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Redação - Av. José Cândido da Silveira, 1500, Bairro
Horto - CEP 31.035-536
Belo Horizonte - MG - Brasil
Telefone: +55 (31) 3280-2105
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Dinâmicas sociais são fluxos contínuos, capazes de alterar a relação dos seres humanos com suas próprias noções de existência. Nesta edição, MINAS FAZ
CIÊNCIA aborda uma das mais importantes questões acerca da convivência entre
os indivíduos na contemporaneidade. Em reportagem especial, a jornalista Verônica
Soares – também responsável, no Programa de Comunicação Científica e Tecnológica (PCCT) da FAPEMIG, pelo gerenciamento das mídias sociais – revela e problematiza, a partir de entrevistas com pesquisadores de múltiplas áreas, as investigações em perspectiva antropológica que, hoje, ressignificam o conceito de “corpo
humano”, de maneira a engendrar novos olhares sobre sexualidades e temas afins.
Destaque, também, para a entrevista com um dos mais importantes nomes da
ciência brasileira. Do alto de sua vasta experiência como gestor e pesquisador, o
químico e ex-ministro José Israel Vargas analisa os obstáculos, as (multi)possibilidades, os erros e acertos do incentivo à pesquisa e à inovação tecnológica no País.
Por falar em estímulo ao espírito inovador, não perca a reportagem de Diogo Brito
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Twitter: @minasfazciencia
sobre a Casa do Empreendedor do Vale da Eletrônica (Ceve)! Sediada em Santa Rita
do Sapucaí (MG), a entidade busca, ao mesmo tempo, transmitir conhecimento e
desburocratizar processos para elaboração de ideias, práticas e produtos indispensáveis ao desenvolvimento da nação.
Como prova do espírito também inovador e multifacetado desta edição, que
GOVERNO DO ESTADO
DE MINAS GERAIS
Governador: Fernando Pimentel
tal conhecer, ainda, o software Quiz Loucura, ferramenta projetada para auxiliar pro-
SECRETARIA DE ESTADO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA
E ENSINO SUPERIOR
Secretário: Miguel Corrêa Jr.
os premiados protótipos de aviões criados por universitários mineiros?
fissionais de Enfermagem a enfrentar desafios ligados à saúde mental, ou voar com
Não se apresse, contudo, pois tem mais! O que acha de saborear a exposição
“Sentidos do nascer”, que pretende conscientizar as pessoas quanto à relevância do
parto normal? De outro modo, caso prefira, o leitor poderá discutir o papel social,
político e econômico dos intelectuais no Norte de Minas ou compreender melhor o
Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado de Minas Gerais
Presidente: Evaldo Ferreira Vilela
diretor de Ciência, tecnologia e inovação:
Paulo Sérgio Lacerda Beirão
diretor de Planejamento, Gestão e Finanças:
Alexsander da Silva Rocha
Conselho Curador
Presidente: João Francisco de Abreu
Membros: Alexandre Christófaro Silva, Dijon Moraes
Júnior, Virmondes Rodrigues Júnior, Esther Margarida
Alves Ferreira Bastos, Flávio Antônio dos Santos,
Júnia Guimarães Mourão, Marcelo Henrique dos
Santos, Ricardo Vinhas Corrêa da Silva, Roberto
do Nascimento Rodrigues, Sérgio Costa Oliveira,
Valentino Rizzioli
Para receber gratuitamente a revista MINAS FAZ
CIÊNCIA, envie seus dados (nome, profissão,
instituição/empresa, endereço completo, telefone, fax
e e-mail) para o e-mail: [email protected] ou para
o seguinte endereço: FAPEMIG / Revista MINAS FAZ
CIÊNCIA - Av. José Cândido da Silveira, 1500, Bairro
Horto - Belo Horizonte/MG - Brasil - CEP 31.035-536
projeto responsável pelo sequenciamento genômico das raças zebuínas Gir e Guzerá.
Para completar, nas seções fixas da revista – Lembra dessa?, Hiperlink e Cinco perguntas para... –, o leitor terá a oportunidade de ficar por dentro das novas
vertentes da pesquisa que transformou soro lácteo em bebida isotônica, de apreciar
a beleza das ilustrações científicas e de conhecer o trabalho do pesquisador Elton
Eduardo Freitas, um dos responsáveis pela plataforma DataViva.
Diante de temáticas com tamanha amplitude e contemporaneidade, só me resta, é claro, convidar o leitor à descoberta das maravilhas da diversidade da vida –
expressa na fascinante complexidade dos seres, dos corpos, dos atos, dos tempos.
Boa leitura!
Maurício Guilherme Silva Jr.
editor-chefe
Ao LEI To R
EX P ED I EN T E
MINAS FAZ CIÊNCIA
diretora de redação: Vanessa Fagundes
editor-chefe: Maurício Guilherme Silva Jr.
redação: Alessandra Ribeiro, Ana Luiza Gonçalves,
Camila Alves Mantovani, Diogo Brito, Maurício
Guilherme Silva Jr., Vanessa Fagundes, Verônica
Soares e Vivian Teixeira
diagramação: Fazenda Comunicação
revisão: Sílvia Brina
Projeto gráfico: Hely Costa Jr.
editoração: Unika Editora, Fatine Oliveira
Montagem e impressão: Rona Editora
tiragem: 20.000 exemplares
Capa: Hely Costa Jr.
Í N D I CE
12
Entrevista
33
Genética
17
Inovação
39
História
21
Pecuária
42
Educação
25
Medicina
46
LEMBRA DESSA?
28
30
4
Ex-ministro José Israel Vargas
comenta rumos, percalços e
perspectivas da prática científica
no Brasil
Software Quiz Loucura auxilia
profissionais de Enfermagem a
lidar com os desafios da saúde
mental
Inédito no Brasil, projeto investe
no sequenciamento genômico
das raças zebuínas Gir e Guzerá
Itinerante, exposição “Sentidos
do nascer” busca conscientizar
população acerca da importância
do parto normal
Pesquisa sobre dinâmica
populacional de aves é capaz
de prever mudanças de
distribuição das espécies em
função do clima
Engenharia
Protótipos de aviões construídos
por universitários mineiros
destacam-se em competições
nacionais e internacionais
Especialistas discutem
relação entre a prática
científica e o processo de
ressignificação do corpo
humano
Iniciativa estimula escolas e
universidades a encontrar outros
modos de pensar o Brasil por
meio da educação
Na UFV, soro lácteo resultante da
fabricação de queijos é usado na
produção de bebida isotônica
47
5 PERGUNTAS PARA...
49
hiperlink
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Especial
Estudo busca compreender
papel social, político e
econômico dos intelectuais no
Norte de Minas
Saúde
Protetor de seios
desenvolvido na Unimontes
beneficia aleitamento e evita
dores e fissuras nos mamilos
das mães
6
Um dos responsáveis pelo
projeto DataViva, Elton Eduardo
Freitas comenta o sucesso da
plataforma
Ilustrações científicas,
colecionismo e outras novidades
do blog Minas faz Ciência
36
Gestão
Sediada em Santa Rita do
Sapucaí (MG), Casa do
Empreendedor transmite
conhecimento e desburocratiza
processos
ciência
fez parte de sua infância?
“As feiras sempre foram superinteressantes! E minha escola tinha um laboratório de ciências muito bom – coisa
que, hoje em dia, não há mais. Era um
laboratório com animais embalsamados
e um monte de outras coisas. Assim que
cheguei nessa escola, precisei comprar
equipamentos para as aulas no laboratório,
que sempre foram as mais interessantes.
Sou muito suspeita para falar, pois sempre
adorei ciência. Essa introdução escolar
foi responsável por muitas coisas futuras,
quando pude, enfim, dar vida à aplicabilidade de tantas descobertas.”
Marina Fráguas Barçante
Via Facebook
“Em meu colégio, no interior do Paraná, havia feira de ciências todos os anos.
Aquele era um dos grandes acontecimentos
da escola, pois juntava a turma toda em um
mesmo projeto. Fizemos sobre a ida à Lua, as
flores, as salinas, os espelhos. A mais marcante, porém, foi nosso trabalho sobre o Universo. Em uma sala escura, iluminávamos,
com lanternas, os planetas, nebulosas etc.”
grupo realizou trabalho sobre magnetismo:
montamos uma espécie de instalação, com
várias coisinhas flutuando. Aí, todo mundo
que passava ficava curioso.”
André Coelho
Via Facebook
“Na minha escola, não havia feira
de ciências, mas, em função de meu pai
trabalhar com Engenharia, ele sempre envolveu a mim e a meu irmão em ciências
divertidas, em eletrônica e coisas assim.
Quando novinha, meu sonho era ser cientista. Meus brinquedos favoritos eram um
microscópio e um kit chamado ‘Meu pequeno químico’. Cresci em casa rodeada
e apaixonada pela ciência!”
erika Araújo
Via Facebook
“Tive um pouquinho de tudo: experiência do feijão no chumaço de algodão,
feira de ciências, aulas no laboratório. Esta
parte dá uma saudade danada. Era bem divertido.”
luciana eastwood romagnolli
Via Facebook
Adriana linhares
Via Facebook
“Cresci abraçado à Biblioteca do
Escoteiro Mirim, coleção de livros da Disney com centenas de textos, quadrinhos
e gráficos sobre uma pancada de coisas,
principalmente, Astronomia e Química. Eu
fazia certas experiências e saía carregando
tudo para a escola. Às vezes, nem os amiguinhos davam muita importância, mas eu
achava muito louco. Acho que, até mesmo
pela escola onde estudei ser bem relapsa
quanto ao ensino de ciências, as raras feiras foram memoráveis. Numa delas, meu
“Aqui em casa convivemos com ciência desde pequenos, fazendo experimentos
na escola e visitando o trabalho de meu
pai, que era pesquisador.”
Ângela Guimarães Pinto dias
Via Facebook
“Adorava as feiras de ciências, e,
como fui criada em casa, material não me
faltava para explorar...”
Piedade oliveira Fagundes
Via Facebook
MINAS FAZ CIÊNCIA tem por finalidade divulgar a produção científica e
tecnológica do Estado para a sociedade. A reprodução do seu conteúdo é
permitida, desde que citada a fonte.
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Verônica So
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MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Em uma sociedade fortemente influenciada pela tecnociência, o corpo
é pensado a partir de suas existências
material e biológica: “Sou homem”.
“Sou mulher”. A maneira de nos relacionarmos à corporeidade – a nossa e
a dos outros –, porém, sofre influência de
diversas circunstâncias culturais e sociais,
capazes de serem observadas no cotidiano: da religião ao trabalho, da cidade de
nascimento à família em que fomos criados
ou aos gostos musicais de nossos pais.
Do referencial estabelecido por René
Descartes (1596-1650) – “Penso, logo
existo” – e, posteriormente, pelos mecanicistas, passando pelo desenvolvimento
da Biologia, e, mais recentemente, pela
Genômica, chega-se a um ideal de corpo cada vez mais visto como conjunto de
informações, sendo passível de manipulação, modulação e controle. A afirmação
é do professor Marko Synésio Alves Monteiro, do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que lidera
o Grupo de Estudos Interdisciplinares em
Ciência e Tecnologia (GEICT) e investiga,
dentre outros temas, os corpos digitais,
as controvérsias sociotécnicas, as biotecnologias e os gêneros.
Conforme destaca o pesquisador,
muitas são as pesquisas e áreas a lidar com
o assunto, da “molecularização” – ou a ênfase na genética e na esfera molecular para
compreensão do corpo – à constante busca
por melhoramento e superação dos limites
naturais. Há, ainda, vertentes de estudo
que pensam a corporeidade em sua interface com as tecnologias digitais, a exemplo
do design interativo. As investigações se
desdobram a partir de questões centrais:
como esse corpo contemporâneo existe
em relação à ciência, à moda, à estética, ao
esporte e à medicina, dentre outras áreas?
Nos estudos sociais da ciência e da
tecnologia, o novo conceito tem se expandido para tratar de corpos em constante
transformação. À primeira vista, o que vem
à mente são transformações físicas motivadas por padrões estéticos, como implantes
de silicone, cirurgias modeladoras ou, até
mesmo, intervenções ortodônticas. Há algo
além disso, contudo. No livro Os dilemas
do humano: reinventando o corpo numa era
Confira vídeo sobre a pesquisa:
(bio)tecnológica, Marko Synésio trata das
mudanças em curso na concepção moderna
de “corpo”, a partir do advento das novas
tecnologias de manipulação genética.
A obra é fruto do doutorado do autor
em Ciências Sociais e promove importante
debate sobre como as biotecnologias, o
avanço da Medicina e as crescentes possibilidades de manipulação corporal afetam
as concepções culturais em torno do “corpo” e do significado de “humano”. “Inicialmente, do ponto de vista antropológico ou
das ciências sociais, é preciso questionar
um conceito unívoco ou universal. A ideia
de que haja uma entidade discreta e autoevidente denominada ‘corpo’, e que seja
universalmente reconhecida enquanto tal,
não faz muito sentido”, declara o professor,
que atenta para o fato de que essa categoria
existe dentro de um contexto, de um sistema de relações sociais e significados.
Imerso numa série de experiências
etnográficas em laboratórios, Marko Synésio desenvolveu pesquisa na Universidade do Texas, em Austin, com cientistas
que buscavam construir nova terapia con-
tra o câncer de próstata, a partir do uso de
computação avançada para prever o dano
causado por luz laser nos tecidos. Surge
daí um importante debate sobre como
“verdades científicas construídas em laboratório” participam da construção e da
manutenção de relações sociais de poder
desiguais, por exemplo.
Ao tratar da forma de trabalho desses
pesquisadores, e do tipo de corpo que se
constituía nas bancadas do laboratório, o
professor pôde vislumbrar a contribuição
de muitas áreas da ciência e da tecnologia.
Na visão de Marko Synésio, as ciências sociais têm buscado a discussão de
políticas públicas e a ampliação do enten-
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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dimento das pessoas sobre o corpo, por
meio do debate, por exemplo, de questões
éticas relacionadas a pesquisas de saúde. “Que o digam as teóricas feministas,
que propõem a reflexão sobre estudos na
área da reprodução, questionando a forma
como algumas delas objetificam o corpo
da mulher, reproduzem e produzem desigualdades”, conclui.
Somos todos ciborgues?
Em 1985, a filósofa feminista americana Donna Haraway publicou seu Manifesto para ciborgues: ciência, tecnologia
e feminismo socialista no final do século
XX, documento que ditou novos parâmetros para a crítica das identidades, em defesa das diferenças, e buscou reivindicar a
apropriação dos avanços científicos e tecnológicos. Na definição da própria autora,
um “ciborgue é um organismo cibernético,
um híbrido de máquina e organismo, uma
criatura de realidade social e, também,
uma criatura de ficção”.
Ainda que pareça inventada em um filme de ficção científica, a ideia de “ciborgue”,
conforme discutida por Donna Haraway, é
uma forma de chamar atenção para o fato
de que o corpo humano aparece cada vez
mais entrelaçado às tecnologias. Além disso, fica o alerta para a necessidade de reflexão sobre o tema, de forma consciente e
crítica, tanto na saúde quanto no esporte, na
moda e no cotidiano.
Para a artista Maria Angelica Melendi de Biasizzo, doutora em Estudos
Literários e professora da Escola de Belas
Artes da UFMG, vive-se, hoje, com a sensação de que não há limite para os corpos, nem para suas potencialidades. Além
disso, tanto as ciências humanas quanto
as investigações tecnológicas alimentam
essa sensação. Segundo a pesquisadora,
o corpo ciborgue proclamado por Donna
Haraway é um fato consumado. Afinal,
todos (ou quase todos) têm computadores, lentes de contato, dentaduras novas,
unhas postiças e seios impecáveis, dentre
outras coisas que desnaturalizam os humanos. “Talvez esse corpo que nos ocupa
seja apenas uma miragem. Por meio de
próteses mais ou menos complexas, estaria o sonho do corpo-máquina perfeito e
eterno que persegue a humanidade desde
8
sempre. Estratégias vãs para distanciar a
morte”, defende Melendi.
Já na acepção de Marko Synésio,
também falta, aos indivíduos, conhecimento
acerca dos processos, produtos e métodos
tecnológicos comuns ao cotidiano de todos.
“Quando usamos pasta de dente ou filtro
solar com nanopartículas, por exemplo, estamos cientes de como essas tecnologias
foram produzidas? Sabemos se causam danos ou não? Quando vemos a obsessão pela
cirurgia estética, desde implantes de silicone
até lipoaspirações, discutimos a ética dessas alterações? Como elas são vivenciadas?
Como o Estado deve se posicionar diante de
tais questões?”, destaca.
Para o pesquisador, à medida que
o homem se torna mais ciborgue – posto
que cada vez mais alterado pela tecnociência, com o auxílio de anabolizantes, roupas
especiais e próteses –, é possível pôr em
questão, até mesmo, a validade da separação entre o que seja natural e artificial. Nos
esportes de alto desempenho, por exemplo, existiriam, hoje, atletas “naturais”? A
competição é justa ou ganha quem tem mais
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Transgênero, travesti ou transexual?
O termo “transgênero” – que poderia ser usado
como guarda-chuva conceitual – não é consenso. Afinal,
nem todos os transexuais se identificam com a definição.
“Na verdade, não há termo correto. O importante é saber
como o sujeito se autoidentifica, para que possamos usar
o melhor vocábulo em cada caso”, explica a professora
Érica Renata de Souza.
Do ponto de vista do conhecimento médico-psiquiátrico, a transexualidade é considerada um transtorno
psíquico, e a travestilidade é classificada como “homens
que se vestem de mulher”. No âmbito dos movimentos
sociais, há pessoas que usam a denominação “travesti”
como afirmação política, por não se conformarem com
uma norma de gênero binária, responsável pela divisão
“homem/mulher”.
