ADENILSON MARIOTTI MATTOS INOVAÇÕES NA GESTÃO DO

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ADENILSON MARIOTTI MATTOS INOVAÇÕES NA GESTÃO DO
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO
MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
LOCAL
ADENILSON MARIOTTI MATTOS
INOVAÇÕES NA GESTÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO
DA ESCOLA E PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE: Análise de uma
experiência em construção
Belo Horizonte
2013
ADENILSON MARIOTTI MATTOS
INOVAÇÕES NA GESTÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO
DA ESCOLA E PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE: Análise de uma
experiência em construção
Dissertação apresentada ao Mestrado em Gestão
Social, Educação e Desenvolvimento Local do
Centro Universitário UNA, como requisto parcial
à obtenção do título de Mestre.
Área de concentração: Inovações
Educação e Desenvolvimento Local.
Sociais,
Linha de pesquisa:
Processos educacionais: tecnologias sociais e
desenvolvimento local
Orientadora: Profª. Drª. Adilene Gonçalves
Quaresma.
Belo Horizonte
2013
M444f
Mattos, Adenilson Mariotti
Inovações na gestão do projeto político-pedagógico da escola e participação da
comunidade: análise de uma experiência em construção. / Adenilson Mariotti
Mattos. – 2013.
215f.: il.
Orientadora: Prof. Dra. Adilene Gonçalves Quaresma
Dissertação (Mestrado) – Centro Universitário UNA, 2013. Programa de
Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local.
Bibliografia f. 212-215.
1. Educação. 2. Inovações Educacionais. 3. Comunidade e escola. I. Quaresma,
Adilene Gonçalves. II. Centro Universitário UNA. III. Título.
CDU: 658.114.8
Ficha catalográfica desenvolvida pela Biblioteca UNA campus Guajajaras
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO
MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
LOCAL
Dissertação Intitulada “INOVAÇÕES NA GESTÃO DO PROJETO POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA E PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE: Análise de
uma experiência em construção”, de autoria do (a) mestrando (a) Adenilson Mariotti
Mattos, aprovada pela banca examinadora, constituída pelos seguintes professores:
Belo Horizonte, 22 de março de 2013.
“Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens
se educam entre si, mediatizados pelo mundo.” (Paulo Freire)
DEDICATÓRIA
À minha esposa, Rita de Cássia Abreu Soares Mariotti, pelas palavras de incentivo e apoio,
convicta de que este sonho seria possível.
Aos meus pais, Elysio de Mattos Freitas e Maria da Glória Mariotti Mattos, cujos valores são
referência para minha vida.
À madrinha, Maria da Conceição Santos, ao meu sogro, Alexandre Soares Moreno, e à minha
sogra, Sônia Abreu Soares, pela presença pelo acolhimento e apoio.
Aos meus filhos Daniel e Isabel, inspiração constante para minha vida.
AGRADECIMENTOS
Aos profissionais do Centro Universitário - UNA, em especial a todos os professores do
Mestrado em Gestão Social Educação e Desenvolvimento Local, pela valiosa contribuição à
minha formação.
À minha orientadora, professora Adilene Gonçalves Quaresma, pela compreensão, incentivo
e apoio, cujo trabalho competente permitiu a conclusão desta dissertação.
Aos colegas do Mestrado, pela convivência e compartilhamento de experiências, em especial
durante os seminários de prática.
A direção e todos os colegas da Superintendência Regional de Ensino, em especial à Idelzira
Feitosa pelo apoio.
A Deus por me sustentar com o seu imenso amor durante toda essa trajetória.
RESUMO
Ao ser intitulada como “Inovações na Gestão do Projeto Político-Pedagógico e Participação da
Comunidade: Análise de uma experiência em construção”, esta investigação parte do pressuposto de
que a gestão democrática do Projeto Político-Pedagógico, resultante do processo de luta dos
movimentos sociais e sindicais pela redemocratização da sociedade, expressos na Constituição Federal
e nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, não se concretizou em uma participação
autogeradora da comunidade em sua prática. Curiosamente, intenções manifestadas por uma escola de
modificação da sua prática para maior participação da comunidade sugeriram a existência de
inovações, motivando a realização desta pesquisa, que se orientou pela seguinte questão: que
inovações estão sendo produzidas nas práticas do PPP para maior participação da comunidade? Para
responder a essa indagação, buscou-se, então, analisar as inovações que estão sendo produzidas na
gestão do PPP que promovem maior participação da comunidade. A pesquisa teórica compreendeu os
estudos de Hérnandez (1998; 2000), Carbonell (2002); Libâneo (2008); Luck (2010); Gohn
(2004;2007); Gadotti (2004); Veiga (2003,2004); Freire (1987;2004); Thuler (2001); Neves (2004),
dentre outros. A investigação empírica, de natureza qualitativa, consistiu num estudo de caso
exploratório, com aplicação de questionários para discentes e docentes, realização de grupos focais
com docentes e discentes e entrevistas com diretor, supervisores e um membro da comunidade.
A
dissertação estrutura-se na análise da trajetória das inovações e sua emergência no contexto
educacional; na gestão escolar, o Projeto Político-Pedagógico e a participação da comunidade; no
percurso metodológico da pesquisa; na análise de uma experiência em construção: a gestão e as
práticas pedagógicas do Projeto Político-Pedagógico para maior participação da comunidade: nos
dados dos questionários, grupos focais e entrevistas. Conclui-se que o diálogo dos profissionais da
escola com segmentos da comunidade escolar e educativa na organização da programação
sociocultural, a abertura da escola para participação da comunidade nos finais de semana, a
sensibilidade e apoio à comunidade são as principais inovações das práticas do PPP para maior
participação da comunidade. Por outro lado, a concepção da participação da comunidade como
presença física nas atividades socioculturais, a coexistência de dimensões societárias e gerenciais de
gestão, a segmentação entre concepção e execução das atividades, a ausência de uma formação
continuada dos profissionais em diálogo com as experiências comunitárias, a pouca articulação do
Colegiado no processo gestor e a falta de implementação de um grêmio estudantil são os desafios
principais a serem enfrentados.
PALAVRAS-CHAVE: Educação; Inovações Educacionais; Participação da Comunidade; Projeto
Político-Pedagógico; Desenvolvimento Local.
ABSTRACT
By titling as "Innovations in the Management of Political-Pedagogical Project and Community
Participation: Analysis of an experience in building" the research assumes that the democratic
management of the Political-Pedagogical project, resulting from the struggle process of the social and
unions movements for the democratization of society, expressed in the federal Constitution and Law
of Guidelines and Bases of National Education, did not materialize in an auto generator participation
of the community in its practice. Interestingly, the intentions expressed by a school change of its
practice for greater community participation, suggested the existence of innovation, motivating this
research, which was guided by the following question: What innovations are being produced in the
practices of PPP for greater community participation ? To answer this question, the innovations made
in the management of PPP that promote greater community participation were analyzed. A literature
search of studies realized Hernandez (1998, 2000), Carbonell (2002); Libâneo (2008), Luck (2010);
Gohn (2004, 2007); Gadotti (2004); Veiga (2003.2004); Freire ( 1987, 2004); Thuler (2001); Neves
(2004), among others. Empirical research, of qualitative kind, consisted of an exploratory case study
with questionnaires for students and teachers, conducting focus groups with teachers and students, and
interviews with director, supervisors and a community member. The dissertation is structured in the
analysis of the trajectory of innovation and its emergence in the educational context; school
management, the Political-Pedagogical Project and community participation, the methodological
approach of the study, analysis of an experience in building: management and teaching practices
Political Pedagogical Project for greater community involvement: data from the questionnaires, focus
groups and interviews; it was concluded that the dialogue with the school professional with segments
of the school community and educational on organization programming sociocultural, the opening of
the school to community participation on weekends, sensitivity and community support are the main
innovations of the practices of the PPP for greater community participation. Moreover, the concept of
community participation as a physical presence in the cultural activities, the coexistence of societal
dimensions and managerial management, segmentation between conception and execution of the
activities, the absence of a continuing education of professionals in dialogue with the community
experiences the little articulation of the collegiate in manager process and a student body are the main
challenges to be faced.
KEYWORDS: Education, Educational Innovations, Community participation, Political-Pedagogical
Project; Local Development.
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 - PERCEPÇÃO DISCENTE DAS PRÁTICAS PARTICIPATIVAS NA ESCOLA...... 101
TABELA 2 – PERCEPÇÃO DOCENTE DAS PRÁTICAS PARTICIPATIVAS NA ESCOLA...... 102
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
QUADRO 1 - TIPOS DE INOVAÇÕES .............................................................................................. 29
QUADRO 2 - INOVAÇÕES E O GRAU DE NOVIDADE ................................................................ 31
QUADRO 3 - PERSPECTIVA DE ABORDAGEM SOCIAL DA INOVAÇÃO ................................ 36
QUADRO 4 - CATEGORIAS E UNIDADES DE ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS, GRUPOS
FOCAIS E ENTREVISTAS ................................................................................................................. 96
GRÁFICO 1 - AVALIAÇÃO DOCENTE DA PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NO
PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO ............................................................................................... 98
GRÁFICO 2 - AVALIAÇÃO DISCENTE DA PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE ESCOLAR
............................................................................................................................................................... 99
GRÁFICO 3 - FREQUÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DOCENTE .................................................... 104
GRÁFICO 4 - FREQUÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DISCENTE EM ATIVIDADES DE
REFLEXÃO COLETIVA ................................................................................................................... 105
GRÁFICO 5 - FATORES PARA UMA MAIOR PARTICIPAÇÃO DISCENTE ............................. 106
GRÁFICO 6 - PROCEDIMENTOS DA ESCOLA QUANTO
ÀS
SUGESTÕES DISCENTES................................................................................................................ 108
GRÁFICO 7 - POSTURA DISCENTE NAS ATIVIDADES DE PARTICIPAÇÃO COLETIVA ... 109
GRÁFICO 8 - POSTURA DOCENTE NOS PROCESSOS DE REFLEXÃO-AÇÃO DO PROJETO
POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA ........................................................................................ 110
GRÁFICO 9 - SENTIMENTO DISCENTE RELATIVO À ESCOLA .............................................. 121
GRÁFICO 10 - FINALIDADES DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA .......... 132
GRÁFICO 11 - PRINCÍPIO COM MAIOR PRESENÇA NA GESTÃO DO PROJETO POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA............................................................................................................ 140
GRÁFICO 12 - FATORES QUE CONTRIBUEM COM A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DO
PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA ...................................................................... 142
GRÁFICO 13 - PRINCIPAL FATOR PARA AUMENTO DOS
PROCESSOS
PARTICIPATIVOS DOCENTES....................................................................................................... 146
GRÁFICO 14 - AUTO-AVALIAÇÃO DISCENTE DA SUA COLABORAÇÃO COM A
PROPOSTA DE TRABALHO DA ESCOLA .................................................................................... 148
GRÁFICO 15 - AUTO-AVALIAÇÃO DOCENTE DA SUA PARTICIPAÇÃO NA
CONSTRUÇÃO/RECONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA .. 149
GRÁFICO 16 - FATORES QUE CONTRIBUEM COM O DESENVOLVIMENTO DO PROJETO
POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA ........................................................................................ 164
GRÁFICO 17 - OS TEMPOS E ESPAÇOS EM ATENDIMENTO AS NECESSIDADES DO
PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA ...................................................................... 171
GRÁFICO 18 - ESPAÇOS ESCOLARES COM MAIOR AFINIDADE DISCENTE DE
PARTICIPAÇÃO ................................................................................................................................ 177
GRÁFICO 19 - ESPAÇOS ESCOLARES COM MENOR AFINIDADE DISCENTE ..................... 178
GRÁFICO 20 - ESTRATÉGIAS DE ENSINO UTILIZADAS COM MAIOR FREQUÊNCIA PELA
ESCOLA ............................................................................................................................................. 179
GRÁFICO 21 - ESTRATÉGIA DE ENSINO QUE OS DISCENTES FREQUENTEMENTE
PARTICIPAM NA ESCOLA ............................................................................................................. 181
GRÁFICO 22 - MODIFICAÇÕES PRIORITÁRIAS DA ESCOLA SEGUNDO OS DISCENTES. 182
GRÁFICO 23 - ATIVIDADES EXTRACURRICULARES, SEGUNDO OS DOCENTES,
FREQUENTEMENTE ORGANIZADAS PELA ESCOLA .............................................................. 183
GRÁFICO 24 - PARTICIPAÇÃO DISCENTE EM ATIVIDADES FORA DA SALA DE AULA . 184
GRÁFICO 25 - DIFICULDADES DA ESCOLA EM PROPOR MUDANÇAS PEDAGÓGICAS .. 188
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 16
Do problema de pesquisa .......................................................................................................... 19
Objeto da pesquisa e questão central ........................................................................................ 21
O percurso metodológico da pesquisa ...................................................................................... 22
Da relevância, conceitos centrais e estrutura da investigação .................................................. 24
1.
A TRAJETÓRIA DAS INOVAÇÕES E SUA EMERGÊNCIA NO
CONTEXTO EDUCACIONAL ................................................................................... 26
1.1 Inovações: origem e evolução conceitual ........................................................................... 26
1.2 As inovações quanto ao padrão ou grau de novidade ......................................................... 31
1.3 Novos enfoques dos processos inovativos ......................................................................... 34
1.3.1 Os enfoques sociológicos das inovações organizacionais ............................................... 39
1.4 Conceituando inovações educacionais ............................................................................... 41
1.5 Os processos de inovações prescritos às escolas ................................................................ 45
1.6 Os enfoques inovativos do ponto de vista da cultura escolar e suas aproximações com o
Projeto Político-Pedagógico ..................................................................................................... 48
2. GESTÃO ESCOLAR, O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO E A
PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE .................................................................... 55
2.1 Organização do trabalho escolar e inovações educacionais ............................................... 55
2.1.1 A concepção burocrática e os processos de inovação escolar ........................................ 55
2.1.2 A concepção gerencial e os processos de inovação escolar ............................................ 60
2.1.3 A Gestão Escolar Sociocrítica ......................................................................................... 66
2.1.4 Os novos princípios organizadores da gestão escolar ..................................................... 72
2.1.4.1 A concepção autogestionária ........................................................................................ 73
2.1.4.2 A concepção interpretacionista .................................................................................... 74
2.1.4.3 A concepção democrático-participativa ....................................................................... 75
2.1.4.3.1 O Projeto Político-Pedagógico e a Gestão democrático-participativa....................... 79
2.1.4.3.2 Analisando experiências inovadoras na Gestão democrático-participativa .............. 85
2.1.4.3.3 O PPP, as formas e valores da gestão democrático-participativa .............................. 87
2.1.4.3.4 A Gestão do PPP: possibilidades e contradições ....................................................... 91
3. ANÁLISE DE UMA EXPERIÊNCIA EM CONSTRUÇÃO: A GESTÃO
E
AS
PRÁTICAS
PEDAGÓGICAS
DO
PROJETO
POLÍTICO-
PEDAGÓGICO PARA MAIOR PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE –
ANÁLISE DOS DADOS DOS QUESTIONÁRIOS, GRUPOS FOCAIS E
ENTREVISTAS ................................................................................................................. 95
3.1 As unidades e categorias de análise dos questionários, grupos focais e entrevistas como
instrumentos de pesquisa .......................................................................................................... 95
3.2 Aproximando da experiência em construção: análise das categorias dos questionários,
grupos focais e entrevistas ........................................................................................................ 97
Categoria 1: Participação da comunidade na gestão do Projeto Político-Pedagógico da escola
.................................................................................................................................................. 97
Unidade 1: Percepção da comunidade da participação nas práticas do PPP ............................ 97
Unidade 2: Os profissionais da escola, processos decisórios e o PPP .................................... 117
Unidade 3: Concepção dos sujeitos da sua vivência escolar .................................................. 120
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes .................................. 121
Categoria 2: O PPP enquanto unidade de articulação escola-comunidade ........................... 132
Unidade 4: Finalidades do PPP e organização das práticas pedagógicas e de gestão ............ 132
Unidade 5: Relações de trabalho na escola ............................................................................ 139
Categoria 3: Ações desenvolvidas pela escola para maior participação da comunidade no
Projeto Político-Pedagógico ................................................................................................... 146
Unidade 6: Fatores para aumento dos processos participativos ............................................. 146
Unidade 7: Os projetos e as experiências curriculares e extracurriculares............................. 153
Unidade 8: Estratégias de Planejamento das ações ................................................................ 162
Unidade 9: Parcerias com a comunidade e sistemas de apoio ................................................ 168
Unidade 10: Organização dos tempos, espaços e práticas pedagógicas ................................. 171
Categoria 4: Dificuldades de maior participação da comunidade no Projeto PolíticoPedagógico ............................................................................................................................. 188
Unidade 11: Os desafios dos processos de mudança na escola .............................................. 188
Unidade 12: A percepção da escola da participação dos pais ................................................ 192
Unidade 13: Preparação profissional para as vivências comunitárias. ................................... 196
Unidade 14: A participação da comunidade no planejamento das ações ............................... 197
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 199
REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 213
APÊNDICES
APÊNDICE A – CONTRIBUIÇÃO TÉCNICA DA DISSERTAÇÃO
APÊNDICE B – QUESTIONÁRIO DOCENTE
APÊNDICE C – QUESTIONÁRIO DISCENTE
APÊNDICE D – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO TCLE
APÊNDICE
E – SELEÇÃO DE DOCENTES PARA PARTICIPAR DO GRUPO
FOCAL
APÊNDICE F – ROTEIRO DE ENTREVISTAS
APÊNDICE G – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA GRAVAÇÃO DE DADOS
ANEXO A – PARECER CONSUBSTANCIADO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA
ANEXO B – PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DA ESCOLA PESQUISADA
16
INTRODUÇÃO
Ao nomear a gestão democrática do ensino público para educação básica, a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDBEN 9394/96)1 prevê que os profissionais da escola deverão
organizar o seu Projeto Político-Pedagógico – PPP de ensino. Tal perspectiva, acompanhando
o cenário de redemocratização das instituições no país, sinaliza com as possibilidades de
maior participação e autonomia da comunidade escolar.
O PPP sistematiza as intenções educacionais da escola, suas convicções pedagógicas e
práticas de gestão, pela participação dos profissionais (professores, diretores, supervisores,
auxiliares), alunos e demais segmentos da comunidade na definição de estratégias e objetivos
coerentes com o enfrentamento dos desafios e construção da escola, da sociedade desejada
(VEIGA, 2004; QUARESMA, 2012).
Consiste na expressam da própria autonomia, entendida como a “[...] capacidade da escola
elaborar e implementar um Projeto Político-Pedagógico que seja relevante à comunidade e à
sociedade a que serve.” (NEVES, 1995. p.113). Essa capacidade é expressa na participação
conjunta e articulada dos sujeitos no PPP.
Essa autonomia da escola e construída fundamentalmente na dialética de constituição do PPP,
envolve rupturas com o presente e a constituição de possibilidades futuras, num diálogo
permanente da comunidade com os campos instituintes e instituídos que caracteriza a sua
realidade histórico-social (GADOTTI, 2004).
Quanto ao PPP da escola pesquisada menciona-se a construção de uma educação de
qualidade, orientada pela formação cidadã e inclusão no mundo do conhecimento e do
trabalho, com respeito às diferenças e autoestima, fundada em princípios educacionais críticoparticipativos: “pensar coletivo na busca de estratégias que permitam [...] proporcionar aos
alunos e comunidade uma educação cidadã, possibilitando a participação e integração em
1
Segundo o Art. 14º. Da LDBEN 9394/96, os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do
ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:
participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e participação das
comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
17
todas as atividades desenvolvidas [...]” (PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA
ESCOLA PESQUISADA, 2012, p.03).
A escola define o Projeto Político-Pedagógico como “uma construção coletiva que evidencia
intencionalidade educativa, balizando as ações pedagógicas, tendo em vista a prática reflexiva
constante, necessária para uma educação de qualidade, inovadora e para todos.” (PROJETO
POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA PESQUISADA, 2012, p.30).
Por outro lado, essa perspectiva de participação no PPP ao pressupor as possibilidades de
maior envolvimento dos sujeitos exige o fortalecimento democrático-participativo para que
seja expressão da vivência da comunidade, das dimensões histórico-sociais dos sujeitos e do
caráter edificante e/ou emancipatório das suas práticas (VEIGA, 2003).
Ao sustentar no caráter edificante, com valorização das dimensões autogeradoras dos sujeitos,
o PPP consiste numa expressão da própria realidade histórico-social da comunidade, que tem
na proposta as referencias necessárias para articular práticas de vivências instituintes que
alteram os campos instituídos. Assim, converte na expressão dos próprios processos de
inovações educacionais, da relação entre processos de estabilidade (instituídos) e mudança
(instituinte) pela participação coletiva dos sujeitos.
Para Carbonell (2002) um Projeto Político-Pedagógico inovador associa conhecimento e
afeto, o pensamento e os sentimentos, o raciocínio e a moralidade, o acadêmico e a pessoa, as
aprendizagens e os valores. Pressupõe um aprofundamento dos processos participativos e uma
formação integrada à realidade histórico-social da comunidade.
Um projeto educativo inovador expressa finalidades e esperanças no futuro; histórias
e narrações compartilhadas; objetivos globais relativos à personalidade dos alunos,
seu desenvolvimento social e suas aprendizagens; concepções sobre a convivência e
a maneiras de enfrentar os conflitos (CARBONELL, 2002, p.81).
Assim, um PPP inovador apoia-se nos processos democrático-participativos, sustentando nas
próprias sinergias comunitárias de construção de um caminho educativo coerente com a
realidade histórico-social dos sujeitos. Exige condições societárias de gestão como forma de
assegurar a autonomia e o compromisso da comunidade na melhoria da qualidade
18
educacional, consequentemente, da transformação da escola pela prática concreta dos seus
sujeitos.
Entretanto, nas experiências profissionais2 como Analista Educacional da Superintendência
Regional de Ensino de Teófilo Otoni – SRE, as possibilidades edificantes do PPP não têm
sido percebidas na grande maioria das escolas. Há lacunas em seu caráter edificante e/ou
emancipatório e, consequentemente, nas inovações aderentes à realidade histórico-social dos
sujeitos.
As práticas concretas existentes nas escolas, onde o pesquisador realiza acompanhamento,
estariam mais próximas do que Veiga (2003) designa de caráter racional ou técnico, no qual
as propostas assumem um sentido burocrático, de cumprimento das formalidades da política
pública. Portanto, distante da vivência de um processo dinâmico que expresse a própria
realidade histórico-social dos sujeitos.
Essas evidências associadas à atividade profissional do pesquisador, das tendências de
vivência do caráter burocrático do PPP sinalizam com uma atuação desarticulada dos sujeitos,
com redução das possibilidades efetivas de construção de um projeto coletivo com ampla
participação comunitária na produção de práticas inovativas endógenas3.
Por outro lado, estudos realizados apontam também incoerências na gestão escolar,
consequentemente, nas práticas do PPP, destacando acordos referendados em gabinetes e a
ausência de um sentido político-democrático das transformações da escola em sintonia com a
realidade histórico-social dos sujeitos (GOHN, 2007; LIBÂNEO, 2008; VEIGA, 2003).
Essa ausência de sentido político-democrático das transformações estaria associada à cultura
dos órgãos centrais de definir um modelo educacional a ser executado pelas escolas com
previsão das estratégicas de implantação, acompanhamento e controle das ações,
desconsiderando aspectos da cultura escolar (LIBÂNEO, 2008).
2
O pesquisador, desde 2002, exerce as suas atividades na Superintendência Regional de Ensino de Teófilo Otoni
como Analista Educacional, cujas atividades profissionais são ligadas ao acompanhamento e apoio às escolas na
implantação dos programas/projetos das políticas de ensino em curso no Estado.
3
Entendidas como aquelas associadas ao caráter edificante do PPP, no qual as mudanças são propostas pelos
próprios sujeitos envolvidos, perpassando por concepção e prática. Assim, diferem dos processos de mudanças
que são prescritos às escolas.
19
A definição pelos órgãos centrais de um modelo a ser seguido pelos sistemas de ensino
sustenta em práticas de difusão das inovações em que são desconsideras as especificidades de
cada unidade educativa como detentora de uma realidade histórico-social própria
(HERNÁNDEZ et al, 2000; CARBONELL, 2002).
Percebe-se que há dificuldades na constituição das relações recíprocas, no diálogo como uma
possibilidade da comunidade refletir sobre a variedade de percepções da cultura pedagógica e
processos gestionários mais coerentes com a realidade histórico-social do PPP.
Do problema de pesquisa
Assim, as experiências relacionadas às atividades profissionais do pesquisador e os
fundamentos teóricos relativos aos processos participativos nas escolas apontaram para uma
contradição entre a previsão legal de gestão democrática das práticas do PPP e as formas
como efetivamente o mesmo é vivenciado no interior das escolas4.
A atividade profissional do pesquisador e a relação com os seus pares permitiram constatar
que o universo de 39 escolas que compõem a rede pública estadual de ensino do município de
Teófilo Otoni, distribuído em 07 escolas rurais e 32 urbanas, em sua maioria, requer uma
maior sinergia escola-comunidade nas práticas do PPP.
Nesse sentido, sem apropriação dos sujeitos escolares dos processos participativos de vivência
e (re) construção do PPP fica comprometido, inexistindo uma coerência entre o que é
proposto formalmente e o que é praticado no interior da escola.
Por outro lado, pela atividade profissional do pesquisador, constatou-se que algumas escolas
empreendiam esforços para maior participação da comunidade nas práticas do PPP,
sinalizando intenções de vivência autogeradora em detrimento ao caráter técnico ou racional.
4
Em aproximadamente 10 anos de atividade profissional na SRE de Teófilo Otoni, exercendo as atribuições de
Analista Educacional, são recorrentes as reclamações dos diferentes segmentos da comunidade escolar. É
comum, por exemplo, professores reclamarem da ausência de participação nas decisões, assim como, as
queixas da direção quanto a falta de apoio da sua comunidade, especialmente dos professores, no
desenvolvimento da escola. A mobilização e envolvimento da comunidade na gestão participativa do PPP em
sua vivência concreta é bastante frágil.
20
Esses esforços eram sugestivos pela possibilidade de existência de modificações nas práticas
do PPP para maior participação da comunidade.
Essas tendências, que curiosamente se apresentaram como possibilidades de inovações nas
práticas do PPP, demandam um maior aprofundamento investigativo, no sentido de
compreender as iniciativas em construção que asseguram uma maior participação da
comunidade.
Diante do cenário reduzido das instituições de ensino que expressam as intenções de uma
maior sinergia escola-comunidade na vivência das práticas do PPP uma escola, pertencente ao
município de Teófilo Otoni, chamou atenção para os seguintes aspectos:
a) A escola situa-se em uma região de vulnerabilidade social e não é vítima de avarias ao seu
patrimônio, como roubos, pichações e depredações, considerando que outras escolas do
município, nessa mesma condição, são frequentemente vítimas desse tipo de ação.
b) A intenção expressa pela escola de aproximar da comunidade nas práticas concretas do
PPP, expresso em faixas e cartazes: “Escola e comunidade de mãos dadas” e o fato da escola
ser referência em apresentações no município (seminários, encontros, recepção política,
igrejas, dentre outros), com destaque para as apresentações do coral da escola.
c) O envolvimento da escola em iniciativas e ações propostas por outras instituições
(concursos, eventos, apresentações, dentre outros), sugerindo vivências ampliadas do seu
PPP.
d) Os resultados alcançados pelos alunos em Programas de Avaliação da Educação 5, em 2011,
assegurando uma posição de destaque em âmbito da SRE de Teófilo Otoni.
Esses aspectos eram sugestivos da existência de inovações nas práticas do PPP para maior
participação da comunidade e determinantes para a escolha proposital dessa unidade para
análise investigativa.
5
Em 2011, a proficiência da escola no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) foi de 5.5,
ficando 17% acima da meta prevista para o período.
21
Objeto da pesquisa e questão central
Estando correlacionado com as evidências da prática profissional do pesquisador, o objeto da
investigação tomou como referência os processos relacionados às inovações na gestão do PPP
e maior participação da comunidade, cujo objetivo geral foi analisar as inovações que estão
sendo produzidas na gestão do Projeto Político-Pedagógico que promovem maior participação
da comunidade.
Esse objetivo geral desdobrou em três pretensões específicas, centradas em compreender o
processo de participação da comunidade escolar na gestão democrática do Projeto PolíticoPedagógico; identificar as ações inovadoras que possibilitam a participação da comunidade
escolar na gestão democrática do Projeto Político-Pedagógico; evidenciar as possibilidades e
limites de participação da comunidade na gestão do Projeto Político-Pedagógico.
A questão central procurou evidenciar as inovações que estão sendo construídas no PPP para
maior participação da comunidade, tomando como referência o PPP concretamente
vivenciado pela escola (campo instituído) em diálogo com as intenções desejadas pelos
sujeitos comunitárias (campo instituinte). Assim, orientou-se pela seguinte pergunta: Quais
inovações estão sendo construídas na gestão do projeto político pedagógico da escola tendo
em vista maior participação da comunidade?
Por inovação na prática do PPP para maior participação da comunidade são tomados os
processos intencionais e sistemáticos de mudanças que envolvem a comunidade e seu caráter
autogerador, em sinergia com a realidade histórico-social dos sujeitos envolvidos. Assim,
buscou-se dialogar com as questões pedagógicas e de gestão, enquanto condições operativas
para vivência das intenções educacionais do PPP e o seu nível de reciprocidade com o projeto
de homem e sociedade desejado.
22
O percurso metodológico da pesquisa
A investigação consistiu num estudo de caso exploratório-descritivo de uma experiência em
construção na rede pública estadual de educação do município de Teófilo Otoni- MG com
planejamento mais estruturado da pesquisa.
Sendo as práticas de gestão e pedagógicas do PPP um processo dinâmico “a metodologia de
pesquisa qualitativa pode descrever a complexidade de determinado problema, analisar a
interação de certas variáveis, compreender e classificar processos dinâmicos vividos por
grupos sociais” (RICHARDSON, 1999. P.80).
A natureza social do fenômeno e a necessidade de compreender as inovações nas práticas do
PPP em condições edificantes e emancipatórias (VEIGA, 2003) foi fundamental para a
escolha do estudo de caso como percurso metodológico da investigação.
O recorte em uma unidade institucional foi proposital6 visando aprofundar conhecimentos
sobre práticas do PPP e participação da comunidade. De acordo com Gil (1995) o
delineamento em estudo de caso pode ser feito em quatro fases: a delimitação da unidadecaso; a coleta de dados; a seleção, a análise e a interpretação dos dados e a elaboração do
relatório.
A escola pesquisada atende 4537 alunos dos anos iniciais do ensino fundamental8 dos bairros
Funcionários, Filadélfia, Esperança, Frei Júlio, Jardim São Paulo, Vila Progresso,
Solidariedade, Pindorama, Alunos da casa Nazaré e Teófilo Rocha9. São bairros marcados
6
A atividade profissional do pesquisador na Superintendência Regional de Ensino de Teófilo Otoni – SRE
permitiu situar evidências empíricas e o caráter proposital, tais como: a escola situar em área de risco social e
não ser vítima de violência, principalmente de avarias ao seu patrimônio, sugerindo uma relação diferenciada na
vivência do PPP pela comunidade; a existência de elementos espontâneos (faixas, cartazes, apresentações, entre
outros) de aproximação da escola com a sua comunidade, a disposição da escola de colaborar e participar de
iniciativas promovidas por outras instituições da comunidade e os resultados alcançados pela escola no Programa
de Avaliação da Alfabetização de Minas Gerais.
7
Dados fornecidos pela Superintendência Regional de Ensino de Teófilo Otoni.
8
De acordo com a LDB 9394/96, a Educação Básica é composta pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e
Médio. O Ensino Fundamental é composto pelos anos Iniciais (1º ao 5º ano) e finais (6º ao 9º ano).
9
Os bairros citados são baseados no zoneamento geográfico adotado para o cadastramento escolar que não
reflete a realidade vivida pela escola, considerando que não atende nenhuma aluno do Bairro Funcionários e
Filadélfia. Apesar de próximos à escola esses dois bairros são de classe média e os pais não matriculam os filhos
na escola pesquisada. Assim, o zoneamento geográfico não corresponde à realidade vivida pela escola.
23
pela violência10 imposta pelo tráfico de drogas, persistindo rivalidades e disputas pelo
domínio de regiões estratégicas.
Na agregação dos impactos e aproximação prática do fenômeno (DEMO, 1994) foram
utilizadas as seguintes técnicas de coleta de dados: entrevistas semiestruturadas, grupo focal e
questionário, orientando-se pela perspectiva de “os procedimentos e instrumentos de coleta
de dados nas pesquisas qualitativas são ‘multimetodológicos’, isto é, usam uma grande
variedade
de
instrumentos
de
coleta
de
dados.”
(ALVES-MAZZOTTI;
GEWANDSZNAJDER, 1998, p.163).
A primeira aproximação com a realidade empírica baseou-se na aplicação de um questionário
aos 28 docentes (APÊNDICE B) e 84 discentes (APÊNDICE C) do 4º ano do Ensino
Fundamental considerando a singularidade desses sujeitos na produção de inovações 11 no
PPP.
Esse primeiro momento possibilitou constituir uma base de dados das práticas
pedagógicas e de gestão do PPP e o seu diálogo com a comunidade.
Dos questionários aplicados, considerando os aspectos mais relevantes para compreensão das
temáticas, foram selecionados 10 professores e 10 alunos para participar dos grupos focais,
cuja intenção foi o aprofundamento qualitativo da vivência do PPP no interior da escola.
As entrevistas seguiram a sistemática de um “encontro entre duas pessoas, a fim de que uma
delas obtenha informações a respeito de determinado assunto, mediante uma conversação de
natureza profissional” (LAKATOS; MARCONI, 2010, p.197). As entrevistas foram
realizadas com 02 supervisores da escola, com a diretora e com um membro da comunidade
voluntário do coral, tendo em vista o papel desses sujeitos na articulação dos processos
participativos nas práticas do PPP.
A combinação de técnicas de coleta de dados de caráter qualitativo (grupos focais e
entrevistas) e quantitativo (questionários) visaram assegurar um maior nível de credibilidade
e validade dos resultados. A interpretação dos dados sustentou na identificação das unidades
10
De acordo com o mapa da violência dos municípios brasileiros, baseados nos atestados de óbitos cadastrados
pelo Subsistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde, Teófilo Otoni ocupa a 46º posição
dos municípios mais violentos do país em 2006.
11
Vê-se que “as inovações que vêm de baixo, ao próprio coletivo docente, têm mais possibilidades de êxito e
continuidade do que aquelas que emanam de cima.” (CARBONELL, 2002, p.28).
24
de análise e agrupamento em categorias empíricas (OLIVEIRA, 2007) e na triangulação das
informações obtidas nos questionários, nos grupos focais e entrevistas (LEONARDO;
GOMES: WALKER, 1994).
Da relevância, conceitos centrais e estrutura da investigação
Ao percorrer a análise das inovações produzidas nas práticas do PPP para maior participação
da comunidade, orientando-se pelo caráter autogerador e realidade histórico-social dos
sujeitos, a investigação visou contribuir com o aprofundamento das relações democráticas no
interior da escola e participação social da comunidade.
Ainda teve como pretensão sistematizar uma experiência concreta de participação social
comunitária no PPP, apontando aspectos relevantes para participação da comunidade e
produção de inovações em suas práticas gestionárias e pedagógicos. Ao tomar posição dos
processos societários como mais adequados para a participação da comunidade objetivou
contribuir com o repensar das políticas públicas, da conversão dos processos prescritos em
uma lógica de auto-organização e associação da comunidade, onde a sociedade civil assuma
papel proativo.
Assim, a compreensão das dimensões societárias, o aprofundamento democráticoparticipativo e sentido autogerador dos sujeitos nas práticas do PPP sinaliza com uma
implicação dos sujeitos quanto as práticas de gestão social, entendidas como um processo de
organização da educação pelo e para além do Estado onde a comunidade, em especial
segmentos da sociedade civil, desenvolvem ações educacionais de interesse público. Estaria
em consonância com o conceito de gestão social expresso por Tenório (2006) de um processo
dialógico no qual a autoridade decisória é compartilhada entre os sujeitos da ação.
Ao destacar o envolvimento da comunidade nas práticas do PPP, com participação de
segmentos da sociedade civil, a sistematização da experiência torna-se relevante para a
compreensão das implicações da escola, do papel proativo e co-responsabilidade dos seus
sujeitos para o desenvolvimento local (DOWBOR, 2006).
Quanto a estrutura desta dissertação no primeiro capítulo situa-se o conceito de inovações,
sua emergência no campo econômico e deslocamento para as áreas de caráter não-
25
tecnológicas, permitindo compreender a emergência social e educacional dos processos
inovativos. É estabelecida, na última parte desse capítulo, uma aproximação entre inovações
educacionais e práticas do PPP.
No segundo capítulo, o conceito de gestão é correlacionado com as concepções de
organização do trabalho escolar e suas aproximações com o PPP, enfatizando as
possibilidades de participação da comunidade. Nesse capítulo sinaliza-se com a perspectiva
das dimensões societárias como possibilidades de aprofundamento do projeto democráticoparticipativo e vivência do caráter autogerador do PPP pelos sujeitos comunitários.
No terceiro capítulo são analisadas as experiências que vem sendo empreendidas por uma
escola pública de práticas pedagógicas e de gestão para maior participação da comunidade no
PPP. São enfatizadas as principais tendências em curso, seus limites e possibilidades, de
expressão dos processos inovativos autogeradores.
Apoiando na revisão literária e na análise dos resultados obtidos o pesquisador apresenta suas
considerações finais quanto ao objeto da investigação e a suposição incialmente levantada a
partir da questão central. As considerações finais serviram de base para organização de uma
contribuição técnica da pesquisa (APÊNDICE A).
26
1.
A TRAJETÓRIA DAS INOVAÇÕES E SUA EMERGÊNCIA NO
CONTEXTO EDUCACIONAL
1.1 Inovações: origem e evolução conceitual
A emergência da chamada teoria da inovação data do início do século XX, quando o
economista e professor da Universidade de Havard, Joseph Schumpeter, correlacionou a
emergência de novos produtos com os ciclos rápidos de dinamização da economia,
destacando a influência das novas tecnologias no desenvolvimento do capitalismo.
Como pilares básicos do pensamento inovativo Schumpeteriano, o Manual de Oslo (2005),
elaborado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e
pelo Eurostat, ressalta a introdução de novos produtos, a abertura de novos mercados, a
criação de novas estruturas industriais e o desenvolvimento de novas fontes provedoras de
matérias-primas. A ideia prevalecente era do aperfeiçoamento e/ou criação de novos produtos
ou processos como fator de dinamização da economia, rearticulando os novos ciclos de
desenvolvimento do capitalismo.
A criação de novos produtos ou processos de produção rearticuladores dos ciclos de
crescimento econômico, ideia central do pensamento Shumpeteriano, passa a ser denominada
de inovações tecnológicas ou de produtos – TPP. Estaria associada ao desenvolvimento de
novos produtos para serem lançados no mercado e/ou à otimização dos processos de
produção, com redução, principalmente, do tempo e custos da produção.
As novas tecnologias associadas aos processos de produção e os novos produtos propostos
por Schumpter na década de 1930 são analisados por Bautzer (2008), destacando que
envolvem doses de incertezas e assumir os riscos quanto à revisão do pensamento sistêmico
operante. A modificação dos processos de produção e criação de novos produtos, segundo o
mesmo, demanda certo grau de “destruição criadora”, desafiando as organizações a
repensarem as condições operantes. Esse processo de destruição associa-se à própria
capacidade de criação, de produção de modificações nas condições operantes para retomada
27
dos ciclos de crescimento econômico, enquanto estratégia para a retomada dos ciclos de
crescimento em momentos de crise capitalista.
Todavia, o que Schumpter não havia previsto era que outras dimensões são intervenientes nos
ciclos de crescimento capitalista, podendo a crise estar associada à retração do consumo das
famílias, ao excesso de produção, à concentração de renda, ao desemprego, e a produtos
estandardizados12.
Esses outros elementos da crise do capital são bem visíveis em 1970, quando as modificações
nos processos de produção e criação de novos produtos demonstram ser insuficientes para a
retomada do ciclo de crescimento capitalista, demandando repensar questões de ordem nãotecnológicas, como diferenciação dos produtos em atendimento às demandas individuais e
formas de ampliação do acesso das populações aos bens produzidos.
Diante da incapacidade da economia estandardizada de responder à retração do consumo,
provocada principalmente pelo desemprego estrutural, crise do capital e esgotamento do
chamado estado de bem-estar social (welfare state), a perspectiva schumpeteriana torna-se
insuficiente para sustentar as inovações tecnológicas como único fator de dinamização dos
ciclos de crescimento capitalista. Outras dimensões, intervenientes nos ciclos de
desenvolvimento, especialmente aquelas correlacionadas às questões sociais e culturais,
passam a ser relevantes.
Na década de 1970, o sistema capitalista passa a adotar o padrão de acumulação flexível13,
como estratégia e enfrentamento da crise do capital, enquanto modo de adequação dos
sistemas produtivos às formas de organização gerencial, centradas em princípios de eficiência,
eficácia e produtividade. Uma das principais mudanças consiste na reorganização das
empresas em unidades menores que buscam diferenciar produtos e serviços em atendimento
às demandas locais.
12
Esses são apontados como os principais fatores da crise do sistema capitalista de 1970.
O modelo flexível de acumulação foi um estratégia de superação da crise do sistema taylorista/fordista da
produção padronizada, tendo como diretriz a descentralização dos sistemas produtivos e os princípios de
eficiência, eficácia e produtividade. Esses princípios, apropriados pela administração pública, tiveram ampla
repercussão no campo educacional (ARAÚJO; CASTRO,2001).
13
28
Diante do novo cenário de acumulação capitalista, as dimensões organizacionais e de
marketing emergem como formas relevantes para o modo de acumulação flexível. Enquanto
dimensões não tecnológicas, as inovações organizacionais e de marketing passam a sustentar
processos de mudanças, tanto na forma de organização e gestão das empresas, quanto na
remodelagem e inserção dos produtos no mercado.
O Manual de Oslo (2005), acompanhando as tendências da reestruturação produtiva flexível,
redefine o conceito de inovação ao incorporar essas dimensões.
Uma inovação é a implementação de um produto (bem ou serviço) novo ou
significativamente melhorado, ou um processo, ou um novo método de marketing,
ou um novo método organizacional nas práticas de negócios, na organização do
local de trabalho ou nas relações externas (OCDE, 2005, p.46).
Essas mudanças acompanham a dinâmica de reorganização dos processos econômicos,
marcada principalmente pela necessidade de diferenciação dos produtos, crescimento do setor
de serviços e redução do tempo de vida útil dos produtos. Assim, as dimensões organizacional
e de marketing, denominadas de inovações não tecnológicas, passam a ser incorporadas nos
processos de gestão das atividades econômicas.
Os enfoques organizacionais e de marketing da teoria das inovações remetem para a
necessidade de reconhecer novas práticas de gestão, de organização dos espaços de trabalho
compatíveis com o modelo da acumulação flexível, da dinâmica de design e inserção de
produtos e serviços no mercado.
Para Bautzer (2009), a inovação organizacional implica em um “novo olhar” sobre a gestão,
permeando tanto empresas quanto as políticas públicas. Esse novo olhar tem sido direcionado
para a organização de processos de gestão gerenciais nas empresas, fundamentado em um
modelo da administração eficiente, produtiva e com qualidade capaz de se sustentar em
ambientes de abertura dos mercados econômicos à ampla concorrência.
Quanto às inovações de marketing, estas são vistas por Carvalho (2009) como uma forma de
criar abertura para novos mercados e/ou reposicionamento de um determinado produto com o
aumento das suas vendas. São relevantes, considerando o princípio de diferenciação dos
produtos em ambientes flexíveis, já que visam a aproximar o produto das expectativas do
29
cliente, criando uma imagem producente com a sua satisfação pessoal e de sensações de
liberdade, segurança, reconhecimento, bem-estar, dentre outras.
Diante da organização flexível dos sistemas produtivos a inovação organizacional e de
marketing emergem como resposta ao processo de acirramento competitivo, de globalização
dos processos de produção e consumo, nos quais as dimensões local e global estão
intimamente interligadas, exigindo uma compreensão de fatores não tecnológicos que
influenciam o sistema produtivo.
Para Lopes e Barbosa (2008), o processo de inovação não compreende somente as atividades
criativas ou inventivas de novas tecnologias, mas também as atividades de gestão, de difusão
e adoção das novidades, podendo ser entendido do ponto de vista da estratégia, dos padrões,
dos processos de gestão e dos seus tipos.
O quadro a seguir sintetiza os tipos de inovações, seus conceitos estruturantes e seus
respectivos autores:
QUADRO 1:
TIPOS DE INOVAÇÕES
Tipos
Inovações em
produtos e serviços
Inovações em
processos e
operações
Inovação em
marketing
Inovação de
estratégia
Inovações de
gestão e
organizacionais
Descrição
Serviços ou bens melhorados (especificações
técnicas, componentes e materiais, softwares, entre
outros) em suas características e usos previstos.
Introdução de novas tecnologias com mudanças na
produção de bens e prestação de serviços.
Autores
OCDE (2005)
Mudanças na concepção do produto (embalagem,
posicionamento, promoção, preços).
Novos modelos de negócios com mudança de
suprimentos, proposição de valor e cliente-alvo.
OCDE (2005)
Mudanças na gestão e organização do trabalho
Hamel (2007)
Hamel (2007)
Davila et al (2007)
Miles e Snow (2007)
Chandler (1997)
Dampanpour (1991)
Hamel (2007)
Daft (1978)
Birkinshaw e Mol
(2006)
Tigre (2006)
Fonte: Adaptado pelo pesquisador baseando em Lopes; Barbosa (2008, p.4)
Observa-se que as inovações sintetizadas no QUADRO 1 visam otimizar os sistemas das
empresas na criação de diferenciais competitivos. Esses diferenciais estariam relacionados aos
30
produtos, serviços ou modo de gestão. A ideia central é produzir mudanças que assegurem às
empresas diferenciarem-se frente às concorrentes no mercado.
Pelo prisma econômico, os processos inovativos são entendidos como motor de dinamização
da economia de mercado, representando dimensões fundamentais dos ajustes estruturais do
sistema capitalista, especialmente em resposta às crises cíclicas do capitalismo.
Por outro lado, mesmo diante do padrão de acumulação flexível, os processos inovativos têm
demonstrado fragilidades quanto à sustentação dos sistemas de mercado apenas pelo viés
econômico, demanda repensar as inovações em outros campos, como o social e o educacional.
31
1.2 As inovações quanto ao padrão ou grau de novidade
Em relação ao padrão ou grau de novidade das inovações, do seu impacto no ambiente da
organização, Carvalho (2009) ao revisar a literatura identifica os níveis de variação a seguir.
QUADRO 2
INOVAÇÕES E O GRAU DE NOVIDADE
Tipos
Descrição
Radical/Incremental
Sustentação/Ruptura
Autônomas/Sistêmicas
Descontínua/Contínua
2
Realmente novo/Incremental
Autores
Schumpeter
(1934);
Stobaugh
(1988); Freeman (1994); Lee e Na
(1994); Atuahene-Gima (1995);
Balachandra e Friar (1997); Kessler
e Chakrabarti (1999).
Christensen (1997); Christensen e
Overdorf (2000)
Cheesbrough e Teece (1996)
Anderson e Tushman (1990);
Robertson (1967)
Shimidt e Cantalone (1998); Song e
Montoya-Weiss (1998)
Grossman (1970)
Normann (1971)
Maidique e Zirger (1984)
Yoon e Lilien (1985)
Rothwell e Gardiner (1988)
Meyers e Tucker (1989)
Utterback (1996)
Rice et al. (1988)
Kleinshmidt e Cooper (1991)
Wheelwright e Clark (1990)
Henderson e Clark (1990)
Abernathy e Clark (1985)
Moriarty e Kosnik (1990)
Instrumental/final
Variações/reorientações
Verdadeira/adoção
Original/reformulada
Inovação/re-inovação
Radical/rotina
Evolucionária/revolucionária
Ruptura/Incremental
3
Baixa/moderada/alta novidade
Incremental, nova geração, radicalmente novo
Incremental/modular/arquitetural/radical
Criação nicho/arquitetural/regular/revolucionária
Incremental/mercadologicamente
4
evolucionária/tecnologicamente
evolucionária/radical
Incremental/arquitetural/fusão/ruptura
Tidd (1995)
5
Sistemático/principal/menor/incremental/sem
Freeman (1994)
registro
Reformulado/novas
Johnson e Jones (1957)
8
partes/remerchandising/novas melhorias/novas
produto/novo
usuário/novo
mercado/novo
consumidores
Fonte: Carvalho, 2009. p.8.
Quanto ao padrão e grau de novidade, as inovações estão relacionadas ao impacto que os
processos de mudança produzem no interior das instituições, nos seus produtos, serviços e
32
mercados alvos. Perpassam desde ajustes nos fluxo dos processos a mudanças de ordem
estrutural.
Machado (2009)14, ao revisar Lemos (1988), infere que a inovação radical ou primária
corresponde a eventos novos que provocam mudanças profundas em produtos, processos e
organização, dando origem a novas oportunidades. Ao passo que a inovação incremental
corresponde a aperfeiçoamentos e reajustes que são feitos em produtos, processos ou formas
de organização sem ruptura paradigmática.
É nesse sentido que a organização da produção no chamado modelo de acumulação flexível,
baseado na descentralização das atividades, unidades de produção menores e participação de
todos na construção dos princípios de eficiência, eficácia e produtividade, é visto como uma
inovação radical que buscou superar a crise da produção em série do sistema
taylorista/fordista.
As inovações radicais podem ser vistas como uma estratégia adotada para o enfrentamento
dos ciclos de depressão do sistema capitalista, no qual a conversão de novas ideias em
práticas produz modificações de caráter estrutural, cuja intenção é retomar os ciclos de
crescimento. Ao passo que as inovações incrementais estariam relacionadas aos ciclos de
crescimento, constituindo em diferenciações dos produtos em ambientes de ampla
concorrência para manter posições estratégicas. Nesse sentido, a pertinência das inovações
radicais seria maior nos ciclos de depressão, enquanto as incrementais como estratégia de
prolongamento dos ciclos de crescimento.
