A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO CONTEXTO DAS

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A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO CONTEXTO DAS
Artigo
A produção do conhecimento no contexto das políticas de
expansão da educação superior no Brasil
pós-LDB/1996: uma síntese*
Knowledge production in the context of higher education
expansion policy in Brazil after LDB 1996: an overview
Karine Nunes de Moraes1
Universidade Federal de Goiás, UFG, Brasil
Mário Luiz Neves de Azevedo2
Universidade Estadual de Maringá, UEM, Brasil
Afrânio Mendes Catani3
Universidade de São Paulo, USP, Brasil
Resumo
Este artigo tem por objetivo analisar a produção do conhecimento no contexto das políticas
de expansão da educação superior no Brasil no período compreendido entre a promulgação da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996, e o suposto início da vigência
do Plano Nacional de Educação (PNE), fixado para 2011. O processo de investigação implicou
em uma série de reuniões de trabalho, em que a equipe se estruturou a partir do objetivo
geral e dos objetivos específicos do projeto de pesquisa. Para isso, conforme previsto nos
procedimentos metodológicos, inicialmente realizou-se um trabalho de revisão da literatura.
Em seguida, a partir da definição de categorias de investigação e análise, ocorreu o processo
de coleta de documentos e da legislação pertinente. Os resultados da pesquisa encontram-se
organizados nesse artigo em três partes, mais as considerações finais, a saber: 1) A produção
do conhecimento acadêmico-científico: expansão, privatização da graduação e pragmatismo
da pós-graduação; 2) A pós-graduação, a pesquisa e a produção do conhecimento no contexto
das políticas de expansão da educação superior no Brasil; 3) Principais achados da pesquisa.
Trata-se de investigação sobre o campo da educação superior em interseção com o campo
científico, inclusive sobre a pós-graduação e a pesquisa no Brasil.
Palavras-chave: Educação superior, Conhecimento, Pesquisa.
Abstract
This article aims to analyze knowledge production in the context of political expansion of
higher education in Brazil in the period between the enactment of the Law for National
Education Guidelines and Basis (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB,
1 Professora na Faculdade de Educação, da Universidade Federal de Goiás (UFG), em cursos de graduação na área de
Educação e formação de professores. E-mail: [email protected]
2 Professor na Universidade Estadual de Maringá (UEM), em cursos de graduação e pós-graduação na área de Educação
(mestrado e doutorado). Pesquisador do CNPq. E-mail: [email protected]
3 Professor na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), em cursos de graduação e de pós-graduação;
professor no Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina (PROLAM)-USP. Pesquisador do CNPq. E-mail:
[email protected]
* Agências Financiadoras: CAPES/INEP – Programa Observatório da Educação (2013-2016) - OBEDUC nº 20346; MCT/
CNPQ - Edital Universal 14/2010 (Processo 470119/2010-1).
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1996), and the supposed beginning of the effectiveness of the National Education Plan (Plano
Nacional de Educação – PNE), set to be initiated in 2011. The research structuring process
consisted of a series of team members meetings, taking the general objective and the specific
objectives of the research project as its starting point. For that, as provided in the methodological procedures, we conducted a literature review. Then, from the definition of categories
of research and analysis, the team collected documents and materials. The research findings
are presented in this article into three parts, plus the final considerations, namely: 1) The
production of scientific knowledge: the expansion and privatization of higher education, 2)
The post-graduate research and knowledge production in Brazil, and 3) Key research findings. Thus, the article discusses the field of higher education (including post-graduation and
research) in intersection with the scientific field in Brazil.
Keywords: Higher education, Knowledge, Research.
Introdução
Este texto tem como objetivo socializar alguns achados da pesquisa intitulada
“A produção do conhecimento no contexto das políticas de expansão da educação
superior no Brasil pós-LDB/1996”4. A pesquisa buscou analisar a produção do conhecimento no contexto das políticas de expansão da educação superior no Brasil no
período compreendido entre a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), ocorrida em 1996, e o prazo para a implantação do Plano Nacional de
Educação (PNE), previsto para 2011. A investigação situou-se no campo das políticas
de educação superior, considerando suas interfaces com o campo científico, uma vez
que a pós-graduação e a pesquisa no Brasil se estruturam por áreas específicas e/ou
grandes áreas de conhecimento.
O objetivo geral do trabalho desenvolvido pela equipe foi o de compreender a natureza e o caráter da produção do conhecimento no contexto da expansão da educação
superior a partir de 1996, bem como analisar as orientações político-econômicas dos
indicadores acadêmico-científicos e das tendências em curso no âmbito do financiamento da pesquisa e da pós-graduação no Brasil.
