pacientes pediátricos com citopenias persistentes guia de
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GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA PACIENTES PEDIÁTRICOS COM CITOPENIAS PERSISTENTES GUIA DE INVESTIGAÇÃO 2012 Comitê de Falências Medulares Marlene Pereira Garanito Celia Martins Campanaro Silvia Liporini Coordenação Dr. Luiz Fernando Lopes GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA ÍNDICE INTRODUÇÃO ..............................................................................................pg 3 INVESTIGAÇÃO DE PANCITOPENIA ..............................................................pg 4 INVESTIGAÇÃO DE NEUTROPENIA ...............................................................pg 7 INVESTIGAÇÃO DE ANEMIA ........................................................................pg 12 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................pg 15 2 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA INTRODUÇÃO As síndromes mielodisplásicas (SMD) são doenças raras em pediatria e representam menos de 5% de todas as neoplasias hematopoéticas, em pacientes com idade inferior a 14 anos. Neste grupo de doenças, a citopenia refratária é o subtipo mais comum e representa 60% das SMD primárias em pediatria e, de acordo com estudo do Grupo Europeu de SMD (EWOG-MDS 98), aproximadamente 80% destes pacientes apresentam hipocelularidade na medula óssea. 1 Figura 1 Figura 1. Síndrome Mielodisplásica Primária Total de pacientes N=324 Citopenia refratária N=193 Interim Analysis (EWOG-MDS 98), February 2007 1 Além disso, a SMD pode fazer interface com as leucemias mielóides agudas (LMA), doenças mieloproliferativas crônicas (DMPC), anemia aplástica adquirida, falências medulares congênitas, enfim, com várias formas passíveis de confusão diagnóstica. Da mesma forma que outras condições clínicas (colagenoses, deficiência de vitamina B12, infecções virais, etc) podem apresentar alterações hematológicas, mimetizar SMD e gerar confusão e erro diagnóstico.2 Neste contexto, no intuito de estabelecer uma rotina na investigação das citopenias refratárias, visando a melhoria do diagnóstico e tratamento; possibilitar melhor notificação dessas patologias; auxiliar os serviços que não possuem o suporte propedêutico necessário para investigações avançadas e estudar a interface entre as doenças que provocam citopenias e que evoluem para SMD ou então que são SMD hipocelular e se confundem com algumas outras doenças, apresentamos um guia de orientação, composto por algoritmos, sobre como investigar os pacientes pediátricos (idade inferior a 18 anos), com citopenias persistentes. 3 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA INVESTIGAÇÃO DE PANCITOPENIA SMD (8) Adaptado de Practical Algorithms in Pediatric Hematology and Oncology, 2003 3 (1) Pancitopenia: Neutrófilos < 1000/mm3 para recém-nascidos caucasianos e crianças até 1 ano de idade. Neutrófilos < 1500/mm3 para pacientes da raça branca, a partir de 1 ano até a idade adulta. Indivíduos afrodescendentes apresentam limites inferiores normais mais baixos do que os caucasianos. Estes limites variam de 200 a 600/mm3 neutrófilos circulantes a menos. Consideraremos neutropenia para afrodescendentes o valor médio de neutrófilos < 1000/mm3.4 Plaquetas < 150.000/mm3 e hemoglobina < 11 g/dl para pacientes entre 6 meses e 6 anos ou hemoglobina < 12 g/dl para pacientes entre 6 anos 1 mês e 14 anos. Todos os pacientes, independente do diagnóstico final, deverão ser matriculados no GCBSMD-PED, em impresso próprio. Os casos suspeitos de Anemia Aplástica, Anemia de Fanconi, Disqueratose congênita e SMD devem ser encaminhados ao GCB-SMDPED para avaliação. (2) Evidência de hemólise: hiperbilirrubinemia indireta, anisocitose, RDW aumentado, haptoglobina baixa, hemoglobinúria e DHL aumentada.3 (3) Anemia hemolítica auto-imune, plaquetopenia e neutropenia auto-imunes podem ocorrer ocasionalmente e, nestas condições o teste de Coombs é quase sempre 4 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA positivo. Neste contexto, deve-se considerar investigar doenças do colágeno, principalmente lupus eritematoso sistêmico. 