CARACTERIZAÇÃO E AVALIAÇÃO DA LAMA ABRASIVA

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CARACTERIZAÇÃO E AVALIAÇÃO DA LAMA ABRASIVA
CARACTERIZAÇÃO E AVALIAÇÃO DA LAMA ABRASIVA PROVENIENTE
DO CORTE DE ROCHAS ORNAMENTAIS: UM ESTUDO COMPARATIVO
Joseane Damasceno MOTA1
Djane de Fátima OLIVEIRA2
Antonio Augusto Pereira de SOUSA
Marinalva Ferreira TRAJANO
Natália de Oliveira SANTIAGO
1
[email protected]
2
Av. das Baraúnas, 351, Campus Universitário, Bodocongó, CEP 58109- 753, Campina
Grande/PB
[email protected]
RESUMO: O setor de rochas ornamentais gera uma série de resíduos, tais como:
fragmentos e pó de rochas nas pedreiras e serrarias, lama abrasiva e, além disso, causam
ruído e vibrações. Desses resíduos gerados, o que mais preocupa o setor e os órgãos
ambientais é a lama abrasiva do desdobramento de rochas ornamentais, pois provocam
impactos consideráveis ao meio ambiente, como contaminação dos corpos hídricos,
colmatação do solo, poluição visual e estética. Em virtude da cobrança cada vez maior e
eficaz por parte dos órgãos ambientais e levando em consideração os altos custos de
armazenamento e descarte dos resíduos gerados pelo setor, fez com que os empresários
passassem a se preocupar com os impactos ambientais gerados nesta atividade
produtiva. Os procedimentos metodológicos seguidos para fins de comparação das duas
amostras de lama abrasiva coletadas em diferentes épocas foram as caracterizações
como análise química por fluorescência de raios-X e análise mineralógica por difração
de raios-X. Diante do exposto, o objetivo geral deste trabalho consiste em verificar as
modificações ocorridas na lama abrasiva durante o período de um ano, bem como
avaliar o potencial de aproveitamento dos rejeitos gerados nos processos de corte de
rochas ornamentais como insumo para a obtenção de materiais alternativos,
contribuindo efetivamente na mitigação dos impactos e passivos ambientais.
Palavras-chave: Caracterização, lama abrasiva, rochas ornamentais.
1 INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas a crescente preocupação com o meio ambiente tem sido motivo
de discussões de esfera nacional e internacional. As sociedades cobram dos governos
medidas mitigadoras de poluição do ambiente. Em termos de potencial poluidor, a
atividade industrial, é uma das fontes mais representativas na geração de impactos
ambientais, devido a um dos problemas mais críticos da atualidade que é a destinação
dos resíduos industriais e do passivo ambiental. No entanto, com a disponibilidade e
utilização atual de melhores tecnologias, que conformam a dinâmica do
desenvolvimento industrial - impulsionada pela pressão de um mercado globalizado
cada vez mais competitivo e exigente quanto à preservação ambiental, esse cenário vem
sendo modificado.
A Indústria da Rocha Ornamental caracteriza-se pela produção de elevadas
quantidades de resíduos, entre os quais, com marcada incidência, os resíduos da lama
abrasiva resultantes da fase de transformação. A atividade transformadora das rochas
ornamentais está fortemente representada no Estado da Paraíba e, embora seja muito
importante a nível econômico e social, ao longo dos anos tem-se assistido a graves
problemas relacionados com a inexistência de um sistema de gestão dos resíduos do
setor (SOUSA, 2007).
Embora a atividade de exploração e beneficiamento de rochas ornamentais por um
lado cause um considerável impacto ambiental, por outro, ela não pode ser
simplesmente paralisada devido a sua importância econômica. Neste contexto, diversos
estudos têm despertado interesses socioambientais de pesquisadores, empresários e
órgãos públicos fiscalizadores, na busca de desenvolver caminhos tecnológicos para
viabilizar aplicações dos resíduos gerados no processo de beneficiamento de rochas
ornamentais tanto na construção civil como em outros produtos de interesse comercial.
Diante do exposto, o objetivo deste trabalho consiste em caracterizar e estudar a
aplicação dos rejeitos da lama abrasiva oriunda do desdobramento de rochas
ornamentais, inclusive buscando a viabilidade técnica e tecnológica para a utilização
deste na fabricação de materiais na construção sustentável.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
O Brasil é um dos países em desenvolvimento que enfrenta dificuldades com os
resíduos provenientes das indústrias de rochas ornamentais que uma vez dispostos,
inadequadamente, causam danos ambientais. No Brasil, a quantidade estimada da
geração conjunta do resíduo de corte de mármore e granito é de 240.000 toneladas/ano,
aproximadamente, distribuídas entre Espírito Santo, Bahia, Ceará, Paraíba, entre outros
estados. O Estado do Espírito Santo produz cerca de 50.000 t/ano de pó de granito
(GONÇALVES, 2000).
Esses resíduos em sua grande maioria são lançados em lagoas de decantação e
aterros. Além da contaminação direta dos aquíferos superficiais, os rejeitos da indústria
de rochas ornamentais descaracterizam a paisagem e preocupam as autoridades
públicas, órgãos sanitários e a população localizada no entorno das serrarias e áreas da
extração (SOUZA et. al., 2010).
