II Seminário Brasileiro Livro e História Editorial
Transcrição
II Seminário Brasileiro Livro e História Editorial
II Seminário Brasileiro Livro e História Editorial Edição de livros didáticos para educação de jovens e adultos Márcia Regina Takeuchi1 Pontifícia Universidade Católica – São Paulo Resumo Este trabalho é parte integrante da dissertação de mestrado — Análise material de livros didáticos para educação de jovens e adultos — defendida no Programa de Estudos PósGraduados em Educação: História, Política, Sociedade em 2005. Tiragem, formato, número de páginas, programação visual, sumário, ilustrações e fotos, manual do professor, são tomados como dispositivos expressivos de estratégias editoriais e traduzem, além de suas intenções comerciais e educacionais, leituras do seu público consumidor (o estudante), suas competências e objetivos educacionais. Esses aspectos são avaliados em exemplares de livros didáticos de EJA e comparados aos presentes em livros didáticos destinados à escolarização regular. O estudo conclui que esse material é em geral simplificação das obras voltadas para a educação regular, não sendo formatado com base em pressupostos pedagógicos e justificativas teóricas e metodológicas específicas ao público a que se destina. Tomo como referencial teórico fundamental o conceito de materialidade de Roger Chartier e apóio-me na tese de doutorado de Kazumi Munakata para inserir na investigaçao conceitos atinentes aos procedimentos editoriais. O entendimento de currículo em processo é considerado no trabalho e é tributário de Gimeno Sacristán. Palavras-chave Livro didático; livros didáticos para educação de jovens e adultos; EJA; edição de livros didáticos. Circunscrevendo o objeto de análise Como costuma ocorrer com a maioria das pesquisas, o primeiro passo foi identificar o que analisar e, depois, como analisar. Encontrar o que analisar foi uma 1 Doutoranda do Programa de Estudos Pós-Graduados Educação: História, Cultura, Sociedade da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, <[email protected]>. dificuldade inicial. Surpreendentemente, constatei carência de livros didáticos específicos de educação de jovens e adultos (EJA), objeto de meu trabalho. Consultando o catálogo e sites das grandes editoras do país, verifiquei que praticamente não havia oferta desse tipo de material – ao menos à mostra, disponibilizados nos espaços de busca mais corriqueiros. Isso me possibilitou traçar algumas hipóteses sobre as razões da baixa oferta desse material no mercado, em detrimento da demanda efetiva, considerando-se que no período havia um contingente significativo de pessoas que potencialmente poderiam acorrer a esse tipo de formação escolar. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 1996, havia no país 15.560.260 pessoas analfabetas na população de 15 anos de idade ou mais, perfazendo 14,7% do universo de 107.534.609 pessoas nesta faixa populacional.2 Uma das razões para a baixa oferta de material por parte das editoras seria a falta de rentabilidade imediata ou a incerteza quanto ao retorno dos investimentos. Essas empresas costumam dividir seus esforços entre a produção de livros escolares para a rede privada e a programação para a rede pública, cujas escolas são atendidas pelo Programa Nacional de Livro Didático (PNLD). Diante dessa destinação mais “rotineira”, “tradicional”, a produção de livros para EJA ficaria, quando ela existisse, em segundo plano na lista de prioridades. Essa primeira dificuldade – encontrar livros didáticos para EJA – me levou a circunscrever a análise de livros didáticos de educação de jovens e adultos