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INTRODUÇÃO Em meus 30 anos de motociclismo, fiz de tudo um pouco. Algumas pistas e muita graxa na adolescência me levaram para a Engenharia. Do interior da Europa ao Sertão nordestino veio o gosto pelas descobertas. Do Pantanal à Patagônia nasceu o prazer de fugir da estrada. A diversidade cultural, os costumes e até os momentos de total solidão me ensinaram o valor de viver entre as pessoas. Em meus 25 anos como executivo de grandes empresas, vivi em diversos tipos de organizações, alguns países e uma infinidade de projetos. Quando comecei a trabalhar para pôr em prática a “Expedição 5 Continentes” – uma volta ao mundo em duas rodas –, talvez meu maior desafio e o que me exigiria o maior número de recursos físicos e emocionais, senti de muitas pessoas reações que já me eram familiares, seja no meu “mundo moto” seja no meu “mundo corporativo”. Aprendi a lidar com isso e seguir meu sonho, assim como identifiquei essas características e aprendi a conviver com elas. E tenho certeza de que você, leitor, conhece pessoas: 2 • Frustradas por nunca realizarem nada do que sonham. • Infelizes com os rumos de sua carreira e de sua vida, agarradas a sonhos delirantes. • Certas de que o desconhecido é sempre muito perigoso ou até impossível! • Que parecem se contentar com pouco, que acham tudo sempre muito “difícil” ou “demorado”, mas reclamam da sorte. • Que não vão adiante por puro medo. Gente que chega a ficar paralisada diante das maiores oportunidades de sua vida. • E o mais assustador: que não tem nenhum sonho, nenhuma ambição e vai tocando a vida sem direção, sem chegar a lugar nenhum. Acredito sinceramente que quando nos colocamos em situações intensas de desafios, longas a ponto de sermos testados em nossa resistência e extremas a ponto de termos de lutar por nossa sobrevivência, temos uma oportunidade única de nos conhecermos e de nos desenvolvermos. Foi o que aconteceu: nos 650 dias de estrada ao redor do mundo e os quase dois anos anteriores de preparação me ensinaram muitas coisas sobre as pessoas e, principalmente, sobre mim mesmo. Ao convidá-lo para atravessar comigo os 3 cinco continentes neste livro, espero dividir com você não só as experiências maravilhosas que vivenciei, mas também aprendizados valiosos que podem ser aplicados na sua vida profissional e pessoal. Que farão você planejar e realizar sonhos que podem parecer impossíveis para a maioria das pessoas. Aprenda a trabalhar a seu favor, entender e desenvolver habilidades e ferramentas de realização. Ofereço a você uma reflexão sobre questões que podem atrapalhar, ou ajudar, o alcance de suas metas e a diminuir ou potencializar sua capacidade de realização. Veja o quadro: Ter sonhos é o que nos faz sentir realmente vivos e não apenas existindo. Eles nos fazem buscar um futuro melhor e mais feliz. Não existe, porém, vida plenamente feliz sem que nossos sonhos se tornem realidade. Sejam os mais simples ou os mais complexos, você precisa alcançá-los. Assim como não existe o sentimento de frustação para quem consegue realizá-los. Porém, é preciso pé no chão, planejamento, preparação e muito trabalho. Garanto que o esforço vale a pena! Nos próximos capítulos você acompanhará a realização de um grande sonho meu, mas também encontrará muitas ferramentas para alcançar os seus! Vamos em frente, pois o tempo é curto e a estrada é muito longa e cheia de buracos! _____________________________________ • O que faz alguns sonhos se transformarem em projetos perfeitamente viáveis, enquanto outros ficam no delírio ou na frustração? • Como é possível enfrentar o desconhecido e por que o “inédito” nem sempre é sinônimo de “impossível”? • Por que a sorte costuma ajudar os que se recusam a se contentar com pouco? • Como é possível construir coragem para realizar nossos maiores desafios? • Por que é fundamental ter enormes fontes de abastecimento de energia e aonde arrumar tanto combustível para sempre ir em frente – além do impossível? Em meados de 2009 eu estava decidido a colocar em prática um grande sonho: dar a volta ao mundo em uma moto, atravessando os cinco continentes, pelos caminhos mais inusitados. Esse sonho já tinha virado uma obsessão, mas demorou a tornar-se uma prioridade real na minha 4 5 2 – Um Continentes” pouco da “Expedição 5 vida. Com cabeça de engenheiro e viciado em conduzir “projetos-encrenca”, eu sabia que para transformar meu sonho em realidade precisava, antes de qualquer coisa, avaliar sua viabilidade e, em caso positivo, estruturar formalmente um projeto. E foi o que fiz. Começou então uma fase de planejamento e preparação que durou quase dois anos. Não contaríamos com nenhum suporte operacional, nem remoto e muito menos em campo. Essa foi uma das razões pela qual investimos muito em nossa preparação. Às vésperas de partir, eu sabia