Assim, Machado (2009) associa as inovações radicais às mudanças qualitativas e as inovações
incrementais às mudanças quantitativas. As inovações radicais seriam mudanças substanciais
da existência das coisas e as incrementais, a continuidade dos processos. Infere-se que o
qualitativo estaria para mudanças na estrutura em processos, tecnologias e modelos
organizacionais, sendo a gênese de proposições paradigmáticas que visam à superação das
disfunções do sistema capitalista.
Ao passo que a dimensão quantitativa consistiria em
aperfeiçoamento do paradigma vigente, na produção de ajustes de sustentação do sistema em
curso.
14
Refere-se a obra: LEMOS, Cristina. Inovação na Era do Conhecimento. In: LASTRES, M.M; ALBAGLI,
Sarita (Orgs). Informação e Globalização na Era do Conhecimento. Cap. 5, Rio de Janeiro: Campus, 1999. 163p.
33
Quanto à natureza da mudança, Carvalho (2009)15, sustentando-se em Christensen (1997) e
Christensen; Overdorf (2000), denomina as inovações como de sustentação e de ruptura. As
inovações de sustentação procuram melhorar o desempenho de um produto, já conhecido no
mercado, enquanto as de ruptura significariam a criação de novos produtos.
Carvalho (2009)16, ao revisar Cheesbrough; Teece (1996), diferencia as inovações autônomas
das sistêmicas. As inovações autônomas são descritas como aquelas que podem ser
desenvolvidas independente das outras, enquanto as sistêmicas dependem de outros campos
diretamente relacionados aos processos de mudanças.
A título de ilustração, os processos de inovação autônomos e sistêmicos poderiam ser como
um processo de mudança no interior de uma determinada empresa, no qual, em cada setor de
trabalho, os servidores poderiam, de forma autônoma, melhorar o atendimento ao público,
reduzir o tempo de espera, por exemplo, com um sistema de agendamento. Por outro lado, em
muitos aspectos, a proposta precisaria ser vista de modo sistêmico, buscando uma coesão
entre os diferentes setores na constituição de uma rede articulável de troca de informações e
melhoria da empresa.
Ainda que a teoria das inovações esteja, inicialmente, vinculada ao campo econômico, tendo
como pano de fundo garantir a sustentabilidade para as organizações em um ambiente de
concorrência, ver-se-á que, a partir da década de 1980, essa perspectiva é apropriada em suas
dimensões sociais, política, cultural e educacional.
15
Refere-se as obras: CHRISTENSEN, C.M. Making strategy: learning by doing. Harvard Business Review,
p.141-156, nov./Dec. 1997; CHRISTENSEN, C.M; OVERDORF, M. Meeting the challenge of disruptive
change. Harvard Business Review, p. 66-76, Mar./APR.2000.
16
Refere-se a obra: CHESBROUGH, H. W.;TEECE, D.J. When is Virtual Virtuous? Harvard Business Review,
v.74, n.º 1, p.65-73, May/June, 1996.
34
1.3 Novos enfoques dos processos inovativos
Originária do início do século XX, a perspectiva Schumpeteriana persiste até a década de
1980, sustentando a ideia do desdobramento das novas tecnologias em produtos e processos
produtivos como fator fundamental para a sustentabilidade da economia, estimulando os
ciclos de crescimento econômico.
Com a chamada revolução científico-tecnológica houve mudanças profundas e aceleradas nas
formas de produzir e nas relações sociais que as acompanham (MACIEL, 2001), destacando a
abertura econômica, a internacionalização dos sistemas produtivos, a volatilidade dos capitais,
as crises econômicas e as modificações dos hábitos de consumo locais.
Machado (2009)17, ao discutir o pensamento de Freeman (1982, 1992), chama a atenção para
a insuficiência da abordagem das inovações circunscritas à dimensão econômica das
empresas, destacando a necessidade de uma maior sinergia entre governos, sistema produtivo
e instituições de pesquisas no novo contexto emergente.
Reconhecendo que a globalização caminha paralelo ao processo de acumulação flexível, um
dos principais aspectos da insuficiência da tipificação das inovações em produto e processo
consiste no fato de não assegurar a sustentabilidade econômica já que fatores como o nível de
organização dos sistemas democráticos, a educação e o acesso a serviços sociais básicos
passam a ser decisivos.
É nessa direção que o aumento das disparidades sociais, especialmente na apropriação dos
processos tecnológicos, implica na necessidade de repensar as inovações como fator capaz de
assegurar uma maior equidade no campo social e educacional para a sustentabilidade mundial.
Machado (2009)18, apoiando-se em Andrade (2005), aponta lacunas na abordagem de
Shumpeter e neoschumpeterianos, ao restringir o debate dos processos inovativos à
lucratividade e aos resultados econômicos das pesquisas em desenvolvimento. Nesse sentido,
repensar as questões de ordem social torna-se imprescindível à construção de uma
17
Refere-se as obras: FREEMAN, Christopher. Economics Of Industrial Innovation. Cambridge: MIT, 1982;
FREEMAN, Christopher. The Economicas of hope. Londres: Pinter. Publishers, 1992.
18
Refere-se a obra: ANDRADE, Thales. Inovação e Ciências Sociais: em busca de novos referenciais. Revista
Brasileira de Ciências Sociais, v.20, n.58, junho/2005, p.145-156.
35
sustentabilidade global. É necessário que os modos organizacionais de apoio às inovações, o
debate das relações entre ciência e tecnologia, o ritmo técnico das inovações, dentre outras,
tenham como referência as questões sociais.
Assim, torna-se imprescindível pensar os processos inovativos, tendo como referência
transformações que assegurem maior equidade social, ou seja, que contribuam com o acesso
das populações a direitos universais como renda mínima, trabalho, lazer, justiça, educação,
dentre outros.
Reforçado a importância da compreensão das inovações Maciel (2001) destaca que sua
compreensão na área social e tecnológica é fundamental, tanto para a ciência social, quanto
para as políticas e estratégias de desenvolvimento em médio e longo prazo.
Nessa direção, vale destacar que os fatores da capacidade inovadora de uma empresa estão
para além das questões econômicas de desenvolvimento de novas tecnologias:
a capacidade inovadora de uma empresa ou de uma nação não depende pura e
simplesmente de sua capacidade econômica de investir em novas tecnologias nem
da de seus dirigentes para elaborar estratégias econômicas adequadas, e sim da
capacidade social, cultural e política de aplicar produtivamente e aproveitar
socialmente os recursos - materiais e imateriais – disponíveis (MACIEL, 2001,
p.19).
Reconhecendo que os processos de desenvolvimento sustentável estão para além das questões
econômicas, ganham espaços tendências que procuram interpretar os processos inovativos no
curso da história, propondo um pensamento reflexivo que contrapõe a perspectiva
determinista de restrição das inovações ao tecnológico e econômico. Outras dimensões
intervenientes nos processos inovativos passam a serem destacadas, como as questões
educacionais, políticas, sociais, culturais. Assim, emergem novas possibilidades de
compreensão dos processos inovativos como objeto de estudo.
Para Lopes e Barbosa (2008), a metodologia de abordagem das inovações como um fenômeno
social pode ser classificada em dois tipos, nomotética e ideográfica. A primeira enfatiza a
forma, a técnica e o uso de protocolo sistemático de pesquisa tipicamente existentes nas
ciências naturais, objetivando testar hipóteses pelo rigor científico. A segunda defende a
36
proximidade com o sujeito, sua experiência e história de vida, valorizando a percepção dos
indivíduos no contexto do fenômeno pesquisado.
Entende-se que a metodologia ideográfica apresenta-se como mais adequada para a
compreensão das inovações enquanto fenômeno social, captando dimensões da subjetividade
dos sujeitos, permitindo compreender com maior riqueza de detalhes processos de
transformação contínuos e sistemáticos em suas dimensões sociais.
É nesse sentido que, ao percorrer os processos inovativos, tendo como referência a
inteligibilidade histórica do homem, Machado (2009) estabelece um diálogo com as
perspectivas teóricas de natureza social apontado as abordagens de translação, redes sociais,
conhecimentos tácitos e ambientes de inovação.
Essas abordagens são sintetizadas no QUADRO 3 a seguir:
QUADRO 3
PERSPECTIVA DE ABORDAGEM SOCIAL DA INOVAÇÃO
Abordagem
Perspectiva de inovação
Translação (LATOUR, 1992; 2000)
Síntese de processos contraditórios e conflituosos pelo
processo de translação.
Redes Sociais (CASTELLS, 1999; Redes sociais impulsionadas por tecnologias da informação e
2003)
comunicação (TIC) que estimulam a interação social e a
circulação de conhecimentos em ambiente cooperativo.
Conhecimentos tácitos (COWAN; Codificação de conhecimentos tácitos em redes sociais de
FORAY, 1998)
interação e cooperação.
Ambientes de inovação (MACIEL, As características físicas, culturais e sociais do lugar
1996;1997; 2001)
associadas à criatividade da população.
Fonte: Adaptado pelo pesquisador baseando em Machado (2009, p.14-19)
Em todas essas abordagens, há um reconhecimento dos sujeitos em sua dimensão social,
valorizando as experiências existentes nos espaços comunitários. Cada qual, ao seu modo,
envolve estratégias de aproximação da realidade social e processos de aprendizagem coletiva,
quer seja por meio de translações, redes de conhecimento social, experiências comunitárias
tácitas e/ou ambientes de inovação. São possibilidades de intercâmbio de experiências e
fomento de aprendizagem, num processo interativo que valoriza dimensões de trabalho
coletivo e colaborativo do grupo.
37
Nesse sentido, essas abordagens são possibilidades de vivência dos fenômenos sociais em sua
natureza autogerador, perpassando pelo reconhecimento dos aspectos subjetivos e das suas
dimensões históricas nos processos participativos, com capacidade de síntese de pensamentos
complementares e/ou contraditórios.
Diante das novas possibilidades de abordagem das inovações, especialmente em suas
dimensões sociais, Machado (2009)19 chama a atenção para os riscos do entendimento da
tecnologia como um movimento autônomo, fundado em explicações reducionistas das
dimensões históricas e sociais. Ao revisar Ianni (2007), a autora enfatiza a necessidade de
compreensão das inovações como síntese de pensamentos contraditórios, envolvendo sempre
pontos como: singular e universal; quantitativo e qualitativo; teoria e prática; sujeito e objeto;
entre outros.
Assim, para explicar a conversão das mudanças quantitativas em qualitativas, Machado
(2009)20, apoiando-se nas relações de medidas nodal21 de Hegel, descreve que há pontos
específicos de variação quantitativa em que as mudanças convertem-se em uma nova
dimensão qualitativa do objeto, fenômeno, produto ou processo. Essa passagem das
determinações quantitativas para qualitativas revela-se em três processos: a variação gradual,
a transição e a superação.
A variação gradual consistiria em mudanças em maior ou menor grau da quantidade do
objeto, produto ou processo, mantendo sua natureza quantitativa. Pode ser interpretada como
pequenos ajustes, incrementos quantitativos. Quanto à transição, implica numa ruptura da
progressividade quantitativa, determinada pela emergência de dimensões qualitativas de
rupturas do fenômeno. A continuidade da transição impulsiona para uma superação, podendo
ser interpretada como um salto de progressividade, com a conversão da dimensão quantitativa
em qualitativa.
Essa dinâmica de conversão das determinações quantitativas em qualitativas indica que há
uma relação de diferenciação das dimensões do objeto. A diferenciação estaria na própria
19
IANNI, O. A crise dos paradigmas na sociologia: problemas de explicação. Disponível em: HTTP: //
www.anpocs.org.br/portal/publicações/rbcs_00_13/rbcs13_05.htm. Acessado em 31 agosto de 2007.
20
Refere-se a obra: HEGEL, G.W. F. Textos Dialéticos. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1969.
21
Na linha nodal de medida de Hegel, as dimensões quantitativas de mudanças do fenômeno, objeto ou processo
são vistas como o quanta (quantitativa) que em determinados pontos específicos criam uma nova dimensão
quantum (qualitativa).
38
natureza do objeto, já que as dimensões quantitativas seriam incrementais, sem modificação
da sua natureza e as qualitativas, um movimento de ruptura da sua natureza essencial. A
diferenciação estaria associada ao fato de que um salto qualitativo do objeto é precedido por
modificações de ordem quantitativa, que, paulatinamente, vão expressando o esgotamento das
suas possibilidades e suas contradições, sendo necessárias mudanças de caráter qualitativo.
Esse momento ou fenômeno em que as mudanças quantitativas provocam as qualitativas seria
decorrente da “luta de contrários, do desenvolvimento por meio de contradições, da negação
de negação” (MACHADO, 2009, p.24). Assim, as relações históricas travadas pelos sujeitos
envolvem o pensamento divergente e diferentes contrapontos, desestabilizando processos
instituídos e criando um campo instituinte22 com capacidade de lidar com a incerteza e
assumir desafios quanto ao futuro.
Obviamente, o movimento de superação, com a construção de novas determinações
qualitativas do objeto, exige ser pensado em uma dinâmica processual de construção das
relações, numa sistemática que envolve os sujeitos e o movimento constante de aproximação
com o campo instituinte desejado.
Se por um lado o desenvolvimento tecnológico e das forças produtivas significa avanço
científico, modernidade; por outro, pode ser sinônimo de esgotamento das fontes de riqueza,
trabalho e aumento das desigualdades (MACHADO, 2009). Assim, é interessante investigar a
forma como os sujeitos participam e o nível de responsabilidade social assumido diante dos
processos inovativos.
Reconhecer as dimensões sociais dos processos inovativos pressupõe superar a visão linear
dos fenômenos, já que existem, no interior das relações, pontos de convergência e
divergência; tanto facilidades, quanto dificuldades na vivência dos processos de mudança, de
superação qualitativa em seu caráter social e coletivo.
Partindo da perspectiva histórica e social, as inovações são vistas como “o nível mais elevado
das capacidades humanas, pois requer uma visão de conjunto e de síntese das necessidades
humanas, dos meios e recursos disponíveis e das condições e oportunidades para o emprego
22
Nesse caso, o campo instituído pode ser entendido como a realidade concreta vivenciada pelos sujeitos e o
instituinte como aquilo que se deseja construir, implicando num movimento de ruptura.
39
de conhecimentos e adaptação de soluções tecnológicas.” (MACHADO, 2009. p.12-13).
Como fenômeno social, exige uma visão em conjunto, demandando considerar a participação
interativa de diferentes atores e instituições na construção de processos de mudanças que
atendam aos interesses coletivos.
Isso demanda captar as dimensões sociais das inovações no interior das instituições,
reconhecendo a forma como os sujeitos envolvem-se com a proposta de organização, assim
como são organizados os processos de trabalho e o nível de participação coletiva dos sujeitos.
1.3.1 Os enfoques sociológicos das inovações organizacionais
As correntes funcionalista, interpretacionista e humanista radical são vistas por Lopes e
Barbosa (2008) como importantes para compreender a penetração das inovações no ambiente
organizacional. A seguir, procurar-se-á descrever os principais pontos de sustentação de cada
uma das concepções.
A) A perspectiva funcionalista
A inovação, na perspectiva teórica funcionalista, tem seus fundamentos nos economistas
clássicos Taylor e Fayol nas chamadas teorias da economia clássica (administração científica
e teoria clássica) que partem do pressuposto de que a sociedade é constituída por organizações
racionais e burocráticas regidas por leis científicas objetivas capazes de refutar dimensões
subjetivas (LOPES; BARBOSA, 2008).
Nesse caso, as inovações são vistas como a aplicação objetiva de um conjunto de princípios e
habilidades capazes de trazer mais eficiência na produção pela racionalização dos processos
produtivos.
Diante da incapacidade do modelo racional de responder a questões diversas, como, por
exemplo, os processos de alienação do trabalhador, surgem desdobramentos da perspectiva
funcionalista relativos aos processos de organização (LOPES; BARBOSA, 2008), a saber:
- Organicista: pressupõe superar o predomínio ideológico e intelectual da teoria clássica,
reconhecendo o dinamismo e a instabilidade de organizações complexas;
40
- Escola das relações humanas: as organizações vistas como unidades que integram indivíduos
à civilização industrial moderna tutelada por uma administração benevolente e socialmente
hábil.
Ainda, segundo os mesmos autores, houve a necessidade de incorporar às teorias o ambiente
político, social e legal capaz de influenciar nas decisões, cujas teorias destacam as influências
externas aos processos das organizações:
- Teoria Geral dos Sistemas: a organização é vista como um sistema aberto, reunindo e
combinando elementos que formam um todo complexo e uno que processa entradas (recursos
humanos, financeiros e materiais), transformando-as em saídas (mercadorias, serviços,
realizações e satisfação);
- Teoria da Contingência Estrutural: o conjunto de relacionamento da organização forma sua
estrutura, incluindo relacionamentos representados em organogramas, comportamentos
decorridos de normas e padrões internos e processos de tomadas de decisão. A estrutura tende
a ser mais hierarquizada e centralizada, quando predominam tarefas com baixo grau de
incertezas, e mais comunicativa e participativa, quando a incerteza da tarefa aumenta;
- Corrente institucionalista: busca compreender por que as organizações, diante de pressões
institucionais, apresentam homogeneidade em suas estruturas.
B) A perspectiva interpretacionista
Ao questionarem o “objetivismo” da realidade social, reconhecem as organizações como
processos que surgem de ações intencionais, individuais ou coletivas, que partem do ponto de
vista dos sujeitos relacionados à ação.
Os enfoques interpretacionistas, segundo Vergara; Caldas (2005, p. 67), são o solipsismo, a
fenomenologia e a hermenêutica. Os autores descrevem o solipsismo como um enfoque que
considera que o mundo é criação da mente ("do eu"). "Ontologicamente, não há criação de
coisa alguma" (VERGARA; CALDAS, 2005, p. 67). No que diz respeito à fenomenologia, o
objetivo é que o pesquisador deixe de lado seus pressupostos para se chegar ao fenômeno em
sua essência. Do enfoque da hermenêutica, que considera que a existência humana é
interpretativa, destacam-se as escolas de pensamento do interacionismo simbólico e da
etnometodologia.
41
C) A perspectiva humanista radical
Essa perspectiva é composta pelo pós-estruturalismo e teóricos críticos, sendo que a
preocupação central consiste em desenvolver a dimensão subjetivista da sociologia de
mudança radical,
sustentando numa epistemologia antipositiva, no voluntarismo como
essência da natureza humana e em metodologias ideográficas23 (LOPES; BARBOSA, 2008).
Essa concepção, de uma maneira geral, visa a transcender as limitações dos arranjos sociais
existentes, de forma a libertar o ser humano do domínio das superestruturas ideológicas. Se o
desafio primordial da sociologia é a mudança social na chamada sociedade do conhecimento
(MACIEL, 2001), essa concepção apresenta-se de modo bastante apropriado para a
compreensão das inovações sociais e educacionais em suas dimensões qualitativas.
1.4 Conceituando inovações educacionais
Em sua origem, as inovações educacionais estavam vinculadas a qualquer aspecto novo
introduzido nos sistemas de ensino, sendo sinônimo de qualquer novidade, independente do
seu caráter intencional ou proposital de melhoria da qualidade educacional ( HÉRNANDEZ et
al, 2000).
Acompanhando a dinâmica societária, o conceito torna-se convergente com o entendimento
de um processo de mudança intencional e sistemático de melhoria da qualidade do ensino
(HERNÁNDEZ et al, 2000; CARBONELL, 2002). Uma ação intencional e sistemática pode
ser entendida como um caminho desejado, que se pretende percorrer por meio de uma ação
articulada e programada pelos sujeitos. Remete, assim, a uma programação, à definição de um
caminho possível de conversão das definições para uma prática concreta de aplicação.
A conversão das ideias em práxis exige um trabalho contínuo dos sujeitos, com aderência
coletiva e aproximação constante da realidade desejada. Supõe sedimentar um caminho que
indique a intencionalidade da mudança de modo deliberado e planejado em uma sequência
que permita responder a um propósito previsto antecipadamente.
Nesse sentido, Hernández et al (2000), descreve as inovações educacionais como um conjunto
de mecanismos e processos que são o reflexo mais ou menos deliberado e sistemático, cuja
23
A metodologias ideográficas procuram captar as dimensões subjetivas dos sujeitos da ação.
42
pretensão é introduzir mudanças nas práticas vigentes, de modo que seja uma tarefa
necessária, útil e enriquecedora para os sujeitos envolvidos.
A organização de processos sistemáticos de mudança nas escolas, com participação dos
sujeitos envolvidos, pode envolver tanto questões relativas à gestão administrativa, financeira
quanto pedagógica, no intuito de que efetivamente contribuam com a melhoria da qualidade
do ensino. No entanto, sem dúvida, o maior desafio são as mudanças pedagógicas, que
contribuam com a melhoria da aprendizagem discente.
Quanto às políticas públicas de ensino, a perspectiva, recentemente, defendida é de que as
questões administrativas e financeiras assegurem a melhoria da qualidade das práticas
pedagógicas, ou seja, a melhoria da qualidade de ensino. O administrativo e financeiro
demanda ser pensando como suporte necessário para as questões pedagógicas.
Ao analisar o caráter multidimensional dos processos de mudança, Fullan24 (apud Hernández
et al, 2000) destaca o uso de novos materiais e tecnologias, novas abordagens de ensino e
alterações de crenças dos envolvidos como componentes críticos de uma nova proposta de
ensino. O maior desafio, segundo o mesmo, situa-se na modificação das concepções dos
sujeitos envolvidos, na construção de uma convicção de que as mudanças são possíveis e
necessárias.
Entende-se que esse sentimento de convicção nos processos de mudança esta associado aos
valores intrínsecos dos sujeitos de participar dos processos de transformação da sua própria
realidade. A convicção associada à motivação constitui-se num pilar fundamental para que os
processos tenham, como referência, o sujeito e sua participação no ambiente coletivo.
Contudo, em relação aos sistemas de ensino, tem predominado a contratação de equipes
técnicas para a sistematização de programas e projetos de mudanças a serem difundidos nas
escolas. A centralização das propostas de mudanças, sem envolvimento dos sujeitos, produz
ruptura na convicção e motivação dos sujeitos. As lacunas são relativas ao caráter prescritivo
e verticalizado das mudanças, da segmentação entre concepção e execução, que rompe com o
sentimento de pertencimento das pessoas que efetivamente estão envolvidas com as
transformações.
24
Refere-se a obra: FULLAN, C. The meaning of educational change. New York: Teachers College
Press, Columbia University, 1982.
43
Os espaços coletivos de reflexão e programação das propostas podem ser considerados como
uma forma de enfrentamento aos processos inovativos centralizados e verticalizados. É
importante que os envolvidos sintam-se contemplados e valorizados e que se fortaleça o
sentimento de pertencimento e identidade relativo às mudanças, tendo como substrato a
melhoria das práticas de gestão e pedagógicas.
Propostas de mudanças baseadas nos sujeitos coletivos exigem aprimoramento na gestão
democrático-participativa. É essa perspectiva que assegura canais de efetivo diálogo e
aderência dos sujeitos com os processos e suas transformações. Acrescenta-se, ainda, que os
espaços democráticos favorecem a emergência da consciência dos sujeitos quanto à sua
condição singular de transformação da escola.
Para Leonardos, Gomes e Walker (1994, p.10), as inovações educacionais consistem em
“modificações adotadas no que se refere aos procedimentos na estrutura institucional, no
universo do currículo e nas práticas de ensino-aprendizagem.” A estrutura institucional
compreende desde o organograma da escola, com os setores e respectivos atributos à
construção do conjunto de normas (regimento escolar), modo de gestão e concepção de ensino
que são expressas no PPP da escola, até o currículo e práticas pedagógicas. Envolve o modo
como se concretiza a concepção de ensino defendida pelos educadores, podendo, de acordo
com as convicções, ser mais humanista ou técnica, conservadora ou liberal, voltada para as
transformações sociais ou a manutenção dos status quo.
Obviamente, as modificações na estrutura institucional, no currículo e nas práticas
pedagógicas apoiam-se na melhoria da qualidade da educação pública na garantia de todos do
acesso e permanência (LDB 9394/96). Por outro lado, na perspectiva de maior sinergia com a
comunidade, essas modificações requerem canais efetivos de diálogo com a comunidade
local.
Do ponto de vista das práticas de ensino-aprendizagem, Saviani (1989) alerta que o
significado de inovar situa-se na intencionalidade do professor de manter um diálogo com o
aluno pautado na cooperação, estimulação das capacidades, atenção individualizada e no seu
reconhecimento como sujeito histórico das práticas educacionais.
Desse modo, as inovações escolares podem estar presentes tanto na forma de organização
institucional, especialmente na gestão dos canais de participação direta da comunidade
44
escolar, quanto na organização curricular e práticas de ensino vivenciadas na escola. Em
relação à organização institucional, o grande desafio consiste no aprofundamento dos
processos democrático-participativos da comunidade, de modo deliberado e autônomo, com
efetivo poder de decisão.
Para Carbonell (2002, p.19) as inovações educacionais são um “conjunto de intervenções,
decisões e processos, com certo grau de intencionalidade e sistematização que trata de
modificar atitudes, ideias, culturas, conteúdos e práticas pedagógicas.” Assim, pressupõe certo
nível de consciência, organização dos sujeitos e planejamento dos processos de mudança.
Com o avanço dos processos de comunicação impulsionados pela sociedade da informação,
Messina (2001, p.227) conceitua as inovações como um “processo multidimensional, capaz
de transformar o espaço no qual habita e de transformar-se a si própria”. Acrescenta, ainda,
que é um processo a ser vivenciado pelos sujeitos mediante o compartilhamento de
experiências de modo a “cumprir uma função projetiva.” (MESSINA, 2001, p.227)
Em termos escolares, a função projetiva é primordial ao permitir definir um horizonte
desejado a ser alcançado por uma prática concreta, de modo que as mudanças sejam
estruturadas a partir de um ordenamento lógico, intencional e planejado, mantendo a coesão e
a articulação coletiva dos sujeitos.
Quanto aos desafios da mudança, Ávila (2003) ressalta que estes são autodesafios técnicos e
profissionais, para que as experiências inovadoras possibilitem aos sujeitos conhecerem a
escola, seus recursos reais, condições e potenciais para o “alavancamento” das quantidadesqualidades desejadas da educação em cada escola-localidade.
Partindo do conceito de inovação observa-se que os processos de mudança perpassam por
uma vivência coerente com a concepção de homem e sociedade que se deseja construir.
Exige-se coerência com a realidade histórico-social da comunidade e papel proativo dos
sujeitos nos processos de mudanças. Assim como, uma simbiose entre proposições teóricas e
práticas comunitárias como elos indissociáveis.
Nesse prisma, as inovações educacionais apresentam-se como um caminho, como uma
possibilidade de aumentar as sinergias da comunidade escolar em processos de
autoconhecimento dos potenciais locais, bem como de materializar ações coerentes com as
suas próprias necessidades.
45
1.5 Os processos de inovações prescritos às escolas
A temática das inovações educacionais surgiu da necessidade de enfretamento dos problemas
sociais norte-americanos na década de 1960, estruturada em um plano de reforma curricular
do ensino de ciências e matemática, com ênfase no enfoque experimental e instrucional que
respondesse ao acelerado processo de desenvolvimento tecnológico do país.
Era um modelo sistemático, com prescrições às escolas de mudanças curriculares que fossem
compatíveis com as demandas da sociedade tecnificada. A ideia principal era de adaptação de
professores e alunos ao desenvolvimento tecnológico, partindo de um plano de instrução
científica no qual “a inovação consistiu em substituir um corpus de conhecimentos científicos
por um enfoque centrado na busca e na descoberta por meio da experimentação.”
(HÉRNANDEZ et al, 2000, p.20)
Ao analisar o modelo inovativo norte-americano, Hernández et al (2000) destaca sua
fragilidade quanto à participação da comunidade escolar:
Apesar do entusiasmo dos políticos e dos planejadores, da quantidade de dinheiro
investido e dos materiais criados, este foi um movimento principalmente legislativo,
promovido de cima para baixo, que não levou em conta os docentes que tinham
dificuldades para acompanhar os programas, as necessidades dos alunos com mais
capacidades, as situações de bilinguismo e a pressão dos novos valores
(HERNÁNDEZ et al, 2000, p. 21).
Segundo Hernández et al (2000), as suas principais fragilidades são a perspectiva simplista,
reduzindo a diversidade e complexidade das relações no interior da escola; a fragmentação
das etapas de planejamento e execução; as incompatibilidades com os processos de mudanças
qualitativas que ocorrem no interior das escolas; a ausência de reconhecimento da
singularidade dos professores frente aos processos de mudança.
Isso implica dizer que se não há envolvimento dos sujeitos, construindo uma identidade
quanto às propostas de mudança, principalmente dos professores enquanto sujeitos singulares,
as propostas de inovação dificilmente encontram a sustentação necessária. Ao se estruturarem
de maneira fragmentada, são contaminadas rapidamente por sentimentos de descrédito e,
consequentemente, de apatia dos profissionais envolvidos.
46
Nesse sentido, o próprio Hernández et al (2000, p.31) alerta que “não bastam a prescrição e o
financiamento das inovações para que estas sejam adotadas nas escolas.” É necessário que as
propostas criem aderência com o coletivo da escola, gerando um sentimento de pertencimento
e reconhecimento da sua importância nos espaços escolares.
Ao descrever as inovações no período de 1970-1980, Messina (2001) alerta para a perspectiva
verticalizada das inovações, fundada em pacotes estruturados pelos órgãos centrais de ensino
para serem implantados nas escolas, mediante acompanhamento sistêmico de equipes
técnicas. Como cada escola possui a sua própria identidade social e cultural, não é difícil
prever que a centralização dos processos de mudança produza um padrão homogeneizado,
definindo um estereotipo de escola inovadora, na grande maioria das vezes, com propostas
distantes das condições concretas vivenciadas pelas escolas.
As propostas de inovações verticalizadas são estruturadas com centralidade na figura do
chamado especialista de ensino que se responsabiliza pela coordenação e implantação das
ações no interior da escola, reduzindo os espaços de manifestação autônomo, especialmente
dos professores (CARBONELL, 2002). A supervisão do processo, em sua grande maioria,
realiza-se de forma mecânica e intransitiva, sem considerar as especificidades do contexto ao
qual a escola pertence e os saberes próprios dos seus sujeitos. Apoiam-se em um modelo
burocrático, cuja intenção é controlar as ações, as estruturas tempo-espaciais que são
mobilizadas pelos professores.
O modelo verticalizado é uma expressão do que Freire (1987) denomina de invasão cultural,
desconsiderando saberes e experiências próprias vivenciadas pela comunidade escolar na
resolução dos seus problemas. Enquanto perspectiva exógena, nega o diálogo entre os sujeitos
coletivos como possibilidade de transformação social. Nesse sentido, a escola torna-se
depositária dos saberes de uma equipe de especialistas.
Após a década de 1980, a perspectiva de inovação verticalizada tem perdurado nas propostas
de ensino do país, desconsiderando os saberes locais, a experiência da comunidade e a
dialogicidade como potenciais para a produção de processos de mudança aderentes com as
expectativas e interesses comunitários. Por outro lado, conforme mencionado anteriormente,
fortalece o sentimento de indiferença dos profissionais quanto às mudanças propostas.
47
Ao segmentar as funções entre o planejador e o executor, a perspectiva verticalizada fortalece
a divisão técnica e social do trabalho, corroborando com a execução de práticas mecânicas,
sem uma conexão com os saberes próprios de cada unidade escolar (CARBONELL, 2002).
Essa segmentação entre o corpo de especialista, tratados como notáveis detentores dos
saberes, e os professores, vistos como uma extensão, apêndice à execução das propostas,
constitui-se num dos graves problemas dos processos de mudança das escolas brasileiras, uma
vez que fortalece a postura cética dos docentes quanto à capacidade autogeradora da
comunidade de inovações.
O modelo de organização prescritiva dos processos inovativos não colabora ainda com a
construção de um trabalho coletivo, fundado na identidade do grupo e cooperação, tendo no
diálogo uma possibilidade de manifestação do pensamento divergente e construção de novas
sínteses, capazes de contribuir efetivamente com o desenvolvimento da instituição escolar,
especialmente com a qualidade do ensino.
Dessa forma, o modelo verticalizado de inovação sustenta-se numa perspectiva regulatória ou
técnica, exógena ao contexto social, cultural e político da escola. As mudanças são
implantadas com o apoio do caráter regulador e normativo da ciência conservadora,
produzindo um processo de mudança fragmentado, limitado e autoritário. Apoiado em Veiga
(2003), vê-se que é uma perspectiva incongruente com uma ação articuladora,
potencializadora de novas relações entre o ser, o saber e o agir.
Essa perspectiva cria uma cisão com os processos autogeradores de participação da
comunidade escolar, da percepção da escola como local de construção da identidade dos
sujeitos e de articulação das suas dimensões político-filosóficas. É um limite a vivência
comunitária como possibilidade de manifestação do agir consciente e dos saberes próprios.
Em maior grau, os processos de mudança assumem a centralidade político-ideológica do
Estado, sendo, na maioria das vezes, impostas, sem a construção de canais de participação
com efetivo poder de decisão da comunidade. É nesse sentido, que Àvila (2003) alerta para o
fato de a educação pública ser tratada como educação estatizada, tornando-se refém de
grupos de elite ideológico-partidária ou simplesmente ideológico-tecnicista que, direta ou
indiretamente, determinam as regras da educação escolar.
48
Para Tedesco25 (apud Messina, 2001), as inovações têm sido esforços responsivos de marcos
gerados nos níveis centrais dos sistemas de ensino que regula e homogeneíza os processos de
mudança. Destaca, ainda, que, ao transitar no contexto das políticas oficiais, a inovação
tornou-se conservadora, naturalizando os processos, criando uma lógica única, pelos
mecanismos de regulação social e pedagógica.
Nesse sentido, corresponderia ao que Machado (2009) denomina de poder de imposição de
um grupo do ponto de vista histórico-social, podendo ser entendido como aquele que controla
a estrutura de poder vigente e cria padrões artificiais de participação de acordo aos seus
interesses.
1.6 Os enfoques inovativos do ponto de vista da cultura escolar e suas aproximações com o
Projeto Político-Pedagógico
Diante dos limites e dificuldades de apropriação dos sujeitos escolares das propostas de
inovação prescritivas, em meados da década de 1990, começam a surgir tendências apoiadas
no caráter multidimensional da cultura escolar. Tal perspectiva parte do reconhecimento do
caráter dinâmico e autogerador dos sujeitos no interior da escola, acreditando que cada prática
educativa possui singularidades próprias e tem sua existência materializada em sua vivência
concreta, na manifestação do realismo histórico social dos seus sujeitos (GADOTTI, 1997).
Fullan26 (apud Messina, 2000) destaca que a inovação pode ser vista como um processo
aberto, assumindo um caráter multidimensional, de maneira que se reconheça sua
aproximação com a cultura e valores que orientam a vida social da comunidade escolar.
Vê-se, ainda, que o modelo verticalizado das propostas inovativas não é suficientemente
compacto, existindo em seu interior contradições favoráveis à desestabilização de processos
instituídos e construção de mudanças numa perspectiva horizontal e democrática fundada em
um projeto alternativo (CABONEL, 2002). A construção de propostas alternativas estaria na
25
Refere-se a obra: TEDESCO, J. C. Algunas hipótesis para una política de innovaciones educativas. In:
PARRA,R. et al. Innovación escolar y cambio social, tomo I. Bogotá: FES-Colciencias, 1997.
26
Refere-se a obra FULLAN, M. El Cambio educativo: guía de planeación para maestros. México: Trilhas,
2000.
49
estreita relação das práticas docentes de articular os processos participativos de constituição
autogeradora do PPP da escola.
Numa perspectiva de aprofundamento do cenário democrático o PPP demanda maior
participação comunitária, na sua concepção e prática, envolvendo processos coordenados e
cooperativas que favoreçam o sentimento de confiança e autonomia coletiva.
A singularidade do trabalho docente estaria nas suas possibilidades de interlocução e diálogo
com os sujeitos escolares, aprofundando os processos de participação direta, na qual as
soluções sejam construídas de forma compartilhada, com foco na resolução dos problemas
enfrentados numa prática concreta, tendo como substrato a melhoria da qualidade de ensino.
A formação de equipes docentes sólidas e comunidade educativa receptiva; redes de
intercâmbio e cooperação, assessores e colaboradores críticos e outros apoios externos;
projetos coletivos territoriais entre as escolas; comunicação fluída e intensa nas relações
interpessoais; sistemas inovativos como dinâmica de funcionamento da escola; possibilidades
de inovar a própria inovação; processos sistemáticos de vivência, reflexão e avaliação são
condições básicas para a existência de processos inovativos referendados na qualidade
educacional (CARBONELL, 2002).
Essas condições básicas reforçam a necessidade do trabalho coletivo e articulado por um PPP
que promova aproximações constantes entre a realidade vivida e as condições ideais, de modo
que a comunidade perceba os seus próprios desafios e seja autogeradora de inovações de
modo intencional e sistemático.
Ao procurarem responder às demandas de melhoria da qualidade da educação, a partir da sua
própria realidade, as práticas inovativas demandam clareza e consciência dos sujeitos em
todas as etapas do processo de mudança para que de fato assumam o caráter autogerador.
Esse caráter autogerador está associado à perspectiva emancipatória ou edificante de
percepção da escola como unidade histórico-social (VEIGA, 2003), sendo imprescindível o
diálogo entre os sujeitos envolvidos como forma de reconhecimento e valorização das
potencialidades comunitárias. É um processo existencial, vivido no interior da escola, com
ampliação dos espaços de argumentação, comunicação e solidariedade.
50
Assim, a solidez das inovações está diretamente relacionada à forma como a própria
comunidade concebe e apropria-se dos processos de mudança. Pressupõe, ainda, de um
processo articulado de mudança que expresse os interesses e finalidades do PPP em seu
caráter concreto e projetivo. Tem como fundamento as interações múltiplas, conectando o
mundo existencial do sujeito com os saberes escolares, num processo de aproximação
sucessiva com a realidade e os seus desafios.
Algumas características apontadas por Hernández et al (2000) corroboram com a perspectiva
autogeradora. Comentar-se-á a seguir cada uma dessas características:
1) que existam canais de comunicação entre o planejador e os que realizarão a inovação:
remete à necessidade do planejamento coletivo das práticas, à importância da participação de
todos os envolvidos nas etapas da ação. O interesse é superar a segmentação entre as equipes
que planejam e executam, bem como criar estratégias que fortaleçam a reciprocidade entre
planejamento e execução enquanto prática de uma mesma equipe;
2) que todos os grupos relacionados com a inovação estejam vinculados: remete à necessidade
da participação coletiva, do engajamento dos sujeitos na ação;
3) que facilite todo tipo de informação, que esclareça o sentido de inovação para todos os
grupos envolvidos: os canais de participação são fundamentais para que os participantes da
ação sintam-se como sujeitos do processo, assim como tenham maior clareza do sentido e
estratégias adotadas para a mudança;
4) que os conflitos sejam interpretados como sinônimo de que a inovação é necessária,
devendo ser recebidos de forma positiva e não sendo eliminados por decretos: o pensamento
divergente permite ampliar o debate e desestabilização de processos instituídos, criando um
ambiente favorável aos processos inovativos;
5) que os professores, a administração e os estudantes devam levar em conta e, se possível,
incorporar nas práticas, as iniciativas que surgirem: remete à necessidade de que os sujeitos
experimentem, vivenciem e testem no campo da prática as novas ideias emergentes;
6) que a revisão da inovação deva ser realizada de forma contínua, principalmente, se se
referir a uma adoção curricular: é um processo continuado, inconcluso, uma linha no
horizonte a ser percorrida como desafio constante dos sujeitos de revisar as suas concepções e
práticas;
7) que seja necessário não destacar papéis específicos e criar uma burocracia excessiva. É
preciso ter cuidado na hora de estabelecer obrigações, relações e privilégios. Uma inovação
51
demanda dos sujeitos flexibilidade e o exercício de diferentes funções numa perspectiva de
trabalho colaborativo;
8) que uma inovação possa levar ao questionamento de todo o sistema (a prática de uma
escola, o trabalhos dos professores), o que implica a ideia da revisão contínua: como processo
de mudança supõe a desestabilização de campos instituídos enquanto possibilidade de criação
de novos espaços instituintes;
9) que se deva poder contrastar, quando se tratar de generalizar alguns aspectos de uma
inovação, o que acontece em escolas que a coloquem em prática, conforme o modelo e as
intenções inovadoras, e outras que podem realizar por sua conta uma adaptação da mesma
inovação: envolve a possibilidade de reaplicação da inovação, de modo adaptado a outros
contextos, com foco na disseminação de processos de mudança por translação, nos quais os
sujeitos tenham possibilidade de reaplicá-la, adaptá-la ao seu modo cultural de vivência.
Destaca-se que, no interior das escolas, na organização dinâmica do PPP, as inovações
surgem como um espaço de interlocução efetivo com a comunidade local, exigindo
aprofundamento da comunicação e diálogo entre o sujeitos envolvidos mediante a criação de
espaços para a reflexão e a construção de soluções compartilhadas no enfrentamento dos
problemas vivenciados pelas unidades escolares.
Esse movimento articulado reforça a necessidade de a escola exercer efetivamente sua
autonomia na gestão de processos participativos, especialmente sua capacidade de “elaborar e
implementar um PPP que seja relevante à comunidade e à sociedade a que serve” (NEVES,
2004, p.113). A autonomia, enquanto processo, é uma conquista da comunidade escolar e
depende das próprias formas de aprofundamento da gestão democrática, enquanto condição
para existência do PPP, e da capacidade de seus agentes comunitários de serem autogeradores
de mudanças.
Assim, a perspectiva autogeradora abre espaço para compreender a inovação como processo
composto pelas vivências múltiplas dos sujeitos no interior da escola, um movimento
dinâmico que incorpora as demandas e aspirações da comunidade expressas em uma prática
concreta do PPP da escola. Para Veiga (2003), é um contraponto importante na superação do
marco regulatório que concebe o PPP de maneira abstrata, distante da realidade concreta,
sendo visto apenas como um documento programático que reúne as principais ideias,
fundamentos, orientações curriculares e organizacionais de uma instituição educativa.
52
Para Gadotti (2004), a marca mais significativa da sociedade atual é o multiculturalismo, que
exige das escolas maior espaço de participação e autonomia traduzidas, sobretudo na
construção do PPP da escola. Registra, ainda, que em um projeto há o confronto entre o
instituído e o instituinte, sendo que o primeiro faz parte do campo formal, da realidade
concreta da escola, composto pelo currículo, métodos, sujeitos e suas relações. O segundo
consiste no vir a ser, numa etapa em direção a uma finalidade presente no horizonte da escola
e dos seus sujeitos. Assim, o campo instituinte será sempre algo a ser construído, inacabado,
diretamente associado à função projetiva da comunidade escolar.
Ao situar-se em um campo ideal é fundamental que os sujeitos coletivos, compartilhem os
sonhos, os ideais perseguidos pela escola, tomando consciência dos seus limites e
possibilidades concretas. Obviamente, toda essa reflexão sustenta-se no ideal de homem e
sociedade desejada, nos valores éticos e sociais da vida comunitária.
Conforme expressa o próprio Gadotti (2004), um PPP constrói-se de forma interdisciplinar,
podendo ser considerado um momento importante de renovação da escola, tanto na sua
concepção, institucionalização e implementação. Assim, envolve desde a definição das
concepções educacionais norteadoras do trabalho educativo às ações concretas de vivência na
escola.
Vê-se que a compreensão do campo instituinte depende da penetração no interior da escola,
de um movimento que procure compreender como são construídas as relações, as vivências
dos ideais e a efetividade da participação da comunidade escolar. Isso supõe construir, no
interior dos espaços escolares, estratégias que fortaleçam o diálogo e o aprofundamento dos
canais de comunicação entre seus atores. Por outro lado, esse campo é imprescindível para a
superação das rotinas escolares, dos processos mecânicos e fragmentados, sendo uma
possibilidade para entender os atores escolares como sujeitos da inovação.
O campo instituinte do PPP converge com o ideal expresso por Freire (1987, p.68) de que
“(...) não seria possível a educação problematizadora, que rompe com os esquemas verticais
característicos da educação bancária, realizar-se como prática de liberdade, sem superar a
contradição entre o educador e os educandos. Como também não lhe seria possível fazê-lo
fora do diálogo.”
53
Retomando Gadotti (2004, p.36) constata-se que o Projeto Político-pedagógico da escola é
uma construção coletiva apoiada nos aspectos, a saber:
a) no desenvolvimento de uma consciência crítica;
b) no envolvimento das pessoas: comunidade interna e externa à escola;
c) na participação e na cooperação das várias esferas de governo;
d) na autonomia, responsabilidade e criatividade como processo e produto do
projeto.
O modo de gestão democrática é condição fundamental para o próprio processo de construção
e desenvolvimento do projeto e, em especial, das possibilidades de fomento do caráter
autogerador das inovações. Em sentido contrário, a ausência de espaços com possibilidades de
efetiva participação e autonomia da comunidade escolar materializa o documento apenas
como uma formalidade da política pública, sem o real sentimento de pertencimento e
envolvimento da comunidade no exercício de sua prática concreta.
Os fundamentos da democracia escolar, como condição para gestão do PPP, são reforçados
por Veiga (2003):
O projeto é um meio de engajamento coletivo para integrar ações dispersas, criar
sinergias no sentido de buscar soluções alternativas para diferentes momentos do
trabalho pedagógico-administrativo, desenvolver o sentimento de pertença,
mobilizar os protagonistas para a explicitação de objetivos comuns definindo o norte
das ações a serem desencadeadas, fortalecer a construção de uma coerência comum,
mas indispensável, para que a ação coletiva produza seus efeitos (VEIGA, 2003,
p.275).
Reforça-se a ideia da gestão democrática como condição fundamental para a emergência
autogeradora dos processos inovativos na vivência e prática do PPP, tendo como substrato a
realidade histórico-social e a participação direta da comunidade. Nesse sentido, um projeto
educativo inovador:
[...] expressa finalidades e esperanças no futuro; histórias e narrações
compartilhadas; objetivos globais relativos à personalidade dos alunos, seu
desenvolvimento social e suas aprendizagens; conflitos sobre a convivência e a
maneira de enfrentar os conflitos; mecanismos para a participação democrática dos
diversos estamentos e tomada de decisões; o modo como a escola se articula com o
entorno; e fórmulas alternativas par mudar a destinação tradicional de tempos e
espaços (CARBONELL, 2002, p.81).
54
Assim, formalmente, um projeto educativo inovador expressa as convicções da sua
comunidade, especialmente os seus valores, missão, tendências pedagógicas e administrativas.
Por outro lado, enquanto instrumento de ação-reflexão do grupo, potencializa novas formas de
organização do trabalho e práticas pedagógicas possibilitando à comunidade, de modo
sistemático e intencional, organizar processos de rupturas epistemológicas. Por esse viés, o
PPP pode ser interpretado como uma possibilidade de organização convergente de processos
inovativos, de modo intencional e sistemático, pela comunidade escolar.
Em síntese, a participação engajada da comunidade produz um ambiente fértil para o
desenvolvimento das inovações no projeto-político pedagógico em seu caráter autogerador. O
aprofundamento da compreensão desse processo exige a penetração em uma comunidade, de
maneira que se perceba melhor como se organiza a dinâmica de gestão participativa do PPP
em sua prática corrente.
55
2. GESTÃO ESCOLAR, O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO E A
PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE
2.1 Organização do trabalho escolar e inovações educacionais
É interessante situar as novas práticas e formas de organização do trabalho escolar para saber
em que medida os processos de gestão contribuem com as tendências inovativas no interior da
escola.
Na literatura que aborda o tema, identifica-se a organização racional, gerencial, sociocrítica
(com os seus desdobramentos nas concepções autogestionária, interpretativa e democráticoparticipativa) como as principais concepções de organização do trabalho escolar.
2.1.1 A concepção burocrática e os processos de inovação escolar
Essa perspectiva organizacional fundamenta-se na teoria da burocracia de Weber ( 1999) que
prevê a construção de processos rígidos de controle e dominação institucional na organização
da sociedade moderna. De acordo com Medeiros, Fortuna e Barbosa (2006), a organização
burocrática é uma concepção coerente com o centralismo estatal na gestão educacional,
apoiando-se em estruturas hierárquicas de concepção e execução, mando e obediência,
estigmatizando os sujeitos a desenvolverem sua atividade de trabalho de forma repetitiva e
mecânica.
Um dos seus fundamentos principais é aumentar a produtividade do trabalho escolar pela
especialização e fragmentação das etapas, definindo papéis e atributos específicos para os
profissionais da educação em sua atividade de trabalho. Outra preocupação é a definição de
padrões rigorosos de controle dos tempos e espaços no desenvolvimento das atividades
educacionais.
São características presentes nesse modelo de gestão a prescrição detalhada de funções e
tarefas; a divisão técnica do trabalho escolar; o poder centralizado no diretor e as relações de
subordinação; a ênfase na administração regulada (rígido sistema de normas, de regras e de
56
procedimentos burocráticos de controle das atividades); as formas de comunicação
verticalizadas; a ênfase nas tarefas em detrimento das interações pessoais (LIBÂNEO, 2008).
Ainda, segundo Libâneo (2008), esse modelo de gestão parte do pressuposto de que a
realidade social é objetiva e neutra, devendo ser planejada, organizada e controlada de modo a
se alcançarem os melhores resultados. Infere-se que uma maior qualidade da educação, estaria
em definir formas de controle mais eficazes dos processos, como, por exemplo, o
cumprimento rigoroso do planejamento, a sequência lógica do livro didático, o controle dos
dias e das horas letivas, a maior fragmentação dos conteúdos, dentre outras.
A ênfase na racionalização de procedimentos didático-metodológicos eficazes nomeia os
aspectos objetivos da realidade, tendo como fundamento unívoco sua dimensão pedagógica,
em especial as formas de especialização dos conteúdos e estratégias de ensino, sendo que os
processos de inovação estariam vinculados à maior fragmentação dos conteúdos e à definição
de estratégias metodológicas eficazes para o ensino.
Tais aspectos seriam alcançados com uma maior especialização das atividades gestionárias,
definindo atributos específicos para cada profissional, tendo como base uma perspectiva
setorizada da atividade de trabalho. O trabalho setorial supostamente asseguraria um maior
controle da atividade de trabalho e, consequentemente, uma maximização do tempo de
realização das atividades.
