a verdadeira adoração

Transcrição

a verdadeira adoração
Uma Descrição
ADORAÇÃO
A VERDADEIRA ADORAÇÃO
HUGO MCCORD
Suponhamos que algumas crianças entrem
numa sala em que a ceia do Senhor está preparada
e sirvam-se do pão e do suco da videira. Estariam
elas adorando a Deus? Fisicamente, estariam
fazendo o que os cristãos fazem quando tomam
a comunhão. Todavia, tal ato não constitui uma
forma de adoração, assim como atos físicos
semelhantes praticados por cristãos ao participarem da ceia do Senhor não constituem adoração,
pois a adoração implica algo mais.
A sede física de uma corça faz com que ela
procure água, e a sede espiritual do homem o
conduz com alegria a “tirar água das fontes da
salvação” (Isaías 12:3).
Uma segunda semelhança é demonstrada
entre os homens e os animais em Salmos 84:3:
O QUE A ADORAÇÃO É
O adorador, estando fora do templo, tinha ciúmes
dos pardais que viviam no templo. Ele disse que
gostaria de morar ali também:
Um Derramamento para Deus
A palavra “adorar” significa “prestar respeito
e honra a uma pessoa digna”1 . O Novo Dicionário
Aurélio da Língua Portuguesa define o verbo
“adorar” da seguinte maneira: “render culto a
(divindade); reverenciar, venerar; prestar culto
de adoração”2 . Normalmente, as pessoas querem
adorar seu Criador. Toda pessoa que pensa no
que é certo reage alegremente à admoestação:
“Alegrei-me quando me disseram: Vamos à Casa
do Senhor” (Salmos 122:1).
A origem do desejo e da capacidade dos seres
humanos adorarem não reside na “evolução” de
seus ancestrais; os animais não podem adorar.
As Escrituras, porém, fazem uma comparação
entre a humanidade e os animais:
Como suspira a corça pelas correntes das águas,
assim, por ti, ó Deus, suspira a minha alma.
A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo;
quando irei e me verei perante a face de Deus?
(Salmos 42:1, 2).
1
O termo português “adorar” deriva do latim “adorare”.
2
Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 2a. ed.
rev. e ampliada. Ed. Nova Fronteira, v. “adorar”.
O pardal encontrou casa,
e a andorinha, ninho para si,
onde acolha os seus filhotes;
eu, os teus altares, Senhor dos Exércitos,
Rei meu e Deus meu!
A minha alma suspira e desfalece
pelos átrios do Senhor;
o meu coração e a minha carne
exultam pelo Deus vivo! (Salmos 84:2).
Bem-aventurados os que habitam em tua casa;
louvam-te perpetuamente (Salmos 84:4).
Louvar a Deus, então, é adorar. É algo que
flui do espírito humano em direção ao Espírito
Divino. É uma veneração por Quem criou e tem
preservado o adorador. É uma apreciação; uma
maneira de dizer: “Sou Teu e Te amo”.
O cristão aguarda ansiosamente pelo próxima
reunião dos santos, assim como um judeu nos
dias de Davi se alegrava quando era chamado
para o templo (Salmos 122:1). O cristão se
entristece se tem de faltar à assembléia (Salmos
84:2).
A adoração é a reação quando as glórias da
criação preenchem a mente de um homem,
quando ele exclama: “Só Deus pôde fazer o
universo!” A essência da adoração é intangível e
invisível. É um sentimento, uma emoção, um
pensamento em reverência e apreciação dentro
da mente de quem canta: “Quão grande és Tu!”
1
A Mente
Uma vez que a adoração é a comunhão do
espírito humano (interno, invisível, imensurável
e eterno; veja Zacarias 12:1; Mateus 22:32) com o
Espírito Divino, ela não pode ser algo de natureza
física. Se a adoração é a expressão de respeito,
veneração e homenagem, intrinsecamente ela é
um sentimento, um pensamento gerado na mente
humana. Atos físicos acompanham o que sucede
na mente do adorador, mas são apenas acompanhamentos. A adoração pode envolver mas não
pode ser o curvar das cabeças e/ou do corpo em
oração, o uso dos lábios para cantar louvores a
Deus ou o uso das mãos para tomar a ceia do
Senhor e para dar o dinheiro da oferta. Esses atos
são externos e físicos, enquanto a adoração
propriamente dita é totalmente interna e mental.
Deus não é adorado quando as pessoas
mostram amor com os lábios, mas seus corações
estão consagrados ao dinheiro. (Veja Ezequiel
33:31.) Discernir o corpo de Cristo (1 Coríntios
11:29) não é algo feito por um dedo ou uma boca.
