ADENILSON MARIOTTI MATTOS INOVAÇÕES NA GESTÃO DO
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ADENILSON MARIOTTI MATTOS INOVAÇÕES NA GESTÃO DO
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL ADENILSON MARIOTTI MATTOS INOVAÇÕES NA GESTÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA E PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE: Análise de uma experiência em construção Belo Horizonte 2013 ADENILSON MARIOTTI MATTOS INOVAÇÕES NA GESTÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA E PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE: Análise de uma experiência em construção Dissertação apresentada ao Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, como requisto parcial à obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Inovações Educação e Desenvolvimento Local. Sociais, Linha de pesquisa: Processos educacionais: tecnologias sociais e desenvolvimento local Orientadora: Profª. Drª. Adilene Gonçalves Quaresma. Belo Horizonte 2013 M444f Mattos, Adenilson Mariotti Inovações na gestão do projeto político-pedagógico da escola e participação da comunidade: análise de uma experiência em construção. / Adenilson Mariotti Mattos. – 2013. 215f.: il. Orientadora: Prof. Dra. Adilene Gonçalves Quaresma Dissertação (Mestrado) – Centro Universitário UNA, 2013. Programa de Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local. Bibliografia f. 212-215. 1. Educação. 2. Inovações Educacionais. 3. Comunidade e escola. I. Quaresma, Adilene Gonçalves. II. Centro Universitário UNA. III. Título. CDU: 658.114.8 Ficha catalográfica desenvolvida pela Biblioteca UNA campus Guajajaras CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL Dissertação Intitulada “INOVAÇÕES NA GESTÃO DO PROJETO POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA E PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE: Análise de uma experiência em construção”, de autoria do (a) mestrando (a) Adenilson Mariotti Mattos, aprovada pela banca examinadora, constituída pelos seguintes professores: Belo Horizonte, 22 de março de 2013. “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo.” (Paulo Freire) DEDICATÓRIA À minha esposa, Rita de Cássia Abreu Soares Mariotti, pelas palavras de incentivo e apoio, convicta de que este sonho seria possível. Aos meus pais, Elysio de Mattos Freitas e Maria da Glória Mariotti Mattos, cujos valores são referência para minha vida. À madrinha, Maria da Conceição Santos, ao meu sogro, Alexandre Soares Moreno, e à minha sogra, Sônia Abreu Soares, pela presença pelo acolhimento e apoio. Aos meus filhos Daniel e Isabel, inspiração constante para minha vida. AGRADECIMENTOS Aos profissionais do Centro Universitário - UNA, em especial a todos os professores do Mestrado em Gestão Social Educação e Desenvolvimento Local, pela valiosa contribuição à minha formação. À minha orientadora, professora Adilene Gonçalves Quaresma, pela compreensão, incentivo e apoio, cujo trabalho competente permitiu a conclusão desta dissertação. Aos colegas do Mestrado, pela convivência e compartilhamento de experiências, em especial durante os seminários de prática. A direção e todos os colegas da Superintendência Regional de Ensino, em especial à Idelzira Feitosa pelo apoio. A Deus por me sustentar com o seu imenso amor durante toda essa trajetória. RESUMO Ao ser intitulada como “Inovações na Gestão do Projeto Político-Pedagógico e Participação da Comunidade: Análise de uma experiência em construção”, esta investigação parte do pressuposto de que a gestão democrática do Projeto Político-Pedagógico, resultante do processo de luta dos movimentos sociais e sindicais pela redemocratização da sociedade, expressos na Constituição Federal e nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, não se concretizou em uma participação autogeradora da comunidade em sua prática. Curiosamente, intenções manifestadas por uma escola de modificação da sua prática para maior participação da comunidade sugeriram a existência de inovações, motivando a realização desta pesquisa, que se orientou pela seguinte questão: que inovações estão sendo produzidas nas práticas do PPP para maior participação da comunidade? Para responder a essa indagação, buscou-se, então, analisar as inovações que estão sendo produzidas na gestão do PPP que promovem maior participação da comunidade. A pesquisa teórica compreendeu os estudos de Hérnandez (1998; 2000), Carbonell (2002); Libâneo (2008); Luck (2010); Gohn (2004;2007); Gadotti (2004); Veiga (2003,2004); Freire (1987;2004); Thuler (2001); Neves (2004), dentre outros. A investigação empírica, de natureza qualitativa, consistiu num estudo de caso exploratório, com aplicação de questionários para discentes e docentes, realização de grupos focais com docentes e discentes e entrevistas com diretor, supervisores e um membro da comunidade. A dissertação estrutura-se na análise da trajetória das inovações e sua emergência no contexto educacional; na gestão escolar, o Projeto Político-Pedagógico e a participação da comunidade; no percurso metodológico da pesquisa; na análise de uma experiência em construção: a gestão e as práticas pedagógicas do Projeto Político-Pedagógico para maior participação da comunidade: nos dados dos questionários, grupos focais e entrevistas. Conclui-se que o diálogo dos profissionais da escola com segmentos da comunidade escolar e educativa na organização da programação sociocultural, a abertura da escola para participação da comunidade nos finais de semana, a sensibilidade e apoio à comunidade são as principais inovações das práticas do PPP para maior participação da comunidade. Por outro lado, a concepção da participação da comunidade como presença física nas atividades socioculturais, a coexistência de dimensões societárias e gerenciais de gestão, a segmentação entre concepção e execução das atividades, a ausência de uma formação continuada dos profissionais em diálogo com as experiências comunitárias, a pouca articulação do Colegiado no processo gestor e a falta de implementação de um grêmio estudantil são os desafios principais a serem enfrentados. PALAVRAS-CHAVE: Educação; Inovações Educacionais; Participação da Comunidade; Projeto Político-Pedagógico; Desenvolvimento Local. ABSTRACT By titling as "Innovations in the Management of Political-Pedagogical Project and Community Participation: Analysis of an experience in building" the research assumes that the democratic management of the Political-Pedagogical project, resulting from the struggle process of the social and unions movements for the democratization of society, expressed in the federal Constitution and Law of Guidelines and Bases of National Education, did not materialize in an auto generator participation of the community in its practice. Interestingly, the intentions expressed by a school change of its practice for greater community participation, suggested the existence of innovation, motivating this research, which was guided by the following question: What innovations are being produced in the practices of PPP for greater community participation ? To answer this question, the innovations made in the management of PPP that promote greater community participation were analyzed. A literature search of studies realized Hernandez (1998, 2000), Carbonell (2002); Libâneo (2008), Luck (2010); Gohn (2004, 2007); Gadotti (2004); Veiga (2003.2004); Freire ( 1987, 2004); Thuler (2001); Neves (2004), among others. Empirical research, of qualitative kind, consisted of an exploratory case study with questionnaires for students and teachers, conducting focus groups with teachers and students, and interviews with director, supervisors and a community member. The dissertation is structured in the analysis of the trajectory of innovation and its emergence in the educational context; school management, the Political-Pedagogical Project and community participation, the methodological approach of the study, analysis of an experience in building: management and teaching practices Political Pedagogical Project for greater community involvement: data from the questionnaires, focus groups and interviews; it was concluded that the dialogue with the school professional with segments of the school community and educational on organization programming sociocultural, the opening of the school to community participation on weekends, sensitivity and community support are the main innovations of the practices of the PPP for greater community participation. Moreover, the concept of community participation as a physical presence in the cultural activities, the coexistence of societal dimensions and managerial management, segmentation between conception and execution of the activities, the absence of a continuing education of professionals in dialogue with the community experiences the little articulation of the collegiate in manager process and a student body are the main challenges to be faced. KEYWORDS: Education, Educational Innovations, Community participation, Political-Pedagogical Project; Local Development. LISTA DE TABELAS TABELA 1 - PERCEPÇÃO DISCENTE DAS PRÁTICAS PARTICIPATIVAS NA ESCOLA...... 101 TABELA 2 – PERCEPÇÃO DOCENTE DAS PRÁTICAS PARTICIPATIVAS NA ESCOLA...... 102 LISTA DE ILUSTRAÇÕES QUADRO 1 - TIPOS DE INOVAÇÕES .............................................................................................. 29 QUADRO 2 - INOVAÇÕES E O GRAU DE NOVIDADE ................................................................ 31 QUADRO 3 - PERSPECTIVA DE ABORDAGEM SOCIAL DA INOVAÇÃO ................................ 36 QUADRO 4 - CATEGORIAS E UNIDADES DE ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS, GRUPOS FOCAIS E ENTREVISTAS ................................................................................................................. 96 GRÁFICO 1 - AVALIAÇÃO DOCENTE DA PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO ............................................................................................... 98 GRÁFICO 2 - AVALIAÇÃO DISCENTE DA PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE ESCOLAR ............................................................................................................................................................... 99 GRÁFICO 3 - FREQUÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DOCENTE .................................................... 104 GRÁFICO 4 - FREQUÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DISCENTE EM ATIVIDADES DE REFLEXÃO COLETIVA ................................................................................................................... 105 GRÁFICO 5 - FATORES PARA UMA MAIOR PARTICIPAÇÃO DISCENTE ............................. 106 GRÁFICO 6 - PROCEDIMENTOS DA ESCOLA QUANTO ÀS SUGESTÕES DISCENTES................................................................................................................ 108 GRÁFICO 7 - POSTURA DISCENTE NAS ATIVIDADES DE PARTICIPAÇÃO COLETIVA ... 109 GRÁFICO 8 - POSTURA DOCENTE NOS PROCESSOS DE REFLEXÃO-AÇÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA ........................................................................................ 110 GRÁFICO 9 - SENTIMENTO DISCENTE RELATIVO À ESCOLA .............................................. 121 GRÁFICO 10 - FINALIDADES DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA .......... 132 GRÁFICO 11 - PRINCÍPIO COM MAIOR PRESENÇA NA GESTÃO DO PROJETO POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA............................................................................................................ 140 GRÁFICO 12 - FATORES QUE CONTRIBUEM COM A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA ...................................................................... 142 GRÁFICO 13 - PRINCIPAL FATOR PARA AUMENTO DOS PROCESSOS PARTICIPATIVOS DOCENTES....................................................................................................... 146 GRÁFICO 14 - AUTO-AVALIAÇÃO DISCENTE DA SUA COLABORAÇÃO COM A PROPOSTA DE TRABALHO DA ESCOLA .................................................................................... 148 GRÁFICO 15 - AUTO-AVALIAÇÃO DOCENTE DA SUA PARTICIPAÇÃO NA CONSTRUÇÃO/RECONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA .. 149 GRÁFICO 16 - FATORES QUE CONTRIBUEM COM O DESENVOLVIMENTO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA ........................................................................................ 164 GRÁFICO 17 - OS TEMPOS E ESPAÇOS EM ATENDIMENTO AS NECESSIDADES DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA ...................................................................... 171 GRÁFICO 18 - ESPAÇOS ESCOLARES COM MAIOR AFINIDADE DISCENTE DE PARTICIPAÇÃO ................................................................................................................................ 177 GRÁFICO 19 - ESPAÇOS ESCOLARES COM MENOR AFINIDADE DISCENTE ..................... 178 GRÁFICO 20 - ESTRATÉGIAS DE ENSINO UTILIZADAS COM MAIOR FREQUÊNCIA PELA ESCOLA ............................................................................................................................................. 179 GRÁFICO 21 - ESTRATÉGIA DE ENSINO QUE OS DISCENTES FREQUENTEMENTE PARTICIPAM NA ESCOLA ............................................................................................................. 181 GRÁFICO 22 - MODIFICAÇÕES PRIORITÁRIAS DA ESCOLA SEGUNDO OS DISCENTES. 182 GRÁFICO 23 - ATIVIDADES EXTRACURRICULARES, SEGUNDO OS DOCENTES, FREQUENTEMENTE ORGANIZADAS PELA ESCOLA .............................................................. 183 GRÁFICO 24 - PARTICIPAÇÃO DISCENTE EM ATIVIDADES FORA DA SALA DE AULA . 184 GRÁFICO 25 - DIFICULDADES DA ESCOLA EM PROPOR MUDANÇAS PEDAGÓGICAS .. 188 SUMÁRIO INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 16 Do problema de pesquisa .......................................................................................................... 19 Objeto da pesquisa e questão central ........................................................................................ 21 O percurso metodológico da pesquisa ...................................................................................... 22 Da relevância, conceitos centrais e estrutura da investigação .................................................. 24 1. A TRAJETÓRIA DAS INOVAÇÕES E SUA EMERGÊNCIA NO CONTEXTO EDUCACIONAL ................................................................................... 26 1.1 Inovações: origem e evolução conceitual ........................................................................... 26 1.2 As inovações quanto ao padrão ou grau de novidade ......................................................... 31 1.3 Novos enfoques dos processos inovativos ......................................................................... 34 1.3.1 Os enfoques sociológicos das inovações organizacionais ............................................... 39 1.4 Conceituando inovações educacionais ............................................................................... 41 1.5 Os processos de inovações prescritos às escolas ................................................................ 45 1.6 Os enfoques inovativos do ponto de vista da cultura escolar e suas aproximações com o Projeto Político-Pedagógico ..................................................................................................... 48 2. GESTÃO ESCOLAR, O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO E A PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE .................................................................... 55 2.1 Organização do trabalho escolar e inovações educacionais ............................................... 55 2.1.1 A concepção burocrática e os processos de inovação escolar ........................................ 55 2.1.2 A concepção gerencial e os processos de inovação escolar ............................................ 60 2.1.3 A Gestão Escolar Sociocrítica ......................................................................................... 66 2.1.4 Os novos princípios organizadores da gestão escolar ..................................................... 72 2.1.4.1 A concepção autogestionária ........................................................................................ 73 2.1.4.2 A concepção interpretacionista .................................................................................... 74 2.1.4.3 A concepção democrático-participativa ....................................................................... 75 2.1.4.3.1 O Projeto Político-Pedagógico e a Gestão democrático-participativa....................... 79 2.1.4.3.2 Analisando experiências inovadoras na Gestão democrático-participativa .............. 85 2.1.4.3.3 O PPP, as formas e valores da gestão democrático-participativa .............................. 87 2.1.4.3.4 A Gestão do PPP: possibilidades e contradições ....................................................... 91 3. ANÁLISE DE UMA EXPERIÊNCIA EM CONSTRUÇÃO: A GESTÃO E AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DO PROJETO POLÍTICO- PEDAGÓGICO PARA MAIOR PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE – ANÁLISE DOS DADOS DOS QUESTIONÁRIOS, GRUPOS FOCAIS E ENTREVISTAS ................................................................................................................. 95 3.1 As unidades e categorias de análise dos questionários, grupos focais e entrevistas como instrumentos de pesquisa .......................................................................................................... 95 3.2 Aproximando da experiência em construção: análise das categorias dos questionários, grupos focais e entrevistas ........................................................................................................ 97 Categoria 1: Participação da comunidade na gestão do Projeto Político-Pedagógico da escola .................................................................................................................................................. 97 Unidade 1: Percepção da comunidade da participação nas práticas do PPP ............................ 97 Unidade 2: Os profissionais da escola, processos decisórios e o PPP .................................... 117 Unidade 3: Concepção dos sujeitos da sua vivência escolar .................................................. 120 Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes .................................. 121 Categoria 2: O PPP enquanto unidade de articulação escola-comunidade ........................... 132 Unidade 4: Finalidades do PPP e organização das práticas pedagógicas e de gestão ............ 132 Unidade 5: Relações de trabalho na escola ............................................................................ 139 Categoria 3: Ações desenvolvidas pela escola para maior participação da comunidade no Projeto Político-Pedagógico ................................................................................................... 146 Unidade 6: Fatores para aumento dos processos participativos ............................................. 146 Unidade 7: Os projetos e as experiências curriculares e extracurriculares............................. 153 Unidade 8: Estratégias de Planejamento das ações ................................................................ 162 Unidade 9: Parcerias com a comunidade e sistemas de apoio ................................................ 168 Unidade 10: Organização dos tempos, espaços e práticas pedagógicas ................................. 171 Categoria 4: Dificuldades de maior participação da comunidade no Projeto PolíticoPedagógico ............................................................................................................................. 188 Unidade 11: Os desafios dos processos de mudança na escola .............................................. 188 Unidade 12: A percepção da escola da participação dos pais ................................................ 192 Unidade 13: Preparação profissional para as vivências comunitárias. ................................... 196 Unidade 14: A participação da comunidade no planejamento das ações ............................... 197 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 199 REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 213 APÊNDICES APÊNDICE A – CONTRIBUIÇÃO TÉCNICA DA DISSERTAÇÃO APÊNDICE B – QUESTIONÁRIO DOCENTE APÊNDICE C – QUESTIONÁRIO DISCENTE APÊNDICE D – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO TCLE APÊNDICE E – SELEÇÃO DE DOCENTES PARA PARTICIPAR DO GRUPO FOCAL APÊNDICE F – ROTEIRO DE ENTREVISTAS APÊNDICE G – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA GRAVAÇÃO DE DADOS ANEXO A – PARECER CONSUBSTANCIADO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA ANEXO B – PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DA ESCOLA PESQUISADA 16 INTRODUÇÃO Ao nomear a gestão democrática do ensino público para educação básica, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 9394/96)1 prevê que os profissionais da escola deverão organizar o seu Projeto Político-Pedagógico – PPP de ensino. Tal perspectiva, acompanhando o cenário de redemocratização das instituições no país, sinaliza com as possibilidades de maior participação e autonomia da comunidade escolar. O PPP sistematiza as intenções educacionais da escola, suas convicções pedagógicas e práticas de gestão, pela participação dos profissionais (professores, diretores, supervisores, auxiliares), alunos e demais segmentos da comunidade na definição de estratégias e objetivos coerentes com o enfrentamento dos desafios e construção da escola, da sociedade desejada (VEIGA, 2004; QUARESMA, 2012). Consiste na expressam da própria autonomia, entendida como a “[...] capacidade da escola elaborar e implementar um Projeto Político-Pedagógico que seja relevante à comunidade e à sociedade a que serve.” (NEVES, 1995. p.113). Essa capacidade é expressa na participação conjunta e articulada dos sujeitos no PPP. Essa autonomia da escola e construída fundamentalmente na dialética de constituição do PPP, envolve rupturas com o presente e a constituição de possibilidades futuras, num diálogo permanente da comunidade com os campos instituintes e instituídos que caracteriza a sua realidade histórico-social (GADOTTI, 2004). Quanto ao PPP da escola pesquisada menciona-se a construção de uma educação de qualidade, orientada pela formação cidadã e inclusão no mundo do conhecimento e do trabalho, com respeito às diferenças e autoestima, fundada em princípios educacionais críticoparticipativos: “pensar coletivo na busca de estratégias que permitam [...] proporcionar aos alunos e comunidade uma educação cidadã, possibilitando a participação e integração em 1 Segundo o Art. 14º. Da LDBEN 9394/96, os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. 17 todas as atividades desenvolvidas [...]” (PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA PESQUISADA, 2012, p.03). A escola define o Projeto Político-Pedagógico como “uma construção coletiva que evidencia intencionalidade educativa, balizando as ações pedagógicas, tendo em vista a prática reflexiva constante, necessária para uma educação de qualidade, inovadora e para todos.” (PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA PESQUISADA, 2012, p.30). Por outro lado, essa perspectiva de participação no PPP ao pressupor as possibilidades de maior envolvimento dos sujeitos exige o fortalecimento democrático-participativo para que seja expressão da vivência da comunidade, das dimensões histórico-sociais dos sujeitos e do caráter edificante e/ou emancipatório das suas práticas (VEIGA, 2003). Ao sustentar no caráter edificante, com valorização das dimensões autogeradoras dos sujeitos, o PPP consiste numa expressão da própria realidade histórico-social da comunidade, que tem na proposta as referencias necessárias para articular práticas de vivências instituintes que alteram os campos instituídos. Assim, converte na expressão dos próprios processos de inovações educacionais, da relação entre processos de estabilidade (instituídos) e mudança (instituinte) pela participação coletiva dos sujeitos. Para Carbonell (2002) um Projeto Político-Pedagógico inovador associa conhecimento e afeto, o pensamento e os sentimentos, o raciocínio e a moralidade, o acadêmico e a pessoa, as aprendizagens e os valores. Pressupõe um aprofundamento dos processos participativos e uma formação integrada à realidade histórico-social da comunidade. Um projeto educativo inovador expressa finalidades e esperanças no futuro; histórias e narrações compartilhadas; objetivos globais relativos à personalidade dos alunos, seu desenvolvimento social e suas aprendizagens; concepções sobre a convivência e a maneiras de enfrentar os conflitos (CARBONELL, 2002, p.81). Assim, um PPP inovador apoia-se nos processos democrático-participativos, sustentando nas próprias sinergias comunitárias de construção de um caminho educativo coerente com a realidade histórico-social dos sujeitos. Exige condições societárias de gestão como forma de assegurar a autonomia e o compromisso da comunidade na melhoria da qualidade 18 educacional, consequentemente, da transformação da escola pela prática concreta dos seus sujeitos. Entretanto, nas experiências profissionais2 como Analista Educacional da Superintendência Regional de Ensino de Teófilo Otoni – SRE, as possibilidades edificantes do PPP não têm sido percebidas na grande maioria das escolas. Há lacunas em seu caráter edificante e/ou emancipatório e, consequentemente, nas inovações aderentes à realidade histórico-social dos sujeitos. As práticas concretas existentes nas escolas, onde o pesquisador realiza acompanhamento, estariam mais próximas do que Veiga (2003) designa de caráter racional ou técnico, no qual as propostas assumem um sentido burocrático, de cumprimento das formalidades da política pública. Portanto, distante da vivência de um processo dinâmico que expresse a própria realidade histórico-social dos sujeitos. Essas evidências associadas à atividade profissional do pesquisador, das tendências de vivência do caráter burocrático do PPP sinalizam com uma atuação desarticulada dos sujeitos, com redução das possibilidades efetivas de construção de um projeto coletivo com ampla participação comunitária na produção de práticas inovativas endógenas3. Por outro lado, estudos realizados apontam também incoerências na gestão escolar, consequentemente, nas práticas do PPP, destacando acordos referendados em gabinetes e a ausência de um sentido político-democrático das transformações da escola em sintonia com a realidade histórico-social dos sujeitos (GOHN, 2007; LIBÂNEO, 2008; VEIGA, 2003). Essa ausência de sentido político-democrático das transformações estaria associada à cultura dos órgãos centrais de definir um modelo educacional a ser executado pelas escolas com previsão das estratégicas de implantação, acompanhamento e controle das ações, desconsiderando aspectos da cultura escolar (LIBÂNEO, 2008). 2 O pesquisador, desde 2002, exerce as suas atividades na Superintendência Regional de Ensino de Teófilo Otoni como Analista Educacional, cujas atividades profissionais são ligadas ao acompanhamento e apoio às escolas na implantação dos programas/projetos das políticas de ensino em curso no Estado. 3 Entendidas como aquelas associadas ao caráter edificante do PPP, no qual as mudanças são propostas pelos próprios sujeitos envolvidos, perpassando por concepção e prática. Assim, diferem dos processos de mudanças que são prescritos às escolas. 19 A definição pelos órgãos centrais de um modelo a ser seguido pelos sistemas de ensino sustenta em práticas de difusão das inovações em que são desconsideras as especificidades de cada unidade educativa como detentora de uma realidade histórico-social própria (HERNÁNDEZ et al, 2000; CARBONELL, 2002). Percebe-se que há dificuldades na constituição das relações recíprocas, no diálogo como uma possibilidade da comunidade refletir sobre a variedade de percepções da cultura pedagógica e processos gestionários mais coerentes com a realidade histórico-social do PPP. Do problema de pesquisa Assim, as experiências relacionadas às atividades profissionais do pesquisador e os fundamentos teóricos relativos aos processos participativos nas escolas apontaram para uma contradição entre a previsão legal de gestão democrática das práticas do PPP e as formas como efetivamente o mesmo é vivenciado no interior das escolas4. A atividade profissional do pesquisador e a relação com os seus pares permitiram constatar que o universo de 39 escolas que compõem a rede pública estadual de ensino do município de Teófilo Otoni, distribuído em 07 escolas rurais e 32 urbanas, em sua maioria, requer uma maior sinergia escola-comunidade nas práticas do PPP. Nesse sentido, sem apropriação dos sujeitos escolares dos processos participativos de vivência e (re) construção do PPP fica comprometido, inexistindo uma coerência entre o que é proposto formalmente e o que é praticado no interior da escola. Por outro lado, pela atividade profissional do pesquisador, constatou-se que algumas escolas empreendiam esforços para maior participação da comunidade nas práticas do PPP, sinalizando intenções de vivência autogeradora em detrimento ao caráter técnico ou racional. 4 Em aproximadamente 10 anos de atividade profissional na SRE de Teófilo Otoni, exercendo as atribuições de Analista Educacional, são recorrentes as reclamações dos diferentes segmentos da comunidade escolar. É comum, por exemplo, professores reclamarem da ausência de participação nas decisões, assim como, as queixas da direção quanto a falta de apoio da sua comunidade, especialmente dos professores, no desenvolvimento da escola. A mobilização e envolvimento da comunidade na gestão participativa do PPP em sua vivência concreta é bastante frágil. 20 Esses esforços eram sugestivos pela possibilidade de existência de modificações nas práticas do PPP para maior participação da comunidade. Essas tendências, que curiosamente se apresentaram como possibilidades de inovações nas práticas do PPP, demandam um maior aprofundamento investigativo, no sentido de compreender as iniciativas em construção que asseguram uma maior participação da comunidade. Diante do cenário reduzido das instituições de ensino que expressam as intenções de uma maior sinergia escola-comunidade na vivência das práticas do PPP uma escola, pertencente ao município de Teófilo Otoni, chamou atenção para os seguintes aspectos: a) A escola situa-se em uma região de vulnerabilidade social e não é vítima de avarias ao seu patrimônio, como roubos, pichações e depredações, considerando que outras escolas do município, nessa mesma condição, são frequentemente vítimas desse tipo de ação. b) A intenção expressa pela escola de aproximar da comunidade nas práticas concretas do PPP, expresso em faixas e cartazes: “Escola e comunidade de mãos dadas” e o fato da escola ser referência em apresentações no município (seminários, encontros, recepção política, igrejas, dentre outros), com destaque para as apresentações do coral da escola. c) O envolvimento da escola em iniciativas e ações propostas por outras instituições (concursos, eventos, apresentações, dentre outros), sugerindo vivências ampliadas do seu PPP. d) Os resultados alcançados pelos alunos em Programas de Avaliação da Educação 5, em 2011, assegurando uma posição de destaque em âmbito da SRE de Teófilo Otoni. Esses aspectos eram sugestivos da existência de inovações nas práticas do PPP para maior participação da comunidade e determinantes para a escolha proposital dessa unidade para análise investigativa. 5 Em 2011, a proficiência da escola no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) foi de 5.5, ficando 17% acima da meta prevista para o período. 21 Objeto da pesquisa e questão central Estando correlacionado com as evidências da prática profissional do pesquisador, o objeto da investigação tomou como referência os processos relacionados às inovações na gestão do PPP e maior participação da comunidade, cujo objetivo geral foi analisar as inovações que estão sendo produzidas na gestão do Projeto Político-Pedagógico que promovem maior participação da comunidade. Esse objetivo geral desdobrou em três pretensões específicas, centradas em compreender o processo de participação da comunidade escolar na gestão democrática do Projeto PolíticoPedagógico; identificar as ações inovadoras que possibilitam a participação da comunidade escolar na gestão democrática do Projeto Político-Pedagógico; evidenciar as possibilidades e limites de participação da comunidade na gestão do Projeto Político-Pedagógico. A questão central procurou evidenciar as inovações que estão sendo construídas no PPP para maior participação da comunidade, tomando como referência o PPP concretamente vivenciado pela escola (campo instituído) em diálogo com as intenções desejadas pelos sujeitos comunitárias (campo instituinte). Assim, orientou-se pela seguinte pergunta: Quais inovações estão sendo construídas na gestão do projeto político pedagógico da escola tendo em vista maior participação da comunidade? Por inovação na prática do PPP para maior participação da comunidade são tomados os processos intencionais e sistemáticos de mudanças que envolvem a comunidade e seu caráter autogerador, em sinergia com a realidade histórico-social dos sujeitos envolvidos. Assim, buscou-se dialogar com as questões pedagógicas e de gestão, enquanto condições operativas para vivência das intenções educacionais do PPP e o seu nível de reciprocidade com o projeto de homem e sociedade desejado. 22 O percurso metodológico da pesquisa A investigação consistiu num estudo de caso exploratório-descritivo de uma experiência em construção na rede pública estadual de educação do município de Teófilo Otoni- MG com planejamento mais estruturado da pesquisa. Sendo as práticas de gestão e pedagógicas do PPP um processo dinâmico “a metodologia de pesquisa qualitativa pode descrever a complexidade de determinado problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar processos dinâmicos vividos por grupos sociais” (RICHARDSON, 1999. P.80). A natureza social do fenômeno e a necessidade de compreender as inovações nas práticas do PPP em condições edificantes e emancipatórias (VEIGA, 2003) foi fundamental para a escolha do estudo de caso como percurso metodológico da investigação. O recorte em uma unidade institucional foi proposital6 visando aprofundar conhecimentos sobre práticas do PPP e participação da comunidade. De acordo com Gil (1995) o delineamento em estudo de caso pode ser feito em quatro fases: a delimitação da unidadecaso; a coleta de dados; a seleção, a análise e a interpretação dos dados e a elaboração do relatório. A escola pesquisada atende 4537 alunos dos anos iniciais do ensino fundamental8 dos bairros Funcionários, Filadélfia, Esperança, Frei Júlio, Jardim São Paulo, Vila Progresso, Solidariedade, Pindorama, Alunos da casa Nazaré e Teófilo Rocha9. São bairros marcados 6 A atividade profissional do pesquisador na Superintendência Regional de Ensino de Teófilo Otoni – SRE permitiu situar evidências empíricas e o caráter proposital, tais como: a escola situar em área de risco social e não ser vítima de violência, principalmente de avarias ao seu patrimônio, sugerindo uma relação diferenciada na vivência do PPP pela comunidade; a existência de elementos espontâneos (faixas, cartazes, apresentações, entre outros) de aproximação da escola com a sua comunidade, a disposição da escola de colaborar e participar de iniciativas promovidas por outras instituições da comunidade e os resultados alcançados pela escola no Programa de Avaliação da Alfabetização de Minas Gerais. 7 Dados fornecidos pela Superintendência Regional de Ensino de Teófilo Otoni. 8 De acordo com a LDB 9394/96, a Educação Básica é composta pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio. O Ensino Fundamental é composto pelos anos Iniciais (1º ao 5º ano) e finais (6º ao 9º ano). 9 Os bairros citados são baseados no zoneamento geográfico adotado para o cadastramento escolar que não reflete a realidade vivida pela escola, considerando que não atende nenhuma aluno do Bairro Funcionários e Filadélfia. Apesar de próximos à escola esses dois bairros são de classe média e os pais não matriculam os filhos na escola pesquisada. Assim, o zoneamento geográfico não corresponde à realidade vivida pela escola. 23 pela violência10 imposta pelo tráfico de drogas, persistindo rivalidades e disputas pelo domínio de regiões estratégicas. Na agregação dos impactos e aproximação prática do fenômeno (DEMO, 1994) foram utilizadas as seguintes técnicas de coleta de dados: entrevistas semiestruturadas, grupo focal e questionário, orientando-se pela perspectiva de “os procedimentos e instrumentos de coleta de dados nas pesquisas qualitativas são ‘multimetodológicos’, isto é, usam uma grande variedade de instrumentos de coleta de dados.” (ALVES-MAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 1998, p.163). A primeira aproximação com a realidade empírica baseou-se na aplicação de um questionário aos 28 docentes (APÊNDICE B) e 84 discentes (APÊNDICE C) do 4º ano do Ensino Fundamental considerando a singularidade desses sujeitos na produção de inovações 11 no PPP. Esse primeiro momento possibilitou constituir uma base de dados das práticas pedagógicas e de gestão do PPP e o seu diálogo com a comunidade. Dos questionários aplicados, considerando os aspectos mais relevantes para compreensão das temáticas, foram selecionados 10 professores e 10 alunos para participar dos grupos focais, cuja intenção foi o aprofundamento qualitativo da vivência do PPP no interior da escola. As entrevistas seguiram a sistemática de um “encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas obtenha informações a respeito de determinado assunto, mediante uma conversação de natureza profissional” (LAKATOS; MARCONI, 2010, p.197). As entrevistas foram realizadas com 02 supervisores da escola, com a diretora e com um membro da comunidade voluntário do coral, tendo em vista o papel desses sujeitos na articulação dos processos participativos nas práticas do PPP. A combinação de técnicas de coleta de dados de caráter qualitativo (grupos focais e entrevistas) e quantitativo (questionários) visaram assegurar um maior nível de credibilidade e validade dos resultados. A interpretação dos dados sustentou na identificação das unidades 10 De acordo com o mapa da violência dos municípios brasileiros, baseados nos atestados de óbitos cadastrados pelo Subsistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde, Teófilo Otoni ocupa a 46º posição dos municípios mais violentos do país em 2006. 11 Vê-se que “as inovações que vêm de baixo, ao próprio coletivo docente, têm mais possibilidades de êxito e continuidade do que aquelas que emanam de cima.” (CARBONELL, 2002, p.28). 24 de análise e agrupamento em categorias empíricas (OLIVEIRA, 2007) e na triangulação das informações obtidas nos questionários, nos grupos focais e entrevistas (LEONARDO; GOMES: WALKER, 1994). Da relevância, conceitos centrais e estrutura da investigação Ao percorrer a análise das inovações produzidas nas práticas do PPP para maior participação da comunidade, orientando-se pelo caráter autogerador e realidade histórico-social dos sujeitos, a investigação visou contribuir com o aprofundamento das relações democráticas no interior da escola e participação social da comunidade. Ainda teve como pretensão sistematizar uma experiência concreta de participação social comunitária no PPP, apontando aspectos relevantes para participação da comunidade e produção de inovações em suas práticas gestionárias e pedagógicos. Ao tomar posição dos processos societários como mais adequados para a participação da comunidade objetivou contribuir com o repensar das políticas públicas, da conversão dos processos prescritos em uma lógica de auto-organização e associação da comunidade, onde a sociedade civil assuma papel proativo. Assim, a compreensão das dimensões societárias, o aprofundamento democráticoparticipativo e sentido autogerador dos sujeitos nas práticas do PPP sinaliza com uma implicação dos sujeitos quanto as práticas de gestão social, entendidas como um processo de organização da educação pelo e para além do Estado onde a comunidade, em especial segmentos da sociedade civil, desenvolvem ações educacionais de interesse público. Estaria em consonância com o conceito de gestão social expresso por Tenório (2006) de um processo dialógico no qual a autoridade decisória é compartilhada entre os sujeitos da ação. Ao destacar o envolvimento da comunidade nas práticas do PPP, com participação de segmentos da sociedade civil, a sistematização da experiência torna-se relevante para a compreensão das implicações da escola, do papel proativo e co-responsabilidade dos seus sujeitos para o desenvolvimento local (DOWBOR, 2006). Quanto a estrutura desta dissertação no primeiro capítulo situa-se o conceito de inovações, sua emergência no campo econômico e deslocamento para as áreas de caráter não- 25 tecnológicas, permitindo compreender a emergência social e educacional dos processos inovativos. É estabelecida, na última parte desse capítulo, uma aproximação entre inovações educacionais e práticas do PPP. No segundo capítulo, o conceito de gestão é correlacionado com as concepções de organização do trabalho escolar e suas aproximações com o PPP, enfatizando as possibilidades de participação da comunidade. Nesse capítulo sinaliza-se com a perspectiva das dimensões societárias como possibilidades de aprofundamento do projeto democráticoparticipativo e vivência do caráter autogerador do PPP pelos sujeitos comunitários. No terceiro capítulo são analisadas as experiências que vem sendo empreendidas por uma escola pública de práticas pedagógicas e de gestão para maior participação da comunidade no PPP. São enfatizadas as principais tendências em curso, seus limites e possibilidades, de expressão dos processos inovativos autogeradores. Apoiando na revisão literária e na análise dos resultados obtidos o pesquisador apresenta suas considerações finais quanto ao objeto da investigação e a suposição incialmente levantada a partir da questão central. As considerações finais serviram de base para organização de uma contribuição técnica da pesquisa (APÊNDICE A). 26 1. A TRAJETÓRIA DAS INOVAÇÕES E SUA EMERGÊNCIA NO CONTEXTO EDUCACIONAL 1.1 Inovações: origem e evolução conceitual A emergência da chamada teoria da inovação data do início do século XX, quando o economista e professor da Universidade de Havard, Joseph Schumpeter, correlacionou a emergência de novos produtos com os ciclos rápidos de dinamização da economia, destacando a influência das novas tecnologias no desenvolvimento do capitalismo. Como pilares básicos do pensamento inovativo Schumpeteriano, o Manual de Oslo (2005), elaborado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pelo Eurostat, ressalta a introdução de novos produtos, a abertura de novos mercados, a criação de novas estruturas industriais e o desenvolvimento de novas fontes provedoras de matérias-primas. A ideia prevalecente era do aperfeiçoamento e/ou criação de novos produtos ou processos como fator de dinamização da economia, rearticulando os novos ciclos de desenvolvimento do capitalismo. A criação de novos produtos ou processos de produção rearticuladores dos ciclos de crescimento econômico, ideia central do pensamento Shumpeteriano, passa a ser denominada de inovações tecnológicas ou de produtos – TPP. Estaria associada ao desenvolvimento de novos produtos para serem lançados no mercado e/ou à otimização dos processos de produção, com redução, principalmente, do tempo e custos da produção. As novas tecnologias associadas aos processos de produção e os novos produtos propostos por Schumpter na década de 1930 são analisados por Bautzer (2008), destacando que envolvem doses de incertezas e assumir os riscos quanto à revisão do pensamento sistêmico operante. A modificação dos processos de produção e criação de novos produtos, segundo o mesmo, demanda certo grau de “destruição criadora”, desafiando as organizações a repensarem as condições operantes. Esse processo de destruição associa-se à própria capacidade de criação, de produção de modificações nas condições operantes para retomada 27 dos ciclos de crescimento econômico, enquanto estratégia para a retomada dos ciclos de crescimento em momentos de crise capitalista. Todavia, o que Schumpter não havia previsto era que outras dimensões são intervenientes nos ciclos de crescimento capitalista, podendo a crise estar associada à retração do consumo das famílias, ao excesso de produção, à concentração de renda, ao desemprego, e a produtos estandardizados12. Esses outros elementos da crise do capital são bem visíveis em 1970, quando as modificações nos processos de produção e criação de novos produtos demonstram ser insuficientes para a retomada do ciclo de crescimento capitalista, demandando repensar questões de ordem nãotecnológicas, como diferenciação dos produtos em atendimento às demandas individuais e formas de ampliação do acesso das populações aos bens produzidos. Diante da incapacidade da economia estandardizada de responder à retração do consumo, provocada principalmente pelo desemprego estrutural, crise do capital e esgotamento do chamado estado de bem-estar social (welfare state), a perspectiva schumpeteriana torna-se insuficiente para sustentar as inovações tecnológicas como único fator de dinamização dos ciclos de crescimento capitalista. Outras dimensões, intervenientes nos ciclos de desenvolvimento, especialmente aquelas correlacionadas às questões sociais e culturais, passam a ser relevantes. Na década de 1970, o sistema capitalista passa a adotar o padrão de acumulação flexível13, como estratégia e enfrentamento da crise do capital, enquanto modo de adequação dos sistemas produtivos às formas de organização gerencial, centradas em princípios de eficiência, eficácia e produtividade. Uma das principais mudanças consiste na reorganização das empresas em unidades menores que buscam diferenciar produtos e serviços em atendimento às demandas locais. 12 Esses são apontados como os principais fatores da crise do sistema capitalista de 1970. O modelo flexível de acumulação foi um estratégia de superação da crise do sistema taylorista/fordista da produção padronizada, tendo como diretriz a descentralização dos sistemas produtivos e os princípios de eficiência, eficácia e produtividade. Esses princípios, apropriados pela administração pública, tiveram ampla repercussão no campo educacional (ARAÚJO; CASTRO,2001). 13 28 Diante do novo cenário de acumulação capitalista, as dimensões organizacionais e de marketing emergem como formas relevantes para o modo de acumulação flexível. Enquanto dimensões não tecnológicas, as inovações organizacionais e de marketing passam a sustentar processos de mudanças, tanto na forma de organização e gestão das empresas, quanto na remodelagem e inserção dos produtos no mercado. O Manual de Oslo (2005), acompanhando as tendências da reestruturação produtiva flexível, redefine o conceito de inovação ao incorporar essas dimensões. Uma inovação é a implementação de um produto (bem ou serviço) novo ou significativamente melhorado, ou um processo, ou um novo método de marketing, ou um novo método organizacional nas práticas de negócios, na organização do local de trabalho ou nas relações externas (OCDE, 2005, p.46). Essas mudanças acompanham a dinâmica de reorganização dos processos econômicos, marcada principalmente pela necessidade de diferenciação dos produtos, crescimento do setor de serviços e redução do tempo de vida útil dos produtos. Assim, as dimensões organizacional e de marketing, denominadas de inovações não tecnológicas, passam a ser incorporadas nos processos de gestão das atividades econômicas. Os enfoques organizacionais e de marketing da teoria das inovações remetem para a necessidade de reconhecer novas práticas de gestão, de organização dos espaços de trabalho compatíveis com o modelo da acumulação flexível, da dinâmica de design e inserção de produtos e serviços no mercado. Para Bautzer (2009), a inovação organizacional implica em um “novo olhar” sobre a gestão, permeando tanto empresas quanto as políticas públicas. Esse novo olhar tem sido direcionado para a organização de processos de gestão gerenciais nas empresas, fundamentado em um modelo da administração eficiente, produtiva e com qualidade capaz de se sustentar em ambientes de abertura dos mercados econômicos à ampla concorrência. Quanto às inovações de marketing, estas são vistas por Carvalho (2009) como uma forma de criar abertura para novos mercados e/ou reposicionamento de um determinado produto com o aumento das suas vendas. São relevantes, considerando o princípio de diferenciação dos produtos em ambientes flexíveis, já que visam a aproximar o produto das expectativas do 29 cliente, criando uma imagem producente com a sua satisfação pessoal e de sensações de liberdade, segurança, reconhecimento, bem-estar, dentre outras. Diante da organização flexível dos sistemas produtivos a inovação organizacional e de marketing emergem como resposta ao processo de acirramento competitivo, de globalização dos processos de produção e consumo, nos quais as dimensões local e global estão intimamente interligadas, exigindo uma compreensão de fatores não tecnológicos que influenciam o sistema produtivo. Para Lopes e Barbosa (2008), o processo de inovação não compreende somente as atividades criativas ou inventivas de novas tecnologias, mas também as atividades de gestão, de difusão e adoção das novidades, podendo ser entendido do ponto de vista da estratégia, dos padrões, dos processos de gestão e dos seus tipos. O quadro a seguir sintetiza os tipos de inovações, seus conceitos estruturantes e seus respectivos autores: QUADRO 1: TIPOS DE INOVAÇÕES Tipos Inovações em produtos e serviços Inovações em processos e operações Inovação em marketing Inovação de estratégia Inovações de gestão e organizacionais Descrição Serviços ou bens melhorados (especificações técnicas, componentes e materiais, softwares, entre outros) em suas características e usos previstos. Introdução de novas tecnologias com mudanças na produção de bens e prestação de serviços. Autores OCDE (2005) Mudanças na concepção do produto (embalagem, posicionamento, promoção, preços). Novos modelos de negócios com mudança de suprimentos, proposição de valor e cliente-alvo. OCDE (2005) Mudanças na gestão e organização do trabalho Hamel (2007) Hamel (2007) Davila et al (2007) Miles e Snow (2007) Chandler (1997) Dampanpour (1991) Hamel (2007) Daft (1978) Birkinshaw e Mol (2006) Tigre (2006) Fonte: Adaptado pelo pesquisador baseando em Lopes; Barbosa (2008, p.4) Observa-se que as inovações sintetizadas no QUADRO 1 visam otimizar os sistemas das empresas na criação de diferenciais competitivos. Esses diferenciais estariam relacionados aos 30 produtos, serviços ou modo de gestão. A ideia central é produzir mudanças que assegurem às empresas diferenciarem-se frente às concorrentes no mercado. Pelo prisma econômico, os processos inovativos são entendidos como motor de dinamização da economia de mercado, representando dimensões fundamentais dos ajustes estruturais do sistema capitalista, especialmente em resposta às crises cíclicas do capitalismo. Por outro lado, mesmo diante do padrão de acumulação flexível, os processos inovativos têm demonstrado fragilidades quanto à sustentação dos sistemas de mercado apenas pelo viés econômico, demanda repensar as inovações em outros campos, como o social e o educacional. 31 1.2 As inovações quanto ao padrão ou grau de novidade Em relação ao padrão ou grau de novidade das inovações, do seu impacto no ambiente da organização, Carvalho (2009) ao revisar a literatura identifica os níveis de variação a seguir. QUADRO 2 INOVAÇÕES E O GRAU DE NOVIDADE Tipos Descrição Radical/Incremental Sustentação/Ruptura Autônomas/Sistêmicas Descontínua/Contínua 2 Realmente novo/Incremental Autores Schumpeter (1934); Stobaugh (1988); Freeman (1994); Lee e Na (1994); Atuahene-Gima (1995); Balachandra e Friar (1997); Kessler e Chakrabarti (1999). Christensen (1997); Christensen e Overdorf (2000) Cheesbrough e Teece (1996) Anderson e Tushman (1990); Robertson (1967) Shimidt e Cantalone (1998); Song e Montoya-Weiss (1998) Grossman (1970) Normann (1971) Maidique e Zirger (1984) Yoon e Lilien (1985) Rothwell e Gardiner (1988) Meyers e Tucker (1989) Utterback (1996) Rice et al. (1988) Kleinshmidt e Cooper (1991) Wheelwright e Clark (1990) Henderson e Clark (1990) Abernathy e Clark (1985) Moriarty e Kosnik (1990) Instrumental/final Variações/reorientações Verdadeira/adoção Original/reformulada Inovação/re-inovação Radical/rotina Evolucionária/revolucionária Ruptura/Incremental 3 Baixa/moderada/alta novidade Incremental, nova geração, radicalmente novo Incremental/modular/arquitetural/radical Criação nicho/arquitetural/regular/revolucionária Incremental/mercadologicamente 4 evolucionária/tecnologicamente evolucionária/radical Incremental/arquitetural/fusão/ruptura Tidd (1995) 5 Sistemático/principal/menor/incremental/sem Freeman (1994) registro Reformulado/novas Johnson e Jones (1957) 8 partes/remerchandising/novas melhorias/novas produto/novo usuário/novo mercado/novo consumidores Fonte: Carvalho, 2009. p.8. Quanto ao padrão e grau de novidade, as inovações estão relacionadas ao impacto que os processos de mudança produzem no interior das instituições, nos seus produtos, serviços e 32 mercados alvos. Perpassam desde ajustes nos fluxo dos processos a mudanças de ordem estrutural. Machado (2009)14, ao revisar Lemos (1988), infere que a inovação radical ou primária corresponde a eventos novos que provocam mudanças profundas em produtos, processos e organização, dando origem a novas oportunidades. Ao passo que a inovação incremental corresponde a aperfeiçoamentos e reajustes que são feitos em produtos, processos ou formas de organização sem ruptura paradigmática. É nesse sentido que a organização da produção no chamado modelo de acumulação flexível, baseado na descentralização das atividades, unidades de produção menores e participação de todos na construção dos princípios de eficiência, eficácia e produtividade, é visto como uma inovação radical que buscou superar a crise da produção em série do sistema taylorista/fordista. As inovações radicais podem ser vistas como uma estratégia adotada para o enfrentamento dos ciclos de depressão do sistema capitalista, no qual a conversão de novas ideias em práticas produz modificações de caráter estrutural, cuja intenção é retomar os ciclos de crescimento. Ao passo que as inovações incrementais estariam relacionadas aos ciclos de crescimento, constituindo em diferenciações dos produtos em ambientes de ampla concorrência para manter posições estratégicas. Nesse sentido, a pertinência das inovações radicais seria maior nos ciclos de depressão, enquanto as incrementais como estratégia de prolongamento dos ciclos de crescimento. Assim, Machado (2009) associa as inovações radicais às mudanças qualitativas e as inovações incrementais às mudanças quantitativas. As inovações radicais seriam mudanças substanciais da existência das coisas e as incrementais, a continuidade dos processos. Infere-se que o qualitativo estaria para mudanças na estrutura em processos, tecnologias e modelos organizacionais, sendo a gênese de proposições paradigmáticas que visam à superação das disfunções do sistema capitalista. Ao passo que a dimensão quantitativa consistiria em aperfeiçoamento do paradigma vigente, na produção de ajustes de sustentação do sistema em curso. 