Artigo 2:Consultas Doença Renal Crônica Avançada Arquivo

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Artigo 2:Consultas Doença Renal Crônica Avançada Arquivo
Consultas Doença Renal Crônica Avançada
Dr. Alberto Alles
Médico Nefrologista – Coordenador Grupo de Trabalho
Saúde Renal da SAN (Sociedade Argentina de Nefrologia),
Membro do Comitê de Saúde Renal – SLANH.
Argentina
Quais os pacientes que devem ser atendidos?
Quem deve integrá-la?
Quais as suas funções?
À medida que a função renal de um paciente se deteriora, torna-se imperativo avaliar o seu
encaminhamento a um especialista em nefrologia.
Isso porque é nesses estágios finais onde se produzem as alterações metabólicas, hidroeletrolíticas e
clínicas para as quais esses especialistas estão melhor preparados e posicionados.
Há muitos anos, em alguns Serviços de Nefrologia (1) foram instalados consultórios DRCA,
institucionalizados através dos Programas de Saúde Renal (PSR), como os bem sucedidos do Uruguai (2), onde
são desenvolvidas estratégias de tratamento para retardar a progressão da DRC (Doença Renal Crônica) em fase
terminal e que, caso não seja alcançado, possibilitam ao paciente o acesso a distintas formas de tratamento
substitutivo renal (TSR), nas melhores condições possíveis.
Nessas consultas, devem ser atendidos preferencialmente os pacientes em estágio 3b (30-45 ml/min),
com proteinúria moderada a severa (que pode determinar um índice de progressão mais acelerado), aqueles
com estágios 4 e 5, isto é, Taxa de Filtração Glomerular estimada (TFGe) < que 30 ml/min, ainda sem proteinúria,
os que têm rápida deterioração da TFGe, iguais ou maiores que 5 ml/min/ano, e com HTA (hipertensão arterial)
descontrolada, apesar de quatro ou mais drogas anti-hipertensivas, e qualquer um deles que tiver episódios
reiterados de quadros de ICC (insuficiência cardíaca congestiva) e/ou retenção hidrossalina.
Já a evolução desses pacientes é melhor se a atenção está a cargo de uma equipe multidisciplinar que
quando efetuada só pelo nefrologista.
É portanto importante, na conformação da equipe, contar com um staff integrado por:
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Médico nefrologista;
Licenciado em enfermagem e licenciado em nutrição (em ambos os casos, formados em
cuidados nefrológicos);
Auxiliar de enfermagem e/ou Administrador;
Psicólogo/Assistente Social/Farmácia.
Disponibilidade de acesso rápido à consulta com cirurgião vascular periférico.
Além disso, continua sendo prioritário trabalhar, mesmo nesses estágios, em estreita relação de
referência e contrarreferência com os médicos de Atenção Primária. A realidade dos recursos humanos
nefrológicos na América Latina é muito díspar. Contudo, ainda os países com maior disponibilidade de recursos,
certamente, não conseguem atender à população potencial de pacientes com DRC. No caso, o estágio 4, com
prevalência de 0,35%, e considerando uma população total de 600 milhões na América Latina, estamos falando
de 2 100 000 pacientes que, se não contarem com este tipo de atenção ou similar, correm risco bem maior de
morrer que de ingressar em tratamento dialítico.
Isso foi corroborado em estudos prospectivos (3), acompanhando durante cinco anos uma população
com diferentes graus de DRC, com mortalidade que aumenta à medida que a função renal diminui.
No caso mais frequente e próximo de Centros de Atenção Primária, as projeções para um Centro tipo,
que atende 5000 personas, considerando 6% de DRC, ou seja, 300 pacientes, se a população for diagnosticada
e atendida corretamente durante cinco anos, seria possível tentar evitar a morte de 48 (27%), e evitar o ingresso
à diálise ou conseguir que seja feito em boas condições de 7 -4%- (4).
Principais objetivos e funções da DRCA
Diminuir a morbimortalidade associada, especialmente a cardiovascular, que aumenta à medida que a
filtração glomerular diminui.
Outra importante função desemprenhada por esses consultórios DRCA é a educativa, procurando a
adesão dos pacientes aos tratamentos médico-dietéticos instituídos, frequentando as interconsultas e
prestando informação clara e precisa sobre TSR disponíveis, na escolha da mais adequada para cada caso
particular, dando ao paciente a opção de escolher uma delas: HD (hemodiálise), CAPD (diálise peritoneal
ambulatorial contínua), transplante renal antecipado à diálise, no caso de contar com um doador vivo.
Reduzir os custos: está demonstrado que o gasto com tratamentos de pacientes em diálise é quatro
vezes superior ao demandado pelo transplante renal e a atenção em consultório DRCA, mesmo sendo esse
dispêndio maior nos estágios mais avançados pela necessária incorporação de tratamentos mais caros, como a
Eritropoetina Humana Recombinante (EPO-rHU), ativadores dos receptores para vitamina D etc.