2.1 Resíduos oriundos do desdobramento de granito
O beneficiamento de rochas ornamentais refere-se ao desdobramento de materiais
brutos, extraídos nas pedreiras em forma de blocos. Os blocos são beneficiados,
sobretudo através da serragem (Figura 1) em chapas com espessuras que variam de 1 a 3
cm, por máquinas denominadas teares, para posterior acabamento e esquadrejamento até
sua dimensão final (SOUSA e RODRIGUES, 2002).
FIGURA 1- Corte de blocos de granitos com auxílio de lama abrasiva.
FONTE: PRÓPRIA, 2010.
Durante a serragem, em teares tradicionais de lâminas de aço é gerado um resíduo
sólido proveniente da lama ou polpa abrasiva utilizada com os objetivos de lubrificar e
esfriar as lâminas de serragem, evitar a oxidação das mesmas, limpar os canais entre
chapas e servir como abrasivo para facilitar a serragem. Essa lama abrasiva é composta
basicamente de água, granalha (mini-esferas de aço ou ferro fundido), cal (calcário ou
carbureto de cálcio) e rocha moída (GONÇALVES, 2000).
A lama abrasiva é distribuída por chuveiros sobre o bloco por meio de
bombeamento. Após infiltrar-se nos canais abertos pelas lâminas no bloco, a lama
retorna ao tanque de bombeamento, quando novamente é bombeada, configurando-se
assim uma operação em circuito fechado (CALMON et al., 1997).
Algumas empresas utilizam sistemas de desidratação, como o filtro-prensa, que
consiste em um processo de prensagem que elimina da lama abrasiva o excesso de água
e devolve à indústria esta mesma água para ser reutilizada e o resíduo úmido obtido é
então descartado (FIGURA 2) (CALMON et al., 1997).
FIGURA 2: Lama abrasiva descartada misturada com abrasivo.
FONTE: PRÓPRIA, 2010.
A partir deste descarte, o resíduo é transportado e, posteriormente, depositado em
poços e lançados em tanques de deposição final, estes tanques absorvem toda a geração
de rejeito do desdobramento. Uma vez cessada esta capacidade, o volume depositado é
removido para que o tanque fique novamente pronto para estocagem de nova quantidade
de resíduo.
3 CARACTERIZAÇÃO DA LAMA ABRASIVA
Para efetivação da pesquisa utilizou-se a as amostras da lama abrasiva
(peneirada na malha fina Nº 200), oriunda do processo de desdobramento de uma das
indústrias de beneficiamento de granito em Campina Grande-PB. A coleta das amostras
da lama abrasiva ocorreu na forma de polpa (pó) e seca na estufa a 110°C, sendo
armazenada em sacos plásticos identificados através de etiquetas. Caracterizou-se então,
as amostras de lama abrasiva quanto à análise química com um equipamento EDX-700
de marca Shimadzu e a difração de raios-X com um equipamento XRD-6000 de marca
Shimadzu. As análises foram realizadas no laboratório de ensaios de materiais do
Centro de Tecnologias do Gás – LABEMAT/CTGÁS - Natal/RN.
As amostras foram analisadas em diferentes épocas (2009 e 2010) e por isto um
trabalho comparativo relacionando as principais mudanças enquanto às análises
químicas e mineralógicas das amostras de lama abrasiva (LA1 E LA2).
Análise Química: para esta análise química o pó foi prensado em prensa manual em
forma de pastilha, com diâmetro de cerca de 15 mm. Utilizou-se equipamento de
fluorescência de raios-X com e o método dos parâmetros fundamentais com resultados
normalizados em 100%. Por limitação do método, somente elementos entre Na (11) e U
(92) são analisados. O equipamento utilizado foi EDX-700 de marca Shimadzu. Para a
avaliação da perda ao fogo, o material após seco em estufa por 24 h em temperatura de
110ºC, foi aquecido até 1000ºC por 20 minutos.
Análise Mineralógica: para identificação da mineralogia da amostra, parte do pó foi
submetida à análise de difração de raios-X e a identificação das fases se deu por
comparação entre o resultado obtido com cartas cristalográficas cadastradas no banco de
dados do ICDD (International Centre for Diffraction Data). O equipamento utilizado foi
XRD-6000 de marca Shimadzu.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
As caracterizações realizadas para a Lama Abrasiva proveniente do corte de
rochas ornamentais foram: Análise química e mineralógica por Fluorescência de RaiosX e Difração de Raios-X, respectivamente.
A Tabela 1 apresenta os resultados das análises químicas em % de peso em
óxidos da amostra de lama abrasiva.
Tabela 1 - Resultado das análises químicas das amostras da lama abrasiva (LA1 e
LA2).
