sugestões de ações

Transcrição

sugestões de ações
In memoriam...
In memoriam...
Henry Ardila Ardila
Luis Gauthier Urzúa
Dois grandes batalhadores que abriram os
caminhos de advocacy em relação a HIV/Aids
em gays e outros HSH, em prol do exercício de
nossos direitos no marco da construção
permanente de uma cidadania integral, plena,
nossa...
Créditos
Gostaríamos de expressar nossos agradecimentos àqueles que colaboram
com esta publicação:
Produção :
ASICAL e o Projeto POLÍTICAS
- Elaboração de documentos e sistematização:
Juan Antonio Izazola (SIDALAC)Capítulo I, Considerações epidemiológicas
Edição geral :
Sandra Aliaga Bruch
Jennypher Calderón e Jeffrey Stanton - Panorama regional sobre a situação do HIV/
Aids na América Latina e no Caribe
Rafael Freda - Sistematização de documentos da UNAIDS e outros
- Sistematização de experiências de advocacy:
Rafael Freda e Javier Durán (Argentina)
Toni Reis e David Harrad (Brasil)
Condução de grupos focais de validação:
”ADESPROC-Libertad” de Bolívia
”Amigos siempre amigos” de República Dominicana
Fundación “Equidad” de Equador
”Grupo Dignidade” de Brasil
”Liga Colombiana de Lucha contra el SIDA” de Colômbia
”MUMS” de Chile
”OASIS” de Guatemala
”SIGLA” de Argentina
Assessoria:
Rubén Mayorga, Orlando Montoya e Omar Pérez
Design, concepção gráfica e diagramação:
Daniela Viscarra & Moira Machicado (La Paz - Bolivia)
Versão original em espanhol
Tradução e revisão da versão em portugûes:
David Harrad
Nosso profundo agradecimento a todas as pessoas que participaram dos
grupos focais por suas valiosas contribuições.
Nosso reconhecimento aos grupos brasileiros membros da ASICAL: Grupo Arco-Íris,
Grupo Dignidade e Grupo Gay da Bahia, e à Associação Brasileira de Gays, Lésbicas
e Travestis e seus grupos filiados, assim como aos Coordenadores e Assistentes do
Projeto Somos, por sua colaboração com a ASICAL na luta constante por nossos
direitos. Também agradecemos ao Programa Nacional de DST e Aids do Ministério da
Saúde do Brasil pela parceria no desenvolvimento do Projeto Somos.
Esta é uma produção da ASICAL e do Projeto POLíTICAS, por nós seráç
uma satisfação que a utilizem, reproduzam, copiem... porém, não
esqueçam de citar a fonte.
Esta publicação está protegida por direitos autorais.
Indice
Introdução - Rubén Mayorga................................................................
i
IV
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Considerações iniciais................................................................................. iii
CAPÍTULOS
I
Considerações epidemiológicass - Juan Antonio Izazola............................
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II
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III
1
Transmissão do HIV e classificação dos casos de Aids...............
Pontes epidemiológicas.............................................................
Informações válidas e confiáveis...............................................
Prevalência de infecção por HIV...............................................
Contas nacionais de HIV/Aids...................................................
Nem se interiorizou, nem se feminilizou, nem se conteve.................
Nem médicos, nem sacerdotes..................................................
Conclusão.................................................................................
2
6
7
9
10
13
15
16
Como surge advocacy?.............................................................................
19
Pelo respeito à diversidade sexual.............................................
Penetrando a estrutura do poder................................................
Aproximações conceituais.........................................................
Entre ações e estratégias............................................................
Lições aprendidas.....................................................................
21
22
22
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25
Desenvolvimento de uma estratégia de advocacy..................................... 27
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Definição de termos..................................................................
Preparando o terreno................................................................
Por onde começar?...................................................................
Precisamos de um “nós” forte...................................................
Desarticulando uma lei chilena homofóbica.............................
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32
Do problema à solução ...........................................................................
V
Definir o problema: uma tarefa fundamental..............................
Coleta de informação.................................................................
É imperativo saber usar a informação........................................
Discussão de alternativas de soluções........................................
Construindo ambientes e climas.................................................
Ferramentas para se pensar .......................................................
No meio do mundo, aí está o Equador........................................
Como Equidad define um dos problemas que enfrenta?.............
35
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41
41
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Incidir sobre quem toma a decisão............................................................ 45
• Como sempre, os mapas ajudam a situar.................................... 46
• A vida continua.......................................................................... 49
• As estruturas de poder: a magia de conhecê-las......................... 50
VI
De alianças e guerras.................................................................................. 51
•
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Nunca subestime os opositores..................,...............................
A dignidade se forja ..................................................................
Transformar de dentro................................................................
Uma aposta coletiva..................................................................
Mapas de poder..........................................................................
Alianças e alianças.....................................................................
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VII A “comunicação”: nossa protagonista........................................................ 59
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O efeito “quebra-cabeças”.........................................................
Do individual para o coletivo....................................................
De mensagens, materiais, meios e processos.............................
Em que momento e em que lugar? ............................................
E sempre se pergunta:
“e os meios de comunicação social?” .......................................
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VIII Refletir para seguir adiante........................................................................ 69
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IX
Monitoramento, avaliação e seguimento...................................
Quantas coisas se conseguiram nos últimos anos!....................
Para tomar decisões..................................................................
Intrinsecamente relacionados....................................................
Que tipo de dados servem para nós?.........................................
Acendeu a faísca, e agora?........................................................
Passo a passinho... a América Latina avança............................
70
70
70
70
71
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Tudo tem um custo........................................................................................ 75
• O que precisamos?.................................................................... 76
• Captando fundos...................................................................... 77
• Ser sustentável. Que maravilha!................................................ 78
X
O caminho se faz andando........................................................................ 81
•
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Plano de trabalho......................................................................
De poder para poder.................................................................
Levantamento de ações.............................................................
Preparando o terreno:
formação de uma consciência coletiva......................................
Preparando o terreno: estabelecendo bases concretas...............
Aproveitando oportunidades.....................................................
Construindo a artilharia conceitual: processo............................
Construindo a artilharia conceitual: elementos..........................
Fortalecendo o mobilização......................................................
Criando o vínculo com o público primário................................
Articulando e mantendo alianças..............................................
Criando materiais de comunicação...........................................
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Considerações finais..........................................................................................
Manifesto pela saúde sexual dos gays e outros HSH..................................... ....
Lista de participantes..........................................................................................
Bibliografía.........................................................................................................
Glossário de abreviaturas..................................................................................
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Introdução
Mulheres, travestis e homens profissionais do
sexo, gays e outros homens que fazem sexo com
homens, usuários e usuárias de drogas
injetáveis... são as pessoas mais afetadas na
América Latina pela epidemia do HIV/Aids,
grupos populacionais marginalizados e
discriminados que até o presente momento
representam mais de 50% dos casos de HIV e a
maioria das mortes associadas à Aids na região.
O HIV/Aids chegou à América Latina e ao Caribe em 1983. Vivia-se uma transição política de
regimes militares ditatoriais em meio a processos
incipientes de democratização. A epidemia,
como em outras regiões do mundo, afetou
inicialmente grupos de homens homossexuais.
Muitos deles estavam em pleno processo de
organização, começando a reivindicar seus
direitos, especialmente os direitos sexuais. A
“peste gay” dificilmente consegue ser um fator
de apoio a este esforço, e as sociedades
conservadoras e homofóbicas têm dificuldades
em enfrentar uma epidemia com estas
características, “culpando” os homossexuais pela
transmissão do HIV.
Os efeitos da epidemia foram devastadores nas
comunidades gays da região. Ficou confirmado
que o HIV se transmite através de relações
sexuais e pelo uso de produtos sanguíneos
infectados ou pelo compartilhamento de material de injeção. Enfrentou-se a epidemia com
negação, negociação, rejeição e, em alguns
poucos casos, com aceitação.
Um sistema que prioriza a saúde materna e
infantil não estava preparado para assumir o
i
grande desafio da Aids. As populações de mães
e filhos haviam se tornado o centro das
preocupações da saúde pública durante as
décadas anteriores, com o apoio da Organização
Pan-americana da Saúde, os governos nacionais,
as agências de cooperação internacional e, em
particular, o impulso dos grupos organizados de
mulheres urbanas e rurais de todas as etnias,
crenças, etc. Assim, conseguiram reduzir as altas
taxas de mortalidade materno-infantil.
Este mesmo sistema não sabia como abordar a
Aids, entendida como um fenômeno alienígena
à saúde e sexualidade masculina que, além disso,
afetava cidadãos com pouco poder de
mobilização social e política. Diante da negação
reinante e a mortalidade prematura de milhares
de gays e outros homens que fazem sexo com
homens na América Latina, a comunidade
começou a responder com atividades de apoio
integral às pessoas que vivem com HIV/Aids e
atividades de prevenção voltadas para eles
mesmos e para “o resto da população”.
Pela natureza homofóbica de nossas estruturas
sociais, o trabalho de prevenção de HIV/Aids
especificamente com gays reforça o “estigma”
em relação à comunidade, e gera a necessidade
de “deshomossexualizar” as epidemias de HIV
na região. O que significa isso 20 anos depois
do início das epidemias latino-americanas? Os
recursos utilizados para a prevenção nestes
grupos continuam muito abaixo da magnitude
das epidemias de HIV e não tem sido possível
conseguir generalizar um tratamento ético e
humano por parte dos profissionais de saúde em
relação a gays e outros homens que fazem sexo
com homens, profissionais do sexo e usuários/
as de drogas injetáveis, que continuam
representando a maioria dos casos de HIV/Aids
na região. Os estudos de contas nacionais em
HIV/Aids coordenados por SIDALAC, entre
outros, demonstram esta situação.
Frente a este panorama, dez organizações latinoamericanas de gays do México, Guatemala,
Colômbia, Equador, Chile, Argentina e Brasil
uniram seus esforços para desenvolver estratégias
de advocacy a fim de obter novos apoios técnicos
e econômicos para realizar atividades de
prevenção, atenção e apoio em HIV/Aids para
gays e outros homens que fazem sexo com
homens. Assim nasceu ASICAL. Durante a
Conferência Pan-americana de Aids em Lima,
Peru, em dezembro de 1997, fundou-se a
Associação para a Saúde Integral e Cidadania
na América Latina.
A essas alturas da epidemia, as organizações
fundadoras já haviam obtido resultados
altamente significativos para a comunidade. Por
exemplo: a revogação de artigos que tipificam a
homossexualidade como delito nos códigos
penais de Chile e Equador; a conquista de
garantias constitucionais equatorianas em defesa
dos direitos da diversidade sexual; a priorização
de fundos para a prevenção com gays e outros
homens que fazem sexo com homens através
de um empréstimo do Banco Mundial para
reduzir o impacto da Aids no México. Também
conseguiu-se que o governo do Distrito Federal
do México dedicasse US$500,000 à prevenção
do HIV com gays e outros HSH.
Na conservadora Guatemala, estudos de
contextos de vulnerabilidade e de
soroprevalência em gays resultaram no Programa
Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/aids
dedicar a totalidade dos fundos de aceleração
de programas (PAF) em 2003 para a elaboração
de estratégias de advocacy com o objetivo de
colocar os temas de homossexualidade
masculina e do trabalho sexual na agenda da
Aids do país e conseguir fundos para a
prevenção, atenção e apoio em HIV/Aids nestas
populações marginalizadas. Na Argentina,
conseguiu-se o apoio dos governos dos estados
que fazem fronteira com o Brasil e a cooperação
brasileira para impulsionar o projeto CREFOR,
modelado no Projeto Somos do Brasil.
O Projeto Somos, modelo para muitos outros
países e esforços, surge como produto dos
esforços de advocacy das organizações gays
brasileiras de luta contra a Aids, várias das quais
pertencem à ASICAL. O projeto capacita
organizações
gays
brasileiras
no
desenvolvimento de projetos próprios de
prevenção do HIV com a população de gays e
outros HSH. Os companheiros brasileiros
conseguiram que a Coordenação Nacional de
DST/Aids do Brasil participasse deste esforço
nacional, em parceria com universidades, outras
agências das Nações Unidas e outras instâncias.
Através de seus esforços de advocacy, o “Somos”
impulsionou o aumento de cobertura de 160,929
HSH em 1999 para 1,635,824 em 2002.
Enquanto isso, sob a liderança de Luis Gauthier,
Henry Ardila e Jeffrey Stanton, as organizações
ii
membros de ASICAL produziram em 1998 o guia
“Estratégias e orientações para ações em HIV/
Aids com HSH”. Com o apoio da UNAIDS e o
patrocínio da Liga Colombiana de Luta contra a
Aids e ASICAL, este guia faz um apanhado de
várias das melhores práticas relacionadas a
conceitos e orientações gerais do trabalho e as
estratégias integrais de intervenção em HIV/Aids
com HSH.
De 1999 a 2000, com o apoio da UNAIDS, foi
promovido o desenvolvimento de planos
estratégicos em quinze países da região para a
prevenção, atenção e apoio em HIV/Aids com
gays e outros homens que fazem sexo com
homens. Participaram as organizações membros
da ASICAL junto com os Programas Nacionais
de Aids (reunidos sob o guarda-chuva do Grupo
de Cooperação Técnica Horizontal, GCTH),
organizações de pessoas que vivem com HIV/
Aids, organizações que trabalham com Aids, a
Rede Latino-americana de Planejamento
Estratégica e outros atores de 15 países latinoamericanos e caribenhos. Pelo fato de que
apenas uma pequena parte destes planos tem
sido executada de maneira significativa, faz-se
indispensável uma estratégia de advocacy que
busque pressionar os tomadores de decisão para
que implementem satisfatoriamente estes planos
estratégicos.
Finalmente, com o apoio de USAID e o Projeto
POLÍTICAS, produzimos o presente guia. Nele
faz-se um apanhado dos princípios de advocacy
e algumas das experiências das organizações da
ASICAL desenvolvidas neste campo. Os bons
exemplos do movimento de mulheres na luta
pela defesa de políticas públicas em saúde sexual
e reprodutiva, nos apontam caminhos possíveis
relativos à conquista das condições necessárias
para garantir a saúde sexual dos homens e, em
particular, dos gays e outros homens que fazem
sexo com homens.
Portanto, gostaríamos de agradecer à Agência
Estadunidense
de
Desenvolvimento
Internacional (USAID) e ao Projeto POLÍTICAS
por seu apoio técnico e financeiro no
desenvolvimento deste guia e por acreditar na
necessidade de uma série de esforços a longo
prazo, os quais contribuirão para melhorar a
saúde de milhões de gays e outros homens que
fazem sexo com homens na América Latina e
no Caribe. Em especial gostaríamos de agradecer
a Clifton Cortez, Sandra Aliaga, Lane Porter, Mary
Kincaid, Kevin Osborne, Omar Pérez e Pablo
Magaz, por seu extraordinário interesse,
empenho e energia em dar início a este grande
projeto.
Dr. Rubén Mayorga Sagastume
Coordenador Geral,
Associação para a Saúde Integral e Cidadania
na América Latina
(ASICAL)
Considerações iniciais...
O HIV/Aids é um problema que afeta mais de
40 milhões de pessoas ao redor do mundo sem
distinção de raça, credo, gênero, idade,
orientação sexual ou nível sócio-econômico. Os
gays e outros homens que fazem sexo com
homens são os mais afetados na América Latina
e nos Estados Unidos. No âmbito da saúde
pública, o estigma e a discriminação têm
contribuído para negar sua existência,
provocando assim a ausência de ações
governamentais que garantam seu acesso aos
programas de prevenção e tratamento do HIV.
Com isso, só conseguiram agravar a expansão
da epidemia.
Por isso, é necessário enfrentar a estigmatização
de cara. Este é um assunto político que precisa
ser encarado abertamente para poder contribuir
para programas eficientes de prevenção e
tratamento do HIV/Aids. Negar a realidade não
nos traz nada positivo, pelo contrário permite
que a sociedade não reconheça a existência de
práticas sexuais entre homens, de natureza
diversa e em circunstâncias distintas.
O termo “homens que fazem sexo com homens”
(HSH) abrange gays, bissexuais, transgêneros,
profissionais do sexo masculino e inúmeros
homens que por distintas razões e situações se
relacionam, experimentam e/ou mantêm praticas
sexuais homossexuais. Também podem ser
adolescentes, homens confinados, militares ou
homens que sofrem outras situações de
isolamento... HSH é uma categoria
epidemiológica para determinar a transmissão
iii
do HIV com relação a práticas sexuais
específicas, independente da orientação e/ou
identidade sexual dos indivíduos.
A ausência de atenção à saúde masculina em
geral por razões de distorções de gênero, o
enfoque tradicional e punitivo da prevenção da
Aids, o modelo heterossexual dos serviços para
pessoas que vivem com HIV... são fenômenos
que afetam a qualidade dos serviços e
capacidade social para combater a epidemia. Ao
não aceitar a existência de práticas sexuais entre homens, tampouco se reconhece a
necessidade de pesquisar, formular políticas e
normas nesta área, e nem o direito dos gays e
outros HSH terem acesso a serviços
especializados de saúde e aconselhamento
ofertados pelos programas de prevenção e
tratamento das DST/HIV/Aids.
A intenção da Associação para a Saúde Integral
e a Cidadania na América Latina (ASICAL) e o
Projeto POLÍTICAS ao aliar-se para apresentar
o Manual de Advocacy, é contribuir para o
fortalecimento da capacidade local de gays e
outros homens que fazem sexo com homens no
desenvolvimento de estratégias de advocacy
neste âmbito de ação, partindo das ricas
experiências protagonizadas na América Latina
por organizações como:
• Grupo Dignidade (Curitiba-PR, Brasil),
• Organización de Apoyo a una Sexualidad Integral frente al SIDA (OASIS - Guatemala),
• Sociedad de Integración Gay Lésbica Argentina (SIGLA - Argentina),
• Movimiento Unificado de Minorías Sexuales
(MUMS - Chile),
• Fundación Ecuatoriana Equidad (Ecuador),
• Liga Colombiana de Lucha contra el SIDA
(Colombia)
Nosso objetivo central é proporcionar a gays e
outros homens que fazem sexo com homens as
linhas básicas de ação sobre como incidir
politicamente (ou seja, fazer advocacy) nos
programas de prevenção e tratamento de DST/
HIV/Aids em homens que fazem sexo com
homens. Para exercer a cidadania, nada melhor
que aprender a participar efetivamente nos
processos governamentais de tomada de
decisões que afetam nossas vidas.
Por um lado, existe material abundante sobre
DST/HIV/Aids e, por outro, manuais sobre como
fazer advocacy. A idéia não é duplicar estes
esforços, e sim complementá-los. Trabalhos
como “Estratégias e linhas de ação em DST/HIV/
Aids com HSH” da Liga Colombiana de Luta
contra a Aids; “Formando redes para a mudança
de políticas: manual de capacitação em defesa
e promoção” do Projeto POLÍTICAS, “Uma
introdução à promoção de saúde sexual para
homens que fazem sexo com homens e gays”
da Fundação Naz, ou os inumeráveis
documentos produzidos pela UNAIDS, são
apenas alguns textos que constam na bibliografia,
cuja consulta seria imprescindível para se
aprofundar nos temas propostos ou para ampliar
conceitos, enfoques ou metodologias.
O presente manual começa com uma revisão,
elaborada por José Antonio Izazola, do panorama
da epidemiologia do HIV/Aids na América Latina
e Caribe. A partir daí, pretende traçar o
surgimento de advocacy como uma estratégia
válida para a conquista de nossos direitos e,
capítulo por capítulo, analisar as características
de cada um dos elementos que a compõem,
tomando em conta experiências desenvolvidas
por diversas organizações na América Latina.
Desta maneira, ASICAL e o Projeto POLÍTICAS
cumprem seu compromisso, na esperança de
proporcionar ferramentas que sejam de utilidade
para guiar e fortalecer a participação cidadã na
melhoria dos programas de prevenção e
tratamento do HIV/Aids em HSH.
iv
Considerações epidemiológicas•
capítulo 1
1
Considerações
epidemiológicas
“Informação para a ação”. Assim poderíamos
definir “epidemiologia”. Nesse sentido, a
informação epidemiológica sobre o HIV/Aids
deve ser utilizada, por um lado, para fazer
prevenção ou controle eficiente na tentativa de
eliminar a doença e, por outra, para chamar a
atenção de forma adequada para as populações
afetadas. Em outras palavras, a epidemiologia
deve guiar a utilização de recursos de prevenção
e assistência.
As tendências epidemiológicas tentam descrever
as características de tempo, lugar e pessoas; ou
seja, quem, onde e quando. No caso do HIV e a
Aids, existem diversas formas de se medir estas
epidemias. Para a Aids, contabilizam-se os casos
diagnosticados, enquanto para o HIV, estimamse as prevalências1 em populações ou grupos
populacionais afetados ou de interesse.
Desde o início, as atividades mundiais no
enfrentamento da epidemia do HIV/Aids
outorgaram um papel fundamental às
populações mais afetadas. Estas não são
consideradas parte exclusivamente da
problemática e sim essencialmente parte da
solução. Frente ao aparecimento da Síndrome
da Imuno-Deficiência Adquirida (SIDA/Aids), a
construção do primeiro programa dedicado a seu
controle epidemiológico, o Programa Especial
de Aids da Organização Mundial da Saúde em
1988, constitui um exemplo de enfoque
multidisciplinar que transcende seu conteúdo
meramente biomédico.
Os mecanismos de transmissão do HIV que
envolvem o comportamento sexual e o uso social de drogas, tanto injetáveis como de outro
tipo, não podem ser abordados de maneira
adequada apenas pela disciplina médica. A
implantação de medidas preventivas, mais ainda
que intervenções – que por definição vêm de
fora das populações afetadas – é composta por
processos. Entre eles, os processos sustentáveis
e de maior eficácia demonstraram-se ser aqueles
desenvolvidos pelas próprias populações
afetadas, apesar de serem promovidos (e
financiados) por outras instâncias, como
governos nacionais ou locais.
O que hoje conhecemos como a epidemia do
HIV/Aids é composta por múltiplas e variadas
epidemias nacionais, regionais ou locais. Estas
epidemias ou sub-epidemias, por sua vez, podem
estar entrelaçadas e depender umas das outras.
De fato, em algumas regiões, o HIV/Aids pode
ter deixado de ser uma epidemia, para se
transformar em uma endemia2. Com freqüência,
existe inicialmente preocupação diante do
surgimento inesperado de casos de uma doença,
logo se transformando em indiferença quando
de seu aparecimento crônico em algumas áreas
ou populações.
Transmissão do HIV e classificação
dos casos de Aids
É complexo tentar caracterizar a epidemia do
HIV/Aids, seja a partir das tendênciasi que
apresenta, seja segundo o grau com que grupos
específicos são afetados.
No início, a epidemia foi classificada a partir de
três tendências, de acordo com seu aparecimento
nas diversas regiões do mundoii :
-
Tendência I: Populações inicialmente afetadas
na Europa Ocidental, América do Norte e na
Ásia: gays e bissexuais masculinos e usuários
de drogas injetáveis.
-
Tendência II: A região sub-saariana na África:
homens e mulheres heterossexuais por igual,
seguido de uma epidemia perinatal.
-
Tendência I/II: Uma combinação destas, por
exemplo no Caribe.
Posteriormente, reconheceu-se uma maior
variabilidade ao descrever as áreas de afinidadeiii,
nas quais se definiu com maior detalhe as
epidemias mais específicas por regiões menores.
Uma análise recente publicada pelo Banco
Mundial, UNAIDS e a Comissão Européiaiv
classifica as epidemias de HIV de acordo com
• Documento elaborado por José A. Izazola-Licea
1
prevalência pode ser definida como o número de pessoas vivendo com HIV que, recentemente ou já há algum tempo, contraíram HIV; normalmente se manifesta no
número de casos por base populacional, de acordo com sua freqüência pode ser uma percentagem; ou expressada em termos de cada cem mil ou milhão de habitantes.
2
Uma epidemia se define como a freqüência “inesperada” (no sentido estatístico) de uma doença; uma endemia se define como a freqüência esperada de uma doença;
existem zonas hipo-endêmicas ou hiper-endêmicas de algumas doenças. No caso do HIV/Aids, os primeiros casos demonstravam claramente uma endemia; também
existia um aumento nos casos quando se esperava que se estabilizassem. O HIV/Aids é uma pandemia que existe em todo o mundo.
2
QUADRO 1. Taxas de Aids por milhão de habitantes, por sexo,
ano de ocorrência, sub-região e país na América Latina* .
sua maturidade e ampliação segundo o grau em
que atinge grupos específicos; classificando-as
como incipientes, concentradas e generalizadas:
-
Concentrada: inferior a 5% em qualquer
grupo específico.
HOMENS
SUBREGIÃO
Incipiente: superior a 5% em um ou vários
grupos populacionais específicos.
Generalizada: superior a 1% em mulheres
atendidas em maternidades.
Esta última classificação ajuda a entender melhor
a dinâmica do HIV e sua expressão final em casos
de Aids por populações diferenciadas nas regiões
do mundo.
O relatório bianual da Organização Panamericana da Saúde de setembro de 2002
informa a respeito das notificações de casos de
Aids até junho de 2002. O número cumulativo
de casos notificados de Aids para a América
Latina e o Caribe (excluindo o Caribe NãoLatino), sem corrigir por atraso na notificação, é
de 371,312 casos:
-
Região Andina: 32,273
-
Cone Sul: 26,986
-
Brasil: 215,810
-
América Central: 28,614
-
México: 51,017
-
Caribe Latino: 16,612
1995
1996
1997
1998
1999
AMÉRICA
LATINA
110
118
112
109
95,2
66
17,2
ÁREA ANDINA
34,9
34,2
29,1
28,3
25,9
19,2
4,1
Bolívia
Colômbia
Equador
Peru
Venezuela
3,5
17,3
10,6
37
9,3
0,9
19,2
9,9
47
2,3
1,4
16,1
19,7
50,1
0,2
3,9
17,6
25,5
41,2
…
…
8,2
39,5
38
…
3,5
2,1
40
28,4
…
CONE SUL
78,6
93,3
86,4
70,1
66,3
Argentina
Chile
Paraguai
Uruguai
50,4
22
8,9
29,8
59,5
25,8
13,1
39
51,3
32,3
13,8
37,6
41,8
26,4
2,5
43,2
BRASIL
196
211
205
AMÉRICA
CENTRAL
104
135
126
Belice
Costa Rica
El Salvador
Guatemala
Honduras
Nicarágua
Panamá
A distribuição destes casos por sexo, ano de
ocorrência, sub-região e país no período de 1995
a 2002v consta no Quadro 1 como uma taxa por
3
2000* 2001*
1995 1996
1997 1998 1999 2000* 2001*
34,1 41,1
43,9
46,4
41,5
30,2
6,3
7,1
5,1
7
7
6,2
0,9
6
…
39,6
17,3
…
0,3
0,1
1,9
2,6
1,8
1,4
9,4 11,9
1
0,3
0,6
1,9
1,7
10,8
0,1
1,4
1,2
3,1
1,2
4,6 12,7
12,7 11,18
…
…
1,7
0,4
9,7
10
…
0,6
…
9,7
6,8
…
48,3
9,9
18,4 24,5
25,4
23,1
19,5
15,3
3,5
36,9
29,4
6,3
43,3
31
10,7
…
43,1
5,5
…
…
29,3
13,1 17,7
2,6
3,4
1,4
2,6
10
9,7
17,4
3,8
5,1
16,1
16,3
3,6
2,7
12,3
12,5
5,1
2,4
15
10,8
1
…
18
1,9
…
…
12,2
202
164
118
11,7
67,1 82,7
91,6
96,4
81,4
60,2
6,2
119
118
42,3
21
44,6 49,6
57,6
66,7
63,5
22,8
3,3
88,6 127,9
… 95,7 245,8
54 55,7 59,9 66,6 52,4
51,2 52,8
52 39,3 48,3
10,6 65,7 46,6 25,9 44,5
134,6 117,8 123,6 128,2 96,9
4,4
5,4
3,7
5,4
6,3
101,5 106,8 123,1 156,1 136,9
78,5
43,4
…
28,8
30,5
9,2
…
33,1
25,8
…
18,2
…
12,4
…
32,7
8,5
16,4
3,5
81,4
0,7
29,3
45,7
5,7
19,3
15,8
68,9
1,2
35,1
… 65,2 135,6
10,3 13,2
8,6
17,9 18,8 20,4
15,1 10,8 21,4
87,3 114,5
83
0,9
1,3
1,5
47 47,3
53
111,6
9,7
…
13,7
26,4
3,2
…
37,2
3,7
…
1,7
…
3,4
…
5,5
7,2
6,6
6,8
6,1
4
1,4
16,7 15,2
13,9
15,6
17,7
16,2
14
2,5
2,8
3,6
3,7
5,1
4,3
24,4 21,6
19
20,7
24
19,4
17,1
MÉXICO
41,3
40,2
37,8
37,3
34,1
21,2
7
CARIBE
LATINO
31,1
26,4
27,8
26,2
31,3
33,5
31,5
8,2
6,4
8,9
9,9
12,2
17,1
23,2
40,1
34,8
33,7
29,6
34,9
31,8
20,5
Cuba
República
Dominicana
*
MULHERES
6,3
2,4
Fonte: Tabela 3 do relatório da OPAS Annual incidence rates of AIDS (per million population), by sex, by country and by year, 1995-2001,
as of June 2002.
Considerações
epidemiológicas
milhão de habitantes, ou seja, ajustando pelo
tamanho populacional de cada país e permitindo
assim ter uma medida relativa e, portanto,
comparável entre populações.
QUADRO 2. Risco Relativo de Homens comparado a Mulheres, casos de Aids, por ano, país
e sub-região na América Latina e o Caribe†
Em geral, a incidência de casos de Aids tem sido
pelo menos duas vezes maior entre homens do
que entre mulheres na América Latina. Em
algumas regiões tem sido o triplo ou mais para
o primeiro grupo do que para o segundo. Isso
ocorreu na Região Andina e no Cone Sul. No
México, os casos em mulheres representam
aproximadamente 15% do total, e a incidência
de casos de Aids em mulheres representa menos
de um quinto dos notificados em homens.
SUBREGIÃO
Este panorama fica claro no Quadro 2, no qual
também são indicados os riscos relativos de
notificação como caso de Aids em homens,
comparados com mulheres3.
Tal medida indica, em termos epidemiológicos,
que a probabilidade de que um homem seja
notificado como um caso de Aids é 2.7 vezes
maior que em mulheres durante o período em
questão. As probabilidades de contrair o HIV,
desenvolver Aids e ser notificado é três vezes
maior em homens que em mulheres. Em
conclusão, pode-se dizer que a epidemia da Aids
na América Latina é fundamentalmente
masculina, se bem que haja um aumento entre
a população feminina.
O risco relativo (RR) é uma medida epidemiológica que compara a
probabilidade de um grupo de pessoas terem a característica de interesse em comparação com outro grupo de pessoas. Neste caso,
compara-se a probabilidade de ter Aids se for de sexo masculino
comparado com o sexo feminino. O cálculo aritmético desta medida
se obtém ao dividir a taxa masculina pela taxa feminina.