que tinha feito tudo que precisava ser feito. Estava seguro e confiante para ir adiante. Com minha moto, uma BMW GS1200 Adventure bem equipada e preparada, eu e Beth, minha mulher, atravessamos as Américas, a Europa, o Oriente Médio, a África, a Austrália e a Ásia. Pouco depois de pegarmos a estrada, enfrentamos a Amazônia, a pobreza e a criminalidade na América Central e os 50ºC do deserto de Cataviña, no norte do México. Do Canadá embarcamos para a Europa, onde finalizamos a preparação para entrar na África. Mas para chegar até lá tivemos de adotar uma rota nova, considerando que os caminhos pela Líbia ou pela Síria tinham sido fechados em decorrência da chamada Primavera Árabe, uma série de manifestações populares que eclodiu em 2011, gerando conflitos e até derrubando alguns governos. Ainda no Egito, me perguntaram se eu não sabia das milícias armadas, dos conflitos em Darfur e da guerra no sul do Sudão. Perguntaram -me também se eu não tinha medo. Claro que sim! Mas fui aprendendo a desenvolver coragem e a passar por esses tipos de situação com planejamento e cuidado. A Estrada de Moyale, no norte do Quênia, é famosa pelos conflitos tribais, pela bandidagem e até pelo histórico de sequestros de estrangeiros. Mas com a minha preparação adquirida e o aprendizado até aquela etapa, eu estava pronto para enfrentá-la. Como disseram os gringos, britânicos e alemães, ao chegar a CapeTown, no extremo sul do continente africano, tínhamos entrado para o seleto grupo dos “African Overlanders” (aqueles que conseguem atravessar o continente africano por terra, de caminhão, 4x4 ou moto). O prazer dessa conquista foi gigantesco e indescritível. Essa enorme emoção era nossa recompensa! Sem preço! 6 7 Depois da África, a Austrália e a Sibéria foram fáceis. Na Austrália fizemos grandes amizades e descobrimos que o famoso Outback não é tão terrível como se imagina. Chegamos à Sibéria no verão. Não por coincidência, mas por planejamento. As marcas do inverno estão em tudo e em todos, mas apesar das distâncias absurdas não tivemos maiores problemas. Chegamos então, cheios de coragem, para enfrentar a Mongólia. Tínhamos ouvido as piores coisas sobre o país. De fato, nessa etapa nos pegamos diversas vezes lutando por nossa própria sobrevivência. Houve dias em que achamos que não iríamos sair de lá. Mas conseguimos! O Irã foi surpreendente, não só pela incrível beleza, mas principalmente pela receptividade que tivemos. O valor de honra dos Persas se faz presente no dia a dia. Não éramos simples passantes estrangeiros. Éramos “hóspedes” de todo um país. O Uzbequistão, bem no centro da antiga Rota da Seda, é uma lição de história ao vivo e um dos lugares mais bonitos que conhecemos até então. No caminho de volta, entrar de moto em Cuba foi um presente merecido! Uma experiência inédita para nós e para os cubanos. Durante toda a expedição, e até mesmo antes de ela começar, ouvimos inúmeras vezes (...) Já era meio da tarde e eu vinha por uma pista de areia rala. Era uma planície imensa e víamos no horizonte o caminho sumindo através de uma pequena montanha. Pelos lados, estepes e areia até o infinito. Com a pista 8 9 que isso ou aquilo seria impossível. No entanto, a experiência e o prazer da superação e da realização foram fantásticos! Ao final tínhamos rodado 90 mil quilômetros, durante 650 dias, por 52 países. Beth e eu nunca achamos que não daria certo. Tínhamos planejado, organizado e desenvolvido metas. Sabíamos da maior parte das dificuldades, mas muitas surpresas vieram para nos trazer mais experiências. Era uma meta muito grande, mas não era maior do que nossa vontade de realizá-la. Um imenso sonho tinha se transformado em realidade. Nunca mais seríamos os mesmos. Não só pelas experiências e vivências que acumulamos, mas pela sensação de plenitude e felicidade que essa realização nos deu. Felicidade é o verdadeiro nome da nossa recompensa! _____________________________________ Capítulo 13 – Um duelo chamado Mongólia (trecho) surpreendentemente boa eu vinha andando bem. A minha moto, chamada Companheira, absorvia tudo sem reclamar. Até que, em uma fração de segundo, um banco de areia apareceu do nada. A frente da moto levantou e fomos caindo de lado, pela direita. A moto nos arrastava deitados e ainda escorregando pelo chão. Quando a própria moto fez uma virada é que conseguimos parar, em cima do lombo do banco de areia e apoiados pelo baú na traseira e pelo guidão enfiado no chão na frente. As rodas sem apoio nenhum. A reação instintiva foi desligar o motor para que a roda não fizesse um estrago ainda maior e rapidamente estiquei a mão até alcançar o botão vermelho que corta a ignição. Procurei Beth, que já estava se levantando. Assustada, mas inteira. Tentei sair, mas não consegui. Minha perna direita estava presa debaixo da moto, entre o carter e o cilindro. Beth tirou o capacete e veio ingenuamente tentar levantar a moto. “Calma! Vem pra frente, se coloca de costas, segura pelo guidão com as duas mãos e vamos juntos tentar de novo.” “Um, dois, três, vamos!” 