dentro do âmbito da produção geral de títulos das editoras e a comparar aspectos da sua edição em relação a obras da primeira escala de prioridades: livros destinados a escolas privadas e livros para o PNLD. A tarefa relativa ao como analisar foi perseguida tomando-se como referencial teórico os autores que me foram apresentados sobretudo na disciplina “História do livro, do livro didático e dos impressos pedagógicos” do curso de mestrado do programa Educação: História, Política, Sociedade. Autores como Roger Chartier (1996; 1998; s.d.), Robert Darnton (1990), Gimeno Sacristán (1998; 2000; s.d.), Michael Apple (1995) 2 <http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/eja/legislacao/parecer_11_2000.pdf> dedicam-se a estudar o livro didático ou material didático impresso, entre outros temas. Um conceito caro extraído desses dois primeiros autores foi o de materialidade. Abarcar esse conceito na investigação requer que se considere que os aspectos materiais de que uma obra didática se compõe (autoria, título, capa, formato, cores, imagens, número de páginas, tipologia, papel, tiragem) são dispositivos que corporificam estratégias ou táticas dos agentes que a produzem e que eles, ao mesmo tempo, pressupõem expectativas e competências do leitor. Essa linha de argumentação é também tributária Michel de Certeau (2002), que considera como práticas culturais não só a produção do livro, mas também a leitura e a subseqüente apropriação que o leitor faz da leitura. […] neste trabalho considera-se que livro não é apenas um conjunto de idéias, mas um objeto constituído de dispositivos materiais e que agrega práticas — ações e relações humanas — tanto em sua produção quanto no uso que dele se faz. (TAKEUCHI, 2005, p. 75) Gimeno Sacristán (2000) afirma que a educação deve ser compreendida em três instâncias, pelo menos: a atividade educacional; o conteúdo; os agentes e outros elementos que determinam a atividade e o conteúdo. Nesse sentido, os livros didáticos entram como um elemento que determina a atividade do professor e o conteúdo aplicado em sala de aula. Dentro do esquema de currículo em processo por ele concebido, o livro didático seria o currículo planejado conforme ressignificações que os editores fazem mediante a sua leitura do currículo prescrito conjugada a fatores de natureza diversa, como a premência de lançamentos, o seu envolvimento com certos grupos de autores, os limites financeiros [exemplos meus]. Por sua vez, o currículo se realiza na sala de aula, mediante determinações concernentes a esse âmbito de ação. No tocante à relativa baixa oferta de títulos didáticos para EJA, também é importante destacar que ela pode ser resultado da incipiente ação do Estado no direcionamento de políticas públicas para esse segmento de ensino: Nosso entendimento é que é esse distanciamento do Estado em relação às ações de EJA que configura a dispersão de materiais didáticos dedicados a essa modalidade de ensino: dadas as grandes Editoras comerciais, somente duas delas tinham, na data da realização deste trabalho, título de EJA; os outros exemplares colhidos na pesquisa eram publicações resultantes de iniciativas diversas, como ONGs (a de maior repercussão era a coleção da organização não-governamental Ação Educativa, inicialmente lançada em parceria com o Inep), associações de professores, Editoras regionais. (TAKEUCHI, p. 33) As duas editoras mencionadas foram a Ática e a FTD, e a referida análise material ocorreu com base em exemplares dessas duas editoras. Duas editoras apenas Num primeiro momento, foram identificados vinte e três títulos de livros didáticos para