´Algebra Matricial - Nota 01 Introduç ˜ao

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´Algebra Matricial - Nota 01 Introduç ˜ao
Álgebra Matricial - Nota 01
Introdução
Márcio Nascimento da Silva
Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA
Curso de Licenciatura em Matemática
[email protected]
15 de maio de 2014
O ensino de álgebra matricial (matrizes, sistemas e determinantes) no Brasil, já há
muitos anos, segue um modelo praticamente imposto pelos livros didáticos. Mesmo com
as Orientações Curriculares para o Ensino Médio de 2006, pouca mudança aconteceu na
estrutura de tais livros.
Tomar como ponto de partida a apresentação de números dispostos em forma de
tabela e, depois, definir operações e constatar certas propriedades com esses objetos é a
forma como as matrizes são abordadas com os estudantes no ensino médio. Isso torna o
aprendizado bastante mecânico, uma vez que num primeiro momento, não se percebe a
utilidade desses elementos.
O estudo de determinantes é feito logo em seguida ao de matrizes e antes de sistemas
lineares, podendo causar a – falsa – impressão de que são imprescindı́veis para a resolução
de sistemas. Mais ainda, o uso de técnicas para a resolução que não se aplicam a todos os
tipos de sistemas lineares, é muitas vezes realizado em detrimento a outras ferramentas
que são mais práticas e abrangentes.
“A resolução de sistemas 2 × 2 ou 3 × 3 também deve ser feita via operações elementares (o processo de escalonamento), com discussão das diferentes situações
(sistemas com uma única solução, com infinitas soluções e sem solução). Quanto
à resolução de sistemas de equação 3×3, a regra de Cramer deve ser abandonada,
pois é um procedimento custoso (no geral, apresentado sem demonstração, e,
portanto de pouco significado para o aluno), que só permite resolver os sistemas
quadrados com solução única”. (BRASIL, pg. 78, 2006)
Assim, levando em conta a existência de formas para que a álgebra matricial seja
trabalhada com o uso de menos ferramentas, é que a disciplina Álgebra Matricial do curso
de Licenciatura em Matemática da Universidade Estadual Vale do Acaraú foi planejada
nos moldes sugeridos pelas Orientações Curriculares. O ponto de partida será o estudo
de sistemas lineares para posteriormente se chegar à definição de matrizes de uma forma
“natural”.
Embora o estudo de determinantes seja até dispensável, como também sugerem as
Orientaçõs Curriculares, aqui este conteúdo será abordado de uma maneira mais geral,
com o uso de permutações. Desta forma, as fórmulas vistas no ensino médio podem ser
deduzidas a partir de uma única definição, não importando a ordem da matriz quadrada.
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1 Um pouco de história
Em 213 a.C. o imperador chinês SHI-HOANG-TI (259 a.C. - 210 a.C.) mandou queimar
todos os livros e executar os estudiosos de seu paı́s. Provavelmente ele queria que as
gerações futuras acreditassem que todo o “conhecimento” tinha como ponto inicial o
perı́odo de seu regime.
Algumas obras sobreviveram e os primeiros indı́cios de sistemas lineares aparecem em
um livro de cerca de 200 a.C. chamado “Nove Capı́tulos sobre Aritmética”. No capı́tulo
VII aparece um problema sobre colheita:
“Três fardos de uma boa colheita, dois fardos de uma colheita
medı́ocre, e um fardo de uma colheita ruim são vendidos por 39
dou. Dois fardos de uma boa colheita, três fardos da medı́ocre, e
um fardo da ruim são vendidos por 34 dou. Um fardo da colheita
boa, dois fardos da medı́ocre, e três fardos da ruim são vendidos
por 26 dou. Qual o preço recebido por cada fardo de uma boa
colheita, cada fardo de uma colheita medı́ocre, e cada fardo de uma
colheita ruim?”
Traduzindo para a linguagem que conhecemos hoje, seria:
3x + 2y + z = 39
2x + 3y + z = 34
x + 2y + 3z = 26
Figura 1: Tabuleiro e bambus representando os coeficientes de um sistema.