“O senso comum diz que transexuais seriam
pessoas que fazem uma transição de gênero e realizam determinadas intervenções corporais, por meio
de hormônios, cirurgias ou implantes de silicone. Tais
limites, porém, são muito tênues na experiência. As
próprias pessoas se autodeclaram de forma diferente,
de acordo com os contextos”, esclarece o professor
Marco Aurélio Prado.
tecnologia? “A busca por melhoria no desempenho já alcançou o nível molecular. Há
muitas pesquisas sobre o chamado doping
genético. Neste cenário, se mudamos o corpo a partir dos genes, ainda se trata de doping? Se sim, como detectá-lo?”, completa.
Direitos e preconceitos
Outro campo crescente de pesquisas
sobre corporeidade relaciona-se à questão das transexualidades, tema, segundo
Marko Synésio, de grande interesse. Conforme destaca o pesquisador, transgêneros
e transexuais põem em xeque as visões
binárias da sociedade – marcada pela dicotomia “homem/mulher” – sobre gênero
e sexo biológico. Além disso, as experiências e os sofrimentos dos indivíduos representam dilemas a serem enfrentados: “Um
diálogo aberto entre a Medicina, a lei e as
Ciências Sociais traria grandes avanços à
proteção dessa população, em geral, extremamente marginalizada. Tal aproximação
também ajudaria a modernizar a visão do
grande público, que ainda trata com grande desconfiança e preconceito qualquer
prática ou forma de vida diferente da heterossexualidade”, sublinha.
Para dar visibilidade a discussões relacionadas ao corpo transexual,
a Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG) conta com o Núcleo de Direitos
Humanos e Cidadania LGBT, o Nuh, que
desenvolve ações de caracterização das
realidades de lésbicas, gays, bissexuais,
travestis, transexuais e transgêneros,
assim como das formas de violência, de
homofobia e de transfobia.
Há cinco anos sob coordenação do
professor Marco Aurélio Máximo Prado,
doutor em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(PUC-SP), o Nuh foi institucionalizado em
dezembro de 2007, por meio de convênio
entre a UFMG e a Secretaria de Direitos
Humanos da Presidência da República. O
pesquisador também está à frente do projeto “Direitos e violências na experiência
de travestis e transexuais na região de Belo
Horizonte”, financiado pela FAPEMIG, que
pretende mapear as formas de agressão e de
acesso a direitos de travestis e transexuais
femininas em trabalho sexual em BH. A iniciativa nasceu do alto índice de assassinatos
e do interesse do movimento das travestis
na cidade, que buscava dados para discussão de políticas públicas no município.
“Do ponto de vista do conhecimento
científico sobre as travestilidades, a Antropologia é pioneira no Brasil e foi responsável por ampliar as pesquisas sobre
diversidade sexual. Sendo assim, quase
todos os estudos no Brasil são de cunho
etnográfico”, explica, ao pontuar que as
travestis estão em um campo de intervenção de várias forças, sejam elas de cunho
religioso, político ou policial. Para realização do trabalho de campo, foi preciso que,
antes, os pesquisadores se inserissem na
comunidade, de modo a desenvolver relações de confiança e a mapear experiências
de direito e de violência.
Marco Aurélio Prado observa, ainda,
que as experiências LGBT foram, por muito
tempo, deslegitimadas pelas ciências. Em
função disso, essa comunidade acabou por
criar conhecimentos quase espontâneos
sobre suas próprias experiências, para dialogar com as instâncias políticas. “Essas
pessoas acumularam saberes que a gente
não tem. Nosso trabalho é delicado, pois
é um campo violento, cheio de vulnerabilidades”, conta.
O pesquisador identifica um hiato
nos estudos sobre travestis no Brasil,
posto que as investigações estão muito
datadas à emergência da Aids, entre as
décadas de 1980 e 1990. A partir dos
anos 1990 é que se inicia no País a discussão sobre as transexualidades à luz
dos direitos humanos. Para Érica Renata
de Souza, professora do departamento de
Antropologia e Arqueologia da Faculdade
de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich)
da UFMG e integrante do Nuh, um dos
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
9
problemas centrais para os estudos na
área das transgeneridade é a escassez de
literatura acadêmica sobre o tema – para
não falar da lacuna de conhecimentos e
políticas públicas adequadas. “Essa população é alvo de muito preconceito e de
violências de vários tipos, sobretudo, física e simbólica. É ainda mais preocupante
pensar que as agressões permeiam todas
as instituições sociais: a família, a escola
e o trabalho”, esclarece.
Érica coordena a extensa pesquisa
denominada “Transexualidades Masculinas
e saúde pública no Brasil”, que estuda o
acesso e a restrição de homens transexuais
aos serviços de saúde. A professora explica
que, no Brasil, grande parte dos “homens
trans” nem se identifica como transexual, e
se apropria do termo “homens trans” para
se autorreferenciar. “A falta de entendimento
dos termos e seus usos é um problema, à
medida que a diversidade de expressões e
identidades não é respeitada e o sujeito não
se identifica com uma categoria na qual
foi arbitrariamente posto por determinado
discurso, seja ele proveniente de médicos,
psicólogos ou familiares”, explica.
Nos últimos dois anos, o grupo coordenado por Érica tem participado de espaços de sociabilidade – inclusive, nas redes
sociais –, a fim de compreender melhor as
transmasculinidades. Assim como a maior
parte das pesquisas sobre a temática LGBT,
também essa tem cunho antropológico, o
que revela a intrínseca relação entre o biológico e o cultural: “Não há linha divisória
identificável entre natureza/biologia/corpo
e cultura/sociedade/mente. Não há corpo,
sujeito, sentimento ou experiência que
possam ser vividos ou concebidos fora de
uma cultura”, conclui.
Resultados preliminares da pesquisa
indicam que a violência física e simbólica
contra homens trans é um fato quase que
naturalizado em todas as instituições sociais. “É mais que urgente a elaboração de
políticas públicas que não se pautem em
discursos patologizantes, mas contemplem a saúde integral dos homens trans e
o reconhecimento de sua cidadania”, defende a professora.
No Brasil, o Ministério da Saúde oferece atenção às pessoas transexuais, por
meio do Sistema Único de Saúde (SUS),
desde a publicação da portaria nº 457,
10
De acordo com o Ministério
da Saúde, o processo transexualizador – ou cirurgia de redesignação de
sexo – pode ser definido como um
conjunto de estratégias assistenciais
para transexuais que pretendem realizar modificações corporais, em função de um sentimento de desacordo
entre seu sexo biológico e seu gênero, em atendimento às legislações e
pareceres médicos.
de agosto de 2008, seguida da portaria
2.803, de 2013, que redefiniu e ampliou
o processo transexualizador, incluindo o
atendimento aos homens trans e travestis.
Segundo dados oficiais, até 2014, houve
6.724 procedimentos ambulatoriais e 243
cirurgias referentes ao processo transexualizador no SUS. Em novembro de 2013, o
Ministério da Saúde aumentou o número de
procedimentos ambulatoriais e hospitalares, incluindo procedimentos para redesignação sexual de mulher para homem (homens trans). A transexualidade está listada
na Classificação Internacional de Doenças
(CID) e ainda é considerada uma patologia
mental por diversos setores da Medicina.
Para Érica, esse movimento diz muito
sobre como a medicina ainda não consegue lidar com a transexualidade a partir
de um viés que não seja patologizante: “É
uma cilada: ao mesmo tempo em que pode
possibilitar o acesso a hormônios e a cirurgias, reifica a ideia de que se trata de
doença e de que essa é a única forma de
resolver o ‘problema’”, questiona. O quadro é ainda mais complexo quando se sabe
que muitos transexuais não se identificam
com o perfil exigido para ter acesso aos
hormônios e à cirurgia, enquanto outros
não querem se submeter à operação.
“Mesmo entre aqueles e aquelas que
desejam hormônios e cirurgias, o acesso
deveria se dar de forma mais autônoma, e
não por meio da dependência de um profissional que ‘ateste’ a necessidade de o indivíduo se submeter ao processo transexualizador”, defende a professora, para quem
há, hoje, uma espécie de “tutela” médica,
como se o outro não tivesse condições suficientes de falar de si e por si.
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Eis as instituições habilitadas
pelo SUS a realizar o processo transexualizador: Hospital das Clínicas da
Universidade Federal de Goiás, Hospital
de Clínicas de Porto Alegre, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Hospital Universitário Pedro Ernesto, da
Universidade Estadual do Rio de Janeiro
(RJ), Fundação Faculdade de Medicina,
da Universidade de São Paulo (USP),
e Hospital das Clínicas da Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE).
Corpos e direitos
As pesquisas conduzidas por Érica
Renata de Souza e Marco Aurélio Prado reforçam a necessidade de acesso a serviços
de saúde para a população trans, no que
concerne a referenciais de democracia, cidadania e direitos humanos. Entretanto, os
estudos encontram desafios impostos por
outras áreas do conhecimento e pela própria
lógica de funcionamento da sociedade. Para
Laís Godoi Lopes, doutoranda na UFMG, o
Direito, por exemplo, encontra-se em nítido
descompasso com as outras ciências em
relação ao tratamento do corpo humano. “A
prática e a regulação consideram o corpo
como dado, uma realidade biológica estática e prévia ao Direito, que deve ser protegida na sua inteireza, inclusive contra a ação
da própria pessoa”, explica.
A pesquisadora acredita que tal posicionamento revela o paternalismo presente
no conceito jurídico de integridade física,
que veda a livre disposição do próprio
corpo. Sua pesquisa junto à Faculdade
de Direito da UFMG, intitulada “A família
para além do gênero: reformulações dos
direitos sexuais e reprodutivos a partir das
biotecnologias”, parte do gênero como
conceito ainda normativo, que constrange
as possibilidades de vivência e o reconhecimento social das diferentes formas
de existir e de se relacionar no mundo.
Contudo, segundo Laís, as biotecnologias
apontam para possibilidades ilimitadas de
No que tange aos direitos
LGBT, a Argentina tem a legislação
mais avançada do mundo. A “Ley
de Identidad de Género da Argentina”, de 2012, desburocratizou uma
série de demandas da comunidade.
Projeto similar foi apresentado ao
Congresso brasileiro em 2013,
como “Lei João W. Nery” – em
referência ao primeiro transexual
brasileiro –, e ainda se encontra
em tramitação no Legislativo. A
aprovação do projeto ajudaria a
desconstruir o modelo médico-jurídico que rotula a transexualidade como doença a ser regulada
pelo Direito, e não como expressão
legítima da diversidade de gênero.
vivência e de reconstrução do corpo, de tal
modo que não mais se sustenta naturalizar
a identidade de gênero como algo determinado por uma realidade corporal inata,
como o genital ou os genes.
“O gênero não é um destino biológico
imutável. A identidade de gênero é uma construção relacional, que, em última instância, só
pode ser definida pelo reconhecimento social
reivindicado pela pessoa. Ou seja, por sua
autoidentificação”, defende. O corpo, neste
sentido, passa a ser o primeiro espaço de
democracia, de construção da própria identidade, na tensão com o reconhecimento do
outro. Essa perspectiva comporta, ainda, a
luta por direitos dos movimentos sociais –
inclusive, o direito à saúde e ao próprio corpo, cotidianamente negado, como visto nas
pesquisas desenvolvidas por Marco Aurélio
Prado e Érica Souza.
Laís Lopes defende que o Direito
seja readequado às novas realidades, que
compreendem o corpo como construção
social e tecnológica, aberta a intervenções
e ressignificações. “As biotecnologias redimensionam as fronteiras corporais. As
possibilidades abertas por elas têm que ser
consideradas em suas consequências políticas e jurídicas”, lamenta.
Na história, na cidade
Denise Berruezo Portinari, doutora
em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC
Rio), desenvolve e orienta pesquisas relacionadas a diferentes formas de articulação
dos corpos com o espaço urbano. Professora do Programa de Pós-graduação em
Design da PUC-Rio, a pesquisadora parte
do pensamento de autores como Michel
Foucault, Roland Barthes, David Le Breton,
Judith Butler e David Harvey, dentre outros, para compreender melhor as diversas
linhas de força que se entrecruzam na produção de formas e relações corpo/cidade.
Dentre as motivações para estudar
o tema, está a possibilidade de produção
ou de encorajamento de alternativas, de
“contracondutas” – conforme termo de
Foucault – e de formas de resistência às
forças biopolíticas que atuam na produção
dos corpos e das subjetividades contemporâneas. “Certamente, vivemos em uma
sociedade na qual o corpo tem lugar privilegiado na constituição das identidades.
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Neste sentido, podemos evocar Foucault,
quando aponta a valorização do corpo, da
saúde, da descendência, da longevidade,
da higiene, do asseio e da multiplicação
dos cuidados corporais como forma de
autoafirmação da burguesia em seu trajeto
de ascensão – processo que culminará, no
século XIX, com a invenção da sexualidade
como atributo fundamental e definidor desse ‘corpo burguês’”, elucida.
O corpo fundado no século XIX, portanto, seria “histórico”, por não contemplar a
“essência” do corpo, nem conter em si a verdade. “A verdade que se produz a partir dos
corpos é o efeito de um jogo de forças, de valorações, de técnicas, de práticas, de formas
de interpretação”. Segundo a pesquisadora,
as ciências estão engajadas, ao menos desde o século XIX, em projetos biopolíticos de
produção dos corpos e da sexualidade – sobretudo, no que tange à extensão do domínio
da “vida”, no sentido biológico do termo.
“Trata-se de produção ininterrupta de
novos saberes, técnicas, estratégias e tecnologias de extensão da vida, da ‘saúde’ e do ‘bem-estar’ mental e físico, que implica, também, na
produção constante de novos sujeitos, como
a criança hiperativa. Criam-se, ainda, novas
técnicas e produtos para investigar, controlar e
tratar as patologias”, descreve Denise.
Como forma de subversão a tal ordem, surge a necessidade de críticas que
permitam reintroduzir o estranhamento (o
queer), a finitude, a incompletude e a problematização da questão da autonomia do
indivíduo, de suas possibilidades de escolha e de produção de outras formas do
viver. Neste contexto, importante abordar
a pesquisa de Fernanda Ribeiro Coutinho,
orientada por Denise Portinari, sobre a
body modification e sua produção de “beleza freak” como forma de subversão das
estéticas e das corporeidades urbanas.
Atualmente na França, para um estágio
doutoral, Fernanda Coutinho trabalha com a
perspectiva antropológica que compreende
o corpo como construção social. “Julgamos
que há, por parte da cultura na qual o homem
se insere, assimilação das propriedades biológicas que lhe são particulares”, afirma a
pesquisadora. Ou seja, as práticas do corpo
aparentemente “naturais” são vistas como
culturalmente produzidas, de acordo com as
singularidades de cada sociedade. Por isso,
noções como as de nascer e morrer, além de
distinções de traços físico-raciais, de sexo e
funções humanas (fome, sono, desejo sexual
etc.), são intermediadas pela cultura.
12
A expressão body modification diz respeito, nos EUA e na
Europa, a uma série de práticas
realizadas por sujeitos que se autointitulam body hackers, self-made
cyborgs, grinders, primitivos modernos, dentre outros termos relacionados
a mudanças corporais. Fernanda Coutinho
pontua que, no Brasil, a diferenciação das
práticas não aparece de forma clara, uma
vez que as mais variadas correntes aglutinam-se sob o genérico termo body modification. Em outras palavras, trata-se de
“modificações corporais” como tatuagens,
implantes subcutâneos, escarificação, bifurcação da língua ou eyeball tattoo – quanto
se tatua a região branca dos olhos.
Esses estilos produzidos no interior
das subculturas configuram-se como “táticas”, na medida em que estão associados
a contracondutas e a formas de resistência
de vanguarda adotadas por grupos identitários minoritários e/ou de estratos sociais
marginalizados, com acesso restrito aos
mercados de bens de consumo. Segundo
Fernanda, as motivações para a promoção
das alterações corporais podem ser percebidas sob dois aspectos: “Há reivindicação
de autonomia do sujeito em relação ao
próprio corpo, em termos políticos, além
de forte rejeição ao que denominam e classificam como ‘corpo burguês’, normatizado pelos dispositivos de poder em termos
estéticos, socioeconômicos e de sexo”,
afirma. Tal “corpo burguês” caracteriza-se
por ser branco, longilíneo, de musculatura
definida, heterossexual e cristão. Para os
adeptos da body modification, tal representação se aproxima dos ideais da eugenia – ou a investigação de características
capazes de melhorar ou empobrecer as
qualidades raciais das gerações futuras.
Quando destituídos de seu significado
original, estes estilos de modificação corporal
são comercializados de forma diluída e pasteurizada, por meio de estratégias voltadas,
sobretudo, ao público jovem, o que leva a um
movimento de assimilação, como ocorreu
com a tatuagem e o piercing, incorporados
maciçamente pelo mercado. “O corpo é uma
biografia em construção”, conclui Fernanda.
Linguagens e excessos
“Estamos nos tornando corpos intolerantes. Essa mistura entre carbono e silício, ou seja, entre corpo e tecnologias, não
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
acontece de maneira harmoniosa”. Tal afirmação, feita por Graziela Andrade, bailarina
e professora adjunta do curso de Licenciatura em Dança da UFMG, no departamento
de Fotografia, Teatro e Cinema da Escola de
Belas Artes, pode parecer na contramão das
discussões apresentadas até aqui. A observação, contudo, vem ao encontro da angústia de muitos indivíduos em relação ao atual
excesso de tecnologia e de informação que
circulam em nosso cotidiano.
A pesquisadora observa que, na atualidade, somos treinados a lidar com uma
troca de informações condicionada pela
compressão do espaço e do tempo. “Quando as coisas não acontecem na velocidade
que desejamos ou esperamos, quando o
corpo está presente de maneira real e não
digital, quando precisamos dar conta de um
tempo lento e de um espaço longo, parece
que perdemos habilidades e que o reconhecimento da alteridade tornou-se bastante
problemático”, explica.
Suas investigações dizem respeito ao
fato de que temos muito mais contato com sujeitos de ‘corpo ausente’ do que com pessoas
de ‘carne e osso’. “Por isso, talvez estejamos
ainda mais intolerantes às diferenças”, pontua
a pesquisadora, ao analisar o comportamento
humano em redes sociais digitais.