3 (4) O hiperesplenismo habitualmente se manifesta com pancitopenia leve a moderada, resultante da combinação de sequestro esplênico e anemia hemolítica. A esplenomegalia é proeminente e sua etiologia é evidente. Doença hepática crônica e/ou hipertensão portal devem ser consideradas. O mielograma apresentase normo/hipercelular.3 (5) Caracterizada por hemólise intravascular, com episódios intermitentes de hemoglobinúria, tendência a maior número de infecções, trombose venosa em 1/3 dos pacientes, hematopoese deficiente (anemia macrocítica na periferia e hiperplasia eritróide na medula óssea ; alguns evoluem para anemia aplástica grave e hipoplasia medular). Apesar de condição muito rara em pediatria, deve ser considerada em crianças com pancitopenia inexplicada ou trombose, uma vez descartadas outras causas. Para o diagnóstico sugere-se citometria de fluxo para análise de CD55 e CD59.5 (6) Várias infecções virais e bacterianas podem causar pancitopenia. Contudo, raramente a medula óssea é aplásica e a recuperação da pancitopenia coincide com a resolução da infecção. Sugerimos pesquisar: HIV, hepatites (A, B, C) citomegalovírus, toxoplasmose, Epstein Baar, Parvovírus B19, tuberculose, sorologias regionais (calazar, malária, etc). (7) Classificada em grave (medula óssea com celularidade < 25% ou 25% a 50% com < 30% de células hematopoéticas residuais associada a 2 itens dos três a seguir : neutrófilos < 500/mm3, plaquetas < 20.000/mm3, reticulócitos < 20.000/mm3); muito grave (mesma definição de anemia aplástica grave associada a neutrófilos < 200/mm3 ) e não grave (paciente que não preenchem os critérios anteriormente citados). Para a confirmação do diagnóstico deve-se excluir: infecções virais, hemoglobinúria paroxística noturna, deficiência de vitamina B12 e folato, anemias aplásticas constitucionais (Anemia de Fanconi, Diqueratose congênita) e SMD hipocelular.6 (8) SMD em pediatria é definida pela presença de pelo menos 2 dos seguintes critérios diagnósticos: citopenia persistente inexplicada, mielodisplasia de pelo menos 2 linhagens, anormalidades citogenéticas clonais adquiridas, número de blastos 5%, ausência obrigatória de anormalidades citogenéticas de LMA. Diagnósticos diferenciais: infecções, deficiências nutricionais, doenças metabólicas, síndrome de Pearson e falências medulares congênitas. 7 (9) A Anemia de Fanconi: doença autossômica recessiva ou ligada ao X, caracterizada por falência medular progressiva (com início na primeira década), anormalidades 5 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA congênitas (esqueléticas, pele, renal, gastrointestinal, cardíaca, baixa estatura, etc) e predisposição a doenças malignas como SMD e LMA. Atualmente, apesar de 14 genes descritos e associados à Anemia de Fanconi, na prática clínica o diagnóstico é feito por meio de história, exame físico, biópsia de medula óssea, citogenética e teste indutor de quebra cromossômica com diepoxibutano (Debtest) ou mitomicina. Apesar de os pacientes portadores de Anemia de Fanconi, habitualmente apresentarem anormalidades congênitas, a ausência destas não exclui este diagnóstico. Portanto, deve-se sempre excluir este diagnóstico em pacientes portadores de anemia aplástica e com fenótipo aparentemente normal.8,9 (10)Disqueratose congênitca: padrão de herança ligado ao X, autossômico recessivo, dominante ou esporádico, caracterizada por defeito na manutenção do telômero. Classicamente o paciente apresenta falência medular, pigmentação reticular da pele, unhas distróficas e leucoplasia de mucosa. Os pacientes afetados são normais ao nascimento, as alterações cutaneomucosas ocorrem na infância e a falência medular na adolescência. Além da forma clássica, tem-se as formas atípica (falência medular e outras manifestações clínicas como fibrose pulmonar) e silenciosa (sem menifestações clínicas). Até o momento temos 6 genes identificados e 50% dos pacientes permanecem descaracterizados. Ao diagnóstico podem apresentar medula óssea hipcoelular, SMD hipocelular ou SMD/LMA. Na prática clínica, a história, exame físico, citogenética, biópsia de medula e o comprimento telomérico permitem o diagnóstico. Aproximadamente 10% dos pacientes evoluem com doenças malignas e óbito na terceira década de vida.8,10 6 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA INVESTIGAÇÃO DE