O processo de investigação implicou numa série de reuniões de trabalho, quando
a equipe estruturou-se a partir do objetivo geral e dos objetivos específicos, tendo
em vista a consecução das metas estabelecidas. Inicialmente realizou-se o processo
de revisão da literatura, conforme previsto nos procedimentos metodológicos. Em
seguida, a partir da definição de categorias de investigação e análise, ocorreu o
processo de coleta de documentos e da legislação pertinente. Para tanto, alguns dos
pesquisadores fizeram visitas a instituições determinadas, buscando coletar dados
e documentos necessários à análise do objeto de estudo.
O resultado de nosso esforço coletivo, que aparece a seguir, encontra-se organizado
em três partes e nas considerações finais, a saber, 1) A produção do conhecimento
4 Pesquisa sob coordenação de Afrânio Mendes Catani (USP). O projeto contou com duas vices coordenadoras, Profas.
Regina Maria Michelotto (UFPR) e Karine Nunes de Moraes (UFG). Integraram, ainda, a equipe de pesquisa: Ana Maria
Netto Machado (UNIPLAC), Ana Paula Hey (USP), Catarina de Almeida Santos (UnB), Celi Rodrigues Almeida Madureira
(UFPR), Jandernaide Resende Lemos (UEG), João Ferreira de Oliveira (UFG), Josenilson Guilherme de Araújo (CNPq),
Maria Amélia Sabbag Zainko (UFPR), Mário Luiz Neves de Azevedo (UEM), Renato de Sousa Porto Gilioli (USJT), Robson
Sipraki (UFPR) e Tânia Cristina Alves de Siqueira (UFPR).
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acadêmico-científico: expansão, privatização da graduação e pragmatismo da pós-graduação; 2) A pós-graduação, a pesquisa e a produção do conhecimento no contexto
das políticas de expansão da educação superior no Brasil; 3) Principais achados da
pesquisa.
A produção do conhecimento acadêmico-científico: expansão, privatização da
graduação e pragmatismo da pós-graduação
Nesse contexto de expansão da graduação e da pós-graduação, a produção científica
brasileira vem crescendo significativamente, sobretudo na última década (CATANI;
OLIVEIRA; MICHELOTTO, 2010; BITTAR, 2010; GUIMARÃES; AVELLAR, 2010;
BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2009; CRUZ, 2003). As políticas para Pesquisa e
Desenvolvimento (P&D) e Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I), em que pese suas
especificidades, guardam estreita relação com a lógica segundo a qual o conhecimento
deve se converter em fator de geração de riquezas e vantagens competitivas para as
empresas e para o país5, devendo, ainda, servir para ampliar a capacidade de inovar,
criar novos produtos e explorar novos mercados. Indicam, ainda, que o discurso da
“inovação” se faz presente na atual política nacional para P&D e CT&I, haja vista
que todos os documentos do governo federal para o setor, nessa década, apontam
a inovação como meta para o conhecimento a ser produzido (BRASIL, 1996, 2000,
2002, 2004, 2005, 2007a).
Na realidade, os programas e as políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação no
Brasil têm respondido ao requerido pela chamada “nova economia” ou “economia
baseada no conhecimento”, formulações políticas compatíveis com o que Slaughter
e Rhoades (2004) chamaram de “capitalismo acadêmico”, regime em que o conhecimento é tratado como matéria-prima crítica [critical raw material] (p. 4). Segundo os
autores de Academic Capitalism and the New Economy, obra a respeito do movimento
de mercadorização do conhecimento, com base principalmente no processo que tem
ocorrido a partir dos anos 1970 nos Estados Unidos da América,
(...) embora a nova economia seja fundamental para a ascensão do regime capitalista
acadêmico do conhecimento, isto não é casual. Universidades são difíceis de separar
da nova economia porque contribuem muitíssimo para o seu desenvolvimento. A
nova economia trata o conhecimento avançado como matéria-prima, que pode ser
considerado, por meio de dispositivos legais, como propriedade e comercializado
como produto ou serviço (SLAUGHTER; RHOADES, 2004, p. 15)6. (tradução nossa)
Desse modo, a política implantada pelo governo brasileiro, voltada à ampliação da
base científica nacional, tem buscado, como sinaliza o próprio MCTI7, a intensificação
5 A esse respeito consultar a Lei do BEM (Lei nº 11.196/2005), a Lei nº 10.168/2000 e a Lei nº 10.973/2004, que tratam de
incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica, bem como à interação universidade – empresa.
6 “Although the new economy is central to the rise of the academic capitalist knowledge regime, it is not casual.
Universities are difficult to separate from the new economy because they contribute richly to its development.
The new economy treats advanced knowledge as raw material that can be claimed through legal devices,
owned, and marketed as products or services” (SLAUGHTER; RHOADES, 2004, p. 15).
