Retalhos da Vida de S. Francisco de Assis
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Retalhos da Vida de S. Francisco de Assis
Clara de Assis O estilo de vida de Francisco não poderia ser privilégio dos homens. Muitas mulheres escutavam a sua pregação, observavam o seu estilo de viver o Evangelho e também queriam viver essa experiência. Uma delas foi Clara de Assis. Clara nasceu em 1194 em Assis, filha de Ortolana de Fiumi e Faverone Offreduccio de Bernardino, família desconhecida, mas que pertencia a uma estirpe de cavaleiros nobres da cidade de Assis. Recebeu da mãe uma sólida educação religiosa e do pai a personalidade forte. Tinha mais três irmãs e um irmão. Era admirada pelos seus longos cabelos dourados e seus olhos decididos. Era muito determinada; quando queria uma coisa, era porque queria. Clara ouvira falar de Francisco e de seu ideal de vida. De como Francisco abandonara a vida confortável proporcionada pelo negócio rentável do pai, para abraçar uma vida de miséria e entrega . Rufino, seu primo, contava-lhe sobre os episódios de Francisco e ela ouvia alegremente acerca da simplicidade do jovem de Assis. A tal ponto que o pai, temendo aquilo que mais tarde acabou por acontecer, proibiu que o primo Rufino lhe relatasse as peripécias de Francisco. Aos 18 anos, Clara ouviu Francisco pregar os sermões da Quaresma na igreja de São Jorge, em Assis. As palavras dele inflamaram tanto seu coração, que o procurou em segredo, pois também ela desejava viver a experiência de pobreza, simplicidade e Amor que Francisco anunciava. Francisco falou-lhe sobre o desprezo do mundo e o amor a Deus, e fortaleceu-lhe o desejo nascente de abandonar tudo por amor a Cristo. Encerrou a conversa dizendo: "Quero contar-te um segredo, Clara: desposei a Senhora Pobreza e quero ser-lhe fiel para sempre." Clara respondeu que "queria viver a mesma vida, a mesma oração e sobretudo a mesma pobreza". Acompanhada de Bona de Guelfuccio, amiga íntima, passou a frequentar a capela da Porciúncula para escutar Francisco. Estava decidida a viver o seu modo de vida. Mas como sair de casa? No Domingo de Ramos, dia 19 de março de 1212, rica e muito bem vestida, Clara participou da missa da manhã. Não havia meio de sair despercebida do castelo de seus pais, mas encontrou a única saída possível pela porta de trás do palacete: a saída dos mortos. Toda casa medieval tinha esta saída, por onde passava o caixão dos defuntos. À noite, quando todos dormiam, a nobre jovem Clara de Favarone fugiu de casa por esse buraco, abandonou os muros da cidade e percorreu cerca de 5km até chegar à Porciúncula, onde foi recebida com muita festa pelos irmãos menores, que tinham ido ao seu encontro com tochas acesas e a acompanharam até a porta da igreja. Ali se desfez das vestes elegantes e Francisco, com uma grande tesoura, lhe cortou os cabelos longos e dourados. Em seguida, deu-lhe o hábito da penitência: uma túnica de aniagem amarrada em volta por uma corda e um par de tamancos de madeira. Clara se consagrou pelos três votos: pobreza, obediência e castidade. Os familiares dando pela falta de Clara, enfurecidos, foram procurá-la. Entrando na capela, viram Clara agarrada ao pé do altar. Puxaram-na com tanta força que arrancaram o véu, percebendo então a cabeça raspada. Concluíram que nada mais poderiam fazer, Não conseguiriam mudar-lhe a idéia. Como Francisco não tinha convento para freiras e ela não poderia ficar entre os irmãos, irmã Clara ficou alguns dias no mosteiro de São Paulo e algumas semanas no mosteiro beneditino de Panzo. Por fim, recolheu-se a São Damião, numa casa pobre contígua à capela, onde ficou até sua morte em 1253. Nascia assim, ainda sob a regra beneditina, o que viria a ser a Ordem das Senhoras Pobres. Pouco tempo depois, seguiram-na na vocação a irmã Inês, 16 dias depois, e mais tarde sua irmã Beatriz e a mãe Ortolana. A obra tornou-se conhecida e diversas mulheres e jovens vieram fazer-lhe companhia. Ficaram conhecidas como as Senhoras Pobres, ou Irmãs Clarissas. Em pouco tempo, havia mosteiros em diversas localidades da Itália, França, Alemanha. Inês, filha do rei da Boêmia, também fundou um convento em Praga, e ela mesma tomou o hábito. Dotada de uma grande capacidade de comunicação, Clara foi responsável pela continuidade do ideal franciscano principalmente após a morte de Francisco, em 1226 Clara de Assis, mãe e adoradora A si própria Clara gostava de se denominar "uma plantinha do bem-aventurado pai Francisco". Ela nunca deixou os muros do convento de São Damião. Designada abadessa (superiora) por Francisco, em 1215, Clara dirigiu o convento durante 40 anos. Sempre quis ser serva das servas, submissa a todas e beijando os pés das irmãs leigas quando regressavam do trabalho de esmolar, servindo à mesa, assistindo aos que estivessem doentes. Enquanto as irmãs descansavam, ela ficava em oração e as cobria, caso as cobertas lhes caíssem. Saía da oração com o semblante sempre