NEUTROPENIA Adaptado de Practical Algorithms in Pediatric Hematology and Oncology, 2003 3 (11) Neutrófilos < 1000/mm3 para recém-nascidos caucasianos e crianças até 1 ano de idade. Neutrófilos < 1500/mm3 para pacientes da raça branca, a partir de 1 ano até a idade adulta. Indivíduos afrodescendentes apresentam limites inferiores normais mais baixos do que os caucasianos. Estes limites variam de 200 a 600/mm3 neutrófilos circulantes a menos. Consideraremos neutropenia para afrodescendentes o valor médio de neutrófilos < 1000/mm3.4 Todos os pacientes, independente do diagnóstico final, deverão ser matriculados no GCBSMD-PED, em impresso próprio. Os casos suspeitos de Neutropenia cíclcia, Neutropenia imune, Neutropenia congênita grave, Mielodisplasia, Síndrome de Scwachman-Diamond e Síndrome de Pearson devem ser encaminhados ao GCBSMD-PED para avaliação. (12) Define-se neutropenia aguda como aquela detectada em vigência de condições agudas como uso ou exposição a drogas, infecções virais, bacterianas, fúngicas, etc. Espera-se que nestas condições, ocorra normalização do número de neutrófilos no intervalo médio de 3 a 4 semanas.3 (13) A neutropenia induzida por drogas com freqüência envolve reação idiossincrática. As drogas mais envolvidas são antimicrobianos (aciclovir, cafalosporinas, cloranfenicol, ciprofloxacina, clindamicina, gentamicina, 7 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA isoniazida, linezolida, macrolídeos, mebendazol, metronidazol, norfloxacina, penicilinas, vancomicina, zidovudina, etc), analgésicos e antinflamatórios (acetaminofen, ácido acetilsalicílico, diclofenaco, dipirona, indometacina, ibuprofeno, naproxeno, etc), antipsicóticos, sedativos e antidepressivos (clorpromazina, diazepam, fluoxetina, haloperidol, levopromazina, etc), anticonvulsivantes (carbamazepina, fenitoína, ácido valpróico, etc) e drogas antitireoideanas, cardiovasculares e para o tratamento de doanças reumatológicas. Habitualmente, após a interrupção do uso, ocorre a recuperação do número de neutrófilos. 3,4 (14) As infecções virais são a causa mais comum de neutropenia transitória. Nestas condições, a neutropenia pode persistir por 3 a 8 dias, durante a viremia aguda. Habitualmente, estes pacientes não necessitam receber antibióticos durante o episódio febril; a menos que exista a evidência de neutropenia crônica e grave (< 500/mm3) que não está sujeita a se resolver rapidamente. A abordagem, nos casos simples, é repetir a contagem de neutrófilos 3 a 4 semanas depois, quando a neutropenia, com freqüência, apresenta recuperação. Se a neutropenia persistir após esta período, deve-se investigar hepatite (A,B,C) e vírus da imunodeficiência adquirida. Caso estas sorologias apresentem-se negativas, o paciente deverá entrar para o protocolo de investigação de neutropenia crônica3 (15) As infecções bacterianas e fúngicas frequentemente causam neutropenia. O ideal é que nova contagem de neutrófilos seja realizada 3 a 4 semanas depois. Se a neutropenia persistir, deve-se considerar a possibilidade de o quadro infeccioso ser secundário a um quadro de neutropenia grave pré existente. Neste caso, há indicação de investigação e o paciente deverá entrar para o protocolo de investigação de neutropenia crônica3 (16) Definimos neutropenia crônica como aquela detectada em 2 hemogramas com intervalo de 4 semanas. (17) O exame físico e a história de quadros infecciosos de repetição, ou não, devem ser considerados nas neutropenias agudas e crônicas. Habitualmente, os pacientes com ausência quadros infecciosos de repetição, apresentam neutrófilos > 500/mm3 e, nestes casos, deve-se considerar as seguintes hipóteses diagnósticas: neutropenia benigna crônica, neutropenia cíclica benigna e neutropenia imune. (18) A neutropenia benigna crônica (neutropenia familiar benigna) é caracterizada por neutropenia leve e ausência de infecções de repetição. O padrão de herança 8 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA é autossômico dominante e tem sido identificado em algumas famílias. Nestes casos, deve-se excluir a neutropenia imune.11 (19) A neutropenia cíclica caracteriza-se por padrão de herança autossômico dominante ou esporádico e oscilação regular do número de neutrófilos a cada 21 