14 Refere-se a obra: LEMOS, Cristina. Inovação na Era do Conhecimento. In: LASTRES, M.M; ALBAGLI, Sarita (Orgs). Informação e Globalização na Era do Conhecimento. Cap. 5, Rio de Janeiro: Campus, 1999. 163p. 33 Quanto à natureza da mudança, Carvalho (2009)15, sustentando-se em Christensen (1997) e Christensen; Overdorf (2000), denomina as inovações como de sustentação e de ruptura. As inovações de sustentação procuram melhorar o desempenho de um produto, já conhecido no mercado, enquanto as de ruptura significariam a criação de novos produtos. Carvalho (2009)16, ao revisar Cheesbrough; Teece (1996), diferencia as inovações autônomas das sistêmicas. As inovações autônomas são descritas como aquelas que podem ser desenvolvidas independente das outras, enquanto as sistêmicas dependem de outros campos diretamente relacionados aos processos de mudanças. A título de ilustração, os processos de inovação autônomos e sistêmicos poderiam ser como um processo de mudança no interior de uma determinada empresa, no qual, em cada setor de trabalho, os servidores poderiam, de forma autônoma, melhorar o atendimento ao público, reduzir o tempo de espera, por exemplo, com um sistema de agendamento. Por outro lado, em muitos aspectos, a proposta precisaria ser vista de modo sistêmico, buscando uma coesão entre os diferentes setores na constituição de uma rede articulável de troca de informações e melhoria da empresa. Ainda que a teoria das inovações esteja, inicialmente, vinculada ao campo econômico, tendo como pano de fundo garantir a sustentabilidade para as organizações em um ambiente de concorrência, ver-se-á que, a partir da década de 1980, essa perspectiva é apropriada em suas dimensões sociais, política, cultural e educacional. 15 Refere-se as obras: CHRISTENSEN, C.M. Making strategy: learning by doing. Harvard Business Review, p.141-156, nov./Dec. 1997; CHRISTENSEN, C.M; OVERDORF, M. Meeting the challenge of disruptive change. Harvard Business Review, p. 66-76, Mar./APR.2000. 16 Refere-se a obra: CHESBROUGH, H. W.;TEECE, D.J. When is Virtual Virtuous? Harvard Business Review, v.74, n.º 1, p.65-73, May/June, 1996. 34 1.3 Novos enfoques dos processos inovativos Originária do início do século XX, a perspectiva Schumpeteriana persiste até a década de 1980, sustentando a ideia do desdobramento das novas tecnologias em produtos e processos produtivos como fator fundamental para a sustentabilidade da economia, estimulando os ciclos de crescimento econômico. Com a chamada revolução científico-tecnológica houve mudanças profundas e aceleradas nas formas de produzir e nas relações sociais que as acompanham (MACIEL, 2001), destacando a abertura econômica, a internacionalização dos sistemas produtivos, a volatilidade dos capitais, as crises econômicas e as modificações dos hábitos de consumo locais. Machado (2009)17, ao discutir o pensamento de Freeman (1982, 1992), chama a atenção para a insuficiência da abordagem das inovações circunscritas à dimensão econômica das empresas, destacando a necessidade de uma maior sinergia entre governos, sistema produtivo e instituições de pesquisas no novo contexto emergente. Reconhecendo que a globalização caminha paralelo ao processo de acumulação flexível, um dos principais aspectos da insuficiência da tipificação das inovações em produto e processo consiste no fato de não assegurar a sustentabilidade econômica já que fatores como o nível de organização dos sistemas democráticos, a educação e o acesso a serviços sociais básicos passam a ser decisivos. É nessa direção que o aumento das disparidades sociais, especialmente na apropriação dos processos tecnológicos, implica na necessidade de repensar as inovações como fator capaz de assegurar uma maior equidade no campo social e educacional para a sustentabilidade mundial. Machado (2009)18, apoiando-se em Andrade (2005), aponta lacunas na abordagem de Shumpeter e neoschumpeterianos, ao restringir o debate dos processos inovativos à lucratividade e aos resultados econômicos das pesquisas em desenvolvimento. Nesse sentido, repensar as questões de ordem social torna-se imprescindível à construção de uma 17 Refere-se as obras: FREEMAN, Christopher. Economics Of Industrial Innovation. Cambridge: MIT, 1982; FREEMAN, Christopher. The Economicas of hope. Londres: Pinter. Publishers, 1992. 18 Refere-se a obra: ANDRADE, Thales. Inovação e Ciências Sociais: em busca de novos referenciais. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v.20, n.58, junho/2005, p.145-156. 35 sustentabilidade global. É necessário que os modos organizacionais de apoio às inovações, o debate das relações entre ciência e tecnologia, o ritmo técnico das inovações, dentre outras, tenham como referência as questões sociais. Assim, torna-se imprescindível pensar os processos inovativos, tendo como referência transformações que assegurem maior equidade social, ou seja, que contribuam com o acesso das populações a direitos universais como renda mínima, trabalho, lazer, justiça, educação, dentre outros. Reforçado a importância da compreensão das inovações Maciel (2001) destaca que sua compreensão na área social e tecnológica é fundamental, tanto para a ciência social, quanto para as políticas e estratégias de desenvolvimento em médio e longo prazo. Nessa direção, vale destacar que os fatores da capacidade inovadora de uma empresa estão para além das questões econômicas de desenvolvimento de novas tecnologias: a capacidade inovadora de uma empresa ou de uma nação não depende pura e simplesmente de sua capacidade econômica de investir em novas tecnologias nem da de seus dirigentes para elaborar estratégias econômicas adequadas, e sim da capacidade social, cultural e política de aplicar produtivamente e aproveitar socialmente os recursos - materiais e imateriais – disponíveis (MACIEL, 2001, p.19). Reconhecendo que os processos de desenvolvimento sustentável estão para além das questões econômicas, ganham espaços tendências que procuram interpretar os processos inovativos no curso da história, propondo um pensamento reflexivo que contrapõe a perspectiva determinista de restrição das inovações ao tecnológico e econômico. Outras dimensões intervenientes nos processos inovativos passam a serem destacadas, como as questões educacionais, políticas, sociais, culturais. Assim, emergem novas possibilidades de compreensão dos processos inovativos como objeto de estudo. Para Lopes e Barbosa (2008), a metodologia de abordagem das inovações como um fenômeno social pode ser classificada em dois tipos, nomotética e ideográfica. A primeira enfatiza a forma, a técnica e o uso de protocolo sistemático de pesquisa tipicamente existentes nas ciências naturais, objetivando testar hipóteses pelo rigor científico. A segunda defende a 36 proximidade com o sujeito, sua experiência e história de vida, valorizando a percepção dos indivíduos no contexto do fenômeno pesquisado. Entende-se que a metodologia ideográfica apresenta-se como mais adequada para a compreensão das inovações enquanto fenômeno social, captando dimensões da subjetividade dos sujeitos, permitindo compreender com maior riqueza de detalhes processos de transformação contínuos e sistemáticos em suas dimensões sociais. É nesse sentido que, ao percorrer os processos inovativos, tendo como referência a inteligibilidade histórica do homem, Machado (2009) estabelece um diálogo com as perspectivas teóricas de natureza social apontado as abordagens de translação, redes sociais, conhecimentos tácitos e ambientes de inovação. Essas abordagens são sintetizadas no QUADRO 3 a seguir: QUADRO 3 PERSPECTIVA DE ABORDAGEM SOCIAL DA INOVAÇÃO Abordagem Perspectiva de inovação Translação (LATOUR, 1992; 2000) Síntese de processos contraditórios e conflituosos pelo processo de translação. Redes Sociais (CASTELLS, 1999; Redes sociais impulsionadas por tecnologias da informação e 2003) comunicação (TIC) que estimulam a interação social e a circulação de conhecimentos em ambiente cooperativo. Conhecimentos tácitos (COWAN; Codificação de conhecimentos tácitos em redes sociais de FORAY, 1998) interação e cooperação. Ambientes de inovação (MACIEL, As características físicas, culturais e sociais do lugar 1996;1997; 2001) associadas à criatividade da população. Fonte: Adaptado pelo pesquisador baseando em Machado (2009, p.14-19) Em todas essas abordagens, há um reconhecimento dos sujeitos em sua dimensão social, valorizando as experiências existentes nos espaços comunitários. Cada qual, ao seu modo, envolve estratégias de aproximação da realidade social e processos de aprendizagem coletiva, quer seja por meio de translações, redes de conhecimento social, experiências comunitárias tácitas e/ou ambientes de inovação. São possibilidades de intercâmbio de experiências e fomento de aprendizagem, num processo interativo que valoriza dimensões de trabalho coletivo e colaborativo do grupo. 37 Nesse sentido, essas abordagens são possibilidades de vivência dos fenômenos sociais em sua natureza autogerador, perpassando pelo reconhecimento dos aspectos subjetivos e das suas dimensões históricas nos processos participativos, com capacidade de síntese de pensamentos complementares e/ou contraditórios. Diante das novas possibilidades de abordagem das inovações, especialmente em suas dimensões sociais, Machado (2009)19 chama a atenção para os riscos do entendimento da tecnologia como um movimento autônomo, fundado em explicações reducionistas das dimensões históricas e sociais. Ao revisar Ianni (2007), a autora enfatiza a necessidade de compreensão das inovações como síntese de pensamentos contraditórios, envolvendo sempre pontos como: singular e universal; quantitativo e qualitativo; teoria e prática; sujeito e objeto; entre outros. Assim, para explicar a conversão das mudanças quantitativas em qualitativas, Machado (2009)20, apoiando-se nas relações de medidas nodal21 de Hegel, descreve que há pontos específicos de variação quantitativa em que as mudanças convertem-se em uma nova dimensão qualitativa do objeto, fenômeno, produto ou processo. Essa passagem das determinações quantitativas para qualitativas revela-se em três processos: a variação gradual, a transição e a superação. A variação gradual consistiria em mudanças em maior ou menor grau da quantidade do objeto, produto ou processo, mantendo sua natureza quantitativa. Pode ser interpretada como pequenos ajustes, incrementos quantitativos. Quanto à transição, implica numa ruptura da progressividade quantitativa, determinada pela emergência de dimensões qualitativas de rupturas do fenômeno. A continuidade da transição impulsiona para uma superação, podendo ser interpretada como um salto de progressividade, com a conversão da dimensão quantitativa em qualitativa. Essa dinâmica de conversão das determinações quantitativas em qualitativas indica que há uma relação de diferenciação das dimensões do objeto. A diferenciação estaria na própria 19 IANNI, O. A crise dos paradigmas na sociologia: problemas de explicação. Disponível em: HTTP: // www.anpocs.org.br/portal/publicações/rbcs_00_13/rbcs13_05.htm. Acessado em 31 agosto de 2007. 20 Refere-se a obra: HEGEL, G.W. F. Textos Dialéticos. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1969. 21 Na linha nodal de medida de Hegel, as dimensões quantitativas de mudanças do fenômeno, objeto ou processo são vistas como o quanta (quantitativa) que em determinados pontos específicos criam uma nova dimensão quantum (qualitativa). 38 natureza do objeto, já que as dimensões quantitativas seriam incrementais, sem modificação da sua natureza e as qualitativas, um movimento de ruptura da sua natureza essencial. A diferenciação estaria associada ao fato de que um salto qualitativo do objeto é precedido por modificações de ordem quantitativa, que, paulatinamente, vão expressando o esgotamento das suas possibilidades e suas contradições, sendo necessárias mudanças de caráter qualitativo. Esse momento ou fenômeno em que as mudanças quantitativas provocam as qualitativas seria decorrente da “luta de contrários, do desenvolvimento por meio de contradições, da negação de negação” (MACHADO, 2009, p.24). Assim, as relações históricas travadas pelos sujeitos envolvem o pensamento divergente e diferentes contrapontos, desestabilizando processos instituídos e criando um campo instituinte22 com capacidade de lidar com a incerteza e assumir desafios quanto ao futuro. Obviamente, o movimento de superação, com a construção de novas determinações qualitativas do objeto, exige ser pensado em uma dinâmica processual de construção das relações, numa sistemática que envolve os sujeitos e o movimento constante de aproximação com o campo instituinte desejado. Se por um lado o desenvolvimento tecnológico e das forças produtivas significa avanço científico, modernidade; por outro, pode ser sinônimo de esgotamento das fontes de riqueza, trabalho e aumento das desigualdades (MACHADO, 2009). Assim, é interessante investigar a forma como os sujeitos participam e o nível de responsabilidade social assumido diante dos processos inovativos. Reconhecer as dimensões sociais dos processos inovativos pressupõe superar a visão linear dos fenômenos, já que existem, no interior das relações, pontos de convergência e divergência; tanto facilidades, quanto dificuldades na vivência dos processos de mudança, de superação qualitativa em seu caráter social e coletivo. Partindo da perspectiva histórica e social, as inovações são vistas como “o nível mais elevado das capacidades humanas, pois requer uma visão de conjunto e de síntese das necessidades humanas, dos meios e recursos disponíveis e das condições e oportunidades para o emprego 22 Nesse caso, o campo instituído pode ser entendido como a realidade concreta vivenciada pelos sujeitos e o instituinte como aquilo que se deseja construir, implicando num movimento de ruptura. 39 de conhecimentos e adaptação de soluções tecnológicas.” (MACHADO, 2009. p.12-13). Como fenômeno social, exige uma visão em conjunto, demandando considerar a participação interativa de diferentes atores e instituições na construção de processos de mudanças que atendam aos interesses coletivos. Isso demanda captar as dimensões sociais das inovações no interior das instituições, reconhecendo a forma como os sujeitos envolvem-se com a proposta de organização, assim como são organizados os processos de trabalho e o nível de participação coletiva dos sujeitos. 1.3.1 Os enfoques sociológicos das inovações organizacionais As correntes funcionalista, interpretacionista e humanista radical são vistas por Lopes e Barbosa (2008) como importantes para compreender a penetração das inovações no ambiente organizacional. A seguir, procurar-se-á descrever os principais pontos de sustentação de cada uma das concepções. A) A perspectiva funcionalista A inovação, na perspectiva teórica funcionalista, tem seus fundamentos nos economistas clássicos Taylor e Fayol nas chamadas teorias da economia clássica (administração científica e teoria clássica) que partem do pressuposto de que a sociedade é constituída por organizações racionais e burocráticas regidas por leis científicas objetivas capazes de refutar dimensões subjetivas (LOPES; BARBOSA, 2008). Nesse caso, as inovações são vistas como a aplicação objetiva de um conjunto de princípios e habilidades capazes de trazer mais eficiência na produção pela racionalização dos processos produtivos. Diante da incapacidade do modelo racional de responder a questões diversas, como, por exemplo, os processos de alienação do trabalhador, surgem desdobramentos da perspectiva funcionalista relativos aos processos de organização (LOPES; BARBOSA, 2008), a saber: - Organicista: pressupõe superar o predomínio ideológico e intelectual da teoria clássica, reconhecendo o dinamismo e a instabilidade de organizações complexas; 40 - Escola das relações humanas: as organizações vistas como unidades que integram indivíduos à civilização industrial moderna tutelada por uma administração benevolente e socialmente hábil. Ainda, segundo os mesmos autores, houve a necessidade de incorporar às teorias o ambiente político, social e legal capaz de influenciar nas decisões, cujas teorias destacam as influências externas aos processos das organizações: - Teoria Geral dos Sistemas: a organização é vista como um sistema aberto, reunindo e combinando elementos que formam um todo complexo e uno que processa entradas (recursos humanos, financeiros e materiais), transformando-as em saídas (mercadorias, serviços, realizações e satisfação); - Teoria da Contingência Estrutural: o conjunto de relacionamento da organização forma sua estrutura, incluindo relacionamentos representados em organogramas, comportamentos decorridos de normas e padrões internos e processos de tomadas de decisão. A estrutura tende a ser mais hierarquizada e centralizada, quando predominam tarefas com baixo grau de incertezas, e mais comunicativa e participativa, quando a incerteza da tarefa aumenta; - Corrente institucionalista: busca compreender por que as organizações, diante de pressões institucionais, apresentam homogeneidade em suas estruturas. B) A perspectiva interpretacionista Ao questionarem o “objetivismo” da realidade social, reconhecem as organizações como processos que surgem de ações intencionais, individuais ou coletivas, que partem do ponto de vista dos sujeitos relacionados à ação. Os enfoques interpretacionistas, segundo Vergara; Caldas (2005, p. 67), são o solipsismo, a fenomenologia e a hermenêutica. Os autores descrevem o solipsismo como um enfoque que considera que o mundo é criação da mente ("do eu"). "Ontologicamente, não há criação de coisa alguma" (VERGARA; CALDAS, 2005, p. 67). No que diz respeito à fenomenologia, o objetivo é que o pesquisador deixe de lado seus pressupostos para se chegar ao fenômeno em sua essência. Do enfoque da hermenêutica, que considera que a existência humana é interpretativa, destacam-se as escolas de pensamento do interacionismo simbólico e da etnometodologia. 41 C) A perspectiva humanista radical Essa perspectiva é composta pelo pós-estruturalismo e teóricos críticos, sendo que a preocupação central consiste em desenvolver a dimensão subjetivista da sociologia de mudança radical, sustentando numa epistemologia antipositiva, no voluntarismo como essência da natureza humana e em metodologias ideográficas23 (LOPES; BARBOSA, 2008). Essa concepção, de uma maneira geral, visa a transcender as limitações dos arranjos sociais existentes, de forma a libertar o ser humano do domínio das superestruturas ideológicas. Se o desafio primordial da sociologia é a mudança social na chamada sociedade do conhecimento (MACIEL, 2001), essa concepção apresenta-se de modo bastante apropriado para a compreensão das inovações sociais e educacionais em suas dimensões qualitativas. 1.4 Conceituando inovações educacionais Em sua origem, as inovações educacionais estavam vinculadas a qualquer aspecto novo introduzido nos sistemas de ensino, sendo sinônimo de qualquer novidade, independente do seu caráter intencional ou proposital de melhoria da qualidade educacional ( HÉRNANDEZ et al, 2000). Acompanhando a dinâmica societária, o conceito torna-se convergente com o entendimento de um processo de mudança intencional e sistemático de melhoria da qualidade do ensino (HERNÁNDEZ et al, 2000; CARBONELL, 2002). Uma ação intencional e sistemática pode ser entendida como um caminho desejado, que se pretende percorrer por meio de uma ação articulada e programada pelos sujeitos. Remete, assim, a uma programação, à definição de um caminho possível de conversão das definições para uma prática concreta de aplicação. A conversão das ideias em práxis exige um trabalho contínuo dos sujeitos, com aderência coletiva e aproximação constante da realidade desejada. Supõe sedimentar um caminho que indique a intencionalidade da mudança de modo deliberado e planejado em uma sequência que permita responder a um propósito previsto antecipadamente. Nesse sentido, Hernández et al (2000), descreve as inovações educacionais como um conjunto de mecanismos e processos que são o reflexo mais ou menos deliberado e sistemático, cuja 23 A metodologias ideográficas procuram captar as dimensões subjetivas dos sujeitos da ação. 42 pretensão é introduzir mudanças nas práticas vigentes, de modo que seja uma tarefa necessária, útil e enriquecedora para os sujeitos envolvidos. A organização de processos sistemáticos de mudança nas escolas, com participação dos sujeitos envolvidos, pode envolver tanto questões relativas à gestão administrativa, financeira quanto pedagógica, no intuito de que efetivamente contribuam com a melhoria da qualidade do ensino. No entanto, sem dúvida, o maior desafio são as mudanças pedagógicas, que contribuam com a melhoria da aprendizagem discente. Quanto às políticas públicas de ensino, a perspectiva, recentemente, defendida é de que as questões administrativas e financeiras assegurem a melhoria da qualidade das práticas pedagógicas, ou seja, a melhoria da qualidade de ensino. O administrativo e financeiro demanda ser pensando como suporte necessário para as questões pedagógicas. Ao analisar o caráter multidimensional dos processos de mudança, Fullan24 (apud Hernández et al, 2000) destaca o uso de novos materiais e tecnologias, novas abordagens de ensino e alterações de crenças dos envolvidos como componentes críticos de uma nova proposta de ensino. O maior desafio, segundo o mesmo, situa-se na modificação das concepções dos sujeitos envolvidos, na construção de uma convicção de que as mudanças são possíveis e necessárias. Entende-se que esse sentimento de convicção nos processos de mudança esta associado aos valores intrínsecos dos sujeitos de participar dos processos de transformação da sua própria realidade. A convicção associada à motivação constitui-se num pilar fundamental para que os processos tenham, como referência, o sujeito e sua participação no ambiente coletivo. Contudo, em relação aos sistemas de ensino, tem predominado a contratação de equipes técnicas para a sistematização de programas e projetos de mudanças a serem difundidos nas escolas. A centralização das propostas de mudanças, sem envolvimento dos sujeitos, produz ruptura na convicção e motivação dos sujeitos. As lacunas são relativas ao caráter prescritivo e verticalizado das mudanças, da segmentação entre concepção e execução, que rompe com o sentimento de pertencimento das pessoas que efetivamente estão envolvidas com as transformações. 24 Refere-se a obra: FULLAN, C. The meaning of educational change. New York: Teachers College Press, Columbia University, 1982. 43 Os espaços coletivos de reflexão e programação das propostas podem ser considerados como uma forma de enfrentamento aos processos inovativos centralizados e verticalizados. É importante que os envolvidos sintam-se contemplados e valorizados e que se fortaleça o sentimento de pertencimento e identidade relativo às mudanças, tendo como substrato a melhoria das práticas de gestão e pedagógicas. Propostas de mudanças baseadas nos sujeitos coletivos exigem aprimoramento na gestão democrático-participativa. É essa perspectiva que assegura canais de efetivo diálogo e aderência dos sujeitos com os processos e suas transformações. Acrescenta-se, ainda, que os espaços democráticos favorecem a emergência da consciência dos sujeitos quanto à sua condição singular de transformação da escola. Para Leonardos, Gomes e Walker (1994, p.10), as inovações educacionais consistem em “modificações adotadas no que se refere aos procedimentos na estrutura institucional, no universo do currículo e nas práticas de ensino-aprendizagem.” A estrutura institucional compreende desde o organograma da escola, com os setores e respectivos atributos à construção do conjunto de normas (regimento escolar), modo de gestão e concepção de ensino que são expressas no PPP da escola, até o currículo e práticas pedagógicas. Envolve o modo como se concretiza a concepção de ensino defendida pelos educadores, podendo, de acordo com as convicções, ser mais humanista ou técnica, conservadora ou liberal, voltada para as transformações sociais ou a manutenção dos status quo. Obviamente, as modificações na estrutura institucional, no currículo e nas práticas pedagógicas apoiam-se na melhoria da qualidade da educação pública na garantia de todos do acesso e permanência (LDB 9394/96). Por outro lado, na perspectiva de maior sinergia com a comunidade, essas modificações requerem canais efetivos de diálogo com a comunidade local. Do ponto de vista das práticas de ensino-aprendizagem, Saviani (1989) alerta que o significado de inovar situa-se na intencionalidade do professor de manter um diálogo com o aluno pautado na cooperação, estimulação das capacidades, atenção individualizada e no seu reconhecimento como sujeito histórico das práticas educacionais. Desse modo, as inovações escolares podem estar presentes tanto na forma de organização institucional, especialmente na gestão dos canais de participação direta da comunidade 44 escolar, quanto na organização curricular e práticas de ensino vivenciadas na escola. Em relação à organização institucional, o grande desafio consiste no aprofundamento dos processos democrático-participativos da comunidade, de modo deliberado e autônomo, com efetivo poder de decisão. Para Carbonell (2002, p.19) as inovações educacionais são um “conjunto de intervenções, decisões e processos, com certo grau de intencionalidade e sistematização que trata de modificar atitudes, ideias, culturas, conteúdos e práticas pedagógicas.” Assim, pressupõe certo nível de consciência, organização dos sujeitos e planejamento dos processos de mudança. Com o avanço dos processos de comunicação impulsionados pela sociedade da informação, Messina (2001, p.227) conceitua as inovações como um “processo multidimensional, capaz de transformar o espaço no qual habita e de transformar-se a si própria”. Acrescenta, ainda, que é um processo a ser vivenciado pelos sujeitos mediante o compartilhamento de experiências de modo a “cumprir uma função projetiva.” (MESSINA, 2001, p.227) Em termos escolares, a função projetiva é primordial ao permitir definir um horizonte desejado a ser alcançado por uma prática concreta, de modo que as mudanças sejam estruturadas a partir de um ordenamento lógico, intencional e planejado, mantendo a coesão e a articulação coletiva dos sujeitos. Quanto aos desafios da mudança, Ávila (2003) ressalta que estes são autodesafios técnicos e profissionais, para que as experiências inovadoras possibilitem aos sujeitos conhecerem a escola, seus recursos reais, condições e potenciais para o “alavancamento” das quantidadesqualidades desejadas da educação em cada escola-localidade. Partindo do conceito de inovação observa-se que os processos de mudança perpassam por uma vivência coerente com a concepção de homem e sociedade que se deseja construir. Exige-se coerência com a realidade histórico-social da comunidade e papel proativo dos sujeitos nos processos de mudanças. Assim como, uma simbiose entre proposições teóricas e práticas comunitárias como elos indissociáveis. Nesse prisma, as inovações educacionais apresentam-se como um caminho, como uma possibilidade de aumentar as sinergias da comunidade escolar em processos de autoconhecimento dos potenciais locais, bem como de materializar ações coerentes com as suas próprias necessidades. 45 1.5 Os processos de inovações prescritos às escolas A temática das inovações educacionais surgiu da necessidade de enfretamento dos problemas sociais norte-americanos na década de 1960, estruturada em um plano de reforma curricular do ensino de ciências e matemática, com ênfase no enfoque experimental e instrucional que respondesse ao acelerado processo de desenvolvimento tecnológico do país. Era um modelo sistemático, com prescrições às escolas de mudanças curriculares que fossem compatíveis com as demandas da sociedade tecnificada. A ideia principal era de adaptação de professores e alunos ao desenvolvimento tecnológico, partindo de um plano de instrução científica no qual “a inovação consistiu em substituir um corpus de conhecimentos científicos por um enfoque centrado na busca e na descoberta por meio da experimentação.” (HÉRNANDEZ et al, 2000, p.20) Ao analisar o modelo inovativo norte-americano, Hernández et al (2000) destaca sua fragilidade quanto à participação da comunidade escolar: Apesar do entusiasmo dos políticos e dos planejadores, da quantidade de dinheiro investido e dos materiais criados, este foi um movimento principalmente legislativo, promovido de cima para baixo, que não levou em conta os docentes que tinham dificuldades para acompanhar os programas, as necessidades dos alunos com mais capacidades, as situações de bilinguismo e a pressão dos novos valores (HERNÁNDEZ et al, 2000, p. 21). Segundo Hernández et al (2000), as suas principais fragilidades são a perspectiva simplista, reduzindo a diversidade e complexidade das relações no interior da escola; a fragmentação das etapas de planejamento e execução; as incompatibilidades com os processos de mudanças qualitativas que ocorrem no interior das escolas; a ausência de reconhecimento da singularidade dos professores frente aos processos de mudança. Isso implica dizer que se não há envolvimento dos sujeitos, construindo uma identidade quanto às propostas de mudança, principalmente dos professores enquanto sujeitos singulares, as propostas de inovação dificilmente encontram a sustentação necessária. Ao se estruturarem de maneira fragmentada, são contaminadas rapidamente por sentimentos de descrédito e, consequentemente, de apatia dos profissionais envolvidos. 46 Nesse sentido, o próprio Hernández et al (2000, p.31) alerta que “não bastam a prescrição e o financiamento das inovações para que estas sejam adotadas nas escolas.” É necessário que as propostas criem aderência com o coletivo da escola, gerando um sentimento de pertencimento e reconhecimento da sua importância nos espaços escolares. Ao descrever as inovações no período de 1970-1980, Messina (2001) alerta para a perspectiva verticalizada das inovações, fundada em pacotes estruturados pelos órgãos centrais de ensino para serem implantados nas escolas, mediante acompanhamento sistêmico de equipes técnicas. Como cada escola possui a sua própria identidade social e cultural, não é difícil prever que a centralização dos processos de mudança produza um padrão homogeneizado, definindo um estereotipo de escola inovadora, na grande maioria das vezes, com propostas distantes das condições concretas vivenciadas pelas escolas. As propostas de inovações verticalizadas são estruturadas com centralidade na figura do chamado especialista de ensino que se responsabiliza pela coordenação e implantação das ações no interior da escola, reduzindo os espaços de manifestação autônomo, especialmente dos professores (CARBONELL, 2002). A supervisão do processo, em sua grande maioria, realiza-se de forma mecânica e intransitiva, sem considerar as especificidades do contexto ao qual a escola pertence e os saberes próprios dos seus sujeitos. Apoiam-se em um modelo burocrático, cuja intenção é controlar as ações, as estruturas tempo-espaciais que são mobilizadas pelos professores. O modelo verticalizado é uma expressão do que Freire (1987) denomina de invasão cultural, desconsiderando saberes e experiências próprias vivenciadas pela comunidade escolar na resolução dos seus problemas. Enquanto perspectiva exógena, nega o diálogo entre os sujeitos coletivos como possibilidade de transformação social. Nesse sentido, a escola torna-se depositária dos saberes de uma equipe de especialistas. Após a década de 1980, a perspectiva de inovação verticalizada tem perdurado nas propostas de ensino do país, desconsiderando os saberes locais, a experiência da comunidade e a dialogicidade como potenciais para a produção de processos de mudança aderentes com as expectativas e interesses comunitários. Por outro lado, conforme mencionado anteriormente, fortalece o sentimento de indiferença dos profissionais quanto às mudanças propostas. 47 Ao segmentar as funções entre o planejador e o executor, a perspectiva verticalizada fortalece a divisão técnica e social do trabalho, corroborando com a execução de práticas mecânicas, sem uma conexão com os saberes próprios de cada unidade escolar (CARBONELL, 2002). Essa segmentação entre o corpo de especialista, tratados como notáveis detentores dos saberes, e os professores, vistos como uma extensão, apêndice à execução das propostas, constitui-se num dos graves problemas dos processos de mudança das escolas brasileiras, uma vez que fortalece a postura cética dos docentes quanto à capacidade autogeradora da comunidade de inovações. O modelo de organização prescritiva dos processos inovativos não colabora ainda com a construção de um trabalho coletivo, fundado na identidade do grupo e cooperação, tendo no diálogo uma possibilidade de manifestação do pensamento divergente e construção de novas sínteses, capazes de contribuir efetivamente com o desenvolvimento da instituição escolar, especialmente com a qualidade do ensino. Dessa forma, o modelo verticalizado de inovação sustenta-se numa perspectiva regulatória ou técnica, exógena ao contexto social, cultural e político da escola. As mudanças são implantadas com o apoio do caráter regulador e normativo da ciência conservadora, produzindo um processo de mudança fragmentado, limitado e autoritário. Apoiado em Veiga (2003), vê-se que é uma perspectiva incongruente com uma ação articuladora, potencializadora de novas relações entre o ser, o saber e o agir. Essa perspectiva cria uma cisão com os processos autogeradores de participação da comunidade escolar, da percepção da escola como local de construção da identidade dos sujeitos e de articulação das suas dimensões político-filosóficas. É um limite a vivência comunitária como possibilidade de manifestação do agir consciente e dos saberes próprios. Em maior grau, os processos de mudança assumem a centralidade político-ideológica do Estado, sendo, na maioria das vezes, impostas, sem a construção de canais de participação com efetivo poder de decisão da comunidade. É nesse sentido, que Àvila (2003) alerta para o fato de a educação pública ser tratada como educação estatizada, tornando-se refém de grupos de elite ideológico-partidária ou simplesmente ideológico-tecnicista que, direta ou indiretamente, determinam as regras da educação escolar. 48 Para Tedesco25 (apud Messina, 2001), as inovações têm sido esforços responsivos de marcos gerados nos níveis centrais dos sistemas de ensino que regula e homogeneíza os processos de mudança. Destaca, ainda, que, ao transitar no contexto das políticas oficiais, a inovação tornou-se conservadora, naturalizando os processos, criando uma lógica única, pelos mecanismos de regulação social e pedagógica. Nesse sentido, corresponderia ao que Machado (2009) denomina de poder de imposição de um grupo do ponto de vista histórico-social, podendo ser entendido como aquele que controla a estrutura de poder vigente e cria padrões artificiais de participação de acordo aos seus interesses. 1.6 Os enfoques inovativos do ponto de vista da cultura escolar e suas aproximações com o Projeto Político-Pedagógico Diante dos limites e dificuldades de apropriação dos sujeitos escolares das propostas de inovação prescritivas, em meados da década de 1990, começam a surgir tendências apoiadas no caráter multidimensional da cultura escolar. Tal perspectiva parte do reconhecimento do caráter dinâmico e autogerador dos sujeitos no interior da escola, acreditando que cada prática educativa possui singularidades próprias e tem sua existência materializada em sua vivência concreta, na manifestação do realismo histórico social dos seus sujeitos (GADOTTI, 1997). Fullan26 (apud Messina, 2000) destaca que a inovação pode ser vista como um processo aberto, assumindo um caráter multidimensional, de maneira que se reconheça sua aproximação com a cultura e valores que orientam a vida social da comunidade escolar. Vê-se, ainda, que o modelo verticalizado das propostas inovativas não é suficientemente compacto, existindo em seu interior contradições favoráveis à desestabilização de processos instituídos e construção de mudanças numa perspectiva horizontal e democrática fundada em um projeto alternativo (CABONEL, 2002). A construção de propostas alternativas estaria na 25 Refere-se a obra: TEDESCO, J. C. Algunas hipótesis para una política de innovaciones educativas. In: PARRA,R. et al. Innovación escolar y cambio social, tomo I. Bogotá: FES-Colciencias, 1997. 26 Refere-se a obra FULLAN, M. El Cambio educativo: guía de planeación para maestros. México: Trilhas, 2000. 49 estreita relação das práticas docentes de articular os processos participativos de constituição autogeradora do PPP da escola. Numa perspectiva de aprofundamento do cenário democrático o PPP demanda maior participação comunitária, na sua concepção e prática, envolvendo processos coordenados e cooperativas que favoreçam o sentimento de confiança e autonomia coletiva. A singularidade do trabalho docente estaria nas suas possibilidades de interlocução e diálogo com os sujeitos escolares, aprofundando os processos de participação direta, na qual as soluções sejam construídas de forma compartilhada, com foco na resolução dos problemas enfrentados numa prática concreta, tendo como substrato a melhoria da qualidade de ensino. A formação de equipes docentes sólidas e comunidade educativa receptiva; redes de intercâmbio e cooperação, assessores e colaboradores críticos e outros apoios externos; projetos coletivos territoriais entre as escolas; comunicação fluída e intensa nas relações interpessoais; sistemas inovativos como dinâmica de funcionamento da escola; possibilidades de inovar a própria inovação; processos sistemáticos de vivência, reflexão e avaliação são condições básicas para a existência de processos inovativos referendados na qualidade educacional (CARBONELL, 2002). Essas condições básicas reforçam a necessidade do trabalho coletivo e articulado por um PPP que promova aproximações constantes entre a realidade vivida e as condições ideais, de modo que a comunidade perceba os seus próprios desafios e seja autogeradora de inovações de modo intencional e sistemático. Ao procurarem responder às demandas de melhoria da qualidade da educação, a partir da sua própria realidade, as práticas inovativas demandam clareza e consciência dos sujeitos em todas as etapas do processo de mudança para que de fato assumam o caráter autogerador. Esse caráter autogerador está associado à perspectiva emancipatória ou edificante de percepção da escola como unidade histórico-social (VEIGA, 2003), sendo imprescindível o diálogo entre os sujeitos envolvidos como forma de reconhecimento e valorização das potencialidades comunitárias. É um processo existencial, vivido no interior da escola, com ampliação dos espaços de argumentação, comunicação e solidariedade. 50 Assim, a solidez das inovações está diretamente relacionada à forma como a própria comunidade concebe e apropria-se dos processos de mudança. Pressupõe, ainda, de um processo articulado de mudança que expresse os interesses e finalidades do PPP em seu caráter concreto e projetivo. Tem como fundamento as interações múltiplas, conectando o mundo existencial do sujeito com os saberes escolares, num processo de aproximação sucessiva com a realidade e os seus desafios. Algumas características apontadas por Hernández et al (2000) corroboram com a perspectiva autogeradora. Comentar-se-á a seguir cada uma dessas características: 1) que existam canais de comunicação entre o planejador e os que realizarão a inovação: remete à necessidade do planejamento coletivo das práticas, à importância da participação de todos os envolvidos nas etapas da ação. O interesse é superar a segmentação entre as equipes que planejam e executam, bem como criar estratégias que fortaleçam a reciprocidade entre planejamento e execução enquanto prática de uma mesma equipe; 2) que todos os grupos relacionados com a inovação estejam vinculados: remete à necessidade da participação coletiva, do engajamento dos sujeitos na ação; 3) que facilite todo tipo de informação, que esclareça o sentido de inovação para todos os grupos envolvidos: os canais de participação são fundamentais para que os participantes da ação sintam-se como sujeitos do processo, assim como tenham maior clareza do sentido e estratégias adotadas para a mudança; 4) que os conflitos sejam interpretados como sinônimo de que a inovação é necessária, devendo ser recebidos de forma positiva e não sendo eliminados por decretos: o pensamento divergente permite ampliar o debate e desestabilização de processos instituídos, criando um ambiente favorável aos processos inovativos; 5) que os professores, a administração e os estudantes devam levar em conta e, se possível, incorporar nas práticas, as iniciativas que surgirem: remete à necessidade de que os sujeitos experimentem, vivenciem e testem no campo da prática as novas ideias emergentes; 6) que a revisão da inovação deva ser realizada de forma contínua, principalmente, se se referir a uma adoção curricular: é um processo continuado, inconcluso, uma linha no horizonte a ser percorrida como desafio constante dos sujeitos de revisar as suas concepções e práticas; 7) que seja necessário não destacar papéis específicos e criar uma burocracia excessiva. É preciso ter cuidado na hora de estabelecer obrigações, relações e privilégios. Uma inovação 51 demanda dos sujeitos flexibilidade e o exercício de diferentes funções numa perspectiva de trabalho colaborativo; 8) que uma inovação possa levar ao questionamento de todo o sistema (a prática de uma escola, o trabalhos dos professores), o que implica a ideia da revisão contínua: como processo de mudança supõe a desestabilização de campos instituídos enquanto possibilidade de criação de novos espaços instituintes; 9) que se deva poder contrastar, quando se tratar de generalizar alguns aspectos de uma inovação, o que acontece em escolas que a coloquem em prática, conforme o modelo e as intenções inovadoras, e outras que podem realizar por sua conta uma adaptação da mesma inovação: envolve a possibilidade de reaplicação da inovação, de modo adaptado a outros contextos, com foco na disseminação de processos de mudança por translação, nos quais os sujeitos tenham possibilidade de reaplicá-la, adaptá-la ao seu modo cultural de vivência. Destaca-se que, no interior das escolas, na organização dinâmica do PPP, as inovações surgem como um espaço de interlocução efetivo com a comunidade local, exigindo aprofundamento da comunicação e diálogo entre o sujeitos envolvidos mediante a criação de espaços para a reflexão e a construção de soluções compartilhadas no enfrentamento dos problemas vivenciados pelas unidades escolares. Esse movimento articulado reforça a necessidade de a escola exercer efetivamente sua autonomia na gestão de processos participativos, especialmente sua capacidade de “elaborar e implementar um PPP que seja relevante à comunidade e à sociedade a que serve” (NEVES, 2004, p.113). A autonomia, enquanto processo, é uma conquista da comunidade escolar e depende das próprias formas de aprofundamento da gestão democrática, enquanto condição para existência do PPP, e da capacidade de seus agentes comunitários de serem autogeradores de mudanças. Assim, a perspectiva autogeradora abre espaço para compreender a inovação como processo composto pelas vivências múltiplas dos sujeitos no interior da escola, um movimento dinâmico que incorpora as demandas e aspirações da comunidade expressas em uma prática concreta do PPP da escola. Para Veiga (2003), é um contraponto importante na superação do marco regulatório que concebe o PPP de maneira abstrata, distante da realidade concreta, sendo visto apenas como um documento programático que reúne as principais ideias, fundamentos, orientações curriculares e organizacionais de uma instituição educativa. 52 Para Gadotti (2004), a marca mais significativa da sociedade atual é o multiculturalismo, que exige das escolas maior espaço de participação e autonomia traduzidas, sobretudo na construção do PPP da escola. Registra, ainda, que em um projeto há o confronto entre o instituído e o instituinte, sendo que o primeiro faz parte do campo formal, da realidade concreta da escola, composto pelo currículo, métodos, sujeitos e suas relações. O segundo consiste no vir a ser, numa etapa em direção a uma finalidade presente no horizonte da escola e dos seus sujeitos. Assim, o campo instituinte será sempre algo a ser construído, inacabado, diretamente associado à função projetiva da comunidade escolar. Ao situar-se em um campo ideal é fundamental que os sujeitos coletivos, compartilhem os sonhos, os ideais perseguidos pela escola, tomando consciência dos seus limites e possibilidades concretas. Obviamente, toda essa reflexão sustenta-se no ideal de homem e sociedade desejada, nos valores éticos e sociais da vida comunitária. Conforme expressa o próprio Gadotti (2004), um PPP constrói-se de forma interdisciplinar, podendo ser considerado um momento importante de renovação da escola, tanto na sua concepção, institucionalização e implementação. Assim, envolve desde a definição das concepções educacionais norteadoras do trabalho educativo às ações concretas de vivência na escola. Vê-se que a compreensão do campo instituinte depende da penetração no interior da escola, de um movimento que procure compreender como são construídas as relações, as vivências dos ideais e a efetividade da participação da comunidade escolar. Isso supõe construir, no interior dos espaços escolares, estratégias que fortaleçam o diálogo e o aprofundamento dos canais de comunicação entre seus atores. Por outro lado, esse campo é imprescindível para a superação das rotinas escolares, dos processos mecânicos e fragmentados, sendo uma possibilidade para entender os atores escolares como sujeitos da inovação. O campo instituinte do PPP converge com o ideal expresso por Freire (1987, p.68) de que “(...) não seria possível a educação problematizadora, que rompe com os esquemas verticais característicos da educação bancária, realizar-se como prática de liberdade, sem superar a contradição entre o educador e os educandos. Como também não lhe seria possível fazê-lo fora do diálogo.” 53 Retomando Gadotti (2004, p.36) constata-se que o Projeto Político-pedagógico da escola é uma construção coletiva apoiada nos aspectos, a saber: a) no desenvolvimento de uma consciência crítica; b) no envolvimento das pessoas: comunidade interna e externa à escola; c) na participação e na cooperação das várias esferas de governo; d) na autonomia, responsabilidade e criatividade como processo e produto do projeto. O modo de gestão democrática é condição fundamental para o próprio processo de construção e desenvolvimento do projeto e, em especial, das possibilidades de fomento do caráter autogerador das inovações. Em sentido contrário, a ausência de espaços com possibilidades de efetiva participação e autonomia da comunidade escolar materializa o documento apenas como uma formalidade da política pública, sem o real sentimento de pertencimento e envolvimento da comunidade no exercício de sua prática concreta. Os fundamentos da democracia escolar, como condição para gestão do PPP, são reforçados por Veiga (2003): O projeto é um meio de engajamento coletivo para integrar ações dispersas, criar sinergias no sentido de buscar soluções alternativas para diferentes momentos do trabalho pedagógico-administrativo, desenvolver o sentimento de pertença, mobilizar os protagonistas para a explicitação de objetivos comuns definindo o norte das ações a serem desencadeadas, fortalecer a construção de uma coerência comum, mas indispensável, para que a ação coletiva produza seus efeitos (VEIGA, 2003, p.275). Reforça-se a ideia da gestão democrática como condição fundamental para a emergência autogeradora dos processos inovativos na vivência e prática do PPP, tendo como substrato a realidade histórico-social e a participação direta da comunidade. Nesse sentido, um projeto educativo inovador: [...] expressa finalidades e esperanças no futuro; histórias e narrações compartilhadas; objetivos globais relativos à personalidade dos alunos, seu desenvolvimento social e suas aprendizagens; conflitos sobre a convivência e a maneira de enfrentar os conflitos; mecanismos para a participação democrática dos diversos estamentos e tomada de decisões; o modo como a escola se articula com o entorno; e fórmulas alternativas par mudar a destinação tradicional de tempos e espaços (CARBONELL, 2002, p.81). 54 Assim, formalmente, um projeto educativo inovador expressa as convicções da sua comunidade, especialmente os seus valores, missão, tendências pedagógicas e administrativas. Por outro lado, enquanto instrumento de ação-reflexão do grupo, potencializa novas formas de organização do trabalho e práticas pedagógicas possibilitando à comunidade, de modo sistemático e intencional, organizar processos de rupturas epistemológicas. Por esse viés, o PPP pode ser interpretado como uma possibilidade de organização convergente de processos inovativos, de modo intencional e sistemático, pela comunidade escolar. Em síntese, a participação engajada da comunidade produz um ambiente fértil para o desenvolvimento das inovações no projeto-político pedagógico em seu caráter autogerador. O aprofundamento da compreensão desse processo exige a penetração em uma comunidade, de maneira que se perceba melhor como se organiza a dinâmica de gestão participativa do PPP em sua prática corrente. 55 2. GESTÃO ESCOLAR, O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO E A PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE 2.1 Organização do trabalho escolar e inovações educacionais É interessante situar as novas práticas e formas de organização do trabalho escolar para saber em que medida os processos de gestão contribuem com as tendências inovativas no interior da escola. Na literatura que aborda o tema, identifica-se a organização racional, gerencial, sociocrítica (com os seus desdobramentos nas concepções autogestionária, interpretativa e democráticoparticipativa) como as principais concepções de organização do trabalho escolar. 2.1.1 A concepção burocrática e os processos de inovação escolar Essa perspectiva organizacional fundamenta-se na teoria da burocracia de Weber ( 1999) que prevê a construção de processos rígidos de controle e dominação institucional na organização da sociedade moderna. De acordo com Medeiros, Fortuna e Barbosa (2006), a organização burocrática é uma concepção coerente com o centralismo estatal na gestão educacional, apoiando-se em estruturas hierárquicas de concepção e execução, mando e obediência, estigmatizando os sujeitos a desenvolverem sua atividade de trabalho de forma repetitiva e mecânica. Um dos seus fundamentos principais é aumentar a produtividade do trabalho escolar pela especialização e fragmentação das etapas, definindo papéis e atributos específicos para os profissionais da educação em sua atividade de trabalho. Outra preocupação é a definição de padrões rigorosos de controle dos tempos e espaços no desenvolvimento das atividades educacionais. São características presentes nesse modelo de gestão a prescrição detalhada de funções e tarefas; a divisão técnica do trabalho escolar; o poder centralizado no diretor e as relações de subordinação; a ênfase na administração regulada (rígido sistema de normas, de regras e de 56 procedimentos burocráticos de controle das atividades); as formas de comunicação verticalizadas; a ênfase nas tarefas em detrimento das interações pessoais (LIBÂNEO, 2008). Ainda, segundo Libâneo (2008), esse modelo de gestão parte do pressuposto de que a realidade social é objetiva e neutra, devendo ser planejada, organizada e controlada de modo a se alcançarem os melhores resultados. Infere-se que uma maior qualidade da educação, estaria em definir formas de controle mais eficazes dos processos, como, por exemplo, o cumprimento rigoroso do planejamento, a sequência lógica do livro didático, o controle dos dias e das horas letivas, a maior fragmentação dos conteúdos, dentre outras. A ênfase na racionalização de procedimentos didático-metodológicos eficazes nomeia os aspectos objetivos da realidade, tendo como fundamento unívoco sua dimensão pedagógica, em especial as formas de especialização dos conteúdos e estratégias de ensino, sendo que os processos de inovação estariam vinculados à maior fragmentação dos conteúdos e à definição de estratégias metodológicas eficazes para o ensino. Tais aspectos seriam alcançados com uma maior especialização das atividades gestionárias, definindo atributos específicos para cada profissional, tendo como base uma perspectiva setorizada da atividade de trabalho. O trabalho setorial supostamente asseguraria um maior controle da atividade de trabalho e, consequentemente, uma maximização do tempo de realização das atividades. Um dos problemas dessa tendência consiste no fato de que a realidade escolar não se apresenta como objetiva e neutra, estando multifacetada por aspectos sociais, culturais e políticos presentes na intersubjetividade dos sujeitos em sua vida comunitária. Há aspectos que são únicos da comunidade, determinando seu modo próprio de agir, pensar e sentir frente a uma determinada realidade e/ou contexto. Pelo prisma da objetividade, os processos de inovação estariam centrados em mudanças racionais no interior da escola, produzidas em atendimento às exigências de organismos externos à mesma (Secretarias e Ministérios de Educação, organismos internacionais, mercado, entre outros), sustentando formas verticalizadas de organização pedagógica e administrativa que desconsideram a intersubjetividade dos sujeitos comunitários. 