3
4
1995
1996
1997
1998
1999
2000‡
2001‡
AMÉRICA
LATINA
3,2317
2,8686
2,5558
2,3427
2,2940
2,1854
2,7302
ÁREA ANDINA
5,5397
4,8169
5,7059
4,0429
3,7000
3,0968
4,5556
Bolívia
Colômbia
Equador
Peru
Venezuela
11,6667
9,1053
5,8889
3,9362
9,3000
9,0000
7,3846
7,0714
3,9496
7,6667
2,3333
8,4737
11,5882
4,6389
2,0000
2,7857
5,6774
5,5435
3,2441
ND
ND
6,8333
3,1102
3,3989
ND
2,0588 10,0000
5,2500
ND
4,1237 4,0825
2,8400 2,5441
ND
ND
CONE SUL
4,2717
3,8082
3,4016
3,0346
3,4000
3,1569
2,8286
Argentina
Chile
Paraguai
Uruguai
3,8473
8,4615
6,3571
2,9800
3,3616
7,5882
5,0385
4,0206
2,9483
8,5000
2,7059
2,3354
2,5644
7,3333
0,9259
3,5122
2,9520
5,7647
2,6250
2,8867
2,8704
10,7000
ND
2,3944
2,8947
ND
ND
2,4016
BRASIL
2,9180
2,5538
2,2380
2,0954
2,0123
1,9518
1,8871
AMÉRICA
CENTRAL
2,3229
2,7177
2,1858
1,7766
1,8614
1,8553
6,3636
Belize
Costa Rica
El Salvador
Guatemala
Honduras
Nicarágua
Panamá
2,7095
6,3529
3,1220
3,0286
1,6536
6,2857
3,4642
2,7987
9,7719
2,7358
4,1582
1,7097
4,5000
3,0427
ND
5,8155
2,9050
3,0861
1,4158
4,1111
2,6191
1,4678
5,0455
2,0904
2,3981
1,1197
4,1538
3,3002
1,8127
6,0930
2,3676
2,0794
1,1675
4,2000
2,5830
0,7034 0,8898
4,4742 6,9730
ND
ND
2,1022 10,7059
1,1553
ND
2,8750 3,6471
ND
ND
MÉXICO
7,5091
5,5833
5,7273
5,4853
5,5902
5,3000
5,0000
CARIBE LATINO
1,8623
1,7368
2,0000
1,6795
1,7684
2,0679
2,2500
Cuba
República
Dominicana
3,4167
2,5600
3,1786
2,7500
3,2973
3,3529
5,3953
1,6434
1,6111
1,7737
1,4300
1,4542
1,6392
1,1988
† O risco relativo (RR) é uma medida
epidemiológica que compara a
probabilidade de um grupo de
pessoas terem a característica de
interesse em comparação com
outro grupo de pessoas. Neste
caso, compara-se a probabilidade
de ter Aids se for de sexo
masculino comparado com o sexo
feminino. O cálculo aritmético
desta medida se obtém ao dividir
a taxa masculina pela taxa
feminina.
‡ As informações para 2001 e 2002
são incompletas devido ao atraso
na notificação de casos.
Esse aumento chegou a ser denominada
incorretamente como a “feminilização” da Aids.
Uma epidemia se feminiliza quando o número
de casos de mulheres excede a proporção que
lhe corresponderia de acordo a sua
representação populacional. Quer dizer, se na
população existe aproximadamente o mesmo
número de habitantes adultos do sexo masculino
e feminino, a epidemia da Aids teria se
“feminilizado” se os casos em mulheres
excedessem a 50% do total.
Total de casos em Mulheres
por transmissão Sexual
Total de casos em Homens por
transmissão Sexual
Sub-total de casos de Homens
homo e bissexuais
(homens que fazem sexo com
outros homens: HSH)
39.420
130.631
82.251
(63% dos casos
em
homens por
via sexual
são HSH)
TOTAL DE CASOS QUE
CONTRAÍRAM HIV POR VIA SEXUAL
170.051
Um subconjunto de 229,241 casos notificados
à Organização Pan-americana da Saúde
incluindo as categorias de transmissão se
apresenta no Quadro 3. O quadro demonstra que
do total de casos na América Latina (incluindo o
Caribe Latino), existem 130,631 casos em
homens nos quais supõe-se ter sido
conseqüência da transmissão sexual, enquanto
existem somente 39,420 casos em mulheres por
esta mesma via, dando uma proporção de 3,3
casos masculinos por cada caso feminino.
Expressado de forma diferente, enquanto a
população adulta feminina na América Latina e
no Caribe constitui 50% dos adultos, os casos
de Aids em mulheres representam 23% do total
de casos Aids em adultos que contraíram o HIV
por transmissão sexual.
Percentagem do total de casos de Aids que
contraíram HIV por via sexual
74,9 %
Total de casos em Homens por transmissão
Sanguínea
3.613
Total de casos em Mulheres por transmissão
Sanguínea
1.560
A partir desses dados, pode-se concluir que a
epidemia da Aids é na sua maioria masculina,
apesar de existir um aumento recente no número
de casos em mulheres, e a existência de outras
epidemias relacionadas.
Percentagem do total de casos de Aids que
contraíram HIV por via sanguínea por uso de
drogas injetáveis
5
TOTAL DE CASOS QUE CONTRAÍRAM
HIV POR VIA SANGUINEA
(Excluindo uso de drogas injetáveis)
Percentagem do total de casos de Aids que
contraíram HIV por via sanguínea-transfusional
5.173
2,3 %
Total de casos em Homens que contraíram
por uso de drogas injetáveis (UDI)
36.470
Total de casos em Mulheres que contraíram
HIV por uso de drogas injetáveis (UDI)
8.306
TOTAL DE CASOS QUE CONTRAÍRAM
HIV POR VIA SANGUINEA POR USO DE
DROGAS INJETÁVEIS
44.776
19,7 %
Total de casos por transmissão Perinatal
6.948
Percentagem do total de casos de Aids que
contraíram HIV perinatalmente
3,1 %
QUADRO 3. Categorias de transmissão do HIV
em um subconjunto de casos de Aids
notificados à Organização Pan-americana de
Saúde para a América Latina, 1994-2002.
Relação dos casos
de Aids em homens,
por casos de Aids
em mulheres:
transmissão sexual
por ano de
notificação para
casos nos países da
América Latina
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
Nº Total de casos
Percentagem
de casos de
Mulheres (%)
95.3%
95.9%
96.0%
96.5%
93.6%
91.3%
89.4%
87.6%
86.2%
82.8%
79.1%
79.9%
77.2%
74.8%
72.5%
68.6%
68.7%
67.7%
76.8%
Proporção
de Casos
Homem:
Mulher (%)
20.50
23.33
24.23
27.32
14.55
10.49
8.44
7.09
6.26
4.81
3.78
3.97
3.39
2.97
2.63
2.18
2.19
2.10
3.31
Considerações
epidemiológicas
Pontes epidemiológicas
Em vez de ter uma epidemia constituída somente
por homens, agora temos pelo menos três subepidemias:
-
a original em homens homossexuais e
bissexuais (definidos por práticas e não por
identidades),
-
a de homens e mulheres heterossexuais
-
a de usuários de drogas injetáveis.
A epidemia de casos perinatais está apenas
começando, como resultado das epidemias em
heterossexuais e usuários de drogas injetáveis (e
seus parceiros). O aumento no número de casos
em mulheres, e portanto as novas infecções por
HIV, se explicam desta forma por uma nova
epidemia que se acrescenta à epidemia entre
homens, sem porém substitui-la.
As pontes epidemiológicas unem estas
epidemias. Por exemplo, existem importantes
epidemias em mulheres e crianças naquelas
áreas geográficas em que o uso de drogas
injetáveis é freqüente e está se iniciando uma
epidemia de HIV nestes grupos. Este é o caso
em algumas regiões na Argentina (por exemplo,
ao redor da Cidade de Buenos Aires), ou na
região sudeste do Brasil (por exemplo, em São
Paulo, Rio do Janeiro e outras cidades). As
epidemias que ocorrem em usuários de drogas
injetáveis têm várias características que
exemplificam as ligações epidemiológicas entre
populações, mas de maneira alguma a epidemia
do HIV/Aids se restringe a estas pontes.
6
Apenas com a finalidade de ilustrar a
complexidade dos componentes das epidemias
de HIV/Aids, vamos supor o seguinte:
transmissão. Nos diversos grupos se criariam
novas epidemias.
Em uma região geográfica exista um grupo de
usuários de drogas injetáveis (fundamentalmente
por via intravenosa) formado principalmente por
homens jovens e que a princípio não sejam
profissionais do sexo. Este grupo pode
compartilhar agulhas e seringas por um período
indeterminado sem que o HIV se transmita.
Entretanto, com freqüência a atividade sexual
aumenta em alguns usuários de certas drogas e,
sob o efeito delas, provavelmente sem utilizar o
preservativo.
Os parceiros sexuais dos membros do grupo
poderiam também estariam expostos à infecção
pelo HIV. Por exemplo, os homens com infecção
recente pelo HIV teriam grandes probabilidades
de transmiti-lo a seus parceiros usuais ou estáveis,
até sem saber, sobretudo se seus parceiros
tampouco soubessem que usam drogas. No
exemplo apresentado, poderia ser que os
usuários masculinos transmitissem o HIV no
período de alta viremia devido a recente
infecção, a suas parceiras, e eventualmente a
seus filhos.
No caso de um membro deste grupo passar a ter
HIV, dentro de pouco tempo, no caso de
compartilharem agulhas e seringas sem
esterilizar, a prevalência de HIV (e outros
patógenos) poderia aumentar a níveis superiores
a 80%. Esta circunstância tem sido documentada
amplamente em múltiplos contextos e se deve
fundamentalmente à grande eficácia da
transmissão do HIV, sendo equivalente a uma
micro-transfusão de todos os usuários anteriores
dos instrumentos de injeção intravenosa.
Se um ou mais membros deste grupo tivessem
um número grande de parceiros sexuais, então
potencialmente em cada um dos grupos em que
estão inseridos seus parceiros sexuais poderia
iniciar-se/continuar-se uma epidemia de HIV, por
exemplo, entre trabalhadores e trabalhadoras do
sexo, contatos homossexuais ou heterossexuais.
Por outro lado, este mecanismo no sentido
contrário poderia ter iniciado a epidemia original apresentada no exemplo, ou tê-la
impulsionada uma vez iniciada.
A cadeia de transmissão do HIV entre todos os
usuários, sejam homens ou mulheres, que
compartilham instrumentos de injeção,
entretanto, não se deteria apenas aos membros
deste grupo, mas sim se iniciaria um ciclo de
aumento de riscos (entendido como a
probabilidade de contrair/transmitir o HIV)
populacionais com múltiplas portas de entrada.
Por exemplo, as relações sexuais sem proteção
entre homens e mulheres dentro e fora do grupo
resultariam em altas probabilidades de
A complexidade não é menor no que diz respeito
a HIV/Aids em homens que têm práticas sexuais
homossexuais e bissexuais. Existem diversas
epidemias ligadas entre si, para cada subgrupo
de homens que em geral somente têm em
comum a característica de fazer sexo com outros
homens.
A probabilidade de se contrair HIV entre homens
homossexuais varia de acordo com a idade,
região geográfica de residência habitual, lugares
onde encontra seus parceiros sexuais, número
de parceiros diferentes por unidade de tempo,
uso do preservativo, antecedentes de doenças
sexualmente transmissíveis, práticas e técnicas
sexuais, entre outras. O termo Homens que
fazem Sexo com Homens (HSH) inclui todo este
conjunto diverso de populações, cada uma das
quais tem características próprias.
Cada sub-grupo imaginável entre os homens que
fazem sexo com outros homens pode ter
características epidemiológicas diferentes, e
portanto merece ações preventivas diferentes
também. Por exemplo, as diferenças entre os
seguintes grupos são bem conhecidas:
-
homens com identidade “gay” e práticas
homossexuais exclusivas;
-
homens sem identidade “gay” e pratica
sexuais com homens e mulheres; e, ainda
neste grupo, profissionais do sexo;
-
-
homens que fazem sexo com homens
ocasionalmente e principalmente com
mulheres, inclusive dependendo do número
de parceiros de cada sexo;
os homens profissionais do sexo, travestis ou
não.
Todos fazem parte da categoria de homens que
fazem sexo com outros homens e
numericamente são significativos, qualquer seja
a forma de estimar este número, muito embora
merecem ações preventivas diferentes para poder
garantir eficiência na intervenção.
A utilização do termo “homens que fazem sexo
com homens” é uma forma abreviada para se
7
referir a diversas comunidades e populações que
estão sob alto risco, entendido como alta
probabilidade de contrair e transmitir o HIV.
Diferentes dos homens com identidade sexual
“gay” que normalmente se envolvem em
atividades de prevenção e de acesso a antiretrovais, os outros homens que fazem sexo com
homens, freqüentemente têm comportamentos
que contribuem para o crescimento da epidemia
do HIV/Aids porém, provavelmente por falta de
identidade sexual e política, são poucas as vezes
que são atores eficientes para implementar ações
preventivas. Os profissionais do sexo masculino,
travestis ou não, em determinados momentos têm
realizado trabalhos de natureza comunitária e
preventiva com relação às DST e Aids, entretanto,
ainda permanece o desafio de que a maioria
deles se envolva neste trabalho.
Informações válidas e
confiáveis
A distorção mais significativa que ocorre na
notificação dos casos de HIV/Aids tem a ver com
estigma e discriminação. A tradição cultural
antiga machista e fundamentalista religiosa
ocidental resulta em padrões duplos na vida das
pessoas que têm múltiplos parceiros e parceiros
do mesmo sexo. Existem na clandestinidade e
não são reconhecidas publicamente, já que estas
práticas e o trabalho sexual têm implicações
negativas na América Latina e no Caribe, bem
como em outras regiões do mundo.
As distorções de notificação na classificação da
categoria de transmissão dos casos de Aids
diminuem a sua validade interna, ou seja, as
diferentes variáveis fazem com que a
classificação não tenha uma precisão de 100%.
Um dos problemas fundamentais é que a
classificação dos casos se faz a partir da melhor
identificação possível da via de transmissão do
HIV.
Entretanto, sabe-se que na ausência dos antiretrovirais – conforme a história natural do HIV/
Aids - 50% das pessoas que se infectam pelo
HIV desenvolvem Aids nos primeiros 10 anos e
a outra metade 10 anos após a infecção.
(Referindo-se ao tempo médio de progressão de
HIV para Aids, e não ao tempo médio em si).
Com estes dados, é necessário chegar a uma
conclusão a respeito das práticas que de fato
resultaram na infecção pelo HIV, tomando em
conta que existe a possibilidade de classificar
erroneamente uma pessoa que tem várias
práticas sexuais, ou de outro tipo, e que levam à
probabilidade de contrair o HIV, apenas por
causa de distorção dos dados.
Realizar diagnósticos de Aids nas instituições de
saúde se defronta com vários problemas. Para
começar, os profissionais de saúde geralmente
não contam com a habilidade necessária para
obter informação sobre o comportamento sexual
dos pacientes. É preciso entender que quem se
submete a um diagnóstico de Aids se encontra
simultaneamente sob um processo patológico de
alto impacto pessoal e familiar e,
freqüentemente, não assumem publicamente
suas práticas sexuais. Além disso, informar os
serviços de saúde (dos quais depende a atenção
imediata para uma situação que põe sua vida
em risco) das práticas sexuais negativamente
sancionadas socialmente, corre-se o risco de ser
discriminado ao ser atendido.
Considerações
epidemiológicas
O medo da discriminação torna compreensível
o fato de que uma alta percentagem de pacientes
com diagnóstico recente de Aids não notifique
suas práticas sexuais. Por último, uma vez que
os pacientes são diagnosticados, preenchem-se
fichas epidemiológicas, que não são validados
posteriormente, ou seja, se não forem
preenchidas corretamente no início do processo,
é improvável que possam ser verificadas as
informações em relação à categoria de
transmissão.
Existem diversos estudos que tentaram descrever
e quantificar estas distorçõesvi . Por exemplo, no
Estado do Chiapas no México, na fronteira com
a Guatemala, realizou-se um estudo (referência)
no qual se comparou o perfil epidemiológico das
notificações em fichas epidemiológicas
sistematizadas nas instâncias nacionais com
informações obtidas diretamente através de
entrevistas aprofundadas durante diagnósticos
recentes de infecção pelo HIV/Aids. Os
resultados indicam que embora o perfil obtido
através de relatórios epidemiológicos sugira a
transmissão heterossexual na maioria dos casos
masculinos, o estudo aprofundado trouxe
informações de que, na realidade, a maioria dos
homens diagnosticados com HIV ou Aids no
Chiapas poderia ter contraído o HIV por meio
de relações sexuais com outros homens.
Além disso, há um outro tipo de informações
que poderia validar estes achados, por exemplo,
embora tenha uma prevalência extremamente
baixa de HIV em mulheres, incluindo as
profissionais do sexo, existe um excesso no
número de casos em homens classificados como
heterossexuais, o que leva a questionar, portanto,
o meio heterossexual de transmissão do HIV. Por
8
outro lado, chama a atenção o número muito
pequeno de casos perinatais naqueles países
onde não existe uma alta freqüência de HIV em
usuários de drogas injetáveis. (Ver o Quadro 4).
Em resumo, é possível concluir que os casos de
Aids conforme os dados da vigilância
epidemiológica trazem informações que
caracterizam a epidemia do HIV/Aids como
sendo “concentrada” na maioria dos países da
América Latina e o Caribe, com exceção do Haiti
e Guiana. Este diagnóstico é claro, mesmo sem
corrigir por fatores de distorção a partir da
classificação incorreta dos casos, classificando
como heterossexuais exclusivos homens que
QUADRO 4. Características da epidemiologia em casos de Aids
selecionados em países de América Latina ‡
PAÍS
Razão H:M
Casos
acumu- somente casos
de Prof. Sexo
lados
Argentina
Bolívia
Brasil
Chile
15506
78
151852
3411
Colômbia
Costa Rica
Cuba
República
Dominicana
Equador
El Salvador
Guatemala
Honduras
México
Nicarágua
Panamá
Paraguai
Peru
Uruguai
Venezuela
TOTAL
3.71
2.70
3.16
4.54
Casos de Casos de Casos de Casos em
Prof. Sexo Prof. Sexo Prof. Sexo HSH sobre
casos de
(HSH)
(Fem.)
(Masc.)
Prof. Sexo
(Masc.)
6066
54
80212
2863
1637
20
25385
630
4376
34
61711
1937
72.1%
63.0%
76.9%
67.7%
5.44
4.46
1.17
3383
1556
732
2846
0
286
164
2427
2187
1133
671
1676
64.6%
72.8%
91.7%
58.9%
877
2803
3588
10626
13417
272
2689
418
9003
1186
2239
6.86
1.23
1.28
1.00
2.77
1.98
1.77
2.07
2.18
3.82
5.43
803
1954
2667
5347
11144
200
1868
273
6181
653
1842
117
1583
2077
5347
4018
101
1053
132
2841
171
339
442
846
1257
3722
8382
110
1151
164
3309
431
1224
229241
2.70
130644
48328
94763
3386
1867
1056
4967
No há mulheres
por transmissão
sexual notificados
Razão de
Casos
Perinatais
por casos
Femininos
Razón de
Casos
Perinatales
por casos
Femeninos
Casos
Perinatais
acumulados
Total de
casos em
Mulheres
1105
2
9087
46
2673
24
58149
784
0.41
0.08
0.16
0.06
0.41
0.08
0.16
0.06
Não há mulheres
por transmissão
Perinatal notificados
Não há mulheres
por transmissão
Perinatal notificados
0.05
0.01
0.04
0.05
0.01
0.04
0
17
2
115
0
362
228
2735
55.0%
43.3%
47.1%
69.6%
75.2%
55.0%
61.6%
60.1%
53.5%
66.0%
66.4%
0.01
0.05
0.02
0.05
0.03
0.03
0.07
0.08
0.03
0.22
0.05
0.01
0.05
0.02
0.05
0.03
0.03
0.07
0.08
0.03
0.22
0.05
1
79
42
320
134
4
84
15
126
97
27
124
1631
2077
6211
4483
121
1163
179
3851
434
541
72.5%
0.13
0.13
11303
85770
‡ Fonte: Estimativas próprias a partir da Tabela do relatório da OPAS Annual incidence rates of AIDS (per million population), by sex, by country and by year, 19952001, as of June 2002.
fazem (exclusivamente ou não) sexo com
homens. Nos poucos estudos a respeito, as
informações mostram que há uma maior
concentração em HSH, tanto casos de infecção
pelo HIV quanto diagnóstico de Aids.
Por último, nos países em que existe um número
crescente de casos em mulheres, conta-se com
informações que indicam que novas epidemias
estão surgindo que não substituem a epidemia
em HSH, mas que mesmo assim estão
relacionadas.
Prevalência de infecção por HIV
Uma outra medida utilizada para quantificar o
grau de enfermidade que o HIV/Aids impõe às
diferentes populações é a quantificação das
pessoas que recentemente, ou já há algum
tempo, se infectaram com o HIV e que vivem
com o HIV/Aids em um momento determinado:
ou seja, levar em consideração a prevalência do
HIV. Outra medida que poderia ser de utilidade
é a medição da incidência, entretanto, existem
múltiplos dificuldades para sua medição e por
isso se dá preferência à medição da prevalência.
Estes estudos foram realizados desde o
aparecimento no mercado de formas de testagem
para detecção de anticorpos contra o HIV através
de determinação ELISA a partir de 1985. No
mesmo ano foi realizado em várias cidades do
México alguns dos primeiros exemplos em que
houve diagnóstico de infecção ao HIV por
categoria sexual e estudos de comportamento práticas de risco-, além de aconselhamento. Das
primeiras populações estudadas vale a pena
destacar homens gays e bissexuais na Cidade do
9
México, Tijuana e Guadalajara. Por exemplo, na
Cidade do México em 1985 foi encontrada uma
prevalência de 5%, 25% em 1986 e 39% em
1987 entre homens que informavam ter parceiros
sexuais masculinos, normalmente identificados
como “gays” e que procuravam serviços de saúde
para obter este diagnóstico. Posteriormente, em
um estudo em 6 cidades onde este tipo de estudo
e diagnóstico se realizou em lugares de
freqüência homossexual, foi demonstrada uma
grande variabilidade nas prevalências de acordo
com a cidade sob estudo. Assim, em 1988,
demonstraram-se prevalências que variavam no
mesmo ano de 2% a 25% dependendo da
cidade, sendo que ficou demonstrado que os
riscos sociológicos são de maior impacto na
prevalência do HIV em HSHvii . Outro estudo
realizado na Cidade do México em 1992-93
utilizando uma amostra probabilística estrita
demonstrou uma prevalência de 4% em homens
que faziam sexo com outros homens, enquanto
a prevalência em homens exclusivamente
heterossexuais foi de 0,09% viii.
Estes estudos, com todas suas imperfeições,
fornecem informações de maior qualidade sobre
o comportamento sexual dos entrevistados que
as notificações de casos em nível nacional ou
local, sendo que as informações trazem maior
validez interna, e dependendo da amostragem,
validez externa que o registro de casos.
Continua-se realizando este tipo utilizando vários
esquemas, por exemplo, estudos transversais em
pesquisas sorológicas, incluindo ou não
pesquisas de comportamento, ou, sob o esquema
de pesquisa sentinela. Esta prática, entretanto,
não tem sido realizada em todos os países da
América Latina e o Caribe, nem em todas as
localidades de importância na epidemia do HIV/
Aids.
Alguns dos estudos transversais mais recentes, e
outros comparativos, provêm de estudos
realizados pelo PASCA - Projeto Ação Aids em
América Central - em um estudo multicêntrico.
Do mesmo modo, estes estudos foram realizados
em outras populações: mulheres profissionais do
sexo e mulheres sendo acompanhadas no prénatal. Os resultados preliminares dos estudos
constam no Quadro 5 e no Gráfico 1. Indicam
claramente que a prevalência de infecção pelo
HIV é maior nos grupos de HSH em estudo do
que nas profissionais do sexo e nas mulheres
acompanhadas em clínicas de pré-natal em todos
os países em que se há informações sobre estes
três grupos.
Inclusive, pode-se observar que Honduras, sendo
um país que se caracterizou por ter uma
epidemia “heterossexual” de Aids que está no
processo de ser “generalizada”, as mulheres
profissionais do sexo nesse país têm uma
probabilidade 4,8 vezes maior de estar vivendo
com HIV que as mulheres atendidas em algumas
clínicas de pré-natal, e os homens que fazem
sexo com outros homens têm 5,6 vezes mais
probabilidade de estar vivendo com HIV que as
mulheres atendidas em clínicas de pré-natal.
Em outros países observa-se uma concentração
maior da possibilidade de estar vivendo com HIV
– e de estar altamente vulnerável - nos homens
que fazem sexo com homens. Por exemplo, na
Guatemala os HSH têm uma probabilidade 23
vezes maior de estar vivendo com o HIV que as
mulheres sob estudo; no Panamá têm 35 vezes
mais probabilidade (risco) que as mulheres.
Considerações
epidemiológicas
Evidentemente, estas cifras apontam para a
existência de várias epidemias co-existentes em
cada país. Mesmo assim, em todos os países em
que há informações sobre estas três populações,
o grupo mais afetado é o dos HSH.
Provavelmente, estas sub-epidemias em cada
país e região da América Latina estejam
conectadas entre si.
Tudo isso indica que a insuficiência de recursos
dedicados à prevenção da infecção pelo HIV nos
grupos de maior risco e de maior vulnerabilidade
a esta epidemia, não só resultou em um aumento
no número de pessoas afetadas dentro destes
grupos, como também no aumento da epidemia
em outros grupos populacionais.
QUADRO 5. Prevalência de HIV em mulheres que freqüentam clínicas pré-natais, em mulheres
profissionais do sexo e homens que fazem sexo com outros homens em países da América Central.
Mulheres que atendem
Clínicas pré-natais %,
(RR*)
GUATEMALA
EL SALVADOR
HONDURAS
NICARÁGUA
COSTA RICA
PANAMÁ
BELIZE
Mulheres profissionais
do sexo
% (RR*)
0.5 (1.0)
0.5 (1.0)
2.5 (1.0)
0.3 (1.0)
0.3 (1.0)
0.5 (1.0)
2
Homens que fazem sexo
com outros homens (HSH)
% (RR*)
5.0 (10.0)
3.8 (7.6)
12 (4.8)
1.5 (5.0)
1.0 (3.3)
2.1 (4.2)
---
11.5 (23.0)
17.8 (35.6)
14.0 ( 5.6)
2.0 ( 6.7)
--11.3 (22.6)
---
FONTE: Estimativas próprias baseadas em “Resultados preliminares resumo do estudo multi-cêntrico sobre HIV/Aids e determinantes
comportamentais HSH e profissionais do sexo femininos na América Central”.
*O risco relativo bivariável - não ajustado - (RR) - foi obtido a través da comparação das taxas de prevalência com base na
prevalência menor (casos em mulheres que freqüentaram clínicas pré-natais), cujo RR=1.
10
20
Clínicas
pré-natais
18
16
Prof.Sexo
14
12
HSH
10
8
6
4
2
Belize
Panamá
Costa Rica
Nicarágua
0
Honduras
Conta-se com informações provenientes destes
exercícios nacionais em 16 países da América
Latina e do Caribe. Entre outras finalidades, estas
informações nos permitem observar o nível de
financiamento em prevenção comparado com
assistência, bem como a variabilidade entre
países devido ao tamanho de suas economias,
população e epidemias.
Gráfico 1. Compara
ção da Prevalência de HIV por grupos afetados
Comparação
El Salvador
A partir de 1997 a Iniciativa Regional sobre Aids
para a América Latina e o Caribe desenvolveu o
projeto denominado “Contas Nacionais de HIV/
Aids”. Seu objetivo é descrever, para cada país,
o nível dos fluxos de financiamento e gastos em
relação ao HIV/Aids, incluindo qualquer fonte
de financiamento: pública, privada e externa,
tanto em atenção médica, prevenção e outros
gastos fora do âmbito direto da saúde, como
também em capacitação, fortalecimento
institucional, advocacy, articulação política, etc.
Guatemala
Contas nacionais de HIV/Aids
É interessante apreciar a quantidade de recursos
dedicados à prevenção e, mais especificamente,
à prevenção nas populações nas quais se
encontram focalizadas ou concentradas as
epidemias do HIV/Aids nos países da América
Latina.
No Gráfico 2 consta o gasto total per capita em
relação ao HIV/Aids de todas as fontes e em todas
as funções em alguns países selecionados da
América Latina que apuraram as contas nacionais
em HIV/Aids para o ano 2000 (em dólares
americanos). O Gráfico 3 mostra a composição
percentual destes gastos de acordo com a sua
função: serviços pessoais - fundamentalmente
atenção médica - e em saúde pública e
prevenção.
O Quadro 6 mostra o gasto total destinado a três
das populações de maior risco para infecção pelo
HIV/Aids e de maior vulnerabilidade na América
Latina, onde se encontra concentrada a grande
maioria da epidemia de HIV e de Aids em nossa
região.
Cabe mencionar que, os dados constantes desse
Quadro apresentam várias limitações que devem
ser consideradas. Os gastos com populações de
alta vulnerabilidade para a infecção pelo HIV/
Aids, retirados da Matriz 4 dos “Relatórios de
Contas Nacionais em DST/Aids” - para o Brasil,
bem como para outros países relacionados – são
imprecisos, visto que refletem apenas parte dos
gastos com essas populações.
No caso brasileiro, considerou-se apenas o gasto
federal direcionados a essas populações. Os
gastos de estados e municípios - que possuem
importante participação no financiamento das
ações de DST e Aids -, assim como os gastos
GRAFICO 2. Gasto total per
capita em HIV/Aids de todas
as fontes e para todas as
áreas. Países selecionados da
América Latina
Latina,, no ano
2000. Valores em Dólares
Americanos (US$)
Uruguai
Perú
Paraguai
Panamá
Nicaragua
México
Honduras
Guatemala
El Salvador
Rep. Dominicana*
Costa Rica*
Chile
Brasil
Bolívia
Argentina
0.00
1.00
QUADRO 6. Gastos com
prevenção dedicados à
prevenção específica em
grupos em situação de alto
risco para infecção pelo
HIV/Aids e de alta
vulnerabilidade em países
selecionados da América
Latina, no ano 2000.
Valores em Dólares
Americanos (US$).
2.00
3.00
4.00
Argentina
Bolívia
Brasil*
Chile
Costa Rica
El Salvador
Guatemala
México
Panamá
Paraguai
Perú
República Dominicana
Uruguai
5.00
6.00
Mulheres
profissionais
do sexo
Gays e outros Homens
que fazem Sexo
com Homens
Usuários de
drogas
Injetáveis
84,828
220,944
935,228
350,814
162,133
243,320
732,916
3,379,801
241,359
203,281
215,288
509,932
14,000
36,068
82,065
900,793
105,959
1,725
178,750
32,059
1,991,622
0
42,081
53,254
146,175
1,000
65,535
0
2,599,617
818
0
30,000
0
0
0
55,270
0
0
0
*Valores referentes apenas à parcela do gasto público federal brasileiro - direcionado às
populações constantes do Quadro - que puderam ser identificados e isolados.
11
Considerações
epidemiológicas
Por outro lado, embora em todos os países haja
gastos dirigidos especificamente a mulheres
profissionais do sexo, em alguns países este gasto
específico é mínimo. Por exemplo, de um gasto
total com HIV/Aids no ano de 2000 de mais de
U$ 170 milhões, em Argentina foram gastos U$
84.828.
12
80%
60%
40%
Serviços de Assistência em Saúde
No caso de recursos dirigidos especificamente
a gays e outros homens que fazem sexo com
homens, o nível de gastos também é baixo. Inclusive, o Panamá não reportou gasto algum.
Neste item se incluiu o gasto especificamente
dirigido e focalizado nestas populações,
incluindo atividades específicas de informação,
educação e comunicação; distribuição de
preservativos ou atividades de marketing social;
testagem, diagnóstica e aconselhamento que
incluíram em seus objetivos ações de prevenção;
diagnóstico e tratamento de doenças
sexualmente transmissíveis (DST); etc.
Uruguai
Peru
Paraguai
Panamá
Nicaragua
México
Honduras
Guatemala
El Salvador
República
Dominicana
Chile
0%
Brasil
20%
Costa Rica
Vale a pena mencionar que no caso de usuários
de drogas injetáveis, em vários países não consta
gasto nenhum (Bolívia, Costa Rica, Guatemala,
México, Panamá, Paraguai, Peru, República
Dominicana e Uruguai). Uma possível
explicação disso seria a mínima representação
que a epidemia do HIV/Aids tem nesta categoria
de transmissão nestes países.
100%
Bolívia
Por tanto, estudos dessa natureza e,
conseqüentemente, comparações entre países
devem ser analisadas com cautela, visto que
podem não refletir a realidade dos gastos com
as populações e alto risco para a infecção pelo
HIV/Aids. Este fator deve ser levado em
consideração caso tais dados sejam utilizados
na tomada de decisão em políticas públicas e/
ou ações das organizações não governamentais
direcionadas ao enfrentamento da epidemia do
HIV/Aids.