10 O pouco que a moto mexeu não adiantou para desbloquear minha perna, mas em compensação a movimentação me serviu para saber o que é uma dor de verdade. Parecia que um elefante estava pisando sobre minha perna. Que dor! “Mais uma vez, um, dois, três e...” Nada de novo. Tinha aí mais de 300 quilos em posição invertida para levantar. Beth não conseguiria nunca me tirar de lá sozinha. Passei um momento tomado pela dor, de olhos fechados, esfregando as mãos pelo rosto e tentando entender. Em segundos passava de tudo pela minha cabeça. O que aconteceu? Será que quebrou algum osso? Tem sangue escorrendo? Ainda não dá pra ver. Talvez esteja dentro da bota ou da calça. Se eu tentar mexer vai piorar. Muita gente perde a perna em acidentes de moto. Será que eu também perderia? Se ficar muito tempo preso, não vai gangrenar? Será que terei de amputar? Onde? Em um hospital? Como vamos sair daqui? Que dor! “Má? (é assim que Beth me chama) Você está bem?” 11 “Tá doendo bastante. Não sei o que aconteceu.” “Má, não podemos ficar aqui, preciso tirar você daqui, precisamos achar alguém, não estou vendo ninguém, não tem nenhum ger por aqui, não tem nada! Como vamos fazer?” Beth não parava de andar. Se abaixava para me ver de perto, me acariciava na tentativa de aliviar a dor, se levantava, tentava ver algo se movimentando ao longe... Enfim, estava meio perdida. O tempo ia passando e nenhum sinal de vida. Nenhum carro, jipe, caminhão, cavalo, nada. Acho que já fazia mais de uma hora que estávamos na mesma situação, sem nenhuma esperança de ajuda. Entendi então que talvez fosse passar muito tempo nesse estado. Comecei a ficar assustado com a possibilidade de passar a noite no chão. Além do frio, a chance de alguém aparecer de noite seria mínima. E se passasse, poderia vir em velocidade e nos pegar como quase fez um jipinho alguns dias antes. Realmente precisávamos resolver tudo antes do anoitecer. Beth começou a ficar mais instável, sentava, levantava, falava algo pra mim e até falava 12 sozinha. Comecei a ficar preocupado com ela também. — Beth, você se lembra quando estávamos na estrada de Leon? E quando estávamos no porto de Ashdod? E de Moyale? Quando estávamos bem no meio dessas situações não víamos nenhuma saída. E sempre conseguimos sair de alguma maneira. E depois sempre tivemos ótimos momentos. Lembra? Nós vamos conseguir desta vez também! Vamos esquecer deste dia e ainda vamos fazer muita coisa bacana! Eu estava tentando segurá-la com a velha técnica de fazer retrospectivas positivas. É o que um líder faz, tentar amenizar o desespero de sua equipe e controlar o próprio anseio. Percebi que começou a funcionar quando ela mesma foi lembrando de várias outras situações. Ela falava, parava, retomava. Quando o silêncio ficava longo demais, eu recomeçava. Cuidar de Beth também me ajudava a esquecer da dor por um momento. Comecei a pensar o que seria o final da Expedição. Quanta coisa bacana, quanto aprendemos, como era gostoso estar concretizando esse antigo sonho. Eu me imaginei passando fotos com meus filhos, contando a eles 13 cada episódio da jornada. Fui longe. Bem longe. Não estava mais com a perna presa e com aquela dor. Estava completando meu sonho. De tempos em tempos a dor me chamava para a realidade e eu fugia de novo. Eu ia conseguir sair de lá! Horas e horas já tinham se passado. Beth começou a falar de morte, de não conseguirmos mais sair, de ninguém nos ajudar, do amor que tinha por mim, então percebi que ela começou a ficar realmente desesperada. frente da cabine. A moto e os outros três militares foram espremidos na parte de trás. Conseguimos sair daquela situação, apesar de não saber ainda como ficaria minha perna. Mas, principalmente, estávamos fora do perigo da estrada, sãos e com um mínimo de esperança. O que nos preocupava agora era minha perna e se poderíamos seguir viagem ou não após a avaliação de um médico. (...) A perna presa era a minha, mas quem precisava de mais cuidado era Beth. É claro que eu estava cada vez mais preocupado, mas cuidei dela para que as coisas não piorassem e para me distrair da minha própria condição. Por volta das nove horas da noite, depois de quase seis horas do acidente, vimos uma movimentação ao longe. Um poeirão subia com a aproximação de alguma coisa. Era um furgão bege em nossa direção. Ficamos eufóricos! Estávamos salvos! Eram militares que seguiam para Uliastay, de onde tínhamos saído pela manhã. Levantar a moto foi fácil para eles. Mas eu não conseguia apoiar o pé no chão. Eu e Beth fomos no banco da 14 15 Este material não tem valor comercial. Distribuição gratuita Este material não tem valor comercial. Distribuição gratuita