57 Ao se desconsiderar as dimensões subjetivas dos processos, não se reconhecem as vivências dos sujeitos no interior da escola, tratando os processos de mudança numa perspectiva exógena e prescritiva, apoiando numa lógica formal dos procedimentos hierárquicos que são sistematizados pelos “especialistas” e implantados nas escolas de forma verticalizada. Outro grave equívoco é que uma maior qualidade da educação não pode ser vista como a soma dos controles de tempo por cada profissional em seu setor de trabalho. Como atividade social, fundamenta-se na capacidade de construção e desenvolvimento de um projeto de gestão articulado, tendo como substrato uma concepção expressa em um PPP que exige uma atuação coesa e integral dos sujeitos. A organização escolar em parâmetros burocráticos acarreta ainda problemas na percepção das escolas como um sistema unificado, na organização do trabalho como um processo social e nas possibilidades alternativas de combinação das atividades entre os sujeitos (THULER, 2001). Assim, consiste numa forma de organização que limita a vivência de um projeto articulado, com possibilidades de participação coletiva dos sujeitos nas etapas de concepção e execução. Esse modelo gestionário, ao promover a segmentação entre concepção e execução, centraliza os processos de mudança em equipes técnicas, limitando a manifestação de valores e experiências endógenas da própria comunidade escolar, fundamentais para os processos de gestão social, onde a sociedade civil se co-responsabiliza com as questões de interesse público e, consequentemente, de desenvolvimento local. Ao se basear na definição rigorosa de cargos e funções, na estrutura hierárquica de trabalho, nas normas e regulamentos, na gestão centralizada como artifícios para sustentar propostas/programas, a organização burocrática inibe o sentimento de pertencimento e desenvolvimento de um projeto comum pelos sujeitos escolares. Além disso, os instrumentos de controle são inibidores da manifestação do pensamento criativo e intersubjetivo dos sujeitos no enfrentamento dos problemas que são vivenciados na realidade comunitária. O autocontrole das ações cria obstáculos quanto à inciativa e diálogo dos sujeitos em buscar soluções endógenas para os problemas, já que se tornam dependentes dos pacotes sistêmicos que são elaborados por equipes técnicas. 58 Sua base exógena de sustentação não considera os valores presentes no interior da comunidade escolar, corroborando com a baixa aderência dos sujeitos e, consequentemente, com a rotatividade dos programas/projetos. Isso pode ser atribuído à ausência do real sentimento de pertencimento dos sujeitos às propostas, prevalecendo valores céticos quanto às reais possibilidades de transformação da escola. Para assegurar a efetividade das propostas é criado todo um arcabouço de parâmetros que justificam a organização racional dos sistemas. Conforme expressa Thuler (2001), assegurados os parâmetros gestionários, a máquina gira por si só, com pequenos ajustes, até as grandes férias seguintes. As decisões, tomadas unilateralmente pouco são submetidas ao debate e apreciação da comunidade escolar, de modo que se considerem as reais necessidades dos seus sujeitos. O exame do cotidiano de nossas instituições escolares revela que, na prática, a gestão da escola se desenvolve a partir de uma sólida rede burocrática, na qual os meios se sobrepõem aos sujeitos, ocasionando um asfixiamento destes no contexto burocrático da instituição (MEDEIROS; FORTUNA; BARBOSA, 2006, p.111). Esse asfixiamento dos sujeitos pode ser interpretado como a perda de identidade e autonomia frente à sua própria realidade, onde seus sentimentos e impressões da realidade têm pouca importância frente às diretrizes de um programa ou projeto estruturado por equipes técnicas. É nesse sentido que Thuler (2001) descreve a gestão escolar burocrática, como uma matriz organizacional que condiciona a vida da escola, estruturada em torno de procedimentos centrais e sistêmicos, pouco voltados para as necessidades e interesses da comunidade. Segundo a autora, esse modelo não estimula as relações recíprocas no interior da escola e os processos de mudanças fundados nas necessidades heterogêneas dos alunos, na competência e nos recursos locais. A sua estrutura centralizada é um limite aos processos participativos, produzindo uma posição de inferioridade dos sujeitos aos meios de ação, mediante mecanismos de controle e, por vez, de repressão que impedem a emergência da consciência crítica e da reconstrução de um sistema que tenha, como fundamento, os interesses e necessidades da comunidade escolar. De acordo com Medeiros; Fortuna; Barbosa (2006), o modelo de organização escolar burocrático, 59 de natureza sistêmica, desagrega os sujeitos no interior da escola, constituindo-se em um limite à sua organização democrática. A presença dessa tendência é muito forte nas escolas brasileiras, destacando: a cisão entre questões administrativas e pedagógicas; a fragmentação dos conteúdos curriculares; a rigidez do tempo (expresso em 50 minutos de aula); a constituição de uma equipe de especialistas responsáveis pelo planejamento/acompanhamento e os professores, pela execução; a percepção restrita dos espaços de aprendizagem (a sala de aula como referência central), dentre outras. Essa organização fragmentada dos tempos e espaços escolares restringe a apropriação dialógica dos espaços pelos sujeitos, bem como a construção das suas práticas na perspectiva da transformação social. Ou seja, a vivência de processos que considerem as dimensões históricas e socais dos sujeitos em ambientes coletivos e colaborativos valoriza a postura proativa e a subjetividade dos mesmos. A gestão escolar burocrática, no entanto, não se manteve estável ao longo da sua trajetória, sendo necessárias adequações para assegurar formas de (re)estabilização dos sistemas escolares. Houve, ao longo dos tempos, uma estreita relação entre os processos de mudança e a retomada dos ciclos de estabilização. Esse modelo passou por provas. Permitiu ajustar, desde o início do século, as modalidades de gestão e controle das escolas ao aumento contínuo do público e das taxas de escolarização, assegurando, ao mesmo tempo, uma certa coerência e uma igualdade na forma de tratamento (THULER, 2001, p.29). As mudanças do modelo burocrático corresponderiam a processos inovativos de caráter incremental, correspondendo a ajustes na forma de reorganização sistêmica, sem rupturas paradigmáticas. Os processos de mudanças estruturais, com a participação direta da comunidade, especialmente na maximização do seu potencial autogerador, não estão presentes nessas transformações. Os processos de mudança são orientados pela chamada objetividade organizacional, baseada em pacotes de mudanças estruturados por organismos externos à escola (Secretarias e Ministérios de Educação, organismos internacionais, mercado, entre outros). Esses pacotes em geral são implantados por uma equipe técnica (consultores, especialistas, entre outros) que 60 definem um plano homogêneo para o desenvolvimento das escolas, suas etapas e respectivas formas de acompanhamento. Essas equipes técnicas, em geral, não possuem nenhum conhecimento da comunidade escolar local ou vínculo com ela. Diante da incapacidade de responder às novas necessidades emergentes de reorganização do mundo da produção, esse modelo de gestão escolar começa a sofrer um processo de reestruturação e adequação às necessidades impostas pelo paradigma flexível de acumulação em curso. Assim, acompanhando a dinâmica de reorganização do mundo da produção e trabalho, o modelo de gestão burocrática assume contornos da administração gerencial. 2.1.2 A concepção gerencial e os processos de inovação escolar Em meados da década de 1970, o modelo de acumulação taylorista/fordista, centrado em grandes linhas de produção homogênea, apresenta os seus sinais de esgotamento. Entre os principais fatores da crise estão a queda na taxa de lucro das empresas, a retração do consumo, a concentração de capitais e a crise do Estado de bem-estar social (ARAÚJO; CASTRO; 2001). A estratégia para superação da crise consistiu na modificação do padrão de acumulação, na substituição do modelo taylorista/fordista pelas estratégias de produção descentralizadas e flexíveis, tendo como orientação central maior eficiência, eficácia e produtividade. Como rearranjos produtivos, podem-se destacar sua organização em unidades menores e flexíveis, maior diferenciação dos produtos, acordos trabalhistas descentralizados para recompensar qualificações e iniciativas do trabalhador, competição e valores individuais, dentre outros. Os princípios que reorientaram os processos da administração empresarial paulatinamente foram incorporados pelas administrações públicas, tendo como eixo central a construção de um Estado eficaz, eficiente e produtivo. Essas tendências acompanharam o conjunto de mudanças que orientaram o movimento de reforma do Estado brasileiro a partir da década de 1990. De acordo com Araújo e Castro (2001), o movimento de reforma gerencial do Estado Brasileiro teve como um dos grandes expoentes o ex-ministro Bresser Pereira (1998), ao 61 preconizar: a descentralização/desconcentração das atividades centrais para as unidades subnacionais; a separação dos órgãos formuladores e executores de políticas públicas; o controle gerencial das agências autônomas, que passa a ser realizado, levando em consideração quatro tipos de controles: (1) controle dos resultados, a partir de indicadores de desempenhos estabelecidos nos contratos de gestão; (2) controle contábil de custos; (3) controle por quase-mercados ou competição administrada; e (4) controle social; a distinção de dois tipos de unidades descentralizadas ou desconcentradas, as agências que realizam atividades exclusivas do Estado e os serviços sociais e científicos de caráter competitivo; a terceirização dos serviços e o fortalecimento da alta burocracia. O aspecto central da reforma consistiu na redução do Estado às ações de fiscalização e controle por meio de agências reguladoras e indicadores de resultados. Há, ainda, uma redução do chamado Estado de bem-estar social e substituição dos direitos universais pelas chamadas políticas focais, valorizando a participação da sociedade civil. Estado para a implementação do ajuste neoliberal, há a emergência de um projeto de Estado mínimo que se isenta progressivamente de seu papel de garantidor de direitos, através do encolhimento de suas responsabilidades sociais e sua transferência para a sociedade civil. Este projeto constitui o núcleo duro do bem conhecido processo global de adequação das sociedades ao modelo neoliberal produzido pelo Consenso de Washington (DAGNINO, 2004, p.96). Um dos principais argumentos defendidos pelo modelo gerencial é a ideia de que as organizações empresariais são mais ágeis e eficientes do que o setor público (ARAÚJO; CASTRO, 2001). Assim, os processos de redução do Estado são necessários para que o mesmo consiga se adequar aos parâmetros da gestão empresarial, condição para sua maior eficiência e qualidade. Por outro lado, dimensões históricas dos movimentos sociais, como democracia e participação, são apropriadas pelo universo ideológico do sistema neoliberal. A participação deixa de ser vista como um movimento que luta pelas transformações sociais, passando a ser caracterizado como filantropia, trabalho voluntário da comunidade, expresso em projetos sociais de participação solidária. Assim como a democracia deixa de ser vista como forma de participação do povo no governo, com poder de decisão, passando a ser a expressão do acesso da população ao consumo e crédito (DAGNINO, 2004). 62 Assim, o modelo gerencial consiste na materialização do discurso hegemônico do neoliberalismo, resinificando o sentido de participação da sociedade civil em parâmetros que desoneram o Estado e aumentam as responsabilidades da sociedade civil. O Estado passa a se restringir às funções de regulamentação e fiscalização. Por outro lado, a readequação do sistema produtivo brasileiro aos parâmetros da produção flexível caminhou paralela aos movimentos sociais de luta da sociedade civil pela redemocratização da sociedade brasileira. A título de exemplo, o movimento pelas Diretas Já, a promulgação da CF/1988 são expressões da luta da sociedade civil, dos movimentos sociais, pela garantia dos direitos fundamentais27. Nessa perspectiva, das lutas históricas travadas pelos movimentos sociais, participação, democracia, cidadania, dentre outros, são expressões de uma sociedade que busca justiça e equidade na construção dos direitos fundamentais do homem. Mesmo sendo projetos antagônicos, a apropriação ideológica do neoliberalismo de termos ligados à luta histórica cria um contexto ideológico de coincidência com o projeto democrático-participativo quanto à formação de uma sociedade civil ativa e propositiva (DAGNINO, 2004). Porém, enquanto para os neoliberais a apropriação pertence a um arcabouço hegemônico, traduzido em voluntariado/filantropia que estimula à desoneração das responsabilidades do Estado; para o projeto democrático-participativo, assume o sentido de luta, de um movimento de participação direta da sociedade nas transformações sociais e de garantia dos direitos fundamentais. A nossa filiação é com o aprofundamento do projeto democrático participativo, tendo como horizonte a justiça social e equidade, convictos de que o aprofundamento da gestão dos processos democrático-participativos pavimenta o caminho para a emergência de inovações autogeradas da comunidade escolar, mediante processos propositivos de transformações sociais. Diante do exposto, perguntar-se-ia: qual tem sido a influência do modelo gerencial nas escolas públicas brasileiras? Que tipos de inovações escolares estão associadas a esse 27 São entendidos como o conjunto de direitos fundamentais à construção da pessoa humana e sua vida social (trabalho, saúde, lazer, moradia, emprego, renda, liberdade de expressão, dentre outros). 63 modelo? Assim, passar-se-á a discutir alguns pontos fundamentais dessas questões no cenário específico das políticas educacionais brasileiras. A partir da década de 1990, com o processo de abertura econômica e aprofundamento da globalização, a educação assume papel estratégico no país, sendo os processos de gestão, baseados em parâmetros de eficácia, vistos como necessários e importantes para prover maior aprendizagem e melhoria da qualidade da educação no país (ARAÚJO; CASTRO, 2001). Pelos processos de gestão educacional competente, pretende-se assegurar aspectos como: pactuação de metas, indicadores educacionais satisfatórios, avaliações externas e de desempenho individual dos servidores, reformas curriculares com a definição de diretrizes nacionais, dentre outras. É um modelo gestionário que propõe uma reestruturação da gestão escolar por meio da adoção de métodos e práticas de gestão da administração empresarial (LIBÂNEO, 2008). Enquanto estratégia empresarial, é guiada por princípios mercadológicos, tendo como foco a relação custo-benefício dos programas e os resultados alcançados em termos de maior proficiência dos alunos. Os processos inovadores são vistos como a adoção de instrumentos gerenciais descentralizados capazes de assegurar empowerment (empoderamento) e accountability (responsabilização) dos envolvidos. A modernização da gestão escolar supõe uma maior participação e controle da sociedade nos serviços prestados, sustentando a ideia de que as pessoas envolvidas nos processos escolares são responsáveis pelo seu sucesso ou fracasso. Por outro lado, ao trabalhar com os pressupostos de responsabilização dos envolvidos, segue a tendência geral de transferir responsabilidades do poder público para a sociedade civil. Outras questões, intervenientes no contexto escolar, como questões sociais que demandam intervenção direta e extrapolam a capacidade dos sujeitos escolares de resolvê-las, são desconsideradas. Acrescenta-se, ainda, que os resultados educacionais negativos são vistos como problemas pontuais, associados a questões de competência individual e não como parte do conjunto sistêmico das políticas. Dessa forma, o problema de baixa proficiência estaria associado, por 64 exemplo, à falta de competência e compromisso dos professores, inexistindo qualquer nexo com as políticas educacionais em curso. Enquanto tendência hegemônica, a gestão gerencial orienta-se mais pelos resultados do que pelo fortalecimento da escola como espaço de participação social e da construção de propostas que valorizem as dimensões socioculturais. Ficam ausentes possibilidades propositivas de aspectos inovativos que tenham como foco as transformações sociais, sendo a centralidade a relação custo-benefício dos projetos/programas, isso é, quanto foi gasto com o programa e se os alunos respondem em termos de proficiência às exigências do mercado. Suprimem-se as dimensões políticas dos processos educacionais, ao enfatizar, de modo restrito, um conjunto de práticas e procedimentos de gestão das escolas para resultados, adotando, por um lado, processos de racionalização dos gastos públicos e, de outro, o alcance da chamada qualidade total. Todo esse processo é sustentado por procedimentos de controle, mediante a construção de indicadores que são aferidos em avaliações externas. Há especificidades nas dimensões político-pedagógicas da gestão educacional que extrapolam a relação restrita de custo-benefício, não podendo ser reduzidas à aplicação de métodos, técnicas e princípios da administração empresarial (DOURADO, 2007). Sabe-se que a formação das dimensões políticas do sujeito coletivo, da sua capacidade de estabelecer interlocução com o desenvolvimento das ações comunitárias, do movimento de transformação social do espaço que vive apresenta-se como uma das dimensões mais relevantes. Assim, ao desconsiderar aspectos políticas e sociais, funciona como uma forma de instrumentalizar os sujeitos escolares para responder às demandas de proficiência exigidas pelos mercados, habilitando-os a operar os novos códigos dos sistemas de produção flexível. Porém produz lacunas importantes na apropriação dos sujeitos políticos dos processos de transformação social. Por outro lado, na perspectiva gerencial mais recente, os resultados esperados são definidos unilateralmente por equipes técnicas, acrescido do bônus (prêmio) de produtividade que deverá ser repassado às escolas de acordo com o seu desempenho. As metas, o plano estratégico e a forma de avaliação são pacotes sistematizados que deverão ser acompanhados por equipes técnicas, sem consulta ou possibilidade de escolha e/ou decisão das escolas. 65 Vale dizer que “não se mede a eficiência das escolas. Ela se constrói, se negocia, se pratica e se vive.” (THULER, 2001, p.55). Nesse sentido, o conceito de eficiência estaria ligado ao conjunto de relações estabelecidas pelas escolas, inclusive de ordem pedagógica, e sua capacidade de produzir resultados amplos na comunidade. Envolve as relações dos sujeitos no ambiente comunitário, não sendo passível de ser medido apenas por um processo de avaliação externa. Ao preconizar princípios mercadológicos a serem aplicados no ambiente escolar, essa perspectiva não é compatível com os processos inovativos autogeradores que partem do pressuposto de reconhecimento da escola e da autonomia dos seus sujeitos na produção de mudanças. Assim, a gestão gerencial das escolas não favorece a construção de processos inovativos que tenham, como referência, as dimensões sociais da comunidade e o seu poder decisório local. Partindo da transferência de responsabilidades para a sociedade civil, os processos participativos assumem conotação dissimulada de redução das responsabilidades sociais do Estado. A participação passa a ser vista como uma colaboração da comunidade, sofrendo um esvaziamento político do seu sentido de movimento e luta pelas transformações sociais. 66 2.1.3 A Gestão Escolar Sociocrítica Os processos de organização escolar, na perspectiva sociocrítica, tomam como pressuposto os sujeitos em suas dimensões históricas e sociais, reconhecendo sua capacidade de modificar a própria realidade, ainda que existam fatores econômicos, políticos e sociais determinantes (LIBÂNEO, 2003). Apoiados na gestão sociocrítica, orientam-se na capacidade humana de produzir transformações mediante processos de compartilhamento de experiências e de decisões colegiadas dos sujeitos. Apoiam-se em uma base horizontalizada de decisão, partindo do pressuposto de que todos os sujeitos envolvidos estão em uma mesma posição, podendo contribuir com o desenvolvimento global da instituição. Ao valorizar a participação e o poder de decisão coletiva, reconhece-se a importância do diálogo e dos consensos construídos no seio do jogo democrático como relevantes para a organização de uma gestão consubstanciada nas dimensões sociais da comunidade local. Nessa perspectiva, as inovações podem ser vistas como produto das relações estabelecidas entre os pares, sustentando-se no diálogo e nos processos de participação social. Sua constituição baseia-se na historicidade dos processos humanos, nas dimensões socioculturais e nas interações mútuas estabelecidas entre os pares como forma de fortalecimento das instâncias colegiadas de decisão como o grêmio, as associações, os conselhos, dentre outros. As relações estabelecidas entre os sujeitos, especialmente as dimensões intersubjetivas, consistem num contraponto aos processos de gestão burocrática e seus desdobramentos gerenciais, apresentando-se como possibilidade de enfrentamento dos processos inovativos verticalizados, reconhecendo as condições histórico-sociais da práxis educativa. Por outro lado, enquanto processo de humanização, de reconhecimento da historicidade dos sujeitos, só pode ser mediatizado em ambientes amplamente democráticos e participativos, onde haja espaço para a manifestação autêntica da existência humana. Acrescenta-se, ainda, que na condição da existência das potencialidades sociais do homem são produzidas as modificações mais próximas dos interesses e necessidades da comunidade escolar. 67 Assim, o reconhecimento histórico e social dos sujeitos escolares apoia-se nos espaços de convivência democrática, nas possibilidades de participação direta da comunidade e democratização das relações escolares pelo aperfeiçoamento dos processos coletivos de base cooperativa (PARO, 2008). A perspectiva sociocrítica aproxima do que Thuler (2001) chama de organização profissional, descrito como um processo no qual se valoriza a corresponsabilidade dos sujeitos em ambientes colegiados e participativos. Segundo a mesma, há desafios quanto ao funcionamento profissional, considerando que os processos de decisão podem ser lentos e ineficientes quando se busca um amplo consenso. Vale dizer que as decisões coletivas pressupõem um tempo maior, correspondendo às dimensões processuais de envolvimento dos sujeitos em espaços coletivos de decisão. Por outro lado, o termo amplo consenso, citado por Thuler (2001), carece de uma maior explicação, podendo ser confundido com unanimidade, desqualificando o real sentido da democracia. Pelo viés sociocrítico demanda ser pensado como o conjunto das sínteses estabelecidas em espaços de participação direta, envolvendo as interpelações subjetivas28 e a livre manifestação do pensamento pelos sujeitos. Em termos de inovações, vê-se que pode corresponder ao nível quantitativo ou qualitativo, incremental ou radical, já que as interpelações podem agregar novos aspectos aos processos sociocríticos ou promover mudanças de caráter estrutural, implicando em um salto de qualidade na participação comunitária. A perspectiva do consenso nos ambientes democráticos de participação direta requer considerar as decisões que são tomadas pela maioria dos membros, sendo que os interesses coletivos sobrepõem-se aos individuais. Portanto é diferente de unanimidade, que dificilmente pode ser alcançada em espaços com livre possibilidade de manifestação do pensamento divergente. Vê-se ainda que as próprias interpelações subjetivas apresentadas pelos sujeitos nos ambientes democráticos podem produzir uma reflexão dos campos de gestão instituídos, podendo 28 Entendida no estudo como a manifestação de diferentes concepções dos sujeitos nos espaços de participação coletiva, um estímulo aos processos de ajustes ou aperfeiçoamentos da gestão instituída. 68 corresponder a ajustes estruturais, com o aperfeiçoamento das práticas gestionárias, que, ao invés de serem pensados como obstáculos ao processo de inovação, passam a ser vistos como motor dos processos de ajuste ou de mudança da gestão. Contudo a gestão sociocrítica não pode ser vista como um modelo linear, definido em determinado tempo e espaço. Ao contrário, é produto das relações estabelecidas pelos sujeitos, acompanhando o curso dos processos históricos e da dinâmica societária vivenciada. É um modelo vinculado ao contexto emergente, constituindo uma prática em espiral que sofre processos de adaptação gradativa no acompanhamento das demandas e necessidades da comunidade escolar. Os processos de adaptação e/ou mudanças das práticas gestionárias não acontecem a qualquer modo, conforme conveniência e interesses individuais dos seus sujeitos. São resultados da reflexão coletiva, orientando-se por princípios fundamentais (administrativos, políticos, sociais, filosóficos e educacionais) expressos no Projeto Político-Pedagógico da escola. É na dinâmica de convivência local dos sujeitos escolares que as dimensões históricas e sociais materializam-se, orientando-se pela filosofia expressa no PPP e, ao mesmo tempo, sendo retroalimentada com novas realidades e demandas emergentes do modo como os sujeitos vivenciam a realidade. A vivência da realidade implica tanto no aprofundamento dos processos democráticos representativos (colegiados, conselhos de classe, pais, entre outros), nos quais os sujeitos investidos de poder respondem pelos interesses comunitários, quanto na participação direta dos sujeitos comunitários no desenvolvimento de ações coerentes com a sua realidade. Nos processos de participação direta da comunidade é importante valorizar o compartilhamento das experiências e a definição de estratégias institucionais de atuação coletiva dos seus membros. Por outro lado, quando se analisa a participação da sociedade civil nos espaços escolares Gohn (2004; 2007) aponta a tendência dominante de redução do universo de atores à comunidade escolar (dirigentes, professores, alunos e demais funcionários das escolas) e a visão restrita da comunidade educativa como a comunidade escolar acrescida dos pais. 69 Segundo a autora, dificilmente se lembra de outras instituições, organizações ou associações que fazem parte da rede de articulações da comunidade educativa.29 Retomando o pressuposto de que o homem é um sujeito histórico e social, sendo as relações da comunidade escolar dinâmicas, os ciclos de estabilidade são rompidos por processos de mudanças e fortalecimento das relações democráticas entre os membros da comunidade escolar, base para o diálogo com a comunidade educativa. Apoiado nas possibilidades dos próprios sujeitos de organizarem ambientes inovadores (MACIEL, 2001), dir-se-ia que é no movimento relacional de vivência dos valores democráticos (liberdade, respeito, tolerância, dentre outros) que são constituídas as possibilidades de diálogo com a comunidade educativa, ampliando as relações da escola e as vivências de sua base comunitária. Assim, “é por meio de canais de participação da comunidade que a escola deixa de ser uma redoma, um lugar fechado e separado da realidade, para conquistar o status de uma comunidade educativa que interage com a sociedade civil.” (LIBÂNEO, 2008, p.139) Pela constituição de uma relação articulada com a comunidade educativa, a escola pode maximizar os seus potenciais educativos, assegurando um processo de formação em uma perspectiva humana integrada, em sinergia com as aspirações presentes no PPP. Se as mudanças na educação dependem das concepções e práticas dos professores (HERNÀNDEZ, 2000), é importante que exista uma sinergia desses sujeitos com a comunidade educativa, considerando as suas singularidades relativas à prática pedagógica e à necessidade de vivência das práticas do PPP em seu caráter autogerador. Os professores têm papel importante, especialmente na articulação das atividades curriculares e extracurriculares, para maior envolvimento da comunidade educativa. Em primeiro lugar, o exercício da autonomia docente permite fomentar espaços reflexivos de participação discente que são necessários para a constituição de relações justas e 29 Nesta dissertação, o conceito de comunidade escolar é entendido como os profissionais da escola (diretor, professor, supervisor, secretário, dentre outros), alunos e os pais; já a comunidade educativa refere-se à comunidade escolar acrescida da comunidade externa às escolas (Regionais de ensino, organizações da sociedade civil, movimento sociais, sindicatos, associações religiosas, organização não-governamentais (ONGS), organizações de empresários e a população que reside e trabalha no entorno da escola). 70 democráticas. Assim, práticas pedagógicas reflexivas, orientadas por princípios de desenvolvimento humano dos discentes, passam a ser fundamentais para a vivência das relações em sentido amplo com a comunidade educativa. O diálogo é uma possibilidade para que os alunos situem-se como sujeitos históricos e sociais, desenvolvendo a consciência crítica e o senso de responsabilidade coletiva. Como expressa Freire (1987): “O diálogo é este encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo, não se esgotando, portanto, na relação eu-tu.” (FREIRE, 1987, p.90). Em segundo lugar, são pelas vivências curriculares, fundadas em princípios como autonomia, liberdade e cooperação, que se criam reciprocidade entre os objetivos institucionais, impressos em um marco ideal (PPP) e a realidade vivida em uma comunidade educativa. Quanto às contribuições docentes para a produção de inovações em uma comunidade educativa, Thuler (2001) destaca que são fortalecidas quando os profissionais da escola, especialmente os professores, são estimulados a manifestar suas concepções e o pensamento criativo quanto às prioridades de organização escolar. Por outro lado, a maneira de pensar e agir desses sujeitos relaciona-se com os espaços democráticos, com a possibilidade de diálogo e manifestação do pensamento divergente como forma de enriquecimento de determinado contexto ou fenômeno presente na comunidade educativa. É necessário, ainda, aproximar conceitos e práticas pedagógicas das experiências vividas pelos alunos, ampliando as suas possibilidades de compreensão e intervenção numa dada realidade. Assim, como situar as inovações na perspectiva de uma comunidade educativa sociocrítica? Em primeiro lugar, valorizar as dimensões sociais e históricas do conjunto de sujeitos e instituições presentes em seu universo é fundamental. Assim, como fortalecer as estruturas colegiadas (conselhos, associações, grêmios, colegiados) da escola e as formas de participação direta da comunidade. É necessário que, no interior da escola, os processos participativos estejam consolidados, fortalecidos pelo envolvimento direto da comunidade escolar. Em segundo lugar, é fundamental mapear o conjunto de instituições e sujeitos presentes na comunidade educativa e as possibilidades efetivas de diálogo com o PPP da escola. 71 O interesse público de melhoria da qualidade da educação é a referência para o envolvimento corresponsável de segmentos da sociedade civil nas práticas do PPP, perpassando pela criação de certo nível de reciprocidade entre os sujeitos escolares e as instituições presentes na comunidade educativa. Esse envolvimento é uma forma de assegurar o acesso dos discentes aos conteúdos curriculares e, consequentemente, aos processos de aprendizagem com significação social. A perspectiva autogeradora do PPP exige considerar também dimensões subjetivas na constituição de processos de mudanças em sinergia com a realidade histórico-social dos sujeitos. As dimensões subjetivas são fundamentais para percepção de aspectos próprios de dado contexto em que os sujeitos estão envolvidos. O que se vive e prática é referência para percepção dos processos autogeradores do PPP. Assim, a maior participação da sociedade civil na escola depende fundamentalmente de mudanças coerentes com essa realidade, com processos de natureza endógena, que valorizem a participação direta dos sujeitos em detrimento às propostas inovativas hierarquizadas. Como qualquer processo de inovação envolve a natureza intencional, sistemática e proposital dos sujeitos, o PPP passa uma referência que permite aos sujeitos transitarem da consciência e ação individual para o nível coletivo e autogerador, orientando-se pelas relações de sinergia escola-comunidade em seu sentido mais amplo. 72 2.1.4 Os novos princípios organizadores da gestão escolar Com a ampliação das formas de organização e gestão escolar, Libâneo (2008) aponta as perspectivas autogestionária, interpretativa e democrático-participativa como ramificações da concepção sociocrítica. Em linhas gerais, situar-se-ão as três concepções originárias da perspectiva sociocrítica, considerando a concepção democrático-participativa como mais coerente com os processos relativos às inovações nas práticas do PPP para maior participação da comunidade. A ênfase ao modelo democrático-participativo situa-se na possibilidade de participação ativa da comunidade como condição para a construção e execução do PPP em seu caráter autogerador. Assim como ao fato da proposta de investigação buscar compreender uma experiência em curso de modificações nas práticas do PPP para maior participação da comunidade escolar, filiando-se aos processos inovativos ideográficos. Considera-se, ainda, que as concepções autogestionária e interpretativa, em maior ou menor grau, demandam um ambiente democrático, sendo que a primeira depende de uma postura proativa dos sujeitos nos processos de tomada de decisão e a segunda envolve a manifestação do pensamento subjetivo, demandando condições de livre manifestação do pensamento. 73 2.1.4.1 A concepção autogestionária A concepção autogestionária parte do pressuposto de que os procedimentos de gestão escolar são organizados por meio da participação direta da comunidade, tendo como pressuposto a proatividade dos sujeitos nos processos de tomada de decisão. Todos os envolvidos são chamados a participar e decidir sobre questões relevantes à sustentabilidade da instituição, rompendo com modelos hierárquicos e centralizados de decisão. Segundo Libâneo (2008), a perspectiva autogestionária acentua a participação direta e por igual de todos os membros da instituição, valorizando a capacidade coletiva dos sujeitos de instituir procedimentos de gestão. Como procedimentos instituintes, podem ser mencionados a capacidade de criação e instituição de um conjunto de normas e procedimentos coletivos, correspondentes com o conjunto de vivências sociais na instituição pela organização das atividades de trabalho dos sujeitos. Outros aspectos da perspectiva autogestionária são os vínculos das formas de gestão interna com as formas de autogestão social30, responsabilidade coletiva, auto-organização dos sujeitos pertencente à instituição, decisões colegiadas em assembleias e reuniões (LIBÂNEO, 2008). São características convergentes com a capacidade dos sujeitos de condução dos próprios processos de desenvolvimento institucional, tendo como fundamento a organização de procedimentos endógenos, compatíveis com as suas aspirações e necessidades. 30 A relação entre gestão interna e autogestão social é vista por Libâneo (2008) como um modo de promover o exercício do poder coletivo na escola e de preparar para formas de autogestão no plano político. As formas de autogestão política dão-se pela prática da participação e contestação das formas de poder instituído, criando bases para as formas instituintes. 74 2.1.4.2 A concepção interpretacionista Quanto à perspectiva interpretacionista, Lopes e Barbosa (2008) descrevem que a mesma considera as dimensões subjetivas ao explicar os fenômenos, procurando interpretar as condições que sustentam a unidade e coesão da sociedade e os elementos constituintes das relações sociais, tais como: consenso, integração e coesão social, solidariedade, necessidade de satisfação e realidade. Enquanto concepção interpretativa da realidade, organiza-se como um conjunto de significados subjetivos atribuídos pelos sujeitos como condição essencial para sustentar o funcionamento da instituição. Destaca-se o fato das dimensões subjetivas, presentes nas relações entre os sujeitos, ser importante para compreender os processos de organização da instituição. De acordo com Libâneo (2008), numa perspectiva interpretacionista, a escola é vista como uma realidade social e subjetiva em que há compartilhamento de valores e práticas por meio de uma “ação organizadora”. A ação organizadora valoriza as interpretações, percepções e significados subjetivos em detrimento do caráter formal, estrutural e normativo presente na estrutura organizacional da instituição. Constata-se que essa perspectiva permite compreender elementos simbólicos que estão presentes no plano da organização da instituição, em especial do entendimento dos valores atribuídos subjetivamente pelos sujeitos aos processos de mudança. 75 2.1.4.3 A concepção democrático-participativa Quanto à concepção democrático-participativa, seus fundamentos estão no processo de redemocratização da sociedade brasileira, orientando-se pela CF/1988 e LDB 9394/96, na qual são definidas as bases legais que estimulam o movimento de repensar a organização escolar em parâmetros democráticos. Esses fundamentos da CF/1988 seriam a instituição da “gestão democrática do ensino público” (Art. 206, Inciso VI), cujos princípios são definidos pela LDB 9394/96: participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e participação da comunidade escolar e local nos conselhos da escola ou equivalentes. Ao tratar das possibilidades de participação dos profissionais da escola na construção do PPP, a LDB 9394/96 aponta para a necessidade de democratização dos espaços escolares, especialmente de uma maior participação da comunidade no interior da escola. A liberdade docente de escolha dos métodos e técnicas pedagógicas, a maior flexibilidade dos tempos e espaços escolares, a participação da sociedade civil nos processos de gestão escolar são, para a época, princípios inovadores. Os pressupostos inovativos da maior liberdade, flexibilidade e autonomia na gestão dos processos de ensino estariam voltados para a criação de condições efetivas de acesso, permanência e progresso dos alunos nas etapas de escolarização. Subentende-se que uma das condições para assegurar a efetividade dos referidos princípios estaria na maior sinergia da escola com a sua comunidade. De acordo com Libâneo (2008), a perspectiva de democratização da escola, fundamentada na CF/1988 e LDB 9394/96, permite inferir que a organização e gestão da escola visam: a) Prover as condições, os meios e todos os recursos necessários ao ótimo funcionamento da escola e do trabalho em sala de aula; b) Promover o envolvimento das pessoas no trabalho por meio da participação e fazer o acompanhamento e a avaliação dessa participação, tendo como referência os objetivos de aprendizagem. c) Garantir a realização da aprendizagem de todos os alunos. (LIBÂNEO, 2008, p.100-101) 76 O sentido do aprofundamento da gestão democrática é a melhoria da escola, em especial dos processos de ensino-aprendizagem. O conceito de aprendizagem refere-se tanto ao acesso dos alunos aos conteúdos curriculares quanto às práticas sociais e culturais extracurriculares. É necessário que os alunos percebam as dimensões sociais e culturais presentes no universo da comunidade como parte da formação cidadã. Assim, há razões que justificam a implantação de um processo de gestão democrática na escola com ênfase nas práticas de ensino: 1ª) A escola deve formar para a cidadania e, para isso, ela dever dar exemplo. A gestão democrática da escola é um passo importante no aprendizado da democracia. 2ª) A gestão democrática pode melhorar o que é específico da escola, isso é, o seu ensino. A participação na gestão da escola proporcionará um melhor conhecimento do funcionamento da escola e de todos os seus atores (GADOTTI, 2004, p.35). Por outro lado, a aprendizagem das práticas sociais e culturais depende da rede de relações construídas pela comunidade. É necessário considerar a diversidade de potenciais dos sujeitos e suas contribuições para aprendizagem. É por meio de relações dialógicas estabelecidas, especialmente entre alunos e professores, que se desenvolve a consciência histórica e social dos desafios da realidade. O diálogo é uma das condições que sustenta a emergência da consciência histórico e social dos membros de uma comunidade, tendo como eixo articulador os princípios democráticoparticipativos, sendo fundamental a liberdade de expressão, o respeito e a tolerância. A compreensão do outro, da sua maneira de perceber a realidade, apresenta-se também como questões essenciais. Acrescenta-se que os processos de participação são expressos em situações de vida concreta, pertencendo ao conjunto das relações que são vivenciadas pela comunidade, sendo referência para o desenvolvimento pedagógico e institucional da escola e, consequentemente, da própria comunidade. Assim, conceitua-se a gestão participativa como um processo de “mobilização da competência e da energia de pessoas coletivamente organizadas para que, por sua participação ativa e competente, promovam a realização, o mais plenamente possível, dos objetivos de sua unidade de trabalho.” (LUCK, 2010, p.21). Os objetivos da escola, enquanto unidade de trabalho, estão expressos no PPP como um instrumento articulador das relações comunitárias. 77 Quanto à unidade de trabalho escolar, os objetivos e metas pactuados coletivamente, expressos no PPP, articulam as relações entre os seus membros, ao se sustentar em princípios de cooperação mútua e respeito às diferenças. Soma-se, ainda, a perspectiva de que “o êxito de uma organização social depende da mobilização, da ação conjunta de seus componentes pelo trabalho associado, mediante reciprocidade que cria um ‘todo’ orientado por uma vontade coletiva.” (LUCK, 2010, p.22). A construção da vontade coletiva estaria associada à solidez das propostas educativas em nível do engajamento pleno31 da comunidade, visto como um processo social e dinâmico, no qual os atores assumem responsabilidades pelo agir com empenho, competência e dedicação. Ao valorizar o envolvimento direto da comunidade, as ideias de Libâneo (2008) e Luck (2010) são convergentes com o sentido de participação como forma de constituição da identidade, autonomia e sentimento de pertencimento ao grupo institucional. O trabalho coletivo, ao apoiar-se nos processos de participação, corresponsabilidade e cooperação, consiste em uma possibilidade concreta de superação das propostas gestionárias centralizadas e fragmentárias. A participação direta da comunidade favorece a emergência de propostas autogeradoras, reconhecendo que o PPP é o que se vive concretamente na escola. O conjunto dessas vivências gradativamente assume um significado concreto, passando a ser um elemento de articulação coletiva da comunidade para alcançar objetivos comuns. Dentre as principais características do projeto de gestão democrático-participativa, a construção de relações orgânicas entre a direção e os membros da equipe escolar, o compartilhamento de objetivos comuns, os processos colegiados de decisão, as definições sociopolíticas e pedagógicas, a gestão participativa em consonância com processos de coordenação e diferenciação de competências profissionais entre os membros da equipe, a gestão eficaz e a avaliação sistemática dos processos executados são as fundamentais (LIBÂNEO, 2008). 31 Para Luck (2010, p.47), “o engajamento implica envolver-se dinamicamente nos processos sociais e assumir responsabilidades por agir com empenho, competência e dedicação visando promover os resultados propostos e desejados.” 78 Ainda, segundo o mesmo autor, enquanto gestão eficaz, a concepção democráticoparticipativa valoriza elementos internos do processo organizacional – o planejamento, a organização, a direção, a avaliação -, chamando a atenção para a necessidade de uma coerência entre as decisões tomadas e as ações praticadas na escola. Pelo prisma democrático-participativo, a gestão eficaz consiste no reconhecimento de que os sujeitos são detentores de direitos e responsabilidades e assumem compromisso com a comunidade escolar, com um projeto coletivo de educação e transformação social. Pressupõe flexibilidade organizacional, na qual os princípios de funcionamento adaptem-se à dinâmica dos sujeitos envolvidos, estimulando-os a exercitarem sua criatividade na resolução dos problemas. Trata-se de avaliar a legitimidade das ações, muitas das quais não previstas em programas e/ou regulamentos, denominada de lógica do arranjo: “o ajuste com os colegas, que permite a realização de acordos locais e novos contratos não previstos pelas regras, garante a eficiência do trabalho” (THULER, 2001. p.39). Assim, a construção de inovações fundadas no caráter autogerador da comunidade implica em assumir desafios na construção de um modelo de gestão democrático-participativo flexível, capaz de considerar a própria comunidade como locus privilegiado da proposição de mudanças para enfrentamento dos problemas vivenciados em seu interior. Nesse sentido, quanto mais flexível for o sistema de organização escolar, maior será a capacidade de incorporar os processos de mudança já que prevê, em sua constituição estrutural, o pensamento reflexivo como fator propulsor das inovações. A reflexão coletiva, fundada na diversidade de opiniões e capacidade de novas sínteses, emerge como uma condição fundamental para a organização da gestão democrático-participativa num contexto dinâmico que incorpore demandas e expectativas da própria comunidade. A compreensão do movimento dinâmico de articulação de inovações no Projeto PolíticoPedagógico da escola requer conhecer a sua postura proativa, especialmente a forma como se apropria dos espaços democráticos no interior da escola, de modo que seja uma “construção coletiva do espaço público, com plena participação consciente de todos na gestação e no controle da esfera política” (COUTINHO, 1999, p.02). 79 2.1.4.3.1 O Projeto Político-Pedagógico e a Gestão democrático-participativa A organização do PPP fundada em parâmetros democráticos consiste num avanço, na medida em que assegura maior autonomia dos seus profissionais na deliberação de questões pedagógicas e administrativas no interior da escola. Apoiando-se em Gohn (2004; 2007), situa-se que sua constituição, enquanto proposta articuladora da comunidade escolar, amplia o diálogo com outros setores da sociedade civil na constituição da chamada comunidade educativa. A constituição e execução do PPP fortalecem as relações democráticas da escola, quando o processo desenvolve-se de maneira articulada, continuada e coletiva. Para Veiga (2004); Quaresma (2012), o PPP envolve a participação dos profissionais da escola (professores, diretores, supervisores, auxiliares), alunos e demais segmentos da comunidade, orientando-se pela definição de estratégias e objetivos para enfrentamento da realidade e dos desafios de construção da sociedade desejada. A igualdade de condições para acesso e permanência na escola, a qualidade educacional para todos, a gestão democrática do ensino público, a autonomia e liberdade, a valorização do magistério são os princípios fundamentais que sustentam a constituição democráticoparticipativo do PPP da escola. (VEIGA, 2004) Obviamente, todo esse processo requer legitimidade e aprofundamento dos princípios da democracia participativa no interior da escola. Pressupõe, ainda, uma maior participação da sociedade civil em questões de interesse público, pressionando o Estado tanto para manter a coerência e equidade no tratamento das políticas educacionais, quanto em assegurar os canais de participação da comunidade educativa. Essa coerência estaria tanto no respeito aos processos de mudança instituídos pela própria escolar, quanto no aporte de recursos públicos necessários à construção da realidade desejada. Ao conceituar o movimento de redemocratização da escola brasileira, ao final da década de 1980, Gadotti; Romão (2004) descreve sua pertinência como a maior participação da sociedade civil. Dentre os aspectos positivos, são destacadas as possibilidades de exercício da autonomia escolar, especialmente na constituição do PPP em uma trajetória compatível com as dimensões histórico e social da escola. 80 Os avanços do processo de redemocratização para os sistemas de ensino brasileiros estariam principalmente nas possibilidades de exercício da autonomia escolar e constituição do PPP. Por outro lado, não se pode esquecer que, decorridas mais de duas décadas, há fragilidades das práticas participativas, convertendo o PPP, um instrumento burocrático, em um documento de gaveta, cumpridor de uma lógica pública formal (VEIGA, 2003). É latente, a necessidade de avançar nas formas como efetivamente as comunidades dialogam com o PPP, enquanto instrumento de ação-reflexão-ação autogerador de mudanças e expressão concreta da organização e do fazer pedagógico em atendimento qualitativo do aluno como sujeito singular da comunidade educativa. O posicionamento dos membros da comunidade educativa orienta-se pelo PPP, pressupondo comprometimento com a escola e com os processos de retroalimentação das práticas curriculares de melhoria da qualidade de ensino e de transformação da realidade, em um exercício permanente de aproximação das concepções filosóficas, pedagógicas e administrativas da escola no marco desejado. Um projeto de educação comum vai exigir que os educadores de cada escola elejam um conjunto de intenções educativas e um conjunto de diretrizes pedagógicas que se articulem para orientar a organização e o desenvolvimento da sua prática educativa. Referenciais mais amplos - de natureza político-filosófica, epistemológica e didático-pedagógica - definidos conjuntamente, oferecerão as bases para a análise da realidade atual da escola e o planejamento da intervenção sobre ela (MURTA, 2004, p.21). A vivência das dimensões político e pedagógicas do PPP, no interior da escola, é fundamental para a radicalização da democracia escolar e, ao mesmo tempo, para a congregação da participação de diferentes segmentos da comunidade na gestão e práticas pedagógicas escolares. A criação de estratégias de envolvimento da comunidade, tanto na participação quanto nos processos de decisão colegiada, é fundamental para a formação de uma organização institucional e pedagógica com maior poder de participação da sociedade civil. A dimensão política do PPP “compreende o que se deseja em relação à formação do cidadão e o tipo de sociedade que se deseja construir, bem como, quanto ao que se compreende sobre educação” (QUARESMA, 2012, p.02). Assim, perpassa tanto pela concepção que orienta as práticas educacionais, quanto pela definição do homem e sociedade que se deseja. Pelas 81 práticas pedagógicas, os discentes têm acesso ao currículo como caminho a ser percorrido na superação dos problemas reais e alcance das condições efetivas desejadas. As dimensões pedagógicas são vistas como as condições operacionais concretas de acesso aos saberes tratados pela escola, tais como: articulação dos conteúdos curriculares, concepções, formas e instrumentos de avaliação, estratégias de recuperação dos alunos, materiais didáticos, dentre outros. Ou como expressa Quaresma: a dimensão pedagógica diz respeito às ações reais para que a formação do aluno se concretize. Ou seja, qual currículo? Qual processo de avaliação? Qual metodologia? Quais recursos didáticos? Quais serão as relações interpessoais? Qual formação continuada para os professores? Quais as formas de participação de alunos, pais e professores? Qual a forma de gestão? Enfim são dimensões que dizem do desejo e do fazer para que o trabalho pedagógico da escola aconteça rumo à formação de qualidade do aluno (QUARESMA, 2012, p.14). Acrescenta-se que a perspectiva autogeradora do PPP acentua a necessidade da sua constituição em consonância com a trajetória histórico social da escola. Implica em desenvolver a consciência dos seus sujeitos para a vida, em sentido mais amplo, em sua comunidade educativa. A construção de estratégias de reflexão conjunta, situando os problemas da comunidade e suas respectivas estratégias de ação, é fundamental para o seu caráter edificante. São as ações de compreensão das contradições de uma dada realidade, a abertura ao diálogo e as formas de compreensão de um dado fenômeno que materializam a prática de constituição democrática do PPP. É a conversão sublime da ideia de participação em um trabalho com estratégias metodológicas coletivas e engajadas, com posicionamento dos sujeitos frente às questões levantadas. Isso reforça a ideia de que as condições autogeradoras do PPP, em consonância com as dimensões históricas e sociais de pertencimento dos sujeitos escolares, demandam um posicionamento comunitário crítico e reflexivo da realidade. Uma vivência dialógica dos seus campos instituídos e instituintes32 no espaço democrático, entre a realidade vivenciada cotidianamente e o que se deseja construir. 32 Ao diferenciar projeto de plano Gadotti (2004) aponta que o plano fica no campo do instituído, do seu cumprimento eficaz, enquanto o projeto (no caso, aplica-se ao PPP), situa-se no campo instituinte, do vir a ser. Assim, necessita rever o campo instituído no seu processo de constituição. 