GRAFICO 3. Composição percentual do gasto por área de prevenção ou de assistência
em países selecionados da América Latina, ano 2000.
Argentina
privados, não foram apropriados. Além disso, a
forma pela qual essa pequena parcela dos gastos,
registrada no Quadro 6, é contabilizada pelo
Programa Brasileiro de DST/Aids, muitas vezes,
impede que os gastos específicos com um
determinado segmento da população sejam
identificados, de forma isolada, à medida que
os gastos não são apropriados originalmente por
população.
Saúde Pública e Prevenção
Embora no Uruguai houve um gasto enorme com
prevenção, tanto público como fundamentalmente individual na compra de
preservativos, mesmo assim este gasto não pode
ser considerado como sendo de prevenção
específica em nenhuma das populações acima
mencionadas visto que não foi um gasto
focalizado, destinado a uma população
específica, nem de HSH e nem de profissionais
do sexo. No Uruguai o gasto destinado
especificamente a profissionais do sexo foi de
US$ 14.000.
60.0
50.0
40.0
30.0
20.0
10.0
% Gastos de prevenção com HSH
Nem se interiorizou, nem se
feminilizou, nem se conteve
É possível vencer a luta contra a Aids, porém
não é fácil enfrentá-la. À medida que avança a
história desta pandemia, é necessário fazer uma
reavaliação do que se aprendeu desde o início
dos anos 80 para poder planejar da melhor forma
possível os próximos passos.
A prestação de assistência médica adequada às
pessoas vivendo HIV e Aids é apenas uma parte
13
Uruguai
Peru
Paraguai
Panama
México
Guatemala
El Salvador
República
Dominicana
Chile
Brasil
0.0
Costa Rica
Por outro lado, existe uma discussão sobre se os
gastos com prevenção são suficientes e
adequadamente distribuídos. Em alguns países
é possível que ocorra que o valor total gasto com
prevenção seja baixo, de modo que a
percentagem de gastos com HSH seja parecida
com os casos entre HSH. Isto acontece na
maioria dos países, salvo notáveis exceções. Pelo
contrário, naqueles poucos países em que o total de gastos com prevenção é de um nível
adequado, é possível que os gastos direcionados
a HSH podem representar uma percentagem
baixa, mas ainda ser adequados em termos do
valor per capita.
70.0
Bolívia
Existe um grande debate acerca da definição do
tamanho das populações sob maior risco para
infecção pelo HIV e de maior vulnerabilidade.
Entretanto, e conforme demonstrado no Gráfico
4, ao comparar as percentagens de gasto em
prevenção específica com gays e outros homens
que fazem sexo com homens e a representação
proporcional que este mesmo grupo tem nos
casos cumulativos de Aids, existe um grande
diferencial, um menor gasto percentual (sobre o
total dos gastos com prevenção) que a proporção
que estes representam em termos do total de
casos.
GRÁFICO 4. Comparação das percentagens de gasto com prevenção com HSH
sobre o total do gasto com prevenção e representação proporcional dos casos
de Aids em HSH sobre o total de casos acumulados.
Argentina
Obs.: Todos os gastos mencionados acima em
relação ao Quadro 6 se referem tão somente aos
gastos registrados pelo estudo de Contas
Nacionais em DST/Aids e, portanto, não refletem
o total de gastos com populações de alta
vulnerabilidade.
% Casos HSH
da luta contra a discriminação e o preconceito,
parte de uma estratégia integral que não pode
se basear em atender mal aquilo que poderia
ter sido prevenido.
A prevenção pode ocorrer por meio de diversas
estratégias. É o que afirmam peritos das áreas
que têm a ver com a mudança de
comportamento necessária para a prevenção do
HIV/Aids. As intervenções requerem uma
seleção adequada de populações “alvo” e um
suporte teórico/técnico correspondente.
Considerações
epidemiológicas
A transmissão do HIV por via sexual e pelo uso
de instrumentos não esterilizados no caso de
drogas injetáveis são as duas áreas que
representam o maior grau de dificuldade no que
diz respeito à prevenção.
A epidemia por via sexual na América Latina tem
sido
tipificada
como
concentrada:
principalmente em homens que têm relações
sexuais com outros homens e que têm de 25 a
34 anos de idade. As taxas instantâneas de
crescimento de grande magnitude nos novos
casos em mulheres e homens heterossexuais,
podem ser devidas ao número reduzido de casos.
Por exemplo, a taxa de crescimento fica maior
ao passar de 200 a 300 casos (taxa de
crescimento de 50%) do que quando se passa
de 1.200 a 1.400 casos novos (taxa de
crescimento de 15%). É o que acontece em
algumas categorias de casos de Aids em um dos
países da região com os casos de mulheres e de
homens que fazem sexo com outros homens,
respectivamente.
Apesar desta situação, a idéia de promover ações
dirigidas de prevenção não agrada a muitos
militantes e ativistas. Inclusive alguns
pesquisadores que, em vez de responder à
descrição da epidemia aplicável a cada
realidade, insistem em se basear nos achados
de outros continentes, onde as circunstâncias são
muito diferentes, ou em temas de interesse
pessoais ou de grupo. Erramos em acreditar que
a epidemia se interiorizou, se feminilizou ou se
conteve. As informações disponíveis não
sustentam estas hipóteses. Conforme os dados
existentes, está confirmado que a epidemia de
HIV/Aids na América Latina ainda é
14
eminentemente urbana, masculina e crescente,
e que a única forma de detê-la tempestivamente
é evitar que pessoas com maior probabilidade
de se infectarem adquiram a doença.
Os dados epidemiológicos que permitem
conhecer e analisar a epidemia do HIV/Aids são
um bem público obtido utilizando recursos
públicos. Obtê-los e processá-los é uma função
inegável do Estado. De maneira alguma podese justificar a restrição do acesso aos mesmo sob
o pretexto de que a população em geral ou por
outros atores não os entendem. Operadores
governamentais e não governamentais devem ter
acesso pleno a estes dados.
Não é nossa intenção negar a existência de uma
epidemia crescente de HIV em mulheres, em
relação à qual devem ser tomadas providências
para que não se transforme em uma epidemia
de grandes proporções. Contudo, a partir da
premissa de que os dados epidemiológicos são
a base sobre a qual se deveria desenvolver e
executar as melhores estratégias de prevenção
do HIV,
como justificamos então a inexistência de
intervenções eficazes e suficientes dirigidas aos
gays e outros homens que fazem sexo com
homens?
Uma das explicações é que a homofobia paralisa
e orienta incorretamente muitos tomadores de
decisão dentro e fora do setor de saúde; levanta
questões de natureza moral tendo em vista que
o maior número de infecções ocorre por via
sexual, em particular em relações homossexuais.
“A epidemia do HIV/Aids na América Latina já
não afeta homens com práticas
homossexuais.”
“A verdadeira epidemia do HIV ocorre em
mulheres... no interior.”
São afirmações que surgiram há muitos anos em
fóruns nacionais e internacionais. Se tais
afirmações são corretas:
Por que não se refletem nos casos de Aids?
Por que, se a população for metade homens e
metade mulheres, o total de casos em mulheres
somente é de 15% em alguns países e em
nenhum país passa da metade?
Por que, ao considerar somente os casos de
transmissão sexual, há cerca de 10 casos
masculinos por cada caso feminino no México,
Colômbia, Chile e vários outros países?
Há quem argumenta que os recursos públicos
devem ser dedicados à proteção das donas-de-
casa, que normalmente se infectam devido às
práticas de risco de seus parceiros, sem que
tenham o mínimo controle para poder diminuir
o risco, ainda mais porque nem sabem que estão
correndo um risco. É verdade. É preciso evitar
que estas mulheres se infectem. Não é isso que
está em pauta. O que está em pauta é definir
qual é a melhor estratégia para enfrentar a
epidemia que nos preocupa.
Criar condições para garantir que as mulheres
tenham igualdade de oportunidades, através de
seu empoderamento e intervenção na tomada
de decisões contribuiria com soluções de fundo,
porém implica em um longo e complexo
processo de transformações sociais. Os
programas de prevenção dirigidos a donas-decasa são paliativos e não têm a cobertura e a
eficácia desejadas e, além disso, não há
possibilidades objetivas de identificar as que
precisam destas intervenções com maior
urgência. Enquanto não se consiga ter relações
igualitárias de gênero, é preciso pensar em outras
formas de evitar que as mulheres se infectem pelo
HIV.
Neste sentido, para evitar que uma dona-de-casa
se infecte devido às práticas de seu parceiro, há
duas possibilidades:
• Que as mulheres utilizem o preservativo em
todas as relações sexuais com seus parceiros,
o que é difícil de garantir devido à
desigualdade de poder de gênero e outras
razões, ou
• Que se tente evitar que seus parceiros se
infectem (prevenção primária).
15
Ambas servem e não são excludentes uma da
outra; a primeira é de longo prazo, enquanto a
segunda pode permitir resultados mais rápidos.
Desta forma, segundo enfoques com eficácia
comprovada há várias décadas, obtêm-se
melhores resultados ao dirigir intervenções às
pessoas que têm práticas de risco para infecção
por doenças sexualmente transmissíveis. Neste
caso, haveria um retorno maior se houvesse uma
cobertura adequada de intervenções dirigidas
aos gays e outros homens que fazem sexo com
homens, Cabe salientar que os benefícios desta
estratégia não se restringem somente a estes
grupos, e sim se estendem à sociedade como
um todo.
Ao evitar a transmissão do HIV entre gays e
outros homens que fazem sexo com outros
homens, se evita que aqueles que também têm
relações sexuais com mulheres as infectem. O
mesmo acontece com os clientes de profissionais
do sexo masculino e feminino.
Nem médicos,
nem sacerdotes...
A estratégia de prevenção dirigida a gays e outros
homens que fazem sexo com outros homens
deve partir da estrutura social que os coloca em
situação de vulnerabilidade. Os epidemiologistas
e os antropólogos falam de “grupos vulneráveis”
para referir-se aos HSH. A vulnerabilidade (em
grande parte) tem a ver com a conjuntura social. A sociedade não aceita e nem favorece
relações amorosas entre dois homens, e menos
ainda relacionamentos duradouros. Isto contribui
para uma constante troca de parceiros sexuais.
A condição de marginalidade faz com que o sexo
entre homens seja anônimo ou clandestino.
Nestas circunstâncias, o cerne da sexualidade é
o relacionamento sexual múltiplo, o mais rápido
e escondido possível. O cuidado, a
responsabilidade... tudo o que envolve uma
relação íntima em outras circunstâncias, não
ocorrem. Desta maneira, se juntam diversos
fatores que fazem com que o conjunto de gays
e outros homens que têm relações sexuais com
homens, tenham maior probabilidade de contrair
uma doença sexualmente transmissível,
incluindo o HIV.
Mais da metade das infecções por via sexual em
homens com menos de 19 anos ocorre através
de relações com outros homens. As campanhas
enfocadas em pais e mães de filhos adolescentes
que não tomam em conta esta realidade são uma
falácia. Estes adolescentes são os mais
vulneráveis porque estão muito isolados por uma
cultura que não permite que se expressem
livremente, que faz de tudo para fazer com que
pensem como heterossexuais, quando na
verdade sentem atração por pessoas do mesmo
sexo. Estes adolescentes não podem falar com
seus pais sobre sua orientação sexual, nem do
uso da camisinha, nem de qualquer coisa
relacionada à sua sexualidade enquanto
existirem estigma e discriminação.
Ao eliminar a discriminação por orientação
sexual, se contribui entre outras coisas, para a
eliminação dos guetos em que vivem estes
homens que não sentem a necessidade de
procurar a união heterossexual para fugir da
mesma. Desta forma, se poderia evitar em grande
medida milhares de casos evitáveis de morbimortalidade.
Considerações
epidemiológicas
Por outro lado, a experiência internacional neste
assunto demonstra que a função pública de
prevenção da transmissão sexual do HIV é mais
eficiente quando realizada através de
intervenções comunitárias. Neste sentido, seria
importante os programas governamentais de
prevenção de HIV/Aids financiarem a
capacitação dos grupos de base comunitária –
por meio de concorrência pública – e as ações
de prevenção em suas comunidades, dando
preferência aos grupos mais afetados de acordo
com os dados epidemiológicos existentes.
A falta de coesão comunitária entre os gays e
outros homens que fazem sexo com outros
homens dificulta em muito o trabalho de
prevenção entre eles, entre outros fatores. As
mudanças de atitudes e valores contribuem para
uma real mudança de comportamento. Não são
os médicos com seus jalecos brancos, nem os
sacerdotes com suas batinas pretas, nem outros
agentes externos à comunidade que são os
protagonistas de uma mudança sustentável, e sim
os próprios membros dessa comunidade, como
indicou uma vez um entrevistado:
“Eu ensino meus amigos por que é preciso se
proteger, e meus amigos acreditam em mim,
porque sabem que somos parecidos. Há afeto
e confiança entre nós”
16
Desta maneira se cria um valor e esse valor se
transmite, então pode haver uma real mudança
de comportamento.
Mais além das campanhas informativas
desenvolvidas em vários países, faltou influir na
mudança de comportamentos. Informar que o
preservativo serve é útil, porém insuficiente. É
preciso educar, mas como educar quando não
existe uma base comunitária? Ao procurar
respostas para esta pergunta, podemos
compreender em toda sua dimensão o conceito
de vulnerabilidade. Se não há uma comunidade
organizada e receptiva às ações de prevenção,
como podemos pensar que é possível contribuir
para a modificação da essência de alguns
comportamentos?
Enquanto se constrói a estrutura comunitária
necessária, não se deve perder de vista que há
pequenos grupos comunitários muito coesos. Se
bem que o fato de serem dispersados complica
um tanto os programas de prevenção, a
importância de seu trabalho é inegável. Realizam
tarefas comunitárias enfocadas na prevenção do
HIV/Aids como um tema de desenvolvimento
humano e de qualidade de vida a partir da
própria perspectiva das comunidades. Também
existem estratégias de marketing que se pode
utilizar para facilitar esse trabalho.
Conclusão
1)
Com base no número de casos notificados,
é tecnicamente incorreto e eticamente
inaceitável a afirmação de que a epidemia
homossexual do HIV/AIDS está controlada
ou até diminuindo. A homofobia faz com
que não se enxerguem os dados existentes.
Se bem que houve um aumento na
transmissão heterossexual, por diversas
razões este aumento foi exagerado
enquanto a transmissão homossexual foi
minimizado ou escondido. É com este
argumento que se pretende justificar o corte
dos escassos recursos técnicos e financeiros
dos já insuficientes programas voltados para
gays e outros HSH, para desviá-los para
outras populações.
2)
As práticas anais penetrativas e receptivas
sem proteção são eficazes na transmissão
do HIV por razões biológicas, da mesma
forma, embora em escala maior, que o coito
vaginal para as mulheres.
3)
Quando o preservativo é utilizado em todas
as relações sexuais tem um alto efeito de
proteção, no entanto, a freqüência de seu uso
é excessivamente baixa na América Latina.
4)
Sendo a epidemiologia “informação para
a ação”, é imprescindível aumentar e
consolidar os programas eficazes de
prevenção para evitar a transmissão do HIV
entre homossexuais. As campanhas oficiais
de prevenção não estão dirigidas a quem
realmente está se infectando. É preciso ter
um diagnóstico preciso; determinar
exatamente quem está se infectando e o
porquê, para prevenir ali, onde é prioritário.
5)
É indispensável elaborar programas específicos de prevenção para cada realidade
concreta, levando em conta as diferenças
sociais e geográficas no número de casos,
prevalência de infecção, práticas sexuais e
uso do preservativo, entre outros fatores.
6) Os estados deveriam fazer esforços
correspondentes para eliminar as condições
legais, políticas e sociais que reforçam a
marginalidade e a vulnerabilidade dos gays
e outros HSH na sociedade. Por exemplo,
aprovar leis que proíbam a discriminação
por orientação sexual, respeitar os centros
culturais de entretenimento e de encontro
de gays, entre outros.
7)
Corresponde aos governos financiar e
supervisionar o trabalho preventivo, bem
como avaliar seu impacto, rigorosamente
coordenado em conjunto com grupos de
base comunitária e com formação
profissional.
Na América Latina, e ainda em cada país, coexiste uma variedade de epidemias. Não se trata
de uma só, cada sub-epidemia deve ser atendida
plenamente. Neste contexto, é de vital
importância reconhecer que a epidemia em gays
e outros homens que fazem sexo com homens é
a mais antiga e a mais carente em termos de
políticas públicas e financiamento. Se
conseguimos atendê-la agora, ainda há tempo de
evitar que milhares deles passem a viver com HIV.
17
1
Mann Jonathan, Chin J, Piot P, Quinn T. The international epidemiology of AIDS. Scientific American. Oct 1988. PP51-62.
Mann Jonathan, Chin J, Piot P, Quinn T. The international epidemiology of AIDS. Scientific American. Oct 1988. PP51-62.
Mann, Jonathan. AIDS in the World; The Global AIDS Policy Coalition.—Cambridge: Harvard University Press, 1992
4
The World Bank. Ainsworth M, Mead O. Confronting AIDS. Public Priorities in a global epidemic. A world Bank Policy Research Report.
Oxford University Press: New York: 1997.
5
Pan American Health Organization / World Health Organization. AIDS Surveillance in the Americas. Biannual Report. September 2002.
Mimeo.
6
Magis C, García ML, González G, González F, Candelas E, Valdespino JL et al. Under report of homosexuality affects epidemiological
patterns of AIDS/HIV in Latin american country. En: Abstract book No. 2. VIII International Conference on AIDS/III STD World
Congress; 1992; Amsterdam, Holanda; abstract No. PoC 4768:C371.
7
Izazola-Licea JA, Valdespino-Gomez JL, Gortmaker SL, Townsend J, Becker J, Palacios M, Mueller NE, Sepulveda J. HIV-1 seropositivity and
behavioral and sociological risks among homosexual and bisexual men in sex Mexican cities. JAIDS 4 (6);614-622, 1991.
8
Izazola-Licea JA. Gortmaker SL. Tolbert K. De Gruttola V. Mann J. Prevalence of same-gender sexual behavior and HIV in a probability
household survey in Mexican men. The Journal of Sex Research Volume 37, No. 1.
2
3
Considerações
epidemiológicas
18
Como surge advocacy?
capítulo 2
19
Como surge
advocacy?
Se antes o papel principal assumido pela
sociedade civil foi de lutar pelo retorno da
democracia nos países latino-americanos,
atualmente é fortalecer esta democracia através
da participação cidadã ativa nos processos de
tomada de decisão acerca do desenvolvimento
econômico, político, social e cultural das nações.
limitaram nossa visão e tempo no sentido de
chegar a entender que o povo não é um tudo
homogêneo. Correspondia então à democracia
dar respostas eqüitativas aos diferentes setores
da sociedade. A liberdade conquistada
paulatinamente abre o cenário para essa
diversidade negada.
A partir dos anos 80, as ditaduras caíram e os
novos ventos começaram a soprar a favor de uma
interação contínua e permanente entre o Estado
e a Sociedade Civil. No novo contexto, a
sociedade civil teve que aprender a marcar sua
presença nos processos de tomada de decisão
no âmbito público, procurando sistematicamente
fortalecer sua ação cidadã fundamentada em
responsabilidades e direitos.
As coletividades humanas começaram a tornar
visíveis características, necessidades e aspirações
díspares de acordo com o sexo, etnia, geração,
classe, orientação sexual... As demandas se
diversificaram. Foi então que começamos a
entender os mecanismos pelos quais uma
sociedade discriminadora e desrespeitosa
transformava as diferenças em desigualdades.
Surgiram múltiplas vozes de protesto, começouse a romper o silêncio, os silêncios. Iniciou-se
um processo longo, lento; porém sem retorno.
Emergiram novos atores sociais: movimentos de
mulheres, de povos indígenas, de ambientalistas,
de jovens, de diversidade sexual ...
As formas tradicionais de representação da
sociedade civil -movimentos sindicais e partidos
políticos - frente ao processo de democratização
e a aplicação de um novo modelo econômico
nos países da América Latina, não tiveram a
capacidade de articular as demandas sociais,
econômicas, políticas e culturais; e perderam
legitimidade e poder de convocação perante suas
bases. A fragmentação destas organizações
tradicionais em Estados com uma capacidade de
gestão social muito fraco exigiu à sociedade civil
um papel mais proativo na luta por obter padrões
aceitáveis de desenvolvimento humano. (Pooley,
B; 1998)
As mudanças não ocorreram em uma só direção.
As sociedades conservadoras e as ditaduras nos
impediram de entender a imensa diversidade dos
povos. A estreiteza do conservadorismo e a
intensidade da luta social em prol da democracia
20
É neste contexto que a partir da década de 80
surgem as comunidades de gays, lésbicas,
transgêneros e bissexuais (GLTB) como atores
sociais de uma América Latina distinta. Como
cidadãos plenos, temos que assumir a
responsabilidade por contribuir para o
desenvolvimento integral de nosso próprio
entorno e aprender a exigir as condições
necessárias para exercer nossos direitos
constitucionais e, dentro destes, nossos direitos
sexuais e reprodutivos. Isso significa participar
ativamente na tomada de decisões que afetam
nossos interesses e vida cotidiana. É
imprescindível reconhecer não somente nossos
direitos como também as responsabilidades que
temos para influenciar as políticas locais,
regionais, nacionais e internacionais para
contribuir com a eliminação das causas
estruturais da discriminação e do estigma,
particularmente a relacionada à orientação
sexual e ao HIV/Aids.
Com relação à epidemia da Aids e a
transmissão por via sexual do HIV “em um
número demasiado de países porém a
existência de sexo entre homens continua
sendo negada, simplesmente porque não se
ajusta aos estereótipos e pautas ocidentais...
Em relação à sexualidade e ao comportamento
sexual, precisa-se de investigação contínua
para melhor entender as identidades, crenças e
culturas sexuais. A forma como as pessoas se
vêem sexualmente tem implicações profundas
nas suas vidas e nas medidas que tomam para
se proteger e proteger outros contra a infecção.
Sabemos muito pouco sobre as formas como o
poder de gênero, a homofobia e os medos
acerca do sexo de modo geral fazem impacto
sobre a maneira como nos entendemos
sexualmente e sobre as expectativas e crenças
que temos a respeito de outros. Fazem-se
necessárias a defesa e a promoção (advocacy)
contínuas para surtir um respeito maior para a
diversidade sexual...” Assim afirmava Peter
Piot em 1997 e até hoje, embora se avançou
muito, ainda há muito por fazer.
21
Pelo respeito à
diversidade sexual
Precisamos desenvolver estratégias eficientes,
dirigidas de maneira específica a gays e outros
homens que fazem sexo com homens (HSH),
para prevenir a transmissão por via sexual do
HIV. Precisamos de intervenções preventivas
efetivas e respostas certas às necessidades que
exige o tratamento do HIV/Aids no marco dos
direitos humanos e o respeito às diferenças.
Dezenas de iniciativas tomadas por organizações
GLTB durante os anos 90 na América Latina
plantaram as sementes da mudança. Alguns
exemplos bem-sucedidos são:
•
as ações desenvolvidas pelo MUMS no
Chile que conseguiu fazer com que Estado
modificasse o Artigo 365 do Código Penal
que penalizava as relações sexuais
consentidas entre homens adultos;
•
a inclusão de HSH nos programas e planos
do Programa Nacional de Aids/DST do
Ministério de Saúde Pública do Equador
como resultado dos esforços liderados pela
Fundación Ecuatoriana Equidad;
•
a eleição do Grupo Dignidade, sempre
apoiado por diversos aliados, como
membro titular dos Conselhos Municipal e
Estadual de Saúde e do Conselho
Permanente de Direitos Humanos dos
Estado do Paraná;
•
a inclusão de anti-retrovirais na lista de
medicamentos essenciais da Colômbia
pelas ações realizadas pela Liga
Colombiana de Lucha contra el SIDA;
•
o reconhecimento por vários Programas
Estaduais de HIV/Aids da Argentina da
necessidade de atuar no campo HSH e a
criação de um clima favorável para este tipo
de intervenções em outros estados e
jurisdições por pressão liderada por SIGLA;
•
a proposta da Guatemala ao Fundo Global
de Luta contra a Aids, a tuberculose e a
malária concentrada em populações
vulneráveis incluindo HSH, profissionais do
sexo e pessoas vivendo com HIV/Aids e a
priorização do tema HIV/Aids em HSH e
profissionais do sexo na utilização dos
fundos de aceleração de programas
solicitados à UNAIDS para 2002 e 2003,
por negociações impulsionadas por OASIS.
Todos estes processos incluem em si mesmos o
fortalecimento das organizações envolvidas; a
sensibilização de grandes setores sociais para o
tema; a rompimento de uma infinidade de
silêncios e mentiras; e o desenvolvimento de
habilidades técnicas em diversas áreas como
planejamento estratégico, comunicação,
negociação... Os movimentos, grupos, parcerias
e organizações não governamentais conseguiram
penetrar a estrutura do poder e influir em suas
decisões. Através da formação e fortalecimento
de lideranças, deram visibilidade à população
homossexual, potencializaram o auto-estima
Como surge
advocacy?
coletiva e apoiaram significativamente a
organização de comunidades de gays, lésbicas,
transgêneros e bissexuais em defesa de seu
direito à saúde e à vida sem discriminação de
qualquer natureza.
econômico, social e cultural do Estado. Neste
sentido, questiona o autoritarismo e centralismo
das autoridades, buscando elaborar políticas em
negociação e acordo com a população
diretamente afetada e envolvida.
Penetrando a estrutura do poder
Se nosso objetivo é ampliar nossa capacidade
de intervenção, como sociedade civil, nas
decisões que dizem respeito à vida coletiva, é
imprescindível nos organizarmos em defesa de
nossos interesses comuns para conseguir a
criação ou mudança de políticas, posições ou
programas de qualquer tipo, para poder propor,
defender e recomendar idéias que permitam a
quem toma as decisões conduzir suas ações
visando soluções mais apropriadas do nosso
ponto de vista.
Este manual pretende compartilhar com você
essas experiências à luz das considerações
epidemiológicas realizadas. Trata-se de
desenvolver um mecanismo de negociação,
buscando conquistar reivindicações próprias das
comunidades GLTB. Não parte de uma lógica
de confrontação, nem de ações diretas de massa.
Propõe, sim, estratégias sustentadas, que
procuram objetivos concretos e realistas para
conseguir, passo a passo, dos tomadores de
decisão soluções para os mais diversos
problemas que enfrentamos na vida cotidiana.
Referimo-nos a “incidência política”, “promoção
e pressão política”, “promoção e defesa”, “defesa
e gestão pública” ou para quem queira utilizar o
termo em inglês, “advocacy”.
Advocacy é um instrumento de participação
cidadã no poder. Permite-nos atuar nos distintos
níveis de decisão institucional, municipal,
estadual, regional, internacional do sistema
político formal e não formal. Ao contribuir para
o fortalecimento do exercício pleno de nossa
cidadania, contribui para a revitalização da
democracia. Trata-se de uma aproximação entre o Estado e a Sociedade Civil - neste caso as
comunidades GLTB - que garante opções de
participação nas decisões de ordem política,
22
O fato de penetrar a estrutura do poder,
compreender suas dinâmicas visíveis e invisíveis,
identificar e analisar nossos problemas e ser
capazes de definir e contribuir para suas
soluções, são sinais de que as relações de poder
estão mudando. Precisamos orientar , de
maneira coordenada com o Estado e os
organismos internacionais, os esforços de
prevenção do alastramento do HIV/Aids,
reconhecendo os gays e outros HSH como sendo
uma população prioritária. Temos que derrotar
o estigma e a discriminação. Para todo isso,
precisamos fazer advocacy, ou seja, desenvolver
estratégias integrais de incidência sistemática em
questões políticas relevantes, construindo
relações democráticas de poder entre o Estado
e as comunidades GLTB. Em um processo de
acumulação.
Aproximações conceituais
Existem várias definições do tema de advocacy,
ou aproximações conceituais ao mesmo. Por
exemplo, em relação à problemática do HIV/
Aids, membros do ASICAL e outras organizações
que trabalham com HIV/Aids, reunidos em 8 de
junho do 2001, construíram coletivamente a
seguinte definição*:
*É uma estratégia que nos aponta
caminhos e metodologias para, a partir da
sociedade civil,- incidir nas decisões dos
tomadores de decisões em diferentes
níveis, visando obter mudanças e/ou o
cumprimento das conquistas alcançadas e
das políticas e programas existentes que
contribuem para o bem-estar coletivo.
Trata-se de um processo de incidir
sistematicamente, que utiliza diferentes
ferramentas para promover, defender,
administrar, modificar, negociar, fazer
lobby, agendar e influir em assuntos de
nosso interesse; sem excluir a
possibilidade de recorrer à mobilização
social quando assim for necessário ou
conveniente.
Advocacy envolve:
Através de um conjunto de ações
planejadas, devemos abrir canais de
interlocução com as instâncias de poder.
Isso exige que fortaleçamos nossas
próprias organizações, procuremos
acordos e construamos alianças em torno
de objetivos claros e causas sociais dentro
da missão que almejamos, fundamentada
nos avanços obtidos no âmbito dos
direitos humanos e na necessidade de
articular esforços para diminuir o impacto
negativo causado pelo HIV.
Ao longo deste módulo, pretendemos explicar
em detalhe esta definição, a fim de pôr esta
poderosa ferramenta a serviço de nossos
interesses.
23
-
identificar um problema e as alternativas para
sua solução;
-
conhecer em profundidade o problema e o
processo de tomada de decisões em torno
do mesmo;
-
compreender o conjunto de atores envolvidos
no processo de tomada de decisões e as
relações entre os mesmos;
-
realizar ações de defesa e promoção visando
influenciar no processo de tomada de
decisões, exercendo uma liderança
reconhecida em torno de uma causa;
-
elaborar estratégias de comunicação que
conquistem os tomadores de decisão em
relação à nossa causa e nos permitam nos
relacionar com nossos aliados, enfraquecer
nossos adversários e influir na opinião
pública em geral;
-
gerar apoios e alianças;
-
contestar as ações e o discurso articulado pela
oposição;
-
mobilizar recursos e forças necessárias para
apoiar determinada causa.
Advocacy serve para:
-
apoiar uma causa a fim de produzir uma
mudança desejada;
-
influir nos tomadores de decisões para obter
um resultado esperado;
-
aprender a dar forma a nossos pontos de vista
e expô-los de modo que possam ser
claramente compreendidos;
-
fortalecer nossa auto-estima,
-
fazer com que sejamos ouvidos e atrair a
atenção para uma causa, encaminhando para
solução a quem toma decisões;
-
obter mudanças favoráveis a nossa causa nas
atitudes e opiniões das pessoas;
-
aumentar o poder das pessoas e dos grupos,
lhes proporcionando as ferramentas
necessárias para que pressionem as
instituições para que respondam às
necessidades humanas coletivas;
-
construir consenso sobre determinado tema
e formar alianças;
-
enfraquecer o discurso de oposição em
relação à nossa causa;
-
exercer a cidadania e, portanto, fortalecer a
democracia como sistema;
-
contribuir para a melhoria da qualidade de
vida.
Como surge
advocacy?
Entre ações e estratégias
É preciso diferenciar entre o que são ações de
advocacy e o que são estratégias. As ações são
atividades que realizamos no decorrer dos fatos
em que estamos envolvidos, em resposta às
oportunidades que nos oferece a própria
conjuntura histórica, social, política, econômica
ou cultural. Para cada pergunta, uma resposta.
Não é sensato perder uma oportunidade.
As estratégias, por outro lado, remetem-se ao
planejamento cuidadoso de atividades que
procuram a consecução de objetivos concretos,
realistas e viáveis, que são como passos graduais
de curto prazo visando alcançar progressivamente uma mudança essencial no longo
prazo. O desenvolvimento de uma estratégia
exige que atuemos seguindo uma seqüência
lógica e com um alto grau de maturidade quanto
à sistematicidade de nossas intervenções e ao
seguimento do processo escolhido. Requer
tempo, dedicação, conhecimento e
representatividade; precisa de continuidade,
seguimento e alguma ou muita paixão para obter
nossos objetivos imediatos no caminho de
soluções de amplo alcance.