EJA; cada título composto de um ou mais volumes, dispersos nos mais diversos formatos, com conteúdos também variados, produzidos em diferentes regiões do país. (TAKEUCHI, p. 66-68). Além desses títulos, sem dúvida havia inúmeros outros, os quais não foram considerados por não terem sido localizados devido à catalogação limitada nos veículos formais ou mais consagrados, como a que ocorre com os títulos didáticos do ensino regular. Verificou-se também um grande número de livros ofertados para o professor, para a sua prática em sala de aula, e não para o aluno usar. Como o objetivo era a comparação com livros didáticos do ensino regular, esta última modalidade de material, elaborada apenas para o professor, foi descartada na pesquisa. Serão considerados nessa categoria os materiais didáticos que se destinam à EJA e produzidos por Editoras diversas, que se componham pelo menos de livros para o uso do aluno em sala de aula, e que não sejam simplesmente usados como suporte da prática pedagógica pelo professor. Por causa do enorme volume de materiais e pela dispersão, a identificação baseou-se, num primeiro momento, no material que chegou fisicamente às minhas mãos no momento do desenvolvimento deste estudo — quer via Editora Ática, quer nas visitas feitas em escolas. (TAKEUCHI, p.66) [...] Reitero que, além desses títulos, deve haver uma infinidade de outros, dada a configuração pulverizada em que se encontra esse segmento de ensino. Diferentemente do que se verifica com os materiais didáticos destinados ao ensino infantil, fundamental e médio, os livros dedicados à EJA são, em sua grande maioria, resultantes de iniciativas dispersas em entidades nãogovernamentais, grupo de professores, sindicatos, escolas particulares, casas publicadoras de difusão local. (TAKEUCHI, p. 69) Contrariamente ao cenário que constitui a produção dos livros didáticos de ensino regular, notadamente da que visa à participação nos PNLD, na qual ocorre o fenômeno da concentração de editoras (Ática, Moderna, FTD, Saraiva, Scipione, Brasil, Ibep)3, a produção e livros de EJA não seguia essa tendência: eles estavam pulverizados por iniciativas dispersas. Das editoras que habitualmente participam do PNLD, apenas duas delas contavam com títulos para EJA – como já enunciamos, as editora Ática e FTD. Após a listagem do material de EJA disponível para consulta, a pesquisadora checou se as outras Editoras com participação no PNLD tinham títulos para EJA. A consulta ao catálogo das maiores Editoras comerciais e ao site das livrarias Cultura e Saraiva entre o ano de 2003 e o mês de junho de 2004 levou a pesquisadora a reafirmar a constatação de que apenas duas das maiores Editoras comerciais possuem coleções para EJA: a Ática e a FTD. Se de fato alguma outra Editora tem obras didáticas de EJA, não fazem sua divulgação em livrarias, nem expõem seus títulos no site da empresa. (TAKEUCHI, p. 73) Elementos da análise material Neste trabalho, a análise se limitará a expor apenas dois dos aspectos que configuram a materialidade de um livro: o autor e a seleção de conteúdos. A dissertação contou com o estudo de outros aspectos, como formato, tiragem, acabamento, impressão, preço, atividades, manual do professor, porém, para as finalidades da comunicação em que este trabalho será veiculado, bem como considerando o seus limites, julgo bastantes os aspectos selecionados. Os livros de EJA escolhidos eram dedicados a cobrir a formação do ensino do terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental. Portanto, para a análise comparativa, foram selecionados livros dos mesmos ciclos do ensino regular. Autores EJA Ática4 Autor Título Carlos Barros e Wilson R. Paulino •Ciências (PNLD 2005) Ciências (mercado privado) EJA – Ciências Geografia Crítica (PNLD 2005) Geografia Crítica (mercado privado) EJA – Geografia J. William Vesentini e Vânia Vlach 3 Sobre a concentração das editoras nos programas governamentais, ver HÖFLING, Eloisa.de M. Notas para discussão quanto à implementação de programas de governo: em foco o Programa Nacional do Livro Didático. Educação & Sociedade, 21 (70): abr. 2000. 