7 O Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) teve o seu nome mudado em 3 de agosto de 2011 para Ministério da Ciência,
Tecnologia e Inovação (MCTI). Segundo o gestor da pasta, a incorporação da palavra “inovação” envolve um conceito
que permeava as ações ligadas à área de ciência e tecnologia, especialmente a partir da edição da Lei de Inovação (Lei nº
10.973/2004), que trata de medidas de incentivo à pesquisa científica e tecnológica desenvolvidas no ambiente acadêmico
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da capacitação tecnológica “para geração, aquisição e transformação do conhecimento
em inovações que permitam incrementar o valor agregado de seus produtos e sua
presença nos mercados doméstico e internacional” (BRASIL, 2007, p. 35), indicando
que a chamada sociedade ou economia do conhecimento vem impactando as políticas para P&D e CT&I no país nas últimas décadas (IANNI, 2000 e 2003; DIAS
SOBRINHO, 2005; BURCH, 2005; SANTOS, 2008).
Nesse sentido, o processo de expansão da produção do conhecimento científico
tem passado pelo incremento da formulação de políticas de ciência, tecnologia e
inovação no país, tendo como uma de suas premissas apoiar a capacitação e formação
de recursos humanos e a modernização da infraestrutura de laboratórios em universidades e centros de pesquisa (CHAUÍ, 2003; FERREIRA; OLIVEIRA, 2011). Por
sua vez, esse processo tem desencadeado um aumento significativo dos indicadores
relativos ao número de pesquisadores, grupos de pesquisa e artigos científicos publicados no contexto do ranking da produção científica mundial.
No atual contexto de expansão da educação superior, a produção do conhecimento
também vem passando por alterações significativas. A ênfase tem recaído na pesquisa
tecnológica, na inovação, na articulação e nas parcerias entre universidades e empresas
por meio de incentivos financeiros, bem como na maior subordinação da produção
intelectual e dos programas de pós-graduação stricto sensu às demandas produtivas
e aos interesses dos governos (MANCEBO; SILVA JÚNIOR; OLIVEIRA, 2008).
Estatísticas recentes mostram que vem sendo aumentado paulatinamente o investimento das agências governamentais, acompanhado de maior exigência na produção
dos docentes e discentes dos programas de pós-graduação, o que tem resultado em
maior produtividade do Brasil no ranking da produção científica mundial. “O Brasil
ampliou em 56% o número de artigos em publicações científicas de alto padrão, entre
2007 e 2008, e passou da 15ª para a 13ª posição no ranking das nações com maior
volume de produção acadêmica. Assim, passou a responder por 2,12% da produção
internacional”8.Para alcançar esse percentual, “o Brasil teve 30.451 artigos publicados
em revistas científicas em 2008, contra 19.436 publicações em 2007. Os EUA lideram
a lista, com 340 mil artigos publicados, seguidos da China (112,8 mil), Alemanha
(87 mil) e Japão (79 mil). Completam, junto com a Índia, o ranking dos 10 melhores,
Inglaterra (78 mil), França (64 mil), Canadá (53 mil), Itália (50 mil) e Espanha (41,9
mil)”9. Esse resultado é atribuído pelo governo, dentre outros, a uma série de fatores,
envolvendo a atuação de centros de pesquisas, universidades, agências de fomento,
ministérios (MCT e MEC)10.
O desafio, segundo autoridades governamentais, é transformar esse conhecimento
científico em produção tecnológica, bem como aumentar o número de patentes e o
impacto dessa produção no cenário nacional e internacional. Porém, além disso,
talvez se esteja diante da adesão, como se fosse um “contrato social” especial dos
e aplicadas às empresas, e da Lei do Bem (Lei nº 11.196/2005), que prevê a concessão de incentivos fiscais às empresas
que inovam.
8 A esse respeito consultar Jornal da Ciência: http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=64181. Acesso em
28/01/2010.
9 Ver: http://www.blogtemposmodernos.com.br/2009/05/brasil-sobre-duas-posicoes-em-ranking.html. Acesso em 28/01/2010.
10 Ver: http://oglobo.globo.com/ciencia/mat/2009/05/06/brasil-ultrapassa-russia-holanda-e-13-do-mundo-no-ranking-daciencia-755719142.asp. Acesso em 28/01/2010.
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atores sociais do campo científico ao capitalismo acadêmico global (SLAUGHTER;
RHOADES, 2004). Para esses autores, ressalte-se, a ideia de “contrato social é, simultaneamente, um conceito analítico e um discurso (despolitizado) que afirma direitos
profissionais e científicos e que, ao mesmo tempo, mascara as complexas e íntimas
relações de poder entre ciência e sociedade” (SLAUGHTER; RHOADES, 2004, p.