Ao pensar uma estratégia de advocacy, devemos
tomar em conta os seguintes fatores:
24
• Se partirmos do reconhecimento de que para exercer
nossos direitos também há obrigações a cumprir, é
importante, como um ato de cidadania, participar dos
processos de tomada de decisões que afetam nossas vidas.
Isso amplia nossas opções para encontrar as ações que
precisamos desenvolver no que diz respeito à luta contra
o HIV/Aids, uma vez que aumenta nossa aptidão para
definir problemas e soluções, e participar ativamente nos
âmbitos político e social.
• Na negociação se dá e se recebe. É necessário
saber de antemão o que se pode e o que não
se pode ceder depois de uma análise dos vários
cenários. Conhecendo os limites do “não
negociável”, às vezes deve-se avaliar a
possibilidade de reduzir a demanda antes de
correr o risco de perder todas as oportunidades
de obter uma vantagem política.
• O consenso é uma das peças
fundamentais da advocacy.
• As outras pessoas com as quais
temos que lidar neste tipo de
processo não são “inimigos” por
definição, são pessoas que estão em
outro lugar, que atuam a partir de
uma posição diferente.
• Advocacy é o desenvolvimento de
uma vontade política que procura
pautar os temas que nos interessam,
bem como levar os formuladores e
operadores políticos a se
preocuparem com eles. Visto que
a abertura democrática permite à
sociedade civil operar no terreno
político, trata-se (quando as
circunstâncias sejam favoráveis) de
modificar a posição de protesto e
confrontação tradicional por uma
postura que nos permita nos
relacionarmos com o Estado para a
discussão dos nossos problemas.
• Negociar implica em sermos reconhecidos pela outra
parte como interlocutores válidos. Implica em
visibilidade, solidez e poder. Os grupos sem poder
não podem relacionar-se diretamente com a elite
política. A fonte de poder resta na quantidade de
pessoas envolvidas no processo, a capacidade de
mobilização para a ação, a quantidade e qualidade
de documentação sobre o tema e a capacidade de
fazer bom uso dessa informação, a quantidade de
dinheiro e recursos e a possibilidade de manter-se ao
longo do tempo, de persistir, de ser. Nesses termos,
estamos construindo a possibilidade de um diálogo
real, com uma lógica de diálogo pautada na
autonomia.
Lições aprendidas
Por último, é importante ressaltar uma série de lições que as organizações membros da ASICAL
aprenderam no decorrer da última década. “As respostas mais criativas e enérgicas em relação ao HIV
vêm diretamente das comunidades mais afetadas” sustentava Piot em novembro do 2000.
É bom tomar em conta a voz da experiência. Cada sucesso e cada fracasso têm um valor cada vez
maior na medida que nos permitem afinar nossos instrumentos teórico-conceituais e práticos para
seguir adiante fortalecidos.
-
A união faz a força e o trabalho conjunto é possível. Vários atores juntos buscando um objetivo
comum têm maiores possibilidades de sucesso.
-
O manejo de conflitos é uma arte que devemos aperfeiçoar.
-
Sem capacidade técnica no encaminhamento das propostas, perdemos liderança, credibilidade e
possibilidade de interlocução.
-
A investigação qualitativa é muito importante, porém deve ser sempre complementada com dados
quantitativos para que tenha maior impacto.
-
Não se deve fazer generalizações quanto aos atores. Por exemplo, em relação aos gays e outros
HSH na luta contra o HIV/Aids, a Igreja não é uma instância monolítica de oposição. É preciso
aprender a olhar dentro das estruturas e capitalizar qualquer fresta de abertura que possa significar
um apoio.
-
É preciso procurar atores-chave favoráveis a nossa causa dentro dos sistemas formais onde se tomam
as decisões. Podem abrir caminhos para nossas iniciativas.
-
Devemos aprender a ser flexíveis, encontrar soluções aceitáveis para todos os envolvidos.
-
Contar com o apoio social da população com a qual se está trabalhando é a única maneira de
legitimar nossas demandas.
-
A paciência é uma qualidade que temos que cultivar. As negociações com as autoridades, de
modo geral, são lentas.
25
Como surge
advocacy?
-
Pode-se chamar a atenção dos Programas Nacionais de DST/Aids e das autoridades com poder de
decisão dos Ministérios de Saúde sobre a situação dos gays e outros homens que fazem sexo com
homens no que diz respeito ao HIV/Aids, através de ações sustentadas, não de confronto e sim de
negociação e de alianças.
-
O trabalho com o Estado é inevitável e possível, sem perder a capacidade crítica e a autonomia.
Através dele, pode-se obter muito mais do que sem ele no desenvolvimento de políticas e programas
favoráveis para o trabalho em Aids.
-
A sociedade civil organizada e dentro dela, as organizações de gays, homossexuais, transgêneros e
bissexuais, é capaz de gerar mudanças fundamentais.
Uma última reflexão é trazida pelo
Grupo Dignidade: “para fazer
prevenção com populações
vulneráveis, não basta falar só de
prevenção. É necessário trabalhar a
auto-estima e promover a cidadania
dos gays e os outros HSH. Estas ações
não podem dissociar-se da
prevenção”.
26
Desenvolvimento de uma
estratégia de advocacy
capítulo 3
27
Desenvolvimento
de uma
Do
problema à solução
Estratégia de Advocacy
Olhando rápida e parcialmente para os fatores
do contexto sexual que influem na epidemia do
HIV/Aids no âmbito dos gays e outros homens
que fazem sexo como homens (HSH), observase um mosaico muito complexo de situações que
exigem intervenções múltiplas de toda natureza.
Sem perder de vista a conjuntura, devemos ser
capazes de enfocar questões nas quais podemos
atuar para efetuar mudanças em benefício dos
gays e outros HSH frente ao HIV/Aids.
Um enfoque coerente e compreensivo na área
da prevenção pode alcançar uma redução
significativa da transmissão do HIV. Estamos nos
referindo a programas de informação, educação
e comunicação; acesso a aconselhamento e
testagem anônimo, confidencial e voluntário;
sangue seguro; o acesso e o uso de preservativos
e lubrificantes; tratamento de DST em homens e
mulheres jovens, assim como nos profissionais
do sexo masculinos e femininos; articulação de
serviços e programas específicos que permitam
o acesso de gays e outros HSH, e dos usuários
de drogas injetáveis, meninos e meninas de rua
e jovens de ambos os sexos explorados
sexualmente, ou que estejam atuando
voluntariamente como profissionais do sexo...
Definição de termos
Há muitas ações que dependem de nós, porém
há muitas outras que dependem de autoridades
municipais, estaduais, regionais, nacionais e/ou
internacionais. Portanto, a decisão não está em
nossas mãos. Quando queremos garantir que
28
as instâncias oficiais tomem a decisão que mais
convém a nossos interesses, ou quando
queremos que modifiquem uma lei ou um
programa que já existe, ou quando mecanismos
operacionais para que funcione adequadamente
uma lei ou um programa, então podemos
recorrer a estratégias ou ações de advocacy para
influir em uma destas áreas.
comuns como as estratégias de IEC (informação,
educação e comunicação), relações públicas,
mobilização comunitária, marketing social, etc.
É importante entender as diferenças para poder
atuar com a maior precisão possível, a fim de
obter o sucesso desejado. No quadro a seguir,
podemos observar as diferenças básicas com
relação aos objetivos de cada estratégia, e com
relação a quem está sendo pressionado.
Freqüentemente se confunde “advocacy” com
outros conceitos que compartilham elementos
Advocacy e conceitos relacionados
Enfoque
Atores/as
Organizações
Públicos-alvo
•Informação
•Educação
•Comunicação
(IEC)
•Prestadores de
serviços
•Organizações
governamentais e
não governamentais
•Redes
•Indivíduos
•Segmentos
populacionais
(mulheres,
homossexuais, gays,
HSH, jovens, etc.)
•Relações
públicas
•Instituições públicas
e privadas
•Mobilização
comunitária
•Advocacy
Objetivo
Estratégias
Medição do
sucesso
•Conscientizar
•Informar
•Educar
•Buscar uma
mudança de
comportamento
•Classificar por público
•Campanhas de
comunicação de massa
•Maior alcance
comunitário
•Meios de comunicação
tradicionais
•Mudança de
conhecimento ou de
habilidades
•Mudança de
comportamento
•Indicadores de processo
•Grupos focais
•Públicos internos e
externos das
instituições
•Projetar imagem
•Posicionar a
instituição
•Publicidade de grande
escala em meios de
comunicação social
•Eventos públicos
•Divulgar a “qualidade”
•Marketing social
•Sistema de
comunicação interna
•Percepção pública
•Nível de comunicação
interna
•Organizações e
membros
comunitários
•Comunidade
•Criar capacidade em
uma comunidade para
priorizar necessidades
e realizar ações
•Visitas domiciliares
•Ações comunitárias
•Ações diretas de massa
•Campanhas
•Eventos
•Indicadores de processo e
resultado de uma questão
específica
•Qualidade de participação
•Número, qualidade e
sucessos de ações realizadas
•ONG
•Redes
•Grupos de
interesses especiais
•Associações de
classe
•Formuladores de
políticas públicas
•Tomadores de
decisão
•Criação e mudança
de políticas,
programas, destinação
de recursos
•Garantir sua
implementação
•Estratégias de Advocacy
•Política/programa criado
ou modificado
•Funcionamento adequado
da política/programa
Segundo o Ministro da Saúde da Tailândia (2002)
- país onde a tendência da epidemia do HIV/
Aids se inverteu - embora não haja uma vacina
que nos proteja do HIV, temos uma “vacina social” que consiste em “aumentar a consciência e
promover a tolerância e a solidariedade para
com as pessoas vivendo com HIV/Aids,
promover a segurança quando se trata de sexo,
utilizando o preservativo em todas as atividades
sexuais de risco, proporcionar educação sexual
e treinamento em habilidades que são essenciais
para os jovens...”.
Preparando o terreno
A problemática do HIV/Aids em gays e outros
HSH apresenta uma infinidade de aspectos,
impossível de resolver como um todo de maneira
imediata.
No que precisamos pensar ao desenvolver uma
estratégia de advocacy ?
• O ponto de partida é a detecção de um
problema que pode se transformar em um
caso de advocacy.
• A coleta de informação em torno do mesmo
é de vital importância para conhecê-lo a
fundo e compreender todas suas dimensões.
29
Somente assim poderemos analisar
alternativas de soluções e finalmente optar
por uma meta de advocacy cuja consecução
signifique um passo rumo à solução do
problema.
• É necessário investigar a estrutura da instância
que toma decisões e seu funcionamento:
hierarquias, protocolos, planos, mecanismos,
procedimentos,
regras
do
jogo,
cronogramas... Este conhecimento nos
permitirá identificar com precisão aonde
pressionar na estrutura institucional, como
intervir no processo de tomada de decisões,
que tipo de pressão serve para que tipo de
personagem em determinado momento.
• Precisamos construir credibilidade. Isto
significa que outras pessoas, tanto os gestores
de políticas como a comunidade afetada pela
demanda em questão, confiem e valorizam
realização de
avaliações e
seguimento
elaboração de um
plano de trabalho
busca de
financiamento
elaboração de
estratégias de
comunicação
o que temos a dizer. Para isso, é
imprescindível fortalecer a organização e a
legitimidade do grupo de pressão.
• É altamente recomendável a construção de
alianças e a identificação de opositores.
• As mensagens devem ser construídas em tempos e espaços adequados, com formatos e
conteúdos específicos, para destinatários
precisos em cada caso, como parte de uma
estratégia de comunicação cuidadosamente
planejada em função da estratégia de advocacy. A participação da comunidade nas
respostas, incluindo as pessoas vivendo com
HIV, é um princípio a ser tomado em conta a
fim de que a estratégia seja bem sucedida.
Ao responder à pergunta acima, encontramos os
elementos essenciais de uma estratégia de advocacy:
identificação
do problema
coleta de
informação
Estratégia de
advocacy
identificação
formação de
alianças e
de alianças opositores
discussão de
alternativas de
solução
definição de
objetivos
identificação de
públicos-alvo
Desenvolvimento de uma
estratégia de advocacy
Por onde começar?
A seqüência da realização destas atividades dependerá em grande parte das lógicas que os próprios
problemas nos apontam com relação aos pressupostos referentes ao desenvolvimento de qualquer tipo
de planejamento. Aqui não há receitas prontas, o trabalho se faz a partir de estruturas que variam de
lugar para lugar e que por sua vez, e com o passar do tempo, são dinâmicas. Por isso, as propostas de
trabalho devem ajustar-se às condições existentes na estrutura ao nosso redor, nesse momento, nessa
conjuntura política, nesse lugar.
Antes de iniciar uma estratégia de advocacy, convém perguntar-se em temos gerais:
por que consideramos que se trata de uma estratégia de advocacy?
O que queremos obter, quais resultados desejamos obter?
Com que legitimidade contamos em relação ao tema e à área em questão?
Como garantimos nossa legitimidade?
Como faremos uma prestação de contas sustentada e transparente de nossas ações?
Quais ações propomos para influir politicamente?
Estamos cientes das atividades nas quais implicam estas ações?
De onde partimos em termos de discurso?
Como percebemos o alcance de nossa postura?
Contamos com formas de transmissão eficaz de nosso discurso?
Se estamos falando de “nós”, convém entender que embora uma estratégia de advocacy possa ser
desenvolvida por uma pessoa, normalmente é assumida por um grupo de pessoas ou por redes ou
parcerias que lhe dão major força e mais presença frente a seus interlocutores no poder. As organizações
membros da ASICAL e outras afins assumiram a liderança na obtenção de conquistas no terreno dos
30
direitos humanos e da prevenção e tratamento
do HIV em gays e outros HSH. Cada uma o fez
em sua própria conjuntura política, social e cultural. ASICAL e outras redes cumprem estas
funções em níveis regionais ou continentais.
As características do estigma e da discriminação
contra o sexo entre homens variam conforme o
lugar. Entretanto, fica universalmente claro que
os programas eficientes de HIV/Aids dirigidos a
gays e outros HSH são de vital importância em
qualquer lugar, apesar de serem gravemente
negligenciados com freqüência. O “nós” que
enfrenta este desafio deve construir-se
solidamente com vistas à sustentabilidade pelo
tempo necessário para sua tarefa cidadã em
defesa dos direitos, da saúde, da vida.
É por isso, que as equipes humanas de advocacy nesta matéria devem definir claramente sua
organização e seu funcionamento como equipe
dentro de uma perspectiva harmônica e integral.
Trata-se da soma de talentos e habilidades onde
os valores hierárquicos perdem sentido, visto que
cada pessoa - de acordo com sua própria
especificidade - é necessária no conjunto, sendo
peças sem as quais a engrenagem não avança.
Precisamos de um “nós” forte
Sobretudo, especialmente em um processo de
grande envergadura, é indispensável
compreender que todos os participantes, além
de suas contribuições particulares para as
estratégias, requerem capacitação e processos
de qualificação de suas ações. Nesse sentido, a
formação pessoal, a leitura e discussão coletiva
sobre os temas de que tratamos e nos quais
queremos influir, bem como a capacitação
sistemática, devem se transformar se em práticas
cotidianas de quem está na luta.
Uma estratégia de advocacy requer habilidades
em diversas técnicas como:
-
pesquisa e planejamento estratégico;
-
coleta, análise e uso apropriado de dados;
-
análise e definição de causas, problemas e
objetivos;
-
negociação, lobby e advocacia;
-
facilitação e dinâmica de grupos;
-
formação de redes de apoio; e
-
o desenho de estratégias de comunicação
• uso do discurso em diferentes cenários
• uso efetivo dos meios de comunicação.
Por outro lado, devemos entender que não se
trata de um planejamento onde os objetivos,
atividades e avaliação se apresentam como um
modelo fácil e lógico.
Quando reivindicamos visibilidade e
esclarecimento sobre a epidemia do HIV como
uma maneira de reduzir o estigma e a vergonha,
ou quando procuramos concentrar esforços
especificamente naqueles que são mais
vulneráveis à infecção, ou quando exigimos
ações tanto de prevenção como de tratamento;
estamos lidando com valores e visões da
conjuntura social muito diferentes dos
convencionais. São por definição controversas.
Isso implica em saber atuar de maneira muito
flexível, fazendo um seguimento sigiloso das
atividades programadas e uma avaliação de
processo que sugira permanentemente os ajustes
necessários.
• estruturação de mensagens
Por exemplo, entre os passos essenciais que
devem ser tomados para lidar efetivamente com
a transmissão do HIV entre pessoas nascidas
homens, é que os líderes políticos e atores-chave
aceitem que o sexo entre homens existe e que é
relevante para o trabalho de prevenção, apoio e
atenção em Aids. Sabemos que na teoria é fácil
dizer isso, mas também sabemos o quão difícil
é consegui-lo na prática. Portanto, preparar o
terreno é essencial para lançar propostas nesta
direção.
• desenvolvimento de materiais de
comunicação
Sem dúvida, este tipo de atividade toma tempo
e esforço. Para nós ativistas custa parar no
• construção sólida de argumentos
31
caminho para discutir uma visão de conjunto
em torno de uma estratégia de advocacy, fazer
análise de contexto, ordenar nossas idéias e
ações de advocacy, de sensibilização, de
promoção e defesa. Evidentemente nos custa,
mas fazê-lo nos fortalece, nos permite enxergar
com ordem e coerência as causas pelas quais
lutamos e portanto, nos consolida como grupo
de referência social nos temas que abrangemos.
São investimentos que valem a pena.
O planejamento de uma estratégia de
advocacy deve reconhecer
agendas ocultas,
informações imperfeitas,
valores,
ideologias e
conflitos
que trazem inúmeras dificuldades para
o processo.
Desenvolvimento de uma
estratégia de advocacy
Um exemplo:
Desarticulando uma lei chilena homofóbica
Um outro ponto é que não é necessário confundir a instituição em si com a forma de nos organizarmos para fazer advocacy, a não ser que sejamos uma
instituição que tenha esse fim exclusivo. Por exemplo, o Movimento Unificado de Minorias Sexuais (MUMS) define-se desde sua origem em 1991
como uma organização que “se propôs a gerar uma visão distinta da sexualidade no Chile, passando pela revisão de mitos, tabus e desconhecimentos
sobre sexualidade presente neste país”. Fixou seus objetivos na reivindicação e exercício dos direitos civis das pessoas homo e bissexuais, a promoção
de um conceito amplo e integrativo da sexualidade humana e a criação de espaços de apoio e integração para quem se sinta vivendo com uma
orientação sexual diferente da heterossexual. A partir dessa perspectiva, assumiu como uma de suas tarefas principais exigir do Estado a modificação
do artigo 365 do Código Penal que castigava com prisão as relações sexuais consentidas entre homens adultos.
Este é claramente um problema de advocacy porque a única instância que pode decidir sobre a modificação de uma lei é o parlamento. A decisão
escapava das mãos do MUMS. Por isso, liderou um movimento destinado a incidir politicamente no parlamento chileno a fim de que se modificasse
o referido artigo. Era indispensável acabar com a perseguição e penalização da homossexualidade para poder desenvolver respostas efetivas frente à
epidemia do HIV/Aids, que afeta de maneira especial os gays e outros homens que fazem sexo com homens.
Com este compromisso específico, o MUMS desenvolveu uma estratégia de advocacy. O Movimento se organizou inteiramente em torno da estratégia
pela descriminalização, formando equipes técnicas de comunicação, estudos, direitos humanos, prevenção e outros, as quais atuam no desenvolvimento
de linhas de ação, de sensibilização social, de mobilização, de denúncia e de solidariedade internacional.
Foi bem-sucedido, conseguiu obter dos parlamentares a modificação da lei, não se penalizam mais as relações sexuais consentidas entre homens
maiores de idade. Além disso, no caminho, conseguiu muitas outras coisas. Rompeu os esquemas de um sistema judicial profundamente tradicional
e conservador de um país que apenas seguiu rumo à democracia depois de viver um dos infernos ditatoriais mais inescrupulosos do continente;
permitiu a que a população GLTB se saísse publicamente como atora social e política; os homossexuais tomaram o cenário público com voz e
reivindicações próprias e as incluíram na agenda das políticas públicas. Agora sim, as condições estavam dadas para exigir do Estado o direito a
serviços de prevenção e atenção adequados e dirigidos à população de gays e outros homens que fazem sexo com homens, eliminando os elementos
homofóbicos e discriminatórios que os caracterizavam. “Enquanto os cães ladram, a caravana passa.”
32
Roda de Planejamento e
Ações de Advocacy
Fonte: Baseado em Millen 2000
Visão
de uma
Sociedade
sem o
Problema
Avaliação
e
Ajustes
Análise
Geral
do
Contexto
Definição e
Análise
do Problema
Levantamento do
Problema
Implementação
a
ni
da
da
De
problemas a
temas
Advocacy
Organização
Desenvolvimento
de Estratégias
de
Comunicação
Análise de
nossa força
interna
33
Ci
Revisão de
Objetivos e
Estratégias
i se
l
á
An
ca
ír t i
C
Análise
do Poder
de
Atores e
Públicos
Análise do
Sistema
Legal e Político
e Objetivos
Mapeamento
de
Possíveis
Estratégias
Desenvolvimento de uma
estratégia de advocacy
34
Do problema à solução
capítulo 4
35
Do problema à solução
O impacto do HIV/Aids em gays, transgêneros e
outros HSH gerou inúmeros problemas que
precisam de atenção, mas nem todos são
merecedores de intervenção política, só aqueles
que requerem decisões que não estão em nossas
mãos
É necessário definir os problemas em termos
administráveis. Ou seja, se nos referirmos à
discriminação por orientação sexual presente nos
âmbitos público e privado da América Latina,
seria impossível expor uma só ação que pudesse
resolver o problema, como também seria
impossível identificar um só responsável pela
situação problema. Este é um tema geral de
política, uma área programática na qual se
poderia enfocar uma estratégia de intervenção
política a partir da definição de um assunto
específico, a solução do qual possa contribuir
para a solução global.
A somatória das pequenas conquistas está
construindo nos mais diversos cenários mudanças
transcendentais em relação à inversão da escala
de valores patriarcais e conservadores. Não
esqueçamos que estas ações - por mais locais e
pontuais que sejam - têm efeitos sinérgicos. É assim
que se está produzindo a mudança, é a única
maneira desta mudança ser real. A sociedade
requer tempo para desfazer seus rumos,
desaprender conceitos e valores que internalizou
durante séculos, desconstruir os códigos de
comportamento resultantes dessa visão do
universo.
Isso requer tempo, profunda reflexão; não é só
readequar esquemas mentais como também ajustálos à sua forma de viver e se relacionar com os
outros cotidianamente.
Por exemplo, se ao revisar o anteprojeto de Lei da Administração Pública da Bolívia, detectamos
um espírito discriminatório em termos de orientação sexual, podemos montar uma estratégia
de intervenção política para mudar o anteprojeto e fazer passar no Congresso uma lei que
respeite a igualdade de direitos de cidadania de todos os homens e mulheres no âmbito da
administração pública, seja qual for sua orientação sexual. Conseguir isso não soluciona o
problema, mas contribui – por menor que seja a contribuição - para diminuir este tipo de
discriminação na América Latina.
Quem quer arrumar tudo de uma vez, corre o risco de não mudar nada no final.
36
“Na região inteira, os HSH continuam
sendo um grupo muito afetado pelo HIV.
Contudo, existe uma grande
desproporção entre a forma como estes
homens são afetados pela epidemia e a
extraordinária falta de programas para esta
população.”
Peter Piot, Querétaro, 28 de outubro de 1998
Definir o problema:
uma tarefa
fundamental
Como negar que a alta soroprevalência e incidência
de HIV entre os homens que fazem sexo com
homens na América Latina é um problema? É obvio
que é. Há partes da América Latina onde o sexo
entre homens é a via principal de transmissão do
HIV, sendo responsável por em torno de 70% dos
casos. Não podemos tapar o sol com a peneira,
ainda mais sabendo que certamente o tamanho
provável do fenômeno do sexo entre homens
sempre foi subestimado pela obscurantismo de
inúmeros
governos,
organismos
não
governamentais e setores privados que se negam a
aceitar sua existência e tomá-la plenamente em
conta na tarefa de prevenir a Aids. A atitude
prevalecente de insistir que “estas coisas não
existem ou quase não existem” em nossa sociedade
é errônea e até perigosa, porque pode nos levar a
não cuidar de uma parte significativa, embora seja
relativamente pequena (em nível mundial), da
epidemia total. (Melhores Práticas. Pontos de Vista.
UNAIDS, 1998)
Os companheiros da
Sociedad de Integración
Gay Lésbica Argentina
(SIGLA) conseguiram
abordar esta perspectiva
do problema atuando em
relação às políticas
argentinas de HIV/Aids.
Pela primeira vez nesse
país, o Ministério de
Saúde abordou esta
problemática de modo
integral no Plano
Estratégico de HIV/Aids e
DST para 2000-2003.
Entretanto, não
mencionou
explicitamente o
componente HSH, salvo
uma referência aos
“grupos de risco e
populações vulneráveis”.
Então, voltando para a necessidade de definir os
problemas em termos administráveis, o desafio está
em transformar este problema em uma causa de
intervenção política. Definido da forma como está,
não nos permite definir o que fazer, como atacálo.
estendeu desde o começo
da epidemia até o início
de 2002, quando se
redigiu o Projeto País para
o Fundo Global de Aids,
Tuberculose e Malária”.
Procurou então alterar a
política pública de HIV
que ignorava a população
HSH nos fatos e
documentos. Em
primeiro lugar,
concentrou-se no Projeto
País até conseguir que a
responsável por Aids do
governo Duhalde se
comprometesse a incluilo no documento. Do
mesmo modo, identificou
a necessidade de
conseguir políticas de
prevenção comuns
explicitando o
componente HSH entre
os dois Buenos Aires onde
se registram 20.000 casos
de Aids e as 23 províncias
restantes onde há mais
6.000. Estes são dados
SIGLA analisou esta
lacuna como “a
continuidade e
culminação de um
silêncio oficial sobre este
componente que se
37
precisos que permitem
avançar passo a passo
rumo à solução do
problema.
Uma vez definido o
problema, deve-se
identificar as barreiras
políticas e as
oportunidades existentes
para abordá-lo de acordo
com nossos interesses de
solução. Por exemplo, os
interesses de SIGLA estão
expressados em sua visão
que busca “a
normalização da
homossexualidade” e sua
missão que busca “obter a
dignificação e o
melhoramento das
histórias de vida das
pessoas homossexuais no
sentido amplo... a
ampliação da cidadania
para incluir aqueles que
hoje são excluídos”.
SIGLA teve que enfrentar
como barreira o estigma e
o preconceito antihomossexual “muito mais
forte no interior do país,
para poder trabalhar
intensamente a prevenção
com HSH”. Mas também
existiam oportunidades:
desde 1993, por lei
nacional, o Ministério de
Saúde Nacional ficou
obrigado a fornecer
medicamentos a todas as
províncias e o que hoje é
a Cidade Autônoma de
Buenos Aires. Além
disso, foi possível recorrer
ao Projeto ACAT para que
apoiasse a realização de
uma reunião com
autoridades das
províncias com o objetivo
de efetuar um diagnóstico
de situação e respostas
que ao mesmo tempo
consolidasse uma frente
única diante do problema
da prevenção na
população HSH.
Do problema à solução
Coleta de informação
Não se pode esquecer que o que estamos
fazendo é promover mudanças dentro de um
sistema. Isso exige conhecimento das bases do
sistema que é precisa mudar, bem como as
interações entre esse sistema e outras forças da
conjuntura política.
Quanto melhor
compreendamos a conjuntura política em que
estamos inseridos, quanto mais fácil será avaliar
o risco de incidir politicamente em relação a essa
causa nesse momento, e quanto mais subsídios
teremos para não cometer erros que poderiam
prejudicar nossa causa ou o grupo de pressão e
pessoas envolvidas.
Existem diversas maneiras de compilar a
informação necessária para uma estratégia de
intervenção política. No caso da intervenção
política de redes estáveis em torno de
determinadas temáticas, trata-se de um processo
de acumulação importante que deve ser
adequadamente registrado. Como (a luta)
resposta pela prevenção e o tratamento do HIV/
Aids é uma ação de grande envergadura, é
importante conhecer e aprender das experiências
tidas até o momento e dar continuidade às linhas
de êxito.
Quando falamos de acumulação, referimo-nos
à necessidade de atualizar sistematicamente
nossa base de dados e nossa rede de contatos e
pontos de coordenação. É preciso articular cada
nova ação com os passos já tomados, não só em
termos de seus resultados.
A pesquisa e o mapeamento político são
ferramentas que progressivamente fornecem
dados para o movimento. A observação; o
registro de bate-papos, discursos, documentos
escritos por pessoas-chave; reuniões e
monitoramento sistemático da imprensa escrita,
oral e televisiva são elementos vitais para a coleta
de informação. Entrevistas com informanteschave, estudos de opinião e grupos focais
também são recursos úteis para conhecer melhor
o tema com que trabalhamos e o que a
coletividade pensa a respeito.
A informação é o resultado da organização,
processamento e interpretação dos dados de
tal maneira que são postos dentro de um
contexto, tendências ou áreas problemáticas
são identificadas e assim os dados são
transformados em conhecimentos que
possam ser úteis para as pessoas
responsáveis por tomar decisões.
Os dados são números sem
processamento ou outros
achados que por si só têm
apenas um valor limitado para
quem toma decisões.
38
Na realidade, é uma questão de não
ficar reinventando a roda cada vez
que enfrentamos uma situação
pontual ou lutar por uma nova
conquista neste terreno.
Ao desenvolver uma estratégia de advocacy,
devemos procurar registrar os fatos na forma
de dados, converter estes em informação e
assim conseguir aumentar nosso
conhecimento sobre o tema ou assunto do
qual estamos tratando. Este conhecimento
será a base para a formulação de um plano
que conduza as ações e nos permita incidir
– com respaldo – na modificação dos fatos.
Devemos entender com muita clareza que não
se trata só de ter a capacidade de conseguir a
informação, de contar com os dados. Este é
apenas o primeiro passo.
É imperativo saber usar a
informação.
A informação tem que ser útil para nossos fins.
Deve guiar nossos planos de ação, orientar a
oportunidade e a sensatez de nossas colocações
e oferecer o conteúdo básico de nossas
mensagens e os elementos de seu desenho. Ou
seja, a informação obtida nos proverá o fio
condutor da estratégia de comunicação que
necessitamos para levar adiante nosso
compromisso. A permanente atualização dos
dados é uma condição sine qua non para o
desenvolvimento sólido de uma estratégia de
intervenção política.
Os resultados das investigações são essenciais
para tomar decisões informadas a respeito do
ambiente político em que trabalhamos.
Na análise de forças internas e externas da
conjuntura, é útil sempre começar “olhando para
dentro”, ou seja, fazer uma auto-avaliação de
nossa própria organização, para logo “olhar para
fora” em uma análise de contexto que procure
descrever a situação em nível político,
econômico, social e cultural. Só uma
organização forte que conta com um
reconhecimento visível pode ser interlocutora
válida diante de representantes do poder oficial.
À luz dos dois tipos de análise, deveremos
estudar nossa possibilidade de participar das
diferentes fases do processo de formulação das
políticas:
Também é necessário refletir sobre as seguintes
perguntas:
Fase 1
definição da agenda
-
Quais aspectos controversos possui o tema
que abordamos e quem representa qual
corrente?
Fase 2
priorização dos problemas
-
Quais assuntos ou pessoas geraram violência
política ou conflito?
Fase 3
formulação da política
-
Quais assuntos ou pessoas tiveram êxito em
ultrapassar limites de gênero, orientação
sexual, étnicos, sociais ou políticos, e gerar
consensos?
Fase 4
implementação da política
-
Como se exerce o poder dentro do sistema
político?
Fase 5
seguimento e avaliação
-
Quais grupos são respeitados e quais não?
Quais são temidos?