4 Ver na parte relativa a fontes, no final do trabalho, a referência completa das obras citadas. Oscar Guelli Claudino Piletti e Nelson Piletti Maria das Graças Vieira e Regina Figueiredo Eliete Canesi Morino e Rita Brugin de Faria Matemática: uma aventura do pensamento (PNLD 2005) Matemática: uma aventura do pensamento (mercado privado) EJA – Matemática História e Vida Integrada (PNLD 2005) História e Vida Integrada (mercado privado) EJA – História Ler, entender, criar (PNLD 2005) Ler, entender, criar (mercado privado) EJA – Língua Portuguesa Start Up (mercado privado) EJA – Inglês Autores EJA FTD Autor Título Eduardo Martins e Demétrio Gowdak Ciências; novo pensar (PNLD 2005) Ciências; natureza e vida (mercado privado) EJA – Ciências; natureza e vida Geografia (PNLD 2005) Geografia (mercado privado) EJA – Geografia A conquista da Matemática — Nova (PNLD 2005) A conquista da Matemática — Nova (mercado privado) EJA – Matemática História, sociedade & cidadania (mercado privado)5 EJA História do Brasil (3º ciclo) EJA História geral (4º ciclo) Entre palavras —edição renovada (PNLD 2005) Entre palavras (mercado privado) EJA – Entre Palavras Blow-Up (mercado privado) EJA – Do It! Sonia Castellar e Valter Maestro José Ruy Giovanni, Castrucci e José Ruy Giovanni Jr. Alfredo Boulos Jr. Mauro Ferreira Dirce Guedes de Azevedo e Ayrton Gomes A leitura dos dados das tabelas nos indica que, em ambas as editoras, os autores de EJA são os mesmos que os de certos materiais dedicados ao ensino regular, segundo a sua suposta disciplina de atuação. Uma pesquisa um pouco mais detida no catálogo das editoras ou mesmo o conhecimento prévio de livros didáticos em uso nos informam que 5 Esse autor não consta do Guia do PNLD 2005. esses autores são, originalmente, detentores de obras didáticas do ensino regular, e não de EJA. Ao fazer um levantamento desses autores de obras de EJA, percebemos que eles constam como autores também em outras versões de coleções — mercado e MEC. Em alguns casos, ocorrem arranjos, como a supressão de um ou outro sobrenome na capa, mas, de qualquer forma, a função da autoria é atribuída a personagens de nomes já consagrados em livros didáticos de ensino regular. E não a agentes de fato vinculados à prática do ensino de jovens e adultos, como a especificidade da obra poderia aludir. (TAKEUCHI, p. 76) […] Até aqui o estudo permitiu identificar que os autores de EJA não são especializados na área e que os projetos não foram concebidos para EJA, mas adaptados de material preexistente. E, dentro do espectro de intenções dos editores, sublinho que, com base na análise do material selecionado, não houve a busca por profissionais ligados à prática educativa a que os livros se destinam.