As pessoas podem dar honras a Deus com seus
lábios mesmo quando Deus sabe que seus corações estão longe dEle (Mateus 15:8). O coração da
adoração, portanto, está no coração do adorador.
A Essência e o Exterior
Embora a adoração seja completamente interna, certos atos externos, físicos, quase sempre a
acompanham. Historicamente, o que um adorador sente no coração ele geralmente tenta expressar externamente, como prostrar o corpo. De
fato, a palavra hebraica mais usada para representar a adoração, shachah, significa primeiramente
“prostrar-se”. Quando Abraão estava comprando
um esquife para enterrar Sara, ele “se levantou…
e se inclinou [shachah] diante do povo da terra,
diante dos filhos de Hete” (Gênesis 23:7). A
mesma palavra é empregada para descrever a
prostração interior de Abraão a Deus em adoração. Quando ele falou para os seus servos
aguardarem no acampamento, ele disse: “Esperai
aqui, com o jumento; eu e o rapaz iremos até lá e,
havendo adorado [shachah], voltaremos para
junto de vós” (Gênesis 22:5).
Semelhantemente, a palavra grega mais
usada para adoração, proskuneo, significa primeiramente (sem o prefixo) “beijar”. Os persas
antigos, ajoelhavam-se, beijavam a mão e os pés
do rei, ou a orla do seu manto. Posteriormente, o
2
ato físico de proskuneo foi transferido ao ato
mental de adoração. O ato físico não é mais
lembrado quando se lê que “os verdadeiros
adoradores [proskunetai] adorarão [proskunesousin] o Pai em espírito e em verdade; porque
são estes que o Pai procura para seus adoradores”
(João 4:23)3 .
É bastante evidente que o ato de prostrar-se
fisicamente (como fizeram os soldados perante
Jesus no pretório de Pilatos em Marcos 15:19) e
realmente beijar (como Judas fez em Mateus
26:49) pode ser empregado por hipócritas sem
haver respeito algum no coração. Podemos
visualizar Eúde, com um punhal de dois gumes
escondido no lado direito da cintura sob as vestes,
prostrando-se e sorrindo para o rei Eglon antes
de tirar-lhe a vida (Juízes 3:14–23). Exteriormente,
expressões físicas de respeito por si só não podem
ser chamadas de reverência ou adoração. Se não
houver uma prostração interior dentro do coração, não estará ocorrendo adoração.
A essência da adoração, portanto, não consiste
em algo externo. Anos atrás, cometi um erro
falando de “cinco atos de adoração”, pois eu via
a adoração como atos físicos. Não entendia a
palavra “adoração”. O fruto de lábios que cantam
não é adoração por si só; mas esse fruto acompanha a adoração feita no coração (Hebreus 13:15;
1 Coríntios 14:15). A adoração propriamente dita
é puramente interna.
É preciso usar as mãos e a boca ao tomar a
ceia do Senhor, mas a adoração está no discernimento e na gratidão pelo sangue derramado por
Jesus (1 Coríntios 11:29). A adoração propriamente dita é puramente mental.
Assim como acontece com os cânticos e a ceia
do Senhor, acontece com os outros três “atos de
adoração”. Nenhum ato externo sozinho — orar,
ofertar ou ler a Bíblia — consiste em adoração.
Aprendi, então, a falar em “expressões de adora3
Creio que é possível adorar sem o uso de expressões
corporais. Paulo cria que os cristãos também podiam psallo
de coração sem qualquer expressão corporal (Efésios 5:19).
Na verdade, o ato de psallo dos cristãos deveria ser
acompanhado de cânticos (aido); mas conforme usado por
Paulo em Efésios 5:19, psallo e aido são duas ações separadas,
e cada uma poderia ser feita sem a outra. Nada é inerente
a psallo exceto o ato de tanger. O termo propriamente não
diz se é o caso de se tocar literalmente a linha de um
carpinteiro ou as cordas de uma harpa ou as cordas do
coração, figuradamente. Da mesma forma, se a adoração é
feita com ou sem o acompanhemento de atos corporais, as
palavras shachah e proskuneo não o descrevem.
ção” ou “atos que acompanham a adoração”.
Finalmente, aprendi o que é a essência da
adoração.
O servo de Abraão, parado junto a um poço
fora da cidade de Naor, estava um dia adorando,
ao cair da noite. Se você estivesse lá, não saberia
o que estava se passando. Ele não se ajoelhou,
não ergueu uma mão para o céu, e seus olhos não
estavam fechados. Nenhuma palavra foi pronunciada, nem os seus lábios se mexeram; mas ele
adorou de coração falando com Deus numa
oração fervorosa (Gênesis 24:12–14). Intrinsecamente, a adoração é apenas um ato de reflexão —
uma alma em comunhão com o Pai no céu.