39
A informação tem que ser útil
para nossos fins. Deve guiar
nossos planos de ação,
orientar a oportunidade e a
sensatez de nossas colocações
e oferecer o conteúdo básico
de nossas mensagens e os
elementos de seu desenho.
Para influir e modificar
aspectos do processo
político com causa e
conhecimento, é
indispensável contar com
a informação apropriada
no momento apropriado.
Do problema à solução
-
Quais são as formas aceitas de diálogo
político e os protocolos adequados para
aproximar-se e dialogar com os gestores de
políticas?
Discussão de
alternativas de soluções
Características de um objetivo de advocacy:
Devemos analisar alternativas de soluções para
o problema com o qual estamos trabalhando.
Trata-se de ver o problema como tal solucionado,
a situação ideal, uma visão de futuro.
É importante definir esta visão de longo prazo
para que o impacto de nossos ganhos não se
reduza a obter respostas puramente paliativas
que de maneira isolada não estariam
contribuindo para uma mudança substancial. É
justamente dentro desta visão que é preciso
formular o(s) objetivo(s) de uma estratégia de
intervenção política com uma orientação clara
para a solução de fundo. O alcance destes
objetivos depende de quem toma as decisões
nas estruturas formais de poder. Como já
dissemos, se estivesse em nossas mãos,
montaríamos outro tipo de projeto para resolvê-lo.
Que se deseja mudar?
O que se
quer obter?
O alcance dos objetivos que vamos definir
depende de quem toma as decisões nas estruturas
formais de poder. Estes tomadores de decisões
devem ser identificados, inclusive com o nome,
sobrenome e cargo, deixando claro quais ações
se espera que tomem.
-
claro,
específico,
realista,
acessível,
mensurável,
com definição de tempo
voltado para a ação.
Para escolher o objetivo de advocacy, é
imprescindível tomar em consideração:
- o ambiente e clima políticos,
- a possibilidade de êxito,
- a pesquisa realizada,
- os recursos existentes e nossa capacidade
organizativa como grupo impulsor.
Quem fará a mudança?
O objetivo
Em quanto a
situação
mudará?
Quando ocorrerá a mudança?
40
Os objetivos de advocacy
são passos gradativos e
realistas rumo à solução
do problema.
Construindo ambientes e climas
O ambiente político
O clima político
É um conjunto de elementos que cercam a
ação de formular as políticas públicas, é o
cenário geral no qual se movem os atores
do octógono das políticas públicas.
É um conjunto de códigos -explícitos e
implícitos - que determinam as percepções
que os "atores" têm de si mesmos e de suas
ações ou omissões.
identifica-se através de elementos externos
como:
A interação entre atores pode ser entendida:
• Apoio político
• Formulação de políticas
• Organização de programas
• Recursos
• Pesquisa
• Marco jurídico
• Componentes de um programa
• Melhoria do processo de formulação de
políticas
O caminho mais direto para a frustração é fixar
objetivos que não poderemos alcançar. Não
devemos esquecer que atingir o objetivo
proporciona entusiasmo à equipe de pressão,
rede ou parceria. Isso constitui uma importante
experiência de êxito que se traduz em
credibilidade dentro do grupo e frente à
sociedade e, conseqüentemente, fortalece a
organização e a auto-estima coletiva.
41
tanto pelos sinais de caráter político como
pela maneira como se percebem esses sinais
através de declarações, cumprimento de
acordos, expressões, e níveis de diálogo e
coordenação entre outros.
Como podemos contribuir para a melhoria do
ambiente político visando à consecução de
nossos objetivos e penetrar na estrutura de
poder que aparentemente impenetrável?
•aumentando o apoio político para nossa causa
•otimizando a organização dos programas
•garantindo que o orçamento atribuído seja
suficiente
•adequando o marco jurídico
•obtendo a informação necessária para o
tratamento adequado de cada tema específico
Quais esforços devemos fazer para construir
climas políticos os mais favoráveis possíveis a
nossas reivindicações?
Contribuir para uma interação direta e
transparente nas relações humanas e no diálogo,
com base na ética, o respeito mútuo e a
consistência dos espaços previstos de
coordenação. É necessário tentar garantir que
declarações estejam apoiadas em fatos, em
expressões objetivas e que os acordos firmados
sejam cumpridos por todas as partes envolvidas.
No caso de temas tão controversos como os com
os quais lidamos, devemos preparar o terreno
para que nossas estratégias enfrentem o menor
número de obstáculos possível.
Ferramentas
para se pensar
Há inumeráveis instrumentos para nos ajudar a
verificar se nossas estratégias estão bem
encaminhadas. No uso de qualquer um deles,
precisamos ser o mais analítico, crítico,
abrangente e flexível possível em relação ao
nosso objetivo. É uma questão de pensar sobre
Do problema à solução
Uma última consideração
os diversos cenários e a forma como impactam
sobre nossa possibilidade de atingir o objetivo
que temos proposto, a partir da missão e visão
de nossa organização.
A estratégia de advocacy não acaba quando
se alcança o objetivo. Precisamos
desenvolver mecanismos de seguimento a
fim de garantir que todo que conquistamos
se cumpra, se mantenha e funcione
eficientemente de acordo com as normas e/
ou acordos estabelecidos.
Uma das ferramentas metodológicas mais
utilizadas neste tipo de tarefa é o FODA que
permite explicitar as fortalezas (F) e deficiências
(D) que encontramos dentro de nossa
organização. Serve para ordenar esse “olhar para
dentro” ao qual fazíamos referência; para logo
“olhar para fora” para o entorno que nos cerca e
onde devemos identificar as oportunidades (O)
e ameaças (A) que existem em relação a nossos
propósitos. Dependendo do tipo de cruzamento
que fazemos com estas quatro variáveis,
estaríamos fazendo uma análise FODA ou
DOFA. Embora a troca de letras aparentemente
não muda nada, a diferença da comparação de
fatores no resultado da análise é significativa e
nos pode sugerir intervenções de natureza muito
distinta.
F ortalezas
Oportunidades
D eficiências
A meaças
42
O FODA nos convida a pensar
nas fortalezas da organização à
luz das oportunidades oferecidas
pela conjuntura. Desta maneira,
nos leva a pensar como
potencializar nossas fortalezas o
máximo possível, aproveitando
as oportunidades. Contudo, deixa
os pontos negativos (deficiências
internas e ameaças externas)
praticamente de lado. Analisa os
pólos extremos enquanto nossa
possibilidade de sucesso: mostra
de um lado um cenário altamente
positivo, do outro um cenário
extremamente desalentador.
O DOFA compara as
oportunidades externas com
nossas deficiências internas,
incentivando-nos a analisar como
podemos aproveitar as
oportunidades que a conjuntura
nos oferece a fim de amenizar o
impacto negativo que nossas
deficiências podem nos ocasionar.
Por outro lado, nos leva a pensar
como utilizar nossas fortalezas
organizacionais para neutralizar
o impacto das ameaças externas
que podem comprometer o
sucesso de nossas ações.
D eficiências
O portunidades
F ortalezas
A meaças
O PEST é outro instrumento que nos pode
ajudar a fiscalizar as principais tendências do
ambiente político em um dado lugar,
apontando para oportunidades e limitações a
fim de poder escolher um objetivo.
A seleção do objetivo deve estar apoiada em uma
avaliação cuidadosa de como a informação pode
modificar o ambiente ou clima político em apóio
à nossa causa. Ainda com uma boa definição
inicial dos objetivos específicos e sua
aprimoração com instrumentos como o DOFA
ou o PEST, é imprescindível tomar em conta, no
processo de execução, que se pode encontrar
circunstâncias que obriguem a introdução de
mudanças e a adaptação dos objetivos a novas
realidades. Além disso, sendo o manejo dos
temas políticos que abordamos freqüentemente
complexo e difícil para os operadores de políticas
devido à sua natureza dinâmica e inacabada, a
flexibilidade é sempre aconselhável.
TENDÊNCIAS
Político-legais
- Qual é o nível de apoio?,
- por parte de quem?,
- existem políticas?
- Existem mecanismos necessários
para implementar políticas?
- Há barreiras legais ou regulamentares?
Econômicas
- Existem recursos adequados para
pesquisar?,
- Existem programas?
- Existem mecanismos para atribuir
recursos para programas para
atender a nossa demanda?,
- Existe orçamento... doações?
Sociais
Opinião da população.
- Está mudando?
- Quem apóia, quem se opõe?
- Quais eventos recentes apóiam ou
geram rejeição em relação à nossa
demanda?
- Existe algum grupo em especial
afetado por nossa demanda?
Técnicas ou tecnológicas
- Novas tecnologias,
estudos, investigações,
técnicas, tratamentos...
43
LIMITAÇÕES
OPORTUNIDADES
Do problema à solução
imediata. Equidad está começando a romper o cerco do silêncio, pondo na
mesa de discussão a problemática da transmissão sexual do HIV nas relações
entre homens.
No meio do mundo,
aí está o Equador
No Equador, a Fundación Ecuatoriana Equidad lidera processos importantes
na prevenção e tratamento do HIV/Aids entre homens que fazem sexo com
homens. Sua missão é trabalhar pela reinserção da problemática da
homossexualidade e o HIV/Aids nas prioridades políticas, intervenções e
iniciativas de prevenção, assistência e educação nos níveis público, privado
e comunitário do país, no contexto da saúde e dos direitos humanos.
De imediato, propôs a inclusão na agenda do Programa Nacional de Aids/
DST do Ministério da Saúde e do setor não governamental da situação dos
gays e outros HSH com relação ao HIV/Aids, promovendo mudanças nas
prioridades políticas e no desenho dos planos e programas de HIV/Aids para
que tomem em conta uma das populações mais vulneráveis frente à epidemia.
Para conhecer a fundo a situação,
-
Como Equidad define um dos
problemas que enfrenta?
-
realizou uma Análise de Situação e Resposta sobre HIV/Aids e HSH,
mobilizou recursos para obter o apoio do Grupo Temático da UNAIDS
para desenvolver atividades de diagnóstico,
elaborou um mapeamento político para poder localizar os poderes a
favor e contra sua causa,
entrevistou informantes-chave institucionais,
fez inventários de intervenções específicas sobre HIV/Aids e HSH,
revisou a bibliografia e os documentos locais e internacionais sobre o
tema, pesquisou as dimensões possíveis,
analisou a legislação vigente no Equador e na América Latina,
questionou as interpretações epidemiológicas que tendem a distorcer o
estado real da epidemia...
Analisa como as mudanças no discurso oficial sobre a epidemia acabaram
por eliminar os poucos programas de prevenção e apoio dirigidos a gays,
bissexuais, transgêneros e outros HSH. As iniciativas oficiais e não
governamentais no Equador mudaram suas prioridades para o tratamento
da transmissão heterossexual do HIV em razão da progressão do número
de casos na população heterossexual e a preocupação sobre a transmissão
mãe-filho.
-
O novo discurso oficial partia da falsa percepção de que a problemática do
HIV/Aids tinha sido superada pelas populações HSH, sem se dar conta - ou
sem lhes importar - que ao deixá-las completamente desprotegidas frente à
transmissão do HIV, sua vulnerabilidade frente à epidemia aumentava.
Só conhecendo com precisão a realidade é que podemos atuar sobre ela.
Assim entendeu Equidad e seus aliados e é com este arsenal conceitual,
factual e documentário que conseguiram definir com precisão seus objetivos
de intervenção política e desenvolver estratégias que lhes permitiu obter
resultados significativos para sua luta.
A orientação para uma solução de fundo para evitar este tipo de situação
passa sem dúvida pela transformação das bases sociais e culturais que
sustentam a persistente homofobia de formuladores de políticas que
apresentam resistências no reconhecimento público das minorias sexuais.
Dessa maneira, só beneficiam os GBT e outros HSH com serviços de atenção
em DST e HIV/Aids de maneira indireta, sem reconhecer sua especificidade
populacional, nem elaborar políticas claras que a respeitem nem a atendam
como tal. O problema é complexo e não pode ser solucionado de forma
44
-
Incidir sobre quem toma a decisão
capítulo 5
45
Incidir sobre quem
toma a decisão
É preciso identificar os atores que estão
relacionados com nosso objetivo de advocacy e
que têm impacto sobre o mesmo. Uma vez
selecionados o tema e os objetivos da estratégia
de advocacy, os esforços devem ser concentrados
nas pessoas cuja participação é crítica para o
êxito do objetivo em curso.
É importante relembrar que quem toma decisões
sobre políticas são sempre seres humanos com
nome e sobrenome, e não instituições. A partir
desta premissa, interessa-nos trabalhar estratégias
de advocacy voltadas para exercer pressão sobre
estas pessoas a fim de atingir nossos objetivos.
O público primário é definitivamente o
protagonista de nossa estratégia. Estas são as
pessoas que precisamos convencer, é preciso
negociar com elas, delas depende a decisão.
As pessoas que compõem o público secundário
são peças fundamentais no jogo devido à
influência que exercem sobre os tomadores de
decisão. Se conseguirmos convencê-las de que
nossas colocações são justas, podem se tornar
aliadas de primeiríssima importância. Por outro
lado, se exercem uma influência opositora,
poderiam ser obstáculos determinantes para
nosso sucesso.
Os públicos podem estar compostos por homens
e mulheres que são líderes políticos, funcionários
públicos municipais, estaduais ou federais,
prestadores de serviços de saúde dos setores
público e privado, chefias de meios de
comunicação, líderes religiosos, diretores de
ONG.... Trata-se de qualquer pessoa que tenha
poder de decisão em relação ao objetivo que
46
definimos na área de prevenção e atenção de
HIV/Aids, especificamente aqueles programas
dirigidos a gays e outros homens que fazem sexo
com homens.
Como sempre,
os mapas ajudam a situar
No caso de uma estratégia de advocacy, é fundamental saber se relacionar e se comunicar com
aqueles personagens, freqüentemente difíceis,
que ostentam algum tipo de poder. Uma boa
parte da pressão exercida será de maneira direta,
inclusive pessoal. Por isso, precisamos estar
preparados para argumentar nossa proposta da
maneira mais sólida, mais bem informada e
fundamentada possível.
Cada contato que estabelecermos deve estar
cuidadosa e detalhadamente preparado, para
não perder nenhuma oportunidade que possa se
apresentar. Nesse sentido, devemos conhecer
todos os detalhes sobre nossos públicos. Isto nos
permite direcionar nossas atividades de advocacy com maior precisão, desenvolver
mensagens eficazes e utilizar os canais de
comunicação mais apropriados para cada uma
destas pessoas.
O mapeamento político é um instrumento que
nos ajuda a ordenar e registrar as informações
que obtemos de nossos públicos. Disponibiliza
rapidamente informações sobre as relações de
poder econômico e social entre os distintos
atores e nossa causa, facilitando o processo ao
nos apontar a viabilidade política de nossas
Protagonistas de nossa estratégia
O público primário é constituído pelos
atores políticos chaves, encarregados de
tomar a decisão que nos interessa, que
convém - do nosso ponto de vista - à
sociedade. Trata-se de uma ou várias
pessoas cujas visões e decisões afetam a
disponibilidade e atribuição de recursos
para atender a nossa demanda.
O público secundário é composto por
aquelas pessoas que por diferentes
motivos influem diretamente na
percepção do público primário em
relação ao tema em questão e, por
conseguinte, em sua decisão.
ações e os elementos para reconhecer os
parâmetros dentro dos quais devemos
desenvolver nosso trabalho dentro do sistema em
que atuamos.
É aconselhável coletar dados como: nomes;
instituições; pessoas chaves; contatos existentes;
interesses políticos, econômicos e sociais;
posições frente a nossa posição; poder de
influência e impacto; alianças possíveis; etc.
PÚBLICOS
Para abordar uma autoridade, ganhamos muito
tempo e confiança se estamos informados sobre
o quanto e o que ela conhece sobre o tema
específico do qual querermos tratar. Se sabemos
que nosso público conhece bem a problemática
e a natureza das alternativas de soluções que
pretendemos apresentar-lhe, não é preciso iniciar
a conversa com preâmbulos explicativos
detalhados. Inclusive deve-se variar a linguagem,
quem conhece bem o tema, também utiliza bem
Nível de conhecimiento
sobre o tema
PÚBLICO PRIMÁRIO
(nome e cargo)
(nome e cargo)
PÚBLICO SECUNDÁRIO
(nome e cargo)
(nome e cargo)
47
Nível de apoio
prévio demonstrado
Nível de oposição
prévia demonstrada
Incidir sobre quem
toma a decisão
a linguagem. Nestes casos, pode-se expor
diretamente a proposta e aproveitar melhor o
tempo do contato para se aprofundar nos
benefícios que a mesma oferece para a
população afetada.
Por outro lado, se sabemos que vamos lidar com
alguém que conhece apenas superficialmente o
tema específico, seja por falta de tempo,
formação, capacidade ou interesse, temos que
analisar a melhor maneira de chegar utilizando
termos claros, amplos, abundando em
antecedentes e contexto.
Como dissemos anteriormente, conhecer e
entender a atitude da pessoa em relação ao tema
também é vital para definir a forma como vamos
tratar a nossa relação com ela e a abordagem
que faremos do assunto. Pode ajudar esboçar
uma argumentação voltada para a visão da
pessoa, que busque reforçar suas apreciações
positivas, do nosso ponto de vista, e sutilmente
amenizar seus enfoques negativos.
Para isso, devemos estudar cuidadosamente o
nível de apoio ou oposição previamente
demonstrado por estes personagens a respeito
de gays e outros homens que fazem sexo com
homens, bem como sua necessidade de
programas específicos de prevenção e atenção
em HIV/Aids. Será útil também estudar os
benefícios potenciais para o público em questão
que surgiriam ao dar atenção para esta
problemática, em nível do êxito de sua gestão,
do cumprimento de seus objetivos institucionais,
de sua contribuição para a contenção da
epidemia. Inclusive pode-se usar como
argumento o reconhecimento social que o
alcance destes objetivos poderia significar para
este público.
Também devemos responder às
seguintes perguntas:
Também é possível encontrar no caminho
pessoas indecisas, que não têm uma posição
definida sobre nossa reivindicação. A forma de
trabalhar com elas deve ser pontual e
especificamente analisada. É uma questão de
aproveitar todas as aberturas possíveis para ganhar
espaço, usando questões argumentativas,
valorativas, teóricas, ideológicas, procedimentais,
éticas... A força não está em nossas mãos, e sim
em nossas mentes, na capacidade que temos de
ajustar nossa fundamentação, nossa lógica ao
entendimento de quem deve tomar a decisão e à
estrutura de poder que dirige.
- Foram planejadas ou estão sendo
realizadas revisões de algumas
políticas? Que papel nosso
grupo de pressão poderia
desempenhar neste processo?
A informação sobre o nível de conhecimentos, atitudes e práticas que os públicos têm acerca
de nosso objetivo pode ser obtida:
• através de pessoas familiarizadas com estes personagens
• lendo seus discursos
• levantando as declarações que fazem à imprensa
• consultando a documentação relativa ao tema
• revisando os resultados das sondagens de opinião e pesquisa
• estando presente em reuniões públicas, debates, painéis nos quais participam...
48
- Há algum plano de mudança de
pessoal que poderia afetar quem
está encarregado do tema que
nos interessa?
- A quem recorrem os gestores de
políticas para obter conselhos?
Em que fontes de informação
confiam mais?
- Carecem de informação para
tomar boas decisões? De que
maneira podemos ajudá-los?
A vida continua
As opções e possibilidades são múltiplas e variadas. Cada realidade é distinta, cada caso merece
análise específica, cada burocracia tem seus pontos fortes e pontos fracos, cada esquema de poder
responde à sua própria construção, cada tema exige um tratamento especial...
Quando a Liga Colombiana de Lucha contra el SIDA enfrentou a necessidade
de garantir o acesso ao tratamento anti-retroviral (ARV) para as pessoas
vivendo com VIH no início dos anos 90, fez de uma maneira totalmente
diferente de outras organizações situadas em outras realidades. “A vida
continua” foi o lema que impulsionou a organização a lutar pela melhoria
da qualidade e quantidade de vida das pessoas vivendo com HIV/Aids no
marco da defesa de seus direitos humanos. Foi criada com o objetivo de
procurar o acesso ao tratamento ARV para as pessoas vivendo com HIV/
Aids, que em sua maioria eram gays.
A Colômbia, apesar de contar com uma reforma do sistema de saúde em
1991, sob os princípios de eqüidade e universalidade, não disponibilizava
o acesso a medicamentos ARV e/ou tratamento integral para as pessoas
vivendo com HIV/Aids. A Liga decidiu iniciar um programa de acesso através
de doações de medicamentos em nível local, numa parceria envolvendo
usuários, gestores e organizações internacionais. Esbarrou diante de
limitações e, em muitos casos, não conseguiu garantir a continuidade do
tratamento. É importante notar que até este momento os esforços realizados
correspondem a programas institucionais e à busca de respostas,
determinados por decisão própria e realizados com recursos próprios.
Diante do constante aparecimento de novos casos de HIV - os esforços das
ONG cobriam apenas 10% dos casos - ficou cada vez mais difícil atender a
demanda de usuários antigos e novos. Frente a esta situação, a Liga analisou
a conveniência de solicitar às entidades oficiais de saúde a cobertura de
anti-retrovirais, sabendo que estes não faziam parte da relação de
49
medicamentos essenciais e que por isso, até então não tinha sido possível
conseguir seu fornecimento. Salienta-se que a articulação desta solicitação
não dependia só da Liga e por isso teve que elaborar uma estratégia de
advocacy para conseguir ser ouvido. A legislação sobre Aids existente
naquele momento, o Decreto Lei 559/91, era limitado quanto à cobertura
de atenção às pessoas vivendo com HIV na Colômbia.
Então, a Liga definiu seu objetivo de advocacy como sendo “conseguir a
inclusão dos medicamentos ARV aprovados até o presente momento na
relação de medicamentos essenciais do país”. Com isso, garantiria a
obrigatoriedade das entidades oficiais de saúde fornecerem os medicamentos
adequados para os pacientes. A decisão dependia do Conselho Nacional
de Saúde presidido pelo Ministério de Saúde. Este era seu público primário:
o Ministro da Saúde, na condição de Presidente do Conselho Nacional de
Saúde.
No planejamento, a Liga entendeu que o Gabinete da Primeira Dama podia exercer influência sobre o Ministro e que além disso teria que aproveitar
a oportunidade da abertura que esta demonstrou para tratar desta temática.
Na análise, também entrou o Gabinete do Senhor Presidente da República.
Estas eram parte de seu público secundário.
Incidir sobre quem
toma a decisão
As estruturas de poder: a magia de
conhecê-las
Por exemplo, esta compreensão nos facilita aproveitar oportunidades singulares como
a que se deu no caso colombiano. Ocorre que enquanto a Liga Colombiana de Lucha
Por último, não devemos esquecer que as
pessoas não são entidades isoladas, elas circulam
dentro de determinados contextos. Por isso, é
crucial conhecer a estrutura de poder na qual
atua nosso público primário. Para poder atuar
sem errar, pressionando as teclas certas no
momento certo, é preciso conhecer e entender
o funcionamento das normas internas, as regras
informais, os códigos de conduta e outros. Todo
isso permite que nós nos aproximemos destas
pessoas e instituições com domínio adequado
das regras do jogo, eliminando o risco de partir
para procedimentos inapropriados; além de
contar com o conhecimento necessário e uma
preparação prévia para estabelecer uma relação
a mais fluida possível.
É impressionante como pode ajudar quando
entendemos as bases nas quais se sustentam estas
estruturas, como são os processos de construção
de suas próprias lógicas, e o que pode afetá-las.
contra el SIDA desenvolvia sua estratégia de advocacy com o objetivo já indicado,
surgiu em 1993 a primeira ação tutelar contra uma organização da área da saúde por se
negar a atender e garantir o acesso a medicamentos de uma pessoa vivendo com HIV/
Aids na cidade do Villavicencio. A ação tutelar é um mecanismo legal que permite
exigir o amparo de direitos fundamentais consagrados na Constituição Política do Estado
e que deve ser julgada imediatamente.
O interessante foi que depois da primeira ação tutelar, veio a segunda, a terceira e assim
sucessivamente. Todas elas exigindo dos serviços de saúde a disponibilização de
medicamentos ARV para determinadas pessoas. As Entidades Promotoras de Saúde
(EPS), neste caso, passaram também a constituir uma parte do público secundário já
que suas ações puderam influir de alguma forma na decisão final. Embora este dispositivo
legal seja de foro individual, teve um impacto de benefício coletivo porque estabeleceu
um precedente legal sobre a importância e o dever dos serviços de saúde de proteger a
população de usuários vivendo com HIV/Aids. Isso, sem dúvida, contribuiu para fortalecer
os argumentos para que de uma vez por todas se incluíssem os anti-retrovirais na relação
de medicamentos essenciais.
50
Del problema a la solución
De alianças e guerras
capítulo 6
51
De alianças e guerras
É importante estar ciente de que assim como
vamos encontrar pessoas que podem respaldar
nossa demanda e se tornar nossas aliadas,
existem pessoas que podem se opor fortemente
ao alcance de nosso objetivo. Da mesma forma,
haverá um grupo de pessoas indecisas sobre o
lidar com os gays e outros homens que fazem
sexo com homens na problemática da prevenção
e assistência em HIV/Aids. Dependendo do peso
específico de cada um destes grupos no jogo do
poder, devemos tomá-los em conta, ou não, para
convencê-los de nossas certezas.
Esta constatação merece que nos sentemos para
pensar, pesquisar e analisar quem nos apóia e
quem se opõe a nós, a fim de definir como
encaminhar nossa estratégia de advocacy. É
preciso analisar as pessoas aliadas em termos
de como elas podem nos apoiar, com que tipo
de ações, intervenções ou respaldo, a fim de
saber com o que contamos. É preciso pensar
também como e quando estabelecer contato com
elas, e como mantê-las informadas do processo.
para qualquer eventualidade. Também é
importante saber quem apóia a oposição, que
recursos tem, que histórico de êxito apresenta,
que meios de comunicação utiliza e a forma
como utiliza, a quem dirige suas mensagens e
que materiais publica.
É um erro imperdoável subestimar o impacto que
os opositores podem ter sobre nossa estratégia.
Por isso, desde o início é preciso trabalhar esta
linha de ação, preparando detalhadamente as
intervenções a serem realizadas neste campo.
Às vezes, não cuidamos o suficiente no
sentido de procurar saber quem pensa de
que maneira sobre o que em particular, e
rotulamos as pessoas de acordo com:
• certos padrões tradicionais (eles
sempre pensaram assim);
Nunca subestime os opositores
É crucial identificar as forças opositoras. É preciso
medir sua força para poder elaborar estratégias
visando derrotá-las, ou pelo menos neutralizá-las.
É necessário não só conhecer seus argumentos
para poder derrubá-los um por um com dados,
informações amplas e fundamentações precisas,
como também sua maneira de comportamento no
debate. Não podemos permitir que nos tomem de
surpresa publicamente com um estilo sensacionalista
ou com imposturas. Devem nos encontrar preparados
• a instituição à qual pertence (sabendo
que nem a Igreja Católica é uma
instituição monolítica);
• o partido no qual militam (essa é a
linha do partido).
As coisas mudam, as pessoas mudam; além
disso, analisar a homossexualidade como um
fenômeno isolado não é a igual a analisá-la
dentro do contexto da luta pelos direitos
humanos, dos movimentos de cidadania, do
respeito às cláusulas de universalidade e
eqüidade contidas nas constituições dos estados.
Vivemos em um mundo de transformações,
dinâmico, onde é preciso se livrar de seus
próprios preconceitos, apreciações mecânicas e
extrapolações supérfluas.
Precisamos nos perguntar:
Qual é a situação das pessoas que nos
interessam estritamente em relação ao
objetivo específico que buscamos atingir
através da nossa estratégia de advocacy?
Quais circunstâncias fazem com que as
pessoas assumam uma determinada
posição?
Qual é a situação da composição das
estruturas que têm poder de decisão
sobre os problemas que nos afetam?
Busquemos todas as possibilidades de somar... De desagregar que se encarreguem os outros.
52
A dignidade se forja
A experiência do Grupo Dignidade em sua luta pela mudança da conjuntura
política visando à inclusão social dos gays e outros HSH no Brasil é
reveladora neste sentido. Dentro de sua missão, teve e continua tendo que
enfrentar inúmeras causas de advocacy com objetivos tão específicos que
vão desde a eliminação de todo tipo de preconceito até a inclusão do tema
orientação sexual na política de educação sexual das escolas do Estado de
Paraná.
Em meados dos anos 90, realizou uma análise de forças opositoras utilizando
uma escala de +10 a -10 em torno de 4 considerações básicas sobre a
proposta em questão:
•
•
•
•
expectativas do opositor
participação e influência ativa
efeito positivo ou negativo sobre o projeto
complementariedade/competitividade.
As igrejas foram identificadas como forças opositoras aos objetivos almejados
pelo Grupo Dignidade quanto à prevenção da Aids, tanto do ponto de vista
dos direitos humanos como da saúde: condenavam o uso do preservativo,
não aceitavam a existência de homossexuais...
Apesar disso, diante de uma atitude de amplitude de ambas as partes,
“Dignidade” fez uma aliança muito importante com a Ordem das Irmãs
Oblatas, já que esta ordem católica realizava um trabalho muito parecido
ao seu em relação a profissionais do sexo. A diferença estava na ênfase que
as Irmãs davam ao trabalho espiritual.
Desta maneira, a Ordem das Irmãs Oblatas foi a principal impulsora da
criação de uma casa de apoio para as pessoas doentes de Aids que estavam
socialmente desamparadas. Estreitaram-se fortes laços entre “Dignidade” e
as Oblatas e foram elas que em 1996 - depois de um incidente de
confrontação aberta entre o Arcebispo de Curitiba e o Grupo Dignidade -
53
facilitaram uma reunião entre ambas as organizações que resultou em um
consenso de respeito mútuo.
O que ocorreu foi que através do jornal de maior circulação do Estado de
Paraná, o Arcebispo fez declarações contrárias ao uso do preservativo e às
candidaturas de homossexuais a cargos legislativos. Isso provocou uma
manifestação organizada por “Dignidade” na frente da Catedral de Curitiba
(capital do Paraná) com faixas que diziam “O Senhor é meu pastor e sabe
que sou gay”. A mediação das Irmãs Oblatas foi tão efetiva que até hoje o
Grupo Dignidade não se posiciona contrário à Igreja Católica e o Arcebispo
não se pronuncia sobre o Aids nem sobre a homossexualidade.
Não se deve perder uma só oportunidade para somar.
O Grupo Dignidade também relata como as Secretarias Estaduais da
Segurança Pública e da Justiça - identificadas inicialmente como forças
opositoras em sua análise - transformaram-se em forças aliadas. Aconteceu
que “porventura” como dizem os companheiros brasileiros, um homem
que era deputado federal em 1987, havendo-se pronunciado já nessa época
a favor da proibição da discriminação por orientação sexual na Constituição
Federal, ocupou os dois cargos. A partir da atuação deste Secretário, foi
possível um diálogo aberto que facilitou a criação do Conselho Permanente
dos Direitos Humanos e a diminuição da violência policial contra gays e
outros HSH.
A reflexão neste caso deve ficar clara para nós. Não investigar o que uma
mudança pode significar, não averiguar as características da pessoa que
assumiu o cargo de Secretário Estadual da Segurança Pública e da Justiça
nessas circunstâncias - inclusive depois de uma análise de forças opositoras
- poderia ter nos levado a cometer equívocos, a afastar personagens
importantes para nossa causa, a prejudicar relações, a não capitalizar as
oportunidades. É uma questão de atitude e maturidade.
De alianças e guerras
Transformar de dentro
A interação entre agentes de mudança que
operam fora do sistema (que somos nós), com
agentes que acreditam na necessidade da
mudança dentro do sistema, são processos que
podem garantir transformações perduráveis.
Nesse sentido, o desafio mais sério que
enfrentamos se encontra em nossa capacidade
de transformar paulatinamente o sistema, de
dentro.