iluminado Falava com tanto fervor que facilmente entusiasmava os que ouviam suas palavras. A exemplo de Francisco, nutria fervorosa devoção ao Santíssimo Sacramento. Mesmo quando estava doente e acamada (esteve sempre doente nos últimos 27 anos de vida), ficava confeccionando belos corporais e toalhas para o serviço do altar, que depois distribuía pelas igrejas de Assis. A força e a eficácia poderosa de sua oração pode ser sentida em 1244, quando o imperador Frederico II atacou o vale de Espoleto, tendo a seu serviço um exército de sarracenos. Lançaram-se ao saque de Assis, e como São Damião ficava fora dos muros, resolveram começar por ali. Embora muito doente, Clara fez colocar o Santíssimo num ostensório, bem à vista do inimigo. E Clara orou com grande fervor, pedindo a Cristo que salvasse suas irmãs do saque e do estupro. Em seguida, orou pela cidade de Assis. No mesmo instante, o terror se apoderou dos assaltantes, que fugiram em debanda. A morte de uma Santa Clara suportou os longos anos de enfermidade com sublime paciência. Em 1253, teve início uma longa e interminável agonia. O papa Inocêncio IV deu-lhe duas vezes a absolvição com o perdão dos pecados, e comentou: "Queria Deus que eu necessitasse de perdão tão pouco assim". Doente e pobre, as mais altas autoridades da Igreja sentiam sua sabedoria e santidade e vinham aconselhar-se com ela em São Damião. Durante os últimos 17 dias não conseguiu tomar nenhum alimento. A fé e a devoção do povo aumentavam cada vez mais. Diariamente cardeais e prelados chegavam para visitá-la, pois todos tinham certeza de que era uma santa que estava para morrer. Irmã Inês, sua irmã, estava presente, bem como os três companheiros de Francisco, os freis Leão, Ângelo e Junípero. Vendo que a vida de Clara estava chegando ao fim, emocionados, leram a Paixão de Jesus segundo João, como tinham feito 27 anos antes, na morte de Francisco. Clara consolou e abençoou suas filhas espirituais. E, para si, disse: "Caminha sem receio, pois tens um bom guia. Ó Senhor, eu vos agradeço e bendigo pela graça que vos dignastes conceder-me de poder viver". E foi recebida na corte celeste. Era Senhora Pobre há 42 anos e tinha 60 de vida. Dois anos após sua morte, o papa Alexandre IV canonizou-a em Anagni. Era o ano de 1255. Há muitas lendas sobre Francisco e Clara. A amizade entre os dois foi relatada em inúmeros livros e até no cinema - em "Irmão Sol, Irmã Lua" (1973), do cineasta italiano Franco Zeffirelli. Algumas biografias admitem que Clara e Francisco exerciam fascínio um sobre o outro, e que eram apaixonados pelo mesmo ideal. Existem teorias que defendem ser Francisco e Clara, duas almas gêmeas. A lenda que explica Santa Clara ter se tornado padroeira da televisão data do ano anterior ao da sua morte: ela teve uma visão à qual se fez a analogia para o "primeiro programa de TV" da história. No Natal de 1252, Clara estava muito doente e não pôde ir às celebrações da data. Quando as irmãs voltaram, Clara descreveu detalhadamente o que ocorrera na missa, como se estivesse presente. Diz a lenda que ela viu e ouviu tudo como se tivesse um televisor no quarto. A Carta Apostólica que nomeia Clara padroeira da TV cita essa lenda e justifica o título "para que essa invenção (a TV) seja protegida por uma direção divina, para evitar males e promover seu uso correcto". Foi o papa Pio 12 quem, em 14 de fevereiro de 1958, declarou Santa Clara "celeste padroeira da televisão". Os Companheiros de Francisco Francisco iniciou a sua missão espiritual, sozinho, explorando o seu Eu interno, e buscando as respostas para aquele sentimento que lhe vinha do fundo da alma. Criou uma rotina que consistia nos trabalhos de reconstrução de S. Damião (e mais tarde, Porciúncula e S. Pedro) na visita à leprosaria para cuidar carinhosamente dos seus leprosos, o peditório de comida para seu sustento à porta das casas de Assis e ainda horas de retiro nas grutas do Monte Subásio para oração e meditação. Mas Deus tinha algo de grandioso para lhe confiar e, para isso Francisco necessitava de ajuda. A sua vida espiritual não se podia resumir a abraçar a humildade, a longas horas de comunhão com Deus e à prática da caridade. Devia sair pelo mundo anunciando a sua alegria e a sua mensagem de Amor e Humildade. O primeiro a dirigir-se a Francisco com o intuito de o seguir foi Bernardo, mas logo outros o seguiram. Francisco nunca procurou angariar seguidores. Antes, eram estes que em observação do seu exemplo e dos seus discursos na igreja de S. Rufino ou em qualquer praça pública sentiam o impulso e decidiam abandonar a sua vida material e entregar-se à vida de rigorosa humildade e espiritualidade defendida por Francisco de Assis. Milhares o fizeram. Alguns não aguentaram a dureza da prova - traduzida em sacrifício físico, fome, cansaço, frio e humilhação pública - e acabaram por desistir. Mas muitos mais foram os que seguiram Francisco até ao final dos seus dias e perpetuaram a sua