais conquistados pelos
trabalhadores e do grande papel social que a
Jocelina Alves de Souza Coelho1
Previdência Social tem nas esferas sócio-econômica e
Amanda Silva de Matos2
política do país, o que tem prevalecido é a lógica do
Maria Lúcia de Souza Carvalho Couto3
modelo neoliberal e do seguro privado.
Palavras-chave: Previdência Social. Auxílios-Doença.
Transformações Contemporâneas.
Resumo
Neste estudo analisam-se os nexos entre o
1 Introdução
atendimento da política previdenciária do Regime Geral
da Previdência Social - RGPS/INSS aos trabalhadores
Os sistemas previdenciários podem se
que requereram auxílios-doença e as transformações
diferenciar de uma sociedade para outra, pois
societárias contemporâneas, ocorridas na esfera da
fatores de ordem política, econômica, social e
organização e produção do trabalho. Constatou-se que
cultural interferem na história da sua formação e
os trabalhadores reagiram, mesmo que de forma
desenvolvimento. Mas possuem uma função
pontual, as seqüelas trazidas com as transformações
comum: servem para substituir a renda do
segurado/contribuinte quando da perda de sua
capacidade laborativa, oferecendo-lhe um plano de
1
Mestre Serviço Social. Especialista em Política Social e Serviço Social,
Assistente Social do INSS e professora de graduação da UNIRB/BA. E-mail:
[email protected]
2
Especialista em Direito e Política Previdenciária pela UNIME, graduada em
Direito pela UFAL – Universidade Federal de Alagoas, advogada e professora
de graduação.Email:[email protected]
3
Mestra em Administração Estratégia e pós-graduada em Psicologia
Organizacional pela UNIFACS, em Metodologia do Serviço Social pela UCSAL
e em Recursos Humanos no Colégio Anchieta e no Curso de Serviço Social
da UNIRB. E-mail: [email protected]
benefícios que o protege contra a perda de renda,
temporária ou permanente, em decorrência das
situações de risco social: morte, invalidez parcial ou
total, velhice (idade avançada), doença, acidente,
maternidade e reclusão.
A Previdência Social brasileiro formou-se
benefícios requeridos 10.337.470 (dez milhões
ao longo do século XX, num primeiro momento
trezentos e trinta e sete mil e quatrocentos e
apareceu como contrato de seguro social firmado
setenta), ou seja, 60% eram auxílios solicitados por
com contribuições de patrões e empregados
perda da capacidade laborativa ou habitual, causada
urbanos, evoluindo para uma concepção de
por doenças comuns, ocupacionais e/ou acidente do
proteção social universal com a Constituição
trabalho. Tratam-se, portanto, de benefícios que
Federal de 1988.
reclamam por um estudo minucioso, pois estão
Desse modo, passou a se caracterizar
como um mecanismo de proteção ao trabalho e
ligados diretamente ao direito à saúde, à vida e à
dignidade de milhões de trabalhadores.
Os auxílios-doença previdenciários e os
como direito social, devendo ser garantida a todos
aqueles que ingressam no mercado de trabalho,
acidentários
formal ou informal, quando da perda da sua
fundamentais, tanto em relação à natureza da
capacidade laborativa e para os atos de sua vida
doença que lhes permitem a concessão, quanto à
habitual. Mas se concretiza sob a lógica do direito
garantia de direitos trabalhistas. Desse modo, o
regulado na forma contributiva, valendo-se de
primeiro é caracterizado através das doenças
carências e controles burocráticos rígidos para o
comuns ou conjuntas da população e familiares e
acesso aos benefícios, especificamente as
não origina nenhuma garantia trabalhista. O
demandas que buscam o amparo legal dos
segundo é caracterizado através das doenças
benefícios previdenciários por incapacidade, entre
ocupacionais ou de acidentes do trabalho e gera
eles: aposentadoria por invalidez, auxílio-doença
garantias trabalhistas, tais como: estabilidade de um
acidentário,
previdenciário,
ano na empresa, contado a partir do retorno ao
benefícios de prestação continuada (concedidos
trabalho, e a contribuição de 08 salários depositados
para idosos e deficientes com uma renda per capita
no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço –
inferior a ¼ do salário mínimo).
FGTS.
auxílio-doença
apresentam
duas
diferenças
Entre os benefícios da Previdência Social
Tais benéficos, pelo grande impacto que
destaca-se que os mais requeridos são os auxílios-
causam na sociedade em termos sócio-econômico e
doença previdenciários e os acidentários. Segundo
políticos passam a serem, também, alvos de
dados do MPS/Dataprev, entre os anos 2006, 2007
inúmeras medidas governamentais que buscam
e maio de 2008, dos 17.232.802 (dezessete milhões
burocratizar e limitar a sua concessão, por exemplo:
duzentos e trinta e dois mil oitocentos e dois)
só na Bahia estão sendo convocados de cerca de
1,6 mil baianos, desde fevereiro de 2008, que estão
era promover o aumento da produtividade na
em gozo de auxílio-doença há mais de dois anos
indústria, por meio de uma melhoria no nível
para uma nova perícia.
operacional. Nesse processo, a ênfase recai nas
O objetivo desse estudo, portanto, foi
tarefas, e também, visa eliminar os desperdícios de
analisar os nexos entre o atendimento da política
tempo e matéria-prima, através da adoção de
previdenciária do Regime Geral da Previdência
métodos e técnicas da engenharia industrial.
Social - RGPS/INSS ao trabalhador que requereram
o auxílio-doença, durante o período de janeiro de
2006 a maio de 2008, e as transformações
societárias contemporâneas ocorridas na esfera da
organização e produção do trabalho, na tentativa de
compreender duas questões: por que os auxíliosdoença previdenciários e acidentários têm um
grande volume de requerimento e indeferimento?
Por que o previdenciário tem predomínio sobre o
acidentário?
Apesar da revolução ocasionada pelo
modelo fordista na esfera produtiva e organizacional
do trabalho, a consolidação desse modelo
encontrou resistência dos trabalhadores devido aos
danos físicos e mentais provenientes desse
processo. Ora, se por um lado o fordismo
potencializa a produção, por outro degrada o
trabalhador à medida que a habilidade dos
trabalhadores é substituída e/ou eliminada pelo
parcelamento das tarefas, pois a execução do
trabalho
2
As transformações Societárias
Contemporâneas
torna-se
fragmentada,
gerando
inquietações na classe operária.
Nesse cenário de mudanças, abre-se
espaço para a consolidação de um novo modelo de
acumulação, assentado em bases flexíveis, o
Sabe-se que as transformações societárias
chamado toyotismo. Neste, a produção é flexível e
contemporâneas foram iniciadas na década 1970
diversificada e tem a qualidade como fator
com a falência do padrão de acumulação
primordial, além do predomínio tecnológico.
fordista/taylorista. Este em linhas gerais é um
Tal processo que surge como uma
modelo de gerenciamento que visa à organização
alternativa de superação da crise do capital
da produção e do trabalho, iniciado quando Ford
demarca o que se pode denominar de
introduz na esfera produtiva da indústria
reestruturação do processo produtivo, em
automobilística americana a Teoria Geral da
decorrência dos avanços tecnológicos, da
Administração, formulada por Taylor, cuja finalidade
automação, da robótica e da globalização dos
mercados. Contudo, o mesmo traz, também, graves
advindos de um estudo crítico dessa realidade
conseqüências à classe trabalhadora, entre elas: a
brasileira.
expansão do desemprego estrutural, o aumento do
Nesse
estudo,
definem-se
como
trabalho precário, o impacto físico e psicossocial
“trabalhadores” tanto aqueles que estão diretamente
com a introdução de inúmeras inovações
no mundo da produção, isto é, os inseridos no
tecnológicas
processo de produção material, como também
que exigem
modificações
e
qualificações profissionais.
As
inovações
aqueles que, não possuindo os meios de produção,
tecnológicas
e
estão ou não incorporados ao mercado de trabalho,
organizacionais passam a alastrar-se na economia
ou seja, os que atuam no mercado informal, terceiro
brasileira somente a partir dos anos 1990.
setor e os desempregados. Estes podem está
Doravante passa a ser difundida na indústria e
mantendo ou não a qualidade de segurado, ou seja,
serviços públicos os programas de cunho flexível,
contribuíram por um determinado período que lhes
como forma de reduzir custos e aumentar a
garante, mesmo sem pagar, o requerimento dos
produtividade. Conseqüentemente, a adesão às
benéficos previdenciários.
inovações tecnológicas organizacionais e gerenciais
começa a atingir um número maior de
trabalhadores.
2.1 As Transformações Estruturais no âmbito da
Produção, do Trabalho e da Sociedade
Para a Previdência Social é imposta à
O mundo desde a década de 1970 está
obrigatoriedade de manter o equilíbrio financeiro e
vivendo um processo de profundas transformações
atuarial do sistema, à base de provimento de uma
estruturais no âmbito da produção, do trabalho e da
única fonte de financiamento e do controle dos seus
sociedade, que trazem em seu bojo o aumento das
benefícios. Isto requer a manutenção de estratégias
desigualdades econômicas, políticas e sociais,
para a notoriedade da falência do sistema e o
principalmente entre os países subdesenvolvidos.
projeto da reforma da Previdência ganha espaço no
Nesse cenário, segundo Antunes (1998, p.16),
meio político, econômico e social do país.
A discussão contribui para a análise da
política nacional de atenção a saúde do trabalhador
no que se refere à democratização do acesso aos
direitos previdenciários, a partir de subsídios
Novos processos de trabalho
emergem onde o cronômetro
e a produção em série e de
massa padrões de busca de
produtividade, por novas
formas de adequação da
produção à lógica do
mercado. São ‘substituídos’
pela
flexibilização
da
produção,
pela
‘especialização flexível’, por
novos.
No âmbito da produção, ocorreu a
trabalho contribuiu também para a modificação do
perfil de saúde, adoecimento e sofrimento dos
trabalhadores.
reorganização dos setores de ponta da indústria
3
(informática,
Previdenciário, Auxílio-doença acidentário e
química,
biotecnologia,
telecomunicações e outros) e a modernização de
Compreendendo
o
Auxílio-doença
Auxílio-acidente.
setores dinâmicos (automobilismo, petroquímico,
equipamento e máquina); deu-se ainda o declínio de
setores tradicionais (siderurgia e têxtil).
A busca pelos benefícios previdenciários
se respalda na Lei nº 8.213/91, que assegura aos
Em relação ao trabalho, houve a
trabalhadores
contribuintes
do
INSS
ou
introdução de novas tecnologias de base
desempregados em manutenção da qualidade de
microeletrônica (automação informatizada) e de
segurado, auxílios em caso de doenças e acidentes,
novos padrões de gestão baseada no toyotismo
denominados: auxílio-doença previdenciário, auxílio-
(modelo
doença acidentário e auxílio-acidente.
japonês),
o
recrudescimento
do
desemprego estrutural, o aumento do mercado
informal e a precarização do trabalho.
a) Auxílio-doença previdenciário - é devido
ao trabalhador que ficar incapacitado para o seu
Relativamente às transformações sociais,
trabalho ou para a sua atividade habitual por mais
pode-se apontar o processo de individualização das
de 15 dias consecutivos. Nos primeiros 15 dias do
relações socialmente estabelecidas, a minimização
afastamento, cabe à empresa o pagamento do
do Estado como gestor majoritário das políticas
salário. No caso dos autônomos ou empregados
sociais públicas e acentuação da desigualdade
domésticos, o benefício é pago diretamente pela
social. Percebe-se que a reestruturação produtiva e
Previdência desde o primeiro dia do afastamento,
social, ao se posicionar a favor dos interesses do
no valor de 91% do salário de benefício. Para ter
capital, induzir à ruptura dos vínculos sociais entre
direito ao auxílio-doença, é necessário cumprir a
trabalho, saúde e previdência, criando um nível de
carência de, no mínimo, 12 contribuições
estranhamento entre essas categorias.
previdenciárias. Esse prazo não será exigido em
Isso reflete no registro de uma grande
caso de acidentes de qualquer natureza. Para
procura dos trabalhadores por serviços médicos e
concessão de auxílio-doença, é necessária a
benefícios previdenciários, pois a adoção de novas
comprovação da incapacidade em exame realizado
tecnologias e métodos gerenciais nos processos de
pela perícia médica da Previdência Social.