Aqui não valem as posições fundamentalistas
anti-estado ou anti-autoridade. É possível que
as ditaduras, os regimes autoritários, as pesadas
burocracias ou a injustiça, discriminação e
desigualdade institucionalizadas tenham criado
fortes resistências contra trabalhar com o Estado,
ou com qualquer instância da ordem
estabelecida, sejam parlamentos, ministérios,
prefeituras... Não podemos permitir que esta
atitude nos paralise. Se fizermos, por maior ou
menor que seja a mudança desejada, será uma
utopia de fato inalcançável.
Se a frustração nos impede de ver saídas
negociadas ou encontrar respostas a nossas
demandas fora do âmbito da confrontação,
estamos negando nossa responsabilidade no
novo cenário social, econômico, político, cultural, sexual. Onde estão os novos atores sociais?
Estamos esperando que algum governo nos dê a
luz verde para exercer plenamente nossos
direitos como cidadãos e cidadãs? Já dizia
Norbert Wiener com toda razão: “me machucam
as ações dos maus, mas o que mais me machuca
é o silêncio dos bons”.
54
Como defensores do direito à livre orientação
sexual no marco dos direitos sexuais e
reprodutivos junto com milhares de ativistas em
todo o mundo, devemos arrancar decisões das
autoridades de nossas cidades, estados, países
ou regiões para garantir programas eficientes de
prevenção e atenção em HIV/Aids entre gays e
outros homens que fazem sexo com homens.
Não se trata só de exercer nossos direitos, tratase também de cumprir nossa responsabilidade
social. Ou intervimos na construção do mundo,
ou deixamos que os outros o construam como
querem, sem poder nos queixar depois.
Uma aposta coletiva
A criação de redes de apoio ou coalizões que
respaldem uma causa representa uma
possibilidade certa de aumentar nossa força,
nosso poder de exercer pressão.
Uma rede ou coalizão é um grupo de
indivíduos e/ou organizações que se juntam
propositalmente com um objetivo comum para
se apoiar e colaborar mutuamente. É
importante criá-las, mas é primordial também
pensar sobre como mantê-las durante o tempo
que for necessário.
Deve-se estabelecer claramente o propósito da
rede ou coalizão, o que se espera de cada
membro e os benefícios de pertencer à mesma.
Deve haver pleno consenso em torno dos
objetivos de cada estratégia de advocacy. O
estabelecimento de formas regulares de
comunicação para informar sistematicamente
sobre o desenvolvimento das ações de advocacy
e seus resultados é de inestimável valor para
manter um contato permanente e consolidar a
rede como uma instância conjunta.
Antes de formar uma rede ou coalizão para atuar
neste âmbito, é preciso analisar cuidadosamente
as vantagens e desvantagens. Não se pode
esquecer que a criação ou desaparecimento de
uma rede não só tem implicações na organização
coletiva e estrutura como tal, como também no
posicionamento da causa levantada.
Mapas de poder
A criação de redes ou coalizões é sempre uma
possibilidade interessante no desenvolvimento
de estratégias de advocacy, contudo não
necessariamente é imprescindível. O que é primordial, sim, é identificar os níveis de apoio e
oposição que existem acerca (neste caso) da
problemática do HIV/Aids em gays e outros HSH.
Por muitas razões (religiosas, culturais, históricas
e históricas) com freqüência este tema levanta
polêmica em nossas sociedades. Tanto quem
apóia como quem opõe, defendem suas
posições.
Ventagens e desvantagens de formar redes ou coalizões
VANTAGENS
DESVANTAGENS
Amplia a base de apoio
Pode-se obter em conjunto o que
individualmente não é possível obter.
O conjunto traz proteção
Há maiores possibilidades de conseguir
mais recursos financeiros, humanos e
programáticos.
Obtém-se maior credibilidade e por
conseguinte, obtém-se major
influência.
Amplia o alcance do trabalho
55
Cada decisão leva mais tempo e
esforço.
Pode comprometer sua posição em
relação a certos aspectos da questão.
Se o poder não for distribuído de
maneira igualitária, pode significar
ceder para organizações mais
poderosas.
Não há reconhecimento individual.
Se a rede ou coalizão se interrompe,
se divide o se enfraquece com a saída
de um ou mais de seus membros, isto
repercute negativamente sobre a
estratégia de advocacy.
Para aumentar as oportunidades de sucesso em
nossas estratégias de advocacy, devemos estudar
os atores que podem apoiar nosso objetivo
específico, assim como aqueles que podem se
opor à sua realização. Trata-se de ampliar o
máximo possível a base de apoio a partir de uma
perspectiva multisetorial, plural e democrática.
Esta base se constrói através de diversas ações
que por último devem convergir na formação
de uma consciência pública. A opinião pública
pode exercer uma poderosa pressão sobre quem
toma as decisões.
O mapa de poder é uma ferramenta de
planejamento que nos permite determinar as
posições dos atores de acordo com seu poder
e influência em relação ao nosso objetivo de
advocacy. Desta forma, contribui para a
definição com maior precisão de atividades e
mensagens de advocacy.
Devemos fazer uma lista a mais completa
possível de atores envolvidos diretamente no
tema específico com o qual estamos trabalhando,
incluindo os públicos primários e secundários
de nossa estratégia de advocacy.
Esta exposição objetiva dos elementos no mapa
nos ajuda a analisar a partir de uma visão de
conjuntura, quais são nossos aliados e opositores,
as interrelações ou conexões entre eles e onde
reside a maior parte do poder e influência.
De alianças e guerras
Só um rigoroso levantamento dos fatores,
elementos e atores envolvidos em nossa
estratégia de advocacy nos permitirá construir
um mapa de poder que reflita a situação real e
que, por conseguinte, possa ser útil para nossos
fins. Com base nesta análise, poderemos definir
como construir o apoio, como neutralizar a
oposição e se vale a pena converter os indecisos.
Como podemos construir nosso mapa do
poder?
1. Dividir uma folha de papel em duas
partes, as quais representam os que
apóiam e a oposição.
Alianças e alianças
2. Fazer uma lista de nomes, de acordo com
as posições (pró e contra).
Existem diversas formas de construir alianças, de
recorrer a elas e conservá-las.
3. A linha no meio da folha representa a
neutralidade, aqui colocamos os
indecisos ou neutros.
4. O tamanho do espaço ocupado pelo
atores selecionados corresponde ao
tamanho de poder ou influência que
exercem sobre o tema e sobre os públicos
primário e secundário.
5. Quanto mais definidas sejam suas
posições a favor ou contra, mais distantes
estarão da linha do meio.
-
Há alianças com as quais, dependendo do
tema específico de advocacy e/ou da natureza
dos atores envolvidos, é preciso ter contato
desde o início do processo.
-
Há outras que se integram pontualmente
conforme as necessidades do processo.
-
Há outras que não se comprometem com o
processo de advocacy, mas sim com a causa
que defende, permitindo simplesmente que
se utilize sua imagem para demonstrar seu
apoio...
Enfim, também não há receitas prontas para tratar
deste aspecto do processo, entretanto a intuição,
os questionamentos e a análise dos mapas de
poder esclarecem como proceder.
6. Aqueles atores que estejam estreitamente
vinculados entre si, devem ser colocados
uns ao lado dos outros a fim de refletir
esta relação mútua.
É preciso entender os fundamentos que facilitam
ou impedem o apoio de determinadas
organizações, movimentos ou pessoas para
analisar friamente como aproveitar ao máximo
sua aproximação a nossos interesses, seja a partir
56
do anonimato, da neutralidade, do apoio
silencioso ou, simplesmente, da não
confrontação. É preciso analisar cada caso, sem
atuar visceralmente nem exigir atos
fundamentalistas de ninguém. Em muitos casos,
uma atitude ponderada e de compreensão pode
nos levar a não perder possíveis futuros aliados,
a não enfraquecer ambientes facilitadores que
são solidários com nossa causa, a ganhar terreno,
aos poucos, rumo à mudança esperada.
A luta contra a discriminação de todo tipo e a
defesa dos direitos humanos facilitou também a
criação de alianças em vários países, abriu o
espectro dos “excluídos”, rompendo o
isolamento dos grupos existentes. Este discurso
de cidadania mudou a forma como gays e outros
homens que fazem sexo com homens são
considerados. Os GLTB, enquanto populações
afetadas pela marginalização e injustiça social,
uniram-se com outros segmentos na luta contra
a discriminação por razões de classe, sexo, idade,
raça, orientação sexual e outros. Em nenhum
momento pode-se subestimar o valor das
alianças com os movimentos de mulheres, povos
indígenas, negros, jovens, etc. rumo à
consolidação de um mundo que respeite as
diferenças e combata as desigualdades.
Uma última consideração: as organizações
filiadas à ASICAL relevaram a importância de
contar com a mobilização internacional como
uma aliada estratégica no decorrer de todas suas
estratégias de advocacy. As declarações e o
posicionamento de agências internacionais
como a UNAIDS e as redes regionais que
trabalham com HIV/Aids da América Latina e o
Caribe são apoios de inestimável valor que, além
de prover recursos financeiros e assessoria
técnica, facilitam informação, resultados de
pesquisa, atualização de dados e estudos que
permitem fundamentar e nortear concretamente
nossas ações.
O MUMS do Chile se arrepende
por exemplo de “não ter
desenvolvido uma aliança de
forma orgânica, ou seja, só se solicitou o
apoio político de determinadas organizações
e instâncias, entretanto, elas não foram
envolvidas diretamente no trabalho cotidiano
da campanha. Portanto, existia uma aliança
implícita que apoiava as iniciativas que o
Movimento empreendia pela revogação do
Artigo, mas não existia nenhum vínculo
Neste sentido, os companheiros guatemaltecos observam
que no caso particular do ASI, apesar de que tem um
projeto para minorias que tem como população-alvo
profissionais do sexo, sua estratégia de crescimento e
sustentabilidade se choca com o apoio a causas que não são
populares ou que podem ser prejudiciais a tais esforços. O que
mais convém nestes casos? Do nosso ponto de vista, convém
estudar a possibilidade de como capitalizar cada experiência,
quando sua essência for afim.
permanente que permitisse coordenar ações
ou dar maior relevância às ações realizadas”.
Para poder atingir seus objetivos, a
Liga Colombiana de Lucha contra
el SIDA estabeleceu vários tipos de
alianças. “A primeira foi entre as ONG e
grupos de apoio participantes. Embora é certo
que nunca se tratou de uma aliança formal,
sempre houve uma unidade conceitual nos
diferentes discursos, todos os participantes
utilizavam todas as oportunidades para
mencionar o tema nos meios de comunicação
e sempre houve um apoio na redação,
assinatura e envio de comunicados”.
57
De alianças e guerras
Cada aliança é valorizada a
partir do que se espera dela.
Para o Grupo Dignidade do Brasil “sempre que houve
algum problema em relação aos serviços públicos
de saúde, em relação à atenção e prevenção em Aids,
“O fundamento principal que reuniu as alianças no caso das
ONG” segundo a Fundação Equidad, do Equador, “foi a
crescente onda de discriminação contra os gays e transgêneros
com relação ao HIV/Aids, particularmente quanto ao acesso a serviços
de atenção prestados pelo sistema público de saúde e alguns programas
do setor não governamental”. Também ocorrem alianças de natureza
profissional, ou que surgiram devido à amizade entre pessoas de áreas
parecidas... ou pelo entendimento da vivência pessoal de membros de
uma população altamente afetada pelo HIV.
o Grupo se aliava com as demais ONG/Aids de Curitiba,
formando um grupo de pressão conjunta para levar o problema
até o Secretário de Saúde responsável. Neste processo, nunca
nos negou uma audiência. Assim aprendemos que é preferível
negociar com o governo antes de fazer denúncias... Este
processo de alianças nos conduziu à criação em 1995 do Fórum
Paranaense de ONG/Aids, uma instância mais representativa e
mais forte de articulação política”. Explicam que estas alianças
se deram basicamente em torno de problemas que afetavam a
todas as pessoas envolvidas na questão Aids, independentemente
de sua orientação sexual. Também se aliou com o Departamento
de Educação da Universidade Federal de Paraná, para
desenvolver ações de capacitação em prevenção de Aids e, em
nível nacional, construiu alianças com outros grupos de gays e
outros HSH com ideologias afins, integrantes do Comitê Assessor HSH do Programa Nacional de Aids.
58
Os companheiros de OÁSIS da Guatemala não encontraram
quase nenhum apóio entre as organizações membros da
Asociación Coordinadora de Sectores de Lucha contra el SIDA.
Consideram que existe “certa hostilidade à abordagem do tema da
homossexualidade na maioria delas”, entretanto explicam a situação
à luz do ambiente conservador e penalizador deste tipo de abertura.
“Em muitas organizações, embora o pessoal tenha vontade de apoiar
a questão, os diretores não permitem. Por exemplo, no caso do APAESSolidariedad, o fato de ter tomado o caminho da prevenção com jovens
em escolas do país inteiro, veda-lhes as oportunidades de fazer
atividades reivindicativas ao redor da homossexualidade”. Afinal,
estamos falando de um país que até 1996 viveu uma guerra civil que
durou 36 anos, com uma política de segurança nacional sob a qual
toda expressão de diversidade humana era reprimida.
A “comunicação”: nossa protagonista
capítulo 7
59
A “comunicação”:
nossa protagonista
-
Significa a experiência e habilidade de saber
escutar, a arte de estabelecer empatias, a
disposição de aprender dos outros.
via satélite
grupal
escrita
não verbal...
verbal
icônica
auditiva
visual
É algo com o qual convivemos. Está aí.
Precisamos dela, utilizamos dela. É obvio que
ela está aí.
60
...
de massa
ca
• Significa destreza no manejo da linguagem e
na possibilidade de adequá-la a cada interlocutor, a cada circunstância, a cada
contexto, com inteligência.
interpessoal
éti
Significa a capacidade de transmitir idéias,
valores e agendas visando convencer quem
toma decisões de que estamos certos.
Todos os dias utilizamos formas, meios,
ferramentas, formatos, estilos... de comunicação.
Somos protagonistas cotidianos da comunicação:
ern
-
O efeito “quebra-cabeças”
cib
O sucesso de uma estratégia de advocacy
dependerá em grande parte de uma estratégia
de comunicação específica. A comunicação é
uma habilidade crucial nestas questões.
simbólica
ambiental...
Talvez seja por isso que não nos damos conta
da necessidade de refletir sobre como otimizar
seu uso, como pensar estrategicamente a seu
respeito, do que fazer para obter o efeito “quebracabeças” no sentido de que todas as atividades
de comunicação que desenvolvemos são peças
que, por suas características formais e de
conteúdo, encaixam harmonicamente no quadro
final, na visão de conjunto. Desta maneira, cada
peça cumpre, por um lado, o objetivo específico
de sua própria atividade dentro de si; e por outro,
cumpre o objetivo de contribuir para o todo. No
tudo, trata-se de:
-
reforçar o conjunto;
-
dar continuidade e fluidez às relações
envolvidas;
-
complementar os sentidos e significados;
-
apelar a todas as pessoas por igual e também
a cada um particularmente, de acordo com
suas próprias especificidades de manejo de
linguagem e códigos, situação, exercício do
poder, conhecimento e atitude frente ao tema;
-
entender e adequar-se ao democrático, ao
plural, ao diverso, ao diferente;
-
ajustar tempos, intensidades, formas e
conteúdos de acordo com o objetivo maior
Uma estratégia de comunicação a serviço de
uma estratégia de advocacy expõe um conjunto
de ações de comunicação voltadas para o
alcance dos objetivos almejados pela estratégia
de advocacy.
61
Estratégia de Comunicação
O que deve ser definido?
O que deve ser garantido?
• os sujeitos intervenientes e envolvidos no
processo, identificando com precisão os
públicos internos e externos da estratégia de
advocacy;
• objetivos claros para cada peça informativa
ou espaço de comunicação;
• o conteúdo, linguagem, gênero e formato das
mensagens e materiais de comunicação;
• a seqüência, horários e circunstâncias da
transmissão ou difusão das mensagens e
materiais;
• os meios a serem utilizados;
• os recursos que serão necessários.
• fluxos dinâmicos e permanentes de
comunicação que possam contribuir para
-
a articulação e o fortalecimento interno
do grupo de pressão, rede ou coalizão
-
o efetivo relacionamento com públicos,
equipes de trabalho, aliados, opositores,
meios de comunicação e público em
geral.
A “comunicação”:
nossa protagonista
Vista desta forma, a comunicação transcende um
papel meramente operacional, pois dentro da
proposta global tem seu próprio espaço de
realização; a partir do qual tem a possibilidade
de contribuir com ações de motivação, de
acompanhamento, de informação contextualizada,
de educação, de intercomunicação, de diagnóstico
e testemunho de situações de vida, de reflexão,
discussão e análise documentada. Nesses termos,
é preciso pensá-la mais além do tecnicismo dos
meios e ainda trabalhá-la como uma instância
própria de negociação na constituição das
identidades culturais e sociais. (Contreras e Ávila,
1992)
Do individual para o coletivo
A comunicação interpessoal é a estrela das
estratégias de advocacy na maioria dos casos.
É assim que entenderam as organizações
membros da ASICAL no desenvolvimento de suas
estratégias. Uma boa parte da estratégia de
comunicação deve estar centrada nos públicos
primário e secundário através de entrevistas,
exposições de motivos, reuniões de negociação,
bate-papos informais... além disso, facilita muito
preparar materiais de apoio visual como vídeos
ou apresentações em power point que facilitam
a explicação do tema abordado. Do mesmo
modo, entregar-lhes materiais de referência
como folhas contendo dados, pastas informativas
ou tabelas estatísticas garante seu acesso à
informação desejada sem distorções e sem
esquecer nada. Todo isso influi em nossa
possibilidade de negociar melhor nossos
objetivos de advocacy.
Como já dissemos, é essencial conhecer muito
bem os públicos para poder elaborar mensagens
concisas e consistentes que se adeqüem a suas
características. As mensagens de advocacy
devem precisar com a maior clareza o que se
espera do público com amplas explicações em
torno dos benefícios da mudança proposta. A
informação é essencial para obter a compreensão
clara do tema, a situação e a mudança de política
desejada. A intenção é levar o público a atuar
em apoio de nosso objetivo. É preciso preparar
as mensagens levando em consideração que, de
modo geral, formuladores de política de alto
escalão contam com tempo limitado.
Pelo fato da natureza dos temas com os quais
trabalhamos ser controversa em sua essência,
nossa estratégia de comunicação, embora se
concentre no público primário, não pode apontar
toda sua artilharia exclusivamente para ele e para
o público secundário que influi diretamente nele.
É preciso desenhar um sistema de comunicação
que além disso garanta um relacionamento
efetivo entre os membros do grupo impulsor da
estratégia de advocacy, com e entre seus aliados,
e com todos aqueles setores envolvidos no tema
específico com o qual trabalhamos. Da mesma
forma, é necessário desenvolver mecanismos de
comunicação para neutralizar o possível impacto
das mensagens da oposição, conseguindo um
grau de presença de tal forma e com tal conteúdo
que possa desmontar os argumentos que
sustentam seu discurso.
Para “Equidad” do Equador “a comunicação desempenhou um papel fun-
iniciativa e contar com predisposição o suficiente para o feedback quanto
damental tanto para o processo como na obtenção dos resultados. No
ao processo a ser seguido, serviu como um eixo facilitador de comunicação
trabalho comunitário e da coordenação interinstitucional existe uma
e interlocução...dando como resultado em primeiro lugar, a elucidação de
desconfiança natural entre os diversos atores que de certa maneira se
conflitos entre os potenciais aliados e a correspondente administração dos
transforma em um obstáculo na hora de formular propostas visando obter
mesmos, essencialmente em uma dinâmica sem confrontos
um trabalho coordenado e/ou associar interesses comuns e
nem de imposição de lideranças ou relações de
responsabilidades. Consultar com os diversos atores sobre o propósito da
competência...”.
62
De mensagens, materiais,
meios e processos
A elaboração de materiais específicos e
processos de comunicação dirigidos a cada um
dos públicos identificados pela estratégia de
comunicação deve responder às necessidades
detectadas para cada caso e em todos os
“momentos” que assim exija o processo de advocacy. Não há receitas prontas, apenas guias
flexíveis sobre que características e elementos
as mensagens devem conter para serem efetivas.
A simplicidade e concisão são grandes aliadas
em uma comunicação fluída.
“Equidad” elaborou uma série de
recursos documentais sobre a
problemática dos gays, transgêneros e
outros homens que fazem sexo com
homens, contendo os resultados obtidos
do diagnóstico e das discussões e oficinas
temáticas que desenvolveu.
63
O conteúdo da mensagem se refere à idéia central da mensagem. É preciso destacar o ponto
principal que queremos comunicar em uma
linguagem apropriada para nosso interlocutor.
Quando falamos de linguagem apropriada,
referimos não apenas a uma seqüência de
palavras corretamente estruturada, mas também
a:
- a escolha de termos compreensíveis e
aceitáveis para quem vai receber nossa
mensagem;
- o tom utilizado;
- os exemplos ou referências aludidas;
- os critérios argumentados;
- a lógica utilizada;
- os símbolos expressados;
- as figuras retóricas utilizadas;
- a forma de alinhavar nosso discurso;
- a contextualização dos fatos e dados.
Esta continua sendo uma fórmula que nos ajuda
a analisar as considerações que devemos fazer
ao elaborar e difundir uma mensagem. O
primeiro “quem” é a fonte da mensagem, referese à pessoa ou às pessoas que entregam a
mensagem. É indispensável que a fonte inspire
confiança e respeito no público-alvo, ou que
produza empatia. As estratégias de advocacy
freqüentemente selecionam porta-vozes oriundas
da população afetada por HIV/Aids. Outra tática
que pode dar visibilidade a nossas causas é
conseguir alguma celebridade ou pessoa de alto
escalão para pronunciar-se publicamente a nosso
favor.
Quem
diz o que
a quem
com que propósito
através de que meio
em que momento
em que lugar?
A “comunicação”:
nossa protagonista
A lógica que fundamenta estes casos
é que uma mesma mensagem pode
adquirir maior significado e/ou força
dependendo de quem a transmite. Assim
entendeu a Liga Colombiana de Lucha contra el
SIDA, que conseguiu que o II Simpósio Nacional
de Direitos Humanos e HIV/Aids (1996) enviasse
um “Direito de Petição” ao Ministro da Saúde
solicitando a modificação da legislação existente
sobre Aids para incluir a atenção integral às
pessoas vivendo com HIV/Aids e sua
participação ativa no Conselho Nacional de Aids.
O “Direito de Petição” é um dispositivo legal
utilizado para solicitar informação ou
explicações a um organismo do Estado que exige
uma resposta imediata quando alude a um direito
fundamental.
Seguem exemplos de alguns
meios que podem ser úteis:
“Atividades de lobby e cartas enviadas ao
gabinete da Primeira Dama com o fim de
envolvê-la no desenvolvimento de atividades de
trabalho em HIV/Aids contribuíram para o
lançamento em setembro de 1996 do Fundo
Nacional de Medicamentos para Doenças de
Alto Impacto Social como uma estratégia
conjunta do gabinete da Primeira Dama e do
Ministério de Saúde. Adicionalmente, como
mecanismo de pressão política e para ganhar
simpatizantes - entre 1996 e 1997 - fez-se uma
campanha por meios de comunicação de massa
para que se incluíssem os inibidores de
retrotranscriptase e de protease no acordo 53 da
Lei 100, a qual se refere aos medicamentos
essenciais.” O decreto foi aprovado em 13 de
fevereiro de 1997.
Silvio Rodríguez dedicou uma música a favor da campanha liderada pelo MUMS do
Chile durante um concerto que contou com a presença de 50.000 pessoas.
64
reuniões individuais ou públicas
resumos executivos
informativos
diálogo e discussão
fóruns políticos
encontros internacionais
simpósios
cartas
propostas escritas
lobby
cartazes
fliers
petições
debates
releases para a imprensa
conferências
concursos
festivais
bate-papos
e-mail
sites na Internet...
A escolha do meio é importante também. É
preciso identificar o canal de comunicação mais
apropriado para transmitir essa mensagem
específica. Dependendo do público, um canal
pode ser mais eficaz que outro.
Em que momento e em que lugar?
Depende do objetivo da mensagem. Lançar uma
proposta de legislação contra a discriminação
nos serviços de saúde referente a gays e outros
HSH vivendo com HIV em uma plenária do
Congresso Nacional no dia 1º de dezembro não
é igual a explicar a proposta em uma reunião do
Comitê Diretor da Assembléia Permanente dos
Direitos humanos.
Há inúmeros meios, o importante é saber
escolhê-los para cada público e para cada
ocasião. É recomendável utilizar estratégias
‘multimídia’ que mantêm a coerência com nossas
mensagens e lhes dêem sentido de unidade
justamente através da multiplicidade das
potencialidades de cada um no momento
preciso.
E sempre se pergunta: “e os meios de
comunicação social?”
O trabalho com os meios de comunicação social pode ser parte, ou não, de uma estratégia de
comunicação para advocacy. Nem sempre é
indispensável.
65
Facilita sempre se perguntar:
- Qual é a idéia central da mensagem? Está claramente formulada?
- O conteúdo é apropriado para o público-alvo da mensagem?
- Quais informações devem ser incluídas? Quais devem ser omitidas?
- Estamos usando os dados de forma efetiva?
- A ação desejada está articulada claramente?
- A escolha do formato, porta-voz, tempo e lugar é apropriada?
Nem sempre é possível também, como no caso argentino,
quando os meios de comunicação social ignoraram o convite
de SIGLA para dar cobertura às negociações realizadas com as
autoridades de saúde para elaborar estratégias de prevenção de HIV/Aids
no subgrupo HSH. Isso não foi impedimento para a difusão das informações,
“através do telefone, fax e e-mail, manteve-se uma constante via de
comunicação que permitiu dar resposta aos interessados”.
A “comunicação”:
nossa protagonista
Em todo caso, quando se decide recorrer aos
meios de comunicação, e quando isto for de fato
possível, esta ação deve estar amplamente
justificada e deve formar parte explícita da
estratégia de comunicação, correspondendo à
lógica da mesma.
Desta forma, deve-se elaborar um plano de meios
de comunicação que define quando e como
utilizar quais meios e com que finalidade.
OÁSIS, da Guatemala, reconheceu
que a ausência de uma estratégia de
comunicação contribuiu para a
pouca cobertura dos resultados de
sua pesquisa por parte dos meios de
comunicação presentes no evento de
apresentação do relatório final. “Do mesmo
modo, a falta de socialização do relatório com
outras organizações da América Central
limitaram seu impacto sobre a mudança de
políticas públicas relacionadas à prevenção de
HIV com HSH ou profissionais do sexo”.
A utilização dos meios de comunicação nestas
estratégias de advocacy ajuda muito para recrutar
apoio para nossa causa, informar o público sobre
os resultados obtidos em relação à nossa
proposta, contribuir para mudar atitudes ou
influir nas políticas e outros. Para obter maior
eficiência, deve-se estabelecer um sistema de
66
monitoramento de imprensa com o objetivo de
fazer um seguimento pontual de tudo o que for
divulgado em relação ao tema em questão.
- O monitoramento aponta concretamente para
a intensidade e qualidade da cobertura dada a
nossas mensagens e ações.
- Nos alerta imediatamente sobre possíveis
distorções que sofrem no processo.
- Permite-nos atuar oportunamente para corrigir
as incorreções na informação divulgada e
trabalhar com os jornalistas aqueles temas que
não foram tratados da forma desejada.
Algo que não podemos esquecer é que os
jornalistas escrevem a partir de sua visão de
mundo. Se, ao longo de sua vida, um jornalista
adquiriu uma postura homofóbica, a cobertura
que fizer das notícias relacionadas direta ou
indiretamente à homossexualidade muito
possivelmente terá um tratamento jornalístico
homofóbico de sua parte. Isso vai além de suas
boas ou más intenções como pessoa ou de seu
profissionalismo como jornalista. Isso pertence
ao mundo dos valores, à ideologia, à forma de
ver e entender a sociedade.
Assim, é preciso desenvolver um plano de
trabalho específico para dar conta deste assunto.
Não basta apenas informar estes jornalistas a
respeito de nossa proposta de vida, é preciso
convencê-los de que é uma proposta válida,
recorrendo a toda a artilharia conceitual e teórica
que faz parte de nossa estratégia. Se for
interessante para nós, devemos dedicar tempo,
esforço e recursos para formar e manter um
relacionamento fluido com os profissionais da
imprensa responsáveis pela cobertura dos
assuntos com os quais trabalhamos. Não é só
procurá-los no momento crucial quando estamos
“precisando deles”, fazendo uso instrumental do
meio, mas sim procurar envolver a longo prazo
o meio de comunicação e os jornalistas na profunda transformação social que propomos. Desta
forma, a interpretação e cobertura de qualquer
assunto serão aceitáveis porque teremos
conseguido sintonizar linguagens e visões
comuns.
Procurar os meios de comunicação na
expectativa de se ter uma cobertura perfeita, sem
preparar o terreno previamente de forma
sistemática e cuidadosa nos traz decepção em
sociedades conservadoras e patriarcais como as
nossas. Ofender-se diante do evidente só reforça
atitudes superficiais que não condizem com a
firmeza e solidez que devem guiar nossos atos
em defesa de nossos direitos.
A Liga Colombiana de Lucha contra el SIDA conclui que
“o papel dos meios de comunicação foi fundamental para
o exercício da pressão política desejada e conseguiu,
mediante um bombardeio constante de notícias e
comunicados”, a sensibilização de personagens influentes e
de jornalistas, “embora tradicionalmente os meios de
comunicação, de modo geral, promoveram uma visão
desfavorável em relação às pessoas vivendo com HIV”.
Assim começaram um trabalho conjunto para mudar o uso de
vocabulário e imagens a favor da causa.
No caso do Grupo Dignidade do Brasil, a persistência e
continuidade do processo em andamento conseguiu
finalmente, depois de 3 anos, que a rede principal de
televisão “TV Globo” lhes desse cobertura. Souberam
mais tarde através de um dos ex-editores da rede que existia uma
ordem expressa na “TV Globo” de jogar no lixo qualquer
informação relacionada à homossexualidade. “Foi a persistência e
a cobertura séria dada por outros meios de comunicação que
finalmente conseguiu interessá-la no tema”.
67
Por sua parte, um dos eixos fundamentais da política de
comunicação do MUMS é um programa de rádio
difundido há anos por uma rádio ligada ao movimento
feminista. Através dele, realizou entrevistas com inúmeras
personalidades do mundo da cultura e formadores de
opinião, dos quais solicitou a adesão à sua campanha
pela revogação do Artigo 365 do Código Penal chileno
que penalizava as relações sexuais entre homens, através
da assinatura de um livro de registro.
É preciso conhecer a estrutura dos meios de
comunicação em nossos países tanto em nível local
como nacional, estudar as formas de conseguir
espaço neles, entender sua lógica de
funcionamento. Devemos analisar sua
programação e os públicos que atingem para poder
definir em que espaços nos interessa estar atuando
e como podemos acessar os mesmos. O Grupo
Dignidade observa que outra forma de
comunicação valiosa no processo de
desmistificação da homossexualidade foi
participar dos debates promovidos pelos
meios de comunicação.
Refletir para seguir adiante
68
Refletir para seguir adiante
capítulo 8
69
Refletir para seguir adiante
Monitoramento,
avaliação e seguimento
É possível que o ponto alto da avaliação de uma
estratégia de advocacy seja quando podemos
celebrar o alcance de nosso objetivo. É uma
conquista e, dentro de um processo cumulativo
como é a luta pela prevenção e tratamento de
HIV/AIDS em gays e outros homens que fazem
sexo com homens, cada conquista significa um
passo a mais para a solução do problema.
Porém, mesmo tendo chegado a este ponto, o
esforço da avaliação não terminou, e o
seguimento está apenas começando.
Quantas coisas se
conseguiram nos últimos anos!
e que junto com todas as pessoas com as quais
estamos compartilhando este manual para levar
adiante nossas atividades e propósitos temos
contribuído de alguma forma para que tudo isto
esteja acontecendo.
disso, com freqüência encaramos estas
atividades como requisitos impostos por
executivos, doadores ou auditores, que na
realidade nos tiram tempo, sem capitalizar o
benefício que representam para nós.