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Tratar adequadamente as complicações da DRC, que se tornam mais graves ou aparecem à medida que
a função renal se deteriora.
Utilizar todos esses elementos mais os recursos humanos para evitar o ingresso precipitado à TSR , em
más condições clínicas, de urgência, por episódios frequentes e graves de ICC, com sintomatologia “urêmica” e
distúrbios eletrolíticos como hiper K, hipocalcemia e acidose metabólica, e sem um acesso vascular, para início
do tratamento hemodialítico, produzindo aumento significativo da mortalidade nos primeiros meses de
tratamento (3) ou pela diálise peritoneal, uma vez que não conta com um cateter abdominal, o que produz
aumento significativo da mortalidade no início do tratamento (5).
Os registros informam o aumento da porcentagem de pacientes que realiza sua primeira hemodiálise
através de cateter provisório duplo lúmen (70%) e, também anual, a redução dos que são feitos através de
acesso vascular funcionante, 25% (6).
REGISTRO ARGENTINO DE DIÁLISIS CRÓNICA 2012
PRIMER ACCESO VASCULAR PARA HEMODIALISIS
Início da TSR
Quando começar?
Início precoce?
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Mesmo no melhor cenário possível, ou seja, com encaminhamento precoce e oportuno ao nefrologista
e acompanhamento frequente e personalizado em consultório de DRCA, há um momento no qual deve ser
considerada a possibilidade de o paciente com DRC iniciar TSR.
O encaminhamento ao nefrologista e o acompanhamento do paciente, mais que em termos de tempo,
em meses ou anos, deve ser considerado como efetuado em tempo e forma para que a intervenção do
especialista em nefrologia possa alterar positivamente a progressão da DRC, e quando, apesar disso, chegar
até instâncias terminais, a possibilidade de que o acesso à TSR seja realizado nas melhores condições clínicas.
Um dos problemas mais importantes que apresentam os pacientes é que, mesmo nas fases terminais
da DRC, em geral, não apresentam sintomatologia – eles se “sentem bem” –, e não percebem alterações do
ritmo diurético, que serviria como alerta. Ao contrário, costumam apresentar aumento do ritmo diurético,
próximo à poliúria, devido à perda da capacidade de concentração da urina.
As normas KDIGO (7) alcançaram um Consenso Internacional sobre quando deve ser iniciada a TSR.
Quando estiverem presentes uma ou mais das seguintes circunstâncias:
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sinais ou sintomas atribuídos à Insuficiência Renal (IR): serosisite, distúrbios eletrolíticos,
especialmente hipepotassemia e hiponatremia;
dificuldade em controlar a volemia e a pressão arterial;
deterioração progressiva do estado nutricional, com perda de peso, refratário à intervenção
dietética,
dano cognitivo.
Todas essas alterações ocorrem com frequência, se bem que não invariavelmente, quando a TFGe está
entre 5 e 10 ml/min.
Dentro do espectro clínico, a HTA descontrolada não é dos problemas mais frequentes; o que deve nos
alertar é que o coração está falhando, com episódios cada vez mais frequentes e sérios de Insuficiência Cardíaca.
Se, além disso, o paciente apresentar perdas proteicas urinárias moderadas a severas, é forte indicador
de que o paciente deve começar logo TSR.
Em relação à TFGe, ela não é, necessariamente, determinante para o início da TSR.
A perda acelerada da função renal deve, sim, alertar-nos; é importante lembrar que para um adulto saudável, a
partir dos 40 anos, é de 1 ml/ano, mas pode se acelerar até 3 a 5 ml/ano, se o paciente tiver proteinúria > que
2,5 g/24 h.
Os clássicos sintomas “urêmicos”, como astenia, anorexia, náusea, vômitos, prurido, mioclonias e
convulsões, alterações cognitivas, polisserosite, especialmente derrame pleural ou pericardite, eram muito
frequentes há 20 anos. Atualmente, com o desenvolvimento de técnicas mais precisas para o diagnóstico
precoce da DRC, como as fórmulas MDRD, CKD-EPI, diminuiu a frequência desse tipo de apresentação, embora
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persista um número preocupante de pacientes que ainda chega à TSR sem terem sido vistos pelo nefrologista,
ou que só foram vistos nos últimos meses, quando as medidas são não só tardias mas também ineficazes.
TIPOS DE TSR (8)
Quais são?
Vantagens e desvantagens de cada uma
O tratamento hemodialítico (HD), isto é, aquele que é realizado através de um circuito extracorpóreo
devidamente anticoagulado, através de um dialisador, produzindo um balanço negativo de solutos “urêmicos”,
ou seja, tóxicos, retidos pela IR (P, ureia, K etc.), e um balanço positivo de elementos que estão em déficit (Ca,
CO3H), sendo, além disso, necessário, na grande maioria de casos, um balanço negativo de líquidos, pela oligúria
da IR. Esses dois processos se produzem simultaneamente: transporte convectivo e difusivo.