Óxidos
(%)
SiO2
Al2 O3
Fe2O3
LA1
14,60
5,85
LA 2
49,47
14,39
K2O MgO
CaO
Na2 O TiO2 Outros
PF
8,74
1,89
1,59
40,67
0,87
1,43
0,32
24,04
11,76
6,28
2,21
8,79
1,99
1,14
1,24
2,73
Na comparação entre as lamas abrasivas (LA1 e LA2) observa-se uma grande
diferença nos percentuais de óxidos, principalmente para os óxidos de silício, alumínio
e cálcio. Onde para a LA1 o percentual de sílica é de 14,60%, valor este, três vezes
menor que o da LA2, com 49,47%. Isso se deve provavelmente ao fato de que houve
um aumento no desgaste do bloco de pedra durante o processo de serragem,
aumentando dessa forma, a quantidade do pó de pedra, principal constituinte da lama
abrasiva.
A composição do óxido de cálcio (CaO) para a LA1 (40,67%) é muito superior
ao percentual da LA2 (8,79%), isso é um provável indicativo de que acorreu uma
diminuição na utilização da cal durante o processo de beneficiamento de rochas
ornamentais, o qual é essencial na serragem do bloco de pedra.
A LA2 possui um teor considerável de alumina (14,39%) e óxido de ferro
(11,76%). Os valores de SiO2, Al2O3 e Fe2O3 totalizaram cerca de 76% superando
assim, o valor mínimo de 70% exigido pela ASTM C618 (2005) indicando assim que a
lama abrasiva (LA2) estudada tem provavelmente atividade pozolânica.
Os óxidos de cálcio (CaO) e ferro (Fe2O3) presentes na lama abrasiva foram
derivados respectivamente da cal utilizada como lubrificante e das granalhas de aço
utilizadas na etapa de desdobramento dos blocos em chapas.
As Figuras 3 e 4 apresentam o difratograma de raios X onde identificam-se
alguns dos compostos presentes na LA1 e LA2 respectivamente:
FIGURA 3: Difratograma de Raios-X da Lama Abrasiva (LA1).
FONTE: CTGÁS (Laboratório de Ensaios de Materiais), 2009.
FIGURA 4: Difratograma de Raios-X da Lama Abrasiva (LA2).
FONTE: CTGÁS (Laboratório de Ensaios de Materiais), 2010.
Os resultados das análises mineralógicas com identificação das fases da amostra
da lama abrasiva (LA1 e LA2) evidencia que estas são constituídas basicamente dos
minerais calcita, quartzo, magnesiorniblenda, ilita, anortita e biotita.
Observa-se que os difratogramas possuem semelhanças entre os minerais
existentes, principalmente relacionado ao pico expressivo do quartzo (3,33 Å),
indicando que a sua presença na amostra deve-se a serragem do bloco de pedra.
No difratograma de raios X da LA1 percebe-se que além do quartzo, esta
também possui os minerais calcita, magnesiorniblenda, ilita, anortita em sua fase
cristalina.
A anortita é um dos minerais da série da plagioclase, um dos grupos de minerais
mais abundantes na crusta. Ocorre nas rochas ígneas e metamórficas. Como o quartzo,
este também apareceu na amostra devido à serragem. Sua fórmula química anortita é
CaAl2Si2O8.
A ilita, o pico mais expressivo, com maior intensidade representa um mineral
argiloso cuja estrutura está essencialmente relacionada com as micas e que são
encontradas nas rochas calcárias. Provavelmente deve-se ao considerável aumento da
quantidade de cal colocada no processo do beneficiamento de granito.
A Biotita, que apresenta um pico expressivo na AL2, com maior intensidade, é
um mineral comum da classe dos silicatos, subclasse dos filossilicatos , grupo das micas
(presente na formação dos granitos) e subgrupo ferromagnesianas, formando uma série
com o mineral flogopita, que contem na sua composição potássio, magnésio, ferro e
alumínio. Cristaliza no sistema monoclínico, apresentando brilho nacarado a metálico.
A sua formula química é K(Mg,Fe)3(OH,F)2(Al,Fe)Si3O10.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base nos estudos realizados sobre a caracterização da lama abrasiva no
desdobramento de rochas ornamentais, certifica-se:
As análises químicas da LA1 e LA2 foram por fluorescência de raios-X mostrou
que as maiores diferenças entre as amostras foram com relação aos óxidos de silício,
alumínio e cálcio onde a LA1 apresentou menores percentuais de sílica e alumínio e um
maior percentual de cálcio, fator devido provavelmente pela maior quantidade de cal
utilizada no corte da pedra na LA1.
Na difração de raios-x observou-se uma semelhança na LA1 e na LA2,
evidenciando-se apenas uma quantidade de quartzo na LA2 e um elevado teor de ilita na
LA1, dado que corrobora com a análise química pelo percentual de óxido de cálcio
encontrado.
A utilização da lama abrasiva com origem da serragem de rochas ornamentais
pode ser usada como material alternativo para construção civil, como tijolos para fins
estruturais; bloquetes para calçamentos de ruas, filers, calçadas em substituição aos
produtos convencionais.
Assim, podemos concluir que as análises mostraram que ocorreu uma pequena
mudança nos elementos encontrado na lama abrasiva com o passar do tempo e que este
resíduo é um material promissor, pois este pode assumir um papel muito importante na
sua reutilização, minimizando o impacto ambiental que este causa.
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