Estaríamos perdendo tanta riqueza se não formos
capazes de manter e aprofundar as mudanças
alcançadas. O seguimento e avaliação são
instrumentos que apóiam este compromisso.
Intrinsecamente relacionados
Para tomar decisões...
Somente se encontrarmos o sentido real do que
significa monitoramento e avaliação, faremos o
esforço de realizar estas atividades. De vez em
quando, dá a impressão de que as estratégias de
advocacy são “cinzentas” porque são
componentes pouco valorizados apesar de sua
importância e utilidade.
Sem sermos otimistas convencidos, há de se
convir que houve mudanças importantes:
• que a abertura e o reconhecimento de que a
dimensão verdadeira das práticas sexuais
homossexuais entre homens vai além dos
gays e que a existência de outros homens que
fazem sexo com homens é uma realidade na
América Latina;
• que o estigma e a discriminação operam entre avanços e retrocessos mas já consta na
agenda pública da discussão política
• que se conseguiu incluir o componente da
transmissão sexual do HIV entre HSH em
muitos programas oficiais de prevenção e
tratamento de HIV/AIDS...
70
A primeira certeza que devemos ter é de que
monitoramento e avaliação significam em
termos claros e diretos “recolher e usar
informação”. Nenhum dos dois componentes
é um fim por si só, mas sim ferramentas que
podem fortalecer nossos projetos,
potencializar nossas habilidades e melhorar
nossas ações futuras.
Talvez uma dos pontos fracos seja que não se
valorize a importância da informação obtida
através de monitoramento e avaliação. Além
O monitoramento consiste no processo de
recolher informações rotineiramente sobre
todos os aspectos envolvidos em uma
estratégia de advocacy, e usá-las na
administração e tomada de decisões do grupo
impulsor ou da rede. Faz-se monitoramento
desde a implementação das atividades.
Um plano de monitoramento fornece as
informações necessárias para o desenho,
implementação, administração e avaliação das
atividades de advocacy. Portanto, inclui sistemas
para a coleta de dados e informações que são
considerados relevantes em relação a atividades
chaves.
Há indicadores de todas as cores, tamanhos e
potencialidades. A questão é saber construir os
indicadores que sirvam especificamente para o
tema com o qual trabalhamos, que as
informações obtidas sirvam para alimentar o
sistema de monitoramento responsável por
sintetizá-las, analisá-las e usá-las para tomar
decisões e iniciar ações.
A avaliação envolve uma análise objetiva e
sistemática do desempenho do grupo impulsor
da estratégia de advocacy, de sua eficiência e
impacto com relação aos objetivos propostos.
Tanto o monitoramento como a avaliação devem
estar fundamentados em dados objetivos e
confiáveis. Se faz parte de nossos planos fazer
comparações ou observar mudanças nos
indicadores, é preciso partir de um levantamento
da situação inicial. Não vale falar que algum
indicador “aumentou” ou “diminuiu” se não
termos os dados concretos da realidade inicial.
Uma avaliação séria nos permite aprender das
experiências para melhorar a qualidade de
futuras atividades, melhorar o desenho das
estratégias a seguir, entender nossas fortalezas e
deficiências e, a partir dessa base, medir o
impacto de nossas intervenções, nos
potencializar como movimento. Permite-nos
olhar nossos sucessos assim como nossos erros
e fracassos em um processo de valorização
crítica.
Existem diversas maneiras de fazer avaliação. A
mais comum envolve a realização de uma
avaliação final, medindo a obtenção do resultado
desejado utilizando as características acima
mencionadas. Há quem também prefere fazer
uma avaliação inicial que tem como objetivo
apreciar o desenho da estratégia antes de
implementá-la para analisar sua coerência e
viabilidade.
71
Para avaliar se fizemos uma boa seleção ao
escolher um determinado tema de advocacy,
podemos compará-lo com os seguintes critérios:
Existem informações suficientes a respeito?
Que tipo de dados
servem para nós?
Desperta interesse amplo, coletivo, de vários
setores?
Conta com apoio das populações vulneráveis em
relação ao HIV/AIDS?
Estará respaldado por dados de impacto?
Existe disposição em setores governamentais e
não governamentais envolvidos de entender e
trabalhar o tema?
O clima e ambiente políticos favorecem a
implementação?
Resultará em uma melhora real da vida de muita
gente?
Será factível trabalhá-lo?
Haverá interesse de outros grupos em formar
alianças?
Está delimitado por prazos claros de tempo?
Criará lideranças populares?
Será consistente com a missão e valores do grupo
impulsor?
Responderá às necessidades expressas pela
comunidade?
•
(Lista de critérios adaptada da Midwest Academy.
1996. Organizing for Social Change: A Manual for
Activities in the 1990s. Santa Ana, CA: Seven Locks
Press)
o número de reuniões realizadas com o
público primário;
•
o resultado das reuniões;
•
compromissos ou acordos assinados com
os diferentes atores;
•
envolvimento de diversos setores da
sociedade;
•
o número de atividades;
•
a quantidade de pessoas envolvidas;
•
a descrição dos principais aliados;
•
o número de releases enviados à imprensa
versus o número de releases publicados;
•
a natureza e o montante de recursos
captados...
Refletir para seguir adiante
No caso da educação sexual nas escolas, em meados dos
anos 90 no Brasil, conseguiu-se que o próprio Ministério de
Educação estabelecesse uma abordagem mais ampla da
matéria. Entretanto, uma avaliação inicial identificou a falta
de preparação dos professores para tratar deste tema e que preferiram
continua se limitando a questões meramente biológicas. Foi preciso
reconhecer que um objetivo desta natureza significa uma mudança social
Também se pode fazer uma avaliação de
processo, sendo um esforço sistemático que
acompanha o seguimento. Ao mesmo tempo
em que se recolhem as informações
rotineiramente, também vai-se atribuindo um
valor a cada atividade, a cada resultado
intermédio da estratégia, para poder adequar
imediatamente as questões-chave e ajustar
sistematicamente o plano às novas condições
que surgem no contexto.
No caso de estratégias de grande envergadura,
também ocorre freqüentemente a realização de
avaliações de meio termo. Na metade do plano,
faz-se uma parada no caminho para avaliar como
o processo está andando. Outros preferem fazer
avaliações periódicas, a cada mês, trimestre,
semestre...
A decisão sobre como e quando fazer
monitoramento e avaliação dependerá das
características e circunstâncias da estratégia, e
o estilo de cada organização. O importante é
tomar em consideração que em qualquer plano
72
profunda para a qual as condições não estavam dadas ainda. Optou-se
por não insistir nesta ação e sim continuar preparando o terreno para sua
realização no futuro. De acordo com essa lógica, o Grupo Dignidade
formou parcerias com as Secretarias Municipal e Estadual da Educação
para desenvolver cursos de sensibilização de profissionais de educação
em torno da homossexualidade.
estas são atividades que requerem tempo,
recursos e esforço adicional. Por isso, devem
estar devidamente planejadas e dotadas de todos
os insumos que requerem para poder ser úteis
para o alcance dos objetivos.
Acendeu a faísca, e agora?
Quanto ao seguimento, devemos prever nossa
capacidade de garantir que as conquistas
alcançadas possam perdurar e que atendam os
objetivos propostos inicialmente.
• Para que nos serve conseguir a inclusão oficial
do componente de gays e HSH nos programas
de prevenção e atenção em HIV/AIDS, se não
garantimos que haverá recursos humanos,
técnicos e financeiros para levar adiante esta
iniciativa?
• De que vale conseguir a modificação de
legislação que discrimina pessoas por sua
orientação sexual, se não estarmos
preparados para fazer com que se cumpra?
• De que mudança podemos falar, se a portaria
ministerial obtida para garantir a
disponibilidade de preservativos de alta
qualidade e lubrificantes à base de água não
se cumpre?
Teremos que embutir nos planos de ação de
nossas estratégias de advocacy, ações concretas
que nos permitam fazer um seguimento
sistemático dos êxitos obtidos. Aquelas leis,
políticas ou programas que se criarem ou forem
modificados como resultado de nossos esforços,
têm que funcionar adequadamente, caso
contrário de pouco terá valido o esforço.
Somente com o tempo, e com o aprofundamento
de suas próprias ações, com a sinergia que forem
capazes de produzir, é que se dará a mudança
lenta e sustentada. Assim se constroem os novos
cenários que por sua vez nos impõem novas
provocações e desafios para seguir adiante.
A Liga Colombiana de Lucha contra
el SIDA, logo depois de conseguir a
inclusão dos medicamentos ARV na
relação de medicamentos essenciais do país,
reconheceu a importância do seguimento ao
observar “a necessidade de atualizar a relação
e incluir exames de acompanhamento como
elemento fundamental para garantir um
verdadeiro acesso a tratamentos efetivos”.
Se não fizermos um seguimento rigoroso e eficaz
e, portanto, não garantirmos o funcionamento e
a realização do que somos capazes de promover,
corremos o risco de voltar praticamente para a
estaca zero. Este tipo de retrocesso abala nossa
auto-estima coletiva e nos tira energias e
vontades para novos empreendimentos.
73
Passo a passinho... a América Latina avança
Esta é a avaliação das organizações membros da ASICAL de alguns dos êxitos conquistados nos
últimos anos, especialmente através de estratégias ou ações de advocacy:
Argentina: SIGLA
• Conseguimos consolidar o conceito de HSH.
• Os Programas Estaduais de Santa Fé, Chaco e Corrientes, e o Programa
Municipal de Rosário passaram a incluir o componente HSH em suas
ações.
• Criou-se um clima favorável para este tipo de intervenção em outras
províncias e jurisdições.
Brasil: Grupo Dignidade
Guatemala: OÁSIS
• Diminuiu o número de denúncias
de violência contra gays e outros
HSH por parte da polícia.
• Diminuiu o número de denúncias
de discriminação contra gays e
outros HSH por parte de
profissionais de educação e saúde.
• Diminuiu o número de
declarações homofóbicas feitas
por religiosos nos meios de
comunicação.
• Estabilizou-se o número de
casos de Aids entre HSH.
• Elaboram-se projetos para a
prevenção de DST/HIV/Aids em
gays e outros HSH e profissionais
do sexo para a América Central
como seguimento ao levantamento realizado.
• Publicou-se um documento
sobre exclusão social por motivo
de orientação sexual, como parte
do Relatório de Desenvolvimento
Humano do PNUD para o ano
2001
Refletir para seguir adiante
Chile: MUMS
Colômbia: Liga Colombiana de Luta contra o
SIDA
• Demonstrou-se que a sociedade civil organizada é capaz de
gerar mudanças políticas.
• Aprendeu-se a importância de trabalhar pela visibilidade
através dos meios de comunicação, sempre transformandoos em aliados.
• Evidenciou-se a importância de trabalhar com o Estado
(embora sem que sempre se esteja de acordo com seu
trabalho), sem perder a capacidade crítica de avaliar o
trabalho desenvolvido pelo mesmo e sem deixar de
reconhecer que em alguns casos o trabalho conjunto é
quase impossível
• A modificação do artigo criou condições claras para a
realização do trabalho em HIV/Aids:
º possibilitou que as organizações homossexuais
pudessem se legalizar;
º abriu o processo de incorporação das minorias sexuais
como um ator importante no trabalho de prevenção de
HIV/Aids.
• Demonstrou-se que os homossexuais no Chile são
sujeitos de direito.
• Houve mudanças na situação que os afeta.
• Observou-se um estado de ânimo diferente no Chile: os
homossexuais já não são mais “delinqüentes” e podem
se assumir publicamente. A marcha do orgulho gay
realizada em setembro de 1999 foi um ato público de
massa.
Equador: Equidad
• Conseguiu-se deter a realização obrigatória da testagem de diagnóstico
do HIV.
• Incorporou-se a problemática de HIV/HSH em alguns planos e programas
como o Plano Estratégico do Ministério da Saúde com relação à Aids, a
proposta do Fundo Global e outras iniciativas privadas.
• Articulou-se o compromisso político estabelecido pelo Ministério de
Saúde no Programa Nacional de Aids/DST com relação ao rompimento
das “políticas de silêncio” que existiam antes da campanha de advocacy.
74
Tudo tem um custo
capítulo 9
75
Tudo tem um custo
Paixão, dedicação, convicção... são ingredientes
essenciais para o sucesso das estratégias de advocacy. Está comprovado: podemos a exercer
cidadania e a participar dos processos de tomada
de decisões que afetam nossas vidas, cada um a
partir de seu universo, para sua conjuntura
específica.
Assim, voltamos ao famoso refrão “só vendo para
acreditar”. “Acreditar para ver” é nosso negócio.
A partir desta base, devemos pensar nos recursos
necessários para levar adiante o plano. No
planejamento de uma estratégia de advocacy,
desde o início devemos pensar nos recursos que
vamos precisar para levar nossas ações adiante.
Contar com os recursos humanos, materiais,
técnicos e financeiros que precisamos para
desenvolver nossa estratégia de advocacy, nos
amplia as opções e permite um desempenho
mais eficiente para o grupo de pressão ou da
rede.
Recursos
Humanos
Materiais
Técnicos
Financeiros
76
Tudo tem um custo. Embora seja possível lançar
uma estratégia bem-sucedida exclusivamente
com os recursos e a energia dos membros do
grupo ou rede, é muito complicado sustentar o
esforço que significa impulsioná-la,
exclusivamente com o trabalho voluntário e a
militância. Temos que desenvolver habilidades
para gerar recursos, para captar fundos. É
essencial evitar dependências econômicas que
possam tirar a autonomia do movimento que
lideramos.
O que precisamos?
-
Precisamos de um plano de financiamento
que nos garanta
-
-
Um orçamento é um mapa
estratégico financeiro que tem
como objetivo ajudar uma
organização na identificação de
suas necessidades e na busca de
captação de fundos
correspondentes.
a viabilidade e continuidade da estratégia
desencadeada
regras claras para a gestão institucional
de fundos
sistemas de documentação de receitas e
despesas
Precisamos de um orçamento. O
desenvolvimento de um orçamento realista
é um instrumento que nos permite entender
quanto dinheiro precisamos para levar
adiante nosso plano de trabalho,
especificando valores para cada uma das
atividades. Conhecer este dado é de primordial importância para prever as necessidades
oportunamente e assim evitar interrupções que normalmente são prejudiciais - uma vez
iniciado o processo.
Reflete os gastos
previstos
Orçamento
e as receitas que se
espera receber
em um
determinado
período de
tempo.
A capacidade de gerenciar de maneira eficiente
e transparente de financiamentos e recursos
obtidos é um compromisso inevitável com a
coletividade envolvida. Por ser um elemento
sensível para o bom funcionamento do grupo
de pressão, deve-se elaborar relatórios periódicos
prestando contas claramente de todas as
movimentações realizadas.
-
Precisamos de um plano de captação de
fundos. Ao fazer o plano, precisamos nos
lembrar de identificar concretamente as
pessoas responsáveis por executá-lo, a quem
as ações se dirigem, mecanismos de contato
e seguimento, e prazos.
Captando fundos
Para aproximar-se das agências de cooperação
é preciso conhecer suas agendas, interesses,
como operam, que tipo de condições e prazos
estabelecem, quais são suas exigências. Vale a
pena fazer esforços para contar com uma base
diversa de financiamento para evitar assim a
dependência e o condicionamento dos recursos.
Definitivamente, precisamos ter a capacidade de
elaborar um plano coerente e viável de trabalho
para poder conseguir doações de pessoas,
instituições ou organizações comprometidas ou
dispostas a facilitar os recursos necessários. Um
plano de trabalho de uma estratégia de advocacy reflete nitidamente o que propomos fazer
em um tempo e espaço determinado para
cumprir os objetivos que estabelecemos.
77
As contribuições aos esforços de advocacy não
têm que ser exclusivamente em dinheiro.
Também se pode obter doações na forma de
trabalho, equipes, espaço para uma sede,
suprimentos, serviços de gráfica, especialização
técnica, apoio administrativo e espaço para
reuniões e eventos... Tudo vale.
Ao elaborar uma estratégia de captação de
recursos, deve-se pensar individualmente em
cada uma das fontes das quais se pretende
aproximar-se, fazendo as seguintes perguntas:
•
Por que esta fonte estaria interessada em
apoiar o objetivo de advocacy proposto?
O custo de uma estratégia não deve ser
pensado somente em termos de
dinheiro, como também em termos de
- horas de trabalho;
- apoio técnico e administrativo;
- infra-estrutura para reuniões e
eventos;
- insumos de diversos tipos;
•
Qual enfoque seria apropriado e eficaz
para obter o apoio da fonte?
- equipes e outros.
•
Que tipo de informação precisamos saber sobre a fonte para nos aproximar dela
(agendas programáticas, ideológicas,
relatórios sobre atividades, disponibilidade)?
O valor em dinheiro de cada um destes
•
Como opera a fonte na atribuição de suas
doações (valores, duração, formatos,
temas)?
A apresentação às fontes de apoio financeiro
sobre nossa organização e sobre a estratégia de
advocacy que pretendemos realizar deve
• Demonstrar que representamos uma
organização
sólida,
administrada
eficazmente, com experiência e exemplos de
esforços bem-sucedidos.
itens deve ser incluído no orçamento.
Tudo tem um custo
• Convencê-los da importância e necessidade
de atingir o objetivo de advocacy, além da
possibilidade certa de êxito em nosso
empenho.
• Conter, de maneira transparente, informações
relacionadas ao controle financeiro e
orçamentário da estratégia. É apropriado
designar responsáveis qualificados para
encabeçar os esforços de captação de
recursos.
Não se pode esquecer de questões legais. As
leis que regulam a concessão e o recebimento
de doações variam de país para país. É necessário
conhecê-las e ajustar-se a elas para evitar
problemas. Devemos saber se existem restrições
relacionadas ao uso das doações, se existem
limites nos valores que indivíduos ou
organizações podem contribuir para advocacy.
Da mesma forma, é importante conhecer as
exigências para a declaração dos valores doados,
regras específicas para a contabilidade e
declaração de impostos, se é que existem para
este item.
Além da busca de captação de recursos por via
de doações, devemos pensar em atividades que
podemos realizar para gerar recursos:
• realizar eventos (jantares, concertos,
festivais...);
• investir em atividades que dêem retorno
rápido;
• vender consultorias, capacitação;
78
• vender artigos, serviços, fazer negócios;
• promover campanhas de arrecadação,
rifas ou leilões;
• vender espaços publicitários e outros.
Ser sustentável. Que maravilha!
Ter sucesso contribui para respaldar o
compromisso das pessoas envolvidas em uma
estratégia de advocacy. Isso é muito importante
porque normalmente estas pessoas investem
muito tempo e energia em impulsionar tais
estratégias. O entusiasmo pelos êxitos obtidos
mantém vigente o espírito de colaboração,
porém é prudente planejar formas de não atrelar
o cumprimento dos planos unicamente ao tempo
e recursos doados voluntariamente pelos
integrantes do grupo impulsor.
As organizações gays ainda têm um longo
caminho a percorrer para cumprir sua missão
como agentes de mudança e isso implica em
identificar muitas estratégias de advocacy, várias
delas de grande envergadura. Neste sentido,
como uma rede de advocacy, convém fazer
planos para garantir seu futuro.
Toda organização próspera deve concentrar
esforços no desenvolvimento de mecanismos,
sistemas e estruturas para assegurar a
sustentabilidade do grupo, instituição ou rede e
a continuidade de suas ações. Olhar para o futuro implica em revisar periodicamente seus
Uma vez aprovado o plano de trabalho, é
preciso pensar em todas as fontes de apoio
financeiro em potencial:
• Manutenção de doadores individuais
importantes.
• Doações corporativas.
• Doações de agências bilaterais (USAID,
governos europeus, etc.)
• Doações de agências multilaterais
(UNAIDS, UNFPA, PNUD, etc)
• Convênios com o governo.
• Empresas do setor privado.
• Cotas ou contribuições em espécie de
pessoas ou organizações aliadas ou
pertencentes ao grupo impulsor.
objetivos e missão, e reconsiderar suas relações
com a comunidade, organizações membros da
rede, doadoras e outras redes e coalizões para
adaptar-se às mudanças. Isso implica na tomada
de decisões em torno de como operar em termos
institucionais, programáticos e financeiros.
A sustentabilidade de um grupo ou rede de advocacy compreende três elementos importantes:
-
-
-
Sustentabilidade institucional - O
nível de eficácia e eficiência dos
sistemas internos, estruturas e cultura
de trabalho da rede. Refere-se
também a como a rede de apoio se
posiciona em relação a seus membros,
o setor público e a comunidade de
doadores.
Sustentabilidade programática - A
capacidade da rede de desenhar e pôr
em prática estratégias de advocacy de
alta qualidade, segundo sua missão,
objetivos e suas diversas necessidades
programáticas e em apóio às
necessidades expressas pela
comunidade e a população
beneficiária.
Sustentabilidade financeira - a
eficácia dos sistemas e estratégias da
rede para gerar e administrar os
79
recursos financeiros necessários para
manter os esforços de advocacy da
rede.
Não se pode descuidar de nenhum destes
elementos já que para perdurar no tempo é
preciso ser forte institucionalmente, ter
programas claros de ação e contar com recursos
para executá-los. Se enfraquecemos em qualquer
um destes aspectos, colocamos em perigo nossa
sustentabilidade.
Por exemplo, com dinheiro mas sem um
programa eficientemente elaborado ou sem a
capacidade humana técnica para desenvolvêlo, estamos destinados ao fracasso. Poderíamos
dizer, “mas com dinheiro podemos contratar
uma consultoria para que se re-elabore o
programa ou podemos contratar os recursos
humanos necessários para executá-lo.” Mas
então teríamos que nos perguntar “O dinheiro
que temos será suficiente para cobrir estas
questões que não estavam contemplados no
orçamento inicial? Será que era somente para a
parte operacional?”
Vale a pena fazer um esforço para alcançar a
sustentabilidade integral de nossas organizações,
nas suas três formas. Na tabela a seguir, constam
as características de sustentabilidade de redes
ou grupos. Se nos conseguimos cumpri-las,
teremos maior probabilidade de garantir nossa
permanência como organização e, desta forma,
Os promotores de estratégias de advocacy
precisam de informações confiáveis e
atualizadas para:
-
-
-
elaborar a bagagem conceitual da
estratégia que possa respaldar suas
mensagens e gerar credibilidade entre os tomadores de decisões,
produzir documentos e materiais de
comunicação,
desenvolver e manter contatos e
reuniões para negociar e pressionar
diretamente seus públicos primários
e secundários,
criar e fortalecer as alianças,
organizar eventos,
etc.
Tudo tem um custo
Características da Sustentabilidade de Redes
Institucional
a continuidade de nossos esforços na luta por
melhores programas de prevenção e atenção em
HIV/Aids dirigidos a gays e outros homens que
fazem sexo com homens no marco do exercício
pleno dos direitos humanos.
Programática
Financeira
Reuniões periódicas
Os membros possuem habilidade
em políticas, resumo e análise de
informação, meios de comunicação,
capacitação, etc.
Estratégias escritas para a captação
de fundos
Compromisso da
organização para com a
rede
Áreas do programa que precisam de
advocacy estão bem definidas
Objetivos anuais definidos
Missão e visão claras
Entre os membros existem grupos
trabalhando em saúde materna,
HIV/Aids, gênero, direitos humanos
e jovens
Sistemas e métodos para a
captação de fundos
Estrutura organizacional
Sistema para o monitoramento do
ambiente político
Transparência financeira
Banco de dados /mala direta
dos membros
Inventário das habilidades e recursos
com os quais os membros contam
Sistemas de administração:
projeções, orçamentos,
contabilidade e elaboração de
relatórios
Metas e objetivos claros
Utilizam-se informações para
desenhar e desenvolver atividades
de advocacy
Processo de desenvolvimento de
propostas e orçamentos
Estrutura de tomada de
decisões
Planos escritos para nortear as
estratégias de advocacy
Atividades de geração de renda
Relações externas
Sistemas para o resumo e a
manutenção de informação em
áreas/assuntos chaves
Custo rateado com outras
redes/coalizões
Funções e responsabilidades
definidas
Os relatórios financeiros são
utilizados na tomada de decisões
Planos para o recrutamento
e a capacitação de membros
Financiamento externo sustenta
atividades da Rede
Participação eqüitativa dos
membros
Banco de dados de doadores
Sistema de comunicação
Plano estratégico
80
O caminho se faz andando...
capítulo 10
81
O caminho se faz andando...
Uma vez definidos o problema, as alternativas
de solução, os objetivos específicos de advocacy,
os públicos primários e secundários, os mapas
de apoiadores e opositores, a estratégia de
comunicação, os estilos e formas de
monitoramento, avaliação e seguimento, a
estratégia de captação de recursos; estamos com
condições de pensar, analisar e ajustar as ações
concretas que devemos realizar para conquistar
nosso objetivo.
Primeiro uma chuva de idéias: O que podemos
fazer?
Em seguida, vamos colocar numa seqüência
lógica todas as ações que nos ocorrem: Por onde
começamos?, o que fazemos depois?...
Plano de trabalho
• quem se encarregará da preparação e execução destas atividades;
• como estarão distribuídas as responsabilidades;
• que recursos humanos, materiais, técnicos e econômicos são necessários para
cada atividade;
• quando e onde acontecerão as atividades;
• a quem estarão dirigidas as atividades;
O plano de trabalho deve conter de maneira
ordenada e detalhadamente planejada as
atividades a serem desenvolvidas em busca do
cumprimento do objetivo da estratégia de advocacy, em consonância com a missão da
organização. Deve definir:
• como daremos seguimento a elas, e
• o orçamento necessário para cada atividade
- quem administrará os recursos e
- de onde serão conseguidos.
82
O plano de trabalho faz com que a estratégia se
traduza em ação. Permite-nos tomar ciência da
quantidade de trabalho, energia e recursos que
precisamos para obter uma vitória política. Por
último, não se pode esquecer que nenhum
esforço importante de trabalho está completo
sem uma referência para o monitoramento da
execução das atividades e sem estabelecer
referências para reconhecer se, quando e até que
ponto estamos alcançando os resultados
desejados. O monitoramento e avaliação são
essenciais para o êxito de qualquer esforço maior.
É preciso estar ciente de que o planejamento para
desenvolver estratégias de advocacy em HIV/Aids
com gays e outros HSH deve reconhecer as agendas ocultas, as informações imperfeitas, os
valores, ideologia e conflitos que permeiam o
tema. Não se trata de um planejamento onde os
objetivos, atividades e avaliação se apresentem
dentro de um modelo fácil e lógico.
De poder para poder
Para sermos interlocutores válidos e sentarmos à
mesa de negociações com igualdade de
condições com instâncias do poder oficial é
indispensável sermos portadores de um poder
social ou comunitário legitimado na sociedade
civil. Uma ação preliminar à implementação
de uma estratégia de advocacy é fortalecer a
organização e estrutura do grupo ou rede
impulsora.
83
A equipe base de trabalho deve
potencializar suas habilidades em:
-
Pesquisa. Coleta, análise e uso
apropriado de dados.
-
Avaliação do conjuntura político.
-
Planejamento estratégico.
-
Negociação e administração de
conflitos.
-
Comunicação interpessoal.
-
Uso efetivo de meios de
comunicação.
-
Desenvolvimento de materiais de
comunicação.
-
Lobby e advocacy.
-
Facilitação e técnicas de dinâmica de
grupos.
-
Formação de redes de apoio.
-
Liderança.
Da mesma forma, deve desenvolver um
conhecimento profundo das áreas nas quais é
preciso atuar para contribuir para a diminuição
dos efeitos do HIV/Aids através de prevenção
holística e atenção integral a pessoas que vivem
com HIV. Entre elas, destacamos as áreas de
educação, prevenção, saúde pública,
orçamentos e atribuição de recursos, direitos
humanos...
Levantamento de ações
Estratégias de advocacy realizadas por várias
organizações membros da ASICAL na última
década nos dão uma série de idéias sobre que
tipo de ações podem ser realizadas para
impulsionar estes processos, desde como
preparar o terreno até como aproveitar as
oportunidades que se apresentam no caminho.
Esta não pretende ser uma lista exaustiva, a
realidade é tão dinâmica e nos oferece tantas
possibilidades, a criatividade é tão infinita que
qualquer lista seria sempre uma amostra da utopia. Também não pretende ser, a partir de
nenhum ponto de vista, um livro de receitas que
nos diz o que tem que fazer. Simplesmente é
uma lista de coisas que foram feitas, que
funcionaram, que são úteis. A idéia aqui e
socializá-las.
SUGESTÕES DE AÇÕES
O caminho se faz andando...
Preparando o terreno:
formação de uma consciência coletiva
-
Organizar fóruns, debates, simpósios,
encontros, conferências, congressos locais,
nacionais e internacionais para discutir o tema
em questão tanto com pessoas vivendo com
HIV/Aids como com múltiplos setores
interessados na questão.
-
Presença contínua do tema na agenda pública
e setorial, ressaltando como prioridade o
assunto específico de advocacy.
-
Implementação de uma linha de apoio
temático disponível para pessoas e
instituições interessadas em se aprofundar na
realidade do HIV/Aids com gays e outros
HSH.
-
Distribuição de materiais e informação
fornecidos por Redes da América Latina e Caribe (LAC), organizações da LAC com trabalho
84
-
em HIV, gays e outros HSH, o Programa
Conjunto das Nações Unidas e outras
conferências e congressos sobre HIV/Aids.
Socialização de estudos e resultados de
investigações sobre soroprevalência e
informação sobre a epidemiologia do HIV/
Aids em gays e outros HSH na LAC.
-
Promover a consciência pública sobre a
opressão e discriminação vividas por gays e
outros HSH para gerar condições políticas
para impulsionar as mudanças desejadas.
-
Persuadir a população de que a discriminação
é causa da vulnerabilidade de mulheres,
jovens, crianças, lésbicas, gays e outros HSH.
-
Promover a aceitação da diversidade sexual
e de gênero.
-
Solicitar a inclusão de HIV/Aids em gays e
outros HSH na agenda de fóruns e atividades
relacionadas com HIV/Aids.
SUGESTÕES DE AÇÕES
Preparando o terreno:
estabelecendo bases concretas
-
Realizar pronunciamentos e declarações em torno de
nosso objetivo específico em encontros e fóruns.
-
Impulsionar o compromisso da coletividade
representada para a execução de ações concretas de
solicitação e de pressão para favorecer nossa causa,
como parte dos encaminhamentos de tais encontros.
-
Organizar processos participativos com representantes
dos diversos setores envolvidos para desenvolver ações
conjuntas acerca do objetivo de advocacy.
-
Formar alianças com organizações e movimentos como
o Ministério Público, a Comissão de Direitos Humanos
e outras afins visando obter pronunciamentos públicos
em torno de casos específicos e situações relacionadas.
-
-
Estabelecer alianças com diversos setores, em particular simpatizantes e solidários frente à problemática do
HIV/Aids, os direitos humanos e da causa das minorias
sexuais.
Mobilização simultânea de ações e atores em distintas
cidades do país.
85
-
Implementar estratégias de contato com diversas
organizações da sociedade para informá-las da
problemática, solicitar seu apoio e entregar-lhes
informação e documentação que lhes permita identificar
os aspectos homofóbicos da legislação que impedem o
exercício pleno dos direitos civis das pessoas
homossexuais.
-
Elaborar uma agenda com os diversos atores sociais,
políticos, culturais, religiosos no decorrer dos anos para
expor, conversar, discutir o tema em diversas instâncias
como colégios profissionais, organizações ligadas à
saúde, centros acadêmicos das universidades,
organizações de mulheres, organizações de direitos
humanos, igrejas...
-
Realização de oficinas de elaboração de propostas de
lei e outros.
-
Entender a lógica do funcionamento do país, envolver
todo o país na iniciativa, não só a capital.
-
Utilizar o diálogo político entre autoridades de
diferentes setores e estados do país para debater o tema.
-
Liderar pesquisas e estudos sobre o tema em geral e os
assuntos específicos de interesse para a estratégia.
SUGESTÕES DE AÇÕES
O caminho se faz andando...
Aproveitando oportunidades
-
Aproveitar qualquer possibilidade que surja na
conjuntura.
-
Aproveitar os processos de descentralização
administrativa, municipalização da saúde,
fortalecimento do poder local para permear
estas instâncias, sobretudo aquelas às quais
que temos mais acesso.