herança espiritual até aos dias de hoje. Quando o grupo chegou a 12 irmãos, São Francisco decidiu ir até Roma e pedir ao Papa autorização para viverem a forma mais pura do Evangelho, conforme o desejo e a escolha que fizeram.O Papa achou que seria muito duro para ele esse modo de vida, porém deu permissão e também autorizou que eles pudessem pregar. Durante esse período de visita, o Papa teve um sinal profético e reconheceu em Francisco, o homem que em seu sonho segurava a Igreja como uma coluna. Muitos outros Irmãos foram se juntando ao grupo, desejando viver conforme Francisco.Os frades fizeram suas habitações em choupanas ao redor da Igrejinha da Porciúncula. Dividiam as actividades entre oração, ajuda aos pobres, cuidados aos leprosos, e pregações nas cidades, também se dedicavam às actividades missionárias, indo 2 a 2 até lugares distantes; eram alegres, pacíficos e amigos dos pobres. Uma grande preciosidade para Francisco e a Ordem dos Frades Menores veio de uma jovem, de família nobre de Assis, chamada Clara. Ela procurou Francisco pedindo para viver o mesmo modo de vida, segundo o Evangelho.Ela ajustou o modo de vida dos Frades, para mulheres e recebeu, por sua vez, muitas companheiras de conversão. Muitos Cristãos ouvindo Francisco de Assis, decidiram seguir o seu exemplo e ensinamento, alguns pediam conselhos, e Francisco dava orientações conforme o estado de vida de cada um. Dentre os seus companheiros, destacamos: Frei Bernardo Frei Rufino Frei Masseo Frei Ângelo Frei Leão Frei Elias Frei Peregrino Frei Egídio Frei Junípero Hoje, na cripta da Basílica de S. Francisco de Assis, onde repousam os restos mortais do irmão de Assis, permanecem à sua volta os restos mortais de quatro dos seus mais íntimos companheiros: Frei Ângelo, Leão, Rufino e Masseo. Só há uma Verdade, e para lá chegar um único caminho: o Amor. Frei Masseo As Peregrinações de Francisco Francisco dedicou grande esforço na difusão da sua filosofia de Vida e do Amor e Entrega em profundo respeito à Bíblia e à sua querida Dama Pobreza. Desde cedo, ele e seus companheiros correram a Itália, depois a Europa, tendo mesmo chegado ao Egipto e à Terra Santa. Após o seu abandono da vida confortável e boémia que levara enquanto jovem, depois do julgamento eclesiástico a que foi sujeito na praça Santa Maria, respondendo às acusações de seu pai, Francisco despiu-se de tudo quanto o ligava à sua vida abastada e iniciou uma viagem até Gubbio, uma cidade da Úmbria próxima de Assis. Esse caminho, é hoje conhecido como a primeira peregrinação de Francisco e é percorrido por milhares de peregrinos de todo o mundo. Trata-se do Sentiero Francescano. Mas na verdade, Francisco já tinha ido antes a Roma visitar a igreja do apóstolo Pedro. Numa outra de suas peregrinações, Francisco foi em peregrinação a Santiago de Compostela em Espanha, visitar o túmulo do apóstolo Tiago na companhia de alguns de seus frades. Para mais detalhes acerca do Caminho de Santiago, visite Caminho Português de Santiago ou Caminhos de Santiago. Franciscou foi também à Terra Santa onde se regozijou por percorrer os mesmos caminhos que nosso Mestre Jesus percorreu e ao Egipto, onde tentou converter o povo do Egipto.. É impressionante verificar a precariedade das vestes e demais apetrechos de Francisco e dos Irmãos Menores. O beato Francisco, terminada a obra da igreja de São Damião, vestia o hábito de eremita com um bastão na mão, sandálias nos pés e uma cinta nos quadris. Um dia, porém, ouviu durante a celebração da Missa aquelas palavras que Cristo disse aos seus discípulos quando os enviou a pregar (que não levassem consigo nem ouro, nem prata, nem saco, nem alforje, nem bastão, nem pão, nem sandálias, nem tivessem duas túnicas). Compreendeu então essas coisas ainda mais claramente quando as ouviu da boca do sacerdote e, cheio de alegria, disse: "É isso que desejo realizar de todo o meu coração." Interpretando então o que ouvira, alegremente se esforçava para praticar aqueles ensinamentos e, deixando a túnica dupla, dali em diante abandonou o bastão, as sandálias, o saco ou o alforje, fez-se uma túnica miserável e grosseira e, jogando fora a tira de couro, amarrou uma corda no lugar do cinto. Em seguida, aplicando-se de todo o coração para, ouvidas as palavras da nova graça, colocar em prática todas essas coisas, começou por inspiração divina a anunciar a perfeição evangélica e a pregar em público com palavras simples a penitência. De facto, Francisco e seus companheiros, percorriam longos quilómetros, de cidade em cidade, cheios de alegria em seu coração, mas também, algumas vezes tomados pelo sentimento de dúvida e medo, pela fome, pelo frio e cansaço. Caminhavam um dia inteiro, vestidos precariamente, descalços ou mais raramente usando rudimentares pantufas. Não transportavam alimentos e nem sequer água para o caminho. Entregavam-se totalmente ao Caminho e tinham fé que Deus não lhes faltaria com o essencial para que