Na dança, percebe-se, desde o final do
século XIX, a tentativa de reflexão sobre um
corpo que não siga os princípios cartesianos, que não se separe da mente e possua
existência – pensante – em si mesmo. “Este
corpo que é sujeito-objeto no e do mundo,
a meu ver, tem grande potência crítica para
experimentar e refletir sobre suas aproximações com as tecnologias. Não quero dizer
com isso que os bailarinos estejam ‘imunes’
aos efeitos da técnica. Ninguém está! Mas,
enquanto campo de pensamento e do fazer
artístico, acredito que a dança tenha muito a
colaborar no que diz respeito a essa grande
questão: ‘Que corpo somos?’”.
entrevista
Em defesa
do mérito
Um dos mais respeitados nomes da
ciência brasileira, José Israel Vargas
analisa movimentos, obstáculos e
soluções para a pesquisa nacional
Maurício Guilherme Silva Jr.
Secretário de Estado de Minas Gerais durante o governo Aureliano Chaves e
ministro de Ciência e Tecnologia ao longo
das gestões dos presidentes Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso – entre
1992 e 1998 –, José Israel Vargas é um dos
principais nomes da produção e da gestão
científicas no País. Formado em Química
pela Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG), tornou-se PhD pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra, e atuou,
ainda, como embaixador do Brasil junto
à Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Desse modo, auxiliou a concretização de
algumas das mais relevantes iniciativas ligadas ao desenvolvimento da pesquisa em
solo brasileiro.
Mineiro de Paracatu, Vargas foi gestor, pesquisador e professor em diversas
instituições nacionais e internacionais.
Como físico – campo do conhecimento
ao qual se dedica com mais afinco –, desenvolveu trabalhos sobre as aplicações da
Correlação Angular Perturbada e o efeito
Mössbauer, ligado ao estudo das transformações nucleares nos sólidos. Dentre suas
tantas atividades, foi diretor do Instituto
de Pesquisas Radioativas da UFMG – de
onde, aliás, é professor emérito – e colaborou com a construção do laboratório de
interações hiperfinas do Centro de Estudos
Nucleares de Grenoble, na França.
Nesta entrevista, o professor e ex-ministro relembra histórias brasileiras de sucesso
na área de ciência, tecnologia e inovação e comenta o que, definitivamente, precisa mudar.
A seu ver, o que é mais importante
para o incentivo a boas gerações de pesquisadores?
Há necessidade de iniciativas criativas e eficazes. Lembro-me, por exemplo,
da Fundação Getúlio Vargas, que criou um
colégio, em Nova Friburgo (RJ), para recrutar meninos, em todo o Brasil, por meio
de concursos de seleção. Muitas pessoas,
hoje com 60, 70 anos, frequentavam esse
colégio de liderança. Recordo-me de Antônio Otávio, que foi presidente da Fundação
João Pinheiro e fez um doutorado no MIT
[Massachusetts Institute of Technology],
em educação. Ele se formou na Faculdade
de Ciências Econômicas da UFMG, que
também é um bom exemplo de criatividade
no ensino, já que lá, em certo período, foi
implantado um regime de tempo integral
para os alunos. Isso culminou com impor-
tante geração de economistas mineiros. Da
mesma maneira, Francisco Magalhães, na
Escola de Engenharia, teve a iniciativa de
criar o Instituto de Pesquisa Radioativa,
fato mais relevante da ciência durante a
guerra. De um lado, estava a importância
estratégica do ato. Afinal, muito mais do
que a produção da bomba atômica, o que
nos interessava era o sonho da energia
nuclear. Por meio da obtenção de energia
barata, seria possível estabelecer, restaurar
ou relançar uma nova Revolução Industrial.
Conforme dizia um antigo presidente da
comissão de energia atômica americana,
um dia, a eletricidade seria tão barata que
não valeria a pena emitir a conta de luz. Outra ótima iniciativa no Brasil diz respeito ao
Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA),
do qual tive a extraordinária chance de participar, no começo dos anos 1954, junto
ao departamento de Física, recrutado por
Paulus Aulus Pompeia, um dos responsáveis pela criação da a Física brasileira. O
Instituto permanece uma grande escola de
Engenharia Eletrônica, de aeronaves, aerovias e eletrônica, além de ter dado origem à
Embraer. Trata-se de excepcional estrutura,
criada pelo tenente coronel Montenegro
[Casimiro Montenegro Filho], que entre-
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Maurício Guilherme Silva Jr.
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MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
vistava todos os novos recrutas que ali
estudariam. Cheguei lá aos vinte e poucos
anos, em consequência de um curso de reciclagem de professores de ensino secundário de Física, baseado no diagnóstico de
que o nível estava muito baixo. No total,
éramos cinquenta professores, dois por
estado, patrocinados pelo Conselho Nacional de Pesquisa. De Minas Gerais, além
de mim, foi escolhida a professora Beatriz
Alvarenga. Fiquei dois anos e meio por lá.
E a iniciativa revelou-se realmente muito
interessante. Os alunos do Instituto foram
recrutados no Brasil inteiro. Para tal, bancas examinadoras deslocavam-se para as
diversas regiões do País, com o intuito de
realizar seleções eficazes, de modo a identificar jovens com mérito para ingressar no
ITA. Importante ressaltar, também, que o
Instituto recebeu professores estrangeiros,
quase todos dos MIT – alguns dos quais,
bastante famosos. Muitos anos depois, eu
e o presidente da Finep [Financiadora de
Estudos e Projetos], José Pelúcio Ferreira
– que teve papel muito importante no desenvolvimento da ciência e da tecnologia
no Brasil – fomos entrevistar Montenegro,
a quem perguntamos: “Como é que o senhor conseguiu fazer o ITA?”. Ao que ele
nos respondeu, com tranquilidade: “Muito
simples”. Primeiramente, ele era amigo de
Getúlio Vargas, pois tinha sido um dos
pilotos, ao lado de “Melo Maluco” [apelido de Francisco de Assis Correia de
Melo], que haviam apoiado a revolução
de 1930. Por ter prestígio com Getúlio,
Montenegro conseguiu ficar livre do
Dasp, o Departamento de Administração
do Serviço Público Brasileiro. Podia,
assim, fixar o salário dos professores a
preços de mercado, além de dar bolsas
aos alunos. Pôde, também, não consultar
o Estado Maior da Aeronáutica, que, provavelmente, teria sido contra aquilo tudo.
Para a boa formação de pesquisadores,
portanto, não há muito mistério: entidades de formação de pessoas de alta qualidade são constituídas por professores
de alta qualidade, bem selecionados,
bem pagos e respeitados. No caso do
ITA, essa elite, 20 anos depois, gerou
a Embraer. Escutei no rádio, há pouco,
que o balanço da Embraer gerou U$ 20
bilhões em produtos. Ou seja: caso haja
o desejo de gerar produtos de boa qualidade, é preciso, obviamente, de gente de
boa qualidade. Por sua vez, gente de boa
qualidade é formada por professores de
boa qualidade. O papel da FAPEMIG, por
exemplo, é este: investir e induzir a boa
qualidade. E não é preciso de números
grandes para tal, nem de se tornar popular, já que qualidade não se encontra aos
“tropicões”. É preciso, sim, de bons processos de seleção e de pouca burocracia.
Pelo que percebo, o trabalho no ITA
revelou-se bastante significativo em sua
trajetória.
Do ponto de vista pessoal, minha
passagem pelo ITA foi formidável, pois, à
época, não havia pós-graduação no Brasil.
O Instituto era o único lugar onde os jovens
professores tinham casa, comida, roupa
lavada, salário suficiente, baixa carga horária e liberdade de realizar seus desejos.
Naquele mesmo período, ao lado de meia
dúzia de colegas, mais seniors do que eu,
também tivemos a chance única de ir a São
Paulo, para frequentar, semanalmente, um
seminário do famoso físico norte-americano David Bohm, que estava refugiado
do Macartismo no Brasil e fora recrutado
pela Universidade de São Paulo. Ele era,
digamos assim, o profeta de um novo ramo
revolucionário: a física quântica. Para além
de tais experiências, no ITA, também havia
o fato de que poderiam fazer pesquisa todos aqueles que assim o desejassem. Éramos estimulados e induzidos a isso. Neste
cenário, montei, talvez, o primeiro curso
de Física atômica experimental. Tempos
depois, eu e Beatriz Alvarenga trouxemos
tal modalidade a Belo Horizonte.
Com base em sua vasta experiência, o
que se revela essencial à gestão da ciência?
Conforme destaquei, só é possível
formar cientistas e técnicos de alta qualidade por meio de cientistas e técnicos de alta
qualidade. Não há outra receita. Lamento
que, em diversos outros setores – com
Do ponto de vista pessoal,
minha passagem pelo ITA foi
formidável, pois, à época,
não havia pós-graduação
no Brasil. O Instituto era o
único lugar onde os jovens
professores tinham casa,
comida, roupa lavada,
salário suficiente, baixa
carga horária e liberdade de
realizar seus desejos.
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exceção da Embrapa, instituição da qual
assisti ao nascimento, por ser membro
do Conselho Nacional de Pesquisa, que
havia deixado de ser um órgão público,
submetido ao Dasp, para se transformar
numa fundação pública de direito privado
–, haja impedimentos ao desenvolvimento
de iniciativas importantes. Na Constituição
de 1988, por exemplo, havia coisas absurdas, como a proibição de contratação de
cientistas e técnicos estrangeiros por instituições públicas brasileiras. Levei quatro
anos para tirar isso da Carta, mas ainda
existiam dispositivos absurdos, como o
chamado “regime jurídico único”, que faz
com que todos os universitários brasileiros federais tenham o mesmo salário,
independentemente da universidade e da
qualidade do que fazem. Trata-se de um
sistema democrático entre aspas, que consiste em nivelar tudo por baixo. É indispensável reconhecer o mérito. Evidentemente,
contudo, nem tudo é ruim. Existem canais,
como a FAPEMIG, que estimulam aqueles
com melhor disposição, em universidades
voltadas e treinadas à pesquisa, e permitem que haja recursos adicionais, por via
de bolsas de contrato etc. De todo modo,
isso ainda é insuficiente, pois os gastos
totais com a ciência, no Brasil, estão em
pouco mais de 1% do PIB [Produto Interno
Bruto], índice muito pequeno, se comparado a países como Japão e Coreia. Outro
ponto importante diz respeito à participação do setor privado – principalmente,
das empresas – no esforço de ciência e
tecnologia, o que é muito restrito e passa
por altos e baixos no Brasil. À época em
que fui ministro, aprovamos duas leis que
tiveram muito sucesso. A de número 8.661
permitia que as empresas destinassem até
8% do imposto devido à tecnologia. Caso
aplicassem na área, as empresas abatiam
a porcentagem correspondente do imposto. A novidade teve muito sucesso, durou
10 anos e acabou. A outra lei, de número
8.248, permitia aplicação de 5% do faturamento bruto das empresas em informática.
Desses 5%, metade podia ser resultado de
projetos mistos, entre as universidades e o
setor privado. A metade era muito grande
16
e gerou uma série de iniciativas importantes, como um programa para o desenvolvimento dos softwares, o Softex 2000.
Como o senhor observa a divulgação
científica brasileira? Em sua visão, os jornais, as revistas, os sites e meios audiovisuais realizam bons trabalhos na área?
O Brasil, na verdade, nunca deu a devida importância à ciência. Costumo dizer
que o País não incluiu, entre seus sistemas
e valores, a educação em geral, e, em particular, a educação científica. Apesar disso,
lembro-me, agora, de uma iniciativa de alta
qualidade, promovida pela TV Escola, que
consiste na transcrição e na dublagem de
ótimos filmes, feitos, na maioria das vezes,
pela BBC [a emissora inglesa de televisão
British Broadcasting Corporation]. Um
deles, muito interessante, abordava o darwinismo. Um programa como este nos
lembra, por exemplo, que a maioria das
experiências de Darwin foram repetidas no
jardim de sua casa. E Darwin, naturalmente,
tornou-se um marco na ciência mundial e
na história do homem. O darwinismo, aliás, teve como precursor o próprio avô do
cientista. Em outros episódios, a TV Escola
abordou o teorema de Pitágoras, a evolução
da Astronomia e da geometria, a origem da
eletricidade, dentro outros assuntos. Iniciativas como estas são extremamente relevantes. As TVs universitárias também precisam
investir em programações assim.
Como o senhor analisa o estudo, o
aprendizado e o ensino da Química e da
Física na atualidade?
Em primeiro lugar, é inegável que o
ensino se expandiu enormemente. Fui o
primeiro doutor em Física e Química do
Brasil, mas era outro universo. Hoje, há
centenas de doutores na UFMG, por exemplo. E a produção é de qualidade razoável.
Há uma imposição errônea do CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico], que obriga o bolsista
a publicar dois trabalhos por ano. Isso faz
com que os trabalhos não tenham grande
qualidade. De todo modo, há gente de
qualidade em Física e Química. Em 1964,
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
segui à França, onde, por sete anos, fui
dirigido por um prêmio Nobel. Trabalhavam comigo uns 20 doutores. Muitos dos
meus ex-alunos já se aposentaram e tenho
visto os meus netos como pesquisadores
de alto nível. Tive, é importante dizer, uma
vida privilegiada. Na atualidade, porém, o
relacionamento entre a ciência e o setor
produtivo continua mal. As duas leis de
incentivo que citei nesta entrevista tiveram
papel importante nesta aproximação, mas
foram abolidas. Além disso, os sistemas
brasileiros de financiamento não entenderam que um importante projeto de pesquisa, aplicada ou econômica, exige sigilo.
O originador da nova ideia, da inovação,
não confia em um grupo anônimo de julgadores de projeto. Quanto às empresas, a
situação é ainda muito mais grave: a perda de conhecimento pode significar perda
de dinheiro ou de sobrevida. Mais do que
poder, conhecimento é valor econômico. A
consequência da separação entre setores é
que perdemos muitos resultados valiosos
de ciência básica, com potencial aplicado,
devido à limitação de contato entre os pesquisadores e o sistema produtivo. Tenho
frequentado a universidade duas vezes por
semana. Ali, tomo conhecimento de trabalhos de Química desperdiçados. Afinal,
não há canais desburocratizados de financiamento. Um destes trabalhos, realizado
sob a direção de um de meus ex-alunos,
refere-se ao desenvolvimento de um nanocatalizador, capaz de produzir a decomposição fotolítica da água, pela radiação do
sol, com eficiência de 8%. Comentei, em
primeiro lugar, que o trabalho deveria estar
no Rio + 20 [Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável].
Falaram do trabalho na China, e, em breve,
pagaremos patente por ele. Eis o problema da propriedade intelectual. Para que
tudo funcione, é preciso de uma fonte de
publicação técnica, de um inovador e de
um empresário, um capitalista que corra o
risco da aplicação.
inovação
Software educativo auxilia formação de
estudantes e profissionais que lidam
com os desafios da saúde mental
Camila Alves Mantovani
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MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Os processos de ensino-aprendizagem têm se modificado bastante nos
últimos anos, principalmente, a partir da
introdução de tecnologias de informação e
comunicação como recursos pedagógicos.
Diante de uma geração de alunos cada vez
mais conectada e tecnológica, a presença
dessas ferramentas no processo educacional apresenta-se como um desafio à produção e à disseminação do conhecimento.
Vale ressaltar que a mudança no cenário das salas de aula deve-se, em grande
parte, à capacidade criativa dos professores, que percebem o valor das tecnologias
de informação e comunicação, do ponto de
vista educacional, e as organizam estrategicamente, para desempenhar importantes
papéis em contextos pedagógicos.
Coordenado por Nadja Lappann Botti,
professora e pesquisadora do departamento
de Enfermagem da Universidade Federal de
São João del-Rei (UFSJ), o projeto “Desenvolvimento de software educativo para o ensino de saúde mental” é um exemplo de tais
iniciativas no “território” das universidades.
A partir da sua experiência no ensino
da saúde mental e da Psiquiatria, junto ao
curso de Enfermagem, a professora percebeu que as metodologias tradicionais de
ensino-aprendizagem não se mostravam
eficientes, principalmente, no que concerne à motivação dos alunos a aprender.
Ao mesmo tempo, percebia-se certa tendência, no âmbito do ensino da saúde, ao
desenvolvimento de programas de ensino
mediado por tecnologias.
“Partindo do pressuposto das possibilidades do uso da tecnologia na educação
e da escassez de materiais pedagógicos e
de inovação no processo de ensino-aprendizagem na área da saúde mental, propusemos o projeto, cujo objetivo é o desenvolvimento e a validação de um software
educativo, voltado a alunos do curso de
Enfermagem”, explica. Tempos depois, o
público-alvo se expandiu, de modo a abarcar não apenas estudantes, mas, também,
profissionais de áreas correlatas.
Segundo a pesquisadora, a produção do software como instrumento de
ensino-aprendizagem na área da saúde men-
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tal, além de se revelar alternativa pedagógica, pode favorecer a valorização da
profissão, ao estimular a pesquisa e a
promoção de mudanças.
Teste de conhecimento
Desenvolvido pelo projeto, o software Quiz Loucura é um jogo de tabuleiro que, além de conteúdos específicos
de saúde mental, apresenta informações
voltadas à formação geral dos estudantes.
De acordo com Nadja Botti, todo o material
disponível foi estruturado em categorias.
Eis as categorias temáticas e os conteúdos do Quiz Loucura:
Formação geral
Categoria temática
Conteúdo
Artes plásticas e loucura
Escultores, pintores, colecionadores, museus, iconografias, personalidades, exposições artísticas relacionados
com a temática da loucura
Artes cênicas e loucura
Peças teatrais, filmes, desenhos infantis, documentários,
programas de televisão e atores relacionados com a
temática da loucura
Música e loucura
Cantores, compositores, grupos musicais, óperas, composições, músicas e apresentações musicais relacionados
com a temática da loucura
Literatura e loucura
Curiosidades e loucura
Escritores, poetas, contistas, obras literárias e frases
relacionadas com a temática da loucura
Expressões, traduções, cultura popular, mitos populares,
frases relacionadas com a temática da loucura
Formação específica
História da loucura
Concepções de loucura nas idades Antiga, Média, Moderna e Contemporânea
Paradigma asilar
Hospícios do Brasil e do mundo, tratamentos realizados
nos hospícios, personalidades e concepções do modelo
asilar
Paradigma psicossocial
Personalidades e concepções da reforma psiquiátrica,
serviços substitutivos de atenção à saúde mental, personalidades e concepções do modelo psicossocial
Legislação e loucura
Declarações, portarias, leis, resoluções e recomendações
relacionadas à temática da loucura
Personalidades e loucura
Biografia dos principais personagens e teóricos da história
da psiquiatria e da saúde mental
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
No âmbito dos itens gerais, há temas como
artes plásticas ou cênicas, música, literatura e curiosidades. Já na parte de formação
específica, estão disponíveis discussões sobre história da loucura, paradigma asilar ou
psicossocial, legislação e personalidades.