(TAKEUCHI, p. 81) Importante notar também que, dadas essas características, trata-se de obras fundamentalmente projetadas por editores, e não desenvolvidas por iniciativa de autores e oferecidas aos editores. Acentua-se nesse aspecto a perspectiva assinalada por Gimeno Sacristán mencionada anteriormente: os editores atuam como agentes nas mediações entre o currículo prescrito e a sua realização. No caso, tais agentes entenderam que estudantes de EJA requeriam o mesmo elenco de conteúdos dos estudantes do ensino regular, porém em formato e extensão condensados. A análise do conteúdo das obras selecionadas também implica no entendimento de que as duas editoras adotaram estratégias de simplificação, tendo como referência o currículo do ensino regular. A título de exemplificação, segue o sumário de dois livros de geografia da editora FTD concebidos para a 5a. e 6a. série6 e do volume de EJA, ambos referidos na tabela anterior. Sumário Geografia FTD mercado 5ª série UNIDADE 1 — APRENDENDO CARTOGRAFIA 6 Capítulo 1 — A localização e a orientação 8 Capítulo 2 — As diferentes concepções sobre a Terra 16 Capítulo 3 — mapeando a Terra 30 Projeto 1 45 UNIDADE 2 — PAISAGENS 50 Capítulo 4 — A origem da Terra e das paisagens 52 6 Nomenclatura adotada no período, agora alterada para 6. e 7. ano, respectivamente. Capítulo 5 — A vida modificando as paisagens 74 Capítulo 6 — As mudanças provocadas pela vida 104 Projeto 2 119 UNIDADE 3 — AS DINÂMICAS DA NATUREZA E A AÇÃO HUMANA: APROPRIAÇÃO DOS RECURSOS E MUDANÇAS NOS RITMOS 122 Capítulo 7 — A dinâmica da atmosfera 124 Capítulo 8 — A dinâmica da água no planeta Terra 147 Capítulo 9 — A dinâmica do relevo 170 Projeto 3 189 Bibliografia e sugestão de leitura para os alunos 191 Atlas consultados nas pesquisas de mapa 191 6ª série UNIDADE 1 — PARA ENTENDER O BRASIL 6 Capítulo 1 — A identidade brasileira 8 Capítulo 2 — A construção e a formação do território brasileiro 29 Capítulo 3 — As origens culturais do povo brasileiro 47 Projeto 1 63 UNIDADE 2 — O ESTUDO DO BRASIL E DE SUA POPULAÇÃO PELAS LINGUAGENS GRÁFICA E CARTOGRÁFICA 66 Capítulo 4 — A localização do Brasil e a cartografia 68 Capítulo 5 — A dinâmica populacional brasileira 83 Capítulo 6 — Migrações 107 Projeto 2 124 UNIDADE 3 — AS REGIÕES BRASILEIRAS 126 Capítulo 7 — A identidade das regiões 128 Capítulo 8 — Amazônia Legal 135 Capítulo 9 — Nordeste 165 Capítulo 10 — Centro-Sul 191 Projeto 3 220 Sumário EJA Geografia FTD UNIDADE 1 — APRENDENDO CARTOGRAFIA 5 Capítulo 1 — A localização e a orientação 6 Capítulo 2 — As diferentes concepções sobre a Terra 10 Capítulo 3 — Mapeando a Terra 18 UNIDADE 2 — PAISAGENS 50 Capítulo 4 — A origem da Terra e das paisagens 30 Capítulo 5 — A vida modificando as paisagens 43 Capítulo 6 — As mudanças provocadas pela vida 59 UNIDADE 3 — AS DINÂMICAS DA NATUREZA E A AÇÃO HUMANA: APROPRIAÇÃO DOS RECURSOS E MUDANÇAS NOS RITMOS 68 Capítulo 7 — A dinâmica da atmosfera 70 Capítulo 8 — A dinâmica da água no planeta Terra 84 Capítulo 9 — A dinâmica do relevo 99 UNIDADE 4 — PARA ENTENDER O BRASIL 110 Capítulo 10 — A identidade brasileira 112 Capítulo 11 — A construção e a formação do território brasileiro 123 Capítulo 12 — As origens culturais do povo brasileiro 134 UNIDADE 5 — O ESTUDO DO BRASIL E DE SUA POPULAÇÃO PELAS LINGUAGENS GRÁFICA E CARTOGRÁFICA 144 Capítulo 13 — A localização do Brasil e a cartografia 146 Capítulo 14 — A dinâmica populacional brasileira 155 Capítulo 15 — Migrações 172 UNIDADE 6 — AS REGIÕES BRASILEIRAS 179 Capítulo 16 — A identidade das regiões 180 Capítulo 17 — Amazônia Legal 183 Capítulo 18 — Nordeste 197 Capítulo 19 — Centro-Sul 209 Bibliografia e sugestões de leitura para os alunos 223 Atlas consultados nas pesquisas de mapa 223 Desses três sumários entendemos que o conteúdo distribuído em dois volumes do ensino regular (terceiro ciclo) foi condensado num único volume de EJA (também de terceiro ciclo). E o número de páginas do livro de EJA é exatamente o mesmo que o do volume da 6a. série: 224 páginas. Isso foi conseguido