46)11(tradução nossa). Esta noção pode ser compreendida também ao se pensar essas
relações como que inseridas em um campo social. Segundo Bourdieu, ao refletir sobre
“os usos sociais da ciência”,
(...) é preciso escapar à alternativa da ‘ciência pura’, totalmente livre de qualquer
necessidade social, e da ‘ciência escrava’, sujeita a todas as demandas político-econômicas. O campo científico é um mundo social e, como tal, faz imposições,
solicitações etc. que são, no entanto, relativamente independentes das pressões
do mundo social global que o envolve. De fato, as pressões externas, sejam de que
natureza forem, só se exercem por intermédio do campo, são mediatizadas pela
lógica do campo. Uma das manifestações mais visíveis da autonomia do campo
é sua capacidade de refratar, retraduzindo sob uma forma específica as pressões
ou as demandas externas [...]. Todo campo, o campo cientifico por exemplo, é um
campo de forças e um campo de lutas para conservar ou transformar esse campo
de forças. Pode-se, num primeiro momento, descrever um espaço científico ou
um espaço religioso como um mundo físico, comportando as relações de força, as
relações de dominação. Os agentes - por exemplo, as empresas no caso do campo
econômico - criam o espaço, e o espaço só existe (de alguma maneira) pelos agentes
e pelas relações objetivas entre os agentes que aí se encontram (BOURDIEU, 2004,
p. 21-23).
Nos dados, a seguir, sobre a estimativa dos investimentos das instituições com
cursos de pós-graduação stricto sensu, indicando investimentos em pesquisa e desenvolvimento das IES, no período compreendido de 2000 a 2007, percebe-se que o
crescimento também tem sido constante ao longo dos anos em todas as dependências
administrativas. Os investimentos federais representam 53,6%, enquanto os estaduais
38,8% e os particulares 7,6%. O percentual de investimentos em relação ao PIB, por
sua vez, indica certa variação no período de 2000 a 2008. A média do período foi de
1%, sendo que a partir de 2007 o país conseguiu ultrapassar e consolidar esse percentual de investimento, chegando em 2008 a 1,13%. Tais investimentos tenderiam a se
elevar se o crescimento econômico do País se mantiver num patamar próximo de 5%
ao ano e se for efetivado o que o governo federal planejou por meio do documento “O
Brasil em 2022: as metas do centenário” (BRASIL, 2010), produzido pela Secretaria
de Assuntos Estratégicos (SAE), vinculada à Presidência da República.
Segundo esse documento, o Brasil deve, no âmbito da Ciência e Tecnologia, atingir
as seguintes metas: elevar o dispêndio em Pesquisa e Desenvolvimento ao patamar de
2,5% do PIB, sendo metade das empresas; dobrar o número de bolsas/ano concedidas
pelo CNPq e pela Capes; ter 450 mil pesquisadores; alcançar 5% da produção cien11 “The social contract discourse is simultaneously an analytical concept and a (depoliticized) discourse that
asserts professional and scientific rights even as it masks complex, power laced relations between science
and society” (SLAUGHTER; RHOADES, 2004, p. 46)
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tífica mundial; triplicar o número de engenheiros formados; dominar as tecnologias
de microeletrônica e de produção de fármacos; decuplicar o número de empresas
inovadoras; decuplicar o número de patentes; assegurar independência na produção
do combustível nuclear; dominar as tecnologias de fabricação de satélites e veículos
lançadores. As metas governamentais são bastante ousadas e retratam, por um lado, as
ambições do País em termos de uma inserção mais competitiva no mercado global e,
por outro, um empreendimento no sentido de que o conhecimento esteja cada vez mais
associado às necessidades de crescimento, inovação e competitividade das empresas.
Trata-se, pois, de produzir um conhecimento engajado na globalização econômica, de
formar profissionais de alto nível, necessários a esse desenvolvimento, e de avançar
em áreas de conhecimento consideradas estratégicas para o País.
Em certa medida, essas metas governamentais guardam similitudes com várias
das propostas apresentadas pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) no documento “A indústria e o Brasil: uma agenda para crescer mais e melhor”, entregue aos
candidatos à Presidência da República em 2010. Buscando a inovação como prioridade nacional para as indústrias, a CNI propõe, dentre outras: 1. Rever o sistema de
incentivos à inovação e aos gastos com P&D do setor privado, de forma a ampliar
a efetividade desses incentivos e permitir que um número crescente de empresas
possa se valer desses incentivos; 2. Aumentar em 50% os recursos para subvenção
à P&D do setor privado, de forma a se aproximar do patamar médio ofertado pelos
países desenvolvidos; 3. Modificar a forma de apoio às empresas nos instrumentos
de subvenção, para a modalidade de apoio aos planos de negócios das empresas e
a sua competitividade, em lugar do simples apoio a projetos específicos; 4. Adotar
normas, regulações e regras de estimulo à inovação nos diversos setores regulados
pelo governo, e eliminar as regulações que gerem obstáculos à inovação e ao aumento
de produtividade; 5. Estimular o desenvolvimento do subsistema financeiro de apoio
à inovação, nas suas diversas dimensões (venture, equity e crédito), através da ação
coordenada da FINEP, BNDES e CVM; 6. Implantar os mecanismos previstos na Lei de
Inovação (encomenda, sociedade de propósitos específicos, direito de preferência nas
compras governamentais), através da ação indutora das agências de governo (BNDES
e FINEP) e da regulamentação desses instrumentos; 7. Viabilizar a aplicação plena
dos recursos dos Fundos Setoriais e do Fundo de Universalização dos Serviços de
Telecomunicações, hoje sujeitos à prática do contingenciamento. (CNI, 2010, p.174-175)
Como se vê, boa parte das propostas estão voltadas para uma política que favoreça
a inovação com o uso de recursos do fundo público, mediante incentivos, subvenções,
diminuição dos obstáculos regulatórios, ampliação do financiamento, etc.