prosseguissem. Sujeitavam-se ao calor e ao frio, à chuva e ao gelo. Algumas vezes encontravam quem lhes desse de comer e beber, outras serviam-se do que a Mãe Natureza lhes oferecia mas outras vezes ainda, nada encontravam e então dedicavam o seu jejum a Deus. Algumas vezes encontravam alguém que por Amor a Deus lhes oferecia um lugar para pernoitar, mas muitas vezes dormiam ao longo do caminho. Alimentavam-se mal, sofriam pelo cansaço e frio e não podiam descansar confortavelmente. Francisco temia pelos seus irmãos. Cuidava deles como uma mãe cuida de seus pequenos filhos. Francisco passava muitas noites em meditação, em profunda comunhão com a Natureza, em busca das respostas para poder continuar a sua missão. Esta é a verdadeira peregrinação. O verdadeiro mergulho no desconhecido interior de nossa Alma, a busca da nossa mais profunda Verdade, a descoberta do nosso Caminho na Vida, com Fé e Amor; com a absoluta certeza de que tudo neste mundo é transitório e cada dia, cada momento deve ser vivido intensamente na Caridade e Amor ao próximo: Sabemos que o nosso Caminho é feito de encruzilhadas e que as nossas decisões nos levarão ao destino que escolhemos a cada momento, a cada pensamento, aceitando as consequências das nossas decisões. O Tau O TAU é uma cruz com a forma da letra grega TAU (T). Além de ser um símbolo Bíblico é a última letra do alfabeto hebraico e a 19ª do grego, derivado dos Fenícios e correspondente ao "T" em Português. Na bíblia o profeta Ezequiel ouviu Deus: Na Bíblia o "Tau" foi utilizado pelo profeta Ezequiel: "E a glória de Deus de Israel se levantou do querubim sobre o qual estava, e passou para a entrada da casa e clamou ao homem vestido de linho branco, que trazia o tinteiro de escrivão à sua cintura. E disse-lhe o Senhor: passa pelo centro de Jerusalém e marca com um T as testas dos homens que suspiram e que gemem por causa de todas as abominações que se cometem na cidade". (Ez 9-3,4) O Tau é a mais antiga grafia em forma de cruz e significa Verdade, Palavra, Luz, Poder e Força da mente direcionada para um grande bem. O Tau, é a convergência das duas linhas: verticalidade e horizontalidade, significam o encontro entre o Céu e a Terra. Divino e Humano. Em 1215 o Papa Inocêncio III prega um novo símbolo cristão e São Francisco, estando presente neste reunião, assume o Tau como símbolo de sua Ordem Religiosa: a Ordem dos Frades Menores. Santa Clara, quando tratava dos doentes e enfermos com a imposição do TAU, invocava a Deus que curasse aqueles que padeciam e sofriam. No Tau de São Francisco há três nós representando seus votos perante a Deus: Pobreza, Obediência e Castidade. Significado do Tau o o o o o o o o Lembrança da Redenção, da Cruz, do Amor. Sinal de penitência e conversão interior. Sinal de dor pelos pecados do mundo. Rumo a uma espiritualidade sadia. Recordação do nosso baptismo. Filhos de Deus. Sinal dos que sofrem. Sinal de Salvação. S. Francisco selava o que escrevia com o TAU, para significar a densidade do amor de Deus, concretizada na Cruz do Cristo, sinal de Salvação. Assim podemos ver na mensagem que redigiu a Frei Leão, e que este conservou até ao fim dos seus dias. Hoje está em exibição na Basílica de S. Francisco em Assis. O Crucifixo Bizantino de S. Damião Foi por meio do Crucifixo de São Damião que Jesus falou a Francisco: "Francisco, reconstrói minha Igreja". Um artista desconhecido, natural de Úmbria, pintou o crucifixo no século XII. Foi pintado num pano colado sobre madeira (nogueira). Tem 1,90m de altura, 1,20m de largura e 12cm de espessura. O mais provável é que tenha sido pintado para ser posto no altar da Igreja de São Damião. Em 1257, as Clarissas deixaram a Igreja de São Damião e foram para a de São Jorge, levando o crucifixo com elas. A cruz, cuidadosamente conservada por 700 anos, foi mostrado ao público pela primeira vez, na Semana Santa de 1957, sobre o novo altar da Capela de São Jorge na Basílica de Santa Clara de Assis. A FIGURA DO CRISTO A figura central do ícone é o Cristo, não só por seu tamanho, mas também por ser o Cristo a figura luminosa que domina a cena e transmite luz para as demais figuras. "Eu sou a luz do mundo; aquele que me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida" (Jo 8, 12). Os olhos de Jesus estão abertos: Ele olha para o mundo que salvou. Ele vive e é eterno. A veste de Jesus é um simples pano sobre o quadril - um símbolo tanto do Sumo Sacerdote como de Vítima. O tórax e o pescoço são muito fortes. Atrás dos braços esticados do Cristo está seu túmulo vazio, representado pelo rectângulo preto. O MEDALHÃO E A INSCRIÇÃO A ascensão é retractada no círculo vermelho: Cristo está saindo dele segurando uma cruz dourada que, agora é Seu símbolo de realeza. As vestimentas são douradas, símbolo de majestade e vitória. A estola vermelha é um sinal de sua autoridade e dignidade supremas exercidas no amor. Anjos lhe dão boas-vindas no Reino dos Céus. IHS são as três primeiras letras