por meio de cortes e reduções de textos expositivos, atividades, imagens, tabelas. É importante reafirmar que estratégias de simplificação de conteúdos foram percebidas nas obras das duas editoras analisadas. Se observarmos o uso de imagens – fotografias, esquemas e ilustrações – tabelas e mapas, também identificamos as mesmas ações: reaproveitamento, redução ou corte, e não desenvolvimento de material específico para os livros de EJA. Conteúdos que na obra original (de mercado ou PNLD) ocupavam quatro ou mais páginas, por exemplo, foram enxutos e reproduzidos em passagens mais breves. A bateria de atividades também foi simplificada. De modo geral, na versão de EJA optou-se por suprimir as atividades em grupo, de discussão e estímulo ao desenvolvimento da competência oral, de partilha de informações baseadas na vivência cotidiana, além de leituras complementares. No caso de obra de ciências da Ática, por exemplo, eliminaram-se as atividades experimentais. Curioso é que se priorizaram atividades “conteudistas”, calcadas no texto, o que contraria a concepção de ensino preconizada na Proposta Curricular de Educação de Jovens e Adultos (2002), que persegue a formação cidadã, a ação crítica e cooperativa para a construção do conhecimento.7 7 PROPOSTA CURRICULAR PARA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS. Brasília: MEC/SEF, 2002. v.3. p. 80-3. A desarticulação em relação à proposta curricular específica exprime certa irrelevância que os editores atribuem a esse documento no processo de edição, contrariamente ao que se nota na produção de material para os PNLD, situação em que os parâmetros curriculares são ao menos minimamente considerados. Considerações finais A exposição que se seguiu indica que os editores analisados conferem ao livros didáticos de EJA um status de segunda linha. A produção desse material obedece, portanto, a determinações diversas das dos dois produtos prioritários (livros para o governo e para o mercado) e é viabilizada conforme a disponibilidade de tempo — encaixando-se entre as programações principais —, de mão-de-obra e de verba. O material é, portanto, um produto secundário. Os editores consideram que os investimentos em livros para EJA sejam pouco atrativos e os relegam a plano secundário. E, quando o fazem, dedicam menos recursos que os dedicados a seus produtos de primeira linha. Além disso, não integram às obras as propostas curriculares atinentes a esse público: o conteúdo, as competências e as habilidades específicas. A inclusão de material didático dessa modalidade de ensino em programas do tipo PNLD poderia suscitar mudanças no entendimento constatado e reformatar os conteúdos de materiais didáticos, impondo uma reconfiguração da estrutura e da capacidade produtiva das editoras, a exemplo do que os programas regulares, forçosamente ou não, implicaram. Referências bibliográficas APPLE, Michael W. 1995. Cultura e comércio do livro didático. In: Trabalho docente e textos: economia política das relações de classe e de gênero em educação. Porto Alegre: Artmed. BATISTA, Antônio Augusto Gomes. 2001. Recomendações para uma política pública de livros didáticos. Brasília: MEC/SEF. ______. 2003. A avaliação dos livros didáticos: para entender o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). In: ROJO, Roxane; BATISTA, Antônio Augusto Gomes (orgs.). Livro didático de língua portuguesa. Campinas: Mercado de Letras. ______ . 