simplex ou simplório?

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simplex ou simplório?
SIMPLEX OU SIMPLÓRIO?
* João Luís Traça
Através da Portaria n.º 1593/2007, de 17 de Dezembro, o Ministério da Administração Interna criou
o Sistema de Queixa Electrónica (SQE). Através do SQE será possível apresentar queixas-crime
online e consultar o estado da queixa até esta transitar para a entidade competente.
O SQE é um serviço partilhado pela GNR, PSP e SEF que recebe queixas-crime. Após a recepção
destas, as queixas são encaminhadas para a “entidade competente”, a qual procederá à sua
transferência “atempada” para os serviços do Ministério Público territorialmente competentes. O
SQE só pode ser utilizado para um conjunto limitado de crimes, tais como, violência doméstica,
maus tratos, furto, roubo, lenocínio, angariação de mão-de-obra ilegal ou danos contra a natureza.
Após a inserção dos factos, o queixoso deve “autenticar a submissão da queixa” por um dos
seguintes meios: (i) assinatura digital com recurso ao cartão do cidadão; (ii) confirmação a partir de
uma conta VIACTT; ou (iii) “confirmação presencial junto de qualquer posto da GNR, esquadra da
PSP, balcões do SEF em loja do cidadão, bem como nas estações dos CTT”. Concluída a
autenticação, a queixa é “enviada às autoridades competentes”.
Segundo o preâmbulo deste diploma, o SQE é mais um passo na implementação do SIMPLEX 2007,
desta vez na vertente de e-policing, uma palavra que sugere modernidade e sofisticação para um
sistema de pouca ou nenhuma utilidade. Senão vejamos.
Por um lado, o conjunto de crimes relativamente aos quais se pode utilizar o SQE não é claro e vai,
certamente, provocar mais dúvidas que certezas no momento da tomada de decisão de recorrer ao
SQE. Na verdade, a maioria dos portugueses não conhece o crime de lenocínio ou qual a diferença
entre furto e roubo.
Por outro lado, na quase totalidade das situações de utilização do SQE será necessária a deslocação
a uma esquadra, estação dos CTT ou balcão do SEF. Na verdade, muito poucos portugueses
dispõem, ou num futuro próximo virão a dispor, de uma conta VIACTT ou de um leitor de cartões
inteligentes compatível com o cartão do cidadão. Em termos práticos, o SQE não evita visitas a
instalações públicas, apenas permite que a queixa, propriamente dita, seja redigida no conforto do
lar, quiçá de pantufas calçadas, ao invés de uma esquadra fria, com bancos duros e na presença de
marginais. Se o “e-policing” é isto é, de facto, muito pouco.
Por fim, o SQE apenas permite a realização da queixa. Uma vez autenticada, a queixa é encaminhada
“à autoridade competente”, ou seja, entra nesse grande buraco negro dos processos em fase de
inquérito e o queixoso deixa de poder beneficiar do SQE para aceder a qualquer informação
adicional. Por exemplo, saber se se verificou o arquivamento da queixa apresentada via SQE.
O SQE é um bom exemplo de como construir uma casa pelo telhado. Nos processos crime a
prioridade no recurso às novas tecnologias e ao e-government deverá consistir em melhorar e agilizar
a organização interna dos serviços de modo a assegurar a transparência e a informação junto dos
cidadãos sobre a evolução das queixas por si apresentadas.
Enfim, o SQE faz lembrar as empresas que na década de 90 afirmavam estar preparadas para os
desafios do e-commerce e que, por cada encomenda feita através do seu site, recebiam um fax, por
não disporem de conta de correio electrónico. Mas o SQE tem ainda uma agravante: esquece tudo o
que se aprendeu em outros bons exemplos de e-government, designadamente, a reforma das
certidões do registo comercial ou a entrega das declarações fiscais. Os bons exemplos, pelos vistos,
continuam a não fazer escola.
* Advogado / Sócio

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