As etapas de desenvolvimento da interface seguiram a metodologia desenvolvida no campo da Engenharia de Software. Na
primeira etapa, foi trabalhada a identificação
dos objetivos e do público-alvo para definição da temática. Em um segundo momento,
partiu-se para o desenho do ambiente de
aprendizagem, bem como da modelagem da
aplicação. Tal fase representa a personalização do ambiente de acordo com características, motivações, preferências e metas do
aprendiz. Nela, são definidos os comandos
e a forma de execução da atividade proposta
– características de desempenho técnico e
controle –, a interação, o enredo e as metas
(desafios e recompensas).
Na terceira etapa, houve o planejamento da interface em termos de critérios de
interação, fundamentação pedagógica, conteúdo e programação. Em momento pos-
terior, definiram-se as tecnologias a serem
usadas na implementação do projeto. Para
tal, recorreu-se às ferramentas do Microsoft
Visual Studio 2010 e às linguagens de programação Asp.Net MVC e Silverlight.
Por fim, foi a vez dos processos de
avaliação e validação, iniciativas bastante
importantes ao ciclo de desenvolvimento
de softwares, posto que visam assegurar
os objetivos e metas propostos na concepção do projeto. “Selecionamos sujeitos representativos dos grupos-alvo,
como estudantes dos cursos de Medicina
e Enfermagem e professores com atuação em saúde mental e Psiquiatria de
universidades públicas, que procederam à
avaliação da interface com base em critérios pré-estabelecidos. No caso, o modelo
desenvolvido pelos autores Reeves e Harmon”, explica a coordenadora.
O referido modelo lista uma série
de critérios, tanto pedagógicos quanto
de interface, para avaliação da qualidade
de um software educacional. Dentre os
fatores de interface, estão, por exemplo,
questões como facilidade de navegação,
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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design da tela, compatibilidade espacial
do conhecimento, apresentação da informação, estética e funcionalidade. No que
se refere aos pedagógicos, destaque para
epistemologia, sequenciamento instrucional, validade experimental, valorização
do erro, estruturação, controle do aluno e
aprendizado cooperativo.
Desse modo, compõe-se a listagem
dos critérios em escala não dimensionada, representada por uma seta dupla. Em
cada extremidade da seta, são postos os
conceitos antagônicos, que caracterizam
o critério em avaliação. Em “controle do
aluno”, por exemplo, o avaliador pode
posicionar a marca mais à direita, onde
está o conceito “irrestrito”, ou mais à esquerda, local de “não existe”.
“A partir desse modelo, que avalia o
software com base na pontuação em escala
de conceitos antagônicos, sendo negativamente à esquerda e positivamente à direita,
encontrou-se média de 92,36±6,54 para
os critérios relacionados à interface com o
usuário e 86,08±9,18 para os pedagógicos”,
explica Nadja Botti, que destaca, ainda, que o
software tem cumprido com suas expectativas, mostrando-se alternativa ao ensino das
formações geral e específica da área da saúde
mental, não só no âmbito da graduação, mas,
também, para profissionais em situações de
treinamento e/ou aperfeiçoamento.
“Percebe-se que os softwares educativos podem promover relação pedagógica
motivadora e interativa quando professores
e alunos os utilizam como recursos auxiliares às atividades de ensino-aprendizagem”,
conclui. Oferecido gratuitamente na web, o
software encontra-se disponível no endereço www.quizloucura.com.br. Atualmente,
o principal desafio da pesquisa é manter o
jogo acessível ao público, pois, com o término do projeto, não há recurso para pagamento do domínio e hospedagem do jogo.
ProJeto: Desenvolvimento de
software educativo para o ensino de
saúde mental
CoordenAdorA: Nadja Cristiane
lappann Botti
ModAlidAde: Universal
VAlor: R$ 31.810,28
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MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
PECUáRIA
Genes da
prosperidade
Embrapa, Fiocruz e UFMG dedicam-se a
projeto pioneiro no País, que busca sequenciar
genoma das raças zebuínas Gir e Guzerá para
melhorar qualidade dos animais
Vivian teixeira
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Para quem vive da atividade pecuária – principalmente, do comércio de leite –,
prever características e condições capazes
de influenciar a produtividade do rebanho
é algo vital: quais os animais indicados e
mais resistentes às doenças? Que grupo
poderia produzir leite de melhor qualidade e adequado a cada produto? A partir de
agora, essas e outras questões poderão ser
respondidas com propriedade, em função
de um feito inédito nas Minas Gerais: o
sequenciamento do genoma das raças de
zebu leiteiro Gir e Guzerá.
O trabalho levou cerca de quatro anos
para ser concluído e contou com equipes da
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), do Centro de Pesquisas René
Rachou (Fiocruz) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A Associação
Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ), a
Associação Brasileira dos Criadores de Gir
Leiteiro (ABCGIL) e o Centro de Melhoramento do Guzerá (CBMG) desenvolveram
“pontes” entre pesquisadores e produtores,
de modo a revelar as necessidades dos criadores e a realidade da fabricação.
Líder do projeto na Embrapa Gado de
Leite, Marcos Vinícius Barbosa da Silva participou, nos Estados Unidos, do grupo que
sequenciou o primeiro bovino no mundo,
de 2006 a 2009. Quando voltou ao Brasil,
percebeu que era preciso sequenciar as raças zebuínas mais importantes ao contexto
nacional. Após conversar com Beatriz Cordenonsi Lopes – à época, no Polo de Bioinformática de Uberaba –, com representantes
das associações e outros setores, o trabalho
foi iniciado, conjuntamente, pelas equipes
da Fiocruz e da UFMG. À Embrapa, coube a
definição dos animais pesquisados, a coleta
do material genético em campo e parte das
análises de bioinformática.
Segundo Marcos Vinícius, hoje, o
genoma já sequenciado possibilita a identificação das regiões do DNA ligadas à produção de leite, à resistência aos parasitas,
às altas temperaturas e ao estresse térmico, o que facilita o processo de seleção.
“Conseguimos olhar o DNA dos indivíduos
e diferenciar esses animais, antes mesmo
de eles nascerem, quanto à adaptabilidade,
à resistência a doenças e à própria produção de leite. Isso apressa o processo de
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melhoramento genético em cerca de cinco
anos. Antes, era preciso esperar quase sete
anos para avaliar o potencial genético de
um animal. Agora, isso pode ser feito em
até 24 meses”, explica o pesquisador.
Metodologia
É vasto o processo para chegar aos
benefícios do sequenciamento. Em longa
etapa de trabalhos, a Fiocruz gerou boa
parte dos dados de análise e montagem dos
genomas nuclear e mitocondrial. Conforme explica Guilherme Correa, que coordenou os estudos na Fiocruz, a montagem e
as anotações para entendimento da função
dos genes foi realizada em conjunto. “Parte
do sequenciamento ocorreu na Fiocruz. Os
colegas já tinham o DNA dos animais coletados e, em seguida, fizemos o controle de
qualidade do material e a construção das
bibliotecas genômicas”, detalha.
Na montagem de tais bibliotecas,
usaram-se duas tecnologias. A primeira
foi o sequenciador Solid, no qual foram
gerados os primeiros dados – o que permitiu cobrir boa parte tanto do genoma
do Gir quanto do Guzerá. Em seguida, foi
empregada a tecnologia da Illumina, mais
moderna, que possibilitou o acesso à outra
parte das informações. “Quando usamos
tecnologias diferentes, aproveitamos as
especificidades de cada uma para montar
bibliotecas genômicas diferentes, o que
permite uma montagem mais rica e complementar”, explica.
Após o sequenciamento do DNA,
realiza-se a etapa de montagem do genoma,
por meio do uso de algoritmos já conhecidos da comunidade científica. Eles são
parametrizados para chegar à expressão
que oferece a melhor montagem, que, em
seguida, é congelada. A segunda etapa é a
de anotação, na qual analisa-se a sequência
do DNA composta por quatro bases, para
identificar os genes e sua função, até que se
determine a fisiologia de cada organismo.
Maria Raquel Carvalho, do Instituto
de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG,
comenta que, na primeira fase da pesquisa, sua equipe foi responsável pela montagem do genoma eucarioto complexo. Para
tal, foi feito um projeto-piloto para testar a
montagem das sequências, que serviu de
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Genoma é o conjunto do DNA
completo do indivíduo, no qual está
codificado o que o constituirá e
como funcionará o conjunto de genes que o compõe. Toda célula de
mamífero conta com dois genomas:
um deles está no núcleo da célula,
e, por isso, é conhecido como “nuclear”; o outro diz respeito a uma
organela, a mitocôndria, responsável por produzir energia. No estudo,
sequenciaram-se os dois genomas
porque existem genes específicos
relacionados aos fenótipos de interesse dos pesquisadores.
base a vários outros trabalhos do grupo –
principalmente, ligados à formação de mão
de obra capaz de trabalhar com esses dados. “Começamos com o Guzerá e fizemos
a primeira montagem do genoma. Em seguida, trabalhamos com o Gir para levantar
variações e diferenças em relação às raças
taurinas”, conta a pesquisadora Izinara
Rosse, também da equipe da UFMG.
Infinitas possibilidades
A interação entre as equipes das três
instituições colaborou para o êxito do projeto. Afinal, cada organização pôde direcionar suas pesquisas a partir do sequenciamento. “Genoma é o primeiro passo, pois
temos uma quantidade muito grande de informações do DNA para caracterizar, o que
demandará anos de trabalho. Ao observar
uma variável, podemos gerar as mais importantes em análise computacional. A
partir daí, investimos em estudos capazes
de determinar os fatores mais relevantes”,
defende Maria Raquel Carvalho.
Duas outras pesquisas têm sido desenvolvidas na UFMG a partir do sequenciamento. A primeira compara as características do Gir leiteiro saudável com animais
portadores de hipoplasia gonadal – que é
a diferença morfológica nos testículos do
touro, que pode ser total, bilateral, unilateral ou unilateral parcial ou total –, capaz
de fazer, por exemplo, com que o animal
tenha maior facilidade ou dificuldade de
reprodução. “O maior problema é que indivíduos com hipoplasia unilateral ou bilateral podem apresentar libido de reprodução,
o que dificulta a detecção do problema
no rebanho e faz com que eles continuem
espalhando a mutação”, explica Pablo Augusto de Souza Fonseca, responsável pelo
estudo na UFMG.
Investigação prévia já conseguiu
identificar regiões genômicas associadas
aos fenótipos relacionados à hipoplasia
gonadal e a anormalidades espermáticas.
Em função disso, serão buscadas mutações em relação ao genoma montado do
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Gir saudável e aos genomas já depositados que possam se revelar as reais causadoras desse fenótipo. O estudo está sendo
conduzido em parceria com a Escola de
Veterinária, que tem como responsável o
professor Vicente Duarte.
A segunda pesquisa estuda o temperamento dos animais da raça Guzerá. “Trata-se
de questão importante nos rebanhos, pois
os animais precisam ser tratados diariamente. Como entram em contato com o pessoal
da fazenda para serem alimentados e ordenhados, não podem ser ariscos”, explica
Fernanda Caroline dos Santos, responsável
pelo estudo no ICB. Segundo a pesquisadora, um animal esquivo apresenta prejuízos
aos rebanhos, como danos à fazenda e leite
de pior qualidade. Além disso, pode causar
acidentes de trabalho. Para a condução do
estudo, aproveitaram-se dados sobre temperamento recolhidos pela equipe da pesquisadora Maria Gabriela Diniz Peixoto, da
Embrapa, e têm sido coletadas amostras de
sangue dos indivíduos mais bravios.
O estudo já identificou que os problemas de temperamento são hereditários.
Ainda é preciso descobrir, porém, o local do
genoma responsável por tais características.
A equipe avaliou as informações relacionadas
a essas características e suas especificações,
de modo a constatar quais áreas têm influência sobre o temperamento do animal. Definidos os dados, o grupo iniciará o sequenciamento dos animais mais ariscos.
Expressividade econômica
Dados da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa), a
partir de informações divulgadas pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), revelam
que o resultado da relação entre o volume da
produção e a cotação média do produto – Valor Bruto da Produção (VBP) – da agropecuária mineira subiu 0,9% (R$ 44,7 bilhões),
em 2014, se comparado ao resultado de
2013 (R$ 44,3 bilhões). Apenas a pecuária é
responsável por 36,7% (R$ 16,40 bilhões)
do VBP agropecuário, sendo que Minas
Gerais tem a principal bacia leiteira do País.
Sozinha, a produção do Estado representa
R$ 7,2 bilhões.
A escolha por realizar o mapeamento das espécies Gir e Guzerá não foi ale-
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MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
atória. Trata-se, afinal, de raças indianas,
importadas ao Brasil no século passado.
Os animais foram selecionados, principalmente, por serem resistentes a doenças e
por aguentarem as altas temperaturas em
zonas tropicais. Atualmente, a pecuária
trabalha com dois grupos: os taurinos,
que vieram da Europa e são mais adaptados a climas mais frios, e os zebuínos,
provenientes da Índia e do Paquistão, que
oferecem maior resistência em relação ao
clima e às doenças.
Marcos Vinícius Barbosa da Silva
explica que, quando as raças taurinas – ligadas à maior produção de leite – foram trazidas ao Brasil, os animais não conseguiam
corresponder à expectativa de produção de
leite porque sofriam demais com o calor. “A
solução foi trazer os animais da Índia e cruzá-los com a raça taurina, para que tivessem
boa produção leiteira e fossem resistentes,
como ocorre com os zebuínos. Desse cruzamento, surgiu o Girolando, que tem características dessas duas raças”, esclarece, ao
destacar, ainda, a importância da pesquisa
no que diz respeito à fertilização in vitro.
Atualmente, são mais de 400 mil animais
nascidos por meio dessa tecnologia.
Para Vania Maldini Penna, diretora
técnica do CBMG, a seleção de animais
mais aptos à produção sustentável econômica, ecológica, etológica e socialmente
correta é de grande importância. “O interesse por nossos animais é cada dia maior.
Além disso, a exportação de material genético, por meio de embriões ou sêmen, já
faz parte de nosso cotidiano e acena como
importante fonte de renda”, avalia.
Projeto: Análise do genoma zebuíno,
prospecção de marcadores moleculares
e comparações com genoma taurino
por meio de sequenciamento de terceira
geração
Coordenador: Marcos Vinícius
Gualberto Barbosa da Silva
Edital: Programa Pesquisador Mineiro
Valor: R$ 48.000,00
MEDICINA
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Exposição “Sentidos do nascer”
busca sensibilizar população
brasileira quanto à importância
do parto normal
Maurício Guilherme Silva Jr.
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Ao longo de 2015, “Sentidos do
nascer” passará por Belo Horizonte (4 a
31/5), Rio de Janeiro (1º a 31/7), Niterói
(1º a 31/8) e Brasília (1º/10 a 30/11).
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No interior do carrinho de compras,
empilham-se inúmeras facilidades, todas
à disposição das futuras mamães. Naquele
pequenino espaço de metal, ao lado de produtos embalados em caixas multicoloridas,
e com nomes bastante curiosos – Mommy
Beauty Spa, Pau de Cesaselfie –, o letreiro
publicitário exibe aos clientes a mais imperdível das ofertas: “Preço promocional!
Cesariana, 50% off, 18h às 22h”.
Antes que alguém se apresse em
investigar as benesses oferecidas por
tal supermercado de ilusões, importante
ressaltar o caráter ficcional da inusitada
cena. Trata-se, tão somente, dos elementos
constituintes de “Loja de conveniências
4”, obra artística a integrar a exposição
“Sentidos do nascer”, iniciativa que busca
sensibilizar a população brasileira quanto
aos perigos da realização indiscriminada
de cesarianas.
A situação é bastante complexa.
Afinal, devido a tais elevados índices de
cesárias no País, tem aumentado significativamente a chamada prematuridade iatrogênica – quando se marca a intervenção cirúrgica sem que a mulher entre em trabalho
de parto –, para não falar de outros tantos
efeitos adversos à saúde da mãe e do filho.
Daí, pois, a importância de melhorar a compreensão do imaginário social em relação
aos “sentidos do nascer” – principalmente,
no que tange à percepção dominante sobre
possíveis riscos do parto normal.
“Ao pensarmos na exposição, não
buscamos apenas a disseminação de informações sobre partos. Ela foi projetada
para emocionar os visitantes, por meio da
arte e da vivência sensorial, e estimular
questões instigantes e reflexivas”, ressalta
Bernardo Jefferson de Oliveira, professor
da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (FaE/UFMG)
e um dos curadores da mostra itinerante,
ao lado de sua esposa, a médica pediatra
Sônia Lansky.
Na exposição, tem-se o privilégio de
apreciar fotografias, vídeos e obras de arte
sobre os desafios do nascimento, assim
como de participar de uma série de atividades interativas. Além disso, os visitantes
deparam-se com marcantes provocações,
a exemplo dos produtos da loja de mater-
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Segundo dados da Organização
Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é
a nação onde mais se realizam cesárias no mundo. As taxas chegam
a 84% no sistema privado e a 40%
no Sistema Único de Saúde (SUS).
A recomendação da OMS é de que as
cesarianas se restrinjam a cerca de
15% do total de partos.
nidade cirúrgica. “Há, ainda, o Dr. Cesário,
que diz preferir o parto normal, mas deixa
subentendido que, na hora agá, ele próprio
escolherá o que lhe for mais conveniente”,
lembra Bernardo Oliveira, ao sublinhar que
os dilemas propostos pela exposição acabam
por gerar desconfiança nas pessoas. “Acho
que fui enganada. Eu deveria ter me informado melhor à época”, pode pensar alguém.