82 [...] um projeto político-pedagógico não nega o instituído da escola que é a sua história, que é o conjunto dos seus currículos, dos seus métodos, o conjunto dos seus atores internos e externos e o seu modo de vida. Um projeto sempre confronta esse instituído com o instituinte (GADOTTI, 2004, p.34). É necessário fortalecer as estratégias de pertencimento dos sujeitos ao PPP de modo que se sintam contemplados e valorizados nos processos de desenvolvimento institucional e pedagógico da escola. O desenvolvimento do diálogo é fundamental para que os processos de decisão sejam compartilhados e exista sensibilidade dos sujeitos quanto ao interesse coletivo. O senso de responsabilidade coletiva e trabalho pedagógico cooperativo evita relações competitivas, corporativas e autoritárias (QUARESMA, 2012). Assim, a participação pode ser vista como uma possibilidade de superação das ações de trabalho individuais e fragmentadas, tendo como referência as decisões coletivas, centradas na escola como unidade social e no poder de competência do grupo (LUCK, 2010). Nesses termos o PPP passa efetivamente a ser um elo de articulação da comunidade educativa à sua unidade social e histórica, sustentada pela consciência dos sujeitos quanto aos desafios e potencialidades de construção de estratégias inovadoras. É na estreita relação entre os campos instituídos e instituinte, da realidade vivida e desejada, que se constitui na linha tênue dos processos de estabilidade e mudança,33 da existência do caráter autogerador de inovações do PPP. A comunidade ao lidar com essa dinâmica em espaços democráticos de participação permite aos sujeitos coletivos converterem o PPP em uma expressão endógena34 dos interesses comunitários, assegurando o seu caráter edificante diante da realidade institucional e pedagógica vivenciada. Por outro lado, o diálogo entre os campos instituinte e instituído do PPP é um movimento inacabado e permanente entre o real e o desejado, exigindo da comunidade o fortalecimento dos processos participativos e a superação de determinadas condições que fragilizam a sua vivência democrática, tais como: centralização das ações pelo diretor, ausência de identidade 33 De acordo com Thuler (2001), qualquer processo de mudança, de inovação supõe rompimento com processos, formas e ideias instituídas. Por outro lado, a inovação para se materializar como um processo proposital e contínuo exige o mínimo de estabilidade. 34 Os processos de mudança endógena são disseminados pela própria comunidade, ao tomar consciência das demandas da sua própria realidade (ÁVILA, 2003). 83 coletiva e de sentimento de pertencimento do grupo, ações mecânicas e fragmentadas, ruídos no diálogo e comunicação interna, dentre outros. Vale destacar que não se pode considerar os processos participativos como sinônimo de consenso e unanimidade. O desenvolvimento do PPP, enquanto proposta articuladora da realidade, supõe a existência do contraditório, da manifestação do pensamento divergente como fator intrínseco ao cenário democrático. Ao analisar os processos de descentralização escolar, Thuler (2001) destaca o fato da participação não se constituir em uma unanimidade na escola: - A descentralização não é garantia de participação. Os diretores de escola podem confiscar o poder acrescido concedido às instituições, se o sistema de gestão não os dissuadir ativamente e não introduzir contrapoderes. - A descentralização e a participação não terão credibilidade se as autoridades limitarem-se a explicar seu ponto de vista sem negociá-lo, sem aceitar interpretações diversas, sem levar a sério os princípios de funcionamento democrático ou sem estabelecer dispositivos de acordo dignos deste nome. - A participação, o acordo e a cogestão não são antídoto ideal à resistência porque esta não é levada em conta. A recusa à participação não apenas é frequente, mas faz parte de uma estratégia. - Os acordos nem sempre são concebidos de maneira a criar um campo de diálogo e cooperação que permita construir representações comuns. (THULER, 2001, p.15). Assim, os processos de participação não são produtos de uma dada realidade natural, pertencendo ao universo das construções histórico-sociais dos sujeitos, marcadas por contradições e, por sua vez, por condições determinantes. Ao serem resultantes das condições históricas e sociais dos seus sujeitos, são marcados por tensões, especialmente quanto às formas de participação. Até mesmo, a posição confortável e privilegiada de determinados sujeitos ou a acomodação em determinado status quo, pode gerar resistência quanto aos processos de mudança. É necessária uma visão crítica dos sujeitos relativa às tensões existentes no interior da escola, especialmente na constituição de um PPP que se proponha a ser inovador para uma maior participação da comunidade, de modo que se perceba a tênue relação entre a realidade e o que se deseja construir, nos quais estão presentes tensões como parte do desafio concreto. É importante estar consciente dos desafios que envolvem a articulação e mobilização dos sujeitos, recursos humanos e materiais, concepções, dentre outros. Vale lembrar que 84 Hernández et al (2000); Carbonell (2002) apontam as modificações das concepções dos seus sujeitos como o principal desafio dos processos de inovação escolar. Assim, o PPP, como expressão da democracia escolar, consiste num movimento permanente e dinâmico de diálogo dos seus sujeitos, reconhecendo suas possibilidades e contradições como inerentes e salutares à produção de inovações que dialogam com o desenvolvimento endógeno da comunidade. É fundamental que o PPP expresse a realidade concreta vivenciada pela escola, correlacionando os marcos teóricos com a prática social. Ou, como expressa Veiga (2003), como um processo de participação direta, envolvendo argumentação, comunicação e a solidariedade dos atores na constituição do horizonte histórico e social da escola e dos seus objetivos concretos. A participação articulada da comunidade escolar pode produzir investigações sobre a realidade concreta da escola, assim como contribuir com o desenvolvimento de centros de estudos, organização de salas de leitura, salas de artes e outras atividades na área da cultura, esporte e lazer nas escolas (GOHN, 2007). Vê-se que um PPP, que possibilita o envolvimento dos alunos em atividades curriculares e extracurriculares, criando estratégias, nas quais são envolvidos efetivamente como sujeitos da ação e desenvolvem experiências de tomada de decisões, apresenta-se como uma possibilidade de diálogo com a vida cidadã dos discentes no ambiente comunitário. O PPP, como expressão da própria organização escolar democrática, implica “não só a participação na gestão, mas também a gestão da participação, em função dos objetivos da escola” (LIBÂNEO, 2008, p.105), ou seja, um movimento de ruptura nos processos de trabalho fragmentados e desarticulados, pressupondo uma articulação coesa de todo o grupo em sua concepção e execução, participando efetivamente da (re)construção da proposta. Partindo do pressuposto de que os princípios organizadores do processo de gestão democrático-participativo são convergentes com a maior participação da comunidade, o desafio e a construção de um conjunto de procedimentos contribuem com o aprofundamento da participação comunitária, equilibrando dimensões objetivas e subjetivas, numa prática orientada por objetivos de melhoria da qualidade da educação. 85 2.1.4.3.2 Analisando experiências inovadoras na Gestão democrático-participativa O processo de democratização da sociedade brasileira pode ser associado a três inovações institucionais: autonomia financeira das escolas, eleição do diretor e colegiado escolar. Esses três processos institucionais estão intrinsicamente interligados já que a autonomia financeira exige a formação de estruturas colegiadas e que o diretor, em um contexto democrático, assume um papel de articulador tanto das estruturas colegiadas quanto da autonomia financeira e constitui-se em presidente da entidade jurídica da caixa escolar, assim como do colegiado escolar (BARROS; MENDONÇA, 1998). A autonomia financeira pode ser vista como a capacidade conquistada pelas escolas de gerir os recursos que são descentralizados do caixa escolar, priorizando a otimização da sua aplicação. Para Barros e Mendonça (1998), a autonomia financeira constitui-se no pilar do processo de descentralização da gestão escolar, na medida em que assegura à própria escola a capacidade de lidar com os recursos financeiros, convivendo diretamente com os limites de aplicação dos recursos no atendimento às demandas prioritárias. Quanto à eleição de diretores, a principal ruptura foi o deslocamento dos processos de indicação política35 para escolhas centradas na competência profissional. Em alguns Estados da Federação, o processo combina exame de certificação, com aplicação de provas para avaliar a proficiência dos candidatos, e eleição da comunidade. A habilitação do candidato para participar das chapas eleitorais fica condicionada à obtenção de uma proficiência mínima no exame de certificação. Em relação ao colegiado escolar, sua natureza normativa e consultiva habilita-o a coordenar e avaliar as atividades pedagógicas, administrativas e financeiras das unidades escolares. É uma forma de participação representativa de professores, funcionários, pais, alunos e membros da comunidade na gestão escolar. A gestão colegiada dos processos visa a aperfeiçoar a aplicação dos recursos públicos, o desenvolvimento administrativo e pedagógico das escolas. Seu potencial está relacionado à capacidade de seus membros dialogarem com a comunidade e articularem processos decisórios compatíveis com os interesses e necessidades da comunidade, bem como com o PPP da escola. 35 Os processos de indicação política e ocupação de cargo público são ranços dos sistemas burocráticos de gestão, nos quais as decisões são centralizadas, desconsiderando os interesses e necessidades da comunidade local. 86 Segundo Abranches (2003), o colegiado é uma forma de construir uma gestão, na qual representantes de diferentes segmentos institucionais participam dos processos decisórios e do acompanhamento, execução e avaliação das ações administrativas, financeiras e pedagógicas nas unidades escolares. A construção da autonomia financeira, eleição direta do(a) diretor(a) pela comunidade e gestão colegiada consistem em três importantes inovações no cenário democráticoparticipativo, com contribuições para melhoria da qualidade da educação (BARROS; MENDONÇA, 1998). Essas três inovações do cenário democrático-participativo são fundamentais para a constituição dos processos democráticos no interior da escola. A radicalização dos processos democráticos, no entanto, exige aperfeiçoamento dos canais de comunicação e envolvimento direto da comunidade no cotidiano escolar criando, conforme visto anteriormente, uma sinergia ampla com a comunidade educativa. As três experiências institucionais mencionadas são importantes, mas possuem limites quanto aos processos de participação direta, sendo importante avançar nas formas como efetivamente a comunidade escolar constrói diretamente os processos participativos em suas relações cotidianas como fator decisivo para a emergência de inovações autogeradoras nas práticas do PPP. 87 2.1.4.3.3 O PPP, as formas e valores da gestão democrático-participativa As formas de participação representam a maneira como os sujeitos escolares envolvem-se nas atividades pedagógicas e administrativas (reuniões, conselhos, atividades curriculares) de acordo com Luck (2010) perpassando pela presença física, expressão verbal e discussão de ideias, representação, tomada de decisões e engajamento. Ao analisar o modelo gerencial de gestão escolar, vê-se que os processos participativos podem assumir um sentido dissimulado, conforme a conveniência e o interesse de determinados grupos ou pessoas. A ausência de um sentido legítimo da participação, enquanto envolvimento consciente dos sujeitos nos processos de transformação social, é um limite à expressão democrático-participativa das práticas do PPP na escola. Esse limite estaria principalmente na falta de conhecimentos integrais dos sujeitos dos processos de transformação sendo, para os mesmos, concepção e execução fatores dissociáveis. Obviamente, a maneira como os sujeitos vivenciam e apropriam-se do PPP em sua prática determina o quanto estão próximos ou distantes dos processos participativos autogeradores, nos quais o caráter edificante das mudanças do PPP fortalece as dimensões sociocríticas das práticas pedagógicas e de gestão. De acordo com Luck (2010), em reuniões escolares, é comum conceber como suficiente a presença física dos participantes, sem que de fato os mesmos tenham tido qualquer tipo de envolvimento com a proposição das ideias. Infere-se que a simples presença física das pessoas no cenário da participação, sem o devido grau de mobilização e envolvimento consciente dos sujeitos, não é suficiente para assegurar processos autogeradores do PPP. Fica adormecido o poder de decisão coletiva dos sujeitos, enquanto fator fundamental para o caráter edificante do PPP. O caráter autogerador do PPP estaria na manifestação da diversidade de posições dos sujeitos e na capacidade coletiva de produção de sínteses que representariam de maneira autêntica os interesses comunitários. É na multiplicidade de concepções e experiências dos sujeitos que se assegura o movimento de vir a ser do PPP como processo inconcluso que reflete o movimento dinâmico da comunidade na construção de alternativas aos desafios da sua realidade. 88 Quanto à verbalização, enquanto forma de participação, assume sentido limitado quando o debate não sofre o devido grau de aprofundamento das questões que envolvem a estrutura administrativa e pedagógica (LUCK, 2010). As reflexões coletivas das práticas do PPP ficam restritas a questões secundárias, sem relevância e com o esvaziamento do poder de decisão comunitário, consequentemente, do seu caráter autogerador. Em termos de participação representativa, sua principal forma de manifestação tem sido os conselhos escolares. Os limites dessa forma de participação estão relacionados ao despreparo dos representantes para atuarem em consonância com as demandas e expectativas da comunidade escolar. A ausência do conhecimento de questões básicas em termos administrativo, pedagógico e financeiro das escolas; a participação dos representantes acoplada por uma lógica estatal e lacunas no diálogo dos representantes com a comunidade são apontados como principais problemas dessa forma de participação (GOHN, 2007). Assim, os processos de atuação nos conselhos estariam mais voltados para a manutenção da fluidez dos interesses de determinados grupos com posição estratégica na política pública do que para o exercício autônomo, crítico-reflexivo dos campos instituídos e a proposição de mudanças, de diálogo com a perspectiva instituinte. Por outro lado, a legitimidade dos processos participativos perpassa pelo envolvimento dos sujeitos e compartilhamento do poder de decisão, nos quais todos efetivamente se envolvem para a busca de soluções para os problemas enfrentados. É, segundo Luck (2010), um movimento de engajamento, no qual os sujeitos assumem responsabilidades quanto ao desenvolvimento de um projeto comum. Essa forma de participação consiste em um contraponto aos processos participativos comandados pelos interesses dos sujeitos que detêm posição estratégica, o debate consiste apenas numa forma para referendar as decisões tomadas previamente pela direção, sem o real envolvimento dos sujeitos e consciência do seu significado para o PPP da escola (LUCK, 2010). Superar as formas dissimuladas de participação no interior da escola, construindo processos que valorizam os sujeitos, com poder efetivo de decisão é um desafio a ser percorrido no 89 interior no aperfeiçoamento do PPP. É importante que os sujeitos estejam envolvidos na proposição das ideias, no compartilhamento das decisões e na responsabilização pelas mesmas. Assim, é necessário uma dinâmica de engajamento com empenho, compromisso e dedicação. O engajamento representa o nível mais pleno de participação. Sua prática envolve o estar presente, o oferecer ideias e opiniões, o expressar opiniões, o expressar o pensamento, o analisar de forma interativa as situações, o tomar decisões sobre o encaminhamento de questões, com base em análises compartilhadas e envolver-se de forma comprometida no encaminhamento e nas ações necessárias e adequadas para a efetivação das decisões tomadas (LUCK, 2010, p.47). Obviamente, a participação engajada é fundamental para a existência, no interior da escola, de processos inovativos de caráter autogerador do PPP. A vivência dos valores no interior da escola corrobora com a construção de uma ação coesa e integral, refletindo a comunidade em sua diversidade, especialmente da forma como concebem a realidade em analogia ao que se deseja. Na medida em que há aprofundamento das interações no ambiente escolar, os sujeitos vão concebendo os valores que orientam os processos de participação engajada, destacando a ética, a solidariedade, a equidade e o compromisso (LUCK, 2010). Os valores éticos são fundamentais para o exercício da autonomia escolar, sendo referência para a vivência dos sujeitos das ações orientadas por princípios de respeito ao ser humano e aos valores institucionais presentes no PPP. A vivência da autonomia exige um compromisso ético-profissional dos sujeitos na promoção da educação para a sua comunidade, sustentado na capacidade da escola de construir e executar um PPP relevante para sua comunidade (NEVES, 2004). A solidariedade, enquanto sentimento que se desenvolve em condições de troca e reciprocidade, é outro valor fundamental para a construção de um trabalho coletivo e colaborativo em detrimento às ações individuais. É fundamental, quando se propõe a criar o sentindo coletivo, superar as ações centralizadas, individuais e fragmentadas. No PPP, as ações de trabalho articuladas exigem a solidariedade, o respeito, a reciprocidade e a participação de todos como base para relações cordiais (QUARESMA, 2012). 90 Quanto à equidade, perpassa pelo reconhecimento e atendimento dos sujeitos que demandam condições especiais, bem como pela justiça social e redução das desigualdades no interior da escola. Pressupõe um compromisso dos envolvidos com os princípios e diretrizes que orientam o PPP sem, no entanto, limitar o direito dos sujeitos de serem atendidos, conforme suas necessidades e manifestar as suas diferenças, quanto aos métodos e técnicas pedagógicas. A legitimidade de todo processo de participação ocorre pelo compromisso dos sujeitos em relação às decisões tomadas, tanto na participação nos processo de constituição dos marcos de orientação coletiva, quanto em assumir as responsabilidades pela sua vivência concreta nas práticas do PPP. É fundamental, no processo de execução e vivência do PPP, orientar-se pelos valores mencionados, nutrindo-se do diálogo como condição essencial. Para Freire (1987), o amor ao mundo e aos homens, a humildade, a fé nos homens e mulheres, a confiança e a esperança são condições essenciais para a existência do diálogo. Esses sentimentos, associados aos valores, nutri as relações entre os sujeitos e as convicções do grupo das suas possibilidades autogeradoras de mudanças. Expressa nos processos de participação coletiva a autonomia dos sujeitos é condição fundamental para proposição de valores e formas coerentes com o caráter autogerador do PPP, referendo em uma escola cujos espaços são abertos as situações de confronto enquanto base para a proposição de inovações (VEIGA, 2003). 91 2.1.4.3.4 A Gestão do PPP: possibilidades e contradições Ao envolver dimensões históricas e sociais, a gestão do PPP não é um movimento linear, dado em um determinado momento histórico pela formalização de um plano que unifica todas as propostas e o modo de relacionar dos seus sujeitos. Há uma dialética própria no interior das escolas, um movimento de reflexão-ação-reflexão que dialoga com a realidade concreta, podendo existir contradições entre o seu referencial político-filosófico, que orienta a perspectiva de escola desejada, e a prática concreta dos sujeitos, especialmente dos professores em sala de aula. Como processo inacabado, o caráter edificante do PPP estaria no diálogo permanente dos sujeitos com a realidade coletiva, com as possibilidades de proposição de propostas inovativas que respondam aos desafios de modificar a realidade concreta, especialmente às demandas emergentes na comunidade. A construção do PPP por especialistas, sem o real envolvimento da comunidade escolar, dissemina a concepção de um documento pontual, de caráter regulatório, definidor de concepções e procedimentos distantes das reais necessidades da comunidade. Ao assumir contornos verticalizados, segmentando planejamento e ação, centra-se em preocupações de padronização, uniformidade e controle burocrático das ações. Essa forma de condução da proposta no interior da escola mitiga o seu potencial autogerador e o caráter dinâmico de envolvimento da comunidade, passando a constituir um plano formal em atendimento aos protocolos da política pública, sem o devido grau de apropriação e envolvimento coletivo da comunidade. A ausência de uma efetiva participação da comunidade na constituição da proposta reduz a aderência dos sujeitos em seu processo de vivência, reforçando a segmentação entre concepção e execução. Torna-se um processo fragmentando, distante da identidade e pertencimento dos sujeitos. Nesse caso, serve apenas como documento de gaveta, cumprindo o rol de procedimentos burocráticos, das diretrizes legais do sistema público de ensino. Esse sentido de participação é visto como uma forma de referendar as exigências da política pública, já que suprime o debate entre os sujeitos envolvidos com a mesma. (GOHN, 2007; 92 DAGNINO, 2004). Os processos de construção do PPP não ficam imunes a essa lógica, especialmente quando são vistos como documentos formais, podendo ser construídos por um corpo técnico, para referendar as políticas educacionais vigentes. A ausência de um sentido político-democrático de transformação da escola produz uma desmobilização da comunidade e cria um ceticismo do ato de participar (LIBÂNEO, 2008; LUCK, 2010). Entre os problemas são destacadas, pelos autores, propostas de restruturação de tempos e espaços escolares sistematizadas coletivamente, mas que, efetivamente, não são levadas adiante pela direção; distorção do debate para questões secundárias em detrimento dos pontos centrais de desenvolvimento institucional, dentre outras. Cria-se uma pseudoparticipação, na qual os envolvidos têm a capacidade de argumentação sem, no entanto, o real poder de decisão. As decisões continuam centralizadas em sujeitos que detêm posições estratégicas, seguindo a lógica da sua conveniência pessoal. Essa redução do sentido da participação impacta a formação de uma consciência coletiva e a mobilização dos sujeitos escolares, no que se refere ao PPP em seu sentido dinâmico, mitigando as possibilidades da comunidade de produzir transformações concretas, compatíveis com as suas reais necessidades. Ao analisar os processos de participação, Libâneo (2008) aponta para o fato de que “as pessoas podem ser induzidas a pensar que estão participando, quando, na verdade, estão sendo manipuladas por interesses de grupos, de facções partidárias, interesses pessoais (p.144).” Isso reforça a necessidade da ação direta dos sujeitos nos processos participativos, da capacidade de articular as práticas institucionais à vivência coletiva, ou seja, de assegurar que as decisões expressas no projeto político-pedagógico sejam vivenciadas na prática concreta. Infere-se que a participação de modo autêntico, pautada na compreensão do PPP da escola, exige uma concepção clara dos participantes acerca dos objetivos sociais que norteiam a instituição, especialmente da sua missão e dos objetivos pactuados pela comunidade escolar. Se a educação consiste em um processo de intervenção no mundo e transformação social (FREIRE, 2004), o PPP exige esse posicionamento político dos sujeitos diante da sua realidade. Segundo o mesmo autor, inexiste na prática educativa neutralidade já que a omissão 93 dos sujeitos em participar corrobora com a racionalidade técnica dominante, com a manutenção do status quo vigente, reproduzindo, no interior da escola, o universo ideológico dominante da sociedade. Por outro lado, a tomada de consciência dos sujeitos da sua realidade, das demandas e contradições presentes permite avançar em processos participativos e práticas articuladas com as transformações sociais e aderentes às reais demandas da comunidade. A falta de consciência dos sujeitos do poder de participação produz resultados negativos na instituição escolar, expressos principalmente em faltas, omissões, descuidos e incompetência, sendo esses aspectos responsáveis por fracassos e involuções (LUCK, 2010). Tem-se sustentado que o PPP é uma possibilidade concreta de fortalecimento dos processos participativos, desde que seja voltado concretamente para a consecução dos objetivos do trabalho escolar. Os processos participativos orientam-se pela consecução dos seguintes objetivos básicos: finalidades da escola, estrutura organizacional, currículo, tempo escolar, processo de decisão, relações de trabalho e avaliação (VEIGA, 2004). Crê-se que é essa participação objetivada que fortalece a vivência coletiva do PPP, sustentando processos engajados, no quais os sujeitos dialogam com a realidade e constroem ações em direção ao que se deseja. Na escola, a participação tem sido evocada em várias circunstâncias: atividades extracurriculares, como festas juninas, promoções de campanhas, atividades de campo ou transversalidade do currículo; reuniões para tomada de decisões dos problemas apresentados pela escola (LUCK, 2010). Esses aspectos são importantes para a vivência social da escola, no entanto é necessária uma centralidade nas questões estruturais, que fundamentalmente contribuam com a maior participação da comunidade, com poder de decisão das questões relativas ao desenvolvimento escolar. Assim, no desenvolvimento do PPP, é necessário atentar para as dificuldades que são impostas para sua vivência engajada. O reconhecimento dessas contradições é fundamental para se avançar na constituição e execução de sua práxis autogeradora. Em síntese, escolas democráticas são aquelas que permitem aos sujeitos que se envolvam plenamente e com poder efetivo de participar na constituição e execução do PPP. Nesse 94 raciocínio, precisa-se avançar na conceituação e compreensão das formas de gestão democrática como condição para a construção autogeradora das práticas do PPP pela comunidade (escolar e educativa). Nos capítulo 3, serão apresentados os dados de análise de uma experiência em construção, na tentativa de compreender as relações que vêm sendo construídas para maior participação comunitária nas vivências do PPP por uma escola do município de Teófilo Otoni/ MG. 95 3. ANÁLISE DE UMA EXPERIÊNCIA EM CONSTRUÇÃO: A GESTÃO E AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DO PROJETO POLÍTICO- PEDAGÓGICO PARA MAIOR PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE – ANÁLISE DOS DADOS DOS QUESTIONÁRIOS, GRUPOS FOCAIS E ENTREVISTAS 3.1 As unidades e categorias de análise dos questionários, grupos focais e entrevistas como instrumentos da pesquisa Conforme mencionado na metodologia o propósito principal da aplicação dos questionários foi levantar dados primários que permitissem uma aproximação com o PPP no interior da escola, evidenciando aspectos e/ou tendências relativas às inovações nas práticas pedagógicas e de gestão do PPP em sua vivência concreta. Apoiado no caráter processual e coletivo do PPP (VEIGA, 2003; GADOTTI, 2004; NEVES, 2004; QUARESMA, 2012), procurou-se por meio dos grupos focais e entrevistas o aprofundamento qualitativo das informações coletadas nos questionários, estabelecendo uma aproximação com as práticas de gestão e pedagógicas da escola pesquisada enquanto expressão daquilo que se vive e pratica. É fundamental compreender as formas de interatividade da comunidade com o PPP, entendendo que, em sua prática concreta, situam-se as condições autogeradoras e propositivas de inovações para uma maior participação da comunidade. São pelas práticas de gestão e pedagógicas que se constroem as relações entre os sujeitos escolares, em especial, o envolvimento dos seus profissionais. Assim, a análise dos dados relativos às inovações na gestão do PPP para maior participação da comunidade foi sistematizada em categorias, com as suas respectivas unidades de análises empíricas (OLIVEIRA, 2007). Para compreender a realidade em sua complexidade buscou-se um diálogo entre os dados apontados pelos sujeitos nas diferentes técnicas de pesquisa empírica (questionários, grupos focais e entrevistas) utilizadas na investigação. Acredita-se que esse caminho é mais coerente com o conhecimento do sentido autogerador dos sujeitos 96 das mudanças do PPP ao ter como fundamento diferentes perspectivas de conhecimento da realidade histórico-social dos sujeitos. A identificação e agrupamento das categorias empíricas baseou-se nos conceitos centrais da investigação, orientando-se por uma perspectiva de interação e interpretação dos dados em sua complexidade, visando perceber as relações estabelecidas entre os sujeitos comunitários na vivência das práticas pedagógicas e de gestão do PPP. As categorias e suas respectivas unidades de análise estão sistematizadas no QUADRO 4. QUADRO 4 CATEGORAIS E UNIDADES DE ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS, GRUPOS FOCAIS E ENTREVISTAS CATEGORIAS DE ANÁLISE COMPOSIÇÃO DA CATEGORIA POR UNIDADES DE ANÁLISE Categoria 1: Participação da comunidade na gestão do Projeto Político-Pedagógico da escola. Categoria 2: O Projeto Político-Pedagógico enquanto unidade de articulação escolacomunidade . Categoria 3: Ações desenvolvidas pela escola para maior participação da comunidade no Projeto Político-Pedagógico. Unidade 1: Percepção da comunidade sobre a participação nas práticas do PPP Unidade 2: Os profissionais da escola, processos decisórios e o PPP Unidade 3: Concepção dos sujeitos da sua vivência escolar Unidade 4: Finalidades do PPP e organização das práticas pedagógicas e de gestão Unidade 5: Relações de trabalho na escola Categoria 4: Dificuldades de maior participação da comunidade no Projeto Político-Pedagógico. Unidade 11: Os desafios dos processos de mudança na escola Unidade 12: A percepção da escola da participação dos pais Unidade 13: Preparação profissional para as vivências comunitárias Unidade 14: A participação da comunidade no planejamento das ações Unidade 6: Fatores para aumento dos processos participativos Unidade 7: Os projetos e as experiências curriculares e extracurriculares Unidade 8: Estratégias de Planejamento das ações Unidade 9: Parcerias da comunidade e sistemas de apoio Unidade 10: Organização dos tempos, espaços e práticas pedagógicas Fonte: Dados extraídos pelos pesquisador dos questionários, grupos focais e entrevistas. No processo de interação progressiva do pesquisador com os dados optou-se pela descrição inicial dos questionários (natureza quantitativa) e da sua correlação como os grupos focais e entrevistas (natureza qualitativa), estabelecendo as correlações necessárias à compreensão das práticas do PPP e maior participação da comunidade. 97 3.2 Aproximando da experiência em construção: análise das categorias dos questionários, grupos focais e entrevistas Categoria 1: Participação da comunidade na gestão do Projeto Político-Pedagógico da escola Unidade 1: Percepção da comunidade sobre a participação nas práticas do PPP Ao tratar das concepções e práticas de gestão no Capítulo 2, situou-se que a forma como os sujeitos concebem sua participação no PPP é fundamental para a construção de uma consciência coletiva e fortalecimento de um projeto societário de educação em que as práticas inovadoras estejam correlacionadas à maior participação e interesse comunitário. A participação coletiva dos sujeitos é fundamental para assegurar uma base endógena de (re) construção, pautando-se por questões de interesse e necessidade da própria comunidade. Viu-se que a constituição autogeradora de um PPP está diretamente relacionada à forma de envolvimento dos sujeitos comunitários e ao reconhecimento do seu caráter dinâmico, dos valores e reciprocidade entre concepção e execução, teoria e prática. Enquanto processo, o envolvimento proativo dos sujeitos torna-se fundamental na construção de uma identidade e sentimento de pertencimentos relativos aos seus princípios e ações prioritárias na escola. Nesse sentido, a perspectiva societária de gestão ao ser vivenciada em seu sentido autogerador e em sinergia com os princípios democrático-participativos apresenta-se como mais adequada para compreender a existência do caráter autogerador dos sujeitos nas práticas do PPP em suas dimensões históricas e sociais. Esse caráter autogerador implica na valorização das dimensões societárias, no aperfeiçoamento das práticas de gestão, no qual as decisões tecnocráticas36 cedem espaço aos processos de participação comunitária, pressupondo o envolvimento coletivo dos sujeitos. Assim, em sua dimensão edificante, o PPP exige uma aproximação da escola com a sua comunidade e a constituição de processos de decisões horizontalizados.37 36 Relativas às decisões centralizadas, em que equipes técnicas de especialistas são responsáveis pela elaboração das propostas e difusão para que outros sujeitos executem. (HERNÁNDEZ et al, 2000; CARBONELL, 2002) 37 Processos de decisão que envolve a participação direta dos sujeitos nos debates, no compartilhamento do poder de decisão e no compromisso com os acordos coletivos.(LUCK, 2010) 98 É um processo que exige consciência dos sujeitos, da realidade, dos fatores que dificultam ou favorecem a expressão das potencialidades comunitárias, com clareza da realidade concreta, e das condições desejadas para vivência do PPP. Sem dúvida, as condições ideais perpassam pela capacidade de exercício das práticas pedagógicas e de gestão, de forma autêntica e legítima, tendo como horizonte uma educação pública de qualidade. Obviamente, o alcance das condições desejadas constitui-se em um horizonte a ser percorrido pelas práticas pedagógicas e de gestão38, envolve um movimento de aproximação sucessivo com a realidade que se deseja construir, acompanhando as próprias expectativas dos sujeitos pertencentes à comunidade escolar e educativa. São pelas condições operativas das práticas pedagógicas e de gestão que ocorrem as intervenções na realidade, isso é, a vivência concreta dos processos participativos e das relações pedagógicas, enquanto movimento de aproximação com o projeto de educação desejado. Quanto à participação da comunidade nas práticas do PPP para 92,86% dos professores, a participação da comunidade é suficiente, sendo que, para apenas 7,14%, é vista como insuficiente. Os dados, de maneira geral, sinalizam para uma concepção positiva dos docentes quanto à participação da comunidade. O GRAF. 1 ilustra os valores encontrados. GRÁFICO 1 - AVALIAÇÃO DOCENTE PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes 38 Essas condições constituem o marco operativo do PPP relativo à prática concreta no interior da escola em sinergia com um projeto de educação desejado. 99 Os dados discentes seguem essa mesma tendência de considerar suficiente os processos de participação da comunidade. O GRAF. 2 expressa que 97,49% julgam ser suficiente a participação da comunidade no PPP e apenas 2,51% dos respondentes considera ser a mesma insuficiente. GRÁFICO 2 - AVALIAÇÃO DISCENTE DA PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE ESCOLAR Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes A existência de valores percentuais superiores a 90%, apontados pelos docentes e discentes, sinalizam para a tendência de adesão comunitária, com envolvimento direto dos sujeitos nos processos participativos, onde as decisões e vivência do PPP expressam um processo colegiado e maior sinergia escola-comunidade. Ao considerar a suficiência da participação comunitária é provável que tenham como referência o PPP como processo de ação-reflexão-ação que congrega a participação permanente dos sujeitos, reconhecendo o seu caráter inconcluso na expressão do que se vive e pratica enquanto força propulsora dos processos autogeradores de mudança. De acordo com Veiga (2003), a ação autogeradora assume um caráter emancipatório e edificante, quando há envolvimento dos sujeitos na construção do PPP para melhoria da qualidade dos sistemas públicos de educação. Por outro lado, enquanto processo de ação-reflexão-ação os processos de mudança ao considerar os sujeitos e sua realidade histórico-social envolve o movimento dialógico entre processos instituídos e instituintes, de síntese de processos que podem ser apresentados de forma contraditória e/ou divergentes pelos sujeitos. Assim, enquanto os processos de 100 estabilidade estão voltados para a conservação, para manutenção de certas condicionantes e práticas instituídas; os de mudanças consistem num movimento de transformação, de diálogo com os campos instituintes. Esse diálogo entre campos instituídos e instituintes é fundamental para a existência de uma perspectiva dialógica dos processos de participação, assim como, para que haja aderência à realidade histórico social dos sujeitos. O fato de mais de 90% dos docentes e discentes considerarem a participação satisfatória pode indicar tanto a existência de um efetivo envolvimento da comunidade, de luta pelas mudanças e transformação da escola, quanto a ideia do alcance do limite desejado, cuja intenção é manter a estabilidade do conjunto de relações vigentes na escola. Um dos riscos da tendência de limite desejado é romper com a perspectiva inconclusa do PPP, que se move com as próprias expectativas históricas dos sujeitos, podendo desdobrar em acomodação e falsa impressão de excelência das suas práticas. Infere-se que os processos de participação nas práticas do PPP sustentam-se nesse diálogo entre os campos instituídos e instituintes, em que o primeiro estaria relacionado à realidade concreta e o segundo ao desejo, do vir a ser, da busca de condições ideais (GADOTTI, 2004). Em um PPP autogerador os processos de mudança se concretizam na participação da comunidade, implicando em desestabilizar relações instituídas para construir novas práticas e concepções, ou seja, um novo campo instituinte pelo engajamento dos seus sujeitos. Entende-se que é nesse diálogo entre os campos instituídos e instituintes que situa a função projetiva do PPP envolvendo a dinâmica histórico-social dos sujeitos, os cíclicos de estabilidade e mudanças quanto às suas concepções e práticas (MESSINA, 2001). Assim, é importante considerar que a percepção dos 7,14% dos docentes e os 2,51% dos discentes que consideram a prática de participação insuficiente seja relativa à existência de lacunas nos processos participativos da comunidade. Um ambiente gestionário democrático favorece que essas posições diferenciadas, ainda que da minoria, sejam manifestadas e que exista a interlocução necessária entre os referidos campos. A provável insatisfação desses sujeitos quanto aos processos de participação da comunidade aumenta a probabilidade de propor e se engajar em processos de mudança do PPP com maior aderência a realidade comunitária. Ao propor ideias divergentes ao status vigente (instituído), 101 tem atuação fundamental na dinâmica cíclica de ação-reflexão-ação do PPP. Obviamente, essas manifestações são mais producentes em ambientes democráticos, sustentada numa perspectiva societária de gestão balizada por princípios democrático-participativos. Por outro lado, um nível de suficiência nos processos de participação pode indicar maior autonomia dos sujeitos nas práticas de gestão e pedagógicas do PPP, permitindo maior compatibilização das estratégias de ação às demandas reais da comunidade escolar e educativa. Tais pressupostos são convergentes com uma escola pública em função da sociedade, sendo sua identidade reforçada, quando os seus resultados correspondem às expectativas comunitárias (NEVES, 2004). Quanto aos processos participativos propostos pelas escolas, a percepção discente é de suficiência (96, 42%) contra 3,58% que julgam serem os mesmos insuficientes; os processos de cooperação discente na resolução de atividades seguem a mesma tendência, sendo que 93,75% consideram suficientes e apenas 6,25% insuficientes; o incentivo e apoio da escola às atividades de participação coletiva é conceituado por 93,75% dos alunos como suficiente e 6,25% acreditam serem insuficientes; a existência de liberdade para expor ideias para melhoria do trabalho escolar é apontada como satisfatória por 100% dos discentes. Os dados relativos aos processos de participação discente, mencionados no parágrafo anterior, estão consolidados na TAB. 1, com os seus descritores e respectivos valores percentuais. TABELA 1 PERCEPÇÃO DISCENTE DAS PRÁTICAS PARTICIPATIVAS NA ESCOLA DESCRITORES PROCESSOS DE PERCEPÇÃO DISCENTE Suficiente Insuficiente Participação discente em atividades proposta pela escola 96,42 % 3,58 % Cooperação discente na resolução conjunta de atividades 93,75 % 6,25 % Incentivo e apoio da escola às atividades de participação coletiva 93,75 % 6,25 % Liberdade discente de expor ideias para melhoria do trabalho escolar 100 % 0% Fonte: Questionários aplicados aos discentes – 2012. 102 O reconhecimento por parte dos discentes da participação comunitária e a existência de valores e/ou princípios como a liberdade de expressão, cooperação e incentivo a organização coletiva dos sujeitos são importantes quando se propõe a substituir uma lógica de trabalho verticalizada, fragmentária e individual por uma dinâmica processual de envolvimento e autogestão dos sujeitos das suas práticas. Quanto à percepção docente das práticas participativas na escola obteve-se uma suficiência (100%) relativa ao envolvimento dos profissionais com o PPP, existência de um trabalho docente colaborativo nas práticas pedagógicas, participação coletiva nos conselhos de classe e apoio da direção ao trabalho docente. A TAB. 2 detalha os respectivos percentuais obtidos. TABELA 2 PERCEPÇÃO DOCENTE DAS PRÁTICAS PARTICIPATIVAS NA ESCOLA PROCESSOS DE PERCEPÇÃO DOCENTE Envolvimento dos profissionais com o PPP Prática pedagógica docente colaborativa Participação docente nos conselhos de classe Apoio da direção ao trabalho docente Fonte: Questionários aplicados aos docentes – 2012. DESCRITORES Suficiente Insuficiente 100 % 0 100 % 0 100 % 0 100 % 0 Os dados sinalizam com a percepção docente da existência de um compromisso dos profissionais, com reconhecimento das estratégias coletivas e colaborativas de trabalho, apontando para a existência de um nível de reciprocidade e envolvimento direto dos sujeitos no PPP, com possibilidades de construção de processos participativos engajados. Vale relembrar que a vivência da participação em seu sentido engajado, mais pleno, pressupõe participação interativa dos sujeitos em processos de tomada de decisão coletiva, estando consciente do seu papel, das possibilidades de apresentar ideias e opiniões em um espaço onde o poder de decisão seja compartilhado (LUCK, 2010). Enquanto forma de participação direta da comunidade, o engajamento demanda o reconhecimento dos sujeitos da realidade, dos limites e dificuldades comunitárias, bem como das possibilidades de potencializar ações coletivas transformadoras do PPP para uma maior participação da comunidade. 103 A existência de condições democráticas de participação comunitária nas escolas maximiza a vivência dos processos de engajamento dos seus sujeitos, pressupondo reconhecer e respeitar a diversidade de expectativas na vivência das práticas do PPP em suas dimensões históricosociais. A percepção dos sujeitos docentes da participação em condições colaborativas aponta para a substituição de uma lógica de trabalhos individual pela perspectiva colaborativa, com o poder compartilhado de decisão entre os sujeitos. São condições favoráveis à emergência do caráter autogerador, potencializando uma maior participação da comunidade na organização das intenções educacionais do PPP em sinergia com as dimensões operativas das práticas pedagógicas e de gestão. Vê-se que os docentes e discentes têm uma percepção positiva dos processos de participação comunitária como expressão do PPP. A percepção da suficiência dos processos são indícios de uma tendência autogeradora capaz de potencializar práticas inovativas para maior participação da comunidade, contrapondo ao caráter regulatório, limitado e fragmentário da constituição das propostas (VEIGA, 2003). A dimensão autogeradora pode ser vista como uma forma de superar a segmentação entre concepção (marco teórico) e execução (marco prático), num movimento de aproximação e construção de processos interativos em que ambos sejam indissociáveis. Enquanto proposta formal, o PPP consiste no campo instituído, sendo uma referência para o que se vive e pratica na escola. Por outro lado, é no espaço da prática concreta que novas demandas surgem, dialogando com novas perspectivas instituintes que retroalimenta o próprio campo instituído. Por outro lado, a tendência regulatória do PPP, na qual concepção e execução estão dissociadas, produz distorções na construção e vivência da proposta. Nessa perspectiva, o PPP constitui em mero documento para cumprimento formal da política pública (VEIGA, 2003). Esse caráter regulatório implica em um processo de construção e vivência restrita da comunidade, sendo sua elaboração delegada a equipes técnicas ou detentores de cargo de direção e/ou supervisão. Esse caráter tecnocrático rompe com os processos participativos de base comunitária, nos quais as decisões são coletivas e descentralizadas. Por outro lado, a percepção docente e discente dos processos participativos no interior da escola parece sinalizar com uma vivência edificante, autogerador de mudanças. 104 Quanto a frequência de participação docente em atividades pedagógicas de reflexão coletiva (reuniões, conselhos, encontros), obtiveram-se os seguintes dados: semanal (42,85%), mensal (57,14%), semestral (0%) e anual (0%). Os resultados apontam para uma prevalência dos processos mensais de participação coletiva, seguidos dos encontros semanais. Observe o GRAF. 3 a seguir: GRÁFICO 3 - FREQUÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DOCENTE EM ATIVIDADES PEDAGÓGICAS DE REFLEXÃO COLETIVA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes A existência de momentos coletivos entre os docentes para discutir questões relativas à gestão e às práticas pedagógicas em períodos mais contínuos, com menor intervalo de tempo, aponta para existência de processo de comunicação e compartilhamento de experiências coletivas dos sujeitos nas práticas do PPP. Em relação à frequência de participação discente em momentos de reflexão coletiva como trabalhos, exposições, teatro, coral, dentre outras, obtiveram-se os seguintes resultados percentuais: semanal (57,14%), mensal (30,95%), semestral (2,38%) e anual (9,52%). O GRAF. 4 ilustra os valores percentuais encontrados. 105 GRÁFICO 4 - FREQUÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DISCENTE EM ATIVIDADES DE REFLEXÃO COLETIVA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes Constata-se que enquanto para os docentes a frequência de participação em atividades de reflexão coletiva é mensal para os discentes são prevalecentes as atividades semanais. É provável que ao responder a questão os docentes associaram a participação coletiva à presença dos seus pares, ou seja, aos processos envolvendo outros docentes ( reuniões, cursos de formação em serviço, conselhos de classe, dentre outras). Se tivessem tomado como referência as práticas pedagógicas diárias, provavelmente, a resposta seguiria a tendência discente. Se as mudanças na escola dependem do que os professores fazem e pensam (FULLAN39 apud HERNÁNDEZ et al, 2000), as possibilidades de reflexão coletiva demanda serem pensadas nas relações pedagógicas, isso é, no fazer educativo envolvendo docentes e discentes. A perspectiva de reflexão coletiva semanal, levantada pelos discentes, mediatiza-se nessa relação. Relações pedagógicas sustentadas na reflexão coletiva apoiam-se no diálogo, nas diferentes perspectivas entre os sujeitos, podendo significar maior envolvimento e autonomia na vivência das práticas do PPP em seu sentido autogerador. São indícios das possibilidades de 39 Refere-se a obra: FULLAN, C. The meaning of educational change. New York: Teachers College Press, Columbia University, 1982. 106 uma prática reflexiva, em que as decisões tenham como fundamento a participação coletiva e o poder compartilhado de decisão. Quanto aos fatores que podem contribuir para uma maior participação discente obtiveram-se os seguintes resultados: respeito às decisões coletivas tomadas pela comunidade escolar (63,09%), equilíbrio da comunidade na construção das relações (7,14%), compromisso da comunidade escolar com a participação coletiva (13,09%), solidariedade e compromisso da comunidade escolar (14,28), outros (1,2%) e ausência de marcação (1,2%). Abaixo, o GRAF. 5 retrata os respectivos valores: GRÁFICO 5 - FATORES PARA UMA MAIOR PARTICIPAÇÃO DISCENTE Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes A percepção dos sujeitos do respeito às decisões tomadas coletivamente pode ser interpretada como um dos fundamentos da participação, dialogando com a perspectiva associa-se à vivência democrática do grupo com prevalência dos interesses coletivos em detrimento aos individuais. Assim, ao ser apontado pelos discentes o respeito às decisões tomadas coletivamente como fator para maior participação da comunidade, há uma sinalização dos sujeitos de que o significado dos processos de participação coletiva é materializado em espaços que respeitam as decisões do grupo na vivência do PPP. O direito de participar é fundamental, demandando condições democráticas, sendo que sua expressão consiste nas práticas de poder de decisão compartilhado. 107 Para além do envolvimento e compromisso dos sujeitos nos processos de participação comunitária, no sentido de contribuir com as reflexões e apresentar sugestões aos problemas enfrentados, é imprescindível que o poder de decisão compartilhado seja praticado. É o respeito às decisões do grupo que assegura a participação em seu sentido mais pleno, rompendo com práticas que servem apenas para referendar decisões tomadas previamente pela direção ou equipe técnica (LUCK, 2010). O respeito às decisões comunitárias, em especial aos processos que envolvem a participação dos alunos, consiste em uma condição aproximativa dos processos engajados de participação. É uma condição para que a cidadania, conceitualmente prevista na CF/1988; LDB 9394/96), dentre outros, realize-se na prática. É importante que os objetivos presentes no PPP dialoguem com essa perspectiva: a) Garantir significado social às ações e práticas pedagógicas, no contexto escolar. b) Elevar os padrões de qualidade da organização escolar e dos resultados de seu trabalho educacional. c) Envolver a família e a comunidade no processo político-pedagógico escolar. d) Promover o sentido de corresponsabilidade e compromisso coletivo dos participantes da escola por suas ações. e) Estabelecer maior integração entre currículo escolar/aprendizagem dos alunos e realidade. f) Criar ambiente formador de cidadania e aprendizagem de habilidades participativas. (LUCK, 2010. p.53). Assim, o respeito às decisões coletivas fortalece a comunidade escolar e a prática do PPP, enquanto núcleo articulador do trabalho pedagógico e dos processos de construção social e histórica dos sujeitos, tendo como objetivo a formação discente para a vida cidadã. É uma condição imprescindível para a vivência democrática e valorização das experiências dos sujeitos enquanto cidadãos comunitários. (FREIRE, 2004). Enquanto processo de construção coletiva, o PPP demanda capacidade de articular formas e espaços de participação direta dos alunos como sujeitos de uma prática concreta. É necessário exercitar sua construção coletiva, bem como a capacidade de aceitar as decisões conjuntas, ainda que possam existir divergências de alguns sujeitos. Assim, as decisões coletivas passam a ter um caráter público, prevalecendo sobre a lógica e interesses individuais de cada sujeito. Quanto à postura da escola relativa às sugestões que são apresentadas pelos discentes e docentes, obtiveram-se os seguintes resultados: debate das proposições, analisando as 108 possibilidades de vivência prática (54,76%); elogio à sugestão sem analisar as possibilidades de vivência prática (27,38%); desconsideração da sugestão, afirmando a impossibilidade de vivência prática (8,33); indiferença, sem tomar qualquer decisão (1,2%); atenção de todos à sugestão apresentada (1,2%); ausência de marcação da questão (1,2%). O GRAF. 6 retrata os valores: GRÁFICO 6 - PROCEDIMENTOS DA ESCOLA QUANTO ÀS SUGESTÕES DISCENTES Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes A existência de um espaço de reflexão, no qual as decisões tomadas pelo grupo são postas em prática é um indicativo de respeito às decisões tomadas coletivamente. A preocupação de vivência prática das decisões expressa a intenção dos sujeitos de que as mesmas sejam praticadas com referência no interesse coletivo. Aponta para a necessidade de uma coerência entre as decisões tomadas pelo grupo e a prática concreta. Enquanto procedimento permite que as sugestões dos alunos sejam valorizadas na melhoria das práticas do PPP. A valorização das ideias discentes nos processos de reflexão é fundamental para a criação das condições prévias de envolvimento desses sujeitos e o avanço da constituição de processos de participação engajada, superando processos circunscritos aos interesses de grupos ou como forma de referendar as políticas públicas (LUCK, 2010). Assim, tomar as sugestões discentes como objetos de reflexão coletiva perpassa pelo reconhecimento desses sujeitos e de suas 109 possibilidades de contribuir com as práticas do PPP, por meio do exercício das vivências comunitárias. A existência de espaços dialógicos no interior da escola aponta para processos mais consistentes de participação da comunidade e maiores possibilidades de existência do caráter autogerador do PPP, potencializado pela participação dos sujeitos nas diferentes vivências estabelecidas no ambiente escolar. Quanto a postura discente nos trabalhos de participação coletiva, são destacados os resultados, a saber: sentir responsável pelo debate e colaborar com as decisões tomadas (58,33%); observar os debates e evitar dizer a opinião ao grupo (17,85%); dizer a opinião pessoal, mas não se sentir responsável pelos trabalhos em equipe (17,85); não se sentir responsável pelo debate e decisões tomadas (3,59%); ausência de marcação da questão (2,38%). O GRAF. 7 permite visualizar os valores percentuais encontrados. GRÁFICO 7 - POSTURA PARTICIPAÇÃO COLETIVA DISCENTE NAS ATIVIDADES DE Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes Ao predominar, na questão, a postura de sentir-se responsável pelo debate, colaborando com as decisões tomadas, constata-se que essa tendência, descrita pelos discentes, é coerente com os processos participativos engajados (LUCK, 2010). Destaca-se que esses processos são producentes com o caráter autogerador do PPP para maior participação da comunidade escolar. 