O QUE A ADORAÇÃO NÃO É
Não É “Tudo o que Fazemos”
Alguns estão ensinando que, como tudo o
que o cristão faz glorifica a Deus (1 Coríntios
10:31), a vida do cristão não se divide em religiosa
e secular, e portanto, segundo eles, tudo o que
fazemos é adoração.
Esses professores bem intencionados parecem
ter se equivocado com as diversas interpretações
de Romanos 12:1: “…apresenteis o vosso corpo
por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que
é o vosso culto racional” (ERAB; grifo meu). Em
algumas versões para o inglês omitiu-se culto
acrescentando-se a palavra “adoração”. Isto fez
com que alguns digam que, como seus corpos
estão entregues ao culto cristão vinte e quatro
horas por dia, estão adorando em tudo o que
fazem.
O que tal ensino defende é verdadeiro desde
que haja uma entrega de cem por cento a Jesus.
“Quer comais, quer bebais ou façais outra coisa
qualquer, fazei tudo para a glória de Deus”
(1 Coríntios 10:31); o amor de Cristo constrange
os cristãos a não mais viverem “para si mesmos,
mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou” (2 Coríntios 5:14, 15). Um cristão não pode
servir em tempo parcial; ele é cristão dia e noite,
e nesta vida ele jamais se aposenta. Ele se esquece
completamente de si mesmo. Aquele que não
abandonar tudo o que tem, disse o Senhor, não
pode ser Seu discípulo (Lucas 14:33).
Por outro lado, se a essência da adoração é
uma reflexão, um pensamento, da mente humana,
um sentimento que brota do coração — e atos
físicos só acompanham essa adoração — nem
tudo o que fazemos consiste em adoração. É
verdade que em certos contextos o termo grego
de Romanos 12:1 (latreuo) é devidamente vertido
para “adoração”. (Em Hebreus 10:2 uma forma
da palavra é traduzida por “adoradores”.) Todavia, a palavra por si só significa apenas “servir”,
quer seja a Deus quer seja a homens. (Um latris é
um servo contratado; latron significa “contratar,
empregar, ou remunerar”.) Outras vezes, formas
da palavra referem-se a uma vida inteira de
serviço a Deus (Atos 24:14; Hebreus 12:28).
O contexto de Romanos 12:1 mostra a oferta
do corpo como um sacrifício vivo. Esse sacrifício
é uma vida de serviço, não de meditação (o que
é a adoração). Os cristãos são chamados a um
plantão de vinte e quatro horas para servirem a
Deus e à humanidade, mas é impossível estar
engajado na adoração (meditação) vinte e quatro
horas por dia. Mesmo se alguém fosse capaz de
concentrar a mente em Deus vinte e quatro horas
seguidas, tal pessoa seria inútil, pois não poderia
realizar nenhum bem prático nesta vida. Se esse
indivíduo não fizesse nada além de adorar, não
estaria apto nem para trabalhar nem para comer.
Não É Contínua
A adoração não é um ato contínuo. Abraão
subiu até o cume de uma montanha para ali
adorar; depois, terminada a adoração, ele voltou
ao acampamento ao pé da montanha (Gênesis
22:1–5).
Por sete dias, Davi ficou deitado ao chão
jejuando e orando pela vida de seu filho moribundo (2 Samuel 12:15–20). Quando o rei soube
que seu filho falecera, ele “se levantou da terra;
lavou-se, ungiu-se, mudou de vestes, entrou na
Casa do Senhor e adorou; depois, veio para sua
casa e pediu pão; puseram-no diante dele, e ele
comeu” (v. 20). Os atos de lavar-se, ungir-se,
mudar de roupa, entrar na Casa do Senhor
precederam a adoração. Após um período de
adoração, ele foi para casa e comeu uma refeição.
Sua adoração não foi contínua, nem tampouco é
a nossa.
Um etíope andou de carruagem uns oitocentos quilômetros para “adorar em Jerusalém”
(Atos 8:27), e depois voltou para casa. Uma longa
jornada precedeu sua adoração, e a viagem de
volta a sucedeu. A adoração é descontínua; tem
começo e fim. No caso do etíope, ela começou,
terminou e recomeçou.
3
Não É o Mesmo que Serviço
Uma antiga placa pendurada acima da porta
em alguns locais de adoração diz: “Entre para
adorar; saia para servir”. Essa idéia ainda é exata.
Por vezes, Jesus orou (adorou) sozinho (Marcos
1:35) e por vezes Ele orou (adorou) publicamente
(Mateus 15:35, 36). Todavia, Ele fez mais do que
adorar: Ele “andou por toda parte, fazendo o
bem” (Atos 10:38).