Emoção é o que não falta à mostra.
Numa de suas atrações, os visitantes são
convidados a entrar em um ambiente que
imita o útero. As pessoas atravessam um
Maria Lansky
Maria Lansky
Foca Lisboa
Informações, imagens e espaços interativos proporcionam experiência única aos visitantes
canal estreito e, durante o percurso, ouvem
sons de batimentos cardíacos, além da voz
de um bebê, que insiste em pedir calma à
mãe. “Muitas pessoas saem dali chorando,
com vontade de conversar sobre o próprio
nascimento ou de relembrar a história de um
parto marcante na família. Gravamos depoimentos bastante emocionantes”, destaca.
Saberes e práticas
A ideia da mostra nasceu de experiências profissionais dos próprios organizadores. “Pensávamos numa exposição
sobre o parto pelo fato de envolver disputas entre diferentes saberes e práticas”,
comenta Bernardo Oliveira, ao revelar
que acompanhava a temática de perto em
função do cotidiano de sua esposa, Sonia
Lansky, que coordena a Comissão Perinatal da Secretaria Municipal de Saúde de
Belo Horizonte e realiza consultoria sobre
o assunto no Ministério da Saúde.
Ao observarem o sucesso de duas
exposições itinerantes – “Sentimentos da
terra” e “Ponto da ciência” –, realizadas
pela UFMG, com investimento da FAPEMIG, os curadores de “Sentidos do nascer”
pensaram na possibilidade de realizar algo
parecido. Descobriram, então, um edital do
Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), em parceria com a Fundação Gates, que possibilitava a abordagem desejada. O CNPq,
afinal, incentivava pesquisas para redução da prematuridade. “Sabíamos que os
altos índices de cesarianas estavam entre
as causas do acentuado número de bebês
prematuros no Brasil. Por isso, para nos
ajudar, articulamos um grupo de especialistas no assunto”, conta.
A proposta foi aceita pelo Conselho,
que concedeu investimento de R$ 495 mil
aos pesquisadores, para que montassem
uma espécie de “laboratório”: surgiam
assim, na verdade, a exposição “Sentidos
do Nascer” e o projeto da pesquisa multimetodológica de avaliação dos impactos
da própria mostra. “O principal objetivo
de tal estudo é avaliar o potencial de uma
exposição tão interativa e instigante para
mudar a percepção das pessoas acerca do
parto”, afirma.
científicas e as disputas entre diferentes visões de mundo e formas de saber são especialmente ricas para a compreensão da
história do conhecimento. Assim como no
caso do aleitamento, a história do parto é
riquíssima para que se entenda o papel dos
grupos de interesse, da difusão de práticas
e, também, das resistências e das dinâmicas de circulação de ideias e de transformação de expectativas”, completa.
Mobilização
Segundo Bernardo Oliveira, embora
o projeto ambicione reverter a cultura de
consumo de cesarianas desnecessárias –
o que envolve não apenas interesses comerciais, mas um sistema de formação e
de práticas profissionais que transformou
o parto em algo violento e gerou equivocadas representações sociais –, os organizadores da iniciativa sabem que é pequeno o
alcance de uma exposição.
“Ainda que seja atraente, e tenhamos
muita demanda, com gente se emocionando e retornando com amigos e parentes, a
mostra não comporta mais do que 240 pessoas por dia. Desse modo, para alcançar um
público maior, é fundamental envolver as redes sociais e a internet”, explica, ao destacar
que a campanha pela humanização do parto
conta, hoje, com a ação de muitos agentes,
além de Organizações não governamentais,
associações e instituições. “A exposição
tem sido vista por esses grupos como fator
de mobilização, o que tem nos ajudado muito”, completa.
Há muitos anos, o pesquisador investiga a história e os processos de popularização e difusão da ciência, o que
o faz dedicar-se à analise de estratégias
discursivas, de veículos e processos de
legitimação de práticas. “As controvérsias
Projeto: Sentidos do nascer: intervenção para mudança de percepção
sobre o parto
Coordenador: Bernardo Jefferson
de Oliveira
Modalidade: Apoio a Projetos de
Extensão em Interface com a Pesquisa
Valor: R$ 32.398,38
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Amamentação
Saúde
sem traumas
Pesquisadora cria
protetor de seios que
favorece aleitamento e
ajuda a prevenir dor e
fissuras nos mamilos
Ana Luiza Gonçalves
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MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Nos últimos meses, questões relativas à amamentação têm sido muito destacadas e discutidas. Tudo isso, em grande
medida, porque Fernando Haddad, prefeito
de São Paulo, sancionou, em abril, a lei
que garante o aleitamento materno em
qualquer estabelecimento da cidade. Quem
proibir ou constranger a mãe de amamentar seu filho em público pagará multa de
R$ 500. Em caso de reincidência, o valor
dobra. O projeto de lei foi proposto após
uma mãe ter sido orientada a não alimentar
seu filho em público no Sesc Belenzinho.
A amamentação é um direito e beneficia a saúde não somente do bebê, mas,
também, da mãe, de modo a prevenir doenças cardiovasculares e câncer de mama.
Já está comprovado que a mulher que amamenta de 6 a 11 meses apresenta índice de
11% a menos de chance de ter diabetes
tipo 2. Já o risco de câncer ovariano revela-se 34% inferior, se comparado àquelas
que não praticam o ato.
Hoje, o Brasil conta com política nacional de incentivo ao aleitamento materno, na rede de atenção básica, por meio da
Rede Amamenta Brasil, estratégia de promoção, proteção e apoio ao aleitamento
materno. A proposta é aumentar os índices
de amamentação no País, por meio da circulação de informação e da capacitação de
profissionais capazes de se tornar agentes
de mudança no ensino e na aprendizagem
do aleitamento. Com a amamentação, conseguiu-se o maior impacto na redução da
mortalidade infantil.
No entanto, o aleitamento requer
preparos, para que se evitem fissuras,
dores e sangramento. O trauma mamilar é
definido como lesão ou alteração do tecido dos seios, o que, comumente, resulta
do manejo inadequado durante a amamentação. A primiparidade – condição
da mulher em sua primeira gestação –, o
lábio inferior do bebê voltado para dentro
ou seu queixo posicionado de forma inadequada, bem como a retirada incorreta
do bebê do seio são alguns dos fatores
indutores de problemas.
Conforme revelam os altos índices
identificados do problema, o trauma pode
acabar por representar um fator de risco ao
desmame precoce, sendo fundamentais a
prevenção e o tratamento. É sabido que a
criança que mama nos seis primeiros meses – ou até os dois anos – tem melhor
qualidade de vida e menos riscos de morrer ou de adoecer.
Preocupada com os chamados traumas mamilares, Sabina Pena Borges Pêgo,
professora da Faculdade de Odontologia da
Universidade Estadual de Montes Claros
(Unimontes), desenvolveu, durante sua
gravidez, um protetor de seios absorvente
capaz de liberar um composto de lanolina
anídrica, substância conhecida por sua ação
hidratante. A intenção é prevenir e tratar os
traumas decorrentes da amamentação.
O mecanismo representa um sistema epidérmico, não adesivo, descartável,
composto por uma membrana de acetato
de celulose, interposta em um reservatório
impermeável contendo lanolina anídrica e
de tecido cutâneo. O sistema está inserido
em uma estrutura usada para absorver o
excesso de leite produzido pela gestante.
A pesquisadora explica que o funcionamento do produto está associado
à liberação – lenta e contínua – da lanolina anídrica, que atua no estímulo à
cicatrização de áreas traumatizadas do
mamilo. A outra forma de prevenção diz
respeito a medidas preventivas, como o
posicionamento correto do bebê durante
a amamentação e o preparo adequado das
mamas durante a gestação.
A lanolina é efetiva no tratamento dos
traumas mamilares e a forma como está
associada ao protetor evita sua contaminação – e, consequentemente, a infecção nas
mamas. Favorece, ainda, o contato efetivo
com o mamilo, ou seja: a lanolina pode ser
ingerida pelo bebê, dispensando lavadas
frequentes nas mamas, o que pode resultar
em aumento do trauma. Por fim, o absorvente está ligado a um protetor mamilar de
algodão, que absorve adequadamente o excesso de leite produzido pela lactante.
“O fato de a lanolina poder ser ingerida pelo bebê dispensa as lavadas dos
mamilos antes da amamentação. Além
disso, como a lanolina já vem no reservatório, evita sua manipulação, impedindo
a contaminação e favorecendo um contato permanente e efetivo com o mamilo”,
conta Sabina Pêgo. Os traumas mamilares
são de difícil tratamento, devido ao fato
de o bebê apresentar alta frequência de
amamentação nos primeiros dias de vida
– além de ocorrer, principalmente, com as
primíparas. A literatura apresenta inúmeras
formas de tratamento, as quais envolvem o
uso de cremes e pomadas. Tais produtos,
porém, grudam na roupa e, por isso, ficam
pouco tempo em contato com o mamilo.
Sabina Pêgo diz que ainda não recebeu proposta para a confecção do protetor
mamilar, mas, devido ao baixo custo, o
produto poderia ser fornecido gratuitamente às gestantes durante o pré-natal,
no momento do parto e nas campanhas
pró-amamentação. “Acredito que o uso do
produto, associado a uma efetiva educação
em relação ao preparo das mamas e ao
correto posicionamento do bebê durante
a amamentação, ajudaria a reduzir efetivamente o desmame precoce por traumas
mamilares”, conclui.
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Engenharia aeroespacial
Bons (in)ventos
Universitários mineiros se destacam no desenvolvimento de
protótipos de aviões
Alessandra Ribeiro
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MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Fotos: Sérgio Fujiki
“Urrú! É pão de queijo!”. O grito de
comemoração tornou-se recorrente na premiação do campeonato anual promovido
nos Estados Unidos pela Sociedade de Engenheiros da Mobilidade (SAE, na sigla em
inglês), a Aerodesign East Competition. O
desafio consiste em projetar e construir aeronaves radiocontroladas, com capacidade
de transportar cargas. Na última edição,
encerrada em março, com a participação
de 75 grupos das Américas, da Ásia e da
Europa, duas equipes mineiras alcançaram
o segundo lugar, em diferentes categorias:
a Uirá, da Universidade Federal de Itajubá
(Unifei), na classe “regular”, e a Trem Ki
Voa, da Universidade Federal de São João
del-Rei (UFSJ), na “micro”.
Instituições mineiras de ensino superior figuram anualmente na lista de vencedores da competição desde 2006, quando
o primeiro e o segundo lugares da classe
“regular” ficaram, respectivamente, com as
equipes Uai-So-Fly, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e Tucano, da
Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
Pouco antes, em 2004, o grupo CEAV-UAV,
também da UFMG, havia conquistado o
vice-campeonato. Nesta categoria, os participantes devem construir aeronaves com dimensões totais de, no máximo, 4,45 metros,
capazes de decolar na distância máxima de
61 m, com o uso de motores elétricos limitados à potência de mil watts. O uso de materiais compostos – com fibra de carbono
ou vidro – é vetado na estrutura dos aviões.
Já na classe “micro”, os protótipos
devem ter dimensões reduzidas e pesar, em
média, 700 gramas. Além disso, a equipe
precisa transportar a aeronave dentro de
um tubo circular de 15,3 centímetros de
diâmetro. Quanto menor o comprimento do tubo, mais pontos são ganhos. As
aeronaves também têm que usar motores
elétricos e decolar por lançamento manual. Foi nesta categoria que a Trem Ki Voa
(TKV), da UFSJ, subiu, pela primeira vez,
no pódio da Aerodesign East Competition.
A equipe micro teve sua participação
iniciada em 2010, por iniciativa de estudantes do curso de Engenharia Mecânica.
“De lá para cá, participamos de todas as
competições, sendo vice-campeões nacionais em 2012 e 2014 e vice-campeões
Aeronave da equipe Trem Ki Voa, campeã brasileira na categoria micro do desafio da SAE, em 2014
mundiais em 2015”, conta o professor
Cláudio Pellegrini, orientador do grupo,
que conta com o apoio do Programa
Santos Dumont, da FAPEMIG. O edital
batizado com o nome do “pai da aviação”, natural de Minas Gerais, estimula
o espírito empreendedor de alunos de
graduação, por meio do financiamento
de projetos focados em iniciação tecnológica. O apoio financeiro abrange a
participação de equipes em competições
de caráter educacional, como as promovidas pela SAE.
A TKV é “filha caçula” da equipe regular da UFSJ, a Coiote, criada em 2001.
Três anos mais tarde, as duas se unificaram
e decidiram adotar a alcunha Trem Ki Voa,
uma referência (ou reverência) ao dialeto
mineiro. Os nomes das equipes, aliás, demonstram o nível de criatividade dos participantes. Na mesma universidade, a NoizAvua, que reúne estudantes das engenharias
Civil, Mecatrônica e de Telecomunicações
do campus Alto Paraopeba, estreou em
2012 na SAE Brasil Aerodesign, competição brasileira que garante a classificação ao
desafio internacional. Já na primeira participação, o grupo recebeu menção honrosa
por apresentar o melhor projeto não custeado. Desde então, já conseguiu patrocínios
pontuais, um deles também viabilizado pelo
programa da FAPEMIG.
“Para esses estudantes, o projeto
e a construção de uma aeronave de carga não tripulada controlada a distância
é uma oportunidade única de testar seus
conhecimentos, de modo a desenvolver a
capacidade de trabalhar em equipe e integrar os conhecimentos adquiridos ao longo das várias unidades curriculares, por
vezes tão distintas, de seu curso”, avalia
Cláudio Pellegrini, orientador da TKV. O
professor ressalta que isso vale, inclusive,
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Protótipo da Uirá, equipe famosa pela maior capacidade de carga na classe regular
para os estudantes sem formação específica em aeronáutica – caso das equipes da
UFSJ. “A participação também desenvolve
a autonomia no aprendizado, característica
essencial em um mercado de trabalho em
constante mudança”, acrescenta.
Peso pesado
Com tradição de 12 anos de participação nas competições nacionais e internacionais promovidas pela SAE, a Uirá
Aerodesign, da Unifei, busca a autossuficiência, mesmo já contando com o apoio de
patrocinadores e com verbas da própria universidade, por meio de projetos de extensão
e da FAPEMIG. “A equipe busca alcançar
a independência financeira, tanto para não
limitar financeiramente nosso projeto, como
para ter uma nova área onde os estudantes
aprendam a lidar com arrecadação de fundos”, revela o capitão administrativo Jean
Lopes de Vilas Boas, estudante do curso de
Engenharia de Produção.
A “microempresa aeronáutica”, como
se autodenomina a Uirá, envolve, ainda,
estudantes das engenharias Mecânica,
Elétrica, Aeronáutica e de Materiais. Eles
participavam apenas da classe regular até
32
2011, quando foi criada a classe “micro”,
exclusivamente, para os novos integrantes. O objetivo é garantir aos calouros “um
aprendizado mais rápido e efetivo em todas
as etapas de um projeto aeronáutico”, conforme destaca o documento elaborado para
apresentação a potenciais patrocinadores.
A Uirá ostenta o recorde mundial em
carga levantada pelas aeronaves na classe
“regular”, de 14,2 kg, alcançado em 2007.
A fama de transportar as maiores cargas das
provas se mantém em três anos consecutivos. Em 2015, “A Barca”, nome do protótipo
desenvolvido pelo grupo, levantou 13,55
kg. A equipe também se destacou pela inovação: foi a primeira a usar dispositivos de
sustentação na parte posterior da asa – o
que os engenheiros chamam de “asa duplamente flapeada”. Pelo visto, Minas Gerais
pode voar alto e sonhar com potenciais
sucessores do inventor do 14-Bis.
Polo aeroespacial
Ao menos cinco universidades oferecem formação superior específica em
Aeronáutica no Estado: na capital mineira, a modalidade pode ser encontrada
na UFMG, na Universidade Fumec e no
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Centro Universitário UNA; no interior, há
opções na UFU e na Unifei – que, aliás,
formará a primeira turma do curso de Engenharia Mecânica Aeronáutica em 2016.
Além da preparação de profissionais especializados, o Estado conduz o processo de
implantação de um polo aeroespacial, que
envolverá as cidades de Lagoa Santa, Itajubá, Diamantina, Uberaba e Tupaciguara,
onde serão instalados centros de desenvolvimento de tecnologias do setor.
O contexto favoreceu a instalação, em
2011, de um escritório de Engenharia da
Embraer em Belo Horizonte, o único fora
da sede da empresa no Brasil, instalada em
São José dos Campos (SP). O espaço, que
já conta com 160 funcionários envolvidos
em desenvolvimento de projetos, produtos
e serviços para o setor aeronáutico e de
defesa e segurança, será transferido para
Lagoa Santa, assim que as obras do Centro
de Capacitação de Tecnologia Aeroespacial
(CCTA) forem concluídas.
Em novembro de 2014, a multinacional firmou um termo de cooperação financeira com a FAPEMIG. As duas instituições
lançaram um edital, no último mês de maio,
com R$ 1 milhão destinados a projetos de
inovação na indústria aeronáutica. “Temos
muito interesse em olhar esse assunto com
as universidades, para que surjam ideias
novas”, comentou Carlos Hilário, engenheiro de desenvolvimento de produto da Embraer, durante workshop de apresentação do
edital aos pesquisadores. “Buscamos verificar se as universidades mineiras têm grupos
de pesquisa habilitados, com experiência e
know-how para entrar no edital”, complementa Elza Fernandes de Araújo, assessora
adjunta de inovação da FAPEMIG.
genética
As aves
que aqui
gorjeiam...
Pesquisa investiga dinâmica populacional
histórica de aves restritas aos topos de
montanha para prever alterações de
distribuição com as oscilações climáticas
Camila Alves Mantovani
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
33
As mudanças no clima, com destaque para o aquecimento global, têm desafiado a comunidade científica a propor
estudos que busquem não apenas conhecer o fenômeno, como, também, avaliar
seus impactos. No âmbito da conservação
e da preservação das espécies, a perda da
biodiversidade é um dos aspectos mais importantes e preocupantes.
