correr por

Transcrição

correr por
correr por
Boston
Além de um desafio à superação física, as corridas representam
a celebração do desporto e de um estilo de vida saudável.
Entusiasmados, tanto corredores como público vibram a cada
quilómetro, que é suposto ser de festa e alegria.
A Maratona de Boston, no dia 15 de abril de 2013, tinha tudo
para ser assim; no entanto, terminou, inesperadamente, da
pior forma, com duas explosões perto da linha da meta que
causaram três mortos e dezenas de feridos.
Este livro é dedicado a Martin Richard, de 8 anos, Lu Lingzi,
de 23, e Krystle Campbell, de 29, que de um momento para o
outro deixaram de poder correr atrás dos seus sonhos.
Possidónio Cachapa _escritor
RUNNING 10 KM COM...IGO
Havia pouco mais de um ano, tinha engordado diversos quilos,
e a natação, que procurava manter regular, apesar da oposição
dos funcionários das piscinas públicas, que todas as semanas
inventavam uma nova forma de desmoralizar quem por lá aparecia
a dar trabalho, não estava a produzir grandes resultados.
Correr parecia-me a pior das opções para regressar
à forma; a mais estúpida, porque era uma espécie
de esforço inglório que não levava a lado algum.
Anos de educação física tinham reduzido este
desporto à nobre arte de cansar adolescentes durante o período letivo. Uma seca.
Por solidariedade com uma pessoa próxima, lá
comecei a ir dar umas voltas à Alameda. Rebentava ao fim de cinco minutos, mas arrastava-me
penosamente até aos oito, para depois andar, antes de voltar a correr, rebentar, e assim sucessivamente. Aos poucos fui ganhando resistência e o
hábito regular de me pôr às voltas, Fonte Luminosa acima e abaixo. Aos fins de semana, alargava o
exercício ao Estádio Universitário. Correr estava longe de ser um dos
meus desportos favoritos, mas ao menos não dependia de gente
hostil a dizer com ar de gozo: «Oh, meu amigo, hoje não há piscina
pra ninguém: parece que uma criança vomitou e isto é fecho e folga
para nós para o dia todo!» Para correr era preciso apenas enfiar os
sapatos e fazer-me ao caminho.
Só quando me propus fazer a primeira corrida, os menos de 7 km
da Ponte 25 de Abril, é que tudo mudou. Achava que não seria
capaz de a concluir, para começar. Uma légua parecia-me ter a
dimensão dantesca de uma maratona. Imaginei a coisa como
penosíssima, capaz de meter ambulância e tudo. Claro que não
aconteceu nada disto. Encontrei uma data de gente conhecida
em cima do tabuleiro, o dia luminoso e quente sobre o rio. Corri
divertidíssimo e, quando as pernas aqueceram, acelerei e cheguei
à meta capaz de fazer um pouco mais. E foi este «pouco mais»
que me empurrou. É esta vontade de ir mais longe, mais rápido e
com menos cansaço que puxa o corredor de fundo. Li Murakami,
que me ensinou que a mensagem de desistência que as minhas
pernas me enviavam, e que eu supunha pessoal, era afinal geral,
nos primeiros quilómetros, faz parte da manha delas. Nascidas
malandras, querem morrer malandras, debaixo de um corpo
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obeso, se tiver de ser. É preciso enganar-lhes o capricho, insistir,
continuar a correr, até que aqueçam e vão por si. E, quando o peito
já não souber muito bem onde ir buscar forças, caberá às ditas
fazer os últimos quilómetros, connosco em cima. Depois dessa
competição vieram outras, treinos que iam encurtando os tempos
e uma forma física que julgava perdida para sempre.
A primeira meia maratona é sempre gloriosa. Um ano depois
de ter começado, estava de novo na ponte, mas dessa vez com
21 km à minha espera. Pensei neles com o mesmo ceticismo
com que encarara os 7 km da primeira vez. É difícil contar a
solidão que se sente no último terço da corrida e antes dos dois
últimos quilómetros, nessa iniciação. Somos nós e a massa de
desconhecidos à nossa volta. Ninguém está contra nós, mas
também ninguém ficará connosco se cairmos para o lado. É pelo
menos o que se pensa. E, mesmo assim, continuamos a correr. Só
mais um quilómetro, antes de parar, só mais outro, ah, água!, estou
pronto para mais um pouco, as pernas gritam de dor, mais um,
mais outro, bananas! Viva!, o corpo recupera um pouco, venham
mais quilómetros, mais água, corpo abaixo, a meta lá ao fundo,
não consigo: vou rebentar aqui mesmo... só mais um esforço,
olho para os pés, para o chão, para os corpos em frente, a meta
mais próxima, acelero, o corpo diz para ter cuidado, abrando,
passam-me por ambos os lados, uma velha gorda (meu Deus,
como é que esta pessoa veio parar aqui, tão à minha frente?) a ser
ultrapassada, a meta, quase, a meta, um grandalhão com 1,90 m de
burrice passa-me, acha que me passa! Acelero, ele dá luta, acelero
mais, não me conheces, pá... A meta, os aplausos, a surpresa...
consegui. Corri 21 km e estou vivo, surpreendentemente.