Deve ser realizado através de um acesso vascular, que pode ser nativo, como a fístula arteriovenosa
protésica, que permita manter um fluxo sanguíneo adequado, maior que 300 ml/min.
O acesso vascular se transforma em autêntico calcanhar de Aquiles, devido à possibilidade de infecção
e trombose, além de a realização ser difícil, especialmente pelas frequentes condições comórbidas dos
pacientes, cada vez mais diabéticos e idosos.
Em geral, o tratamento hemodialítico deve ser realizado, no mínimo, três vezes por semana; quatro
horas de duração, com intervalos de 48 h e de 72 h, no fim de semana.
O tratamento com diálise peritoneal compreende a depuração realizada ao longo do dia, praticamente
todos os dias da semana.
É de escolha para determinados pacientes, particularmente, diabéticos e aqueles que querem ter maior
autonomia e menor dependência dos tratamentos hospitalares. Além disso, é de escolha em situações onde as
distâncias geográficas têm papel determinante.
É feita por meio de cateter peritoneal permanente colocado por via cirúrgica.
Os intercâmbios são feitos através do intercâmbio de líquidos, com determinada osmolaridade, permitindo
balanços negativos de líquidos e transporte. Este tratamento implica uma participação ativa do paciente e seu
grupo de convívio familiar, assim como certa infraestrutura na sua casa quanto à higiene, espaço e
biossegurança.
A metodologia consiste em permitir o intercâmbio de líquidos através da membrana peritoneal durante
um certo número de horas, extraí-lo e infundi-lo novamente, permitindo o intercâmbio três ou quatro vezes por
dia.
Há determinadas variantes, como a CAPD ou a diálise peritoneal noturna com cicladora, entre outras.
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A perda de capacidade de intercâmbio por esgotamento da membrana peritoneal poderá limitar a
duração desse tratamento.
A complicação mais perigosa, e uma das mais frequentes, é a infecção. Quadros de peritonite podem
ser não só perigosos para o paciente senão que vão limitando a capacidade da membrana peritoneal.
Transplante Renal Antecipado (TxA)
É realizado, por enquanto, em um número não significativo de pacientes. Seria indicado para os
pacientes com IRC (IR crônica), com TFGe menor que 20 ml/min, nos que o nefrologista considere que a
deterioração definitiva da função renal é irreversível e que irão necessitar, no período de 6-12 meses,
tratamento dialítico crônico. Nesses casos, é requisito quase exclusivo que o TxA seja com doador vivo
relacionado, ou autorizado por lei, em casos muito especiais. A escolha desse tipo de TSR permite ao paciente
recuperar sua função renal, caso o transplante seja bem sucedido, evitando tratamentos dialíticos crônicos.
O Tx renal, quando o paciente já tiver iniciado o tratamento dialítico, requer um doador vivo ou
cadavérico. Se for bem sucedido, o paciente deve recuperar total ou parcialmente a função renal, alcançando
uma boa qualidade de vida. Requer, invariavelmente, tratamentos imunossupressores para evitar a rejeição, em
esquemas que atinjam esse objetivo sem aumento das possibilidades de infecção. Não está ao alcance de todos
os pacientes em tratamento dialítico, devido às contraindicações pelos vários fatores de comorbidade.
Referências
1. Víctor Lorenzo Sellares. Consulta de Enfermedad Renal Crónica Avanzada. Experiencia de 12 años.
Nefrología. 2007;27:425-33.
2. Sola L, De Souza N, Sans A. Calidad de cuidado médico en una clínica de Enfermedad Renal Avanzada
con estrategia multicausal. Nefrología, Diálisis y Transplante. 2013;33(3)123-132.
3. Keith D, et al. Longitudinal Follow-up and Outcomes Among a Population with Chronic Kidney Disease
in a Large Managed Care Organization. Arch Int Med. 2004;164:659-6635.
4. Alles A, González M, González S, Torales S: Inducción de cambios en la conducta prescriptiva como
política sanitaria para mejorar detección de Enfermedad Renal Crónica oculta. Primer Premio al Mejor
Trabajo Científico. Revista Nefrología. 2011, Vol. 2:96.
5. Lorenzo V, Martín M, Rufino M, Hernández D, Torres A, Ayus JC.: predialysis nephrologic care and
functioning arteriovenous fistula at entry are associated with better survival in incident hemodialysis
patientes: an observational cohort study. Am J Kidney Dis. 43:999-1007, 2004.
6. Marinovich S, Lavorato Carlos, Bisigniano L, Soratti M, Hansen Krogh D, Celia E, Fernández V,
Tagliafichi V, Rosa Diez G, Fayad A, López A. Registro Argentino de Diálisis Crónica. 2012.
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7. KDIGO 12. Clinical Practice Guideline for the Evaluation and Management of Chronic Kidney Disease.
8. Lorenzo V, Torres A, Hernández D, Ayus JC. Manual de Nefrología Clínica, Diálisis y Transplante Renal.
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