Um dos problemas dessa tendência consiste no fato de que a realidade escolar não se
apresenta como objetiva e neutra, estando multifacetada por aspectos sociais, culturais e
políticos presentes na intersubjetividade dos sujeitos em sua vida comunitária. Há aspectos
que são únicos da comunidade, determinando seu modo próprio de agir, pensar e sentir frente
a uma determinada realidade e/ou contexto.
Pelo prisma da objetividade, os processos de inovação estariam centrados em mudanças
racionais no interior da escola, produzidas em atendimento às exigências de organismos
externos à mesma (Secretarias e Ministérios de Educação, organismos internacionais,
mercado, entre outros), sustentando formas verticalizadas de organização pedagógica e
administrativa que desconsideram a intersubjetividade dos sujeitos comunitários.
57
Ao se desconsiderar as dimensões subjetivas dos processos, não se reconhecem as vivências
dos sujeitos no interior da escola, tratando os processos de mudança numa perspectiva
exógena e prescritiva, apoiando numa lógica formal dos procedimentos hierárquicos que são
sistematizados pelos “especialistas” e implantados nas escolas de forma verticalizada.
Outro grave equívoco é que uma maior qualidade da educação não pode ser vista como a
soma dos controles de tempo por cada profissional em seu setor de trabalho. Como atividade
social, fundamenta-se na capacidade de construção e desenvolvimento de um projeto de
gestão articulado, tendo como substrato uma concepção expressa em um PPP que exige uma
atuação coesa e integral dos sujeitos.
A organização escolar em parâmetros burocráticos acarreta ainda problemas na percepção das
escolas como um sistema unificado, na organização do trabalho como um processo social e
nas possibilidades alternativas de combinação das atividades entre os sujeitos (THULER,
2001). Assim, consiste numa forma de organização que limita a vivência de um projeto
articulado, com possibilidades de participação coletiva dos sujeitos nas etapas de concepção e
execução.
Esse modelo gestionário, ao promover a segmentação entre concepção e execução, centraliza
os processos de mudança em equipes técnicas, limitando a manifestação de valores e
experiências endógenas da própria comunidade escolar, fundamentais para os processos de
gestão social, onde a sociedade civil se co-responsabiliza com as questões de interesse público
e, consequentemente, de desenvolvimento local.
Ao se basear na definição rigorosa de cargos e funções, na estrutura hierárquica de trabalho,
nas normas e regulamentos, na gestão centralizada como artifícios para sustentar
propostas/programas, a organização burocrática inibe o sentimento de pertencimento e
desenvolvimento de um projeto comum pelos sujeitos escolares.
Além disso, os instrumentos de controle são inibidores da manifestação do pensamento
criativo e intersubjetivo dos sujeitos no enfrentamento dos problemas que são vivenciados na
realidade comunitária. O autocontrole das ações cria obstáculos quanto à inciativa e diálogo
dos sujeitos em buscar soluções endógenas para os problemas, já que se tornam dependentes
dos pacotes sistêmicos que são elaborados por equipes técnicas.
58
Sua base exógena de sustentação não considera os valores presentes no interior da
comunidade escolar, corroborando com a baixa aderência dos sujeitos e, consequentemente,
com a rotatividade dos programas/projetos. Isso pode ser atribuído à ausência do real
sentimento de pertencimento dos sujeitos às propostas, prevalecendo valores céticos quanto às
reais possibilidades de transformação da escola.
Para assegurar a efetividade das propostas é criado todo um arcabouço de parâmetros que
justificam a organização racional dos sistemas. Conforme expressa Thuler (2001),
assegurados os parâmetros gestionários, a máquina gira por si só, com pequenos ajustes, até
as grandes férias seguintes.
As decisões, tomadas unilateralmente pouco são submetidas ao debate e apreciação da
comunidade escolar, de modo que se considerem as reais necessidades dos seus sujeitos.
O exame do cotidiano de nossas instituições escolares revela que, na prática, a
gestão da escola se desenvolve a partir de uma sólida rede burocrática, na qual os
meios se sobrepõem aos sujeitos, ocasionando um asfixiamento destes no contexto
burocrático da instituição (MEDEIROS; FORTUNA; BARBOSA, 2006, p.111).
Esse asfixiamento dos sujeitos pode ser interpretado como a perda de identidade e autonomia
frente à sua própria realidade, onde seus sentimentos e impressões da realidade têm pouca
importância frente às diretrizes de um programa ou projeto estruturado por equipes técnicas.
É nesse sentido que Thuler (2001) descreve a gestão escolar burocrática, como uma matriz
organizacional que condiciona a vida da escola, estruturada em torno de procedimentos
centrais e sistêmicos, pouco voltados para as necessidades e interesses da comunidade.
Segundo a autora, esse modelo não estimula as relações recíprocas no interior da escola e os
processos de mudanças fundados nas necessidades heterogêneas dos alunos, na competência e
nos recursos locais.
A sua estrutura centralizada é um limite aos processos participativos, produzindo uma posição
de inferioridade dos sujeitos aos meios de ação, mediante mecanismos de controle e, por vez,
de repressão que impedem a emergência da consciência crítica e da reconstrução de um
sistema que tenha, como fundamento, os interesses e necessidades da comunidade escolar. De
acordo com Medeiros; Fortuna; Barbosa (2006), o modelo de organização escolar burocrático,
59
de natureza sistêmica, desagrega os sujeitos no interior da escola, constituindo-se em um
limite à sua organização democrática.
A presença dessa tendência é muito forte nas escolas brasileiras, destacando: a cisão entre
questões administrativas e pedagógicas; a fragmentação dos conteúdos curriculares; a rigidez
do tempo (expresso em 50 minutos de aula); a constituição de uma equipe de especialistas
responsáveis pelo planejamento/acompanhamento e os professores, pela execução; a
percepção restrita dos espaços de aprendizagem (a sala de aula como referência central),
dentre outras.
Essa organização fragmentada dos tempos e espaços escolares restringe a apropriação
dialógica dos espaços pelos sujeitos, bem como a construção das suas práticas na perspectiva
da transformação social. Ou seja, a vivência de processos que considerem as dimensões
históricas e socais dos sujeitos em ambientes coletivos e colaborativos valoriza a postura
proativa e a subjetividade dos mesmos.
A gestão escolar burocrática, no entanto, não se manteve estável ao longo da sua trajetória,
sendo necessárias adequações para assegurar formas de (re)estabilização dos sistemas
escolares. Houve, ao longo dos tempos, uma estreita relação entre os processos de mudança e
a retomada dos ciclos de estabilização.
Esse modelo passou por provas. Permitiu ajustar, desde o início do século, as
modalidades de gestão e controle das escolas ao aumento contínuo do público e das
taxas de escolarização, assegurando, ao mesmo tempo, uma certa coerência e uma
igualdade na forma de tratamento (THULER, 2001, p.29).
As mudanças do modelo burocrático corresponderiam a processos inovativos de caráter
incremental, correspondendo a ajustes na forma de reorganização sistêmica, sem rupturas
paradigmáticas. Os processos de mudanças estruturais, com a participação direta da
comunidade, especialmente na maximização do seu potencial autogerador, não estão
presentes nessas transformações.
Os processos de mudança são orientados pela chamada objetividade organizacional, baseada
em pacotes de mudanças estruturados por organismos externos à escola (Secretarias e
Ministérios de Educação, organismos internacionais, mercado, entre outros). Esses pacotes
em geral são implantados por uma equipe técnica (consultores, especialistas, entre outros) que
60
definem um plano homogêneo para o desenvolvimento das escolas, suas etapas e respectivas
formas de acompanhamento. Essas equipes técnicas, em geral, não possuem nenhum
conhecimento da comunidade escolar local ou vínculo com ela.
Diante da incapacidade de responder às novas necessidades emergentes de reorganização do
mundo da produção, esse modelo de gestão escolar começa a sofrer um processo de
reestruturação e adequação às necessidades impostas pelo paradigma flexível de acumulação
em curso. Assim, acompanhando a dinâmica de reorganização do mundo da produção e
trabalho, o modelo de gestão burocrática assume contornos da administração gerencial.
2.1.2 A concepção gerencial e os processos de inovação escolar
Em meados da década de 1970, o modelo de acumulação taylorista/fordista, centrado em
grandes linhas de produção homogênea, apresenta os seus sinais de esgotamento. Entre os
principais fatores da crise estão a queda na taxa de lucro das empresas, a retração do
consumo, a concentração de capitais e a crise do Estado de bem-estar social (ARAÚJO;
CASTRO; 2001).
A estratégia para superação da crise consistiu na modificação do padrão de acumulação, na
substituição do modelo taylorista/fordista pelas estratégias de produção descentralizadas e
flexíveis, tendo como orientação central maior eficiência, eficácia e produtividade. Como
rearranjos produtivos, podem-se destacar sua organização em unidades menores e flexíveis,
maior diferenciação dos produtos, acordos trabalhistas descentralizados para recompensar
qualificações e iniciativas do trabalhador, competição e valores individuais, dentre outros.
Os princípios que reorientaram os processos da administração empresarial paulatinamente
foram incorporados pelas administrações públicas, tendo como eixo central a construção de
um Estado eficaz, eficiente e produtivo. Essas tendências acompanharam o conjunto de
mudanças que orientaram o movimento de reforma do Estado brasileiro a partir da década de
1990.
De acordo com Araújo e Castro (2001), o movimento de reforma gerencial do Estado
Brasileiro teve como um dos grandes expoentes o ex-ministro Bresser Pereira (1998), ao
61
preconizar: a descentralização/desconcentração das atividades centrais para as unidades
subnacionais; a separação dos órgãos formuladores e executores de políticas públicas; o
controle gerencial das agências autônomas, que passa a ser realizado, levando em
consideração quatro tipos de controles: (1) controle dos resultados, a partir de indicadores de
desempenhos estabelecidos nos contratos de gestão; (2) controle contábil de custos; (3)
controle por quase-mercados ou competição administrada; e (4) controle social; a distinção de
dois tipos de unidades descentralizadas ou desconcentradas, as agências que realizam
atividades exclusivas do Estado e os serviços sociais e científicos de caráter competitivo; a
terceirização dos serviços e o fortalecimento da alta burocracia.
O aspecto central da reforma consistiu na redução do Estado às ações de fiscalização e
controle por meio de agências reguladoras e indicadores de resultados. Há, ainda, uma
redução do chamado Estado de bem-estar social e substituição dos direitos universais pelas
chamadas políticas focais, valorizando a participação da sociedade civil.
Estado para a implementação do ajuste neoliberal, há a emergência de um projeto de
Estado mínimo que se isenta progressivamente de seu papel de garantidor de
direitos, através do encolhimento de suas responsabilidades sociais e sua
transferência para a sociedade civil. Este projeto constitui o núcleo duro do bem
conhecido processo global de adequação das sociedades ao modelo neoliberal
produzido pelo Consenso de Washington (DAGNINO, 2004, p.96).
Um dos principais argumentos defendidos pelo modelo gerencial é a ideia de que as
organizações empresariais são mais ágeis e eficientes do que o setor público (ARAÚJO;
CASTRO, 2001). Assim, os processos de redução do Estado são necessários para que o
mesmo consiga se adequar aos parâmetros da gestão empresarial, condição para sua maior
eficiência e qualidade.
Por outro lado, dimensões históricas dos movimentos sociais, como democracia e
participação, são apropriadas pelo universo ideológico do sistema neoliberal. A participação
deixa de ser vista como um movimento que luta pelas transformações sociais, passando a ser
caracterizado como filantropia, trabalho voluntário da comunidade, expresso em projetos
sociais de participação solidária. Assim como a democracia deixa de ser vista como forma de
participação do povo no governo, com poder de decisão, passando a ser a expressão do acesso
da população ao consumo e crédito (DAGNINO, 2004).
62
Assim, o modelo gerencial consiste na materialização do discurso hegemônico do
neoliberalismo, resinificando o sentido de participação da sociedade civil em parâmetros que
desoneram o Estado e aumentam as responsabilidades da sociedade civil. O Estado passa a se
restringir às funções de regulamentação e fiscalização.
Por outro lado, a readequação do sistema produtivo brasileiro aos parâmetros da produção
flexível caminhou paralela aos movimentos sociais de luta da sociedade civil pela
redemocratização da sociedade brasileira. A título de exemplo, o movimento pelas Diretas Já,
a promulgação da CF/1988 são expressões da luta da sociedade civil, dos movimentos sociais,
pela garantia dos direitos fundamentais27. Nessa perspectiva, das lutas históricas travadas
pelos movimentos sociais, participação, democracia, cidadania, dentre outros, são expressões
de uma sociedade que busca justiça e equidade na construção dos direitos fundamentais do
homem.
Mesmo sendo projetos antagônicos, a apropriação ideológica do neoliberalismo de termos
ligados à luta histórica cria um contexto ideológico de coincidência com o projeto
democrático-participativo quanto à formação de uma sociedade civil ativa e propositiva
(DAGNINO, 2004).
Porém, enquanto para os neoliberais a apropriação pertence a um
arcabouço hegemônico, traduzido em voluntariado/filantropia que estimula à desoneração das
responsabilidades do Estado; para o projeto democrático-participativo, assume o sentido de
luta, de um movimento de participação direta da sociedade nas transformações sociais e de
garantia dos direitos fundamentais.
A nossa filiação é com o aprofundamento do projeto democrático participativo, tendo como
horizonte a justiça social e equidade, convictos de que o aprofundamento da gestão dos
processos democrático-participativos pavimenta o caminho para a emergência de inovações
autogeradas da comunidade escolar, mediante processos propositivos de transformações
sociais.
Diante do exposto, perguntar-se-ia: qual tem sido a influência do modelo gerencial nas
escolas públicas brasileiras? Que tipos de inovações escolares estão associadas a esse
27
São entendidos como o conjunto de direitos fundamentais à construção da pessoa humana e sua vida social
(trabalho, saúde, lazer, moradia, emprego, renda, liberdade de expressão, dentre outros).
63
modelo? Assim, passar-se-á a discutir alguns pontos fundamentais dessas questões no cenário
específico das políticas educacionais brasileiras.
A partir da década de 1990, com o processo de abertura econômica e aprofundamento da
globalização, a educação assume papel estratégico no país, sendo os processos de gestão,
baseados em parâmetros de eficácia, vistos como necessários e importantes para prover maior
aprendizagem e melhoria da qualidade da educação no país (ARAÚJO; CASTRO, 2001).
Pelos processos de gestão educacional competente, pretende-se assegurar aspectos como:
pactuação de metas, indicadores educacionais satisfatórios, avaliações externas e de
desempenho individual dos servidores, reformas curriculares com a definição de diretrizes
nacionais, dentre outras.
É um modelo gestionário que propõe uma reestruturação da gestão escolar por meio da
adoção de métodos e práticas de gestão da administração empresarial (LIBÂNEO, 2008).
Enquanto estratégia empresarial, é guiada por princípios mercadológicos, tendo como foco a
relação custo-benefício dos programas e os resultados alcançados em termos de maior
proficiência dos alunos.
Os processos inovadores são vistos como a adoção de instrumentos gerenciais
descentralizados capazes de assegurar empowerment (empoderamento) e accountability
(responsabilização) dos envolvidos. A modernização da gestão escolar supõe uma maior
participação e controle da sociedade nos serviços prestados, sustentando a ideia de que as
pessoas envolvidas nos processos escolares são responsáveis pelo seu sucesso ou fracasso.
Por outro lado, ao trabalhar com os pressupostos de responsabilização dos envolvidos, segue a
tendência geral de transferir responsabilidades do poder público para a sociedade civil. Outras
questões, intervenientes no contexto escolar, como questões sociais que demandam
intervenção direta e extrapolam a capacidade dos sujeitos escolares de resolvê-las, são
desconsideradas.
Acrescenta-se, ainda, que os resultados educacionais negativos são vistos como problemas
pontuais, associados a questões de competência individual e não como parte do conjunto
sistêmico das políticas. Dessa forma, o problema de baixa proficiência estaria associado, por
64
exemplo, à falta de competência e compromisso dos professores, inexistindo qualquer nexo
com as políticas educacionais em curso.
Enquanto tendência hegemônica, a gestão gerencial orienta-se mais pelos resultados do que
pelo fortalecimento da escola como espaço de participação social e da construção de
propostas que valorizem as dimensões socioculturais. Ficam ausentes possibilidades
propositivas de aspectos inovativos que tenham como foco as transformações sociais, sendo a
centralidade a relação custo-benefício dos projetos/programas, isso é, quanto foi gasto com o
programa e se os alunos respondem em termos de proficiência às exigências do mercado.
Suprimem-se as dimensões políticas dos processos educacionais, ao enfatizar, de modo
restrito, um conjunto de práticas e procedimentos de gestão das escolas para resultados,
adotando, por um lado, processos de racionalização dos gastos públicos e, de outro, o alcance
da chamada qualidade total. Todo esse processo é sustentado por procedimentos de controle,
mediante a construção de indicadores que são aferidos em avaliações externas.
Há especificidades nas dimensões político-pedagógicas da gestão educacional que extrapolam
a relação restrita de custo-benefício, não podendo ser reduzidas à aplicação de métodos,
técnicas e princípios da administração empresarial (DOURADO, 2007). Sabe-se que a
formação das dimensões políticas do sujeito coletivo, da sua capacidade de estabelecer
interlocução com o desenvolvimento das ações comunitárias, do movimento de transformação
social do espaço que vive apresenta-se como uma das dimensões mais relevantes.
Assim, ao desconsiderar aspectos políticas e sociais, funciona como uma forma de
instrumentalizar os sujeitos escolares para responder às demandas de proficiência exigidas
pelos mercados, habilitando-os a operar os novos códigos dos sistemas de produção flexível.
Porém produz lacunas importantes na apropriação dos sujeitos políticos dos processos de
transformação social.
Por outro lado, na perspectiva gerencial mais recente, os resultados esperados são definidos
unilateralmente por equipes técnicas, acrescido do bônus (prêmio) de produtividade que
deverá ser repassado às escolas de acordo com o seu desempenho. As metas, o plano
estratégico e a forma de avaliação são pacotes sistematizados que deverão ser acompanhados
por equipes técnicas, sem consulta ou possibilidade de escolha e/ou decisão das escolas.
65
Vale dizer que “não se mede a eficiência das escolas. Ela se constrói, se negocia, se pratica e
se vive.” (THULER, 2001, p.55). Nesse sentido, o conceito de eficiência estaria ligado ao
conjunto de relações estabelecidas pelas escolas, inclusive de ordem pedagógica, e sua
capacidade de produzir resultados amplos na comunidade. Envolve as relações dos sujeitos no
ambiente comunitário, não sendo passível de ser medido apenas por um processo de avaliação
externa.
Ao preconizar princípios mercadológicos a serem aplicados no ambiente escolar, essa
perspectiva não é compatível com os processos inovativos autogeradores que partem do
pressuposto de reconhecimento da escola e da autonomia dos seus sujeitos na produção de
mudanças. Assim, a gestão gerencial das escolas não favorece a construção de processos
inovativos que tenham, como referência, as dimensões sociais da comunidade e o seu poder
decisório local.
Partindo da transferência de responsabilidades para a sociedade civil, os processos
participativos assumem conotação dissimulada de redução das responsabilidades sociais do
Estado. A participação passa a ser vista como uma colaboração da comunidade, sofrendo um
esvaziamento político do seu sentido de movimento e luta pelas transformações sociais.
66
2.1.3 A Gestão Escolar Sociocrítica
Os processos de organização escolar, na perspectiva sociocrítica, tomam como pressuposto os
sujeitos em suas dimensões históricas e sociais, reconhecendo sua capacidade de modificar a
própria realidade, ainda que existam fatores econômicos, políticos e sociais determinantes
(LIBÂNEO, 2003).
Apoiados na gestão sociocrítica, orientam-se na capacidade humana de produzir
transformações mediante processos de compartilhamento de experiências e de decisões
colegiadas dos sujeitos. Apoiam-se em uma base horizontalizada de decisão, partindo do
pressuposto de que todos os sujeitos envolvidos estão em uma mesma posição, podendo
contribuir com o desenvolvimento global da instituição.
Ao valorizar a participação e o poder de decisão coletiva, reconhece-se a importância do
diálogo e dos consensos construídos no seio do jogo democrático como relevantes para a
organização de uma gestão consubstanciada nas dimensões sociais da comunidade local.
Nessa perspectiva, as inovações podem ser vistas como produto das relações estabelecidas
entre os pares, sustentando-se no diálogo e nos processos de participação social. Sua
constituição baseia-se na historicidade dos processos humanos, nas dimensões socioculturais
e nas interações mútuas estabelecidas entre os pares como forma de fortalecimento das
instâncias colegiadas de decisão como o grêmio, as associações, os conselhos, dentre outros.
As relações estabelecidas entre os sujeitos, especialmente as dimensões intersubjetivas,
consistem num contraponto aos processos de gestão burocrática e seus desdobramentos
gerenciais, apresentando-se como possibilidade de enfrentamento dos processos inovativos
verticalizados, reconhecendo as condições histórico-sociais da práxis educativa.
Por outro lado, enquanto processo de humanização, de reconhecimento da historicidade dos
sujeitos, só pode ser mediatizado em ambientes amplamente democráticos e participativos,
onde haja espaço para a manifestação autêntica da existência humana. Acrescenta-se, ainda,
que na condição da existência das potencialidades sociais do homem são produzidas as
modificações mais próximas dos interesses e necessidades da comunidade escolar.
67
Assim, o reconhecimento histórico e social dos sujeitos escolares apoia-se nos espaços de
convivência democrática, nas possibilidades de participação direta da comunidade e
democratização das relações escolares pelo aperfeiçoamento dos processos coletivos de base
cooperativa (PARO, 2008).
A perspectiva sociocrítica aproxima do que Thuler (2001) chama de organização profissional,
descrito como um processo no qual se valoriza a corresponsabilidade dos sujeitos em
ambientes colegiados e participativos. Segundo a mesma, há desafios quanto ao
funcionamento profissional, considerando que os processos de decisão podem ser lentos e
ineficientes quando se busca um amplo consenso.
Vale dizer que as decisões coletivas pressupõem um tempo maior, correspondendo às
dimensões processuais de envolvimento dos sujeitos em espaços coletivos de decisão. Por
outro lado, o termo amplo consenso, citado por Thuler (2001), carece de uma maior
explicação, podendo ser confundido com unanimidade, desqualificando o real sentido da
democracia. Pelo viés sociocrítico demanda ser pensado como o conjunto das sínteses
estabelecidas em espaços de participação direta, envolvendo as interpelações subjetivas28 e a
livre manifestação do pensamento pelos sujeitos.
Em termos de inovações, vê-se que pode corresponder ao nível quantitativo ou qualitativo,
incremental ou radical, já que as interpelações podem agregar novos aspectos aos processos
sociocríticos ou promover mudanças de caráter estrutural, implicando em um salto de
qualidade na participação comunitária.
A perspectiva do consenso nos ambientes democráticos de participação direta requer
considerar as decisões que são tomadas pela maioria dos membros, sendo que os interesses
coletivos sobrepõem-se aos individuais. Portanto é diferente de unanimidade, que dificilmente
pode ser alcançada em espaços com livre possibilidade de manifestação do pensamento
divergente.
Vê-se ainda que as próprias interpelações subjetivas apresentadas pelos sujeitos nos ambientes
democráticos podem produzir uma reflexão dos campos de gestão instituídos, podendo
28
Entendida no estudo como a manifestação de diferentes concepções dos sujeitos nos espaços de participação
coletiva, um estímulo aos processos de ajustes ou aperfeiçoamentos da gestão instituída.
68
corresponder a ajustes estruturais, com o aperfeiçoamento das práticas gestionárias, que, ao
invés de serem pensados como obstáculos ao processo de inovação, passam a ser vistos como
motor dos processos de ajuste ou de mudança da gestão.
Contudo a gestão sociocrítica não pode ser vista como um modelo linear, definido em
determinado tempo e espaço. Ao contrário, é produto das relações estabelecidas pelos
sujeitos, acompanhando o curso dos processos históricos e da dinâmica societária vivenciada.
É um modelo vinculado ao contexto emergente, constituindo uma prática em espiral que sofre
processos de adaptação gradativa no acompanhamento das demandas e necessidades da
comunidade escolar.
Os processos de adaptação e/ou mudanças das práticas gestionárias não acontecem a qualquer
modo, conforme conveniência e interesses individuais dos seus sujeitos. São resultados da
reflexão coletiva, orientando-se por princípios fundamentais (administrativos, políticos,
sociais, filosóficos e educacionais) expressos no Projeto Político-Pedagógico da escola.
É na dinâmica de convivência local dos sujeitos escolares que as dimensões históricas e
sociais materializam-se, orientando-se pela filosofia expressa no PPP e, ao mesmo tempo,
sendo retroalimentada com novas realidades e demandas emergentes do modo como os
sujeitos vivenciam a realidade.
A vivência da realidade implica tanto no aprofundamento dos processos democráticos
representativos (colegiados, conselhos de classe, pais, entre outros), nos quais os sujeitos
investidos de poder respondem pelos interesses comunitários, quanto na participação direta
dos sujeitos comunitários no desenvolvimento de ações coerentes com a sua realidade. Nos
processos de participação direta da comunidade é importante valorizar o compartilhamento
das experiências e a definição de estratégias institucionais de atuação coletiva dos seus
membros.
Por outro lado, quando se analisa a participação da sociedade civil nos espaços escolares
Gohn (2004; 2007) aponta a tendência dominante de redução do universo de atores à
comunidade escolar (dirigentes, professores, alunos e demais funcionários das escolas) e a
visão restrita da comunidade educativa como a comunidade escolar acrescida dos pais.
69
Segundo a autora, dificilmente se lembra de outras instituições, organizações ou associações
que fazem parte da rede de articulações da comunidade educativa.29
Retomando o pressuposto de que o homem é um sujeito histórico e social, sendo as relações
da comunidade escolar dinâmicas, os ciclos de estabilidade são rompidos por processos de
mudanças e fortalecimento das relações democráticas entre os membros da comunidade
escolar, base para o diálogo com a comunidade educativa.
Apoiado nas possibilidades dos próprios sujeitos de organizarem ambientes inovadores
(MACIEL, 2001), dir-se-ia que é no movimento relacional de vivência dos valores
democráticos (liberdade, respeito, tolerância, dentre outros) que são constituídas as
possibilidades de diálogo com a comunidade educativa, ampliando as relações da escola e as
vivências de sua base comunitária.
Assim, “é por meio de canais de participação da comunidade que a escola deixa de ser uma
redoma, um lugar fechado e separado da realidade, para conquistar o status de uma
comunidade educativa que interage com a sociedade civil.” (LIBÂNEO, 2008, p.139) Pela
constituição de uma relação articulada com a comunidade educativa, a escola pode maximizar
os seus potenciais educativos, assegurando um processo de formação em uma perspectiva
humana integrada, em sinergia com as aspirações presentes no PPP.
Se as mudanças na educação dependem das concepções e práticas dos professores
(HERNÀNDEZ, 2000), é importante que exista uma sinergia desses sujeitos com a
comunidade educativa, considerando as suas singularidades relativas à prática pedagógica e à
necessidade de vivência das práticas do PPP em seu caráter autogerador. Os professores têm
papel importante, especialmente na articulação das atividades curriculares e extracurriculares,
para maior envolvimento da comunidade educativa.
Em primeiro lugar, o exercício da autonomia docente permite fomentar espaços reflexivos de
participação discente que são necessários para a constituição de relações justas e
29
Nesta dissertação, o conceito de comunidade escolar é entendido como os profissionais da escola (diretor,
professor, supervisor, secretário, dentre outros), alunos e os pais; já a comunidade educativa refere-se à
comunidade escolar acrescida da comunidade externa às escolas (Regionais de ensino, organizações da
sociedade civil, movimento sociais, sindicatos, associações religiosas, organização não-governamentais (ONGS),
organizações de empresários e a população que reside e trabalha no entorno da escola).
70
democráticas. Assim, práticas pedagógicas reflexivas, orientadas por princípios de
desenvolvimento humano dos discentes, passam a ser fundamentais para a vivência das
relações em sentido amplo com a comunidade educativa. O diálogo é uma possibilidade para
que os alunos situem-se como sujeitos históricos e sociais, desenvolvendo a consciência
crítica e o senso de responsabilidade coletiva. Como expressa Freire (1987): “O diálogo é este
encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo, não se esgotando,
portanto, na relação eu-tu.” (FREIRE, 1987, p.90).
Em segundo lugar, são pelas vivências curriculares, fundadas em princípios como autonomia,
liberdade e cooperação, que se criam reciprocidade entre os objetivos institucionais,
impressos em um marco ideal (PPP) e a realidade vivida em uma comunidade educativa.
Quanto às contribuições docentes para a produção de inovações em uma comunidade
educativa, Thuler (2001) destaca que são fortalecidas quando os profissionais da escola,
especialmente os professores, são estimulados a manifestar suas concepções e o pensamento
criativo quanto às prioridades de organização escolar.
Por outro lado, a maneira de pensar e agir desses sujeitos relaciona-se com os espaços
democráticos, com a possibilidade de diálogo e manifestação do pensamento divergente como
forma de enriquecimento de determinado contexto ou fenômeno presente na comunidade
educativa. É necessário, ainda, aproximar conceitos e práticas pedagógicas das experiências
vividas pelos alunos, ampliando as suas possibilidades de compreensão e intervenção numa
dada realidade.
Assim, como situar as inovações na perspectiva de uma comunidade educativa sociocrítica?
Em primeiro lugar, valorizar as dimensões sociais e históricas do conjunto de sujeitos e
instituições presentes em seu universo é fundamental. Assim, como fortalecer as estruturas
colegiadas (conselhos, associações, grêmios, colegiados) da escola e as formas de
participação direta da comunidade. É necessário que, no interior da escola, os processos
participativos estejam consolidados, fortalecidos pelo envolvimento direto da comunidade
escolar. Em segundo lugar, é fundamental mapear o conjunto de instituições e sujeitos
presentes na comunidade educativa e as possibilidades efetivas de diálogo com o PPP da
escola.
71
O interesse público de melhoria da qualidade da educação é a referência para o envolvimento
corresponsável de segmentos da sociedade civil nas práticas do PPP, perpassando pela criação
de certo nível de reciprocidade entre os sujeitos escolares e as instituições presentes na
comunidade educativa. Esse envolvimento é uma forma de assegurar o acesso dos discentes
aos conteúdos curriculares e, consequentemente, aos processos de aprendizagem com
significação social.
A perspectiva autogeradora do PPP exige considerar também dimensões subjetivas na
constituição de processos de mudanças em sinergia com a realidade histórico-social dos
sujeitos. As dimensões subjetivas são fundamentais para percepção de aspectos próprios de
dado contexto em que os sujeitos estão envolvidos.
O que se vive e prática é referência para percepção dos processos autogeradores do PPP.
Assim, a maior participação da sociedade civil na escola depende fundamentalmente de
mudanças coerentes com essa realidade, com processos de natureza endógena, que valorizem
a participação direta dos sujeitos em detrimento às propostas inovativas hierarquizadas.
Como qualquer processo de inovação envolve a natureza intencional, sistemática e proposital
dos sujeitos, o PPP passa uma referência que permite aos sujeitos transitarem da consciência e
ação individual para o nível coletivo e autogerador, orientando-se pelas relações de sinergia
escola-comunidade em seu sentido mais amplo.
72
2.1.4 Os novos princípios organizadores da gestão escolar
Com a ampliação das formas de organização e gestão escolar, Libâneo (2008) aponta as
perspectivas autogestionária, interpretativa e democrático-participativa como ramificações da
concepção sociocrítica. Em linhas gerais, situar-se-ão as três concepções originárias da
perspectiva sociocrítica, considerando a concepção democrático-participativa como mais
coerente com os processos relativos às inovações nas práticas do PPP para maior participação
da comunidade.
A ênfase ao modelo democrático-participativo situa-se na possibilidade de participação ativa
da comunidade como condição para a construção e execução do PPP em seu caráter
autogerador. Assim como ao fato da proposta de investigação buscar compreender uma
experiência em curso de modificações nas práticas do PPP para maior participação da
comunidade escolar, filiando-se aos processos inovativos ideográficos.
Considera-se, ainda, que as concepções autogestionária e interpretativa, em maior ou menor
grau, demandam um ambiente democrático, sendo que a primeira depende de uma postura
proativa dos sujeitos nos processos de tomada de decisão e a segunda envolve a manifestação
do pensamento subjetivo, demandando condições de livre manifestação do pensamento.
73
2.1.4.1 A concepção autogestionária
A concepção autogestionária parte do pressuposto de que os procedimentos de gestão escolar
são organizados por meio da participação direta da comunidade, tendo como pressuposto a
proatividade dos sujeitos nos processos de tomada de decisão. Todos os envolvidos são
chamados a participar e decidir sobre questões relevantes à sustentabilidade da instituição,
rompendo com modelos hierárquicos e centralizados de decisão.
Segundo Libâneo (2008), a perspectiva autogestionária acentua a participação direta e por
igual de todos os membros da instituição, valorizando a capacidade coletiva dos sujeitos de
instituir procedimentos de gestão. Como procedimentos instituintes, podem ser mencionados
a capacidade de criação e instituição de um conjunto de normas e procedimentos coletivos,
correspondentes com o conjunto de vivências sociais na instituição pela organização das
atividades de trabalho dos sujeitos.
Outros aspectos da perspectiva autogestionária são os vínculos das formas de gestão interna
com as formas de autogestão social30, responsabilidade coletiva, auto-organização dos sujeitos
pertencente à instituição, decisões colegiadas em assembleias e reuniões (LIBÂNEO, 2008).
São características convergentes com a capacidade dos sujeitos de condução dos próprios
processos de desenvolvimento institucional, tendo como fundamento a organização de
procedimentos endógenos, compatíveis com as suas aspirações e necessidades.
30
A relação entre gestão interna e autogestão social é vista por Libâneo (2008) como um modo de promover o
exercício do poder coletivo na escola e de preparar para formas de autogestão no plano político. As formas de
autogestão política dão-se pela prática da participação e contestação das formas de poder instituído, criando
bases para as formas instituintes.
74
2.1.4.2 A concepção interpretacionista
Quanto à perspectiva interpretacionista, Lopes e Barbosa (2008) descrevem que a mesma
considera as dimensões subjetivas ao explicar os fenômenos, procurando interpretar as
condições que sustentam a unidade e coesão da sociedade e os elementos constituintes das
relações sociais, tais como: consenso, integração e coesão social, solidariedade, necessidade
de satisfação e realidade.
Enquanto concepção interpretativa da realidade, organiza-se como um conjunto de
significados subjetivos atribuídos pelos sujeitos como condição essencial para sustentar o
funcionamento da instituição. Destaca-se o fato das dimensões subjetivas, presentes nas
relações entre os sujeitos, ser importante para compreender os processos de organização da
instituição.
De acordo com Libâneo (2008), numa perspectiva interpretacionista, a escola é vista como
uma realidade social e subjetiva em que há compartilhamento de valores e práticas por meio
de uma “ação organizadora”. A ação organizadora valoriza as interpretações, percepções e
significados subjetivos em detrimento do caráter formal, estrutural e normativo presente na
estrutura organizacional da instituição.
Constata-se que essa perspectiva permite compreender elementos simbólicos que estão
presentes no plano da organização da instituição, em especial do entendimento dos valores
atribuídos subjetivamente pelos sujeitos aos processos de mudança.
75
2.1.4.3 A concepção democrático-participativa
Quanto à concepção democrático-participativa, seus fundamentos estão no processo de
redemocratização da sociedade brasileira, orientando-se pela CF/1988 e LDB 9394/96, na
qual são definidas as bases legais que estimulam o movimento de repensar a organização
escolar em parâmetros democráticos.
Esses fundamentos da CF/1988 seriam a instituição da “gestão democrática do ensino
público” (Art. 206, Inciso VI), cujos princípios são definidos pela LDB 9394/96: participação
dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e participação
da comunidade escolar e local nos conselhos da escola ou equivalentes.
Ao tratar das possibilidades de participação dos profissionais da escola na construção do PPP,
a LDB 9394/96 aponta para a necessidade de democratização dos espaços escolares,
especialmente de uma maior participação da comunidade no interior da escola. A liberdade
docente de escolha dos métodos e técnicas pedagógicas, a maior flexibilidade dos tempos e
espaços escolares, a participação da sociedade civil nos processos de gestão escolar são, para
a época, princípios inovadores.
Os pressupostos inovativos da maior liberdade, flexibilidade e autonomia na gestão dos
processos de ensino estariam voltados para a criação de condições efetivas de acesso,
permanência e progresso dos alunos nas etapas de escolarização. Subentende-se que uma das
condições para assegurar a efetividade dos referidos princípios estaria na maior sinergia da
escola com a sua comunidade.
De acordo com Libâneo (2008), a perspectiva de democratização da escola, fundamentada na
CF/1988 e LDB 9394/96, permite inferir que a organização e gestão da escola visam:
a) Prover as condições, os meios e todos os recursos necessários ao ótimo
funcionamento da escola e do trabalho em sala de aula;
b) Promover o envolvimento das pessoas no trabalho por meio da participação e
fazer o acompanhamento e a avaliação dessa participação, tendo como referência os
objetivos de aprendizagem.
c) Garantir a realização da aprendizagem de todos os alunos. (LIBÂNEO, 2008,
p.100-101)
76
O sentido do aprofundamento da gestão democrática é a melhoria da escola, em especial dos
processos de ensino-aprendizagem. O conceito de aprendizagem refere-se tanto ao acesso dos
alunos aos conteúdos curriculares quanto às práticas sociais e culturais extracurriculares. É
necessário que os alunos percebam as dimensões sociais e culturais presentes no universo da
comunidade como parte da formação cidadã.
Assim, há razões que justificam a implantação de um processo de gestão democrática na
escola com ênfase nas práticas de ensino:
1ª) A escola deve formar para a cidadania e, para isso, ela dever dar exemplo. A
gestão democrática da escola é um passo importante no aprendizado da democracia.
2ª) A gestão democrática pode melhorar o que é específico da escola, isso é, o seu
ensino. A participação na gestão da escola proporcionará um melhor conhecimento
do funcionamento da escola e de todos os seus atores (GADOTTI, 2004, p.35).
Por outro lado, a aprendizagem das práticas sociais e culturais depende da rede de relações
construídas pela comunidade. É necessário considerar a diversidade de potenciais dos sujeitos
e suas contribuições para aprendizagem. É por meio de relações dialógicas estabelecidas,
especialmente entre alunos e professores, que se desenvolve a consciência histórica e social
dos desafios da realidade.
O diálogo é uma das condições que sustenta a emergência da consciência histórico e social
dos membros de uma comunidade, tendo como eixo articulador os princípios democráticoparticipativos, sendo fundamental a liberdade de expressão, o respeito e a tolerância. A
compreensão do outro, da sua maneira de perceber a realidade, apresenta-se também como
questões essenciais. Acrescenta-se que os processos de participação são expressos em
situações de vida concreta, pertencendo ao conjunto das relações que são vivenciadas pela
comunidade, sendo referência para o desenvolvimento pedagógico e institucional da escola e,
consequentemente, da própria comunidade.
Assim, conceitua-se a gestão participativa como um processo de “mobilização da
competência e da energia de pessoas coletivamente organizadas para que, por sua participação
ativa e competente, promovam a realização, o mais plenamente possível, dos objetivos de sua
unidade de trabalho.” (LUCK, 2010, p.21). Os objetivos da escola, enquanto unidade de
trabalho, estão expressos no PPP como um instrumento articulador das relações comunitárias.
77
Quanto à unidade de trabalho escolar, os objetivos e metas pactuados coletivamente,
expressos no PPP, articulam as relações entre os seus membros, ao se sustentar em princípios
de cooperação mútua e respeito às diferenças.
Soma-se, ainda, a perspectiva de que “o êxito de uma organização social depende da
mobilização, da ação conjunta de seus componentes pelo trabalho associado, mediante
reciprocidade que cria um ‘todo’ orientado por uma vontade coletiva.” (LUCK, 2010, p.22).
A construção da vontade coletiva estaria associada à solidez das propostas educativas em
nível do engajamento pleno31 da comunidade, visto como um processo social e dinâmico, no
qual os atores assumem responsabilidades pelo agir com empenho, competência e dedicação.
Ao valorizar o envolvimento direto da comunidade, as ideias de Libâneo (2008) e Luck
(2010) são convergentes com o sentido de participação como forma de constituição da
identidade, autonomia e sentimento de pertencimento ao grupo institucional. O trabalho
coletivo, ao apoiar-se nos processos de participação, corresponsabilidade e cooperação,
consiste em uma possibilidade concreta de superação das propostas gestionárias centralizadas
e fragmentárias.
A participação direta da comunidade favorece a emergência de propostas autogeradoras,
reconhecendo que o PPP é o que se vive concretamente na escola. O conjunto dessas
vivências gradativamente assume um significado concreto, passando a ser um elemento de
articulação coletiva da comunidade para alcançar objetivos comuns.
Dentre as principais características do projeto de gestão democrático-participativa, a
construção de relações orgânicas entre a direção e os membros da equipe escolar, o
compartilhamento de objetivos comuns, os processos colegiados de decisão, as definições
sociopolíticas e pedagógicas, a gestão participativa em consonância com processos de
coordenação e diferenciação de competências profissionais entre os membros da equipe, a
gestão eficaz e a avaliação sistemática dos processos executados são as fundamentais
(LIBÂNEO, 2008).
31
Para Luck (2010, p.47), “o engajamento implica envolver-se dinamicamente nos processos sociais e assumir
responsabilidades por agir com empenho, competência e dedicação visando promover os resultados propostos e
desejados.”
78
Ainda, segundo o mesmo autor, enquanto gestão eficaz, a concepção democráticoparticipativa valoriza elementos internos do processo organizacional – o planejamento, a
organização, a direção, a avaliação -, chamando a atenção para a necessidade de uma
coerência entre as decisões tomadas e as ações praticadas na escola.
Pelo prisma democrático-participativo, a gestão eficaz consiste no reconhecimento de que os
sujeitos são detentores de direitos e responsabilidades e assumem compromisso com a
comunidade escolar, com um projeto coletivo de educação e transformação social.
Pressupõe flexibilidade organizacional, na qual os princípios de funcionamento adaptem-se à
dinâmica dos sujeitos envolvidos, estimulando-os a exercitarem sua criatividade na resolução
dos problemas. Trata-se de avaliar a legitimidade das ações, muitas das quais não previstas
em programas e/ou regulamentos, denominada de lógica do arranjo: “o ajuste com os colegas,
que permite a realização de acordos locais e novos contratos não previstos pelas regras,
garante a eficiência do trabalho” (THULER, 2001. p.39).
Assim, a construção de inovações fundadas no caráter autogerador da comunidade implica em
assumir desafios na construção de um modelo de gestão democrático-participativo flexível,
capaz de considerar a própria comunidade como locus privilegiado da proposição de
mudanças para enfrentamento dos problemas vivenciados em seu interior.
Nesse sentido, quanto mais flexível for o sistema de organização escolar, maior será a
capacidade de incorporar os processos de mudança já que prevê, em sua constituição
estrutural, o pensamento reflexivo como fator propulsor das inovações. A reflexão coletiva,
fundada na diversidade de opiniões e capacidade de novas sínteses, emerge como uma
condição fundamental para a organização da gestão democrático-participativa num contexto
dinâmico que incorpore demandas e expectativas da própria comunidade.
A compreensão do movimento dinâmico de articulação de inovações no Projeto PolíticoPedagógico da escola requer conhecer a sua postura proativa, especialmente a forma como se
apropria dos espaços democráticos no interior da escola, de modo que seja uma “construção
coletiva do espaço público, com plena participação consciente de todos na gestação e no
controle da esfera política” (COUTINHO, 1999, p.02).
79
2.1.4.3.1 O Projeto Político-Pedagógico e a Gestão democrático-participativa
A organização do PPP fundada em parâmetros democráticos consiste num avanço, na medida
em que assegura maior autonomia dos seus profissionais na deliberação de questões
pedagógicas e administrativas no interior da escola. Apoiando-se em Gohn (2004; 2007),
situa-se que sua constituição, enquanto proposta articuladora da comunidade escolar, amplia o
diálogo com outros setores da sociedade civil na constituição da chamada comunidade
educativa.
A constituição e execução do PPP fortalecem as relações democráticas da escola, quando o
processo desenvolve-se de maneira articulada, continuada e coletiva. Para Veiga (2004);
Quaresma (2012), o PPP envolve a participação dos profissionais da escola (professores,
diretores, supervisores, auxiliares), alunos e demais segmentos da comunidade, orientando-se
pela definição de estratégias e objetivos para enfrentamento da realidade e dos desafios de
construção da sociedade desejada.
A igualdade de condições para acesso e permanência na escola, a qualidade educacional para
todos, a gestão democrática do ensino público, a autonomia e liberdade, a valorização do
magistério são os princípios fundamentais que sustentam a constituição democráticoparticipativo do PPP da escola. (VEIGA, 2004)
Obviamente, todo esse processo requer legitimidade e aprofundamento dos princípios da
democracia participativa no interior da escola. Pressupõe, ainda, uma maior participação da
sociedade civil em questões de interesse público, pressionando o Estado tanto para manter a
coerência e equidade no tratamento das políticas educacionais, quanto em assegurar os canais
de participação da comunidade educativa. Essa coerência estaria tanto no respeito aos
processos de mudança instituídos pela própria escolar, quanto no aporte de recursos públicos
necessários à construção da realidade desejada.
Ao conceituar o movimento de redemocratização da escola brasileira, ao final da década de
1980, Gadotti; Romão (2004) descreve sua pertinência como a maior participação da
sociedade civil. Dentre os aspectos positivos, são destacadas as possibilidades de exercício da
autonomia escolar, especialmente na constituição do PPP em uma trajetória compatível com
as dimensões histórico e social da escola.
80
Os avanços do processo de redemocratização para os sistemas de ensino brasileiros estariam
principalmente nas possibilidades de exercício da autonomia escolar e constituição do PPP.
Por outro lado, não se pode esquecer que, decorridas mais de duas décadas, há fragilidades
das práticas participativas, convertendo o PPP, um instrumento burocrático, em um
documento de gaveta, cumpridor de uma lógica pública formal (VEIGA, 2003).
É latente, a necessidade de avançar nas formas como efetivamente as comunidades dialogam
com o PPP, enquanto instrumento de ação-reflexão-ação autogerador de mudanças e
expressão concreta da organização e do fazer pedagógico em atendimento qualitativo do
aluno como sujeito singular da comunidade educativa.
O posicionamento dos membros da comunidade educativa orienta-se pelo PPP, pressupondo
comprometimento com a escola e com os processos de retroalimentação das práticas
curriculares de melhoria da qualidade de ensino e de transformação da realidade, em um
exercício permanente de aproximação das concepções filosóficas, pedagógicas e
administrativas da escola no marco desejado.
Um projeto de educação comum vai exigir que os educadores de cada escola elejam
um conjunto de intenções educativas e um conjunto de diretrizes pedagógicas que se
articulem para orientar a organização e o desenvolvimento da sua prática educativa.
Referenciais mais amplos - de natureza político-filosófica, epistemológica e
didático-pedagógica - definidos conjuntamente, oferecerão as bases para a análise da
realidade atual da escola e o planejamento da intervenção sobre ela (MURTA, 2004,
p.21).
A vivência das dimensões político e pedagógicas do PPP, no interior da escola, é fundamental
para a radicalização da democracia escolar e, ao mesmo tempo, para a congregação da
participação de diferentes segmentos da comunidade na gestão e práticas pedagógicas
escolares. A criação de estratégias de envolvimento da comunidade, tanto na participação
quanto nos processos de decisão colegiada, é fundamental para a formação de uma
organização institucional e pedagógica com maior poder de participação da sociedade civil.
A dimensão política do PPP “compreende o que se deseja em relação à formação do cidadão e
o tipo de sociedade que se deseja construir, bem como, quanto ao que se compreende sobre
educação” (QUARESMA, 2012, p.02). Assim, perpassa tanto pela concepção que orienta as
práticas educacionais, quanto pela definição do homem e sociedade que se deseja. Pelas
81
práticas pedagógicas, os discentes têm acesso ao currículo como caminho a ser percorrido na
superação dos problemas reais e alcance das condições efetivas desejadas.
As dimensões pedagógicas são vistas como as condições operacionais concretas de acesso aos
saberes tratados pela escola, tais como: articulação dos conteúdos curriculares, concepções,
formas e instrumentos de avaliação, estratégias de recuperação dos alunos, materiais
didáticos, dentre outros. Ou como expressa Quaresma:
a dimensão pedagógica diz respeito às ações reais para que a formação do aluno se
concretize. Ou seja, qual currículo? Qual processo de avaliação? Qual metodologia?
Quais recursos didáticos? Quais serão as relações interpessoais? Qual formação
continuada para os professores? Quais as formas de participação de alunos, pais e
professores? Qual a forma de gestão? Enfim são dimensões que dizem do desejo e
do fazer para que o trabalho pedagógico da escola aconteça rumo à formação de
qualidade do aluno (QUARESMA, 2012, p.14).
Acrescenta-se que a perspectiva autogeradora do PPP acentua a necessidade da sua
constituição em consonância com a trajetória histórico social da escola. Implica em
desenvolver a consciência dos seus sujeitos para a vida, em sentido mais amplo, em sua
comunidade educativa.
A construção de estratégias de reflexão conjunta, situando os
problemas da comunidade e suas respectivas estratégias de ação, é fundamental para o seu
caráter edificante.
São as ações de compreensão das contradições de uma dada realidade, a abertura ao diálogo e
as formas de compreensão de um dado fenômeno que materializam a prática de constituição
democrática do PPP. É a conversão sublime da ideia de participação em um trabalho com
estratégias metodológicas coletivas e engajadas, com posicionamento dos sujeitos frente às
questões levantadas.
Isso reforça a ideia de que as condições autogeradoras do PPP, em consonância com as
dimensões históricas e sociais de pertencimento dos sujeitos escolares, demandam um
posicionamento comunitário crítico e reflexivo da realidade. Uma vivência dialógica dos seus
campos instituídos e instituintes32 no espaço democrático, entre a realidade vivenciada
cotidianamente e o que se deseja construir.
32
Ao diferenciar projeto de plano Gadotti (2004) aponta que o plano fica no campo do instituído, do seu
cumprimento eficaz, enquanto o projeto (no caso, aplica-se ao PPP), situa-se no campo instituinte, do vir a ser.
Assim, necessita rever o campo instituído no seu processo de constituição.