110 Assim, ao se sentirem responsáveis pela participação, os discente assumem o compromisso de participar dos debates, de propor soluções, de refletir sobre novas ideias e de assumir responsabilidades, quanto aos acordos referendados coletivamente. Reconhece ainda o diálogo como fundamento das vivências democráticas, em que as decisões são processuais, com prevalência do poder compartilhado. Em relação à forma de participação docente na reflexão-ação do projeto político-pedagógico da escola, constata-se que prevalece o envolvimento ativo nos debates como possibilidade de reflexão e reorganização dos processos (82,14%) em detrimento do envolvimento nos debates, evitando expor suas próprias ideias (10,71%); a participação verbal e ativa, mas sem senso de responsabilidade pelas decisões tomadas (7,14%); e o sentimento de indiferença, quanto às proposições apresentadas (0%). Os valores são registrados no GRAF. 8, a seguir: GRÁFICO 8 - POSTURA DOCENTE NOS PROCESSOS DE REFLEXÃOAÇÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes A participação dos docentes nos processos de reflexão coletiva segue a tendência anteriormente apontada pelos discentes das intenções de vivência do PPP em seu sentido 111 autogerador, assim como, de um vínculo e compromisso dos sujeitos com dada realidade histórico-social. A percepção docente e discente de envolvimento dos sujeitos nos processos participativos aponta para as inovações como uma energia rearticuladora das relações, com conexão com a realidade histórico-social e diálogo entre os diferentes saberes. Para Veiga (2003), o reconhecimento dos sujeitos envolvidos é a base dos processos participativos e emergência do caráter emancipatório do PPP. Sendo docentes e discentes sujeitos pertencentes à comunidade escolar, requer que suas ações sejam aderentes ao PPP em seu sentido emancipatório e/ou edificante de vivência. Se a cooperação, por exemplo, é um valor inerente aos processos participativos, requer reciprocidade entre as pretensões e práticas docentes/discentes. Nesse caso, pode ser evidenciada na busca de soluções conjuntas aos problemas da escola, nas ações compartilhadas para o alcance de objetivos comuns, no desenvolvimento de atividades coletivas em sala de aula, na própria disposição de envolvimento coletivo dos alunos e profissionais da escola. Assim, estaria associada à vivência de experiências e poder de decisão compartilhado, sendo uma estratégia de enfrentamento dos processos unilaterais com poder de decisão verticalizado40. Enquanto forma de participação direta da comunidade, o engajamento demanda o reconhecimento dos sujeitos da realidade, dos limites e dificuldades comunitárias, bem como das possibilidades de potencializar ações coletivas de maior participação da comunidade na concepção e prática do PPP. Essa percepção discente de participação da comunidade nas práticas pedagógicas e gestão do PPP prevalece também no grupo focal docente41, tendo como principal enfoque a perspectiva da parceria escola-comunidade. A comunidade aqui é parceira da escola. Todas as ocasiões que a comunidade tem que estar na escola a comunidade comparece em massa, reuniões e todas as chamadas. Projeto dia das mães, pais, formatura de alunos, quadrilha, festa junina. 40 Conforme se abordou no Capítulo 2, a centralização de decisões e prescrição de modelos gestionários e propostas pedagógicas são tendências muito presentes na gestão escolar tanto burocrática como gerencial. 41 Grupo focal realizado com 10 docentes da escola pesquisada em 02/10/2012. 112 Todos os projetos a comunidade está ativa dentro da escola, é só receber o chamado que a comunidade é muito participativa (Participante 9).42 A ideia da parceria também está presente nas entrevistas realizadas com os supervisores e diretor: Nossa preocupação é buscar a parceria com a comunidade escolar de uma forma bem ampla. Primeiro trazer os pais para dentro da escola, buscar os alunos, buscar a relação entre o profissional da escola e a família desse aluno, fazer com que a escola se torne um espaço prazeroso e de referência para a comunidade escolar (Entrevistado 3 ).43 Vê-se que a tendência apontada pelos docentes e discentes (questionários e grupos focais) é convergente com os achados das entrevistas realizadas com os supervisores e diretores concernentes a participação comunitária. A ênfase principal é a parceria escola-comunidade como possibilidade de envolvimento da comunidade e fortalecimento dos processos democrático-participativos de gestão. Constata-se que a parceria escola-comunidade é uma das principais estratégias de envolvimento dos sujeitos apoiando na interlocução dos profissionais da escola com a comunidade. Essas intenções são manifestadas tanto no diálogo e envolvimento coletivo dos sujeitos quanto na modificação dos espaços escolares para acolhimento da comunidade44. Por outro lado, observa-se que a ênfase dada ao sentido de participação são as atividades extracurriculares onde a comunidade (país, vizinhança, representes de entidades, dente outros etc.) é convidada a assistir as apresentações de culminância da programação cultural da escola. De acordo com Luck (2010) a presença física da comunidade nas atividades extracurriculares, ainda que seja importante, demanda avançar para processos que tenham como centralidade o desenvolvimento do PPP pelo compartilhamento do poder de decisão. A parceria estaria relacionada ao envolvimento comunitário nas atividades extracurriculares promovidas pela escola, possuindo seus limites quanto ao diálogo com os processos de participação engajada. Há, no cenário da escola pesquisada, uma centralidade nos processos 42 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 44 A intenção de modificação dos espaços para acolhimento da comunidade são manifestados em cartazes e faixas de acolhimento da comunidade quanto na sensibilidade, principalmente da direção da escola, de ouvir e articular estratégias de apoio à mesma. 43 113 participativos ao nível da presença física da comunidade (pais, vizinhos, comerciantes, líder de bairro, dentre outros) na programação sociocultural da escola. Ainda, no sentido da parceria escola-comunidade, destacam-se como proposições do grupo de reflexão docente: “É verdade, eleições de colegiado. Eventos quando têm em parceria com o SESC eles vão” (Participante 4)45; “Além das atividades externas que também acontecem e eles participam. Por exemplo, 7 de setembro eles acompanham os alunos.” (Participante 2)46. Reafirma-se a ideia da participação comunitária em atividades extracurriculares, estando relacionada à organização dos alunos durante o evento, assim como, contribuir com a segurança dos discentes no decorrer da realização da programação. Ainda que não seja qualificado o nível de envolvimento é mencionada pelos sujeitos à participação da comunidade nas eleições do colegiado47. Situou-se, no Capítulo 2, que o colegiado escolar consiste numa participação representativa dos interesses comunitários, evitando que suas ações sejam acoplados pela lógica de referendo das políticas públicas estaduais. Alertou-se para a importância e, ao mesmo tempo, para os limites dessa forma de participação e da necessidade de avançar para processos diretos que contemplem o caráter autogerador do PPP nas dimensões societárias de gestão. Em relação ao grupo focal discente48 aparece a participação da comunidade no colegiado, nas festas, formaturas e quadrilhas da escola: “Às vezes a comunidade participa. Os vizinhos vieram na quadrilha da escola.” (Participante 15)49; “na quadrilha nós dançamos, os pais e professores estavam presentes.” (Participante 12)50. Assim, a perspectiva levantada pelos discentes converge para a participação da comunidade nas atividades extracurriculares, associando participação à presença física dos sujeitos. A ideia de participação da comunidade no PPP da escola confirma as evidências da primeira etapa51 na qual os participantes afirmaram que a comunidade participa da gestão do PPP. Pelos dados dos grupos focais e entrevistas, de natureza qualitativa, evidencia-se contudo que 45 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 47 De acordo com o Art. 6º da Resolução SEE/MG n.º 2034 os membros do colegiado escolar são escolhidos pelos pares da comunidade, mediante eleição, para exercer mandato de dois anos. 48 Grupo focal realizado com 11 discentes da escola pesquisada em 04/10/2012. 49 Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012. 50 Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012. 51 Relativa à aplicação de questionários aos 28 docentes e 84 discentes participantes da pesquisa. 46 114 essa participação é guiada pela presença física da comunidade na escola. Ainda que seja mencionada a participação representativa (colegiado escolar) e participação direta dos pais em reuniões, a concepção prevalecente é a presença física da comunidade em atividades extracurriculares como possibilidade de maior sinergia escola-comunidade nas práticas do PPP. Por outro lado, a direção da escola sinaliza com as possibilidades de aprofundamento dos processos participativos ao afirmar que a escola é receptiva e há liberdade dos pais de apresentar sugestões para melhoria do trabalho: “a comunidade tem muita tranquilidade de vir a escola, de colocar os problemas, de dar sugestões na gestão da escola, de conversar com os professores.” (Entrevistado 3).52 Ainda, em relação à participação dos pais, a supervisão da escola expressa: “A participação é muito boa, os pais são presentes [...] estão dentro da escola, ajudando, participam do clube de mães fazendo crochê, costura na escola. Eles estão sempre aqui acompanhando os filhos no passeio, estão sempre ajudando na escola com os trabalhos comunitários que realizamos.” (Entrevistado 1).53 Mesmo existindo espaço para os pais, enquanto parte da comunidade escolar para apresentar sugestões e/ou participar das atividades socioculturais, percebe-se que persiste a ideia da participação associada ao envolvimento na culminância da programação sociocultural, sem papel proativo nas etapas de concepção e planejamento das ações e projetos articulados com o PPP, principalmente nas questões relativas à prática pedagógica. Por outro lado, nota-se que a escola procura estimular a participação da comunidade em atividades do seu interesse, principalmente os trabalhos manuais que valorizam habilidades artísticas e a troca de experiências entre os seus membros. Essas atividades acontecem principalmente nos finais de semana, corroborando com a perspectiva apontada no grupo focal docente de abertura da escola para participação da comunidade. Os pais e os demais segmentos da escola participam ativamente de todos os movimentos que acontecem, sejam à noite ou diurno e eu me emociono muito [...] é um escola de periferia em que a gente conta com a participação, eu venho de outras 52 53 Diretora da escola pesquisa participante da entrevista em 30/10/2012. Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 115 escolas também em que a participação dos pais era muito pequena e na [...] a participação é muito grande (Entrevistado 4). Reitera-se a ideia de que a participação da comunidade é sustentada pelo envolvimento nas atividades extracurriculares (programação sociocultural), situando-se ao nível da presença física. Isso expressa lacunas nos processos participativos do PPP, nas etapas de concepção e planejamento das atividades, principalmente naquelas de caráter pedagógico. Essa participação estaria mais em nível de envolvimento da comunidade em projetos e ações previamente definidas pelos profissionais da escola, do que em um processo que valorize o caráter autogerador dos sujeitos na construção das propostas. Há lacunas nos processos de construção das propostas em sua forma colegiada, nas quais sejam acolhidas e debatidas as sugestões com a participação da comunidade, apoiando-se no planejamento participativo das ações, no modo como se concebem as práticas e vivências da realidade. Assim, a perspectiva dos processos participativos engajados, com compartilhamento do poder e corresponsabilidade, não se apresenta de forma clara nos grupos focais e nas entrevistas, principalmente nos aspectos relativos às práticas pedagógicas. Quando questionada em relação à participação da comunidade no planejamento das práticas pedagógicas a supervisora da escola afirma que diretamente não, descrevendo: A gente faz as reuniões de módulo II e a comunidade participa quanto se faz necessário. Nos já tivemos assim a montagem de oficinas na escola, oficinas de reciclagem, oficinas de meio ambiente, nas quais a família vem mesmo para mostrar que é capaz de participar. Trazem os filhos, igual já fizemos campanha do meio ambiente, oficinas de reciclagem, eles trazem material para mostrar, para ajudar a fazer com os filhos. Ajuda quando acontecem as oficinas, acompanhando os filhos e de acordo com o evento fica às vezes o dia todo na escola (Entrevistado 1).54 A ausência de participação da comunidade no planejamento das atividades curriculares e extracurriculares reforça a perspectiva de segmentação entre concepção e execução, corroborando com a perspectiva do convite à participação da comunidade enquanto expectadora da culminância da programação sociocultural da escola. Apoiando em Thuler (2001), vê-se que esse é um dos desafios das práticas pedagógicas e de gestão para maior sinergia da escola com a sua comunidade. A modificação na forma como é programada e concebida a participação da comunidade nas atividades curriculares e 54 Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 116 extracurriculares passa a ser fator decisivo para sua maior sinergia com o PPP. É fundamental existir um processo sistemático e intencional de mudança que sustente a participação da comunidade na concepção, planejamento e execução das ações. Por outro lado, a ideia de parceria implica em certo grau de sinergia e mutualidade entre os envolvidos, tanto na tomada de decisões, quanto no planejamento das atividades e/ou ações que serão realizadas, demandando estratégias colaborativas para o alcance de objetivos comuns. Sustentando em Gohn (2004; 2007), vê-se que essas parcerias consistem numa ampliação das relações da escola e do próprio sentido de comunidade, do seu limite de ação, dialogando com instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa, podendo ser apontada como uma das principais estratégias inovativas das práticas gestão do PPP. São essas experiências em construção, especialmente com outras instituições públicas e da sociedade civil organizada, um dos fatores de maior proeminência da relação escolacomunidade, possibilitando aos alunos vivenciarem atividades curriculares e extracurriculares ampliadas. Esse diálogo com o universo da comunidade educativa, enquanto fator de maior participação da comunidade estaria relacionado às sinergias com o SESC, com os Correios, com a Universidade Federal do Vales do Mucuri e Jequitinhonha – UFVJM, promotoria, dentre outras. 55 55 SESC – Serviço Social do Comércio – Unidade Teófilo Otoni. com a 117 Unidade 2: Os profissionais da escola, processos decisórios e o PPP Quanto à participação dos profissionais a ênfase dada foi ao envolvimento coletivo, com divisão de funções no interior da escola e corresponsabilidade dos sujeitos na realização de um projeto comum: “Aqui todo mundo pega junto quando tem qualquer projeto na escola. Há uma integração muito grande, um ajuda o outro. Acho que é por isso que as coisas aqui na escola andam bem. Divide as tarefas e todo mundo faz satisfeito.” (Participante 6)56 O desenvolvimento de ações orientadas por um projeto sinaliza com o envolvimento dos profissionais em ações intencionais e sistemáticas, orientadas pelo alcance de objetivos pedagógicos e institucionais comuns a escola. A predisposição profissional em trilhar objetivos comuns, aderentes a missão escolar, pode converter-se num processo dialógico que valoriza os sujeitos e sua comunidade, podendo produzir mudanças autogeradoras do PPP. Se orientada por uma perspectiva de participação engajada, onde efetivamente os sujeitos participam da construção e decisão das propostas, o compartilhamento das funções e responsabilidades pode ser entendido com uma dimensão societária de gestão democráticoparticipativa. Quanto aos supervisores, enquanto profissionais da escola, seu envolvimento relaciona-se ao acompanhamento e apoio às questões pedagógicas da escola: “orientar, acompanhar, subsidiar o professor em toda parte pedagógica da escola.” (Entrevistado 4)57 Já, para o diretor, o envolvimento com o PPP perpassa por uma complexidade de funções, dialogando com questões pedagógicas e administrativas “durante o dia você é administrador pedagógico, administrador financeiro e administrador da área dos recursos humanos, administra a secretaria, a parte de pessoal da escola, é uma rotina bem complexa, em que, a todo tempo, você exerce em diferentes tarefas” (Entrevistado 3).58 Esse envolvimento do diretor e dos supervisores é fundamental para subsidiar as ações que são desenvolvidas na escola pelos demais profissionais na vivência das práticas e concretude das intencionalidades do PPP, tendo como horizonte a melhoria da qualidade do ensino. 56 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012 58 Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012 57 118 Exige-se desses sujeitos certo nível de liderança e sensibilidade em ouvir o grupo numa perspectiva de valorização das dimensões societárias de gestão do PPP. Vale ressaltar, por outro lado, que há uma linha muito tênue entre a perspectiva tecnicista e o projeto democrático-participativo, quando se analisa a liderança exercida por esses profissionais na trajetória escolar brasileira. Ainda que as escolas intitulem-se como democráticas, a figura do supervisor, por exemplo, durante anos, esteve associada ao profissional detentor de conhecimentos especializados capaz de determinar metodologias e práticas adequadas a professores e alunos. Assim, como a do diretor, relacionada ao poder de decisão, determinando ações a serem cumpridas pelos demais profissionais. Esse modelo tecnicista, baseado em um processo unilateral de decisão, produziu lacunas no conjunto das relações profissionais, especialmente no diálogo entre professores e alunos, configurando o que Freire (2004) denominou de Educação Bancária. Nessa perspectiva, diretor e supervisores, seriam os responsáveis diretos pela constituição do PPP que é previamente elaborado e difundido aos demais profissionais, assumindo uma lógica inovativa regulatória. Na perspectiva democrático-participativa o exercício da liderança por esses sujeitos pode contribuir com a vivência das participações colegiadas e descentralização do poder de decisão. É uma tendência edificante, autogeradora, onde supervisores e diretor são responsáveis pelo debate e estímulo ao pensamento reflexivo do grupo, na construção e vivência de uma proposta fundamentada no poder de decisão compartilhado. Assim, enquanto a primeira tendência estaria para os processos de inovação denominados de regulatórios ou técnicos; a segunda estaria para as condições edificantes ou emancipatórios, valorizando as vivências societárias dos sujeitos, assim como, a produção de mudanças aderentes às suas expectativas histórico-sociais (VEIGA, 2003). A forma como a entrevistada 1 expressa o exercício da sua atividade profissional reforça a intenção desses sujeitos de filiar-se com a primeira tendência: “o trabalho como supervisora [...] é um trabalho participativo, com participação de todos os professores, da diretora. A 119 diretora é uma pessoa que dá toda assistência, são poucas as dificuldades diante da participação de todos (Entrevistado 1).59 Há uma interlocução direta entre os profissionais, sustentada na ideia do envolvimento dos sujeitos nos processos de organização institucional e pedagógica: “As decisões são coletivas, a gente está sempre apoiando, ouvindo e, através do diálogo dessas reuniões, a gente busca esse equilíbrio de preparar a cada dia mais, de fazer uma escola de excelência ou tentar errar menos.” (Entrevistado 3)60; “A participação é coletiva, as decisões são tomadas de forma democrática, priorizando o que é mais importante para a escola e com isso eu posso observar que há uma participação de todos no PPP” (Entrevistada 1).61 Infere-se ainda, que os profissionais da escola participam do PPP, existindo um compartilhamento das ações para o alcance de objetivos comuns: “A participação dos profissionais é muito boa. Ao final de cada projeto, cada avaliação, a gente pode dizer que é uma equipe muito boa e muito responsável” (Entrevistado 3)62. Ainda, segundo a mesma, há uma atuação profissional para além do nível das obrigações (assiduidade, pontualidade, planejamento, dentre outros) cujo nível de dedicação e motivação permite qualificar o grupo como muito bom. Percebe-se que esse envolvimento dos profissionais contribui para que a escola desenvolva uma programação sociocultural diversificada e amplie o seu espaço de interlocução com segmentos da comunidade educativa, assim como, articule estratégias de apoio aos escolares e seus familiares de acesso a direitos sociais fundamentais63. Esse envolvimento dos profissionais com a programação sociocultural da escola tem ampliando as suas sinergias com a comunidade educativa oportunizando aos alunos vivenciarem atividades que sejam referência para a vida cidadã. Domingo passado a gente teve a rua de lazer. Tínhamos feito a proposta no domingo, porque no sábado havia o passeio com o grupo de adolescente no SESC. Então imagina: segunda, terça, quarta, quinta sexta, sábado e domingo, com 59 Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 61 Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 62 Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 63 Situamos no Capítulo 4 o papel de apoio das escolas às famílias cadastradas no Programa Habitacional do Município, com destinação de residências do Conjunto Habitacional Paulo Freire. 60 120 atividades. Então, pensei como eu vou pedir para esse pessoal voltar aqui no domingo. Eu não vou ter cara e nem coragem. Então, procurei o grupo de jovens, o grupo de coral, as catequistas e disse: Olha vai ter a rua de lazer, vamos precisar da ajuda de vocês. Mas, pensei assim, vou passar um bilhete na escola, vai que alguém deseja vir. Para minha supressa tinha muitos funcionários da escola no domingo, eu olhava para cada um e não sabia o que dizer, só fiquei muito feliz de saber que a gente tem uma equipe muito boa e que tá entendendo a proposta [...]” (Entrevistado 3).64 Esse envolvimento dos profissionais é um dos aspectos que favorece a emergência de processos propositivos de mudanças do PPP em suas dimensões autogeradoras. É necessário, no entanto, que sua participação traduza-se em aprofundamento do projeto democráticoparticipativo, com o envolvimento direto da comunidade nas práticas do PPP, valorizando as dimensões societárias em sua constituição. Quanto às relações estabelecidas entre o diretor (a) e os supervisores prevalece as dimensões societárias, orientando-se pelo diálogo: “a direção dá todo o apoio para o supervisor trabalhar, caminha junto com a supervisão, então deixa que o trabalho seja conjunto. É possível dialogar, tomar decisões juntas, fazer o planejamento junto com a direção” (Entrevistado 4).65 Essa sinergia entre direção e supervisão pressupõe a coexistência dos processos de concepção e execução das respectivas atribuições funcionais, possibilitando aos sujeitos uma maior coerência na realização das ações. Unidade 3: Concepção dos sujeitos da sua vivência escolar A vivência dos sujeitos na escola é expressa pelos sentimentos de alegria, prazer, amor e acolhimento, apontando para a existência de uma sinergia positiva entre a escola e os alunos que contribui para o fortalecimento dos processos participativos. São favoráveis ao reconhecimento da escola como espaço de convivência coletiva das múltiplas relações (educacional, social, política, cultural, dentre outras), existindo um significado concreto das práticas do PPP para os alunos. Em termos percentuais os valores são expressos da seguinte forma: 76,19 % concebem a escola como um espaço de alegria e prazer; para 1,56%, de decepção; e para 22,61%, um local de amor e acolhimento. A prevalência desses sentimentos expressa uma valorização, por 64 65 Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012. 121 parte desses sujeitos, do que se vive e prática na escola enquanto espaço de convivência pedagógica e sociocultural. O GRAF. 9 ilustra os valores encontrados: GRÁFICO 9 - SENTIMENTO DISCENTE RELATIVO À ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes Os achados quantitativos sinalizam com um vínculo dos discentes com a escola, sendo uma condição favorável para a construção de processos de participação com maior efetividade discente. São sentimentos que permitem uma maior aderência da comunidade escolar e vivência do PPP como instrumento de ação-reflexão-ação na produção de processos inovativos. Por outro lado, o aprofundamento qualitativo expressa condições endógenas dos sujeitos que podem ser mobilizadas na produção de práticas inovativas, principalmente nas atividades curriculares e extracurriculares: “a escola ensina para a gente muitas coisas e eu aprendo.” (Participante 18)66; “[...] a gente aprende e tem amigos, nos ensina coisas legais, professores e diretora legal” (Participante 12).67 São indícios da potencialização e reconhecimento histórico-social dos discentes como sujeitos comunitários, de envolvimento direto no conjunto das práticas do PPP. Há por parte desses sujeitos uma representação positiva da escola e dos seus profissionais, vista como espaço de vivência e aprendizagem cognitiva e social. Os sentimentos expressos 66 67 Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012. Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012. 122 de alegria e prazer favorecem os processos participativos e envolvimento nas atividades curriculares e extracurriculares, sendo favoráveis à concretude de um projeto de formação cidadã68. A participação dos sujeitos discentes nas práticas pedagógicas envolve um planejamento com definição pela equipe pedagógica da programação diária. “A gente chega e vai para a sala onde faz atividades de matemática e português, depois o recreio, aí volta para a sala e às vezes tem aula de computação, vídeos, Educação Física” (Participante 15).69; “A gente toda segunda e sexta feira tem auditório70, tia dá os avisos dela, depois a gente vai para sala fazer os deveres” (Participante 12).71 As falas remetem a uma compreensão discente da sistemática de funcionamento da escola, dos seus espaços e possibilidades efetivas de trabalho. Essa compreensão é facilitada pela existência de uma organização sistemática das rotinas pela equipe pedagógica. Porém, nas descrições não se percebe o grau de participação e efetivo envolvimento dos sujeitos nas práticas pedagógicas e processos de gestão. Um dos aspectos que orienta as práticas pedagógicas e de gestão da escola é o acolhimento de todos os alunos independente de desvio social72 ou condutas típicas73, procurando assegurar a permanência no percurso escolar. O trabalho é baseado no atendimento às necessidades individuais e coletivas, com a criação de serviços de atendimento especializados e tendo como fundamento uma pedagogia diferenciada. Vamos até a criança vê uma maneira de tá envolvendo ela com o aprendizado, de maneira diferenciada para que ela possa aprender, porque nem todos são iguais. [...] tem trabalho diferenciado na sala de aula [...] eu costumo até pegar uma criança para aprender e colocar junto, agrupar para ver se ele desenvolve. De repente ele não da conta de pegar o que eu estou passando mas, na hora que eu coloco junto, consegue (Participante 7). 68 A formação dos alunos para uma formação cidadã é um dos aspectos com maior ênfase no PPP da escola. Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012. 70 O auditório é um grande salão com palco, utilizado na escola para avisos gerais e orientações dos discentes da programação e rotina da escola. É ainda, utilizado na culminância dos projetos pedagógicas da escola que envolve apresentações, no desenvolvimento da programação artística da escola (teatro, dança, etc). Também as reuniões com membros da comunidade (escolar e educativa) são realizadas nesse espaço. . 71 Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012. 72 Refere-se aos alunos com problemas no comportamento social, com dificuldades de assimilar regras de convivência, sendo indisciplinados, agressivos. 73 Alunos que apresentam algum tipo de necessidade especial e que requer serviço especializado (professor de apoio, sala de recursos, dentre outros). Há, na escola pesquisada, alguns desses serviços como: professor de apoio, sala de recurso e intérprete de libras. 69 123 O trabalho coletivo baseia-se nas experiências dos sujeitos coletivos, tendo como estratégias as atividades de apresentação, os trabalhos em grupo, as exposições e momentos de reflexão coletivos. Em algumas salas de aula, é afixado o plano de trabalho 74, envolvendo professor (es) e aluno(s). Quanto à individualidade, é assegurada por trabalhos compatíveis com as necessidades individuais, pelo reconhecimento das diferenças e limites individuais dos alunos. A perspectiva de trabalho inclusivo75 favorece valorizar os sujeitos em sua diversidade e criar um ambiente social de diálogo com as dimensões sociais, estando para além do alcance de determinadas habilidades necessárias à aquisição de competências cognitivas. As dimensões sociais dos discentes ao serem valorizadas chama atenção para as dimensões humanas da vida cidadã. Vê-se que a escola procura estabelecer estratégias de trabalho coletivo na intenção de contribuir com a aprendizagem dos alunos. Esses processos de convivência coletiva, quando fortalecidos no ambiente escolar, podem contribuir tanto para a aprendizagem dos alunos, quanto com sua maior participação na escola. Em relação às práticas pedagógicas, relativas aos processos de ensino-aprendizagem, as reflexões no grupo discente apontam para uma centralidade na abordagem dos conteúdos curriculares, dando ênfase ao pensamento lógico-racional: “português e matemática todos os dias” (Participante 16)76. A ênfase é a aprendizagem de conhecimentos lógico-racionais em detrimento a outros conhecimentos e dimensões da vida humana.77 Partindo do pressuposto de que o PPP da escola sustenta a perspectiva de inclusão, a ênfase dada pela abordagem curricular aos processos de inteligência lógico-racional consiste numa vivência incoerente com as intenções da proposta. Em termos de inclusão, a perspectiva de valorização das inteligências múltiplas dos sujeitos apresenta-se como mais adequada. Assim, 74 Combinado de regras, envolvendo professor e aluno, em que são definidos direitos e deveres dos sujeitos. A escola recebe alunos com necessidades especiais e com desvios de comportamentos sociais. Para o alunos com necessidades educacionais especiais a escola mantém serviços especializados: professor de apoio e sala de recursos. Quanto aos alunos com desvios de comportamento sociais, um dos principais suportes do trabalho é o acolhimento social dos alunos e o estímulo às experiências coletivas. 76 Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012. 77 Uma dos suporte à abordagem curricular inclusiva é a teoria das inteligências múltiplas fundamentada por Howard Gardner (1985). 75 124 há um descompasso entre a perspectiva apontada pelos docentes e a abordagem dos conteúdos curriculares em sua prática efetiva. Apoiando na teoria da complexidade de Morin (2010), infere-se que uma estrutura curricular fragmentada em disciplinas e que prioriza a inteligência lógico-racional é insuficiente para a percepção das múltiplas relações que envolvem a escola-comunidade em suas dimensões sociais, culturais, afetivas, histórico e sociais. A fragmentação do currículo em disciplinas é típica dos modelos burocrático e gerencial que visam a estabelecer ênfases específicas78 e formas de controle especializado. Esse é um dos desafios a ser enfrentado pela escola, especialmente na compatibilização dos pressupostos de inclusão com as vivências curriculares do PPP, tendo, como pressuposto, o currículo como instrumento para concretude da proposta (MURTA, 2004). Os discentes consideram-se participativos e envolvidos com o PPP da escola. A percepção do grupo é de que o envolvimento nas atividades curriculares, especialmente naquelas desenvolvidas em sala de aula, assim como extracurriculares, consiste na expressão da participação em sua forma plena. Nesse caso, a participação traduz-se no envolvimento nas atividades que são propostas pela escola. “A gente participa falando sobre a matéria, conversando sobre a matéria que a gente não sabe. Aí a gente pergunta” (Participante 20).79 No grupo de reflexão discente, não se identifica a participação no sentido de compartilhamento do poder de decisão dos sujeitos, nem maior autonomia na definição de aspectos relativos às questões pedagógicas. Assim, o sentido de participar consiste no envolvimento estabelecido entre docentes e discentes na realização das atividades curriculares e extracurriculares que são definidas pela equipe pedagógica. A participação nas atividades curriculares é vista também como uma forma dos discentes colaborarem com os colegas e professores em sala de aula: “As atividades em grupo são importantes, porque às vezes o colega tem uma dúvida e a gente pode ajudar” (Participante 78 Um dos aspectos acordados pelo Brasil no Consenso de Washington foi a prioridade aos anos iniciais do ensino fundamental com ênfase nos processos de leitura e escrita. O controle especializado é feito pela submissão dos alunos a processos de avaliação externa do nível de proficiência. 79 Discente participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 04/10/2012. 125 21).80; “Acho as atividades coletivas muito legais. Quando o meu colega tem dificuldade eu ajudo ele, quando eu tenho dificuldade ele me ajuda. É muito legal” (Participantes 13).81 O sentido de participação estaria relacionado ao senso de colaboração com os demais colegas na resolução das atividades propostas. A percepção dos processos participativos em sua forma colaborativa é importante, mas exige-se avançar na constituição de processos mútuos orientados por objetivos comuns, nos quais o poder coletivo de decisão seja exercitado. Quanto aos docentes, nota-se que reconhecem a condição do aluno como sujeito dos processos participativos e sua capacidade de contribuir com as práticas pedagógicas e de gestão do PPP. Hoje em dia não pode ser mais aquele professor padrão. Como se diz: fala, fala, fala! Você fala, mas tem que escutar o seu aluno. Hoje mudou, o aluno tem que participar. Vamos montar um projeto, vamos fazer uma maquete, o alunado, todo mundo junto ali. Eles gostam de dar opinião. Às vezes nós, professores, temos uma opinião, mas o aluno tem uma opinião até melhor do que a gente. A gente aprende com eles. A gente monta os projetos e eles gostam (Participante 4).82 Situou-se, no Capítulo 2, que a valorização dos discentes como sujeito das práticas consiste numa forma de estimulo aos processos participativos e à vivência do PPP em seu caráter autogerador, enquanto condição de um projeto democrático-participativo de escola. Essa condição autogeradora do PPP demanda dos sujeitos exercitarem a autonomia e o caráter propositor de mudanças no ambiente de participação coletiva. Os discentes envolvem-se e participam das atividades curriculares e extracurriculares da escola, especialmente aquelas de caráter mais amplo, abertas à participação da comunidade escolar e educativa. Porém inexiste uma consciência efetiva dos mesmos, quanto às suas possibilidades concretas de contribuir nas decisões coletivas e planejamento das estratégias pedagógicas e de gestão do PPP. A construção das atividades e projetos não considera a condição fundamental dos discentes como sujeitos propositores de processos de mudanças das práticas do PPP. A expressão “a 80 Discente participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 04/10/2012. Discente participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 04/10/2012. 82 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 81 126 gente monta os projetos e eles gostam” (Participante 4).83 Aponta para um processo que segmenta concepção e execução, com planejamento centralizado na equipe pedagógica. Esse viés reproduz no interior da escola os processos verticalizados de inovações (HÉRNANDEZ et al, 2000), das propostas previamente elaboradas pelos docentes e apresentadas aos alunos, separando concepção e execução como processos distintos. Assim, desconsidera o caráter propositor dos discentes na reflexão e delineamento da concepção das propostas, desagregando concepção e execução, teoria e prática do PPP. O caráter autogerador implica no reconhecimento do aluno como sujeito nas etapas de planejamento e execução da proposta. Mesmo que esse processo de construção envolva os demais profissionais da escola, a ausência de participação direta dos discentes cria fissuras na vivência do PPP em suas dimensões societárias de gestão democrático-participativa. A existência de lacunas nos processos de participação discente, especialmente nas etapas de planejamento, explica o fato dos discentes afirmarem que apresentam sugestões de melhoria do trabalho escolar, mas não sabem relatar nenhuma proposição apresentada pelos mesmos para as práticas pedagógicas e/ou de gestão do PPP. A existência dessas condições, que reduz a autonomia dos sujeitos e o seu caráter propositivo de mudança, requer uma revisão no interior da escola. É um desafio a ser enfrentado na intenção de construir processos alicerçados em uma perspectiva de formação humana integrada: “A ideia de formação integrada sugere superar o ser humano dividido historicamente pela divisão social do trabalho entre a ação de executar e a ação de pensar, dirigir ou planejar” (BRASIL, 2012, p.59). Quanto aos processos de tomada de decisão na escola, os docentes apontam para as intenções colegiadas de construção dos processos decisórios com participação direta dos sujeitos. Diante das dificuldades de reunir os profissionais da escola, especialmente face aos limites impostos por uma jornada dupla de trabalho,84 uma das soluções encontradas pela escola para 83 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. A grande maioria dos professores trabalham em mais de uma escola, exercendo diariamente a dupla jornada de trabalho em duas escolas. 84 127 aperfeiçoamento dos processos de comunicação interna é a veiculação diária de um caderno com informações aos profissionais. Tudo que acontece aqui na escola é passado ou através de reunião ou através de um caderninho. Muitas vezes não há tempo propício para fazer uma reunião, mas tem como passar um aviso. Aí é colocado o aviso no caderno, todo mundo lê assina (Participante 9).85 Essa forma de comunicação interna, de utilização de um caderno, no qual são veiculadas informações gerais da escola aos profissionais, consiste num processo importante de retroalimentação dos sujeitos com a realidade dinâmica vivenciada no interior da escola. É uma forma de enfrentar os desafios de tempo dos profissionais pela vivência coletiva das práticas do PPP. Ainda que não possibilite a reflexão coletiva dos sujeitos, o fato de constituir-se em um processo sistemático e intencional de comunicação no interior da escola, numa forma de enfrentamento aos desafios da comunicação interna, esse caderno, pode ser visto como uma estratégia inovadora, consistindo numa alternativa de apoio ao trabalho escolar. No entanto, a veiculação das informações em um caderno, enquanto estratégia de apoio aos processos de comunicação na escola possui os seus limites e não pode ser vista como processo de substituição da participação direta dos sujeitos. O caráter autogerador das mudanças do PPP depende do fortalecimento da participação coletiva direta, da reflexão das práticas e do compartilhamento do poder de decisão para a formação de uma consciência dos sujeitos, quanto aos limites e possibilidades das práticas pedagógicas e de gestão. Por outro lado, as reflexões docentes apontam para a existência de um diálogo no interior da escola nas atividades que envolvem a participação coletiva dos sujeitos: “Há bastante diálogo entre os profissionais da escola. Em todos os setores: secretaria, direção, supervisão. Em qualquer setor um trabalha pelo outro mesmo” (Participante 2)86. A ideia é da existência de uma sinergia entre os profissionais da escola nas ações de envolvimento coletivo, estimulada por práticas pedagógicas e de gestão que favorecem a liberdade de expressão dos sujeitos. 85 86 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 128 A liberdade de expressão estaria apoiada na existência de condições democráticas que favorecem o debate e a expressão das diferentes posições dos sujeitos em ambientes de participação coletiva. Essas condições de diálogo são fundamentais para a manifestação das diferentes posições, enquanto motor dos processos de mudança e emergência de inovações, bem como para a produção de novas sínteses coletivas e a vivência de ciclos de estabilização fundados na coesão e visão integral das práticas do PPP. Essa perspectiva do diálogo entre os profissionais estaria apoiada no compromisso, enquanto valor que orienta os processos de participação coletiva dos sujeitos (LUCK, 2010). “Além do diálogo existe uma sintonia no trabalho. Todo mundo abraça a causa. Há um grande compromisso com a realização do projeto da escola” (Participante 2).87 Partindo do pressuposto de que um projeto de escola pressupõe instituir algo novo (GADOTTI, 2004), o compromisso seria um dos valores que orientam o PPP da escola, para que, de forma intencional e sistemática, sejam alcançados os objetivos pretendidos pela instituição em sua prática pedagógica e de gestão. Esse compromisso dos profissionais estaria em diálogo com a perspectiva de trabalho colaborativo, cuja intenção é alcançar objetivos comuns pretendidos pelos sujeitos coletivos nas práticas do PPP. A existência de processos articulados pelo compromisso de trabalho colaborativo dos profissionais estaria em reciprocidade com as demandas de expressão autogeradora do PPP, das condições societárias necessárias à maior participação dos profissionais e da comunidade em geral. Nesse sentido, o trabalho colaborativo apresenta-se como uma estratégia inovativa de enfrentamento do viés gestionário tradicional88 enquanto possibilidade para a vivência democrático-participativa das dimensões societárias, dos processos dialógicos apoiados no compromisso dos sujeitos enquanto possibilidade de vivência processual do PPP. Além de favorecer a articulação dos diferentes segmentos escolares em torno de um projeto comum, esse diálogo entre os profissionais contribui para o reconhecimento do aluno como 87 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. Situamos no capítulo 2 que o modelo de gestão tradicional é marcado pela fragmentação e organização burocrática das ações, prevalecendo o baixo nível de autonomia dos profissionais. 88 129 sujeito social em sua diversidade, permitindo constituir estratégia de acolhimento mais compatível com a sua situação de vulnerabilidade social.89 [...] são meninos que necessitam de um acolhimento maior da comunidade escolar. É uma clientela diferenciada [...], são crianças que têm dificuldade de moradia, de alimentação, de condução de ir e vir, relacionamento, afeto. São crianças filhos de pais que estão atrás de grades, outros são criados por avós, outras são filhos de pais que mexem com certas coisas aí erradas [...] (Participante 9).90 Esse acolhimento discente consiste numa predisposição dos profissionais em ouvir e procurar compreender os alunos, de estabelecer estratégias de orientação e aconselhamento quanto aos problemas sociais que são enfrentados pela comunidade. É visto ainda como um processo de relação afetiva entre professores e alunos: “uma palavra amiga, um gesto, um carinho [...]” (Participante 6).91 Essa sensibilidade dos profissionais em acolher os alunos em situação de vulnerabilidade social é acrescida do esforço de buscar instituições públicas e da sociedade civil que possam apoiar o processo de escolarização discente. Essas instituições, pertencentes ao universo da chamada comunidade educativa92, passam a se mobilizar e apoiar o trabalho desenvolvido pela escola. Quanto ao diálogo dos professores com os pais, constata-se que é centrado principalmente nas questões relativas às dificuldades de aprendizagem dos filhos ou nos problemas relacionados ao comportamento do(s) mesmo(s): “Se tiver algum aluno com dificuldade, eu procuro chamar o pai, converso com o pai, com a mãe, com quem tiver acompanhando” (Participante 3).93 89 Um dos aspectos enfatizados no grupo focal docente são as condições de vulnerabilidade social das crianças que são criadas pelos avós e/ou apenas pela mãe. Assim comum a violência imposta pelo tráfico de drogas na comunidade em que vivem. Reiteramos que, de acordo com o IDF (Índice de Desenvolvimento das Famílias), a presença de idosos, crianças e gestantes aumenta o volume de recursos adicionais que uma família requer para satisfazer suas necessidades básicas, sendo um indicador de vulnerabilidade social. São 300 famílias atendidas pela escola cadastradas em um programa de renda mínima (Bolsa-família). 90 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 91 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 92 Dentre as instituição que apoiam o trabalho da escola, são mencionados pelos docentes o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), Serviço Social do Comércio (SESC) e a Polícia Militar de Minas Gerais Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (PROERD). 93 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 130 A relação entre professores e pais ao centrar em questões relativas à aprendizagem e comportamento dos alunos segue a tendência que tradicionalmente tem orientado as escolas, sendo sua presença restrita à descrição de notas e comportamento dos filhos aos pais pelos professores. Assim, pouco se exploram os pais, enquanto sujeitos pertencentes ao universo comunitário, e as suas possibilidades de contribuir com a aproximação da escola-comunidade nas práticas do PPP. Por essa lógica, são poucos os avanços na constituição de uma maior articulação dos professores e pais na constituição de práticas que tenham como referência as dimensões políticas, históricas e sociais, dialogando com as possibilidades de construção de um processo de formação, ampliando a sinergia escola-comunidade. Se, por um lado, existe a sensibilidade dos profissionais, especialmente dos professores, de acolher e receber os alunos em situação de vulnerabilidade social; por outro, há dificuldades no tratamento dessas questões no âmbito das práticas pedagógicas, do movimento de aproximação da escola com a comunidade. As dimensões da realidade concreta, das situações reais vivenciadas pela comunidade são pouco exploradas como estratégias de ensino e de reflexão das múltiplas dimensões (sociais, políticas, culturais, entre outras). Assim, o conjunto das experiências vivenciadas em âmbito comunitário, que poderia ser associado à abordagem dos conteúdos curriculares como dimensões da vida cidadã94, fica adormecido. Se a cidadania pressupõe a participação dos sujeitos na vida social, com reconhecimento de direitos e deveres, a ausência de diálogo em tais aspectos compromete a formação cidadã dos discentes para a vida comunitária. Esse é um desafio que precisa ser enfrentado pela escola na constituição de práticas pedagógicas que dialoguem com saberes formais e não-formais95, voltando-se para questões curriculares que estejam em estreito diálogo com dimensões sociais, políticas e culturais. É necessário ir além das questões tradicionais dos conteúdos a serem ensinados (o que ensinar?) 94 Um das possibilidades consistiria na própria abordagem dos temas da vida cidadã prevista pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, como temas transversais: ética, saúde, pluralidade cultural, meio ambiente, trabalho e consumo, dentre outros. 95 Apoiando em (GOHN, 2006), pode-se dizer que os saberes formais estão relacionados à educação formal, desenvolvida nas escolas, com conteúdos previamente previstos; os não-formais à educação não-informal, apreendidos pelo compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e ações coletivos cotidianos. 131 e das metodologias de ensino (como ensinar?), assegurando um enfoque sociocrático nas dimensões da vida cidadã no universo comunitário (MURTA, 2004). Assim, o PPP, enquanto expressão da participação da comunidade nas práticas pedagógicas pressupõe ir além das questões de o que e como ensinar, dialogando com múltiplas dimensões (políticas, sociais, culturais, éticas, dentre outras) de uma realidade complexa e que envolve o esforço coletivo de aproximação dos sujeitos e suas experiências. O aprofundamento do diálogo nas práticas pedagógicas com questões dessa natureza é fundamental para uma aproximação com as dimensões societárias de gestão democráticoparticipativa. Requer, ainda, uma percepção dos profissionais de que a participação não é um processo dado naturalmente, envolve uma construção histórico-social das relações estabelecidas no seio da comunidade. Obviamente, a aproximação escola-comunidade nas práticas do PPP pode ser vista como uma experiência inovativa, na medida em que se apresenta como um processo intencional e sistemático de maior participação dessa comunidade. 132 Categoria 2: O PPP enquanto unidade de articulação escola-comunidade Unidade 4: Finalidades do PPP e organização das práticas pedagógicas e de gestão Para os docentes, a principal finalidade do PPP consiste na formação em serviço dos profissionais da escola (60,72%), aparecendo em menor proporção a formação humana da escola, dos seus profissionais e alunos (17,86%); a formação política e social (10,71%); a formação dos valores culturais da instituição (7,14%); a ausência de marcação (3,57%) e a formação de princípios orientadores da comunidade no desenvolvimento das práticas pedagógicas (0%). O GRAF. 10 descreve os valores obtidos. GRÁFICO 10 - FINALIDADES DO PROJETO POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes Ainda que a formação em serviço seja uma condição importante não pode constituir-se na principal finalidade do PPP. O mesmo deve orientar-se por dimensões político-sociais de consecução dos processos de aprendizagem e da vida social comunitária. Obviamente, a formação em serviço é uma condição importante para alcance de práticas educativas qualitativas de acesso as dimensões da vida social e aos processos de aprendizagem. Deve sustentar em uma dinâmica de preparação continuada e processual dos profissionais para enfrentamento dos desafios das práticas pedagógicas e de gestão. Para alcance das 133 condições desejadas é fundamental que essa perspectiva esteja em sintonia com as demandas e experiências dos sujeitos em seu espaço de vivência comunitária. A capacitação dos profissionais consiste em uma das metas previstas no PPP da escola: “promover encontros com o coletivo da escola para discussão e correção de rumos do plano de intervenção pedagógica.” (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓICO DA ESCOLA PESQUISADA, 2012. p.13). Há, no entanto, apenas incorporação das dimensões gerenciais do Estado que orientam as políticas públicas educacionais para resultados de proficiência, distanciando de dimensões histórico-sociais importantes para a compreensão da educação numa perspectiva comunitária. Se para os docentes96 uma das principais finalidades do PPP consiste na capacitação dos profissionais, na formação em serviço, para o diretor (a) e os supervisores, as questões humanísticas e pedagógicas são finalidades prevalecentes. O nosso desejo maior é o sucesso escolar do aluno e a permanência dele na escola, que ele se torne um cidadão feliz de bem, que seja responsável pela comunidade em que vive (Entrevistado 3).97 Uma escola que atende alunos em situação de risco social tem que pensar no pedagógico em uma base humanística [...] não é possível desvincular a parte pedagógica da humanística (Entrevistado 4).98 Ao apontar as finalidades humanísticas e pedagógicas expressam a preocupação de construir um percurso escolar, das práticas pedagógicas e de gestão, conectado com o reconhecimento dos alunos como sujeitos das práticas e das vivências comunitárias numa perspectiva cidadã. Por outro lado, as vivências das dimensões humanísticas e pedagógicas do PPP requer uma formação aderente aos valores humanos, em uma perspectiva continuada que acompanhe a dinâmica histórico-social dos sujeitos nas práticas do PPP. Assim, em sua prática concreta é fundamental ter como referência os valores humanos, a diversidade sociocultural, a ética das relações e o senso de responsabilidade social. As dimensões humanísticas e pedagógicas mencionadas pelos sujeitos, presentes nos esforços que são empreendidos em uma prática concreta, estão no PPP formalmente instituído pela 96 Conforme análise de dados do questionário docente. Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 98 Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012. 