do nome de Jesus em grego. NAZARÉ é o Nazareno. A MÃO DO PAI De dentro do semicírculo, na extremidade mais alta da cruz, Ele, que nenhum olho viu, se revela numa benção. Esta benção é dada pela mão direita de Deus, com o dedo estendido. A VIDEIRA MÍSTICA Em torno da cruz, há ornamentos caligráficos que podem significar a videira mística, "Eu sou a videira, vós os ramos..." (Jo 15, 5), e faz relação com "ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida por seus amigos" (Jo 15, 13). Na base da cruz, há algo que parece ser uma pedra - o símbolo da Igreja. As conchas do mar são símbolos de eternidade - um mistério, guardado no rosto e infinito mar da eternidade, nos é revelado. MARIA E JOÃO Como no evangelho de São João, Maria e João são colocados lado a lado. O manto de Maria é branco, significando vitória (Ap 3, 5), purificação (Ap 7, 14) e boas obras (Ap 19, 8). As pedras preciosas no manto dizem respeito às graças do Espírito Santo. O vermelho escuro usado indica intenso amor, enquanto a veste interna na cor purpúrea lembra a Arca da Aliança (Ex 26, 1-4). A mão esquerda de Maria está no rosto, retractando a aceitação do amor de João, e sua mão direita aponta para João, enquanto seus olhos proclamam a aceitação das palavras de Cristo: "Mulher, eis aí teu filho" (Jo 19, 26). O sangue goteja em João neste momento. O manto de João é cor de rosa que indica sabedoria eterna, enquanto sua túnica é branca - pureza. Sua posição é entre Jesus e Maria, o discípulo amado por ambos. Ele está olhando para Maria, aceitando as palavras de Jesus: "Eis aí tua mãe" (Jo 19, 27). NÚMEROS Há 33 figuras no Ícone: duas imagens de Cristo, 1 mão do Pai, 5 figuras maiores, 2 figuras menores, 14 anjos, 2 pessoas desconhecido nas mãos de Jesus, 1 menino pequeno, 6 desconhecidas ao fundo da Cruz e um galo. Há 33 cabeças em torno da cruz, dentro das conchas, e sete ao redor da auréola. AS OUTRAS FIGURAS MAIORES Maria Madalena Maria Madalena, que era considerada por Jesus de uma forma muito especial, está junto à cruz. Sua mão está no queixo, indicando um segredo "Ele ressuscitou". Sua veste tem cor escarlate, que simboliza amor, e seu manto azul intensifica este símbolo. Maria de Cleófas Usa veste cor castanha, símbolo de humildade, e seu manto verde claro - esperança. Sua admiração por Jesus é demonstrada no gesto de suas mãos. O Centurião de Cafarnaum Ele segura, na mão esquerda, um pedaço de madeira representado sua participação na construção da sinagoga (Lc 7, 110). As crianças ao lado é o seu filho curado por Jesus. As três cabeças atrás do menino mostram: "e creu tanto ele, como toda a sua casa" (Jo 19, 28-30). Tem três dedos estendidos, símbolo da Trindade, e os outros dois fechados, simbolizando o mistério das duas naturezas de Jesus Cristo (divina e humana). "Este homem era verdadeiramente o filho de Deus" (Mc 15, 39) FIGURAS MENORES Longinus O soldado romano que feriu o lado de Jesus com uma lança. Estefânio A tradição dá este nome ao soldado que ofereceu a Jesus uma esponja encharcada com vinagre após Ele ter dito "tenho sede" (Jo 19, 28-30) OS SANTOS DESCONHECIDOS Embaixo dos pés de Jesus, há seis santos desconhecidos que estudiosos afirmam ser Damião, Rufino, Miguel, João Baptista, Pedro e Paulo, todos patronos de igrejas na área de Assis. São Damião era o patrono da igreja que alojou a cruz e São Rufino, o patrono de Assis. Essa parte da pintura está muito danificada e não permite uma adequada identificação. OS ANJOS QUE DISCUTEM Há dois grupos de anjos - que animadamente discutem as cenas que se desenrolam diante deles. "Com efeito, de tal modo Deus amou o mundo, que lhe deu seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jo 3, 16) O SEPULCRO Como foi mencionado anteriormente, atrás de Cristo está o seu túmulo aberto. Cristo está vivo e venceu a morte. O vermelho do amor supera o negro da morte. Os gestos de mão indicam fé, a fé dos santos desconhecidos. Seriam Pedro e João junto ao sepulcro vazio? (Jo 20, 3-9) O GALO Em primeiro lugar, a inclusão do galo recorda a negação de Pedro, que depois chorou amargamente. Em segundo, o galo proclama novo despertar do Cristo ressuscitado, Ele que é a verdadeira luz (1 Jo 2, 8). "Mas sobre vós que temeis o meu nome, levantar-se-á o Sol de Justiça que traz a salvação em seus raios" (Mt 3, 20) O FORMATO DA CRUZ O formato tradicional da cruz alterado para permitir ao artista a inclusão de todos aqueles que participaram da paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo. À direita da cruz está o ladrão bom, chamado tradicionalmente Dismas; à esquerda está o ladrão mau. Os seguidores de Francisco de Assis Desde o século XII surgiram inúmeras pessoas, que baseadas na sua Fé em Deus e no exemplo de Francisco de Assis viveram uma vida de Amor e Entrega ao próximo. Muitas se destacaram e fizeram história. Alguns desses irmãos foram canonizados pela Igreja Católica. Muitos mais partiram sem deixar a sua marca impressa na