b) Auxílio-doença acidentário - é o benefício
redução da capacidade para o trabalho que impeça,
concedido ao segurado incapacitado para o trabalho
por si só, o desempenho da atividade que exercia
em decorrência de acidente de trabalho ou de
na época do acidente, porém não de outra, de nível
doença profissional. Considera-se acidente de
inferior de complexidade, após a reabilitação
trabalho aquele ocorrido no exercício de atividades
profissional.
profissionais, a serviço da empresa ou no trajeto
Na relação trabalho e saúde, registram-se
casa-trabalho-casa. Para solicitá-lo, é preciso
a acentuação tanto das doenças psíquicas, como as
preenchimento do formulário de Comunicação de
neuroses, as depressões, a ansiedade, as
Acidente de Trabalho (CAT), que deve ser
perturbações do comportamento ou da alimentação,
encaminhado ao INSS juntamente com o atestado
o alcoolismo entre outros, quanto das doenças
médico de afastamento do trabalho, para que seja
físicas, como as Lesões por Esforços Repetitivos -
realizada uma perícia médica. Também neste caso,
LER.
cabe à empresa o pagamento do salário do
Esta realidade levou os trabalhadores a
trabalhador nos primeiros 15 dias do afastamento e,
exigir indenização acidentária pelos distúrbios
posteriormente, à Previdência Social. Enquanto
psíquicos ocasionados pelas suas condições de
recebe auxílio-doença por acidente de trabalho ou
trabalho e reivindicar que as enfermidades físicas ou
doença ocupacional, o trabalhador é considerado
mentais fossem classificadas como doenças do
licenciado e tem estabilidade por 12 meses após o
trabalho, se desenvolvidas em função das atividades
retorno às atividades.
realizadas pelos trabalhadores. Dessa forma, de
c) Auxílio-acidente - é concedido, como
indenização, ao trabalhador vítima de seqüelas
decorrentes de acidente, que impliquem: redução
da capacidade para o trabalho que exija maior
esforço ou necessidade de adaptação para exercer
a mesma atividade, independentemente de
reabilitação profissional; redução da capacidade
para o trabalho que impeça, por si só, o
desempenho da atividade que exercia na época do
acidente, porém não de outra, do mesmo nível de
complexidade após a reabilitação profissional; e
acordo com Verthein e Gomez (2000, p.102) em
1980 foi criada a denominação “doenças
relacionadas ao trabalho”.
O registro dessas reivindicações dos
trabalhadores expressa a perspectiva marxista, pois
conforme Pastorini (1997, p.87), nesta as políticas
sociais são compreendidas como fruto da luta de
classes que se trava entre o trabalhador e a
burguesia. Ou seja, inserem-se definitivamente no
núcleo das disputas das classes antagônicas por
meio da relação orgânica das suas funções
econômicas e políticas.
Ratificamos que as políticas sociais, entre
elas a política previdenciária, capitalistas não são
exclusivamente os resultados de um processo de
atenção à pobreza ou à desigualdade social,
adotadas e formuladas pelo Estado para serem
aplicadas à sociedade. Inversamente, apresentamse
como
resultado
complexidades
das
históricas
contradições
das
e
sociedades
capitalistas, transformando-se num importante
espaço de luta de classes. Trata-se da defesa de
condições dignas de existência, face às intensas
investidas da classe dominante no corte de recursos
públicos para a reprodução da força de trabalho.
A Tabela 01 apresenta que em meados da
década de 1980 começou a existe uma tendência no
aumento da ocorrência de doenças relacionadas ao
trabalho, acelerando-se no início de 1990.
Fonte: MPS, Dataprev
Em 06 de agosto de 1987, o Ministério da
Previdência Social, através da Portaria nº. 4.062,
Tabela 01 - Acidentes e doenças ocupacionais
reconhece as Lesões por Esforços Repetitivos (LER)
registradas Brasil, no período de 1985 a 2002.
como uma doença relacionada com as condições de
trabalho. Inicialmente, a mesma, conforme Sato
(1993) foi reconhecida com “doença dos
digitadores”, pois os primeiros diagnósticos dessa
afecção foram identificados em trabalhadores que
exerciam essa atividade profissional. Contudo, dada
a magnitude assumida pela LER, a mesma foi
“diagnosticada em trabalhadores das mais diversas
categorias profissionais que têm em comum o fato
de realizarem tarefas que demandem movimentos
repetitivos e/ou esforços físicos” (SATO, 1993, p.51).
Organização Mundial de Saúde – OMS, na América
Em 1997, o termo LER, de acordo com
Latina, apenas 1% a 4% das doenças do trabalho
Verthein e Minayo (2000, p.102) foi mudado pelo
são notificadas. No Brasil, entre os muitos fatores
INSS
Osteomusculares
que corroboram para as subnotificações estão: a
Relacionados ao Trabalho - DORT, como uma forma
informalidade das relações de trabalho; a falta de
de atender as reivindicações da classe médica, dos
informações sobre a diferença entre: auxílio-doença
trabalhadores e dos pesquisadores do tema que
previdenciário e acidentário e doenças comuns e
apontava o adoecimento numa dimensão mais
ocupacionais; a notificarem apenas dos acidentes
ampla, atingindo desse modo as esferas da
mais graves,
psicossociologia, da epidemiologia e da ergonomia.
conseqüências em termos de benefícios e
Porém, o termo DORT que parecia atender a essa
assistência à saúde; e o medo de perder o
expectativa, ao ser reapropriado pelo INSS reverteu
emprego.
para
Distúrbios
ou seja,
dos que geram
à idéia original, enfatizando com o conceito de
No final da década de 1990, o Ministério
distúrbio a noção de uma doença adquirida por
da Previdência Social começou um estudo, por
predisposição do sujeito.
intermédio da Secretaria de Previdência Social,
Esse novo entendimento afastaria do
sobre a criação de uma metodologia que servisse
ambiente profissional os males que as condições do
para os seguintes propósitos: flexibilizar as
ambiente físico de trabalho podem provocar nos
alíquotas
trabalhadores como as doenças profissionais ou do
financiamento do benefício de aposentadoria
trabalho, além dos acidentes propriamente ditos.
especial e daqueles concedidos em razão do grau
Isso porque a saúde do trabalhador está
de incidência de incapacidade laborativa
condicionada a fatores sociais, econômicos,
decorrente dos riscos ambientais do trabalho;
tecnológicos e organizacionais relacionados ao perfil
conferir estímulo ao desenvolvimento econômico
de produção e consumo, além de fatores de riscos
via redução de custos e fomento ao trabalho
de natureza física, química, biológica, mecânica e
saudável;
ergonômica presentes nos processos de trabalho
afastassem trabalhadores, muitas vezes até o
particularmente.
despedindo, logo após a concessão do benefício;
de
contribuição
evitar
que
destinadas
algumas
ao
empresas
Apesar dos números da Tabela 01 se
conferir aos empregadores previdentes em matéria
mostrar elevados, os mesmos não refletem a
de segurança e saúde do trabalho um incentivo
realidade brasileira, pois segundo estimativa da
tributário como vantagem competitiva, ganho de
imagem mercadologia e retorno econômico devido
Para dimensionar a gravidade e o custo
à gestão dos riscos ocupacionais dentro da política
dos benefícios: auxílios-doença previdenciários
de responsabilidade social da empresa.
(B31), aposentadoria por invalidez previdenciária
Dessa forma, foi editada a Medida
(B32), auxílios-doença acidentários (B91) e
Provisória nº. 83, de 12 de dezembro de 2002,
aposentadoria por invalidez por acidente do
posteriormente convertida na Lei nº 10.666, de 08
trabalho (B92), foi criado um componente
de maio de 2003, que em seu art. 10, prescreve
frequencista do FAP, denominado Nexo Técnico
que as empresas que investirem em prevenção de
Epidemiológico Previdenciário – NTEP. Este
acidentes de trabalho poderá receber até 50% de
consiste no vínculo da classificação internacional
redução das alíquotas, previstas na Lei nº
de doenças (CID), obtida a partir da Perícia
8.212/91, ou em dimensão oposta se onerarem em
Médica/INSS, com a atividade desempenhada pelo
até 100%. Essas alíquotas se referem: a) 1% (um
segurado, reconhecendo-se o benefício como
por cento) para as empresas em cuja atividade
acidentário mesmo sem a Comunicação de
preponderante o risco de acidentes do trabalho
Acidente de Trabalho - CAT.
seja considerado leve; b) 2% (dois por cento) para
De acordo com o contido no anexo à
as empresas em cuja atividade preponderante esse
Resolução nº 1.269, de 15 de fevereiro de 2006, a
risco seja considerado médio; c) 3% (três por
sonegação da CAT é um tema complexo e
cento) para as empresas em cuja atividade
demarcado por questões políticas, econômicas e
preponderante esse risco seja considerado grave.
sociais, pois o acidente/doença ocupacional é
Isso induziu a instituição de um fator, ora
considerado socialmente o lado negativo da relação
denominado Fator Acidentário Previdenciário –
trabalho e saúde. Dessa forma, evita-se que os
FAP, conforme estabelecido na Resolução nº
seus dados apareçam nas estatísticas oficiais com
1.236/04, do Conselho Nacional da Previdência
o seguinte propósito: a) impedir o reconhecimento
Social, que determina a redução de até 50% ou a
da estabilidade de um ano de duração na empresa,
ampliação de até 100% das alíquotas de 1%, 2%
a partir do retorno do trabalhador que estava de
ou 3%, conforme o grau de risco previdenciário,
auxílio-doença acidentário; b) ter a liberdade de
pagas por cada uma das empresas ativas no Brasil.
poder demitir o trabalhador a qualquer tempo; c)
Isso em conformidade com os resultados obtidos a
não ter a obrigação de depositar a contribuição
partir dos índices de freqüência, gravidade e custo.
devida de 8 salários, em conta do FGTS,
correspondente ao período de afastamento; d) não
reconhecer a presença de agente nocivo causador
1990, e disciplinar a aplicação, o acompanhamento
da doença do trabalho ou profissional; d) não
e a avaliação do Fator Acidentário de Prevenção -
recolher a contribuição específica correspondente
FAP e do Nexo Técnico Epidemiológico
ao custeio da aposentadoria especial para os
Previdenciário - NTEP. Dessa forma, no seu Art.
trabalhadores expostos aos agentes nocivos. Tais
13, consta que a empresa informará mensalmente,
evidências descredenciaram a CAT como único
por meio da Guia de Recolhimento do Fundo de
elemento
Garantia do Tempo de Serviço e informações à
primário
epidemiológico
para
caracterização das doenças crônicas.
Previdência
Social
-
GFIP
a
alíquota
O FAP foi amplamente defendido,
correspondente ao seu grau de risco, a respectiva
principalmente, por vários especialistas brasileiros
atividade preponderante e a atividade do
em Saúde do Trabalhador, entre eles: professores,
estabelecimento.
pesquisadores e técnicos. Assim, em 11 de março
Isto representou um avanço significativo
de 2005, um grupo de estudiosos do tema reunido
para a política de incentivo das notificações das
em Florianópolis, após debate e análise da sua
doenças ocupacionais e acidentes do trabalho.
viabilidade pontuaram as seguintes questões: a
Porém, tal mudança conforme o anexo à
atual realidade dos ambientes e condições de
Resolução nº 1.269, está fundamentada
trabalho no Brasil não tem contribuído para diminuir
principalmente, nos autos custos que a ausência
os acidentes, as doenças e as mortes relacionadas
de segurança no ambiente do trabalho gera para o
ao trabalho; a lógica atual para a caracterização e
governo, impactando com isso nos sistema de
notificação dos agravos ligados ao trabalho é
proteção social e no modo como afetam
pontual, individual, injusta e imprópria, e por isso
negativamente a produtividade econômica. Sem
vem contribuindo para diagnósticos inadequados e
levar em consideração a sua contribuição para o
sub-registros; o modelo de custeio previdenciário
déficit da Previdência Social.
vigente é ineficaz para cobrar de forma justa as
Nesse sentido, as políticas sociais
empresas que geram um maior número de agravos
capitalistas não são exclusivamente os resultados
à saúde dos trabalhadores.
de um processo de atenção à pobreza ou à
Com a publicação do Decreto nº 6.042, de
desigualdade social, adotadas e formuladas pelo
12 de fevereiro de 2007, o presidente Lula pode
Estado para serem aplicadas à sociedade.
alterar o Regulamento da Previdência Social,
Inversamente, apresentam-se como resultado das
aprovado pelo Decreto nº 3.048 , de 6 de maio de
contradições e complexidades históricas das
sociedades capitalistas, transformando-se num
importante espaço de luta de classes.