2002. Um objeto variável e instável: textos, impressos e livros didáticos. In: ABREU, Márcia (org.). Leitura, história e história da leitura. Campinas: Mercado de Letras/Associação de Letras. BEISIEGEL, Celso Rui de. 1974. Estado e educação popular: um estudo sobre educação de jovens e adultos no estado de São Paulo. Rio de Janeiro: Pioneira. BITTENCOURT, Circe M. F. 1993. Livro didático e conhecimento histórico: uma história do saber escolar. São Paulo: USP/FFCLH. Tese (doutorado). BRASIL. 1998. Parâmetros Curriculares Nacionais. Terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental. Introdução. Brasília: MEC/SEF. ______ . 2000. Diretrizes Curriculares Nacionaios para Educação de Jovens e Adultos. Parecer nº 160 11/2000 e Resolução nº 1/2000. ______ . 2002. Proposta Curricular para o Segundo Segmento do Ensino Fundamental da Educação de Jovens e Adultos. Brasília: MEC/SEF. ______. 2004. Guia do Livro Didático 5ª a 8ª séries — PNLD 2005. Brasília: MEC/SEF. CERTEAU, Michel de. 2002. A invenção do cotidiano; a arte de fazer. 8. ed. Petrópolis: Vozes. CHARTIER, Roger. 1996. A história cultural — entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand. ______. 1998. A aventura do livro; do leitor ao navegador. São Paulo: Unesp/Imprensa Oficial. ______; ROCHE, Daniel. s.d. O livro. In: História: novos objetos. São Paulo: Martins Fontes. CORAGGIO, José Luis. 1996. Propostas do Banco Mundial para a educação: sentido oculto ou problemas de concepção? In: TOMMASI, Livia de; WARDE, Mirian Jorge; HADDAD, Sérgio (orgs.). O Banco Mundial e as políticas educacionais. São Paulo: Cortez/Ação Educativa/PUC-SP. CURY, Carlos Roberto Jamil. 2001. Por uma nova Educação de Jovens e Adultos. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE QUALIDADE NA EDUCAÇÃO — formação de professores. Simpósios. Brasília: MEC/SEF. p. 308-10. v. 1. ______. 2002. A educação básica no Brasil. In: Educação & Sociedade, 23 (80). DARNTON, Robert. 1990. O beijo de Lamourette. São Paulo: Companhia das Letras. GIMENO SACRISTÁN, J. s.d. Materiales y textos: contradicciones de la democracia cultural. In: MÍNGUEZ, J. García; MIRANDA, M. Beas. Libros de texto y construcción de materiales curriculares. Granada: Ediciones S.A.L. ______. 1998. Reformas educativas y reforma del currículo: anotaciones a partir de la experiencia española. In: WARDE, M. J. (org.) Novas políticas educacionais: críticas e perspectivas. II Seminário Internacional. São Paulo: PUC-SP/EHPS. ______. 2000. O currículo: os conteúdos do ensino ou uma análise prática? In: GIMENO SACRISTÁN, J.; PÉREZ GÓMEZ, A. I. Compreender e transformar o ensino. 4. ed. Porto Alegre: Artmed. HADDAD, Sérgio. 1991. Estado e educação de adultos (1964-1985). São Paulo: USP. Tese (doutorado). ______ . 2000. O estado da arte das pesquisas em educação de jovens e adultos no Brasil: a produção discente da pós-graduação em educação no período 1986-1998. São Paulo: Ação Educativa. ______ ; DI PIERRO, Maria Clara. 2000. Escolarização de jovens e adultos. Revista Brasileira de Educação, 14: maio/jun./jul./ago. HÖFLING, Eloisa de Mattos. 2000. Notas para discussão quanto à implementação de programas de governo: em foco o Programa Nacional do Livro Didático. Educação & Sociedade, 21 (70): abr. IBGE. Censo Escolar 2001. Rio de Janeiro: 2001. MUNAKATA, Kazumi. 1997. Produzindo livros didáticos e paradidáticos. São Paulo: PUC-SP/EHPS. Tese (doutorado). ______. 2003. Investigações acerca dos livros escolares no Brasil: das idéias à materialidade. Comunicação no VI Congresso Iberoamericano de Historia de la Educación Latinoamericana, San Luis Potosí, México. ______ . Livro didático: produção e leituras. 2002. In: ABREU, Márcia (org.). Leitura, história e história da leitura. Campinas: Mercado de Letras/Associação de Letras. SOARES, Maria Clara Couto. 