Ao redor do mundo, pesquisadores
buscam compreender a dinâmica das espécies – principalmente, daquelas restritas
às áreas mais frias do planeta. No projeto
“Genética de paisagem de aves em topos
de montanha nos refúgios climáticos
holocênicos da América do Sul”, coordenado por Fabrício Rodrigues dos Santos,
professor do departamento de Biologia
Geral da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG), o foco são as aves, ou,
mais especificamente, as que vivem nas
áreas de topo de montanha, localizadas na
região leste do Brasil.
De acordo com Santos, várias espécies de aves adaptadas a climas frios estão
hoje restritas às áreas de campos rupestres
e de altitude, que funcionam como refúgios
climáticos holocênicos. Holoceno é o pe-
ríodo atual, quando se registra a temperatura mais quente dos últimos 2 milhões de
anos. O momento anterior, ou Pleistoceno,
caracterizava-se pelas glaciações e pelo
frio. “Em regiões mais baixas, poderiam
existir ambientes parecidos com o das
áreas de topo de montanhas. Na transição
para o Holoceno, o ambiente frio reduziu-se ainda mais aos topos”, explica.
Na mudança para o Holoceno, há 12
mil anos, o planeta esquentou e os animais
e plantas adaptados a ambientes mais frios
deslocaram-se ainda mais para cima. Se a
temperatura continuar a subir, a expectativa
é que eles se desloquem mais e mais, até
chegar-se ao ponto de não haver habitat
viável para tais espécies.
Na acepção de Anderson Vieira Chaves, doutor em Ecologia e Conservação
da Vida Silvestre, pela UFMG, e também
coordenador do projeto, a preocupação é
grande, pois, conforme apontam diversos
estudos, feitos em outros países, sobre os
impactos do aquecimento global, há animais que já subiram 200 metros. “Muitas
espécies se beneficiaram com o aumento
da temperatura e houve ampliação de suas
distribuições. Com as aves de topos de
Anderson Vieira Chaves
montanha, seria o contrário. São espécies
adaptadas a regiões mais frias, que, cada
vez mais, têm sua área reduzida. Algumas
aves poderão subir a montanha. Contudo,
os passarinhos que só existem lá, e são de
regiões frias, ficarão ainda mais no alto.
Isso se houver ambiente para eles. Possivelmente, poderá ocorrer sua extinção”,
lamenta o pesquisador.
Para muitas espécies, fala-se em
deslocamento e em migração. No que diz
respeito ao tipo de ave estudado, entretanto, não se conhece movimento migratório,
por exemplo, de uma serra para outra. De
acordo com Anderson Chaves, as aves
vivem naquelas populações e, há muito
tempo, estão isoladas. “As montanhas têm
sido refúgio para essas populações, que
até poderiam, no passado, ter tido distribuição mais ampla do que a que hoje se
verifica”, pondera.
As cadeias de montanhas incluídas no
estudo são a Serra do Espinhaço – onde a
vegetação dominante é a de campos rupestres, distribuídos, geralmente, acima de 900
metros –, as serras do Mar e da Mantiqueira,
ambas com presença de campos de altitude,
distribuídos acima de 1500 m, e a Serra Geral, área com predomínio de campos sulinos.
Diferencial metodológico
Muitas aves adaptadas a climas frios estão restritas às áreas de campos rupestres e de altitude
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MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Ao investigar os padrões de distribuição desses grupos de aves, cujos gêneros restringem-se a regiões frias, acima
de mil metros de altitude no Brasil, o estudo arvora a genética de paisagens. De
acordo com os pesquisadores, tal perspectiva teórica e metodológica leva em
conta não apenas informações presentes
nos genes, mas, também, as diversas unidades do ambiente físico – configuração
geográfica, geologia, relevo, clima e vegetação – e os dados da biologia geral.
“Trata-se de uma linha de pesquisa que
busca trabalhar as informações da genética de populações e da evolução, somadas
às modelagens da ecologia de paisagem”,
explica Anderson Chaves.
Além da abordagem inovadora, outro
desafio do estudo foi empreender as amostragens populacionais de várias espécies
endêmicas de aves, pois, devido às restri-
Segundo Anderson Chaves, muitas espécies se beneficiaram com o aumento da temperatura e houve ampliação de suas distribuições
ções de acesso às regiões montanhosas,
quase não havia representação dessas espécies em coleções e museus. Outro ponto
problemático apontado por Anderson está
na existência de poucos parques e/ou unidades de conservação ao longo das montanhas estudadas – o que dificultava ainda
mais o acesso dos pesquisadores.
“Muitas vezes, o trabalho começava no
Google Earth. Hoje, essa é uma vantagem,
pois, antes, a opção era ir ao local e descobrir os acessos ou trilhas para atingir as áreas
mais preservadas. A gente chegou a acessar
pontos não preservados, onde os bichos não
viviam mais por causa da mineração ou de
outras atividades humanas”, conta.
Segundo os pesquisadores, para fazer um desenho amostral que permitisse
avaliar a dinâmica populacional dos grupos, foi preciso ir até essas áreas, coletar
os indivíduos, colher material sanguíneo,
registrar os seus cantos e taxidermizar.
Para Fabrício dos Santos, o esforço naturalístico da coleta é muito importante para
estudos futuros, pois, a partir dessa referência, é possível pesquisar algo diferente
e fazer novas perguntas.
Nessa empreitada, parte da história
natural de espécies ainda não conhecidas
foi revelada. Até então, segundo os pesquisadores, a maioria delas era identificada
em poucas regiões geográficas ou estava
presente em coleções científicas da Europa
ou Estados Unidos, em poucos museus.
As diversas expedições de campo
desse estudo contaram com a participação não só de moradores, que conheciam
bem a região, como também dos pesquisadores Marcelo Ferreira de Vasconcelos e Guilherme H. S. Freitas, também
idealizadores do projeto. Nesse trabalho
foi feito o registro do beija-flor Augastes
scutatus, até então endêmico da Cadeia do
Espinhaço ‘mineira’, nas ‘terras baianas’ do
município de Jacaraci (Morro do Chapéu),
próximo à divisa de MG e BA. Esse achado aproximou em 150 Km os limites da
distribuição geográfica com a sua espécie
irmã, típica da Chapada Diamantina, o
Augastes lumachella.
Os estudos também possibilitaram
a descoberta e descrição de uma nova
espécie de pássaro nativo dos campos rupestres da região da Serra do Cipó, o Cinclodes espinhacensis, que é irmã de outra
espécie endêmica da Serra Geral no sul do
País, o Cinclodes pabsti.
Além do registro e da identificação
de espécies, Fabrício dos Santos destaca a
temática da conservação e da preservação.
Segundo o pesquisador, os campos rupestres, por exemplo, são ambientes únicos,
posto que não há regeneração na área, por
se tratar de solos extremamente pobres,
e com mais de 2 bilhões de anos. Nestas
áreas, não há os recursos minerais que, normalmente, aparecem em terrenos novos.
Trata-se, portanto, de ambientes extremamente sensíveis a distúrbios ambientais. Além disso, as espécies ali identificadas não aparecem em outros lugares, pois
não conseguem sobreviver em terras baixas. “Se acabou lá, acabou para sempre”,
alerta, ao destacar que, ao recorrer à genética, busca-se estudar, coletar e entender
as relações temporais entre as populações
das espécies. “Pensamos em conservação
não apenas para o agora, mas, também,
para nossos netos e muitas outras gerações”, destaca.
ProJeto: Genética de paisagem de
aves em topos de montanha nos refúgios climáticos holocênicos da América
do Sul
CoordenAdoreS: Fabrício Rodrigues
dos Santos e Anderson Vieira Chaves
ModAlidAde: Universal
VAlor: R$ 49.980,00
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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gestão
Estratégia
em primeiro
plano
Em Santa Rita do Sapucaí (MG), Casa do
Empreendedor do Vale da Eletrônica transmite
informações e desburocratiza processos para
os empresários do futuro
Diogo Brito
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MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Para certas pessoas, o ato de empreender pode ser considerado um dom natural, algo que poucos possuem, quiçá, desde
o nascimento. Empreendedores, por vezes,
são considerados indivíduos diferenciados,
seres visionários, dotados de conhecimento
autodidata, mestres na arte de prosperar e
de, por meio de medidas simples, encontrar
soluções em tempos difíceis e em meio a
crises financeiras ou políticas.
De fato, tais profissionais bem sucedidos possuem características que os distinguem dos outros, o que não quer dizer
que possam ser considerados “sobrenaturais”. É claro que a vocação ao empreendedorismo deve ser levada em conta, assim
como em qualquer ramo profissional, mas
a diferença entre aqueles que prosperam
em seus negócios e os que desistem ao
primeiro sinal de dificuldade – e param no
meio do caminho – também diz respeito à
capacidade de adaptar os negócios às necessidades de mercado.
Alie-se, a tal preocupação, o investimento em estratégias distintas, capazes de
atender às demandas do mercado no qual
o empreendedor está inserido. Tudo isso
ganha ainda mais força quando a pessoa
pode contar com orientação profissional
adequada, além de um plano de negócios
condizente com sua realidade. O resultado
são ações que podem dar sobrevida a uma
microempresa em meio a crises financeiras
ou fazê-la ampliar de porte.
Por outro lado, pessoas com espírito
aventureiro arriscam-se neste universo do
empreendedorismo de maneira equivocada, sem orientação, preparo profissional
ou acadêmico. Desse modo, abraçam o sonho de ter negócio próprio e investem valores altos em projetos sem planejamento
estratégico ou plano de negócios. Tal combinação de ingredientes é a “fórmula ideal”
para o fracasso de qualquer iniciativa.
Qualificação, portanto, ainda se revela
requisito primordial para que uma pessoa
se torne empreendedora. Quem reside na
charmosa cidade mineira de Santa Rita do
Sapucaí sabe disso. A localidade, que fica
a 420 km de Belo Horizonte, é conhecida,
no Estado, pelo pioneirismo nos ramos da
eletrônica e das telecomunicações, graças
ao arranjo produtivo local dessas indústrias.
Durante muitos anos, porém, o cenário não
era bem assim. O município de pouco mais
de 40 mil habitantes tornou-se conhecido
como “Vale do Silício” brasileiro – em referência ao importante polo com sede na
Califórnia (EUA) –, devido aos investimentos realizados em capacitação nas últimas
cinco décadas.
O start para a configuração do atual
cenário de prosperidade foi dado por uma
mulher que atendia pelo nome de Sinhá
Moreira. Casada com o diplomata Antônio
Moreira de Abreu, ela soube aproveitar
bem uma oportunidade rara em sua época:
viajar e conhecer o mundo. Em 1959, esta
ilustre cidadã deu início a uma transformação social na cidade, que sobrevivia, sobretudo, da produção de leite e café.
Após regressar de viagem ao Japão, Sinhá fundou, em sua terra natal, a primeira Escola Técnica de Eletrônica da América Latina.
Passou, assim, a capacitar os alunos da época, despertando o interesse de sua gente pelos estudos em tecnologia. Tal exemplo bem
poderia ser aplicado nos dias de hoje, posto
que, para empreendedores, são essenciais a
capacitação pessoal e a investigação do mercado. Não que Sinhá soubesse que sua ação
transformaria a cidade em polo tecnológico
de excelência em eletrônica, mas, certamente,
já naquele tempo, conhecia o potencial transformador do conhecimento.
Por se tratar de fenômeno mundial,
o empreendedorismo é, hoje, estimulado
por diversas instituições públicas e privadas, que têm investido esforços e capital
em pesquisa e formação de profissionais.
Atualmente, a realidade é diferente de outros
tempos, e o município de Santa Rita do Sapucaí conta com novos métodos para incentivar o espírito empreendedor e desenvolver
ferramentas para o desenvolvimento local.
A casa
Muitos anos se passaram desde a primeira semente plantada por Sinhá Moreira.
Seu exemplo empreendedor, contudo, permanece por meio de projeto financiado pela
FAPEMIG, em parceria com a prefeitura
da cidade, que tem servido de nova luz
a quem deseja investir em negócios próprios. Trata-se da Casa do Empreendedor
do Vale da Eletrônica (Ceve). Com pouco
mais de dois anos e meio de trabalho, a iniciativa mostra resultados animadores.
Inicialmente implementada em caráter experimental, em março de 2012, a
Ceve, após os primeiros resultados positivos, foi oficialmente inaugurada em
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
37
Divulgação
20 de dezembro daquele ano. O projeto
encaminhado à Fundação define que a
casa funciona como uma divisão ligada
diretamente à Secretaria Municipal de Ciência, Tecnologia, Indústria e Comércio.
Desse modo, atua como importante agente
interlocutor no apoio a todos que buscam
orientações sobre o mercado local. O suporte oferecido se divide em duas frentes
de trabalho, expressos nos balcões de
“serviços” e de “negócios”.
A primeira linha de atividade está
ligada às ações básicas de formalização
de todos os tipos de empresas, dos empreendedores individuais (MEIs) às instituições de pequeno porte e às sociedades
anônimas. Segundo Dani Lúcia Xavier,
diretora de divisão de programa de incubação e coordenadora do projeto Ceve, o
balcão de serviços tem importância ímpar
no atendimento básico a quem busca legalizar seu empreendimento. Neste sentido, a
Casa torna-se um órgão de apoio, capaz de
minimizar as burocracias do setor público.
“A Ceve centraliza, facilita e agiliza
o atendimento às empresas ao oferecer
orientações básicas sobre os passos para
constituir um empreendimento e realizar
procedimentos como abertura, alteração
ou baixa de empresas, emissão de alvará
etc.”, explica Dani Xavier. Desde a inauguração da Casa, aproximadamente 350
empreendedores deixaram a informalidade
e, hoje, possuem alvará e licença de funcionamento. Para facilitar os procedimentos, aliás, a instituição conta, no local, com
uma unidade da Junta Comercial do Estado de Minas Gerais (Jucemg).
Para compreender as carências do
público e transmitir orientações empresariais, a Ceve também dispõe de atendimento focado nos interesses de quem
deseja montar um empreendimento na
cidade. Segundo a coordenadora da iniciativa, o trabalho “consiste em oferecer
noções básicas ao empreendedor sobre
os primeiros passos para constituir um
empreendimento”. Dani Xavier ressalta,
ainda, que também faz parte do escopo
de trabalho o direcionamento do empreendedor aos parceiros da Casa, para que
possam encontrar qualificações, consultorias e financiamentos. “As parcerias
variadas com o meio acadêmico, bancos
e entidades de classe, dentre outros, são
imprescindíveis”, conclui.
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Casa do Empreendedor do Vale da Eletrônica (Ceve) busca fomentar inovações
No que se refere à tecnologia, a Ceve
encontrou um meio inovador de distribuir
informações relevantes sobre o mercado
local. Para aqueles que desejam empreender e conhecer nuances regionais, há
um banco de dados disponível aos futuros empreendedores, com informações
competitivas valiosas. O serviço também
fornece referências sobre prestadores de
serviços especializados, como contadores e engenheiros ambientais, para que o
empresário tenha referências iniciais.
A localização da Ceve é estratégica.
Ela está instalada no prédio da Incubadora
Municipal de Empresas Sinhá Moreira e
conta com a parceria do poder público municipal no que tange à oferta de mobílias e
à disponibilização de funcionários efetivos
para atendimento gratuito aos interessados. Atualmente, a Casa realiza cerca de
10 atendimentos diários, o que, no ver de
Dani Xavier, não é um número baixo. “Para
um município de aproximadamente 40 mil
habitantes, consideramos a busca pela
Ceve razoável”, afirma.
Os impactos obtidos com o trabalho
da Ceve refletem-se em setores primários
do poder público, expressos na desburocratização de processos e na conscientização das pessoas acerca dos caminhos
de abertura de empreendimentos. Além
disso, com a divulgação de informações
sobre os benefícios da lei de inovação,
houve redução significativa da informalidade na cidade e aumento dos processos
de inscrições municipais e de emissões
de alvarás de funcionamento.
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
ProPoStA: Casa do Empreendedor do
Vale da Eletrônica
CoordenAdorA: Dani Lúcia Xavier
ModAlidAde: Inovação Regional
VAlor: R$ 46.511,20
PSICoLoGIA SoCIAL
Eu tenho
a força?
Pesquisa da Unimontes investiga papel
social, político e econômico exercido
por intelectuais no Norte de Minas
Vivian teixeira
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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No dia 20 de fevereiro deste ano, um
grupo de respeitados pensadores brasileiros
lançou o manifesto O que está em jogo agora, que propõe debate acerca da crise de corrupção que ronda a Petrobras e dos rumos a
serem tomados a partir dela. O documento foi
assinado por personalidades como Cândido
Mendes, Leonardo Boff e Marilena Chauí,
dentre outros intelectuais do País.
Se as condições da nação fossem outras – como à época da luta pela redemocratização do Brasil ou contra os avanços do
neoliberalismo – tal iniciativa seria taxada
de natural. Hoje, quando o País vive em regime democrático e muitos parecem imersos no estilo de vida neoliberal, que atende
plena e confortavelmente aos anseios de
consumo da população, a movimentação
dos intelectuais, ligados a alinhamentos
ideológicos e políticos de contestação do
status quo, faz com que sejam reconhecidos
como indivíduos “de esquerda”.
O manifesto do dia 20 sugere alterações na estrutura, já que boa parte dos
nomes que o ratificaram não é contrária
às inclinações do atual governo. Tal constatação vai ao encontro das ideias do filósofo francês Michel Foucault, para quem
“o papel do intelectual não é mais o de se
colocar ‘um pouco à frente ou um pouco de
lado’ para dizer a muda verdade de todos; é,
antes, o de lutar contra as formas de poder
exatamente onde ele é, ao mesmo tempo, o
objeto e o instrumento na ordem do saber,
da ‘verdade’, da ‘consciência’ do discurso”.
No Norte de Minas, o historiador
Laurindo Mekie Pereira, da Universidade
Estadual de Montes Claros (Unimontes),
pesquisou o papel dos intelectuais na identidade regional e na hegemonia de classe.