-
-
Manter a mobilização proativa, com amplos
protestos públicos organizados contra os
“crimes de ódio por homofobia” (como os
assassinatos), maus tratos e todo tipo de
injustiça por motivo da homossexualidade;
para conscientizar a população sobre o flagrante atentado aos direitos humanos que estes
representam.
Não necessariamente esperar mudanças na
legislação; provocá-las através de ações
86
individuais frente aos tribunais judiciais para
obter jurisprudência procurando a garantia de
direitos individuais. A jurisprudência é um
mecanismo que está obrigando mudanças na
legislação.
-
Aproveitar iniciativas oficiais como o processo
de modernização do sistema judicial, de
reformas à Constituição, de atualização de
normas legais relacionadas; para ampliar o debate e apresentar propostas próprias.
-
Aproveitar qualquer oportunidade ou abertura
política para tratar do tema.
-
Conhecer, saber interpretar e usar os
instrumentos legais em favor dos interesses do
componente HSH em relação ao HIV/Aids.
SUGESTÕES DE AÇÕES
Construindo a artilharia conceitual:
processo
- Fazer contato com profissionais e peritos de diversas
áreas, buscando contar com assessoramento técnico
especializado de acordo com as necessidades da ação a
ser realizada.
- Realizar visitas periódicas e intercâmbio de informação
com informantes-chave, tanto das instâncias do setor
público como do setor não governamental.
- Conhecer o que pensam os diversos atores, expor a
artilharia conceitual rigorosamente preparada para
desmentir os elementos apresentados pela oposição.
- Demonstrar que o adversário não é dono da verdade e
que a parte essencial de seu discurso se sustenta em
preconceitos, não apresenta fundamentos válidos para
sua posição.
- Documentar as violações mais freqüentes dos Direitos
humanos nas populações-alvo.
- Facilitar a análise da situação atual da prevenção, atenção
e apoio em DST/HIV/Aids em gays e outros HSH,
propondo mudanças relevantes nas políticas
institucionais e governamentais, segundo os resultados
do estudo.
- Pôr as relações sexuais entre homens no centro da
abordagem da questão HIV/Aids.
- Utilizar o termo “populações nucleares” ao falar da
transmissão das doenças sexualmente transmissíveis, e
87
o termo “pontes epidemiológicas” para poder obter o
apoio de pessoas interessadas na questão da transmissão
do HIV para a “população em geral” através de gays,
outros HSH e profissionais do sexo masculinos ou
femeninos.
- Utilizar argumentos do Banco Mundial que indicam que,
na prevenção do HIV/Aids, os programas governamentais
devem enfocar os grupos que têm maior probabilidade
de contrair e transmitir o vírus. Esta análise se apóia em
fatores de custo/efetividade e custo/benefício que
estabelecem que a prevenção da infecção em uma pessoa
com comportamento de risco evita muitas infecções
secundárias entre os indivíduos com quem ela se
relacione sexualmente.
- Elaborar propostas de projetos de lei, portarias
ministeriais, propostas técnicas, programas e políticas.
- Realizar permanente análise do discurso da oposição.
Definir ações e intervenções para neutralizar seus
argumentos e sua influência.
- Desenvolver um enfoque multisetorial e multidisciplinar
na estratégia.
- Realizar análise de situação e resposta sobre HIV/Aids
em gays e outros HSH.
- Conhecer e reinterpretar os estudos epidemiológicos
sobre HIV/Aids.
- Analisar e processar a informação obtida a fim de
elaborar uma bagagem conceitual sólida, documentada
e contextualizada.
SUGESTÕES DE AÇÕES
O caminho se faz andando...
Construindo a artilharia
conceitual: elementos
• Utilizar a informação técnica
epidemiológica sobre HIV/Aids em
HSH que demonstra o impacto da
epidemia nestas populações e as
potenciais pontes de transmissão
para outras populações.
• Utilizar preceitos da Constituição
como fundamentação para nossas
propostas:
- A saúde é um direito de todos
e dever estado
- Todas as pessoas gozam de
garantias individuais básicas.
- Todos os seres humanos
nascem livres e iguais em
dignidade e direitos.
- O Estado tem o dever de
assegurar o direito das pessoas
a participarem com igualdade
de oportunidades na vida
nacional.
• Utilizar
os
fundamentos
conceituais dos documentos da
88
OMS para a saúde sexual, os
programas ou plataformas de ação
das conferências internacionais de
Cairo (População e Desenvolvimento), Beijing (Mulher), Vienna
(Direitos Humanos).
• Aperfeiçoar sociologicamente uma
análise sexológica da epidemia.
• Demonstrar como as intervenções
preventivas em gays e outros HSH
favorecem a redução da expansão da
epidemia.
• Caracterizar os comportamentos de
alto risco para a infecção por DST/
HIV/Aids.
• Elaborar uma aproximação das
concepções de vida, valores pessoais
e comunitários, normas sociais,
códigos de conduta e outros temas
relevantes que incidem na
transmissão de DST/HIV/Aids, nas
populações de gays e outros HSH.
• Estabelecer a relação da situação legal e de direitos humanos das
populações em questão e a
prevenção, atenção e apoio em DST/
HIV/Aids das mesmas.
• Tomar em conta a manifestação das
identidades sexuais na América
Latina, fortemente predeterminada
por expressões do “machismo”, como
condicionantes do caráter cultural e
que definem os papéis de homem e
mulher. Isto explica em parte a
transgressão sentida por estas culturas
acerca de qualquer manifestação de
sexualidade diferente, com respeito a
gênero.
• Demonstrar o efeito da conjuntura na
vulnerabilidade ao HIV/Aids das
populações-alvo, destacando a
diferença com estudos e conceitos
que atribuem a transmissão do HIV
ao comportamento individual muito
mais do que às concepções de vida,
valores pessoais e comunitários,
normas sociais, códigos de conduta.
• Demonstrar a relação entre a
precariedade da situação legal e de
direitos humanos dos homossexuais
e a falta de formulação e
implementação de políticas de
prevenção acessíveis e eficazes.
SUGESTÕES DE AÇÕES
Fortalecendo a mobilização
•
•
•
•
•
•
Coordenar tarefas e fluxo de informações tanto para as
organizações e pessoas apoiando o plano, como para
os tomadores de decisão dos níveis inferiores até os
hierarquicamente superiores.
Capitalizar a mobilização internacional, declarações e
posicionamento tanto de agências internacionais como
a UNAIDS e redes regionais que trabalham com HIV/
Aids na América Latina e no Caribe em torno do tema
HIV/Aids em gays e outros HSH; como parte de nosso
movimento.
Participação de líderes gays em comissões, conselhos e
outras instâncias de poder.
Conseguir que gays, transgêneros e outras minorias
sexuais tenham voz de representação pública.
Mostrar ao governo que - com o apoio das organizações
GLTB - este pode ter benefícios ao atender populações
vulneráveis às quais não chegava tradicionalmente.
Posicionar a organização frente à problemática do HIV/
Aids em gays e outros HSH como sua principal área de
ação.
89
•
Mostrar o movimento GLTB como algo político e sério;
que não está isolado, que conta com apoio de amplos
setores da sociedade.
•
Prever os efeitos das mudanças de governo e anteciparse aos fatos trabalhando nas campanhas eleitorais.
•
Reduzir a vulnerabilidade de gays e outros HSH,
aumentando sua auto-estima mediante a promoção de
seus direitos civis.
•
Reduzir a incidência do HIV nessa população mediante
a promoção de práticas de sexo seguro e uso de
preservativos.
•
Conhecer procedimentos legislativos e jurídicos para a
modificação e criação de leis.
•
Conhecer a estrutura do poder público e do processo
de tomada de decisões.
•
Desenvolver e atualizar permanentemente os mapas de
poder.
•
Desenvolver um banco de dados sobre o tema no país
e em nível internacional, e atualizá-lo sistematicamente.
SUGESTÕES DE AÇÕES
O caminho se faz andando...
Criando o vínculo com o público primário
•
•
Ganhar respeito e credibilidade nas instâncias do poder
formal.
•
Abrir espaços para a influência política das
organizações gays nas repartições públicas.
Criar e fortalecer lideranças GLTB em espaços de
tomada de decisões.
•
Colaboração com organismos do Estado que favoreçam
a superação das condições de vulnerabilidade em
relação ao HIV/Aids e à violação dos direitos humanos.
•
Aproveitar os compromissos políticos e/ou relações
pessoais com personagens da estrutura do poder oficial.
•
Dirigir campanhas a parlamentares e partidos políticos.
•
Sensibilizar a classe política, entregando-lhes material
informativo e documentos cuidadosamente
selecionados e sintetizados.
•
Cooperar com o Ministério da Saúde em todas as ações
possíveis, envolvê-lo em nossas ações, criar climas
favoráveis.
•
Promover reuniões entre autoridades e representantes
de organismos gays para compartilhar visões e
•
Apresentar candidatas e candidatos GLTB assumidos
para cargos públicos.
•
Identificar canais de comunicação específicos para
influir nos tomadores-chave de decisão e de influência
no tratamento da problemática do HIV/Aids.
•
•
relevância positiva para HIV/Aids e direitos humanos
de gays e outros HSH.
Participar de processos como o da UNGASS que
apresenta oportunidades para discutir propostas de
governo sobre o HIV/Aids diante das Nações Unidas,
trazendo possibilidades para a inclusão do tema de
HIV/Aids em gays e outros HSH.
Valorizar, através de reconhecimentos públicos,
pessoas e instituições que tenham contribuído para o
enfrentamento da epidemia e a promoção dos direitos
humanos, entre elas, ações governamentais de
90
SUGESTÕES DE AÇÕES
estratégias e coordenar ações e estratégias de prevenção
do HIV em gays e outros HSH.
•
Articular listas de envio de informação sistemática e
convites para participação em fóruns e debates
temáticos para atores indecisos.
Relacionar-se com autoridades sensibilizadas em setores
vinculados ao tema.
•
Desenvolver consultas permanentes com os diferentes
atores envolvidos no tema.
Organizar reuniões, telefonemas, envio de
correspondência e bate-papos com públicos primários
e secundários. Solicitar que façam declarações sobre o
tema.
•
Fomentar a participação das minorias sexuais em
diferentes espaços sociais e políticos.
•
Envolver o movimento de mulheres e organismos
vinculados à defesa dos direitos humanos e de ONG
que trabalham na construção da cidadania.
•
Construir alianças sociais sólidas com o mundo
acadêmico para que nos proporcionem respaldo teórico
em relação a nossas demandas.
•
Compartilhar os resultados de estudos e análise de
políticas de prevenção, atenção e apoio nas populaçõesalvo com organizações que trabalham com Aids, de
direitos humanos, organismos de cooperação,
financiadores e outras.
•
Estar presente em massa no congresso durante a
discussão das propostas do movimento.
•
•
•
•
Articulando e mantendo alianças
Promover a participação de tomadores de decisão, tanto
do setor governamental como do setor não
governamental, em atividades de capacitação e
sensibilização sobre HIV/Aids em gays e outros HSH.
Facilitar espaços de fortalecimento conceitual e
intercâmbio de informação sobre temas relacionados
às sub-populações de HSH com a equipe diretor dos
Programas Nacionais de Aids/DST dos Ministérios da
Saúde e outras agências de cooperação técnica e
financeira.
91
SUGESTÕES DE AÇÕES
O caminho se faz andando...
Criando materiais de
comunicação
• Tornar visível a população
homossexual através de marchas e
outros tipos de eventos públicos,
informação.
• Desenvolvimento de todo tipo de
campanhas públicas para obter o
maior apoio possível.
• Projetar uma imagem positiva de gays
e outros HSH como sujeitos atuantes
promotores de uma mudança social
importante, contra a imagem
pejorativa e estereotipada tradicional.
• Obter uma cobertura ampla e
adequada dos meios de comunicação
sobre as ações desenvolvidas.
• Manter coerência discursiva.
• Divulgar o tema por diversos meios
de comunicação, desde fliers até
folhetos informativos.
• Desenvolver um processo contínuo
de sensibilização nos meios de
comunicação. Plano de meios de
comunicação, relacionamento
permanente com jornalistas que
fazem cobertura do setor.
• Preparar dossiês temáticos.
• Elaborar recursos documentários
sobre a problemática dos gays e
outros homens que fazem sexo com
homens.
• Elaborar apresentações em power
point, com distribuição em reuniões
e espaços de discussão e sessões de
feedback temático.
• Conseguir visibilidade gay e de outros
HSH e da problemática da Aids em
telenovelas, guias cinematográficos,
literatura, etc.
• Realizar campanhas dirigidas a
personalidades do mundo da cultura
e formadores de opinião para
conseguir apoio para a causa.
• Desenvolver
espaços
de
comunicação social estáveis e
regulares.
92
• Promover debates públicos sobre o
tema com autoridades, opositores,
personalidades.
• Fazer campanhas de assinaturas de
notáveis, e da população em geral.
• Solicitar o apoio para a cidadania
mediante o envio de cartas ao público
primário.
• Garantir a presença periódica do
tema, e dos atores em diferentes
espaços programáticos dos meios de
comunicação.
• Solicitar cartas de apoio a diferentes
organismos internacionais que
desejem promover o respeito aos
direitos de gays e outros HSH.
• Socializar informação específica
sobre HIV/Aids em gays e outros HSH
através de e-mail a contatos chaves
de instituições e organizações.
Considerações finais...
Advocacy se move entre a ciência e a arte (Mostajo; 2001), entre a
razão e a paixão:
razão para saber onde queremos chegar, como e por quê
paixão para chegar lá.
A experiência demonstra que uma estratégia de advocacy é mais efetiva
quando é planejada de forma sistemática. Da perspectiva científica, não
existe uma fórmula universal para incidir politicamente de maneira eficaz. É
uma arte. As pessoas que levam adiante este tipo de processo, que fazem
pressão, que promovem seus interesses; utilizam sua criatividade para articular um tema de maneira que motive outras a atuarem. São pessoas que
possuem um senso agudo do tempo, sabem o que fazer à medida que ocorrem
as mudanças, têm faro político. São negociadoras hábeis e, na busca do
consenso, aproveitam as oportunidades para obter os benefícios possíveis
que, embora muitas vezes modestos, abrem caminho para o alcance futuro
de ganhos maiores. Definitivamente, são pessoas que não perdem a paixão
que significa conquistar mudanças à procura da melhoria da qualidade de
vida.
Desta maneira, ao longo das últimas décadas, as organizações GLTB, de
mãos dadas com todos seus aliados, foram escrevendo a história da
transformação da sociedade latino-americana, contribuindo para eliminar o
estigma e a discriminação das pessoas por motivo de sua orientação sexual
e lutando para conseguir melhores condições para o enfrentamento da
epidemia do HIV/Aids.
Utilizaram numerosas estratégias de advocacy, mexendo com diversas áreas
das estruturas de poder, com demandas das mais diversas. É uma história
escrita com sucessos e fracassos, mas é sem dúvida uma história que avança.
Os resultados acumulados são positivos, as lições são de vida; e no caminho,
o fortalecimento das organizações concretizado em suas próprias conquistas
é a garantia mais fiel de que vamos adiante.
Concluímos esta reflexão sobre advocacy com o depoimento de organizações
membros da ASICAL que seguiram esta estratégia de negociação, assumindo
sua responsabilidade como sociedade civil, exercendo a cidadania, lutando
por seus direitos. Cada organização respondeu sucintamente sobre o que
significou para ela atuar nas questões de advocacy:
93
“Aprendemos
a ter um
relacionamento mais
interativo com os outros
atores envolvidos. Já não
nos tratamos como
‘inimigos’. Já não é
necessário fazer
manifestações de protesto.
É possível resolver os
problemas através do
diálogo com os órgãos
competentes.”
Grupo Dignidade - Brasil
“Dois anos depois deste
processo, já existe uma
proposta da Guatemala
para o Fundo Global de
Luta contra a Aids,
Tuberculose e Malária que
se concentra em
‘populações vulneráveis’
incluindo HSH,
profissionais do sexo e
pessoas vivendo com HIV/
Aids. A totalidade dos
recursos de aceleração de
programas solicitados à
UNAIDS para 2002 e 2003
se dedicará exclusivamente
ao financiamento de
atividades de intervenção
para priorizar o tema de
HIV/Aids em HSH e
profissionais do sexo.
Finalmente, a USAID
realiza esforços por
priorizar suas atividades de
prevenção de HIV/Aids
entre HSH na América
Central.”
OÁSIS - Guatemala
Considerações finais...
“Essencialmente, tem sido
uma aprendizagem. Fomos
tomando consciência da
importância de se acumular
conhecimentos e definir um
discurso coerente e bem
fundamentado em relação à
epidemia de HIV em gays e
outros HSH. Conseguimos
definir um objetivo claro:
criar e fortalecer
organizações gays no
interior do país.
Defendemos propostas
concretas junto aos órgãos
competentes. Muitas vezes
não conseguimos os apoios
solicitados, mas
continuamos tentando.
Tivemos paciência e
estivamos atentos para
aproveitar as oportunidades
apresentadas pela
conjuntura. O componente
HSH ficou incluído no
Projeto do governo
argentino aprovado pelo
Fundo Mundial”.
“O trâmite legislativo foi
bastante demorado... de tal
maneira que ao final do
processo as forças do
movimento estavam muito
desgastadas e ressentidas.
Foi necessário desenvolver
um plano para enfrentar o
novo período que consistia
na ocupação e a ampliação
dos espaços conquistados,
e a consolidação de um
sujeito social lésbicotransgênero-homossexual
que abrisse caminho para
as novas campanhas pelos
direitos da população
GLBT.”
MUMS - Chile
“O impacto fundamental
foi o fortalecimento e
posicionamento da
organização frente ao tema
como sua principal área de
ação; fortalecimento de
sua capacidade técnica
para o trabalho com gays e
outros HSH,
reconhecimento de sua
liderança, reconhecimento
de sua capacidade de
interlocução e negociação
com pares, maiores
habilidades para a
coordenação e trabalho em
Rede e de negociação com
instâncias institucionais
públicas e privadas.”
Equidad - Equador
SIGLA - Argentina
94
“Como organização
participante, conseguimos
consolidar o trabalho da
então Comissão de Direitos
Humanos, estreitar nossas
relações com o Ministério
da Saúde e o Ministério
Público, capacitar novos
voluntários no
desenvolvimento de
atividades legais. Também
conseguimos um maior
reconhecimento de nosso
trabalho, estabelecer
alianças com o Fundo de
Medicamentos que nos
permitiu conseguir
medicamentos subsidiados
para alguns usuários, e
ganhamos a oportunidade
de participar ativamente na
reforma da legislação sobre
Aids.”
Liga Colombiana de Lucha
contra el SIDA - Colômbia
Manifesto pela saúde sexual
dos gays e outros HSH
95
Manifesto pela
saúde sexual dos
gays e outros HSH
Ser gay ou um homem que faz sexo com outros homens não é crime, pecado e
nem motivo de vergonha; é uma condição humana e uma prática sexual
absolutamente normal que não significa que sejamos inferiores às demais.
Contudo, pela rejeição e discriminação aos quais ainda estamos sujeitos,
precisamos aprender a viver nossa sexualidade da maneira responsável, livre e
saudável. Hoje mais do que nunca contamos com as ferramentas para conseguir
isso. Para tanto, é preciso assumir com orgulho e dignidade nossa orientação
sexual, sem permitir que ninguém nos prejudique física, psicológica ou
emocionalmente devido a essa orientação.
Nós homens latino-americanos que fazemos sexo com outros homens estamos
vivendo uma crise de saúde provocada pelo HIV/Aids. Somos a população
mais afetada, embora não a única. E, apesar das enormes e dolorosas perdas
de vidas humanas que temos sofrido, estamos aprendendo a responder e nos
conhecermos melhor. A Aids tem nos obrigado a ter maior consciência de
nosso corpo, de nossa saúde e, sobretudo, de nossa sexualidade.
A busca pelo prazer sexual traz riscos para nossa saúde que precisamos saber
como evitar. Não é uma questão de renunciar a uma vida sexual plena e
satisfatória, e sim de saber nos proteger e nos cuidar. Devemos conhecer as
infecções e doenças às quais podemos nos expor durante nossas relações
sexuais, os meios de transmissão, as formas de se proteger delas e todo que
tem a ver com a saúde sexual.
A saúde sexual não é uma questão de aparência, e nem consiste apenas na
ausência de doenças. É sobretudo o estado de bem-estar sexual, físico e
emocional, satisfatório, livre de culpa e de pressão. Todos temos o direito de
viver esse estado de bem-estar e todos nós devemos aspirar atingi-lo.
O direito da saúde, independentemente da orientação sexual, forma parte
do exercício de nossos direitos como cidadãos. Ter acesso à prevenção da
transmissão do HIV e ao tratamento integral da Aids faz parte do direito à saúde,
à vida, à educação, ao trabalho, à moradia, à intimidade, à vida em parceria e
à formação de uma família.
Exercer a cidadania é participar de questões que dizem respeito a:
nossa saúde,
nossa educação,
a eleição de nossos governantes,
o controle social do trabalho dos funcionários públicos,
o controle social dos compromissos assumidos por nossos governos em
relação ao HIV/Aids.
Ser cidadão é ter uma vida sexual o mais saudável possível, ser uma pessoa
completa.
Manifesto pela saúde sexual dos gays e outros HSH
Lista de participantes
Oficina de advocacy
sobre HIV/Aids, saúde
sexual e homens que
fazem sexo com
homens na América
Latina
Quito, 27 a 31 de
janeiro de 2003
LETRA S*
Representante: Arturo Díaz
Canarias No. 45
Col. San Simón Ticumac
C.P. 03660, México, D.F.
MÉXICO
Telefone: (5255) 5532 2751
(5255) 56727096
[email protected]
[email protected]
ARCO IRIS*
Representante: Luiz Carlos Freitas
Rua Do Russel 496/1110,
Río De Janeiro RJ 22210-010
BRASIL
Telefone: +55(21) 2552-5995
55 21 9174-6620
Caixa Postal 2084 Río de Janeiro RJ
CEP 20001-970
[email protected]
[email protected]
OASIS*
Representante: Rubén Mayorga
6 Avenida 1-63 Zona 1
Ciudad Guatemala, 01001
GUATEMALA
Telefone: (502) 220-1332
253-3453
[email protected]
GRUPO GAY DA BAHIA*
Representante: Marcelo Cerqueira
Rua Frei Vicente, 24 -Pelourinho
Caixa Postal 2552 - 40022-260
Salvador Bahia,BRASIL
Telefone: + (71) 321-1848 / 322-2552
[email protected]
SIGLA*
Representante: Rafael Freda
Humberto I 613 PBC
Ciudad Autóma de Buenos Aires
ARGENTINA
Telefone: (54 11) 4362 8261
[email protected]
Grupo DIGNIDADE*
Representante: Toni Reis
Caixa Postal 1095
Curitiba - Pr
CEP 80001-70
* Organização membro da ASICAL
98
BRASIL
Telefone: +55 41 222-3999
[email protected]
LCLCS*
Representante: Felipe Vallejo
Av. 32 No. 14-43
Santafé de Bogotá, COLOMBIA
Telefone: + 57 245-4757
[email protected]
MUMS*
Representante: Marco Ruíz
Alberto Reyes 063
Providencia
Santiago, CHILE
Telefone: +56-2 737-0829
Fax:
+56-2 732-0863
[email protected]
EQUIDAD*
Representante: Orlando Montoya H.
Rábida N26-32 y Santa María
Quito, ECUADOR
Telefone: +593-9 973-6959
+593-2 252-9008
[email protected]
[email protected]
KIMIRINA
Representante: Margarita Quevedo
Ramírez Dávalos 258 y Paez
Quito, ECUADOR
Telefone: +593-2 25432466
+593-2 568767
[email protected]
SOC. WILL WILDE
AMIGOS SIEMPRE AMIGOS
Representante: Sergio Guzmán
Av. Andrés Bello, C.C. Alto Chama
Piso 1 Local 226
Apartado Postal 324
Mérida 5101-A,
VENEZUELA
Telefax (+58. 274) 2710220
Telefone (+58 274) 2710438
Celular (+58 416) 6740956
[email protected]
Representante: Leonardo Sánchez
Yolanda Guzmán No. 183-3 Piso 2
Villa María. Santo Domingo
REPUBLICA DOMINICANA
Telefone: + 809 536-8118
Fax:
+ 809 536-8172
[email protected]
DIGNIDAD GAY
Representante: Willmer Mendoza
Antezana 415
Cochabamba, BOLIVIA
Telefone: +591-4 4501935
[email protected]
ACCSI / LACCASO
Representante: Edgar Carrasco
Av. Rómulo Gallegos Edf. Maracay.
Apto. 21, piso 11. El Marqués Caracas
1071, VENEZUELA
Telefone: 58 212 232 7938
Fax:
58 212 235 9215
[email protected]
ADESPROC-LIBERTAD
Representante: Alberto Moscoso
Calle Estados Unidos No. 772 y Esq.
Puerto Rico. Zona Miraflores
La Paz, BOLIVIA
Telfax: + 591-2 222-6210
[email protected]
Instituto Internacional de Derechos
Humanos en Salud (IIDEHSA)
Representante: Norma García de
Paredes
Residencial La Pradera, No. 18,
Panamá, PANAMÁ
(507)675-8818
[email protected]
[email protected]
LAMBDA VENEZUELA
Representante: Jesús Medina
Av. Urdaneta. Edificio Karam
Piso 5. Oficina 514
Caracas. Distrito Capital
VENEZUELA
Telefone: + 0212 561-5359
+ 0414 324-9773
[email protected]
99
CENTRO PARA LA EDUCACIÓN Y
PREVENCION DEL SIDA -CEPRESI
Representante: Norman Gutierrez
Morgan
Bosques de Altamira Farmacia Sagrada
Familia 1/2 cuadra arriba Casa B#69
Managua, NICARAGUA
Telefone: 505-270-0652
[email protected]
PROGRAMA DE SEXUALIDAD
HUMANA. UNIVERSIDAD DE
MINESOTA
Representante: Jeffrey Stanton
Minesota, EEUU
Telefone: +1 612 624.8821
[email protected]
COLECTIVO VIOLETA
Representante: Marco Antonio Alonzo
López
Barrio la concordia calle Morelos, casa
#1726
Tegucigalpa , HONDURAS
Telefone: 504- 237-6398
[email protected]
COMUNIDAD GAY SANPEDRANA
Representante: Ramón Antonio
Valladares López
Bo. Concepción 2 Calle, 8 y 9 Av. S.E.
Casa No. 67 , San Pedro Sula
HONDURAS
Apdo. Postal 2824
Telefax: 504 553-43-63
[email protected]
Lista de participantes
PROGRAMAS NACIONAIS
DE AIDS/DST
PROGRAMA NACIONAL ITS/SIDA
Ministerio de Salud y Bienestar Social
Avenida 20 de Octubre 1687 Edificio
Wuirakocha 4º A
La Paz, BOLIVIA
Telfax: 591-2 244-1479 / 71506034
COORDENAÇÃO NACIONAL
DE DST/AIDS
CENTRO NACIONAL SIDA/ITS
Secretaría de Salud
Ministério da Saúde, W3 Norte
SEPN 511, Bloco C
70750-920 Brasília - DF Brasil
Telefone: + 5561 448-8004
www.aids.gov.br
CALZADA DE TLALPAN 4585, 2º. PISO,
COLONIA TORIELLO GUERRA,
DELEGACIÓN TLALPAN, C.P. 14050
Ciudad de México D.F.
MÉXICO
Telefone:525 55284848, 55284856
Ext. 260 y 261
PROGRAMA NACIONAL SIDA/ITS.
Ministerio de Salud
Buenos Aires, ARGENTINA
Telefone: + 5411 4379-9017
DIRECCIÓN GENERAL DE
CONTROL ITS/SIDA
Plaza Metropolitana, Local 305. 3ª.planta.
Av. John F. Kennedy y Ortega y Gasset Distrito
Nacional
Santo Domingo
REPUBLICA DOMINICANA
Telefone: (809)472-7580, 227-9218,
FAX;
(809)472-8355
[email protected]
PROGRAMA NACIONAL SIDA/ITS.
Ministerio de Salud Pública
COMISIÓN NACIONAL SIDA
Ministerio de Salud Pública
MAC IVER 541, OFICINA 68
Santiago, CHILE
Telefone: + 562 630-0681
[email protected]
PROGRAMA NACIONAL SIDA/ITS
Ministerio de Salud Pública
7 Av. 3-67
Residenciales Valle de la Mariposa, Amatitlán,
Guatemala, GUATEMALA
Telefone: + 502 251-6054
Fax:
+ 502 251-6055
[email protected]
Juan Larrea 483 y Río Frío
Edif. Pazmiño Acuña. Piso 3
Quito, ECUADOR
Telefax: +593-2 250-2222
[email protected]
PROGRAMA NACIONAL SIDA/ITS
Ministerio de Salud Pública
Col Primero de Mayo, Complejo Nacional De
Salud, Concepción Palacios
Managua, NICARAGUA
Telefone: 505-2894402
[email protected]
100
PROGRAMA NACIONAL SIDA/ITS
Caracas,VENEZUELA
Telefone: + 582 481-4984
[email protected]
COORDINACIÓN DE PREVENCIÓN Y
CONTROL DE ENFERMEDADES
Ministerio de Salud Pública
Cra. 13 No. 32-76. Piso 12.
Santafé de Bogotá
COLOMBIA
Telefone: +(57-1) 336-50-66 Ext.1200
PROGRAMA SIDA/ITS
Ministerio de Salud Pública
Trabajo: Ancón, Avenida Gorgas, Edificio 261
Casa: Urb. Lomas del Golf, calle Córdoba,
casa 154
Panamá, PANAMÁ
Telefone: (507) 212 - 9321
Telefax; (507) 212 - 9473
[email protected]
Bibliografia
Bibliografia sobre Advocacy
ASICAL (2000) Matriz de advocacy (cabildeo) en
prevención, atención y apoyo en VIH/SIDA con
HSH. Rio de Janeiro, Brasil.
ASICAL (2000) Matriz de desarrollo de
organizaciones de HSH. Rio de Janeiro, Brasil.
ASICAL (2000) Matriz de creación de climas
favorables para el desarrollo de intervenciones
en prevención, atención y apoyo en VIH/SIDA
con HSH. Rio de Janeiro, Brasil.
Boyd, Barbara et al.(1999) “Redes para cambiar
políticas: un manual de capacitación en
advocacy”. The POLICY Project. Washington.
CEDPA - The Centre for Development and
Population Activities (1995) “Más allá de El Cairo
y Beijing. Manual de gestoría para mujeres
líderes”. Washington.
CEDPA (1997) “Taller de trabajo para las
instituciones miembros de la red PROCOSI:
Introducción a la promoción y defensa pública.”
(no publicado) La Paz.
Corporación SISMA-MUJER; “El ‘advocacy’
como estrategia integral de influencia política”
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Glossário de abreviaturas
ACAT
Advocacy, Capacitação e Apoio Técnico
Aids
Síndrome da Imunodeficiência
Adquirida
ARV
Anti-retrovirais
ASICAL
Associação para a Saúde Integral e
Cidadania na América Latina
LACCASO
Consejo Latinoamericano y del Caribe
de ONGs con servicio en VIH/SIDA
UNAIDS
Programa Conjunto das Nações
Unidades sobre HIV/Aids
MUMS
Movimiento Unificado de Minorías
Sexuales
UNFPA
Fundo das Populações das Nações
Unidas
OASIS
Organización de apoyo a una
Sexualidad Integral frente al SIDA
USAID
Agência Estadunidense de
Desenvolvimento Internacional
OMS
Organização Mundial da Saúde
DST
Doenças Sexualmente Transmissíveis
GBLTT
Gays, bissexuais, lésbicas, transgêneros
e transexuais
HIV
Vírus de Imunodeficiência Humana
ONG
Organização Não Governamental
OPAS
Organização Pan-americana da Saúde
SIGLA
Sociedad de Integración Gay Lésbica
Argentina
HSH
Homens que fazem sexo com homens
(categoria epidemiológica)
104
UDI
Usuários de Drogas Injetáveis