Tal agenda se complementa, ainda, com as propostas que a CNI (2010, p.164)
apresenta para a educação superior do País: a) Substituir a gratuidade universal das
universidades públicas por bolsas de estudo baseadas no nível de renda e no desempenho do aluno; b) Distribuir recursos públicos para a educação superior com base no
desempenho das instituições de ensino; c) Flexibilizar a obrigatoriedade em educação,
pesquisa e extensão. Permitir que as instituições de ensino superior se dediquem a
funções mais ligadas a sua vocação, recursos e necessidades regionais; d) Eliminar
os entraves legais que dificultam a interação instituição pública de ensino-empresa;
e) Estimular a interação instituição pública de ensino-empresa; f) Estimular a oferta
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de cursos de tecnologia de curta duração; g) Estimular a oferta de cursos voltados
para o mercado de trabalho; h) Adequar os conteúdos programáticos aos requisitos
da sociedade do conhecimento: disseminação da cultura empreendedora, formação
de profissionais criativos e preparados para a prática da inovação, equilíbrio entre os
conteúdos teóricos e as aplicações práticas e autonomia universitária com responsabilidade e cobrança social. Enfim, trata-se de propostas que mais se identificam com o
modelo de “capitalismo acadêmico” do que necessariamente a uma agenda de desenvolvimento para o País ou algo que equivalha à entrada do País na era da produção
industrial com alto valor agregado (inteligência autônoma a partir da parceria entre
Estado, universidades e empresas com o propósito de alcançar a “fronteira do conhecimento” ou, conforme o título do relatório de Vannevar Bush, de 1945, para buscar
a Ciência, a Fronteira sem Fim - Science, the Endless Frontier)12.
As mencionadas propostas da CNI, no âmbito da educação superior, implicam
em fim da gratuidade nas IES públicas, distribuição dos recursos por desempenho
institucional, dissociação entre ensino, pesquisa e extensão, estímulo à parceria entre
IES-empresas, ampliação da oferta de cursos voltados para o mercado de trabalho,
sobretudo de tecnologia de curta duração e mudanças nos componentes curriculares
que busquem atender às demandas da sociedade do conhecimento ou das próprias
empresas em termos de empreendedorismo, inovação e aplicações práticas do conhecimento. Nesse contexto, as agências de financiamento à produção do conhecimento vêm
estimulando a produtividade docente por meio de editais que financiam a pesquisa,
o intercâmbio de pesquisadores e uma espécie de complementação salarial por meio
de bolsas. Assim, associa-se cada vez mais a produção do conhecimento aos salários
dos docentes/pesquisadores, à prestação de serviços e ao registro de patentes. Isto,
necessariamente, não significa um “contrato social” de produção científica autônoma, mas pode ser um “acordo” que não envolveria obrigatoriamente a produção de
conhecimento novo – inovação, neste caso, pode significar somente “adaptação” do
conhecimento (C&T) da metrópole para a “periferia”. Essa “produtividade” também
é estimulada por meio da avaliação da pós-graduação, que formalmente associa a
avaliação dos programas (mestrado e doutorado) à produção intelectual, sobretudo
por intermédio da publicação em periódicos de maior reconhecimento e prestígio
acadêmico, muitos dos quais, cujas sedes estão em países centrais, que circulam
em língua inglesa, exigem o acesso pago (conhecimento “cercado”). Enfim, como
percebem Slaughters e Rhoades (2004), a nova economia e o capitalismo acadêmico
transmutam o conhecimento em uma “matéria-prima mercadorizada” – um bem
público torna-se uma mercadoria (commodity). Esse tipo de despossessão pode ser
compreendido como uma espécie de “cercamento” de bens públicos e comuns (BOYLE,
2008; SLAUGHTER; RHOADES, 2004; AZEVEDO, 2012).
12 Relatório elaborado por Vannevar Bush, Diretor do Escritório de Pesquisa Científica e Desenvolvimento, Julho de 1945, a
ser entregue ao Presidente dos Estados Unidos da América, Franklin D. Roosevelt.