Contraditoriamente,
viu-se
que
os
trabalhadores reagiram, mesmo que de forma
Analisar a política previdenciária dos
pontual,
as
seqüelas
trazidas
com
as
auxílios-doença sob o ponto de vista da
transformações do mundo do trabalho, pois além
perspectiva da totalidade implica, de acordo com
do desemprego estrutural, do aumento do mercado
Pastorini (1997), levar em consideração os
informal e da precarização do trabalho refletiram,
indissociáveis entrelaçamentos existentes entre
também, de forma negativa na saúde do
economia e política. Dessa forma, só poderemos
trabalhador, trazendo-lhe doenças vinculadas ao
capturar a complexidade de um fenômeno social se
ambiente de trabalho e ao desenvolvimento das
apreender os seus vínculos com a economia e a
atividades profissionais.
política.
Contudo, apesar de alguns avanços legais
conquistados pelos trabalhadores e do grande
papel social que a Previdência Social tem nas
esferas sócio-econômica e política do país, o que
tem prevalecido é a lógica do modelo neoliberal e
4 Considerações Finais
do seguro privado. No qual o trabalhador,
O estudo demonstra que a política
previdenciária dos
rebatimento
direto
auxílios-doença tem
das
o
transformações
contemporâneas, no que se referem às
contribuinte, é visto como cidadão consumidor e a
perspectiva
visualizada
para
a
política
previdenciária é a Previdência Social básica nos
rumos da não descartada privatização.
modificações estruturais do mundo de trabalho. Isto
O benefício auxílio-doença previdenciário se
porque o novo modelo de ajuste fiscal, somado a
destaque em relação ao auxílio-doença acidentário
crescente precarização das relações de trabalho e
tanto pelo volume dos requerimentos quanto pelo
ao desemprego estrutural, além das exigências de
número de concessões e indeferimentos, porque
redução dos gastos públicos com vistas à produção
esse último implica o reconhecimento de direitos,
de superávit, constitui um bloco de demandas que
tais como: a garantia da estabilidade por um ano e
refletem de forma negativa nas reais possibilidades
a obrigação do recolhimento do FGTS. Isso em
de filiação dos trabalhadores ao sistema
tese vai de encontro com a lógica do lucro do
previdenciário e, consequentemente, no acesso aos
capitalismo e dos empregadores.
direitos previdenciários.
Conclui-se que as políticas sociais, entre
elas a previdenciária dos auxílios-doenças,
surgiram como garantia dos interesses do capital,
na medida em que se sustenta na desigualdade e
na exploração da classe trabalhadora. Contudo,
entende-se que a viabilização das mesmas só foi
possível através da luta das classes trabalhadoras,
por melhores condições de produção e reprodução
social.
Nesse sentido, é preciso compreender a
importância da mobilização, da luta, da resistência
diante do projeto hegemônico, movimentos
atualmente tão debilitados, fragmentados e imersos
em uma cultura de crise que aponta como solução
a via da solidariedade social e/ou do voluntarismo,
próprios da sociedade civil. Isso implica em ação
coletiva e organizada que envolve aspectos
econômicos, culturais e relativos ao poder (Estado,
governo, instituições, grupos, etc.).
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Saúde Coletiva, Rio de janeiro, p. 101-127, 2000.
PROTEÇÃO SOCIAL E POPULAÇÃO EM
SITUAÇÃO DE RUA NO BRASIL: Uma
trajetória de invisibilidade
colaboram para a falta de proteção social a essa
população.
Palavras-Chave: População em Situação de Rua.
Proteção Social. Capitalismo. Invisibilidade.
Camila Santana Oliveira1
[email protected]
1 Introdução
Sandra Moreira Costa de Carvalho2
[email protected]
No modo de produção capitalista, a
pauperização relativa ou absoluta cresceu para a
maioria esmagadora da população e apenas uma
Resumo
minoria manipula a produção e o fluxo de riqueza no
mundo. Frente a uma questão social maximizada,
O sistema de proteção social brasileiro, implantado a
partir de 1988, efetiva direitos e dá visibilidade a
população em situação de rua? Este artigo é fruto de
um estudo teórico a partir do método histórico crítico.
Apresenta uma breve contextualização histórica
acerca da população em situação de rua e evidencia
que esse fenômeno está relacionado às próprias
condições estruturais da sociedade capitalista. O
presente artigo foi dividido em dois capítulos e a
temática trabalhada nesta pesquisa envolveu duas
categorias teóricas: Proteção Social e Capitalismo.
Trata-se de uma pesquisa qualitativa e a técnica
adotada foi a pesquisa bibliográfica. Este trabalho tem
como objetivo refletir acerca da população em situação
de rua e sua trajetória de invisibilidade no sistema de
proteção social brasileiro pós 1988. Demonstra que a
relação desse segmento populacional com as políticas
sociais é de ínfima cobertura. No Brasil não existem
políticas públicas capazes de alcançar plenamente
essa população e que possam interferir na redução
desse fenômeno. Assim, ressalta-se a ineficácia de
políticas que contribuam para a efetivação dos direitos
a esse grupo societário, apresentando fatores que
quadro em que se deterioram cada vez mais as
condições de vida da população, em decorrência das
desigualdades sociais resultantes das relações sociais
do sistema capitalista, a maioria da população fica
submetida ao aumento gradativo da pobreza, com isso,
cada vez mais pessoas têm ganhado a rua de grandes
capitais.
A população em situação de rua constitui um
grupo populacional heterogêneo, mas que têm em
comum três aspectos: a pobreza extrema, os vínculos
familiares fragilizados ou interrompidos e um grande
diferencial que é a inexistência de moradia
convencional de forma regular, o que faz com que
essas pessoas procurem as ruas, os logradouros
públicos como espaço de moradia e sobrevivência.
Discriminados e desrespeitados em seus
1
Graduada em Serviço Social pela Faculdade Regional da Bahia (UNIRB).
2
Mestranda em Política Social e Cidadania e Professora da UNIRB
direitos fundamentais e sociais, a população em
situação de rua enfrenta uma degradação de vida cada
vez maior, em face da pobreza extrema e da ausência
passa por uma adequação das políticas sociais às
de proteção social. É um segmento populacional que
demandas postas por esse grupo societário.
precisa de suporte diferenciado do Poder Público para
que possam ter acesso às Políticas Públicas.
2 Desenvolvimento
Vivemos em um momento histórico em que os
direitos sociais estão sendo cerceados pela ampliação
2.1 A relação: situação de rua e capitalismo
e reprodução do capital mundial. Em todos os espaços
excludente
de dominação capitalista há uma profunda restrição de
direitos. E as pessoas em situação de rua estão
A população em situação de rua no contexto
sujeitas a privação dos direitos básicos de cidadania.
mundial caracteriza-se como um fenômeno inserido na
Diante do exposto, coloca-se como problema deste
lógica do sistema capitalista, sua origem vincula-se ao
trabalho: O sistema de proteção social brasileiro,
processo de acumulação do capital, ao pauperismo
implantado a partir de 1988 efetiva direitos e dá
que se generalizou na Europa nos séculos XVI e XVIII,
visibilidade a população em situação de rua? Essa
com o surgimento das sociedades pré-industriais, no
indagação serviu de ponto de partida para a
contexto do que Marx (1985) descreveu como
construção desta pesquisa.
“acumulação primitiva” que, segundo ele, foi o ponto de
Organizado em dois capítulos, o estudo busca
demonstrar a invisibilidade da população em situação
partida para a formação do capitalismo, ou seja, a préhistória do capital e do modo de produção capitalista.
de rua no sistema de proteção social brasileiro pós
Marx (1985), ao analisar o processo de
1988. Assim, o objetivo principal deste trabalho é
acumulação de riqueza que atende pelo nome de
estudar a situação dessa população a luz da
acumulação primitiva, demonstrou que ocorreu uma
implementação de políticas sociais públicas no
expropriação do produtor rural e dos camponeses de
contexto da proteção social brasileira, considerando
sua base fundiária através de métodos violentos, ou
que no contexto de 1988 se formatam como universais.
seja, um êxodo forçado dos trabalhadores, que ficaram
É um tema importante levando-se em conta
privados de suas terras e de suas condições de
que estatisticamente se tem observado o aumento
trabalho. Assim, para o autor:
dessa demanda nas ruas do país e verificado uma
ausência do Estado em relação à garantia de políticas
públicas efetivas para essa população, entendendo
que a questão do problema social de estar na rua
[...] a expropriação da grande
massa da população de seus
meios de subsistência e
instrumentos de trabalho [...]
compreende uma série de métodos
violentos, dos quais passamos em
revista apenas aqueles que fizeram
época como métodos de
acumulação primitiva do capital.
(MARX, 1985, p. 380).
A acumulação primitiva, uma acumulação por
desapropriação, foi um processo violento e original de
separação dos trabalhadores dos meios de produção
com que se deu a acumulação de capital e a
concentração de riquezas nas mãos de uns poucos
privilegiados, chamados burgueses.
população em situação de rua no contexto Europeu.
Em suas palavras:
Pode-se dizer que essas são as
condições histórico-estruturais que
deram origem ao fenômeno do
pauperismo, no qual se insere, o
que se denomina população em
situação de rua. Têm como base a
expropriação dos produtores rurais
e camponeses e a sua
transformação em assalariados, no
contexto da chamada acumulação
primitiva e da indústria nascente.
Sabe-se que historicamente, a classe
trabalhadora foi formada primeiro por camponeses que,
Sabe-se, porém, que a situação de
expulsos de suas terras, acabaram por ser utilizados
pauperismo não se relaciona diretamente na “situação
como mão-de-obra nas indústrias, então em processo
de rua”, mas certamente a influencia fortemente.
de formação. Porém, muitos deles não foram
A população em situação de rua, dentro do
absorvidos pela indústria nascente. Os camponeses
modo de produção capitalista, faz parte do chamado
seriam expulsos de suas terras e os artesãos aos
lumpen proletariado, a camada que vive em piores
poucos passariam a trabalhar para os comerciantes,
condições, num mundo dos desvalidos, (parte da
até perderem os seus meios de produção. Marx (1985)
classe trabalhadora que se encontra no pauperismo, é
afirma que a partir do século XVI, os camponeses e
apta ao trabalho, mas não é absorvida pelo mercado).
artesãos foram pouco a pouco substituídos,
Tais indivíduos vivem a margem da sociedade, essa
respectivamente, pelo trabalhador livre assalariado e
camada, abaixo do proletariado, Marx (1985) a
pela indústria. Estudos mais recentes, como os de
descreve como: “a escória social, aquela massa
Silva (2009), desenvolvem que a era capitalista
passivamente putrescente, expulsa pelas camadas
propriamente dita surge no século XVI e a
mais baixas da sociedade antiga”.
expropriação dos camponeses e produtor rural que
Silva (2009, p. 101) aborda que as condições
ficaram privados de suas terras constitui a base da
histórico-estruturais que deram origem e que
história da acumulação primitiva que deu origem à
reproduzem o fenômeno população em situação de rua
produção capitalista.
nas sociedades capitalistas são exatamente as
Silva (2009, p. 96) considera que esse
mesmas que deram origem ao capital e que garantem
processo histórico foi o propulsor do aumento da
sua acumulação. A autora refere-se ao processo de
expropriação dos camponeses de suas terras e a sua
Tais efeitos produziram um expressivo exército
transformação em assalariados no contexto do que se
industrial de reserva que fez aumentar as
denominou como acumulação primitiva.
desigualdades sociais e os níveis de pobreza da classe
Com o advento de um modo de produção
trabalhadora. Nesse contexto, torna-se cada vez maior
capitalista há o processo de exclusão social e pobreza.