«Running x quilómetros», escrevo muitas vezes no meu mural
do Facebook. Comecei a fazê-lo, primeiro, por surpresa: «Eh, pá,
olha o que consegui fazer!» Depois, como forma de incentivo às
muitas pessoas que me visitam. Se eu, o mais desastrado dos
atletas, sou capaz e me sinto melhor depois de correr, talvez
elas também se sintam motivadas para fazer o mesmo. Talvez
possa ajudar alguém a melhorar um bocadinho a sua vida com o
exemplo. Por isso, vou registando.
Um dia destes vou tentar a maratona. Até lá terei de me treinar a
sério. Atendendo às dificuldades dos últimos treinos, vou ter de
me treinar mesmo MUITO A SÉRIO. Mas uma maratona será como os
meus primeiros 7 km: intransponível. Por isso, naturalmente, mais
cedo ou mais tarde, terei de lhe provar que 42 é um número que
eu já conheço, enquanto idade. E já se sabe que nestas coisas da
superação pessoal o número pessoal também conta...
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017
top 10 corridas
+ 5 CORRIDAS DE SONHO
Tudo sobre as dez melhores corridas do mundo
e mais cinco provas imperdíveis (pág. 37).
047
roteiro das cidades
guia de prova
089
correr em portugal
os melhores locais
Conheça em Portugal alguns locais agradáveis
para correr ou simplesmente andar, seja em
sítios urbanos ou integrados na natureza.
103
corridas
nacionais e internacionais
Listagem de corridas em todo o mundo.
155
glossário
Conheça alguns dos termos mais comuns do
mundo das corridas…
159
as minhas corridas
registo pessoal
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correr é muito mais
do que um desporto,
é uma filosofia de vida!
Faz como eu, há cerca de uma década saltei do sofá e dediquei-me
de corpo e alma ao desporto, primeiro ao montanhismo e depois à
corrida. A cada etapa ultrapassada vivia um sentimento incrível de
vitória, nessa altura não vencia outros corredores nem distâncias,
mas a mim próprio, ainda hoje vejo assim as minhas competições.
Se correr é a forma mais simples, barata e com maiores benefícios
para o corpo humano, correr na natureza (trail running) é ainda
mais gratificante, pois conseguimos descobrir um outro país que,
de outra forma, seria impossível descobrir. A forma de ser e estar
das pessoas que correm trail é distinta da maioria que pratica
outras modalidades.
Para te iniciares nesta modalidade, deves inscrever-te na Associação Trail Running de Portugal. Assim ficas com um bom seguro
de acidentes em provas e treinos, ficas a conhecer os calendários
das provas que se realizam em Portugal e outras informações que
te podem ser úteis.
Deves comprar uma mochila de hidratação para treinos mais longos, sapatilhas apropriadas para correr em trilhos, um relógio com
função GPS para te aventurares nos trilhos e não te perderes. Leva
sempre contigo uma luz frontal, telemóvel, apito e uma manta térmica para qualquer lesão ou mesmo se te perderes.
Na estrada, trilhos, praia ou noutro local qualquer. O melhor é mesmo saltar do sofá e começar a correr!
Carlos Sá _trailer e ultramaratonista
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Correr
basta
Correr é uma atividade ancestral do ser humano. Hoje, continuamos
com as mesmas características biológicas do Homo sapiens sapiens,
de há 100 000 anos, e, portanto, mantemos a corrida como forma de
locomoção rápida e eficaz. Para chegar antes de a porta do elevador se fechar, até chegar primeiro que os concorrentes ao produto
apetecível em saldos, a primeira ação que nos lembramos de fazer
é correr. Nascemos preparados para correr, geração após geração.
De notar que para começar basta correr! Claro que roupas frescas e
que sequem depressa, calçado confortável, não necessariamente
com sola alta, mas justo ao pé e com sola aderente, são fatores
facilitadores. Outros aspetos que ajudam são os chamados hidratos de carbono complexos (alimentos como o pão!) que ingeridos
antes das corridas vão libertando lentamente os nutrientes que precisamos para ter energia.