Adorar é servir a Deus, e é certo dizer que
vamos ao “serviço de adoração”. Todavia, nem
todo serviço consiste em adoração. Arar um
campo, tocar um violão ou comer um hambúrguer não é adorar.
A adoração é um ato perpendicular — louvores enviados para cima até Deus. O serviço é um
ato horizontal — mãos estendidas para ajudar
outros seres humanos. É certo prover o necessário
para a família, criar os filhos, aliviar os aflitos ou
tirar férias (1 Timóteo 5:8, 10; Marcos 6:31). Mas
tais ações não são adoração. Pode-se estabelecer
o contraste disso da seguinte maneira:
Adoração
A Deus —
Jo 4:24; At 17:24, 25
Uma reflexão —
Sl 95:4
Interna — Atos 17:25
Vertical — Sl 95:6;
Jo 17:1
Descontínua — Gn 22:5;
2 Sm 12:20
Acompanhada por
cinco atos — Atos 2:42;
Ef 5:19
Serviço
À humanidade —
Gl 5:13; Hb 6:10
Um ato — Ef 4:28
Externo — Lc 10:33–35
Horizontal — Mt 10:42
Duradouro — Atos 6:2;
1 Tm 5:10
Uma centena de obras —
Tt 3:1; Gl 6:9
CONCLUSÃO
Ah, a beleza e a simplicidade da adoração
pública! Os cristãos se reúnem no primeiro dia
da semana para partir o pão — uma atividade
visível, física — mas no coração, discernem
novamente o corpo sangrando do Senhor
(1 Coríntios 11:29).
Lábios se abrem num louvor jubiloso ao Pai
celestial (Hebreus 13:15). Os espectadores podem
ver somente o “exterior, porém o Senhor, o
coração” (1 Samuel 16:7). Com alegria, eles contribuem espontaneamente ao Senhor (2 Coríntios
9:7), assim como os magos, ajoelhados, abriram
seus baús de tesouros, presenteando o menino
4
Jesus com ouro, incenso e mirra (Mateus
2:11).
Nem o dobrar dos joelhos nem as riquezas
dos magos constituíram adoração — esses atos
simplesmente acompanharam a adoração deles.
A maioria dos cristãos fecham os olhos quando a
oração, tal qual incenso, sobe em direção a Deus,
mas o ato de fechar os olhos não constitui
adoração. É feito apenas para ajudar o adorador
a concentrar a mente na conversa com Deus.
DANDO SENTIDO À ADORAÇÃO
Quando cantamos, oramos, observamos a
ceia do Senhor e nos empenhamos em outras
expressões de adoração, que mensagens básicas
Deus quer de nós? Nossa adoração pode se
resumir em cinco sentimentos oferecidos a Deus.
Louvor. Hebreus 13:15 fala do sacrifício de
louvor que oferecemos a Deus. Grande parte da
adoração deve ser na forma de louvor. As letras
dos cânticos e as orações nos ajudam a refletir no
“louvor”.
Ações de graças. Filipenses 4:6 menciona
orações e súplicas com ações de graças (veja
também Efésios 5:20). Certamente, uma das
mensagens básicas da adoração é a gratidão —
nos cânticos, na oração, na oferta monetária e
durante a ceia do Senhor.
Arrependimento. Devemos “examinar” a nós
mesmos quando tomamos a comunhão. Quando
a Palavra é pregada, devemos estar perguntando
onde nos desviamos, pedindo o perdão de Deus e
nos comprometendo em melhorar as nossas vidas.
Petições. Paulo disse: “…em tudo, porém,
sejam conhecidas, diante de Deus, as vossas
petições, pela oração e pela súplica” (Filipenses
4:6). Podemos cantar nossas petições, ou pensar
nelas por meio da oração conduzida por outro.
Às vezes, fazemos as petições em particular no
íntimo de nossos corações.
Alegria. Filipenses 4:7, o versículo consecutivo
ao que fala de orações e súplicas com ações de
graças, diz: “a paz de Deus, que… guardará o
vosso coração e a vossa mente em Cristo Jesus”.
Nos cultos de adoração, devemos estar freqüentemente pensando na comunhão com Deus e
sentindo alegria nessa comunhão.
A chave para melhorarmos nossa adoração é
nos concentrarmos mais em enviar a Deus
mensagens de louvor, agradecimento, arrependimento, petições e alegria, à medida que nos
empenhamos em adorá-lO como Ele instruiu.
Adaptado de The Christian Chronicle4
Stafford North
4
Extraído do periódico The Christian Chronicle (“A
Crônica Cristã”), maio de 2000. O artigo intitulado “Unlocking our hearts to God is key to making our worship
meaningful” (“Destrancar o coração é a chave para dar
sentido à adoração”) está disponível em inglês no site
www.christianchronicle.org.
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