82
[...] um projeto político-pedagógico não nega o instituído da escola que é a sua
história, que é o conjunto dos seus currículos, dos seus métodos, o conjunto dos seus
atores internos e externos e o seu modo de vida. Um projeto sempre confronta esse
instituído com o instituinte (GADOTTI, 2004, p.34).
É necessário fortalecer as estratégias de pertencimento dos sujeitos ao PPP de modo que se
sintam contemplados e valorizados nos processos de desenvolvimento institucional e
pedagógico da escola. O desenvolvimento do diálogo é fundamental para que os processos de
decisão sejam compartilhados e exista sensibilidade dos sujeitos quanto ao interesse coletivo.
O senso de responsabilidade coletiva e trabalho pedagógico cooperativo evita relações
competitivas, corporativas e autoritárias (QUARESMA, 2012).
Assim, a participação pode ser vista como uma possibilidade de superação das ações de
trabalho individuais e fragmentadas, tendo como referência as decisões coletivas, centradas na
escola como unidade social e no poder de competência do grupo (LUCK, 2010). Nesses
termos o PPP passa efetivamente a ser um elo de articulação da comunidade educativa à sua
unidade social e histórica, sustentada pela consciência dos sujeitos quanto aos desafios e
potencialidades de construção de estratégias inovadoras.
É na estreita relação entre os campos instituídos e instituinte, da realidade vivida e desejada,
que se constitui na linha tênue dos processos de estabilidade e mudança,33 da existência do
caráter autogerador de inovações do PPP. A comunidade ao lidar com essa dinâmica em
espaços democráticos de participação permite aos sujeitos coletivos converterem o PPP em
uma expressão endógena34 dos interesses comunitários, assegurando o seu caráter edificante
diante da realidade institucional e pedagógica vivenciada.
Por outro lado, o diálogo entre os campos instituinte e instituído do PPP é um movimento
inacabado e permanente entre o real e o desejado, exigindo da comunidade o fortalecimento
dos processos participativos e a superação de determinadas condições que fragilizam a sua
vivência democrática, tais como: centralização das ações pelo diretor, ausência de identidade
33
De acordo com Thuler (2001), qualquer processo de mudança, de inovação supõe rompimento com processos,
formas e ideias instituídas. Por outro lado, a inovação para se materializar como um processo proposital e
contínuo exige o mínimo de estabilidade.
34
Os processos de mudança endógena são disseminados pela própria comunidade, ao tomar consciência das
demandas da sua própria realidade (ÁVILA, 2003).
83
coletiva e de sentimento de pertencimento do grupo, ações mecânicas e fragmentadas, ruídos
no diálogo e comunicação interna, dentre outros.
Vale destacar que não se pode considerar os processos participativos como sinônimo de
consenso e unanimidade. O desenvolvimento do PPP, enquanto proposta articuladora da
realidade, supõe a existência do contraditório, da manifestação do pensamento divergente
como fator intrínseco ao cenário democrático.
Ao analisar os processos de descentralização escolar, Thuler (2001) destaca o fato da
participação não se constituir em uma unanimidade na escola:
- A descentralização não é garantia de participação. Os diretores de escola podem
confiscar o poder acrescido concedido às instituições, se o sistema de gestão não os
dissuadir ativamente e não introduzir contrapoderes.
- A descentralização e a participação não terão credibilidade se as autoridades
limitarem-se a explicar seu ponto de vista sem negociá-lo, sem aceitar interpretações
diversas, sem levar a sério os princípios de funcionamento democrático ou sem
estabelecer dispositivos de acordo dignos deste nome.
- A participação, o acordo e a cogestão não são antídoto ideal à resistência porque
esta não é levada em conta. A recusa à participação não apenas é frequente, mas faz
parte de uma estratégia.
- Os acordos nem sempre são concebidos de maneira a criar um campo de diálogo e
cooperação que permita construir representações comuns. (THULER, 2001, p.15).
Assim, os processos de participação não são produtos de uma dada realidade natural,
pertencendo ao universo das construções histórico-sociais dos sujeitos, marcadas por
contradições e, por sua vez, por condições determinantes. Ao serem resultantes das condições
históricas e sociais dos seus sujeitos, são marcados por tensões, especialmente quanto às
formas de participação. Até mesmo, a posição confortável e privilegiada de determinados
sujeitos ou a acomodação em determinado status quo, pode gerar resistência quanto aos
processos de mudança.
É necessária uma visão crítica dos sujeitos relativa às tensões existentes no interior da escola,
especialmente na constituição de um PPP que se proponha a ser inovador para uma maior
participação da comunidade, de modo que se perceba a tênue relação entre a realidade e o que
se deseja construir, nos quais estão presentes tensões como parte do desafio concreto.
É importante estar consciente dos desafios que envolvem a articulação e mobilização dos
sujeitos, recursos humanos e materiais, concepções, dentre outros. Vale lembrar que
84
Hernández et al (2000); Carbonell (2002) apontam as modificações das concepções dos seus
sujeitos como o principal desafio dos processos de inovação escolar.
Assim, o PPP, como expressão da democracia escolar, consiste num movimento permanente
e dinâmico de diálogo dos seus sujeitos, reconhecendo suas possibilidades e contradições
como inerentes e salutares à produção de inovações que dialogam com o desenvolvimento
endógeno da comunidade. É fundamental que o PPP expresse a realidade concreta vivenciada
pela escola, correlacionando os marcos teóricos com a prática social. Ou, como expressa
Veiga (2003), como um processo de participação direta, envolvendo argumentação,
comunicação e a solidariedade dos atores na constituição do horizonte histórico e social da
escola e dos seus objetivos concretos.
A participação articulada da comunidade escolar pode produzir investigações sobre a
realidade concreta da escola, assim como contribuir com o desenvolvimento de centros de
estudos, organização de salas de leitura, salas de artes e outras atividades na área da cultura,
esporte e lazer nas escolas (GOHN, 2007).
Vê-se que um PPP, que possibilita o envolvimento dos alunos em atividades curriculares e
extracurriculares, criando estratégias, nas quais são envolvidos efetivamente como sujeitos da
ação e desenvolvem experiências de tomada de decisões, apresenta-se como uma
possibilidade de diálogo com a vida cidadã dos discentes no ambiente comunitário.
O PPP, como expressão da própria organização escolar democrática, implica “não só a
participação na gestão, mas também a gestão da participação, em função dos objetivos da
escola” (LIBÂNEO, 2008, p.105), ou seja, um movimento de ruptura nos processos de
trabalho fragmentados e desarticulados, pressupondo uma articulação coesa de todo o grupo
em sua concepção e execução, participando efetivamente da (re)construção da proposta.
Partindo do pressuposto de que os princípios organizadores do processo de gestão
democrático-participativo são convergentes com a maior participação da comunidade, o
desafio e a construção de um conjunto de procedimentos contribuem com o aprofundamento
da participação comunitária, equilibrando dimensões objetivas e subjetivas, numa prática
orientada por objetivos de melhoria da qualidade da educação.
85
2.1.4.3.2 Analisando experiências inovadoras na Gestão democrático-participativa
O processo de democratização da sociedade brasileira pode ser associado a três inovações
institucionais: autonomia financeira das escolas, eleição do diretor e colegiado escolar. Esses
três processos institucionais estão intrinsicamente interligados já que a autonomia financeira
exige a formação de estruturas colegiadas e que o diretor, em um contexto democrático,
assume um papel de articulador tanto das estruturas colegiadas quanto da autonomia
financeira e constitui-se em presidente da entidade jurídica da caixa escolar, assim como do
colegiado escolar (BARROS; MENDONÇA, 1998).
A autonomia financeira pode ser vista como a capacidade conquistada pelas escolas de gerir
os recursos que são descentralizados do caixa escolar, priorizando a otimização da sua
aplicação. Para Barros e Mendonça (1998), a autonomia financeira constitui-se no pilar do
processo de descentralização da gestão escolar, na medida em que assegura à própria escola a
capacidade de lidar com os recursos financeiros, convivendo diretamente com os limites de
aplicação dos recursos no atendimento às demandas prioritárias.
Quanto à eleição de diretores, a principal ruptura foi o deslocamento dos processos de
indicação política35 para escolhas centradas na competência profissional. Em alguns Estados
da Federação, o processo combina exame de certificação, com aplicação de provas para
avaliar a proficiência dos candidatos, e eleição da comunidade. A habilitação do candidato
para participar das chapas eleitorais fica condicionada à obtenção de uma proficiência mínima
no exame de certificação.
Em relação ao colegiado escolar, sua natureza normativa e consultiva habilita-o a coordenar e
avaliar as atividades pedagógicas, administrativas e financeiras das unidades escolares. É uma
forma de participação representativa de professores, funcionários, pais, alunos e membros da
comunidade na gestão escolar. A gestão colegiada dos processos visa a aperfeiçoar a
aplicação dos recursos públicos, o desenvolvimento administrativo e pedagógico das escolas.
Seu potencial está relacionado à capacidade de seus membros dialogarem com a comunidade
e articularem processos decisórios compatíveis com os interesses e necessidades da
comunidade, bem como com o PPP da escola.
35
Os processos de indicação política e ocupação de cargo público são ranços dos sistemas burocráticos de
gestão, nos quais as decisões são centralizadas, desconsiderando os interesses e necessidades da comunidade
local.
86
Segundo Abranches (2003), o colegiado é uma forma de construir uma gestão, na qual
representantes de diferentes segmentos institucionais participam dos processos decisórios e do
acompanhamento, execução e avaliação das ações administrativas, financeiras e pedagógicas
nas unidades escolares.
A construção da autonomia financeira, eleição direta do(a) diretor(a) pela comunidade e
gestão colegiada consistem em três importantes inovações no cenário democráticoparticipativo, com contribuições para melhoria da qualidade da educação (BARROS;
MENDONÇA, 1998).
Essas três inovações do cenário democrático-participativo são fundamentais para a
constituição dos processos democráticos no interior da escola. A radicalização dos processos
democráticos, no entanto, exige aperfeiçoamento dos canais de comunicação e envolvimento
direto da comunidade no cotidiano escolar criando, conforme visto anteriormente, uma
sinergia ampla com a comunidade educativa.
As três experiências institucionais mencionadas são importantes, mas possuem limites quanto
aos processos de participação direta, sendo importante avançar nas formas como efetivamente
a comunidade escolar constrói diretamente os processos participativos em suas relações
cotidianas como fator decisivo para a emergência de inovações autogeradoras nas práticas do
PPP.
87
2.1.4.3.3 O PPP, as formas e valores da gestão democrático-participativa
As formas de participação representam a maneira como os sujeitos escolares envolvem-se nas
atividades pedagógicas e administrativas (reuniões, conselhos, atividades curriculares) de
acordo com Luck (2010) perpassando pela presença física, expressão verbal e discussão de
ideias, representação, tomada de decisões e engajamento.
Ao analisar o modelo gerencial de gestão escolar, vê-se que os processos participativos
podem assumir um sentido dissimulado, conforme a conveniência e o interesse de
determinados grupos ou pessoas. A ausência de um sentido legítimo da participação, enquanto
envolvimento consciente dos sujeitos nos processos de transformação social, é um limite à
expressão democrático-participativa das práticas do PPP na escola. Esse limite estaria
principalmente na falta de conhecimentos integrais dos sujeitos dos processos de
transformação sendo, para os mesmos, concepção e execução fatores dissociáveis.
Obviamente, a maneira como os sujeitos vivenciam e apropriam-se do PPP em sua prática
determina o quanto estão próximos ou distantes dos processos participativos autogeradores,
nos quais o caráter edificante das mudanças do PPP fortalece as dimensões sociocríticas das
práticas pedagógicas e de gestão.
De acordo com Luck (2010), em reuniões escolares, é comum conceber como suficiente a
presença física dos participantes, sem que de fato os mesmos tenham tido qualquer tipo de
envolvimento com a proposição das ideias. Infere-se que a simples presença física das pessoas
no cenário da participação, sem o devido grau de mobilização e envolvimento consciente dos
sujeitos, não é suficiente para assegurar processos autogeradores do PPP. Fica adormecido o
poder de decisão coletiva dos sujeitos, enquanto fator fundamental para o caráter edificante do
PPP.
O caráter autogerador do PPP estaria na manifestação da diversidade de posições dos sujeitos
e na capacidade coletiva de produção de sínteses que representariam de maneira autêntica os
interesses comunitários. É na multiplicidade de concepções e experiências dos sujeitos que se
assegura o movimento de vir a ser do PPP como processo inconcluso que reflete o movimento
dinâmico da comunidade na construção de alternativas aos desafios da sua realidade.
88
Quanto à verbalização, enquanto forma de participação, assume sentido limitado quando o
debate não sofre o devido grau de aprofundamento das questões que envolvem a estrutura
administrativa e pedagógica (LUCK, 2010). As reflexões coletivas das práticas do PPP ficam
restritas a questões secundárias, sem relevância e com o esvaziamento do poder de decisão
comunitário, consequentemente, do seu caráter autogerador.
Em termos de participação representativa, sua principal forma de manifestação tem sido os
conselhos escolares. Os limites dessa forma de participação estão relacionados ao despreparo
dos representantes para atuarem em consonância com as demandas e expectativas da
comunidade escolar.
A ausência do conhecimento de questões básicas em termos administrativo, pedagógico e
financeiro das escolas; a participação dos representantes acoplada por uma lógica estatal e
lacunas no diálogo dos representantes com a comunidade são apontados como principais
problemas dessa forma de participação (GOHN, 2007). Assim, os processos de atuação nos
conselhos estariam mais voltados para a manutenção da fluidez dos interesses de
determinados grupos com posição estratégica na política pública do que para o exercício
autônomo, crítico-reflexivo dos campos instituídos e a proposição de mudanças, de diálogo
com a perspectiva instituinte.
Por outro lado, a legitimidade dos processos participativos perpassa pelo envolvimento dos
sujeitos e compartilhamento do poder de decisão, nos quais todos efetivamente se envolvem
para a busca de soluções para os problemas enfrentados. É, segundo Luck (2010), um
movimento de engajamento, no qual os sujeitos assumem responsabilidades quanto ao
desenvolvimento de um projeto comum.
Essa forma de participação consiste em um contraponto aos processos participativos
comandados pelos interesses dos sujeitos que detêm posição estratégica, o debate consiste
apenas numa forma para referendar as decisões tomadas previamente pela direção, sem o real
envolvimento dos sujeitos e consciência do seu significado para o PPP da escola (LUCK,
2010).
Superar as formas dissimuladas de participação no interior da escola, construindo processos
que valorizam os sujeitos, com poder efetivo de decisão é um desafio a ser percorrido no
89
interior no aperfeiçoamento do PPP. É importante que os sujeitos estejam envolvidos na
proposição das ideias, no compartilhamento das decisões e na responsabilização pelas
mesmas. Assim, é necessário uma dinâmica de engajamento com empenho, compromisso e
dedicação.
O engajamento representa o nível mais pleno de participação. Sua prática envolve o
estar presente, o oferecer ideias e opiniões, o expressar opiniões, o expressar o
pensamento, o analisar de forma interativa as situações, o tomar decisões sobre o
encaminhamento de questões, com base em análises compartilhadas e envolver-se
de forma comprometida no encaminhamento e nas ações necessárias e adequadas
para a efetivação das decisões tomadas (LUCK, 2010, p.47).
Obviamente, a participação engajada é fundamental para a existência, no interior da escola, de
processos inovativos de caráter autogerador do PPP. A vivência dos valores no interior da
escola corrobora com a construção de uma ação coesa e integral, refletindo a comunidade em
sua diversidade, especialmente da forma como concebem a realidade em analogia ao que se
deseja.
Na medida em que há aprofundamento das interações no ambiente escolar, os sujeitos vão
concebendo os valores que orientam os processos de participação engajada, destacando a
ética, a solidariedade, a equidade e o compromisso (LUCK, 2010).
Os valores éticos são fundamentais para o exercício da autonomia escolar, sendo referência
para a vivência dos sujeitos das ações orientadas por princípios de respeito ao ser humano e
aos valores institucionais presentes no PPP. A vivência da autonomia exige um compromisso
ético-profissional dos sujeitos na promoção da educação para a sua comunidade, sustentado
na capacidade da escola de construir e executar um PPP relevante para sua comunidade
(NEVES, 2004).
A solidariedade, enquanto sentimento que se desenvolve em condições de troca e
reciprocidade, é outro valor fundamental para a construção de um trabalho coletivo e
colaborativo em detrimento às ações individuais. É fundamental, quando se propõe a criar o
sentindo coletivo, superar as ações centralizadas, individuais e fragmentadas. No PPP, as
ações de trabalho articuladas exigem a solidariedade, o respeito, a reciprocidade e a
participação de todos como base para relações cordiais (QUARESMA, 2012).
90
Quanto à equidade, perpassa pelo reconhecimento e atendimento dos sujeitos que demandam
condições especiais, bem como pela justiça social e redução das desigualdades no interior da
escola. Pressupõe um compromisso dos envolvidos com os princípios e diretrizes que
orientam o PPP sem, no entanto, limitar o direito dos sujeitos de serem atendidos, conforme
suas necessidades e manifestar as suas diferenças, quanto aos métodos e técnicas pedagógicas.
A legitimidade de todo processo de participação ocorre pelo compromisso dos sujeitos em
relação às decisões tomadas, tanto na participação nos processo de constituição dos marcos de
orientação coletiva, quanto em assumir as responsabilidades pela sua vivência concreta nas
práticas do PPP.
É fundamental, no processo de execução e vivência do PPP, orientar-se pelos valores
mencionados, nutrindo-se do diálogo como condição essencial. Para Freire (1987), o amor ao
mundo e aos homens, a humildade, a fé nos homens e mulheres, a confiança e a esperança são
condições essenciais para a existência do diálogo. Esses sentimentos, associados aos valores,
nutri as relações entre os sujeitos e as convicções do grupo das suas possibilidades
autogeradoras de mudanças.
Expressa nos processos de participação coletiva a autonomia dos sujeitos é condição
fundamental para proposição de valores e formas coerentes com o caráter autogerador do
PPP, referendo em uma escola cujos espaços são abertos as situações de confronto enquanto
base para a proposição de inovações (VEIGA, 2003).
91
2.1.4.3.4 A Gestão do PPP: possibilidades e contradições
Ao envolver dimensões históricas e sociais, a gestão do PPP não é um movimento linear,
dado em um determinado momento histórico pela formalização de um plano que unifica todas
as propostas e o modo de relacionar dos seus sujeitos. Há uma dialética própria no interior das
escolas, um movimento de reflexão-ação-reflexão que dialoga com a realidade concreta,
podendo existir contradições entre o seu referencial político-filosófico, que orienta a
perspectiva de escola desejada, e a prática concreta dos sujeitos, especialmente dos
professores em sala de aula.
Como processo inacabado, o caráter edificante do PPP estaria no diálogo permanente dos
sujeitos com a realidade coletiva, com as possibilidades de proposição de propostas inovativas
que respondam aos desafios de modificar a realidade concreta, especialmente às demandas
emergentes na comunidade.
A construção do PPP por especialistas, sem o real envolvimento da comunidade escolar,
dissemina a concepção de um documento pontual, de caráter regulatório, definidor de
concepções e procedimentos distantes das reais necessidades da comunidade. Ao assumir
contornos verticalizados, segmentando planejamento e ação, centra-se em preocupações de
padronização, uniformidade e controle burocrático das ações.
Essa forma de condução da proposta no interior da escola mitiga o seu potencial autogerador e
o caráter dinâmico de envolvimento da comunidade, passando a constituir um plano formal
em atendimento aos protocolos da política pública, sem o devido grau de apropriação e
envolvimento coletivo da comunidade.
A ausência de uma efetiva participação da comunidade na constituição da proposta reduz a
aderência dos sujeitos em seu processo de vivência, reforçando a segmentação entre
concepção e execução. Torna-se um processo fragmentando, distante da identidade e
pertencimento dos sujeitos. Nesse caso, serve apenas como documento de gaveta, cumprindo
o rol de procedimentos burocráticos, das diretrizes legais do sistema público de ensino.
Esse sentido de participação é visto como uma forma de referendar as exigências da política
pública, já que suprime o debate entre os sujeitos envolvidos com a mesma. (GOHN, 2007;
92
DAGNINO, 2004). Os processos de construção do PPP não ficam imunes a essa lógica,
especialmente quando são vistos como documentos formais, podendo ser construídos por um
corpo técnico, para referendar as políticas educacionais vigentes.
A ausência de um sentido político-democrático de transformação da escola produz uma
desmobilização da comunidade e cria um ceticismo do ato de participar (LIBÂNEO, 2008;
LUCK, 2010). Entre os problemas são destacadas, pelos autores, propostas de restruturação
de tempos e espaços escolares sistematizadas coletivamente, mas que, efetivamente, não são
levadas adiante pela direção; distorção do debate para questões secundárias em detrimento
dos pontos centrais de desenvolvimento institucional, dentre outras.
Cria-se uma pseudoparticipação, na qual os envolvidos têm a capacidade de argumentação
sem, no entanto, o real poder de decisão. As decisões continuam centralizadas em sujeitos que
detêm posições estratégicas, seguindo a lógica da sua conveniência pessoal.
Essa redução do sentido da participação impacta a formação de uma consciência coletiva e a
mobilização dos sujeitos escolares, no que se refere ao PPP em seu sentido dinâmico,
mitigando as possibilidades da comunidade de produzir transformações concretas,
compatíveis com as suas reais necessidades.
Ao analisar os processos de participação, Libâneo (2008) aponta para o fato de que “as
pessoas podem ser induzidas a pensar que estão participando, quando, na verdade, estão sendo
manipuladas por interesses de grupos, de facções partidárias, interesses pessoais (p.144).” Isso
reforça a necessidade da ação direta dos sujeitos nos processos participativos, da capacidade
de articular as práticas institucionais à vivência coletiva, ou seja, de assegurar que as decisões
expressas no projeto político-pedagógico sejam vivenciadas na prática concreta.
Infere-se que a participação de modo autêntico, pautada na compreensão do PPP da escola,
exige uma concepção clara dos participantes acerca dos objetivos sociais que norteiam a
instituição, especialmente da sua missão e dos objetivos pactuados pela comunidade escolar.
Se a educação consiste em um processo de intervenção no mundo e transformação social
(FREIRE, 2004), o PPP exige esse posicionamento político dos sujeitos diante da sua
realidade. Segundo o mesmo autor, inexiste na prática educativa neutralidade já que a omissão
93
dos sujeitos em participar corrobora com a racionalidade técnica dominante, com a
manutenção do status quo vigente, reproduzindo, no interior da escola, o universo ideológico
dominante da sociedade. Por outro lado, a tomada de consciência dos sujeitos da sua
realidade, das demandas e contradições presentes permite avançar em processos participativos
e práticas articuladas com as transformações sociais e aderentes às reais demandas da
comunidade.
A falta de consciência dos sujeitos do poder de participação produz resultados negativos na
instituição escolar, expressos principalmente em faltas, omissões, descuidos e incompetência,
sendo esses aspectos responsáveis por fracassos e involuções (LUCK, 2010). Tem-se
sustentado que o PPP é uma possibilidade concreta de fortalecimento dos processos
participativos, desde que seja voltado concretamente para a consecução dos objetivos do
trabalho escolar.
Os processos participativos orientam-se pela consecução dos seguintes objetivos básicos:
finalidades da escola, estrutura organizacional, currículo, tempo escolar, processo de decisão,
relações de trabalho e avaliação (VEIGA, 2004). Crê-se que é essa participação objetivada
que fortalece a vivência coletiva do PPP, sustentando processos engajados, no quais os
sujeitos dialogam com a realidade e constroem ações em direção ao que se deseja.
Na escola, a participação tem sido evocada em várias circunstâncias: atividades
extracurriculares, como festas juninas, promoções de campanhas, atividades de campo ou
transversalidade do currículo; reuniões para tomada de decisões dos problemas apresentados
pela escola (LUCK, 2010). Esses aspectos são importantes para a vivência social da escola,
no entanto é necessária uma centralidade nas questões estruturais, que fundamentalmente
contribuam com a maior participação da comunidade, com poder de decisão das questões
relativas ao desenvolvimento escolar.
Assim, no desenvolvimento do PPP, é necessário atentar para as dificuldades que são
impostas para sua vivência engajada. O reconhecimento dessas contradições é fundamental
para se avançar na constituição e execução de sua práxis autogeradora.
Em síntese, escolas democráticas são aquelas que permitem aos sujeitos que se envolvam
plenamente e com poder efetivo de participar na constituição e execução do PPP. Nesse
94
raciocínio, precisa-se avançar na conceituação e compreensão das formas de gestão
democrática como condição para a construção autogeradora das práticas do PPP pela
comunidade (escolar e educativa).
Nos capítulo 3, serão apresentados os dados de análise de uma experiência em construção, na
tentativa de compreender as relações que vêm sendo construídas para maior participação
comunitária nas vivências do PPP por uma escola do município de Teófilo Otoni/ MG.
95
3. ANÁLISE DE UMA EXPERIÊNCIA EM CONSTRUÇÃO: A GESTÃO
E
AS
PRÁTICAS
PEDAGÓGICAS
DO
PROJETO
POLÍTICO-
PEDAGÓGICO PARA MAIOR PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE –
ANÁLISE DOS DADOS DOS QUESTIONÁRIOS, GRUPOS FOCAIS E
ENTREVISTAS
3.1 As unidades e categorias de análise dos questionários, grupos focais e entrevistas como
instrumentos da pesquisa
Conforme mencionado na metodologia o propósito principal da aplicação dos questionários
foi levantar dados primários que permitissem uma aproximação com o PPP no interior da
escola, evidenciando aspectos e/ou tendências relativas às inovações nas práticas pedagógicas
e de gestão do PPP em sua vivência concreta.
Apoiado no caráter processual e coletivo do PPP (VEIGA, 2003; GADOTTI, 2004; NEVES,
2004; QUARESMA, 2012), procurou-se por meio dos grupos focais e entrevistas o
aprofundamento qualitativo das informações coletadas nos questionários, estabelecendo uma
aproximação com as práticas de gestão e pedagógicas da escola pesquisada enquanto
expressão daquilo que se vive e pratica.
É fundamental compreender as formas de interatividade da comunidade com o PPP,
entendendo que, em sua prática concreta, situam-se as condições autogeradoras e propositivas
de inovações para uma maior participação da comunidade. São pelas práticas de gestão e
pedagógicas que se constroem as relações entre os sujeitos escolares, em especial, o
envolvimento dos seus profissionais.
Assim, a análise dos dados relativos às inovações na gestão do PPP para maior participação
da comunidade foi sistematizada em categorias, com as suas respectivas unidades de análises
empíricas (OLIVEIRA, 2007). Para compreender a realidade em sua complexidade buscou-se
um diálogo entre os dados apontados pelos sujeitos nas diferentes técnicas de pesquisa
empírica (questionários, grupos focais e entrevistas) utilizadas na investigação. Acredita-se
que esse caminho é mais coerente com o conhecimento do sentido autogerador dos sujeitos
96
das mudanças do PPP ao ter como fundamento diferentes perspectivas de conhecimento da
realidade histórico-social dos sujeitos.
A identificação e agrupamento das categorias empíricas baseou-se nos conceitos centrais da
investigação, orientando-se por uma perspectiva de interação e interpretação dos dados em
sua complexidade, visando perceber as relações estabelecidas entre os sujeitos comunitários
na vivência das práticas pedagógicas e de gestão do PPP.
As categorias e suas respectivas unidades de análise estão sistematizadas no QUADRO 4.
QUADRO 4
CATEGORAIS E UNIDADES DE ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS, GRUPOS FOCAIS E
ENTREVISTAS
CATEGORIAS DE ANÁLISE
COMPOSIÇÃO DA CATEGORIA POR UNIDADES DE ANÁLISE
Categoria 1: Participação da
comunidade na gestão do
Projeto Político-Pedagógico
da escola.
Categoria 2: O Projeto
Político-Pedagógico
enquanto
unidade
de
articulação
escolacomunidade .
Categoria
3:
Ações
desenvolvidas pela escola
para maior participação da
comunidade no Projeto
Político-Pedagógico.
Unidade 1: Percepção da comunidade sobre a participação nas
práticas do PPP
Unidade 2: Os profissionais da escola, processos decisórios e o PPP
Unidade 3: Concepção dos sujeitos da sua vivência escolar
Unidade 4: Finalidades do PPP e organização das práticas
pedagógicas e de gestão
Unidade 5: Relações de trabalho na escola
Categoria 4: Dificuldades de
maior
participação
da
comunidade no Projeto
Político-Pedagógico.
Unidade 11: Os desafios dos processos de mudança na escola
Unidade 12: A percepção da escola da participação dos pais
Unidade 13: Preparação profissional para as vivências comunitárias
Unidade 14: A participação da comunidade no planejamento das
ações
Unidade 6: Fatores para aumento dos processos participativos
Unidade 7: Os projetos e as experiências curriculares e
extracurriculares
Unidade 8: Estratégias de Planejamento das ações
Unidade 9: Parcerias da comunidade e sistemas de apoio
Unidade 10: Organização dos tempos, espaços e práticas pedagógicas
Fonte: Dados extraídos pelos pesquisador dos questionários, grupos focais e entrevistas.
No processo de interação progressiva do pesquisador com os dados optou-se pela descrição
inicial dos questionários (natureza quantitativa) e da sua correlação como os grupos focais e
entrevistas (natureza qualitativa), estabelecendo as correlações necessárias à compreensão das
práticas do PPP e maior participação da comunidade.
97
3.2 Aproximando da experiência em construção: análise das categorias dos questionários,
grupos focais e entrevistas
Categoria 1: Participação da comunidade na gestão do Projeto Político-Pedagógico da escola
Unidade 1: Percepção da comunidade sobre a participação nas práticas do PPP
Ao tratar das concepções e práticas de gestão no Capítulo 2, situou-se que a forma como os
sujeitos concebem sua participação no PPP é fundamental para a construção de uma
consciência coletiva e fortalecimento de um projeto societário de educação em que as práticas
inovadoras estejam correlacionadas à maior participação e interesse comunitário. A
participação coletiva dos sujeitos é fundamental para assegurar uma base endógena de (re)
construção, pautando-se por questões de interesse e necessidade da própria comunidade.
Viu-se que a constituição autogeradora de um PPP está diretamente relacionada à forma de
envolvimento dos sujeitos comunitários e ao reconhecimento do seu caráter dinâmico, dos
valores e reciprocidade entre concepção e execução, teoria e prática. Enquanto processo, o
envolvimento proativo dos sujeitos torna-se fundamental na construção de uma identidade e
sentimento de pertencimentos relativos aos seus princípios e ações prioritárias na escola.
Nesse sentido, a perspectiva societária de gestão ao ser vivenciada em seu sentido autogerador
e em sinergia com os princípios democrático-participativos apresenta-se como mais adequada
para compreender a existência do caráter autogerador dos sujeitos nas práticas do PPP em
suas dimensões históricas e sociais.
Esse caráter autogerador implica na valorização das dimensões societárias, no
aperfeiçoamento das práticas de gestão, no qual as decisões tecnocráticas36 cedem espaço aos
processos de participação comunitária, pressupondo o envolvimento coletivo dos sujeitos.
Assim, em sua dimensão edificante, o PPP exige uma aproximação da escola com a sua
comunidade e a constituição de processos de decisões horizontalizados.37
36
Relativas às decisões centralizadas, em que equipes técnicas de especialistas são responsáveis pela elaboração
das propostas e difusão para que outros sujeitos executem. (HERNÁNDEZ et al, 2000; CARBONELL, 2002)
37
Processos de decisão que envolve a participação direta dos sujeitos nos debates, no compartilhamento do
poder de decisão e no compromisso com os acordos coletivos.(LUCK, 2010)
98
É um processo que exige consciência dos sujeitos, da realidade, dos fatores que dificultam ou
favorecem a expressão das potencialidades comunitárias, com clareza da realidade concreta, e
das condições desejadas para vivência do PPP. Sem dúvida, as condições ideais perpassam
pela capacidade de exercício das práticas pedagógicas e de gestão, de forma autêntica e
legítima, tendo como horizonte uma educação pública de qualidade.
Obviamente, o alcance das condições desejadas constitui-se em um horizonte a ser percorrido
pelas práticas pedagógicas e de gestão38, envolve um movimento de aproximação sucessivo
com a realidade que se deseja construir, acompanhando as próprias expectativas dos sujeitos
pertencentes à comunidade escolar e educativa. São pelas condições operativas das práticas
pedagógicas e de gestão que ocorrem as intervenções na realidade, isso é, a vivência concreta
dos processos participativos e das relações pedagógicas, enquanto movimento de aproximação
com o projeto de educação desejado.
Quanto à participação da comunidade nas práticas do PPP para 92,86% dos professores, a
participação da comunidade é suficiente, sendo que, para apenas 7,14%, é vista como
insuficiente. Os dados, de maneira geral, sinalizam para uma concepção positiva dos docentes
quanto à participação da comunidade. O GRAF. 1 ilustra os valores encontrados.
GRÁFICO 1 - AVALIAÇÃO DOCENTE
PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NO
PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO
DA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos
questionários docentes
38
Essas condições constituem o marco operativo do PPP relativo à prática concreta no interior da escola em
sinergia com um projeto de educação desejado.
99
Os dados discentes seguem essa mesma tendência de considerar suficiente os processos de
participação da comunidade. O GRAF. 2 expressa que 97,49% julgam ser suficiente a
participação da comunidade no PPP e apenas 2,51% dos respondentes considera ser a mesma
insuficiente.
GRÁFICO 2 - AVALIAÇÃO DISCENTE DA PARTICIPAÇÃO
DA COMUNIDADE ESCOLAR
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários
docentes
A existência de valores percentuais superiores a 90%, apontados pelos docentes e discentes,
sinalizam para a tendência de adesão comunitária, com envolvimento direto dos sujeitos nos
processos participativos, onde as decisões e vivência do PPP expressam um processo
colegiado e maior sinergia escola-comunidade.
Ao considerar a suficiência da participação comunitária é provável que tenham como
referência o PPP como processo de ação-reflexão-ação que congrega a participação
permanente dos sujeitos, reconhecendo o seu caráter inconcluso na expressão do que se vive e
pratica enquanto força propulsora dos processos autogeradores de mudança. De acordo com
Veiga (2003), a ação autogeradora assume um caráter emancipatório e edificante, quando há
envolvimento dos sujeitos na construção do PPP para melhoria da qualidade dos sistemas
públicos de educação.
Por outro lado, enquanto processo de ação-reflexão-ação os processos de mudança ao
considerar os sujeitos e sua realidade histórico-social envolve o movimento dialógico entre
processos instituídos e instituintes, de síntese de processos que podem ser apresentados de
forma contraditória e/ou divergentes pelos sujeitos.
Assim, enquanto os processos de
100
estabilidade estão voltados para a conservação, para manutenção de certas condicionantes e
práticas instituídas; os de mudanças consistem num movimento de transformação, de diálogo
com os campos instituintes.
Esse diálogo entre campos instituídos e instituintes é fundamental para a existência de uma
perspectiva dialógica dos processos de participação, assim como, para que haja aderência à
realidade histórico social dos sujeitos. O fato de mais de 90% dos docentes e discentes
considerarem a participação satisfatória pode indicar tanto a existência de um efetivo
envolvimento da comunidade, de luta pelas mudanças e transformação da escola, quanto a
ideia do alcance do limite desejado, cuja intenção é manter a estabilidade do conjunto de
relações vigentes na escola. Um dos riscos da tendência de limite desejado é romper com a
perspectiva inconclusa do PPP, que se move com as próprias expectativas históricas dos
sujeitos, podendo desdobrar em acomodação e falsa impressão de excelência das suas
práticas.
Infere-se que os processos de participação nas práticas do PPP sustentam-se nesse diálogo
entre os campos instituídos e instituintes, em que o primeiro estaria relacionado à realidade
concreta e o segundo ao desejo, do vir a ser, da busca de condições ideais (GADOTTI, 2004).
Em um PPP autogerador os processos de mudança se concretizam na participação da
comunidade, implicando em desestabilizar relações instituídas para construir novas práticas e
concepções, ou seja, um novo campo instituinte pelo engajamento dos seus sujeitos.
Entende-se que é nesse diálogo entre os campos instituídos e instituintes que situa a função
projetiva do PPP envolvendo a dinâmica histórico-social dos sujeitos, os cíclicos de
estabilidade e mudanças quanto às suas concepções e práticas (MESSINA, 2001). Assim, é
importante considerar que a percepção dos 7,14% dos docentes e os 2,51% dos discentes que
consideram a prática de participação insuficiente seja relativa à existência de lacunas nos
processos participativos da comunidade. Um ambiente gestionário democrático favorece que
essas posições diferenciadas, ainda que da minoria, sejam manifestadas e que exista a
interlocução necessária entre os referidos campos.
A provável insatisfação desses sujeitos quanto aos processos de participação da comunidade
aumenta a probabilidade de propor e se engajar em processos de mudança do PPP com maior
aderência a realidade comunitária. Ao propor ideias divergentes ao status vigente (instituído),
101
tem atuação fundamental na dinâmica cíclica de ação-reflexão-ação do PPP. Obviamente,
essas manifestações são mais producentes em ambientes democráticos, sustentada numa
perspectiva societária de gestão balizada por princípios democrático-participativos.
Por outro lado, um nível de suficiência nos processos de participação pode indicar maior
autonomia dos sujeitos nas práticas de gestão e pedagógicas do PPP, permitindo maior
compatibilização das estratégias de ação às demandas reais da comunidade escolar e
educativa. Tais pressupostos são convergentes com uma escola pública em função da
sociedade, sendo sua identidade reforçada, quando os seus resultados correspondem às
expectativas comunitárias (NEVES, 2004).
Quanto aos processos participativos propostos pelas escolas, a percepção discente é de
suficiência (96, 42%) contra 3,58% que julgam serem os mesmos insuficientes; os processos
de cooperação discente na resolução de atividades seguem a mesma tendência, sendo que
93,75% consideram suficientes e apenas 6,25% insuficientes; o incentivo e apoio da escola às
atividades de participação coletiva é conceituado por 93,75% dos alunos como suficiente e
6,25% acreditam serem insuficientes;
a existência de liberdade para expor ideias para
melhoria do trabalho escolar é apontada como satisfatória por 100% dos discentes.
Os dados relativos aos processos de participação discente, mencionados no parágrafo anterior,
estão consolidados na TAB. 1, com os seus descritores e respectivos valores percentuais.
TABELA 1
PERCEPÇÃO DISCENTE DAS PRÁTICAS PARTICIPATIVAS NA ESCOLA
DESCRITORES
PROCESSOS DE PERCEPÇÃO
DISCENTE
Suficiente
Insuficiente
Participação discente em atividades proposta
pela escola
96,42 %
3,58 %
Cooperação discente na resolução conjunta
de atividades
93,75 %
6,25 %
Incentivo e apoio da escola às atividades de
participação coletiva
93,75 %
6,25 %
Liberdade discente de expor ideias para
melhoria do trabalho escolar
100 %
0%
Fonte: Questionários aplicados aos discentes – 2012.
102
O reconhecimento por parte dos discentes da participação comunitária e a existência de
valores e/ou princípios como a liberdade de expressão, cooperação e incentivo a organização
coletiva dos sujeitos são importantes quando se propõe a substituir uma lógica de trabalho
verticalizada, fragmentária e individual por uma dinâmica processual de envolvimento e
autogestão dos sujeitos das suas práticas.
Quanto à percepção docente das práticas participativas na escola obteve-se uma suficiência
(100%) relativa ao envolvimento dos profissionais com o PPP, existência de um trabalho
docente colaborativo nas práticas pedagógicas, participação coletiva nos conselhos de classe e
apoio da direção ao trabalho docente. A TAB. 2 detalha os respectivos percentuais obtidos.
TABELA 2
PERCEPÇÃO DOCENTE DAS PRÁTICAS PARTICIPATIVAS NA ESCOLA
PROCESSOS DE PERCEPÇÃO DOCENTE
Envolvimento dos profissionais com o PPP
Prática pedagógica docente colaborativa
Participação docente nos conselhos de classe
Apoio da direção ao trabalho docente
Fonte: Questionários aplicados aos docentes – 2012.
DESCRITORES
Suficiente
Insuficiente
100 %
0
100 %
0
100 %
0
100 %
0
Os dados sinalizam com a percepção docente da existência de um compromisso dos
profissionais, com reconhecimento das estratégias coletivas e colaborativas de trabalho,
apontando para a existência de um nível de reciprocidade e envolvimento direto dos sujeitos
no PPP, com possibilidades de construção de processos participativos engajados.
Vale relembrar que a vivência da participação em seu sentido engajado, mais pleno, pressupõe
participação interativa dos sujeitos em processos de tomada de decisão coletiva, estando
consciente do seu papel, das possibilidades de apresentar ideias e opiniões em um espaço
onde o poder de decisão seja compartilhado (LUCK, 2010).
Enquanto forma de participação direta da comunidade, o engajamento demanda o
reconhecimento dos sujeitos da realidade, dos limites e dificuldades comunitárias, bem como
das possibilidades de potencializar ações coletivas transformadoras do PPP para uma maior
participação da comunidade.
103
A existência de condições democráticas de participação comunitária nas escolas maximiza a
vivência dos processos de engajamento dos seus sujeitos, pressupondo reconhecer e respeitar
a diversidade de expectativas na vivência das práticas do PPP em suas dimensões históricosociais. A percepção dos sujeitos docentes da participação em condições colaborativas aponta
para a substituição de uma lógica de trabalhos individual pela perspectiva colaborativa, com o
poder compartilhado de decisão entre os sujeitos. São condições favoráveis à emergência do
caráter autogerador, potencializando uma maior participação da comunidade na organização
das intenções educacionais do PPP em sinergia com as dimensões operativas das práticas
pedagógicas e de gestão.
Vê-se que os docentes e discentes têm uma percepção positiva dos processos de participação
comunitária como expressão do PPP. A percepção da suficiência dos processos são indícios
de uma tendência autogeradora capaz de potencializar práticas inovativas para maior
participação da comunidade, contrapondo ao caráter regulatório, limitado e fragmentário da
constituição das propostas (VEIGA, 2003).
A dimensão autogeradora pode ser vista como uma forma de superar a segmentação entre
concepção (marco teórico) e execução (marco prático), num movimento de aproximação e
construção de processos interativos em que ambos sejam indissociáveis. Enquanto proposta
formal, o PPP consiste no campo instituído, sendo uma referência para o que se vive e pratica
na escola. Por outro lado, é no espaço da prática concreta que novas demandas surgem,
dialogando com novas perspectivas instituintes que retroalimenta o próprio campo instituído.
Por outro lado, a tendência regulatória do PPP, na qual concepção e execução estão
dissociadas, produz distorções na construção e vivência da proposta. Nessa perspectiva, o PPP
constitui em mero documento para cumprimento formal da política pública (VEIGA, 2003).
Esse caráter regulatório implica em um processo de construção e vivência restrita da
comunidade, sendo sua elaboração delegada a equipes técnicas ou detentores de cargo de
direção e/ou supervisão. Esse caráter tecnocrático rompe com os processos participativos de
base comunitária, nos quais as decisões são coletivas e descentralizadas. Por outro lado, a
percepção docente e discente dos processos participativos no interior da escola parece
sinalizar com uma vivência edificante, autogerador de mudanças.
104
Quanto a frequência de participação docente em atividades pedagógicas de reflexão coletiva
(reuniões, conselhos, encontros), obtiveram-se os seguintes dados: semanal (42,85%), mensal
(57,14%), semestral (0%) e anual (0%). Os resultados apontam para uma prevalência dos
processos mensais de participação coletiva, seguidos dos encontros semanais. Observe o
GRAF. 3 a seguir:
GRÁFICO 3 - FREQUÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DOCENTE
EM ATIVIDADES PEDAGÓGICAS DE REFLEXÃO COLETIVA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes
A existência de momentos coletivos entre os docentes para discutir questões relativas à gestão
e às práticas pedagógicas em períodos mais contínuos, com menor intervalo de tempo, aponta
para existência de processo de comunicação e compartilhamento de experiências coletivas dos
sujeitos nas práticas do PPP.
Em relação à frequência de participação discente em momentos de reflexão coletiva como
trabalhos, exposições, teatro, coral, dentre outras, obtiveram-se os seguintes resultados
percentuais: semanal (57,14%), mensal (30,95%), semestral (2,38%) e anual (9,52%). O
GRAF. 4 ilustra os valores percentuais encontrados.
105
GRÁFICO 4 - FREQUÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DISCENTE EM
ATIVIDADES DE REFLEXÃO COLETIVA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes
Constata-se que enquanto para os docentes a frequência de participação em atividades de
reflexão coletiva é mensal para os discentes são prevalecentes as atividades semanais. É
provável que ao responder
a questão os docentes associaram a participação coletiva à
presença dos seus pares, ou seja, aos processos envolvendo outros docentes ( reuniões, cursos
de formação em serviço, conselhos de classe, dentre outras). Se tivessem tomado como
referência as práticas pedagógicas diárias, provavelmente, a resposta seguiria a tendência
discente.
Se as mudanças na escola dependem do que os professores fazem e pensam (FULLAN39 apud
HERNÁNDEZ et al, 2000), as possibilidades de reflexão coletiva demanda serem pensadas
nas relações pedagógicas, isso é, no fazer educativo envolvendo docentes e discentes. A
perspectiva de reflexão coletiva semanal, levantada pelos discentes, mediatiza-se nessa
relação.
Relações pedagógicas sustentadas na reflexão coletiva apoiam-se no diálogo, nas diferentes
perspectivas entre os sujeitos, podendo significar maior envolvimento e autonomia na
vivência das práticas do PPP em seu sentido autogerador. São indícios das possibilidades de
39
Refere-se a obra: FULLAN, C. The meaning of educational change. New York: Teachers
College Press, Columbia University, 1982.
106
uma prática reflexiva, em que as decisões tenham como fundamento a participação coletiva e
o poder compartilhado de decisão.
Quanto aos fatores que podem contribuir para uma maior participação discente obtiveram-se
os seguintes resultados: respeito às decisões coletivas tomadas pela comunidade escolar
(63,09%), equilíbrio da comunidade na construção das relações (7,14%), compromisso da
comunidade escolar com a participação coletiva (13,09%), solidariedade e compromisso da
comunidade escolar (14,28), outros (1,2%) e ausência de marcação (1,2%). Abaixo, o GRAF.
5 retrata os respectivos valores:
GRÁFICO 5 - FATORES PARA UMA MAIOR PARTICIPAÇÃO
DISCENTE
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes
A percepção dos sujeitos do respeito às decisões tomadas coletivamente pode ser interpretada
como um dos fundamentos da participação, dialogando com a perspectiva associa-se à
vivência democrática do grupo com prevalência dos interesses coletivos em detrimento aos
individuais. Assim, ao ser apontado pelos discentes o respeito às decisões tomadas
coletivamente como fator para maior participação da comunidade, há uma sinalização dos
sujeitos de que o significado dos processos de participação coletiva é materializado em
espaços que respeitam as decisões do grupo na vivência do PPP. O direito de participar é
fundamental, demandando condições democráticas, sendo que sua expressão consiste nas
práticas de poder de decisão compartilhado.
107
Para além do envolvimento e compromisso dos sujeitos nos processos de participação
comunitária, no sentido de contribuir com as reflexões e apresentar sugestões aos problemas
enfrentados, é imprescindível que o poder de decisão compartilhado seja praticado. É o
respeito às decisões do grupo que assegura a participação em seu sentido mais pleno,
rompendo com práticas que servem apenas para referendar decisões tomadas previamente
pela direção ou equipe técnica (LUCK, 2010).
O respeito às decisões comunitárias, em especial aos processos que envolvem a participação
dos alunos, consiste em uma condição aproximativa dos processos engajados de participação.
É uma condição para que a cidadania, conceitualmente prevista na CF/1988; LDB 9394/96),
dentre outros, realize-se na prática.
É importante que os objetivos presentes no PPP
dialoguem com essa perspectiva:
a) Garantir significado social às ações e práticas pedagógicas, no contexto escolar.
b) Elevar os padrões de qualidade da organização escolar e dos resultados de seu
trabalho educacional.
c) Envolver a família e a comunidade no processo político-pedagógico escolar.
d) Promover o sentido de corresponsabilidade e compromisso coletivo dos
participantes da escola por suas ações.
e) Estabelecer maior integração entre currículo escolar/aprendizagem dos alunos e
realidade.
f) Criar ambiente formador de cidadania e aprendizagem de habilidades
participativas. (LUCK, 2010. p.53).
Assim, o respeito às decisões coletivas fortalece a comunidade escolar e a prática do PPP,
enquanto núcleo articulador do trabalho pedagógico e dos processos de construção social e
histórica dos sujeitos, tendo como objetivo a formação discente para a vida cidadã. É uma
condição imprescindível para a vivência democrática e valorização das experiências dos
sujeitos enquanto cidadãos comunitários. (FREIRE, 2004).
Enquanto processo de construção coletiva, o PPP demanda capacidade de articular formas e
espaços de participação direta dos alunos como sujeitos de uma prática concreta. É necessário
exercitar sua construção coletiva, bem como a capacidade de aceitar as decisões conjuntas,
ainda que possam existir divergências de alguns sujeitos. Assim, as decisões coletivas passam
a ter um caráter público, prevalecendo sobre a lógica e interesses individuais de cada sujeito.
Quanto à postura da escola relativa às sugestões que são apresentadas pelos discentes e
docentes, obtiveram-se os seguintes resultados: debate das proposições, analisando as
108
possibilidades de vivência prática (54,76%); elogio à sugestão sem analisar as possibilidades
de vivência prática (27,38%); desconsideração da sugestão, afirmando a impossibilidade de
vivência prática (8,33); indiferença, sem tomar qualquer decisão (1,2%); atenção de todos à
sugestão apresentada (1,2%); ausência de marcação da questão (1,2%). O GRAF. 6 retrata os
valores:
GRÁFICO 6 - PROCEDIMENTOS DA ESCOLA QUANTO
ÀS SUGESTÕES DISCENTES
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários
discentes
A existência de um espaço de reflexão, no qual as decisões tomadas pelo grupo são postas em
prática é um indicativo de respeito às decisões tomadas coletivamente. A preocupação de
vivência prática das decisões expressa a intenção dos sujeitos de que as mesmas sejam
praticadas com referência no interesse coletivo. Aponta para a necessidade de uma coerência
entre as decisões tomadas pelo grupo e a prática concreta. Enquanto procedimento permite
que as sugestões dos alunos sejam valorizadas na melhoria das práticas do PPP.