Mas o importante é correr, e, para correr com mais prazer e de
modo a atingir os objetivos que nos propomos, o melhor treino é
simplesmente correr confortavelmente distâncias mais curtas ou
durante menos tempo. Correr com um ritmo que saiba bem, que
sintamos que, se o mantivermos, atingimos aquilo que nos propusemos. Não faz mal testarmos vários ritmos, até em dias diferentes,
para vermos como nos sentimos melhor. Se acharmos que não
aguentamos, não tem problema algum, abrandamos, paramos,
e continuamos no dia seguinte. É que, como nascemos «motivados» para correr, podemos correr também para nos desafiarmos
a nós mesmos. E cada dia podemos colocar um desafio diferente.
Por exemplo, conseguir completar uma certa distância (há provas
para todas as distâncias!), fazer um determinado tempo numa
dada distância, ou simplesmente para acompanhar amigos que
pretendem correr a mesma distância ou o mesmo tempo que nós.
O importante é desfrutar a corrida, de modo a ficarmos a saber,
mesmo que não seja por palavras, como devemos correr para atingir a meta desse dia. É que podemos ter a coragem de escolher ser
competentes a correr, em vez de apenas nos deixarmos arrastar
pela «correria» do dia a dia.
Duarte Araújo
Professor e investigador da Faculdade de Motricidade Humana
da Universidade Técnica de Lisboa
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A primeira VEZ
VAI PARTICIPAR
numa CORRIDA?
Se vai participar pela primeira vez numa corrida, é natural que esteja um pouco
inseguro e apreensivo. O intuito é que se divirta e desfrute bem cada momento;
no entanto, não vá «às escuras» e saiba como proceder perante diversas situações.
Se já é um corredor experiente... não faz mal relembrar algumas das regras e
princípios básicos para que tudo corra da melhor forma possível.
ANTES DA
CORRIDA
1. Respeite sempre o regulamento afixado pela organização, assim como as
indicações colocadas ao longo do percurso.
2. Depois de se inscrever, se por algum motivo não puder participar,
verifique, junto da organização se é possível receber o reembolso.
3. Saiba o dia e o local onde pode levantar o seu kit de atleta e qual a
documentação a apresentar.
4. Na noite anterior ao dia da corrida, verifique uma vez mais a data e
a hora do seu início.
5. Fixe sempre o seu número de identificação na parte da frente
da T-shirt.
6. Não se esqueça de ir à casa de banho antes de se alinhar para a
corrida, especialmente se tiver ingerido muitos líquidos.
7. Ao alinhar-se para a partida, escolha uma posição apropriada.
Ou seja, se achar que pode ficar nos primeiros lugares, fique na
frente da linha de partida. Se, pelo contrário, for mais lento
e estiver a correr pelo prazer, então posicione-se para trás. É
bastante frustrante para os corredores mais rápidos e com
ambições na luta por um bom lugar partirem atrás dos que
correm mais devagar.
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DURANTE
A CORRIDA
1. Nunca pare de repente. Escolha um posto de
distribuição de bebidas ou a linha de chegada.
2. Nos postos de água, o melhor é apanhar uma garrafa e afastar-se da mesa o mais depressa possível.
3. Habitualmente pode levar a sua própria garrafa de
água (na mão ou numa mochila).
4. Se geralmente ouve música enquanto corre, à partida
poderá fazê-lo (no entanto, verifique as regras – se não
mencionarem nada, pode). Todavia, lembre-se de que,
com a música, não vai ouvir o que se passa à sua volta, e a
verdade é que há muita gente em seu redor.
5. Respeite os voluntários que dão apoio à corrida.
DEPOIS DA
CORRIDA
1. Verifique a política da corrida em relação à entrega de prémios,
e caso exista a possibilidade de ganhar algum prémio, por favor,
fique para as entregas. Se, por algum motivo, tiver de sair antes,
certifique-se de que alguém o recebe por si.
2. Se tem alguma queixa a fazer sobre a corrida, poderá fazê-la se
possível junto da organização, dando-lhes sempre a oportunidade de
corrigir o erro ou a falha.
3. Se gostou da experiência, ótimo! Que esta seja a primeira de muitas
corridas. E porque não incentivar outras pessoas a participarem também?
«Prefiro correr com
companhia, embora
na maioria dos casos,
corra sozinho.»
João Ralha · Economista
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