97 134 escola apoiadas no pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (LDB 9394/96). A referência para a formação em serviço são as finalidades humanísticas e pedagógicas enquanto categoria estruturante e mais producente com os processos autogeradores do PPP da escola. Isso requer uma sinergia da formação dos profissionais da escola com esses princípios estruturadores das práticas pedagógicas e de gestão. Nesse sentido, as estratégias de capacitação requer maior autonomia da comunidade nos processos de autogestão escolar. Os cursos devem contribuir com a formação de uma responsabilidade coletiva e auto-organização dos sujeitos para vivência coletiva (LIBÂNEO, 2008). Assim, uma maior compreensão dos profissionais da realidade local, da escola e da sua comunidade99 perpassa por processos de formação que considerem a própria realidade histórico-social da comunidade. Numa perspectiva autogeradora as estratégias de formação em serviço exige conhecer a comunidade escolar, seus saberes tácitos, suas potencialidades e dificuldades na construção de soluções endógenas às vivências do PPP. Estão para além da racionalidade técnica do aperfeiçoamento profissional, demandando estabelecer um diálogo com as experiências locais. Pressupõe fortalecer os circuitos dialógicos de comunicação entre os profissionais e sua comunidade, como forma de assegurar as sinergias necessárias entre a vivência do PPP (marco operativo) e as reais demandas comunitárias. Apoiado em Maciel (2001), dir-se-ia que é necessário o conhecimento das possibilidades de maximização dos arranjos institucionais e políticos das redes de relações simbólicas e sociais, presentes na articulação das dimensões autogeradoras do PPP para maior participação da comunidade. Por outro lado, a formação em serviço demanda coerência com as dimensões histórico-sociais da comunidade, compreendendo a realidade como um processo dinâmico, associado às 99 As experiências de Desenvolvimento Local apontam para a necessidade de participação da comunidade, especialmente da proatividade da sociedade civil em questões de interesse público, bem como, a necessidade de valorizar experiências e saberes tácitos dos sujeitos em sua base local (DOWBOR, 2006). 135 condições temporais e espaciais. Processos de formação dessa natureza são convergentes com uma formação humana integrada.100 Com os processos de aceleração capitalista101 vale destacar que as condições histórico-sociais dos sujeitos não estão conectadas apenas à realidade local, estando intrinsicamente interligadas as condições globais. Nessa dinâmica de sinergia entre local e global, uma perspectiva de formação humana integral pode contribuir com a compreensão das características próprias da comunidade, das suas dimensões histórico-sociais enquanto estratégia de enfrentamento das tendências de homogeneização difundidas globalmente. Enquanto principal finalidade do PPP, a formação em serviço é descrita pelos docentes como a realização de palestras, oficinas, reuniões e trabalhos coletivos. As principais temáticas tratadas são relativas às dificuldades de aprendizagem dos alunos, qualidade de vida dos profissionais, inclusão de alunos com necessidades especiais e desvio de comportamentos sociais. Assim, são trabalhados temas relativos às relações interpessoais, violência na escola (bullying), alfabetização dos alunos com dificuldades de aprendizagem, dentre outras. Para a direção as reuniões de planejamento e suas possibilidades de troca de experiências; as rodas de conversas e estudos102; as palestras em parceria com à sociedade civil (psicológicos, terapeutas, médicos, etc.), abordando temas relativos à melhoria da qualidade de vida dos profissionais; encontros com a promotoria, CREAS, CRAS, Conselho Tutelar para reflexão de situações conflituosas são as principais estratégias maximizadas em serviço na formação dos profissionais. Nessa mesma direção a supervisão aponta as ações e estratégias que são adotadas pela escola para capacitação dos seus profissionais: Uns 06 ou 08 profissionais fizeram o curso virtual de Educação Inclusiva, participamos das capacitações promovidas pela Superintendência [...] a escola conta com a participação de pessoas para dar palestras, nós tivemos palestras. Temos também as atividades que são desenvolvidas com os professores, trocas de experiências, o trabalho coletivo no interior da escola (Entrevistado 1).103 100 Neste estudo, entende-se por formação humana integrada um processo de superação histórica da divisão social do trabalho, da fragmentação das ações entre quem pensa e executa. (BRASIL, 2012) 101 O processo de aceleração capitalista está diretamente associado a globalização, ao modelo de acumulação flexível e à abertura econômica. 102 Segundo a direção, as rodas de conversa têm como fundamento análise de trechos das obras de Paulo Freire. 103 Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 136 Nas estratégias de capacitação dos profissionais são destacadas pelos docentes, supervisão e direção, as palestras e os cursos realizados. Dentre as ações, as rodas de conversas, citada pelo diretor, ao pressupor uma participação dos sujeitos de modo interativo apresentam-se com maior aderência às finalidades humanísticas e pedagógicas do PPP em seu sentido autogerador. Por outro lado, ainda que existam as rodas de conversas como forma de troca de experiências entre os profissionais e diálogo com a realidade concreta, não é perceptível processos de capacitação sistematizados para abordagens de temas específicos da comunidade, baseados na reflexão de experiências presentes na própria comunidade. A realização de cursos dessa natureza implicaria na participação conjunta de diferentes segmentos da comunidade (pais, alunos, professores, representantes da sociedade, vizinhança, dentre outros). Quanto as palestras e cursos são trabalhados pela própria escola em parceira com instituições ou pessoas pertencentes à comunidade escolar e/ou educativa, assim como, em ações de capacitação realizadas pela SRE104 de Teófilo Otoni. Ainda que as estratégias de formação promovidas pela SRE sejam baseadas na perspectiva difusionista105 não se identificou no grupo focal uma postura crítica dos docentes. Os mesmos consideram tanto as estratégias promovidas pela escola, quanto aquelas promovidas pela SRE, como oportunidades para repensar sua práxis educativa. Segundo o corpo docente há liberdade dos profissionais de sugerir propostas de temas a serem trabalhados na escola, quanto dos sujeitos de expor suas próprias ideias, assim como, manifestar o seu pensamento durante a realização das capacitações: “há uma capacitação que a superintendência promove duas a três vezes por ano. [...] Têm algumas oficina e a gente troca experiências e coloca nossas ideias” (Participante 9).106 104 A Superintendência Regional de Ensino de Teófilo Otoni é responsável pelo acompanhamento das escolas públicas, possuindo servidores da equipe pedagógica (inspetores e analistas) que fazem o acompanhamento das escolas. 105 A perspectiva difusionista consiste na base dos processos inovativos verticalizados, onde programas e projetos são elaborados e difundidos às escolas, sem o devido grau de sinergia e diálogo com a comunidade local na sua concepção e execução. 106 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 137 Ainda segundo os mesmos, as capacitações promovidas pela SRE há possibilidades dos sujeitos expressarem sua opinião, assim como, adequação das temáticas, conforme a sua realidade. Existiria, nesses cursos, um espaço de autonomia em consonância com o disposto a seguir: A autonomia da escola não deixa de ser autonomia por considerar a existência e importância das diretrizes básicas de um sistema nacional de educação (...) a autonomia da escola justifica-se no respeito à diversidade e à riqueza das culturas brasileiras, na superação das marcantes desigualdades locais e regionais e na abertura à participação (NEVES, 2004. p.99). Numa perspectiva de Estado Gerencial de gestão das políticas educacionais essa liberdade é relativa, considerando que uma modelo para resultados, centrado na proficiência dos alunos e em avaliações externas se impõe aos interesses autogeradores da própria comunidade. Vê-se, apoiando em Dourando (2007), que há dimensões sociais na educação que não são passíveis de serem mensuradas em avaliações externas. O grupo docente ao apontar que os cursos realizados pela SRE são importantes para o processo de formação profissional, relacionando ao alcance das metas esperadas,107 expressa os seus limites de compreensão do PPP em um sentido autogerador que compreenda a comunidade em suas dimensões societárias e autogeradora: “A gente vê que a escola está desenvolvendo. Você olha pelo rendimento escolar e desenvolvimento das crianças das metas que estão sendo alcançadas, todo ano consegue atingir” (Participante 4).108 Obviamente, essa visão é produto de uma perspectiva verticalizada de inovação109, apoiando em instrumento de marketing e controle da produtividade pedagógica dos docentes pelo Estado que se impõe a escola. Ao atribuir como principal significado para os processos de formação o alcance das metas que são pactuadas pelo Estado expressam uma redução do universo social do PPP a uma lógica instrumental, de caráter tecnicista, apoiada em um modelo gerencial centrado no adestramento (treinamento) de docentes e discentes para o alcance dos índices satisfatórios de 107 Em Minas Gerais, os resultados esperados são definidos pela pactuação de metas que é assinada pela direção da escola, comprometendo-se com determinados índices de proficiência. O termo situa-se como força de expressão, do que como uma realidade concreta de combinação dos acordos entre as partes, já que as metas são prescritas pelo Estado. 108 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 109 A expressão mais recente da penetração ideológica desse modelo consiste nos resultados de proficiência das escolas no Índice de Avaliação da Educação Básica – IDEB que são afixados nas escolas. 138 proficiência. Essa perspectiva não favorece a percepção das múltiplas dimensões (históricas, políticas, sociais e culturais) expressas no PPP de maior sinergia escola-comunidade. A questão central é que os modelos pré-formatados por equipes técnicas são pouco eficazes para a compreensão dos sujeitos e sua realidade comunitária (VEIGA, 2003). Assim, ainda que haja espaço para o exercício da autonomia escolar, o significado construído pelos sujeitos nos processos de formação possuem lacunas na compreensão das dimensões societárias do PPP, não sendo producentes com a maior sinergia escola-comunidade. É necessário que as propostas de formação em serviço, tanto em sua concepção quanto execução, dialoguem com as experiências comunitárias, assegurando aos sujeitos vivências de processos de formação aderentes as dimensões societárias e a emergência do caráter autogerador do PPP enquanto possibilidade para capturar as múltiplas dimensões societárias da comunidade. Assim, supõe extrapolar a lógica de instrumentalização de ações para o alcance de resultados de proficiência, da relação restrita dos cursos de capacitação desenvolvidos numa perspectiva gerencial da eficiência, eficácia e produtividade. Apoia-se no pressuposto de que os resultados educacionais são amplos, envolvem questões político-pedagógicas que não podem ser mensuradas em termos de proficiência (DOURADO, 2007). Acrescenta-se, ainda, que a perspectiva gerencial produz uma dissimulação do sentido da participação, subtraindo principalmente o poder de decisão dos sujeitos (ARAÚJO; CASTRO, 2001), sendo um limite à vivência da perspectiva societária de caráter democráticoparticipativo. Assim, numa perspectiva de maior vivência das dimensões societárias, a formação em serviço demanda construir formas de enfrentamentos dos sujeitos a essa perspectiva dissimulada. A construção de processos de formação em serviço, com envolvimento dos profissionais da escola e demais membros da comunidade é fundamental para a existência de uma convergência com o sentido autogerador do PPP, enquanto um processo de construção histórico-social, que materialize procedimentos de gestão e práticas pedagógicas compatíveis com as necessidades da comunidade. 139 Unidade 5: Relações de trabalho na escola Quanto às relações de trabalho na escola, os sujeitos apontam para um processo dialógico, aberto às sugestões dos profissionais da escola e da comunidade: “quando há alguma sugestão a escola analisa para ver se é viável para o coletivo. A escola trabalha no coletivo, com a participação de todos. Às vezes é sugerido algo [...], então é feito o trabalho de análise, de pontuar se é uma coisa boa para todos” (Entrevistado 1).110 Ainda, nesse mesmo sentido, o entrevistado 4 destaca que, quando há alguma sugestão de qualquer pessoa da comunidade, como, por exemplo, um pai, a escola sempre analisa a sua viabilidade e possibilidades de vivência concreta, principalmente quando as sugestões são apresentadas pela comunidade. Há uma tendência de fortalecimento das relações democráticas, valorizando as dimensões societárias, sendo perceptível também na forma como a escola procura lidar com o conflito. São organizadas, segundo a direção, rodas de conversas entre professores, alunos e pais, para encontrar a melhor maneira de resolver os problemas. A supervisão escolar também sustenta que o diálogo consiste na principal estratégia para resolver as situações conflituosas na escola: Às vezes a gente depara com uma situação de conflito, vamos supor com um pai que chega nervoso em relação a uma determinada situação. A melhor maneira que a gente age aqui é com o diálogo, é conversando, é tentando explicar [...]. Escutar ambas as partes, tentar resolver aqui dentro do ambiente escolar sem precisar acionar outro órgão, sem precisar recorrer a outra situação. É assim também com os profissionais. O diálogo ainda é a melhor maneira de lidar com o conflito, tentar fazer com que ambas as partes entendam o acontecido, esclarecer e apurar aqui mesmo, dentro do ambiente escolar (Entrevistado 1).111 Ao prezar pela autonomia dos sujeitos na resolução dos problemas, a escola tem no diálogo e na participação coletiva da comunidade sua principal estratégia para a construção de ações comuns que orientam as práticas do PPP. Por outro lado, reconhece as dimensões históricosociais da comunidade e a capacidade proativa dos sujeitos de enfrentamento dos desafios concretos. 110 111 Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 140 O diálogo enquanto elemento articulador dos sujeitos e síncrono com o trabalho colaborativo para o alcance de objetivos comuns. Essa tendência é expressa nos questionários docentes, ao ter no trabalho coletivo e colaborativo, em diálogo com a experiência da comunidade, o princípio com maior presença na gestão do Projeto Político-Pedagógico da escola (39,29%). Em valores percentuais decrescentes aparece o respeito e valorização das potencialidades humanas em sua diversidade comunitária (28,57%), planejamento coletivo e decisão compartilhada entre a comunidade interna (17,86%) e resolução dos problemas com participação direta da comunidade (14,29%). O GRAF. 11 ilustra os percentuais a seguir: GRÁFICO 11 - PRINCÍPIO COM MAIOR PRESENÇA NA GESTÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes Na perspectiva colaborativa as relações de trabalho apoiam-se no desenvolvimento de um trabalho conjunto, baseado na igualdade e ajuda mútua para o alcance de objetivos comuns (BOAVIDA; PONTE, 2002). Os docentes, ao indicar o trabalho colaborativo, em diálogo com as experiências da comunidade, sinalizam com a substituição de uma lógica de organização individual e fragmentária por um processo cooperativo, interativo e processual de gestão do PPP. 141 Por outro lado, a construção de uma lógica processual e interativa de gestão implica em fortalecer o compartilhamento de experiências entre os sujeitos e a visão problematizadora da realidade comunitária, num movimento de ação-reflexão-ação de reconfiguração das práticas gestionárias e pedagógicas em seu sentido emancipatório e/ou edificante. Ao estabelecer o trabalho colaborativo como uma estratégia concreta para vivência do PPP os sujeitos se filiam a um caminho processual, intencional e sistemático de vivência dos processos inovativos em dimensões democrático-participativas, apoiando no poder coletivo de decisão dos sujeitos. Tais aspectos são coerentes com uma prática em reciprocidade com a função projetiva do PPP em sintonia com as dimensões histórico-sociais dos sujeitos envolvidos. É no diálogo entre a realidade concreta e o que se pretende alcançar, mediado pela vivência das dimensões pedagógicas, que se maximiza o potencial autogerador do PPP. Assim, a lógica de trabalho colaborativo apresenta-se como uma estratégia importante de superação dos processos segmentados de mudança, especialmente da cisão entre concepção e execução, sinalizando com as possibilidades de maximizar do potencial autogerador do PPP. Traduz-se num esforço coletivo de aproximação da realidade concreta e do que se deseja construir, associada às possibilidades de transformação da escola pelas ações mútuas dos sujeitos. É nesse sentido que a busca conjunta e cooperativa de soluções para os problemas enfrentados é apontada pelos docentes como a principal estratégia (50%) para construção da identidade do PPP. Em menores valores percentuais são vistos a comunicação direta com democratização das informações aos profissionais da escola (21,43%), o respeito às decisões tomadas coletivamente pelo grupo e o compromisso dos membros com os processos participativos (14,29%) . O GRAF. 12 ilustra os percentuais encontrados: 142 GRÁFICO 12 - FATORES QUE CONTRIBUEM COM A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DO PROJETO POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes O nível de identidade dos sujeitos com os princípios do PPP expressa o grau de envolvimento nos processos participativos, já que a identificação com uma prática ou processo é fator fundamental para o envolvimento dos sujeitos. Percebe-se que a participação nas práticas do PPP estaria relacionada à forma como os sujeitos concebem e vivenciam a proposta, construindo sua identidade no espaço de participação coletiva. Assim, os fatores de identidade do PPP estão relacionados com o maior aprofundamento dos processos participativos, permitindo criar maior sinergia da escola-comunidade com seus princípios e valores. Para Neves (2004), quando os resultados escolares atendem às expectativas das famílias e da comunidade, a identidade e o papel social da escola são fortalecidos. Se a busca por soluções conjuntas e cooperativas para os problemas enfrentados pela escola é apontada pelos docentes como principal estratégia de construção da identidade do PPP observa-se uma convergência com as ideias da participação e envolvimento coletivo dos profissionais presentes no grupo focal docente e nas entrevistas realizadas com o diretor e superiores. Isso reforça a perspectiva da existência de uma nível de interação e vivência de dimensões societárias do PPP pela comunidade. 143 Pressupõe a existência de um espaço aberto à manifestação e sistematização das concepções educacionais, bem como, de compreender sua sinergia com a realidade. Assim, a cooperação pode ser vista como uma estratégia para superação de processos de decisão centralizados e orientados por interesses individuais, apoiando-se na proatividade e interatividade dos sujeitos na gestão do PPP. Em sua base estão os processos associados de participação como contraponto as estratégias de mudança prescritas112, individuais e exógenas aos sujeitos comunitários. Enquanto ação realizada pelos pares, com a intenção de alcançar objetivos comuns, a cooperação apresenta-se como uma possibilidade de fortalecimento do grupo para enfrentamento dos desafios da realidade, especialmente dos processos inovativos prescritos que concebem o PPP como uma racionalidade técnica. Assim, a experiência autogeradora do PPP pressupõe ruptura com os processos de natureza prescritiva, dos modelos burocráticos e/ou gerenciais de gestão. Sua base de sustentação são as dimensões societárias do projeto democrático-participativo e as possibilidades de aprofundamento da gestão social enquanto processo de envolvimento proativo de sujeitos da escola e da sociedade civil em questões públicas de melhoria da qualidade educacional. Esse caráter autogerador depende de uma estrutura organizacional que dialogue com espaços de vivência colegiada e cooperativa das experiências comunitárias. Assim, a capacidade da comunidade escolar de articular processos de enfrentamento dos problemas da sua realidade é favorecida por um ambiente cooperativo e participativo de vivência do PPP. Por outro lado, o diálogo com as experiências comunitárias colaborativas exige um maior grau de interação entre os diferentes saberes, especialmente dos escolares com as experiências concretas dos sujeitos em seu ambiente comunitário. É importante reconhecer e mobilizar essa base de conhecimentos endógenos para o desenvolvimento do PPP, potencializando as vivências das experiências comunitárias pelos sujeitos. 42 De acordo com Hernández et al (2000) a tendência é de um menor envolvimento dos sujeitos nos processos inovativos prescritos, sendo mais suscetíveis ao fracasso. 144 Observa-se ainda, que a vivência da programação cultural permite aos profissionais compartilhar experiências e desenvolver estratégias de trabalho conjuntas, expressas principalmente na participação coletiva de professores e alunos nas apresentações dos trabalhos, corroborando com uma perspectiva de trabalho colaborativo nas práticas do PPP para alcance de objetivos comuns (BOAVIDA; PONTE, 2002). A perspectiva de que a escola e os profissionais colaboram entre si para alcançar os objetivos comuns previstos nas práticas do PPP pode ser vista com uma condição para a emergência de pressuposto de gestão social: “a gente sempre fala com o colega assim: aqui você não está só. Você tem o seu colega de cada lado e se você olhar para frente e para trás você vai ver muitas outras pessoas dispostas a ajudar” (Entrevistado 3).113 Quanto às atividades de trabalho, as iniciativas adotadas pela direção são de envolvimento de todos os segmentos da escola (professor, supervisor, secretário, auxiliares da educação básica, dentre outros) na vivência da programação cultural. Quando eu falo profissional não é somente o professor. É toda a equipe, envolve também os ASB e ATB114, todos participam da programação cultural. De manhã três participam, à tarde mais três. Se vamos fazer um passeio, toda equipe de profissionais e representada nesse passeio. Se o passeio dessa semana é só o grupo de adolescentes do 5º ano, por exemplo, vão professores, equipe da área administrativa, ASB, ATB, para todos entenderem como funciona a escola (Entrevistado 3). Esse envolvimento coletivo dos profissionais na programação cultural da escola, além de possibilitar a construção de um significado coletivo das atividades para a instituição permite o desenvolvimento de ações articuladas e conexas entre os segmentos escolares. Essa é uma tendência mais compatível com o viés societário de gestão e vivência autogeradoras dos sujeitos. Os projetos da escola constituem num dos pilares fundamentais da experiência de aproximação com a comunidade na vivência das práticas do PPP. Aponta-se que essa tendência inovativa situa-se principalmente na capacidade da escola de estabelecer um sistema de parcerias com a comunidade educativa, com diversificação das atividades que são oferecidas aos alunos. 113 Diretor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. A expressão ASB refere-se aos Auxiliares de Serviços da Educação Básica e ATB aos Assistentes Técnicos da Educação Básica. 114 145 Quanto aos projetos existentes na escola, a supervisão escolar destaca: Nós temos vários projetos, como o tempo integral, a sala de recurso, o projeto do SESC em parceria com a escola. O SESC traz atividades de artesanato, de pintura, de ruas de lazer para as crianças. É um projeto que está ajudando muito nessa participação, nessa integração aqui da escola. Temos também um projeto muito bacana que é o projeto dos correios, que é uma participação no natal das crianças [...] (Entrevistado 4).115 Esses projetos apresentam-se como uma condição para uma intervenção mais processual, com maior grau de interação escola-comunidade. É uma possibilidade de organização mais conexa dos processos de abordagem dos conteúdos, de dialogo das práticas pedagógicas com experiências comunitárias, presentes em instituições do universo da comunidade educativa. O projeto da escola com o SESC, por exemplo, proporciona a vivência de atividades importantes para aprendizagem e formação social discente, envolvendo atividades de manipulação e criação em sintonia com dimensões socioculturais da própria comunidade. Acrescenta-se que a organização dos conteúdos em projetos consiste numa possibilidade de estabelecer uma interlocução entre diferentes áreas de conhecimento e dialogo com experiências comunitárias, com participação de segmentos da sociedade civil. O projeto do coral116, por exemplo, consiste numa iniciativa voluntária da comunidade escolar atendendo aos alunos e ex-alunos, orientando-se por uma formação humana e social. Quanto aos projetos pedagógicos que são desenvolvidos pela escola desdobram numa programação cultural mensal aberta ao envolvimento e participação da comunidade escolar e educativa: Temos uma programação de elaborar os projetos junto com os professores de todas as datas comemorativa do mês. Cada professor trabalha em sua sala de aula com as atividades selecionadas, tem o último dia de cada mês que esses alunos vão para o pátio e apresentam as atividades relacionadas a essas datas. E temos o projeto meio ambiente, o projeto da água, todas essas outras datas que são trabalhadas durante o ano (Entrevistado 1).117 Essa aproximação estaria tanto nas possibilidades de assistir às apresentações dos alunos relativas à culminância das atividades, quanto na participação direta de representantes da 115 Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012. Na última parte desse capítulo, traremos especificamente as experiências que são desenvolvidas no coral na perspectiva do trabalho voluntário realizado pelo seu membro fundador e regente. 117 Supervisora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 116 146 comunidade educativa em algumas ações, especialmente em palestras e orientações à determinados temas. Assim, os projetos desenvolvidos pela escola, em especial àqueles que dialogam com a comunidade educativa, permitem articular uma programação sociocultural mais ampla com maiores possibilidades de envolvimento da comunidade nas práticas do PPP. Categoria 3: Ações desenvolvidas pela escola para maior participação da comunidade no Projeto Político-Pedagógico Unidade 6: Fatores para aumento dos processos participativos A solidariedade e o compromisso do grupo em buscar soluções concretas para os problemas enfrentados (53, 57 %) é apontado pelos docentes como principal fator para aumento dos processos participativos da comunidade. Em valores descrecentes situam-se o respeito às decisões coletiva tendo como fundamento o projeto educativo (32,14%); o compromisso das representações instituídas, retroalimentando os docentes quanto às decisões tomadas, encaminhamentos e suas possibilidades concretas ( 10,71%); o fortalecimento das relações éticas, fundadas nos valores da atuação profissional (3,57%). O GRÁF. 13 retrata os valores encontrados. GRÁFICO 13 - PRINCIPAL FATOR PARA AUMENTO DOS PROCESSOS PARTICIPATIVOS DOCENTES Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes 147 Se o trabalho colaborativo exige uma maior capacidade de compartilhamento e interação dos sujeitos (BOAVIDA; PONTE, 2002), a solidariedade e compromisso podem ser vistas como condições para expressão desse trabalho. Se o compromisso implica em participar das decisões coletivas, assumindo responsabilidades com a vivência e prática do PPP, a solidariedade tem como principal referência a sensibilidade dos sujeitos em relação ao outro, de compartilhar conhecimentos, experiências e atitudes. Em uma gestão societária dos processos escolares um dos principais impactos da solidariedade e compromisso dos sujeitos perpassa pela humanização dos procedimentos e práticas que visam contribuir com as condições de vivência cidadã da comunidade. Assim, se as interações estabelecidas na escola contribuem com a qualidade educacional, por outro, consiste nas próprias possibilidades de vivência cidadã. São valores que permitem aos sujeitos participarem de um projeto comum de educação, enquanto “grupo de pessoas que trabalham juntas, de forma colaborativa e solidária, visando à formação e aprendizagem dos alunos.” (LIBÂNEO, 2008. P.103). Assim, a indicação desses valores sinaliza a condição essencial de vivência coletiva do PPP em sua prática, em que os processos decisórios envolvem a conexão dos sujeitos com a realidade comunitária. Assim, compromisso e solidariedade associam-se às formas de organização das relações de trabalho, baseadas na descentralização do poder de decisão, no compartilhamento das experiências e na construção de processos de mudança endógenos que estejam sustentados nos saberes e práticas da comunidade. A solidariedade e compromisso são referência para a dimensão societária de gestão, implica numa lógica processual de reorganização da escola, em que os sujeitos tenham condições de decidir sobre estratégias e procedimentos de vivência do PPP sustentada na diversidade, independência, autonomia, contrato, transparência, negociação e cooperação, enquanto princípios básicos de uma gestão participativa (THULER, 2001). Essa solidariedade e compromisso estariam alicerçados na própria perspectiva de realização de um trabalho colaborativo para o alcance de objetivos comuns. Quanto à participação 148 discente, tendo como orientação estratégias de ação colaborativas O GRAF. 7 expressa os valores percentuais da auto-avaliação dos sujeitos. GRÁFICO 14 - AUTO-AVALIAÇÃO DISCENTE DA SUA COLABORAÇÃO COM A PROPOSTA DE TRABALHO DA ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes Observa-se que 93,23% autoavaliam-se como suficiente sua participação colaborativa com a proposta de trabalho da escola; 3,57% como insuficiente e 1,2% não responderam. O nível de colaboração com a proposta de trabalho da escola sugere o compartilhamento de objetivos comuns com a capacidade de contribuir com o conjunto das práticas vividas na escola, proporcionadas em especial pelo trabalho em equipe. Em relação a auto-avaliação docente da sua participação em colaboração com a construção/reconstrução do PPP, são obtidos os seguintes valores percentuais: 96,42% consideram sua participação suficiente; 3,58% de abstinência e 0% de insuficiência. No GRAF. 15 observa-se os referidos valores percentuais. 149 GRÁFICO 15 - AUTO-AVALIAÇÃO DOCENTE DA SUA PARTICIPAÇÃO NA CONSTRUÇÃO/RECONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes Vê-se que os valores docentes e discentes são expressivos quanto auto-avaliação dos sujeitos na participação concreta das práticas do PPP. Existe, em maior ou menor grau, um reconhecimento da sua condição de sujeito histórico-social, apto a contribuir com o desenvolvimento do PPP da escola. Subjacente à ideia de colaboração está, também, uma certa mutualidade na relação: todos têm algo a dar e algo a receber do trabalho conjunto. Se a relação é muito desequilibrada, havendo uns que dão muito e recebem pouco e vice-versa, é problemático atribuir a essa actividade um carácter de colaboração (BOAVIDA; PONTE, 2002, p.6). A auto-avaliação dos sujeitos de colaborares com o PPP da escola é uma condição favorável aos processos de participação coletiva, sinalizando com a percepção do grupo de objetivos compartilhados. Associa-se a uma perspectiva de educação libertadora (FREIRE, 2004), em que todos são sujeitos do diálogo e podem contribuir com o aperfeiçoamento dos processos e práticas educacionais. Essa perspectiva perpassa por uma ação articulada com os princípios democráticos, envolvendo o compartilhamento de ações e poder de decisão. Vincula-se as possibilidades de participação e decisão em caráter local, circunscritas ao ambiente de vivência dos sujeitos. É conveniente, no entanto, que se busque uma clareza dessas questões, em especial em tempos 150 de apropriação dissimulada do sistema neoliberal dos processos e mecanismos de gestão democrática. 118 Vê-se, por outro lado, mesmo identificando no interior da escola características de outros modelos gestionários119 uma preocupação da escola de aproximar da sua comunidade, apoiando-se na humanização das relações e no respeito aos alunos em sua diversidade. De acordo com os docentes, o respeito à comunidade cria um sentimento de confiança relativo ao trabalho escolar. A comunidade confia muito na escola. Você vê que muitas escolas fecham as portas, escolas até maiores, aqui não. Nunca se vê fundir turmas, a escola recebe crianças expulsas ou indicadas por juiz que chegam aqui é se adaptam. Às vezes, chegam e até ficam meio receosos mas, acabam se enturmando [...] Eles também têm abertura para chegar, para procurar, para elogiar, para reclamar, para exigir, para pedir (Participante 4).120 Em sentimento da confiança pode ser visto com uma das condições prévias para a existência das ações colaborativas e solidárias. Apoiando na Teoria da Complexidade (MORIN, 2010), dir-se-ia que a solidariedade e o trabalho colaborativo são formas de construção de um elo orgânico entre a escola e sua comunidade, enquanto condição para a existência do poder compartilhado de vivência comunitária do PPP. Assim, consiste em uma forma real de enfrentamento dos processos burocráticos e gerenciais, nos quais as decisões são centralizadas e/ou orientadas por princípios mercadológicos. Enquanto experiência concreta, sustentada nos valores humanísticos e pedagógicos que orientam o PPP da escola, vale mencionar o próprio envolvimento dos discentes no coral: “os alunos são muito unidos. É um pelo outro” (Entrevistado 2)121, enquanto relação mútua para o desenvolvimento de um projeto com objetivos comuns (BOAVIDA; PONTE, 2002). Por outro lado, os níveis de suficiência nos processos participativos podem significar tanto mudança quanto estabilidade (THULER, 2001). A mudança estaria associada ao sentimento de envolvimento e compromisso como os processos de transformação pelo poder de decisão 118 A esse respeito leia: DAGNINO, Evelina (2004) “¿Sociedade civil, participação e cidadania: de que estamos falando?”En Daniel Mato (coord.), Políticas de ciudadanía y sociedad civil en tiempos de globalización. Caracas: FACES, Universidad Central de Venezuela, pp. 95-110. 119 Ao tratar dos processos de formação em serviço, por exemplo, menciona-se a relação restrita entre qualificação e resultados de proficiência da perspectiva gerencial. 120 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 121 Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 151 colegiado, enquanto a estabilidade vincula-se a impressão de um suposto nível de excelência participativa e organização dos processos, onde os sujeitos eximem-se de novos esforços adicionais. Enquanto a mudança vivida em sua dimensão societária implica numa perspectiva de participação engajada, de envolvimento dinâmico com as propostas do PPP e compromisso com as práticas pedagógicas e de gestão, a estabilidade guia-se pela ideia de suficiência da participação, do alcance de um limite das dimensões histórico-sociais, convertendo em acomodação e manutenção de saberes e fazeres, eximindo-se dos novos desafios. Assim, o desenvolvimento institucional e pedagógico da escola passa pela tênue relação entre processos de estabilidade e mudança122, exigindo um nível de coordenação e equilíbrio dos sujeitos diante dessas questões. Um processo de mudança supõe ruptura com campos instituídos, desestabilizando relações e procedimentos, para a constituição de novos processos. Os sujeitos ao se auto-avaliarem como participativos sinalizam com a predisposição de lidar com as incertezas, reconhecendo na mudança as possibilidades de maior participação da sua comunidade. Por sua vez, os processos de mudança e estabilidade refletem o próprio caráter dinâmico do PPP, o diálogo entre os campos instituinte e instituindo, num processo de aproximação interativa com a concepção de sociedade e homem desejado. Situa-se que a abertura da escola ao diálogo com a comunidade é um dos aspectos que contribuem para a maior participação nas práticas do PPP e democratização das relações no interior da escola, fortalecendo os processos participativos e o respeito às decisões comunitárias. Assim, ainda que as diretrizes das políticas educacionais vigentes sejam baseadas numa perspectiva gerencial123, a escola procura vivenciar as práticas de gestão e pedagógicas do PPP em suas dimensões societárias. Há uma tendência de constituição de relações mútuas com a comunidade, tendo como suporte os princípios democrático-participativos. 122 Sustentando em Thuler (2001) descrevemos no capítulo 2 os desafios dos processos inovativos relativos a tênue relação entre mudança e estabilidade. 123 O enfoque nos resultados de proficiência dos alunos, avaliação individual de desempenho dos servidores e diretrizes são alguns dos vieses dessa política. 152 Essa tendência de mutualidade está presente no diálogo estabelecido com a chamada comunidade educativa, na ampliação das vivências oportunizadas pelos projetos no espaço comunitário. São possibilidades dos alunos vivenciarem experiências para além da sua própria realidade, construindo uma interlocução entre a realidade local como o contexto mais global, presente na comunidade educativa. A abertura da escola ao diálogo com o conjunto das instituições do universo da comunidade educativa permite o desenvolvimento de atividades curriculares e extracurriculares que possibilitam uma maior aproximação com a sua comunidade local. Essa sinergia está presente, por exemplo, nas atividades de lazer, saúde, oficinas, artesanato, jogos, dos quais a comunidade participa. A comunidade escolar também desenvolve ações de caráter social e cultural que contribuem para o diálogo com a comunidade educativa. O coral da escola, por exemplo, nasce como uma estratégia de atividade para participação dos alunos, mas, ao se apresentar em instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa, proporciona tanto entretenimento e cultura às pessoas pertencentes à instituição, como cria possibilidades de interlocução da escola com aquele universo. Quanto aos discentes, esse apoio estaria relacionado tanto ao trabalho pedagógico diferenciado, de reconhecer as necessidades de cada aluno, quanto à sensibilidade docente de conhecer os alunos e suas dificuldades: “Aqui tem situações que você tem que ser o psicólogo mesmo, a criança só consegue andar na aprendizagem quando você descobre o problema. Aí você da um carinho ele se apega bastante com a gente, uma palavra amiga” (Participante 6).124 Ainda, nessa mesma direção, a participante 7125 expressa: “Se você tá com um aluno que a mãe bate muito ou que não dá aquela atenção, então você trata aquela criança com carinho perto da mãe ou então pede a mãe ou pai com amor para cuidar dele [...].” Os trechos expressam uma preocupação dos docentes relativa à aprendizagem dos alunos e das questões sociais126, tanto no sentido de identificar problemas que interferem nas práticas 124 125 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 153 pedagógicas, quanto no estabelecimento de estratégias que contribuam com a integridade da criança. O diálogo é o principal caminho buscado pela escola, tanto no acolhimento da criança e seus familiares, quanto no estabelecimento de estratégias que contribuam com a solução do problema. Unidade 7: Os projetos e as experiências curriculares e extracurriculares. Se compromisso e solidariedade estão associados à maior participação da comunidade, na prática concreta uma das suas expressões consiste na mobilização dos sujeitos relativa a abertura dos espaços escolares para a participação da comunidade nos finais de semana. Enquanto estratégia que envolve a organização voluntária dos seus membros, exige compromisso e solidariedade dos sujeitos na organização de atividades que sejam expressão das demandas e/ou experiências da própria comunidade. A escola abre as portas para a participação da comunidade nos finais de semana. Final de semana aqui já teve encontro de casais, o coral ensaia, tem encontros da catequese. Se a comunidade precisa do espaço físico da escola para acontecer uma feijoada a escola tá de portas abertas. Teve, agora mesmo, aquele bingo que teve o almoço e que veio muita gente, que também era da igreja. Teve aqui o curso teológico, então assim tem vários projetos que traz a comunidade para a escola (Participante 9). As atividades desenvolvidas na escola nos finais de semana envolvem projetos e/ou atividades que tenham um significado importante para a comunidade na vivência de práticas de gestão social127, na construção de uma maior sinergia entre o seus membros. Essa participação coletiva, compromissada, solidária e orientada por objetivos comuns permite a comunidade construir uma identidade da escola como espaço de vivência social. Constata-se ainda, que as atividades que são propostas pela comunidade há uma participação dos seus membros nas etapas de concepção e execução. A abertura nos finais de semana para participação da comunidade é prevista no Projeto Político-Pedagógico da escola: 126 Numa perspectiva gerencial de gestão, os baixos índices de proficiência são atribuídos a problemas pontuais, circunscritos aos indivíduos (empenho, capacitação, entre outros), desconsiderando as questões sociais e suas interferências nas práticas educacionais. 127 Apoiado em Tenório (2006), pode ser entendida como um processo dialógico no qual a autoridade decisória é compartilhada entre os sujeitos da ação. 154 “A escola disponibiliza seu espaço para a comunidade, nos fins de semana, tornando-se centro cultural, onde são realizadas oficinas de teatro, canto coral, artesanato, com intuito de oferecer as crianças, adolescentes e jovens da comunidade alternativas de desenvolvimento cultural e que contribuam para mantê-los longe das ruas e dos riscos da marginalidade presente nas comunidades atendidas pela escola” (PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA PESQUISADA, 2012, p.30). Essas experiências de participação da comunidade nas escolas públicas nos finais de semana são apoiadas pela Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais - SEE/MG por meio do Programa Escola Viva – Comunidade Ativa nas escolas que estão situadas em regiões de vulnerabilidade social. Por outro lado, a inexistência de uma articulação mínima entre a escola-comunidade não tem permitido a apropriação desses espaços nos finais de semana e desenvolvimento de experiências significativas para os seus membros. Ressalta-se que a participação da comunidade na escola nos finais de semana antecede a própria criação do Programa Escola Viva – Comunidade Ativa existindo experiências anteriores de participação voluntária da comunidade na escola. O coral da escola, por exemplo, desde a década de 80 envolve a participação da comunidade. Quando cheguei à escola128 percebi tanta carência, preocupei de arranjar qualquer coisa para envolver aquelas crianças e vencer os comportamentos agressivos. Aí eu comecei a convidá-las para participar do coral. [...] Para fazer com que elas enxergassem um horizonte diferente de brigas, de palavrões, de xingamentos [...] (Entrevistado 2).129 O coral passa a ser uma estratégia de enfrentamento dos problemas relacionados aos desvios de comportamento sociais dos alunos constituindo-se em uma das principais inovações nas práticas do PPP que visa assegurar o acesso e permanência130 discentes na escola. Constituise numa expressão do caráter autogerador do PPP na busca de condições efetivas de melhoria da qualidade educacional. As temáticas tratadas no coral são relacionadas à aprendizagem de princípios e valores, assim como, das possibilidades de vivência cidadã: “o coral passa sempre uma mensagem de vida, 128 Em 22 de fevereiro de 1980 a entrevistada iniciou sua atividade docente na escola, criando em 1988 o coral, estando desde o início da sua criação em sua regência. Atualmente a professora é aposentada, dando continuidade às atividades como voluntária da escola. 129 Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 130 O acesso e permanência de todos na escola é uma dos princípios previstos na LDB 9394/96 como expressão de uma gestão democrática da escola. 155 de respeitar ao próximo e valorizar a si mesmo.” (Entrevistado 2)131. As dimensões pedagógicas são maximizadas principalmente pela análise crítica do contexto das letras das músicas e da sua compreensão sociopolítica e cultural numa perspectiva interdisciplinar.132 São trabalhados temas como a família, o comportamento, o crescimento, o desenvolvimento[...]. A parte cultural, eu também trabalho, história do Brasil, ciências, a geografia, tudo incluído nas músicas. As músicas que eu trabalho com eles são músicas selecionadas, da onde a gente pode tirar algum proveito daquela letra e daquela melodia (Entrevistado 2).133 As atividades desenvolvidas pelo coral, além de aumentar a sinergia escola-comunidade, permite os discentes exercer um papel proativo e de referência para sua comunidade escolar. Essa credibilidade na escola é aumentada na medida em que os resultados socioculturais são expressos em apresentações e/ou exposição que dialogam tanto com a comunidade escolar como educativa. A vivência dos discentes das atividades do coral permite conhecer outras instituições e realidades presentes na comunidade educativa: “O coral é muito bom, a gente canta nos lugares: na lajinha, na UNIPAC134, na praça, num monte de lugar. É muito bom. Nos ensaios a gente aprende a cantar músicas que não conhece. Os ensaios são todo sábado às 8 horas [...]” (Participante 12).135 A participação voluntária dos discentes no coral é uma forma de assegurar a vivência de atividades socioculturais como expressão do direito de cidadania. São possibilidades de uma formação humana integrada, com reconhecimento parte dos sujeitos das múltiplas dimensões (sociais, políticas, culturais, dentre outras) da vida cidadã. As ações desenvolvidas pelo coral favorecem a interlocução entre comunidade escolar e educativa e oportunizam vivenciar atividades ampliadas em sintonia com os temas da vida cidadã. É ainda, a tradução do PPP em sua prática concreta, enquanto processo intencional e 131 Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. A interdisciplinaridade pode se interpretada no contexto mencionado como uma abordagem conexa dos conteúdos pela atitude cooperativa dos sujeitos envolvidos. O PPP da escola, formalmente instituído, prevê a interdisciplinaridade dos conteúdos como forma de assegurar uma educação de qualidade. 133 Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 134 Refere-se à unidade da Faculdade Presidente Antônio Carlos de Teófilo Otoni. 135 Discente participante do grupo focal realizado na escola em 04/10/2012. 132 156 sistemático de vivência discente de possibilidades inovativas na estreita relação de aproximação da escola com a sua comunidade. As dimensões da vida cidadã estariam presentes principalmente na preocupação de tratar questões relativas à diversidade étnico-racial presentes na própria constituição histórico-social da comunidade. O envolvimento dos sujeitos no cenário de concepção e execução das propostas permite compreender melhor a sinergia dos processos participativos, das suas dimensões sociopolíticas. A gente trabalha uma coreografia com roupa adequada ao tema e a música da apresentação. Então dentro dessa música, dessa coreografia, eles contam pela expressão corporal a história. Os negros, por exemplo, quando a gente fala da senzala, da mãe preta, da negra menina África. Essa negra menina África vem sempre uma menina acorrentada, triste, no meio da música ela arrebenta as correntes, sorri, canta. Então transmite para o público que está assistindo o que a gente que contar, falar da história do Brasil através dessa música (Entrevistado 2).136 Uma das principais possibilidades de interlocução com a comunidade, de diálogo com as suas experiências são as questões relativas à vida cidadã tratadas no coral, centradas na compreensão da realidade e processos de construção da consciência coletiva dos sujeitos. A reciprocidade das temáticas tratadas com a questões da vida cidadã, a participação discente na concepção e execução das ações, o diálogo das apresentações com o universo da comunidade educativa é um condição coerente com uma formação integrada. É uma possibilidade de a escola contribuir com a superação do ser humano dividido historicamente pela ação de executar e a ação de pensar, dirigir ou planejar (BRASIL, 2012). Outro aspecto emergente, tanto no grupo docente quanto discente, são as atividades desenvolvidas pelo SESC para assegurar uma maior participação da comunidade na vivência do PPP. É relatada a existência de um trabalho em parceria da escola com o SESC, em que as atividades são destinadas para a comunidade cujas finalidades são pedagógicas, culturais, lazer e humanísticas. Essas atividades são desenvolvidas tanto na escola como em demais espaços públicos, inclusive com a utilização dos espaços da própria unidade do SESC Teófilo Otoni. 136 Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 157 Dentre as ações desenvolvidas na escola, é mencionada pelos discentes a participação em jogos pedagógicos, de mesa e atividades culturais, como: campeonatos de xadrez, construção de quebra-cabeça e brinquedos com materiais alternativos, atividades de artesanato, rua de lazer, dentre outras. Há ainda palestras que são destinadas para a comunidade (alunos, pais, professores, dentre outros), abordando temas relacionados à saúde e educação. As visitas dos alunos as instalações do SESC proporcionam a vivência de atividades de lazer, esporte e cultura. É mencionado, ainda, pelo participante 2137 que o SESC participa de apresentações conjuntas com a escola como, por exemplo, o desfile da independência. Além de despertar o interesse, o conjunto dessas atividades possui oum significado para a comunidade de acesso a determinados direitos, como o de acesso às atividades de lazer, que historicamente ficaram à sua margem da comunidade: “A comunidade vem toda para as ruas de lazer que são realizadas dentro da escola” (Participante 9). São atividades, às quais a comunidade tem pouco acesso, despertando o interesse da grande maioria em conhecer e participar. Foi mencionado, ainda, o projeto “Projeto Papai Noel”, realizado em parceria com os correios e a Rede de Farmácia Indiana. De acordo com os docentes, nas últimas semanas letivas, os professores trabalham com os alunos a carta como portador de texto, destacando suas funções no processo de comunicação. Ao término do desenvolvimento das atividades em sala de aula, os alunos são convidados a escrever uma carta para Papai Noel, pedindo o presente que desejam ganhar no natal. No projeto, os presentes são doados pela Rede de Farmácia Indiana e entregues na escola por funcionários dos correios: “todo ano tem esse projeto dos correios. Os alunos ficam muito entusiasmados e motivados a escrever as cartinhas. Os funcionários dos correios têm uma satisfação muito grande em entregar os presentes” (Participante 2).138 Vale ressaltar que há um diálogo, nesse projeto, entre as atividades curriculares e extracurriculares, na medida em que os conhecimentos trabalhados em sala de aula são pertinentes com a matriz de referência dos conteúdos para o ano de escolarização, envolvendo 137 138 Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012. Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012. 158 competências de leitura, escrita e comunicação, com desdobramento em uma ação extracurricular que envolve as instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa. Assim, o “Projeto Papai Noel” ilustra as possibilidades de um maior diálogo entre atividades curriculares e extracurriculares, enquanto prática concreta do PPP na aproximação com sua comunidade. Esse é um dos desafios a ser assumido pela escola de aproximação das práticas pedagógicas à realidade vivenciada, aumentando a sinergia escola-comunidade e, ao mesmo tempo, mantendo as funções específicas da escola de ensino numa perspectiva de formação humana integrada. Nessa interação da escola com a comunidade são mencionadas as atividades de visita a outras instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa para conhecer e/ou participar, como a feira de ciências promovida pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM, a participação em concursos na Câmara Municipal de Vereadores de Teófilo Otoni: “Tem o concurso que a gente vai todo ano na câmara, aquele de língua portuguesa, frases, poemas. Ano passado a escola ganhou 1º, 2º e 3º lugar” (Participante 4).139; “A participação da escola na feira de ciências da federal [...] Experiências interessantes que todo aluno parou para observar” (Participante 2).140 Vê-se que há uma postura sistemática da escola de visitar e/ou participar das atividades que são promovidas por instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa. Ao assumir os desafios de participar dessas atividades, a escola além de enriquecer sua programação sociocultural de vivência extracurricular, permite aos alunos compreender melhor a dinâmica societária local/global, dialogando com as possibilidades de uma formação humana integrada em um cenário de vivência cidadã. Dentre as principais atividades de vivência em âmbito da comunidade educativa, destaca-se a participação da escola em feiras, seminários, gincanas, concursos, dentre outros. Nas reflexões, os docentes destacaram os resultados positivos obtidos pela escola ao participar dessas atividades, mencionando o maior envolvimento dos alunos e os resultados obtidos nos 139 140 Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012. Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012. 159 concursos: “Esse ano mesmo uma aluna minha ganhou em primeiro lugar das escolas estaduais no concurso de redação do PROERD141. O ano passado também” (Participante 6).142 Essas atividades permitem tanto motivar os alunos a vivenciar formas de participação ampliada, como perceber um sentido mais concreto de vivência dos processos em reciprocidade com instituições pertencentes à chamada comunidade educativa. A existência de reciprocidade entre escola e comunidade educativa aumenta o compromisso dessas instituições com a própria escola. Na medida em que se apresenta como um processo intencional e sistemático, esse diálogo da escola com instituições da comunidade educativa pode ser visto como uma das principais estratégias inovadoras do PPP, de aproximação da escola com sua comunidade. É uma forma dos alunos terem acesso em um sentido mais ampliado à cultura e ao lazer como um direito de cidadania. Os projetos de ensino143enquanto abordagens conexas, realizados pela própria escola ou em parceria com a comunidade educativa, são importantes para a participação e estímulo à vivência coletiva dos alunos. De acordo com Hernández et al (1998), são formas de romper com os rígidos limites epistemológicos das disciplinas, uma possibilidade de aproximar os saberes escolares das experiências dos alunos. Enquanto principais inciativas em curso de articulação escola-comunidade nas práticas do PPP, os projetos requerem uma percepção comunitária das estratégias de (re)significação da vida escolar coletiva. Atendemos uma demanda muito sofrida que vive num conflito social, envolvendo drogas, violência doméstica, abusos contra criança. Deparamos com situações muito difíceis no nosso dia a dia e por isso procuramos conhecer as famílias. Fazemos visitas para conhecer a realidade, buscamos parcerias com ONGS, com o poder público, com a promotoria, com a saúde. Essa estrutura é para que as crianças, as famílias, os profissionais encontrem o apoio e principalmente as condições para 141 O PROERD é um Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência, desenvolvido pela Polícia Militar de Minas Gerais em parceria com as escolas públicas e privadas. Equipes de policiais, denominados de amigos da escola, desenvolvem ações (palestras, reuniões, oficinas) para os alunos e comunidade. 