A valorização das ideias discentes nos processos de reflexão é fundamental para a criação das
condições prévias de envolvimento desses sujeitos e o avanço da constituição de processos de
participação engajada, superando processos circunscritos aos interesses de grupos ou como
forma de referendar as políticas públicas (LUCK, 2010). Assim, tomar as sugestões discentes
como objetos de reflexão coletiva perpassa pelo reconhecimento desses sujeitos e de suas
109
possibilidades de contribuir com as práticas do PPP, por meio do exercício das vivências
comunitárias.
A existência de espaços dialógicos no interior da escola aponta para processos mais
consistentes de participação da comunidade e maiores possibilidades de existência do caráter
autogerador do PPP, potencializado pela participação dos sujeitos nas diferentes vivências
estabelecidas no ambiente escolar.
Quanto a postura discente nos trabalhos de participação coletiva, são destacados os resultados,
a saber: sentir responsável pelo debate e colaborar com as decisões tomadas (58,33%);
observar os debates e evitar dizer a opinião ao grupo (17,85%); dizer a opinião pessoal, mas
não se sentir responsável pelos trabalhos em equipe (17,85); não se sentir responsável pelo
debate e decisões tomadas (3,59%); ausência de marcação da questão (2,38%). O GRAF. 7
permite visualizar os valores percentuais encontrados.
GRÁFICO 7 - POSTURA
PARTICIPAÇÃO COLETIVA
DISCENTE
NAS
ATIVIDADES
DE
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes
Ao predominar, na questão, a postura de sentir-se responsável pelo debate, colaborando com
as decisões tomadas, constata-se que essa tendência, descrita pelos discentes, é coerente com
os processos participativos engajados (LUCK, 2010). Destaca-se que esses processos são
producentes com o caráter autogerador do PPP para maior participação da comunidade
escolar.
110
Assim, ao se sentirem responsáveis pela participação, os discente assumem o compromisso de
participar dos debates, de propor soluções, de refletir sobre novas ideias e de assumir
responsabilidades, quanto aos acordos referendados coletivamente. Reconhece ainda o
diálogo como fundamento das vivências democráticas, em que as decisões são processuais,
com prevalência do poder compartilhado.
Em relação à forma de participação docente na reflexão-ação do projeto político-pedagógico
da escola, constata-se que prevalece o envolvimento ativo nos debates como possibilidade de
reflexão e reorganização dos processos (82,14%) em detrimento do envolvimento nos debates,
evitando expor suas próprias ideias (10,71%); a participação verbal e ativa, mas sem senso de
responsabilidade pelas decisões tomadas (7,14%); e o sentimento de indiferença, quanto às
proposições apresentadas (0%). Os valores são registrados no GRAF. 8, a seguir:
GRÁFICO 8 - POSTURA DOCENTE NOS PROCESSOS DE REFLEXÃOAÇÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes
A participação dos docentes nos processos de reflexão coletiva segue a tendência
anteriormente apontada pelos discentes das intenções de vivência do PPP em seu sentido
111
autogerador, assim como, de um vínculo e compromisso dos sujeitos com dada realidade
histórico-social.
A percepção docente e discente de envolvimento dos sujeitos nos processos participativos
aponta para as inovações como uma energia rearticuladora das relações, com conexão com a
realidade histórico-social e diálogo entre os diferentes saberes. Para Veiga (2003), o
reconhecimento dos sujeitos envolvidos é a base dos processos participativos e emergência do
caráter emancipatório do PPP.
Sendo docentes e discentes sujeitos pertencentes à comunidade escolar, requer que suas ações
sejam aderentes ao PPP em seu sentido emancipatório e/ou edificante de vivência. Se a
cooperação, por exemplo, é um valor inerente aos processos participativos, requer
reciprocidade entre as pretensões e práticas docentes/discentes.
Nesse caso, pode ser evidenciada na busca de soluções conjuntas aos problemas da escola, nas
ações compartilhadas para o alcance de objetivos comuns, no desenvolvimento de atividades
coletivas em sala de aula, na própria disposição de envolvimento coletivo dos alunos e
profissionais da escola. Assim, estaria associada à vivência de experiências e poder de decisão
compartilhado, sendo uma estratégia de enfrentamento dos processos unilaterais com poder de
decisão verticalizado40.
Enquanto forma de participação direta da comunidade, o engajamento demanda o
reconhecimento dos sujeitos da realidade, dos limites e dificuldades comunitárias, bem como
das possibilidades de potencializar ações coletivas de maior participação da comunidade na
concepção e prática do PPP.
Essa percepção discente de participação da comunidade nas práticas pedagógicas e gestão do
PPP prevalece também no grupo focal docente41, tendo como principal enfoque a perspectiva
da parceria escola-comunidade.
A comunidade aqui é parceira da escola. Todas as ocasiões que a comunidade tem
que estar na escola a comunidade comparece em massa, reuniões e todas as
chamadas. Projeto dia das mães, pais, formatura de alunos, quadrilha, festa junina.
40
Conforme se abordou no Capítulo 2, a centralização de decisões e prescrição de modelos gestionários e
propostas pedagógicas são tendências muito presentes na gestão escolar tanto burocrática como gerencial.
41
Grupo focal realizado com 10 docentes da escola pesquisada em 02/10/2012.
112
Todos os projetos a comunidade está ativa dentro da escola, é só receber o chamado
que a comunidade é muito participativa (Participante 9).42
A ideia da parceria também está presente nas entrevistas realizadas com os supervisores e
diretor:
Nossa preocupação é buscar a parceria com a comunidade escolar de uma forma
bem ampla. Primeiro trazer os pais para dentro da escola, buscar os alunos, buscar a
relação entre o profissional da escola e a família desse aluno, fazer com que a escola
se torne um espaço prazeroso e de referência para a comunidade escolar
(Entrevistado 3 ).43
Vê-se que a tendência apontada pelos docentes e discentes (questionários e grupos focais) é
convergente com os achados das entrevistas realizadas com os supervisores e diretores
concernentes a participação comunitária. A ênfase principal é a parceria escola-comunidade
como possibilidade de envolvimento da comunidade e fortalecimento dos processos
democrático-participativos de gestão.
Constata-se que a parceria escola-comunidade é uma das principais estratégias de
envolvimento dos sujeitos apoiando na interlocução dos profissionais da escola com a
comunidade. Essas intenções são manifestadas tanto no diálogo e envolvimento coletivo dos
sujeitos quanto na modificação dos espaços escolares para acolhimento da comunidade44.
Por outro lado, observa-se que a ênfase dada ao sentido de participação são as atividades
extracurriculares onde a comunidade (país, vizinhança, representes de entidades, dente outros
etc.) é convidada a assistir as apresentações de culminância da programação cultural da
escola.
De acordo com Luck (2010) a presença física da comunidade nas atividades
extracurriculares, ainda que seja importante, demanda avançar para processos que tenham
como centralidade o desenvolvimento do PPP pelo compartilhamento do poder de decisão.
A parceria estaria relacionada ao envolvimento comunitário nas atividades extracurriculares
promovidas pela escola, possuindo seus limites quanto ao diálogo com os processos de
participação engajada. Há, no cenário da escola pesquisada, uma centralidade nos processos
42
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
44
A intenção de modificação dos espaços para acolhimento da comunidade são manifestados em cartazes e
faixas de acolhimento da comunidade quanto na sensibilidade, principalmente da direção da escola, de ouvir e
articular estratégias de apoio à mesma.
43
113
participativos ao nível da presença física da comunidade (pais, vizinhos, comerciantes, líder
de bairro, dentre outros) na programação sociocultural da escola.
Ainda, no sentido da parceria escola-comunidade, destacam-se como proposições do grupo de
reflexão docente: “É verdade, eleições de colegiado. Eventos quando têm em parceria com o
SESC eles vão” (Participante 4)45; “Além das atividades externas que também acontecem e
eles participam. Por exemplo, 7 de setembro eles acompanham os alunos.” (Participante 2)46.
Reafirma-se a ideia da participação comunitária em atividades extracurriculares, estando
relacionada à organização dos alunos durante o evento, assim como, contribuir com a
segurança dos discentes no decorrer da realização da programação.
Ainda que não seja qualificado o nível de envolvimento é mencionada pelos sujeitos à
participação da comunidade nas eleições do colegiado47. Situou-se, no Capítulo 2, que o
colegiado escolar consiste numa participação representativa dos interesses comunitários,
evitando que suas ações sejam acoplados pela lógica de referendo das políticas públicas
estaduais. Alertou-se para a importância e, ao mesmo tempo, para os limites dessa forma de
participação e da necessidade de avançar para processos diretos que contemplem o caráter
autogerador do PPP nas dimensões societárias de gestão.
Em relação ao grupo focal discente48 aparece a participação da comunidade no colegiado, nas
festas, formaturas e quadrilhas da escola: “Às vezes a comunidade participa. Os vizinhos
vieram na quadrilha da escola.” (Participante 15)49; “na quadrilha nós dançamos, os pais e
professores estavam presentes.” (Participante 12)50. Assim, a perspectiva levantada pelos
discentes converge para a participação da comunidade nas atividades extracurriculares,
associando participação à presença física dos sujeitos.
A ideia de participação da comunidade no PPP da escola confirma as evidências da primeira
etapa51 na qual os participantes afirmaram que a comunidade participa da gestão do PPP.
Pelos dados dos grupos focais e entrevistas, de natureza qualitativa, evidencia-se contudo que
45
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
47
De acordo com o Art. 6º da Resolução SEE/MG n.º 2034 os membros do colegiado escolar são escolhidos
pelos pares da comunidade, mediante eleição, para exercer mandato de dois anos.
48
Grupo focal realizado com 11 discentes da escola pesquisada em 04/10/2012.
49
Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012.
50
Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012.
51
Relativa à aplicação de questionários aos 28 docentes e 84 discentes participantes da pesquisa.
46
114
essa participação é guiada pela presença física da comunidade na escola. Ainda que seja
mencionada a participação representativa (colegiado escolar) e participação direta dos pais em
reuniões, a concepção prevalecente é a presença física da comunidade em atividades
extracurriculares como possibilidade de maior sinergia escola-comunidade nas práticas do
PPP.
Por outro lado, a direção da escola sinaliza com as possibilidades de aprofundamento dos
processos participativos ao afirmar que a escola é receptiva e há liberdade dos pais de
apresentar sugestões para melhoria do trabalho: “a comunidade tem muita tranquilidade de vir
a escola, de colocar os problemas, de dar sugestões na gestão da escola, de conversar com os
professores.” (Entrevistado 3).52
Ainda, em relação à participação dos pais, a supervisão da escola expressa: “A participação é
muito boa, os pais são presentes [...] estão dentro da escola, ajudando, participam do clube de
mães fazendo crochê, costura na escola. Eles estão sempre aqui acompanhando os filhos no
passeio, estão sempre ajudando na escola com os trabalhos comunitários que realizamos.”
(Entrevistado 1).53
Mesmo existindo espaço para os pais, enquanto parte da comunidade escolar para apresentar
sugestões e/ou participar das atividades socioculturais, percebe-se que persiste a ideia da
participação associada ao envolvimento na culminância da programação sociocultural, sem
papel proativo nas etapas de concepção e planejamento das ações e projetos articulados com o
PPP, principalmente nas questões relativas à prática pedagógica.
Por outro lado, nota-se que a escola procura estimular a participação da comunidade em
atividades do seu interesse, principalmente os trabalhos manuais que valorizam habilidades
artísticas e a troca de experiências entre os seus membros. Essas atividades acontecem
principalmente nos finais de semana, corroborando com a perspectiva apontada no grupo
focal docente de abertura da escola para participação da comunidade.
Os pais e os demais segmentos da escola participam ativamente de todos os
movimentos que acontecem, sejam à noite ou diurno e eu me emociono muito [...] é
um escola de periferia em que a gente conta com a participação, eu venho de outras
52
53
Diretora da escola pesquisa participante da entrevista em 30/10/2012.
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
115
escolas também em que a participação dos pais era muito pequena e na [...] a
participação é muito grande (Entrevistado 4).
Reitera-se a ideia de que a participação da comunidade é sustentada pelo envolvimento nas
atividades extracurriculares (programação sociocultural), situando-se ao nível da presença
física. Isso expressa lacunas nos processos participativos do PPP, nas etapas de concepção e
planejamento das atividades, principalmente naquelas de caráter pedagógico. Essa
participação estaria mais em nível de envolvimento da comunidade em projetos e ações
previamente definidas pelos profissionais da escola, do que em um processo que valorize o
caráter autogerador dos sujeitos na construção das propostas.
Há lacunas nos processos de construção das propostas em sua forma colegiada, nas quais
sejam acolhidas e debatidas as sugestões com a participação da comunidade, apoiando-se no
planejamento participativo das ações, no modo como se concebem as práticas e vivências da
realidade.
Assim,
a
perspectiva
dos
processos
participativos
engajados,
com
compartilhamento do poder e corresponsabilidade, não se apresenta de forma clara nos grupos
focais e nas entrevistas, principalmente nos aspectos relativos às práticas pedagógicas.
Quando questionada em relação à participação da comunidade no planejamento das práticas
pedagógicas a supervisora da escola afirma que diretamente não, descrevendo:
A gente faz as reuniões de módulo II e a comunidade participa quanto se faz
necessário. Nos já tivemos assim a montagem de oficinas na escola, oficinas de
reciclagem, oficinas de meio ambiente, nas quais a família vem mesmo para mostrar
que é capaz de participar. Trazem os filhos, igual já fizemos campanha do meio
ambiente, oficinas de reciclagem, eles trazem material para mostrar, para ajudar a
fazer com os filhos. Ajuda quando acontecem as oficinas, acompanhando os filhos e
de acordo com o evento fica às vezes o dia todo na escola (Entrevistado 1).54
A ausência de participação da comunidade no planejamento das atividades curriculares e
extracurriculares reforça a perspectiva de segmentação entre concepção e execução,
corroborando com a perspectiva do convite à participação da comunidade enquanto
expectadora da culminância da programação sociocultural da escola.
Apoiando em Thuler (2001), vê-se que esse é um dos desafios das práticas pedagógicas e de
gestão para maior sinergia da escola com a sua comunidade. A modificação na forma como é
programada e concebida a participação da comunidade nas atividades curriculares e
54
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
116
extracurriculares passa a ser fator decisivo para sua maior sinergia com o PPP. É fundamental
existir um processo sistemático e intencional de mudança que sustente a participação da
comunidade na concepção, planejamento e execução das ações.
Por outro lado, a ideia de parceria implica em certo grau de sinergia e mutualidade entre os
envolvidos, tanto na tomada de decisões, quanto no planejamento das atividades e/ou ações
que serão realizadas, demandando estratégias colaborativas para o alcance de objetivos
comuns. Sustentando em Gohn (2004; 2007), vê-se que essas parcerias consistem numa
ampliação das relações da escola e do próprio sentido de comunidade, do seu limite de ação,
dialogando com instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa, podendo ser
apontada como uma das principais estratégias inovativas das práticas gestão do PPP.
São essas experiências em construção, especialmente com outras instituições públicas e da
sociedade civil organizada, um dos fatores de maior proeminência da relação escolacomunidade, possibilitando aos alunos vivenciarem atividades curriculares e extracurriculares
ampliadas. Esse diálogo com o universo da comunidade educativa, enquanto fator de maior
participação da comunidade estaria relacionado às sinergias com o SESC, com os Correios,
com a Universidade Federal do Vales do Mucuri e Jequitinhonha – UFVJM,
promotoria, dentre outras. 55
55
SESC – Serviço Social do Comércio – Unidade Teófilo Otoni.
com a
117
Unidade 2: Os profissionais da escola, processos decisórios e o PPP
Quanto à participação dos profissionais a ênfase dada foi ao envolvimento coletivo, com
divisão de funções no interior da escola e corresponsabilidade dos sujeitos na realização de
um projeto comum: “Aqui todo mundo pega junto quando tem qualquer projeto na escola. Há
uma integração muito grande, um ajuda o outro. Acho que é por isso que as coisas aqui na
escola andam bem. Divide as tarefas e todo mundo faz satisfeito.” (Participante 6)56
O desenvolvimento de ações orientadas por um projeto sinaliza com o envolvimento dos
profissionais em ações intencionais e sistemáticas, orientadas pelo alcance de objetivos
pedagógicos e institucionais comuns a escola. A predisposição profissional em trilhar
objetivos comuns, aderentes a missão escolar, pode converter-se num processo dialógico que
valoriza os sujeitos e sua comunidade, podendo produzir mudanças autogeradoras do PPP.
Se orientada por uma perspectiva de participação engajada, onde efetivamente os sujeitos
participam da construção e decisão das propostas, o compartilhamento das funções e
responsabilidades pode ser entendido com uma dimensão societária de gestão democráticoparticipativa.
Quanto aos supervisores, enquanto profissionais da escola, seu envolvimento relaciona-se ao
acompanhamento e apoio às questões pedagógicas da escola: “orientar, acompanhar, subsidiar
o professor em toda parte pedagógica da escola.” (Entrevistado 4)57 Já, para o diretor, o
envolvimento com o PPP perpassa por uma complexidade de funções, dialogando com
questões pedagógicas e administrativas “durante o dia você é administrador pedagógico,
administrador financeiro e administrador da área dos recursos humanos, administra a
secretaria, a parte de pessoal da escola, é uma rotina bem complexa, em que, a todo tempo,
você exerce em diferentes tarefas” (Entrevistado 3).58
Esse envolvimento do diretor e dos supervisores é fundamental para subsidiar as ações que
são desenvolvidas na escola pelos demais profissionais na vivência das práticas e concretude
das intencionalidades do PPP, tendo como horizonte a melhoria da qualidade do ensino.
56
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012
58
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012
57
118
Exige-se desses sujeitos certo nível de liderança e sensibilidade em ouvir o grupo numa
perspectiva de valorização das dimensões societárias de gestão do PPP.
Vale ressaltar, por outro lado, que há uma linha muito tênue entre a perspectiva tecnicista e o
projeto democrático-participativo, quando se analisa a liderança exercida por esses
profissionais na trajetória escolar brasileira. Ainda que as escolas intitulem-se como
democráticas, a figura do supervisor, por exemplo, durante anos, esteve associada ao
profissional detentor de conhecimentos especializados capaz de determinar metodologias e
práticas adequadas a professores e alunos. Assim, como a do diretor, relacionada ao poder de
decisão, determinando ações a serem cumpridas pelos demais profissionais.
Esse modelo tecnicista, baseado em um processo unilateral de decisão, produziu lacunas no
conjunto das relações profissionais, especialmente no diálogo entre professores e alunos,
configurando o que Freire (2004) denominou de Educação Bancária. Nessa perspectiva,
diretor e supervisores, seriam os responsáveis diretos pela constituição do PPP que é
previamente elaborado e difundido aos demais profissionais, assumindo uma lógica inovativa
regulatória.
Na perspectiva democrático-participativa o exercício da liderança por esses sujeitos pode
contribuir com a vivência das participações colegiadas e descentralização do poder de
decisão. É uma tendência edificante, autogeradora, onde supervisores e diretor são
responsáveis pelo debate e estímulo ao pensamento reflexivo do grupo, na construção e
vivência de uma proposta fundamentada no poder de decisão compartilhado.
Assim, enquanto a primeira tendência estaria para os processos de inovação denominados de
regulatórios ou técnicos; a segunda estaria para as condições edificantes ou emancipatórios,
valorizando as vivências societárias dos sujeitos, assim como, a produção de mudanças
aderentes às suas expectativas histórico-sociais (VEIGA, 2003).
A forma como a entrevistada 1 expressa o exercício da sua atividade profissional reforça a
intenção desses sujeitos de filiar-se com a primeira tendência: “o trabalho como supervisora
[...] é um trabalho participativo, com participação de todos os professores, da diretora. A
119
diretora é uma pessoa que dá toda assistência, são poucas as dificuldades diante da
participação de todos (Entrevistado 1).59
Há uma interlocução direta entre os profissionais, sustentada na ideia do envolvimento dos
sujeitos nos processos de organização institucional e pedagógica: “As decisões são coletivas,
a gente está sempre apoiando, ouvindo e, através do diálogo dessas reuniões, a gente busca
esse equilíbrio de preparar a cada dia mais, de fazer uma escola de excelência ou tentar errar
menos.” (Entrevistado 3)60; “A participação é coletiva, as decisões são tomadas de forma
democrática, priorizando o que é mais importante para a escola e com isso eu posso observar
que há uma participação de todos no PPP” (Entrevistada 1).61
Infere-se ainda, que os profissionais da escola participam do PPP, existindo um
compartilhamento das ações para o alcance de objetivos comuns: “A participação dos
profissionais é muito boa. Ao final de cada projeto, cada avaliação, a gente pode dizer que é
uma equipe muito boa e muito responsável” (Entrevistado 3)62. Ainda, segundo a mesma, há
uma atuação profissional para além do nível das obrigações (assiduidade, pontualidade,
planejamento, dentre outros) cujo nível de dedicação e motivação permite qualificar o grupo
como muito bom.
Percebe-se que esse envolvimento dos profissionais contribui para que a escola desenvolva
uma programação sociocultural diversificada e amplie o seu espaço de interlocução com
segmentos da comunidade educativa, assim como, articule estratégias de apoio aos escolares e
seus familiares de acesso a direitos sociais fundamentais63.
Esse envolvimento dos profissionais com a programação sociocultural da escola tem
ampliando as suas sinergias com a comunidade educativa oportunizando aos alunos
vivenciarem atividades que sejam referência para a vida cidadã.
Domingo passado a gente teve a rua de lazer. Tínhamos feito a proposta no
domingo, porque no sábado havia o passeio com o grupo de adolescente no SESC.
Então imagina: segunda, terça, quarta, quinta sexta, sábado e domingo, com
59
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
61
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
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Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
63
Situamos no Capítulo 4 o papel de apoio das escolas às famílias cadastradas no Programa Habitacional do
Município, com destinação de residências do Conjunto Habitacional Paulo Freire.
60
120
atividades. Então, pensei como eu vou pedir para esse pessoal voltar aqui no
domingo. Eu não vou ter cara e nem coragem. Então, procurei o grupo de jovens, o
grupo de coral, as catequistas e disse: Olha vai ter a rua de lazer, vamos precisar da
ajuda de vocês. Mas, pensei assim, vou passar um bilhete na escola, vai que alguém
deseja vir. Para minha supressa tinha muitos funcionários da escola no domingo, eu
olhava para cada um e não sabia o que dizer, só fiquei muito feliz de saber que a
gente tem uma equipe muito boa e que tá entendendo a proposta [...]” (Entrevistado
3).64
Esse envolvimento dos profissionais é um dos aspectos que favorece a emergência de
processos propositivos de mudanças do PPP em suas dimensões autogeradoras. É necessário,
no entanto, que sua participação traduza-se em aprofundamento do projeto democráticoparticipativo, com o envolvimento direto da comunidade nas práticas do PPP, valorizando as
dimensões societárias em sua constituição.
Quanto às relações estabelecidas entre o diretor (a) e os supervisores prevalece as dimensões
societárias, orientando-se pelo diálogo: “a direção dá todo o apoio para o supervisor trabalhar,
caminha junto com a supervisão, então deixa que o trabalho seja conjunto. É possível
dialogar, tomar decisões juntas, fazer o planejamento junto com a direção” (Entrevistado 4).65
Essa sinergia entre direção e supervisão pressupõe a coexistência dos processos de concepção
e execução das respectivas atribuições funcionais, possibilitando aos sujeitos uma maior
coerência na realização das ações.
Unidade 3: Concepção dos sujeitos da sua vivência escolar
A vivência dos sujeitos na escola é expressa pelos sentimentos de alegria, prazer, amor e
acolhimento, apontando para a existência de uma sinergia positiva entre a escola e os alunos
que contribui para o fortalecimento dos processos participativos. São favoráveis ao
reconhecimento da escola como espaço de convivência coletiva das múltiplas relações
(educacional, social, política, cultural, dentre outras), existindo um significado concreto das
práticas do PPP para os alunos.
Em termos percentuais os valores são expressos da seguinte forma: 76,19 % concebem a
escola como um espaço de alegria e prazer; para 1,56%, de decepção; e para 22,61%, um
local de amor e acolhimento. A prevalência desses sentimentos expressa uma valorização, por
64
65
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012.
121
parte desses sujeitos, do que se vive e prática na escola enquanto espaço de convivência
pedagógica e sociocultural. O GRAF. 9 ilustra os valores encontrados:
GRÁFICO 9 - SENTIMENTO DISCENTE RELATIVO À ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes
Os achados quantitativos sinalizam com um vínculo dos discentes com a escola, sendo uma
condição favorável para a construção de processos de participação com maior efetividade
discente. São sentimentos que permitem uma maior aderência da comunidade escolar e
vivência do PPP como instrumento de ação-reflexão-ação na produção de processos
inovativos.
Por outro lado, o aprofundamento qualitativo expressa condições endógenas dos sujeitos que
podem ser mobilizadas na produção de práticas inovativas, principalmente nas atividades
curriculares e extracurriculares: “a escola ensina para a gente muitas coisas e eu aprendo.”
(Participante 18)66; “[...] a gente aprende e tem amigos, nos ensina coisas legais, professores
e diretora legal” (Participante 12).67 São indícios da potencialização e reconhecimento
histórico-social dos discentes como sujeitos comunitários, de envolvimento direto no conjunto
das práticas do PPP.
Há por parte desses sujeitos uma representação positiva da escola e dos seus profissionais,
vista como espaço de vivência e aprendizagem cognitiva e social. Os sentimentos expressos
66
67
Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012.
Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012.
122
de alegria e prazer favorecem os processos participativos e envolvimento nas atividades
curriculares e extracurriculares, sendo favoráveis à concretude de um projeto de formação
cidadã68.
A participação dos sujeitos discentes nas práticas pedagógicas envolve um planejamento com
definição pela equipe pedagógica da programação diária. “A gente chega e vai para a sala
onde faz atividades de matemática e português, depois o recreio, aí volta para a sala e às vezes
tem aula de computação, vídeos, Educação Física” (Participante 15).69; “A gente toda segunda
e sexta feira tem auditório70, tia dá os avisos dela, depois a gente vai para sala fazer os
deveres” (Participante 12).71
As falas remetem a uma compreensão discente da sistemática de funcionamento da escola,
dos seus espaços e possibilidades efetivas de trabalho. Essa compreensão é facilitada pela
existência de uma organização sistemática das rotinas pela equipe pedagógica. Porém, nas
descrições não se percebe o grau de participação e efetivo envolvimento dos sujeitos nas
práticas pedagógicas e processos de gestão.
Um dos aspectos que orienta as práticas pedagógicas e de gestão da escola é o acolhimento de
todos os alunos independente de desvio social72 ou condutas típicas73, procurando assegurar a
permanência no percurso escolar. O trabalho é baseado no atendimento às necessidades
individuais e coletivas, com a criação de serviços de atendimento especializados e tendo como
fundamento uma pedagogia diferenciada.
Vamos até a criança vê uma maneira de tá envolvendo ela com o aprendizado, de
maneira diferenciada para que ela possa aprender, porque nem todos são iguais. [...]
tem trabalho diferenciado na sala de aula [...] eu costumo até pegar uma criança para
aprender e colocar junto, agrupar para ver se ele desenvolve. De repente ele não da
conta de pegar o que eu estou passando mas, na hora que eu coloco junto, consegue
(Participante 7).
68
A formação dos alunos para uma formação cidadã é um dos aspectos com maior ênfase no PPP da escola.
Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012.
70
O auditório é um grande salão com palco, utilizado na escola para avisos gerais e orientações dos discentes da
programação e rotina da escola. É ainda, utilizado na culminância dos projetos pedagógicas da escola que
envolve apresentações, no desenvolvimento da programação artística da escola (teatro, dança, etc). Também as
reuniões com membros da comunidade (escolar e educativa) são realizadas nesse espaço. .
71
Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012.
72
Refere-se aos alunos com problemas no comportamento social, com dificuldades de assimilar regras de
convivência, sendo indisciplinados, agressivos.
73
Alunos que apresentam algum tipo de necessidade especial e que requer serviço especializado (professor de
apoio, sala de recursos, dentre outros). Há, na escola pesquisada, alguns desses serviços como: professor de
apoio, sala de recurso e intérprete de libras.
69
123
O trabalho coletivo baseia-se nas experiências dos sujeitos coletivos, tendo como estratégias
as atividades de apresentação, os trabalhos em grupo, as exposições e momentos de reflexão
coletivos. Em algumas salas de aula, é afixado o plano de trabalho 74, envolvendo professor
(es) e aluno(s). Quanto à individualidade, é assegurada por trabalhos compatíveis com as
necessidades individuais, pelo reconhecimento das diferenças e limites individuais dos alunos.
A perspectiva de trabalho inclusivo75 favorece valorizar os sujeitos em sua diversidade e criar
um ambiente social de diálogo com as dimensões sociais, estando para além do alcance de
determinadas habilidades necessárias à aquisição de competências cognitivas. As dimensões
sociais dos discentes ao serem valorizadas chama atenção para as dimensões humanas da vida
cidadã.
Vê-se que a escola procura estabelecer estratégias de trabalho coletivo na intenção de
contribuir com a aprendizagem dos alunos. Esses processos de convivência coletiva, quando
fortalecidos no ambiente escolar, podem contribuir tanto para a aprendizagem dos alunos,
quanto com sua maior participação na escola.
Em relação às práticas pedagógicas, relativas aos processos de ensino-aprendizagem, as
reflexões no grupo discente apontam para uma centralidade na abordagem dos conteúdos
curriculares, dando ênfase ao pensamento lógico-racional: “português e matemática todos os
dias” (Participante 16)76. A ênfase é a aprendizagem de conhecimentos lógico-racionais em
detrimento a outros conhecimentos e dimensões da vida humana.77
Partindo do pressuposto de que o PPP da escola sustenta a perspectiva de inclusão, a ênfase
dada pela abordagem curricular aos processos de inteligência lógico-racional consiste numa
vivência incoerente com as intenções da proposta. Em termos de inclusão, a perspectiva de
valorização das inteligências múltiplas dos sujeitos apresenta-se como mais adequada. Assim,
74
Combinado de regras, envolvendo professor e aluno, em que são definidos direitos e deveres dos sujeitos.
A escola recebe alunos com necessidades especiais e com desvios de comportamentos sociais. Para o alunos
com necessidades educacionais especiais a escola mantém serviços especializados: professor de apoio e sala de
recursos. Quanto aos alunos com desvios de comportamento sociais, um dos principais suportes do trabalho é o
acolhimento social dos alunos e o estímulo às experiências coletivas.
76
Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012.
77
Uma dos suporte à abordagem curricular inclusiva é a teoria das inteligências múltiplas fundamentada por
Howard Gardner (1985).
75
124
há um descompasso entre a perspectiva apontada pelos docentes e a abordagem dos conteúdos
curriculares em sua prática efetiva.
Apoiando na teoria da complexidade de Morin (2010), infere-se que uma estrutura curricular
fragmentada em disciplinas e que prioriza a inteligência lógico-racional é insuficiente para a
percepção das múltiplas relações que envolvem a escola-comunidade em suas dimensões
sociais, culturais, afetivas, histórico e sociais.
A fragmentação do currículo em disciplinas é típica dos modelos burocrático e gerencial que
visam a estabelecer ênfases específicas78 e formas de controle especializado. Esse é um dos
desafios a ser enfrentado pela escola, especialmente na compatibilização dos pressupostos de
inclusão com as vivências curriculares do PPP, tendo, como pressuposto, o currículo como
instrumento para concretude da proposta (MURTA, 2004).
Os discentes consideram-se participativos e envolvidos com o PPP da escola. A percepção do
grupo é de que o envolvimento nas atividades curriculares, especialmente naquelas
desenvolvidas em sala de aula, assim como extracurriculares, consiste na expressão da
participação em sua forma plena. Nesse caso, a participação traduz-se no envolvimento nas
atividades que são propostas pela escola. “A gente participa falando sobre a matéria,
conversando sobre a matéria que a gente não sabe. Aí a gente pergunta” (Participante 20).79
No grupo de reflexão discente, não se identifica a participação no sentido de
compartilhamento do poder de decisão dos sujeitos, nem maior autonomia na definição de
aspectos relativos às questões pedagógicas. Assim, o sentido de participar consiste no
envolvimento estabelecido entre docentes e discentes na realização das atividades curriculares
e extracurriculares que são definidas pela equipe pedagógica.
A participação nas atividades curriculares é vista também como uma forma dos discentes
colaborarem com os colegas e professores em sala de aula: “As atividades em grupo são
importantes, porque às vezes o colega tem uma dúvida e a gente pode ajudar” (Participante
78
Um dos aspectos acordados pelo Brasil no Consenso de Washington foi a prioridade aos anos iniciais do
ensino fundamental com ênfase nos processos de leitura e escrita. O controle especializado é feito pela
submissão dos alunos a processos de avaliação externa do nível de proficiência.
79
Discente participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 04/10/2012.
125
21).80; “Acho as atividades coletivas muito legais. Quando o meu colega tem dificuldade eu
ajudo ele, quando eu tenho dificuldade ele me ajuda. É muito legal” (Participantes 13).81
O sentido de participação estaria relacionado ao senso de colaboração com os demais colegas
na resolução das atividades propostas. A percepção dos processos participativos em sua forma
colaborativa é importante, mas exige-se avançar na constituição de processos mútuos
orientados por objetivos comuns, nos quais o poder coletivo de decisão seja exercitado.
Quanto aos docentes, nota-se que reconhecem a condição do aluno como sujeito dos
processos participativos e sua capacidade de contribuir com as práticas pedagógicas e de
gestão do PPP.
Hoje em dia não pode ser mais aquele professor padrão. Como se diz: fala, fala, fala!
Você fala, mas tem que escutar o seu aluno. Hoje mudou, o aluno tem que
participar. Vamos montar um projeto, vamos fazer uma maquete, o alunado, todo
mundo junto ali. Eles gostam de dar opinião. Às vezes nós, professores, temos uma
opinião, mas o aluno tem uma opinião até melhor do que a gente. A gente aprende
com eles. A gente monta os projetos e eles gostam (Participante 4).82
Situou-se, no Capítulo 2, que a valorização dos discentes como sujeito das práticas consiste
numa forma de estimulo aos processos participativos e à vivência do PPP em seu caráter
autogerador, enquanto condição de um projeto democrático-participativo de escola. Essa
condição autogeradora do PPP demanda dos sujeitos exercitarem a autonomia e o caráter
propositor de mudanças no ambiente de participação coletiva.
Os discentes envolvem-se e participam das atividades curriculares e extracurriculares da
escola, especialmente aquelas de caráter mais amplo, abertas à participação da comunidade
escolar e educativa. Porém inexiste uma consciência efetiva dos mesmos, quanto às suas
possibilidades concretas de contribuir nas decisões coletivas e planejamento das estratégias
pedagógicas e de gestão do PPP.
A construção das atividades e projetos não considera a condição fundamental dos discentes
como sujeitos propositores de processos de mudanças das práticas do PPP. A expressão “a
80
Discente participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 04/10/2012.
Discente participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 04/10/2012.
82
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
81
126
gente monta os projetos e eles gostam” (Participante 4).83 Aponta para um processo que
segmenta concepção e execução, com planejamento centralizado na equipe pedagógica.
Esse viés reproduz no interior da escola os processos verticalizados de inovações
(HÉRNANDEZ et al, 2000), das propostas previamente elaboradas pelos docentes e
apresentadas aos alunos, separando concepção e execução como processos distintos. Assim,
desconsidera o caráter propositor dos discentes na reflexão e delineamento da concepção das
propostas, desagregando concepção e execução, teoria e prática do PPP.
O caráter autogerador implica no reconhecimento do aluno como sujeito nas etapas de
planejamento e execução da proposta. Mesmo que esse processo de construção envolva os
demais profissionais da escola, a ausência de participação direta dos discentes cria fissuras na
vivência do PPP em suas dimensões societárias de gestão democrático-participativa.
A existência de lacunas nos processos de participação discente, especialmente nas etapas de
planejamento, explica o fato dos discentes afirmarem que apresentam sugestões de melhoria
do trabalho escolar, mas não sabem relatar nenhuma proposição apresentada pelos mesmos
para as práticas pedagógicas e/ou de gestão do PPP.
A existência dessas condições, que reduz a autonomia dos sujeitos e o seu caráter propositivo
de mudança, requer uma revisão no interior da escola. É um desafio a ser enfrentado na
intenção de construir processos alicerçados em uma perspectiva de formação humana
integrada: “A ideia de formação integrada sugere superar o ser humano dividido
historicamente pela divisão social do trabalho entre a ação de executar e a ação de pensar,
dirigir ou planejar” (BRASIL, 2012, p.59).
Quanto aos processos de tomada de decisão na escola, os docentes apontam para as intenções
colegiadas de construção dos processos decisórios com participação direta dos sujeitos.
Diante das dificuldades de reunir os profissionais da escola, especialmente face aos limites
impostos por uma jornada dupla de trabalho,84 uma das soluções encontradas pela escola para
83
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
A grande maioria dos professores trabalham em mais de uma escola, exercendo diariamente a dupla jornada
de trabalho em duas escolas.
84
127
aperfeiçoamento dos processos de comunicação interna é a veiculação diária de um caderno
com informações aos profissionais.
Tudo que acontece aqui na escola é passado ou através de reunião ou através de um
caderninho. Muitas vezes não há tempo propício para fazer uma reunião, mas tem
como passar um aviso. Aí é colocado o aviso no caderno, todo mundo lê assina
(Participante 9).85
Essa forma de comunicação interna, de utilização de um caderno, no qual são veiculadas
informações gerais da escola aos profissionais, consiste num processo importante de
retroalimentação dos sujeitos com a realidade dinâmica vivenciada no interior da escola. É
uma forma de enfrentar os desafios de tempo dos profissionais pela vivência coletiva das
práticas do PPP.
Ainda que não possibilite a reflexão coletiva dos sujeitos, o fato de constituir-se em um
processo sistemático e intencional de comunicação no interior da escola, numa forma de
enfrentamento aos desafios da comunicação interna, esse caderno, pode ser visto como uma
estratégia inovadora, consistindo numa alternativa de apoio ao trabalho escolar.
No entanto, a veiculação das informações em um caderno, enquanto estratégia de apoio aos
processos de comunicação na escola possui os seus limites e não pode ser vista como
processo de substituição da participação direta dos sujeitos. O caráter autogerador das
mudanças do PPP depende do fortalecimento da participação coletiva direta, da reflexão das
práticas e do compartilhamento do poder de decisão para a formação de uma consciência dos
sujeitos, quanto aos limites e possibilidades das práticas pedagógicas e de gestão.
Por outro lado, as reflexões docentes apontam para a existência de um diálogo no interior da
escola nas atividades que envolvem a participação coletiva dos sujeitos: “Há bastante diálogo
entre os profissionais da escola. Em todos os setores: secretaria, direção, supervisão. Em
qualquer setor um trabalha pelo outro mesmo” (Participante 2)86. A ideia é da existência de
uma sinergia entre os profissionais da escola nas ações de envolvimento coletivo, estimulada
por práticas pedagógicas e de gestão que favorecem a liberdade de expressão dos sujeitos.
85
86
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
128
A liberdade de expressão estaria apoiada na existência de condições democráticas que
favorecem o debate e a expressão das diferentes posições dos sujeitos em ambientes de
participação coletiva. Essas condições de diálogo são fundamentais para a manifestação das
diferentes posições, enquanto motor dos processos de mudança e emergência de inovações,
bem como para a produção de novas sínteses coletivas e a vivência de ciclos de estabilização
fundados na coesão e visão integral das práticas do PPP.
Essa perspectiva do diálogo entre os profissionais estaria apoiada no compromisso, enquanto
valor que orienta os processos de participação coletiva dos sujeitos (LUCK, 2010). “Além do
diálogo existe uma sintonia no trabalho. Todo mundo abraça a causa. Há um grande
compromisso com a realização do projeto da escola” (Participante 2).87
Partindo do pressuposto de que um projeto de escola pressupõe instituir algo novo
(GADOTTI, 2004), o compromisso seria um dos valores que orientam o PPP da escola, para
que, de forma intencional e sistemática, sejam alcançados os objetivos pretendidos pela
instituição em sua prática pedagógica e de gestão.
Esse compromisso dos profissionais estaria em diálogo com a perspectiva de trabalho
colaborativo, cuja intenção é alcançar objetivos comuns pretendidos pelos sujeitos coletivos
nas práticas do PPP. A existência de processos articulados pelo compromisso de trabalho
colaborativo dos profissionais estaria em reciprocidade com as demandas de expressão
autogeradora do PPP, das condições societárias necessárias à maior participação dos
profissionais e da comunidade em geral.
Nesse sentido, o trabalho colaborativo apresenta-se como uma estratégia inovativa de
enfrentamento do viés gestionário tradicional88 enquanto possibilidade para a vivência
democrático-participativa das dimensões societárias, dos processos dialógicos apoiados no
compromisso dos sujeitos enquanto possibilidade de vivência processual do PPP.
Além de favorecer a articulação dos diferentes segmentos escolares em torno de um projeto
comum, esse diálogo entre os profissionais contribui para o reconhecimento do aluno como
87
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
Situamos no capítulo 2 que o modelo de gestão tradicional é marcado pela fragmentação e organização
burocrática das ações, prevalecendo o baixo nível de autonomia dos profissionais.
88
129
sujeito social em sua diversidade, permitindo constituir estratégia de acolhimento mais
compatível com a sua situação de vulnerabilidade social.89
[...] são meninos que necessitam de um acolhimento maior da comunidade escolar. É
uma clientela diferenciada [...], são crianças que têm dificuldade de moradia, de
alimentação, de condução de ir e vir, relacionamento, afeto. São crianças filhos de
pais que estão atrás de grades, outros são criados por avós, outras são filhos de pais
que mexem com certas coisas aí erradas [...] (Participante 9).90
Esse acolhimento discente consiste numa predisposição dos profissionais em ouvir e procurar
compreender os alunos, de estabelecer estratégias de orientação e aconselhamento quanto aos
problemas sociais que são enfrentados pela comunidade. É visto ainda como um processo de
relação afetiva entre professores e alunos: “uma palavra amiga, um gesto, um carinho [...]”
(Participante 6).91
Essa sensibilidade dos profissionais em acolher os alunos em situação de vulnerabilidade
social é acrescida do esforço de buscar instituições públicas e da sociedade civil que possam
apoiar o processo de escolarização discente. Essas instituições, pertencentes ao universo da
chamada comunidade educativa92, passam a se mobilizar e apoiar o trabalho desenvolvido
pela escola.
Quanto ao diálogo dos professores com os pais, constata-se que é centrado principalmente nas
questões relativas às dificuldades de aprendizagem dos filhos ou nos problemas relacionados
ao comportamento do(s) mesmo(s): “Se tiver algum aluno com dificuldade, eu procuro
chamar o pai, converso com o pai, com a mãe, com quem tiver acompanhando” (Participante
3).93
89
Um dos aspectos enfatizados no grupo focal docente são as condições de vulnerabilidade social das crianças
que são criadas pelos avós e/ou apenas pela mãe. Assim comum a violência imposta pelo tráfico de drogas na
comunidade em que vivem. Reiteramos que, de acordo com o IDF (Índice de Desenvolvimento das Famílias), a
presença de idosos, crianças e gestantes aumenta o volume de recursos adicionais que uma família requer para
satisfazer suas necessidades básicas, sendo um indicador de vulnerabilidade social. São 300 famílias atendidas
pela escola cadastradas em um programa de renda mínima (Bolsa-família).
90
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
91
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
92
Dentre as instituição que apoiam o trabalho da escola, são mencionados pelos docentes o Centro de Referência
de Assistência Social (CRAS), Serviço Social do Comércio (SESC) e a Polícia Militar de Minas Gerais Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (PROERD).
93
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
130
A relação entre professores e pais ao centrar em questões relativas à aprendizagem e
comportamento dos alunos segue a tendência que tradicionalmente tem orientado as escolas,
sendo sua presença restrita à descrição de notas e comportamento dos filhos aos pais pelos
professores. Assim, pouco se exploram os pais, enquanto sujeitos pertencentes ao universo
comunitário, e as suas possibilidades de contribuir com a aproximação da escola-comunidade
nas práticas do PPP.
Por essa lógica, são poucos os avanços na constituição de uma maior articulação dos
professores e pais na constituição de práticas que tenham como referência as dimensões
políticas, históricas e sociais, dialogando com as possibilidades de construção de um processo
de formação, ampliando a sinergia escola-comunidade.
Se, por um lado, existe a sensibilidade dos profissionais, especialmente dos professores, de
acolher e receber os alunos em situação de vulnerabilidade social; por outro, há dificuldades
no tratamento dessas questões no âmbito das práticas pedagógicas, do movimento de
aproximação da escola com a comunidade. As dimensões da realidade concreta, das situações
reais vivenciadas pela comunidade são pouco exploradas como estratégias de ensino e de
reflexão das múltiplas dimensões (sociais, políticas, culturais, entre outras).
Assim, o conjunto das experiências vivenciadas em âmbito comunitário, que poderia ser
associado à abordagem dos conteúdos curriculares como dimensões da vida cidadã94, fica
adormecido. Se a cidadania pressupõe a participação dos sujeitos na vida social, com
reconhecimento de direitos e deveres, a ausência de diálogo em tais aspectos compromete a
formação cidadã dos discentes para a vida comunitária.
Esse é um desafio que precisa ser enfrentado pela escola na constituição de práticas
pedagógicas que dialoguem com saberes formais e não-formais95, voltando-se para questões
curriculares que estejam em estreito diálogo com dimensões sociais, políticas e culturais. É
necessário ir além das questões tradicionais dos conteúdos a serem ensinados (o que ensinar?)
94
Um das possibilidades consistiria na própria abordagem dos temas da vida cidadã prevista pelos Parâmetros
Curriculares Nacionais, como temas transversais: ética, saúde, pluralidade cultural, meio ambiente, trabalho e
consumo, dentre outros.
95
Apoiando em (GOHN, 2006), pode-se dizer que os saberes formais estão relacionados à educação formal,
desenvolvida nas escolas, com conteúdos previamente previstos; os não-formais à educação não-informal,
apreendidos pelo compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e ações coletivos cotidianos.
131
e das metodologias de ensino (como ensinar?), assegurando um enfoque sociocrático nas
dimensões da vida cidadã no universo comunitário (MURTA, 2004).
Assim, o PPP, enquanto expressão da participação da comunidade nas práticas pedagógicas
pressupõe ir além das questões de o que e como ensinar, dialogando com múltiplas dimensões
(políticas, sociais, culturais, éticas, dentre outras) de uma realidade complexa e que envolve o
esforço coletivo de aproximação dos sujeitos e suas experiências.
O aprofundamento do diálogo nas práticas pedagógicas com questões dessa natureza é
fundamental para uma aproximação com as dimensões societárias de gestão democráticoparticipativa. Requer, ainda, uma percepção dos profissionais de que a participação não é um
processo dado naturalmente, envolve uma construção histórico-social das relações
estabelecidas no seio da comunidade.
Obviamente, a aproximação escola-comunidade nas práticas do PPP pode ser vista como uma
experiência inovativa, na medida em que se apresenta como um processo intencional e
sistemático de maior participação dessa comunidade.
132
Categoria 2: O PPP enquanto unidade de articulação escola-comunidade
Unidade 4: Finalidades do PPP e organização das práticas pedagógicas e de gestão
Para os docentes, a principal finalidade do PPP consiste na formação em serviço dos
profissionais da escola (60,72%), aparecendo em menor proporção a formação humana da
escola, dos seus profissionais e alunos (17,86%); a formação política e social (10,71%); a
formação dos valores culturais da instituição (7,14%); a ausência de marcação (3,57%) e a
formação de princípios orientadores da comunidade no desenvolvimento das práticas
pedagógicas (0%). O GRAF. 10 descreve os valores obtidos.
GRÁFICO 10 - FINALIDADES DO PROJETO POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes
Ainda que a formação em serviço seja uma condição importante não pode constituir-se na
principal finalidade do PPP. O mesmo deve orientar-se por dimensões político-sociais de
consecução dos processos de aprendizagem e da vida social comunitária. Obviamente, a
formação em serviço é uma condição importante para alcance de práticas educativas
qualitativas de acesso as dimensões da vida social e aos processos de aprendizagem.
Deve sustentar em uma dinâmica de preparação continuada e processual dos profissionais
para enfrentamento dos desafios das práticas pedagógicas e de gestão. Para alcance das
133
condições desejadas é fundamental que essa perspectiva esteja em sintonia com as demandas
e experiências dos sujeitos em seu espaço de vivência comunitária.
A capacitação dos profissionais consiste em uma das metas previstas no PPP da escola:
“promover encontros com o coletivo da escola para discussão e correção de rumos do plano
de intervenção pedagógica.” (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓICO DA ESCOLA
PESQUISADA, 2012. p.13). Há, no entanto, apenas incorporação das dimensões gerenciais
do Estado que orientam as políticas públicas educacionais para resultados de proficiência,
distanciando de dimensões histórico-sociais importantes para a compreensão da educação
numa perspectiva comunitária.
Se para os docentes96 uma das principais finalidades do PPP consiste na capacitação dos
profissionais, na formação em serviço, para o diretor (a) e os supervisores, as questões
humanísticas e pedagógicas são finalidades prevalecentes.
O nosso desejo maior é o sucesso escolar do aluno e a permanência dele na escola,
que ele se torne um cidadão feliz de bem, que seja responsável pela comunidade em
que vive (Entrevistado 3).97
Uma escola que atende alunos em situação de risco social tem que pensar no
pedagógico em uma base humanística [...] não é possível desvincular a parte
pedagógica da humanística (Entrevistado 4).98
Ao apontar as finalidades humanísticas e pedagógicas expressam a preocupação de construir
um percurso escolar, das práticas pedagógicas e de gestão, conectado com o reconhecimento
dos alunos como sujeitos das práticas e das vivências comunitárias numa perspectiva cidadã.
Por outro lado, as vivências das dimensões humanísticas e pedagógicas do PPP requer uma
formação aderente aos valores humanos, em uma perspectiva continuada que acompanhe a
dinâmica histórico-social dos sujeitos nas práticas do PPP. Assim, em sua prática concreta é
fundamental ter como referência os valores humanos, a diversidade sociocultural, a ética das
relações e o senso de responsabilidade social.
As dimensões humanísticas e pedagógicas mencionadas pelos sujeitos, presentes nos esforços
que são empreendidos em uma prática concreta, estão no PPP formalmente instituído pela
96
Conforme análise de dados do questionário docente.