a presença de pessoas em situação de rua nas
Marx (1985, p. 325) afirma que as desigualdades
grandes metrópoles.
sociais são consequência de uma enorme quantidade
O capitalismo monopolista tem causado graves
de riquezas que se concentra nas mãos de poucos
consequências. Verifica-se a existência de um
indivíduos. O capitalismo acirrou e aumentou a miséria,
contingente significativo de força de trabalho, que se
através de sua apropriação privada de lucros. A
caracteriza por uma inserção irregular no mercado. Os
contradição social está intimamente ligada a essa
efeitos disto atingiram diretamente a vida de milhões
ordem societária dominante, relacionado ao
de trabalhadores, do mercado formal e também do
crescimento da miséria, que não é proporcional ao
mercado informal como, por exemplo, o aumento de
crescimento da riqueza, e reflete na existência da
atividades de reciclagem para as pessoas em situação
população em situação de rua, pois esta é uma
de rua, conforme Silva (2009) ressalta no seu estudo,
expressão das desigualdades sociais e resultantes das
além de arrocho nos setores sociais, redução dos
relações sociais do modo capitalista de produção.
postos de trabalho, aviltamento dos salários,
A fase monopolista do capital, onde este
desemprego em massa e a acentuação da fome e
detém o controle sobre todas as atividades econômicas
miséria. Estes são desdobramentos mais visíveis
e detém um valor excedente cada vez maior, produzido
desse processo. Esse desenvolvimento recente
pelo trabalho em todo o mundo, convertendo esse
ampliou as contradições imanentes entre a
valor em renda monopolista, constitui a base do
socialização da produção e a apropriação privada,
crescimento desproporcionado da desigualdade. Este
entre o desenvolvimento das forças produtivas e das
momento do capital repercute como piora das
relações sociais de produção. Assim, Netto enfatiza:
condições de vida das classes trabalhadoras.
As transformações societárias postas por esse
novo estágio de desenvolvimento do capital, provocou
mudanças no mundo do trabalho, agravando o
desemprego, a precarização das condições de trabalho
e o processo de empobrecimento dos trabalhadores.
O capitalismo monopolista conduz
ao ápice a contradição elementar
entre a socialização da produção e
a
apropriação
privada:
internacionalizada a produção,
grupos de monopólios controlamna por cima de povos e Estados. E
no âmbito emoldurado pelo
monopólio, a dialética forças
produtivas/relações de produção é
tensionada adicionalmente pelos
condicionantes específicos que a
organização monopólica impõe.
(NETTO, 2007, p. 24)
contradição Capital/Trabalho, causada no sistema
O atual período da etapa imperialista do
Segundo Silva (2009), no modo de produção
capitalismo, seu atual padrão de acumulação e
capitalista existe a relação de exploração da burguesia
dominação é conhecido como sistema de capitalismo
sobre os trabalhadores e a apropriação privada dos
globalizado,
à
meios de produção, o que resulta em uma pobreza
monopolização, assim como ao desenvolvimento
extrema e no reduzido acesso à riqueza produzida
desigual. O capitalismo monopolista agrava a questão
socialmente. A autora aponta que essa é uma das
social, traz consigo uma dramática concentração das
condições que caracterizam a população em situação
desigualdades econômicas e sociais, e seu impacto é
de rua. Esse segmento populacional expressa uma
mais visível para quem menos se beneficiam dele.
situação de pobreza extrema e é expressão das
com
tendências
econômicas
capitalista de produção, onde há a apropriação privada
de uma riqueza produzida socialmente.
consequências
objetivas
do
modelo
de
2.2 A situação de rua enquanto expressão da
desenvolvimento injusto que reduz dramaticamente o
questão social
campo de possibilidades nas quais podem usufruir das
riquezas produzidas.
A partir do século XIX, com o processo
O sistema capitalista de produção criou um
industrial, ocorreram grandes transformações sociais,
conjunto de trabalhadores desatendidos em seus
econômicas e políticas na Europa, com isso, a questão
direitos sociais e mínimos e provocou uma enorme
social ficou estabelecida. Na medida em que a
desigualdade social, agravando a questão social. A
industrialização se consolidava, a concentração de
conjuntura atual acentua o estado de precariedade de
renda nas mãos de poucos tornava-se maior,
vida dos trabalhadores, que ficam sujeitos à falta de
ampliando as desigualdades sociais e as contradições
emprego e às condições precárias do mercado informal
nas relações de trabalho. Alargasse, portanto, a
de trabalho. Diante do desemprego crescente e
distância entre ricos e pobres radicalizando a chamada
aprofundamento das desigualdades sociais, do
questão social que se retrata no cotidiano de
crescimento de uma superpopulação relativa,
contingentes majoritários das classes subalternas.
excedente a capacidade média do capital, surge cada
A questão social é construída pela profunda
vez mais pessoas em situação de profunda espoliação
desigualdade inerente ao desenvolvimento capitalista,
da vida e das condições humanas de sobrevivência. A
surge da generalização do trabalho livre, dentro da
situação de rua tornou-se mais complexa ante
o
agravamento da Questão Social.
de Porto Alegre, Belo Horizonte, São Paulo e Recife.
As pesquisas consideraram oito variáveis no perfil da
2.3 Características históricas da situação de rua no
população em situação de rua: sexo, idade,
Brasil: um pouco de quem é, por que existe e como
escolaridade, tempo na rua, origem ou procedência
vive
dessas pessoas, relação com a família, relação com o
trabalho antes da situação de rua e relação com o
A Política Nacional para Inclusão Social da
trabalho na situação de rua.
População em Situação de Rua, instituída em 2009
Faz-se importante aqui demonstrar alguns
pelo decreto presidencial 7.053, como forma de
contrastes em relação às pesquisas mencionadas e os
orientar a construção e execução de políticas públicas
dados nacionais. Em relação ao sexo as pesquisas
voltadas para esse grupo societário, aponta que
apontaram que 78% são do sexo masculino, essa
durante o ano de 2007 o Ministério do
condição foi confirmada na pesquisa do MDS que
Desenvolvimento Social e Combate à Fome promoveu
apontou 82% do sexo masculino. Em relação a idade,
uma pesquisa nacional censitária em 71 municípios
essa população encontra-se em idade ativa, a faixa
com o objetivo de conhecer melhor o perfil da
etária predominante dos entrevistados varia de 25 a 55
população em situação de rua. Essa pesquisa localizou
anos, na pesquisa do MDS essa confirmação também
31.922 pessoas em situação de rua. Se considerado os
ocorreu. No que diz respeito a escolaridade, a
números das pesquisas semelhantes realizadas pelas
capacidade de ler ou não, os números refletem que
capitais Belo Horizonte-MG, São Paulo-SP, Recife-PE
70% sabem ler e escrever. Com relação a procedência
e Porto Alegre-RS, estima-se que esse número
dessas pessoas, observou-se que nos primeiros anos
chegará perto de 45.000, então a referência que se
havia uma grande quantidade de pessoas que estavam
tem aproximada pois não dá para fazer uma projeção
vindo de outros municípios ou de outros estados,
estatística devido as pesquisas terem sido realizadas
entretanto, ficou evidenciado nas pesquisas realizadas
em épocas diferentes, estima-se um número em torno
depois do ano 2000 um grande aumento do número de
de 50 mil pessoas vivendo em situação de rua,
pessoas provenientes da própria cidade ou de cidades
considerando nos grandes municípios brasileiros com
vizinhas, essa indicação também foi confirmada na
mais de 300 mil habitantes.
pesquisa realizada pelo Ministério do Desenvolvimento
Os estudos de Silva (2009) mostraram a
Social e Combate à Fome em 71 municípios.
existência de pesquisas realizadas por governos
No que se refere ao tempo de permanência na
municipais, no período entre 1995 e 2005, nas cidades
rua, as pesquisas realizadas no período entre 1995-
2000 mostraram que pessoas com até 1 ano vivendo
experiência de trabalho anterior e que ainda na
nas ruas foi a grande predominância. As pesquisas
condição de rua realizam alguma atividade.
realizadas posteriormente, sobretudo no período 2003-
Considerados um problema social, apenas
2005 apontaram que em relação ao tempo de
mais um elemento no cenário urbano, a população em
permanência, cresceu o número de pessoas para até
situação de rua sobrevive na e da rua. É uma
cinco anos vivendo nas ruas. No que diz respeito a
população muito específica, heterogênea, que tem uma
relação com a família, as pesquisas demonstraram que
característica de mobilidade. A população em situação
apenas 10% dos entrevistados, em São Paulo, Belo
de rua vive em condições subumanas, tem uma ínfima
Horizonte, Recife ou Porto Alegre, estavam
cobertura das políticas públicas, sofre constantes
acompanhados de alguma pessoa da família definida
perseguições e violações de direitos humanos e sociais
pelos laços de consanguinidade, na pesquisa realizada
e está sem proteção do Estado.
pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate
As pessoas que moram nas ruas, são cidadãos
à Fome isso também foi confirmado baixando o
invisíveis à rotina da população. A sociedade naturaliza
percentual para 7%.
essa população, isso acaba agravando a formação do
No aspecto da relação dessas pessoas com o
preconceito e radicaliza ainda mais o processo na
trabalho antes da situação de rua as pesquisas
relação com o diferente, porque o diferente denota em
mostraram que 72% afirmaram ter exercido algum tipo
nós algo que incomoda.
de trabalho antes da situação de rua. No último item,
O Ministério do Desenvolvimento Social e
que se refere a relação dessa população na condição
Combate à Fome (2009, p.08) define a população em
de rua com o trabalho as pesquisas apontaram que
situação de rua como “grupo populacional heterogêneo
43% sobreviviam da catação de materiais reciclados.
que está em uma condição de pobreza extrema, os
Em relação a essa situação, a pesquisa do MDS
vínculos familiares são interrompidos ou fragilizados e
mostrou que 70% realizam algum trabalho na condição
não possuem moradia convencional regular.” Ainda
de rua.
segundo o MDS, essa população é composta por
As pesquisas demonstram, portanto, que a
pessoas que buscam habitar logradouros públicos e,
população em situação de rua é fundamentalmente do
ocasionalmente, utilizam abrigos e albergues para
sexo masculino, com idade produtiva, que sabem ler e
passar a noite.
escrever, são da própria cidade ou de uma cidade de
Tomando como referência a Política Nacional
origem, possuem família, porém mantém pouca
para Inclusão Social da População em Situação de
relação com ela, são pessoas que mantiveram uma
Rua (2009), as pessoas que estão nas ruas possuem
uma variedade de características: são desempregados,
ausência de moradia, fobia social, problemas de saúde
imigrantes, egressos do sistema penitenciário e
tanto física como mental, vulnerabilidade sóciofamiliar,
psiquiátrico, entre outros, que constituem uma
perda dos vínculos sociais e afetivos, violência,
quantidade considerável da população. Segundo Flora
pessoas que estiveram em prisões, foram libertos, mas
(1987), essa população, invisíveis a rotina da
não têm para onde ir, entre outros. Os conflitos
sociedade, vive em situação de vulnerabilidade social e
familiares também influenciam na determinação da
extrema pobreza. São homens, mulheres, crianças,
situação de rua, nesses casos a rua foi a alternativa
jovens, idosos privados de direitos básicos, que diante
para essas pessoas cujo ambiente familiar tornou
da inexistência de moradia convencional regular,
inevitável a convivência. Os caminhos que os levam
procuram viadutos, parques, calçadas, praças,
para as ruas são muitos e normalmente mais de um
rodovias, túneis, jardins, canteiros, marquises, galpões,
motivo de uma vez, ou seja, as causas que giram em
prédios abandonados e lixões para utilizarem como
torno da ida a rua podem ser concomitantes. Existe
abrigo.
uma série de questões que fazem com que essa
Segundo Silva (2009, p. 105), são diversos os
população procure na rua um ambiente acolhedor.
fatores que conduzem essa população a situação de
Muitas pessoas que vivem nessa situação sentem-se
rua. A autora observa que:
acolhidas nas ruas, que é um lugar onde vão estar
mais vulneráveis, isso é um paradoxo, essa pessoa vai
[...] Fala-se em fatores estruturais
(ausência de moradia, inexistência
de trabalho e renda, mudanças
econômicas e institucionais de
forte impacto social etc.), fatores
biográficos, ligados à história de
vida de cada indivíduo (rupturas
dos vínculos familiares, doenças
mentais, consumo frequente de
álcool e outras drogas, infortúnios
pessoais - morte de todos os
componentes da família, roubos de
todos os bens, fuga do país de
origem etc.) e, ainda, em fatos da
natureza ou desastres de massas
(terremotos, inundações etc.).
encontrar acolhimento num lugar em que se torna
invisível tanto para as políticas públicas quanto para as
pessoas que colocam um estigma sobre elas.