142 Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012. 143 Mencionamos no capítulo anterior que o projeto Zé do Livro e Recreio com Libras são inciativas da própria escola de construir processos mais conexos de ensino, dialogando com tempos e espaços mais ampliados de formação. 160 trabalhar de uma forma saudável e com mais compromisso com essa realidade e com a sociedade (Entrevistado 3).144 Há ainda os projetos circunscritos ao âmbito das diretrizes da política pública de educação que estão presentes na escola e são citados pelos docentes como forma de aumentar a sinergia com a comunidade. São mencionadas no grupo focal docente os projetos Incluir e Aluno de tempo integral145. O projeto incluir perpassa pelo acolhimento aos alunos com necessidades educativas especiais, garantindo a acessibilidade aos conteúdos curriculares por meio de serviços especializados. Para atendimento desses alunos, a escola possui professor de apoio em sala de aula, sala de recurso para aprendizagem da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS e professor intérprete de Libras. Um dos princípios que orienta a prática da escola é o envolvimento de todos os alunos nas atividades propostas independente da sua necessidade especial. Por exemplo, havendo um aluno surdo em uma determinada sala, a escola procura ensinar para os demais gestos básicos de comunicação em LIBRAS. Há, ainda, experiências mais amplas como as atividades do “recreio com LIBRAS”, no qual são montados no pátio da escola painéis com os sinais e os alunos desenvolvem experiências de comunicação entre si. As apresentações da programação cultural da escola também envolvem alunos com necessidades especiais na intenção de assegurar o acesso e o envolvimento desses alunos em todas as atividades que são oferecidas. O projeto Aluno de tempo integral funciona no contraturno do processo de escolarização regular dos alunos, sendo voltado para o atendimento dos alunos em situação de vulnerabilidade social e dificuldades de aprendizagem. O projeto segue as diretrizes de funcionamento do Estado, sendo desenvolvido na forma de oficinas pedagógicas. De acordo com os docentes, as oficinas procuram valorizar as habilidades dos alunos (teatro, dança, artesanato, jogos, dentre outras), a troca de experiências e o atendimento às dificuldades individuais dos alunos. 144 Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. Os Projetos Incluir e Aluno de Tempo Integral são programas do Estado, pertencentes ao universo das políticas públicas estaduais em atendimento a LDB 9394/96 e Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica. 145 161 Para o desenvolvimento dessas oficinas, os profissionais da escola apoiam-se na participação de instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa, sendo mencionadas as oficinas de jogos de xadrez e artesanato146 desenvolvidas em parceria com o SESC. Assim, esses projetos permitem aumentar a sinergia com a comunidade educativa que passa a contribuir diretamente com a vivência do PPP da escola. São descritos, ainda, os pequenos projetos realizados pelos professores na escola e em sala de aula: “Tem os projetinhos em sala de aula, tem o Zé do livro, o recreio com libras para socializar o conhecimento.” (Participante 7)147. São citados, pelos docentes e discentes, os passeios feitos com os alunos no trenzinho na semana da criança, as atividades envolvendo datas comemorativas especiais (dia dos pais, das mães, semana do trânsito, dentre outras) que contribuem para a aproximação da escola com a comunidade. O papel proativo dos profissionais da escola é fundamental, especialmente da direção escolar, tanto na liderança, quanto na motivação do grupo para vivenciar essas possibilidades do PPP aderentes à maior participação da comunidade. Pode-se considerar que esse fato está relacionado à abertura dos espaços escolares, à sensibilidade no apoio e no acolhimento da comunidade, desenvolvendo projetos pedagógicos e o diálogo com as instituições pertencentes ao universo da comunidade educativa. Um dos desafios constantes é fortalecer o equilíbrio entre processos de mudança e estabilidade, preservando os valores e princípios do PPP em suas dimensões democráticoparticipativas de vivência das relações societárias das práticas pedagógicas e de gestão; assim como os níveis de comunicação e articulação adequados à maior sinergia entre comunidade escolar e educativa. 146 Durante a realização das entrevistas, tivemos a oportunidade de observar alunos do tempo integral confeccionando, com o apoio dos professores e de profissionais do SESC, uma caixa como porta-objetos pessoais. 147 Professor participante do grupo focal realizado na escola em 02/10/2012. 162 Unidade 8: Estratégias de Planejamento das ações Quanto ao planejamento das atividades pedagógicas, a posição do grupo docente é de que há um planejamento coletivo, apoiado principalmente nos encontros de módulo148. De acordo com os docentes, nesses encontros são feitos o planejamento das ações, dos projetos que serão desenvolvidos pela escola por turmas de escolarização: “Temos as reuniões de módulo. É no coletivo é assim no módulo por séries: primeiro ano junta os professores do primeiro ano, segundo ano, terceiro ano, quarto ano e quinto ano. Cada um interage para chegar a um denominador comum” (Participante 10).149 A ideia principal é de que nas reuniões de módulo II os professores, a supervisão e a direção têm a oportunidade de conversar e estabelecer prioridades relativas às práticas curriculares e suas possibilidades de desdobramento em um programação cultural enquanto condições operativas do currículo como expressão do PPP. De acordo com a direção da escola, essas reuniões são para planejamento e reflexão das metas, ações e estudos com o grupo de professores. A ideia principal é construir estratégias de planejamento em sintonia com as experiências e saberes do grupo tendo como referência o ano de escolarização da atuação docente. São feitos em reunião de módulo 2, extra-turno, quinzenalmente e os projetos se realizam através dos níveis de ensino. Todos os professores do 1º ano se sentam juntos, os dos 2º ano e, assim, sucessivamente. E ali são planejadas todas as ações e metas do trabalho para o mês (Entrevistado 1).150 Ainda nessa direção, como detalhamento mais minucioso do planejamento das atividades uma das supervisoras da escola expressa: No início do ano letivo são reunidos os professores por ano do ciclo e feito um planejamento anual que é acompanhado pelo supervisor. Durante o ano nós temos as questões do módulo II que na escola acontece quinzenalmente. Na primeira quinzena a gente prepara o planejamento mensal, feito também por ano do ciclo, são agrupados por ano do ciclo e o planejamento semanal. A partir do planejamento semanal o professor faz o seu planejamento de aula (Entrevistado 4).151 148 Na escola pesquisada, as reuniões de módulo são realizadas quinzenalmente, envolvendo toda equipe pedagógica. 149 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 150 Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 151 Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012. 163 Em sentido macro observa-se que é organizado o planejamento anual com previsão do conjunto de estratégias, conteúdos e metodologias de trabalho. Essa programação anual orienta as reuniões de módulo II e a organização das propostas mensais e semanais, cuja execução desdobra no plano de aula dos(as) professores(as), permitindo inferir que há uma sequência lógica das atividades, com interlocução entre o contexto macro e micro, expresso no plano de aula. Enquanto expressão das dimensões operativas o plano de aula reflete a prática do PPP, as atividades a serem vivenciadas pelos alunos em sala de aula, com interconexão entre as dimensões macro e micro, cuja intenção consiste na vivência de experiências coerentes com os ideais da escola. Por outro lado, nas estratégias de planejamento adotadas pela escola para a vivência comunitária do PPP fica ausente um sentido de participação direta da comunidade com envolvimento de pais, representantes da sociedade civil e, especialmente dos alunos, na constituição das propostas. Observa-se ainda, que a segmentação das atividades por ano de escolarização, sem previsão de interlocução com o contexto global da escola, não favorece um enfoque globalizante das dimensões curriculares. Por outro lado, as atividades de flexibilização curricular são apontadas por (50%) dos docentes como o principal fator que contribui para o desenvolvimento do PPP da escola, seguidas da ações articuladas da comunidade escolar (35,72%), apoio dos órgãos do sistema estadual de esnino (10,71%) e o sentimento de pertencimento da comunidade (3,57%). O GRÁF 16 ilustra os valores encontrados. 164 GRÁFICO 16 - FATORES QUE CONTRIBUEM COM O DESENVOLVIMENTO DO PROJETO POLÍTICOPEDAGÓGICO DA ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes Se o currículo é o instrumento de concretude do PPP enquanto expressão das vivências (MURTA, 2004) os processos de flexibilização das práticas pode ser visto como uma possibilidade de maior participação da comunidade na construção de percursos compatíveis com autonomia e exercício da vida cidadã pelos discentes. Assim, os processos de flexibilização curricular diz respeito tanto ao acesso dos discentes aos conteúdos curriculares quanto ao diálogo com as experiências comunitárias cidadãs. A flexibilização curricular pode ser interpretada como uma estratégia de melhoria da qualidade escolar e formação de atitudes proativas dos sujeitos para a vivência da vida social, relacionando os saberes escolares e seu diálog com as experiências da comunidade. Enquanto estratégia adotada pela escola, implica na construção de relações mútuas e indissociáveis com a comunidade. Os processos de flexibilização curricular presuspõe uma interação dos saberes escolares com as experiências comunitárias, do diálogo com a comunidade escolar e educativa, perpassando por atividades curriculares e/ou extracurriculares que envolvem os sujeitos comunitários. Se as redes sociais com codificação de conhecimentos tácitos favorece a interação e cooperação entre os sujeitos, podendo ser situadas como inovações sociais (MACHADO, 2009), em termos escolares a flexibilização curricular pode ser vista como uma caminho de diálogo entre conhecimentos escolares e experiências tácitas, entre os sujeitos comunitários e 165 a existência de uma colaboração nas atividades de trabalho, podendo sustentar práticas de inovação social. A tendência apontada pelos docentes é de modificação das práticas enquanto resposta educativa as necessidades da comunidade, especialmente dos alunos: “os processos de flexibilização curricular são adotados pela escola sempre que há necessidades de promover mudanças nas práticas pedagógicas.” (Participante 8)152; “é o Trabalho diferenciado, é ensinar brincando, jogos pedagógicos, livros e revistas, tirar as filas, mudar as estratégias da sala, sentar um junto com o outro” (Participante 9).153 Essa perspectiva é coerente com a LDB 9394/96 ao dispor que os métodos, técnicas, recursos e espaços escolares podem ser modificados sempre que houver necessidade de atendimento diferenciado dos alunos. Assim, os próprios jogos, brincadeiras e vivências sociais oportunizadas pela escola de visitação a outros espaços (feiras, concursos, apresentações, dentre outras) são estratégias de flexibilização curricular. Por outro lado, não fica claro uma percepção sistemática e intencional dos sujeitos da adaptação dos currículos para maior participação da comunidade, especialmente do diálogo entre os saberes escolares e as experiências comunitárias associadas aos processos de aprendizagem formal e não-formal154 na vivência do PPP. Apesar de acontecerem as atividades na escola as sinergias entre esses processos não são maximizadas. Quanto aos processos de mudança a tendência apontada pelos docentes é do envolvimento coletivo da escola e seus profissionais, com a combinação de processos de participação direta e representação. Quando tem alguma coisa para mudar no currículo nunca é mudado sozinho pela direção e equipe pedagógica. Os problemas são colocados em discussão para ver o que pode ser feito. Há um estudo prévio das ideias e formação de uma comissão. Depois do estudo pela comissão, há uma nova reunião para expor e acertar as decisões finais (Participante 9). 152 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 154 Segundo (GOHN, 2006) a educação formal relaciona-se aos conteúdos previamente previstos e desenvolvidos nas escolas e a educação não-informal aos saberes aprendidos pelo compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e ações coletivas. 153 166 Os processos de participação direta envolvem a reflexão dos sujeitos sobre os problemas de enfrentamento e encaminhamento coletivo de possíveis soluções. Segundo os mesmos as possibilidades encaminhadas pelo grupo passam a ser estudadas por uma comissão de representantes que assume a responsabilidade por uma análise detalhada da viabilidade das propostas, constituindo a chamada participação representativa. De posse dos dados da análise a comissão retorna as sugestões ao grupo para análise final e aprovação da proposta. Há certo grau de reciprocidade entre os processos de mudança, especialmente das práticas curriculares, com as dimensões democrático-participativas de gestão, envolvendo os profissionais da escola e a combinação de formas de participação (direta e representativa). Tais aspectos são favoráveis à existência de possibilidades autogeradas nas práticas do PPP. Por outro lado, persiste lacunas relativas ao envolvimento direto dos alunos nesse processo de mudança, especialmente do estímulo a esses sujeitos em formar comissões entre os pares e/ou conjuntos (discentes e equipe pedagógica) para estudar possibilidades curriculares com maior nível de aderência às práticas comunitárias. Assim como, o envolvimento mais amplo da comunidade escolar (pais) e mesmo da comunidade educativa (representantes da sociedade civil, representantes de associações, representantes de instituições, vizinhança, dentre outros) nesse processo. A ausência de processos ampliados de mudança remete à própria forma com que os profissionais da escola, nesse caso os docentes, concebem a participação da comunidade, relacionada mais à presença física do que como engajamento: “há um compromisso sim com a comunidade dentro da escola por causa das participações, sempre que a gente convoca uma reunião os pais estão presentes” (Participante 9).155; “Olha no final do ano quanto faz o encerramento, os pais comparecem” (Participante 4)156. Assim, a concepção restrita do sentido de participação, associada à presença física dos sujeitos, compromete a construção de processos de mudança com o envolvimento ampliado dos sujeitos comunitários. Quanto às reuniões, o sentido maior estaria em comunicar e/ou informar os pais sobre o desempenho do(s) filho(s) na escola (notas, frequência, comportamento, etc.) do que 155 156 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 167 efetivamente estabelecer um processo de interlocução em que os pais efetivamente participem da construção das propostas e, consequentemente, da vivência concreta do PPP. Assim, os potenciais existentes na comunidade são pouco explorados nas estratégias de planejamento e proposta de mudanças estabelecidas pela escola, especialmente as possibilidades de articulação das experiências comunitárias, dos saberes tácitos com os saberes escolares. Assim como do maior diálogo entre atividades curriculares e extracurriculares para maior sinergia escola-comunidade, tendo como substrato a própria experiência de vida dos sujeitos. Assim a participação proativa da comunidade nas atividades extracurriculares e, ou mesmo, nas práticas pedagógicas no interior da escola157 precisa estar associada a todas as etapas, perpassando desde a concepção das ideias, ao planejamento participativo e execução colegiada, tendo como substrato o poder de decisão e responsabilidades compartilhadas entre os sujeitos. 157 Refere-se, por exemplo, à participação do SESC em oficinas pedagógicas (xadrez e artesanato) em âmbito do Programa Alunos de Tempo Integral. 168 Unidade 9: Parcerias com a comunidade e sistemas de apoio A intenção que vem sendo manifestada pela escola é de consolidação de uma rede de apoio comunitária que contribua com a melhoria das práticas pedagógicas e de gestão da escola, a partir de um conjunto de ações articuladas. “Quando a gente não consegue de imediato a parceria com a família ou com o pai [...] acionamos o Conselho Tutelar. Têm as parcerias com o conselho Tutelar, se tá acontecendo alguma coisa tem o CRAS também que ajuda. É uma rede, um ajudando o outro” (Participante 9).158 Essa rede de apoio ao trabalho escolar requer o envolvimento tanto de instituições pertencentes à comunidade escolar quanto educativa. Os dados apontam para uma interlocução em curso na escola, especialmente com instituições pertencentes ao poder público (Conselho Tutelar, CRAS, promotoria, Polícia Militar, UFVJM, Câmara Municipal de Vereadores de Teófilo Otoni, Correios), sendo necessário aprofundar essas relações com a participação de segmentos pertencentes à sociedade civil (SESC, Rede de Farmácia Indiana), com a vizinhança da escola, familiares e pais. Visa ampliar as vivências qualitativas das práticas do PPP em suas dimensões gestionárias e pedagógicas. É uma estratégia conjunta (escola-comunidade) para enfrentamento dos problemas associados à vulnerabilidade social dos escolares. É prevista no PPP por meio da perspectiva de relacionamento escola-comunidade de mãos dadas, prevendo relações mútuos e benefícios recíprocos entre os parceiros. Escola e Comunidade de Mãos Dadas – Através deste projeto a escola apóia ações de entidades e associações comunitárias que atendem crianças e adolescentes da comunidade, sendo também apoiada em suas atividades por estas. É uma parceria que tem como objetivo maior o cuidado e atendimento às crianças e adolescentes carentes da comunidade, especialmente os que vivem em situação de risco social (PROJETO POLÍTÍCO-PEDAGÓGICO, 2012, p.30) As principais em curso são a abertura da escola a participação da comunidade, divulgação do trabalho escolar (seminários, apresentações, exposições), visita às instituições estratégicas (SESC, UFVJM, Correios, dentre outras) e participação dos profissionais da escola em ações diversas na comunidade (feiras, concursos, apresentações, desfiles, dentre outras). 158 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 169 Essas parceiras oportunizam a escola desenvolver uma programação cultural, recreativa, esportiva e de lazer diversificada. Assim como, abordar temas importantes para a melhoria da qualidade de vida da comunidade. Esse ano de uma forma bem bacana fizemos um planejamento desde o início do ano através de oficinas de lazer, de recreação e cultura. São para os alunos da escola, para os pais dos alunos da escola e para os profissionais da escola. Então nós temos a rua de Lazer periodicamente dentro da escola que atende aos alunos e à comunidade, no dia da rua de lazer nós temos atividades de oficinas culturais, oficinas de artesanato, brincadeiras com as crianças. Tem a culminância com a saúde, onde pessoas da área da saúde, do posto de saúde, fazem exames médicos (aferir pressão, controle de glicose, glicemia e outras coisas) [...] termos parceria com nutricionistas que dão palestras sobre uma alimentação saudável, atividades com educadores físicos que fazem exercícios matinais, não só com os alunos, mas também com professores e os pais (Entrevistado 3).159 As sinergias com a comunidade educativa produz uma maior interação e riqueza de vivência dos sujeitos, um avivamento dos espaços escolares, especialmente nos finais de semana. É por meio do envolvimento nessas atividades que a escola vai se tornando um espaço de referência comunitária, maximizando suas possibilidades de ser expressão dos processos compartilhados, com maior descentralização do poder de decisão. Assim o interesse e envolvimento da comunidade nas atividades socioculturais é um passo fundamental para aproximação da comunidade escolar. É necessário, no entanto, avançar em direção aos processos participativos engajados, nos quais a comunidade deixe o papel de coadjuvante, de apenas estar presente nas atividades, para assumir um papel proativo na construção das propostas. A escola sempre que promove uma atividade está envolvendo a família, as atividades realizadas pelo SESC na escola , bordado, pintura, aferir pressão, glicose, são referências para as famílias. Então a família se prepara para esse dia. As festinhas de comunidade, a escola sempre promove alguma coisa para que a comunidade possa ser bem atendida, para que a comunidade se sinta acolhida (Entrevistado 4).160 É necessário que a escola perceba que a aproximação e acolhimento da comunidade é uma etapa inicial dos processos participativos, demandando avançar na proposição de práticas autogeradoras em que a comunidade efetivamente participe de todas as etapas com poder de decisão. Esse aprofundamento é necessário, seja pela participação direta dos sujeitos na concepção e programação das propostas, na formação de comissões comunitárias 159 160 Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012. 170 responsáveis pela definição da programação cultural e submissão à(s) assembleia(s) geral(is) ou pelo compartilhamento das propostas em seminários de práticas, dentre outras. Outra estratégia de maior aderência da escola à comunidade nas práticas do PPP são as visitas feitas às instituições da comunidade escolar e educativa. Essas visitas têm a intenção de oportunizar, principalmente aos alunos, processos significativos para a formação humana e pedagógica. São feitas, ainda, visitas dos profissionais da escola às famílias dos alunos, na intenção de conhecer melhor a realidade dos alunos com dificuldades (assiduidade, dificuldades de aprendizagem, agressividade, dentre outras) no percurso escolar: “A comunidade tem acesso à escola, mas a gente também tem acesso à comunidade. Se a gente solicita à comunidade, e o pai ou a mãe não comparecem, nós vamos até eles. Não temos nenhuma dificuldade de chegar até uma casa, a um pai, a um bairro” (Entrevistado 3).161 As visitas refletem uma preocupação e sensibilidade da escola de entender o aluno como sujeito da escola, quais são as suas dificuldades e que adequações são necessárias para o seu atendimento e garantia do seu sucesso escolar. A escola quando constata uma ausência de um aluno por um período prolongado, quando ela depara com uma dificuldade que o aluno vem trazendo em se tratando do familiar, do emocional, a escola percorre até a casa desses familiares para estar conversando, para saber o que está acontecendo com essa família e tenta ajudar da melhor maneira possível (Entrevistado 1).162 Essa preocupação da escola em visitar os alunos com dificuldades, de conhecer a sua realidade específica e de tentar estabelecer estratégias pedagógicas mais compatíveis com as suas necessidades pode ser vista como uma perspectiva autogeradora das práticas do PPP. Quanto ao coral a posição dos profissionais da escola é de apoio à inciativa, especialmente quando são realizadas as apresentações em instituições pertencentes à comunidade educativa: “A escola me dá todo apoio. Sempre apoiou, das direções anteriores à diretora atual. Sempre que eu preciso de qualquer coisa eu a procuro.” (Entrevistado 2).163 161 Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 163 Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 162 171 O apoio da escola consiste na flexibilização das atividades pedagógicas (recuperação de conteúdos) dos alunos que estão participando das apresentações e manter uma disponibilidade de profissionais para acompanhar as apresentações com o regente do coral: “Quando a gente sai, eles acompanham porque são muitas crianças. Nunca que eu dou conta de olhá-las sozinhas. Então sempre vão dois, três, quatro funcionários para me ajudar” (Entrevistado 2)164. Unidade 10: Organização dos tempos, espaços e práticas pedagógicas Em relação a modificação dos tempos e espaços para atendimento às necessidades do PPP da escola registram-se os seguintes resultados: 96,43% dos docentes afirma que os mesmos são suficientes no atendimento do PPP contra 3,57% que consideraram ser insatisfatórios. O GRAF. 17 ilustra os resultados encontrados. GRÁFICO 17 - OS TEMPOS E ESPAÇOS EM ATENDIMENTO AS NECESSIDADES DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes Ainda que todos os docentes tenham apontado a sua satisfação e/ou insatisfação quanto aos tempos e espaços escolares no atendimento às necessidades do PPP, quando se analisa a parte discursiva da questão, constata-se que 64,28% eximiram-se de registrar qualquer justificativa para a opção assinalada. Entende-se que a ausência de justificativa sinaliza com uma falta de 164 Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 172 clareza dos educadores das possibilidades e/ou limites dos tempos e espaços escolares na construção do PPP. Quanto aos 35,72% dos docentes que construíram uma justiticativa para a questão, as duas tendências principais foram o/a: 1) Caráter coletivo na vivência da proposta nos tempos e espaços escolares: reuniões com professores e pais dos alunos (Q3/Q9/Q14)165; colaboração da direção, professores e alunos para o desenvolvimento efetivo do PPP (Q22). 2) Preocupação de articulação do PPP com a realidade vivida pela escola nos tempos e espaços escolares: ações organizadas em atendimento às necessidades do PPP (Q15); construção do PPP, de acordo com a realidade da escola (Q17/Q19); o PPP é sempre reformulado para atender às necessidades dos alunos (Q26). As respostas apontam para um nível de interação coletiva da comunidade na organização dos tempos e espaços, expresso em reuniões, encontros, dentre outros, momentos de (re) construção das práticas. Reaparece ainda, a ideia de colaboração dos sujeitos coletivos, em articular estratégias nos seus espaços de vivência de ações pela comunidade escolar. Ainda que essas referências sejam importantes para a compreensão das dimensões autogeradoras do PPP nota-se uma ausência de aprofundamento das justificativas quanto as questões pedagógicas de modificaçções dos tempos e espaços para participação da comunidade. Retomando a ideia de Murta (2004), das dimensões curriculares como concretude do PPP, entende-se que sua organização é histórico-social e envolve a participação dos sujeitos comunitários, sendo uma possibilidade de superaraçaõ dos modelos acríticos e tecnicistas de organização. Nesses viés as condições democrático-participativas de organização dos tempos e espaços é uma condição necessária para a existência de processsos inovativos em seu caráter autogerador. Nesse sentido, enquanto estratégia de ação pedagógica a reorganização dos tempos e espaços implica em construir possibilidades concretas de apropriação autônoma dos discentes dos 165 Os questionários foram organizados em ordem alfabética e numerados de 1 a 28 para análise da parte discursiva das questões. 173 processos escolares. Em sua amplitude, perpassa pelo reconhecimetno dos processos de diálogo escolar, seja em ciclos de debates em sala de aula ou participação discente em atividades extracurriculares (exposições, apresentações etc). Assim, é fundamental a mobilização de estratégias pedagógicas que respeitem os alunos em sua diversidade, valorizando a participação dos sujeitos na (re)construção da dinâmica histórico-social dos diferentes espaços e tempos escolares. Por outro lado, para os docentes a modificação nos tempos e espaços escolares são vistos como aspectos diretamente relacionados aos limites impostos pela estrutura física166 da escola, sendo descritas ações de acessibilidade (rampas, adaptação dos banheiros, dentre outras) para atendimento dos alunos do Projeto Incluir e a cobertura da quadra para a realização das aulas práticas de Educação Física: “Ao falar de inclusão, a gente tem dificuldades por causa do prédio antigo [...]” (Participante 7).167; às vezes tá chovendo ou o sol está muito quente o professor de Educação Física não consegue ir para a quadra. Aí ele vai para a biblioteca, ele faz bingo na sala de aula com os alunos” (Participante 1).168 As modificações nos tempos e espaços estão diretamente relacionadas aos desafios impostos pela estrutura física, exigindo adequação e compatibilização das práticas à realidade estrutural da escola. Assim, é com o olhar nas condições físicas concretas que os docentes estabelecem as estratégia de vivência do PPP e suas aproximações com a comunidade. Desse modo a perspectiva de suficiência dos tempos e espaços escolares estaria relacionada à visão docente de que o PPP, enquanto uma proposta coletiva da escola é construído com o olhar na própria realidade e das suas vivências dos sujeitos, tendo como horizonte aquilo que é passível de realização imediata. Sem dúvida esse é um aspecto importante, principalmente quando se considera que as dimensões autogeradores do PPP estão relacionadas à sua prática efetiva. Por outro lado, a perspectiva autogeradora implica também na função projetiva, de transformar o campo instituinte em instituído (GADOTTI, 2004). 166 Ainda que a comunidade preserve a estrutura física da escola, a mesma funciona em um prédio alugado pertencente à entidade jurídica Mitra Arquidiocesana de Teófilo Otoni. São poucos os investimentos do Estado, para adequação do prédio às necessidades do alunado, já que o mesmo não é patrimônio do Estado. 167 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 168 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 174 Assim, o diálogo com uma nova perspectiva instituinte implica em assumir os desafios de transformação da escola, dos seus tempos e espaços de vivência, das questões pedagógicas e gestionárias e, consequentemente, de mobilização para a transformação da própria estrutura física para além dos limites das possibilidades concretas. Em uma perspectiva autogeradora, pressupõe repensar a forma como são construídas as relações dos sujeitos nos tempos e espaços como possibilidade para a vivência das dimensões societária do projeto democráticoparticipativo. Demanda um pensamento reflexivo e criativo dos sujeitos relativo à sua práxis, das possibilidades de articulação de tempos processuais e espaços interativos169 para vivência das práticas do PPP em seu sentido autogerador, enquanto produto das relações históricas e sociais vivenciadas pelos sujeitos. Assim, ao invés das práticas de gestão ou pedagógicas serem adequadas aos espaços e tempos, pode-se pensar na modificação dos tempos e espaços para atendimento às demandas histórico-sociais dos sujeitos na vivência do PPP. Os fundamentos para a mudança estão relacionados à própria dinâmica e função projetiva do PPP, enquanto processo inconcluso de diálogo com novos campos instituintes. Há o risco de os docentes, ao apontarem a perspectiva das ações curriculares adequadas à realidade dos tempos e espaços da escola, reduzirem o PPP apenas a vivência da realidade concreta, sem diálogo com os novos campos instituintes. O ideal é pensar na realidade campo instituído, tendo como contraface ao que se deseja construir, campo instituinte. A concepção docente centrada apenas no campo instituído do PPP, sem diálogo com o campo instituinte, pode comprometer os desafios da mudança, seu caráter processual e dinâmico, enquanto construção possível. Para Hernández et al (1998), uma perspectiva transgressiva na organização dos projetos de trabalho é necessária, no sentido de que os processos de mudança promovam rupturas com as práticas instituídas, como condição necessária para a existência de novos processos 169 Ainda que o PPP tenha como referência as condições concretas dos tempos e espaços escolares, campo instituinte, a existência de pinturas no pátio da escola (jogos, letras do alfabeto, desenhos) indicam uma relação mais interativas dos sujeitos como os referidos espaços. 175 inovativos. É nesse sentido, que os tempos e espaços demandam serem pensados como construção histórico-social dos sujeitos que em sua prática concreta lança luz em relação às questões futuras. Na prática do PPP da escola, nota-se que existem processos de apropriação discente dos espaços (biblioteca, auditório, sala de aula, pátio, sala de informática, dentre outras) de forma mais processual, assim como formas de lidar com o tempo de maneira mais interativa, expresso pelos projetos pedagógicos de trabalho. Podem ser mencionadas as atividades de convivência social realizadas toda semana no pátio e as apresentações conjuntas, envolvendo professores e alunos170. O que eu admiro muito é a interação do professor com o aluno no decorrer das apresentações dos projetos, apresentando junto com o aluno. Dia do circo, o professor apresenta junto com o aluno, festa junina da mesma forma, professor interage mesmo, trabalha junto com a criança (Participante 2).171 É necessária uma maior consciência docente do significado dessas atividades na vivência de relações interativas nos tempos e espaços escolares. Nota-se que as iniciativas existem, seja por meio de projetos de trabalho ou de atividades de convivência coletiva, sendo mediatizadas no diálogo entre a realidade e o que se deseja construir nos tempos e espaços, enquanto apropriação dos sujeitos históricos e sociais. A vivência das práticas pedagógicas no interior da escola demanda um nível de articulação e coerência entre o projeto de educação desejado e a vivência concreta da escola, isto é, as sinergias entre o marco de educação desejado e as dimensões operativas concretas. Assim, sua vivência autogeradora é expressa no conjunto de relações praticadas no ambiente escolar. Obviamente, o modelo democrático-participativo ao ter como marco legal estruturante a LDBEN 9394/96 apoia-se nos princípios da liberdade de ensino. As possibilidades de coexistência de diferentes concepções e métodos de ensino previstas na LDB 9394/96 favorecem a existência de inovações nas práticas pedagógicas do PPP, do seu caráter autogerador para maior participação da comunidade, na medida em que apoia e respeita os sujeitos em sua diversidade. 170 A perspectiva de o professor apresentar junto com os alunos atividades no pátio e/ ou auditório também aparece no grupo focal discente. 171 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 176 Por outro lado, uma maior sinergia escola-comunidade implica no diálogo entre práticas pedagógicas do PPP e realidade comunitária, desenvolvendo a consciência crítica dos sujeitos das suas demandas e necessidades de transformação da realidade, num processo de aproximação e reflexão da realidade, produzindo transformações em consonância com as expectativas dos seus sujeitos. Esse movimento de reflexão (re)construção das relações pedagógicas tem como fio condutor a realidade concreta e as estratégias buscadas pelos sujeitos de enfrentamento dos problemas, especialmente de superação dos ranços de uma educação bancária, centrada na transmissão de conhecimento, relações fragmentárias e na cisão do diálogo escola-comunidade ao desconsidera as experiências dos sujeitos comunitários (FREIRE, 2004). Num perspectiva de práticas pedagógicas interacionistas172, muitas soluções para os problemas estão na própria comunidade, na forma como diariamente constrói suas estratégias de enfrentamento dos desafios. Isso pressupõe admitir uma predisposição dos sujeitos para uma dinâmica autogeradora de vivência das práticas pedagógicas do PPP, para a construção de processos inovativos endógenos, sustentados nas aspirações da própria comunidade. Ao percorrer as dimensões operativas das práticas pedagógicas da escola verifica-se que para os discentes, o espaço escolar com maior afinidade (categoria 15) consiste na quadra (51,19%), sendo mencionados em menores valores percentuais a sala de aula (21,42%), biblioteca (11,9%), o laboratório de informática (4,76%), o pátio (4,76%), a cantina (2,38%), a direção/secretária (1,19%), o auditório (1,19%) e ausência de marcação (1,19%). O GRAF. 18 retrata os valores percentuais encontrados. 172 Entendidas como aquelas práticas que valorização o diálogo e potencial dos sujeitos escolares na construção de soluções endógenas aos problemas enfrentados. 177 - ESPAÇOS ESCOLARES AFINIDADE DISCENTE DE PARTICIPAÇÃO GRÁFICO 18 COM MAIOR Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes Ao apontar a quadra como espaço de maior afinidade participativa os discentes sinalizam para a necessidade de maior vivência das dimensões173 procedimetais, do fazer educativo associado a inteligência cinéstesico-corporal na escola. É perceptível que a vivência de atividades lúdicas (jogos e brincadeiras) e de práticas esportivas nesses espaços estão associadas ao prazer dos discentes de participar dessas atividades. É importante que a escola valorize os espaços com maior possibilidade de envolvimento e participação direta dos sujeitos e suas possibilidade de interação proativa dos sujeitos comunitários explorando o movimento como uma dimensão para (re)construção do PPP em sua perspecitva autogeradora. Isso envolve a criação de estratégias de valorização das expressões corporais e reconhecimento do próprio movimento como parte de expressão da participação em seu sentido autogerador. Por outro lado, quanto aos espaços escolares com menor afinidade de participação discente, o auditório (41,66%) é o principal local que os discentes não gostam de frequentar, acompanhado da direção/secretaria (34,52%). Com valores percentuais menores, encontramse a sala de aula e o pátio, ambos com 5,95%; a cantina com 4,76%; a biblioteca e a quadra, ambas com 2,38%; o laboratório de informática e ausência de marcação com 1,19%. O GRAF. 19 representa os valores percentuais encontrados. 173 De acordo com os parâmetros Parâmetros Curriculares Nacionais Para o Ensino Fundamental (2001) os conteúdos devem ser trabalhados nas dimensões conceitual, procedimental e atitudinal. 178 GRÁFICO 19 - ESPAÇOS ESCOLARES COM MENOR AFINIDADE DISCENTE de frequência Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes Ainda que o auditório seja mencionado nos questionários como o espaço de menor afinidade de participação discente essa perspectiva não se confirma no grupo focal onde são levantadas dimensões de natureza qualitativa. Segundo os discentes, participantes do grupo focal, todos os espaços pertencentes ao grupo focal são importantes e despertam o interesse dos mesmos. Vale lembrar, que o auditório é um espaço de vivência que demanda maior expressão corporal (teatro, dança, jogral, etc), participação direta e proatividade dos envolvidos. Quanto a direção/secretaria a ausência de afinidade pode estar associdada aos ranços de uma pedagogia tradicional em que historicamente eram vistos como locais de aplicação das punições aos discentes. Sem desconsiderar a importância do caráter normativo, presente no regimento escolar, uma dimensão societária de gestão implica em aproximar os discentes dos processos participativos, reconhecendo esses espaços como importantes articuladores das escola-comunidade, consequentemente dos próprios discentes. Para os docentes a organização dinâmica dos tempos e espaços escolares está diretamente relacionada às estratégias de ensino, sendo obtidos os seguites resultados percentuais: explicação do professor e realização de atividades individuais em sala de aula (28,57%); estudo orientado em sala de aula (25%); produção individual e coletiva (14,28%); dinâmicas de trabalho em grupo (10,71%); jogos pedagógicos e brincadeiras em sala de aula (7,14%); outras: conceitos no quadro, explicação e trabalhos em dupla com alunos dispostos em círculo 179 e semicirculo, aulas expositivas e interativas com atividades lúdicas (7,14%). O GRAF. 20 resgistra os respectivos valores encontrados. GRÁFICO 20 - ESTRATÉGIAS DE ENSINO UTILIZADAS COM MAIOR FREQUÊNCIA PELA ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes A explicação do professor e organização de atividades individuais, ainda que sejam importantes, não podem ser vistas como mais adequadas para vivência autogeradora das práticas do PPP e maior participação da comunidade. As atividades que fomentam o caráter social e coletivo do aluno, estimulando o debate e a construção interativa dos processos, o envolvimetno e a cooperação dos sujeitos apresentam maior grau de pertinência. Essa é uma dimensão pedagógica que precisa ser revista já que as práticas centradas na explicação do professor e desenvolvimento de atividades individuais dialogam com a tradição pedagógica onde os docentes consideram detentores de um saber transmitido aos alunos, ou seja, têm como princípio orientador a educação bancária. (FREIRE, 2004) 180 A centralização docente dos processos pedagógicos e a ênfase em atividades de caráter individual consiste num descompasso entre práticas pedagógicas e a concepção e autoavaliação dos mesmos da participação comunitária, apontando lacunas na coerência entre a prática concreta e as condições ideais. Ao reproduzir a lógica de organização gestionária fragmentada essas estratégias não são as mais adequadas para a participação da comunidade já que não favorecem as tendências autogeradoras do PPP e a valorização da participação histórico-social dos sujeitos no enfrentamento dos desafios da realidade comunitária. Assim, as estratégias de ensino frequentemente adotadas restringe as possibilidades de vivência dos alunos de fundamentos da vivência cidadã, do desenvolvimento da sua autonomia e proatividades com as dimensões da vida comunitária. A centralização das experiência pelos docentes é um limite ao diálogo das atividades curriculares e extracurriculares em sitonia com os saberes tácitos presenes no seio da comunidade. Por outro lado, para os discentes, as atividades que participam com maior frequência são os trabalhos em grupo na sala de aula (57,14%). Em menores valores, foram descritos: a explicação do professor e as atividades individuais em sala de aula (16,66%); o estudo orientado em sala (7,14%); a leitura e a produção de texto individual e coletiva (4,76%); a pesquisa na sala de informática (3,57%); os jogos pedagógicos e as brincadeiras em sala de aula (3,57%); as dinâmicas de trabalho em grupo (2,38%); a anotação de conceitos do quadro, seguida da explicação do professor (2,38%); a pesquisa na biblioteca 1,19% e o estudo de vídeos (1,19%). O GRAF. 21 ilustra os respectivos valores. 181 GRÁFICO 21 - ESTRATÉGIA DE ENSINO QUE OS DISCENTES FREQUENTEMENTE PARTICIPAM NA ESCOLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários discentes Enquanto para os docentes prevalecem a explicação do professor e as atividades individuais, para os discentes são comuns os trabalhos em grupo na sala de aula. Essas diferenças estão associadas a percepção dos docentes e discentes do que sejam atividades em grupo, sendo para os primeiros atividades sistematizadas de acesso coletivo aos conteúdos curriculares e para os segundos qualquer atividade que envolva contato entre os alunos. Por outro lado, vêse no grupo focal que os próprios docentes apóiam-se nas atividades coletivas para superar dificuldades de aprendizagem: “É o Trabalho diferenciado é ensinar brincando, jogos pedagógicos, livros e revistas, tirar as filas, mudar as estratégias da sala , sentar um junto com o outro” (Participante 9). Quanto às modificações para serem produzidas na escola, para os docentes, a forma como são trabalhados os conteúdos em sala de aula (35,71%) consistiria em prioridade. Em seguida, aparecem os espaços disponíveis na escola, especialmente aqueles para o desenvolvimento de atividades culturais e práticas esportivas (28,57%); os eventos e as atividades propostos pela escola fora da sala de aula (25%); a forma de comunicação e a relação interna da escola, especialmente entre professores e alunos (8,33%); e outros: cobertura de quadra e melhoria dos espaços da escola (2,3%). O GRAF. 22 representa os respectivos valores. 182 GRÁFICO 22 - MODIFICAÇÕES PRIORITÁRIAS DA ESCOLA SEGUNDO OS DISCENTES. Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes Sejam as explicações do professor e os trabalhos individuais, ou mesmo, as atividades em grupo em sala de aula, os dados remetem à necessidade de produção de modificações, considerando o caráter inconcluso do PPP e a intenção de construir uma maior sinergia comunitária. Por outro lado, a produção de modificações está diretamente associada aos aspectos de uma dada realidade que incomoda os sujeitos e precisa ser transformada. Nesse caso, a principal mudança na escola estaria associada às metodologias e às relações construídas em sala de aula. Os resultados obtidos chamam a atenção para duas questões instrinsicamente relacionadas e fundamentais, que envolve a forma como são construídas as relações em sala de aula e as metodologias e práticas pedagógicas adotadas. Essas questões precisam de outras evidências que pemitam compreender se as práticas pedagógicas orientam-se por uma perspectiva de trabalho dialógico, compromissado com as transformações societárias de maior participação da comunidade ou, simplesmente, pela manutenção das relações e reprodução de uma estrutura bancária. 183 Quanto às atividades extracurriculares desenvolvidas pela escola, nota-se que a maior frequência são a organização de mostras culturais e/ou exposições para 75% dos docentes. Em menores valores percentuais estão a organização de oficinas de teatro e/ou dança (10,72%); os movimentos culturais na escola e extraescolar (7,14%); a organização de gincanas ou eventos esportivos (3,57%) e a organização de visitas às instituições pertencentes à comunidade (10,72%). Observe os valores retratados no GRAF. 23 a seguir: GRÁFICO 23 - ATIVIDADES EXTRACURRICULARES, SEGUNDO OS DOCENTES, FREQUENTEMENTE ORGANIZADAS PELAS ESOCLA Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes Quanto aos discentes, as atividades de que participam frequentemente fora da sala de aula são: organização de mostras culturais e/ou exposições (34,52%); organização de gincanas e/ou eventos esportivos (27,38%); organização de oficinas de teatro e/ou dança (26,19%); organização de visitas às instituições pertencentes à comunidade (9,52%); outras: participação no coral (1,19%) e ausência de marcação da questão (1,19%). O GRAF. 24 ilustra os valores obtidos na questão. 184 GRÁFICO 24 - PARTICIPAÇÃO DISCENTE ATIVIDADES FORA DA SALA DE AULA EM Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes Os valores expressos pelos docentes e discentes, salvo diferenças percentuais, convergem para a organização de mostras culturais e/ou exposições como atividades frequentemente realizadas fora da sala de aula. Essas atividades são importantes, já que favorecem a interlocução com a comunidade, dialogando com questões sociais e culturais conectadas com a vida comunitária. É importante compreender a forma como são desenvolvidos os valores e níveis de adesão dos sujeitos comunitários. É evidente que a organização de mostras culturais e/ou exposições demanda uma sinergia com o trabalho desenvolvido pelos docentes e discentes em sala de aula, pressupondo uma articulação entre as atividades curriculares e extracurriculares. Enquanto atividades de caráter amplo, abertas à comunidade escolar e educativa, exigem um diálogo dos sujeitos com os processos de mudança, reconhecendo novos tempos e espaços como possibilidades de aprendizagem comunitária. Percebe-se um esforço da escola em oportunizar aos alunos uma vivência interativa para além da sala de aula, sendo desenvolvidas atividades no pátio, no laboratório de informática, na biblioteca, na quadra e de visitas no próprio ambiente comunitário. Essas atividades fazem parte de uma programação sistemática da escola, sendo semanalmente oportunizada aos alunos a vivência de atividades em boa parte desses espaços. 185 A gente usa todos os espaços da melhor forma possível, a gente usa a biblioteca com aula de vídeo e aula de biblioteca, usa o espaço da sala de computação com aula de computação, os alunos têm durante a semana tanto a aulas de biblioteca quanto de computação [...], têm a quadra onde acontecem as aulas de Educação Física [...], usa o pátio para os auditórios, praticamente os auditórios acontecem no pátio, temos um salão onde há eventos com os alunos e a comunidade [...] a escola procura utilizar esses espaços da melhor forma possível (Entrevistado 3).174 Em geral a vivência dos espaços de participação coletiva corresponde à culminância mensal dos projetos pedagógicas que são desenvolvidos em sala da aula como parte da programação sociocultural da escola. [...] conseguimos reunir todos os alunos no pátio e eles conseguem assistir às apresentações dos colegas. Sentados, acomodados e mais do que isso, vivendo, aplaudindo, felizes, cantando, participando desse momento, ele se torna corresponsável pelo processo [...] Cada professora procura fazer um número artístico mais próximo do tema trabalhado. Além de ter o envolvimento desses alunos tem o envolvimento dos profissionais (Entrevistado 3).175 Esse sentimento de corresponsabilidade está associado à própria vivência discente dos processos, do significado das atividades para sua formação, do potencial de penetrar no seu interior e construir uma significação social da vivência concreta do PPP. Muitas das atividades desenvolvidas pelos professores exigem um tempo mais processual e espaços mais ampliados de vivência, extrapolando os limites da sala de aula: “Quando é uma atividade que precisa explorar espaços mais amplos os professores levam os alunos para o pátio, como em alguns jogos pedagógicos” (Entrevistada 1).176 A vivência proporcionada por essas atividades socioculturais, além de permitir a (re)significação por parte dos alunos dos processos de vivência escolar, contribui com a construção das relações mais processuais e interativas entre os sujeitos. Contata-se que a organização dos projetos é uma possibilidade de romper com a organização disciplinar e vivenciar ações mais conexas de caráter interdisciplinar,177 enquanto possibilidade de vivência coletiva dos tempos e espaços escolares. 174 Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 176 Supervisor da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 177 A interdisciplinaridade pode ser entendida como uma atitude de cooperação dos profissionais na construção de relações conexas de abordagem dos conteúdos. 175 186 Os projetos interdisciplinares de trabalho apresentam-se como uma alternativa possível de vivência dos tempos e espaços de forma interativa e processual, com possibilidades de diálogo com os processos pedagógicos e gestionários conexos. O aprofundamento dessa perspectiva na escola demanda assumir os desafios de superação dos processos lineares de organização, determinada por um viés mecanicista, em detrimento das dimensões sociais e históricas da comunidade escolar como mais adequada para a vivência autogeradora do PPP. As atividades extracurriculares, como as desenvolvidas no coral da escola, ao dialogar com instituição pertencentes a comunidade educativa cria também novos desafios à participação dos alunos, assim como, reconstrói o próprio sentido de tempo e espaço educativo, exigindo dos sujeitos maior compromisso e corresponsabilidade coletiva situando para além da vivência do tempo mecânico de vivência da hora-aula. Nós temos ensaio todos os sábados de 8 às 10 horas da manhã. Para participar do coral, eles têm que ser assíduos aos ensaios, porque durante o ano temos uma agenda de convites. A gente apresenta nas faculdades, a gente apresenta em outras escolas de primeira a quarta série. A gente apresenta também na prefeitura. É, como se diz, a escola [...] tornou-se uma referência e em qualquer evento os alunos são solicitados. Até nos correios os alunos fazem apresentação (Entrevistado 3).178 Essa vivência de tempos e espaços extrapolam os muros da escola expressando um condição de flexibilização curricular que correlaciona com as próprias finalidades humanísticas e pedagógicas do PPP permitindo aos alunos um conjunto de vivências da vida cidadã. Ao demandar uma articulação entre as dimensões curriculares e extracurriculares requer um trabalho associado dos sujeitos, envolvendo especialmente os desafios dos docentes de articular as práticas curriculares formais com os processos de vivência social na escola. Por outro lado, são oportunidades de aplicação, demonstração e desenvolvimento das capacidades necessárias para a vida social em espaços e tempos mais amplos. A organização desse diálogo curricular e extracurricular nas práticas pedagógicas de trabalho permite uma organização dos processos conectados com a realidade externa e interna da escola, na qual os alunos sejam sujeitos ativos (HÉRNANDEZ et al, 1998). É uma forma de superação dos processos de fragmentação dos conteúdos curriculares, de estabelecer conexão 178 Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 187 da escola com a realidade comunitária, de base local e, ao mesmo tempo, com dimensões globais. Assim, as mostras e exposições podem ser vistas como uma primeira forma de aproximação da comunidade, tanto na participação em atividades propostas pela escola, quanto nas possibilidades de maior autonomia e proposição de uma programação, permitindo expressar potencialidades presentes na própria comunidade a ser valorizadas no cenário escolar. As mostras culturais e exposições permite também o diálogo entre comunidade escolar e educativa numa perspectiva de relações ampliadas e transferência de resultados do trabalho pedagógico de caráter sociocultural para a comunidade educativa, bem como, a constituição de relações que favoreçam o fortalecimento do trabalho escolar. O envolvimento dinâmico da comunidade nessas atividades pode ampliar o sentido da participação na medida em que se constrói uma identidade escolar. É um caminho estratégico de diálogo com setores da sociedade civil e de construção de uma rede de relações colaborativas de vivência do PPP como possibilidades de vivência do poder compartilhado de decisões. 