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
98
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012.
97
134
escola apoiadas no pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho (LDB 9394/96).
A referência para a formação em serviço são as finalidades humanísticas e pedagógicas
enquanto categoria estruturante e mais producente com os processos autogeradores do PPP da
escola. Isso requer uma sinergia da formação dos profissionais da escola com esses princípios
estruturadores das práticas pedagógicas e de gestão.
Nesse sentido, as estratégias de capacitação requer maior autonomia da comunidade nos
processos de autogestão escolar. Os cursos devem contribuir com a formação de uma
responsabilidade coletiva e auto-organização dos sujeitos para vivência coletiva (LIBÂNEO,
2008). Assim, uma maior compreensão dos profissionais da realidade local, da escola e da sua
comunidade99 perpassa por processos de formação que considerem a própria realidade
histórico-social da comunidade.
Numa perspectiva autogeradora as estratégias de formação em serviço exige conhecer a
comunidade escolar, seus saberes tácitos, suas potencialidades e dificuldades na construção de
soluções endógenas às vivências do PPP. Estão para além da racionalidade técnica do
aperfeiçoamento profissional, demandando estabelecer um diálogo com as experiências
locais. Pressupõe fortalecer os circuitos dialógicos de comunicação entre os profissionais e
sua comunidade, como forma de assegurar as sinergias necessárias entre a vivência do PPP
(marco operativo) e as reais demandas comunitárias.
Apoiado em Maciel (2001), dir-se-ia que é necessário o conhecimento das possibilidades de
maximização dos arranjos institucionais e políticos das redes de relações simbólicas e sociais,
presentes na articulação das dimensões autogeradoras do PPP para maior participação da
comunidade.
Por outro lado, a formação em serviço demanda coerência com as dimensões histórico-sociais
da comunidade, compreendendo a realidade como um processo dinâmico, associado às
99
As experiências de Desenvolvimento Local apontam para a necessidade de participação da comunidade,
especialmente da proatividade da sociedade civil em questões de interesse público, bem como, a necessidade de
valorizar experiências e saberes tácitos dos sujeitos em sua base local (DOWBOR, 2006).
135
condições temporais e espaciais. Processos de formação dessa natureza são convergentes com
uma formação humana integrada.100
Com os processos de aceleração capitalista101 vale destacar que as condições histórico-sociais
dos sujeitos não estão conectadas apenas à realidade local, estando intrinsicamente
interligadas as condições globais. Nessa dinâmica de sinergia entre local e global, uma
perspectiva de formação humana integral pode contribuir com a compreensão das
características próprias da comunidade, das suas dimensões histórico-sociais enquanto
estratégia de enfrentamento das tendências de homogeneização difundidas globalmente.
Enquanto principal finalidade do PPP, a formação em serviço é descrita pelos docentes como
a realização de palestras, oficinas, reuniões e trabalhos coletivos. As principais temáticas
tratadas são relativas às dificuldades de aprendizagem dos alunos, qualidade de vida dos
profissionais, inclusão de alunos com necessidades especiais e desvio de comportamentos
sociais. Assim, são trabalhados temas relativos às relações interpessoais, violência na escola
(bullying), alfabetização dos alunos com dificuldades de aprendizagem, dentre outras.
Para a direção as reuniões de planejamento e suas possibilidades de troca de experiências; as
rodas de conversas e estudos102; as palestras em parceria com à sociedade civil (psicológicos,
terapeutas, médicos, etc.), abordando temas relativos à melhoria da qualidade de vida dos
profissionais; encontros com a promotoria, CREAS, CRAS, Conselho Tutelar para reflexão
de situações conflituosas são as principais estratégias maximizadas em serviço na formação
dos profissionais.
Nessa mesma direção a supervisão aponta as ações e estratégias que são adotadas pela escola
para capacitação dos seus profissionais:
Uns 06 ou 08 profissionais fizeram o curso virtual de Educação Inclusiva,
participamos das capacitações promovidas pela Superintendência [...] a escola conta
com a participação de pessoas para dar palestras, nós tivemos palestras. Temos
também as atividades que são desenvolvidas com os professores, trocas de
experiências, o trabalho coletivo no interior da escola (Entrevistado 1).103
100
Neste estudo, entende-se por formação humana integrada um processo de superação histórica da divisão
social do trabalho, da fragmentação das ações entre quem pensa e executa. (BRASIL, 2012)
101
O processo de aceleração capitalista está diretamente associado a globalização, ao modelo de acumulação
flexível e à abertura econômica.
102
Segundo a direção, as rodas de conversa têm como fundamento análise de trechos das obras de Paulo Freire.
103
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
136
Nas estratégias de capacitação dos profissionais são destacadas pelos docentes, supervisão e
direção, as palestras e os cursos realizados. Dentre as ações, as rodas de conversas, citada pelo
diretor, ao pressupor uma participação dos sujeitos de modo interativo apresentam-se com
maior aderência às finalidades humanísticas e pedagógicas do PPP em seu sentido
autogerador.
Por outro lado, ainda que existam as rodas de conversas como forma de troca de experiências
entre os profissionais e diálogo com a realidade concreta, não é perceptível processos de
capacitação sistematizados para abordagens de temas específicos da comunidade, baseados na
reflexão de experiências presentes na própria comunidade. A realização de cursos dessa
natureza implicaria na participação conjunta de diferentes segmentos da comunidade (pais,
alunos, professores, representantes da sociedade, vizinhança, dentre outros).
Quanto as palestras e cursos são trabalhados pela própria escola em parceira com instituições
ou pessoas pertencentes à comunidade escolar e/ou educativa, assim como, em ações de
capacitação realizadas pela SRE104 de Teófilo Otoni. Ainda que as estratégias de formação
promovidas pela SRE sejam baseadas na perspectiva difusionista105 não se identificou no
grupo focal uma postura crítica dos docentes. Os mesmos consideram tanto as estratégias
promovidas pela escola, quanto aquelas promovidas pela SRE, como oportunidades para
repensar sua práxis educativa.
Segundo o corpo docente há liberdade dos profissionais de sugerir propostas de temas a serem
trabalhados na escola, quanto dos sujeitos de expor suas próprias ideias, assim como,
manifestar o seu pensamento durante a realização das capacitações: “há uma capacitação que
a superintendência promove duas a três vezes por ano. [...] Têm algumas oficina e a gente
troca experiências e coloca nossas ideias” (Participante 9).106
104
A Superintendência Regional de Ensino de Teófilo Otoni é responsável pelo acompanhamento das escolas
públicas, possuindo servidores da equipe pedagógica (inspetores e analistas) que fazem o acompanhamento das
escolas.
105
A perspectiva difusionista consiste na base dos processos inovativos verticalizados, onde programas e
projetos são elaborados e difundidos às escolas, sem o devido grau de sinergia e diálogo com a comunidade local
na sua concepção e execução.
106
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
137
Ainda segundo os mesmos, as capacitações promovidas pela SRE há possibilidades dos
sujeitos expressarem sua opinião, assim como, adequação das temáticas, conforme a sua
realidade. Existiria, nesses cursos, um espaço de autonomia em consonância com o disposto a
seguir:
A autonomia da escola não deixa de ser autonomia por considerar a existência e
importância das diretrizes básicas de um sistema nacional de educação (...) a
autonomia da escola justifica-se no respeito à diversidade e à riqueza das culturas
brasileiras, na superação das marcantes desigualdades locais e regionais e na
abertura à participação (NEVES, 2004. p.99).
Numa perspectiva de Estado Gerencial de gestão das políticas educacionais essa liberdade é
relativa, considerando que uma modelo para resultados, centrado na proficiência dos alunos e
em avaliações externas se impõe aos interesses autogeradores da própria comunidade. Vê-se,
apoiando em Dourando (2007), que há dimensões sociais na educação que não são passíveis
de serem mensuradas em avaliações externas.
O grupo docente ao apontar que os cursos realizados pela SRE são importantes para o
processo de formação profissional, relacionando ao alcance das metas esperadas,107 expressa
os seus limites de compreensão do PPP em um sentido autogerador que compreenda a
comunidade em suas dimensões societárias e autogeradora: “A gente vê que a escola está
desenvolvendo. Você olha pelo rendimento escolar e desenvolvimento das crianças das metas
que estão sendo alcançadas, todo ano consegue atingir” (Participante 4).108 Obviamente, essa
visão é produto de uma perspectiva verticalizada de inovação109, apoiando em instrumento de
marketing e controle da produtividade pedagógica dos docentes pelo Estado que se impõe a
escola.
Ao atribuir como principal significado para os processos de formação o alcance das metas
que são pactuadas pelo Estado expressam uma redução do universo social do PPP a uma
lógica instrumental, de caráter tecnicista, apoiada em um modelo gerencial centrado no
adestramento (treinamento) de docentes e discentes para o alcance dos índices satisfatórios de
107
Em Minas Gerais, os resultados esperados são definidos pela pactuação de metas que é assinada pela direção
da escola, comprometendo-se com determinados índices de proficiência. O termo situa-se como força de
expressão, do que como uma realidade concreta de combinação dos acordos entre as partes, já que as metas são
prescritas pelo Estado.
108
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
109
A expressão mais recente da penetração ideológica desse modelo consiste nos resultados de proficiência das
escolas no Índice de Avaliação da Educação Básica – IDEB que são afixados nas escolas.
138
proficiência. Essa perspectiva não favorece a percepção das múltiplas dimensões (históricas,
políticas, sociais e culturais) expressas no PPP de maior sinergia escola-comunidade.
A questão central é que os modelos pré-formatados por equipes técnicas são pouco eficazes
para a compreensão dos sujeitos e sua realidade comunitária (VEIGA, 2003). Assim, ainda
que haja espaço para o exercício da autonomia escolar, o significado construído pelos sujeitos
nos processos de formação possuem lacunas na compreensão das dimensões societárias do
PPP, não sendo producentes com a maior sinergia escola-comunidade.
É necessário que as propostas de formação em serviço, tanto em sua concepção quanto
execução, dialoguem com as experiências comunitárias, assegurando aos sujeitos vivências de
processos de formação aderentes as dimensões societárias e a emergência do caráter
autogerador do PPP enquanto possibilidade para capturar as múltiplas dimensões societárias
da comunidade.
Assim, supõe extrapolar a lógica de instrumentalização de ações para o alcance de resultados
de proficiência, da relação restrita dos cursos de capacitação desenvolvidos numa perspectiva
gerencial da eficiência, eficácia e produtividade. Apoia-se no pressuposto de que os resultados
educacionais são amplos, envolvem questões político-pedagógicas que não podem ser
mensuradas em termos de proficiência (DOURADO, 2007).
Acrescenta-se, ainda, que a perspectiva gerencial produz uma dissimulação do sentido da
participação, subtraindo principalmente o poder de decisão dos sujeitos (ARAÚJO; CASTRO,
2001), sendo um limite à vivência da perspectiva societária de caráter democráticoparticipativo. Assim, numa perspectiva de maior vivência das dimensões societárias, a
formação em serviço demanda construir formas de enfrentamentos dos sujeitos a essa
perspectiva dissimulada.
A construção de processos de formação em serviço, com envolvimento dos profissionais da
escola e demais membros da comunidade é fundamental para a existência de uma
convergência com o sentido autogerador do PPP, enquanto um processo de construção
histórico-social, que materialize procedimentos de gestão e práticas pedagógicas compatíveis
com as necessidades da comunidade.
139
Unidade 5: Relações de trabalho na escola
Quanto às relações de trabalho na escola, os sujeitos apontam para um processo dialógico,
aberto às sugestões dos profissionais da escola e da comunidade: “quando há alguma sugestão
a escola analisa para ver se é viável para o coletivo. A escola trabalha no coletivo, com a
participação de todos. Às vezes é sugerido algo [...], então é feito o trabalho de análise, de
pontuar se é uma coisa boa para todos” (Entrevistado 1).110
Ainda, nesse mesmo sentido, o entrevistado 4 destaca que, quando há alguma sugestão de
qualquer pessoa da comunidade, como, por exemplo, um pai, a escola sempre analisa a sua
viabilidade e possibilidades de vivência concreta, principalmente quando as sugestões são
apresentadas pela comunidade.
Há uma tendência de fortalecimento das relações democráticas, valorizando as dimensões
societárias, sendo perceptível também na forma como a escola procura lidar com o conflito.
São organizadas, segundo a direção, rodas de conversas entre professores, alunos e pais, para
encontrar a melhor maneira de resolver os problemas.
A supervisão escolar também sustenta que o diálogo consiste na principal estratégia para
resolver as situações conflituosas na escola:
Às vezes a gente depara com uma situação de conflito, vamos supor com um pai que
chega nervoso em relação a uma determinada situação. A melhor maneira que a
gente age aqui é com o diálogo, é conversando, é tentando explicar [...]. Escutar
ambas as partes, tentar resolver aqui dentro do ambiente escolar sem precisar acionar
outro órgão, sem precisar recorrer a outra situação. É assim também com os
profissionais. O diálogo ainda é a melhor maneira de lidar com o conflito, tentar
fazer com que ambas as partes entendam o acontecido, esclarecer e apurar aqui
mesmo, dentro do ambiente escolar (Entrevistado 1).111
Ao prezar pela autonomia dos sujeitos na resolução dos problemas, a escola tem no diálogo e
na participação coletiva da comunidade sua principal estratégia para a construção de ações
comuns que orientam as práticas do PPP. Por outro lado, reconhece as dimensões históricosociais da comunidade e a capacidade proativa dos sujeitos de enfrentamento dos desafios
concretos.
110
111
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
140
O diálogo enquanto elemento articulador dos sujeitos e síncrono com o trabalho colaborativo
para o alcance de objetivos comuns. Essa tendência é expressa nos questionários docentes, ao
ter no trabalho coletivo e colaborativo, em diálogo com a experiência da comunidade, o
princípio com maior presença na gestão do Projeto Político-Pedagógico da escola (39,29%).
Em valores percentuais decrescentes aparece o respeito e valorização das potencialidades
humanas em sua diversidade comunitária (28,57%), planejamento coletivo e decisão
compartilhada entre a comunidade interna (17,86%) e resolução dos problemas com
participação direta da comunidade (14,29%). O GRAF. 11 ilustra os percentuais a seguir:
GRÁFICO 11 - PRINCÍPIO COM MAIOR PRESENÇA NA
GESTÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA
ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários
docentes
Na perspectiva colaborativa as relações de trabalho apoiam-se no desenvolvimento de um
trabalho conjunto, baseado na igualdade e ajuda mútua para o alcance de objetivos comuns
(BOAVIDA; PONTE, 2002). Os docentes, ao indicar o trabalho colaborativo, em diálogo
com as experiências da comunidade, sinalizam com a substituição de uma lógica de
organização individual e fragmentária por um processo cooperativo, interativo e processual de
gestão do PPP.
141
Por outro lado, a construção de uma lógica processual e interativa de gestão implica em
fortalecer o compartilhamento de experiências entre os sujeitos e a visão problematizadora da
realidade comunitária, num movimento de ação-reflexão-ação de reconfiguração das práticas
gestionárias e pedagógicas em seu sentido emancipatório e/ou edificante.
Ao estabelecer o trabalho colaborativo como uma estratégia concreta para vivência do PPP os
sujeitos se filiam a um caminho processual, intencional e sistemático de vivência dos
processos inovativos em dimensões democrático-participativas, apoiando no poder coletivo
de decisão dos sujeitos. Tais aspectos são coerentes com uma prática em reciprocidade com a
função projetiva do PPP em sintonia com as dimensões histórico-sociais dos sujeitos
envolvidos. É no diálogo entre a realidade concreta e o que se pretende alcançar, mediado
pela vivência das dimensões pedagógicas, que se maximiza o potencial autogerador do PPP.
Assim, a lógica de trabalho colaborativo apresenta-se como uma estratégia importante de
superação dos processos segmentados de mudança, especialmente da cisão entre concepção e
execução, sinalizando com as possibilidades de maximizar do potencial autogerador do PPP.
Traduz-se num esforço coletivo de aproximação da realidade concreta e do que se deseja
construir, associada às possibilidades de transformação da escola pelas ações mútuas dos
sujeitos.
É nesse sentido que a busca conjunta e cooperativa de soluções para os problemas enfrentados
é apontada pelos docentes como a principal estratégia (50%) para construção da identidade do
PPP. Em menores valores percentuais são vistos a comunicação direta com democratização
das informações aos profissionais da escola (21,43%), o respeito às decisões tomadas
coletivamente pelo grupo e o compromisso dos membros com os processos participativos
(14,29%) . O GRAF. 12 ilustra os percentuais encontrados:
142
GRÁFICO 12 - FATORES QUE CONTRIBUEM COM A
CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DO PROJETO POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes
O nível de identidade dos sujeitos com os princípios do PPP expressa o grau de envolvimento
nos processos participativos, já que a identificação com uma prática ou processo é fator
fundamental para o envolvimento dos sujeitos. Percebe-se que a participação nas práticas do
PPP estaria relacionada à forma como os sujeitos concebem e vivenciam a proposta,
construindo sua identidade no espaço de participação coletiva.
Assim, os fatores de identidade do PPP estão relacionados com o maior aprofundamento dos
processos participativos, permitindo criar maior sinergia da escola-comunidade com seus
princípios e valores. Para Neves (2004), quando os resultados escolares atendem às
expectativas das famílias e da comunidade, a identidade e o papel social da escola são
fortalecidos.
Se a busca por soluções conjuntas e cooperativas para os problemas enfrentados pela escola é
apontada pelos docentes como principal estratégia de construção da identidade do PPP
observa-se uma convergência com as ideias da participação e envolvimento coletivo dos
profissionais presentes no grupo focal docente e nas entrevistas realizadas com o diretor e
superiores. Isso reforça a perspectiva da existência de uma nível de interação e vivência de
dimensões societárias do PPP pela comunidade.
143
Pressupõe a existência de um espaço aberto à manifestação e sistematização das concepções
educacionais, bem como, de compreender sua sinergia com a realidade. Assim, a cooperação
pode ser vista como uma estratégia para superação de processos de decisão centralizados e
orientados por interesses individuais, apoiando-se na proatividade e interatividade dos sujeitos
na gestão do PPP. Em sua base estão os processos associados de participação como
contraponto as estratégias de mudança prescritas112, individuais e exógenas aos sujeitos
comunitários.
Enquanto ação realizada pelos pares, com a intenção de alcançar objetivos comuns, a
cooperação apresenta-se como uma possibilidade de fortalecimento do grupo para
enfrentamento dos desafios da realidade, especialmente dos processos inovativos prescritos
que concebem o PPP como uma racionalidade técnica.
Assim, a experiência autogeradora do PPP pressupõe ruptura com os processos de natureza
prescritiva, dos modelos burocráticos e/ou gerenciais de gestão. Sua base de sustentação são
as dimensões societárias do projeto democrático-participativo e as possibilidades de
aprofundamento da gestão social enquanto processo de envolvimento proativo de sujeitos da
escola e da sociedade civil em questões públicas de melhoria da qualidade educacional.
Esse caráter autogerador depende de uma estrutura organizacional que dialogue com espaços
de vivência colegiada e cooperativa das experiências comunitárias. Assim, a capacidade da
comunidade escolar de articular processos de enfrentamento dos problemas da sua realidade é
favorecida por um ambiente cooperativo e participativo de vivência do PPP.
Por outro lado, o diálogo com as experiências comunitárias colaborativas exige um maior
grau de interação entre os diferentes saberes, especialmente dos escolares com as experiências
concretas dos sujeitos em seu ambiente comunitário. É importante reconhecer e mobilizar
essa base de conhecimentos endógenos para o desenvolvimento do PPP, potencializando as
vivências das experiências comunitárias pelos sujeitos.
42 De acordo com Hernández et al (2000) a tendência é de um menor envolvimento dos sujeitos nos processos
inovativos prescritos, sendo mais suscetíveis ao fracasso.
144
Observa-se ainda, que a vivência da programação cultural permite aos profissionais
compartilhar experiências e desenvolver estratégias de trabalho conjuntas, expressas
principalmente na participação coletiva de professores e alunos nas apresentações dos
trabalhos, corroborando com uma perspectiva de trabalho colaborativo nas práticas do PPP
para alcance de objetivos comuns (BOAVIDA; PONTE, 2002).
A perspectiva de que a escola e os profissionais colaboram entre si para alcançar os objetivos
comuns previstos nas práticas do PPP pode ser vista com uma condição para a emergência de
pressuposto de gestão social: “a gente sempre fala com o colega assim: aqui você não está só.
Você tem o seu colega de cada lado e se você olhar para frente e para trás você vai ver muitas
outras pessoas dispostas a ajudar” (Entrevistado 3).113
Quanto às atividades de trabalho, as iniciativas adotadas pela direção são de envolvimento de
todos os segmentos da escola (professor, supervisor, secretário, auxiliares da educação básica,
dentre outros) na vivência da programação cultural.
Quando eu falo profissional não é somente o professor. É toda a equipe, envolve
também os ASB e ATB114, todos participam da programação cultural. De manhã
três participam, à tarde mais três. Se vamos fazer um passeio, toda equipe de
profissionais e representada nesse passeio. Se o passeio dessa semana é só o grupo
de adolescentes do 5º ano, por exemplo, vão professores, equipe da área
administrativa, ASB, ATB, para todos entenderem como funciona a escola
(Entrevistado 3).
Esse envolvimento coletivo dos profissionais na programação cultural da escola, além de
possibilitar a construção de um significado coletivo das atividades para a instituição permite o
desenvolvimento de ações articuladas e conexas entre os segmentos escolares. Essa é uma
tendência mais compatível com o viés societário de gestão e vivência autogeradoras dos
sujeitos.
Os projetos da escola constituem num dos pilares fundamentais da experiência de
aproximação com a comunidade na vivência das práticas do PPP.
Aponta-se que essa
tendência inovativa situa-se principalmente na capacidade da escola de estabelecer um
sistema de parcerias com a comunidade educativa, com diversificação das atividades que são
oferecidas aos alunos.
113
Diretor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
A expressão ASB refere-se aos Auxiliares de Serviços da Educação Básica e ATB aos Assistentes Técnicos
da Educação Básica.
114
145
Quanto aos projetos existentes na escola, a supervisão escolar destaca:
Nós temos vários projetos, como o tempo integral, a sala de recurso, o projeto do
SESC em parceria com a escola. O SESC traz atividades de artesanato, de pintura,
de ruas de lazer para as crianças. É um projeto que está ajudando muito nessa
participação, nessa integração aqui da escola. Temos também um projeto muito
bacana que é o projeto dos correios, que é uma participação no natal das crianças
[...] (Entrevistado 4).115
Esses projetos apresentam-se como uma condição para uma intervenção mais processual, com
maior grau de interação escola-comunidade. É uma possibilidade de organização mais conexa
dos processos de abordagem dos conteúdos, de dialogo das práticas pedagógicas com
experiências comunitárias, presentes em instituições do universo da comunidade educativa. O
projeto da escola com o SESC, por exemplo, proporciona a vivência de atividades importantes
para aprendizagem e formação social discente, envolvendo atividades de manipulação e
criação em sintonia com dimensões socioculturais da própria comunidade.
Acrescenta-se que a organização dos conteúdos em projetos consiste numa possibilidade de
estabelecer uma interlocução entre diferentes áreas de conhecimento e dialogo com
experiências comunitárias, com participação de segmentos da sociedade civil. O projeto do
coral116, por exemplo, consiste numa iniciativa voluntária da comunidade escolar atendendo
aos alunos e ex-alunos, orientando-se por uma formação humana e social.
Quanto aos projetos pedagógicos que são desenvolvidos pela escola desdobram numa
programação cultural mensal aberta ao envolvimento e participação da comunidade escolar e
educativa:
Temos uma programação de elaborar os projetos junto com os professores de todas
as datas comemorativa do mês. Cada professor trabalha em sua sala de aula com as
atividades selecionadas, tem o último dia de cada mês que esses alunos vão para o
pátio e apresentam as atividades relacionadas a essas datas. E temos o projeto meio
ambiente, o projeto da água, todas essas outras datas que são trabalhadas durante o
ano (Entrevistado 1).117
Essa aproximação estaria tanto nas possibilidades de assistir às apresentações dos alunos
relativas à culminância das atividades, quanto na participação direta de representantes da
115
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012.
Na última parte desse capítulo, traremos especificamente as experiências que são desenvolvidas no coral na
perspectiva do trabalho voluntário realizado pelo seu membro fundador e regente.
117
Supervisora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
116
146
comunidade educativa em algumas ações, especialmente em palestras e orientações à
determinados temas.
Assim, os projetos desenvolvidos pela escola, em especial àqueles que dialogam com a
comunidade educativa, permitem articular uma programação sociocultural mais ampla com
maiores possibilidades de envolvimento da comunidade nas práticas do PPP.
Categoria 3: Ações desenvolvidas pela escola para maior participação da comunidade no
Projeto Político-Pedagógico
Unidade 6: Fatores para aumento dos processos participativos
A solidariedade e o compromisso do grupo em buscar soluções concretas para os problemas
enfrentados (53, 57 %) é apontado pelos docentes como principal fator para aumento dos
processos participativos da comunidade. Em valores descrecentes situam-se o respeito às
decisões coletiva tendo como fundamento o projeto educativo (32,14%); o compromisso das
representações instituídas, retroalimentando os docentes quanto às decisões tomadas,
encaminhamentos e suas possibilidades concretas ( 10,71%); o fortalecimento das relações
éticas, fundadas nos valores da atuação profissional (3,57%). O GRÁF. 13 retrata os valores
encontrados.
GRÁFICO 13 - PRINCIPAL FATOR PARA AUMENTO DOS
PROCESSOS PARTICIPATIVOS DOCENTES
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes
147
Se o trabalho colaborativo exige uma maior capacidade de compartilhamento e interação dos
sujeitos (BOAVIDA; PONTE, 2002), a solidariedade e compromisso podem ser vistas como
condições para expressão desse trabalho. Se o compromisso implica em participar das
decisões coletivas, assumindo responsabilidades com a vivência e prática do PPP, a
solidariedade tem como principal referência a sensibilidade dos sujeitos em relação ao outro,
de compartilhar conhecimentos, experiências e atitudes.
Em uma gestão societária dos processos escolares um dos principais impactos da
solidariedade e compromisso dos sujeitos perpassa pela humanização dos procedimentos e
práticas que visam contribuir com as condições de vivência cidadã da comunidade. Assim, se
as interações estabelecidas na escola contribuem com a qualidade educacional, por outro,
consiste nas próprias possibilidades de vivência cidadã.
São valores que permitem aos sujeitos participarem de um projeto comum de educação,
enquanto “grupo de pessoas que trabalham juntas, de forma colaborativa e solidária, visando à
formação e aprendizagem dos alunos.” (LIBÂNEO, 2008. P.103). Assim, a indicação desses
valores sinaliza a condição essencial de vivência coletiva do PPP em sua prática, em que os
processos decisórios envolvem a conexão dos sujeitos com a realidade comunitária.
Assim, compromisso e solidariedade associam-se às formas de organização das relações de
trabalho, baseadas na descentralização do poder de decisão, no compartilhamento das
experiências e na construção de processos de mudança endógenos que estejam sustentados
nos saberes e práticas da comunidade.
A solidariedade e compromisso são referência para a dimensão societária de gestão, implica
numa lógica processual de reorganização da escola, em que os sujeitos tenham condições de
decidir sobre estratégias e procedimentos de vivência do PPP sustentada na diversidade,
independência, autonomia, contrato, transparência, negociação e cooperação, enquanto
princípios básicos de uma gestão participativa (THULER, 2001).
Essa solidariedade e compromisso estariam alicerçados na própria perspectiva de realização
de um trabalho colaborativo para o alcance de objetivos comuns. Quanto à participação
148
discente, tendo como orientação estratégias de ação colaborativas O GRAF. 7 expressa os
valores percentuais da auto-avaliação dos sujeitos.
GRÁFICO 14 - AUTO-AVALIAÇÃO DISCENTE DA SUA
COLABORAÇÃO COM A PROPOSTA DE TRABALHO DA
ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários
discentes
Observa-se que 93,23% autoavaliam-se como suficiente sua participação colaborativa com a
proposta de trabalho da escola; 3,57% como insuficiente e 1,2% não responderam. O nível de
colaboração com a proposta de trabalho da escola sugere o compartilhamento de objetivos
comuns com a capacidade de contribuir com o conjunto das práticas vividas na escola,
proporcionadas em especial pelo trabalho em equipe.
Em relação a auto-avaliação docente da sua participação em colaboração com a
construção/reconstrução do PPP, são obtidos os seguintes valores percentuais: 96,42%
consideram sua participação suficiente; 3,58% de abstinência e 0% de insuficiência. No
GRAF. 15 observa-se os referidos valores percentuais.
149
GRÁFICO 15 - AUTO-AVALIAÇÃO DOCENTE DA SUA
PARTICIPAÇÃO NA CONSTRUÇÃO/RECONSTRUÇÃO DO
PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes
Vê-se que os valores docentes e discentes são expressivos quanto auto-avaliação dos sujeitos
na participação concreta das práticas do PPP. Existe, em maior ou menor grau, um
reconhecimento da sua condição de sujeito histórico-social, apto a contribuir com o
desenvolvimento do PPP da escola.
Subjacente à ideia de colaboração está, também, uma certa mutualidade na relação:
todos têm algo a dar e algo a receber do trabalho conjunto. Se a relação é muito
desequilibrada, havendo uns que dão muito e recebem pouco e vice-versa, é
problemático atribuir a essa actividade um carácter de colaboração (BOAVIDA;
PONTE, 2002, p.6).
A auto-avaliação dos sujeitos de colaborares com o PPP da escola é uma condição favorável
aos processos de participação coletiva, sinalizando com a percepção do grupo de objetivos
compartilhados. Associa-se a uma perspectiva de educação libertadora (FREIRE, 2004), em
que todos são sujeitos do diálogo e podem contribuir com o aperfeiçoamento dos processos e
práticas educacionais.
Essa perspectiva perpassa por uma ação articulada com os princípios democráticos,
envolvendo o compartilhamento de ações e poder de decisão. Vincula-se as possibilidades de
participação e decisão em caráter local, circunscritas ao ambiente de vivência dos sujeitos. É
conveniente, no entanto, que se busque uma clareza dessas questões, em especial em tempos
150
de apropriação dissimulada do sistema neoliberal dos processos e mecanismos de gestão
democrática. 118
Vê-se, por outro lado, mesmo identificando no interior da escola características de outros
modelos gestionários119 uma preocupação da escola de aproximar da sua comunidade,
apoiando-se na humanização das relações e no respeito aos alunos em sua diversidade. De
acordo com os docentes, o respeito à comunidade cria um sentimento de confiança relativo ao
trabalho escolar.
A comunidade confia muito na escola. Você vê que muitas escolas fecham as portas,
escolas até maiores, aqui não. Nunca se vê fundir turmas, a escola recebe crianças
expulsas ou indicadas por juiz que chegam aqui é se adaptam. Às vezes, chegam e
até ficam meio receosos mas, acabam se enturmando [...] Eles também têm abertura
para chegar, para procurar, para elogiar, para reclamar, para exigir, para pedir
(Participante 4).120
Em sentimento da confiança pode ser visto com uma das condições prévias para a existência
das ações colaborativas e solidárias. Apoiando na Teoria da Complexidade (MORIN, 2010),
dir-se-ia que a solidariedade e o trabalho colaborativo são formas de construção de um elo
orgânico entre a escola e sua comunidade, enquanto condição para a existência do poder
compartilhado de vivência comunitária do PPP. Assim, consiste em uma forma real de
enfrentamento dos processos burocráticos e gerenciais, nos quais as decisões são centralizadas
e/ou orientadas por princípios mercadológicos.
Enquanto experiência concreta, sustentada nos valores humanísticos e pedagógicos que
orientam o PPP da escola, vale mencionar o próprio envolvimento dos discentes no coral: “os
alunos são muito unidos. É um pelo outro” (Entrevistado 2)121, enquanto relação mútua para o
desenvolvimento de um projeto com objetivos comuns (BOAVIDA; PONTE, 2002).
Por outro lado, os níveis de suficiência nos processos participativos podem significar tanto
mudança quanto estabilidade (THULER, 2001). A mudança estaria associada ao sentimento
de envolvimento e compromisso como os processos de transformação pelo poder de decisão
118
A esse respeito leia: DAGNINO, Evelina (2004) “¿Sociedade civil, participação e cidadania: de que estamos
falando?”En Daniel Mato (coord.), Políticas de ciudadanía y sociedad civil en tiempos de globalización. Caracas:
FACES, Universidad Central de Venezuela, pp. 95-110.
119
Ao tratar dos processos de formação em serviço, por exemplo, menciona-se a relação restrita entre
qualificação e resultados de proficiência da perspectiva gerencial.
120
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
121
Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
151
colegiado, enquanto a estabilidade vincula-se a impressão de um suposto nível de excelência
participativa e organização dos processos, onde os sujeitos eximem-se de novos esforços
adicionais.
Enquanto a mudança vivida em sua dimensão societária implica numa perspectiva de
participação engajada, de envolvimento dinâmico com as propostas do PPP e compromisso
com as práticas pedagógicas e de gestão, a estabilidade guia-se pela ideia de suficiência da
participação, do alcance de um limite das dimensões histórico-sociais, convertendo em
acomodação e manutenção de saberes e fazeres, eximindo-se dos novos desafios.
Assim, o desenvolvimento institucional e pedagógico da escola passa pela tênue relação entre
processos de estabilidade e mudança122, exigindo um nível de coordenação e equilíbrio dos
sujeitos diante dessas questões.
Um processo de mudança supõe ruptura com campos
instituídos, desestabilizando relações e procedimentos, para a constituição de novos
processos.
Os sujeitos ao se auto-avaliarem como participativos sinalizam com a predisposição de lidar
com as incertezas, reconhecendo na mudança as possibilidades de maior participação da sua
comunidade. Por sua vez, os processos de mudança e estabilidade refletem o próprio caráter
dinâmico do PPP, o diálogo entre os campos instituinte e instituindo, num processo de
aproximação interativa com a concepção de sociedade e homem desejado.
Situa-se que a abertura da escola ao diálogo com a comunidade é um dos aspectos que
contribuem para a maior participação nas práticas do PPP e democratização das relações no
interior da escola, fortalecendo os processos participativos e o respeito às decisões
comunitárias.
Assim, ainda que as diretrizes das políticas educacionais vigentes sejam baseadas numa
perspectiva gerencial123, a escola procura vivenciar as práticas de gestão e pedagógicas do
PPP em suas dimensões societárias. Há uma tendência de constituição de relações mútuas
com a comunidade, tendo como suporte os princípios democrático-participativos.
122
Sustentando em Thuler (2001) descrevemos no capítulo 2 os desafios dos processos inovativos relativos a
tênue relação entre mudança e estabilidade.
123
O enfoque nos resultados de proficiência dos alunos, avaliação individual de desempenho dos servidores e
diretrizes são alguns dos vieses dessa política.
152
Essa tendência de mutualidade está presente no diálogo estabelecido com a chamada
comunidade educativa, na ampliação das vivências oportunizadas pelos projetos no espaço
comunitário. São possibilidades dos alunos vivenciarem experiências para além da sua própria
realidade, construindo uma interlocução entre a realidade local como o contexto mais global,
presente na comunidade educativa.
A abertura da escola ao diálogo com o conjunto das instituições do universo da comunidade
educativa permite o desenvolvimento de atividades curriculares e extracurriculares que
possibilitam uma maior aproximação com a sua comunidade local. Essa sinergia está
presente, por exemplo, nas atividades de lazer, saúde, oficinas, artesanato, jogos, dos quais a
comunidade participa.
A comunidade escolar também desenvolve ações de caráter social e cultural que contribuem
para o diálogo com a comunidade educativa. O coral da escola, por exemplo, nasce como uma
estratégia de atividade para participação dos alunos, mas, ao se apresentar em instituições
pertencentes ao universo da comunidade educativa, proporciona tanto entretenimento e
cultura às pessoas pertencentes à instituição, como cria possibilidades de interlocução da
escola com aquele universo.
Quanto aos discentes, esse apoio estaria relacionado tanto ao trabalho pedagógico
diferenciado, de reconhecer as necessidades de cada aluno, quanto à sensibilidade docente de
conhecer os alunos e suas dificuldades: “Aqui tem situações que você tem que ser o psicólogo
mesmo, a criança só consegue andar na aprendizagem quando você descobre o problema. Aí
você da um carinho ele se apega bastante com a gente, uma palavra amiga” (Participante 6).124
Ainda, nessa mesma direção, a participante 7125 expressa: “Se você tá com um aluno que a
mãe bate muito ou que não dá aquela atenção, então você trata aquela criança com carinho
perto da mãe ou então pede a mãe ou pai com amor para cuidar dele [...].”
Os trechos expressam uma preocupação dos docentes relativa à aprendizagem dos alunos e
das questões sociais126, tanto no sentido de identificar problemas que interferem nas práticas
124
125
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
153
pedagógicas, quanto no estabelecimento de estratégias que contribuam com a integridade da
criança. O diálogo é o principal caminho buscado pela escola, tanto no acolhimento da criança
e seus familiares, quanto no estabelecimento de estratégias que contribuam com a solução do
problema.
Unidade 7: Os projetos e as experiências curriculares e extracurriculares.
Se compromisso e solidariedade estão associados à maior participação da comunidade, na
prática concreta uma das suas expressões consiste na mobilização dos sujeitos relativa a
abertura dos espaços escolares para a participação da comunidade nos finais de semana.
Enquanto estratégia que envolve a organização voluntária dos seus membros, exige
compromisso e solidariedade dos sujeitos na organização de atividades que sejam expressão
das demandas e/ou experiências da própria comunidade.
A escola abre as portas para a participação da comunidade nos finais de semana.
Final de semana aqui já teve encontro de casais, o coral ensaia, tem encontros da
catequese. Se a comunidade precisa do espaço físico da escola para acontecer uma
feijoada a escola tá de portas abertas. Teve, agora mesmo, aquele bingo que teve o
almoço e que veio muita gente, que também era da igreja. Teve aqui o curso
teológico, então assim tem vários projetos que traz a comunidade para a escola
(Participante 9).
As atividades desenvolvidas na escola nos finais de semana envolvem projetos e/ou atividades
que tenham um significado importante para a comunidade na vivência de práticas de gestão
social127, na construção de uma maior sinergia entre o seus membros. Essa participação
coletiva, compromissada, solidária e orientada por objetivos comuns permite a comunidade
construir uma identidade da escola como espaço de vivência social. Constata-se ainda, que as
atividades que são propostas pela comunidade há uma participação dos seus membros nas
etapas de concepção e execução.
A abertura nos finais de semana para participação da comunidade é prevista no Projeto
Político-Pedagógico da escola:
126
Numa perspectiva gerencial de gestão, os baixos índices de proficiência são atribuídos a problemas pontuais,
circunscritos aos indivíduos (empenho, capacitação, entre outros), desconsiderando as questões sociais e suas
interferências nas práticas educacionais.
127
Apoiado em Tenório (2006), pode ser entendida como um processo dialógico no qual a autoridade decisória é
compartilhada entre os sujeitos da ação.
154
“A escola disponibiliza seu espaço para a comunidade, nos fins de semana,
tornando-se centro cultural, onde são realizadas oficinas de teatro, canto coral,
artesanato, com intuito de oferecer as crianças, adolescentes e jovens da comunidade
alternativas de desenvolvimento cultural e que contribuam para mantê-los longe das
ruas e dos riscos da marginalidade presente nas comunidades atendidas pela escola”
(PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA PESQUISADA, 2012, p.30).
Essas experiências de participação da comunidade nas escolas públicas nos finais de semana
são apoiadas pela Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais - SEE/MG por meio do
Programa Escola Viva – Comunidade Ativa nas escolas que estão situadas em regiões de
vulnerabilidade social. Por outro lado, a inexistência de uma articulação mínima entre a
escola-comunidade não tem permitido a apropriação desses espaços nos finais de semana e
desenvolvimento de experiências significativas para os seus membros.
Ressalta-se que a participação da comunidade na escola nos finais de semana antecede a
própria criação do Programa Escola Viva – Comunidade Ativa existindo experiências
anteriores de participação voluntária da comunidade na escola. O coral da escola, por
exemplo, desde a década de 80 envolve a participação da comunidade.
Quando cheguei à escola128 percebi tanta carência, preocupei de arranjar qualquer
coisa para envolver aquelas crianças e vencer os comportamentos agressivos. Aí eu
comecei a convidá-las para participar do coral. [...] Para fazer com que elas
enxergassem um horizonte diferente de brigas, de palavrões, de xingamentos [...]
(Entrevistado 2).129
O coral passa a ser uma estratégia de enfrentamento dos problemas relacionados aos desvios
de comportamento sociais dos alunos constituindo-se em uma das principais inovações nas
práticas do PPP que visa assegurar o acesso e permanência130 discentes na escola. Constituise numa expressão do caráter autogerador do PPP na busca de condições efetivas de melhoria
da qualidade educacional.
As temáticas tratadas no coral são relacionadas à aprendizagem de princípios e valores, assim
como, das possibilidades de vivência cidadã: “o coral passa sempre uma mensagem de vida,
128
Em 22 de fevereiro de 1980 a entrevistada iniciou sua atividade docente na escola, criando em 1988 o coral,
estando desde o início da sua criação em sua regência. Atualmente a professora é aposentada, dando
continuidade às atividades como voluntária da escola.
129
Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
130
O acesso e permanência de todos na escola é uma dos princípios previstos na LDB 9394/96 como expressão
de uma gestão democrática da escola.
155
de respeitar ao próximo e valorizar a si mesmo.” (Entrevistado 2)131.
As dimensões
pedagógicas são maximizadas principalmente pela análise crítica do contexto das letras das
músicas e da sua compreensão sociopolítica e cultural numa perspectiva interdisciplinar.132
São trabalhados temas como a família, o comportamento, o crescimento, o
desenvolvimento[...]. A parte cultural, eu também trabalho, história do Brasil,
ciências, a geografia, tudo incluído nas músicas. As músicas que eu trabalho com
eles são músicas selecionadas, da onde a gente pode tirar algum proveito daquela
letra e daquela melodia (Entrevistado 2).133
As atividades desenvolvidas pelo coral, além de aumentar a sinergia escola-comunidade,
permite os discentes exercer um papel proativo e de referência para sua comunidade escolar.
Essa credibilidade na escola é aumentada na medida em que os resultados socioculturais são
expressos em apresentações e/ou exposição que dialogam tanto com a comunidade escolar
como educativa.
A vivência dos discentes das atividades do coral permite conhecer outras instituições e
realidades presentes na comunidade educativa: “O coral é muito bom, a gente canta nos
lugares: na lajinha, na UNIPAC134, na praça, num monte de lugar. É muito bom. Nos ensaios
a gente aprende a cantar músicas que não conhece. Os ensaios são todo sábado às 8 horas
[...]” (Participante 12).135
A participação voluntária dos discentes no coral é uma forma de assegurar a vivência de
atividades socioculturais como expressão do direito de cidadania. São possibilidades de uma
formação humana integrada, com reconhecimento parte dos sujeitos das múltiplas dimensões
(sociais, políticas, culturais, dentre outras) da vida cidadã.
As ações desenvolvidas pelo coral favorecem a interlocução entre comunidade escolar e
educativa e oportunizam vivenciar atividades ampliadas em sintonia com os temas da vida
cidadã. É ainda, a tradução do PPP em sua prática concreta, enquanto processo intencional e
131
Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
A interdisciplinaridade pode se interpretada no contexto mencionado como uma abordagem conexa dos
conteúdos pela atitude cooperativa dos sujeitos envolvidos. O PPP da escola, formalmente instituído, prevê a
interdisciplinaridade dos conteúdos como forma de assegurar uma educação de qualidade.
133
Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
134
Refere-se à unidade da Faculdade Presidente Antônio Carlos de Teófilo Otoni.
135
Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012.
132
156
sistemático de vivência discente de possibilidades inovativas na estreita relação de
aproximação da escola com a sua comunidade.
As dimensões da vida cidadã estariam presentes principalmente na preocupação de tratar
questões relativas à diversidade étnico-racial presentes na própria constituição histórico-social
da comunidade. O envolvimento dos sujeitos no cenário de concepção e execução das
propostas permite compreender melhor a sinergia dos processos participativos, das suas
dimensões sociopolíticas.
A gente trabalha uma coreografia com roupa adequada ao tema e a música da
apresentação. Então dentro dessa música, dessa coreografia, eles contam pela
expressão corporal a história. Os negros, por exemplo, quando a gente fala da
senzala, da mãe preta, da negra menina África. Essa negra menina África vem
sempre uma menina acorrentada, triste, no meio da música ela arrebenta as
correntes, sorri, canta. Então transmite para o público que está assistindo o que a
gente que contar, falar da história do Brasil através dessa música (Entrevistado 2).136
Uma das principais possibilidades de interlocução com a comunidade, de diálogo com as suas
experiências são as questões relativas à vida cidadã tratadas no coral, centradas na
compreensão da realidade e processos de construção da consciência coletiva dos sujeitos.
A reciprocidade das temáticas tratadas com a questões da vida cidadã, a participação discente
na concepção e execução das ações, o diálogo das apresentações com o universo da
comunidade educativa é um condição coerente com uma formação integrada. É uma
possibilidade de a escola contribuir com a superação do ser humano dividido historicamente
pela ação de executar e a ação de pensar, dirigir ou planejar (BRASIL, 2012).
Outro aspecto emergente, tanto no grupo docente quanto discente, são as atividades
desenvolvidas pelo SESC para assegurar uma maior participação da comunidade na vivência
do PPP. É relatada a existência de um trabalho em parceria da escola com o SESC, em que as
atividades são destinadas para a comunidade cujas finalidades são pedagógicas, culturais,
lazer e humanísticas. Essas atividades são desenvolvidas tanto na escola como em demais
espaços públicos, inclusive com a utilização dos espaços da própria unidade do SESC Teófilo
Otoni.
136
Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
157
Dentre as ações desenvolvidas na escola, é mencionada pelos discentes a participação em
jogos pedagógicos, de mesa e atividades culturais, como: campeonatos de xadrez, construção
de quebra-cabeça e brinquedos com materiais alternativos, atividades de artesanato, rua de
lazer, dentre outras. Há ainda palestras que são destinadas para a comunidade (alunos, pais,
professores, dentre outros), abordando temas relacionados à saúde e educação.
As visitas dos alunos as instalações do SESC proporcionam a vivência de atividades de lazer,
esporte e cultura. É mencionado, ainda, pelo participante 2137 que o SESC participa de
apresentações conjuntas com a escola como, por exemplo, o desfile da independência.
Além de despertar o interesse, o conjunto dessas atividades possui oum significado para a
comunidade de acesso a determinados direitos, como o de acesso às atividades de lazer, que
historicamente ficaram à sua margem da comunidade: “A comunidade vem toda para as ruas
de lazer que são realizadas dentro da escola” (Participante 9). São atividades, às quais a
comunidade tem pouco acesso, despertando o interesse da grande maioria em conhecer e
participar.
Foi mencionado, ainda, o projeto “Projeto Papai Noel”, realizado em parceria com os correios
e a Rede de Farmácia Indiana. De acordo com os docentes, nas últimas semanas letivas, os
professores trabalham com os alunos a carta como portador de texto, destacando suas funções
no processo de comunicação. Ao término do desenvolvimento das atividades em sala de aula,
os alunos são convidados a escrever uma carta para Papai Noel, pedindo o presente que
desejam ganhar no natal.
No projeto, os presentes são doados pela Rede de Farmácia Indiana e entregues na escola por
funcionários dos correios: “todo ano tem esse projeto dos correios. Os alunos ficam muito
entusiasmados e motivados a escrever as cartinhas. Os funcionários dos correios têm uma
satisfação muito grande em entregar os presentes” (Participante 2).138
Vale ressaltar que há um diálogo, nesse projeto, entre as atividades curriculares e
extracurriculares, na medida em que os conhecimentos trabalhados em sala de aula são
pertinentes com a matriz de referência dos conteúdos para o ano de escolarização, envolvendo
137
138
Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012.
Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012.
158
competências de leitura, escrita e comunicação, com desdobramento em uma ação
extracurricular que envolve as instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa.
Assim, o “Projeto Papai Noel” ilustra as possibilidades de um maior diálogo entre atividades
curriculares e extracurriculares, enquanto prática concreta do PPP na aproximação com sua
comunidade. Esse é um dos desafios a ser assumido pela escola de aproximação das práticas
pedagógicas à realidade vivenciada, aumentando a sinergia escola-comunidade e, ao mesmo
tempo, mantendo as funções específicas da escola de ensino numa perspectiva de formação
humana integrada.
Nessa interação da escola com a comunidade são mencionadas as atividades de visita a outras
instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa para conhecer e/ou participar,
como a feira de ciências promovida pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e
Mucuri – UFVJM, a participação em concursos na Câmara Municipal de Vereadores de
Teófilo Otoni: “Tem o concurso que a gente vai todo ano na câmara, aquele de língua
portuguesa, frases, poemas. Ano passado a escola ganhou 1º, 2º e 3º lugar” (Participante
4).139; “A participação da escola na feira de ciências da federal [...] Experiências interessantes
que todo aluno parou para observar” (Participante 2).140
Vê-se que há uma postura sistemática da escola de visitar e/ou participar das atividades que
são promovidas por instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa. Ao
assumir os desafios de participar dessas atividades, a escola além de enriquecer sua
programação sociocultural de vivência extracurricular, permite aos alunos compreender
melhor a dinâmica societária local/global, dialogando com as possibilidades de uma formação
humana integrada em um cenário de vivência cidadã.
Dentre as principais atividades de vivência em âmbito da comunidade educativa, destaca-se a
participação da escola em feiras, seminários, gincanas, concursos, dentre outros. Nas
reflexões, os docentes destacaram os resultados positivos obtidos pela escola ao participar
dessas atividades, mencionando o maior envolvimento dos alunos e os resultados obtidos nos
139
140
Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012.
Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012.
159
concursos: “Esse ano mesmo uma aluna minha ganhou em primeiro lugar das escolas
estaduais no concurso de redação do PROERD141. O ano passado também” (Participante 6).142
Essas atividades permitem tanto motivar os alunos a vivenciar formas de participação
ampliada, como perceber um sentido mais concreto de vivência dos processos em
reciprocidade com instituições pertencentes à chamada comunidade educativa. A existência
de reciprocidade entre escola e comunidade educativa aumenta o compromisso dessas
instituições com a própria escola.