História dos homens. A estas últimas, queremos dedicar esta página em especial. É surpreendente o número daqueles que aderiram aos ensinamentos de Francisco de Assis e, em maior ou menor grau, o seguiram. Entre os terceiros franciscanos contam-se o rei Luis IX de França, Carlos V, Maria Teresa da Áustria, Dante, Petrarca, Cervantes, Lope de Vega, Cristóvão Colombo, Miguel Ângelo, Rafael, Lizst, Gounod, Volta, Branly, Vicente de Paulo, João Bosco, Ozanam, Leão Harmel, o abade Pierre e José Folliet entre muitos outros. Aqui encontraremos algumas passagens da vida, daqueles que nos impressionaram pelo seu Amor Incondicional e a sua Entrega ao próximo, segundo a herança espiritual recebida de Francisco de Assis. Uns foram franciscanos, outros não; mas em todos eles encontramos a marca do Irmão de Assis. Madre Teresa de Calcutá (1910 a 1997,São José da Cruz (1625 a 1737, Itália) Índia) Frei Damião (1898 a 1997, Brasil) Maximiliano Kolbe (1894 a 1941, Polónia) São Berardo e Companheiros (... 1226, Itália) São Benedito (1526 a 1589, Itália) Santa Ângela de Foligno (1248 a 1297,São Boaventura (1217 a 1274, Itália) Itália) Santo António (1195 a 1231, Portugal) São Domingos (1170 - 1220, Espanha) São José Cupertino (1603 a 1663, Itália) Santa Isabel da Hungria (1207 a 1231, Hungria) Rogério Bacon (1214 a 1294, Inglaterra) Santa Margarida de Cortona (1247 a 1297) João Duns Scoto (1266 a 1309) São Bernardino de Sena (1380 a 1444) Santa Coleta (1381 a 1447, França) São Pedro de Alcântara (1499 a 1562) Padre Pio (1881 a 1968, Itália) Alberto Stancke (11904 a 1947, Alemanha) Jaquelina Settesoli (1190 a 1274, Itália) Por outro lado, o Amor transbordante de Francisco pela humanidade de Jesus Cristo marcou profundamente a oração cristã. Ele e os seus Irmãos Menores criaram o Presépio, a Via Sacra, a devoção ao Santíssimo Sacramento e ao Sagrado Coração de Jesus, o Ânngelus... A importância colocada na humanidade de Jesus abriu caminho a uma teologia em que Cristo é o centro e o vértice do universo. A influência de Francisco de Assis não conhece limitações de fronteiras geográficas, políticas ou religiosas nem o desgaste do tempo e ultrapassa em muito a família franciscana propriamente dita A Família Franciscana As Instituições Franciscanas Hoje Ordem Franciscana Ordem das Clarissas Ordem Terceira Capuchinhos Em 1209, um jovem de Assis, Francisco, apaixonado por Jesus Cristo "pobre e crucificado", que por amor se fez "irmão nosso", junto com seus primeiros 12 companheiros, iniciou uma forma de "vida segundo o Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo". O Papa Inocêncio III aprovou, oralmente, o propósito da vida evangélica. Iniciava, assim, "como uma primavera", a presença rejuvenecedora do movimento franciscano, no mundo e na Igreja. Em 1221, com a Bula "Solet Annuere", o Papa Honório III aprovou definitivamente a Regra, documento-base, em vigor até hoje, de vida e de santificação de Francisco e dos seus seguidores. Pela determinação do Fundador, os seguidores foram chamados de "Frades Menores". "Frades" (de frater=irmão), para indicar a fraternidade, o primeiro aspecto fundamental do movimento franciscano. "Menores", em clara alusão às palavras de Jesus e às duas classes sociais da época ("menores" e "maiores"), para indicar que a forma de vida e o lugar social dos franciscanos é viver "como" e "com" os pobres, sendo a pobreza o segundo fator característico do franciscanismo. A acentuação diversificada desses dois aspectos, fraternidade e pobreza, deu origem às disputas acerca das formas históricas de concretização do ideal primitivo, e resultou em três ramos dentro da chamada Primeira Ordem Franciscana: Frades Menores Frades Menores FradesMenores Conventuais OFMConv. Capuchinhos OFMCap. (Observantes) OFMObs. (ou OFM) Em 1212, a jovem Clara de Assis seguiu o atraente exemplo de Francisco e viveu, dentro da clausura e na contemplação, o ideal de pobreza evangélica. Surgiu, assim, a Ordem das Clarissas, ou a Segunda Ordem Franciscana. Às pessoas já comprometidas no matrimônio e com suas profissões, Francisco mostrou o caminho de comunidades leigas, comprometidas de viver, dentro dos seus compromissos, o ideal evangélico, com particular esforço para testemunhar a simplicidade, obediência aos Mandamentos de Deus, sendo promotores da Paz e do Bem. Surgiu, assim, por volta do ano 1221, o movimento franciscano chamado Ordem Franciscana Secular, ou Terceira Ordem Franciscana. Muitos atribuem a S. Francisco de Assis a criação do primeiro presépio. Contudo, a encenação da Natividade criada por este não pode ser considerada como um presépio, de acordo com o sentido que se dá este tem nos dias de hoje. Mesmo assim, é indiscutível o grande contributo de S. Francisco para o surgimento dos presépios. Tudo se passou na véspera de Natal, noite de 24 de Dezembro de 1223 (século XIII),com a realização de uma missa diferente dentro de uma gruta, onde estava representado o nascimento