As mudanças operadas no mundo do trabalho
também contribuem significativamente para o
agravamento da situação dos que moram nas ruas. A
precarização
crescente
do
trabalho
e
o
aprofundamento do desemprego, foram determinantes,
tiveram um peso significativo na reprodução desse
fenômeno no nosso país. No contexto contemporâneo,
A literatura corrente sobre o tema, a exemplo
o fator econômico, expresso principalmente pela
de Silva (2009), traz que entre as maiores causas que
ausência de trabalho e renda, é preponderante para
levam as pessoas a morarem nas ruas estão:
desemprego, consumo frequente de álcool, drogas,
que uma série de pessoas, diante da inviabilidade do
O estabelecimento dessa nova
concepção, seguridade social,
rompeu com o modelo de seguro
que até então modelara o sistema
de proteção social de forma
segmentária e discrimi-natória,
visando reordená-lo sob o conceito
de cidadania uni-versal. (SPOSATI,
2012, p.129)
emprego, passe a morar nas ruas.
2.4 A proteção social brasileira pós 1988 e a
invisibilidade da população em situação de rua no
desenho das políticas sociais
Abordar a Seguridade Social no contexto da
Segundo a Constituição de 1988, que traz em
Constituição Federal de 1988 significa um conjunto de
seu núcleo essencial a Seguridade Social, o Estado
proteção que envolve três direitos fundamentais: o
deve trabalhar em prol da concretização e garantia de
direito à saúde, à previdência e a assistência social. A
direitos sociais. Porém, a tentativa de implantação do
esse conjunto de direitos a Constituição chamou de
Welfare State no Brasil é tardia, ocorre em pleno
Seguridade Social, cujo objetivo é proteger todos em
neoliberalismo onde há uma maior ênfase na política
todas as situações de necessidade.
econômica e vê a política social como um problema
A década de 1980 foi marcada por conquistas
para seus fins lucrativos. Como afirma Pereira:
democráticas e houve um grande acolhimento das
políticas sociais com a Constituição Federal de 1988,
Brasil, possibilitando o desenvolvimento das condições
O Welfare State vem sendo
contraditado pela avassaladora
tendência capitalista global de
romper com a proteção social
gerida pelo Estado, de privatizar o
patrimônio coletivo, de atender as
necessidades do capital em
detrimento da satisfação de
necessidades sociais e de
desmontar
direitos
sociais
conquistados pelos movimentos
democráticos. (PEREIRA, 2011, p.
57)
necessárias ao seguro social coletivo, assegurando a
A partir de 1990 até hoje, a atuação do Estado
ampliação dos direitos da população através da
tem sido de contrarreforma, ou seja, o Estado vem
proteção social não contributiva, além do acesso aos
restringindo os direitos conquistados na Constituição
serviços de políticas sociais a todos os cidadãos, uma
de 1988, reduzindo custos com as políticas sociais com
vez que a assistência social possui caráter universal.
objetivo de adaptação a lógica do capital. De acordo
que trouxe em seu núcleo a Seguridade Social. Tal
Constituição foi criada tendo como objetivo que o
Estado passasse a assumir um compromisso com os
direitos sociais na garantia de um patamar mínimo de
dignidade ao cidadão brasileiro. Com a Constituição de
1988 iniciou-se um novo sistema de proteção social no
Assim, para Sposati:
com Silva:
Não existe no Brasil um sistema
coeso e consistente de seguridade
social implementado. O processo
de desconstrução da noção de
seguridade social expressa na
Constituição Federal de 1988 tem
sido intenso e permanente. São
exemplos dessa desconstrução as
frequentes ameaças de abandono
dos princípios gerais da seguridade
social. (SILVA, 2009, p. 245)
fragilizada. O Estado reduz o gasto com as políticas
sociais públicas para aumentar o repasse de recurso
público para o setor privado. A efetivação das políticas
está cada vez mais complicada por conta da redução
de recursos e do “Estado Mínimo” que vivenciamos
hoje.
Estamos diante de um momento em que há
uma proposta política neoliberal que se pauta pela
Verdadeiramente o Brasil não viveu o Estado
de Bem-Estar, vivenciado pelos países europeus e
americanos. A reforma política de 1988 não se
transformou
em
reforma
fiscal.
Receitas
macroeconômicas neoliberais implicaram sempre
restrição de direitos democráticos. O processo de
reforma do Estado tende a suprimir direitos, afetando a
legitimidade democrática da própria Constituição.
Enfim, o Estado sob ideologia neoliberal dá maior
ênfase no capital e vem rompendo com os direitos das
políticas sociais conquistados na Constituição Federal,
buscando cada vez mais distanciar-se e repassar suas
responsabilidades para a sociedade civil.
O modelo de Estado conhecido como “Estado
Mínimo” buscava não interferir na sociedade, deixandoa se autogerir. A concepção neoliberal defende o
“Estado Mínimo” extremamente forte, no sentido de ser
mínimo nas suas dimensões democráticas e máximo
nas suas dimensões de favorecimento ao capital. Ou
seja, o Estado é mínimo para os trabalhadores e
máximo para o grande capital. Com o Estado
minimizado, consequentemente, a proteção social fica
supressão e restrição de direitos sociais, pela
eliminação desses direitos estabelecidos na
Constituição. O Estado “neoliberalizante” tem um
papel com um viés muito mais econômico e menos
focado na dignidade da pessoa humana, muitas vezes
privilegiando a questão econômica em detrimento da
proteção social.
A Constituição de 1988 se constitui em um
marco histórico para a assistência social. A partir dela,
a assistência não passa somente a ser de caráter
público, mas também se constitui como um direito do
cidadão, com um caráter não contributivo, trazendo
ainda a questão da descentralização e participação.
Posterior a Constituição de 1988, será criada
em 1993 a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS),
pois somente o artigo 203 e 204 que trata da
assistência social como política pública não foi
suficiente para que essa política pudesse acontecer na
prática. Com a Lei Orgânica da Assistência Social
ocorre a regulamentação da política de assistência,
onde serão definidos não só os princípios e diretrizes,
mas o início da operacionalização dessa política.
O direito da assistência social foi introduzido
muita dificuldade. Ainda são poucas as ações de
na Constituição de 1988, explicitado pela Lei Orgânica
proteção social do Estado para essa população. As
da Assistência Social e institucionalmente consolidado
iniciativas existentes limitam-se à área de assistência
pela Política Nacional de Assistência Social e pela
social.
regulação do SUAS.
A Constituição brasileira de 1988 foi orientada
Cabe destacar que:
A regulamentação da Assistência
Social como Política Pública
constituinte da Seguridade Social,
bem como o seu redesenho
mediante a criação do SUAS
sinaliza, sem dúvida, um avanço
de relevância histórica na trajetória
de uma Política que tem sua
gênese estruturada sobre as bases
da matriz caritativa e filantrópica,
destituída de visibilidade na sua
natureza política e institucional.
(COUTO, 2012, p.130).
a partir da perspectiva de universalidade das políticas
sociais o que supõe a dimensão da cidadania e o
acesso aos direitos sociais básicos. Porém, a
incorporação do direito para a população em situação
de rua como direito social é um processo muito
recente.
A população em situação de rua padece de um
processo histórico de invisibilidade e negação da sua
cidadania. Um possível mapeamento para eventual
desenho de política pública direcionada a essa
população só foi possível no ano de 2007,
A inclusão da população em situação de rua
anteriormente, para os órgãos oficiais de contagem
no sistema de proteção social brasileiro aconteceu
populacional, tratava-se de população sem visibilidade.
mediante a assinatura, em 2009, do Decreto
A partir do ano de 1988 até 2005 existia uma
Presidencial 7.053, pelo presidente Lula, que institui a
invisibilidade da população em situação de rua na
Política Nacional para a Inclusão Social da População
proteção social brasileira, esse grupo populacional era
em Situação de Rua, criando um grupo interministerial
excluído da proteção social, para o qual nenhum
para que fossem pensadas em conjunto quais seriam
sistema de proteção foi pensado. Até 2004, no âmbito
as saídas, no campo das políticas públicas que
do governo federal, inexistia qualquer iniciativa de
fizessem a inclusão social da população em situação
políticas dirigidas a esse grupo populacional. Tal
de rua.
população só será visível na Seguridade Social dita
Apesar da implantação da Política Nacional
universal a partir de 2005 e apenas será inserida na
voltada para essa população, conforme apresentado
política de assistência social. Porém, somente no ano
acima, a proteção social para esse grupo populacional
de 2010 é criada a Política Nacional para a Inclusão
tem sido pensada ainda de forma muito recente e com
Social da População em Situação de Rua, principal
ganho para esse grupo populacional ao longo de
federal, que alcancem esse segmento populacional. E
muitos anos, em termos de proteção social a essa
os limites de cobertura estabelecidos pela seletividade
população no Brasil. Apesar da implantação desta
das políticas sociais conforme mencionado acima se
política, não se visualizam políticas públicas
constituem no principal fator do não alcance à
consistentes e de atendimento eficazes que contribuam
população em situação de rua. O legado histórico de
para a efetivação dos direitos dessa população.
práticas assistencialistas e segregacionistas da política
A população em situação de rua é um
de assistência social e o preconceito e estigma social
segmento populacional que não alcançou a contagem
que alcançam a população em situação de rua, o
dos censos oficiais nacionais, embora exista
próprio limite das políticas públicas como um todo, que
efetivamente. Por não habitarem um domicílio fixo, a
vem atuando de forma cada vez mais reduzida, com
inclusão da população em situação de rua nos serviços
pouco financiamento, as metodologias que são usadas,
de assistência social torna-se um desafio. Silva
critério de acesso adotado que limita os direitos, são
expressa isso claramente:
outros fatores importantes que contribuem para essa
As chamadas “exigências formais” para poder
falta de proteção social.
participar dos programas que dão corpo às políticas
A consolidação da Política Nacional para a
sociais geralmente constituem limites de acesso a eles
população em situação de rua torna-se um desafio,
pelas pessoas em situação de rua. Uma das
visto que este grupo social não se encaixa ao perfil dos
“exigências formais” é a apresentação de documentos
assistidos pela maioria das políticas públicas. Não há
de identificação pessoal. No entanto, são poucas as
políticas sociais universalizantes com perspectiva de
pessoas em situação de rua que os tem. Outra
ampliar a cidadania e garantir cobertura à este
“exigência formal” é o endereço domiciliar. (SILVA,
segmento populacional.
2009, p. 176)
Essas exigências formais das políticas sociais
torna visível a seletividade que caracteriza tais
3 Considerações finais
políticas. Dessa forma, a população em situação de rua
A população em situação de rua é um
tem sido excluída do acesso aos serviços oferecidos
fenômeno complexo e expõe as contradições básicas
pelas políticas sociais. Consoante ao entendimento de
do modo capitalista de produção. Em comum, esse
Silva (2009), a cobertura das políticas públicas para
segmento populacional carrega o estigma do desprezo
esse grupo populacional é ínfima, quase inexistente.
e da marginalização. Essa população é parte da
Não existem políticas sociais no país, em âmbito
sociedade que clama por reconhecimento e
visibilidade.
população
profundamente
invisível,
sendo
Com o avanço do neoliberalismo no Brasil, as
indispensáveis políticas sociais específicas e eficientes
políticas sociais tornaram-se seletivas e residuais,
para esse segmento populacional, que não sejam
apresentando limites de cobertura. Nesse contexto, a
políticas segregadoras. O Poder Público deve realizar
relação da população em situação de rua com as
as políticas públicas faltantes para implementação de
políticas sociais é de ínfima cobertura. Essa parcela da
direitos sociais.
população está fora de censos, estatísticas, e,
Sendo assim, é necessário ter um olhar
principalmente, é inelegível para os programas sociais
específico para essa parcela da população que não só
existentes no país.