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A pós-graduação, a pesquisa e a produção do conhecimento no contexto das
políticas de expansão da educação superior no Brasil
O crescimento da pós-graduação, da pesquisa e da produção do conhecimento
científico no Brasil encontra-se associado, em grande medida, à expansão da educação
superior, sobretudo por meio de universidades públicas, que concentram a maior parte
das pesquisas, dos programas de pós-graduação stricto sensu e dos grupos, núcleos
e laboratórios de pesquisa. De um lado, observam-se as políticas de ampliação do
acesso à educação superior em instituições públicas e privadas, a expansão da pós-graduação stricto sensu e a ampliação das exigências de produção docente e discente,
que vêm sendo implantadas desde os anos 1990. De outro, registra-se o aumento dos
investimentos públicos no crescimento da Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e da
Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I), sobretudo em áreas consideradas estratégicas
para o desenvolvimento econômico e social do país. Considerando esse cenário, o
propósito do presente texto é analisar e refletir sobre o processo de ampliação da
pós-graduação, da pesquisa e da produção do conhecimento, no contexto da expansão
da educação superior, destacando alguns dos indicadores mais significativos sobre
a temática na última década.
Em 2010, a pós-graduação no Brasil somava um total de 2.840 programas, sendo:
a) 1.453 de mestrado e doutorado; b) 1.091 somente de mestrado; c) 247 de mestrado
profissional; d) 49 somente de doutorado. Se a oferta de cursos e matrículas de graduação no Brasil está concentrada majoritariamente em IES privadas, essa situação se
inverte na pós-graduação stricto sensu. Do total de programas de pós-graduação
somente 535 (18,8%) se vinculam à esfera privada enquanto que 2.305 (81,2%) se
vinculam às IES públicas, sendo 1.579 (55,6%) na esfera federal, 703 (24,8%) na
esfera estadual e 23 (0,8%) na esfera municipal. Esses dados, por sua vez, corroboram a concentração das pesquisas acadêmicas nas IES públicas, particularmente
nas federais e estaduais paulistas. Estes cursos/programas de pós-graduação se
distribuíram de modo não homogêneo entre nove grandes áreas do conhecimento,
sendo: a) Linguística, letras e artes – 160 programas; b) Ciências biológicas – 234
programas; c) Ciências exatas e da terra – 277 programas; d) Ciências agrárias – 316
programas; e) Multidisciplinar – 316 programas; f) Engenharias – 324 programas; g)
Ciências sociais e aplicadas – 357 programas; h) Ciências humanas – 401 programas;
i) Ciências da saúde – 455 programas (BRASIL, 2011).
Quanto à oferta de cursos/programas, segundo as categorias administrativas, os
dados revelam que em todas as regiões os programas de pós-graduação concentram-se
nas instituições públicas. Em 2000, do total de programas de pós-graduação stricto
sensu (1.440), o setor público teve maior percentual de oferta, com 89%, enquanto o
setor privado possuía apenas 11% (159). Já em 2010, com 1.400 programas de pós-graduação stricto sensu a mais que em 2000, o setor público ficou com 81,2% das
ofertas de cursos/programas e o setor privado com 18,8%. No período analisado (2000
e 2010) verifica-se um crescimento da oferta de cursos/programas de pós-graduação
de 97,22%, a região Norte apresentando o maior crescimento (329,03%), seguida pela
região Centro-Oeste (162,03%). Esses dados também expressam maior concentração
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de oferta de programas na região Sudeste, tanto em 2000 como em 2010, seguida
pela região Sul (BRASIL, 2011).
Dados consolidados pela Capes/MEC e CNPq/MCTI sobre alguns dos principais
indicadores de CT&I, no período entre 2000 e 2010, mostram que houve um crescimento significativo. O número de projetos de pesquisa cresceu cerca de 156,90%, de
41.539 projetos em 2000, para 106.715 em 2010. As bolsas de produtividade passaram
de 7.413 para 12.941, registrando um aumento de 74,57%. Já os grupos de pesquisa
cresceram mais de 1.041%, totalizando 27.523 grupos em 2010. Esse incremento da
pesquisa decorreu, em grande parte, do forte crescimento que se deu na pós-graduação
brasileira, particularmente na esfera pública.
Os cursos de mestrado acadêmico totalizaram 2.544, em 2010, com aumento
de 81,33% sobre o total de 2000. Os cursos de doutorado cresceram ainda mais,
84,75%, alcançando 1.502 cursos em 2010. O maior crescimento no período ocorreu,
no entanto, com os mestrados profissionais, que iniciados no começo da década,
aumentaram 648% em 11 anos (OLIVEIRA; OLIVEIRA, 2011). O crescimento de
estudantes matriculados também foi acentuado no período de 2000 a 2010, tendo
sido de 63,19% nos mestrados acadêmicos, 96,32% nos doutorados e 803,01% nos
mestrados profissionais.