Na medida em que se apresenta como um processo intencional e sistemático, esse diálogo da
escola com instituições da comunidade educativa pode ser visto como uma das principais
estratégias inovadoras do PPP, de aproximação da escola com sua comunidade. É uma forma
dos alunos terem acesso em um sentido mais ampliado à cultura e ao lazer como um direito de
cidadania.
Os projetos de ensino143enquanto abordagens conexas, realizados pela própria escola ou em
parceria com a comunidade educativa, são importantes para a participação e estímulo à
vivência coletiva dos alunos. De acordo com Hernández et al (1998), são formas de romper
com os rígidos limites epistemológicos das disciplinas, uma possibilidade de aproximar os
saberes escolares das experiências dos alunos.
Enquanto principais inciativas em curso de articulação escola-comunidade nas práticas do
PPP, os projetos requerem uma percepção comunitária das estratégias de (re)significação da
vida escolar coletiva.
Atendemos uma demanda muito sofrida que vive num conflito social, envolvendo
drogas, violência doméstica, abusos contra criança. Deparamos com situações muito
difíceis no nosso dia a dia e por isso procuramos conhecer as famílias. Fazemos
visitas para conhecer a realidade, buscamos parcerias com ONGS, com o poder
público, com a promotoria, com a saúde. Essa estrutura é para que as crianças, as
famílias, os profissionais encontrem o apoio e principalmente as condições para
141
O PROERD é um Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência, desenvolvido pela Polícia
Militar de Minas Gerais em parceria com as escolas públicas e privadas. Equipes de policiais, denominados de
amigos da escola, desenvolvem ações (palestras, reuniões, oficinas) para os alunos e comunidade.
142
Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012.
143
Mencionamos no capítulo anterior que o projeto Zé do Livro e Recreio com Libras são inciativas da própria
escola de construir processos mais conexos de ensino, dialogando com tempos e espaços mais ampliados de
formação.
160
trabalhar de uma forma saudável e com mais compromisso com essa realidade e
com a sociedade (Entrevistado 3).144
Há ainda os projetos circunscritos ao âmbito das diretrizes da política pública de educação
que estão presentes na escola e são citados pelos docentes como forma de aumentar a sinergia
com a comunidade. São mencionadas no grupo focal docente os projetos Incluir e Aluno de
tempo integral145.
O projeto incluir perpassa pelo acolhimento aos alunos com necessidades educativas
especiais, garantindo a acessibilidade aos conteúdos curriculares por meio de serviços
especializados. Para atendimento desses alunos, a escola possui professor de apoio em sala de
aula, sala de recurso para aprendizagem da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS e professor
intérprete de Libras.
Um dos princípios que orienta a prática da escola é o envolvimento de todos os alunos nas
atividades propostas independente da sua necessidade especial. Por exemplo, havendo um
aluno surdo em uma determinada sala, a escola procura ensinar para os demais gestos básicos
de comunicação em LIBRAS. Há, ainda, experiências mais amplas como as atividades do
“recreio com LIBRAS”, no qual são montados no pátio da escola painéis com os sinais e os
alunos desenvolvem experiências de comunicação entre si. As apresentações da programação
cultural da escola também envolvem alunos com necessidades especiais na intenção de
assegurar o acesso e o envolvimento desses alunos em todas as atividades que são oferecidas.
O projeto Aluno de tempo integral funciona no contraturno do processo de escolarização
regular dos alunos, sendo voltado para o atendimento dos alunos em situação de
vulnerabilidade social e dificuldades de aprendizagem. O projeto segue as diretrizes de
funcionamento do Estado, sendo desenvolvido na forma de oficinas pedagógicas. De acordo
com os docentes, as oficinas procuram valorizar as habilidades dos alunos (teatro, dança,
artesanato, jogos, dentre outras), a troca de experiências e o atendimento às dificuldades
individuais dos alunos.
144
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
Os Projetos Incluir e Aluno de Tempo Integral são programas do Estado, pertencentes ao universo das
políticas públicas estaduais em atendimento a LDB 9394/96 e Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Básica.
145
161
Para o desenvolvimento dessas oficinas, os profissionais da escola apoiam-se na participação
de instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa, sendo mencionadas as
oficinas de jogos de xadrez e artesanato146 desenvolvidas em parceria com o SESC. Assim,
esses projetos permitem aumentar a sinergia com a comunidade educativa que passa a
contribuir diretamente com a vivência do PPP da escola.
São descritos, ainda, os pequenos projetos realizados pelos professores na escola e em sala de
aula: “Tem os projetinhos em sala de aula, tem o Zé do livro, o recreio com libras para
socializar o conhecimento.” (Participante 7)147. São citados, pelos docentes e discentes, os
passeios feitos com os alunos no trenzinho na semana da criança, as atividades envolvendo
datas comemorativas especiais (dia dos pais, das mães, semana do trânsito, dentre outras) que
contribuem para a aproximação da escola com a comunidade.
O papel proativo dos profissionais da escola é fundamental, especialmente da direção escolar,
tanto na liderança, quanto na motivação do grupo para vivenciar essas possibilidades do PPP
aderentes à maior participação da comunidade. Pode-se considerar que esse fato está
relacionado à abertura dos espaços escolares, à sensibilidade no apoio e no acolhimento da
comunidade, desenvolvendo projetos pedagógicos e o diálogo com as instituições
pertencentes ao universo da comunidade educativa.
Um dos desafios constantes é fortalecer o equilíbrio entre processos de mudança e
estabilidade, preservando os valores e princípios do PPP em suas dimensões democráticoparticipativas de vivência das relações societárias das práticas pedagógicas e de gestão; assim
como os níveis de comunicação e articulação adequados à maior sinergia entre comunidade
escolar e educativa.
146
Durante a realização das entrevistas, tivemos a oportunidade de observar alunos do tempo integral
confeccionando, com o apoio dos professores e de profissionais do SESC, uma caixa como porta-objetos
pessoais.
147
Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012.
162
Unidade 8: Estratégias de Planejamento das ações
Quanto ao planejamento das atividades pedagógicas, a posição do grupo docente é de que há
um planejamento coletivo, apoiado principalmente nos encontros de módulo148. De acordo
com os docentes, nesses encontros são feitos o planejamento das ações, dos projetos que serão
desenvolvidos pela escola por turmas de escolarização: “Temos as reuniões de módulo. É no
coletivo é assim no módulo por séries: primeiro ano junta os professores do primeiro ano,
segundo ano, terceiro ano, quarto ano e quinto ano. Cada um interage para chegar a um
denominador comum” (Participante 10).149
A ideia principal é de que nas reuniões de módulo II os professores, a supervisão e a direção
têm a oportunidade de conversar e estabelecer prioridades relativas às práticas curriculares e
suas possibilidades de desdobramento em um programação cultural enquanto condições
operativas do currículo como expressão do PPP.
De acordo com a direção da escola, essas reuniões são para planejamento e reflexão das
metas, ações e estudos com o grupo de professores. A ideia principal é construir estratégias de
planejamento em sintonia com as experiências e saberes do grupo tendo como referência o
ano de escolarização da atuação docente.
São feitos em reunião de módulo 2, extra-turno, quinzenalmente e os projetos se
realizam através dos níveis de ensino. Todos os professores do 1º ano se sentam
juntos, os dos 2º ano e, assim, sucessivamente. E ali são planejadas todas as ações e
metas do trabalho para o mês (Entrevistado 1).150
Ainda nessa direção, como detalhamento mais minucioso do planejamento das atividades uma
das supervisoras da escola expressa:
No início do ano letivo são reunidos os professores por ano do ciclo e feito um
planejamento anual que é acompanhado pelo supervisor. Durante o ano nós temos as
questões do módulo II que na escola acontece quinzenalmente. Na primeira
quinzena a gente prepara o planejamento mensal, feito também por ano do ciclo, são
agrupados por ano do ciclo e o planejamento semanal. A partir do planejamento
semanal o professor faz o seu planejamento de aula (Entrevistado 4).151
148
Na escola pesquisada, as reuniões de módulo são realizadas quinzenalmente, envolvendo toda equipe
pedagógica.
149
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
150
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
151
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012.
163
Em sentido macro observa-se que é organizado o planejamento anual com previsão do
conjunto de estratégias, conteúdos e metodologias de trabalho. Essa programação anual
orienta as reuniões de módulo II e a organização das propostas mensais e semanais, cuja
execução desdobra no plano de aula dos(as) professores(as), permitindo inferir que há uma
sequência lógica das atividades, com interlocução entre o contexto macro e micro, expresso
no plano de aula.
Enquanto expressão das dimensões operativas o plano de aula reflete a prática do PPP, as
atividades a serem vivenciadas pelos alunos em sala de aula, com interconexão entre as
dimensões macro e micro, cuja intenção consiste na vivência de experiências coerentes com
os ideais da escola.
Por outro lado, nas estratégias de planejamento adotadas pela escola para a vivência
comunitária do PPP fica ausente um sentido de participação direta da comunidade com
envolvimento de pais, representantes da sociedade civil e, especialmente dos alunos, na
constituição das propostas. Observa-se ainda, que a segmentação das atividades por ano de
escolarização, sem previsão de interlocução com o contexto global da escola, não favorece um
enfoque globalizante das dimensões curriculares.
Por outro lado, as atividades de flexibilização curricular são apontadas por (50%) dos
docentes como o principal fator que contribui para o desenvolvimento do PPP da escola,
seguidas da ações articuladas da comunidade escolar (35,72%), apoio dos órgãos do sistema
estadual de esnino (10,71%) e o sentimento de pertencimento da comunidade (3,57%). O
GRÁF 16 ilustra os valores encontrados.
164
GRÁFICO 16 - FATORES QUE CONTRIBUEM COM O
DESENVOLVIMENTO
DO
PROJETO
POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários
discentes
Se o currículo é o instrumento de concretude do PPP enquanto expressão das vivências
(MURTA, 2004) os processos de flexibilização das práticas pode ser visto como uma
possibilidade de maior participação da comunidade na construção de percursos compatíveis
com autonomia e exercício da vida cidadã pelos discentes. Assim, os processos de
flexibilização curricular diz respeito tanto ao acesso dos discentes aos conteúdos curriculares
quanto ao diálogo com as experiências comunitárias cidadãs.
A flexibilização curricular pode ser interpretada como uma estratégia de melhoria da
qualidade escolar e formação de atitudes proativas dos sujeitos para a vivência da vida social,
relacionando os saberes escolares e seu diálog com as experiências da comunidade. Enquanto
estratégia adotada pela escola, implica na construção de relações mútuas e indissociáveis com
a comunidade.
Os processos de flexibilização curricular presuspõe uma interação dos saberes escolares com
as experiências comunitárias, do diálogo com a comunidade escolar e educativa, perpassando
por atividades curriculares e/ou extracurriculares que envolvem os sujeitos comunitários.
Se as redes sociais com codificação de conhecimentos tácitos favorece a interação e
cooperação entre os sujeitos, podendo ser situadas como inovações sociais (MACHADO,
2009), em termos escolares a flexibilização curricular pode ser vista como uma caminho de
diálogo entre conhecimentos escolares e experiências tácitas, entre os sujeitos comunitários e
165
a existência de uma colaboração nas atividades de trabalho, podendo sustentar práticas de
inovação social.
A tendência apontada pelos docentes é de modificação das práticas enquanto resposta
educativa as necessidades da comunidade, especialmente dos alunos: “os processos de
flexibilização curricular são adotados pela escola sempre que há necessidades de promover
mudanças nas práticas pedagógicas.” (Participante 8)152;
“é o Trabalho diferenciado, é
ensinar brincando, jogos pedagógicos, livros e revistas, tirar as filas, mudar as estratégias da
sala, sentar um junto com o outro” (Participante 9).153
Essa perspectiva é coerente com a LDB 9394/96 ao dispor que os métodos, técnicas, recursos
e espaços escolares podem ser modificados sempre que houver necessidade de atendimento
diferenciado dos alunos. Assim, os próprios jogos, brincadeiras e vivências sociais
oportunizadas pela escola de visitação a outros espaços (feiras, concursos, apresentações,
dentre outras) são estratégias de flexibilização curricular.
Por outro lado, não fica claro uma percepção sistemática e intencional dos sujeitos da
adaptação dos currículos para maior participação da comunidade, especialmente do diálogo
entre os saberes escolares e as experiências comunitárias associadas aos processos de
aprendizagem formal e não-formal154 na vivência do PPP. Apesar de acontecerem as
atividades na escola as sinergias entre esses processos não são maximizadas.
Quanto aos processos de mudança a tendência apontada pelos docentes é do envolvimento
coletivo da escola e seus profissionais, com a combinação de processos de participação direta
e representação.
Quando tem alguma coisa para mudar no currículo nunca é mudado sozinho pela
direção e equipe pedagógica. Os problemas são colocados em discussão para ver o
que pode ser feito. Há um estudo prévio das ideias e formação de uma comissão.
Depois do estudo pela comissão, há uma nova reunião para expor e acertar as
decisões finais (Participante 9).
152
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
154
Segundo (GOHN, 2006) a educação formal relaciona-se aos conteúdos previamente previstos e
desenvolvidos nas escolas e a educação não-informal aos saberes aprendidos pelo compartilhamento de
experiências, principalmente em espaços e ações coletivas.
153
166
Os processos de participação direta envolvem a reflexão dos sujeitos sobre os problemas de
enfrentamento e encaminhamento coletivo de possíveis soluções. Segundo os mesmos as
possibilidades encaminhadas pelo grupo passam a ser estudadas por uma comissão de
representantes que assume a responsabilidade por uma análise detalhada da viabilidade das
propostas, constituindo a chamada participação representativa. De posse dos dados da análise
a comissão retorna as sugestões ao grupo para análise final e aprovação da proposta.
Há certo grau de reciprocidade entre os processos de mudança, especialmente das práticas
curriculares, com as dimensões democrático-participativas de gestão, envolvendo os
profissionais da escola e a combinação de formas de participação (direta e representativa).
Tais aspectos são favoráveis à existência de possibilidades autogeradas nas práticas do PPP.
Por outro lado, persiste lacunas relativas ao envolvimento direto dos alunos nesse processo de
mudança, especialmente do estímulo a esses sujeitos em formar comissões entre os pares e/ou
conjuntos (discentes e equipe pedagógica) para estudar possibilidades curriculares com maior
nível de aderência às práticas comunitárias. Assim como, o envolvimento mais amplo da
comunidade escolar (pais) e mesmo da comunidade educativa (representantes da sociedade
civil, representantes de associações, representantes de instituições, vizinhança, dentre outros)
nesse processo.
A ausência de processos ampliados de mudança remete à própria forma com que os
profissionais da escola, nesse caso os docentes, concebem a participação da comunidade,
relacionada mais à presença física do que como engajamento: “há um compromisso sim com
a comunidade dentro da escola por causa das participações, sempre que a gente convoca uma
reunião os pais estão presentes” (Participante 9).155; “Olha no final do ano quanto faz o
encerramento, os pais comparecem” (Participante 4)156. Assim, a concepção restrita do
sentido de participação, associada à presença física dos sujeitos, compromete a construção de
processos de mudança com o envolvimento ampliado dos sujeitos comunitários.
Quanto às reuniões, o sentido maior estaria em comunicar e/ou informar os pais sobre o
desempenho do(s) filho(s) na escola (notas, frequência, comportamento, etc.) do que
155
156
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
167
efetivamente estabelecer um processo de interlocução em que os pais efetivamente participem
da construção das propostas e, consequentemente, da vivência concreta do PPP.
Assim, os potenciais existentes na comunidade são pouco explorados nas estratégias de
planejamento e proposta de mudanças estabelecidas pela escola, especialmente as
possibilidades de articulação das experiências comunitárias, dos saberes tácitos com os
saberes escolares. Assim como do maior diálogo entre atividades curriculares e
extracurriculares para maior sinergia escola-comunidade, tendo como substrato a própria
experiência de vida dos sujeitos.
Assim a participação proativa da comunidade nas atividades extracurriculares e, ou mesmo,
nas práticas pedagógicas no interior da escola157 precisa estar associada a todas as etapas,
perpassando desde a concepção das ideias, ao planejamento participativo e execução
colegiada, tendo como substrato o poder de decisão e responsabilidades compartilhadas entre
os sujeitos.
157
Refere-se, por exemplo, à participação do SESC em oficinas pedagógicas (xadrez e artesanato) em âmbito do
Programa Alunos de Tempo Integral.
168
Unidade 9: Parcerias com a comunidade e sistemas de apoio
A intenção que vem sendo manifestada pela escola é de consolidação de uma rede de apoio
comunitária que contribua com a melhoria das práticas pedagógicas e de gestão da escola, a
partir de um conjunto de ações articuladas. “Quando a gente não consegue de imediato a
parceria com a família ou com o pai [...] acionamos o Conselho Tutelar. Têm as parcerias com
o conselho Tutelar, se tá acontecendo alguma coisa tem o CRAS também que ajuda. É uma
rede, um ajudando o outro” (Participante 9).158
Essa rede de apoio ao trabalho escolar requer o envolvimento tanto de instituições
pertencentes à comunidade escolar quanto educativa. Os dados apontam para uma
interlocução em curso na escola, especialmente com instituições pertencentes ao poder
público (Conselho Tutelar, CRAS, promotoria, Polícia Militar, UFVJM, Câmara Municipal
de Vereadores de Teófilo Otoni, Correios), sendo necessário aprofundar essas relações com a
participação de segmentos pertencentes à sociedade civil (SESC, Rede de Farmácia Indiana),
com a vizinhança da escola, familiares e pais.
Visa ampliar as vivências qualitativas das práticas do PPP em suas dimensões gestionárias e
pedagógicas. É uma estratégia conjunta (escola-comunidade) para enfrentamento dos
problemas associados à vulnerabilidade social dos escolares. É prevista no PPP por meio da
perspectiva de relacionamento escola-comunidade de mãos dadas, prevendo relações mútuos
e benefícios recíprocos entre os parceiros.
Escola e Comunidade de Mãos Dadas – Através deste projeto a escola apóia ações
de entidades e associações comunitárias que atendem crianças e adolescentes da
comunidade, sendo também apoiada em suas atividades por estas. É uma parceria
que tem como objetivo maior o cuidado e atendimento às crianças e adolescentes
carentes da comunidade, especialmente os que vivem em situação de risco social
(PROJETO POLÍTÍCO-PEDAGÓGICO, 2012, p.30)
As principais em curso são a abertura da escola a participação da comunidade, divulgação do
trabalho escolar (seminários, apresentações, exposições), visita às instituições estratégicas
(SESC, UFVJM, Correios, dentre outras) e participação dos profissionais da escola em ações
diversas na comunidade (feiras, concursos, apresentações, desfiles, dentre outras).
158
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
169
Essas parceiras oportunizam a escola desenvolver uma programação cultural, recreativa,
esportiva e de lazer diversificada. Assim como, abordar temas importantes para a melhoria da
qualidade de vida da comunidade.
Esse ano de uma forma bem bacana fizemos um planejamento desde o início do ano
através de oficinas de lazer, de recreação e cultura. São para os alunos da escola,
para os pais dos alunos da escola e para os profissionais da escola. Então nós temos
a rua de Lazer periodicamente dentro da escola que atende aos alunos e à
comunidade, no dia da rua de lazer nós temos atividades de oficinas culturais,
oficinas de artesanato, brincadeiras com as crianças. Tem a culminância com a
saúde, onde pessoas da área da saúde, do posto de saúde, fazem exames médicos
(aferir pressão, controle de glicose, glicemia e outras coisas) [...] termos parceria
com nutricionistas que dão palestras sobre uma alimentação saudável, atividades
com educadores físicos que fazem exercícios matinais, não só com os alunos, mas
também com professores e os pais (Entrevistado 3).159
As sinergias com a comunidade educativa produz uma maior interação e riqueza de vivência
dos sujeitos, um avivamento dos espaços escolares, especialmente nos finais de semana. É
por meio do envolvimento nessas atividades que a escola vai se tornando um espaço de
referência comunitária, maximizando suas possibilidades de ser expressão dos processos
compartilhados, com maior descentralização do poder de decisão.
Assim o interesse e envolvimento da comunidade nas atividades socioculturais é um passo
fundamental para aproximação da comunidade escolar. É necessário, no entanto, avançar em
direção aos processos participativos engajados, nos quais a comunidade deixe o papel de
coadjuvante, de apenas estar presente nas atividades, para assumir um papel proativo na
construção das propostas.
A escola sempre que promove uma atividade está envolvendo a família, as
atividades realizadas pelo SESC na escola , bordado, pintura, aferir pressão, glicose,
são referências para as famílias. Então a família se prepara para esse dia. As
festinhas de comunidade, a escola sempre promove alguma coisa para que a
comunidade possa ser bem atendida, para que a comunidade se sinta acolhida
(Entrevistado 4).160
É necessário que a escola perceba que a aproximação e acolhimento da comunidade é uma
etapa inicial dos processos participativos, demandando avançar na proposição de práticas
autogeradoras em que a comunidade efetivamente participe de todas as etapas com poder de
decisão. Esse aprofundamento é necessário, seja pela participação direta dos sujeitos na
concepção e programação das propostas, na formação de comissões comunitárias
159
160
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012.
170
responsáveis pela definição da programação cultural e submissão à(s) assembleia(s) geral(is)
ou pelo compartilhamento das propostas em seminários de práticas, dentre outras.
Outra estratégia de maior aderência da escola à comunidade nas práticas do PPP são as visitas
feitas às instituições da comunidade escolar e educativa. Essas visitas têm a intenção de
oportunizar, principalmente aos alunos, processos significativos para a formação humana e
pedagógica.
São feitas, ainda, visitas dos profissionais da escola às famílias dos alunos, na intenção de
conhecer melhor a realidade dos alunos com dificuldades (assiduidade, dificuldades de
aprendizagem, agressividade, dentre outras) no percurso escolar: “A comunidade tem acesso à
escola, mas a gente também tem acesso à comunidade. Se a gente solicita à comunidade, e o
pai ou a mãe não comparecem, nós vamos até eles. Não temos nenhuma dificuldade de chegar
até uma casa, a um pai, a um bairro” (Entrevistado 3).161
As visitas refletem uma preocupação e sensibilidade da escola de entender o aluno como
sujeito da escola, quais são as suas dificuldades e que adequações são necessárias para o seu
atendimento e garantia do seu sucesso escolar.
A escola quando constata uma ausência de um aluno por um período prolongado,
quando ela depara com uma dificuldade que o aluno vem trazendo em se tratando do
familiar, do emocional, a escola percorre até a casa desses familiares para estar
conversando, para saber o que está acontecendo com essa família e tenta ajudar da
melhor maneira possível (Entrevistado 1).162
Essa preocupação da escola em visitar os alunos com dificuldades, de conhecer a sua
realidade específica e de tentar estabelecer estratégias pedagógicas mais compatíveis com as
suas necessidades pode ser vista como uma perspectiva autogeradora das práticas do PPP.
Quanto ao coral a posição dos profissionais da escola é de apoio à inciativa, especialmente
quando são realizadas as apresentações em instituições pertencentes à comunidade educativa:
“A escola me dá todo apoio. Sempre apoiou, das direções anteriores à diretora atual. Sempre
que eu preciso de qualquer coisa eu a procuro.” (Entrevistado 2).163
161
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
163
Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
162
171
O apoio da escola consiste na flexibilização das atividades pedagógicas (recuperação de
conteúdos) dos alunos que estão participando das apresentações e manter uma disponibilidade
de profissionais para acompanhar as apresentações com o regente do coral: “Quando a gente
sai, eles acompanham porque são muitas crianças. Nunca que eu dou conta de olhá-las
sozinhas. Então sempre vão dois, três, quatro funcionários para me ajudar” (Entrevistado
2)164.
Unidade 10: Organização dos tempos, espaços e práticas pedagógicas
Em relação a modificação dos tempos e espaços para atendimento às necessidades do PPP da
escola registram-se os seguintes resultados: 96,43% dos docentes afirma que os mesmos são
suficientes no atendimento do PPP contra 3,57% que consideraram ser insatisfatórios. O
GRAF. 17 ilustra os resultados encontrados.
GRÁFICO 17 - OS TEMPOS E ESPAÇOS EM
ATENDIMENTO AS NECESSIDADES DO PROJETO
POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários
docentes
Ainda que todos os docentes tenham apontado a sua satisfação e/ou insatisfação quanto aos
tempos e espaços escolares no atendimento às necessidades do PPP, quando se analisa a parte
discursiva da questão, constata-se que 64,28% eximiram-se de registrar qualquer justificativa
para a opção assinalada. Entende-se que a ausência de justificativa sinaliza com uma falta de
164
Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
172
clareza dos educadores das possibilidades e/ou limites dos tempos e espaços escolares na
construção do PPP.
Quanto aos 35,72% dos docentes que construíram uma justiticativa para a questão, as duas
tendências principais foram o/a:
1) Caráter coletivo na vivência da proposta nos tempos e espaços escolares: reuniões com
professores e pais dos alunos (Q3/Q9/Q14)165; colaboração da direção, professores e alunos
para o desenvolvimento efetivo do PPP (Q22).
2) Preocupação de articulação do PPP com a realidade vivida pela escola nos tempos e
espaços escolares: ações organizadas em atendimento às necessidades do PPP (Q15);
construção do PPP, de acordo com a realidade da escola (Q17/Q19); o PPP é sempre
reformulado para atender às necessidades dos alunos (Q26).
As respostas apontam para um nível de interação coletiva da comunidade na organização dos
tempos e espaços, expresso em reuniões, encontros, dentre outros, momentos de (re)
construção das práticas. Reaparece ainda, a ideia de colaboração dos sujeitos coletivos, em
articular estratégias nos seus espaços de vivência de ações pela comunidade escolar.
Ainda que essas referências sejam importantes para a compreensão das dimensões
autogeradoras do PPP nota-se uma ausência de aprofundamento das justificativas quanto as
questões pedagógicas de modificaçções
dos tempos e espaços para participação da
comunidade.
Retomando a ideia de Murta (2004), das dimensões curriculares como concretude do PPP,
entende-se que sua organização é histórico-social e envolve a participação dos sujeitos
comunitários, sendo uma possibilidade de superaraçaõ dos modelos acríticos e tecnicistas de
organização. Nesses viés as condições democrático-participativas de organização dos tempos
e espaços é uma condição necessária para a existência de processsos inovativos em seu caráter
autogerador.
Nesse sentido, enquanto estratégia de ação pedagógica a reorganização dos tempos e espaços
implica em construir possibilidades concretas de apropriação autônoma dos discentes dos
165
Os questionários foram organizados em ordem alfabética e numerados de 1 a 28 para análise da parte
discursiva das questões.
173
processos escolares. Em sua amplitude, perpassa pelo reconhecimetno dos processos de
diálogo escolar, seja em ciclos de debates em sala de aula ou participação discente em
atividades extracurriculares (exposições, apresentações etc).
Assim, é fundamental a
mobilização de estratégias pedagógicas que respeitem os alunos em sua diversidade,
valorizando a participação dos sujeitos na (re)construção da dinâmica histórico-social dos
diferentes espaços e tempos escolares.
Por outro lado, para os docentes a modificação nos tempos e espaços escolares são vistos
como aspectos diretamente relacionados aos limites impostos pela estrutura física166 da
escola, sendo descritas ações de acessibilidade (rampas, adaptação dos banheiros, dentre
outras) para atendimento dos alunos do Projeto Incluir e a cobertura da quadra para a
realização das aulas práticas de Educação Física: “Ao falar de inclusão, a gente tem
dificuldades por causa do prédio antigo [...]” (Participante 7).167; às vezes tá chovendo ou o
sol está muito quente o professor de Educação Física não consegue ir para a quadra. Aí ele vai
para a biblioteca, ele faz bingo na sala de aula com os alunos” (Participante 1).168
As modificações nos tempos e espaços estão diretamente relacionadas aos desafios impostos
pela estrutura física, exigindo adequação e compatibilização das práticas à realidade estrutural
da escola. Assim, é com o olhar nas condições físicas concretas que os docentes estabelecem
as estratégia de vivência do PPP e suas aproximações com a comunidade.
Desse modo a perspectiva de suficiência dos tempos e espaços escolares estaria relacionada à
visão docente de que o PPP, enquanto uma proposta coletiva da escola é construído com o
olhar na própria realidade e das suas vivências dos sujeitos, tendo como horizonte aquilo que
é passível de realização imediata.
Sem dúvida esse é um aspecto importante, principalmente quando se considera que as
dimensões autogeradores do PPP estão relacionadas à sua prática efetiva. Por outro lado, a
perspectiva autogeradora implica também na função projetiva, de transformar o campo
instituinte em instituído (GADOTTI, 2004).
166
Ainda que a comunidade preserve a estrutura física da escola, a mesma funciona em um prédio alugado
pertencente à entidade jurídica Mitra Arquidiocesana de Teófilo Otoni. São poucos os investimentos do Estado,
para adequação do prédio às necessidades do alunado, já que o mesmo não é patrimônio do Estado.
167
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
168
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
174
Assim, o diálogo com uma nova perspectiva instituinte implica em assumir os desafios de
transformação da escola, dos seus tempos e espaços de vivência, das questões pedagógicas e
gestionárias e, consequentemente, de mobilização para a transformação da própria estrutura
física para além dos limites das possibilidades concretas. Em uma perspectiva autogeradora,
pressupõe repensar a forma como são construídas as relações dos sujeitos nos tempos e
espaços como possibilidade para a vivência das dimensões societária do projeto democráticoparticipativo.
Demanda um pensamento reflexivo e criativo dos sujeitos relativo à sua práxis, das
possibilidades de articulação de tempos processuais e espaços interativos169 para vivência das
práticas do PPP em seu sentido autogerador, enquanto produto das relações históricas e
sociais vivenciadas pelos sujeitos.
Assim, ao invés das práticas de gestão ou pedagógicas serem adequadas aos espaços e
tempos, pode-se pensar na modificação dos tempos e espaços para atendimento às demandas
histórico-sociais dos sujeitos na vivência do PPP. Os fundamentos para a mudança estão
relacionados à própria dinâmica e função projetiva do PPP, enquanto processo inconcluso de
diálogo com novos campos instituintes.
Há o risco de os docentes, ao apontarem a perspectiva das ações curriculares adequadas à
realidade dos tempos e espaços da escola, reduzirem o PPP apenas a vivência da realidade
concreta, sem diálogo com os novos campos instituintes. O ideal é pensar na realidade campo
instituído, tendo como contraface ao que se deseja construir, campo instituinte. A concepção
docente centrada apenas no campo instituído do PPP, sem diálogo com o campo instituinte,
pode comprometer os desafios da mudança, seu caráter processual e dinâmico, enquanto
construção possível.
Para Hernández et al (1998), uma perspectiva transgressiva na organização dos projetos de
trabalho é necessária, no sentido de que os processos de mudança promovam rupturas com as
práticas instituídas, como condição necessária para a existência de novos processos
169
Ainda que o PPP tenha como referência as condições concretas dos tempos e espaços escolares, campo
instituinte, a existência de pinturas no pátio da escola (jogos, letras do alfabeto, desenhos) indicam uma relação
mais interativas dos sujeitos como os referidos espaços.
175
inovativos. É nesse sentido, que os tempos e espaços demandam serem pensados como
construção histórico-social dos sujeitos que em sua prática concreta lança luz em relação às
questões futuras.
Na prática do PPP da escola, nota-se que existem processos de apropriação discente dos
espaços (biblioteca, auditório, sala de aula, pátio, sala de informática, dentre outras) de forma
mais processual, assim como formas de lidar com o tempo de maneira mais interativa,
expresso pelos projetos pedagógicos de trabalho. Podem ser mencionadas as atividades de
convivência social realizadas toda semana no pátio e as apresentações conjuntas, envolvendo
professores e alunos170.
O que eu admiro muito é a interação do professor com o aluno no decorrer das
apresentações dos projetos, apresentando junto com o aluno. Dia do circo, o
professor apresenta junto com o aluno, festa junina da mesma forma, professor
interage mesmo, trabalha junto com a criança (Participante 2).171
É necessária uma maior consciência docente do significado dessas atividades na vivência de
relações interativas nos tempos e espaços escolares. Nota-se que as iniciativas existem, seja
por meio de projetos de trabalho ou de atividades de convivência coletiva, sendo mediatizadas
no diálogo entre a realidade e o que se deseja construir nos tempos e espaços, enquanto
apropriação dos sujeitos históricos e sociais.
A vivência das práticas pedagógicas no interior da escola demanda um nível de articulação e
coerência entre o projeto de educação desejado e a vivência concreta da escola, isto é, as
sinergias entre o marco de educação desejado e as dimensões operativas concretas. Assim,
sua vivência autogeradora é expressa no conjunto de relações praticadas no ambiente escolar.
Obviamente, o modelo democrático-participativo ao ter como marco legal estruturante a
LDBEN 9394/96 apoia-se nos princípios da liberdade de ensino.
As possibilidades de coexistência de diferentes concepções e métodos de ensino previstas na
LDB 9394/96 favorecem a existência de inovações nas práticas pedagógicas do PPP, do seu
caráter autogerador para maior participação da comunidade, na medida em que apoia e
respeita os sujeitos em sua diversidade.
170
A perspectiva de o professor apresentar junto com os alunos atividades no pátio e/ ou auditório também
aparece no grupo focal discente.
171
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
176
Por outro lado, uma maior sinergia escola-comunidade implica no diálogo entre práticas
pedagógicas do PPP e realidade comunitária, desenvolvendo a consciência crítica dos sujeitos
das suas demandas e necessidades de transformação da realidade, num processo de
aproximação e reflexão da realidade, produzindo transformações em consonância com as
expectativas dos seus sujeitos.
Esse movimento de reflexão (re)construção das relações pedagógicas tem como fio condutor a
realidade concreta e as estratégias buscadas pelos sujeitos de enfrentamento dos problemas,
especialmente de superação dos ranços de uma educação bancária, centrada na transmissão de
conhecimento, relações fragmentárias e
na cisão do diálogo escola-comunidade ao
desconsidera as experiências dos sujeitos comunitários (FREIRE, 2004).
Num perspectiva de práticas pedagógicas interacionistas172, muitas soluções para os
problemas estão na própria comunidade, na forma como diariamente constrói suas estratégias
de enfrentamento dos desafios. Isso pressupõe admitir uma predisposição dos sujeitos para
uma dinâmica autogeradora de vivência das práticas pedagógicas do PPP, para a construção
de processos inovativos endógenos, sustentados nas aspirações da própria comunidade.
Ao percorrer as dimensões operativas das práticas pedagógicas da escola verifica-se que para
os discentes, o espaço escolar com maior afinidade (categoria 15) consiste na quadra
(51,19%), sendo mencionados em menores valores percentuais a sala de aula (21,42%),
biblioteca (11,9%), o laboratório de informática (4,76%), o pátio (4,76%), a cantina (2,38%),
a direção/secretária (1,19%), o auditório (1,19%) e ausência de marcação (1,19%). O GRAF.
18 retrata os valores percentuais encontrados.
172
Entendidas como aquelas práticas que valorização o diálogo e potencial dos sujeitos escolares na construção
de soluções endógenas aos problemas enfrentados.
177
- ESPAÇOS ESCOLARES
AFINIDADE DISCENTE DE PARTICIPAÇÃO
GRÁFICO
18
COM
MAIOR
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes
Ao apontar a quadra como espaço de maior afinidade participativa os discentes sinalizam para
a necessidade de maior vivência das dimensões173 procedimetais, do fazer educativo
associado a inteligência cinéstesico-corporal na escola. É perceptível que a vivência de
atividades lúdicas (jogos e brincadeiras) e de práticas esportivas nesses espaços estão
associadas ao prazer dos discentes de participar dessas atividades.
É importante que a escola valorize os espaços com maior possibilidade de envolvimento e
participação direta dos sujeitos e suas possibilidade de interação proativa dos sujeitos
comunitários explorando o movimento como uma dimensão para (re)construção do PPP em
sua perspecitva autogeradora. Isso envolve a criação de estratégias de valorização das
expressões corporais e reconhecimento do próprio movimento como parte de expressão da
participação em seu sentido autogerador.
Por outro lado, quanto aos espaços escolares com menor afinidade de participação discente, o
auditório (41,66%) é o principal local que os discentes não gostam de frequentar,
acompanhado da direção/secretaria (34,52%). Com valores percentuais menores, encontramse a sala de aula e o pátio, ambos com 5,95%; a cantina com 4,76%; a biblioteca e a quadra,
ambas com 2,38%; o laboratório de informática e ausência de marcação com 1,19%. O
GRAF. 19 representa os valores percentuais encontrados.
173
De acordo com os parâmetros Parâmetros Curriculares Nacionais Para o Ensino Fundamental (2001) os
conteúdos devem ser trabalhados nas dimensões conceitual, procedimental e atitudinal.
178
GRÁFICO 19 - ESPAÇOS ESCOLARES COM MENOR
AFINIDADE DISCENTE
de frequência
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes
Ainda que o auditório seja mencionado nos questionários como o espaço de menor afinidade
de participação discente essa perspectiva não se confirma no grupo focal onde são levantadas
dimensões de natureza qualitativa. Segundo os discentes, participantes do grupo focal, todos
os espaços pertencentes ao grupo focal são importantes e despertam o interesse dos mesmos.
Vale lembrar, que o auditório é um espaço de vivência que demanda maior expressão corporal
(teatro, dança, jogral, etc), participação direta e proatividade dos envolvidos.
Quanto a direção/secretaria a ausência de afinidade pode estar associdada aos ranços de uma
pedagogia tradicional em que historicamente eram vistos como locais de aplicação das
punições aos discentes. Sem desconsiderar a importância do caráter normativo, presente no
regimento escolar, uma dimensão societária de gestão implica em aproximar os discentes dos
processos participativos, reconhecendo esses espaços como importantes articuladores das
escola-comunidade, consequentemente dos próprios discentes.
Para os docentes a organização dinâmica dos tempos e espaços escolares está diretamente
relacionada às estratégias de ensino, sendo obtidos os seguites resultados percentuais:
explicação do professor e realização de atividades individuais em sala de aula (28,57%);
estudo orientado em sala de aula (25%); produção individual e coletiva (14,28%); dinâmicas
de trabalho em grupo (10,71%); jogos pedagógicos e brincadeiras em sala de aula (7,14%);
outras: conceitos no quadro, explicação e trabalhos em dupla com alunos dispostos em círculo
179
e semicirculo, aulas expositivas e interativas com atividades lúdicas (7,14%). O GRAF. 20
resgistra os respectivos valores encontrados.
GRÁFICO 20 - ESTRATÉGIAS DE ENSINO UTILIZADAS COM MAIOR
FREQUÊNCIA PELA ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes
A explicação do professor e organização de
atividades individuais, ainda que sejam
importantes, não podem ser vistas como mais adequadas para vivência autogeradora das
práticas do PPP e maior participação da comunidade. As atividades que fomentam o caráter
social e coletivo do aluno, estimulando o debate e a construção interativa dos processos, o
envolvimetno e a cooperação dos sujeitos apresentam maior grau de pertinência.
Essa é uma dimensão pedagógica que precisa ser revista já que as práticas centradas na
explicação do professor e desenvolvimento de atividades individuais dialogam com a tradição
pedagógica onde os docentes consideram detentores de um saber transmitido aos alunos, ou
seja, têm como princípio orientador a educação bancária. (FREIRE, 2004)
180
A centralização docente dos processos pedagógicos e a ênfase em atividades de caráter
individual consiste num descompasso entre práticas pedagógicas e a concepção e autoavaliação dos mesmos da participação comunitária, apontando lacunas na coerência entre a
prática concreta e as condições ideais. Ao reproduzir a lógica de organização gestionária
fragmentada essas estratégias não são as mais adequadas para a participação da comunidade já
que não favorecem as tendências autogeradoras do PPP e a valorização da participação
histórico-social dos sujeitos no enfrentamento dos desafios da realidade comunitária.
Assim, as estratégias de ensino frequentemente adotadas restringe as possibilidades de
vivência dos alunos de fundamentos da vivência cidadã, do desenvolvimento da sua
autonomia e proatividades com
as dimensões da vida comunitária. A centralização das
experiência pelos docentes é um limite ao diálogo das atividades curriculares e
extracurriculares em sitonia com os saberes tácitos presenes no seio da comunidade.
Por outro lado, para os discentes, as atividades que participam com maior frequência são os
trabalhos em grupo na sala de aula (57,14%). Em menores valores, foram descritos: a
explicação do professor e as atividades individuais em sala de aula (16,66%); o estudo
orientado em sala (7,14%); a leitura e a produção de texto individual e coletiva (4,76%); a
pesquisa na sala de informática (3,57%); os jogos pedagógicos e as brincadeiras em sala de
aula (3,57%); as dinâmicas de trabalho em grupo (2,38%); a anotação de conceitos do quadro,
seguida da explicação do professor (2,38%); a pesquisa na biblioteca 1,19% e o estudo de
vídeos (1,19%). O GRAF. 21 ilustra os respectivos valores.
181
GRÁFICO 21 - ESTRATÉGIA DE ENSINO QUE OS DISCENTES
FREQUENTEMENTE PARTICIPAM NA ESCOLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes
Enquanto para os docentes prevalecem a explicação do professor e as atividades individuais,
para os discentes são comuns os trabalhos em grupo na sala de aula. Essas diferenças estão
associadas a percepção dos docentes e discentes do que sejam atividades em grupo, sendo
para os primeiros atividades sistematizadas de acesso coletivo aos conteúdos curriculares e
para os segundos qualquer atividade que envolva contato entre os alunos. Por outro lado, vêse no grupo focal que os próprios docentes apóiam-se nas atividades coletivas para superar
dificuldades de aprendizagem: “É o Trabalho diferenciado
é ensinar brincando, jogos
pedagógicos, livros e revistas, tirar as filas, mudar as estratégias da sala , sentar um junto com
o outro” (Participante 9).
Quanto às modificações para serem produzidas na escola, para os docentes, a forma como são
trabalhados os conteúdos em sala de aula (35,71%) consistiria em prioridade. Em seguida,
aparecem os espaços disponíveis na escola, especialmente aqueles para o desenvolvimento de
atividades culturais e práticas esportivas (28,57%); os eventos e as atividades propostos pela
escola fora da sala de aula (25%); a forma de comunicação e a relação interna da escola,
especialmente entre professores e alunos (8,33%); e outros: cobertura de quadra e melhoria
dos espaços da escola (2,3%). O GRAF. 22 representa os respectivos valores.
182
GRÁFICO 22 - MODIFICAÇÕES PRIORITÁRIAS DA ESCOLA
SEGUNDO OS DISCENTES.
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários
docentes
Sejam as explicações do professor e os trabalhos individuais, ou mesmo, as atividades em
grupo em sala de aula, os dados remetem à necessidade de produção de modificações,
considerando o caráter inconcluso do PPP e a intenção de construir uma maior sinergia
comunitária.
Por outro lado, a produção de modificações está diretamente associada aos aspectos de uma
dada realidade que incomoda os sujeitos e precisa ser transformada. Nesse caso, a principal
mudança na escola estaria associada às metodologias e às relações construídas em sala de
aula. Os resultados obtidos chamam a atenção para duas questões instrinsicamente
relacionadas e fundamentais, que envolve a forma como são construídas as relações em sala
de aula e as metodologias e práticas pedagógicas adotadas.
Essas questões precisam de outras evidências que pemitam compreender se as práticas
pedagógicas orientam-se por uma perspectiva de trabalho dialógico, compromissado com as
transformações societárias de maior participação da comunidade ou, simplesmente, pela
manutenção das relações e reprodução de uma estrutura bancária.
183
Quanto às atividades extracurriculares desenvolvidas pela escola, nota-se que a maior
frequência são a organização de mostras culturais e/ou exposições para 75% dos docentes.
Em menores valores percentuais estão a organização de oficinas de teatro e/ou dança
(10,72%); os movimentos culturais na escola e extraescolar (7,14%); a organização de
gincanas ou eventos esportivos (3,57%) e a organização de visitas às instituições pertencentes
à comunidade (10,72%). Observe os valores retratados no GRAF. 23 a seguir:
GRÁFICO 23 - ATIVIDADES EXTRACURRICULARES,
SEGUNDO
OS
DOCENTES,
FREQUENTEMENTE
ORGANIZADAS PELAS ESOCLA
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes
Quanto aos discentes, as atividades de que participam frequentemente fora da sala de aula são:
organização de mostras culturais e/ou exposições (34,52%); organização de gincanas e/ou
eventos esportivos (27,38%); organização de oficinas de teatro e/ou dança (26,19%);
organização de visitas às instituições pertencentes à comunidade (9,52%); outras: participação
no coral (1,19%) e ausência de marcação da questão (1,19%). O GRAF. 24 ilustra os valores
obtidos na questão.
184
GRÁFICO 24 - PARTICIPAÇÃO DISCENTE
ATIVIDADES FORA DA SALA DE AULA
EM
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários
docentes
Os valores expressos pelos docentes e discentes, salvo diferenças percentuais, convergem
para a organização de mostras culturais e/ou exposições como atividades frequentemente
realizadas fora da sala de aula.
Essas atividades são importantes, já que favorecem a
interlocução com a comunidade, dialogando com questões sociais e culturais conectadas com
a vida comunitária. É importante compreender a forma como são desenvolvidos os valores e
níveis de adesão dos sujeitos comunitários.
É evidente que a organização de mostras culturais e/ou exposições demanda uma sinergia
com o trabalho desenvolvido pelos docentes e discentes em sala de aula, pressupondo uma
articulação entre as atividades curriculares e extracurriculares. Enquanto atividades de caráter
amplo, abertas à comunidade escolar e educativa, exigem um diálogo dos sujeitos com os
processos de mudança, reconhecendo novos tempos e espaços como possibilidades de
aprendizagem comunitária.
Percebe-se um esforço da escola em oportunizar aos alunos uma vivência interativa para além
da sala de aula, sendo desenvolvidas atividades no pátio, no laboratório de informática, na
biblioteca, na quadra e de visitas no próprio ambiente comunitário. Essas atividades fazem
parte de uma programação sistemática da escola, sendo semanalmente oportunizada aos
alunos a vivência de atividades em boa parte desses espaços.
185
A gente usa todos os espaços da melhor forma possível, a gente usa a biblioteca com
aula de vídeo e aula de biblioteca, usa o espaço da sala de computação com aula de
computação, os alunos têm durante a semana tanto a aulas de biblioteca quanto de
computação [...], têm a quadra onde acontecem as aulas de Educação Física [...], usa
o pátio para os auditórios, praticamente os auditórios acontecem no pátio, temos um
salão onde há eventos com os alunos e a comunidade [...] a escola procura utilizar
esses espaços da melhor forma possível (Entrevistado 3).174
Em geral a vivência dos espaços de participação coletiva corresponde à culminância mensal
dos projetos pedagógicas que são desenvolvidos em sala da aula como parte da programação
sociocultural da escola.
[...] conseguimos reunir todos os alunos no pátio e eles conseguem assistir às
apresentações dos colegas. Sentados, acomodados e mais do que isso, vivendo,
aplaudindo, felizes, cantando, participando desse momento, ele se torna
corresponsável pelo processo [...] Cada professora procura fazer um número artístico
mais próximo do tema trabalhado. Além de ter o envolvimento desses alunos tem o
envolvimento dos profissionais (Entrevistado 3).175
Esse sentimento de corresponsabilidade está associado à própria vivência discente dos
processos, do significado das atividades para sua formação, do potencial de penetrar no seu
interior e construir uma significação social da vivência concreta do PPP.
Muitas das atividades desenvolvidas pelos professores exigem um tempo mais processual e
espaços mais ampliados de vivência, extrapolando os limites da sala de aula: “Quando é uma
atividade que precisa explorar espaços mais amplos os professores levam os alunos para o
pátio, como em alguns jogos pedagógicos” (Entrevistada 1).176
A vivência proporcionada por essas atividades socioculturais, além de permitir a
(re)significação por parte dos alunos dos processos de vivência escolar, contribui com a
construção das relações mais processuais e interativas entre os sujeitos. Contata-se que a
organização dos projetos é uma possibilidade de romper com a organização disciplinar e
vivenciar ações mais conexas de caráter interdisciplinar,177 enquanto possibilidade de vivência
coletiva dos tempos e espaços escolares.
174
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
176
Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
177
A interdisciplinaridade pode ser entendida como uma atitude de cooperação dos profissionais na construção
de relações conexas de abordagem dos conteúdos.
175
186
Os projetos interdisciplinares de trabalho apresentam-se como uma alternativa possível de
vivência dos tempos e espaços de forma interativa e processual, com possibilidades de
diálogo com os processos pedagógicos e gestionários conexos. O aprofundamento dessa
perspectiva na escola demanda assumir os desafios de superação dos processos lineares de
organização, determinada por um viés mecanicista, em detrimento das dimensões sociais e
históricas da comunidade escolar como mais adequada para a vivência autogeradora do PPP.
As atividades extracurriculares, como as desenvolvidas no coral da escola, ao dialogar com
instituição pertencentes a comunidade educativa cria também novos desafios à participação
dos alunos, assim como, reconstrói o próprio sentido de tempo e espaço educativo, exigindo
dos sujeitos
maior compromisso e corresponsabilidade coletiva situando para além da
vivência do tempo mecânico de vivência da hora-aula.
Nós temos ensaio todos os sábados de 8 às 10 horas da manhã. Para participar do
coral, eles têm que ser assíduos aos ensaios, porque durante o ano temos uma agenda
de convites. A gente apresenta nas faculdades, a gente apresenta em outras escolas
de primeira a quarta série. A gente apresenta também na prefeitura. É, como se diz,
a escola [...] tornou-se uma referência e em qualquer evento os alunos são
solicitados. Até nos correios os alunos fazem apresentação (Entrevistado 3).178
Essa vivência de tempos e espaços extrapolam os muros da escola expressando um condição
de flexibilização curricular que correlaciona com as próprias finalidades humanísticas e
pedagógicas do PPP permitindo aos alunos um conjunto de vivências da vida cidadã.
Ao demandar uma articulação entre as dimensões curriculares e extracurriculares requer um
trabalho associado dos sujeitos, envolvendo especialmente os desafios dos docentes de
articular as práticas curriculares formais com os processos de vivência social na escola. Por
outro lado, são oportunidades de aplicação, demonstração e desenvolvimento das capacidades
necessárias para a vida social em espaços e tempos mais amplos.