dias. Os pacientes cujo número de neutrófilos, no nadir, não é inferior a 500/mm3, habitualmente não apresentam quadros infecciosos de repetição e não há indicação para o uso de filgrastima (GCSF). Esta condição é denominada neutropenia cíclica benigna. Contudo, alguns pacientes podem apresentar, no nadir, o número de neutrófilos inferior a 500/mm3 , associado a quadros infecciosos graves e de repetição (úlceras orais, gengivite,estomatite, febre, pneumonia, lesões de pele, etc). Nestes casos, está indicado o uso de GCSF profilático.11 (20) A neutropenia auto imune pode ocorrer de forma isolada, em associação com outras doenças auto imunes (anemia hemolítica auto imune, púrpura trombocitopênica, síndrome linfoproliferativa auto imune (ALPS), lúpus eritematoso sistêmico) ou secundária a infecções (mononucleose, síndrome da imunodeficiência adquirida) drogas (iburpofeno, penicilinas, fenitoína) e doenças malignas (leucemia, linfoma e doença de Hodgkin). Muitos casos de neutropenia imune em crianças e adultos são reconhecidos como secundários à auto imunidade, isto é, anticorpos anti neutrófilos. O pico de incidência é em crianças e adolescentes, trata-se de doença benigna que remite espontaneamente. Fato que chama a atenção é que apesar da neutropenia – podendo atingir até contagem de neutrófilos < 200/mm3 – os quadros infecciosos não são comuns. A medula óssea evidencia celularidade normal ou aumentada, com hiperplasia mielóide e número normal ou aumentado de neutrófilos maduros. A presença de anticorpo anti neutrófilo auxilia no diagnóstico. Neste contexto, estes pacientes não necessitam receber GCSF. No período neonatal, à semelhança da isoimunização Rh, pode ocorrer a neutropenia imune transitória, que pode durar várias semanas e o recém nascido, com frequência, é assintomático. 11 (21) Quadros infecciosos: celulites, abcessos, estomatites, pneumonias, infecção perianal, sepse bacteriana e/ou fúngica, úlceras orais, etc. (22) Corresponde a um grupo heterogêneo de doenças, com padrão de herança autossômico dominante, recessivo, ligado ao X e casos esporádicos. Caracterizam-se pela parada de maturação em promielócitos, número de neutrófilos < 500/mm3, infecções graves na primeira infância e alto risco de progressão para leucemia mielóide aguda. Até o momento, foram descritos os genes ELA2, GFI1, WAS, CSF3R e G6PC3 associados à neutropenia congênita 9 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA grave e o gene HAX1 associado à síndrome de Kostmann. O diagnóstico é firmado por biologia molecular e o tratamento, até o momento, consiste no uso de GCSF. 11,12 (23) SMD em pediatria é definida pela presença de pelo menos 2 dos seguintes critérios diagnósticos: citopenia persistente inexplicada, mielodisplasia de pelo menos 2 linhagens, anormalidades citogenéticas clonais adquiridas, número de blastos 5%, ausência obrigatória de anormalidades citogenéticas de LMA. Diagnósticos diferenciais: infecções, deficiências nutricionais, doenças metabólicas, síndrome de Pearson e falências medulares congênitas.7 (24) Doença autossômica recessiva, resultante de mutação no gene CHS1, que determina granulopoese inefetiva e neutropenia. Caracteriza-se por albinismmo oculocutâneo, infecções bacterianas graves e de repetição, gengivite e periodontite, neuropatia periférica e central e linfohistiocitose hemofagocítica. No sangue periférico há neutrófilos com grânulos gigantes e na medula óssea há infiltrado linfohistiocitário generalizado, na fase acelerada.11 (25) Entre as doenças metabólicas associadas a neutropenia temos: Síndrome de Barth’s, hiperglicemia, acidemia propiônica, acidemia metilmalônica e tirosinemia. O mecanismo etiopatológico aceito é a supressão da mielopoese. Além destas, vale lembrar a glicogenose IB e a síndrome de Pearson.11 (26) A neutropenia na síndrome da imunodeficiência adquirida por ser imune mediada ou secundária a toxicidade medular pelo vírus. (27) As imunodeficiências primárias correspondem a um grupo heterogêneo composto por mais de 120 doenças causadas por defeitos intrínsecos na função do sistema imune. Muitas dessas doenças estão associadas a anormalidades na hematopoese e têm a neutropenia como importante achado. Nesse grupo de doenças, estão associadas