Nesse contexto, é importante observar como se deu o crescimento de cursos/
programas de pós-graduação, segundo as nove grandes áreas de conhecimento, no
período de 2000 a 2010. Nota-se, pelos dados oficiais, que houve crescimento em
todas as áreas, porém, os dados revelam que a grande área Multidisciplinar, que
tem como objetivo formar recursos humanos com ênfase em temas de pesquisas
que envolvem intrinsecamente conhecimento e metodologia multi e interdisciplinar,
apresentou crescimento substancial (464,29%), ocupando, consequentemente, espaço
até recentemente inexplorado na pesquisa e na pós-graduação. As áreas de Ciências
Sociais Aplicadas (147,92%), Linguística, Letras e Artes (102,53%), Ciências Humanas
(101,51%) e as Engenharias (100%) tiveram, todas elas, crescimento igual ou superior
a 100% na formação de mestres e doutores. A área de Ciências da Saúde, com crescimento de 45,83% durante o período analisado, apresenta o maior quantitativo de
oferta de cursos/programas (455), em segundo lugar vem a área de Humanas, com
401 programas, um crescimento equivalente a 101,51%.
Quando analisada a distribuição geográfica dos cursos/programas de pós-graduação stricto sensu, no período de 2000-2010, observa-se que a região Sudeste
concentra o maior volume deles, sendo que o estado de São Paulo13 é o que mais oferta
cursos de pós-graduação – nesse período, o número de cursos passou de 870 em
2000 para 1.176 em 2010. Em segundo lugar vem o estado do Rio de Janeiro, com 561
cursos/programas em 2010; em terceiro, Minas Gerais, com 427. Em outro extremo,
temos os estados do Acre, Amapá, Roraima e Tocantins, todos da região Norte, que
são os que possuem oferta mais reduzida nessa modalidade, em 2010. Além disso,
podemos observar que muitos estados dessa região só iniciaram a oferta em nível de
13 São Paulo produz metade da ciência nacional. “Em 2002, a região tinha 49,9% da produção de ciência nacional. Agora,
de acordo com o último levantamento da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo), o número
foi para 51%. Isso acontece porque a produção científica continua concentrada nas universidades públicas paulistas,
especialmente USP, Unicamp, Unesp e Unifesp”. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/inde24082011.
htm. Acesso em: 24 de ago. 2011.
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pós-graduação stricto sensu em anos mais recentes, a saber: Acre e Rondônia (2001),
Tocantins (2003), Roraima (2004) e Amapá (2006).
Destaca-se ainda que o país vem aumentando, de maneira significativa, a titulação
de mestres e doutores, em especial a partir do final da segunda metade da década de
1990, quando o número de mestres titulados anualmente passa de cerca de 10 mil
para cerca de 40 mil, enquanto o número de doutores vai de 2,5 mil para 11,4 mil.
Toda essa expansão da pós-graduação e da pesquisa tem sido impulsionada pelo
aumento do financiamento (SANTOS; MORAES, 2010). Houve ampliação do fomento
à pesquisa por grandes áreas do conhecimento segundo as linhas de ação, junto ao
CNPq, de 2000 a 2010. Os dados revelam que houve um crescimento de 413,84%
durante o período analisado, com maior concentração de investimentos no ano de
2010 (R$ 595.007 milhões). A grande área Ciências da Vida, que contempla as Ciências
Agrárias, Biológicas e Saúde, experimentou um aumento de 547,24%, com destaque
de maior percentual de crescimento nas inversões financeiras para Ciências Agrárias
(856,34%), seguida por Ciências da Saúde (731,44%).
Na grande área Humanidades, com crescimento de investimentos de 439,79%,
destaca-se a área de Humanas (456,60%), seguida pela de Sociais Aplicadas (440,90%).
Na grande área Ciências da Natureza, houve um crescimento de 364,70% nos investimentos, enquanto para os domínios das Ciências Exatas e da Terra alcançou a
expansão de 393,40%. As áreas com menores percentuais de investimentos, durante
os 11 anos analisados, são Linguística, Letras e Artes (321,48%) e Engenharias e
Computação (338,13%). É preciso considerar, no entanto, que o volume de recursos
aplicados por área, em 2010, em que pese seu crescimento, priorizou as Ciências da
Vida (287.425 mil), seguida das Ciências da Natureza (186.510 mil) e, por último, as
Humanidades (64.580 mil).
Principais achados
Desde a segunda metade dos anos 1990 o Brasil vem intensificando o crescimento da graduação, da pós-graduação, da pesquisa e da produção do conhecimento
científico, como evidenciam inúmeros indicadores. Observa-se que há uma forte
predominância do setor privado na oferta dos cursos de graduação, enquanto prevalece a oferta pública de mestrados e doutorados. A pesquisa, igualmente, concentra-se
nas IES públicas, embora seja possível afirmar que a política de educação superior,
assim como de P&D e CT&I, procura tornar cada vez mais indissociável as esferas
pública e privada, ampliando o grau de articulação e de subordinação da produção
científica aos interesses das indústrias e do capital em termos de inovação e aumento
da competitividade.