A organização desse diálogo curricular e extracurricular nas práticas pedagógicas de trabalho
permite uma organização dos processos conectados com a realidade externa e interna da
escola, na qual os alunos sejam sujeitos ativos (HÉRNANDEZ et al, 1998). É uma forma de
superação dos processos de fragmentação dos conteúdos curriculares, de estabelecer conexão
178
Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
187
da escola com a realidade comunitária, de base local e, ao mesmo tempo, com dimensões
globais.
Assim, as mostras e exposições podem ser vistas como uma primeira forma de aproximação
da comunidade, tanto na participação em atividades propostas pela escola, quanto nas
possibilidades de maior autonomia e proposição de uma programação, permitindo expressar
potencialidades presentes na própria comunidade a ser valorizadas no cenário escolar.
As mostras culturais e exposições permite também o diálogo entre comunidade escolar e
educativa numa perspectiva de relações ampliadas e transferência de resultados do trabalho
pedagógico de caráter sociocultural para a comunidade educativa, bem como, a constituição
de relações que favoreçam o fortalecimento do trabalho escolar.
O envolvimento dinâmico da comunidade nessas atividades pode ampliar o sentido da
participação na medida em que se constrói uma identidade escolar. É um caminho estratégico
de diálogo com setores da sociedade civil e de construção de uma rede de relações
colaborativas de vivência do PPP como possibilidades de vivência do poder compartilhado de
decisões.
188
Categoria 4: Dificuldades de maior participação da comunidade no Projeto PolíticoPedagógico
Unidade 11: Os desafios dos processos de mudança na escola
Enquanto processo inconcluso o PPP envolve os desafios projetivos de antecipar ações
futuras, numa tênue relação entre campos instituídos e instituintes, tendo como horizonte o
atendimento dos novos desafios da vida cidadã. (GADOTTI, 2004)
Quanto aos desafios de proposição de mudanças pedagógicas na escola há um equilíbrio entre
organização burocrática e hierárquica do trabalho escolar; o choque causado ao educador
quando ocorrem mudanças na educação; participação dos pais no processo de aprendizagem e
frequência nas reuniões (21,43%). Com valores percentuais intermediários situa-se a ausência
de significado concreto das mudanças para a prática pedagógica e a centralização das decisões
como limite a participação da comunidade escolar (17,86 %). Em menor escala de valor
observa-se a insegurança e a resistência dos profissionais quanto aos processos de mudança
das práticas pedagógicas (10,41%); ausência de marcação da questão (7, 14 %) e baixa
autonomia e liberdade concreta no exercício das práticas pedagógicas (3,57%). O GRAF. 25
retrata os valores percentuais encontrados:
GRÁFICO 25 - DIFICULDADES DA ESCOLA EM PROPOR
MUDANÇAS PEDAGÓGICAS
Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes
189
A análise da trajetória dos processos inovativos tem apontado que a organização burocrática e
hierárquica do trabalho escolar tem sido um dos principais fatores que dificultam a
emergência de processos inovativos endógenos (HÉRNANDEZ et al, 2000; CABONELL,
2002). Numa estrutura burocrática, as inovações são prescritas por equipes técnicas com
segmentação dos processos.
Quanto aos desafios das mudanças a organização hierárquica e burocrática do trabalho
escolar; o choque causado ao educador; a participação dos pais nas práticas pedagógicas e
frequência em reuniões são as principais dificuldades enfrentadas pela escola. Esses aspectos
são limites a participação sólida da comunidade, com envolvimento dos sujeitos em todas as
ações propostas.
Vê-se ainda uma contradição entre a forma como os docentes concebem e autoavaliam-se
diante dos processos participativos e as dificuldades enfrentadas pela escola relativa à
participação, especialmente quanto a organização burocrática da escola. Assim, as ações
relativas a perspectiva societária de gestão são, em muitos momentos, atravessadas por
condições intempestivas e prescritas, impostas por uma conjuntura sistêmica das políticas
educacionais. Essas mudanças ao ser definidas por equipes técnicas, materializa uma
perspectiva difusionista, limitando o sentimento de pertencimento dos sujeitos.
As mudanças que estão ocorrendo na educação criam um impacto [...]. O trabalho se
torna mais demorado, o professor fica inseguro em relação a tantas mudanças. As
reclamações são de que um dia se pede uma coisa e no outro dia, outra. Afirmam
que todo dia essa secretaria manda uma coisa, a gente vai fazer, mas não sei se vai
dar tempo. De acordo com o tempo que a secretaria está pedindo para a gente
(Entrevistado 4).179
Vê-se que esse medo é muito mais um processo de resistência dos docentes às mudanças
prescritas pela SEE/MG que interferem diretamente na sua práxis pedagógica. Consiste numa
manifestação da insatisfação as questões intempestivas de organização das políticas
educacionais típicas da perspectiva difusionista, da ausência de um tempo de maturação das
propostas na estreita relação entre SEE/MG, escolas e comunidade escolar.
179
Supervisora da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012.
190
Ainda que sejam manifestadas intenções de vivências autogeradoras das práticas do PPP a
existência dessas características aponta para a coexistência de diferentes perspectivas de
gestão ( societárias, burocráticas e gerenciais) no interior da escola.
Mesmo que um modelo de gestão dificulte a emergência de processos inovativos no PPP para
maior participação da comunidade é necessário reconhecer que, na prática concreta, os
sujeitos podem buscar estratégias de ação compatíveis com sua maior proatividade
comunitária como contraponto aos processos verticalizados e prescritos.
O caráter proativo dos sujeitos é uma condição importante para enfrentamento dos processos
centralizados e verticalizados de mudanças, permitindo dialogar com campos instituintes
compatíveis com a realidade comunitária. Nesse sentido, o choque causado ao educador pelas
mudanças verticalizadas, demanda dos sujeitos consciência das possibilidades do grupo na
sistematização de ações de enfrentamento do problema.
Se considerarmos as ações difundidas pela SEE/MG, por meio da SRE de Teófilo Otoni,
situam-se em âmbito da comunidade educativa, esse é um importante desafio a ser enfrentado
pelos sujeitos na intenção de reconstrução das práticas e valorização do potencial autogerador
de caráter local180.
Ainda em relação aos impactos das prescrições verticalizadas dos processos inovativos a
supervisão escolar descreve a experiência do PROALFA.
[...] o volume de material que chegou para o PROALFA foi num espaço de tempo
muito curto. Antes de terminar de aplicar aquela apostila, chega outra apostila e
chega outra, então foram umas quatro apostilas seguidas. Então é um volume de
material muito grande, que dificultou o trabalho do professor, até mesmo da
coordenação pedagógica do supervisor (Entrevistado 4).181
Obviamente essas mudanças estão associadas a uma perspectiva de gestão gerencial, com
adequação dos princípios da administração empresarial à escola. Como se vê, um dos focos
principais é a proficiência discente em processos avaliativos externos (ARAÚJO; CASTRO,
180
A corresponsabilidade dos sujeitos com o espaço de vivência local em ações de interesse público pode ser
vista com um prática orientada pela perspectiva da gestão social e base para o desenvolvimento local.
181
Supervisora da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012.
191
2001). O exemplo ilustra como essas estratégias são programadas182 e determinadas nas
escolas sem a participação dos sujeitos na concepção e organização dos processos.
Processos gestionários dessa natureza implicam em fissuras nas dimensões de organização
societária do PPP, em especial no envolvimento e articulação dos profissionais. Nota-se que o
supervisor, enquanto articulador das ações pedagógicas tem que estabelecer uma interlocução
com os professores relativa a processos dos quais não houve compartilhamento de objetivos,
concepção e planejamento das ações.
O modo de condução dos processos verticalizados183 gera resistência dos professores,
enquanto principais sujeitos envolvidos com a prática pedagógica e, consequentemente com
os processos de mudança.
Assim, não favorece a articulação desses profissionais na
construção de ações comuns ao grupo, relacionadas às dimensões histórico-sociais dos
sujeitos.
182
Mencionamos no capítulo 2 que os programas e estratégias são programados por equipes técnicas para o
alcance da chamada eficiência na gestão e práticas pedagógicas.
183
Como vimos são propostas de inovações prescritas por equipe técnicas, de cima para baixo, sem
envolvimento efetivo dos sujeitos na programação das mudanças.
192
Unidade 12: A percepção da escola da participação dos pais
Quanto a participação dos pais a ênfase dada pelos docentes no grupo focal são os problemas
de desestruturação das famílias, sendo muitas crianças criadas pelos avós184.
Sempre 20%, 10% dos pais não participa da escola. Olha têm dois meninos aqui na
escola que o pai está preso em uma cidade e a mãe que, já tinha três filhos, teve
outro bebê e depressão pós-parto. Ficou louca e a avó de quase 70 anos pegou essas
crianças para cuidar. É uma dificuldade que a gente tem é de trazer essa avó e esse
avô para dentro do escola com essas crianças (Participante 9).185
As crianças criadas pelos avós refletem um modelo de organização familiar atual demando da
escola atenção a essa nova realidade na organização das suas práticas pedagógica e de gestão.
Essa reorganização das famílias esta associada principalmente ao cenário social vivenciado
atualmente (pais presos, abandono dos filhos pelas mães viciadas, assassinato do(s) pai(s),
acidentes no trânsito, dentre outros).
Por outro lado, não há uma relação direta entre crianças criadas pelos avós e incapacidade
intelectual e física dos mesmos de acompanhar a vida escolar do(s) neto(s). Em muitos casos,
podem ser até mais zelosos com o(s) neto(s) do que os próprios pais, inclusive no
acompanhamento escolar. Além disso, os avós podem ter maior disponibilidade de tempo,
bem como, interesse em se envolver nos processos de participação escolar, deixando suas
experiências a serviço da comunidade.
Assim como, não se pode negar que em alguns casos existe problemas relativos à participação
dos avós no acompanhamento do(s) neto(s) associados às dificuldades de locomoção,
reduzindo sua presença física na escola, ou mesmo, diferenças associadas aos anos de
frequência regular à escola, impõe dificuldades de acompanhamento das prática pedagógicas
do(s) neto(s).
Essas mudanças na estrutura familiar demandam dos profissionais da escola repensarem
novas possibilidades de reorganização das práticas pedagógicas e de gestão do PPP,
considerando que a realidade da comunidade escolar é diversa e exige estratégias
diferenciadas para maior participação da comunidade. São necessárias modificações na
184
De acordo com o IDF – Índice de Desenvolvimento das Famílias, crianças criadas pelos avós aumenta a
vulnerabilidade social das famílias.
185
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
193
própria percepção docente dessas formas de organização familiar no diálogo com novos
campos instituintes: “Sempre em uma sala tem dificuldades sim. Tem aquelas crianças que
diante da grande desestruturação e diferença familiar fica difícil trabalhar” (Participante 7).186
As dificuldades de trabalho mencionadas estão associadas ao comportamento social das
crianças e a falta de acompanhamento das atividades pela família. Muitas crianças apresentam
desvio de comportamento, com dificuldade de assimilar as regras de convivência social. A
principal reclamação docente consiste na falta de acompanhamento, de ajudar aos filhos(s)
e/ou neto(s) na realização das atividades em casa.
Para os discentes os problemas associados ao comportamento social são uma das principais
dificuldades para fortalecer os processos participativos na escola: “o respeito dos colegas com
os professores. Às vezes tá fazendo alguma coisa errada a professora corrige e ele xinga a
professora. Aí às vezes dá ocorrência.” (participante 21)187; “A falta de respeito de alguns
colegas em relação aos outros e aos professores” (Participante 18).188
A principal forma apontada pelo grupo discente para resolver o problema da indisciplina é o
diálogo: “A professora conversa primeiro com os alunos, depois tia chama os pais.”
(participante 16). Percebe-se que o diálogo perpassa por uma reflexão do ato cometido, tendo
como propósito principal despertar a consciência discente de formas mais adequadas de
conduta social. Ainda, segundo os mesmos, nas situações mais graves os pais são convocados
e pode haver registro de uma ocorrência do aluno.
Retomando a questão de acompanhamento das atividades pedagógicas dos filhos observa-se
que não consiste em um problema isolado e envolve a grande maioria dos discentes da escola.
O próprio balançar da cabeça dos docentes, em sinal de concordância com o que estava sendo
relatado pelo(a) professor(a), indica que o problema abrange a escola como um todo.
O acompanhamento do filho não acontece com aquela preocupação de ensinar. Que
a criança aprenda. A maioria das crianças chega sem tarefa de casa [...]. O professor
tem que desdobrar aqui para alcançar resultados. O tempo integral tá suprindo muito
essa questão. Só que o vazio, aquela falta de ajuda do pai, não tem nada que
substitui. Mas a credibilidade tem muita, eles gostam da escola, eles participam da
escola, eles participam desses eventos. Mas, no dia-a-dia, na tarefa de casa, no
186
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
Discente participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 04/10/2012.
188
Discente participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 04/10/2012.
187
194
acompanhamento do aprendizado não. Até porque eles não têm nem essa
capacidade, conhecimento [...] (Participante 7).189
As dificuldades190 dos pais de acompanhamento das atividades escolares dos filhos é um
aspecto recorrente nas entrevistas:
às vezes sentimos um pouco de omissão por parte de alguns pais quanto à
aprendizagem dos alunos. Certa dificuldade de estar ajudando na aprendizagem do
menino (Entrevistado 1).191
As dificuldades que muitas vezes encontramos é de alguns pais, poucos pais, que
não reconhece que precisam participar da vida do filho. Quantas vezes deixam de ir
numa reunião, afirmando que a escola pode caminhar sem a sua presença
(Entrevistado 4).192
Para os docentes, a ausência de acompanhamento dos pais nas atividades pedagógicas dos
filhos associa-se ao fato de serem, em sua grande maioria, analfabetos. Obviamente o
analfabetismo implica em restrições aos pais, especialmente no acompanhamento das
atividades curriculares dos filhos, na articulação dos saberes tratados pela escola com os
conhecimentos e experiências dos sujeitos.
Por outro lado, a inexistência de acompanhamento das atividades pedagógicas dos filhos está
associada também ao próprio sentido de participação que vem sendo construído pela escola,
situado mais no nível da presença física do que como engajamento. Assim, para muitos pais,
participar é sinônimo de presença física em reuniões e eventos promovidos pela escola, sem
se comprometer com as ações e resultados.
Para assegurar maior participação da comunidade nas práticas do PPP esse é um dos desafios
que a ser enfrentado pela escola, considerando que a ausência de envolvimento dos pais nas
atividades pedagógicas compromete a qualidade do ensino (PARO, 2000).
Mesmo diante das restrições de apoio às atividades curriculares dos filhos, crê-se que formas
alternativas de acompanhamento podem ser canalizadas, de modo a permitir um papel
proativo desses sujeitos no acompanhamento da vida escolar dos filhos, preocupando-se com
o seu dia a dia na escola, assim como em relatar sua própria experiência de vida.
189
Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012.
Conforme descrição feita no grupo focal docente.
191
Supervisora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012
192
Supervisora da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012.
190
195
Por outro lado, os profissionais da escola em parceira com a comunidade educativa podem
viabilizar uma reflexão com os pais das possibilidades de aproximação e acompanhamento
das atividades curriculares trabalhadas pela escola, apoiados em reuniões, seminários, grupos
de reflexão, palestras, dentre outras atividades. Assim como estabelecer estratégias de
abordagem dos conteúdos em diálogo com às experiências tácitas presentes na comunidade
que permitam uma maior participação dos pais.
O acompanhamento dos pais das atividades pedagógicas desenvolvidas pelo(s) filho(s) é
fundamental, pois favorece a articulação entre saberes escolares e experiências tácitas,
componentes curriculares e extracurriculares. Refletir sobre as possibilidades de uma
participação mais proativa dos pais nas práticas pedagógicas é fundamental para o
fortalecimento dos processos de participação engajada, onde coexista compartilhamento de
responsabilidades entre pais-escola para o alcance do sucesso pedagógico da escola. Esse
envolvimento dinâmico é fundamental para construção de práticas pedagógicas colaborativas
sintonizadas com as experiências da comunidade e potencialmente aptas à uma maior
interlocução discente.
Uma dessas possibilidades estaria no próprio diálogo entre saberes escolares e experiências de
vida (saberes tácitos) da comunidade, valorizando a autonomia e identidades do sujeitos na
construção de uma práxis educativa capaz de articular as dimensões concretas (realidade) e as
expectativas (desejo) pelas condições concreta vivenciadas pela escola.
196
Unidade 13: Preparação profissional para as vivências comunitárias
O diálogo entre as experiências comunitárias e o saberes tratados pela escola demanda uma
formação dos profissionais em sinergia com a realidade local com maior sensibilidade no
reconhecimento de dimensões históricas e socioculturais próprias da comunidade escolar.
Requer ainda, valorizar os sujeitos escolares em sua diversidade de experiências e
expectativas.
É preciso que o profissional esteja preparado para lidar com a educação. A educação
é em longo prazo, então ele precisa estar estruturado, com bastante conhecimento.
Ele precisa ser um profissional estudioso em todos os sentidos para ele poder se
completar como ser humano e entender as diferentes realidades de cada criança [...]
(Entrevistado 3).193
Ainda que para os docentes a principal finalidade do PPP seja a capacitação dos profissionais
em serviço e que exista estratégias de capacitação sustentadas em iniciativas da própria escola
(palestras, seminários, rodas de conversas, dentre outras) ou em iniciativas da SRE de Teófilo
Otoni, persiste lacunas no diálogo dessas estratégias com as experiências comunitárias.
Entende-se que a ausência de uma formação mais sistemática, em sintonia com as próprias
experiências comunitárias, dificulta a compreensão das práticas do PPP como possibilidade de
maior participação da comunidade. Assim como, as possibilidades de maximização das
sinergias entre as atividades curriculares e extracurriculares, de aproximação dos saberes
escolares aos saberes tácitos.
Ainda que haja apoio da comunidade educativa, a principal dificuldade encontrada para a
continuidade das atividades é a falta de financiamento da experiência que permita ao grupo
participar, assim como de promover encontros entre corais com estímulo à própria
experiência. Às vezes, faltam recursos para questões básicas necessárias à sustentabilidade do
grupo.
A parte financeira é a mais difícil. Os alunos crescem rápido, a gente consegue um
uniforme bonitinho, daqui a pouco fica pequeno e a gente fica sem saber como
comprar outro. É o sapato que aperta no pé. O mais difícil e essa parte financeira.
Nós ainda não encontramos um apoio financeiro (Entrevistado 2).194
193
194
Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
197
Em uma comunidade carente e vulnerável não é possível às famílias assumirem esse tipo de
despesa. É necessário qualificar a comunidade para buscar no conjunto das políticas públicas
para a cultura e lazer incentivos para financiamento da experiência, considerando o seu papel
imprescindível para a comunidade.
Outro desafio consiste na articulação das atividades curriculares com as questões de formação
humanística e pedagógica tratadas no coral. A relação estabelecida com os profissionais da
escola, principalmente como os professores, situa-se ainda ao nível da presença física. É
necessário um papel proativo maior dos professores na construção de processos articulados
entre as experiências vivenciadas no coral com os conteúdos e conjunto de saberes
curriculares.
Unidade 14: A participação da comunidade no planejamento das ações
Em relação ao planejamento das atividades uma das principais dificuldades consiste na
sistemática adotada nas reuniões de módulo II em que o planejamento é feito por ano de
escolarização, dificultando a compreensão da dinâmica global da escola. Essa estratégia de
planejamento não favorece a interlocução com o contexto global da escola e compreensão da
articulação das dimensões do PPP (situacional, ideal e operativa) com esse contexto.
No planejamento das atividades por ano de escolarização fica ausente ainda um envolvimento
da comunidade escolar, em especial de pais, alunos e segmentos da sociedade civil na
programação das propostas. A elaboração fica restrita a equipe pedagógica ou, melhor, aos
professores por ano de escolarização e supervisores, assumindo um caráter de formalidade
técnica.
Essa estrutura de planejamento fragmentária segmenta as ações entre o corpo de sujeitos
responsáveis pelo pensamento e estruturação das propostas e aquelas que executam as ações,
implicando numa restrição quanto a percepção do contexto global do PPP. Isso reforçar as
visões compartimentadas da sua natureza pedagógica e institucional em detrimento ao seu
caráter autogerador (VEIGA, 2003).
198
Salvo algumas exceções195 a ausência de um envolvimento dos discentes no planejamento das
atividades compromete a formação da autonomia e desenvolvimento proativo dos discentes
demandando avançar em processos colegiados de planejamento das atividades curriculares
como possibilidade de concretude da vivências democráticas do PPP.
Quando vamos fazer uma apresentação, de acordo com a música que eles irão
apresentar têm aqueles personagens que deverão ser encenados, às vezes tem um ou
dois alunos que não querem fazer aquele personagem. Eu sempre procuro respeitar a
opinião deles, negociando outras possibilidades de participação com o grupo
(Entrevistado 2).196
As possibilidades dos sujeitos sugerirem os temas das apresentações e de participarem da sua
programação, com liberdade de expor as suas ideias, sugerem certo nível de reciprocidade
com os processos engajados, com poder descentralizado das decisões e corresponsabilidades
coletivas (LUCK, 2010).
195
Essas exceções estão relacionada as atividades extracurriculares do coral e as atividades programadas pela
própria comunidade nos finais de semana na escola onde prevalece a indissociabilidade entre concepção e
execução.
196
Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012.
199
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao tomar como objeto de estudo os processos relacionados às inovações nas práticas do PPP
para maior participação da comunidade priorizou-se, num primeiro momento, a análise da
emergência das inovações e sua aplicação no campo educacional, bem como, dos processos
de gestão e suas possibilidades de participação autogeradora da comunidade nas práticas do
PPP da escola.
Vê-se que o conceito de inovação têm sua origem no pensamento do economista Joseph
Schumpeter, da chamada teoria das inovações, cuja base era a criação de novos produtos e
processos, associados ao desenvolvimento tecnológico, com fator de dinamização dos ciclos
de crescimento do capitalismo.
A crise do sistema capitalista (1970), motivada pelo esgotamento do sistema produtivo
taylorista/fordista, demonstrou a insuficiência dessa perspectiva para assegurar os ciclos de
crescimento capitalista (ARAÚJO; CASTRO, 2001). Constata-se que havia outras questões
intervenientes, como a concentração de renda, retração do consumo das famílias, desemprego
estrutural, dentre outras, que precisavam ser consideradas.
A estratégia principal consistiu em mudanças no padrão de acumulação para os parâmetros da
produção flexível, assim como da emergência das dimensões dos processos inovativos
organizacional e de marketing, de caráter não-tecnológico. Por sua vez, essas mudanças
implicaram em alterações nos processos de gestão, que passaram a ser referendados na
eficácia, eficiência e produtividade das empresas.
Na década de 80, com a acentuação dos processos de internacionalização da economia,
observa-se que aprofundaram os parâmetros da acumulação flexível, das formas de
organização da produção e consumo, tendo como implicação principal a necessidade de
compreender os processos econômicos interrelacionados às questões sociais, políticas e
culturais. Esses processos passaram a ser objeto de pesquisas relativas às inovações, inclusive
no campo educacional.
200
As novas dimensões implicaram na necessidade de intepretação das inovações numa
perspectiva reflexiva, contrapondo as questões deterministas da tecnologia. Assim, as
pesquisas passaram a destacar as dimensões educacionais, políticas, sociais, culturais e o
papel dos sujeitos como importantes para compreender os processos inovativos (MACHADO
2009; MACIEL, 2001).
Nesse novo cenário de análise dos processos inovativos a metodologia ideográfica, ao
pressupor a aproximação dos sujeitos da compreensão da sua experiência de vida (LOPES;
BARBOSA, 2008), apresenta-se como mais adequada para a compreensão dos processos
inovativos autogeradores que envolvem a participação da comunidade na gestão das práticas
do PPP.
Quanto ao campo educacional situou-se que na década de 1960 começa-se a pensar em
mudanças na organização curricular norte-americana para o ensino de ciências e matemática,
em um caráter investigativo e experimental, que respondesse às demandas da sociedade
tecnificada (HERNÀNDEZ, 2000).
Se, no início, essas mudanças estavam relacionadas a qualquer aspecto novo introduzido no
sistema de ensino, paulatinamente, esse conceito passa a ser visto como um processo
intencional e sistemático de melhoria da qualidade do ensino (HERNÁNDEZ et al, 2000;
CARBONELL, 2002). Enquanto processo intencional e sistemático, inferiu-se que essas
mudanças perpassam por uma concepção de homem e sociedade que se deseja construir,
coerente com a trajetória histórico-social da comunidade.
Por outro lado, constata-se que as propostas de inovações norte-americanas eram
verticalizadas, elaboradas por equipes técnicas, sendo essa tendência incorporada pelas
políticas educacionais brasileiras. Ao analisar as práticas de gestão do PPP observa-se que a
perspectiva gerencial, centrada na prescrição para as escolas de metas de proficiência, sem
envolvimento direto da comunidade, consiste numa novo cenário de reconfiguração dessa
tendência em uma base verticalizada.
Constata-se ainda, que a ausência de envolvimento dos sujeitos e modificação das suas
concepções consiste num fator decisivo para o fracasso das propostas de inovação prescritas
pelos órgãos centrais que comandam as políticas educacionais. Implica em reconhecer o papel
201
fundamental dos sujeitos, sua realidade histórico-social e participação na constituição de todas
as etapas da proposta.
Vê-se que na década de 1990 há um aprofundamento do debate dos processos inovativos
relacionados à realidade histórico-social dos sujeitos, ao caráter multidimensional da cultura
escolar. Essas propostas têm como referência o caráter dinâmico e autogerador da
comunidade no diálogo entre os campos instituído e instituintes nas práticas do PPP.
Tomando como referência a participação direta e os potenciais existentes na comunidade esse
caráter autogerador das propostas estaria no envolvimento direto dos sujeitos com as
transformações, valorizando suas dimensões histórico-sociais e sua capacidade de proposição
de mudanças emancipatórias ou edificantes (VEIGA, 2003).
Quanto aos processos de gestão do trabalho escolar e produção de inovações nas práticas do
PPP, percebe-se que a concepção sociocrítica, com seus desdobramentos democráticoparticipativos, apresenta-se como mais adequada para a emergência de ações autogeradora da
comunidade nas práticas do PPP.
A perspectiva sociocrítica baseia-se na historicidade dos processos humanos, nas dimensões
socioculturais, nas interações mútuas estabelecidas entre os pares. Ao tomar como referência
os sujeitos reconhece a capacidade dos mesmos de modificar a própria realidade e produzir
inovações sustentadas no diálogo,
na participação social. Parte do reconhecimento das
possibilidades de mobilização coletiva, da participação ativa e competente dos sujeitos na
organização das ações coerentes com a unidade de trabalho, consequentemente, com as
práticas do PPP (LUCK, 2010).
As dimensões societárias de organização do projeto democrático-participativo sinaliza com
condições prévias para a existência de inovações autogeradoras das práticas do PPP na
medida em que valoriza o caráter proativo e propositivo dos sujeitos comunitários de
enfrentamento da realidade.
Os fundamentos da perspectiva sociocrítica de gestão estão no contexto histórico-social de
redemocratização da sociedade brasileira, dos movimentos de participação social que
emergem a partir da década de 1980 como condição necessária para a vivência de processos
202
de participação coletiva, do poder de decisão compartilhado e corresponsabilidade dos
sujeitos com o alcance de objetivos comuns quanto ao ideal de sociedade desejada.
É nesse contexto de democratização da escola que começam a surgir experiências inovativas
como possibilidade de maior participação da comunidade em suas práticas. Dentre essas
experiências destaca-se a eleição dos diretores escolares, o colegiado escolar e a
administração dos recursos pela própria escola com a constituição da unidade jurídica
denominada caixa escolar. Todas essas experiências têm como fundamento a CF/1988 e LDB
9394/96 ao nomear a gestão democrática e possibilidades da escola de organizar o seu PPP.
Quanto à participação da comunidade, apoiando-se em Gohn (2004), discute-se que a sua
maior participação nas práticas do PPP perpassa pelo reconhecimento e diálogo com o
universo da comunidade educativa, e pelo envolvimento dos sujeitos dentro da escola
(professores, alunos, supervisores, diretor, pessoal do setor administrativo, dentre outras.) e
fora da escola (secretarias, associações, sindicatos, vizinhança, dentre outros).
Na medida em que segmentos da sociedade civil desenvolvem ações educacionais de interesse
público esse diálogo permite maximizar o capital social197 e avançar em práticas de gestão
social. Esse aspecto é um dos fatores decisivos para o desenvolvimento local ao coresponsabilizar os atores a atuarem de forma comprometida com a transformação social da
escola e, consequentemente, da comunidade (DOWBOR, 2006).
Destaca-se a importância do envolvimento da comunidade educativa nas ações escolares,
especialmente nas atividades socioculturais e do seu real significado para os processos de
aprendizagem cognitiva e vivência social discente. Assim como, da reciprocidade entre os
sujeitos escolares e as instituições presentes na comunidade educativa, na ampliação do
significado social da escola e suas contribuições com o desenvolvimento local.
Evidencia-se que enquanto processo de ação-reflexão-ação inconcluso, as vivências do PPP
demandam de relações dialógicas da comunidade educativa perpassando pelos campos
instituintes e instituídos, na tênue relação entre mudanças e estabilidade, para constituição do
projeto de educação e sociedade desejada.
197
Para Dowbor (2006) esse capital social esta presente na estreita relação entre as instituições públicas e a
sociedade civil nos processos de transformação local.
203
Quanto as experiências empíricas de participação da comunidade escolar os dados sinalizam
com as intenções dos sujeitos escolares de democratização das práticas do PPP para maior
participação da comunidade em sua vivência concreta. As intenções estariam relacionadas à
liberdade de expressão dos sujeitos, ao compromisso e cooperação dos profissionais, à
preocupação em conhecer e acolher a comunidade educacional, ao reconhecimento dos alunos
em sua diversidade, aos projetos pedagógicos de ensino, à abertura da escola à participação da
comunidade, às atividades extracurriculares e ao diálogo da escola com a comunidade
educativa.
Apontam ainda, uma escola aberta ao diálogo com participação dos diferentes segmentos
comunitários com liberdade de expressão. Essa liberdade estaria tanto nas práticas de gestão,
abertas a ouvir a comunidade, quanto nas possibilidades dos sujeitos manifestarem o
pensamento divergente nos espaços de participação coletiva (reuniões, cursos, rodas de
conversas, dentre outras).
Quanto à participação dos profissionais da escola prevalece um compromisso dos sujeitos
relativos aos processos participativos, com envolvimento e cooperação dos diferentes
segmentos profissionais na vivência colegiada das práticas pedagógicas e de gestão do PPP,
cuja intenção é uma maior articulação escola-comunidade na realização de um projeto
comum.
O compromisso estaria relacionado tanto ao desenvolvimento da proposta de ensino da escola,
responsabilidade com a aprendizagem dos alunos, articulação de tempos e espaços de
formação mais amplos quanto na diversificação da programação extracurricular da escola e
práticas colegiadas (das reuniões pedagógicas e do colegiado escolar).
Quanto a vivência dos tempos e espaços escolares, a tendência predominante dos discentes é
de alegria e prazer.198 A existência de sentimentos dessa natureza favorece o envolvimento
dos alunos nas práticas do PPP, sinalizando uma predisposição de engajamento com as
198
Vale ressaltar que na realização dos grupos focais docentes e nas entrevistas com os supervisores sentimentos
dessa natureza também estão presentes, estando associados principalmente à postura, compromisso e
acolhimento da direção escolar.
204
proposta da escola. Esse engajamento estaria relacionado, principalmente, às vivências de
atividades curriculares e extracurriculares da escola.
Retomado o compromisso, enquanto valor dos processos participativos da escola, vê-se que se
associa à própria perspectiva de trabalho colaborativo que permite à escola alcançar objetivos
comuns. A ação colaborativa estaria relacionada principalmente à culminância dos projetos
pedagógicos e da programação cultural, envolvendo um fazer e uma vivência coletiva dos
professores e alunos. A soma de esforços docentes e discentes para realização das
apresentações, o envolvimento de todas as turmas, a organização do cenário e a participação
conjunta nas apresentações são algumas experiências em direção a essa perspectiva.
As apresentações conjuntas199, envolvendo professores e alunos, podem ser vistas como uma
prática inovativa de vivência da programação sociocultural da escola, na medida em que os
conhecimentos são mediados na prática pelos sujeitos que assumem corresponsabilidades
coletivas pela realização da ação.
Percebe-se que a existência do compromisso e colaboração dos sujeitos nas práticas de
participação pode ser vista como valor coerente com a emergência do caráter autogerador dos
sujeitos nos processos participativos. Esse valor é importante, tanto na incorporação dos
pressupostos teórico-filosóficos do PPP, orientando a concepção de homem e sociedade
desejada, quanto na vivência das práticas. Existe, ainda, uma reciprocidade entre os valores
encontrados e o que preconiza Luck (2010), ao apontar a ética, a solidariedade, a equidade e o
compromisso dos sujeitos como valores dos processos participativos.
Quanto ao envolvimento dos diferentes segmentos escolares numa mesma ação, além de
favorecer o trabalho colaborativo entre os sujeitos, que passam a desenvolver uma ação para
alcance de objetivos, fortalece as articulações do PPP para o desenvolvimento das suas ações
em uma prática colaborativa. Essa dinâmica de envolvimento dos diferentes segmentos da
escola favorece a construção das relações mútuas e a sinergia entre os profissionais,
permitindo o desenvolvimento de ações articuladas para a participação da comunidade.
199
A ideia das apresentações conjuntas envolvendo professores e alunos aparece tanto no grupo focal docente
quanto discente.
205
Quanto às finalidades do PPP, nota-se que a escola tem como referência questões
humanísticas e pedagógicas, pressupondo uma participação fundamentada no respeito à
diversidade, no acesso de todos os sujeitos aos conteúdos curriculares. É uma escola
inclusiva, intencionada a democratizar o acesso e a permanência dos alunos, conforme
previsto na LDB 9394/96, procurando receber e acolher todos, seja com necessidades
especiais (condutas típicas) ou desvio de comportamento social. Vê-se que há uma coerência
entre os princípios que orientam a concepção da escola e a prática concreta dos sujeitos
comunitários.
As finalidades humanísticas e pedagógicas do PPP são determinantes também para o trabalho
que a escola realiza de visitas às famílias dos alunos, cuja intenção é a construção de
estratégias de apoio ao processo de escolarização discente. Obviamente, por limitações de
tempo e recursos humanos, as visitas200 são feitas, priorizando os alunos com maiores
dificuldades de aprendizagem.
Por outro lado, essa aproximação com as famílias e conhecimento da sua realidade históricosocial permite à escola mobilizar outras instituições e seus respectivos serviços, enquanto
parceiros da escola, na constituição dos serviços de apoio necessários ao enfrentamento dos
problemas vivenciados.
Ao constituir-se como um processo intencional e sistemático voltado para o conhecimento da
realidade histórico-social dos alunos, as visitas às famílias podem ser vistas como uma
estratégia de gestão autogeradora que contribui com a melhoria da qualidade educacional e
com a maior participação da comunidade nas práticas do PPP.
Essa aproximação da escola com a comunidade está relacionada também à abertura dos
espaços escolares para a participação da comunidade, especialmente nos finais de semanas.
Vale ressaltar que essa cultura de participação da comunidade nos finais de semana na escola
antecede ao próprio Programa Estadual Escola Viva, Comunidade Ativa201, considerando que
já existiam oficinas (artesanato e pintura, costura, coral, dentre outras), atividades culturais e
200
As visitas feitas pelos profissionais das escolas às famílias dos alunos aparecem tanto no grupo focal docente
quanto nas entrevistas realizadas com os supervisores e diretor.
201
Conforme apontamos atualmente, a escola é contemplada pelo Programa que consiste numa iniciativa das
políticas estaduais de educação públicas de aproximação da escola à comunidade em regiões de vulnerabilidade
social.
206
de lazer na escola. Além da aproximação escola-comunidade, o desenvolvimento das
atividades favorece o acesso ao lazer como um direito fundamental para a vivência cidadã.
O desenvolvimento de atividades na escola nos finais de semana é um dos fatores que
contribui para que a escola não seja vítima de avarias no seu patrimônio, mesmo situada em
área de vulnerabilidade social. Há ainda um trabalho pedagógico voltado para a preservação
do patrimônio da escola, sendo que os discentes expressam serem conscientes da utilização
dos espaços em sua vivência escolar.202
Outro aspecto relativo às dimensões democráticas de gestão do PPP enquanto ação que
contribui para a maior sinergia da escola com a comunidade são os projetos pedagógicos203
desenvolvidos pela escola. Esses projetos contribuem para a vivência discente de tempos e
espaços escolares mais amplos e participação, principalmente de pais e familiares, na
programação sociocultural de culminância dos mesmos.
Aponta-se, ainda, que os projetos desenvolvidos pela escola em parceria com a comunidade
educativa viabilizam o desenvolvimento de atividades diversificadas (oficinas, ruas de lazer,
palestras, dentre outras) de caráter sociocultural para a comunidade. Essas atividades
asseguram à comunidade o acesso à cultura e ao lazer como direitos fundamentais. Há ainda
as atividades que são desenvolvidas nos espaços da própria instituição parceira204, sendo
oportunizado aos discentes o conhecimento de novos espaços e suas possibilidades.
O diálogo da escola com a comunidade educativa apresenta-se como uma das principais
inovações das práticas do PPP, na medida em que oportuniza à comunidade, especialmente
aos discentes, o acesso a um conjunto de experiências extracurriculares diversificadas,
enquanto possibilidade para a vivência cidadã. Umas das principais formas de articulação
desse diálogo têm sido por meio da programação cultural da escola e das ações que vem
sendo desenvolvidas pelo coral da escola.
202
Tivemos a oportunidade de observar, por exemplo, que há uma preservação dos painéis da escola e do
pequeno jardim existentes na escola.
203
Os projetos pedagógicos foram enfatizados tanto no grupo focal docente quanto nas entrevistas, sendo
mencionado o Projeto Zé do Livro.
204
Dentre essas atividades, destacamos as visitas feitas pelos alunos ao SESC, onde têm oportunidade de
vivenciar atividades de lazer (oficinas de jogos de mesas, jogos de quadra, recreação aquática, dentre outras) e
atividades culturais (visita à biblioteca e conhecimento das obras literárias disponíveis, visita ao casarão de
cultura, dentre outras).
207
As atividades desenvolvidas pelo coral da escola fortalece o diálogo entre comunidade escolar
e educativa, permitindo aos alunos conhecerem novas realidades e amplia as sinergias dos
processos de vivência curricular com a sua realidade histórico-social.
Assim, a interlocução com a comunidade educativa permite um enriquecimento da
programação cultural da escola e favorece uma maior participação da comunidade nas
práticas do PPP. Dentre as instituições da comunidade educativa que apoiam as ações
escolares, destacam-se o SESC – Serviço Social do Comércio, a Polícia Militar por meio do
Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência – PROERD e os Correios.
Nesse processo de articulação da escola com a comunidade educativa. percebe-se que há um
esforço dos profissionais da escola na construção de dimensões societárias de gestão, de
aprofundamento dos princípios democrático-participativos que visam à maior participação da
comunidade. Essas características gestionárias estão presentes na participação dos
profissionais da escola nos processos decisórios, e na sensibilidade dos mesmos de ouvir a
comunidade, especialmente as suas sugestões e críticas. Assim como de mobilizar outros
parceiros da rede no apoio às dificuldades enfrentadas.
Assim, ações prioritárias que vêm sendo desenvolvidas pela escola para maior participação da
comunidade nas práticas do PPP podem ser apontadas pelo respeito aos valores humanos
associados ao reconhecimento dos sujeitos escolares em sua diversidade: a valorização da
liberdade de expressão da comunidade; o compromisso e cooperação dos profissionais da
escola nos processos participativos; a preocupação em conhecer e acolher a comunidade
educacional em sua diversidade, especialmente na construção de estratégias de trabalho
pedagógico diferenciadas; os projetos pedagógicos de ensino desenvolvidos pela escola; as
atividades abertas à participação da comunidade, especialmente nos finais de semana; as
atividades extracurriculares e o diálogo da escola com comunidade educativa.
Essas ações, enquanto principais estratégias que vêm sendo construídas, de caráter intencional
e sistemático para a participação da comunidade nas práticas do PPP, apresentam-se como as
principais possibilidades de vivência das dimensões histórico-sociais dos sujeitos. Assim,
dialogam com os potenciais autogeradores, com o caráter edificante das inovações, na medida
em que propõe contribuir com a melhoria da qualidade do ensino.
208
Por outro lado, as experiências de articulação escola-comunidade na vivência das práticas do
PPP apontam para determinados limites que comprometem a emergência de processos
inovativos autogeradores em sua prática. Dentre esses limites, a investigação aponta para a
concepção dos profissionais da escola dos processos participativos como presença física,
especialmente dos pais e familiares na programação sociocultural da escola; as dificuldades
dos pais de acompanhar as atividades pedagógicas; a ausência de uma formação em serviço
articulada com as experiências comunitárias; a segmentação entre concepção e execução no
planejamento das atividades, especialmente no envolvimento dos alunos; a coexistência de
processos societários e gerenciais nas práticas de gestão.
Apesar da percepção dos sujeitos (docentes e discentes) ser positiva205 quanto à participação
da comunidade, a concepção central desses sujeitos é da participação da comunidade nas
atividades extracurriculares da escola. A ideia é: uma comunidade participativa sempre recebe
um chamado, um convite para participar da programação sociocultural (eventos, palestras,
exposições, dentre outras). De acordo com Luck (2010), o envolvimento da comunidade
apenas nas atividades extracurriculares estaria para a participação como presença física, na
qual a simples presença da comunidade na programação é associada como participação.
Mesmo existindo uma abertura da escola em ouvir e dialogar com as sugestões da
comunidade, são necessárias mudanças substanciais nos processos participativos, de modo a
assegurar a efetiva participação dos sujeitos nos processos decisórios. O sentido de
participação estaria relacionado mais à presença física em atividades extracurriculares (festas
juninas, ruas de lazer, oficinas, dentre outras) do que participar das decisões da escola, com
sentimento de autoria e responsabilidade coletiva (LUCK, 2010).
Vale ressaltar que as atividades, quando são organizadas pela própria comunidade e
acontecem na escola nos finais de semana, são uma exceção à participação como presença
física, considerando que, nesse caso, a comunidade é responsável pela concepção e execução
das propostas, ou seja, existe um sentimento de autoria.
Ainda que existam as experiências de articulação com a comunidade educativa, conforme
situado anteriormente, quando os docentes e discentes referem-se à participação comunitária,
205
Os dados apontam que mais de 90% dos discentes e docentes consideram a comunidade participativa.
209
a tendência central corrobora com a redução do seu universo de atores (GOHN, 2004), não
situando as relações mais amplas em processo de construção com outras instituições (públicas
e privadas) e segmentos da sociedade civil.
Os achados investigativos apontam para a necessidade de trabalhar as formas de participação
e o conceito de comunidade com os profissionais da escola, potencializando esses sujeitos a
maximizar as experiências em construção, com o deslocamento da perspectiva do convite para
processos continuados de interação escola-comunidade nas práticas do PPP.
A mudança de concepção é fundamental, já que a perspectiva da participação como presença
física não produz um efetivo envolvimento dos sujeitos no debate, nos processos de tomada
de decisões, compartilhando responsabilidades. Nesse sentido, não favorece a emergência de
inovações numa perspectiva autogeradora das práticas do PPP.
Quanto às formas de participação representativas ainda que sejam mencionadas no grupo
focal discente em que o colegiado da escola é atuante, precisam ser fortalecidas nos processos
participativos, especialmente dos discentes e suas formas de representação. Sente-se uma
ausência nos grupos focais e nas entrevistas da abordagem de questões como as formas de
associação de discente (grêmio estudantil), grupos de trabalho, líderes de turmas, dente outras.
Essas questões precisam ser trabalhadas e fortalecidas na escola.
Em relação à programação das atividades extracurriculares, que são realizadas em parceira
com a comunidade educativa, não são mencionadas as formas de planejamento participativo,
como estratégia de envolvimento mais amplo da comunidade. A ideia que persiste são das
atividades e/ou programação definidas pela instituição parceira e pelos profissionais da escola
abertas à participação da comunidade. Nota-se que é necessário aperfeiçoar as formas de
planejamento participativo, em que a comunidade seja consultada, participe das decisões e
assuma corresponsabilidades. A forma como são organizadas as atividades produzem uma
segmentação entre concepção e execução, limitando a expressão do sentimento de autoria dos
sujeitos.
Ainda que os professores relatem a importância de ouvir o aluno, vê-se que a segmentação
entre concepção e execução também está presente no planejamento das atividades
pedagógicas que culminam na programação sociocultural, já que a proposta dos temas são
210
programadas pelos professores em reuniões de módulo sem a participação de representantes
discentes e/ou mesmos de canais de interlocução direta e levantamento prévio das
expectativas discentes.
Constata-se, ainda, que o planejamento das atividades em reuniões de módulo, feito apenas
por ano de escolarização, compartimentaliza as propostas, dificultando a percepção global da
escola e de seu PPP. A definição de estratégias e conteúdos específicos para um determinado
ano de escolarização é importante, mas demanda ser intercalada com momentos de reflexão
coletiva que permitam aos sujeitos compreender a dinâmica global de funcionamento da
escola.
A superação dos processos fragmentados demanda um esforço dos profissionais da escola em
compreender e construir elos indissociáveis entre concepção das práticas pedagógicas, gestão
dos processos e vivência concreta do PPP, rompendo com a segmentação entre concepção e
execução. Essa é uma demanda que exige uma intervenção capaz de produzir uma maior
sinergia escola-comunidade, especialmente na programação das atividades curriculares e
extracurriculares.
Outro desafio de vivência de dimensões autogeradores da prática do PPP consiste nas
dificuldades encontradas ao apoio do processo de escolarização dos filhos, considerando que
muitas crianças vivem com os avós que não vivenciaram o processo de escolarização formal.
A falta de apoio estaria relacionada às atividades pedagógicas que são propostas pelos
professores em sala de aula para serem desenvolvidas em casa como o acompanhamento das
famílias.
Sem dúvida, a ausência de uma vivência escolar dificulta o acompanhamento escolar dos
filhos, especialmente o diálogo dos pais e/ou avós com os saberes sistematizados. Situa-se
que ainda que haja limite no acompanhamento das atividades pedagógicas, um dos caminhos
para se construir essa interlocução estaria na possibilidade de dialogar com os saberes e
experiências tácitas da comunidade, enquanto possibilidade de vivência inovativa do PPP.
Pontua-se, ainda, que a escola também pode buscar estratégias com a comunidade educativa,
especialmente das instituições de formação docente, estratégias de apoio a essas famílias.
211
Por outro lado, as estratégias de formação em serviço dos profissionais da escola não são
focalizadas no diálogo com as experiências da comunidade. Ainda que exista um processo de
capacitação dos profissionais (cursos, palestras, oficinas, dentre outras) para as práticas do
PPP, os mesmos não preveem estratégias de diálogo com as experiências comunitárias.
Se as inovações nas práticas do PPP para maior participação da comunidade demandam
reconhecer as experiências tácitas da comunidade, como fator de maior sinergia escolacomunidade, é necessário que o processo de formação continuada dialogue com essas
questões, como forma de conhecer os aspectos que favorecem e dificultam as vivências
democráticas do PPP em seu sentido autogerador.
Quanto às práticas de gestão206, uma das dificuldades apontadas, especialmente pelos
docentes, é o medo e insegurança quanto às propostas de mudanças definidas pela SEE/MG.
Essas questões estão associadas ao modelo de gestão definido pelo Estado para as escolas
públicas em curso, de aplicação dos princípios da administração empresarial à gestão para
resultados. Essa perspectiva de associar resultados educacionais à remuneração num sistema
de concorrência reduz a vivência dos processos societários e gera insegurança dos
profissionais.
Infere-se, assim, que ainda que exista o esforço da escola e de seus profissionais em produzir
modificações nas práticas do PPP para vivência de processos autogeradores em suas
dimensões societárias, há um modelo gerencial em curso, presente no universo das políticas
estaduais que verticaliza essas relações e gera contradições na vivência concreta. Assim, a
escola convive com a tênue relação da perspectiva societária e gerencial de gestão.
Enquanto um processo de experiência em construção, a suposição de que a escola produz
inovações na gestão do seu PPP para maior participação da comunidade pode ser confirmada,
na medida em que há um processo intencional e sistemático de aproximação da comunidade
educativa para a constituição de um sistema de apoio à escola; a existência de um
envolvimento e compromisso dos profissionais da escola com as práticas do PPP; as sinergias
entre os diferentes segmentos escolares e o trabalho colaborativo; a vivência das finalidades
humanísticas e pedagógicas do PPP na prática concreta, respeitando os alunos em sua
206
As questões relativas à insegurança quanto aos processos de mudança aparecem nos questionários docentes e
nas entrevistas com os supervisores.
212
diversidade. Diante do cenário democrático de vivência das relações na escola, esses aspectos
apresentam-se como possibilidades de vivência dos processos em uma base autogeradora, na
qual os sujeitos assumem sua condição histórico-social de produção de mudanças de caráter
edificante e/ou emancipatório.
Vale mencionar que esse diálogo com a comunidade educativa amplia as possibilidades de
participação de segmentos da sociedade civil em ações educacionais onde prevalece o
interesse público de melhoria da qualidade educacional. O nível de evidência mais
significativo são as atividades extracurriculares onde, pela participação da sociedade civil, há
possibilidades de vivência e interlocução dos discentes com a realidade local. O
aprofundamento dessa participação da sociedade civil são condições necessárias para
emergência de uma gestão social cujo desdobramento podem ser práticas do PPP conexas
com a perspectiva do desenvolvimento local.
Por outro lado, enquanto experiência em construção persiste desafios que limitam a vivência
dos processos autogeradores do PPP. Conforme mencionado, torna-se relevante reconsiderar
o processo de participação da comunidade, inclusive dos discentes no planejamento e na
programação pedagógica e sociocultural; o fortalecimento da perspectiva de gestão societária
da escola, já que coexiste com o modelo gerencial; a formação dos profissionais em sinergia
com as experiências comunitárias; a estratégia de apoio aos pais no acompanhamento
pedagógico dos filhos; o ressignificado das formas de participação e do conceito de
comunidade; a criação do grêmio estudantil e o fortalecimento da atuação do colegiado
A revisão desses aspectos contribuirá para o fortalecimento da experiência prática do PPP em
construção, aprofundando as dimensões societárias de um projeto democrático-participativo
de gestão em construção e dos processos inovativos autogeradores, em que os sujeitos
assumem o curso das mudanças, conforme sua realidade histórico-social.
213
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