O pesquisador baseou-se na história de
quatro indivíduos da região: o fazendeiro;
industrial; engenheiro; professor e líder político Simeão Ribeiro Pires; o proprietário de
terras e professor universitário Alfredo Dolabela, o empresário Luiz de Paula Ferreira
e o médico Pedro Santos. De acordo com o
pesquisador, cada um deles representa uma
estratégia de desenvolvimento pensada para
a cidade mineira e suas proximidades.
Na pesquisa, foi usada abordagem
baseada no pensador italiano Antônio
Gramsci (1891-1937), famoso, principal-
40
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
mente, pela elaboração dos conceitos de
hegemonia e de bloco hegemônico. “Os
intelectuais são pensados como agentes organizadores das classes sociais, operando
nos âmbitos social, cultural e político. Além
disso, não se restringem a atividades imediatamente econômico-corporativas. Eles
podem ser grandes pensadores e acadêmicos, mas também podem ser cidadãos não
escolarizados”, explica Laurindo Mekie.
Atores sociais
Os quatro personagens analisados
pela pesquisa foram atores-chave nos
meios empresarial e político da região,
atuando, ao longo da segunda metade
do século XX, nas construções da identidade regional e da hegemonia do grande
capital no Norte de Minas. Para Mekie,
outros indivíduos também contribuíram
nesse processo. O discurso regionalista
foi um dos mecanismos que permitiram
a hegemonia dos grandes comerciantes e
industriais, consumando um modelo de
desenvolvimento fundado na industrialização, incentivada na modernização do
campo por meio de grandes projetos de
reflorestamento e irrigação e na transformação das antigas fazendas pela lógica
capitalista. “Simeão Ribeiro, por exemplo,
atuou em várias frentes. Suas pesquisas e
publicações sobre a história de Minas Gerais contribuíram para a difusão da ideia de
que o Norte do Estado é uma região com
identidade própria desde a colonização,
vinculando-se mais à Bahia do que a Minas Gerais”, explica.
Já Alfredo Dolabela foi um dos
grandes idealizadores, se não o principal,
do Estado de São Francisco. Apesar de o
projeto não ter sido aprovado, a pesquisa
demonstrou que ele contribuiu para levar
mais “água para o moinho” do discurso regionalista. De acordo com os estudos, Luiz
de Paula é o mais claramente identificado
com o modelo vitorioso. O intelectual, que
chegou a ser deputado federal, migrou
ainda jovem para Montes Claros, onde fez
carreira como empresário, sendo também
conhecido por sua sociedade com o ex-senador e vice-presidente José Alencar
(1931-2011). “Sua trajetória e seu pensamento ilustram com razoável nitidez uma
visão de mundo difundida entre os empresários, segundo a qual o desenvolvimento é obra do capital privado, cabendo ao
estado incentivá-lo, subsidiá-lo e servi-lo,
sem jamais concorrer com ele. O Estado é
bem visto como agente supletivo e subsidiário”, acrescenta Mekie.
Dados da pesquisa mostram que,
para a fração norte-mineira, havia também
as variáveis “território” ou “região”, como
era usual dizer. “Assim, em nome do Norte
de Minas, requeria-se do poder público
um benefício adicional ao destinado para
as demais frações da classe. Na prática,
reclamou-se um estado máximo para os
donos do capital e mínimo para os trabalhadores”, completa o professor.
Por fim, a pesquisa demonstrou que
Pedro Santos – considerado um caso especial, posto que funcionou como contraexemplo do pensamento hegemônico, por ser um
médico que se vinculava deliberadamente
aos setores de baixa renda – foi escolhido
para análise como uma estratégia metodológica. Por meio dele, buscou-se examinar
a trajetória e o pensamento de alguém de
fora, ou, ao menos, não muito identificado
com os grupos hegemônicos. “A campanha
abertamente trabalhista, reformista e nacionalista, em 1962, a vitória nas urnas contra
todos os grupos econômica e politicamente
poderosos, as posteriores dificuldades para
governar e as inevitáveis concessões que fez
aos conservadores indicam a força dos grupos hegemônicos e os limites de projetos
alternativos”, esclarece o pesquisador.
Segundo a acepção utilizada na
pesquisa, confirmou-se a tese de Antonio
Gramsci de que não há organização social
sem intelectuais. “São eles os organizadores dos consensos sociais e políticos,
os agentes da sociedade civil, cujo papel
depende da importância dessa esfera na
dinâmica maior da sociedade”, afirma.
No contexto nacional, é possível usar
as definições de Foucault e do professor
Mekie para demonstrar que, atualmente, os
intelectuais não estão inertes às urgências
de seu tempo. O manifesto do dia 20 de
fevereiro é apenas um dentre vários exemplos de contribuições dos pensadores para
uma percepção mais crítica sobre os problemas da atualidade.
Pensar e agir
Cineasta Silvio Tendler defende engajamento dos intelectuais
Quando o papel do intelectual extrapola as barreiras acadêmicas, as ferramentas de reflexão e debate ganham formas distintas: livros, músicas, poemas, esculturas, filmes. Para o cineasta Silvio Tendler, o intelectual de hoje está sendo um pouco
desprezado devido ao fato de a civilização revelar-se extremamente midiática: nela,
afinal, mídia e conhecimento se confundem.
Sobre o papel dos pensadores na contemporaneidade, Tendler apresenta o
conceito gramsciano do “intelectual orgânico”, que se divide em dois tipos: o intelectual em si é aquele que todos conhecem, enquanto o para si tem consciência
da importância do que faz, transformando reflexão em ação. “O intelectual orgânico
é atrelado a causas políticas. Ele sabe de suas responsabilidades na sociedade e
usa o conhecimento como ferramenta para as causas às quais se dedica”, afirma o
cineasta.
Para Tendler, o que falta, hoje, é um espaço para fazer cinema de reflexão.
Segundo ele, existem muitas salas voltadas a filmes comerciais, que fazem mais
rir do que pensar. “Sou de uma época em que todas as artes se tangenciavam, se
misturavam. Por isso, meus filmes têm essa ‘cara de esquina’, que é o lugar onde as
pessoas se encontram para conversar e pensar projetos. Sinto falta disso na atual
geração. Afinal, o intelectual é, sobretudo, um ser engajado”, conclui.
Projeto: Identidade regional e hegemonia de classe no norte de Minas - o papel
dos intelectuais
Coordenador: Laurindo Mekie Pereira
Modalidade: Demanda Universal
Valor: R$ 7.978,95
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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EDUCAção
Sentidos do
conhecimento
Projeto mobiliza
comunidades escolar e
acadêmica a encontrar
novas maneiras de
pensar o Brasil por meio
da educação
Ana luiza Gonçalves
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MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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Mais do que pátria e mátria, queremos ter frátria, ressalta Caetano Veloso na
canção “Língua”, escrita no início da década de 1980. Afinal, mais do que a representação de pai e mãe, os indivíduos desejam
“algo” que caminhe a seu lado. Em 1984,
o compositor não se referia à linguagem
apenas como meio de comunicação ou expressão, mas, também, como símbolo de
uma história. História essa que, agora, trava luta constante para que o Brasil torne-se
uma nação densa, democrática, igualitária
e de alta qualidade.
No que se refere à educação, o País
ainda precisa encontrar medidas e promover uma série de ações sociais para se afirmar, finalmente, como “pátria educadora”,
lema proposto pelo governo da presidente
da república, Dilma Rousseff, para seu
segundo mandato. É possível dizer que a
educação foi estendida às mulheres, aos
negros, aos indígenas e aos moradores de
áreas rurais. Apesar disso, ainda é grande
o desafio de fazer das escolas um ambiente
acolhedor, de inclusão e respeito. Para tal,
há de se criar condições para que o ensino
não ocorra apenas no âmbito escolar, assim como para trabalhar a política, a cidadania e a desigualdade social.
No dia 28 de abril de 2000, durante o
Fórum Mundial de Educação, realizado em
Dakar, no Senegal, representantes de 164
países estabeleceram seis metas, junto
à Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco),
com o objetivo de ampliar o acesso ao ensino de qualidade no mundo, com prazo de
cumprimento em 2015.
Os dados foram publicados no dia
9 de abril de 2015 e o resultado não é
nada satisfatório. Somente um terço dos
países alcançou os objetivos mensuráveis
de Educação Para Todos (EPT). O Brasil
atingiu apenas duas metas no prazo de 15
anos: garantir educação primária universal,
do primeiro ao quinto anos do ensino fundamental – particularmente, para meninas,
minorias étnicas e crianças marginalizadas
– e alcançar paridade e igualdade de gênero, o que significa levar meninos e meninas às escolas em proporções idênticas.
“Enquanto o Brasil não tiver um outro
projeto societário, será muito difícil falar
em ‘pátria educadora’. A própria presidente
Dilma disse que pensar nesse lema não é
enfatizar apenas a escola”, destaca Luciano
Mendes de Faria Filho, um dos coordenadores do projeto “Pensar a educação, pensar o Brasil (1822-2022)”, desenvolvido em
rede por 11 instituições de ensino e pesquisa do País. O que fica evidente é que não
se pode esperar um sistema educacional de
boa qualidade sem boas políticas públicas.
Sozinha, a escola não realiza toda a
educação necessária, apesar de, nos últimos 200 anos, as instituições de ensino
terem adquirido centralidade na formação
das novas gerações. Com base na comemoração do bicentenário da independência, a
ser completado em 2022, surgiu o projeto,
que estimula a discussão em torno dos sentidos da educação no espaço público. Desde
2007, a iniciativa articula ações de ensino,
pesquisa e extensão em universidades públicas brasileiras, como forma de procurar
alternativas para pensar o Brasil.
Vertentes de ação
De que modo tornar a discussão sobre educação mais densa, uma vez que a
grande mídia veicula, predominantemente, relatos sobre a violência nas escolas?
Além disso, é bastante comum ver, na imprensa, os preceitos educacionais sendo
discutidos por jornalistas, economistas,
psicólogos, sociólogos e outros profissionais que não se especializaram no assunto. Segundo Luciano Mendes, as ações
de violência envolvendo a escola e seus
sujeitos, por exemplo, cresceram muito,
mas ainda estão aquém dos números do
“mundo social”. Enquanto isso, as boas
experiências de ensino e aprendizagem, ou
de diminuição de atos violentos, acabam
estritas aos pés de página dos jornais.
Neste cenário, “Pensar a educação,
pensar o Brasil” tornou-se um grande
projeto de comunicação pública, ao promover amplos debates embasados em
pesquisa. Para tal, a iniciativa desenvolve
sete distintas vertentes de ação: um portal
eletrônico, um jornal, uma pesquisa, um
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
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programa de rádio, uma coleção, um seminário e uma revista.
No portal, é possível encontrar
qualquer informação sobre o projeto. Já
o jornal, que conta com cerca de 40 colaboradores, entre professores e alunos
de mestrado e doutorado do Brasil e do
exterior, apresenta, semanalmente, opiniões de especialistas sobre o tema, além
de notícias de divulgação científica e um
grande clipping sobre educação. Outra ação do grupo, a pesquisa intitulada
“Moderno, modernidade, modernização:
a educação nos projetos de Brasil no século XIX e XX” garante suporte teórico ao
trabalho desenvolvido. No total, são pesquisadores de 11 instituições brasileiras,
que investigam a educação no pensamento social e político brasileiro.
Já o programa de rádio vai ao ar às
segundas-feiras, às 14h, pela rádio UFMG
Educativa (104,5 FM) e é organizado nas
seguintes seções: entrevista, educação em
pauta, destaques do boletim e agenda da
educação. Há, ainda, as sessões especiais,
que discutem literatura, mídia e cinema.
Com 33 títulos publicados, a coleção busca reunir diferentes séries e temas
voltados a professores de educação básica, com ensaios, relatos e resultados de
pesquisas. Também foi criada uma revisão
bibliográfica sobre a pesquisa em educação. Um pesquisador é convidado a fazer a
revisão sobre um tema e indica outros dez
textos fundamentais sobre o assunto. Já o
seminário, hoje na nona edição, é realizado anualmente. Todos os anos, um grande
tema é escolhido para debate.
Em 2015, a discussão diz respeito
à formação de professores. No segundo
semestre, serão realizadas quatro conferências, no auditório da Faculdade de Educação da UFMG, e os interessados que não
puderem estar presentes ao evento poderão acompanhar ao vivo pela webrádioFAE
(www.radio.fae.ufmg.br) ou pelo canal que
o projeto mantém no YouTube. Após as
discussões, o seminário se desdobra em
uma disciplina de pós-graduação.
Além dessas ações, o projeto abriga
um programa de estágio para alunos da Pedagogia e da Comunicação, uma mobilização
das redes sociais para divulgação da pesquisa e para formação de professores e, também,
um boletim semanal de divulgação científica
construído com uma rede de articulistas de
várias universidades brasileiras.
Uma nova iniciativa está em gestação: trata-se de revista dedicada aos professores de escola básica, que divulgará a
pesquisa em educação e, também, experiências de professores. A publicação será
lançada, até o fim do ano, em parceria com
o mestrado da FAE.
Escola básica
Em 2008, Fernando Haddad, então
ministro da educação do governo Lula,
anunciou o primeiro Plano Nacional de
Formação dos Professores da Escola Básica (Parfor), com o intuito de formar, até
2013, 330 mil professores para educação
básica, com investimento de R$ 1 bilhão.
Até 2012, o Parfor implantou 1920 turmas.
Mais de 50 mil professores frequentaram
44
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
os cursos em turmas especiais do programa, espalhado por 397 municípios do País.
A realidade dos professores, contudo, ainda se caracteriza por baixa remuneração, salas de aula lotadas, material
didático insuficiente e infraestrutura inadequada. Por que, então, muitos professores
de escola básica permanecem realizando
ótimos projetos? Em parceria com o Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (SindUTE), o projeto
discute esse aparente paradoxo, dirigindo-se aos professores, de modo a funcionar
como uma espécie de política de formação
e de discussão pública sobre a carreira.
Luciano Mendes explica que o projeto busca ser um canal para reforçar o
debate sobre a dignificação da profissão.
Para tal, aliás, a revista pretende reforçar
os próprios professores da escola básica
como protagonistas do debate sobre sua
trajetória profissional. “A autoria é parte
da dignificação da profissão. No mundo
contemporâneo existe essa ideia de que
somos autores de nossa vida e de nossa
profissão, e os professores não são apenas consumidores de livros didáticos. Há
produção de conhecimento nessa experiência”, sublinha o coordenador.
Além de ações indiretas de alcançar
a escola básica, o projeto mobiliza a comunidade escolar à participação em programas de rádio realizados e transmitidos de
dentro das instituições de ensino. Dessa
forma, professores, pais e alunos podem
acompanhar de perto as ações do projeto,
além de incentivar a escola a apresentar
suas propostas para a educação. “Esperamos que todos esses canais sejam formas
de aproximar os professores da escola básica, que são o nosso público. O projeto
foi todo construído com a ideia de que é
preciso dialogar fortemente com os docentes, de modo a reconhecer sua autoria e a
valorizar a carreira e a profissão”, afirma.
Mesmo com várias iniciativas a envolver a comunidade escolar, o projeto
ainda não conseguiu alcançar os pais e os
alunos. “Temos que pensar nisso para o futuro: de que modo produzir material ‘com’
os alunos e não ‘para’ os alunos? Hoje, por
meio das novas tecnologias, é possível
criar canais de expressão da população e,
mais especificamente, da comunidade escolar. Há muitos projetos pelo Brasil afora
que já realizam isso e precisamos aprender
com eles”, completa o pesquisador.
Expectativas
Atualmente, o projeto conta com a
colaboração direta de cerca de 70 pessoas de todo o Brasil e do exterior, que, em
sua maioria, não imaginavam ser possível
colaborar com a formação de professores e
alunos por meio da comunicação pública
de suas pesquisas. Segundo Luciano Mendes, com o projeto, foi possível montar
uma rede de colaboração que se estendeu
aos campos da pesquisa e da extensão.
Outro bom retorno da iniciativa diz
respeito à formação de comunicólogos,
algo bastante importante no atual contexto das grandes mídias. “Os estudantes
que se formam em Comunicação Social
têm novos olhos e temos que aproveitar
esse momento. Tal formação específica é
muito atraente para o projeto”, confessa o
coordenador.
No mais, esperam-se melhores condições para exercício da profissão, assim como
a elevação da qualidade da escola no Brasil
– sobretudo a básica e a pública. Isso passa
pela elevação dos valores financeiros aplicados. “Esperamos chegar ao final da década
com os 10% do produto interno bruto (PIB)
aplicados na educação, mas é preciso que o
dinheiro seja bem gasto. É necessário aumentar os recursos porque o valor per capita,
no Brasil, é muito baixo em relação a outros
países”, comenta Luciano Mendes.
O projeto tem pretensão, ainda, de
mobilizar mais pesquisadores para discutir a educação também em espaços não
acadêmicos. Luciano Mendes comemora a
mobilização da comunidade para produzir conteúdo e interagir com a escola. “A
ideia é que mais pessoas participem, não
somente para pensar, mas para dar visibilidade à pesquisa e à discussão. Além disso,
devemos criar um portal de comunicação
pública”, defende, ao lembrar a necessidade de tornar ainda mais densa a “disputa”
pelos sentidos da educação.
ProJeto: Projeto de Extensão Pensar
a Educação Pensar o Brasil (18222022), em interface com Pesquisa
editAl: Apoio a Projetos de Extensão
em Interface com a Pesquisa
VAlor: R$ 47.349,36
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
45
LEMBRA DESSA?
Do leite ao
isotônico
Especialistas da UFV
estudam uso de soro
lácteo, resultante da
fabricação de queijos,
na produção de bebida a ser consumida
por esportistas
Diogo Brito
Verdade seja dita: o brasileiro gosta de se exercitar. Basta uma olhada nas
academias de qualquer cidade e é possível
perceber muita gente dedicada a atividades
físicas – o que é ótimo!