Nos últimos vinte anos, têm prevalecido, no âmbito do governo federal, uma
compreensão crescente de que a chamada economia baseada no conhecimento requer
um empreendimento nacional para tornar a produção científica mais ajustada aos
interesses de crescimento das empresas e do país no contexto da globalização produtiva, o que deve ser feito com inovação constante que resulte em novos produtos,
processos ou serviços. Nessa direção, observa-se a implantação de um conjunto de
políticas, programas, ações e mecanismos legais (leis, decretos, portarias) no sentido
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de promover a interação universidade-empresa e de incentivar a inovação, a pesquisa
científica e tecnológica no ambiente produtivo.
A inovação tem sido apontada como a atividade que mais gerará riquezas, tendo
em vista a sua capacidade de usar o conhecimento agregado aos produtos e serviços,
ocupando, assim, lugar proeminente na atual “economia baseada no conhecimento”.
No caso do MCT – mais especificamente, em um de seus últimos documentos oficiais
–, torna-se evidente a preocupação com inovação já na enumeração de suas prioridades
estratégicas: expansão e consolidação do Sistema Nacional de CT&I; promoção da
inovação tecnológica nas empresas; pesquisa, desenvolvimento e inovação em áreas
estratégicas; e CT&I para o Desenvolvimento Social.
Neste sentido, a produção científica nacional teve um crescimento médio anual nos
últimos 28 anos de 10,5%, o que representa três vezes a média mundial. A expansão
da produção do conhecimento pode ser sinalizada, em parte, pelo crescimento da
produção dos Diretórios dos Grupos de Pesquisa/CNPq, no período de 2000 a 2008.
Ao observar o conjunto dos indicadores percebe-se que houve um crescimento substantivo no número de artigos completos publicados em periódicos especializados de
circulação nacional e internacional, no número de trabalhos publicados em anais
de eventos e no número de livros e capítulos. No período supracitado, o número de
artigos em periódicos internacionais cresceu 143,54%, enquanto o total de livros e
capítulos de livros aumentou 117,07%, sendo esses os indicadores que apresentaram
os maiores índices de crescimento. Mas, de modo geral, em todas as grandes áreas
houve aumento significativo da publicação livros e capítulos de livros.
Contudo, apesar do crescimento expressivo no conjunto de indicadores destacados
nos parágrafos anteriores, cabe destacar o decréscimo no número de docentes vinculados a programas de pós-graduação. No período analisado o número de docentes
passou de 69.665 para 60.039, uma redução de 13,82%. Essa redução no número
de docentes face ao aumento dos indicadores de produtividade tende a indicar um
processo de intensificação de trabalho, particularmente para os docentes vinculados
à pós-graduação.
Para concluir...
A pesquisa tratou de temática inovadora na área de políticas públicas de educação
superior e de pós-graduação. Entendemos que o desenvolvimento da pesquisa
contribuiu para uma melhor compreensão acerca do atual estado da “produção do
conhecimento científico no Brasil”, bem como para situar o papel das agências de
financiamento no processo de fomento à pesquisa em diferentes áreas do conhecimento. Também buscou-se analisar as exigências e critérios em termos da qualificação
das propostas e dos pesquisadores nos documentos e editais das agências de financiamento, contribuindo, para compreensão da relação entre agências de fomento,
universidades, áreas de conhecimento e pesquisadores/grupos de pesquisa, tendo
por base as constantes transformações no campo científico-universitário.
O desenvolvimento desta pesquisa contribuiu ainda para: a) dar maior visibilidade à problemática da expansão da educação superior; b) viabilizar a socialização,
a divulgação e o intercâmbio de documentos sobre a temática, buscando ampliar a
produção de conhecimentos na área; c) Manter e ampliar as redes de informações
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entre grupos de pesquisa (nacionais e internacionais) que desenvolvam ações no campo
da educação superior; e, d) fortalecer os grupos e linhas de pesquisa nos diferentes
programas ao envolver pesquisadores de diferentes universidades, que atuam em
diferentes programas de pós-graduação na área de educação, bem como estudantes
nos níveis de graduação, mestrado e doutorado.
Concluindo, conforme apontado ao longo deste artigo, a educação superior cresceu
bastante nas duas últimas décadas. Com ela também cresceu a pós-graduação, sobretudo nos cursos de mestrado e doutorado. O Brasil tem participado cada vez mais do
crescimento da ciência e da tecnologia no mundo. A inovação tem se constituído em
um grande desafio para as políticas públicas. Todavia, já se observa que tanto as agências de financiamento como os pesquisadores das diversas áreas vêm se preocupando
com essa questão. Esta pesquisa também mostrou que a produção do conhecimento
tem se ajustado cada vez mais às exigências do sistema produtivo, mas também das
agências de avaliação e fomento, o que traz preocupações com a natureza e com o
caráter dessa produção do conhecimento, uma vez que pode atender demandas mais
econômicas do que propriamente sociais.
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