é a mais vulnerável e carente como, ao contrário do
O presente estudo possibilitou verificar que as
que deveria acontecer, é a mais excluída do conjunto
exigências formais das políticas sociais, os limites de
das ações do setor público. É necessário elaborar
cobertura estabelecidos pela seletividade dessas
propostas para a criação de projetos de lei que
políticas são fatores que contribuem para a falta de
melhorem a condição de vida dessas pessoas. Faltam
proteção social a população em situação de rua. O
a essa população políticas públicas eficazes que de
preconceito como uma marca de dignidade e valor
fato confiram dignidade e o respeito que é de direito.
atribuído pela sociedade é mais um dos fatores que
Existe a necessidade de obter serviços públicos que
pesam para o não acesso dessa população às políticas
ajudem essas pessoas a fazer a travessia da rua para
públicas. Existe uma tendência da sociedade e do
a cidadania, para o resgate de uma cidadania.
Estado à naturalização do fenômeno e isso justifica a
insuficiência ou a ausência de políticas públicas, bem
como a pouca produção de estudos e pesquisas sobre
Referências
essa temática.
Conforme os resultados deste trabalho ficou
evidente que há uma ausência do Estado em relação à
garantia de políticas públicas efetivas para a população
em situação de rua.
Diante do que foi exposto, de um quadro tão
negativo de proteção social à população em situação
de rua, torna-se de grande importância ressaltar a
necessidade de trazer para a agenda pública essa
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a
Fome – MDS. Secretaria Nacional de Assistência Social.
Política Nacional para Inclusão Social da População em
situação de rua. Brasília: MDS, mai.2009.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a
Fome – MDS. Secretaria Nacional de Assistência Social.
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do trabalho e o fenômeno população em situação de rua
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Brasília, 2006
Trabalho e população em
situação de rua no Brasil. São Paulo: Cortez, 2009.
TRABALHO E SITUAÇÃO DE RUA NO
BRASIL: MECANISMOS E FORMAS DE
PRECARIZAÇÃO
Sandra Moreira Costa de Carvalho 1
Resumo
O artigo desenvolve sobre a precarização do
trabalho de pessoas adultas em situação de rua no
Brasil e em Salvador e como a falta de efetivação de
políticas protetivas rebate na pobreza e perdas de
direitos destes sujeitos . Está dividido em três
capítulos: o primeiro discorre sobre a pobreza
extrema e a categoria trabalho no contexto de desproteção social, apresenta um olhar sobre as
pesquisas realizadas com estes sujeitos no período
de 1990 à 2005 e os caracteriza como parte do
exército industrial de reserva . No segundo capítulo
apresenta o lócus da pesquisa: o processo de
precarização do trabalho das pessoas em situação
de rua ,mecanismos e formas no contexto brasileiro.
O terceiro capítulo traz um contexto mais
contemporâneo e discorre sobre os censos
realizados no Brasil e em Salvador e as
características atuais destes sujeitos, no que se
relaciona ao trabalho. O objeto do artigo é a relação
trabalho precarizado e situação de rua em seus
determinantes históricos, sociais econômicos e
políticos . É fruto de um estudo teórico, a partir de
revisão bibliográfica. Utilizou-se também dados de
pesquisa quantitativa realizada em 2007 no Brasil e
em 2009 em Salvador .
Palavras Chaves: Trabalho. Precarização. Situação
de rua.
The article presents a discussion of job insecurity of
adults on the streets in Brazil and Salvador, and the
lack of effective protective rebate policies on poverty
and loss of rights. It is divided into three chapters :
the first discusses the extreme poverty and class
work in the context of social protection - des ,
presents a look at the research conducted with these
subjects from 1990 to 2005 and characterized as part
of the industrial army reservation. The second
chapter presents the research locus: the process of
job insecurity of the people on the streets ,
mechanisms and forms in the Brazilian context . The
third chapter brings a more contemporary context
and discusses the census conducted in Brazil and
the characteristics of these subjects . The object is
the relationship precarious work and the homeless
and the economic and political determinants that
underlie the issue . The article is the result of a
theoretical study , based on literature review . We
also used data from quantitative research conducted
in 2007 in Brazil and 2009 in Salvador .
Key Words : Work . Precariousness . Homeless
1 Introdução
Nos últimos anos o crescimento da
população em situação de rua tem despertado a
necessidade de medir as suas proporções, os
censos no Brasil têm como referência básica o
domicilio, desconsiderando portanto as pessoas que
não possuem residência. Vários estudos e pesquisas
na década de 90 sobre esses sujeitos possibilitaram
avançar sobre a realidade e o que a rua realmente
1
Assistente Social da Secretaria Municipal de Saúde, Professora do curso de
Serviço Social da UNIRB, Mestranda em Política Social e Cidadania.
E-mail: [email protected]
representava na atualidade.
Quanto as estratégias de subsistência
entendida em seus determinantes históricos, sociais
utilizadas por estas pessoas, os estudos revelam que
e econômicos, considerando a má distribuição da
é nos grandes centros urbanos que estes sujeitos
riqueza social, advinda da produção e reprodução do
procuram permanecer, buscando lugares que
sistema capitalista.
favoreçam sua sobrevivência, sendo os lugares mais
utilizados para isso : abrigos, albergues, ruas,
praças, avenidas, viadutos, canteiros, jardins, etc.
Esses lugares têm que atender às necessidades de
higiene, limpeza e alimentação, como abrigo ou
acomodação, esse modo de viver só é possível nos
grandes centros e ajudam a explicar porque esse
fenômeno é essencialmente urbano e por que as
Este artigo busca apresentar a condição de
extrema pobreza destes sujeitos e como a categoria
trabalho se expressa na estrutura da sociedade
capitalista.
2 O trabalho no Contexto de des-proteção Social
Brasileiro: um olhar sobre as pessoas em
situação de rua no período de 1990 à 2005
cidades de pequeno porte não oferecem estrutura e
alternativas de abrigo e sustento das grandes
cidades.
A caracterização deste fenômeno assume
diferenças em relação à caracterização geral das
pessoas que o vivenciam, quanto as suas principais
características, alguns autores descrevem as
pessoas em situação de rua como pessoas de
origem, interesses, vinculações sociais e perfis
socioeconômicos diversificados, e por isso um grupo
populacional heterogêneo.
Embora as pessoas em situação de rua
possuam motivos e/ou características diversas para
usarem o espaço público como meio de
sobrevivência, existem condições e características
que possibilitam identificá-los como um grupo
populacional distintos dos demais, e como principal
motivo a pobreza extrema, que somente pode ser
Antes de desenvolver sobre o trabalho
precarizado, vale destacar o conceito de pessoas em
situação de rua adotado neste artigo:
Considera-se população em
situação de rua o grupo
populacional heterogêneo, que
tem em comum a pobreza
absoluta,
os
vínculos
familiares fragilizados ou
interrompidos, a inexistência
de moradia convencional
regular para uso privado e faz
da rua espaço de moradia e
sustento por contingência
temporária ou de forma
permanente, podendo utilizar
albergues para pernoitar e
abrigos, repúblicas, casas de
acolhida temporária ou moradias
provisórias, no processo de
construção de saída das ruas.
(MDS, 2008) .
O conceito apresentado acima, destaca três
característica fundamentais da situação de rua na
atualidade: os vínculos familiares rompidos ou
fragilizados, a pobreza extrema e a existência na
A proteção social no Brasil, encontra-se
rua. Precisa-se , no entanto, entender como este
aquém das condições necessárias para efetivação
fenômeno se reproduz no contexto brasileiro e qual
dos princípios norteadores preconizados na
sua vinculação com o contexto político e econômico.
Constituição Federal de 1988 e já implantado nos
As mudanças políticas sociais e econômicas
ocorridas no Brasil a partir de 1990 apresentaram
como principal efeito o aumento do desemprego,
precarização do trabalho, devido a terceirização e
queda de renda dos trabalhadores. A pobreza e a
desigualdade social fazendo parte mais marcante do
cenário brasileiro, derivadas especialmente da falta
de proteção social. No contexto brasileiro, percebese que a seguridade social se deu pelo viés
focalizado, priorizando a proteção social nas políticas
de previdência e assistência social, criando um
contexto de des-proteção social e não de
universalização de direitos.
Os critérios para inaptidão ao trabalho
prevaleceram nas políticas supracitadas, mesmo
com a inclusão do Estado Social, quando analisa-se
os benefícios destas políticas , percebe-se que o
países europeus e americanos. O Estado brasileiro
está voltado para redução de gastos sociais,
privatizações e focalização exigidas pelo ideário
neoliberal na condução da política de seguridade
social, criando assim um sistema voltado para uma “
universalização excludente”.
O capital se organiza e reorganiza para
manter
esta
exclusão
no
fenômeno
da
reestruturação produtiva2, por exemplo, que
constituiu um elemento importante para a
reorganização política e econômica, pois ele
reformulou as forças produtivas na reprodução do
capital. Segundo Silva (2009), essas características
políticas, econômicas e sociais acompanham essa
fase, pois estiveram presentes no Brasil desde 1980
, contexto que ficou mais nítido em 1995, devido as
medidas neoliberais de Fernando Henrique Cardoso
e que interessa para discussão que iremos iniciar:
aumento do índice de desemprego , as relações
Aprofundamento
do
desemprego, e do trabalho
precarizado; queda da renda
média real; elevação da
produtividade das empresas
pelo uso intensivo da
capacidade intelectual dos
trabalhadores em favor do
informais de trabalho, baixas contribuições , salários
defasados e baixos, não permitem a efetivação de
uma proteção social efetiva no contexto brasileiro,
seu desenho, constituiu-se centrado na focalização,
privatização, o que gera uma massa de
trabalhadores que não se beneficiam da seguridade
social prometida em 1988.
2
Silva (2009) chama de reestruturação produtiva a financerização do
capital e a nova condução no papel do Estado. Caminhos adotados para
favorecer a acumulação do capital e fundaram o novo padrão de
acumulação.
capital, associado a novos
métodos e processos de
trabalho; a crescente cooptação
do movimento sindical [...] uma
gigantesca superpopulação
relativa ou exército industrial de
reserva no agravamento da
pobreza e das desigualdades
sociais. (SILVA, 2009, p. 259).
trazer um aprofundamento histórico deste fenômeno,
nem se aprofundar em pesquisas sobre o tema, mas
vale ressaltar que a origem desse segmento remonta
ao surgimento das sociedades pré-industriais da
Europa, no contexto da chamada acumulação
primitiva, em que os camponeses foram
As características citadas acima, prefiguram
expressões da questão social3, que surgiram como
conseqüência do desenho político adotado nesta
época e que se relaciona á extrema pobreza. Dentre
as várias expressões da questão social esse artigo
se propôs analisar á população em situação de rua,
devido ser um fenômeno específico das sociedades
capitalistas, e especificamente na década de 90 ter
ganhado mais visibilidade no Brasil . Esse segmento
social também demonstra, através da sua própria
existência, a ineficácia do sistema de proteção social
brasileiro e o previlegiamento da política de
assistência social em detrimento de outras também
importantes, enquanto resposta para esta questão.
Apesar da sua multifatorialidade, no que se
refere às causas da situação de rua, um
componente inerente á sua existência é a pobreza
nas sociedades capitalistas. É um fenômeno antigo e
o seu dimensionamento ao longo da história, em
qualquer forma social demonstra ser uma atividade
complexa para análise. Esse artigo não pretende
desapropriados e expulsos de suas terras sem que
todos fossem absorvidos pela indústria nascente.
Esse descompasso entre a expulsão e não absorção
desta mão de obra, fez com que parte desses
camponeses vivenciasse a experiência de
perambular pelas ruas expostos à violência. Assim,
arrisca-se aqui afirmar que a origem desse fenômeno
vincula-se à criação das condições necessárias à
produção capitalista, que forjou o pauperismo que se
generalizou na Europa Ocidental, no final do século
XVIII.