de Jesus. Para que tudo corresse conforme o planeado, S. Francisco de Assis teve de realizar alguns preparativos.Assim, prudentemente o Santo começou por pedir uma autorização especial ao Papa Honório III para criar a encenação, isto porque, 16 anos antes, o Papa Inocêncio III proibiu a realização de dramas litúrgicos nas igrejas, pelo que era necessário pedir para que tal proibição não se aplicasse naquele caso. Depois, Giovanni Vellita, o magnânimo senhor da região, disponibilizou os animais verdadeiros (um jumento e um boi) e o feno. Estes foram transportados para uma gruta que S. Francisco de Assis descobriu na floresta de Greccio (ou Grécio). No feno foi colocada uma imagem do Menino Jesus, estava assim criado o berço Deste e altar para aquela missa tão especial. S. Francisco criou ainda mais duas imagens, a da Virgem Maria e a de S. José, estas foram colocadas uma de cada lado do berço, junto destas estavam os animais. Estava assim tudo preparado para a realização da missa. Como já foi dito, a missa celebrou-se na noite de 24 de Dezembro de 1223, só que em vez se ser celebrada igreja como era habitual, esta realizou-se na gruta preparada por S. Francisco, sendo celebrada pelo cardeal Ugolino, Conde de Segni, em seguida, S. Francisco falou aos fieis. Passados 2 anos, S. Francisco faleceu, contudo durante esses anos não se tornou a realizar a representação do nascimento de Cristo. Talvez S. Francisco de Assis não possa ser considerado como o criador do presépio (tudo depende do ponto de vista), mas ninguém pode pôr em causa a importância do seu acto para o aparecimento destes, com este Santo deu-se um grande passo nesse sentido. Os frades franciscanos podem ser considerados verdadeiros pioneiros na construção de presépios, já que imitaram a encenação criada por S. Francisco em igrejas e conventos por toda a Europa. Em 1986, embora não unanimemente, S. Francisco de Assis foi considerado patrono dos presépios. S. Francisco de Assis esteve na Beira-Serra, pelo Dr. Alberto Diniz da Fonseca Está hoje demonstrado que a Guarda foi o berço da poesia lírica portuguesa, terra natal de Rui de Pina, o mais fecundo dos nossos cronistas, e foi aqui que se completou a independência de Portugal, quer pela junção das terras de Riba Côa, quer pela pacificação moral estabelecida pela concordata com o clero. A Guarda é hoje a cidade dos 5 FF – formosa, fria, forte, franca e farta, e é sob o ponto de vista da salubridade, já desde os tempos de D.Fernando, conhecida pela cidade da Saúde. É na Guarda que está o segundo monumento do paíz – a sua catedral – assim como é nesta que se encontra a melhor obra de João de Ruão – o precioso retábulo do seu altar-mór. Só na Guarda podem hoje encontrar-se ao mesmo tempo, dentro da mesma praça,casas sobradadas dos séculos XIV, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX e XX. A Guarda é ainda célebre por dentro dela se terem albergado não só a Rainha Santa, que aqui veiu passar a sua lua-de-mel, mas ainda o grande patriarca S.Francisco de Assis, que visitou a capelinha românica do Mileu, e deu princípio à fundação do convento que hoje está transformado em quartel. Da estada de S. Francisco d’ Assis na Guarda, há constante tradição, e fala um documento, escrito em pergaminho que existia na Ordem Terceira, de Trancoso, e que foi vandálicamente queimado pelas tropas que ali passaram, quando foi da Traulitânia, mas de que existem cópias e traduções uma delas publicada na Folha de Trancoso, e que a seguir reproduzimos: D.Gonçalo Mendes de Sousa, Alcaide-Mor de Trancoso. Faço esta memória por indicação de meu Padrinho (?) o muito Reverendo Cónego do Santíssimo Sacramento. Em o terceiro Domingo de Março de 1252 ( 1214 ) houve grande rumor e alvoroço nesta Vila e fui imediatamente investigar e nessa ocasião foi-me dito que eram Homens de Almeida, e falando eu aos mesmos homens, me disseram Ter aqui chegado, viajando das Espanhas e tendo entrado por Almeida, um Homem tido por Santo; ali tomou homens por companhia até esta vila e por eles sou conhecedor que chegaram aqui ao declinar do Dia, ao Sol posto. Elle disse chamar-se neste Mundo Francisco, era de Itália, natural de Assis, e era um frade humilde, pobre, simples, magro. Francisco ou frade santo acolheu-se à Igreja de S.Bartolomeu o Velho, agora dedicada a S.Sebastião, sita no princípio das pastagens; ali ficou a orar, a rogar, a suplicar, só junto do Cadeiral; não trazia alforge e foi abonado de viveres que aceitou amavelmente agradecido. - in Revista ALTITUDE – II, 5 ( 1942 ) São Francisco de Assis: O Trovador de DEUS Sabemos que S. Francisco, nos tempos da sua juventude, em Assis, era conhecido como o «rei das festas», promovendo o convívio associado à poesia, à música e ao canto. As serenatas e os jograis dos trovadores encontravam nele um dos representantes mais entusiastas. Após a sua conversão, ocorrida em 1208, não abdica da sua sensibilidade artística. Existe um episódio