PRÉMIO LITERÁRIO GLÓRIA DE SANT`ANNA – 2016

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PRÉMIO LITERÁRIO GLÓRIA DE SANT`ANNA – 2016
PRÉMIO LITERÁRIO GLÓRIA DE SANT’ANNA – 2016
AO AUTOR DO MELHOR LIVRO DE POESIA 1ª EDIÇÃO EM PORTUGAL, PAÍSES E REGIÕES LUSÓFONAS
Lista Final
ÁGORA de Samuel Pimenta - LIVROS DE ONTEM
ANDAR A PAR de José Ricardo Nunes - TINTA DA CHINA
CURSO DE LINGUÍSTICA GERAL de Igor Lugris - ATRAVÉS EDITORA
EUROPA de Rui Cóias - TINTA DA CHINA
MIRLEOS de João Miguel Fernandes Jorge - RELÓGIO D’ÁGUA
PERSIANAS de Miguel-Manso - TINTA DA CHINA
POEMAS DA SHOÁ de Ana Paula Mabrouk - EDIÇÕES ESGOTADAS
SEFER SEFARAD de Pedro Casteleiro - AZETA EDICIÓNS
(Poema de cada uma das Obras nas seguintes páginas)
Júri:
António Cabrita - Escritor
Xosé Lois García - Escritor
Jacinto Guimarães - JORNAL DE VÁLEGA
Andrea Paes - Ourives
Carmen Lúcia Tindó Ribeiro Secco - Professora
O Vencedor do Prémio no valor de 3.000 € será anunciado
no dia 11 de Maio de 2016
Detalhes sobre o Prémio http://gloriadesantanna.wordpress.com/
Patrocínio:
Mª de Lourdes Sacavém Cardoso
Família Gouvêa Lemos e Andrade Paes
ÁGORA de Samuel Pimenta
Cais
Novos faróis incendeiam a branca areia.
Novos barcos entram na cidade.
Sobre o mar se desenham os perfis
de quem pela maré sonhou.
Pelas águas se redimem
os homens.
andar a par de José Ricardo Nunes
11.
Vejo-me estendido no buraco
reservado para mim. Entretenho-me
a dar comida à vida. É a última tarefa
que me cabe cumprir. E vou adiando quanto posso
o fim. Depois não sei se partirei
de vez, se lograrei voltar, e aí
não sei o que irei encontrar.
Levanto torrões, deito água, amasso
um pouco. Idealizo
figuras que não se parecem
com as formas estranhas que me caem
das mãos. Os dedos
enfiados no vaso chegam a tocar
naquele veio mais profundo
que atravessa o magma. Sei que depois
irá a terra remexer
em mim por dentro
como faço agora com ela, num verso
e num vaso, cheio de
paixão.
[…]
Curso de Linguística Geral de Igor Lugris
A SUBORDINAÇÃO
Por muito que insistam
uma subordinada
substantiva adjetiva ou de relativo
enquanto obrigatoriamente dependente
duma estrutura subordinante
sem possibilidade de eleição
não pode ser feliz
europa de Rui Cóias
9.
Esta é a terra nocturna. A do líquen azul do poente.
Receberemos nos ombros a incandescência dos cedros.
A noite tem um chacal que vem comer os viajantes,
insinua‑‑lhes sigilosamente na nuca o Ocidente acabado.
O coração espera o último lugar do mundo,
o inevitável presságio dos meses costeiros.
Que mistério sobe ao planalto cultivando o líquen?
Que segredo abençoa os campos onde pastam hirtos os cavalos?
O nosso silêncio reacende a morte na terra nocturna,
em cada bênção só lembramos os rostos que um dia amámos.
Os mortos levitam na urze, enchem o ar das ilhas,
os cavalos reúnem‑‑se sob os cedros abatidos.
Mirleos de João Miguel Fernandes Jorge
SANTA FACE
No pano
o sangue
na fronte
rasgaram
nuvem de granizo e de neve
fulgor de relâmpago
o mar se revolve os remos se quebram
por obra dos ventos
a face
no pano restou
nada a altera
obscuro
o pensar de deus
límpido
o pensar de um deus
* Óleo sobre madeira. Séc. xv
persianas de Miguel-Manso
em que pensa o persa que apascenta
o rebanho astronómico dos seus silêncios
toda a vida dedicada ao cicio perspicaz
com que agremia o seu único rebanho
acerca os lábios do dejejum de um verso
divaga do nigredo ao rubedo e torna
nómada de um interno e vasto domicílio
POEMAS DA SHOÁ de Ana Paula Mabrouk
XIV
Aqui não há borboletas
Mãe, por que não há borboletas?
Pergunta uma criança pequena
De olhos demasiados grandes
E corpo mirrado e inquieto.
A mãe olha em redor
Os parques que já não há
As flores que desapareceram
As árvores há muito cortadas.
As borboletas, querido filho,
Voaram para muito muito longe
E nas cores das suas asas
Levaram os nossos sonhos.
Um dia hão de pousar
Num belo e fresco jardim
Do outro lado do mundo
E contar a nossa História.
As borboletas, querido filho
São como os teus desenhos
Levam a tua imaginação
Para onde ainda se pode sonhar.
SEFER SEFARAD de Pedro Casteleiro
A casa vazia
Desde sempre me lembro da nossa casa vazia,
vejo-a ali, onde a pintei em pequeno, nossa
casa na enorme solidão da memória.
Nossa casa cheia de vozes enterradas nas paredes
nossa casa chorando ao norte dançando ao sul
como uma mulher que de repente vivesse todas as idades
desde a manhã
até o entardecer do
sangue.
Desde sempre,
desejei conhecer a nossa casa de vinho.
No centro
da colina.
Nossa casa vazia
no centro
da memória.