à neutropenia, entre outras, a agamaglobulinemia ligada ao X (XLA) e a síndrome de hiper-IgM ligada ao X. A XLA é caracterizada por quadros de infecção bacteriana de repetição durante a primeira infância, hipogamaglobulinemia e redução do número de linfócitos B no sangue periférico. A neutropenia associada á síndrome de hiper-IgM ligada ao X ocorre em aproximadamente 40% a 50% dos pacientes e pode ser secundária a um decréscimo da produção medular dos neutrófilos ou por mecanismos imunes. Os pacientes se apresentam na infância com infecções bacterianas frequentes e alguns morrem nos primeiros anos de vida.13 (28) Shwachman-Diamond: doença autossômica recessiva, resultante do defeito na biogênese do ribossomo, caracterizada por insuficiência pancreática exócrina, 10 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA falência medular e anormalidades esqueléticas. O gene associado a esta doença é o SBDS e, do ponto de vista hematológico, além da falência medular, os pacientes podem evoluir para mielodisplasia e leucemia mielóde aguda. O tratamento consiste na reposição de enzimas pancreáticas e filgrastima para manter o número de neutrófilos > 1000/mm3. Durante o acompanhamento é fundamental a avaliação anual da medula óssea, para detectar anormalidades citogenéticas clonais. O transplante de células tronco hematopoéticas é o único tratamento curativo.8 (29) Síndrome de Pearson: doença resultante de defeito enzimático mitocondrial, com repercussão sistêmica que se manifesta no primeiro ano de vida. Caracterizada por pancitopenia associada a disfunção pancreática exócrina, falência hepática e tubulopatia renal que podem causar acidose lática. As células precursoras hematopoéticas apresentam vacuolizações e a maioria dos pacientes evoluem a óbito antes dos 3 anos de idade, cuja principal causa é a acidose metabólica seguida de falência hepática e renal. A vacuolização dos precursores hematopoéticos, fibrose pancreática a ausência de anormalidades esqueléticas, permite distinguir Pearson de Shwachman-Diamond. O manejo consiste em transfusão de concentrado de hemácias, eritropoetina e filgrastima.8 11 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA INVESTIGAÇÃO DE ANENIA Adaptado de Practical Algorithms in Pediatric Hematology and Oncology, 2003 14,15,16 (30) Definimos anemia como: hemoglobina < 11 g/dl para pacientes entre 6 meses e 6 anos ou hemoglobina < 12 g/dl para pacientes entre 6 anos 1 mês e 14 anos. Todos os pacientes, independente do diagnóstico final, deverão ser matriculados no GCB-SMD-PED, em impresso próprio. Os casos suspeitos de doenças congênitas ou adquiridas, anemia hipoplásica, hipoplasia eritróide pura, SMD e anemia diseritropoética congênita devem ser encaminhados ao GCB-SMD-PED para avaliação. (31) Volume corpuscular médio inferior a 80fl. 17 Neste grupo, além dos diagnósticos diferenciais clássicos (anemia ferropriva, talassemias e hemoglobinopatias), deve-se considerar como outras hipóteses diagnósticas a anemia de doença crônica e a anemia sideroblástica. Apesar de habitualmente a anemia associada à doença crônica ser normocítica, 20% a 30% dos pacientes apresentam microcitose.14 (32) Anemia sideroblástica: constitui um grupo raro e heterogêneo de anemias caracterizado por anemia microcítica, normocítica ou macrocítica, reticulocitopenia, depósito de ferro anormal nas mitocôndrias dos eritroblastos medulares (sideroblástos em anel). Diagnóstico: medula óssea hipercelular, com 12 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA hiperplasia eritróide e presença de mais de 15% de sideroblastos em anel .Tratamento: transfusão de concentrado de hemácias, vitamina B6 e transplante de medula óssea.18 (33) Volume corpuscular médio superior a 95 fl. 17 (34) A anemia macrocítica induzida por drogas é a etiologia mais comum de macrocitose nas crianças nos países industrializados. A patogênese não é clara. As drogas mais comumente envolvidas são agentes quimioterápicos (6mercaptopurina / hidroxiuréia), anticonvulsivantes (carbamazepina/ ácido valpróico/ fenitoína/ fenobarbital), zidovudina, agentes imunossupressores e sulfas. Diagnóstico: história do uso da medicação e afastar deficiência de vitamina B12 e folato. Tratamento: considerar a interrupção