1996. Banco Mundial: políticas e reformas. In: TOMMASI, L.; WARDE, M. J.; HADDAD, Sérgio (orgs.). O Banco Mundial e as políticas educacionais. São Paulo: Cortez/Ação Educativa/PUC-SP. TAKEUCHI, Márcia. R. 2005. Análise material de livros didáticos para educação de jovens e adultos. São Paulo: PUC-SP/EHPS. Dissertação (mestrado). Site <http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/eja/legislacao/parecer_11_2000.pdf> Fontes BARROS, C.; PAULINO, W. Ciências. São Paulo, Ática, 2002. 4 v. ______ . Ciências. São Paulo, Ática, 2002. 4 v. PNLD 2005. ______ . EJA – Ciências. 3º e 4º ciclos. São Paulo, Ática, 2003. 2 v. BOULOS JR., Alfredo. História do Brasil — Colônia, Império, República. 3ª etapa. São Paulo, FTD, 2001. ______ . História geral — Antiga, medieval, moderna, contemporânea. 4ª etapa. São Paulo, FTD, 2001. BRUDZINSKI, Leoni Teresa Mezzadri. EJA — Matemática. 1º e 2º ciclos. Curitiba, Educarte, 2001. 2 v. CAMARGO, José; GEMAQUE, Francisco; COSTA, Marcelo; MIRANDA, Mauro; BOUTH, Nonato; ESTUMANO, André; MIRANDA, Lena. Visão para o futuro. Editora Mega-Mestre, s.d. 4 v. CARDOSO, Alfredo; CAMARA, Joaquim; BRITO, Joana; RAYOL, Regina; PALHETA, Pedro. Coleção Curupira. Belém, Amazônia, 2003. 2 v. CASTELLAR, Sonia; MAESTRO, Valter. EJA — Geografia. 3ª e 4ª etapas. São Paulo, FTD, 2001. 2 v. ______ . Geografia. São Paulo, Quinteto Editorial, 2001. 4 v. CYTRYBSKI, Arilete Regina; Maria Helena ORLOWSKI. EJA — Ciências. 1º e 2º ciclos. Curitiba, Educarte, 2001. 2 v. ______ . Ciências — cidadania e qualidade de vida. 3º e 4º ciclos. Curitiba, Educarte, 1998. 2 v. FERREIRA, Mauro. EJA — Entre palavras. 3ª e 4ª etapas. São Paulo, FTD, 2001. 2 v. GIOVANNI, José Ruy; CASTRUCCI, Benedito; GIOVANNI JR., José Ruy. A conquista da matemática. São Paulo, FTD, 1998. 4 v. ______ . EJA — A conquista da matemática. 3ª e 4ª etapas. São Paulo, FTD, 1998. 4 v. GOWDAK, Demétrio; MARTINS, Eduardo. Ciências; natureza e vida. São Paulo, FTD, 1996. 4 v. ______ . EJA — Ciências; natureza e vida. 3ª e 4ª etapas. São Paulo, FTD, 2001. 2 v. GUELLI, Oscar. EJA — Matemática. 3º e 4º ciclos. São Paulo, Ática, 2003. 2 v. LÍNGUA PORTUGUESA — A sociabilidade do ser humano. Recife, Edições Bagaço/Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação de Jovens e Adultos e em Educação Popular, 1998. 1 v. EJA Módulo 2. MATEMÁTICA — A historicidade do ser humano. Recife, Edições Bagaço/Universidade Federal de Pernambuco – Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação de Jovens e Adultos e em Educação Popular, 1998. 1 v. EJA Módulo 1. MORINO, Eliete Canesi; FARIA, Rita Brugin de. EJA — Inglês. 3º e 4º ciclos. São Paulo, Ática, 2004. 2 v. MOTTA, Maria Inez Kierski; NEPOMUCENO, Rose Maria A. M.. Estudos da sociedade e da natureza. Curitiba, Educarte, 2001. 2 v. EJA 1º segmento do ensino fundamental. NASCIMENTO, Rubi Rachel; GERIN, Júlia. Língua portuguesa. 1º e 2º ciclos. Curitiba, Educarte, 2001. 2 v. PILETTI, Nelson; PILETTI, Claudino. EJA — História. 3º e 4º ciclos. São Paulo, Ática, 2003. 2 v. ______ . História e vida integrada. São Paulo, Ática, 2002. PNLD 2005. VIEIRA, Maria das Graças; FIGUEIREDO, Regina. EJA – Língua Portuguesa. São Paulo, Ática, 2003. 2 v. ______ . Ler, escrever, criar. São Paulo, Ática, 2002. 4. v. PNLD 2005. VIVER, APRENDER. 2. ed./3. ed. São Paulo, Ação Educativa/Global, 2002. 3 v. 1º segmento do ensino fundamental. ______ . São Paulo/Brasília, Ação Educativa/MEC/SEF, 1998/1999. 3 v. VLACH, Vânia; VESENTINI, J. W. EJA — Geografia. 3º e 4º ciclos. São Paulo, Ática, 2003. 2 v. VLACH, Vânia; VESENTINI, J. W. Geografia crítica. São Paulo, Ática, 2003. 4 v. PNLD 2005.