Diante de tanta gente a praticar exercício físico, uma pergunta revela-se fundamental: as pessoas se hidratam de maneira
ideal durante as atividades? A ingestão de
água durante a prática de ginástica, afinal, é
imprescindível à saúde do corpo. Pelo que
se pode perceber, muitos são os esportistas
que aderem ao uso de repositores energéticos, os conhecidos isotônicos. Nestes
casos, é preciso ficar atento! A necessidade
de consumo do isotônico é recomendada
apenas quando há perda de dois por cento
do peso corporal durante a “labuta”.
Reportagem publicada na edição nº 53
de MINAS FAZ CIÊNCIA, veiculada em
2013, tratava, justamente, da produção de
tais isotônicos – a partir, porém, de algo
bastante improvável: o soro que resta durante a produção de queijos. O texto da
revista apresentava os resultados preliminares de estudo realizado por um grupo de
pesquisadores do Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal de Viçosa (UFV), financiado
pela FAPEMIG) por meio do edital Demanda Universal. A equipe buscava solução
para o aproveitamento integral do chamado “permeado”, tanto do leite quanto do
soro usado na produção de queijo, assim
como para a diminuição dos impactos ambientais gerados pelo descarte de resíduos
orgânicos no processo de fabricação.
Ao produzir queijos, os fabricantes
lidam, basicamente, com dois distintos
componentes lácteos: o coalho – a parte
sólida usada durante a fabricação – e o
soro, líquido que detém boa parte dos nu-
46
trientes do alimento, o que inclui proteínas,
sais, vitaminas, lactose e enzimas.
Os primeiros resultados da pesquisa
indicavam que, por meio do processo descrito como “ultrafiltração”, seria possível
reduzir os impactos ambientais, já que o
permeado do soro e do leite não seria mais
tratado como resíduo – ou como subproduto da indústria de laticínios –, mas como
coproduto da indústria alimentícia, servindo de base a alimentos de suplementação
alimentar e ao enriquecimento do valor
proteico de alimentos.
Durante décadas, a ausência de tecnologia na indústria de laticínios não permitiu o aproveitamento adequado para os
dois derivados do leite. Assim, boa parte
dos produtos era descartada indevidamente nas redes fluviais sanitárias, tornando-os agentes poluidores do meio ambiente.
A coordenadora do projeto e doutora em
Ciência e Tecnologia de Alimentos, Edimar
Aparecida Filomeno, constatou, entretanto,
que, com os avanços da pesquisa, a composição dos permeados reuniria todos os
nutrientes necessários à elaboração de
bebidas hidroeletrolíticas e com potencial
para a produção de isotônicos.
Outra importante vertente da pesquisa envolvia os processos de coloração
e de escolha de sabor para as bebidas.
Devido à alta concentração de vitaminas
do complexo B, os permeados possuem
tom próximo à cor verde. Por isso, o grupo optou por dar ao produto o gosto de
limão, e, desse modo, fazer referência à
coloração natural do produto.
Cores e sabores
Após concluídos os estudos de
aplicabilidade do permeado do soro e do
leite, os esforços da equipe de pesquisa
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
concentram-se, agora, na adição de elementos de base natural capazes de atribuir novos sabores e colorações à bebida.
Segundo Edimar Aparecida Filomeno, a
equipe tem a intenção de inserir paladares não muito convencionais ao produto.
Trata-se de gostos característicos, por
exemplo, de diversas regiões mineiras.
“Trabalharemos com extratos de pigmentos naturais de frutas típicas do Brasil,
com destaque especial para o pequi, fruta
típica do cerrado de Minas Gerais”, conta. Açaí e jabuticaba são outras possíveis
apostas dos pesquisadores.
Mesmo com avanços significativos na
elaboração de bebida isotônica a partir do
permeado do leite – estudo realizado, coincidentemente, em período próximo às Olimpíadas 2016, no Rio de Janeiro (RJ) –, não
se espera a comercialização do produto nos
próximos anos. A coordenadora da pesquisa alega que, para tal, ainda seria necessário avaliar resultados técnicos importantes.
“No momento, o foco está na pesquisa. Os
resultados que envolvem a participação de
estudantes de pós-graduação e de iniciação
científica darão informações importantes
quanto ao emprego de embalagens adequadas, às condições de armazenamento, à vida
de prateleira, aos critérios de identidade e à
qualidade físico-química e microbiológica
do produto final”, explica.
Portanto, o produto deve chegar às
prateleiras somente após a última etapa
de testes. Tal avaliação é focada em um
público específico e pode demorar até
dois anos. “Estudos sensoriais estão
sendo executados para verificar a aceitabilidade da bebida isotônica junto ao
público, com ênfase nos praticantes de
atividade física”, esclarece.
Graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Ceará e mestre em Economia pelo Centro de Desenvolvimento e
Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais (Cedeplar/UFMG), Elton Eduardo
Freitas tem vasta experiência em pesquisas, análises econômicas e Data Science. O pesquisador também é o responsável pela área de
inteligência e de conteúdo do projeto DataViva, plataforma eletrônica aberta que, desde dezembro de 2013, oferece, aos usuários, dados
econômicos e outras informações acerca de diversos setores governamentais do Estado. Na iniciativa, que recebeu aporte de R$ 1,2 milhão
da FAPEMIG, Elton Freitas atua na definição de modelos, conteúdos e regras de negócios.
Diogo Brito
1
A plataforma DataViva foi aberta ao
público em 2013. Qual a avaliação de seu
funcionamento pela equipe que a gerencia?
Nossa expectativa era muito grande.
Foram quase 2 anos de trabalho conjunto
entre o governo do Estado e a equipe do
professor César Hidalgo, do Media Lab,
ligado ao Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT). A plataforma foi inicialmente pensada para atender o que chamávamos
de Sistema de Desenvolvimento Econômico
de Minas Gerais, e centrada em uma ferramenta que apresentasse o product space do
Estado. Com o decorrer do projeto, vimos
a possibilidade de fazer isso para todo o
Brasil. Chegamos, então, à segunda versão, lançada há pouco, com números que
consideramos impressionantes: são quase
77 mil usuários desde o lançamento da
primeira versão até hoje. No total, 793 mil
páginas foram visitadas. Estamos falando
de uma plataforma que exibe dados sobre
a economia brasileira. Os números, portanto, revelam-se bastante expressivos. O
DataViva vem sendo acessado por usuários
em diversos países e tem se transformado
em referência na busca por informações das
localidades brasileiras.
2
Hoje, a sociedade conectada exige
informações imediatas sobre determinados assuntos e o DataViva se destaca por
apresentar amplo raio-x do Estado. Que
outras informações podem, no futuro, ser
agregadas à plataforma?
Temos, como visão, transformar o
DataViva na melhor plataforma de visualização de dados abertos do Brasil, revelando novas perspectivas sobre problemas relevantes para o desenvolvimento de nossa
sociedade. A primeira versão da plataforma
continha informações sobre empregos for-
mais, obtidas no Ministério do Trabalho,
além de dados de exportação fornecidos
pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Lançamos, no
dia 24 de abril de 2015, a segunda versão
da plataforma, que não apenas conta com
novo layout, mas apresenta novos conjuntos de dados. Incluímos informações de
importação, que faltavam na primeira versão, e dados do Censo Escolar e do Censo de Educação Superior fornecidos pelo
Ministério da Educação. Pensamos numa
plataforma não focada apenas em desenvolvimento econômico, mas no desenvolvimento em si – seja ele econômico, social
ou humano. Para as próximas versões, trabalhamos a inclusão de, ao menos, duas
novas bases de dados. Uma delas seria a
base de informações do currículo Lattes,
de modo a captarmos a produção científica
no Brasil. A outra diria respeito ao Datasus,
que contém informações bastante detalhadas sobre o sistema de saúde brasileiro.
3
Quais os desafios para criar e gerenciar uma ferramenta com tal complexidade?
Posso citar três grandes desafios: o
primeiro deles foi a distância entre a equipe de desenvolvimento local e o grupo do
professor Hidalgo. Isso foi solucionado
com as atuais ferramentas de comunicação e de desenvolvimento, que nos ajudaram bastante nesse processo. O segundo
refere-se à obtenção dos dados. Ainda não
temos uma cultura de dados abertos, o que
dificultou bastante nossa vida. Foram inúmeras idas a Brasília para tentar conseguir
essas informações. Conseguimos convencer os fornecedores dos dados e fazer deles
parceiros desse projeto. O terceiro desafio
diz respeito ao fato de que o DataViva foi
construído por várias mãos. Montamos o
Grupo Técnico Ampliado – que chamamos
de GTA –, no qual tínhamos representantes
de várias instituições, do governo de Minas aos setores privado, federal etc. Essa
rede foi montada com vários intuitos.
4
A plataforma foi criada com base em
software de código aberto. Apesar disso, a
segurança das informações está resguardada?
Na verdade, todas as informações
que temos no DataViva também são públicas. Não há nenhum dado sigiloso. São
informações que você pode obter, até mesmo, nos sites dos ministérios. O que fizemos de diferente foi mostrar esses dados
de forma nunca antes vista. A plataforma
não só apenas conta com informações
abertas, como também o código é aberto e
pode ser obtido no repositório do projeto,
localizado na plataforma GitHub (https://
github.com/DataViva).
Qual a influência do DataViva no desenvolvimento do Estado?
O principal impulso do projeto está
na criação de uma cultura de dados para
a tomada de decisão. Antes, o “tomador
de decisões” necessitava de uma equipe
com técnicos que trabalhassem dados e
apresentassem resultados em complexas
tabelas de Excel. Com o DataViva, poucos
cliques podem ser suficientes para que
se encontre a informação necessária, de
forma muito mais amigável e reveladora.
Essa mudança cultural proporcionada pela
plataforma tem atraído não só a atenção
dos que se utilizam da DataViva para tomar decisões, mas, também, daqueles que
querem se inspirar nas ferramentas de visualização e de tecnologia para tratar suas
informações de forma inovadora.
5
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
47
5 PERGUNTAS PARA...
Elton Eduardo Freitas
LEITURAS
Tudo pelo
Essa reflexão sobre os efeitos e desdobramentos do Assédio Moral nas Organizações
Públicas, bem como a atuação dos sindicatos
frente a este problema em níveis local, regional,
nacional, e até mesmo, internacional, deixa claro o quanto ainda há de ser caminhado. Inclusive para fornecer a estas organizações, dentre
essas, as sindicais, maior suporte para a prevenção e o combate ao assédio, principalmente
em termos de políticas públicas.
trabalhador
Envolver as organizações públicas e
sindicais de forma efetiva no debate sobre
o assédio moral e considerá-las “como um
frutífero campo de pesquisas e intervenção
voltado ao desenvolvimento do bem-estar
e da qualidade de vida do trabalhador”: eis
o argumento central do livro Assédio moral
em organizações públicas e a (re)ação dos
sindicatos. O objetivo da obra é ajudar a
preencher a lacuna existente no ambiente
acadêmico sobre as discussões relacionadas ao assédio moral no contexto das
organizações.
A publicação reúne trabalhos de
autores com expressão nacional e internacional e se relaciona à linha de pesquisa
Políticas Públicas e Sustentabilidade, do
grupo de pesquisa Gestão e Desenvolvimento de Territórios Criativos do Conselho
Meu nome é
O fazer ciências é e sempre foi uma seara difícil de galgar em nosso país. Passamos
muitos anos sem grandes incentivos para a
área de desenvolvimento científico e pesquisas.
Mas, não obstante os percalços, conseguimos
destaques em campos particulares do avanço
da ciência em nível mundial. Como é o caso do
professor José Israel Vargas, que traz em sua
vivência o pioneirismo e o compromisso com a
modernização de várias áreas do conhecimento
científico no Brasil, aliados ao desenvolvimento
de estudos de interesse mais amplo.
48
A história de um dos principais nomes da produção científica brasileira acaba
de chegar às mãos dos leitores. O livro
Desafiando fronteiras, escrito pela historiadora Lígia Maria Leite Pereira, reconta a
brilhante trajetória do mineiro José Israel
Vargas, professor e pesquisador que, no
campo da ciência e da tecnologia, também
trabalhou como secretário de Estado, em
Minas Gerais, de 1977 a 1979, e ministro,
entre 1992 e 1998, nas gestões dos presidentes Itamar Franco e Fernando Henrique
Cardoso – além de ter atuado como embaixador do Brasil junto à Unesco.
Nascido em Paracatu (MG), Vargas
formou-se em química pela Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), e, logo
em seguida, ganhou o mundo. Como pesquisador, aprimorou-se em Cambridge, no
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), liderado pelo professor Magnus Luiz Emmendoerfer, da
Universidade Federal de Viçosa (UFV).
Também participaram da organização os
professores Suzana da Rosa Tolfo e Thiago
Soares Nunes, da Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC).
Livro: Assédio Moral em Organizações
Públicas e a (Re)Ação dos Sindicatos
Autores: Magnus Luiz Emmendoerfer,
Suzana da Rosa Tolfo e Thiago Soares
Nunes (organizadores)
Editora: CRV
Páginas: 276
Ano: 2015
“Ciência”
Reino Unido, em Grenoble, na França, e em
Moscou, na Rússia. Além de muitas histórias sobre tais jornadas internacionais, o
livro reaviva a caminhada do grande pesquisador em uma série de momentos relevantes, das descobertas do menino curioso
às experiências do gestor de ciência.
Livro: Desafiando fronteiras – Trajetória
de vida do cientista José Israel Vargas
Autora: Lígia Maria Leite Pereira
Editora: Editora UFMG
Páginas: 415
Ano: 2015
Nem só de biólogos vive o mundo da
ilustração científica. Nos últimos 10 anos,
a Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG) ofertou diversos cursos na área,
com temas e técnicas diversas – a maioria
ligada à extensão. Em tais iniciativas, artistas exploram seu
talento para a ciência ao possibilitar, por meio de imagens,
a descrição e a identificação de espécies, além da apresentação de características morfológicas essenciais ao estudo das
ciências naturais. Além de biólogos, também donas de casa,
engenheiros, geógrafos, farmacêuticos, fotógrafos, jornalistas, médicos e paleontólogos interessados na arte de desenhar o universo das práticas científicas podem atuar como
ilustradores. É preciso, contudo, especializar-se. Embora
pareçam criações artísticas, os desenhos obedecem a regras
internacionais.
BIG DATA,
SMALL DATA
Muitas vezes, percebem-se as pesquisas
quantitativas e qualitativas como abordagens distintas, embora possam ser
complementares. Em ensaio publicado
na revista Big Data & Society, a etnógrafa
Heather Ford buscou desmistificar tal visão, tendo por base o
trabalho desenvolvido sobre a Wikipédia, durante três anos,
em parceria com dois cientistas da Ciência da Computação.
Ao falar sobre sua experiência nesse trabalho conjunto, e,
principalmente, sobre os ganhos obtidos na pesquisa, apareceram temas importantes, todos relacionados à colaboração
científica: há muitas coisas em comum entre as abordagens
“quali” e “quanti” e o trabalho em conjunto resultou em visão
mais ampla e profunda sobre o assunto.
CoLECIoNISMo
Eis algo que, provavelmente, o caro leitor
já tenha feito (ou permanece a fazê-lo):
guardar e organizar coisas. Afinal, há pessoas que colecionam selos, livros, brinquedos, figurinhas e obras de arte. Apesar
de tudo ser colecionável, geralmente, as pessoas privilegiam
os objetos. Além disso, na maior parte das vezes, os itens
armazenados são antigos e guardam história. Atualmente,
o conceito de “antigo” mudou muito. Com a velocidade da
inovação, até um computador do fim do século passado já se
torna item de coleção. No podcast Ondas da Ciência, conheça
a coleção de computadores e videogames do professor Marco
Aurélio Birchal.
CIÊNCIA E
ESPoRTES
Seja na academia, nas quadras ou ao
ar livre, a prática de esportes ganha cada
vez mais adeptos, preocupados com a saúde e com o bem-estar. Devido à Copa do
Mundo de 2014 e aos Jogos Olímpicos de
2016, o interesse pelo tema só tem aumentado, não apenas
entre os amantes da prática de esportes, mas, também, no
âmbito acadêmico. Pesquisadores buscam contribuir com
estudos que permitam melhores resultados para os atletas,
além da redução de lesões. Neste episódio do Ciência no Ar,
falamos sobre como a ciência pode contribuir para a melhoria
do desempenho de atletas profissionais e amadores.
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hI P ER LI N k
ILUSTRADoR
CIENTÍFICo
50
MINAS FAZ CIÊNCIA • JUN/JUL/AGO 2015
Poucos conseguem vê-los em tal estado de paz e tranquilidade. Afinal, estão sempre em pleno voo, como resultado de asas que chegam a bater até 80 vezes por segundo. Nesta
bela imagem, um beija-flor da espécie Ramphodon dohrnii cuida de seu singelo ninho, construído nos galhos de uma Mangueira (Mangifera indica). A cena foi registrada no
quintal da casa de Aline Graziele Pinheiro Aguiar, que acompanhou de perto as etapas do processo de reprodução. As fêmeas da delicada ave encarregam-se de todo o trabalho
duro. Sem ajuda dos machos, elas constroem o “lar, doce lar”, encubam os ovos e alimentam os filhotes. Aline Aguiar é estudante de Engenharia de Produção nas Faculdades
Santo Agostinho de Montes Claros (MG).
VARAL
Aline Graziele Pinheiro Aguiar
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51
PARA USO DOS CORREIOS
MUDOU-SE
DESCONHECIDO
RECUSADO
FALECIDO
AUSENTE
NÃO PROCURADO
END. INSUFICIENTE
CEP
NÃO EXISTE Nº INDICADO
INFORMAÇÃO ESCRITA PELO
PORTEIRO OU SÍNDICO
REINTEGRADO AO SERVIÇO
POSTAL EM ___/___/___
___/___/___
_______________
RESPONSÁVEL
Avenida José Cândido da Silveira, 1500
Bairro Horto
Belo Horizonte (MG)
CEP: 31 035-536
Contatos: [email protected]
Blog: blog.fapemig.br/
www.facebook.com/minasfazciencia
www.twitter.com/minasfazciencia/
www.youtube.com/user/ciencianoar
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