Os chineses utilizavam uma espécie de quadro no qual pedaços de bambus coloridos
representavam os coeficientes do sistema. As “regras de ouro”, manipulações realizadas
de uma maneira ordenada, levavam à solução do sistema. Mais tarde, essas técnicas
chegaram ao Japão e também à Europa, onde foram popularizadas principalmente por
Carls Gauss e se tornaram conhecidas como Eliminação Gaussiana. Mais de mil anos se
passaram até que algum progresso acontecesse de fato.
Já no século XVII, Seki Kowa (1642-1708), considerado um dos maiores matemáticos
japoneses de todos os tempos, utilizando as técnicas chinesas, formulou o conceito do
que hoje conhecemos como determinantes. Na europa, o alemão Gottfried W. Leibniz
(1646-1716) também desenvolvia o conceito de determinantes para usar na resolução de
sistemas. Tudo indica que o japonês fez um tratamento geral, com sistemas de ordem
n × n (n equações e n variáveis), enquanto o alemão se limitou a casos até a ordem 3 × 3.
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Figura 2: Seki Kowa e Gottfried Leibniz.
Entre 1750 e 1900 houve uma grande utilização de determinantes para resolução de
sistemas enquanto o desenvolvimento da teoria matricial ficou relativamente estagnado;
mas a partir do século XIX esta se desenvolve principalmente com Arthur Cayley (18211895).
Figura 3: Arthur Cayley.
Embora os determinantes tenham dado o caminho a Cayley, ele trabalhou com as
matrizes separadamente definindo suas operações algébricas. Em 1857 pôs suas ideias
na obra “Uma memória sobre a Teoria das Matrizes”, considerada base para a Álgebra
Linear. Vale também registrar a parceria entre Cayley e James J. Sylvester, da qual se deve
boa parte do desenvolvimento da teoria matricial.
Apesar de separados por cerca de dois séculos, a teoria dos determinantes e a álgebra
matricial ocupam hoje uma posição central na matemática aplicada.
2 O curso
Nesta disciplina, será dada ênfase ao estudo de sistemas lineares e matrizes através
do método conhecido como Eliminação Gaussiana e uma variação desta, o método de
Gauss-Jordan. Ambas também são chamadas de escalonamento. A ideia é usar ao máximo
o mesmo método como ferramenta para resolução de sistemas, inversão de matrizes e
cálculo de determinantes.
Inicialmente serão definidas as equações lineares e em seguida os sistemas (de equações)
lineares. Depois, para se encontrar as soluções, a ideia é simplicar o sistema de modo que
se tenha um outro sistema equivalente (com a mesma solução do primeiro, caso exista!).
O processo de simplificação do sistema será feito através de operações elementares com as
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suas equações. Dependendo do formato do sistema que se quer obter ao final, será usada
a Eliminação Gaussiana ou Método de Gauss-Jordan.
Durante o estudo de tais métodos, a definição de matrizes se dá de forma natural
e a partir daı́ o estudo dos sistemas se dá apenas com as matrizes que representam o
conjunto de equações lineares. O conceito de posto de uma matriz será também de grande
importância.
A Álgebra Matricial propriemante dita começa com a definição de operações entre
matrizes e suas propriedades.
Para a inversão de matrizes, novamente será usado o escalonamento em detrimento
das regras mais conhecidas. A eficácia, simplicidade e rapidez em comparação aos
métodos mais usados na educação básica são visı́veis. Isso permitirá ao futuro professor
otimizar o tempo em sala de aula: menos tempo com teoria - sem perda alguma - e mais
tempo com a prática.
Por fim, o determinante será definido através do conceito de permutação. Embora
não seja essencial para a resolução de sistemas ou inversão de matrizes, este conceito
é importante em outras áreas e será definido de forma que se possa obter as famosas
fórmulas a partir de uma única expressão.
Referências
[1]
BRASIL. Secretaria de Educação Básica. Ciências da Natureza, matemática e suas
tecnologias: Orientações curriculares para o ensino médio, v. 2. Brası́lia: MEC,
2006.
[2]
MEYER, Carl Dean. Matrix Analysis and Applied Linear Algebra Book and Solutions Manual. SIAM, 2000.
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