Nota-se que para o enfrentamento dessa
questão, faz-se necessário a efetivação de políticas
de longa duração que articulem um conjunto amplo
de ações intersetoriais. Países como o Brasil, que
teve a implantação do capitalismo tardiamente e o
crescimento da industrialização de maneira
diferenciada dos países europeus e americanos,
registra uma atenção aos pobres historicamente
centrada na caridade, no assistencialismo e na
filantropia, sabe-se também que o desenvolvimento
3
Entende-se questão social como amplo aspecto de problemas sociais
que decorrem da instauração e da expansão da industrialização
capitalista. É a expressão concreta das contradições entre o capital e o
trabalho no interior do processo de industrialização capitalista
(CERQUEIRA FILHO, 1982).
político neoliberal do país incidiu diretamente no
aumento e tratamento desta questão.
Ivo (2004), ao analisar o agravamento da
pobreza
no
Brasil,
informa
que
na
formas de serviços sociais na assistência as suas
demandas.
contemporaneidade esse processo se deu com o
O desemprego é consequencia da expansão
advento do neoliberalismo, mais especificamente a
da superpopulação relativa ou exercito industrial de
partir 1990, e menciona um aumento do que Mota
reserva, elevação dos níveis de pobreza e rebate no
4
(2009) denomina de superpopulação flutuante ,
Porém, na atualidade, essa superpopulação é
permanentemente
crescimento da população em situação de rua.
O estudo de Silva (2009) faz-se importante
refuncionalizada,
nesta afirmação, a autora desenvolve que existe uma
transformando‐se em peça chave da acumulação por
estreita relação entre exercito industrial de reserva
espoliação.
determinada
ou superpopulação relativa , aumento de pobreza e
individualização da pobreza, assegurando sua
o tempo de permanência na rua, ao considerar o
solução indevidamente centrada na vontade pessoal
período no intervalo de 1995 até 2000, verificou
dos sujeitos.
neste intervalo houve um aumento do número de
Reflete-se
sobre
Para Motta ( 2009), na atualidade existem os
pessoas nesta condição. Para comprovação desta
“pobres” e os “mais pobres dos pobres”, ou seja,
afirmação esse artigo apresentará a posteriori,
graduações da pobreza.
recortes de pesquisas feitas com este público neste
Pode-se
que
período, Porto Alegre ( 1995), Belo Horizonte ( 1998)
independentemente das denominações dadas aos
e São Paulo (2000) nestas cidades os estudos
sujeitos que vivenciam esta situação, sejam pobres,
demostraram que o tempo de permanência nas ruas
mendigos ou pessoas em situação de rua, o
concentrou-se de um ano até cinco anos, 63,00%
crescimento
o
dos entrevistados, pesquisas realizadas em 2001 e
desenvolvimento do sistema capitalista de produção
2005 indicaram uma redução de pessoas que
e a exclusão de alguns trabalhadores do processo de
estavam na rua a menos de cinco anos e um
produção que reconfigura novas formas de trabalho
aumento dos que já estavam ha mais de cinco anos.
para a sua subsistência e a necessidade de novas
Esses dados sugerem que este fenômeno ganha
da
afirmar,
no
pobreza
entanto
acompanha
ampla dimensão da década de 1990, coecidindo
com as mudanças sociais, econômicas e políticas ,
4
Super população flutuante: tem a função econômica de empurrar os
salários dos trabalhadores ativos para baixo. Nessa dinâmica, os países
periféricos têm se transformado em imensos reservatórios de força de
trabalho barata e precária para as megacorporações transnacionais
(MOTA, 2009)
que transformaram o mundo do trabalho, associado
a aumento da taxa de desemprego estrutural, a mais
alta do país .
Percebe-se que a relação que este grupo
populacional estabelece com as políticas sociais e
que compõem a seguridade social, é tensionada,
3
Processo de Precarização do Trabalho
das Pessoas em situação de rua no
Brasil: mecanismos e formas
pois esta última não se concretiza para alcançar
seus beneficiários, ao contrário reforça a existência
Antes de discorrer sobre os mecanismos e
de uma parcela que não acessa os direitos sociais .
formas do processo de precarização do trabalho de
Os limites são colocados, pela natureza seletiva e
pessoas em situação de rua, vale discorrer sobre a
focalista das políticas sociais , os preconceitos e
categoria trabalho. Mas afinal, o que é trabalho?
estigmas que acompanham esta população, bem
todas as formas de vida apoderam-se de produtos
como suas marcas históricas registradas na restrição
naturais para o seu proveito, mas isso não é
de atenção na política de assistência social e para os
trabalho. Trabalho “ [...] altera o estado natural
contribuintes da previdência ou seja para aqueles.
desses materiais para melhorar sua utilidade” (
No entanto, é na política de assistência
social que esta popaulação encontra parte de seus
direitos concentrados, sobre programas de acolhida,
moradias provisórias, com alguns alargamentos
destes direitos, fruto de sua manifestação
organizativa frágil recente, tais como Movimento
Nacional de Pessoas em situação de Rua,
Movimento Nacional de Catadores de Reciclável,
alcançando, como resultado de sua luta, uma
contagem nacional desta população em 71
municípios e a implantação em 2010 de uma política
nacional de atrenção a população em situação de
rua, que não será aprofundada neste estudo, porém
serão trazidos alguns dados que ajudarão à
compreenção da inserção desta parcela da
população no mundo do trabalho e a sua cotidiana
precarização .
BRAVERMAN, 1987, p. 49).
O mesmo autor ainda informa que o trabalho
que ele refere é o trabalho humano:
“Não estamos tratando agora
daquelas primitivas formas
instintivas de trabalho que nos
lembram o mero animal ,
pressupomos trabalho de um
modo que o assinala como
exclusivamente humano. Antes
o trabalho idealizado na
imaginação dos trabalhadores.
O trabalhador transforma o
material que opera e imprime a
ele o que tinha conscientemente.
Aristóteles, chamou o trabalho
de ação inteligente. A cultura
humano segundo o autor “ é o
resultado dessa capacidade de
pensamento
conceptual”
(Ibidem, p. 51).
O autor ainda cita que vários elementos
contribuem para este processo, o qual ele denomina
de símbolos, tais como a linguagem que pode
transmitir através do grupo as gerações seguintes
essa atividade, essa continuidade se dá no aspecto
subjetivo e não por imitação como no caso do
ou transformar a natureza, assim o valor do trabalho
macaco. È o símbolo sob a forma de palavra que
está em que todo indivíduo é proprietário de uma
proporciona esses elementos de continuidade da
porção da força de trabalho total da comunidade, que
experiência instrumental do homem e isso que
os economistas burgueses desprezam.
possibilitou à acumulação do progresso , cultura e
Segundo Engels, 1979
material. Desta forma, o autor demonstra que o
social, pois o homem transforma a natureza e ao
As relações sociais estão
intimamente ligadas às forças
produtivas. Adquirindo novas forças
produtivas, os homens transformam
o seu modo de produção e, ao
transformá-lo, alterando a maneira
de ganhar sua vida, eles
transformam todas as relações
sociais. O moinho movido pelo braço
humano nos dá a sociedade com o
suserano; o moinho a vapor dá-nos
a sociedade com o capitalista
industrial. (p. 125)
mesmo tempo modifica a sua própria natureza e é
O mesmo autor ainda discorre que é na
neste processo que difere o trabalho humano do
relação capital trabalho que existe a compra e venda
trabalho animal, a teleologia ou intencionalidade que
da força de trabalho e para isso são necessários três
imprime ao trabalho. Em todas as demais espécies a
componentes destacados neste artigo: a) disposição
força diretriz e a atividade resultante instinto e
da força de trabalho, ou seja, separar os
execução são indivisíveis, a aranha tece de acordo
trabalhadores dos meios de produção que só podem
com a incitação biológica e não delega esta função a
ter acesso á eles vendendo a sua força de trabalho;
outra aranha, já o homem a unidade de concepção e
b) o princípio da liberdade onde os trabalhadores
execução pode ser dissolvida, a idéia pode ser
deverão estar livres de servidão ou escravidão para
concebida por um e executada por outro, essa
dispor desta força de trabalho; c) a expropriação da
unidade pode ser rompida.
mais valia, onde uma unidade de capital pertencerá
trabalho humano não é só atividade em si, mas
também os instrumentos que o sustentam e o
reproduzem como categoria central na história da
humanidade.
Os teóricos marxistas endossam que o
trabalho tem relação ontológica e dialética com o ser
A capacidade humana de executar o
ao empregador e não voltará ao trabalhador. O
trabalho que Marx (1975) chamou de “força de
processo de trabalho começa com um contrato que
trabalho" não deve se confundir com o poder do
estabelece as condições de venda da força de
animal, para que o trabalho do homem seja exercido
trabalho.
ou armazenado em produtos, maquinarias, serão
Na esteira desta discussão, vale aqui
necessários recursos da humanidade para enfrentar
analisar como se dá o trabalho das pessoas em
situação de rua no contexto de produção capitalista.
sociedades pré industriais, na impossibilidade de
Silva ( 2009) , citada no capítulo anterior, busca
venda da sua força de trabalho e de moradia ,
trazer essa análise para o Brasil a partir da década
habitaram as ruas como espaço de sustento e
de 90, para entender este ponto a autora realizou
moradia.
uma pesquisa com recorte a partir de 1995 á 2005 e
Marx (1975) ao analisar o pauperismo da
demonstrou que neste período houveram mudanças
Inglaterra do século XIX menciona como “ aquela
significativas no mundo do trabalho , já apresentadas
parcela da classe trabalhadora que perdeu a
neste texto e também na produção de informações
condição de sua existência, a venda da força de
em torno das pessoas em situação de rua.
trabalho, e vegeta na base da caridade pública” (p.
Analisa-se que, o surgimento das pessoas
759). Silva (2009) ao desenvolver sobre este
em situação de rua está relacionado ao processo de
contexto no Brasil, apresenta que o crescimento do
industrialização e refere-se aqueles que em
capitalismo foi expandindo esta situação de rua e de
determinado período histórico foram expulsos da
parcela de trabalhadores e foi formando cada vez
terra e não foram absorvidos neste processo
mais a superpopulação relativa ou exercito industrial
remanescente na mesma proporção que foram
de reserva. A autora cita Tiene (2004) e apresenta
expulsos, tornando-se sobrantes. Esse fenômeno se
que “ a mulher e o homem são levados a morar na
generalizou e muitos se transformaram em
rua por uma condição imposta pela sociedade de
mendigos, ladrões vagabundos, alguns por vontade,
classes, organizada a defender a mercadoria e o
mas grande parte pelas condições estruturais.
mercado, e não a pessoa e a vida” ( Tiene, 2004,
Castel (1988), identifica parcela desta
p.19 apud Silva , 2009, p. 97). Outro autor citado
população como o “ vagabundo” , o autor resgata o
pela autora que explica a população em situação de
histórico da civilição europeia pré industrial que na
rua e seu lugar enquanto surperpopulação flutuante
sua obra ele denomina como “ estrangeiro”, esses
é Luiz Eduardo Wanderley, pesquisador social que
seriam os imigrantes, que procuraram sobrevivência
participou enquanto assessor do I Seminário
fora de suas terras. (p. 130). Citando Georges Duby
Nacional sobre população em Situação de Rua em
o autor desenvolve que “ o vagabundo pertence a
São Paulo em 1992, para ele a população em
massa dos pobres, que só pode viver do trabalho de
situação de rua faz parte do chamado
seus braços “ [...]está submetido á dupla coerção de
lupemproletariado5 (1995, p.180).
ter que trabalhar e não poder fazer” ( DUBY, 1987
apud CASTEL, 1998, p. 56) Esses trabalhadores nas
5
Lupemproletariado: termo, que pode ser traduzido, ao pé da letra, como
"homem trapo", foi introduzido por Karl Marx e Friedrich Engels em A
Segundo Marx (1975, p 746) essa população
benefícios assistenciais e transferência de renda
está sempre com “um pé no pântano e outro no
mínima.
pauperismo”.