curioso, na vida do santo, que ilustra a sua predilecção pela música, como prolongamento natural do seu coração enamorado por Cristo. Nas Fontes Franciscanas, lemos no Espelho de Perfeição: «A suavíssima melodia espiritual que botava dentro dele jorrava frequentemente para o exterior e encontrava expressão na língua francesa, e a poesia dos murmúrios divinos ouvidos por ele em segredo irrompia em cânticos de júbilo nesta mesma língua. Outras vezes colhia do chão um pedaço de madeira e colocava-o sobre o braço esquerdo; com a mão direita pegava outro pedaço à maneira de arco e passava-o e repassava-o sobre o primeiro, como se estivesse a tocar violino. Fazendo os gestos próprios, cantava em francês ao Senhor Jesus Cristo» (EP 93). Noutra ocasião pediu a Fr. Pacífico, que no mundo fora tocador de cítara, que fosse pedir uma emprestada para alívio das suas dores, quando fazia o tratamento dos olhos (cf 2 C 126). Francisco exprimia a alegria do seu coração enamorado por Cristo, associando a poesia e o canto à pregação. Deu largas à criatividade, representando o despojamento de Belém, através do presépio de Greccio. Mas como se isto ainda não bastasse, e porque a sua pregação é de alcance universal, Francisco não se contentando em pregar aos homens, dirige também a sua pregação às criaturas irracionais, correspondendo estas à sua presença e pregação, tendo ficado célebre a sua pregação aos pássaros. S. Francisco, em 1225, compôs o Cântico do Irmão Sol, junto do Mosteiro de S. Damião, onde viviam S. Clara e suas irmãs. Este texto foi composto não para ser lido, mas para ser cantado. Composto na língua do povo (dialecto da Úmbria), este cântico, de singular musicalidade, é considerado a mais antiga e a mais preciosa pérola da poesia italiana. De tal modo, que S. Francisco é considerado o primeiro poeta de Itália, tendo-lhe dedicando Dante Alighieri, mais tarde, uma generosa referência na sua Divina Comédia. No Cântico do Irmão Sol ou Cântico das Criaturas, o santo começa por se dirigir ao «Altíssimo, Omnipotente e bom Senhor», ao Pai de todas a Criação, para, logo depois, abraçar no seu louvor todas as criaturas nossas irmãs: o sol, a lua e as estrelas, o vento e as nuvens, a água e o fogo. Importa realçar que o Cântico do Irmão Sol brota da profundidade do coração enamorado de Francisco por Jesus Cristo, após dois longos anos de provação ou «noite escura» no cimo do Monte Alverne, onde recebera os Estigmas. Associando-se, assim, à Paixão do seu Senhor, S. Francisco experimentou o abandono dos seus irmãos, a doença e a ausência sensível de Deus. Contudo, numa noite, quase cego e tolhido de dores, o Senhor dissipa-lhe toda a dúvida e toda a treva, revelando-lhe a certeza da sua salvação. Então, de um jacto, compõe o Cântico do Irmão Sol. A luminosidade deste cântico expressa a alegria dessa noite, socorrendo-se do mesmo sempre que outras «noites» procuravam erguer a sua «voz», como o conflito que opunha o Bispo de Assis ao Podestá da cidade e a proximidade da morte (cf LP 44; 100). Tanto numa como noutra situação, pediu aos seus frades que entoassem e prolongassem este verdadeiro Hino da Alegria franciscana, tendo-lhe acrescentado duas estrofes: uma dedicada àqueles que constroem a Paz e outra à Irmã Morte. Em S. Damião inicia-se esse novo e inesperado canto de louvor perene, quais Laudes da nova Criação. Contudo, adivinhamse outros mais, quando lemos, na Legenda Perusina, que «Francisco, depois de compor os Louvores de Deus pelas criaturas, ditou também um cântico, letra e música, para alegria das Irmãs Clarissas do Mosteiro de S. Damião» (LP 45). O Poeta-Cantor, colocando em prática a afirmação de S. Agostinho, segundo a qual «cantar é rezar duas vezes», extravasa mediante a alegria do canto todo o seu sentir. Muitas vezes, «indo ele de longada pelo mundo, meditando e cantando a Jesus, interrompia e esquecia a caminhada para convidar as criaturas todas a louvarem com ele o Criador» (1C 155). Ainda assim, Francisco, cultivando a estética do Amor, subordina a beleza do canto e da criação à sintonia com o Criador, pedindo aos seus irmãos que na recitação dos Salmos não atendam «tanto à melodia da voz, quanto à consonância do espírito, de modo que a voz sintonize com o espírito e o espírito sintonize com Deus, e assim possam agradar a Deus e não, pela melodia da voz, encantar os ouvidos do povo» (CO 41-42). Deste modo, Deus constitui a Fonte de todo o Louvor, de todo o Canto e de toda a Música que brota do coração enamorado de Francisco pelo seu Senhor. Dos seus cânticos e jograis, irradia uma positividade que contrasta com os movimentos heréticos do seu tempo, mais predispostos a condenar do que a salvar. Francisco quer renovar a Igreja e a sociedade do seu tempo não pela condenação, mas pela exaltação da Bondade e do Amor de Deus, presentes no coração de cada homem, no mais íntimo de cada criatura e de todo o Universo criado pela mão de Deus. Frei Nélio Mendonça, ofm