do uso da droga.16 (35) As anemias megaloblásticas não relacionadas à deficiência de vitaminas ou drogas são raras e podem ser congênitas (deficiência de transcobalamina ou fator intrínseco, doenças metabólicas, anemia diseritropoética congênita) ou adquiridas (síndrome mielodisplásica).16 Vide itens (41) e (42). (36) Drogas podem causar macrocitose isolada; doenças cardíacas e Síndrome de Down também estão associadas à macrocitose e o mecanismo envolvido ainda é desconhecido. No hipotireoidismo, nas doenças hepáticas e depois de esplenectomia, o excesso de lípides na membrana pode causar macrocitose. Tratamento: no caso das drogas, deve-se ponderar a suspensão das mesmas; no caso de hipotireoidismo e doença hepática deve-se tratar a doença de base.16 (37) Neste grupo devemos considerar como hipóteses diagnósticas: Anemia de Blackfan-Diamond, Anemia de Fanconi – item (9), síndrome mielodisplásica – item (41), anemia sideroblástica – item (32) e anemia diseritropoética congênita – item (42). Anemia de Blackfan-Diamond: doença autossômica dominante em 45% dos casos, podendo também se manifestar com padrão de herança autossômico recessivo ou mutação esporádica. Caracteriza-se por falência da série vermelha, malformações congênitas e predisposição a doenças malignas. As anormalidades hematológicas são: anemia macrocítica ou normocítica, reticulocitopenia, redução ou ausência de precurssores eritróides na medula, manifestações clínicas antes do primeiro ano de vida e a idade média ao diagnóstico é de oito semanas. Atualmente há nove genes descritos e associados a esta doença, sendo o mais comum o RPS19. Compreendem diagnósticos diferenciais as outras falências medulares congênitas (Fanconi, Disqueratose e Shwachman-Diamond) e as formas adquiridas (eritroblastopenia transitória da infância, síndrome 5q-, 13 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA infecções virais, drogas e agentes químicos). Tratamento: corticoesteróides, transfusão de concentrado de hemácias e transplante de células tronco hematopoéticas.8,19 (38) Volume corpuscular médio entre 82 e 92 fl. 17 (39) Considerar como possibilidades: eritroblastopenia transitória da infância, aplasia de série vermelha induzida por drogas (carbamazepina, fenitoína e ácido valpróico) e anemia de Blackfan-Diamond, item (37).15 (40) Doenças de depósito ou leucoses. (41) SMD em pediatria é definida pela presença de pelo menos 2 dos seguintes critérios diagnósticos: citopenia persistente inexplicada, mielodisplasia de pelo menos 2 linhagens, anormalidades citogenéticas clonais adquiridas, número de blastos 5%, ausência obrigatória de anormalidades citogenéticas de LMA. Diagnósticos diferenciais: infecções, deficiências nutricionais, doenças metabólicas, síndrome de Pearson e falências medulares congênitas.7 (42) Anemia diseritropoética congênita: grupo de desordens congênitas raras da eritropoese, caracterizado por anemia leve a moderada, eritropoese ineficaz e alterações morfológicas nos precursores eritróides. Originalmente, as anemias diseritropoéticas foram classificadas em três tipos (I, II e III) e, mais recentemente, outras variantes foram descritas (IV a VII). O aspirado de medula óssea é caracterizado por hiperplasia eritróide e diseritropoese (alterações megaloblásticas, eritroblastos binucleados e multinucleados , eritroblastos gigantes e multinucleados, pontes internucleares entre os eritroblastos). O tratamento varia de acordo com o tipo (esplenectomia, interferon). Diagnósticos diferenciais: talassemia, anemia sideroblástica, deficiência de vitamina B12 ou folato, deficiência de ferro, síndrome mielodisplásica, leucemia mielóide aguda, hemoglobinúria paroxística noturna, anemia aplástica, infecções como malária, calazar e síndrome da imunodeficiência adquirida e doenças hepáticas.20 14 GCB-SMD-PED GRUPO COOPERATIVO BRASILEIRO SÍNDROME MIELODISPLÁSICA EM PEDIATRIA REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Interim Analysis (EWOG-MDS 98), February 2007 2. Lopes LF, Lorand-Metze I, Mendes WL, Seber A, Melo LN. Sídrome mielodisplásica na infância. Rev Bras Hematol Hemoter. 2006; 28(3): 226-237. 3. Sills RH, Deters A. Pancytopenia. In: Sills RH . 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