4 Dados Nacionais e a Situação de Rua
em Salvador: entendendo o Trabalho Precarizado
no período de 2007- 2009
No Brasil, no período de industrialização
entre 1930 e 1970 com ênfase na agro exportação, a
população rural contribuiu muito com o exercito
Em abril de 2008 o Ministério de
industrial de reserva especialmente no eixo sul e
Desenvolvimento social e Combate a Fome, realizou
sudeste. Avalia-se que no ano de 1980 esse
a primeira Pesquisa Nacional sobre a População em
processo foi desencadeado e intensificado em 1990,
Situação de Rua, realizada pelo Meta Instituto de
com a reestruturação produtiva , redução da mão de
Pesquisa de Opinião da Secretaria de Avaliação e
obra industrial e ociosidade da mão de obra rural ora
Gestão da Informação, como um primeiro censo
absorvida, mostrando declínio desse segmento rural
nacional voltado para contagem destes sujeitos no
na população economicamente ativa (IPEA, 1980).
Brasil.
A forma estagnada de trabalhadores
A pesquisa Nacional contemplou 71
representava a massa que fazia ocupações
municípios brasileiros acima de 300 mil habitantes e
irregulares, No Brasil no período de 1990 á 2005 as
teve como sujeitos, adultos acima de 18 anos de
pessoas em situação de rua estavam ocupando
idade. O total pesquisado ficou em torno de 31. 922
funções como vigia, lavador de carro, engraxate,
pessoas em situação de rua . Este artigo resgatará
catador de recicláveis.
alguns aspectos identificados na pesquisa e
O pauperismo é a parte da superpopulação
relativa de trabalhadores aptos para o trabalho mas
relacionados ao objeto proposto , a saber trabalho e
renda das pessoas em situação de rua.
que não são absorvidos, aqui também são
No período apresentado acima, no que se
compostos por pessoas com deficiência, idosos,
refere a trabalho, a população em situação de rua
enfermos, etc. O sustento desta parcela da
era composta, em grande parte, por trabalhadores:
população é arcada pelo Estado, através de
70,9%
exerciam
alguma
atividade
remunerada, dessas atividades destacam-se:
catador de materiais recicláveis (27,5%), flanelinha
Ideologia Alemã (1845). O lumpemproletariado seria constituído por
trabalhadores em situação de miséria extrema ou por indivíduos
(14,1%), construção civil (6,3%), limpeza (4,2%) e
desvinculados da produção social, dedicados a atividades marginais,
carregador/estivador (3,1%). Apenas 15,7% das
como os ladrões e as prostitutas
pessoas pediam dinheiro como principal meio para a
sobrevivência. Esses dados são importantes para
situação de rua, mas é o principal meio de acesso à
desmistificar o fato de que a população em situação
renda para os entrevistados pelo Censo.
de rua é composta por “mendigos” e “pedintes”.
Evidenciando a configuração de um novo perfil de
Aqueles que pediam dinheiro para sobreviver
morador de rua a partir de 1990, bastante diferente
constituíram minoria. Desse modo, a maioria tem
da imagem vigente a poucas décadas, de mendigos,
profissão: 58,6% dos entrevistados afirmaram ter
velhos e doentes, nada menos que 80% dos
alguma profissão. Entre as profissões mais citadas
indivíduos em situação de rua de Salvador
destacam-se aquelas ligadas à construção civil
declararam na pesquisa ,ter no trabalho, a principal,
(27,2%), ao comércio (4,4%), ao trabalho doméstico
embora não exclusiva, atividade geradora de renda.
(4,4%) e à mecânica (4,1%). Contudo, a maior parte
A população em situação de rua da cidade é
dos trabalhos realizados situa-se na chamada
formada, sobretudo, por trabalhadores submetidos a
economia informal: apenas 1,9% dos entrevistados
níveis extremos de precarização, uma parte
afirmaram estar trabalhando atualmente com carteira
(minoritária) dos quais também busca a mendicância
assinada. Essa não é uma situação ocasional. 47,7%
e a prostituição como formas de acesso à renda.
dos entrevistados nunca trabalharam com carteira
Este perfil da população em situação de rua foi
assinada, entre aqueles que afirmaram já ter
encontrado também pelo Censo Nacional, mas, nele,
trabalhado alguma vez na vida com carteira
o percentual dos que trabalham (70,9%) é inferior ao
assinada, a maior parte respondeu que isso ocorreu
encontrado em Salvador, que pode ser verificado na
há muito tempo (50% há mais de cinco anos; 22,9%
tabela a seguir.
de dois a cinco anos).
Outro contexto que este artigo apresenta é o
de Salvador no ano de 2010, nesta cidade, a
realidade das pessoas em situação de rua não difere
dos demais grandes centros. O relatório da pesquisa
sobre a população em situação de rua neste
município no ano de 2010, emitido pela Prefeitura
Municipal de Salvador e realizado pelo Programa
Salvador Cidadania da Secretaria de Assistência
Social, identificou que quanto ao trabalho destes
sujeitos, este não aparece como causa principal da
Tabela 01- Principais atividades geradoras de
renda da população em situação de rua de
Salvador, Outubro de 2009
Atividades
Trabalho
Profissionais do sexo
Desempregado
Pedinte
Transferências
Outras
%
80,4
3,4
4,4
34,8
2,2
12,3
Fonte: Pesquisa realizada pela Secretaria de Assistência social de
Salvador, no ano de 2010.
* Múltipla escolha
As atividades de catação de materiais
recicláveis e a prestação/oferta de serviços aos
proprietários de automóveis respondem por 73,7%
das atividades remuneradas da população em
situação de Rua de Salvador. Também aqui, não
difere do observado em outras metrópoles brasileiras
a partir da década de 1990, quando a coleta de lixo
reciclável – uma atividade que viabiliza uma cadeia
produtiva que vem se estruturando e modernizando e
que se expandiu nesta década com base no trabalho
precarizado, perigoso, pesado, sujo e mal
contratava pessoal para fazer a
seleção dos papeis, passa a contar
com mão-de-obra a um custo bem
menor. O que à primeira vista
parece ser uma “caridade” (comprar
o papel dos moradores de rua), na
verdade
se
traduz
numa
superexploração do trabalho
(OLIVEIRA, 2003: 183-184).
“A atividade de “catar material reciclável”
apresenta-se como uma das principais estratégias de
sobrevivência das pessoas em situação de rua
também em 2009, verifique tabela abaixo”.
Tabela 02 - Principais atividades geradoras de
renda, declaradas pelos que trabalham, Salvador,
outubro/2009
remunerado, milhares de trabalhadores dentre os
quais os que vivem em situação de rua. A
importância da utilização dessa mão de obra para
assegurar a competitividade do setor é reconhecida
pelos próprios representantes do setor: “A mão de
obra barata faz com que a logística reversa,
realizada no Brasil, esteja em vários setores entre
as mais baratas do mundo”. ( ABIRP, 2008 p.11)
Neste sentido, analisando dos trabalhadores em
situação de rua de Brasília, Oliveira (2003) contribui
Atividades
Catador de material reciclado
Guardador de carro
Lavador de carro
Flanelinha
Construção civil/pedreiro
Vendas
Limpeza
Carregador/Estivador
Profissional da indústria/Comércio
Bico/biscate
Pintor
Artista
Mecânico
Total
%
46,6
15,3
11,9
5,6
1,9
2,8
2,4
1,1
0,4
8,8
1,3
1,7
0,2
100,0
Fonte: Pesquisa realizada pela Secretaria de Assistência social de
Salvador, no ano de 2010.
* Questão de múltipla escolha
com esta discussão e também observa que:
“Ainda que as empresas possam
recolher os conteineres de lixo nas
repartições públicas (e existem
muitos especificamente para
papeis), para elas é muito mais
rentável comprar do catador de
papeis, não tendo que assumir a
responsabilidade de fazer todo o
processo de seleção do material.
Fazer esse trabalho implicaria a
contratação de mão-de-obra e
consequente pagamento de
encargos trabalhistas. O resultado é
que a empresa, que antes
No exercício dessas atividades apenas 1%
dos entrevistados declarou ter emprego com carteira
assinada. A maioria não respondeu qual o tipo de
vínculo, mas outras informações levantadas na
pesquisa mostraram que a inserção destes
trabalhadores no mercado de trabalho de Salvador
ocorre sob a forma de trabalho autônomo. Ou seja,
muitos se misturam, competem e até podem ser
confundidos com a parcela mais pauperizada do
podem ser removidos de onde estão não têm onde
“informal” de rua que, ao contrário dos entrevistados,
guardar seus pertences, correndo cotidianamente o
tem domicílio fixo. Quanto ao tempo de vínculo
risco de perdê-los. Os rendimentos auferidos nestas
com/na ocupação atual, cerca de 50% declarou mais
atividades são extremamente baixos, situando-se no
de um ano e quase 30% mais de quatro anos,
patamar inferior de renda dos ocupados da Região
indicando que as estratégias de sobrevivência de
Metropolitana de Salvador. Quase todos os que
uma parcela dos trabalhadores em situação de rua
responderam a questão informaram uma renda
permitem que eles conquistem uma estabilidade na
mensal inferior ao salário mínimo e quase metade
precariedade. Mais uma vez aqui é possível
declararam ganhar menos de ½ salário mínimo,
encontrar
enquanto
semelhanças
com
os
demais
entre
os
ocupados
da
Região
trabalhadores do chamado setor informal que têm a
Metropolitana de Salvador o percentual com este
rua como espaço de trabalho. Com o passar do
patamar de rendimento mensal era de 12,1% em
tempo, os mais bem sucedidos vão construindo as
2008. Os baixos níveis de renda auferidos nas
suas redes e os pactos necessários com a cidade
atividades extremamente precárias que realizam, os
formal e os seus integrantes, passando a controlar
inserem no público alvo dos programas de
determinados espaços da cidade e, também, a subir
transferência de renda.
na hierarquia da rua, que também possui os seus
líderes geralmente os que têm mais tempo de
vivência na rua .
Os trabalhadores da reciclagem em situação
de rua são deste modo, úteis e necessários para o
processo de acumulação e, apesar de excluídos do
mundo oficial e não reconhecidos ou valorizados
como trabalhadores, mantêm relações regulares com
atores
da economia formal. Mas, embora regular, esta
atividade não lhes abre oportunidade para planejar o
futuro, pois a população em situação de rua tem uma
vida marcada pela insegurança, pela instabilidade
que a leva a gastar imediatamente o que ganha, pois
5 Considerações finais
A situação de rua é um retrato da pobreza,
especialmente por estar concentrada nos grandes
centros urbanos, como ocorre no Brasil e em
Salvador, conforme demonstrado neste estudo
através dos recortes das pesquisas realizadas
recentemente no Brasil e em Salvador. Nota-se que
para o enfrentamento desta questão, faz-se
necessário a efetivação de políticas de longa
duração que articulem um conjunto amplo de ações
intersetoriais. Neste contexto, verifica-se que para
que este segmento tenha acesso a direitos sociais,
podendo desenvolver sua cidadania, é preciso que
s seguintes princípios que fundamentam a Política Nacional para a População de Rua sejam
efetivados de forma ampla: o princípio da igualdade, reconhecimento da pessoa em
situação de rua, com os mesmos direitos da pessoa humana expressos na Constituição
Federal de 1988 e na Declaração Universal dos Direitos Humanos; o princípio da
equidade compreende como reconhecimento, por parte do Estado brasileiro, do
segmento da população adulta de rua e suas características, cujos direitos não têm sidos
reconhecidos ou garantidos.
Assim sendo, deve-se garantir mudanças nas outras políticas que deveriam
atender estas pessoas e suas famílias em seus vários ciclos de vida tais, como a
educação, emprego e renda.
Verificou-se aqui, através dos recortes das pesquisas realizadas com este
público, seja em âmbito nacional como no município de Salvador que diferentemente
de outras décadas, no que se refere a trabalho as pessoas em situação de rua na
atualidade efetivamente trabalham, tendo como principal atividade o catação de material
reciclável, contribuindo sim com a riqueza social e com acumulação do capital, que
neste cenário acumula por espoliação, pois precarizam este trabalho por não
reconhecê-lo e mantê-lo na informalidade e assim estes apesar de gerar riqueza
social esses trabalhadores não se beneficiam dos beneficiam de seu direitos sociais
básicos.
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