188 Categoria 4: Dificuldades de maior participação da comunidade no Projeto PolíticoPedagógico Unidade 11: Os desafios dos processos de mudança na escola Enquanto processo inconcluso o PPP envolve os desafios projetivos de antecipar ações futuras, numa tênue relação entre campos instituídos e instituintes, tendo como horizonte o atendimento dos novos desafios da vida cidadã. (GADOTTI, 2004) Quanto aos desafios de proposição de mudanças pedagógicas na escola há um equilíbrio entre organização burocrática e hierárquica do trabalho escolar; o choque causado ao educador quando ocorrem mudanças na educação; participação dos pais no processo de aprendizagem e frequência nas reuniões (21,43%). Com valores percentuais intermediários situa-se a ausência de significado concreto das mudanças para a prática pedagógica e a centralização das decisões como limite a participação da comunidade escolar (17,86 %). Em menor escala de valor observa-se a insegurança e a resistência dos profissionais quanto aos processos de mudança das práticas pedagógicas (10,41%); ausência de marcação da questão (7, 14 %) e baixa autonomia e liberdade concreta no exercício das práticas pedagógicas (3,57%). O GRAF. 25 retrata os valores percentuais encontrados: GRÁFICO 25 - DIFICULDADES DA ESCOLA EM PROPOR MUDANÇAS PEDAGÓGICAS Fonte: Dados extraídos pelo pesquisador dos questionários docentes 189 A análise da trajetória dos processos inovativos tem apontado que a organização burocrática e hierárquica do trabalho escolar tem sido um dos principais fatores que dificultam a emergência de processos inovativos endógenos (HÉRNANDEZ et al, 2000; CABONELL, 2002). Numa estrutura burocrática, as inovações são prescritas por equipes técnicas com segmentação dos processos. Quanto aos desafios das mudanças a organização hierárquica e burocrática do trabalho escolar; o choque causado ao educador; a participação dos pais nas práticas pedagógicas e frequência em reuniões são as principais dificuldades enfrentadas pela escola. Esses aspectos são limites a participação sólida da comunidade, com envolvimento dos sujeitos em todas as ações propostas. Vê-se ainda uma contradição entre a forma como os docentes concebem e autoavaliam-se diante dos processos participativos e as dificuldades enfrentadas pela escola relativa à participação, especialmente quanto a organização burocrática da escola. Assim, as ações relativas a perspectiva societária de gestão são, em muitos momentos, atravessadas por condições intempestivas e prescritas, impostas por uma conjuntura sistêmica das políticas educacionais. Essas mudanças ao ser definidas por equipes técnicas, materializa uma perspectiva difusionista, limitando o sentimento de pertencimento dos sujeitos. As mudanças que estão ocorrendo na educação criam um impacto [...]. O trabalho se torna mais demorado, o professor fica inseguro em relação a tantas mudanças. As reclamações são de que um dia se pede uma coisa e no outro dia, outra. Afirmam que todo dia essa secretaria manda uma coisa, a gente vai fazer, mas não sei se vai dar tempo. De acordo com o tempo que a secretaria está pedindo para a gente (Entrevistado 4).179 Vê-se que esse medo é muito mais um processo de resistência dos docentes às mudanças prescritas pela SEE/MG que interferem diretamente na sua práxis pedagógica. Consiste numa manifestação da insatisfação as questões intempestivas de organização das políticas educacionais típicas da perspectiva difusionista, da ausência de um tempo de maturação das propostas na estreita relação entre SEE/MG, escolas e comunidade escolar. 179 Supervisora da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012. 190 Ainda que sejam manifestadas intenções de vivências autogeradoras das práticas do PPP a existência dessas características aponta para a coexistência de diferentes perspectivas de gestão ( societárias, burocráticas e gerenciais) no interior da escola. Mesmo que um modelo de gestão dificulte a emergência de processos inovativos no PPP para maior participação da comunidade é necessário reconhecer que, na prática concreta, os sujeitos podem buscar estratégias de ação compatíveis com sua maior proatividade comunitária como contraponto aos processos verticalizados e prescritos. O caráter proativo dos sujeitos é uma condição importante para enfrentamento dos processos centralizados e verticalizados de mudanças, permitindo dialogar com campos instituintes compatíveis com a realidade comunitária. Nesse sentido, o choque causado ao educador pelas mudanças verticalizadas, demanda dos sujeitos consciência das possibilidades do grupo na sistematização de ações de enfrentamento do problema. Se considerarmos as ações difundidas pela SEE/MG, por meio da SRE de Teófilo Otoni, situam-se em âmbito da comunidade educativa, esse é um importante desafio a ser enfrentado pelos sujeitos na intenção de reconstrução das práticas e valorização do potencial autogerador de caráter local180. Ainda em relação aos impactos das prescrições verticalizadas dos processos inovativos a supervisão escolar descreve a experiência do PROALFA. [...] o volume de material que chegou para o PROALFA foi num espaço de tempo muito curto. Antes de terminar de aplicar aquela apostila, chega outra apostila e chega outra, então foram umas quatro apostilas seguidas. Então é um volume de material muito grande, que dificultou o trabalho do professor, até mesmo da coordenação pedagógica do supervisor (Entrevistado 4).181 Obviamente essas mudanças estão associadas a uma perspectiva de gestão gerencial, com adequação dos princípios da administração empresarial à escola. Como se vê, um dos focos principais é a proficiência discente em processos avaliativos externos (ARAÚJO; CASTRO, 180 A corresponsabilidade dos sujeitos com o espaço de vivência local em ações de interesse público pode ser vista com um prática orientada pela perspectiva da gestão social e base para o desenvolvimento local. 181 Supervisora da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012. 191 2001). O exemplo ilustra como essas estratégias são programadas182 e determinadas nas escolas sem a participação dos sujeitos na concepção e organização dos processos. Processos gestionários dessa natureza implicam em fissuras nas dimensões de organização societária do PPP, em especial no envolvimento e articulação dos profissionais. Nota-se que o supervisor, enquanto articulador das ações pedagógicas tem que estabelecer uma interlocução com os professores relativa a processos dos quais não houve compartilhamento de objetivos, concepção e planejamento das ações. O modo de condução dos processos verticalizados183 gera resistência dos professores, enquanto principais sujeitos envolvidos com a prática pedagógica e, consequentemente com os processos de mudança. Assim, não favorece a articulação desses profissionais na construção de ações comuns ao grupo, relacionadas às dimensões histórico-sociais dos sujeitos. 182 Mencionamos no capítulo 2 que os programas e estratégias são programados por equipes técnicas para o alcance da chamada eficiência na gestão e práticas pedagógicas. 183 Como vimos são propostas de inovações prescritas por equipe técnicas, de cima para baixo, sem envolvimento efetivo dos sujeitos na programação das mudanças. 192 Unidade 12: A percepção da escola da participação dos pais Quanto a participação dos pais a ênfase dada pelos docentes no grupo focal são os problemas de desestruturação das famílias, sendo muitas crianças criadas pelos avós184. Sempre 20%, 10% dos pais não participa da escola. Olha têm dois meninos aqui na escola que o pai está preso em uma cidade e a mãe que, já tinha três filhos, teve outro bebê e depressão pós-parto. Ficou louca e a avó de quase 70 anos pegou essas crianças para cuidar. É uma dificuldade que a gente tem é de trazer essa avó e esse avô para dentro do escola com essas crianças (Participante 9).185 As crianças criadas pelos avós refletem um modelo de organização familiar atual demando da escola atenção a essa nova realidade na organização das suas práticas pedagógica e de gestão. Essa reorganização das famílias esta associada principalmente ao cenário social vivenciado atualmente (pais presos, abandono dos filhos pelas mães viciadas, assassinato do(s) pai(s), acidentes no trânsito, dentre outros). Por outro lado, não há uma relação direta entre crianças criadas pelos avós e incapacidade intelectual e física dos mesmos de acompanhar a vida escolar do(s) neto(s). Em muitos casos, podem ser até mais zelosos com o(s) neto(s) do que os próprios pais, inclusive no acompanhamento escolar. Além disso, os avós podem ter maior disponibilidade de tempo, bem como, interesse em se envolver nos processos de participação escolar, deixando suas experiências a serviço da comunidade. Assim como, não se pode negar que em alguns casos existe problemas relativos à participação dos avós no acompanhamento do(s) neto(s) associados às dificuldades de locomoção, reduzindo sua presença física na escola, ou mesmo, diferenças associadas aos anos de frequência regular à escola, impõe dificuldades de acompanhamento das prática pedagógicas do(s) neto(s). Essas mudanças na estrutura familiar demandam dos profissionais da escola repensarem novas possibilidades de reorganização das práticas pedagógicas e de gestão do PPP, considerando que a realidade da comunidade escolar é diversa e exige estratégias diferenciadas para maior participação da comunidade. São necessárias modificações na 184 De acordo com o IDF – Índice de Desenvolvimento das Famílias, crianças criadas pelos avós aumenta a vulnerabilidade social das famílias. 185 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. 193 própria percepção docente dessas formas de organização familiar no diálogo com novos campos instituintes: “Sempre em uma sala tem dificuldades sim. Tem aquelas crianças que diante da grande desestruturação e diferença familiar fica difícil trabalhar” (Participante 7).186 As dificuldades de trabalho mencionadas estão associadas ao comportamento social das crianças e a falta de acompanhamento das atividades pela família. Muitas crianças apresentam desvio de comportamento, com dificuldade de assimilar as regras de convivência social. A principal reclamação docente consiste na falta de acompanhamento, de ajudar aos filhos(s) e/ou neto(s) na realização das atividades em casa. Para os discentes os problemas associados ao comportamento social são uma das principais dificuldades para fortalecer os processos participativos na escola: “o respeito dos colegas com os professores. Às vezes tá fazendo alguma coisa errada a professora corrige e ele xinga a professora. Aí às vezes dá ocorrência.” (participante 21)187; “A falta de respeito de alguns colegas em relação aos outros e aos professores” (Participante 18).188 A principal forma apontada pelo grupo discente para resolver o problema da indisciplina é o diálogo: “A professora conversa primeiro com os alunos, depois tia chama os pais.” (participante 16). Percebe-se que o diálogo perpassa por uma reflexão do ato cometido, tendo como propósito principal despertar a consciência discente de formas mais adequadas de conduta social. Ainda, segundo os mesmos, nas situações mais graves os pais são convocados e pode haver registro de uma ocorrência do aluno. Retomando a questão de acompanhamento das atividades pedagógicas dos filhos observa-se que não consiste em um problema isolado e envolve a grande maioria dos discentes da escola. O próprio balançar da cabeça dos docentes, em sinal de concordância com o que estava sendo relatado pelo(a) professor(a), indica que o problema abrange a escola como um todo. O acompanhamento do filho não acontece com aquela preocupação de ensinar. Que a criança aprenda. A maioria das crianças chega sem tarefa de casa [...]. O professor tem que desdobrar aqui para alcançar resultados. O tempo integral tá suprindo muito essa questão. Só que o vazio, aquela falta de ajuda do pai, não tem nada que substitui. Mas a credibilidade tem muita, eles gostam da escola, eles participam da escola, eles participam desses eventos. Mas, no dia-a-dia, na tarefa de casa, no 186 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. Discente participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 04/10/2012. 188 Discente participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 04/10/2012. 187 194 acompanhamento do aprendizado não. Até porque eles não têm nem essa capacidade, conhecimento [...] (Participante 7).189 As dificuldades190 dos pais de acompanhamento das atividades escolares dos filhos é um aspecto recorrente nas entrevistas: às vezes sentimos um pouco de omissão por parte de alguns pais quanto à aprendizagem dos alunos. Certa dificuldade de estar ajudando na aprendizagem do menino (Entrevistado 1).191 As dificuldades que muitas vezes encontramos é de alguns pais, poucos pais, que não reconhece que precisam participar da vida do filho. Quantas vezes deixam de ir numa reunião, afirmando que a escola pode caminhar sem a sua presença (Entrevistado 4).192 Para os docentes, a ausência de acompanhamento dos pais nas atividades pedagógicas dos filhos associa-se ao fato de serem, em sua grande maioria, analfabetos. Obviamente o analfabetismo implica em restrições aos pais, especialmente no acompanhamento das atividades curriculares dos filhos, na articulação dos saberes tratados pela escola com os conhecimentos e experiências dos sujeitos. Por outro lado, a inexistência de acompanhamento das atividades pedagógicas dos filhos está associada também ao próprio sentido de participação que vem sendo construído pela escola, situado mais no nível da presença física do que como engajamento. Assim, para muitos pais, participar é sinônimo de presença física em reuniões e eventos promovidos pela escola, sem se comprometer com as ações e resultados. Para assegurar maior participação da comunidade nas práticas do PPP esse é um dos desafios que a ser enfrentado pela escola, considerando que a ausência de envolvimento dos pais nas atividades pedagógicas compromete a qualidade do ensino (PARO, 2000). Mesmo diante das restrições de apoio às atividades curriculares dos filhos, crê-se que formas alternativas de acompanhamento podem ser canalizadas, de modo a permitir um papel proativo desses sujeitos no acompanhamento da vida escolar dos filhos, preocupando-se com o seu dia a dia na escola, assim como em relatar sua própria experiência de vida. 189 Professor participante do grupo focal realizado na escola pesquisada em 02/10/2012. Conforme descrição feita no grupo focal docente. 191 Supervisora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012 192 Supervisora da escola pesquisada participante da entrevista em 02/11/2012. 190 195 Por outro lado, os profissionais da escola em parceira com a comunidade educativa podem viabilizar uma reflexão com os pais das possibilidades de aproximação e acompanhamento das atividades curriculares trabalhadas pela escola, apoiados em reuniões, seminários, grupos de reflexão, palestras, dentre outras atividades. Assim como estabelecer estratégias de abordagem dos conteúdos em diálogo com às experiências tácitas presentes na comunidade que permitam uma maior participação dos pais. O acompanhamento dos pais das atividades pedagógicas desenvolvidas pelo(s) filho(s) é fundamental, pois favorece a articulação entre saberes escolares e experiências tácitas, componentes curriculares e extracurriculares. Refletir sobre as possibilidades de uma participação mais proativa dos pais nas práticas pedagógicas é fundamental para o fortalecimento dos processos de participação engajada, onde coexista compartilhamento de responsabilidades entre pais-escola para o alcance do sucesso pedagógico da escola. Esse envolvimento dinâmico é fundamental para construção de práticas pedagógicas colaborativas sintonizadas com as experiências da comunidade e potencialmente aptas à uma maior interlocução discente. Uma dessas possibilidades estaria no próprio diálogo entre saberes escolares e experiências de vida (saberes tácitos) da comunidade, valorizando a autonomia e identidades do sujeitos na construção de uma práxis educativa capaz de articular as dimensões concretas (realidade) e as expectativas (desejo) pelas condições concreta vivenciadas pela escola. 196 Unidade 13: Preparação profissional para as vivências comunitárias O diálogo entre as experiências comunitárias e o saberes tratados pela escola demanda uma formação dos profissionais em sinergia com a realidade local com maior sensibilidade no reconhecimento de dimensões históricas e socioculturais próprias da comunidade escolar. Requer ainda, valorizar os sujeitos escolares em sua diversidade de experiências e expectativas. É preciso que o profissional esteja preparado para lidar com a educação. A educação é em longo prazo, então ele precisa estar estruturado, com bastante conhecimento. Ele precisa ser um profissional estudioso em todos os sentidos para ele poder se completar como ser humano e entender as diferentes realidades de cada criança [...] (Entrevistado 3).193 Ainda que para os docentes a principal finalidade do PPP seja a capacitação dos profissionais em serviço e que exista estratégias de capacitação sustentadas em iniciativas da própria escola (palestras, seminários, rodas de conversas, dentre outras) ou em iniciativas da SRE de Teófilo Otoni, persiste lacunas no diálogo dessas estratégias com as experiências comunitárias. Entende-se que a ausência de uma formação mais sistemática, em sintonia com as próprias experiências comunitárias, dificulta a compreensão das práticas do PPP como possibilidade de maior participação da comunidade. Assim como, as possibilidades de maximização das sinergias entre as atividades curriculares e extracurriculares, de aproximação dos saberes escolares aos saberes tácitos. Ainda que haja apoio da comunidade educativa, a principal dificuldade encontrada para a continuidade das atividades é a falta de financiamento da experiência que permita ao grupo participar, assim como de promover encontros entre corais com estímulo à própria experiência. Às vezes, faltam recursos para questões básicas necessárias à sustentabilidade do grupo. A parte financeira é a mais difícil. Os alunos crescem rápido, a gente consegue um uniforme bonitinho, daqui a pouco fica pequeno e a gente fica sem saber como comprar outro. É o sapato que aperta no pé. O mais difícil e essa parte financeira. Nós ainda não encontramos um apoio financeiro (Entrevistado 2).194 193 194 Diretora da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 197 Em uma comunidade carente e vulnerável não é possível às famílias assumirem esse tipo de despesa. É necessário qualificar a comunidade para buscar no conjunto das políticas públicas para a cultura e lazer incentivos para financiamento da experiência, considerando o seu papel imprescindível para a comunidade. Outro desafio consiste na articulação das atividades curriculares com as questões de formação humanística e pedagógica tratadas no coral. A relação estabelecida com os profissionais da escola, principalmente como os professores, situa-se ainda ao nível da presença física. É necessário um papel proativo maior dos professores na construção de processos articulados entre as experiências vivenciadas no coral com os conteúdos e conjunto de saberes curriculares. Unidade 14: A participação da comunidade no planejamento das ações Em relação ao planejamento das atividades uma das principais dificuldades consiste na sistemática adotada nas reuniões de módulo II em que o planejamento é feito por ano de escolarização, dificultando a compreensão da dinâmica global da escola. Essa estratégia de planejamento não favorece a interlocução com o contexto global da escola e compreensão da articulação das dimensões do PPP (situacional, ideal e operativa) com esse contexto. No planejamento das atividades por ano de escolarização fica ausente ainda um envolvimento da comunidade escolar, em especial de pais, alunos e segmentos da sociedade civil na programação das propostas. A elaboração fica restrita a equipe pedagógica ou, melhor, aos professores por ano de escolarização e supervisores, assumindo um caráter de formalidade técnica. Essa estrutura de planejamento fragmentária segmenta as ações entre o corpo de sujeitos responsáveis pelo pensamento e estruturação das propostas e aquelas que executam as ações, implicando numa restrição quanto a percepção do contexto global do PPP. Isso reforçar as visões compartimentadas da sua natureza pedagógica e institucional em detrimento ao seu caráter autogerador (VEIGA, 2003). 198 Salvo algumas exceções195 a ausência de um envolvimento dos discentes no planejamento das atividades compromete a formação da autonomia e desenvolvimento proativo dos discentes demandando avançar em processos colegiados de planejamento das atividades curriculares como possibilidade de concretude da vivências democráticas do PPP. Quando vamos fazer uma apresentação, de acordo com a música que eles irão apresentar têm aqueles personagens que deverão ser encenados, às vezes tem um ou dois alunos que não querem fazer aquele personagem. Eu sempre procuro respeitar a opinião deles, negociando outras possibilidades de participação com o grupo (Entrevistado 2).196 As possibilidades dos sujeitos sugerirem os temas das apresentações e de participarem da sua programação, com liberdade de expor as suas ideias, sugerem certo nível de reciprocidade com os processos engajados, com poder descentralizado das decisões e corresponsabilidades coletivas (LUCK, 2010). 195 Essas exceções estão relacionada as atividades extracurriculares do coral e as atividades programadas pela própria comunidade nos finais de semana na escola onde prevalece a indissociabilidade entre concepção e execução. 196 Membro da comunidade da escola pesquisada participante da entrevista em 30/10/2012. 199 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao tomar como objeto de estudo os processos relacionados às inovações nas práticas do PPP para maior participação da comunidade priorizou-se, num primeiro momento, a análise da emergência das inovações e sua aplicação no campo educacional, bem como, dos processos de gestão e suas possibilidades de participação autogeradora da comunidade nas práticas do PPP da escola. Vê-se que o conceito de inovação têm sua origem no pensamento do economista Joseph Schumpeter, da chamada teoria das inovações, cuja base era a criação de novos produtos e processos, associados ao desenvolvimento tecnológico, com fator de dinamização dos ciclos de crescimento do capitalismo. A crise do sistema capitalista (1970), motivada pelo esgotamento do sistema produtivo taylorista/fordista, demonstrou a insuficiência dessa perspectiva para assegurar os ciclos de crescimento capitalista (ARAÚJO; CASTRO, 2001). Constata-se que havia outras questões intervenientes, como a concentração de renda, retração do consumo das famílias, desemprego estrutural, dentre outras, que precisavam ser consideradas. A estratégia principal consistiu em mudanças no padrão de acumulação para os parâmetros da produção flexível, assim como da emergência das dimensões dos processos inovativos organizacional e de marketing, de caráter não-tecnológico. Por sua vez, essas mudanças implicaram em alterações nos processos de gestão, que passaram a ser referendados na eficácia, eficiência e produtividade das empresas. Na década de 80, com a acentuação dos processos de internacionalização da economia, observa-se que aprofundaram os parâmetros da acumulação flexível, das formas de organização da produção e consumo, tendo como implicação principal a necessidade de compreender os processos econômicos interrelacionados às questões sociais, políticas e culturais. Esses processos passaram a ser objeto de pesquisas relativas às inovações, inclusive no campo educacional. 200 As novas dimensões implicaram na necessidade de intepretação das inovações numa perspectiva reflexiva, contrapondo as questões deterministas da tecnologia. Assim, as pesquisas passaram a destacar as dimensões educacionais, políticas, sociais, culturais e o papel dos sujeitos como importantes para compreender os processos inovativos (MACHADO 2009; MACIEL, 2001). Nesse novo cenário de análise dos processos inovativos a metodologia ideográfica, ao pressupor a aproximação dos sujeitos da compreensão da sua experiência de vida (LOPES; BARBOSA, 2008), apresenta-se como mais adequada para a compreensão dos processos inovativos autogeradores que envolvem a participação da comunidade na gestão das práticas do PPP. Quanto ao campo educacional situou-se que na década de 1960 começa-se a pensar em mudanças na organização curricular norte-americana para o ensino de ciências e matemática, em um caráter investigativo e experimental, que respondesse às demandas da sociedade tecnificada (HERNÀNDEZ, 2000). Se, no início, essas mudanças estavam relacionadas a qualquer aspecto novo introduzido no sistema de ensino, paulatinamente, esse conceito passa a ser visto como um processo intencional e sistemático de melhoria da qualidade do ensino (HERNÁNDEZ et al, 2000; CARBONELL, 2002). Enquanto processo intencional e sistemático, inferiu-se que essas mudanças perpassam por uma concepção de homem e sociedade que se deseja construir, coerente com a trajetória histórico-social da comunidade. Por outro lado, constata-se que as propostas de inovações norte-americanas eram verticalizadas, elaboradas por equipes técnicas, sendo essa tendência incorporada pelas políticas educacionais brasileiras. Ao analisar as práticas de gestão do PPP observa-se que a perspectiva gerencial, centrada na prescrição para as escolas de metas de proficiência, sem envolvimento direto da comunidade, consiste numa novo cenário de reconfiguração dessa tendência em uma base verticalizada. Constata-se ainda, que a ausência de envolvimento dos sujeitos e modificação das suas concepções consiste num fator decisivo para o fracasso das propostas de inovação prescritas pelos órgãos centrais que comandam as políticas educacionais. Implica em reconhecer o papel 201 fundamental dos sujeitos, sua realidade histórico-social e participação na constituição de todas as etapas da proposta. Vê-se que na década de 1990 há um aprofundamento do debate dos processos inovativos relacionados à realidade histórico-social dos sujeitos, ao caráter multidimensional da cultura escolar. Essas propostas têm como referência o caráter dinâmico e autogerador da comunidade no diálogo entre os campos instituído e instituintes nas práticas do PPP. Tomando como referência a participação direta e os potenciais existentes na comunidade esse caráter autogerador das propostas estaria no envolvimento direto dos sujeitos com as transformações, valorizando suas dimensões histórico-sociais e sua capacidade de proposição de mudanças emancipatórias ou edificantes (VEIGA, 2003). Quanto aos processos de gestão do trabalho escolar e produção de inovações nas práticas do PPP, percebe-se que a concepção sociocrítica, com seus desdobramentos democráticoparticipativos, apresenta-se como mais adequada para a emergência de ações autogeradora da comunidade nas práticas do PPP. A perspectiva sociocrítica baseia-se na historicidade dos processos humanos, nas dimensões socioculturais, nas interações mútuas estabelecidas entre os pares. Ao tomar como referência os sujeitos reconhece a capacidade dos mesmos de modificar a própria realidade e produzir inovações sustentadas no diálogo, na participação social. Parte do reconhecimento das possibilidades de mobilização coletiva, da participação ativa e competente dos sujeitos na organização das ações coerentes com a unidade de trabalho, consequentemente, com as práticas do PPP (LUCK, 2010). As dimensões societárias de organização do projeto democrático-participativo sinaliza com condições prévias para a existência de inovações autogeradoras das práticas do PPP na medida em que valoriza o caráter proativo e propositivo dos sujeitos comunitários de enfrentamento da realidade. Os fundamentos da perspectiva sociocrítica de gestão estão no contexto histórico-social de redemocratização da sociedade brasileira, dos movimentos de participação social que emergem a partir da década de 1980 como condição necessária para a vivência de processos 202 de participação coletiva, do poder de decisão compartilhado e corresponsabilidade dos sujeitos com o alcance de objetivos comuns quanto ao ideal de sociedade desejada. É nesse contexto de democratização da escola que começam a surgir experiências inovativas como possibilidade de maior participação da comunidade em suas práticas. Dentre essas experiências destaca-se a eleição dos diretores escolares, o colegiado escolar e a administração dos recursos pela própria escola com a constituição da unidade jurídica denominada caixa escolar. Todas essas experiências têm como fundamento a CF/1988 e LDB 9394/96 ao nomear a gestão democrática e possibilidades da escola de organizar o seu PPP. Quanto à participação da comunidade, apoiando-se em Gohn (2004), discute-se que a sua maior participação nas práticas do PPP perpassa pelo reconhecimento e diálogo com o universo da comunidade educativa, e pelo envolvimento dos sujeitos dentro da escola (professores, alunos, supervisores, diretor, pessoal do setor administrativo, dentre outras.) e fora da escola (secretarias, associações, sindicatos, vizinhança, dentre outros). Na medida em que segmentos da sociedade civil desenvolvem ações educacionais de interesse público esse diálogo permite maximizar o capital social197 e avançar em práticas de gestão social. Esse aspecto é um dos fatores decisivos para o desenvolvimento local ao coresponsabilizar os atores a atuarem de forma comprometida com a transformação social da escola e, consequentemente, da comunidade (DOWBOR, 2006). Destaca-se a importância do envolvimento da comunidade educativa nas ações escolares, especialmente nas atividades socioculturais e do seu real significado para os processos de aprendizagem cognitiva e vivência social discente. Assim como, da reciprocidade entre os sujeitos escolares e as instituições presentes na comunidade educativa, na ampliação do significado social da escola e suas contribuições com o desenvolvimento local. Evidencia-se que enquanto processo de ação-reflexão-ação inconcluso, as vivências do PPP demandam de relações dialógicas da comunidade educativa perpassando pelos campos instituintes e instituídos, na tênue relação entre mudanças e estabilidade, para constituição do projeto de educação e sociedade desejada. 197 Para Dowbor (2006) esse capital social esta presente na estreita relação entre as instituições públicas e a sociedade civil nos processos de transformação local. 203 Quanto as experiências empíricas de participação da comunidade escolar os dados sinalizam com as intenções dos sujeitos escolares de democratização das práticas do PPP para maior participação da comunidade em sua vivência concreta. As intenções estariam relacionadas à liberdade de expressão dos sujeitos, ao compromisso e cooperação dos profissionais, à preocupação em conhecer e acolher a comunidade educacional, ao reconhecimento dos alunos em sua diversidade, aos projetos pedagógicos de ensino, à abertura da escola à participação da comunidade, às atividades extracurriculares e ao diálogo da escola com a comunidade educativa. Apontam ainda, uma escola aberta ao diálogo com participação dos diferentes segmentos comunitários com liberdade de expressão. Essa liberdade estaria tanto nas práticas de gestão, abertas a ouvir a comunidade, quanto nas possibilidades dos sujeitos manifestarem o pensamento divergente nos espaços de participação coletiva (reuniões, cursos, rodas de conversas, dentre outras). Quanto à participação dos profissionais da escola prevalece um compromisso dos sujeitos relativos aos processos participativos, com envolvimento e cooperação dos diferentes segmentos profissionais na vivência colegiada das práticas pedagógicas e de gestão do PPP, cuja intenção é uma maior articulação escola-comunidade na realização de um projeto comum. O compromisso estaria relacionado tanto ao desenvolvimento da proposta de ensino da escola, responsabilidade com a aprendizagem dos alunos, articulação de tempos e espaços de formação mais amplos quanto na diversificação da programação extracurricular da escola e práticas colegiadas (das reuniões pedagógicas e do colegiado escolar). Quanto a vivência dos tempos e espaços escolares, a tendência predominante dos discentes é de alegria e prazer.198 A existência de sentimentos dessa natureza favorece o envolvimento dos alunos nas práticas do PPP, sinalizando uma predisposição de engajamento com as 198 Vale ressaltar que na realização dos grupos focais docentes e nas entrevistas com os supervisores sentimentos dessa natureza também estão presentes, estando associados principalmente à postura, compromisso e acolhimento da direção escolar. 204 proposta da escola. Esse engajamento estaria relacionado, principalmente, às vivências de atividades curriculares e extracurriculares da escola. Retomado o compromisso, enquanto valor dos processos participativos da escola, vê-se que se associa à própria perspectiva de trabalho colaborativo que permite à escola alcançar objetivos comuns. A ação colaborativa estaria relacionada principalmente à culminância dos projetos pedagógicos e da programação cultural, envolvendo um fazer e uma vivência coletiva dos professores e alunos. A soma de esforços docentes e discentes para realização das apresentações, o envolvimento de todas as turmas, a organização do cenário e a participação conjunta nas apresentações são algumas experiências em direção a essa perspectiva. As apresentações conjuntas199, envolvendo professores e alunos, podem ser vistas como uma prática inovativa de vivência da programação sociocultural da escola, na medida em que os conhecimentos são mediados na prática pelos sujeitos que assumem corresponsabilidades coletivas pela realização da ação. Percebe-se que a existência do compromisso e colaboração dos sujeitos nas práticas de participação pode ser vista como valor coerente com a emergência do caráter autogerador dos sujeitos nos processos participativos. Esse valor é importante, tanto na incorporação dos pressupostos teórico-filosóficos do PPP, orientando a concepção de homem e sociedade desejada, quanto na vivência das práticas. Existe, ainda, uma reciprocidade entre os valores encontrados e o que preconiza Luck (2010), ao apontar a ética, a solidariedade, a equidade e o compromisso dos sujeitos como valores dos processos participativos. Quanto ao envolvimento dos diferentes segmentos escolares numa mesma ação, além de favorecer o trabalho colaborativo entre os sujeitos, que passam a desenvolver uma ação para alcance de objetivos, fortalece as articulações do PPP para o desenvolvimento das suas ações em uma prática colaborativa. Essa dinâmica de envolvimento dos diferentes segmentos da escola favorece a construção das relações mútuas e a sinergia entre os profissionais, permitindo o desenvolvimento de ações articuladas para a participação da comunidade. 199 A ideia das apresentações conjuntas envolvendo professores e alunos aparece tanto no grupo focal docente quanto discente. 205 Quanto às finalidades do PPP, nota-se que a escola tem como referência questões humanísticas e pedagógicas, pressupondo uma participação fundamentada no respeito à diversidade, no acesso de todos os sujeitos aos conteúdos curriculares. É uma escola inclusiva, intencionada a democratizar o acesso e a permanência dos alunos, conforme previsto na LDB 9394/96, procurando receber e acolher todos, seja com necessidades especiais (condutas típicas) ou desvio de comportamento social. Vê-se que há uma coerência entre os princípios que orientam a concepção da escola e a prática concreta dos sujeitos comunitários. As finalidades humanísticas e pedagógicas do PPP são determinantes também para o trabalho que a escola realiza de visitas às famílias dos alunos, cuja intenção é a construção de estratégias de apoio ao processo de escolarização discente. Obviamente, por limitações de tempo e recursos humanos, as visitas200 são feitas, priorizando os alunos com maiores dificuldades de aprendizagem. Por outro lado, essa aproximação com as famílias e conhecimento da sua realidade históricosocial permite à escola mobilizar outras instituições e seus respectivos serviços, enquanto parceiros da escola, na constituição dos serviços de apoio necessários ao enfrentamento dos problemas vivenciados. Ao constituir-se como um processo intencional e sistemático voltado para o conhecimento da realidade histórico-social dos alunos, as visitas às famílias podem ser vistas como uma estratégia de gestão autogeradora que contribui com a melhoria da qualidade educacional e com a maior participação da comunidade nas práticas do PPP. Essa aproximação da escola com a comunidade está relacionada também à abertura dos espaços escolares para a participação da comunidade, especialmente nos finais de semanas. Vale ressaltar que essa cultura de participação da comunidade nos finais de semana na escola antecede ao próprio Programa Estadual Escola Viva, Comunidade Ativa201, considerando que já existiam oficinas (artesanato e pintura, costura, coral, dentre outras), atividades culturais e 200 As visitas feitas pelos profissionais das escolas às famílias dos alunos aparecem tanto no grupo focal docente quanto nas entrevistas realizadas com os supervisores e diretor. 201 Conforme apontamos atualmente, a escola é contemplada pelo Programa que consiste numa iniciativa das políticas estaduais de educação públicas de aproximação da escola à comunidade em regiões de vulnerabilidade social. 206 de lazer na escola. Além da aproximação escola-comunidade, o desenvolvimento das atividades favorece o acesso ao lazer como um direito fundamental para a vivência cidadã. O desenvolvimento de atividades na escola nos finais de semana é um dos fatores que contribui para que a escola não seja vítima de avarias no seu patrimônio, mesmo situada em área de vulnerabilidade social. Há ainda um trabalho pedagógico voltado para a preservação do patrimônio da escola, sendo que os discentes expressam serem conscientes da utilização dos espaços em sua vivência escolar.202 Outro aspecto relativo às dimensões democráticas de gestão do PPP enquanto ação que contribui para a maior sinergia da escola com a comunidade são os projetos pedagógicos203 desenvolvidos pela escola. Esses projetos contribuem para a vivência discente de tempos e espaços escolares mais amplos e participação, principalmente de pais e familiares, na programação sociocultural de culminância dos mesmos. Aponta-se, ainda, que os projetos desenvolvidos pela escola em parceria com a comunidade educativa viabilizam o desenvolvimento de atividades diversificadas (oficinas, ruas de lazer, palestras, dentre outras) de caráter sociocultural para a comunidade. Essas atividades asseguram à comunidade o acesso à cultura e ao lazer como direitos fundamentais. Há ainda as atividades que são desenvolvidas nos espaços da própria instituição parceira204, sendo oportunizado aos discentes o conhecimento de novos espaços e suas possibilidades. O diálogo da escola com a comunidade educativa apresenta-se como uma das principais inovações das práticas do PPP, na medida em que oportuniza à comunidade, especialmente aos discentes, o acesso a um conjunto de experiências extracurriculares diversificadas, enquanto possibilidade para a vivência cidadã. Umas das principais formas de articulação desse diálogo têm sido por meio da programação cultural da escola e das ações que vem sendo desenvolvidas pelo coral da escola. 202 Tivemos a oportunidade de observar, por exemplo, que há uma preservação dos painéis da escola e do pequeno jardim existentes na escola. 203 Os projetos pedagógicos foram enfatizados tanto no grupo focal docente quanto nas entrevistas, sendo mencionado o Projeto Zé do Livro. 204 Dentre essas atividades, destacamos as visitas feitas pelos alunos ao SESC, onde têm oportunidade de vivenciar atividades de lazer (oficinas de jogos de mesas, jogos de quadra, recreação aquática, dentre outras) e atividades culturais (visita à biblioteca e conhecimento das obras literárias disponíveis, visita ao casarão de cultura, dentre outras). 207 As atividades desenvolvidas pelo coral da escola fortalece o diálogo entre comunidade escolar e educativa, permitindo aos alunos conhecerem novas realidades e amplia as sinergias dos processos de vivência curricular com a sua realidade histórico-social. Assim, a interlocução com a comunidade educativa permite um enriquecimento da programação cultural da escola e favorece uma maior participação da comunidade nas práticas do PPP. Dentre as instituições da comunidade educativa que apoiam as ações escolares, destacam-se o SESC – Serviço Social do Comércio, a Polícia Militar por meio do Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência – PROERD e os Correios. Nesse processo de articulação da escola com a comunidade educativa. percebe-se que há um esforço dos profissionais da escola na construção de dimensões societárias de gestão, de aprofundamento dos princípios democrático-participativos que visam à maior participação da comunidade. Essas características gestionárias estão presentes na participação dos profissionais da escola nos processos decisórios, e na sensibilidade dos mesmos de ouvir a comunidade, especialmente as suas sugestões e críticas. Assim como de mobilizar outros parceiros da rede no apoio às dificuldades enfrentadas. Assim, ações prioritárias que vêm sendo desenvolvidas pela escola para maior participação da comunidade nas práticas do PPP podem ser apontadas pelo respeito aos valores humanos associados ao reconhecimento dos sujeitos escolares em sua diversidade: a valorização da liberdade de expressão da comunidade; o compromisso e cooperação dos profissionais da escola nos processos participativos; a preocupação em conhecer e acolher a comunidade educacional em sua diversidade, especialmente na construção de estratégias de trabalho pedagógico diferenciadas; os projetos pedagógicos de ensino desenvolvidos pela escola; as atividades abertas à participação da comunidade, especialmente nos finais de semana; as atividades extracurriculares e o diálogo da escola com comunidade educativa. Essas ações, enquanto principais estratégias que vêm sendo construídas, de caráter intencional e sistemático para a participação da comunidade nas práticas do PPP, apresentam-se como as principais possibilidades de vivência das dimensões histórico-sociais dos sujeitos. Assim, dialogam com os potenciais autogeradores, com o caráter edificante das inovações, na medida em que propõe contribuir com a melhoria da qualidade do ensino. 208 Por outro lado, as experiências de articulação escola-comunidade na vivência das práticas do PPP apontam para determinados limites que comprometem a emergência de processos inovativos autogeradores em sua prática. Dentre esses limites, a investigação aponta para a concepção dos profissionais da escola dos processos participativos como presença física, especialmente dos pais e familiares na programação sociocultural da escola; as dificuldades dos pais de acompanhar as atividades pedagógicas; a ausência de uma formação em serviço articulada com as experiências comunitárias; a segmentação entre concepção e execução no planejamento das atividades, especialmente no envolvimento dos alunos; a coexistência de processos societários e gerenciais nas práticas de gestão. Apesar da percepção dos sujeitos (docentes e discentes) ser positiva205 quanto à participação da comunidade, a concepção central desses sujeitos é da participação da comunidade nas atividades extracurriculares da escola. A ideia é: uma comunidade participativa sempre recebe um chamado, um convite para participar da programação sociocultural (eventos, palestras, exposições, dentre outras). De acordo com Luck (2010), o envolvimento da comunidade apenas nas atividades extracurriculares estaria para a participação como presença física, na qual a simples presença da comunidade na programação é associada como participação. Mesmo existindo uma abertura da escola em ouvir e dialogar com as sugestões da comunidade, são necessárias mudanças substanciais nos processos participativos, de modo a assegurar a efetiva participação dos sujeitos nos processos decisórios. O sentido de participação estaria relacionado mais à presença física em atividades extracurriculares (festas juninas, ruas de lazer, oficinas, dentre outras) do que participar das decisões da escola, com sentimento de autoria e responsabilidade coletiva (LUCK, 2010). Vale ressaltar que as atividades, quando são organizadas pela própria comunidade e acontecem na escola nos finais de semana, são uma exceção à participação como presença física, considerando que, nesse caso, a comunidade é responsável pela concepção e execução das propostas, ou seja, existe um sentimento de autoria. Ainda que existam as experiências de articulação com a comunidade educativa, conforme situado anteriormente, quando os docentes e discentes referem-se à participação comunitária, 205 Os dados apontam que mais de 90% dos discentes e docentes consideram a comunidade participativa. 209 a tendência central corrobora com a redução do seu universo de atores (GOHN, 2004), não situando as relações mais amplas em processo de construção com outras instituições (públicas e privadas) e segmentos da sociedade civil. Os achados investigativos apontam para a necessidade de trabalhar as formas de participação e o conceito de comunidade com os profissionais da escola, potencializando esses sujeitos a maximizar as experiências em construção, com o deslocamento da perspectiva do convite para processos continuados de interação escola-comunidade nas práticas do PPP. A mudança de concepção é fundamental, já que a perspectiva da participação como presença física não produz um efetivo envolvimento dos sujeitos no debate, nos processos de tomada de decisões, compartilhando responsabilidades. Nesse sentido, não favorece a emergência de inovações numa perspectiva autogeradora das práticas do PPP. Quanto às formas de participação representativas ainda que sejam mencionadas no grupo focal discente em que o colegiado da escola é atuante, precisam ser fortalecidas nos processos participativos, especialmente dos discentes e suas formas de representação. Sente-se uma ausência nos grupos focais e nas entrevistas da abordagem de questões como as formas de associação de discente (grêmio estudantil), grupos de trabalho, líderes de turmas, dente outras. Essas questões precisam ser trabalhadas e fortalecidas na escola. Em relação à programação das atividades extracurriculares, que são realizadas em parceira com a comunidade educativa, não são mencionadas as formas de planejamento participativo, como estratégia de envolvimento mais amplo da comunidade. A ideia que persiste são das atividades e/ou programação definidas pela instituição parceira e pelos profissionais da escola abertas à participação da comunidade. Nota-se que é necessário aperfeiçoar as formas de planejamento participativo, em que a comunidade seja consultada, participe das decisões e assuma corresponsabilidades. A forma como são organizadas as atividades produzem uma segmentação entre concepção e execução, limitando a expressão do sentimento de autoria dos sujeitos. Ainda que os professores relatem a importância de ouvir o aluno, vê-se que a segmentação entre concepção e execução também está presente no planejamento das atividades pedagógicas que culminam na programação sociocultural, já que a proposta dos temas são 210 programadas pelos professores em reuniões de módulo sem a participação de representantes discentes e/ou mesmos de canais de interlocução direta e levantamento prévio das expectativas discentes. Constata-se, ainda, que o planejamento das atividades em reuniões de módulo, feito apenas por ano de escolarização, compartimentaliza as propostas, dificultando a percepção global da escola e de seu PPP. A definição de estratégias e conteúdos específicos para um determinado ano de escolarização é importante, mas demanda ser intercalada com momentos de reflexão coletiva que permitam aos sujeitos compreender a dinâmica global de funcionamento da escola. A superação dos processos fragmentados demanda um esforço dos profissionais da escola em compreender e construir elos indissociáveis entre concepção das práticas pedagógicas, gestão dos processos e vivência concreta do PPP, rompendo com a segmentação entre concepção e execução. Essa é uma demanda que exige uma intervenção capaz de produzir uma maior sinergia escola-comunidade, especialmente na programação das atividades curriculares e extracurriculares. Outro desafio de vivência de dimensões autogeradores da prática do PPP consiste nas dificuldades encontradas ao apoio do processo de escolarização dos filhos, considerando que muitas crianças vivem com os avós que não vivenciaram o processo de escolarização formal. A falta de apoio estaria relacionada às atividades pedagógicas que são propostas pelos professores em sala de aula para serem desenvolvidas em casa como o acompanhamento das famílias. Sem dúvida, a ausência de uma vivência escolar dificulta o acompanhamento escolar dos filhos, especialmente o diálogo dos pais e/ou avós com os saberes sistematizados. Situa-se que ainda que haja limite no acompanhamento das atividades pedagógicas, um dos caminhos para se construir essa interlocução estaria na possibilidade de dialogar com os saberes e experiências tácitas da comunidade, enquanto possibilidade de vivência inovativa do PPP. Pontua-se, ainda, que a escola também pode buscar estratégias com a comunidade educativa, especialmente das instituições de formação docente, estratégias de apoio a essas famílias. 211 Por outro lado, as estratégias de formação em serviço dos profissionais da escola não são focalizadas no diálogo com as experiências da comunidade. Ainda que exista um processo de capacitação dos profissionais (cursos, palestras, oficinas, dentre outras) para as práticas do PPP, os mesmos não preveem estratégias de diálogo com as experiências comunitárias. Se as inovações nas práticas do PPP para maior participação da comunidade demandam reconhecer as experiências tácitas da comunidade, como fator de maior sinergia escolacomunidade, é necessário que o processo de formação continuada dialogue com essas questões, como forma de conhecer os aspectos que favorecem e dificultam as vivências democráticas do PPP em seu sentido autogerador. Quanto às práticas de gestão206, uma das dificuldades apontadas, especialmente pelos docentes, é o medo e insegurança quanto às propostas de mudanças definidas pela SEE/MG. Essas questões estão associadas ao modelo de gestão definido pelo Estado para as escolas públicas em curso, de aplicação dos princípios da administração empresarial à gestão para resultados. Essa perspectiva de associar resultados educacionais à remuneração num sistema de concorrência reduz a vivência dos processos societários e gera insegurança dos profissionais. Infere-se, assim, que ainda que exista o esforço da escola e de seus profissionais em produzir modificações nas práticas do PPP para vivência de processos autogeradores em suas dimensões societárias, há um modelo gerencial em curso, presente no universo das políticas estaduais que verticaliza essas relações e gera contradições na vivência concreta. Assim, a escola convive com a tênue relação da perspectiva societária e gerencial de gestão. Enquanto um processo de experiência em construção, a suposição de que a escola produz inovações na gestão do seu PPP para maior participação da comunidade pode ser confirmada, na medida em que há um processo intencional e sistemático de aproximação da comunidade educativa para a constituição de um sistema de apoio à escola; a existência de um envolvimento e compromisso dos profissionais da escola com as práticas do PPP; as sinergias entre os diferentes segmentos escolares e o trabalho colaborativo; a vivência das finalidades humanísticas e pedagógicas do PPP na prática concreta, respeitando os alunos em sua 206 As questões relativas à insegurança quanto aos processos de mudança aparecem nos questionários docentes e nas entrevistas com os supervisores. 212 diversidade. Diante do cenário democrático de vivência das relações na escola, esses aspectos apresentam-se como possibilidades de vivência dos processos em uma base autogeradora, na qual os sujeitos assumem sua condição histórico-social de produção de mudanças de caráter edificante e/ou emancipatório. Vale mencionar que esse diálogo com a comunidade educativa amplia as possibilidades de participação de segmentos da sociedade civil em ações educacionais onde prevalece o interesse público de melhoria da qualidade educacional. O nível de evidência mais significativo são as atividades extracurriculares onde, pela participação da sociedade civil, há possibilidades de vivência e interlocução dos discentes com a realidade local. O aprofundamento dessa participação da sociedade civil são condições necessárias para emergência de uma gestão social cujo desdobramento podem ser práticas do PPP conexas com a perspectiva do desenvolvimento local. Por outro lado, enquanto experiência em construção persiste desafios que limitam a vivência dos processos autogeradores do PPP. Conforme mencionado, torna-se relevante reconsiderar o processo de participação da comunidade, inclusive dos discentes no planejamento e na programação pedagógica e sociocultural; o fortalecimento da perspectiva de gestão societária da escola, já que coexiste com o modelo gerencial; a formação dos profissionais em sinergia com as experiências comunitárias; a estratégia de apoio aos pais no acompanhamento pedagógico dos filhos; o ressignificado das formas de participação e do conceito de comunidade; a criação do grêmio estudantil e o fortalecimento da atuação do colegiado A revisão desses aspectos contribuirá para o fortalecimento da experiência prática do PPP em construção, aprofundando as dimensões societárias de um projeto democrático-participativo de gestão em construção e dos processos inovativos autogeradores, em que os sujeitos assumem o curso das mudanças, conforme sua realidade histórico-social. 213 REFERÊNCIAS ABRANCHES, Mônica. 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